O protagonista, Calisto Elói, um fidalgo transmontano, austero e conservador, é uma espécie de encarnaçøo satírica desse eleito deputado, Calisto vai viver para Lisboa, onde se deixa corromper pelo luxo e pelo prazer que imperam na capital, tomando por amante uma prima afastada, Ifigénia, e transitando da posiçøo miguelista para o partido liberal no governo. Ironicamente, a esposa de Calisto, Teodora, uma aldeø prosaica, imita-o na devassidø vendo-se desprezada pelo marido, une-se a um primo interesseiro e sucumbe ela própria aos vícios da modernidade.
«Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco (1825-1890) foi um dos escritores mais prolíferos e marcantes da literatura portuguesa contemporânea tendo sido romancista, cronista, crítico, dramaturgo, historiador, poeta e tradutor. Teve uma vida atribulada, que lhe serviu muitas vezes de inspiração para as suas novelas. Foi o primeiro escritor de língua portuguesa a viver exclusivamente do que escrevia. Durante quase 40 anos, entre 1851 e 1890, escreveu à pena, logo sem qualquer ajuda mecânica, mais de duzentas e sessenta obras, com a média superior a 6 por ano. Prolífico e fecundo escritor, deixou obras de referência na literatura lusitana. Apesar de toda essa fecundidade, Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco não permitiu que a intensa produção prejudicasse a sua beleza idiomática ou mesmo a dimensão do seu vernáculo, transformando-o numa das maiores expressões artísticas e a sua figura num mestre da língua portuguesa.» Fonte; http://www.luso-livros.net/biografia/...
Camilo Ferreira Botelho Castelo-Branco (1st Viscount de Correia Botelho), was born out of wedlock and orphaned in infancy. He spent his early years in a village in Trás-os-Montes. He fell in love with the poetry of Luís de Camões and Manuel Maria Barbosa de Bocage, while Fernão Mendes Pinto gave him a lust for adventure, but Camilo was a distracted student and grew up to be undisciplined and proud.
He intermittently studied medicine and theology in Oporto and Coimbra and eventually chose to become a writer. After a spell of journalistic work in Oporto and Lisbon he proceeded to the episcopal seminary in Oporto in order to study for the priesthood. During this period Camilo wrote a number of religious works and translated the work of François-René de Chateaubriand. Camilo actually took minor holy orders, but his restless nature drew him away from the priesthood and he devoted himself to literature for the rest of his life. He was arrested twice, the second time due to his adulterous affair with Ana Plácido, who was married at the time. During his incarceration he wrote his most famous work "Amor de Perdição" and later it inspired his "Memórias do Cárcere" (literally "Memories of Prison"). Camilo was made a viscount (Visconde de Correia Botelho) in 1885 in recognition of his contributions to literature, and when his health deteriorated and he could no longer write, Parliament gave him a pension for life. Going blind (because of syphilis) and suffering from chronic nervous disease, Castelo Branco committed suicide in 1890.
A obra é uma sátira ao momento de mudança que se vive em Portugal com a Regeneração, séc. XIX.
Um fidalgo Transmontano, em tudo por tudo austero e conservador, ao mudar-se para Lisboa a fim de exercer o cargo de deputado acaba por se mudar a si próprio, no sentido lato da palavra, ao se deixar corromper pela luxúria que existe na capital. Achei muito atual o tema, mas sobretudo muito muito caricato e divertido.
Sinceramente fez-me rir o antagonismo entre o "antes" e o "depois". A transformação é deveras escandalosa e calamitosa.
Contudo, o dialeto floreado parafraseado no parlamento é quase intragável e dei por mim a pensar se era defeito meu... se seria eu muito iletrada ou se os discursos não seriam uma verborreia incompreensível.
É um clássico. Vale a pena ler, mais a mais é pouco extensa a obra.
