Quando se reflete ou se intervém
no desenvolvimento, com frequência, ele é tomado como podendo acontecer, sem
que o território seja tido em conta. Um tal pressuposto tem consequências
gravosas sobre o ritmo de desenvolvimento pretendido e sobre a equidade alcançada
na repartição dos seus resultados. Acontece que não pode haver desenvolvimento sem
território.
Ainda assim, coloca-se a questão:
para que precisa o desenvolvimento do território? Quase que poderíamos dizer
que não é necessário explicitá-lo, porque o desenvolvimento não pode acontecer sem
território.
No que se segue, procuramos, fazer
uma análise da situação com que, em Portugal, nos confrontamos, identificar
constrangimentos, problemas e potencialidades e enunciar perspetivas de futuro,
na relação entre território e desenvolvimento. Antes, convém que fixemos o que
entendemos por desenvolvimento e por território.
São
infindáveis as noções e conceções de desenvolvimento que têm sido tomadas ao
longo do tempo e no espaço. No âmbito da reflexão que o GES tem vindo a fazer sentimo-nos
confortáveis com a noção de que o desenvolvimento
é um processo de transformação social que, a todos permite a obtenção de melhor
bem-estar, com respeito pela sua dignidade humana e que, simultaneamente,
garante a sua sustentabilidade, intertemporal e na relação entre os vários
espaços.
Quanto ao
território, ele é frequentemente olhado como não sendo mais do que o espaço
físico que nos rodeia. No entanto, ao longo de todos os tempos o Homem foi-o
ocupando e moldando ao que, em cada circunstância, considerou serem os seus
interesses. Ao espaço físico
transformado pelo Homem designamos por território.
Na medida
em que o desenvolvimento envolve a presença humana e esta só acontece tendo
como suporte, um determinado território, fica justificado que não pode haver desenvolvimento
sem território, nem território sem desenvolvimento.
1.
O
território, o desenvolvimento regional e os desequilíbrios
Nos primórdios
da ciência económica, toda a análise e formulação de políticas era concebida com
o território como sua parte integrante. Toda a reflexão sobre o desenvolvimento
tinha como primeira vocação dar resposta aos problemas das populações que
viviam sobre um território. Assim foi, pelo menos até princípios do séc. XX.
Depois, à semelhança das ciências exatas, a preocupação, em introduzir na
reflexão económica raciocínios abstratos que permitissem fazer generalizações levou
a que, pouco a pouco, o território fosse dela desaparecendo (porque dificultava
as generalizações) ou, se não desaparecia, estava presente como se o território
fosse um ponto, ou um espaço homogéneo, sem rugosidades. Assim sendo, deixava de
se justificar que ao território fosse prestada a atenção que antes possuía. Pensou-se que transpondo, assim, sem mais,
as metodologias das ciências ditas exatas para a economia, se lhe atribuía uma
maior cientificidade.
Só depois
do fim da 2ª Grande Guerra é que o território voltou a espreitar nas
preocupações dos economistas. A razão era simples. As destruições provocadas
pela Guerra, que tinham tido intensidades diversas nos vários territórios e as
necessidades da reconstrução exigiam que a cada um fosse dada uma atenção
específica.
Década e
meia mais tarde, a arquitetura da Comunidade Europeia deu um lugar central à
política e à reflexão regional. O seu instrumento principal, em termos de
financiamento, era e é o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). A
razão era simples. Nos fundamentos da criação da Comunidade Europeia havia o
propósito de fazer do espaço europeu uma grande economia, capaz de ombrear e
competir com outros grandes blocos económicos. Ora, entendia-se que a economia europeia não podia ser competitiva enquanto no
seu interior existissem tão
flagrantes desigualdades territoriais, na capacidade de desenvolvimento e na
obtenção de resultados. Para além disso, entendia-se que uma maior
igualdade, também, reforçava o crescimento e o desenvolvimento no seu seio, na
medida em que alargava, o mercado interno e a intensidade de relações
comerciais e económicas que entre eles estabeleciam, tornando o bloco económico
europeu mais coeso, produzindo maior bem-estar para os seus cidadãos e tornando-se
mais competitivo face aos outros blocos económicos.
