Insones - a origem – parte 1
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Insones - a origem – parte 1 - Paulo Rossi de Moura Júnior
Para Thalissa OS, minha principal fonte
de inspiração, incentivo e reprovação.
Eu te amo.
AGRADECIMENTOS
A Deus e a todos os meus santos de devoção.
A Gustavo Nunes.
Aos familiares que sempre foram um porto seguro nos momentos de insônia
e tormenta.
A todos os amigos que acreditaram.
Aos futuros leitores, meu muitíssimo obrigado.
PREFÁCIO
Vocês viverão em constante incerteza, cheios de terror, dia e noite, sem nenhuma segurança na vida. De manhã dirão: ‘Quem me dera fosse noite!’, e de noite dirão: ‘Ah, quem me dera fosse dia!’
(Deuteronômio 28, 66-67).
E, havendo aberto o sexto selo, olhei, e eis que houve um grande tremor de terra; o sol tornou-se negro como saco de carvão; e a lua tornou-se toda vermelha como sangue. As estrelas do céu caíram sobre a terra. Então os reis, os grandes, os ricos, os chefes, os poderosos, todos, tanto escravos como livres, esconderam-se nas cavernas e grutas de montanhas. Era chegado o Grande Dia, Dia de sua Ira, e quem conseguiria subsistir?
(Apocalipse 6, 12.13.15.17).
Janeiro de 1993 – Nápoles (Itália)
Ao retornarem após paralisação por conta das festividades de fim de ano, pesquisadores italianos descobriram o roubo de todo um estudo feito até então sobre príons.¹ Tudo foi levado: décadas de pesquisa, fichas médicas, laudos, acompanhamento de famílias cujos distúrbios causados pela falta de sono eram severos, relatos de pacientes, certidões de óbitos, jornais da época, dados científicos após experimentos em ratos.
Material semelhante também desapareceu misteriosamente em outro laboratório, este, porém, em território norte-americano. Ladrões levaram até os fragmentos de hipotálamos que serviam como base de pesquisa.
Neurocientistas e a comunidade acadêmica internacional lamentaram os dois roubos. A polícia local iniciou uma investigação, mas, como não houve suspeitos, os casos continuam em aberto até os dias de hoje.
Dezembro de 1999 – Taguatinga, cidade-satélite próxima a Brasília (Brasil)
Em um ritual realizado no Vale do Amanhecer, médiuns previram grandes transformações no cosmos. Os seguidores presentes ouviram que somente o amor e o conhecimento dos descendentes do Planeta Capela poderiam salvar a todos.
Maio de 2006 – Zona rural próxima a Bhopal (Índia)
Dois fazendeiros locais conversavam na varanda de um casebre. Juntos, terminavam de amarrar pequenos fardos de lã. No transporte de parte da produção para acondicioná-la em um cômodo seco, assistiram aos cães correndo em círculos pastoreando as ovelhas de uma forma bem estranha.
– Precisa trocar ou adestrar melhor esses cachorros. Nunca vi latirem tanto. Não te incomoda?
– Não são os cães. O problema é com as ovelhas. Essas danadas mesmo à noite teimam em voltar para o pasto.
– Melhore sua tranca.
– Prendê-las é pior. Ficam agressivas. Só se acalmam pastando. Ficam tanto tempo desse jeito que nem sei mais quando dormem.
Novembro de 2007 – Fermilab, Illinois, Chicago (EUA) Campus universitário próximo a Tevatron
Tyler percorria os corredores; como de costume, limpava sala a sala. Uma luz acesa chamou sua atenção. Ao abrir a porta ele deparou com Joseph, sozinho, ainda trabalhando.
– Não vai embora? – perguntou Tyler.
– Vou dar mais um tempo. Adiantar um pouco o de amanhã. Não tenho conseguido dormir quando chego em casa – respondeu Joseph, debruçado para fazer a correção de uma pilha de textos.
