Academia.eduAcademia.edu

Bogdan Biklen investigacao qualitativa em educacao

ROBERT C. BOGDAN SARI KNOPP BIKLEN COLECÇÃO CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO Orientada por MARIA TERESA ESTRELA e ALBANO ESTRELA INVESTIGAÇAO QUALITATIVA EM EDUCAÇAO UMA INTRODUÇÃO À TEORIA E AOS MÉTODOS Titulo INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO Autores: Rober~o C. e San Biklen Sara dos Santos Tradutores: Maria João e Telmo MOJrinho Baptista Revisor: António Bra'lco Vasco Editora: Porto Ed:tcra -;-itulo da ed,,;áooClcllnal Qualltative Research for Educatlon !Edlçao 0-205-13266-91 Copyrlgh, 1991 by Ally~ & Bacon, Inc RESUMO DOS CONTEÚDOS © PORTO E:JITQRA LDA - 1994 Rua da Restauração. 365 ,1099 POPTO CODEX - PORTUGAL 1Odo ou gravaçãoQ" pane, por quô1que' préviaõulorlzação ISBN 972-0·34112-2 .JEZ/1999 PORTO EDITORA. LDA. R'Jada 'i!li22G07669 pr de D ~llipa de Lencastre, 42 - 4050-259 PORTO D :,rR ali 'B DORE's LIVRARIA ARNADO, lDA. ~ivra',a I1Ja ,je Ma"ue! 'vIaaeira, 20 ia Pea~u!~2i -302C'-303 COIMBRA ~ 2394g 7ü9~ ~~a de Joac fl'achacio, 9·11 - 3000-226 COI~vIBRA f: 239833528 ZONA SuL EMPRESA UTERÁRIA flUMINENSE, LOA. Av. Alm,rar'le Gago Coutinho, 59 - A ~ :7QC-Dn LISBOA L';,'ara Av Alm'ranle Gago Coulinho, 59· D -1700-D27 LISBOA f: 2184309 00 g 218430900 o D II II iii Fundamentos da investigação qualitativa em educação: uma introdução. Plano de investigação ........_.........._...... Trabalho de campo. 11 Dados qualitativos .. 14 Análise de dados ........ 20 Fax mRedacção da investigação . 24 Fax 21843 0ge1 ii .. 26 E"'cç" gcol,,, d, BLOCO GRAFiCO, :...DA - R da RestaLJraçao, 387 - 4050-506 PORTO - PORTUG,AL Investigação qualitativa aplicada em educação: avaliação, pedagogia e acção iii Aética.............................................................................................................. 75 1m Em que consiste opresente livro 79 / INDICE NOTAS PREFÁCIO............................................................................................. :...................................................................................... 80 II II PLANO DE INVESTIGAÇÃO I FUNDAMENTOS DA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO: UMA INTRODUÇÃO o o Aescolha de um estudo 85 IJ Estudos de caso 89 Estudos de caso de organizações numa perspectiva histórica Estudos de caso de observação....... HistóIias de vida................................................... 90 90 92 Atradição da investigação qualitativa em educação. 19 Origens no século dezanove . O nascimento da antropologia A sociologia de Chicago A sociologia da educação Dos anos trinta aos anos cinquenta.... Os anos sessenta: uma época de mudança social . Os anos setenta: investigação qualitativa em educação, a diversidade... Os anos oitenta e noventa: computadores, feminismo e a investigação qualitativa pós-moderna 19 25 26 29 31 36 39 43 IJ Características da investigação qualitativa 47 IJ Fundamentos teóricos 52 A abordagem fenomenológica A interacção simbólica A cultura A etnometodologia Os estudos culturais Uma história 53 55 57 60 61 61 o Como obter acesso ao campo 115 Nove questões frequentes sobre a investigação qualitativa 63 IJ 122 II 6 I . .".~_. IJ II iii Estudos realizados simultaneamente em múltiplos locais.............................. Indução analítica modificada..... Método comparativo constante................................................................. 98 98 101 Questões adicionais relacionadas com oplano 105 Redacção da proposta...... Grelhas de entrevista e guiões do observador Investigação em equipa e investigação do "cavaleiro solitário" 105 107 108 Conclusão 109 III TRABALHO DE CAMPO Os primeiros dias no campo de investigação 7 ------:50----1..- ----__. II ocontúlUo participante/observador V 125 Seja discreto Contextos educativos em conflito Sentimentos :......................................................... Quanto tempo deve durar uma sessão de observação? 128 130 131 133 II Entrevistas........................................................................................................ 134 D Análise no campo 207 g Fotografia e trabalho de campo 140 D Outras sugestões sobre aanálise no campo de investigação 218 mAbandonar ocampo de investigação 144 II Análise após arecolha de dados 220 NOTAS...................................................................................................................... 145 Desenvolvimento de categorias de codificação........ A utilização do computador para a análise........................... 221 229 232 239 Um comentário final......................................................................................... 241 ANÁLISE DE DADOS Int1uências na codificação e na análise............................... As formas de trabalhar os dados.... IV II DADOS QUALITATIVOS D Notas de campo O conteúdo das notas de campo O formato das notas de campo O processo de escrita das notas de campo..................... Transcrições das entrevistas gravadas D Os textos escritos pelos sujeitos Documentos pessoais................................................................................ Documentos oficiais II Fotografia 150 152 167 169 172 176 177 180 Fotografias encontradas..... Fotografias produzidas pelo investigador................................................. Fotografias como análise Técnica e equipamento 183 184 188 190 191 D Estatísticas oficiais e outros dados quantitativos.............................................. 194 g Comentários finais.. 200 VI REDACÇÃO DA INVESTIGAÇÃO D Por onde começar 246 D Um bom manuscrito 247 A introdução.......... A conclusão 250 250 257 Considerações finais sobre aescrita 258 O desenvolvimento................................................................................... II NOTAS...................................................................................................................... 201 NOTAS...................................................................................................................... 260 8 9 I ..w.. , t_a I • • • • • • • • • • • • • •- • • • • • • • • • • • . :;;;; VII INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA APLICADA EM EDUCAÇÃO: AVALIAÇÃO, PEDAGOGIA EACÇÃO D Investigação avaliativa edecisória Trabalho em equipas................................................................................. Audiência. Prazos O futuro da investigação avaliativa e decisória........................................ 268 270 272 275 277 278 279 280 281 Utilizações pedagógicas da investigação qualitativa........................................ 283 Como utilizar a investigação qualitativa para melhorar a sua eficácia enquanto professor A abordagem qualitativa e a fonnação de professores Métodos qualitativos no currículo escolar................................................ 285 287 289 Conseguir subsídios Relações entre o contratante e o investigador Local da investigação Feedback D II Investigação-acção PREFÁCIO A investigação em educação modificou-se desde a publicação da primeira edição de Investigação Qualitativa em Educação: Uma Introdução à Teoria e aos Métodos, em 1982. Um campo que era dominado pelas questões da mensuração, definições operacionais, variáveis, teste de hipóteses e estatística, alargou-se para contemplar uma metodologia de investigação que enfatiza a descrição, a indução, a teoria fundamentada e o estudo das percepções pessoais. Designamos esta abordagem por "Investigação Qualitativa". A influência dos métodos qualitativos no estudo de várias questões educacionais é cada vez maior. Muitos dos investigadores educacionais manifestam uma atitude positiva face às mudanças que se têm vindo a verificar nas estratégias de investigação, contemplando a abordagem qualitativa tanto a nível pedagógico como a nível da condução da investigação. Um número crescente de investigadores identifica-se como especialista na abordagem qualitativa, e as universidades solicitam, cada vez mais, docentes com este tipo de competências. Basta tomar em consideração os padrões de financiamento dos organismos governamentais, os programas dos congressos de educação, os títulos dos livros da especialidade e os conteúdos das diversas revistas de educação, para perceber que a abordagem qualitativa atingiu a maturidade (Popkewitz, 1984). É igualmente crescente o número de disciplinas cujos conteúdos programáticos contemplam exclusivamente os métodos qualitativos (Wolcott, 1983; Bogdan, 1983), bem coma o número de disciplinas gerais de investigação que o fazem. Quando escrevemos a Investigação Qualitativa em Educação, existiam poucos livros publicados sobre o tópico. Contudo, desde 1982 que a situação se modificou, e muitos outros livros foram publicados. No prefácio da primeira edição explicitámos os nossos objectivos: proporcionar os fundamentos para a compreensão das diferentes ,.............................................................. 292 Investigação para a acção O que a investigação-acção pode fazer A abordagem dos dados na investigação-acção Conclusão: a investigação aplicada e a tradição qualitativa 293 296 298 300 NOTAS...................................................................................................................... 301 APÊNDICE EXEMPLOS DE QUESTÕES RELATIVAS À OBSERVAÇÃO EM CONTEXTOS EDUCACIONAIS 303 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 316 ÍNDICE REMISSIVO 333 10 1,,"'_."Illl~~. ------.I----...VU.i'LIILi.