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Eleições no Brasil: um voto pela democracia - 29/09/2022 - Latinoamérica21 - Folha
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Eleições no Brasil: um voto pela democracia
Diante de autoritarismo, violência e instabilidade, a democracia e a reconstrução do
país devem ser prioridade
29.set.2022 às 9h50
María Villarreal
Cientista política. Professora de Relações Internacionais da UFRRJ e do programa de PósGraduação em Ciência Política da UNIRIO. Doutora em Ciência Política pela Universidade
Complutense de Madri
No dia 2 de outubro, uma eleição memorável será realizada na história do
Brasil. Embora todas as disputas sejam importantes, as eleições deste ano
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/eleicoes/2022/) talvez sejam as mais relevantes porque estão
ocorrendo no meio da maior crise da democracia brasileira
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/08/carta-pela-democracia-atinge-1-milhao-de-assinaturas-em-dia-de-ato.shtml)
desde a transição e em um clima de alta polarização e violência política.
As últimas pesquisas mostram Luiz Inácio Lula da Silva como o favorito
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/09/datafolha-lula-vai-a-47-abre-14-pontos-sobre-bolsonaro-e-amplia-chance-devencer-no-1o-turno.shtml)
com 47% dos votos. Jair Messias Bolsonaro está em segundo
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lugar com 33%, enquanto os candidatos Ciro Gomes e Simone Tebet têm menos
de 10% de apoio e estão tecnicamente empatados. As eleições serão, portanto,
uma luta entre Lula e Bolsonaro, mas no momento atual elas representam
muito mais do que isso: refletem duas visões opostas de país.
O ex-presidente Lula, líder nas pesquisas, e o atual presidente Jair Bolsonaro, 2º nas intenções de
voto - Miguel Schincariol/AFP e Zanone Fraissat/Folhapress
CONSTRUINDO UMA FRENTE AMPLA PRÓ-DEMOCRACIA
A campanha eleitoral começou oficialmente em agosto e tem estado em pleno
andamento nos debates televisivos, nas redes sociais e em outras esferas.
Entretanto, o clima de polarização e a exacerbação da violência política
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/07/casos-de-violencia-politica-disparam-no-pais-em-2022-mostra-novolevantamento.shtml),
que levou a assassinatos e ferimentos, bem como numerosos
ataques a jornalistas, funcionários públicos e pesquisadores, produziu uma
atmosfera de medo em que as pessoas estão se autocensurando ou com receio
de expressar suas preferências. Segundo o Datafolha, quase sete em cada dez
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brasileiros dizem agora ter medo de serem atacados fisicamente por causa de
suas escolhas políticas (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/09/datafolha-maioria-tem-medo-de-agressaopor-motivos-politicos.shtml).
Seus medos são mais do que bem fundamentados. Embora a violência política
não seja um fenômeno novo no Brasil, e casos como o assassinato da vereadora
Marielle Franco em 2018 deram a volta ao mundo e se tornaram emblemáticos
da luta contra a violência política de gênero e racial, desde a chegada de Jair
Bolsonaro à presidência o fenômeno assumiu níveis sem precedentes. Segundo
o Observatório de Violência Política e Eleitoral da Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro (OVPE-Unirio), somente no primeiro semestre de
2022, este fenômeno já causou mais de quarenta mortes no país.
Além disso, ao contrário do que acontecia no passado, quando a violência se
limitava aos políticos e setores específicos, hoje é uma tendência generalizada
na qual os cidadãos comuns desempenham um papel central. Esta é uma
consequência do crescente clima de ódio que se instalou no país, apoiado e
legitimado por um presidente autoritário que elogia os torturadores da
ditadura militar, mas também por uma sociedade que tem uma quantidade de
armas sem precedentes à sua disposição. Quase meio milhão de revólveres e
pistolas foram importados desde 2019, um número recorde em comparação
com as duas últimas décadas.
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O clima de ódio também levou a ataques a jornalistas e ativistas
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/03/ataques-a-imprensa-avancam-no-brasil-aponta-relatorio-bolsonaro-lidera-emofensas.shtml)de
direitos humanos e ambientais, com ênfase especial às mulheres,
afrodescendentes, indígenas e pessoas LGBTQIA+. Como se isto não fosse
suficiente, segundo o Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o clima de ódio e ameaças aos
críticos do governo também colocou em risco a liberdade acadêmica. Quase
seis em cada dez entrevistados sabem de experiências de pessoas que sofreram
limitações ou interferências indevidas em seus estudos ou aulas.
Mas as agressões não estão restritas às liberdades civis. Os ataques de
Bolsonaro a todas as instituições têm sido uma constante desde que ele tomou
posse. Seu questionamento do sistema eleitoral e dos resultados das eleições,
alegando que as urnas eletrônicas são deficientes e que "se ele não ganhar no
primeiro turno com mais de 60% dos votos é porque algo anormal aconteceu
no Supremo Tribunal Eleitoral", é apenas mais um episódio em uma longa lista
de ameaças golpistas.
A gravidade da crise democrática do país é expressa em ameaças como estas e
na permanente falta de respeito pela independência dos Poderes do Estado.
Neste processo, o presidente tem o apoio de vários setores antidemocráticos e
parte das Forças Armadas, que exigiu que o TSE testasse a integridade das
urnas (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/09/forcas-armadas-farao-apuracao-paralela-em-tempo-real-com-385urnas.shtml) no dia das eleições, apesar de a transparência e a eficiência do sistema
eleitoral brasileiro serem reconhecidas internacionalmente.
Neste contexto de sérias ameaças à democracia brasileira, a aliança entre os exrivais Lula e Alckmin assume um caráter fundacional. Além disso, a defesa da
democracia levou à formação de uma frente ampla que reúne vários expresidentes e representantes de diferentes setores políticos, como Marina Silva
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/09/marina-silva-declara-apoio-a-lula-apos-sequencia-de-magoas-edivergencias.shtml),
Fernando Meirelles e Guilherme Boulos. Empresários, intelectuais
e artistas também assinaram petições e promoveram eventos pró-democracia.
Um dos últimos a aderir é o intelectual e ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/09/petistas-veem-apoio-velado-a-lula-em-nota-de-fhc.shtml), que
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recentemente publicou uma carta pró-democracia. Sem mencionar
explicitamente Lula, o ex-presidente convocou as pessoas a votarem "naqueles
que estão comprometidos com a luta contra a pobreza e a desigualdade,
defendem direitos iguais para todos" e estão comprometidos com o
"fortalecimento das instituições que garantem nossas liberdades".
Diante de uma das crises mais delicadas da história recente, este momento
decisivo exige diálogo, responsabilidade e o compromisso de todos aqueles que
buscam aprofundar a democracia no país. E, dada a importância do Brasil, a
comunidade internacional, além de exercer pressão diplomática e enviar
missões de observação eleitoral, deve fazer ouvir sua voz através de iniciativas
de solidariedade internacional com a democracia brasileira e a realização de
eleições livres.
As eleições estão no coração da democracia, mas como vários setores têm
denunciado, o Brasil corre o risco de que os resultados das eleições de outubro
não sejam respeitados e que um clima inédito de autoritarismo, violência e
instabilidade seja estabelecido. Diante de tal cenário, a democracia e a
reconstrução do país devem ser uma prioridade para todos nós.
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