Setembro de 2008 – Dallas, Texas (EUA)
Pensando já na janela de lançamento proporcionado pelo alinhamento da Terra, da Lua e de Marte em 2020, cientistas começaram a desenvolver nanorrobôs para a Nasa. Sua missão era criar dispositivos microscópios capazes de monitorar mesmo a distância, além de tentar manter saudável toda uma tripulação de astronautas que seria enviada ao espaço. Os nanorrobôs iriam atuar como verdadeiros médicos dentro do organismo dos viajantes, evitando doenças e se aliando ao sistema imunológico para combater qualquer distúrbio. Pesquisadores acreditavam que essa nova tecnologia, depois de aprovada, teria grande impacto na luta contra o câncer.
Um dos funcionários que participavam do projeto, e que foi demitido, copiou parte dos arquivos e os disponibilizou por meio de um site dois anos depois. Por conta disso, foi condenado, preso e responde hoje em liberdade por crimes praticados na internet. Proibido de pisar em solo americano, ele recebeu de muitos países ofertas de asilo político. FBI e Interpol continuam oferecendo recompensa a toda e qualquer informação sobre seu paradeiro. Sua exata localização no globo continua sigilosa.
Dezembro de 2010 – Região próxima ao LHC, Grande Coliser de Hádrons (França)
Laboratório de pesquisas – Centro de Desenvolvimento Cosmético
Marcílio entrou na sala e deparou com seu assistente de pé, em frente às gaiolas de confinamento dos animais. Wallis observava alguns roedores.
– Prestando atenção no quê? – perguntou Marcílio.
– No comportamento das cobaias C2 e A5. Elas estão agindo de uma forma estranha há pelo menos dois dias – explicou Wallis, olhando fixamente para as gaiolas.
– Estranha como? – quis saber Marcílio, sem dar muita importância, enquanto se dirigia para sua mesa de trabalho.
– Não repousam, estão inquietas, agitadas. Passaram o dia se movimentando nos brinquedos – respondeu Wallis.
– Efeito colateral do medicamento? – arriscou Marcílio, acomodando-se em sua cadeira.
– Pior que não. Já me certifiquei. A5 e C2 fazem parte do grupo do placebo – explicou Wallis, bastante intrigado.
•
Anos de 2010 e 2011 – Fumaça vulcânica expelida na Islândia e no Chile se espalhou pela atmosfera causando o cancelamento de milhares de voos em todo o globo. As partículas das erupções cobriram casas, ruas, cidades inteiras. Muitos moradores contraíram doenças respiratórias graves.
Ano de 2011 – Lixo do Japão após tsumani foi encontrado na costa do Alasca. Houve grande preocupação com a direção dos ventos. Prevendo que nuvens radioativas atingiriam Tóquio, japoneses e turistas esgotaram estoques de máscaras.
Ano de 2012 – Milho transgênico causa tumores em ratos e reacende o debate: Alimentos geneticamente modificados podem fazer mal ao ser humano?
/Em longo prazo, que tipo de problema a ingestão regular desse tipo de alimento pode nos causar?
.
Cientistas continuam as buscas por respostas.
Enquanto isso, no Brasil, no mesmo período, foram veiculados na mídia: Pipoca faz bem para o intestino
/Milho é rico em fibras
/Dieta e saúde, comer uma tigela de pipoca sacia a fome; porção equivale a menos de 100 calorias
.
15 de fevereiro de 2013 – Chelyabinsk, região central da Rússia, a 1,6 mil quilômetros de Moscou
Um meteorito cruzou os céus da cidade. Uma grande bola de luz e fogo, com luminosidade maior que o Sol e seguida pelo som forte do que parecia ser um trovão, foi vista e ouvida por todos. O fenômeno instantaneamente recebeu repercussão mundial. Câmeras de vigilância do trânsito instaladas pela cidade registraram tudo. Equipes da Cruz Vermelha foram imediatamente acionadas e serviços de saúde registraram mais de mil feridos. Bases militares, tanto na Rússia quanto nos Estados Unidos, ficaram em estado de alerta. Gases emanando de silos de mísseis e tropas reforçando as fronteiras podiam ser vistos em diversos lugares. Sites como o da agência internacional de notícias Reuters e o YouTube congestionaram com tamanho acesso de internautas por todo o mundo.