Compreende-se
assim e é suficientemente conhecido que a preocupação principal da política
regional europeia fosse a da redução dos desequilíbrios económicos e sociais
nos e entre os vários territórios. Mas fica a questão, porque é que os desequilíbrios existiam e se desenvolviam. A
problemática é muito semelhante à que existe, hoje, na sociedade portuguesa,
sobre a relação entre os fogos
florestais e a gestão da floresta. Desenvolver
o território é, não apenas, corrigir os desequilíbrios, mas sobretudo evitar
que eles aconteçam. Do mesmo modo que a boa gestão e ordenamento da
floresta dificulta o aparecimento e a propagação de fogos, também, a correta gestão
do território diminui, de forma sustentada, o aparecimento e aprofundamento de
desequilíbrios regionais.
Vejamos
porquê. Todas as medidas de política económica têm incidências diretas, ou
indiretas, sobre cada ponto, sobre cada lugar, do território. Só que essas incidências não se refletem do mesmo modo
em cada um desses pontos, porque sendo eles diferentes uns dos outros, cada
um vai reagir de modo diferente perante uma medida de política que é tomada de
forma indiferenciada para cada lugar ou, para cada espaço. A falta de
consciência de que é assim que se propagam os fenómenos económicos só pode ter,
como tem tido, como consequência a redução da robustez de cada uma das
economias e a diminuição da sua capacidade para produzir riqueza.
Temos
insistido sobre a utilização da designação “território” em vez da terminologia
mais corrente de “região”. E temo-lo feito por boas razões. O espaço deve ser considerado em diferentes
dimensões (escalas), de que a dimensão regional é apenas uma entre elas.
Entre as restantes deveremos autonomizar, pelo menos, os seguintes territórios:
local, nacional e internacional. O que justifica a autonomização das escalas é
o fato de a projeção dos fenómenos e decisões económicas terem áreas de influência diversas sobre o
território. Umas esgotam-se num território local. Outras, para se poder ter
em conta todos os seus efeitos, exigem uma escala regional. E, assim,
sucessivamente, para as escalas, nacional, internacional ou global.
Contudo,
importa estar consciente de que todas as
escalas interagem, intensamente, tanto em
termos horizontais (por ex. umas regiões com as outras), como em termos verticais (por ex. as regiões
com os espaços nacionais, porventura, de outros países).
Claro que fica
ainda por discutir o que é um
desequilíbrio. Numa abordagem simplista, poderá dizer-se que existem
desequilíbrios territoriais quando as
populações existentes em cada um dos territórios não possuem iguais
oportunidades de desenvolvimento e de benefício dos seus resultados. Mas pode perguntar-se esta pretensão tem,
sempre, razoabilidade? A questão deve ser posta, porque, em cada tempo, o
desenvolvimento acontece em espaços com recursos e capacidades diversas, de que
resultam aptidões diferentes para produzir riqueza. As que têm menor aptidão
vão ficando mais distanciadas das que têm maior aptidão e assim acontecem os
desequilíbrios. Para além disso, os recursos e as capacidades evoluem no tempo
e é necessário tomar essa evolução em consideração.
Também, é
verdade que os territórios são espaços abertos e, por isso, analisar a
verdadeira natureza dos desequilíbrios exige, também, compreender como é que as dinâmicas de desenvolvimento se difundem
entre os vários territórios. Também daqui decorre que é de extraordinária
importância a identificação de quem faz
o quê, em cada território.
Importa,
ainda, que nos interroguemos sobre se a busca da igualdade deve ser prosseguida,
sempre, sem quaisquer limitações. Sim e não. A resposta depende dos termos de
referência que tivermos para medirmos a igualdade e a desigualdade. Como se
referiu, a capacidade de cada território para produzir riqueza não é uma
característica estática. Vai variando ao longo do tempo, já que com ele, se
alteram os recursos e as possibilidades de os valorizar ou deixam de ter
mercado os bens e serviços anteriormente produzidos.
Em muitas circunstâncias, pode dizer-se que
certos territórios deixaram de ter viabilidade económica e social colocando-se,
então, a questão de saber o que fazer. Haverá quem defenda que, se o
território não tem viabilidade, então será mero desperdício de dinheiros
públicos e privados continuar a insistir a nele realizar a sua aplicação. Diz-se
que não se deverá contrariar a tendência para a emigração dos seus recursos,
nomeadamente os humanos e permitir que, inevitavelmente,
aconteça a desertificação do território, porque o funcionamento do mercado, com
mais ou menos tempo, conduzirá à reconstituição dos equilíbrios. Os que assim pensam esquecem-se de referir as
dificuldades do ajustamento, nomeadamente, em relação a cada pessoa, com
consequências e sacrifícios pessoais, em muitos casos, considerados injustos e insuportáveis.
