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Habitação em análise: 40 anos de estudo na Oikos

2021, Oikos: Família e Sociedade em Debate

O tema da habitação tem sido estudado em vários âmbitos da ciência, e, no contexto deste periódico, os estudos vêm registrando diferentes abordagens e perspectivas teórico-metodológicas. Para refletir como esta temática tem sido abordada pelos pesquisadores-autores, ao longo dos últimos 40 anos da Revista Oikos, a pesquisa centrou-se na seleção dos trabalhos que trouxessem o tema desde o ano de 1981, quando o primeiro periódico foi publicado, até os dias atuais. Após a identificação e seleção de 32 trabalhos, os textos foram analisados por meio do software do Iramuteq que identificou três classes principais de temáticas abordadas: “Tipologias Habitacionais, Modos de Morar e Realidades Familiares”; “Condições Habitacionais, Construção e Uso do Espaço” e “Políticas Públicas e Habitação”. Os resultados revelaram as diferentes perspectivas que desvendaram a questão social mais ampla associada ao consumo da habitação, nas condições habitacionais a qual se coloca também no campo de ação d...

PINTO, Neide Maria Almeida; BASTOS FILHO, Reinaldo Antônio. Habitação em análise: 40 anos de estudo na Oikos. Oikos: Família e Sociedade em Debate, v. 32, n. 3, p.1-18, 2021. Doi: https://doi.org/10.31423/oikos.v32i3.13351 www.periodicos.ufv.br/Oikos | ISSN: 2236-8493 [email protected] Recebido: 25/10/2021 Aprovado: 09/11/2021 HABITAÇÃO EM ANÁLISE: 40 ANOS DE ESTUDO NA OIKOS1 HOUSING UNDER ANALYSIS: 40 YEARS OF STUDY AT OIKOS VIVIENDA EN ANÁLISIS: 40 AÑOS DE ESTUDIO EN OIKOS 2 Neide Maria de Almeida Pinto 3 Reinaldo Antônio Bastos Filho Resumo O tema da habitação tem sido estudado em vários âmbitos da ciência, e, no contexto deste periódico, os estudos vêm registrando diferentes abordagens e perspectivas teórico-metodológicas. Para refletir como esta temática tem sido abordada pelos pesquisadores-autores, ao longo dos últimos 40 anos da Revista Oikos, a pesquisa centrouse na seleção dos trabalhos que trouxessem o tema desde o ano de 1981, quando o primeiro periódico foi publicado, até os dias atuais. Após a identificação e seleção de 32 trabalhos, os textos foram analisados por meio do software do Iramuteq que identificou três classes principais de temáticas abordadas: “Tipologias Habitacionais, Modos de Morar e Realidades Familiares”; “Condições Habitacionais, Construção e Uso do Espaço” e “Políticas Públicas e Habitação”. Os resultados revelaram as diferentes perspectivas que desvendaram a questão social mais ampla associada ao consumo da habitação, nas condições habitacionais a qual se coloca também no campo de ação do Estado. Palavras-chave: Habitação. Modos de Morar. Políticas Públicas em Habitação. Abstract The theme of housing has been studied in various areas of science, and, in the context of this journal, studies have been recording different theoretical-methodological approaches and perspectives. To reflect how this theme has been approached by the researchers-authors, over the last 40 years of Revista Oikos, the research focused on the selection of works that brought the theme from 1981, when the first journal was published, until the present day. After identifying and selecting 32 works, the texts were analyzed using the Iramuteq software, which identified three main classes of topics addressed: “Dwelling Typologies, Living Ways and Family Realities”; “Housing Conditions, Construction and Use of Space” and “Public Policies and Housing”. The results revealed the different perspectives that unveiled the broader social issue associated with housing consumption, in housing conditions, which is also part of the State's field of action. Keywords: Housing. Ways of Living. Public Policies in Housing. Resumen El tema de la vivienda ha sido estudiado en diversas áreas de la ciencia y, en el contexto de esta revista, los estudios han ido registrando diferentes enfoques y perspectivas teórico-metodológicas. Para reflejar cómo este tema ha sido abordado por los investigadores-autores, durante los últimos 40 años de Revista Oikos, la investigación se centró en la selección de trabajos que trajeron el tema desde 1981, cuando se publicó la primera revista, hasta la actualidad. Después de identificar y seleccionar 32 obras, los textos fueron analizados utilizando el software Iramuteq, que identificó tres clases principales de temas abordados: “Tipologías de vivienda, modos de 1 Os autores agradecem o apoio financeiro do CNPq todos os financiamentos obtidos para a realização das suas pesquisas, em especial ao apoio recebido no projeto “As casas da cidade chegam ao campo: as transformações dos modos de morar das famílias de agricultores e as reconfigurações dos seus modos de vida". 