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Coletividades em afirmação: debates e visibilidades: - Volume 1
Coletividades em afirmação: debates e visibilidades: - Volume 1
Coletividades em afirmação: debates e visibilidades: - Volume 1
E-book177 páginas2 horas

Coletividades em afirmação: debates e visibilidades: - Volume 1

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Sobre este e-book

A obra "Coletividades em afirmação: debates e visibilidades", em seu volume 1, apresenta seis capítulos com trabalhos plurais com o objetivo de gerar debates e nos instigar a refletir sobre temáticas relacionadas a direitos humanos, trabalho, linguística, cultura e até antropologia, considerando diversas coletividades representadas por comunidades tradicionais, classes sociais, raças e gênero.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de set. de 2022
ISBN9786525257396
Coletividades em afirmação: debates e visibilidades: - Volume 1

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    Coletividades em afirmação - Francisco das Chagas Rodrigues de Morais

    A CONSTANTE LUTA FEMININA NO ESPAÇO SOCIAL E A DESIGUALDADE DE GÊNERO

    Francisco das Chagas Rodrigues de Morais

    Mestre

    [email protected]

    DOI 10.48021/978-65-252-5741-9-C1

    RESUMO: O presente trabalho discute a questão da desigualdade de gênero, além de pretender contribuir para a compreensão de como a sociedade enxerga a mulher, seu comportamento, e como se criaram as representações do feminismo em diferentes momentos históricos. Aborda também a questão das diferenças e da violência que a mulher enfrenta no mundo de hoje, com altas taxas de estupro, feminicídio e o problema das desigualdades no mundo do trabalho, tanto as laborais quanto as questões pertinentes à valoração. Foi realizada apurada pesquisa bibliográfica e em instituições renomadas quanto a dados estatísticos. Também são apresentadas reflexões da mulher e seu papel na sociedade em diversos períodos da História.

    Palavras-chave: Gênero; Feminismo; Violência; Feminicídio; Estupro.

    1. INTRODUÇÃO

    A desigualdade de gênero é, ainda, algo alarmante em termos globais. Salários mais baixos que os dos homens na mesma função laboral, violências físicas, psicológicas, feminicídio, jornada tripla de trabalho são apenas algumas das facetas mais claras aos olhos do mundo. Há todo um abuso a ser investigado e discutido: nações continuam escravizando suas mulheres, mutilando-as, negando-lhes o direito à educação, à escolha do próprio marido. São submetidas a sevícias, vistas como um ser que deve ser controlado e muitas vezes aprisionado, sobrando-lhes como moeda de sobrevivência a obediência e as funções da maternidade. Na sociedade patriarcal é o Estado que determina sobre seus corpos.

    A religião e a própria filosofia sempre foram usadas pelos homens para respaldar a submissão das mulheres, mantendo-as como perigosas e pecadoras. Beauvoir (2016) afirma que as religiões forjadas pelos homens refletem essa vontade de domínio: buscaram argumentos nas lendas de Eva, de Pandora, puseram a filosofia e a teologia a serviço de seu desígnio. (BEAUVOIR, 2016 p.23).

    Já o conceito de gênero é algo relativamente novo. Sua formulação aconteceu apenas no final dos anos 1960. Questionando a influência da cultura exatamente nas igualdades, representou um enorme salto na conquista das teóricas feministas. Levatti (2011) explica que o conceito serviu para descontruir a ideia arraigada do reducionismo biológico, pilar da construção cultural da sociedade da época. As feministas queriam mais, almejavam que as mulheres fossem reconhecidas como sujeito político.

    Reducionismo biológico é uma expressão que sempre esteve em pauta. Piscitelli (2002) afirma que já no final do século XIX, época que marca o início da luta pelos direitos iguais entre os sexos, a grande questão que dominava os centros das discussões era a seguinte: Se a subordinação da mulher não é justa, nem natural, como se chegou a ela e como se mantém? (PISCITELLI, 2002, p. 9).

