Os Cinco Maiores Arrependimentos Antes de Morrer
De Bronnie Ware
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Sobre este e-book
Após anos de trabalho insatisfatório, Bronnie Ware decidiu procurar um emprego com mais significado. Sem qualificações formais ou experiência, acabou por se dedicar aos cuidados paliativos. Ao cuidar de pessoas em fase terminal, a vida de Bronnie transformou-se profundamente.
Mais tarde, escreveu um artigo para o seu blogue sobre os arrependimentos mais comuns partilhados por aqueles de quem cuidou. O artigo, intitulado Os Cinco Maiores Arrependimentos Antes de Morrer, tornou-se viral e foi lido milhões de vezes em todo o mundo.
Ao aplicar as lições aprendidas com aqueles que enfrentavam a morte à sua própria vida, Bronnie percebeu que é possível morrer com paz de espírito, através de escolhas conscientes.
Esta biografia envolvente é um livro corajoso e inspirador, capaz de transformar vidas e deixar o leitor mais compassivo e motivado para viver com plenitude.
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Os Cinco Maiores Arrependimentos Antes de Morrer - Bronnie Ware
Introdução
O vento uivava com uma determinação feroz no exterior de uma pequena casa de campo, nas Montanhas Azuis da Austrália. Com uma chávena de chá por perto, eu permanecia confortável no interior, teclando alegremente, absorvida na minha escrita.
Estávamos em 2009 e o segundo artigo para o meu blogue recém-criado, o Inspiration and Chai, desenrolava-se. Chamava-se Os Cinco Maiores Arrependimentos Antes de Morrer e fluía ao seu próprio ritmo, sem hesitações, guiado por memórias poderosas e claras. Nos oito anos prévios, foram-me oferecidas repetidas lições e perceções de vida transformadoras, enquanto permanecia à cabeceira de pessoas no leito da morte, como cuidadora e ouvinte.
O artigo espalhou-se tal qual um incêndio por todos os cantos do mundo. Após inúmeros pedidos, encontrei a coragem para partilhar esta sabedoria com maior profundidade. Para o fazer tinha de contar a minha própria história, sobre como os arrependimentos das pessoas no seu leito da morte me tinham mudado. A minha jornada na vida real, em direção a uma vida sem arrependimentos, era um exemplo dos próprios desafios da vida. Não fazia sentido partilhar apenas os arrependimentos. Isso já tinha feito no artigo. Quando alguns dos meus pacientes terminais insistiram para que partilhasse as suas mensagens, queriam que outros pudessem compreender plenamente a angústia e a dor que morrer com arrependimentos causa. Queriam que eu ajudasse outras pessoas a encontrar a coragem que lhes havia faltado.
Ao empenhar-me em criar a minha própria vida sem arrependimentos, enquanto ainda cuidava de pessoas em estado terminal, passei a compreender o quão difícil é libertarmo-nos de tudo o que nos impede de ser a nossa melhor versão. Viver sem arrependimentos não é algo que se atinja num estalar de dedos. Consiste num processo contínuo de decisões conscientes, ações bondosas para connosco mesmos e um balde cheio de coragem. A minha sincera intenção e esperança é que este livro o ajude a encontrar essa coragem para mudar.
Esta autobiografia foi traduzida para trinta e uma línguas, lida por mais de um milhão de pessoas por todo o mundo e conta com um filme em preparação. A importância da mensagem repercute-se, claramente, em pessoas de todas as classes sociais. Afinal de contas, vamos todos morrer e nenhum de nós deseja fazê-lo com arrependimentos. No fundo, queremos viver a nossa melhor vida, o que também inclui ousar ser a nossa melhor versão.
Conforme fui assistindo ao desenrolar da viagem deste livro, e ao meu próprio desenvolvimento ao longo do tempo, senti-me muito abençoada por ser a mensageira desta história. Ainda mais, estou incrivelmente grata por ter testemunhado a realidade da morte e do arrependimento. Enfrentar isso deu-me coragem em muitas ocasiões, sobretudo quando a vida parecia demasiado difícil. Encontrar a coragem para agir ou render, nunca será tão doloroso como estar no leito da morte com arrependimentos.
