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Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down

2008, ConScientiae Saúde

Neste estudo, objetivou-se analisar a posição dos pés durante a marcha, com e sem uso de bandagem funcional, de crianças e jovens com e sem síndrome de Down (SD). Desta análise de caráter transversal, participaram 12 indivíduos: 6 portadores da SD e 6 típicos, com idades de 3 a 5 anos e de 10 a 20 anos. Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (Uniara) e das instituições convidadas a participar do estudo, as crianças foram examinadas num único dia. Para avaliar a posição dos pés, usando-se tinta guache em papel pardo, verificaram-se, pelo método de marcação dos pés, comprimento e largura do passo, abdução dos pés e ciclo e cadência da marcha. Foi feita uma bandagem funcional a fim de corrigir a posição dos pés de crianças e jovens com SD. Os resultados foram apresentados de forma descritiva e pelos testes Anova One-Way e Tukey, considerando p≤0,05. Houve diferença significativa no comprimento do passo entre os jovens com SD e típicos, e na largura do passo e abdução dos pés e...

ConScientiae Saúde ISSN: 1677-1028 [email protected] Universidade Nove de Julho Brasil Felício, Sandra Regina; Gava, Nádia Maria; Zanella, Régis Cristian; Pereira, Karina Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down ConScientiae Saúde, vol. 7, núm. 3, 2008, pp. 349-356 Universidade Nove de Julho São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=92911262010 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Recebido em 1º jul. 2008. Aprovado em 2 set. 2008 Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down Gait of children and youngsters with Down syndrome Sandra Regina Felício1; Nádia Maria Gava1; Régis Cristian Zanella1; Karina Pereira2 1 2 Fisioterapeuta pelo Centro Universitário de Araraquara – Uniara-SP. Doutora em Fisioterapia pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar e Docente do Centro Universitário de Araraquara – Uniara-SP. Editorial Endereço para correspondência R. Luiz Batelli, nº 648, Jd. Paulistano, 14810-233 – Araraquara – SP [Brasil] e-mail: [email protected] Local de execução do trabalho: Este trabalho foi realizado para conclusão do curso de Fisioterapia no Centro Universitário de Araraquara – Uniara. Ponto de vista Resumo Artigos Neste estudo, objetivou-se analisar a posição dos pés durante a marcha, com e sem uso de bandagem funcional, de crianças e jovens com e sem síndrome de Down (SD). Desta análise de caráter transversal, participaram 12 indivíduos: 6 portadores da SD e 6 típicos, com idades de 3 a 5 anos e de 10 a 20 anos. Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (Uniara) e das instituições convidadas a participar do estudo, as crianças foram examinadas num único dia. Para avaliar a posição dos pés, usando-se tinta guache em papel pardo, verificaram-se, pelo método de marcação dos pés, comprimento e largura do passo, abdução dos pés e ciclo e cadência da marcha. Foi feita uma bandagem funcional a fim de corrigir a posição dos pés de crianças e jovens com SD. Os resultados foram apresentados de forma descritiva e pelos testes Anova One-Way e Tukey, considerando p≤0,05. Houve diferença significativa no comprimento do passo entre os jovens com SD e típicos, e na largura do passo e abdução dos pés entre as crianças com SD e típicas. A cadência durante a marcha de crianças e jovens com SD foi maior em relação às típicas. A bandagem funcional não apresentou grandes efeitos na correção dos pés das crianças e dos jovens com SD. para os autores Descritores: Marcha; Posição dos pés; Síndrome de Down. Abstract In this study it was aimed to analyze the position of the feet during the gait, using and not using the functional bandage, of children and youngsters with and without Down Syndrome (DS). In this transversal study participated 12 children: 6 with DS and 6 typical, with ages of 3 to 5 years and 10 to 20 years. After the approval of the Research Ethics Committee (Uniara) and the institutions invited to participate in the study, children were evaluated in a single day. In the position of