2 Professora Titular do Departamento de Economia Doméstica da Universidade Federal de Viçosa (UFV). Doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Pós-Doutora em Sociologia no Centro de Investigação em Ciências Sociais da Universidade do Minho em Portugal. Mestre em Economia Doméstica pela Universidade Federal de Viçosa e graduação em Economia Doméstica pela Universidade Federal de Viçosa. E-mail: [email protected]. ORCID: http://orcid.org/0000-0002-8713-5471 3 Professor da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). Doutor em Economia Doméstica e Mestre em Administração pela Universidade Federal de Viçosa e Bacharel em Administração Pública pela Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: [email protected]. ORCID: http://orcid.org/0000-0002-8790-6117 Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 1 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho vida y realidades familiares”; “Condiciones de vivienda, construcción y uso del espacio” y “Políticas públicas y vivienda”. Los resultados revelaron las diferentes perspectivas que develaron la problemática social más amplia asociada al consumo de vivienda, en las condiciones habitacionales, que también forma parte del campo de acción del Estado. Palabras clave: Alojamiento. Formas de vivir. Políticas Públicas en Vivienda. INTRODUÇÃO Ao longo dos seus 40 anos, a Revista Oikos: Família e Sociedade em Debate tem se dedicado à “publicação de trabalhos científicos inéditos desenvolvidos na área de conhecimento das Ciências Humanas e Ciências Sociais Aplicadas que proponham contribuições teóricas, metodológicas e/ou análise empírica que possuam implicações sobre as temáticas Família e Sociedade” (OIKOS, 2021). A perspectiva da revista associa-se aos trabalhos que representem clara contribuição para os debates sobre família e sociedade em suas interfaces com políticas sociais, trabalho, consumo, lazer, moradia, desenvolvimento humano, dentre outros temas correlatos. A partir deste leque de opções temáticas, elegemos a habitação, enquanto categoria de análise neste artigo, buscando refletir como este tema tem sido abordado pelos pesquisadoresautores, ao longo dos últimos 40 anos, na revista. Neste intuito, centrou-se o foco da pesquisa na seleção dos trabalhos que trouxessem como objeto, o tema da habitação, tendo como início da busca, o ano de 1981, quando o primeiro periódico foi publicado, até outubro de 2021. O tema da habitação tem sido estudado em vários âmbitos da ciência, e, no contexto deste periódico, os estudos, vêm registrando diferentes abordagens vindas de diferentes áreas do conhecimento. A perspectiva multidisciplinar da revista tem atraído diferentes grupos de pesquisadores e possibilitado a construção de conhecimento científico relevante para os problemas da habitação e do Brasil urbano. Ao longo desses 40 anos, autores-pesquisadores em diferentes estágios de formação, e vindos de universidades, instituições de pesquisas e programas de pós-graduação, têm tido na revista um espaço efetivo para divulgação de suas pesquisas em diversas áreas do conhecimento, abarcando toda a complexidade que o tema da habitação envolve. Assim, o compartilhamento do resultado dessas pesquisas na Oikos, tem feito da revista um espaço dinâmico e efetivo de produção do conhecimento, a qual tem gerado subsídios importantes para intervenções profissionais. E, no que diz respeito aos conhecimentos na área da habitação, esse conhecimento gerado tem se colocado como um importante aporte para o conhecimento da realidade, tornando possível que essas intervenções se deem de forma mais assertiva. Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 2 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho ASPECTOS METODOLÓGICOS Buscando refletir sobre o tema da habitação na Oikos, a partir da abordagem dada pelos autores nos últimos 40 anos, a pesquisa centrou-se na seleção dos trabalhos que trouxessem o tema desde o ano de 1981, quando o primeiro periódico foi publicado, até os dias atuais. Assim, a busca foi feita inicialmente a partir dos títulos e dos resumos publicados, com o intuito de se identificar trabalhos que trouxessem a temática da habitação como objeto central de análise. Como critério de seleção para a leitura completa dos trabalhos, estabeleceu-se que a temática deveria estar presente no título e/ou no seu resumo. Ressalta-se que entre os anos de 1981 a 2010, a revista ainda não possuía a sua versão digital. Em função disso, a busca foi feita a partir dos links disponibilizados pelo periódico de todo o seu acervo anterior. Assim, a partir do download desses arquivos foi possível acessar a versão digitalizada de cada um dos números anteriormente publicados, à fase digital da revista. Em relação ao período de 2011 a 2021, quando a revista passou a ser disponibilizada na sua versão digital, utilizou-se da ferramenta de busca disponível no próprio periódico, a partir da utilização alternada de termos relacionados à categoria habitação, tais como: “moradia”, “casa”, “assentamentos urbanos”, “assentamentos rurais”. A partir deste trabalho, foram identificados 32 trabalhos associados à temática. Tendo sido observado que, ao longo dos anos de 1980, a revista publicou 08 trabalhos dentro da temática e um menor número ao longo