\~~q. 11 .a .s.i utilizações da investigação qualitativa em educação, examinar as bases teóricas e históricas e especificar métodos concretos para a realização da investigação. Na presente edição tais objectivos mantêm-se. Muito do que escrevemos em 1982 continua a ser relevante. A segunda edição da Investigação Qualitativa em Educação reflecte o desenvolvimento deste campo. Dado que novas áreas e questões - a relação entre o sexo e o feminismo com a investigação qunlitativa, o pós-modernismo, a desconstrução e a investigação qualitativa, bem como a utilização do computador na recolha e análise de dados qualitativos - têm vindo a ganhar relevância, acrescentámos material que as contempla. Simultaneamente, entendemos manter o livro como um texto introdutório. Pretendemos que ele seja útil para os que se encontram emfase de iniciação. Finalmente, actualizámos as referências com o objectivo de relacionar partes especificas do livro com a literatura publicada após a sua primeira edição. Estas referências adicionais têm particular utilidade para todos aqueles que pretendam literatura complementar. Tal como fizemos na edição de 1982, iniciamos o livro com uma discussão geral tendente à caracterização da investigação qualitativa e do modo como esta se articula com a educação, com'iderando tanto os conceitos teóricos como os históricos. Nos quatro capítulos seguintes, procedemos à aplicação dos conceitos ao planeamento e à prática, ao trabalho de campo e à recolha e análise de dados. Seguidamente, debruçamo-nos sobre o processo de redacção da investigação. No último capítulo focamo-nos num conjunto especial de casos de investigação qualitativa em educação - a investigação aplicada. Neste capítulo discutimos a investigação avaliativa, pedagógica e a investigação-acção. Entendemos a investigação qualitativa a partir de uma perspectiva sociológica; tal orientação reflecte-se no livro. Contudo, como estamos interessados na antropologia, mantivemo-nos atentos às importantes modificações que se têm vindo a verificar na conceptualização dos métodos qualitativos, muitas das quais são oriundas daquela disciplina. São devidos agradecimentos a muitas pessoas. O National Institute ofEducation (bolsa n.o 400-79-0052) apoiou o estudo de integração que referimos no livro. O estudo relativo à unidade de cuiclndos intensivos para recém-nascidos de um hospital universitário foi apoiado por uma bolsa do New York Bureau of Mental Retardation and Developmental Disabilities, bem como pelo Senate Research Fund da Universidade de Syracuse. Andrejs Ozolins escreveu parte das secções sobre fotografia e auxiliou na escolha das fotografias que integram o livro. Mary Pittman da Universidade de Cincinnati e Earle Knowlton da Universidade do Kansas fizeram um excelente trabalho de revisão. Debra Gold ajudou na revisão de literatura. Sue Kelly excedeu-se no processamento de texto. SUflS 12 I FUNDAMENTOS DA "" INVESTIGAÇAO QUALITATIVA EM "" EDUCAÇAO: "" UMA INTRODUÇAO 13 I'T_~'_' ---------------I-----,.,Jj;:. ,_1& m investigador de trinta e poucos anos de idade encontrava-se no pátio de recreio de uma escola primária a observar a chegada, para o primeiro dia de aulas, de um autocarro cheio de crianças afro-americanas. Tratava-se do primeiro grupo de afro-americanos a frequentar esta escola. O investigador estava a desenvolver um estudo exploratório sobre o processo de integração. O estudo obrigava-o a visitar a escola regularmente, com o objectivo de observar as experiências de alunos e professores. Adicionalmente, entrevistou professores, o director, as crianças e os pais, tendo igualmente assistido a reuniões. Este tipo de trabalho prolongou-se ao longo de todo um ano, resultando num registo escrito no qual foi anotado, de forma não intrusiva, aquilo que observara (Rist, 1987). Noutro local dos Estados Unidos, alguns investigadores estudaram o significado que os itens dos testes tinham para as crianças que as eles se submetiam. Interrogaram crianças da primeira classe sobre as suas respostas. Por exemplo, uma das questões do teste solicitava às crianças que escolhessem, de entre três gravuras, aquela que melhor se relacionava com determinada palavra que as acompanhava. Muitas das crianças responderam à palavra mosca, que acompanhava gravuras representando um elefante, um pássaro e um cão, assinalando simultaneamente o pássaro e o elefante ou mesmo só o elefante (a resposta "certa" era o pássaro). Quando questionados relativamente às suas respostas, as crianças disseram aos investigadores que o elefante era o "Dumbo", o elefante voador de Walt Disney. As crianças tinham compreendido o conceito que a questão do teste tentava evocar, mas responderam baseando-se numa perspectiva diferente daquela que os criadores do teste tinham em mente. Este estudo pretendia investigar o raciocínio das crianças (Mehan,1978). Numa grande cidade, determinada investigadora entrevistou um grupo de professoras, na tentativa de compreender das relações entre as suas vidas privadas e as suas vidas profissionais. A amostra era reduzida, menos de dez sujeitos. Acabou por conhecer bem estas mulheres, dado que as entrevistas eram longas e em profundidade, tendo sido conduzidas ao longo de todo um ano nas próprias casas e salas de aulas das professoras. A investigadora analisou os dados deste estudo de caso com o objectivo de identificar padrões relativos às perspectivas das professoras face às suas vidas profissionais (Spencer, 1986). U 14 1~"~_''''''_''j_a ---------_J. 15 tiJ. , Todos os exemplos anteriores são ilustrações de investigação qualitativa