the feet, using gouache on brown paper, considering the step length, it was verified the width of the step, abduction of the feet, the gait cycle and rhythm of the gait. It was made a functional bandage in order to correct the position of the feet of children and youngsters with DS. The results were presented in a descriptive way and by the tests One-Way Anova and Tukey, p ≤0.05. There was a significant difference in the length of the step between youngsters with DS and the typical ones, the width of the step and the abduction of the feet, between children with DS and the typical ones. The cadence during the gait of children and youngsters with DS was greater than the typical ones. The functional bandage showed no major effect on the correction of the feet of children and youngsters with DS. Key words: Down syndrome; Position of the feet; Walk. ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. 349 Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down Introdução A síndrome de Down é decorrente de um erro genético, localizado no par do cromossomo 21. Cada cromossomo possui dois pares de células (46 cromossomos); na síndrome de Down, há três pares de células no 21, totalizando 47 cromossomos em cada célula em desenvolvimento, sendo nomeada de trissomia do 211, 2, 3. Esta síndrome apresenta características específicas como frouxidão ligamentar generalizada1, hipotonia fisiológica, instabilidade atlantoaxial, hipermobilidade articular, pé pronado e evertido, arco plantar desabado, baixa estatura, aumento de peso corporal, retardo mental, comprimento reduzido do fêmur e do úmero, fissuras palpebrais e distância aumentada entre o primeiro e o segundo dedo dos pés 4. A hipotonia, a hipermobilidade articular e a frouxidão ligamentar são as principais causas dos déficits motores das crianças com síndrome de Down 5, 6. Características como abdução e rotação externa de quadril, hiperextensão de joelhos e pés pronados são alterações estruturais que dificultam o ato de andar e de equilibrar-se em dois pés, ocasionando atraso na aquisição da marcha 5, 7. O atraso no desenvolvimento motor é visível, visto que crianças típicas começam a deambular por volta dos 13 meses, podendo variar de 8 a 18 meses, enquanto a criança com síndrome de Down adquire a marcha por volta dos 20 meses, podendo variar de 12 a 45 meses 6. A marcha normal consiste em três fases: a de apoio, em que o corpo se encontra sujeito a uma instabilidade significativa, devido à incidência vertical do centro de gravidade; a de balanço, na qual os dedos tocam o chão, e a cabeça, os braços e o tronco representam 2/3 da massa corporal total e têm de ser direcionados pela musculatura do quadril, a fim de evitar inclinação pélvica, e a de apoio duplo, que é a fase de maior estabilidade, ainda que os pés não estejam completamente apoiados no chão, sendo este o momento em que os braços, a cabeça e o tronco se encontram em máxima velocidade8. 350 O corpo engloba pontos denominados determinantes na marcha, tais como o centro de gravidade do corpo, a inclinação e a rotação pélvica e os movimentos conjuntos entre quadril, joelho e tornozelo. Esses fatores estão diretamente ligados tanto ao aumento quanto à diminuição do comprimento funcional dos membros inferiores, refletindo diretamente na funcionalidade e na qualidade da marcha8. A eficiência dinâmica da marcha é resultado da integração sensorial dos sistemas visual, vestibular, proprioceptivo, tátil e da força muscular adequada, boa mobilidade articular e controle neuromuscular eficiente9. A manutenção do equilíbrio é adquirida segundo um conjunto de mecanismos ligados entre si, tais como elasticidade dos ligamentos, tendões e músculos, que proporcionam estabilização das articulações, dando enfoque a quadril, joelho e tornozelo11. Para analisar a marcha, algumas variáveis devem ser observadas: o tamanho do passo, a direção da posição do pé, a cadência e a velocidade10, 12. Neste estudo, foram analisadas algumas variáveis, entre as quais comprimento do passo, largura, ângulo de abdução do pé, comprimento do ciclo da marcha e cadência, para descrever a posição dos pés durante a