    Esse parece ser o grande questionamento, que permeou todo o século passado e continua neste. Porém, frisa-se que com a transformação da sociedade é necessário que se reavalie sobre quais são os novos critérios igualitários das responsabilidades entre os sexos, que têm impacto e implicações na vida em sociedade, no tocante à dinâmica comunitária, familiar e política. Inclui-se também direitos e garantias nessa nova ordem social, onde o acesso ao mercado de trabalho e como é praticada essa política de igualdade nas empresas.

    2. MULHERES E SUA REPRESENTAÇÃO NA HISTÓRIA

    Compreender como a sociedade enxerga a mulher, seu comportamento, e como se criaram as representações do feminismo em diferentes momentos históricos é o ponto de partida para se entender a situação da mulher hoje. Tedeschi (2008) sintetiza:

    Esses discursos recorrentes exerceram influência decisiva na elaboração de códigos, leis e normas de conduta, justificando a situação de inferioridade em que o sexo feminino foi colocado [...] Assim, a desigualdade de gênero passa a ter um caráter universal, construído e reconstruído numa teia de significados produzidos por vários discursos, como a filosofia, a religião, e educação, o direito, etc. perpetuando-se através da história, e legitimando-se sob seu tempo". (TEDESCHI, 2008, p. 123)

    Segundo o autor, as articulações entre história e gênero é que demonstram as inter-relações construídas socialmente entre os sexos. Para Butler (2017), é forte a desigualdade, escrita e administrada de forma patriarcal, misógina, sexista e machista, servindo para fortalecer papéis de gênero. Segundo a autora o gênero é culturalmente construído: consequentemente, não é nem o resultado causal do sexo nem tampouco tão aparentemente fixo quanto o sexo (BUTLER, 2017, p. 26).

    Izquierdo (1992) afirma, sobre a relação de dominação masculina, no constructo social da história de gênero, que as rupturas com os modelos de dominação foram e são dificultadas por ações muitas vezes tidas como democráticas, mas que, na verdade, sacramentam ainda mais a submissão feminina:

    [...] com isso produz o paradoxo de que sociedades que se autodeterminam democráticas, supostos reinos das liberdades individuais, estão construídas sobre uma férrea ditadura, na medida em que aspectos essenciais da identidade da pessoa, não são a expressão de suas aspirações, decisões ou capacidades, senão da imposição violenta de certos modelos que consagram a mutilação da pessoa, pois só lhe permite desenvolver em uma direção". (IZQUIERDO, 1992, p.12-13)

    Isso acontece a partir do momento em que a criança nasce e, por meio do sexo biológico, é ensinada pelos cuidadores – pais, avós, educadores, a sociedade em geral – como deverá pensar, agir, determinando, com esses ensinamentos, sua identidade. Cabral (1998) diz:

    [...] as meninas são incentivadas a serem passivas, sensíveis, frágeis, dependentes e todos os brinquedos e jogos infantis reforçam o seu papel de mãe, dona de casa, e consequentemente responsável por todas as tarefas relacionadas ao cuidado dos filhos e da casa. Ou seja, as meninas brincam de boneca, de casinha, de fazer comida, de limpar a casa, tudo isto dentro do lar. Pelo contrário, os meninos brincam em espaços abertos, na rua. Eles jogam bola, brincam de carrinho, de guerra, etc. Ou seja, desde pequenos eles se dão conta que pertencem ao grupo que tem poder. Até nos jogos os meninos comandam. Ninguém os manda arrumarem a cama, ou lavarem a louça, eles são incentivados a serem fortes, independentes, valentes". (CABRAL & DÍAZ, 1998, p. 142)

    Bourdieu (2014) corrobora com a ideia de Cabral & Diaz:

    Assim a lógica paradoxal da dominação masculina e da submissão feminina, que se pode dizer ser, ao mesmo tempo e sem contradição, espontânea e extorquida, só pode ser compreendida se nos mantivermos atentos aos efeitos duradouros que a ordem social exerce sobre as mulheres (e os homens), ou seja, às disposições espontaneamente harmonizadas com essa ordem que as expõe". (BOURDIEU, 2014, p. 60)

    A luta pela emancipação feminina ganhou contornos mais claros durante a Revolução Francesa. A Declaração dos Direitos da Mulher e Cidadã, escrita em 1791 por Olympe de Gugers, em contraponto à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que não falava nada da mulher e sua participação política. Essa declaração é uma reivindicação dos mesmos direitos dos homens para as mulheres. Em 1793 Olympe de Gugers é decapitada e as mulheres são proibidas de poderem exercer qualquer atividade política (ROCHA, 2009).