Estou muito grata à minha editora, Hay House, por me ter dado a oportunidade de fazer esta segunda edição. Os Cinco Maiores Arrependimentos Antes de Morrer foi originalmente publicado de maneira independente na sua forma original, após ser rejeitado por vinte e cinco editoras. Quando encontrou a sua onda, não houve tempo para o editar antes de ser profissionalmente publicado. Qualquer magia que este livro tivesse na sua forma original, era independente de quaisquer regras de composição ou gramática. Escrevi-o, simplesmente, como se estivesse a falar com um amigo, a partilhar a minha história e as dos pacientes que aprendi a amar.
Portanto, esta edição não está editada de uma forma tradicional, seguindo fórmulas ou regras. Consiste apenas numa limpeza gramatical e num reforço da mensagem em algumas partes. A minha vida e o meu estilo de escrita evoluíram nos últimos dez anos, desde aquela primeira experiência invernal nas Montanhas Azuis. Por isso, é maravilhoso poder trazer para esta segunda edição um pouco da essência da minha própria jornada, sem perder o poder da mensagem das queridas pessoas de quem cuidei.
Enquanto este livro continua a chegar a um número cada vez maior de mãos e corações à volta do mundo, reparei que lhes permite fazer mudanças e encontrar uma coragem imensa. Permite que as lágrimas corram e que os corações se ergam. Apoia o perdão e ensina a gentileza. Reforça também o quão sagrada e preciosa é a vida.
Que o resto das vossas vidas seja alterado da melhor forma, através da partilha desta história.
Com amor e bondade,
Bronnie
Dos trópicos à neve
— Não consigo encontrar a minha dentadura. Não consigo encontrar a minha dentadura. — O chamamento familiar ecoou pelo quarto, enquanto tentava desfrutar da minha tarde de folga. Coloquei o livro que estava a ler em cima da cama e saí para a sala de estar.
Como esperado, a Agnes estava parada com um aspeto confuso e inocente, exibindo o seu sorriso gengival. Desatámos ambas a rir. A este ponto a piada já deveria ter perdido a graça, uma vez que o desaparecimento da dentadura ocorria, pelo menos, dia sim, dia não. Mas tal nunca acontecia.
— Tenho a certeza de que fazes isto só para me trazeres de volta para ao pé de ti — ri-me, enquanto começava a procura do dia pelos lugares já conhecidos. No exterior, a neve continuava a cair, intensificando o aconchego e o calor da casa de campo.
Agitando a cabeça, a Agnes estava convicta:
— De forma alguma, querida! Tirei-a antes da minha sesta, mas quando acordei não a encontrei em lado nenhum. — Apesar da perda de memória, ela era fina como um alfinete.
A Agnes e eu tínhamos começado a viver juntas há quatro meses, quando eu respondi a um anúncio à procura de uma cuidadora para morar com ela. Como uma australiana em Inglaterra, eu estava a trabalhar e a viver num pub para garantir um teto sobre a minha cabeça. Foi divertido e fiz belas amizades com outros funcionários e habitantes locais. As competências de barista eram extremamente úteis e permitiram-me começar a trabalhar logo após a minha chegada ao país. Estava grata por isso. No entanto, senti que tinha chegado a altura de mudar.
Os dois anos antes de emigrar foram passados a viver numa ilha tropical, tão pitoresca quanto qualquer postal poderia retratar. Depois de mais de uma década a trabalhar no setor bancário, senti a necessidade de experimentar algo que me libertasse da rotina de segunda a sexta-feira, das nove às cinco.
Uma das minhas irmãs e eu aventurámo-nos numas férias para uma ilha no norte de Queensland, para obtermos os nossos certificados de mergulho. Enquanto ela se dedicava ao nosso instrutor de mergulho, o que foi muito benéfico para passarmos nos testes, eu escalei uma montanha. Quando estava sentada num enorme rochedo, a sorrir, tive uma epifania: queria viver numa ilha.
Quatro semanas depois, despedi-me do emprego no banco, alguns dos meus pertences foram vendidos e outros enviados para um arrumo na quinta dos meus pais. A partir de um mapa, duas ilhas foram escolhidas simplesmente pela sua adequação geográfica. Não sabia mais nada sobre estas ilhas, para além de gostar da sua localização e de haver uma estância em cada uma delas. Isto foi antes de a Internet nos permitir ter acesso a tudo num instante. Com as cartas de candidatura no correio, dirigi-me para norte, destino desconhecido. Estávamos em 1991, antes da chegada em massa dos telemóveis à Austrália.