marcha de crianças e jovens, com síndrome de Down, aos 3, 4, 5, 10, 15 e 20 anos de idade. Essas variáveis também foram analisadas com a colocação de bandagem funcional nos pés, para corrigir sua pronação e eversão. As seguintes hipóteses foram levantadas para caracterizar a marcha das crianças e dos jovens com síndrome de Down. Hipótese I: o comprimento do passo, o ciclo e a cadência da marcha serão menores nas crianças e nos jovens com Down em relação a crianças e jovens típicos. Hipótese II: a largura do passo e o grau de abdução dos pés serão maiores nas crianças e jovens com Down pela hipotonia, frouxidão ligamentar e hipermobilidade articular. Hipótese III: a colocação da bandagem funcional nos pés das crianças e jovens com síndrome de Down acarretará diminuição na abdução dos pés e na largura dos passos. ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. Felício SR et al Materiais e métodos Participantes para os autores ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. Artigos Foi elaborada uma ficha de avaliação para dados pessoais, anamnese, história da gravidez e exame físico dos participantes. Na análise da posição do pé e da marcha, utilizaram-se tinta guache, papel pardo (60cm x 1m), régua, trena, goniômetro, fita métrica, pincel atômico, esparadrapo, micropore, bexiga (para despertar a Após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa, da Universidade de Araraquara/Uniara (protocolo nº657/07), pela secretária municipal da saúde e pelas coordenadoras das instituições especiais, as crianças e os jovens com Down foram convidados a participar do estudo; as típicas, recrutadas de familiares dos pesquisadores, e os jovens, de uma escola municipal de ensino fundamental. Com o consentimento dos responsáveis por escrito, as crianças e os jovens foram avaliados. Neste estudo de caráter transversal, as crianças e os jovens com e sem síndrome de Down foram avaliados uma única vez, realizando-se filmagens e fotos no percurso de cada um. Para avaliar a posição dos pés, três folhas de papel pardo (60cm de largura por 5m de comprimento) foram colocadas paralelamente e fixadas no chão com fita crepe. Em uma das extremidades do percurso foi colocada uma bexiga na altura aproximada dos olhos da criança ou do jovem, para que tivessem interesse de buscá-la. Essa foi uma forma de estimular a atenção da criança para andar em linha reta em busca da bexiga. Na outra extremidade, colocou-se uma cadeira para a criança ficar sentada, enquanto o pesquisador pintava a face plantar de seus pés com tinta guache. Numa fase posterior, aplicou-se a bandagem funcional utilizando micropore e esparadrapo. A bandagem teve enfoque podálico, para corrigir a eversão e a pronação do pé, melhorando o desabamento do arco plantar e dando formato mais próximo do típico, além de tornozelo valgo e manter a funcionalidade da articulação. A criança típica percorreu três folhas de cinco metros, e a com síndrome de Down, quatro folhas, sendo a última correspondente à correção do pé com bandagem funcional. Entretanto, ape- Ponto de vista Material Procedimentos Editorial Participaram deste estudo doze indivíduos do mesmo sexo, divididos em dois grupos: um de 3 crianças com diagnóstico de síndrome de Down (Trissomia do 21) e 3 crianças típicas, distribuídas igualmente nas idades de 3, 4 e 5 anos, e outro grupo de 6 jovens, sendo 3 com diagnóstico de síndrome de Down (Trissomia do 21) e 3 jovens típicos, distribuídos igualmente nas idades de 10, 15 e 20 anos. Todas as crianças e jovens nasceram a termo, com idade gestacional variando entre 37 e 42 semanas. Todos apresentaram Apgar 8 e 9, no primeiro e quinto minutos, respectivamente. As crianças e jovens com síndrome de Down apresentaram atraso de 12 a 15 meses para a aquisição da marcha em relação às crianças e jovens típicos. A média de peso e altura, no momento da avaliação, para as crianças com síndrome de Down, foi 19,17±1,61 e 102,33±4,04, respectivamente, e, para ºos jovens com síndrome de Down, 48,33kg±10,79 e 145,33cm±11,59; para as crianças típicas, 17,50kg±4,44 e 99,33cm± 6,11, respectivamente, e, para os jovens típicos, 52,67kg±9,45 e 164cm±19,29. A maioria das mães das crianças e jovens com síndrome de Down engravidou entre 35 e 39 anos de idade, tendo apenas uma mãe engravidado aos 20 anos. A maioria das mães de crianças e jovens típicas ficou grávida entre 20 e 25 anos de idade, e apenas duas engravidaram com mais de 30 anos. atenção da criança durante a avaliação), máquina fotográfica (Sony) e máquina fotográfica para realização da filmagem (Kodak EasyShare). 