Ora, tem sido neste quadro de pensamento que, em grande medida, têm sido
encaradas as questões relacionadas com a dinâmica dos desequilíbrios regionais,
em Portugal.
No entanto,
convém que se tenha presente que ninguém pode garantir que, a longo prazo, um
território que hoje deixou de ter viabilidade não volte a recuperá-la face ao
aparecimento de novas tecnologias e de novos mercados e novas capacidades de
combinar os recursos. E como garantir o que fazer?
Haverá, em
primeiro lugar, que encontrar um consenso social e político de que é no caminho
do esvaziamento dos territórios que se deve procurar uma solução. Encontrado o
consenso terá que se procurar o processo de ajustamento que tenha resultados da
maior equidade, para os que saem e para os que ficam. Efetivamente, justifica-se
que alguns tenham que ficar, por duas razões. Em primeiro lugar, porque aquele
território não pode tornar-se em terra de ninguém e é necessário que se cuide,
entre outros, dos valores ambientais e da paisagem. Depois, porque a vigilância
sobre a possibilidade do aparecimento de novos recursos e capacidades de
desenvolvimento é a melhor forma de promover a sua valorização e utilização
futura.
Não pode,
assim, eleger-se o acaso da espontaneidade como a forma de resolução dos
desequilíbrios e da reconversão dos territórios. Além disso, importa
compreender que os bloqueamentos com que um determinado território se vê
confrontado, não têm que ser resolvidos apenas por aqueles que lá residem, mas
antes devem ser entendidos como um problema que é da responsabilidade de toda a
comunidade e que, por isso, deve ser objeto de um consenso social, por ela
assumido, tendo como condição a de que, a
todos os que ficam ou que partem, deve ser garantido, pelo menos, um nível de
rendimento ou de bem-estar equivalente ao da média dos seus concidadãos com
idênticas qualificações e ocupações.
Apresentados
os princípios, que têm validade independentemente do tempo e do espaço que
tenhamos como referência, debrucemo-nos, agora, sobre os problemas principais com
que se confronta a gestão do território português. Começaremos com a análise da
situação e abordaremos depois, os constrangimentos, os problemas, as
potencialidades e o enunciado de propostas de futuro.
2.
A autonomia
dos territórios
Desde os
primórdios que a construção da nacionalidade portuguesa se caracteriza pela enorme
diversidade de características, físicas dos vários territórios e dos quadros
culturais das suas gentes. A diversidade justificava um certo grau de autonomia
para esses territórios, autonomia essa que se desenvolvia de forma compatível
com fortes sentimentos de unidade nacional. Não são poucas as iniciativas de
fomento, dos nossos reis e governantes, em várias partes do território, com
vista a criarem robustez para o seu todo e, assim, manterem a unidade nacional.
Ao longo
dos séculos o território foi partido, ou organizado, em parcelas, com
diferentes designações, tendo em vista, a gestão da administração central
nesses territórios ou a criação de autonomias que melhor fomentassem a sua
gestão. Não faremos a análise de todas essas partições. Recordemos, apenas, as
mais recentes, de que destacaremos, os distritos,
as províncias e as regiões de planeamento ou regiões plano.
Os
distritos foram a partição que se revestiu de maior durabilidade, só vindo a
perder a sua plena eficácia muito recentemente. Tiveram como vocação,
essencial, serem espaços de organização desconcentrada das decisões da
administração central do Estado. Deve, no entanto, reconhecer-se que na
ausência de outro suporte, não poucas vezes, os distritos, também serviram de
canal para transmitir ao Estado Central aspirações locais.
As províncias
nunca deixaram de ser muito mais do que referências de natureza cultural,
agregadoras de tradições e costumes de espaços regionais possuidores de características
comuns. Ainda hoje não passam muito disso, raramente servindo de suporte à
tomada de decisões de política económica e social das várias administrações.