da década de 1990, 03 artigos. O maior número de artigos foi publicado nas duas últimas décadas: 09, entre 2000 a 2009; e, entre 2010 a 2021, 12 artigos. Figura 01 – Número de artigos publicados por décadas na OIKOS. Fonte: elaboração própria com base em dados da pesquisa, 2021. Após essa etapa, os artigos foram submetidos à análise de conteúdo, nos termos de Bardin (2011). Na análise dos dados textuais utilizou-se da técnica CHD (Classificação Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 3 Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Hierarquia Descendente) e AFC (Análise Fatorial de Correspondência) do software Iramuteq 0.7 Alpha 2. Na técnica CHD, os resultados são apresentados na forma de um dendograma, formado pelos clusters da UCE, onde vocabulários semelhantes são apresentados em um cluster e os diferentes em outro. Já na técnica AFC, os resultados que foram obtidos também a partir da CHD, são apresentados na forma de um plano fatorial, representação em um plano cartesiano das diferentes palavras e variáveis associadas a CHD (CAMARGO; JUSTO, 2013). Figura 02 – Procedimentos metodológicos 1ª Etapa Escolha e separação do material: 1981-2010: busca manual pelo tema “habitação” no banco de dados da revista. 2011-2021: “busca no site pelas palavras-chave: “moradia”, “casa”, assentamentos urbanos”, “assentamentos rurais”. 2ª Etapa Análise dos anos de 1981 a 2021: Leitura dos títulos e resumos 3ª Etapa Elaboração e criação do CORPUS (Texto final para análise) e execução no software Iramuteq 0.7 Alpha 2. Identificação de artigos encontrados/32 no total. Análise dos resultados da Classificação Hierarquia Descendente (CHD) e Análise Fatorial de Correspondência (AFC) Fonte: Elaboração própria a partir de dados da pesquisa, 2021. Portanto, em suma, o procedimento metodológico foi dividido em 3 etapas: na primeira foi feita a seleção dos trabalhos (títulos e resumos), em seguida a leitura dos trabalhos selecionados para a geração dos dados utilizados na primeira parte das discussões que se seguem; e por fim, a terceira etapa, onde agrupou-se em um único documento (chamado de corpus) todos os títulos e resumos para uma análise textual, no software Iramuteq 0.7 Alpha 2. Tal agrupamento possibilitou a identificação das palavras mais recorrentes e associadas entre sim, gerando clusters de palavras mais associadas no que diz respeito à discussão sobre os assuntos: “habitação”, “moradia”, “casa”, “assentamentos urbanos”, “assentamentos rurais”. Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 4 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho ANÁLISE DO CONTEÚDO DOS ARTIGOS ATRAVÉS DO SOFTWARE IRAMUTEQ Nesse momento do trabalho serão expostos os resultados da análise do corpus, composta pelos títulos e resumos de todos os artigos, realizado a partir do uso do programa Iramuteq 0.7 Alpha 2. Observou-se após a geração dos dados que houve um aproveitamento de 72,30% do texto analisado, com um número de ocorrência de 10.639 e 278 segmentos de texto. Tal análise gerou 3 clusters, denominados de “Assuntos abordados” divididos em duas ramificações distintas, onde, do lado esquerdo encontra-se 2 clusters, divididos nas classes 1 (37,8 % dos segmentos de texto) e classe 2 (14,4% dos segmentos de texto) respectivamente, e, no lado direito, um terceiro cluster, denominado classe 3 (47,8 % dos segmentos de texto) conforme dendograma na Figura 3, abaixo. Figura 03 – Dendograma em nuvem de palavras Fonte: elaboração própria com base em dados da pesquisa, 2021. Na sequência foi realizada uma análise fatorial, que revelou através de suas informações, aqueles artigos e os anos que houveram concentrações semelhantes de assuntos, objetivos e temáticas através da associação das palavras dos seus respectivos textos. A Figura 4, abaixo, mostra, de acordo com suas respectivas cores, os artigos e anos referentes aos clusters descritos acima. Observou-se que no primeiro quadrante encontram-se Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 5 Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. aqueles artigos e anos que trataram da classe 2 (vermelha) “Políticas Públicas e Habitação”, ou seja, os resumos 09, 16, 19, 20, 21, 22, 23, 28, 29 e os anos 1992, 2004, 2009, 2010, 2014 e 2015 foram os que contribuíram para a classe 2, tendo como destaque as palavras: comunidade, floresta, modos de vida, condições de vida, relacionar, desenvolver, implantação e uso, as quais estiveram associadas ao contexto e às ações tratadas nos referidos trabalhos. Figura 04 – Análise fatorial Fonte: elaboração própria com base em dados da pesquisa, 2021. O quadrante 4, a classe 1 (verde), denominada “Tipologias Habitacionais, Modos de Morar e Realidades Familiares” agregou trabalhos que analisaram várias formas de moradia e realidades familiares. Neste contexto, os estudos dos tipos habitacionais exploraram a perspectiva da habitação enquanto expressão possível da demarcação que os sujeitos ocupam Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 6 