Pelo caminho, o meu espírito despreocupado recebeu um aviso oportuno e cauteloso após um incidente durante uma boleia. O condutor desviou-se da autoestrada para um caminho de terra batida que não mostrava qualquer sinal de visitantes. À medida que as casas desapareciam e o mato se adensava, já longe da cidade pretendida, ele disse que queria mostrar-me onde morava. Felizmente, permaneci firme e determinada, mantendo conversa para conseguir sair daquela situação. Apenas algumas tentativas de beijos babados foram feitas por ele, quando, por fim, saí do carro o mais rápido que consegui e na cidade certa. Assim terminaram as minhas aventuras a pedir boleia.
Desde então, limitei-me aos transportes públicos e, tirando aquela experiência duvidosa, foi uma grande aventura sobretudo por não saber onde viveria a seguir. Viajar em autocarros e comboios permitiu que, enquanto me dirigia para climas mais quentes, o meu caminho se cruzasse com algumas pessoas fantásticas. Após algumas semanas a viajar, telefonei à minha mãe que tinha recebido uma carta a dizer que havia um emprego à minha espera numa das ilhas escolhidas. Desesperada para escapar à rotina bancária, cometi o erro ridículo de dizer que estava disposta a aceitar qualquer emprego. Então, poucos dias depois, estava a viver numa linda ilha com tachos e panelas até aos cotovelos.
A vida na ilha foi uma experiência fantástica, não só por me libertar da rotina de segunda a sexta-feira, mas também por me fazer perder a noção dos dias da semana. Adorei. Após um ano a ser não tão carinhosamente conhecida como «lava-pratos», evoluí para o bar. O tempo passado no bar foi, de facto, muito divertido e ensinou-me uma série de coisas sobre cozinha criativa. Mas era um trabalho quente, duro e suado num espaço sem ar condicionado, nos trópicos. Pelo menos, os dias de folga eram passados a passear por magníficas e húmidas florestas, a alugar barcos e a navegar até às ilhas vizinhas, a fazer mergulho ou simplesmente a relaxar no paraíso.
O voluntariado no bar acabou por me abrir a porta para esta tão cobiçada posição. Com uma vista digna de um milhão de dólares, sobre águas calmas e azuis, areias brancas e palmeiras ao sabor do vento, não era um trabalho difícil. Lidar com clientes felizes que estavam a ter as férias das suas vidas e tornar-me perita em preparar cocktails dignos de fotografias de folhetos de viagens, fazia com que a vida que conhecera anteriormente, enquanto ainda trabalhava no banco, estivesse a quilómetros de distância.
Foi atrás do balcão do bar que conheci um europeu que me ofereceu um emprego na sua empresa. Os desejos de viajar sempre fizeram parte de mim e, depois de mais de dois anos na ilha, precisava de alguma mudança e de desfrutar novamente de algum anonimato. Quando se vive e trabalha dentro da mesma comunidade, dia após dia, a privacidade no quotidiano torna-se sagrada.
Seria de esperar um choque cultural para qualquer pessoa que regressasse à vida continental após alguns anos passados numa ilha. Lançar-me dessa realidade para um país estrangeiro, onde nem sequer falava a língua, foi, no mínimo, desafiante. O meu caminho cruzou-se com algumas pessoas simpáticas durante esses meses e fico contente por ter tido essa experiência. Porém, precisava de amigos com interesses semelhantes aos meus, por isso acabei por partir para a Inglaterra. Cheguei lá apenas com dinheiro suficiente para um cartão de viagem para chegar à única pessoa que conhecia no país. E com uma libra e sessenta e seis pence de sobra, começou um novo capítulo.
O Nev tinha um sorriso grande e encantador e uma cabeça de caracóis brancos e finos. Era, também, especialista em vinhos e trabalhava no departamento vinícola do Harrods. Era o primeiro dia dos saldos de verão da loja. Vinda diretamente do ferry noturno que atravessava o canal, devia parecer uma vagabunda ao entrar naquele local elegante e movimentado.
— Olá, Nev. Sou a Bronnie. Conhecemo-nos uma vez. Sou amiga da Fiona. Há uns anos, dormiste no meu pufe — revelei por cima do balcão, com um sorriso alegre.