A criação
das regiões plano, ou de planeamento, surgiu, apenas, em finais dos anos 60 do
século passado, dentro das preocupações de fomento do Estado central, através
dos últimos Planos de Fomento. Eram 4 as regiões: Norte, Centro, Lisboa e Sul e
2 regiões autónomas: Açores e Madeira. Posteriormente, a região de Lisboa veio
a designar-se de Lisboa e Vale do Tejo e a região Sul foi partida em Região
Alentejo e Região do Algarve, administradas, primeiro pelas Comissões de
Coordenação Regional (CCR) e depois, pelas Comissões de Coordenação e
Desenvolvimento Regional (CCDR); neste âmbito são, aliás, designadas como áreas
de intervenção das CCDR, ou regiões para fins estatísticos e, por isso, não se
lhes pode, propriamente, atribuir a categoria de “regiões”.
Apesar da
sua importância administrativa, as CCDR, sendo órgãos desconcentrados da
administração central, são hoje, quase exclusivamente, espaços de afetação de
financiamentos comunitários naquelas áreas (naturalmente, que nestas
considerações não são tidos em conta os casos particulares das Regiões
Autónomas dos Açores e da Madeira). Apesar das vinculações constitucionais
sobre a criação de Regiões Administrativas, é isto o que hoje nos resta, de partições
regionais. Com escala inferior existem outras partições (áreas metropolitanas,
comunidades urbanas, comunidades intermunicipais), mas não se lhes pode
atribuir a natureza de regiões. Muito menos se pode esperar que a gestão de
espaços regionais possa surgir a partir das iniciativas conjuntas de vários
municípios, porque estes não podem gerir em conjunto outra coisa que não seja o
que resulta das suas competências, que já possuem um quadro de exercício
próprio que é o dos concelhos.
Vale a
pena, agora, perguntarmo-nos sobre se, hoje, com dinâmicas económicas e sociais
que já não são as do séc. XX, tem alguma relevância a existência de regiões num
quadro de autonomia. A resposta é a de que tem e muita. Não se pode querer
valorizar a gestão dos territórios e a correção dos desequilíbrios, na
ignorância da existência de regiões.
Apesar dos
tempos de aprendizagem que foi necessário cumprir, neste momento, são raros os
que põem em causa a necessidade da existência de autarquias locais, pelo
relevantíssimo papel que têm tido na promoção do desenvolvimento dos espaços
locais dos seus municípios. Talvez a alguém tal passe desapercebido, mas a
designação de “autarquia” não é mera figura decorativa. Ela significa que as
entidades em causa são autónomas no exercício das suas competências e dispõem,
para o efeito, de órgãos próprios, eleitos.
Do mesmo
modo que para as autarquias locais, dizer regiões autónomas é o mesmo que dizer
regiões “autárquicas”. Por isso, a criação de regiões administrativas pode, em
muito, beneficiar da aprendizagem feita no desenvolvimento das autarquias
locais. Haverá quem pense que, se já possuímos autarquias locais, se dispomos
de um estado central a funcionar regularmente, para que é que precisamos,
agora, de regiões administrativas?
Por 3
simples razões: eficácia, eficiência (poupança de recursos) e aumento as
potencialidades de desenvolvimento. Já antes se referiu que os fenómenos e as
decisões económicas têm um espaço ou domínio de produção de consequências, que
pode ser maior ou menor. Tal já é reconhecido para as autarquias locais, mas
depois, considera-se que tudo o resto pode ser abarcado pelo espaço nacional, o
que tem como consequência que se considera irrelevante, o papel mobilizador e
organizador que podem ter as populações a nível supra local. Bem conhecemos os
argumentos que têm sido invocados contra a regionalização, sobretudo em termos
de desperdício de recursos e de estabilidade política. Mesmo admitindo que
existem desperdícios, o que há a fazer é eliminar as razões que os provocam,
que mais têm a ver com a manutenção ou alteração dos equilíbrios de poderes
políticos nas várias regiões e menos com a racionalidade da criação de regiões.
Esta
reflexão sobre a criação de regiões é uma componente indispensável do
diagnóstico da situação do território. Os bloqueamentos atualmente existentes à
criação de regiões não podem ter como consequência senão o agravamento das
desigualdades entre os vários espaços territoriais.