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho na pirâmide social, ou seja, o espaço físico como intrinsicamente associado ao lugar social que os sujeitos ocupam na sociedade. As análises estiveram associadas também ao universo dos seus residentes e do espaço doméstico, historicamente associado à mulher e, por vezes, espaço de empoderamento feminino, a partir das políticas de acesso à habitação, tal qual observaram Soares et al (2017). As palavras que aparecem para explicar essa classe são: mulher, homem, casa, lugar, doméstico, vida, trabalhador, empoderamento, social e outros. Os resumos que mais evidenciam essa associação de palavras são: 08, 14, 15, 18, 23, 24, 30, 31 e 32. Já os anos relativos a essa discussão foram: 1989, 1994, 2003, 2004, 2009, 2012, 2017, 2021. Por outro lado, percebe-se no terceiro quadrante os resumos que representam a classe 3 (Azul), denominada “Formas de uso e condições do espaço habitacional”. São eles: resumos 1, 2, 3, 4, 5, 7, 10, 12, 13, 17, 26. E os anos os quais mais se evidenciou essa discussão foram: 1982, 1984, 1985, 1987, 1994, 2000, 2002, 2005 e 2013. Para explicar essa classe, as palavras que se destacaram foram: moradia, utilizar, caracterizar, características, habitabilidade, levantamento, entrevista, unidade, influenciar, problema, variáveis, mostrar, objetivo, Viçosa e outras. POLÍTICAS PÚBLICAS E HABITAÇÃO A complexidade do tema da habitação deriva da sua natureza no conjunto das necessidades reprodutivas dos cidadãos, compondo um dos direitos dos trabalhadores. Os estudos na revista têm revelado essas perspectivas, desvendando a questão social mais ampla associada ao consumo da habitação, a qual se coloca também no campo de ação do Estado, a partir das políticas públicas de habitação. Na OIKOS, a perspectiva analítica das políticas públicas habitacionais enquanto objeto central, esteve em consonância com os estudos acadêmicos e em sintonia com a conjuntura política e o cenário econômico do país. Neste quadrante os trabalhos reconstituem alguns marcos importantes do processo de urbanização da sociedade brasileira e da ação do Estado no campo das políticas públicas de habitação, os quais nos colocam a necessidade de reflexão de um projeto social para as cidades que possibilitem, o acesso à cidade e à habitação de forma mais justa e igualitária aos segmentos mais pobres da população. A pesquisa de Peixoto et al (2004) se delineou, buscando compreender as contradições presentes no espaço idealizado pelo Estado nas políticas públicas habitacionais sob as diretrizes do orçamento participativo da habitação e no espaço vivido pelos moradores dos Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 7 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho conjuntos habitacionais multifamiliares construídos na capital mineira em 2001. Para tal, os autores analisaram o uso do espaço físico e social em nestes espaços, tomando por base a percepção ambiental de seus moradores. As unidades habitacionais do conjunto são percebidas como conquistas sociais alcançadas, muito embora elas ainda não correspondam à idealização de casa que os moradores trazem consigo. A não correspondência dessas perspectivas impõem, como apontam a pesquisa, a necessidade de projetos que intermedeiem os atores públicos e as famílias. Essa perspectiva esteve presente mais tarde, em um estudo desenvolvido por Guimarães et al (2014) que analisaram o significado da casa própria para os beneficiários do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) em Viçosa, MG. A delimitação da realidade habitacional, sob a perspectiva dos moradores, trouxe à tona os contrastes e as oposições sociais, associados à conquista da casa própria, a qual se revela no reconhecimento dos processos de inclusão e de exclusão social inerentes ao Programa. Assim, de um lado, através do acesso ao imóvel, as famílias passaram a ser reconhecidas socialmente como cidadãos de direitos e deveres. De outro lado, no espaço segregado dos conjuntos, elas têm a dimensão do lugar social que ocupam na sociedade e da condição de subcidadania, que se revela nas atuais condições habitacionais no imóvel adquirido e no verdadeiro apartheid construído entre a ‘cidade dos pobres’ e na ‘cidade dos ricos’, revelado a partir destes empreendimentos. Também analisando a realidade de famílias em um pequeno município da Zona da Mata, Teixeiras, MG, Silva et al (2009) identificaram as políticas habitacionais e de saneamento como importantes fatores de equidade e de promoção da saúde no contexto do Programa de Saúde da Família. Para elas, a desigualdade socioeconômica, característica da sociedade brasileira, com acesso não equitativo das famílias ao acesso dos serviços de saneamento básico, impõe limites aos direitos fundamentais à sobrevivência humana. Segundo elas, entre os principais fatores que podem contribuir para o desenvolvimento de doenças e precarização da qualidade de vida das famílias se destacaram a baixa escolaridade, a qualidade da água consumida pelas famílias, o destino final do lixo doméstico