Papers by Vicente Cretton
Introdução No texto a seguir desenvolvo uma leitura da relação dos Mbya Guarani e suas divindades... more Introdução No texto a seguir desenvolvo uma leitura da relação dos Mbya Guarani e suas divindades a partir do idioma das relações de maestria, o qual ao designar um laço que envolve controle, proteção e cuidado (Costa 2013:473) coloca a predação às avessas sem com isso ser o avesso da predação. Tratar-se-á então tanto de perceber os deuses enquanto donos dos humanos, quanto de compreender a agência dos termos implicados na relação de maestria: dono (-ja) e seu recíproco animal de estimação (mymba, ou xerimbabo, tal como aparece comumente na literatura). No âmbito da etnologia das terras baixas, provocou-me a difundida noção de perspectiva (ver Viveiros de Castro 1996; Lima 1996) comum a vários povos amazônicos, mas que procuro extrapolar para os Mbya Guarani, não sem ter sido levado a isto pela experiência etnográfica junto a eles que teve lugar nas aldeias de Mamanguá, Paraty Mirim, Araponga e principalmente Camboinhas (todas localizadas no estado do Rio de Janeiro), entre os anos de 2008 e 2013. Ao investigar de que modo os Mbya pensariam a humanidade dos animais, se impôs à reflexão a complementaridade entre dono e xerimbabo, par a partir do qual procuro aqui organizar uma noção mbya guarani sobre o ponto de vista. Condição humana e transformação em animal O tema em questão surgiu de várias formas durante meu trabalho de campo junto aos Mbya, desde a denominação Nhandejára 2 (1ªpess. pl.inc.+ " dono ") para as divindades até os relatos de-jepota (" transformação em animal ") nos quais a pessoa se vê em processo de captura por algum dono de animal ou planta. Ao longo dos anos em que convivi com os Mbya, o fenômeno do-jepota sempre me chamou a atenção enquanto perigo constante e destino absolutamente indesejável para a pessoa. Logo, me surpreendi
RESUMO O artigo é um estudo sobre a organização política mbya guarani Comissão Guarani Yvyrupa. P... more RESUMO O artigo é um estudo sobre a organização política mbya guarani Comissão Guarani Yvyrupa. Procura entender o movimento de uma perspectiva primeiramente histórica, a partir da resistência guarani desde a chegada dos colonizadores e depois a partir do contexto específico das aldeias de São Paulo. Após um breve sobrevôo pelas manifestações indígenas nesta cidade faz um esforço por analisar o discurso dos Mbya que integram a Comissão a partir de alguns documentos publicados por eles desde 2006. Por fim chega-se a três elementos chave deste discurso: as referências ao xamanismo e ao modo de vida " tradicional " , a delimitação dos ruralistas como inimigos dos povos indígenas e o diálogo com o público em geral. ABSTRACT The article is a research about the mbya guarani political organization Comissão Guarani Yvyrupa. Searchs to understand the movement from a historic perspective, first from the guarani resistance since the arrival of the colonizers and them from the São Paulo villages particular context. After a quick flight above the indigenous acts in this city, makes an effort to analize the discourse of the Mbya who integrates the Comissão from some documents published by them since 2006. At least arrives at three key elements of this discourse: the references to the shamanism e to the " traditional " way of life, the delimitation of the ruralists as enemies of the indigenous people e and the dialogue with the public in general. COMMISSION GUARANI YVYRUPA :MOBILISATION (COSMO)POLITIQUE MBYA GUARANI RÉSUMÉ Cet article est une étude sur l'organisation politique Mbya Guarani, Comissão Guarani Yvyrupa. Tout d'abord, on cherche à comprendre ce mouvement d'un point de vue historique, en partant de la résistance guaranie depuis l'arrivée des colonisateurs, puis à partir du contexte spécifique des villages guaranis Mbya de São Paulo. Après un bref survol des manifestations indigènes dans cette ville, on portons l'effort d'analyse sur le discours des Mbya qui intègrent la Comissão, à partir de plusieurs documents qu'ils ont publiés depuis 2006. Enfin, on arrive aux trois éléments-clés de ce discours: les références au chamanisme et au mode de vie traditionnel, la