3. A análise dos desequilíbrios
Convém
recordar que não é possível analisar desigualdades sem ter em conta as
características dos espaços de suporte e que, no seu conjunto, são parte do
todo nacional. Quer dizer, a forma como se fazem partições tem consequências
sobre a medida do nível de desequilíbrio entre os espaços partidos.
Por exemplo,
suponhamos que temos um espaço onde existem 4 polos de crescimento (mais
desenvolvidos) e que começamos por partir esse espaço em dois conjuntos, de
modo que num dos conjuntos fiquem os 4 polos e no outro conjunto ficam, apenas,
os espaços menos desenvolvidos. Em alternativa admita-se que se faz uma outra
partição, também em dois conjuntos, de modo que num deles ficam dois polos e no
outro os outros dois. Poderíamos, ainda, supor que em lugar de dois conjuntos
partíamos o conjunto global em três subconjuntos. Aqui chegados, se tomássemos
um mesmo indicador de desequilíbrio para medir as assimetrias no interior do espaço
global, iríamos verificar que obteríamos um resultado diferente para cada uma
das partições acima referida.
Conclusão:
a forma como agregamos os espaços tem consequências sobre os resultados da
medida dos desequilíbrios, o que coloca a questão de saber qual é a metodologia
correta de fazer as partições. A solução não é fácil e depende de critérios vários.
Não é aqui o lugar para desenvolver esta questão, mas sempre diremos que convém
conformar as partições com o tipo de relações que estão subjacentes à dinâmica
de desenvolvimento que se pretende implementar.
Tem-se
usado como medida dos desequilíbrios, a que toma como território de referencia
a partição entre litoral e interior. Mais importante que os resultados que daí
possam decorrer, em termos de desequilíbrios, o que é mais relevante são as
consequências que se possam retirar em termos de medidas de política, por ex.,
no sentido de promover o interior face ao litoral. Considerar o interior como
independente do litoral é o mesmo que admitir que os problemas do interior se
podem equacionar, o que quer que seja que aconteça no litoral. Ora, as regiões
são espaços abertos e as dinâmicas de desenvolvimento que acontecem, ou se
devem promover, circulam entre os espaços independentemente das fronteiras que
entre eles tenhamos estabelecido.
Pelas
razões apontadas não é fácil encontrar consenso acerca de uma medida de
desequilíbrio para o conjunto dos espaços nacionais, porque há que determinar,
primeiro, quais são os espaços a considerar e depois, escolher quais são as
variáveis cujo comportamento se quer medir e o horizonte temporal que se quer
privilegiar. Apesar de tudo, sendo difícil, sempre é preferível ter alguma medida
do que não ter nenhuma. Por isso, tomaremos como variável de referência o PIB
per capita e o rendimento disponível das famílias e como espaços, os das
regiões eleitas para fins estatísticos. A fonte é a da contabilidade nacional
do INE, com cálculos nossos.
Para efeito
de mais fácil comparação reduzimos todos os dados a uma base 100, sendo 100, o
conjunto do país. O PIB pode ser tomado como um indicador da criação de riqueza
e o rendimento disponível das famílias como indicador de efeitos
redistributivos (ver quadros da página seguinte).
Tomando o
quadro do produto, o que verificamos é uma grande estabilidade da parte de cada
território ao longo do tempo, isto é, uma forte dificuldade de cada território
em criar riqueza, modificando
as suas partes relativas.
Excetuam-se as
regiões de Lisboa, Algarve, Açores e Madeira. Lisboa e Algarve diminuem o seu peso e Açores e Madeira aumentam-no substancialmente.
regiões de Lisboa, Algarve, Açores e Madeira. Lisboa e Algarve diminuem o seu peso e Açores e Madeira aumentam-no substancialmente.
Se
olharmos, agora, para os dados do rendimento disponível constatamos que, em
relação ao PIB, diminui, fortemente, a parte de Lisboa aumentando todas as
restantes, o que mostra o papel que têm as medidas de política distributiva. No
entanto, excetuando os Açores, o efeito que pode ser observado no primeiro ano
apresentado (2000) não se intensifica nos anos seguintes.
Servem-nos
estes resultados para alguma coisa? Têm um papel de alerta, mas seria
importante que se dispusesse de outras agregações de territórios que
permitissem verificar se estas tendências são constantes em todas elas. Fica a
nota de que se partirmos o Alentejo em Alentejo Litoral e restante Alentejo,
obtemos resultados que não nos devem causar surpresa. O Alentejo como um todo
tem uma posição abaixo da média nacional. No entanto, em 2011, o Alentejo
Litoral, só por si, consegue um índice de 133.