This is considered one of the most famous literary works written by this author, who narrates his life from its origins until he entered the Parliament. He makes contact with all the politicians. It satirically describes the Portuguese social and political life of the time. Calisto goes to Lisbon, where he lets himself be corrupted by the luxury and pleasure that prevail in the first city in the country, becoming a lover of a distant cousin, Ifigénia, a relationship disapproved by the most distinguished Portuguese society. Always supported by bookish culture, his speeches made such a sensation in Parliament that they caused controversy and conflicting reactions between favorable and opposite. Defending the morality of good old customs and attacking the liberality of the modern ones, his fame is increasing, acquiring a great dimension. However, its decline soon begins, which justifies the book's title. He falls in love first with a friend's young daughter, Adelaide. He then begins an illicit love relationship with the widow Dona Ifigênia Ponce de Leon - his mistress, with whom he ends up living maritally and has two children. Her husband, Dona Teodora, abandoned by her husband, also finds another companion: Lopo de Gamboa, her cousin, with whom she has a son. This work expresses criticism of the romantics and the misuse of the Portuguese language. The theme of adultery makes a criticism related to the accelerated progress of customs and their harmful consequences.
There is nothing like a man with the name, “O morgado da Agra de Freimas, o fidalgo Calisto Eloy de Silos e Benevides de Barbuda.” You know that he sounds pompous. He knows his Greek and Latin, recalls the great deeds of the past, wants the good people of Lisboa to recognize his talents as a member of parliament, with his flowery speech, and working to make Portugal great again by assisting the king. A perfect angel!
But above all, a perfect ladies man. Oh, that last one annoys his wife, Theodora. Yep, the angel must fall.
He makes waves in the government and in public. He changes his dress, changes his appearance, packs on a few pounds in the waist area, so much so that his wife barely recognizes him. He is a changed man.
Calisto is 44. Not young nor old we are told. Is this a simple case of mid life follies? What is the perfect distraction? Her name is Iphigenia. A recently widowed Brazilian woman. She has money, a big house near Cintra. Add in a distant cousin. And the looks! Temptation is too much for our fidalgo.
Now hold on. Iphigenia? Remember your Greek myths. King Agamemnon wanted to set sail for Troy with his band of ships, but the winds (in the guise of an angered Artemis) were not in his favour. He sacrificed his own daughter, Iphigenia, to appease the gods, and in doing so angered his wife Clytemnestra, and thus set up a terrifying set of tales, the Oresteia. A woman wronged!
When Calisto asked Iphigenia about her name, she answered, of course, it’s from the play by Racine! Helas! Ah, those French writers were all the rage in Lisboa.
This is a classic by the Portuguese author Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco. There is some moralizing in the end but that is par for the course (it was written in 1866). And of course, a little comparison to that big city Paris.
Nunca tinha lido Camilo . Passados 150 anos da sua publicação este romance tão português consegue fazer-nos sorrir. É uma história bem contada num português cheio de floreados mas que se lê com agrado . A distância entre o interior e a cidade grande ainda persistem apesar da época tão diferente em que vivemos Um clássico e como tal intemporal .
Camilo Castelo Branco tem um lugar inegável na história do romantismo português. Neta obra, conta a história de Calisto Elói, um fidalgo que vive afastado da vida moderna e mundana das cidades e que despreza o estilo de vida não tradicionalista. Quando é eleito deputado e se muda para Lisboa, a sua vida e costumes começam a mudar gradualmente.
Com a sátira já habitual neste estilo, o autor reflete sobre a hipocrisia do tradicionalismo e a decadência do estilo de vida romântico do sec XIX.
Não foi uma leitura que me agradasse particularmente, dado que o estilo está longe de ser o meu favorito, a sátira é muito datada e pouco subtil e a comédia não funciona muito bem para o meu gosto pessoal. Recomendo a quem seja apreciador do estilo.
A Queda dum Anjo vem relatar um época retrograda, que recua à inícios do século XIX para retratar de forma crítica a sociedade e a política do país, realçando de igual modo as fases de transição de um Portugal antigo para um Portugal moderno. Publicada em 1860, esta obra apresenta uma evidente dependência com o passado, no passadismo do “anjo” que cai bem como no contraste com o Portugal atual, sendo que, como refere Óscar Lopes a obra faz uma sátira da vida política e parlamentar do constitucionalismo, e exalta o arcaico provinciano de Angra de Freimas que é corrompido pela alta burguesia de Lisboa A segunda metade do século XIX é marcada pelas grandes mudanças ocorridas ao nível das infraestruturas e meios de comunicações. Este período é marcado pelas políticas fontistas de Fontes Pereira de Melo que farão o país progredir gradualmente apesar de ainda atrasado perante os outros países.Tratando-se de uma obra recorrentemente discursiva, o narrador irá narrar os conflitos entre Calisto Elói e Libório Meireles (portuense
O fidalgo Calisto Elói, por brilhar entre ignorantes, é encaminhado para Lisboa com o objectivo de representar os seus eleitores. Para trás deixa a propriedade rural, a esposa trabalhadora e, pouco a pouco, todos os seus escrúpulos...