Resumo A partir de alguns contextos específicos de interação com os brancos (jurua) procuro inves... more Resumo A partir de alguns contextos específicos de interação com os brancos (jurua) procuro investigar no presente trabalho como a cosmopolítica mbya está orientada. A partir de um irônico comentário de uma xamã mbya sobre sua (e de seu grupo) transformação corporal em brancos(as), busco entender as relações com o jurua como formas que os Mbya arranjam de experimentar um mundo que os ultrapassa e que, por isso mesmo, desperta seu desejo de modos diversos. Durante encontros lúdicos os Mbya estabeleciam certos laços com os brancos que podem resultar até mesmo em casamento, contudo a tensão que caracteriza a relação com o Outro algumas vezes é resolvida através da guerra ou de tentativas de familiarização. Abstract Stemming from some specific contexts of relation with White people (jurua), this articles aim at investigating how and what mbya cosmopolitics is geared towards. From an ironic commentary of a mbya shaman about her (and her group's) bodily transformation into White people, it attempts to understand mbya relationships with White people as a way of experiment with a world that both overcomes them and figures out as an object of desire. During playful encounters, the Mbya engage into relationships that can even result in marital arrangements, but the tension characteristic to the relationship with the Other is also relieved, sometimes, via war or attemps to make one into kin. Introdução O texto a seguir é parte de um plano investigativo mais amplo acerca das relações entre os Mbya Guarani e os brancos (chamados por eles de jurua, ou no plural jurua kuéry). Em meu trabalho de campo, entre 2008 e 2013 na então aldeia de Camboinhas (Niterói, RJ), tais relações apareceram de diversas formas: desde a simples compra de artesanato feita por um visitante eventual até o casamento duradouro de moradores da aldeia, homens e mulheres, com jurua (algo que certamente pode ser caracterizado como
Resumo: A partir de trabalho de campo em aldeias guarani mbya do estado do Rio de Janeiro, especi... more Resumo: A partir de trabalho de campo em aldeias guarani mbya do estado do Rio de Janeiro, especialmente aquela que se localiza em perímetro urbano, na Região Oceânica da cidade de Niterói, procurei discutir a relação destes grupos indígenas com a cidade e categorias relacionadas. Situações observadas durante a pesquisa suscitaram uma série de questões sobre os motivos e expectativas que gravitam em torno da mobilidade de grupos (e indivíduos) guarani mbya: que critérios orientam a busca por novos lugares para se viver? Porque a escolha de um local urbano como destino do deslocamento? Quais as reações (interiores e exteriores ao grupo) que uma ocupação guarani em um meio urbano pode causar? A partir destes questionamentos procurei investigar como era conciliada, pelos diferentes sujeitos, a idéia de um povo (o " índio " genérico) visto, essencialmente, como " habitante das matas " ocupar um espaço urbano. Busquei entender também qual a importância dos aspectos " urbanos " no cotidiano dos Guarani Mbya, e como os significados envolvidos na categoria apareciam nos diferentes contextos. Na discussão procuro destacar as concepções cosmológicas mbya guarani em relação com o cotidiano dos sujeitos, levando em conta as trajetórias pela cidade e modos específicos de apropriação do " urbano ". Palavras-chave: Identidade indígena; ocupações urbanas; Guarani Mbya. Abstract: Based on field work made at the guarani mbya indigenous villages of Rio de Janeiro state, specially the one which is located in urban perimeter, in the Região Oceânica of Niterói city, I intend to discuss the relations between this indigenous groups with the city and its related categories. Some situations observed during research development gave rise to a series of questions about reasons and expectations that gravitate around the mobility of groups (and individuals) guarani mbya: which criterions orientate the search for new places to live in? Which are the reasons that lead them to choose an urban place as destiny of the movement? Which reactions (inside and outside the group) a guarani occupation in the city may cause? I intended to investigate how was it possible the rise, by the different subjects, of the idea of a people (the generic " índio ") perceived as " forest inhabitant " invading an urban space. I aimed to understand, as well, which was the importance of " urban " aspects in the everyday life of the Guarani Mbya, and how the meanings related to that category showed up in different contexts. With this discussion I intend to detach the mbya