Há uma anedota famosa transmitida por Diógenes Laértio na
sua Vidas e doutrinas dos filósofos
ilustres acerca de Diógenes, o cão ele nos conta que: “durante o dia,
Diógenes, caminhava (periéei)
segurando uma lanterna dizendo: ‘procuro um homem’! (anthropon zetô)” (Diógenes Laértios,Vidas e Doutrinas. VI,II,41).
Essa anedota chama a atenção pelo excentrismo do filósofo
cínico, mas a sua performance nos diz mais do que queremos saber. Na linha
acima desse relato Laértio no informa que: “Diógenes dizia que os demagogos são
empregados das massas (
ókhlou diakónous)”
(Idem. VI,II,41). Imaginem Diógenes, ele toma a sua lanterna em plena luz do
dia e perambula pelas ruas da cidade gritando: “procuro um homem de verdade”
digo perambula, porque é exatamente isso que o verbo
pérao indica,
quer dizer, Diógenes andava de um lado para o outro com sua lanterna em punho. Procurava um homem de verdade,
ánthropos, o gênero humano por excelência
e não o homem e a mulher, o macho e a fêmea, mas a humanidade escondida por
detrás do macho e da fêmea, do homem e da mulher. Mas hoje quero repetir o
gesto do filósofo cínico e pegar a minha lanterna, porém, não vou procurar por
um homem de verdade, mas por um político honesto.
Procuro um político honesto, porque só me deparo com
demagogos. Me sinto como Diógenes que sempre que lhe perguntavam se havia muita
gente em um lugar respondia: “sim, muita gente (ókhlos polýs), porém, poucos homens (olígoi d’ hoi ánthropoi)”
(Cf. Idem. VI,II,60). Chama a atenção pelo contraste entre ókhlos e ánthropos,
entre multidão, massa, turba de um lado e homens do outro. Para o nosso
filósofo cínico a práxis política se resume a demagogia, e creio que seu
diagnóstico se dá principalmente pela força dos discursos que ouvira na assembleia
ateniense. A política resumida à demagogia, isto é, a condução do povo, dessa
multidão que corre como um rio impetuoso. Por isso também Diógenes louvava quem
queria participar da política (assumindo um cargo), mas não assumia. Diógenes,
é certo, seria considerado um anarquista e o anarquismo pela sua radicalidade
pode ser difícil de ser compreendido e assimilado, mas ao menos nos põe a
pensar, e a querer perambular com uma lanterna na mão a procurar um político
honesto, um homem de verdade.
Procuro um político honesto, mas só me deparo com
demagogos. Procuro um parresiásta, mas ele se esconde da política. A política
como profissão exige de quem a professa que seja capaz de vender a mentira como
verdade. O político profissional é um adulador que diz o que a turba quer ouvir,
por isso “o demagogo é um empregado das massas”, porque se põem aos seus
serviços adulando-o. A adulação passa do dizer o que a multidão quer ouvir a
fazer o que ela deseja, mesmo que isso seja prejudicial.
Inquerido, certa vez, sobre que fera teria a mordida
pior, Diógenes respondeu que das feras selvagens o sicofanta (os sicofantas
viviam da extorsão e do estelionato) e das feras domésticas o adulador (kólacs) (Cf. Ibidem. VI,II,51).
Ser seduzido pelo adulador, seja no âmbito privado, isto
é, pelos amigos e familiares que querem receber seus favores, seja no âmbito público,
ou seja, pelo demagogo é receber uma mordida terrível.
Vou segurar a minha lanterna, sob o brilho da luz do sol
em busca de um político honesto, em busca também da minha honestidade, e
gostaria de ter a felicidade de encontrar ao menos uma das duas coisas.