Chegado à corrupta capital, o contraste é gritante: Calisto está fora de moda...em vários sentidos! Sem querer reconhecer que o mundo evoluiu, insiste para que se façam aplicar leis e regras desactualizadas; escandaliza-se com pouco, critica tudo e está determinado em levar à letra os seus clássicos de literatura, apesar destes darem provas, uma e outra vez, de não lhe trazer nada de bom. Muito púdico, Calisto confronta os seus oponentes políticos com inteligência e distinção, enchendo-se de moralidades para lhes tecer severas críticas. Contudo, na sua ânsia por converter...Calisto acaba convertido.
As traições sucedem-se umas às outras e em vários níveis (ideais, valores, crenças, os estimados clássicos, os amigos e até a esposa) quando o coração de Calisto se sobrepõe à razão que sempre o orientou. Poderíamos afirmar que, com isto, o pobre Calisto se trai a si mesmo mas temos que reconhecer que, embora agindo injusta e cegamente, Calisto apenas queria amar e ser amado. Lamentavelmente, esta busca pela felicidade tornou-o tão velhaco e escorregadio como os seus anteriores alvos de censura.
Nesta crítica à sociedade e muito provavelmente em justificativa às suas próprias decisões e comportamentos, Camilo Castelo Branco serviu-se de um vocabulário rico, carregado de humor e injectado de sarcasmo que, só por si, já vale a leitura. A história não abunda em originalidade mas a competência do autor dá tamanha graça e vida às suas personagens que o rumo da narrativa acaba por se tornar secundário.
Uma novela já mais ao estilo de Eça, mas ainda assim com uma linguagem muito floreada, por vezes, pouco acessível. Apesar disso, é possível esboçar uns quantos sorrisos enquanto a lemos. É interessante o enredo: um fidalgo transmontano, cultíssimo de letras clássicas, mas pouco dado às modernices do século XIX; vai em busca de carreira política para Lisboa, munido de ideias do antigamente, mas esbarra com os luxos da cidade, com as suas tentações, com a antítese de si mesmo. O resto decorre dessa mesma antítese, da qual se enamora perdidamente. Poder-se-ia esperar um reforço moralizante em A Queda dum Anjo, mas a história desenrola-se como se apartada da estrutura habitual de uma narrativa oitocentista. Daí, chegar-se mais a Eça do que ao Camilo romântico que conhecemos.
Em A Queda dum Anjo, Camilo Castelo Branco apresenta ao leitor um romance intenso e ilícito entre o herói do conto, Calisto Elói de SIlos, e D. Ifigénia.
Todo o livro de Camilo Castelo Branco é uma delícia literária da língua portuguesa, não apenas pelo rico vocabulário do escritor, mas também pela originalidade com que o mesmo desenvolve a história, optando pelo relato na primeira pessoa, o que provoca a sensação de não estarmos só a ler a história mas a ouvi-la, a senti-la.
Pecando apenas pelo simples enredo do conto - que é, na sua maioria, repetitivo -, a história apresenta-nos um herói genuíno: Calisto Elói, um homem extremamente culto, erudito, convicto, lutador, apaixonado e sobretudo ingénuo, que acredita que o segredo para a progressão é voltar ao passado. Agarrado aos seus ideais da literatura clássica, Calisto é a personagem que Camilo desenvolve com mais sucesso, atribuíndo ao herói uma personalidade verdadeiramente astuta e invejável.
O próprio autor refere-se a Calisto como o anjo, e a sua mudança trágica a meio do conto é, conforme o título indica, a sua queda: o homem outrora apaixonado pela província passa a amar Lisboa; o seu ar provinciano transforma-se num ar urbano; os seus ideais políticos mudam; o homem que todos admiravam por ser diferente, torna-se igual a todos os demais; o anjo cai.
