Enquanto o tempo não passa
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Enquanto o tempo não passa - Stella Florence
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Branca de Neve, com ou sem príncipe
DENTRE AS PRINCESAS da Disney que povoaram a minha e a sua infância, a preferida, a primeira, a diva, é ela: Branca de Neve!
Pra começar, ponhamos de lado o príncipe, pobrezinho. Sabe por que ele aparece tão pouco? Porque quando Branca de Neve, o primeiro longa metragem colorido visto nos cinemas, foi lançado, em 1938, Walt Disney não dominara a arte de desenhar a beleza masculina. O que fazer então? Diminuir ao mínimo as aparições do príncipe.
Também não vamos falar sobre a madrasta e o quanto o mote principal é falho, afinal ela é obviamente mais bonita que Branca de Neve. Só mesmo num desenho animado e no mundo ilusório da moda uma menina de 14 anos é tida como mais bela do que uma mulher na plenitude da sua feminilidade.
O que me encanta em Branca de Neve é... você vai ver. Ou melhor, ler.
Ao saber que sua madrasta a quer morta, a menina foge, se embrenhando numa floresta desconhecida. Após atravessar a noite escura do medo, ela fica à espera de um salvador ou de um milagre? Não. Branca de Neve faz amizade com os animais selvagens e pede a eles que a levem até uma habitação humana.
Diante da casa pequenina ela se senta e espera? Não. Branca de Neve entra, observa a bagunça e a sujeira e pensa em oferecer uma permuta a seus donos. Mais do que pensar, a menina entra e decide dar uma amostra do que pode oferecer em troca de abrigo. É muito trabalho para uma pessoa só, afinal a casa está imunda, por isso ela coloca toda a bicharada no batente, inclusive a tartaruga. Coloca e supervisiona!
Casa limpa, um bom cozido no fogo... Branca de Neve aguarda os donos da casa? Não. Ela tem a ousadia de dormir na cama deles. Quando os anões chegam, bastam três minutos para que Branca de Neve passe de intrusa a dona dos seus corações e senhora daquele lar: três minutos!
A partir de então, Branca de Neve se esmera em servir os seus anfitriões? Não. Ela exige que eles se lavem para o jantar e inspeciona suas mãozinhas calejadas com a colher de pau na mão.
Depois há música e dança! Branca de Neve espera um príncipe para cair na folia? Não. Ela junta dois anões e se acaba no arrasta-pé.
Quando o sono chega, Branca de Neve vai dormir onde? No quarto dos anões, que cedem suas camas à menina. Mais do que ganhar amigos e protetores, ela ganha súditos fiéis.
O.k., para o conto de fadas seguir em algum momento ela tem de cometer um vacilo. A gula então a faz morder uma maça vendida por uma velha suspeita e... o resto a gente já sabe. Sei que parece absurdo sacrificar sua segurança por conta de uma maçã, mas suponha que fossem brigadeiros: quem nunca comeu brigadeiros de um vendedor desconhecido atire a primeira pedra. Pois é, vamos todas juntas pro caixão de vidro.
Mas voltando ao foco desta crônica, um homem de negócios com o tino e o empenho de Branca de Neve seria no mínimo um Steve Jobs. O que realmente me fascina, no entanto, é que com casa ou sem casa, com medo ou sem medo, com príncipe ou sem príncipe, Branca de Neve segue em frente. E segue muito bem.
O Fantasma da Ópera: duas interpretações fascinantes
Não há dúvida de que O Fantasma da Ópera é um fenômeno, mas por que essa história nos atrai tanto? Por que, muito antes do musical de Andrew Lloyd Weber, nós já nos debruçávamos estranhamente absortos sobre o livro de Gaston Leroux, de 1910 (um livro que, do ponto de vista literário, não chega aos pés dos grandes romances do século XX)?
Em toscas pinceladas, o livro (e o musical) trata de Christine, uma jovem soprano que se divide entre seu misterioso professor de música (Érik, o Fantasma da Ópera) e seu belo amor de infância (Raoul, o Visconde de Chagny). Estamos então a falar de um banal triângulo amoroso? De modo algum.
A trama nos leva a duas interpretações diferentes e igualmente fascinantes.
A primeira razão para que O Fantasma da Ópera seja tão atraente, a maior, a mais profunda, a mais universal é que Christine, o Fantasma e Raoul, os três, estão dentro de cada um de nós. A história é um mito moderno, um símbolo de como se definem as decisões no fundo das nossas almas. O Fantasma simboliza nossa força criativa, nossa vida interior, nossos desejos mais íntimos e vitais, muitas vezes considerados loucos pela sociedade; Érik habita o nosso inconsciente (não à toa ele vive nos subterrâneos do teatro). Já Raoul é a vida exterior, que acontece sobre o palco, à vista de todos, é se encaixar nos padrões da sua cultura e do seu tempo, é fazer tudo conforme esperam de você, sem espaço