351 Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down Análise Estatística Comparou-se a evolução da posição dos pés, durante a marcha, entre as crianças e os jovens com e sem síndrome de Down. Para verificar a cadência da marcha, foram utilizados a média e o desvio padrão; para analisar a diferença do comprimento do passo, da largura, do ângulo de abdução e do ciclo da marcha, intragrupo e inter-grupos, entre as crianças e os jovens, aplicaram-se os testes Anova One-way e o pos hoc de Tukey, considerando-se o nível de confiança de 5% para todas as análises. 352 Resultados Comprimento do passo A Figura 1 apresenta o comprimento dos passos das crianças e jovens com e sem síndrome de Down. Comprimento do passo (cm) nas uma folha foi analisada e utilizada no estudo para crianças e jovens típicos, enquanto, para aqueles com Down, foram utilizadas duas folhas, sendo uma delas a da bandagem funcional. A primeira folha foi considerada como uma experiência do ambiente para criança, pois, embora pintar os pés e andar na folha sejam ações consideradas interessantes, as crianças poderiam olhar para trás para ver seus passos, o que comprometeria sua marcha, sendo essa folha excluída da análise. Foi utilizada para análise a segunda ou a terceira folha. O procedimento para a escolha previa que a criança ou jovem andasse corretamente, olhando para a bexiga que estava a sua frente, e não para trás. Para aqueles com Down, também foi utilizada a quarta folha a fim de analisar a correção podálica. A avaliação da posição do pé foi mensurada pelas variáveis: comprimento do passo (distância existente entre o contato do calcanhar de um pé até o contato do outro calcanhar, que deve ser equivalente à metade do valor da passada); largura do passo (base de suporte – distância entre a linha média de um pé e a de outro); ângulo de abdução do pé (linha base do calcanhar em relação à linha média do pé); cadência da marcha (número de passos dividido pelo tempo gasto para realizá-los, numa distância de 5m proposta pelo estudo), e ciclo da marcha (apoio do calcanhar de um pé em solo até o apoio do calcanhar do mesmo pé). 80 70 60 50 40 30 20 10 0 CSD CT 3 anos CSD CT 4 anos CSD CT 5 anos JSD JT 10 anos JSD JT 15 anos JSD JT 20 anos Figura 1: Comprimento do passo para crianças e jovens com e sem síndrome de Down Legenda: SD: Síndrome de Down; CT: criança típica, e JP: jovem típico. Pôde-se constatar, na análise intragrupo, diferença significativa entre o comprimento do passo das crianças típicas de 3 (31,3cm±5,2), 4 (32,9cm±3,2) e 5 anos (41,2cm±4,8). A jovem típica de 10 anos (50,9cm±4,0) apresentou diferença no comprimento do passo em relação às típicas de 15 (62,54cm±6,2) e de 20 anos (63,5cm±1,9). Não houve diferença no comprimento do passo entre as crianças e jovens com síndrome de Down. Na análise inter-grupos, houve diferença significativa entre a de 4 anos (30,7cm±6,6) com síndrome de Down e a típica de 5 anos (41,2cm± 4,8). As jovens típicas e as com síndrome de Down aos 10 (30,2cm±3,6), 15 (52,8cm±7,2) e 20 anos (52,4cm±4,2) apresentaram diferença no comprimento do passo. Largura do passo A Figura 2 apresenta a largura do passo das crianças e jovens com e sem síndrome de Down. Na análise intragrupo, houve diferença significativa apenas entre as jovens com Down ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. Felício SR et al Comprimento do ciclo da marcha 15 10 5 0 CSD CT 3 anos CSD CT 4 anos CSD CT 5 anos JSD JT 10 anos JSD JT 15 anos JSD JT 20 anos Figura 2: Largura do passo para crianças e jovens com e sem síndrome de Down 15 10 5 CSD CT 5 anos JSD JT 10 anos JSD JT 15 anos JSD JT 20 anos Figura 3: Abdução do pé em crianças e jovens com e sem síndrome de Down Legenda: SD: Síndrome de Down; CT: criança típica, e JP: jovem típico. Na análise inter-grupos, a criança típica de 4 anos (0,71º±1,2) apresentou diferença significativa no ângulo de abdução dos pés comparado às crianças com síndrome de Down aos 3 (13,6º±6,4), 4 (7,7 º±5,1) e 5 anos (13,6º±10,1). ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. 30 0 CSD CT 3 anos CSD CT 4 anos CSD CT 5 anos JSD JT 10 anos JSD JT 15 anos JSD JT 20 anos Figura 4: Comprimento do ciclo de marcha das crianças e jovens com e sem Síndrome de Down Cadência da marcha A Figura 5 apresenta a freqüência de passos por segundo, ou seja, a cadência da marcha das crianças e jovens com e sem síndrome de Down. 3,0 2,5 para os autores Abdução do pé (grau) 20 CSD CT 4 anos 60 Artigos A Figura 3 apresenta o ângulo de abdução do pé das crianças e jovens com e sem síndrome de Down. Na análise intragrupo, houve diferença significativa no ângulo de abdução do pé entre as crianças típicas de 3 (12,7º±5,7) e 4 anos (0,71º±1,2), e entre as de 4 e 5 anos (10,8º±5,3). CSD CT 3 anos 90 Legenda: SD: Síndrome de Down; CT: criança típica, e JP: jovem típico. Ângulo de abdução do pé 0 120 Ponto de vista entre 10 e 20 anos (16,4cm±5,7). Na análise intergrupos, as crianças típicas de 3 (10,7cm±2,3), 4 (8,9cm±2,6) e 5 anos (13,4cm±5,4) apresentaram diferença significativa na largura do passo em relação às crianças Down de 3 (16,8cm±3,1), 4 (18,5cm±4,7) e 5 anos (17,5cm±4,2). 150 Editorial Legenda: SD: Síndrome de Down; CT: criança típica, e JP: jovem típico. Comprimento do ciclo da marcha (cm) A Figura 4 apresenta o comprimento do ciclo da marcha de crianças e jovens com e sem síndrome de Down. No ciclo, não foi constatada diferença estatisticamente significativa na análise tanto intragrupo quanto inter-grupos. 20 Cadência da marcha (passos/seg) Largura do passo (cm) 25 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 CSD CT 3 anos CSD CT 4 anos CSD CT 5 anos JSD JT 10 anos JSD JT 15 anos JSD JT 20 anos Figura 5: Cadência na marcha de crianças e jovens com e sem síndrome de Down Legenda: SD: Síndrome de Down; CT: criança típica, e JP: jovem típico. Pode-se observar que a cadência na marcha das crianças e jovens com síndrome de Down foi maior nas idades de 3 (2 passos/s±4,2), 5 (2,6 passos/s±5,6), 15 (2 passos/s±3,5) e 20 anos 353 Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down (1,5 passos/s±2,8), comparada com as crianças e jovens típicos da mesma idade (1,6 passos/s±4,2; 0,42 passos/s±2,1; 1,6 passos/s±2,83, e 1 passo/ s±1,4, respectivamente). Análise do uso da bandagem funcional nas crianças e jovens com síndrome de Down Na análise do comprimento do passo, foi constatada diferença significativa entre a jovem de 20 anos, com e sem bandagem funcional (36,2cm±3,7, 52,4cm±4,2, respectivamente). Na análise da largura do passo, foi constatada diferença significativa entre as crianças com e sem bandagem funcional (p=0,01), de 5 anos (17,5cm±4,2; 23,9cm±2,0, respectivamente), e entre os jovens com e sem bandagem funcional (p=0,001), aos 20 anos (16,4cm±5,7, 27,9cm±4,0, respectivamente). Na análise do ângulo de abdução dos pés e no ciclo da marcha, não foi verificada diferença significativa entre crianças e jovens com e sem bandagem funcional; na cadência da marcha, pôde-se observar que as crianças e jovens com bandagem funcional, de 3 (2,3 passos/s±0,24), 5 (2,44 passos/s±0,52), 10 (1,33 passos/s±0,24) e 20 anos (1,65 passos/s±0,32) apresentaram maior número de passos por segundo (cadência), comparado com as crianças e os jovens de mesma idade, sem bandagem funcional (1,67 passos/ s±0,06; 1,02 passos/s±0,73; 1,77 passos/s±0,25 e 0,88 passos/s±0,13, respectivamente). Discussão Cerca de 50% das crianças com síndrome de Down apresentam alterações na marcha, e, neste estudo, pode-se verificar que nem sempre essas alterações são significantes quando comparadas às crianças típicas da mesma idade. Na análise inter-grupos, constata-se que o comprimento do passo das crianças com síndrome de Down é significativamente maior apenas na criança de 3 anos, apresentando um decréscimo 354 ao longo da idade com relação à criança e aos