No entanto, este minucioso retrato de Calisto reverte numa pobre caracterização das restantes personagens do conto, que sofrem de pouca profundidade a nível de personalidade e acabam por levar o leitor a apaixonar-se apenas por Calisto. Não obstante, o romance entre a personagem principal e Ifigénia é de um valor literário elevado, e todo o percurso de Calisto é digno de uma leitura atenta da obra, que apresenta, entre outros, os seguintes temas (a meu ver e do meu ponto de vista de interpretação): - crítica ao papel da religião na mentalidade da sociedade (na medida em que impede a livre proliferação da paixão e do romance ao existir matrimónios por interesse); - crítica à aristocracia e ao modo como tenta reunir vantagens e benefícios para si, sem apurar as consequências das suas decisões na vida dos mais pobres; - crítica ao papel da mulher (em diversos aspectos, entre os quais a repetida traição, a ingenuidade do seu papel matrimonial, a sua exagerada actuação como companheira); - crítica ao matrimónio por interesse, que não permite transparecer ideais de paixão; - crítica ao progresso de mentalidades em Lisboa e, eventualmente, em Portugal, bem como à sua sociedade em geral.
Em suma, A Queda dum Anjo é um romance que tenta evidenciar o papel do amor na vida de todos os homens, e como este sentimento é importante para atingir a felicidade e o máximo bem-estar. É verdade que Calisto começa como um herói e termina como um homem banal por causa do amor, mas não seria a ausência destes sentimentos o motivo pelo qual Calisto era tão bem visto na sua terra natal? De notar também como o amor permitiu a integração de Calisto na sociedade actual e, mais que tudo, permitiu descobrir os prazeres de uma relação.
Para terminar, transcrevo duas passagens do livro que mais me agradaram, avisando, porém, para eventuais revelações de enredo:
"Quem o tivesse conhecido, um mês antes, Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda devia chorá-lo, quando o viu entrar num café e pedir água combater os vómitos provocados pelo charuto! Irá perder-se aquela alma tão portuguesa, aquele exemplar marido, aquele sacerdote e glorificador dos clássicos lusitanos?
O amor abrirá no pavimento da Câmara um alçapão, onde se afunda aquele brilhante, desluzido, mas prometedor de reguldente lume?
Di meliora piis!
Ó Lisboa!...
Ó mulheres!..."
"Que te valeram as máximas de boa vida colhidas a centenares nos teus clássicos, e enceladas nessa alma, refractária à ternura de tanta moça escarlate e sucada, que, lá em Caçarelhos, se enfeitava para achar graça em teus olhos?
Cairias tu nas piores desta princesa dos mares, desta Lisboa que filtra os nervos dos seus habitantes e fogo que lhe estua nas entranhas?
Esta foi minha primeira leitura de Camilo Castelo Branco. Fiquei bastante surpreso. O livro conta a história de Calisto Elói, um fidalgo de Miranda do Douro, homem dos livros, conservador, casado com sua prima Teodora. Calisto rege a sua vida pelos costumes antigos, geralmente citando grandes clássicos da literatura. Um belo dia, a cidade decide que Calisto seria um bom representante da região no parlamento em Lisboa e o escolhe como deputado.
O livro descreve de forma muito hilariante o choque cultural na chegada de Calisto a Lisboa. O caso da água da fonte de El-Rei tão citada na literatura é muito engraçado. O livro traz uma crítica a classe política da época por meio dos seus discursos vazios de conteúdo e repletos de floreados e de certa forma também mostra a enorme distância entre a capital e o interior do país.
Calisto acaba se acostumando com a vida em Lisboa e cai nas tentações da cidade grande. Ele renega os seus costumes de Miranda do Douro e muda até a sua visão política.
Não deixa de ser um tema atual. O idealista que chega a cidade grande para mudar o mundo e acaba engolido pelo “sistema”. O livro vale 3,5 estrelas e eu arredondo para 4 por causa do bom humor na crítica que arranca umas risadas. Recomendo a quem for ler que tenha um dicionário ao lado.