como também as condições das habitações e precariedade de sua higiene. Carvalho (2009) também mostrou a importância das políticas sociais no Brasil, em especial, aquelas relacionadas à transferência direta de renda aos segmentos mais vulneráveis da população (notadamente, o Programa Bolsa Família) para que as populações melhorem suas condições de vida, principalmente suas condições de moradia e acesso aos serviços públicos. Para isso, a autora traçou e analisou o perfil dos domicílios beneficiados pelo Programa Bolsa Família a partir de suas características demográficas, condições de moradia e Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 8 Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. atendimento pelos serviços públicos (saneamento básico) tomando como referência os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, nos anos de 2004 e 2006. As variáveis associadas à moradia e ao saneamento básico, mostraram que as melhorias ocorridas nos domicílios foram mais significativas entre os domicílios beneficiados do que nos outros domicílios brasileiros. De forma geral, as condições demográficas, de moradia e sanitária dos domicílios os expõem à maior vulnerabilidade beneficiados e, neste contexto, o benefício obtido a partir do PBF assume grande importância para a redução da miséria e da pobreza. No rural brasileiro, as ações do Estado a partir das políticas de reforma agrária e reassentamentos rurais foram analisadas por Sousa (2010; 2012) no estado de Sergipe e por Farias. Neste trabalho, a realidade agrária do estado marcada pela concentração histórica de terras e pela luta dos movimentos sociais no campo foi analisada com o intuito de verificar os efeitos da reforma agraria sobre a qualidade de vida das famílias assentadas. Num contexto próximo, Bortone et al (2009) privilegiaram os processos de deslocamento/reassentamento de famílias atingidas por barragem construídas a partir dos empreendimentos hidrelétricos em Minas Gerais, considerados projetos de desenvolvimento e progresso que, ao serem implantados, causam impactos ambientais e sociais. O trabalho de Bortone expressou as contradições da lógica capitalista, perceptíveis a partir das perspectivas das famílias atingidas, mediante as mudanças espaciais, econômicas, sociais e culturais ocorridas depois do reassentamento. O deslocamento, desejado ou não, rompe costumes, práticas sociais e identidades, além de desestruturar modos de vida das famílias reassentadas. Se a migração, em algum momento representou possibilidades de novas oportunidades, o deslocamento não foi capaz de reproduzir os antigos modos e condições de vida das famílias. Mais tarde, Santos et al (2015) tomaram como objeto de estudo a análise da adequação do Programa Nacional de Habitação Rural à realidade das famílias camponesas de municípios da Zona da Mata de Minas Gerais, Guiricema e São Miguel do Anta. Para as autoras, a reforma agrária enquanto política pública, apesar de não ter na moradia um dos seus objetivos específicos, apresenta uma interface positiva nesse aspecto. Isso porque, através do credito especifico para a construção das moradias, ela proporciona às famílias as condições que atendem as suas necessidades tendo em vista o nível de satisfação apresentado. CONDIÇÕES HABITACIONAIS, CONSTRUÇÃO E USO DO ESPAÇO No segundo quadrante, os estudos abordaram as condições habitacionais, níveis de habitabilidade, bem como, a construção e uso do espaço a partir dos trabalhos de Tambara Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 9 Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. (1982), Minioni e Silveira Júnior (1982) Martins (1984 e 1987), Pasternack e Mautner (1982), Muller e Ltickes (1994), Irala (2000), Carvalho e Sacht (2005) e Guimarães et al (2013). Na cronologia dos estudos, é possível perceber a prioridade para análises que colocam foco na moradia enquanto uma questão social que envolve as populações pobres brasileiras quer seja referindo-se às condições habitacionais dos trabalhadores na indústria (Tambara, 1982), perpassando pela realidade das populações residentes nos conjuntos produzidos pelo Sistema Financeiro de Habitação (Martins, 1984 e 1987), das alternativas habitacionais para os pobres na cidade, conforme relatadas por Pasternack e Mautner (1982). Ao longo dos anos de 1980, os trabalhos exploraram a análise das condições de moradia dos pobres na cidade, evidenciando o contexto de crise econômica do país, a queda do poder aquisitivo da população, a falência do BNH, o aumento do desemprego e da pobreza, o crescimento da população de rua, a proliferação de favelas e cortiços, dos assentamentos urbanos, especialmente, nas grandes cidades. Para análise das condições habitacionais, de forma geral, os trabalhos enfocaram os fatores socioeconômicos ligados à família (renda familiar, escolaridade, posse da casa, acesso à lazer e à comunicação, etc.), a caracterização dos domicílios (número e características dos cômodos, número de moradores, acesso aos serviços de infraestrutura