— Claro, Bronnie. — Fiquei aliviada ao ouvir a sua resposta — O que se passa?
— Preciso de um lugar para pernoitar durante algumas noites, por favor — disse, esperançosa.
Ao tirar a chave do bolso, o Nev respondeu:
— Claro. Aqui tens.
E com isso tinha indicações para a sua casa, um teto sobre a cabeça e o sofá dele para dormir.
— Achas que me podias emprestar dez libras, por favor? — perguntei com otimismo. Sem hesitação, ele tirou dez libras do seu bolso de trás. Com palavras de agradecimento e um sorriso alegre como resposta, estava encaminhada. Tinha uma cama e comida.
A revista de viagens na qual tencionava encontrar um emprego foi publicada naquela manhã, pelo que adquiri um exemplar, regressei à casa do Nev e fiz três telefonemas. Na manhã seguinte, estava a ser entrevistada para um trabalho com alojamento incluído num pub em Surrey. Nessa tarde, já estava a morar lá. Perfeito.
A vida desenrolou-se durante alguns anos com amizades e romance. Foram tempos divertidos. A vida na aldeia agradava-me, por vezes fazia-me lembrar a comunidade da ilha e estava rodeada por pessoas que tinha aprendido a amar. Além disso, não estávamos muito longe de Londres, por isso, fazia viagens regularmente, a maioria das quais eu desfrutava bastante.
Contudo, lugares distantes chamavam por mim. Queria visitar partes do Médio Oriente. Os longos invernos ingleses foram boas experiências e fiquei contente por os ter vivenciado. Eram um enorme contraste face aos longos e quentes verões da Austrália. Porém, eu tinha a opção de ficar ou ir embora e decidi ficar mais um inverno, determinada a conseguir poupar algum dinheiro para a minha próxima viagem. Para isso, eu tinha de me afastar do ambiente dos pubs e controlar a tentação de sair todas as noites para socializar. Nunca fui muito de beber, mas sair com frequência continuava a custar dinheiro que me podia levar a viajar.
Mal tomei essa decisão, o anúncio de emprego para o lugar de cuidadora da Agnes saltou-me à vista, uma vez que era no concelho vizinho de Surrey. O emprego foi-me oferecido na primeira entrevista, quando o agricultor Bill percebeu que eu era uma rapariga do campo.
A sua mãe, Agnes, tinha cerca de oitenta anos, cabelos grisalhos, pelos ombros, uma voz alegre e uma enorme barriga redonda, coberta quase todos os dias pelo mesmo casaco cinzento e vermelho. A quinta deles ficava a cerca de meia-hora de carro dos meus amigos, pelo que era fácil ver toda a gente nos dias de folga. No entanto, sentia-me num mundo diferente quando lá estava. Era bastante isolador visto que eu estava com a Agnes permanentemente, desde a noite de domingo até à noite de sexta-feira. As duas horas livres todas as tardes não me permitiam muito tempo para socializar, embora as usasse ocasionalmente para ver o meu homem inglês.
O Dean era um querido. Foi o humor que nos uniu assim que nos conhecemos. O nosso amor pela música também nos aproximou. Conhecemo-nos no dia seguinte à minha chegada, logo após a entrevista para o emprego no pub, e percebemos rapidamente que ambas as nossas vidas eram mais ricas e divertidas por nos conhecermos. Infelizmente, não era com ele que eu passava a maior parte do meu tempo nessa altura. Costumava ficar retida na neve em casa da Agnes e, muitas vezes, ocupada a tentar encontrar a sua dentadura. Era impressionante como ela encontrava tantos sítios diferentes, numa casa tão pequena, para perder os dentes.
A sua cadela, Princess, era uma pastora-alemã com dez anos e que largava pelo em todo o lado. Era uma cadela dócil, porém, estava a perder a força nas patas traseiras devido à artrite. Aparentemente, era uma doença comum nos cães daquela raça. Tendo aprendido com experiências passadas, levantei-lhe o traseiro e, por baixo, procurei os dentes da sua dona. Nesse dia, não tive sorte. Noutras ocasiões sentava-se neles, portanto valia sempre a pena procurar ali. Princess abanou a sua grande cauda e depois retomou o seu sono junto à lareira, esquecendo-se rapidamente da breve perturbação.
A Agnes e eu cruzámo-nos várias vezes enquanto continuávamos a procurar.