em educação. E óbvio que não esgotam nem a diversidade de estratégias de investigação, nem os tópicos possíveis. Outros autores que conduzem investigação qualitativa estudam os contos de fadas e os livros escolares para identificar as formas como são representadas as pessoas com deficiências físicas (Biklen e Bogdan, 1977); analisam fotografias de crianças em álbuns familiares para identificar as formas como a família se representa (Musello, 1979); e visionam vídeos de estudantes a executar trabalhos escolares com o objectivo de compreender os conceitos que as crianças têm sobre ordem (Florio, 1978; McDermott, 1976). As experiências educacionais de pessoas de todas as idades (bem como todo o tipo de materiais que contribuam para aumentar o nosso conhecimento relativo a essas experiências), tanto em contexto escolar como exteriores à escola, podem constituir objecto de estudo. A investigação qualitativa em educação assume muitas formas e é conduzida em múltiplos contextos. Ainda que os investigadores em antropologia e sociologia tenham vindo a utilizar a abordagem descrita no presente livro desde há um século, a expressão "investigação qualitativa" não foi utilizada nas ciências sociais até ao final dos anos sessenta. Utilizamos a expressão investigação qU(llitativÇl como um termo genérico que agrupa diversas estratégias de investigação qUê-partilham determinadas características. Os dados recolhidos são designados por qualitativos, o que significa ricos em pormenores descritivos relativamente a pessoas, locais e conversas, e de complexo tratamento estatístico. As questões a investigar não se estabelecem mediante a operacionalização de variáveis, sendo, outrossim, formuladas com o objectivo de investigar os fenómenos em toda a sua complexidade e em contexto natural. Ainda que os indivíduos que fazem investigação qualitativa possam vir a seleccionar questões específicas à medida que recolhem os dados, a abordagem à investigação não é feita com o objectivo de responder a questões prévias ou de testar hipóteses. Privilegiam, essencialmente, a compreensão dos comportamentos a partir da perspectiva dos sujeitos da investigação. As causas exteriores são consideradas de importância secundária. Recolhem normalmente os dados em função de um contacto aprofundado com os indivíduos, nos seus contextos ecológicos naturais. As estratégias mais representativas da investigação qualitativa, e aquelas que melhor ilustram as características anteriormente referidas, são a observação participante e a entrevista em profundidade. O investigador que observou as crianças afro-americanas a sair do autocarro estava a realizar um estudo de observação participante. O investigador introduz-se no mundo das pessoas que pretende estudar, tenta conhecê-Ias, dar-se a conhecer e ganhar a sua confiança, elaborando um registo escrito e sistemático de tudo aquilo que ouve e observa. O material assim recolhido é complementado com outro tipo de dados, como registos escolares, artigos de jornal e fotografias. O caso da investigadora que estudou o grupo de professoras trata-se de um exemplo do recurso à entrevista em profundidade. Por vezes, este tipo de entrevista é designada por 16 S- -1--.. . . "não-estruturada" (Maccoby e Maccoby, 1954) ou "aberta" (Jahoda, Deutsch e Cc 1951), "não-directiva" (Meltzer e Petras, 1970) ou, ainda, entrevista "de estrutura fi< vel" (Whyte, 1979). O objectivo do investigador é o de compreender, com bastante d lhe, o que é que professores, directores e estudantes pensam e como é que desenvolve os seus quadros de referência. Este objectivo implica que o investigador passe, freql temente, um tempo considerável com os sujeitos no seu ambiente natural, elabora questões abertas do tipo "descreva um dia típico" ou "de que é que mais gosta no seu balho?", registando as respectivas respostas. O carácter flexível deste tipo de aborda! permite aos sujeitos responderem de acordo com a sua perspectiva pessoal, em ve2 terem de se moldar a questões previamente elaboradas. Na investigação qualitativa nã, recorre ao uso de questionários. Ainda que se possa, ocasionalmente, recorrer a grei de entrevista pouco estruturadas, é mais típico que a pessoa do próprio investigador se único instrumento, tentando levar os sujeitos a expressar livremente as suas opin: sobre determinados assuntos. Dado o detalhe pretendido, a maioria dos estudos são c duzidos com pequenas amostras. Nalguns estudos o investigador limita-se a traçar I caracterização minuciosa de um único sujeito. Nestes casos, onde o objectivo é o de ( tar a interpretação que determinada pessoa faz da sua própria vida, o estudo design por história de vida. Se bem que utilizemos a expressão investigação qualitativa, outros autores recorre expressões diferentes e conceptualizam o tipo de investigação descrito no presente I de modo algo diverso. Investigação de campo é uma expressão utilizada por antropóle e sociólogos, devendo-se a sua utilização ao facto dos dados serem normalmente rece dos no