Especialistas explicaram que o objeto, ao colidir com as altas camadas atmosféricas, explodiu com força equivalente a mais de 30 bombas nucleares como as que atingiram Nagasaki e Hiroshima em 1945, no Japão. O rastro do impacto se fez presente por horas no céu, e pôde ser avistado a quilômetros de distância. Astrônomos divergiram quanto à possibilidade de se prever com antecedência tal acontecimento, por se tratar de um corpo celeste de tamanho muito reduzido. Políticos locais pediram calma à população.
Em um dos muitos pontos da cidade, dois paramédicos que prestavam auxílio aos moradores feridos começaram a apresentar estranho comportamento.
– Cansada? – perguntou Pavlov a sua parceira.
– Não sei você, mas por mim faria mais uns 80 atendimentos – respondeu Nadezhda.
– É estranho, também não me sinto cansado – disse Pavlov.
– Deve ser a adrenalina.
– Deve. Vamos continuar, que pelo visto ninguém aqui vai dormir hoje – falou Pavlov.
O paramédico tinha razão. Por conta do pânico e do medo que tomaram conta daquela pequena faixa territorial do planeta, todos os moradores preferiram passar a noite na rua, fora de suas casas e bem acordados.
15 de fevereiro de 2013 – 17h25, horário de Brasília
O asteroide 2012DA14, de aproximadamente 130 mil toneladas e 45 metros de comprimento, passou a uma distância de 27,6 mil quilômetros da Terra, a menos de um décimo da distância que nos separa da Lua. Astrônomos de todo o mundo e cientistas da Alemanha afirmaram não haver nenhuma relação entre a passagem do asteroide e a queda do meteorito na Rússia. Ambos vieram em sentidos opostos
, disseram à imprensa.
16 de fevereiro de 2013
Uma bola de fogo foi avistada cruzando os céus da Califórnia e de Cuba.
17 de fevereiro de 2013
A Nasa registrou a maior tempestade solar dos últimos anos. Ondas eletromagnéticas que atingiram a Terra provocaram falhas em sistemas de comunicação. Fotógrafos registraram lindas imagens de auroras boreais.
18 de fevereiro 2013
Para ganhar dinheiro, moradores recolheram fragmentos do possível asteroide que caiu na Rússia, e sites como Ebay e Amazon começaram a comercializá-los. Internautas de todos os continentes compraram o objeto como peça de decoração e o item logo se tornou um dos mais vendidos, uma febre de consumismo mundial.
19 de fevereiro de 2013
Nova bola de fogo foi visualizada, dessa vez no Brasil. Moradores de estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais afirmaram ter registrado a passagem do estranho e incandescente objeto cruzando os céus. Astrônomos concluíram que o fenômeno foi causado pela reentrada na atmosfera da Terra de um foguete de lançamento de satélites chinês.
1 Moléculas proteicas que possuem propriedades infectantes. Não existe nenhum mecanismo de defesa imunológica capaz de neutralizar essa partícula infectante, o que torna sua disseminação muito rápida. (NE)
CAPÍTULO 1
20 de fevereiro de 2013, Brasil
Saguão de desembarque – Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim, Ilha do Governador (Rio de Janeiro)
Usando jeans e calçando sapatos confortáveis de camurça, Marcos andava apreensivo de um lado para o outro. Confuso em meio a tantas obras, tapumes e andaimes, buscava pelo portão que achava ser o certo.
Mesmo apressado, perdeu alguns instantes prestando atenção em um homem com aspecto de sujo que segurava uma placa amassada de papelão com a inscrição: O sossego dos maus se findará quando todos estivermos acordados
. Marcos não entendeu o que aquela frase queria dizer, mesmo assim sorriu de volta para aquele homem maltrapilho, em um gesto de quem se solidarizou com a causa.