— Não estão aqui! — gritava ela do quarto.
— Aqui também não estão — respondia eu da cozinha. Inevitavelmente, trocávamos de lugar e eu acabava por procurar no quarto, e a Agnes na cozinha. Não há assim tantos quartos para procurar numa casa pequena, então verificávamos todos para ter a certeza absoluta. Naquele dia em específico, os dentes tinham escorregado para o seu saco de tricô, ao lado da poltrona na sala.
— Ah, tu és um tesouro, querida — disse ela, colocando-os de volta na boca. — Vem ver televisão comigo, já que estás aqui. — Esta era uma estratégia recorrente e eu sorri ao concordar com o seu pedido. Era uma senhora idosa que tinha vivido sozinha durante muito tempo e estava a desfrutar de companhia. O meu livro podia esperar. Não era como se o trabalho fosse extenuante. Era simplesmente companhia e se ela precisava disso fora das minhas horas de trabalho programadas, não havia problema.
Os dentes já tinham sido encontrados debaixo da sua almofada, no armário da casa de banho, numa chávena de chá no armário da cozinha, no seu saco de tricô e em muitos outros lugares quase inacreditáveis. Também já tinham aparecido atrás da televisão, na lareira, no caixote do lixo, em cima do frigorífico e no seu sapato. E, claro, debaixo da Princess e do seu grandioso traseiro de pastora-alemã.
As rotinas funcionam para muita gente. Eu floresço na mudança. Mas a rotina tem a sua importância e com certeza funciona melhor para muitas pessoas, especialmente à medida que envelhecem. Havia rotinas semanais e diárias com a Agnes. Todas as segundas-feiras íamos ao médico, uma vez que ela fazia exames ao sangue com regularidade. A consulta era à mesma hora todas as semanas. Uma atividade por dia era suficiente, caso contrário arruinaria a sua rotina da tarde, de descanso e tricô.
A Princess acompanhava-nos para todo o lado — fizesse chuva, granizo ou sol. Primeiro, baixava-se a traseira da pick-up. A velha cadela esperava pacientemente, sempre a abanar a cauda. Era um animal lindo. Depois, levantava-lhe as patas da frente para a plataforma traseira e erguia-lhe rapidamente a parte inferior do corpo, antes que as patas cedessem e tivéssemos de recomeçar. Via-me, assim, coberta de pelos de cão cor de areia durante o resto do passeio.
Descer era mais fácil, embora ainda precisasse de ajuda. A Princess deixava-se cair para que as patas da frente tocassem o chão. Depois, esperava que eu levantasse as patas traseiras. Se, entretanto, a Agnes precisasse de ajuda para alguma coisa, a Princess esperaria nessa mesma posição, até eu regressar. Uma vez no chão, ela caminhava feliz e sem dor, sempre a abanar aquela cauda grande e velha.
As terças-feiras eram passadas a fazer compras na aldeia mais próxima. Muitos dos idosos com quem tenho trabalhado desde então são muito frugais. A Agnes era o oposto. Estava sempre a tentar comprar-me coisas, sobretudo aquilo de que eu não precisava ou queria. Éramos vistas em cada corredor, as mesmas duas mulheres, uma idosa e uma jovem, a discutir uma com a outra. Estaríamos a sorrir e por vezes a rir, mas ambas determinadas. Como resultado, eu acabava por ficar com metade das coisas que a Agnes me queria comprar. Quer fossem várias iguarias vegetarianas, mangas importadas, uma nova escova para o cabelo, uma camisola interior ou uma pasta de dentes com um sabor terrível.
Às quartas-feiras jogava-se bingo, novamente, na aldeia local. A visão da Agnes estava a deteriorar-se, por isso, eu era os seus olhos para confirmar os números no bingo. Ela conseguia ler e ouvir relativamente bem os números, mas antes de riscar qualquer um, verificava comigo para ter certeza. Eu adorava todos os idosos presentes. Estava no fim dos meus vinte anos e era a única jovem, portanto, a Agnes sentia-se especial. Chamava-me «a minha amiga».
— Bem, eu e a minha amiga fomos às compras ontem e eu comprei-lhe umas cuecas novas — partilhava ela, séria e orgulhosa, a todas as suas amigas idosas do bingo.