Conclusões:
A extrema lentidão na mudança de situações preexistentes; o papel relevante que
as políticas distributivas podem ter na promoção da equidade regional e o
efeito limitado das políticas distributivas na potenciação da equidade regional
porque elas, só por si, não bastam para fomentar a capacidade autónoma,
durável, para a criação de riqueza. Isto significa que os dados de diagnóstico
a que, habitualmente se tem acesso não bastam para que, a partir deles, se
possam sustentar medidas de política que promovam a alteração das situações de
desequilíbrio.
4. Constrangimentos e propostas de futuro
É habitual
os constrangimentos ao desenvolvimento do território serem enunciados em termos
das suas caraterísticas físicas, capacidades dos recursos humanos, apetência
para criar riqueza a partir dos recursos disponíveis e das suas formas de
relacionamento com outros espaços. São esquecidos, com frequência, os aspetos
relacionados com a capacidade de gestão e de governança. Em grande medida, o
papel que estes últimos fatores têm na produção de desenvolvimento territorial
foram suficientemente sublinhados no ponto anterior.
A obtenção
dos indispensáveis consensos acerca do que é que o país quer fazer com o seu
território está longe de ser obtida, não podendo esse consenso ser deduzido a
partir da reflexão que tem sido feita em torno das medidas de programação e
financiamento comunitárias.
Para além
disso, antes de saber o que se quer fazer no território, há que formatar esse
território, autonomizando os espaços regionais a considerar e escolher os
espaços urbano e rural que queremos.
É claro
para todos que não poderão ser descurados: os aspetos demográficos (natalidade,
envelhecimento, migrações, fixação da população); a obtenção de maiores níveis
de equidade nas condições de vida da população; o fortalecimento e
revitalização da estrutura urbana; a melhoria das redes de transportes e
comunicações, não apenas as que facilitam as relações com o exterior, mas
também as que permitem densificar o espaço interior de cada região ou
localidade; a criação de robustez nas instituições de ensino e formação, pelas sinergias
que geram à sua volta, a capacidade em lidar com a inovação, etc.
A criação
de condições para que o desenvolvimento aconteça constitui, por si própria, uma
componente das propostas de futuro, mas importa ter sempre presente que as
condições que se escolhem se têm que ordenar em relação a objetivos previamente
escolhidos. Quais os objetivos a prosseguir?
Há
objetivos que são próprios a cada região, em função das suas características
específicas e dos objetivos de equidade politicamente aceitáveis no todo
nacional. Uns e outros visam obter o máximo de bem-estar compatível com os
objetivos maior bem-estar no futuro, de sustentabilidade dos recursos e de
preservação da paisagem e do ambiente.
Não estamos
em condições de enunciar os objetivos específicos de cada espaço, mas quaisquer
que eles sejam devem ficar subordinados aos consensos societários que, hoje, se
consideram inquestionáveis:
1. Alteração
do modelo de desenvolvimento que tem vindo a ser prosseguido;
2. Diminuição
da intensidade do uso de recursos finitos;
3. Preservação
da paisagem e do ambiente;
4. Endogeneização
dos efeitos das alterações climáticas;
5. Construção
de um modelo de ordenamento do território que retire dos objetivos anteriores as consequências
adequadas;
6. Alteração
dos modelos de trabalho e de vida;
7. Melhor
articulação entre o prosseguimento de objetivos locais e de objetivos globais;
8. Compatibilização
dos vários objetivos de equidade, social e territorial;
9. Orientação
das opções em matéria de objetivos tecnológicos, de forma a que se possam
melhor compatibilizar com a realização dos objetivos anteriores;
10. Adoção
de formas de governança adequadas ao prosseguimento dos objetivos anteriores,
que tenham em conta os valores e experiências já adquiridos e que devam ser
mantidos;
11. Implantação
de uma rigorosa disciplina de avaliação que, permanentemente, confronte,
objetivos programados com objetivos realizados e recursos utilizados com
recursos cuja mobilização tinha sido planeada; célere responsabilização dos
agentes responsáveis pelos desvios encontrados.
Manuel Brandão Alves
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