campo, em contraste com os estudos conduzidos em laboratório ou noutros lo controlados pelo investigador (ver Junker, 1960)1. Em (:Qucação, a investigação qua tiva é frequentemente designada por naturalista, porque o investigador frequenta os lo em que naturalmente se verificam os fenómenos nos quais está interessado, incidindl dados recolhidos nos comportamentos naturais das pessoas: conversar, visitar, obseI comer, etc. (Guba, 1978; Wolf, 1978a). A expressão etnográfica é igualmente aplica, este tipo de abordagem. Enquanto que alguns autores a utilizam num sentido formal, I se referirem a uma categoria particular de investigação qualitativa, aquela a que amai dos antropólogos se dedica e que tem como objectivo a descrição da cultura, ela també utilizada de forma mais genérica - algumas vezes como sinónimo - da investigação ql tativa tal como a estamos a descrever (Goetz e LeCompte, 1984). Existem igualmente outras expressões associadas com a investigação qualitat Referimo-nos a: interaccionismo simbólico, perspectiva interior, Escola de Chie, fenomenologia, estudo de caso, etnometodologia, ecologia e descritivo. A utilizaç; definição exactas destas expressões, bem como de trabalho de campo e de investigc qualitativa, têm variado ao longo do tempo e entre diferentes utilizadores. Isto não si fica que todas estas expressões queiram dizer a mesma coisa, nem que algumas delas tenham um significado preciso quando utilizadas por determinados autores (Jacob, 19 IQE-2 17 J 2,!.~,,~~ Escolhemos privilegiar a expressão investigação qualitativa como englobando todo o conjunto de estratégias que designamos por "qualitativas". Iremos clarificar algumas das expressões anteriormente mencionadas no decorrer da exposição. Até ao momento, limitámo-nos a introduzir o tópico de estudo. Voltaremos, no presente capítulo, a discutir mais detalhadamente as características da investigação qualitativa, bem como os seus fundamentos teóricos. Mas, antes do mais, contextualizemos historicamente o nosso objecto de estudo. D A tradição da investigação qualitativa em educação o s historiadores da investigação educacional tradicional citam o ano de 1954 co um ponto de viragem (Travers, 1978; Tyler, 1976). O Congresso aprovou legi; ção que, pela primeira vez, permitia a atribuição de bolsas a instituições com p gramas de investigação educacional 2. Tomando os subsídios federais como indicado investigação educacional tinha sido finalmente reconhecida. Contudo, o reconhecime dos investigadores que trabalhavam com metodologias qualitativas cujo trabalho, à épo era considerado marginal, ainda teria de aguardar algum tempo. Para estes investigado o ano de 1954 foi um ano como outro qualquer. Por razões sobre as quais nos debruç2 mos nas próximas páginas, o desenvolvimento da investigação qualitativa em educação se veio a verificar no final dos anos sessenta. Ainda que a investigação qualitativa no campo da educação só recentemente ter sido reconhecida, possui uma longa e rica tradição. As características desta herança au liam os investigadores qualitativos em educação a compreender a sua metodologia contexto histórico 3. As origens da investigação qualitativa encontram-se em várias dü plinas, donde que a nossa resenha histórica ultrapasse as fronteiras disciplinares. Pro mos uma perspectiva relativa ao desenvolvimento dos métodos de investigação qual tiva em educação. ORIGENS NO SÉCULO DEZANOVE Algumas das características da vida quotidiana do século dezanove nos Estados l dos estiveram na base da investigação social. A urbanização e o impacto da imigração 18 - 1_~.,"-";:;I!I!lI I I !I I I lI I I ..... ...-,. . . .,. ,.,. .,..... -----_1.. _.jj-_•.i•t~. 19 2. massa deram origem a vários problemas nas cidades: sanitários, de saúde pública, bem-estar e educação. O fotógrafo Jacob Riis (1890) expôs a vida dos pobres urbanos nas páginas de How lhe Olher Half Lives. Jornalistas de investigação, como Lincoln Steffens (1904, 1931) e outros, denunciaram nos seus artigos a corrupção na gestão da cidade, a "vergonha das cidades" e outras calamidades. Entre 1870 e 1890, o papel tomou-se mais barato, a distribuição dos jornais expandiu-se enormemente e o "jornalismo sensacionalista" floresceu (Taylor, 1919). Este tipo de publicidade chamou a atenção para as condições degradadas da vida urbana na sociedade americana. A denúncia jornalística dos problemas sociais exigia resposta, uma delas foi o "movimento dos levantamentos sociais", constituído por um conjunto de estudos comunitários coordenados, relativos aos problemas urbanos, e levados a cabo próximo do início do século vinte. Estes levantamentos revestiram-se de determinada forma, dado o nascimento das ciências naturais ter estimulado o entendimento de disciplinas, tais como a sociologia, como científicas e não simplesmente filosóficas (Harrison, 1931; Riley, 1910-1911). Foram igualmente antecedidos por levantamentos relativos aos pobres, conduzidos na Europa e na Inglaterra. Nos finais do século dezanove, o francês Frederick LePlay estudou famílias da classe trabalhadora, recorrendo ao método designado por "observação participante" pelos cientistas sociais dos anos trinta (Wells. 