Dir-me-ão que andei distraído, mas sempre tomei Eça e Camilo, neste torneio Sporting/Benfica em que alguns de nós se divertem a comparar vultos coêtaneos (Shakespear/Cervantes, Dostoievsky/Tolstoi, Saramago/Antunes, etc/etc) respectivamente como mestre da ironia e senhor da destreza vocabular romântica apontada a Minho e Alto Douro. Tenho porém descoberto que o Camilo que me interessa não é o resignado comercial puxando pela virtude de suas leitoras e freguesas, a custo de paixões incestuosas e remoques de piedade (esse Amor de Perdição com que por décadas temos perdido leitores por esses liceus afora), mas precisamente o descriminador de índoles mistas, disposto a desenfeixar a natureza humana com tanto de lâmina como de natural ternura pela falência comum. É claro que há o português opulento, tirado de tantos sítios, e o amor aos clássicos antigos e portugueses, que não é só, percebe-se bem, de Calisto Elói, mas de Camilo ele mesmo: isso esperava-se. Talvez nem tanto o relevo que fica deste anti-herói semi-quixotesco (fantasmagórico de vestes, de hábitos e de retórica) , cuja queda nos não leva para longe dele mas para mais perto dos irmãos humanos.
Depois que a gente espana um pouco a poeira clássica, a gente percebe que Machado é mesmo cria do Camilo. Tá tudo ali em potência: o mesmo narrador, o mesmo olho para a falsidade diabólica dos burocratas do Reino e a mesma ironia. O que separa os dois é que, diferente de Machado que fica sempre em cima do muro, Camilo é moralista, de certa forma como é o seu próprio personagem, Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda.
Dar 2 estrelas a um clássico da literatura portuguesa fez-me sentir a necessidade de trazer já a opinião completa.
Eu já tinha lido “Amor de perdição” de Camilo Castelo Branco, livro que na altura gostei de ler. Não foi maravilhoso pois senti que faltava alguma contextualização do romance entre as personagens, mas gostei da escrita e decidi ler mais obras do autor.
Neste caso temos Calisto Eloi, fidalgo de uma zona rural de Portugal, que é eleito como deputado e se muda para Lisboa para exercer as suas funções. Gostei tanto da crítica social por trás, algumas coisas ainda bastante actuais. Chega este fidalgo a Lisboa e tenta mudar a sociedade lisboeta, até que se converte, perde os seus valores e adquire os do meio em que está. Em termos de história gostei muito mais do que o “Amor de perdição”. A história é completa, a personagem evolui muito (não no bom sentido, mas vemos uma mudança e gosto sempre quando isso acontece e me leva a pensar o que faria em dada situação).
No entanto, a escrita, ai a escrita. Para mim a escrita será, quase sempre, o que determina a minha vontade de ler um livro. As coisas têm de ser analisadas à data em que foram produzidas, no caso, nunca podemos ler Camilo Castelo Branco esperando encontrar uma realidade e uma escrita iguais às actuais. Há algumas passagens, neste livro, sobre o papel da mulher na sociedade que não retratam a actualidade. Mas não me incomodaram, era a realidade da altura e não podemos negar a História. Dito isto, nunca esperei encontrar uma escrita igual à actual, mas também já tinha lido uma obra do autor, por isso achava que sabia ao que ia. Na realidade, até costumo preferir clássicos pelo tipo de escrita, mais trabalhado. A escrita actual, normalmente, não chama tanto por mim. Por isso acabou por ser um espanto ter de me obrigar a ler esta obra. Não há um aspecto único que possa apontar como negativo, mas foi uma leitura que se arrastou bastante, o que resultou nesta classificação.
Já dizia (sabiamente, se me permitem acrescentar) o velho ditado: No melhor pano cai a nódoa.
Perdida estive eu sobre a quem dito pano pertenceria… e, se porventura, tal enfada mancha daria por terminado ali o estrago ou se arrastaria também consigo o legítimo dono do outrora imaculado pano!
Deliciosamente repleta de ironias, Camilo Castelo Branco oferece-nos uma representação brilhante, viva, apaixonada da sociedade portuguesa. A acreditar na dedicatória, a obra data de 1865… porém, as semelhanças com a vergonha que ainda hoje se testemunha por parte daqueles que dizem dedicar a carreira (e a vida, crendo nos mais dramáticos) ao bom governo da Pátria, são flagrantes.
Aquilo que eu chamo de prodígio, o autor denomina “demónio da verdade”: Estes são os ossos malditos do ofício; esta é a condenação dos infelizes artífices que edificam para a posteridade e exploram nas cavernas do coração humano os cimentos da sua obra.