Poucos metros mais à frente, ao se ver refletido no vidro de uma placa publicitária, aproveitou para ajeitar a gola do paletó e retocar o penteado, escondendo entre mechas alguns dos fios brancos que teimavam em se sobressair. Depois, retomou sua atenção no que de fato o trouxera ali.
Novamente conferiu as horas em seu relógio de pulso. Não satisfeito e desconfiado de que o horário estaria errado, retirou do bolso o celular. Destravada a tela, leu 9h32
.
Já era para ela ter chegado, pensou Marcos.
Procurando à sua volta, encontrou um monitor com informações sobre horários, destinos, empresas e situação dos voos. Aproximando-se, começou a prestar mais atenção.
– Atrasados no momento. Atrasados. Previsão… Confirmado: voo 04649, dia 20, Miami-Rio, observação em solo, desembarque no terminal 1, portão 18 – Marcos leu para si.
Marcos percebeu que estava aguardando no local errado, então se apressou. Ofegante, conseguiu chegar a tempo de ver sua filha Gabriella surgindo em meio a uma dezena de outros passageiros que pareciam protestar contra alguma coisa.
Linda e jovem, Gabriella trazia consigo, além de uma bolsa a tiracolo e uma mala com rodinhas, uma case com seu precioso violino dentro.
– Eu estava perdido, estava lá do outro lado. Chegou agora, minha filha? – Marcos beijou Gabriella no rosto e a ajudou com a bagagem.
– Bênça, pai. – Ela retribuiu o abraço.
– O que é aquela fila? – questionou Marcos, estranhando um pequeno tumulto e apontando para uma das saídas do desembarque.
– A fila é para os que chegam da Europa. Pelo que entendi, são agentes de saúde fazendo perguntas. – A garota referia-se a um grupo de agentes da Anvisa que recepcionavam os recém-chegados.
– Estou curioso para saber: o que disse sua mãe?
– Sermão tradicional de sempre. Não entende minha preferência em querer morar em um país subdesenvolvido – respondeu de modo bem natural Gabriella.
– Também não entendi sua decisão repentina de abandonar seus estudos. Tão perto agora! Não era seu sonho se tornar a primeira violinista da filarmônica de Nova York?
– Longa história, senhor Marcos. Explico em casa após um bom banho.
– Por falar em banho e em casa, também tenho explicações a dar a você – avisou Marcos, coçando a cabeça, enquanto caminhava em direção à saída.
Méier, Hospital do Estado – Centro Cirúrgico, zona norte da cidade do Rio de Janeiro
Ao som de How Far We’ve Come
, da banda Matchbox Twenty, a equipe médica se preparava para dar início a um novo procedimento. Roberto Lima, o cirurgião responsável, após uma breve oração, usava uma caneta para demarcar a coluna cervical do paciente.
Ao término de suas marcações, um instrumentador recolheu a caneta e entregou a ele uma pequena lâmina. Com mãos firmes, Roberto iniciou uma incisão. O corte foi preciso. Utilizando-se de uma gaze, uma enfermeira secou o sangramento que surgiu.
Trabalhando agora com um bisturi elétrico, Roberto aumentou o tamanho da incisão, e à medida que avançava com o corte, cauterizava o tecido no entorno. Interrompeu abruptamente a ação acreditando que houvesse algo de errado.
Sem entender exatamente o que o cirurgião desejava, uma das enfermeiras auxiliares ofereceu uma toalha para que ele secasse o suor do rosto.
Todos se entreolharam quando Roberto rejeitou a toalha.
Willian, o anestesista que acompanhava a cirurgia, afastou-se dos equipamentos que monitoravam o paciente e foi até a caixa amplificada na qual conectou um celular. Mudou a faixa e aumentou ainda mais o som.
Empolgado com o novo ritmo, Roberto recomeçou o procedimento cirúrgico.
Um grito agonizante de dor ecoou na sala, fazendo-o paralisar novamente.
– Willian! – Roberto gritou assustado.
