O ministério dito da "Educação" está a resvalar para a maior fraude no ensino desde a 1ª. República. Refiro-me ao novo modelo de avaliação do desempenho dos professores. Como é que foi possível caber nas cabeças iluminadas dos nossos (des)governantes que a qualidade do ensino melhoraria se os professores fossem avaliados pelas notas que dão aos alunos? Isto é uma autêntica perversão. Os professores não rejeitam a sua avaliação, desde que ela seja ponderada, justa, exequível e fundamentada, respeitadora de critérios éticos. Os professores não querem violentar as suas consciências, sentindo-se coagidos a dar notas positivas aos alunos que as não merecerem. É que, se o não fizerem, a espada de Dâmocles cairá sobre as suas cabeças, pois verão comprometida a progressão na carreira. O Sr. Presidente da República não vê ao que poderá conduzir uma medida destas? Desta forma teremos futuramente fartura de engenheiros, por exemplo, todos com um diploma inquestionável. Resta saber com que conhecimentos!!! Entretanto, ter-se-á contribuído positivamente para as famosas e imprescindíveis estatísticas com um facilitismo tacitamente instituído. O nosso Governo não pode mostrar à Europa que os alunos têm um insucesso tão grande em Portugal. Com tanta cimeira de sucesso!!! Obviamente que só pode haver um responsável: a classe docente. Como se o atraso secular de um país se pudesse inverter numa geração! Como se a sociedade que temos não fosse a geradora das incapacidades que os nossos alunos demonstram cada vez mais nas nossas escolas. Não que sejam menos inteligentes que os dos outros países europeus. O problema radica num sistema de contravalores que a sociedade difunde como valores. Se não, vejamos: onde está o reconhecimento do mérito pelo trabalho dedicado, esforçado? O que as nossas televisões transmitem, como paradigma para a nossa juventude, é o “desenrascanço” fácil, o confronto com o professor que, nalguns casos é representado como um “totó” completamente paranóico e desajustado da realidade, servindo de chacota aos alunos. Bonito exemplo que dão à sociedade! E que nobres valores transmitem! Desta forma, que belo incentivo à falta de educação, indisciplina e ausência de civismo (ou cidadania, como agora se diz!). Não é o que demonstram tantos e tantos jovens, actualmente, nas nossas escolas? Alguém já se escandaliza com as agressões físicas e verbais de que os professores são vítimas por parte de alguns alunos, e por vezes dos próprios pais? Seria interessante mostrar ao país o que se passa dentro de muitas salas de aula, onde os alunos se divertem a humilhar os professores, numa atitude irresponsável que faria corar de vergonha os seus avós. Já não digo os pais, porque não tenho a certeza de que tivessem essa reacção. É que os professores têm vindo a ser postos de joelhos, principalmente por este governo, e passaram a ser motivo de chacota. Não sei a quem esta vulgaridade aproveitará, mas não será sem dúvida aos nossos alunos. A escola deve ser uma transmissora de valores e de regras de conduta social, mas está a tornar-se num sítio onde uma classe de angustiados tem de descobrir como há-de ensinar alguma coisa aos filhos de outros cidadãos que não parecem ter consciência do que se passa. E muito menos com uma campanha de difamação da classe docente. Como poderemos ter criatividade, amor è profissão, espírito de missão, sendo tratados desta maneira?
Para além disso, o sistema de ensino que temos, remendado por tantas reformas e reformas das reformas, tornou-se numa verdadeira manta de retalhos, com lacunas a todos os níveis. Tem-se pretendido facilitar o ensino para gerar um sucesso que nunca será mais do que um embuste. O pior é que todos perdemos com isso, pois os nossos jovens saem cada vez menos preparados para enfrentar a competitividade que o mercado de trabalho exige. Este Governo (com este Ministério dito da Educação) só está a meter a cabeça na areia. Porque é óbvio que não se pode forçar o conhecimento: este tem de ser adquirido com esforço e participação. Infelizmente, a mensagem que passa não é essa: o que importa, para os nossos iluminados dirigentes da Educação, é que os alunos frequentem a escola, vão às aulas. Não importa o que lá se faz ou se não deixa fazer a quem deseja apenas cumprir a sua obrigação.
As novas medidas do Ministério, tendo como corolário este novo e maquiavélico processo de "avaliação do desempenho" dos professores, que mais não é do que uma forma encapotada de perseguição à classe docente, farão com que muitos professores, sentindo em perigo a sua carreira profissional, se vejam obrigados, repito, a dar positivas a quem as não merece. Isto, para além de escandaloso, é ridículo e imoral. Outro tanto se passa com as chamadas "NOVAS OPORTUNIDADES" — outra panaceia. Com este rótulo pomposo, pretende-se certificar "competências", sem ter em conta os conteúdos. Aos “alunos” bastará demonstrarem “competências”, mesmo que não dominem nenhum conhecimento escolar em concreto. Ao que nós chegámos! Desta maneira, passaremos de um país com elevado nível de iliteracia a um país de superdotados. E com esta visão messiânica, temos um processo que mais não é do que uma panóplia salvadora para as nossas estatísticas. Mais uma vez as estatísticas! Será que O PAÍS NÃO VÊ QUE O REI VAI NU? O nosso governo está a promover a incompetência ao estatuto de missão patriótica! E a forçar a classe docente a participar nesta mentira, sob pena de ver comprometidos alguns dos seus objectivos, os tais que passam a contribuir para a dita “progressão na carreira”! Dá vontade de dizer: “Tirem-me deste filme!”, à semelhança do que dirão muitos dos nossos jovens, a propósito do novo contexto tão sabiamente criado: “Eh pá, tás a ver a cena? Bué da louca! Fixe, meu, agora é que está a dar! Tu até nem precisas de ir às aulas. Os mangas dos setôres têm que nos dar positiva, para não terem problemas. Baril!”
Estas medidas do nosso Ministério parecem ter saído de um concurso de anedotas!
Mas, se o lúdico acaba forçosamente, mais cedo ou mais tarde, por desembocar no risível, já o mesmo se não pode dizer das ameaças veladas, encapotadas, disfarçadas deste novo iluminismo político, cavalgando um espírito de cruzada de falsos cavaleiros da Távola Redonda, que brandem cem cessar a espada “Excalibur” sobre as cabeças pensantes dos professores que ousem tornar-se rebeldes, isto é, “discordantes”. Processos inovadores? Nem por isso. Isto, afinal, não passa de um “déjà vu”. A perseguição, a admoestação, a criação de um clima de insegurança e medo já eram utilizados pelos esbirros do anterior regime. Mas esses ao menos não se diziam de esquerda!!!
José Colaço – Prof. Efectivo na Escola Secundária de Cascais
23/02/2008