1939). Por seu lado, LePlay designava o método meramente por "observação" (Zimmerman e Frampton, 1935), utilizando-o na tentativa de encontrar um remédio para o sofrimento social. Enquanto observadores participantes, LePlay e os seus colegas viveram com as famílias que estudaram; participavam nas suas vidas, observando cuidadosamente o que faziam no trabalho, no tempo de lazer, na igreja e na escola. Este trabalho foi publicado sob o título Les Ouvriers Europeans (o primeiro volume surgiu em 1879), e descreve detalhadamente a vida de família da classe trabalhadora na Europa. Por sua vez, a obra de Henry Mayhew, London Labour and lhe London Poor, publicada em quatro volumes entre 1851 e 1862 (Fried e Elman, 1968; Stott, 1973), consiste no registo, ilustração e descrição das condições de vida dos trabalhadores e dos desempregados. Mayhew apresenta histórias de vida e os resultados de entrevistas exaustivas com os pobres. A investigação de Charles Booth, um estatístico que começou a fazer levantamentos sociais relativos aos pobres de Londres em 1886 (Webb, 1926), seguiu a tendência da literatura urbana emergente. O empreendimento de Booth revestiu-se de dimensões incríveis, prolongando-se por dezassete anos e dando origem a igual número de volumes escritos. O seu principal objectivo era o de descobrir quantos pobres existiam em Londres e quais as suas condições de vida. Ainda que a sua principal preocupação fosse documentar quantitativamente a extensão e natureza da pobreza em Londres, o seu trabalho contém descrições exaustivas e detalhadas das pessoas que estudou. Tais descrições foram recolhidas durante os períodos de tempo em que Booth viveu, anonimamente, entre as pessoas que observou, com o objectivo de ter experiência directa das vidas dos seus sujeitos (ver Taylor, 1919; Webb, 1926; Wells, 1939). 20 . I~,.,""",. -"'.;;_:- - - - Professora e alunos, cidade de Nova Iorque, 1890 Um dos colaboradores do projecto colossal de Booth foi Beatrice Webb (nome de sol teira, Potter) que, juntamente com o marido, se tomou uma figura destacada do movi mento socialista Fabiano. Com toda uma vida dedicada ao estudo das instituições sociai e do sofrimento dos pobres, o despertar do interesse, dedicação e empenho de Webb pel temática, ficou a dever-se à sua primeira experiência de trabalho de campo. Compreen deu em primeira mão aquilo que Roy Stryker, outro estudioso dos pobres, viria mais tard a escrever, "o povo é constituído por indivíduos" (Stott, 1973)'; "Nunca tinha visto o trabalho como composto por homens e mulheres individuais, de diferentes formas e feitios. Até ao momento em que me comecei a interessar pelas ciências sociais e a receber formação como investigador social, o trabalho não era mais do que uma abstracção que parecia denotar uma massa de seres humanos aritmeticamente calculá:el (cada indivíduo como repetição do indivíduo anterior), de forma mUIto semelhante ao facto do capital das empresas do meu pai consistir, presumo, em soberanos de ouro idênticos a todos os outros soberanos de ouro, em forma, peso, cor e também em valor." (Webb, 1926, p. 4I) Aquilo que não passava de mera abstracção ganhou carne e osso para Beatrice Webb, mediante o seu contacto em primeira mão com os seus sujeitos de investigação. Posterior mente, o casal Webb publicou uma descrição da sua metodologia, obra que foi objecto de 21 1 .. .;.:. apresenta igualmente descrições detalhadas, entrevistas, desenhos (executados em carvãl por vários artistas) e fotografias. Esta articulação entre o quantitativo e o qualitativo está bem patente na revista Charit and lhe Commol1s (que posteriormente se transformou na The Survey), que publicO! resultados do Inquérito de Pittsburgh em três números que lhe foram dedicados em 1908 1909. Os relatos vão desde o planeamento educacional - "nesta cidade, os edifícios esco lares", afirmou um experiente responsável escolar de Allengheny, "são primeiro construí dos e só depois é que se reflecte sobre eles" (North, 1909), até às questões levantado pelos estudantes mais "débeis" na escola, devido às características da abordagem dos pro fessores do ensino elementar ao problema. Determinada professora: "teve 128 alunos num ano e 107 no seguinte. Dividiu as crianças em duas turmas. As crianças mais inteligentes vinham pela manhã e era-lhes permitido proceder segundo o seu próprio ritmo, acabando por 'cobrir' entre seis e nove livros por ano; os com maiores dificuldades, em menor número, vinham pela tarde. Dedicavam-se essencialmente a brincar, e as sessões da tarde não duravam mais de duas horas: consequentemente, estas crianças não 'cobriam' mais de um livro por ano." Escola nocturna numa modesta pensão da Sétima Avenida, começos de 1890 ampla leitura nos Estados Unidos (Wax, 1971)5, e que parece constituir a primeira discussão prática da abordagem