– Impossível! – Willian estava incrédulo e aferiu o pulso do paciente.
– Tem certeza de que fez o cálculo certo do peso e da quantidade do medicamento? – questionou uma das enfermeiras.
– Não entendo. Era para ele só acordar daqui a cinco horas! – Willian conferia as condições clínicas e do tubo de respiração.
– Tá esperando o quê para colocá-lo pra dormir de novo? – Roberto tentou manter o controle da situação.
– Doutor, pode começar a contar. Antes do dez ele vai estar inconsciente novamente – avisou Willian, já administrando outra dose de medicação na veia do paciente.
A música vinda da caixa amplificada foi desligada.
Quatro longos minutos depois, os únicos sons ouvidos na sala eram o gemido agonizante de dor do paciente e o respiradouro artificial em funcionamento. Presenciando a frustração de Willian devido à incapacidade de conseguir sedar novamente o paciente, e percebendo que a cada segundo seu nível de consciência e de irritabilidade aumentavam, Roberto não teve mais escolha e fez o que julgou certo.
– Desentubem ele. Alguém providencie as suturas depois. Cirurgia cancelada – disse Roberto, já retirando suas luvas.
– Tem certeza, doutor? – quis confirmar Inácio, o instrumentador.
– Willian, quero o nome do fabricante e número do lote de todos os anestésicos de que fez uso hoje… Agora vamos com isso, o dia só está começando e ainda temos muito trabalho agendado pela frente – falou Roberto, deixando a sala.
Londres, Clube White’s, sala reservada – 13h10, hora local
Uma enorme porta esculpida e pesada, feita de madeira traficada de uma floresta tropical, abriu-se. Do lado de fora, no corredor, seguranças portando armas automáticas permitiram a passagem de um senhor gordo que trajava um fino terno da alta-costura italiana. Ele trazia entre os dedos um charuto apagado e parecia nervoso.
Do lado de dentro, 12 homens de diferentes nacionalidades.
O homem gordo aguardou pelo fechamento total da porta para começar a falar. O idioma da conversa foi o inglês.
– O que é tão grave que fez com que me separasse da companhia da minha netinha e me fizesse voar por mais de duas horas?
– Boa tarde para você também, Dimitry. Leu os relatórios? – Raul perguntou de costas, enquanto apreciava uma das telas de Caravaggio penduradas na parede.
– Li. Um bando de gente que parou de dormir… Você deveria estar feliz, Peter. Vai ficar ainda mais rico. A não ser que outro país emergente quebre mais uma das patentes de um dos seus milagrosos remédios para insônia. Eu mesmo faço uso diariamente de um coquetel multicolorido seu. Funciona de verdade. – Dimitry acendeu seu charuto.
– Dimitry, você não está dando a devida importância à gravidade dessa situação. Ainda não percebeu? Estamos todos aqui. – Hassam apontou à sua volta.
– Não vejo o Elvis. Ele ficou tocando gaita e violão onde dessa vez?
– Esqueça o Elvis por um segundo. Preste atenção aqui dentro. Há quanto tempo isso não acontecia, Dimitry? Todos juntos em um mesmo local… Convocação extraordinária – Armin relembrou.
Armin referia-se ao Clube dos Doze Reis, do qual ele e Dimitry faziam parte. Doze homens com um grande objetivo: a possibilidade de governar o mundo sem a necessidade de nenhum deles assumir um cargo público. Estavam ali, naquela sala, os 12 homens mais ricos e influentes do planeta, mesmo que boa parte deles nunca tivesse posado ou sido capa da Forbes ou da Rolling Stones. Cada um era dono e administrava um enorme conglomerado de empresas; quase todas as mais valiosas patentes mundiais pertenciam àquele seleto grupo. Juntos, eles elegiam e depunham chefes de Estado, primeiros-ministros, senadores e secretários. Praticamente conseguiram se infiltrar em todos os níveis da sociedade como ela é conhecida hoje. O montante produzido pela soma do valor de mercado de suas empresas e rendimentos seria comparado a mais da metade de toda riqueza mundial.