guarani cosmologic conceptions related with the the group's every day life, considering the trajectories in the city and specific ways of appropriation of the " urban ". Résumé: À partir de travail de champ dans des villages guarani mbya de l'état de Rio de Janeiro, spécialement celle qui se localise dans le périmètre urbain, dans la Région Océanique de la ville de Niterói, j'ai cherché à discuter la relation de ces groupes indigènes avec la ville et les catégories rapportées. Des situations observées pendant la recherche ont suscité une série de quéstions sur les raisons et des attentes autour de la mobilité de groupes (et personnes) guarani mbya : quels critères guident la recherche par des nouvelles places pour se vivre ? Pour quoi le choix d'un lieu urbain comme destination du deplacement? Quelles sont les réactions (intérieurs et extérieurs au groupe) qu'une occupation guarani dans un moyen urbain peut causer ? À partir de ces questionnements, j'ai interrogé comment était concilié, par les différents sujets, l'idée d'un peuple (l' " Indien " générique), essentiellement vu comme " habitant des bois " , qui occupe un espace urbain. J'ai cherché à comprendre aussi quelle est l'importance des aspects « urbains » dans le quotidien du Guarani Mbya, et comme les significations impliquées dans la catégorie apparaissaient aux différents contextes. Dans la discussion, je cherche à détacher les conceptions cosmologiques mbya guarani par rapport le quotidien des sujets, en considerant les trajectoires pour la ville et les manières spécifiques d'appropriation de l' " urbain " .
Resumo: O presente trabalho busca analisar o xamanismo mbya guarani a partir da embriaguez (-ka'u... more Resumo: O presente trabalho busca analisar o xamanismo mbya guarani a partir da embriaguez (-ka'u), efeito do uso de tabaco. Dada a condição tekoaxy (" perecível ") desta terra em que se vive o uso de petyngua (cachimbo) constitui-se num dispositivo fundamental de controle ou de bloqueio dos perigos que emanam de subjetividades maléficas que habitam o cosmo mbya. Embora o efeito do tabaco seja o de " embriagar " a pessoa, como o do álcool, ele é posto duplamente em oposição a este: se é preciso " saber beber " , evitando excessos no uso do álcool, dizem comumente que o xamã é alguém que precisa agüentar o excesso do uso de tabaco a fim de realizar suas curas; além disso, se a bebida aproxima a pessoa do ponto de vista dos mortos, o petyngua faz o mesmo porém em relação à perspectiva dos deuses. O uso do petyngua, a qualquer momento do dia, manifesta uma afecção ou um desejo divino – é o nhe'ë (alma) que quer, me diziam – o que levou-me a pensar nas relações de distância (afastamento, aproximação) que são ativadas por este dispositivo. Como tanto o calor quanto o frio excessivos estão associados à aproximação dos espíritos dos mortos, sugeri que o uso do petyngua ajusta a temperatura do corpo a um grau mediano de um gradiente de calor, através de uma aproximação com os divinos e um simultâneo afastamento de potências causadores de males. Não se trataria assim, no xamanismo mbya, nem de esquentar a pessoa e tampouco de esfriá-la, mas sim de esfriar aquele que se encontra demasiado quente e de esquentar aquele que está gelado. Palavras-chave: Mbya Guarani; xamanismo; embriaguez. Introdução Tonico Benites, liderança guarani kaiowa que morou em Camboinhas 1 durante quase um ano explicou-me certa vez que a doença estaria sempre chegando nas aldeias e o pajé teria como função desviá-la para que não alcance ninguém. Muitos anos depois de ter ouvido isso, durante uma tarde nublada em que estávamos eu e Agai fazendo passar o tempo conversando, escutamos o seguinte pedido de Lidia, liderança local no âmbito tanto do parentesco quanto no do xamanismo: " vão estourar o chicote " (tapeo, tukumbo pembopororo-roro). Nos dirigimos então para a opy'i (casa de reza) a fim de pegarmos o tukumbo, que é um chicote como o que usam os vaqueiros, feito de couro (no original, de guembepi, um cipó fino), na ponta do qual se amarram pequenas tiras de plástico para que faça soar um estampido quando chicoteado no ar. Jéka e Agai 1 Bairro de Niterói (RJ) no qual localizava-se a aldeia onde realizei trabalho de campo entre os anos de 2008 e 2013. A (extensa) família mbya guarani que então residia ali mudou-se em 2013 para Maricá, município vizinho, local onde se encontram até hoje.
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