qualitativa (Webb e Webb, 1932)'. Por sua vez, nos Estados Unidos, foi W. E. B. Ou Bois que procedeu ao primeiro levantamento social. Publicado em 1899 com o título de The Philadelphia Negro, consistia num trabalho levado a cabo durante cerca de um ano e meio de estudo apurado, recorrendo a entrevistas e observações de sujeitos que habitavam essencialmente no Sétimo Bairro da cidade. O objectivo da investigação era o de examinar "as condições de vida dos mais de quarenta mil indivíduos de raça negra que habitavam na cidade de Filadélfia" (Ou Bois, 1899 [1967], p. 1). Um dos levantamentos sociais mais significativos foi o de Pittsburgh, conduzido em 1907. O grupo que o conduziu tentou aplicar o "método científico" ao estudo dos problemas sociais. Ainda que os estudiosos ligados ao movimento dos levantamentos sociais tendam a acentuar a natureza estatística destes (ver, por exemplo, Devine 1906-1908; Kellog, 1911-1912), os resultados do Inquérito de Pittsburgh, por exemplo, sugeriram que esta ênfase se podia dever mais aos valores contemporâneos inerentes à quantificação como símbolo da abordagem científica do que ao conteúdo dos registos propriamente ditos. Ainda que Inquérito de Pittsburgh apresente quantificações estatísticas, relativamente a questões que vão desde o número de acidentes semanais e valor dos salários, até aos tipos e localizações dos sanitários e a frequência escolar, ° 22 I Estes últimos alunos acabavam por desistir, engrossando a "coluna de trabalhadore industriais i1etrados" (North, 1909). Além deste, abundam os registos semelhantes. A variedade dos dados dos levantamentos sociais devia-se à natureza interdisciplina da investigação: cientistas sociais, assistentes sociais, líderes cívicos, o investigador exte rior culto (equivalente aos consultores modernos) e jornalistas, todos eles deram o sei contributo. Adicionalmente, os diferentes materiais eram discutidos em reuniões pública e expostos à comunidade (Taylor, 1919). Os levantamentos sociais têm uma importância particular para a compreensão da his tória da investigação qualitativa em educação, dada a sua relação imediata com os pre blemas sociais e a sua posição particular a meio caminho entre a narrativa e o estudo cien tífico. Por exemplo, em 1904, Lincoln Steffens apresentou a sua obra Shame of Ih Cilies, com os seguintes comentários: "Nada disto é muito científico, mas eu não sou um cientista. Sou um jornalista. Não recolhi todos os factos com indiferença, nem os ordenei pacientemente com o objectivo de serem preservados e laboratorialmente analisados. Não os quis preservar, quis destruir os factos. O meu intuito foi tão científico como o espírito da minha investigação e dos meus registos; foi, como já referi, ver se os factos vergonhosos se apresentavam em toda a sua ClUeza, agitando a indiferença cívica e incendiando o orgulho americano. Era este o componente jornalístico, a intenção de convencer e de p'rovocar reacções." (Steffens, 1904, em Harrison, 1931, p. 21) 23 .,..-"-".'- ----__-------_1 ..). Steffens tinha esperança de, com os seus escritos, desencadear acções que contribuíssem para aliviar o sofrimento humano. Vinte e cinco anos mais tarde, em 1929, após inúmeros levantamentos sociais por todos os Estados Unidos, William Ogburn faria os seguintes comentários, na conferência de abertura da Sociedade Americana de Sociologia. Quão diferentes pareciam os métodos científicos e jornalísticos, à data. Do ponto de vista profissional, a sociologia tinha de desenvolver novos hábitos para se tomar científica: "Um destes novos hábitos será a escrita de artigos totalmente desapaixonados e o abandono do hábito corrente de tentar transformar os resultados da ciência em literatura... Os artigos necessitam sempre de ser acompanhados pelos dados em que se baseiam; desta forma, o texto será mais pequeno e o espaço ocupado pelos dados maior. .. É óbvio que o sociólogo trabalhará com o tipo de problemas que tendem a transformar a sociologia num corpo de conhecimentos organizado e sistemático, escolherá, igualmente, para objecto de investigação, os problemas cuja solução beneficiará a espécie humana e a sua cultura... Mas, o sociólogo científico atacará os problemas escolhidos com uma só ideia em mente: a construção de novos conhecimentos." (Harrison, 1931, p. 21) Rapazes do carvão da mina de Ewen em S. Pittston, Pensilvânia, 10 de Janeiro de 1911. O trabalho fotográfico de Hine contribuiu para a aprovação das leis relativas ao trabalho infantil. 