Nada escapava ou acontecia em qualquer lugar do globo sem que os Doze Reis soubessem, permitissem, estivessem no controle ou pura e simplesmente de acordo. Juntos, conseguiam controlar a movimentação na Bolsa de Valores Mundial, ditando valores e suas respectivas cotações. Podiam desestabilizar ou fortalecer qualquer governo em um piscar de olhos; bastava que aplicassem ou retirassem parte de seus investimentos financeiros de um determinado país, movendo-os para outro.
Cada Rei era responsável por uma especialidade e controlava mais de 85% do mercado ativo e do fluxo financeiro do setor. Só como exemplo, na sala, citando pelo menos seis deles e o ramo a que se destinavam, encontravam-se presentes: o Rei do petróleo e gás, o Rei da indústria farmacêutica, o Rei da mineração e siderurgia, o Rei das armas, o Rei do comércio, finanças, empresas seguradoras e de cartões de crédito, e o Rei têxtil.
– E esse aí é quem? – perguntou Dimitry, fazendo referência a um rapaz jovem, recém-chegado, vestindo camisa de botão e com gel no cabelo e distribuindo entre todos os presentes microbooks e óculos especiais.
– É o Christopher, um de nossos consultores. É ele quem vai nos atualizar sobre os últimos acontecimentos – explicou Rayhan, preferindo acompanhar tudo usando os óculos.
Christopher remotamente acionou uma projeção holográfica: nela, planilhas, gráficos, representação do globo terrestre e imagens da anatomia sistêmica de alguns mamíferos.
– Bem, cavalheiros, é hora de começarmos. Vou pular a parte chata e ir direto ao ponto. Se quiserem se aprofundar em qualquer outro detalhe, os arquivos estão à sua disposição nos kits distribuídos. – Christopher iniciou a apresentação.
A luz da sala foi reduzida e a projeção holográfica ficou sendo exibida em cima da mesa principal. Dimitry foi um dos poucos que preferiram acompanhar tudo pela tela do microbook, dispensando o uso dos óculos futurísticos.
– Não há qualquer indício de degeneração, cansaço físico ou perda de memória. A biópsia nos tecidos e um estudo minucioso celular não revelou nenhuma alteração fisiológica significativa.
– DNA? – perguntou Peter.
– Ainda não foi totalmente mapeado, mas já descobrimos pequenas mutações que coincidentemente são idênticas em todos os seres mamíferos do planeta. Mutação que também está presente nos exames dos senhores, como podem visualizar na imagem de número 34.
– E com qual autorização você me submeteu a um exame-teste? – protestou Raul, levantando-se indignado.
– Acalme-se, Raul, nem queira saber quanto tecnologicamente estamos evoluídos nesse setor. Deixe o Christopher continuar, depois eu conto tudo sobre nossos escâneres corpóreos. Há alguns instalados em lugares que você nem imagina – avisou Peter, acalmando-o.
– Foi alguma coisa nossa? – perguntou Telso em voz baixa para Armin.
– Não creio – Kyoichi participou do papo paralelo.
– E daí? O que isso tem a ver com a dificuldade de dormir de uma meia dúzia? – Dimitry quis saber, fechando a tela de seu computador.
– Tudo. Não é só o grupo de pessoas na Rússia. Estamos monitorando rebanhos de gado na Austrália, no Brasil, nos Estados Unidos e no Canadá. Temos dados de veterinários que têm acompanhado o comportamento de animais em pelo menos 40 zoológicos espalhados pelos quatro cantos do mundo. Biólogos e pescadores também enviaram relatórios sobre baleias e golfinhos. Até nosso centro avançado de pesquisa polar advertiu sobre o estado de acordado dos ursos em pleno inverno – explanou Christopher.
– Deixando de lado esses programas americanizados de Animal Planet e Discovery Channel, o que isso significa em termos práticos? – Kyoichi quis saber.