Ora aqui está um pequeno grande livro, completamente merecedor de quatro estrelas. O que é que há de particularmente interessante nesta obra? Para mim três aspetos. O primeiro – elemento estrutural de toda a ação – a fantástica personagem principal: o nobilíssimo Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda, morgado da Agra de Freimas, o protótipo de “fidalgo-provinciano”. Em segundo lugar, o posicionamento paradigmático desta obra no seu contexto histórico. Sendo, neste âmbito, particularmente eloquente a acompanhar-nos por deambulações entre a ascensão e a queda do “mérito” dos “clássicos”, mostrando-nos que, gradual e paulatinamente, estes vão sendo preteridos face ao que é, na verdade, emocional e que concerne ao livre e prazeroso arbítrio individual. Finalmente, destaco como terceiro elemento, a componente satírica. Camilo Castelo Branco terá sido – dizem – muito eficaz na descrição da sociedade portuguesa da altura. O que terá um interesse adicional será notar que hoje, passados mais de 150 anos, a narrativa de base continuará a mesma. Neste sentido, na obra, como hoje aos olhos de muitos, coexistem duas realidades opostas: a visão de um “interior” frugal, abandonado e desconsiderado que, por oposição, suportará o estilo de vida dos desapegados da “realidade real” que povoam a iluminada e faustosa urbe. Numa palavra: intemporal.
No que toca à escrita do autor não há nada a apontar, mas quando se fala das personagens e do enredo já é outra história.
O protagonista e suposto 'anjo', Calisto Eloi é uma figura anedótica e puritana, com a mania que sabe muito e é um senhor distinto, mas na verdade é ridicularizado por grande parte das pessoas que o rodeiam.
Já a sua mulher, D. Teodora, é simplesmente cega e igualmente ridícula, por confiar demais nas pessoas e deixar-se enredar em coisas que são 'areia de mais para a sua camioneta', como diz a expressão.
Reli esta novela com a sensação de novidade. Estou cada vez mais fã da escrita de Camilo. Continuo a achar que esta história de ascensão e queda podia ter sido escrita ontem.
Agradável surpresa, de fácil leitura. Camilo mostra-nos a ambivalência de duas culturas no mesmo país. O Portugal do rural , do antigo, em contraponto com o Portugal urbano , de Lisboa , do parlamentar. Mostra-nos como se chega a deputado e como essa nova vida faz alterar a forma de viver e ver os novos tempos, passando do partido Legitimista (conservador) a liberal. Pontua o humor com a sagaz visão de um País em mudança.
A escrita de Camilo Castelo Branco mantem, mais uma vez, relação direta com quem lê. Através de referência direta ao leitor e ao narrador como próprio autor. É cómico e com uma narrativa simples, o que faz a leitura antiga ser mais fácil.
Um livro excelente, com um grande sentido de humor que nos agarra! A sua linguagem, mesmo nos floreados próprios da época e da sátira, traça diante de nós um retrato vivo do Portugal social e político do século XIX.
É certo que deve ser lido como uma sátira, uma crítica humorística apontada em várias direcções. Quase ninguém escapa à pena de Camilo Castelo Branco, que de certo modo permite identificar cada personagem como "personagem-tipo" de alguma classe social ou linha de pensamento. Mas em nada isto diminui cada personagem na sua individualidade, brilhantemente construída de modo a ser única.
Ao terminar a leitura, percebi que o romance, sem cair em lugares-comuns, trata as questões de sempre da vida humana: virtude e vício, honra e dever, amor, queda e redenção. Sem eufemismos (o que aprecio); o próprio narrador, apesar de não disfarçar o que pensa, não faz juízos de valor. Assim, fico convencido de que haverá em todos nós um pequeno Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda, nem que seja naquilo que nos é semelhante pela comum condição humana. Fica sempre bem recordar o que o Apóstolo Paulo recordava e que porventura Calisto esqueceu: "qui stat timeat ne cadat".
4* Amor de Perdição 4* Mistérios de Lisboa I 4* Mistérios de Lisboa II 4.5* Mistérios de Lisboa III 3.5* A Queda dum Anjo TR Amor de Salvação TR O Regicida