urbana, área média das habitações, acesso a equipamentos e eletrodomésticos) para mensuração das suas condições habitacionais. Na análise do uso do espaço urbano e das condições de moradia, a habitação é concebida para além da perspectiva de abrigo, vinculando-a na sua inserção na cidade, como ocupação do espaço urbano e seus complementos de infraestrutura, serviços, transporte, equipamentos sociais e paisagem, bem como, dos atores envolvidos no seu processo de produção. Em sintonia com este quadro, o trabalho de Suzane Pasternack e Mautner (1982), buscou analisar os processos de produção, distribuição e consumo das alternativas habitacionais para a população de baixa renda no contexto da grande metrópole de São Paulo. Para tanto, as autoras exploraram as alternativas fundamentais aos pobres na cidade, as quais perpassaram pelo universo das ocupações de terras (favelas) e das unidades construídas (cortiços), dos conjuntos habitacionais de interesse social e das unidades na periferia, tanto em regime de propriedade como em regime de locação. A partir daí, se explorou a estrutura e a organização de cada um desses submercados, seus agentes e interrelações, bem como, o papel de cada um na transformação do espaço urbano. Já o trabalho de Martins (1984) analisou as condições habitacionais de famílias moradoras no núcleo habitacional Jardim Esplanada, o primeiro do gênero implantado em Piracicaba, SP, adquiridas através do Sistema Financeiro de Habitação (STH), sob a Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 10 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho administração da Companhia de Habitação Popular Bandeirante COHAB, BD. Embora o pano de fundo do estudo tenha trazido o cenário das ações do governo no pós-1964, especialmente aquelas associadas ao Plano Nacional de Habitação, o foco do trabalho se centrou na análise das condições habitacionais. Nos anos de 1990, os novos tempos de acumulação flexível e da transnacionalização mostraram a força do capital financeiro e imobiliário que passa a remodelar o espaço urbano de outra forma. Dentro deste quadro de desigualdades sociais profundas, produzindo uma massa de excluídos, de sem-terra, sem-habitação, carentes de infraestrutura e de serviços básicos, a questão espacial ganha destaque nos estudos da época clássicos e também no periódico Oikos. Explorando este quadro, Muller e Ltickes (1994) e Irala et al (2000) apontaram alternativas vivenciadas por famílias pobres em contextos de uma cidade de grande e médio porte no Brasil. As primeiras autoras analisaram a realidade de famílias assentadas e inscritas em um loteamento público e doado pela Prefeitura Municipal, em Pelotas, RS, enquanto Irala (2000) analisou o processo de autoconstrução em Viçosa, MG, enquanto uma pratica social de acesso à casa própria. Ambos os trabalhos exploraram argumentos de como a ineficácia das políticas habitacionais dirigidas às classes populares, a especulação nos preços dos alugueis e na utilização da terra têm transformado o acesso à moradia por parte desse segmento da população em um desafio na luta pela sobrevivência. As avaliações das condições de habitação e habitabilidade também perpassaram por parâmetros que buscaram identificar o grau de adequação das moradias, as condições de infraestrutura e os fatores ligados ao déficit habitacional em bairros periféricos (CARVALHO e SACHT, 2005), bem como pela identificação de barreiras arquitetônicas pelos idosos no espaço vivenciado na casa (FERREIRA et al, 2002). Abrangendo a problemática habitacional no meio rural, o estudo de Minioni e Silveira Jr (1982) reconstitui este debate a partir das mudanças estruturais ocorridas no campo, agravadas por fatores que envolveram o êxodo rural e as políticas de desenvolvimento da época. Partindo daí, os autores problematizam o lugar que o rural ocupa nas políticas de desenvolvimento e, em especial, os planos e as diretrizes das políticas habitacionais. Nesse sentido, a premissa é de que o desenvolvimento rural integrado está associado ao melhoramento do bem-estar ou da qualidade de vida da população rural. Para tanto, os autores buscaram analisar os fatores socioeconômicos diretamente associados aos níveis habitacionais de uma comunidade rural do Rio Grande do Sul. O estudo aponta a significativa relação no nível da habitação com os fatores socioeconômicos, os quais se atrelaram aos ganhos líquidos familiares, bem como aos fatores culturais, manifestados nos níveis de cosmopolitismo . Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 11 Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Haveria, pois, uma relação positiva entre a renda e o nível da habitação bem como em relação aos contatos estabelecidos com a cultura urbana. Os contatos com a cidade ou com elementos ligados a ela traria novos estímulos à aquisição de novos equipamentos e eletrodomésticos relacionados com a habitação e maior usufruto do desenvolvimento tecnológico. TIPOLOGIAS HABITACIONAIS, MODOS DE MORAR E REALIDADES FAMILIARES Neste terceiro quadrante os estudos exploraram a análise de diferentes tipologias habitacionais, modos de moradia e realidades familiares aí presentes. Os estudos partilharam das reflexões de Bourdieu quando ele apontou que, a partir do espaço social se pode chegar a uma real compreensão do espaço físico. Ou vice-versa. Um dos primeiros trabalhos nesta vertente, o estudo de Elza Guimarães et al (1994), contribuiu para construção de uma tipologia das habitações de populações de classe média residentes na cidade de Viçosa, na Zona da Mata de Minas Gerais. O estudo possibilitou a caracterização e análise de apartamentos residenciais que, nos anos de 1990 representava o principal investimento do setor imobiliário voltado para atender o perfil da família nuclear neste segmento social. Já Minioni (1989), mediante um quadro tipológico constituído, buscou registros da manifestação da cultura lusa em habitações rurais e urbanas dos municípios de Pelotas e Rio Grande do Sul. Para tanto, as habitações foram analisadas a partir de um quadro tipológico com a seguinte abrangência: tipo de unidade habitacional e processo evolutivo, processo construtivo, parede e cobertura, disposição e elementos da fachada, cozinha, serviços e planta baixa. Os resultados apontaram que as habitações apresentavam características próprias e singulares da etnia lusa enquadrando se quase sempre no quadro tipológico construído. Apesar disso, verificou-se também adaptações e reformas constantes nas habitações para satisfazer as necessidades da vida atual. Ou seja, as pessoas adquirem e incorporam conhecimentos e hábitos relacionados com o meio urbano e, em função disso, mudanças de comportamento e adoção de novos hábitos, inclusive, em torno dos modos de morar. Anos mais tarde, em 2013, os reflexos da urbanização do campo nos modos de moradia das famílias rurais foi objeto de estudo de Edilene Guimarães et al (2013) em sua pesquisa de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Economia Doméstica. No trabalho, as pesquisadoras buscaram perceber indícios das possíveis transformações ocorridas no campo, constatadas em termos dos modos de vida do rural tradicional ao moderno e expressos nos modos de morar das famílias residentes no meio rural. A análise dos modos de morar do idoso, Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 12 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho a partir do processo de urbanização e das mudanças no perfil sociodemográfico da população também foi objeto de estudo de Miguel et al (2017). As autoras investigaram a moradia dos idosos mineiros, enquanto uma tipologia específica, a partir das suas características físicas e perfil sociodemográfico. A partir de uma vertente sociopolítica de análise das favelas, Pinto et al (2003) analisou esta tipologia enquanto um fenômeno da segregação socioespacial presente na cidade capitalista e que se reflete nas ações e nas formas de sociabilidades presentes neste espaço. A perspectiva de analise apresentada privilegiou aquilo que é representado como legal e ilegal destacando que essas dimensões qualificativas do espaço são como expressões de uma identidade cultural brasileira. O estudo também buscou investigar qual o sentido as políticas públicas assumem nos espaços das favelas e como elas são percebidas pelos moradores. Neste sentido, a intervenção excludente, clientelista do Estado na implementação das políticas sociais, quer sejam elas, de habitação, saúde, educação, etc., atribui ao morador da favela, uma “cidadania menor”. Assim, a falta de oportunidades iguais para todos concorre para reforçar emblemas sociais discriminatórios construindo uma identidade estigmatizada do morador de favela. De outro lado, a permissividade ou maior flexibilidade na legislação urbana está também associada à ausência de políticas urbanas para os segmentos populares e garantindo a estruturação de um mercado imobiliário capitalista voltado para uma pequena parcela da população. Dentro desta lógica, produz-se uma sociedade hierarquicamente organizada, a qual se expressa fisicamente nos territórios urbanos, na divisão da cidade a partir dos ‘espaços para pobres’ e ‘espaços para ricos’. Tais processos além de alterar a morfologia urbana, alteram as relações que os moradores da cidade estabelecem entre si e colaboram para a constituição de uma cidade repartida, fragmentada, segundo hierarquias aceitas e cotidianamente reproduzidas. Esses fenômenos que estão presentes especialmente nas grandes cidades, são identificados também em algumas cidades de médio e pequeno porte, e se ‘objetivam’ ou se ‘materializam’ nas realidades das favelas e, no seu oposto, nos condomínios fechados. A compreensão dessas tipologias pressupõe a compreensão do processo de urbanização presentes, bem como sobre os processos de identidade, alteridade e territorialidades relacionados à população residente. Foi dentro desta perspectiva que a pesquisa de Godoy et al (2009) possibilitou um olhar mais focado para a realidade dos condomínios residenciais fechados no contexto de uma