jovem típicos. A alteração entre comprimento do passo inter-grupos é decorrente da falta de estabilidade das crianças com síndrome de Down, pois a fase de apoio bipodálico e a de apoio simples são maiores do que nas crianças típicas, resultado da redução de estabilidade10. Na análise intragrupo, foi possível encontrar diferença significativa entre as crianças típicas, com o passar da idade, provavelmente relacionada com a maturação do sistema ósseo. O comprimento do passo obtido pelas crianças e jovens com e sem síndrome de Down foi classificado como normal (entre 37 e 50cm), segundo os parâmetros adotados por Hoppenfeld e Murthy8. Os jovens típicos e com síndrome de Down, de 15 e 20 anos, ultrapassaram a pontuação máxima, ou seja, acima de 50cm, no comprimento do passo, segundo a escala de Hoppenfeld e Murthy8. É importante ressaltar que o comprimento no passo dos jovens típicos foi maior em relação ao dos jovens com síndrome de Down, dada a estatura, o que permite sugerir que essa diferença ocorreu por ser maior o comprimento do fêmur nas crianças típicas (a estatura é maior em relação às portadoras de Down). Entretanto, esse dado precisa ser confirmado em estudos futuros. Com relação à largura do passo, encontrou-se, na análise intragrupo, diferença significativa entre as jovens com síndrome de Down de 10 e 20 anos. Já na análise inter-grupos, houve diferença significativa entre as crianças de 3, 4 e 5 anos, com e sem síndrome de Down. A largura do passo das crianças com síndrome de Down prevalece provavelmente em razão da abdução do pé e da rotação externa de quadril, acompanhada de hipotonia fisiológica muscular, característica dessa síndrome. Esses resultados confirmam a terceira hipótese deste estudo: as crianças com síndrome de Down apresentam maior base de suporte. Os valores encontrados na largura do passo superaram, em sua totalidade, os valores adotados como normais (7,5 a 10cm) por Hoppenfeld e Murthy8. Notou-se também que as crianças tí- ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. Felício SR et al Ponto de vista Artigos para os autores ConScientiae Saúde, 2008;7(3):349-356. cultam os processos de aquisição e controle dos movimentos, porém não impedem a aquisição e a realização de suas funções13. Em relação à cadência da marcha, os resultados encontrados permitiram aceitar a segunda hipótese, pois as crianças, com Down, de 3 e 5 anos e os jovens de 15 e 20 anos apresentaram maior número de passos por segundo, ou seja, gastaram menos tempo para realizar a fase de apoio, e isso provavelmente se deve à falta de apoio de calcanhar quando comparadas com as crianças típicas, o que pode estar relacionado também à alteração cerebelar característica dessa síndrome. Estudos de Highstein e Thatch14 mostram que pessoas com alterações cerebelares tornam-se mais lentas e simplificam seus movimentos como estratégia para compensar a falta de dados sensoriais de alta qualidade. Durante o estudo, observou-se que as crianças e jovens com Down apresentavam maior apoio plantar inicial na primeira fase da marcha do que apoio de calcâneo, ou seja, passam a fase de apoio de calcâneo e seguem diretamente para a de apoio planar do pé, com base de suporte alargada e pouca elevação do calcanhar na fase de balanço, o que pode ser explicado pela presença de hipotonia muscular, frouxidão ligamentar e instabilidade articular10. A bandagem funcional foi utilizada neste estudo para corrigir a eversão podálica das crianças e jovens com síndrome de Down, auxiliando na hipotonia muscular e na frouxidão ligamentar, resultando em maior estabilidade postural e melhora no desempenho funcional. Após aplicação da bandagem funcional, os dados obtidos não foram significativos. Verificouse que apenas as crianças Down de 5 anos e o jovem de 20 apresentaram melhora significativa nas variáveis comprimento e largura do passo, com uso da bandagem funcional, negando a terceira hipótese de que a bandagem poderia corrigir a abdução dos pés. Contudo, é importante ressaltar que, neste estudo, foi analisada apenas uma criança e um jovem de cada idade, não se podendo generalizar os indivíduos. Com relação à