Todos acenavam e sorriam para mim, enquanto eu estava ali sentada e a pensar: «Valha-me Deus!». A Agnes continuava.
— A mãe dela escreveu-lhe esta semana, da Austrália. Está muito calor lá nesta altura do ano, sabem. E ela tem um novo sobrinho. — Mais uma vez, as cabeças acenavam e sorriam.
Não demorei muito a aprender a filtrar a quantidade de informação que lhe dava. Detesto pensar o que eles teriam descoberto sobre a minha vida caso contrário, especialmente quando a minha mãe me enviou lingerie bonita e outros presentes, para me mimar à distância. Porém, tudo era inocente e terno com a Agnes. Portanto, consegui suportar a vergonha e o desconforto que ela às vezes me causava.
As quintas-feiras eram o único dia em que ficávamos fora durante a hora de almoço. Era um grande dia para nós as três, a Princess incluída, claro. Íamos de carro até uma cidade em Kent e almoçávamos com a sua filha. Cinquenta quilómetros era uma distância grande segundo os padrões ingleses, mas, para um australiano, era apenas um salto.
A nossa perspetiva de distância é, definitivamente, uma diferença cultural. Na Inglaterra, se conduzirmos três quilómetros chegamos a outra aldeia. O sotaque será totalmente diferente e podemos não conhecer ninguém, mesmo tendo vivido na aldeia vizinha a vida toda. Na Austrália, podemos conduzir oitenta quilómetros por um pão. Os vizinhos podem estar tão longe que telefonam ou falam pelo rádio para dizerem «olá», mas mesmo assim consideram-nos vizinhos. Uma vez trabalhei numa zona, no Território do Norte, tão remota que as pessoas voavam de avião para chegarem ao pub mais próximo. A pequena pista de aterragem ficava cheia de aviões de um e dois lugares ao início da noite, mas totalmente vazia na manhã seguinte, quando todos tinham voado de volta, meio bêbados, para as suas quintas.
Sendo assim, o longo passeio de quinta-feira era um grande dia para a Agnes, contudo, para mim, era um passeio de carro relaxante. A filha dela era uma mulher gentil e os momentos que passávamos juntas eram agradáveis. Elas comiam sempre um almoço ploughman’s, com carne, queijo e picles. Eu admirava o quanto os ingleses gostavam dos seus picles. Também era um bom país para vegetarianos, portanto as minhas escolhas nunca eram muito limitadas. Estando num clima tão frio, geralmente, gostava de uma sopa quente ou de um prato de massa reconfortante.
As sextas-feiras eram passadas sempre no mesmo sítio. Vivíamos numa quinta que tinha o seu próprio talho, gerida por dois dos filhos da Agnes. Quando saíamos nas manhãs de sexta-feira, era sempre a esse talho que íamos. Embora a Agnes insistisse em dedicar o seu tempo a analisar tudo detalhadamente, comprava as mesmas coisas todas as semanas, sem falhar. O talhante até se oferecia para ir entregar o seu pedido a casa, mas não.
— Muito obrigada, mas tenho de vir e fazer a minha escolha aqui — respondia ela educadamente.
Naquela altura eu era vegetariana. Agora sou vegana. No entanto, ali estava eu a viver numa quinta, um cenário não muito diferente daquele onde eu tinha crescido. Mesmo não defendendo o consumo de carne, compreendia o negócio e o estilo de vida. Afinal, era um território familiar.
Nós voltávamos do talho e atravessávamos o celeiro a conversar com os trabalhadores da quinta e com as vacas. A Agnes andava devagarinho com a sua bengala e eu sempre ao seu lado, com a Princess atrás de nós. O frio não importava, se fosse necessário vestíamos mais camadas de roupa. As sextas-feiras eram sempre passadas assim, visitávamos a loja e depois as vacas no celeiro.
Ficava maravilhada com o quão diferente as vacas inglesas eram tratadas em comparação com as australianas, com os seus celeiros aquecidos e atenção individualizada. Contudo, as vacas australianas não tinham de suportar os invernos ingleses. Mesmo assim, deixava-me bastante triste conhecer aquelas vacas, sabendo que provavelmente estaríamos a comprar a sua carne no talho dias mais tarde. Foi difícil aceitar essa realidade e, na verdade, nunca o consegui fazer.