cidade média mineira, buscando analisar as relações que os moradores estabelecem entre si e com o espaço físico que os envolve, tanto na cidade – espaço público, quanto na sua moradia – espaço privado. Ao repensar essas realidades, as Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 13 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho autoras concluem, que “nos tempos modernos, a cultura individual se sobreporia à cultura coletiva e em cada indivíduo prevaleceria a unicidade qualitativa e não a universalidade. Assim, faltaria à cidade moderna a etapa da inclusão total da alteridade (...)” (PINTO, 2002). A forma como as populações percebem, organizam e se relacionam com o espaço onde está inserida, define os seus modos de vida e as formas como elas interpretam o seu território. Esta perspectiva foi explorada por Oliveira (2012) analisando o uso do espaço em comunidades amazônicas em uma comunidade extrativista amazônica chamada Iratapuru, Amapá e por Farias et al (2012) se referindo aos assentamentos rurais advindos das políticas de assentamento agrário em Bambui, oeste de Minas Gerais. No estudo de Oliveira (2012), o autor buscou compreender as formas mais significativas de organização cultural e espacial presente na comunidade extrativista e apontou que “a relação construída entre a comunidade, a floresta e o rio era fundamental para a manutenção do modo de vida”. Segundo o estudo, “essa organização do espaço com o ambiente corresponde a um padrão tradicional que perpassa pelo modo que esses atores se relacionam com a casa, a floresta, o rio, o ciclo agrícola e as relações de trabalho” (OLIVEIRA, 2012). No contexto analisado por Oliveira (2012), de forma expressiva, os modos de vida tradicionais continuavam sendo características que marcam o desenvolvimento socioeconômico da comunidade. Já na pesquisa de Faria et al (2012) que estudou os assentamentos rurais advindos das políticas de assentamento agrário, em Bambui, oeste de Minas Gerais, a possibilidade de reprodução das famílias estava dada, fundamentalmente, a partir das relações construídas para além do assentamento. No estudo de Faria el al (2012), a autora buscou compreender o lugar que o assentamento rural ocupava nos projetos de vida das famílias assentadas, analisando suas trajetórias e perspectivas em relação a terra conquistada. No estudo, as autoras identificaram que a reprodução das famílias não estava associada, exclusivamente, às atividades desenvolvidas no assentamento, tendo suas sociabilidades construídas também nos inúmeros vínculos que mantinham no município a partir do trabalho lazer e estudo. A condição do assentamento como fim, per si, ou como meio, per si, não constitui fator restritivo às possibilidades de reprodução social do grupo. CONSIDERAÇÕES FINAIS No mundo todo, o processo histórico de urbanização tem deixado marcas perversas, expressão da lógica de lucro que perpassa o sistema capitalista, no qual a habitação, mercadoria altamente rentável e desejável, não está disponível a todos. Este contexto tem sido Oikos: Família e Sociedade em Debate, Viçosa, v. 32, n.3, p.1-18, 2021 14 Habitação em Análise: 40 Anos de Estudo na OIKOS. Neide Maria de Almeida Pinto Reinaldo Antônio Bastos Filho objeto de análise dos autores na Oikos, que têm apontado ao longo dos anos, as desigualdades históricas e a parcialidade do direito à habitação e à cidade. A análise do estudo da habitação nos 40 anos da Oikos revelou as diferentes abordagens dadas pelos autores-pesquisadores, vindas de diferentes áreas do conhecimento, as quais se revelaram, sobretudo, nas três classes principais de temáticas abordadas: “Tipologias Habitacionais, Modos de Morar e Realidades Familiares”; “Condições Habitacionais, Construção e Uso do Espaço” e “Políticas Públicas e Habitação”. Diferentes realidades foram desnudadas nos contextos das pequenas, das médias e das grandes metrópoles, os quais revelaram as atuais condições habitacionais. Observou-se através dos artigos publicados na Oikos, um verdadeiro apartheid: a cidade capitalista dividida entre o “mundo dos ricos” e o “mundo dos pobres”. Foram analisados diferentes programas e políticas públicas de habitação, que expuseram os contrastes e as oposições sociais, associados à conquista da casa própria, cuja dimensão expôs o lugar social que os seus beneficiários ocupam na sociedade e a sua condição de subcidadania. No rural brasileiro, as ações do Estado a partir das políticas de reforma agrária e reassentamentos rurais, do Programa Nacional de Habitação Rural, assim como os processos de deslocamento/reassentamento de famílias atingidas por barragem, expuseram as contradições da lógica capitalista. Na cronologia dos trabalhos, o foco também se centrou na análise das condições habitacionais dos trabalhadores na indústria, perpassando pela realidade das populações residentes nos conjuntos habitacionais e nas análises sobre as alternativas habitacionais para os pobres na cidade e no campo brasileiro. 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