– Baseado em dados científicos, posso afirmar que todos os mamíferos da face da Terra deixarão de dormir em breve – Christopher decretou sem rodeios.
– Em breve? Breve quando? – Rayhan levantou-se.
– Não temos certeza. Estudos e pesquisas apontam para… – Christopher acelerou as imagens de sua apresentação buscando uma ilustração com melhores gráficos e estatísticas.
– Apontam…? – perguntou de pé Armin, com certa preocupação.
– Calculamos no máximo dez dias – sentenciou Christopher.
– Você deve estar de brincadeira! – De pé, Telso estava incrédulo.
– Não estou. Essa pesquisa já foi revisada dezenas de vezes. E tem mais… – Christopher elevou o tom de voz, conseguindo interromper e silenciar um pequeno tumulto de questionamentos que se iniciava entre os presentes na sala.
– Mais? Como assim mais? – indagou Raul.
– Junto à ausência da necessidade e incapacidade de se conseguir dormir, observamos a ineficácia de todo e qualquer anestésico, calmante, tranquilizante ou sedativo. Seja ele qual for sua fonte, natural ou sintética. Só nos últimos dois dias pelo mundo, soubemos de pelo menos 625 casos de pessoas que acordaram de coma profundo. O caso mais relevante, ou que foi mais vezes noticiado pela mídia, aconteceu na França: o ex-piloto de Fórmula 1 acordou depois de meses de um estágio de sono; ele simplesmente se levantou, perguntou onde estava, pediu as chaves do carro e deixou o hospital. Só hoje, a própria Igreja Católica recebeu mais de 90 pedidos de beatificação, atribuindo esse despertar do coma a verdadeiros milagres.
– E como ela está lidando com isso? – Telso quis saber.
– A Igreja ainda não se pronunciou e o Papa resolveu se afastar. Nos bastidores já se cogita em renúncia.
– Renúncia de um Papa? Há quanto tempo isso não acontecia?
– O último foi Gregório XII, em 1415, Peter – informou Raul.
– Afinal de contas, isso é o quê? Uma doença? Um vírus? Alguma espécie de arma biológica? Por que nosso sistema imune não combate essa ameaça? O Peter não pode fabricar uma vacina? – questionou Edgar.
– Ainda investigamos o que causou e desencadeou essa contaminação. Quanto ao sistema imune ou vacina, não encontramos nada no DNA que o próprio organismo identifique como agressor. Pesquisas preliminares indicam que os mamíferos de todo o planeta sofrerão alguma espécie de evolução. Mas também não temos 100% de certeza disso. Estou trabalhando em duas frentes no momento: identificar o causador e dizer antecipadamente o que essa nova condição de acordados vai nos causar.
– Então nos faz vir até aqui sem certeza? Como podemos acreditar em tudo que disse? – questionou Raul.
– Minha equipe ainda não tem todas as respostas, mas, pelo que temos monitorado, reafirmo que todos deixarão de dormir naquele prazo que estipulei. O mal da insônia já cruzou os continentes, senhores. O relógio está correndo e logo chegará a zero.
– E o que faremos agora? – Armin quis saber.
– Antes de qualquer medida drástica, recomendo que aguardem a escolha do novo pontífice. Em alguns dias, a Igreja deve fazer o anúncio do conclave.
– E o nome revelado após aquela fumacinha branca, favorito entre todos, será um dos nossos, aposto? – Dimitry baforou seu charuto.
Christopher consentiu que sim com um gesto de cabeça.
– Então é isso, cavalheiros. Dez dias! – falou Telso, recolhendo seus pertences.
– Diante desse quadro, melhor conversarmos com nossos acionistas e líderes de empresas. Vamos prepará-los. Temos menos de duas semanas para blindarmos nossos patrimônios, diminuir ou maximizarmos nossas perdas e lucros no mercado financeiro – racionalizou Edgar, surgindo de um dos cantos da sala.
– Alguém precisa alertar os chefes de governo – pediu Raul.