    Segundo Pinto (2010), somente a partir das últimas décadas do século XIX é que a onda do feminismo surge. O primeiro movimento foi das mulheres inglesas, que se organizaram para lutar pelo voto, ficando conhecidas como sufragetes. Ganharam as ruas de Londres, em diversas manifestações, eram presas, faziam greve de fome. A luta apresenta um episódio tráfico: Emily Davison, em uma corrida de cavalos em Derby, atirou-se à frente do Cavalo do Rei Jorge V, morrendo. Em 1918, as sufragetes conseguem que a mulher tenha direito ao voto.

    Nisia Floresta, uma abolicionista e republicana, foi a pioneira do movimento feminista no Brasil. Data de 1831 seus primeiros artigos sobre a condição feminina. No ano seguinte, lança o livro Direitos das mulheres e injustiça dos homens. Atuou, também na área de Educação, fundando o colégio Augusto para meninas, com aulas de Português, Latim e Geografia (ROCHA, 2009).

    Mas é Bertha Lutz, uma bióloga de importância, com estudos realizados no exterior que, ao voltar para o Brasil em 2010, traz na bagagem as ideias feministas. Ela funda a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, que vai fazer uma acirrada campanha pública pelo voto. Em 1927, a organização leva um abaixo-assinado ao Senado, pedindo a aprovação do Projeto de Lei, de autoria do Senador Juvenal Larmartine, que dava o direito de voto às mulheres. Virou lei em 1932, por ocasião da promulgação do Novo Código Eleitoral brasileiro.

    De igual importância, com manifestações que chamavam a atenção, o movimento das operárias de ideologia anarquista, reunidas na União das Costureiras, Chapeleiras e Classes Anexas merece menção. Segundo o manifesto de 1917, proclamam: Se refletirdes um momento vereis quão dolorida é a situação da mulher nas fábricas, nas oficinas, constantemente, amesquinhadas por seres repelentes (PINTO, 2003, p. 35).

    Enquanto os movimentos feministas ganham força na Europa na década de 60, acompanhando o surgimento do movimento hippie, na Califórnia, o maio de 68, em Paris, foi lançada a pílula anticoncepcional, primeiro nos Estados Unidos e depois na Alemanha. Os jovens dividiam-se entre Beatles e Rolling Stones. Em meio a todas essas novidades Betty Friedan lança, em 1963, A Mística Feminina, bíblia do novo feminismo. As mulheres falam, pela primeira vez, sobre as relações de poder entre homens e mulheres (PINTO, 2010).

    O feminismo aparece como um movimento libertário, que não quer só espaço para a mulher – no trabalho, na vida pública, na educação –, mas que luta, sim, por uma nova forma de relacionamento entre homens e mulheres, em que esta última tenha liberdade e autonomia para decidir sobre sua vida e seu corpo. Aponta, e isto é o que há de mais original no movimento, que existe uma outra forma de dominação – além da clássica dominação de classe –, a dominação do homem sobre a mulher – e que uma não pode ser representada pela outra, já que cada uma tem suas características próprias. (PINTO, 2010 p. 16)

    O Brasil não acompanha essa dinâmica. A efervescência do início dos anos 1960, na música, com a Bossa Nova, a renúncia de Jânio Quadros e ascensão de João Goulart, o Jango, que implementa o parlamentarismo, culminando com o golpe de Estado e a tomada do poder pelos militares, faz com que a luta das feministas recrudesça. A á de cal veio com o Ato Institucional n. 5 (AI-5), dando todo o poder ao Presidente da República Ernesto Geisel. A repressão apagava qualquer tentativa de insurgimento, e as questões femininas,

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