cadência da marcha, foi possível verificar Editorial picas ficaram mais próximas da média adotada como parâmetro de classificação, embora os jovens típicos de 20 anos estejam cerca de 30cm acima desta. Na análise inter-grupos, houve diferenças significativas entre a criança típica de 4 anos e as crianças com síndrome de Down de 3, 4 e 5 anos, tendo as crianças Down apresentado maior angulação com relação à típica, confirmando a terceira hipótese do estudo. Essa ocorrência pode ser explicada segundo as observações colhidas no momento da passada, em que a criança com síndrome de Down realiza abdução de coxa, enfatizando a rotação externa de quadril e uma ligeira diminuição na dorsiflexão de tornozelo, durante a fase de apoio de calcâneo e balanço10. Segundo Hoppenfeld e Murthy8, os níveis de normalidade variam do 6º ao 7º de abdução do pé. Isso permitiu verificar que apenas a criança de 4 anos, com síndrome de Down, está dentro dos níveis de normalidade, e a de 3 e a de 5 anos encontram-se acima desses níveis, refletindo que, embora a abdução do pé esteja presente, não ocorre em todas as faixas etárias. No ciclo da marcha, houve evolução quanto ao tamanho dele com o passar do tempo, nas crianças e jovens com e sem síndrome de Down, além destas não apresentarem valores diferentes entre si. Esses dados negam a primeira hipótese do estudo de que o ciclo da marcha das crianças e jovens com Down seria inferior ao das típicas. Estas não atingiram os parâmetros de classificação proposto por Hoppenfeld e Murthy8 (de 75cm a 100cm), sendo que as com síndrome de Down foram as que mais se aproximaram de tais valores. Os típicos não apresentaram diferença significativa entre si nem em relação aos com síndrome de Down. Isso mostra que, embora haja diferença entre as variáveis obtidas, elas não são significativas a ponto de prejudicar a criança e o jovem com Down, cuja trajetória do desenvolvimento da motricidade pode ser vista como paralela às crianças típicas, mas de forma mais lenta. Esse fato está associado à hipotonia global, fraqueza muscular e hipermobilidade articular, que difi- 355 Marcha de crianças e jovens com síndrome de Down que as crianças de 3 e 5 anos e jovens de 10 e 20 realizaram maior número de passos por segundo, após aplicação da bandagem. Isso provavelmente ocorreu porque foi reduzida a base de suporte da criança com Down, exigindo menor apoio podálico para realização dos passos, tornando-os mais ágeis. Segundo Orner et al15, a bandagem e a órtese supramaleolar16 proporcionam um alinhamento biomecânico, permitindo que os músculos trabalhem com mais interação, deixando mais balanceada a relação comprimento-tensão dos músculos. Hylton17 enfatiza que as órteses flexíveis são melhores, pois ajudam na propriocepção e na maleabilidade da articulação do tornozelo, resultando num melhor controle do movimento. Assim, pode-se inferir que, quanto mais cedo for utilizada a órtese ou bandagem funcional na criança com síndrome de Down, menor será o desabamento do arco plantar, da rotação externa e da abdução do pé, o que, posteriormente, possibilitará um melhor ajuste postural. O protocolo de avaliação utilizado neste estudo pode ser indicado para uso nas clínicas de fisioterapia, principalmente por ser um método de baixo custo e fácil manuseio. Embora o uso da bandagem funcional não ressalte resultados marcantes entre as crianças e jovens com síndrome de Down nas diferentes idades, ela pode ser utilizada para proporcionar correção da posição dos pés e oferecer mais estabilidade postural, a fim de amenizar as alterações encontradas. 4 de portadores de Síndrome de Down procedentes da região urbana da cidade de São Paulo. Tese de Doutorado; 2001. 5 Environmental and Task Constraints. 6 hiperfrouxidão ligamentar na Síndrome de Dowm. 7 Human Development. 2004;79:119-130. 8 3 356 Hoppenfeld S, Murthy VL. Tratamento e Reabilitação de fraturas. 1ª ed. Manole: São Paulo; 2001. 9 Westcoot SL, Goulet C. Sistema Neuromuscular: estruturas, funções, diagnóstico e avaliação. Fisioterapia Pediátrica: atendendo às necessidades das crianças. Effgen, SK. 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