A questão do vegetarianismo vinha à baila muitas vezes em casa da Agnes, apesar da minha tentativa de silêncio e do meu respeito pelo estilo de vida escolhido pela família. Eu não era o tipo de vegetariana, ou vegana, que gostasse de falar sobre isso em demasia. No entanto, por ter visto o que vi durante a minha educação, incluindo uma excursão escolar traumatizante a um matadouro, entendo a razão pela qual algumas pessoas são tão vocais e apaixonadas. Ficamos de coração partido quando encontramos coragem para olhar honestamente para estas indústrias e vemos o que acontece por trás das cortinas.
Contudo, preferia viver de forma tranquila e simples, dando o exemplo e, ao mesmo tempo, respeitando o direito de todos viverem como lhes faz sentido. Só falava das minhas crenças se me perguntassem e ficava feliz em fazê-lo, já que havia um interesse genuíno.
Quando a Agnes começou a questionar-me sobre a razão de ser vegetariana, hesitei. A sua sobrevivência dependia do rendimento da quinta de gado. Na prática, a minha também, embora na altura ainda não tivesse percebido isso. Aceitei o trabalho simplesmente com a intenção de poupar dinheiro e alegrar a vida de uma senhora idosa.
A Agnes insistiu com as perguntas. Por isso, contei-lhe sobre o que sentia ao assistir o abate de vacas e ovelhas quando era criança e como isso me afetou; o quanto eu amava os animais e como eu tinha notado que as vacas mugiam de maneira diferente quando sabiam que estavam prestes a morrer. Os sons de terror e pânico ainda me assombram.
E foi isso. A Agnes declarou-se vegetariana na hora. «Oh, meu Deus!», pensei. «Como é que vou explicar isto à família dela?». Falei sobre isso com o filho, Bill, pouco depois e ele falou com a mãe sobre o seu desejo de que ela continuasse a comer carne. No início, resistiu um pouco, mas acabou por aceitar comer carne vermelha um dia por semana, peixe e frango noutros dias. A família alimentava-a nos meus dias de folga, por isso estaria a comer carne também nesses dias.
Com o tempo, as minhas opiniões fortaleceram-se e agora nem consideraria aceitar um trabalho que envolvesse cozinhar carne. Porém, naquela época, foi o que fiz e detestava essa parte dos meus deveres. Não conseguia cozinhar carne sem me entristecer quando me lembrava que aquele tinha sido, em tempos, um lindo ser vivo. Portanto, gostei logo deste novo acordo, mesmo que peixe e frango fossem igualmente animais, a meu ver.
Acontece que a Agnes só tinha concordado com o Bill para manter a paz. Ela não tinha intenção nenhuma de comer qualquer tipo de carne durante a semana. Então, passei os restantes meses de inverno e primavera a preparar deliciosos banquetes vegetarianos com tortas de nozes, sopas deliciosas, salteados coloridos e pizzas gourmet. Penso que a Agnes teria vivido feliz com uma dieta à base de ovos cozidos e, claro, feijão cozido. Afinal ela era inglesa e os ingleses adoram o seu feijão.
A neve derreteu e os narcisos anunciaram a primavera. Os dias alongaram-se e os céus azuis regressaram. À medida que a quinta ganhava vida novamente, vitelos recém-nascidos corriam nas suas pernas trémulas. Os pássaros voltaram e saudavam-nos com o chilrear todos os dias. A Princess largava ainda mais pelo.
A Agnes e eu largámos os nossos casacos e chapéus de inverno, e continuámos com a nossa rotina habitual por mais alguns meses, desfrutando do sol primaveril. Éramos duas mulheres de gerações muito diferentes, a caminhar de braço dado, dia após dia, enquanto partilhávamos risadas e histórias contínuas.
O desejo de viajar ainda chamava por mim. Ambas sabíamos desde o início que me iria embora. Sentia falta do Dean também. Os fins de semana já não eram tempo suficiente para estarmos juntos e estávamos ansiosos por começar a viajar. O a vaga para o meu lugar foi anunciada e o nosso tempo juntas estava a chegar ao fim. Aqueles meses com a Agnes foram uma experiência maravilhosa e especial. Embora tivesse aceitado o emprego maioritariamente pelo benefício dos meus desejos de viajar, fazer companhia era um trabalho lindo.
Era muito mais agradável do que servir cervejas. Preferia ajudar alguém a caminhar com firmeza por ser