– Já estamos providenciando isso. Informaremos a eles em breve. Um pronunciamento a nossos moldes também já está sendo redigido. Contratamos os melhores roteiristas de Hollywood para isso – informou Christopher, pedindo licença e indo atender a um telefonema.
– Bem, cavalheiros, não sei os senhores, mas eu retornarei para desfrutar desses últimos momentos com minha família. – Dimitry apagou seu charuto, levantou-se e se despediu.
– Isole-os imediatamente – ordenou Christopher, agitado, desligando o telefone.
– Outra novidade? – perguntou Kyoichi.
– Inacreditável! Identificamos, por acaso, em um dos nossos postos de atendimento médico humanitário, quatro indivíduos de uma mesma família que, após passarem por uma simples coleta de sangue, aparentemente não foram infectados – comentou Christopher, enquanto arrumava seus pertences.
– Infectados? Você quer dizer que não sofreram da tal mutação. Mas como isso é possível? Esse mal não atingiria todos os mamíferos do globo terrestre?
– Atingirá. Mas essa família em particular, por uma dádiva, razão desconhecida e que eu classificaria como extraordinária, não teve seu DNA alterado ainda. – Christopher estava intrigado.
– Quer dizer então que eles são a exceção? – perguntou Peter.
– Não! Quero dizer que eles são a verdadeira e única galinha de ovos de ouro da humanidade – concluiu Christopher, já deixando a sala apressado.
CAPÍTULO 2
Bairro Grajaú, zona norte da cidade do Rio de Janeiro
Depois de ligar a seta, Marcos diminuiu a marcha do carro e coçou a cabeça, intrigado.
– Que foi, pai? Que cara é essa? – perguntou a filha, percebendo a mudança no semblante de Marcos.
– Nada, filha. Aquele homem… Lembro-me de tê-lo visto no saguão do aeroporto – Marcos apontou para um mendigo segurando um pedaço de papelão com os dizeres: Vocês, que no passado foram tantos quanto as estrelas do céu, ficarão reduzidos a um pequeno número, porque não obedeceram ao Senhor, ao seu Deus
(Deuteronômio 28, 61-62).
– Relaxa, é só mais um daqueles fanáticos religiosos. Lá em Manhattan estávamos repletos deles. Você deve ter se confundido – tranquilizou Gabriella, após também ter olhado para o homem em questão.
– Pode ser. Chegamos! – interrompeu Marcos, ignorando por completo aquela figura no outro lado da rua e acionando um controle remoto que fez soar um sinal de entrada e saída de garagem.
À sua direita, dez metros mais à frente, um portão automatizado começou a se abrir. Uma grade metálica de pouco mais de dois metros de altura separava quem estava do lado de fora na calçada.
Um pequeno recuo de uns quatro metros servia como jardim e possível área de lazer para as crianças, tamanha a quantidade de brinquedos espalhados pelo chão. Quatro postes de iluminação, um banco de praça branco e uma passarela de pedras enfileiradas davam o toque final de personalidade ao imóvel.
O estacionamento dos carros ficava em uma área espaçosa e cimentada nos fundos. Antes, porém, era preciso percorrer um apertado corredor espremido entre o prédio e o muro do condomínio vizinho.
Com muito cuidado e perícia, Marcos certificou-se de que seus retrovisores não esbarrariam no chapisco das paredes. Prosseguiu em baixa velocidade.
– Então é aqui? – perguntou Gabriella, olhando para a fachada do prédio.
– Como disse, é provisório. Só até o apartamento da Lagoa ficar pronto. Achei que seria mais aconchegante do que um hotel – disse Marcos, esterçando o volante para estacionar o carro em sua vaga.
– Aconchegante e bastante animado, você quis dizer – Gabriella referiu-se a uma discussão acalorada de moradores que acontecia naquele momento no pátio de estacionamento.
– Nem sempre é assim. E o melhor de tudo é que aqui fica bem pertinho do Maracanã.
Marcos desligou o motor e desceu do carro.
– Odeio futebol – reclamou Gabriella, juntando suas coisas.
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