24 I o levantamento social encontrava-se a meio caminho entre estes dois mundos: ( conduzido com o objectivo de encorajar mudanças sociais, com base na investigação os seus métodos apresentavam os problemas em termos humanos. o NASCIMENTO DA ANTROPOLOGIA As origens antropológicas da investigação qualitativa em educação estão convince temente documentadas (ver, particularmente, Roberts, 1976)'. Franz Boas, fundador primeiro departamento universiüírio nos Estados Unidos, terá possivelmente sido o p meiro antropólogo a escrever sobre antropologia e educação, num artigo publicado ( 1898 e dedicado ao ensino da antropologia a nível universitário. Boas e os seus co boradores foram igualmente dos primeiros antropólogos a residir nos contextos natur: dos sujeitos, ainda que durante curtos espaços de tempo, e a basear-se em informadOl competentes que falavam inglês, dado não terem conhecimento da língua nativa. Para o nosso propósito, o desenvolvimento da investigação qualitativa em educação contributo mais significativo de Boas foi a sua participação no desenvolvimento ~a antl pologia interpretativa, bem como o seu conceito de cultura. Em contraste com os antl pólogos anteriôiês,Roas era um "relativista cultural", acreditando que cada cultura esl dada devia ser abordada de forma indutiva. Caso os etnógrafos abordassem uma detl minada cultura na expectativa de a compreender segundo a perspectiva ocidental, acal riam necessariamente por distorcer aquilo que observavam. Boas pensava que os antl pólogos deviam estudar as culturas com o objectivo de aprender a forma como cada UI delas era vista pelos seus próprios membros (ver Case, 1927). Igualmente em 1898, o ano do artigo de Boas, Nina Vandewalker, que Roberts (l9í descreveu como uma "académica desconhecida", aplicou, pela primeira vez, a antropo: gia à educação, no artigo "Some Demands of Education upon Anthropology", publica no American Journal of Sociology. No artigo abordava as relações entre a educação ( cultura (Vandewalker, 1898). Relativamente ao desenvolvimento das técnicas de trabalho de campo é necessário, ( primeiro lugar, considerar os estudos antropológicos das culturas nativas. Ao contrário Boas, que se baseou mais em documentos e informadores do que em observações direc' e aprofundadas, Bronislaw Malinowski foi o primeiro antropólogo cultural a passar lc gos períodos de tempo numa aldeia nativa, para observar o seu funcionamento (Wl 1971). Foi igualmente o primeiro antropólogo profissional a descrever o modo cor obteve os seus dados e a experiência do trabalho de campo. Estabeleceu as bases antropologia interpretativa, ao enfatizar a importância de apreender "o ponto de vista nativo" (Malinowski, 1922, p. 25). Malinowski insistia que a teoria da cultura se devia basear em experiências humar particulares e na observação, e ser construída indutivamente (Malinowski, 1960). É j teressante o facto de a sua abordagem de campo se ter desenvolvido acidentalmen 25 ., ,. -.,-------------------1------_.. . .4 ;:7:~$1 Quando chegou à Nova Guiné, dispondo de meios financeiros muito limitados, verificou-se o início da Primeira Grande Guerra. Deste modo, a sua viagem foi negativamente afectada, sendo obrigado a permanecer na Austrália e nas ilhas até ao fim da guerra, em 1918. Tal facto contribuiu para a futura delineação do "trabalho de campo". Possivelmente, a primeira aplicação concreta da antropologia à educação nos Estados Unidos foi efectuada pela antropóloga Margaret Mead (ver, particularmente, Mead, 1942 e 1951). Essencialmente preocupada com o papel do professor e com a escola enquanto organização, recorreu às suas experiências de campo em sociedades menos tecnológicas, para ilustrar o quadro educativo em rápida mudança dos Estados Unidos da época. Mead estudou a forma como contextos particulares - os tipos de escola que categorizou como a "pequena escola vermelha", a "escola de cidade" e a "academia" - necessitavam de professores específicos, e a forma como estes professores interagiam com os alunos. Defendeu que os professores necessitavam de estudar, através de observações e experiências em primeira mão, os contextos cambiantes dos processos de socialização dos seus alunos, para se tomarem melhores professores. Ainda que não tenha conduzido trabalho de campo formal nos Estados Unidos, reflectiu sobre a educação americana, focando-se nos conceitos antropológicos mais do que no método. Uma das figuras principais no desenvolvimento do método qualitativo foi Robert Redfield, um antropólogo que estudou na Universidade de Chicago no período de desenvolvimento da sociologia. Era genro de Robert Park, outro sociólogo que, como teremos oportunidade de ver posteriormente, foi um pioneiro no desenvolvimento da investiga~ão qualitativa nesta disciplina. O trabalho de campo dos antropólogos constituiu um fundamento importante do modelo que ficou conhecido como a sociologia de Chicago (Douglas, 1976). Os estudos etnográficos de Redfield tiveram muita influência na investigação de campo sobre as comunidades (Faris, 1967). Na perspectiva de Wax, um antropólogo, os "sociólogos de Chicago" prosseguiram a tradição antropológica do trabalho de campo: "ao incidirem na 'observação participante', os sociólogos de Chicago denunciaram a sua ligação à tradição etnográfica do trabalho de campo, iniciada por Maliaowski" (Wax, 1971, p. 40). Albion Small foi o fundador do departamento de Sociologia da Universidade de Chiem 1892; foi igualmente o primeiro e o maior de todo o mundo (Odum, 1951). A 'Escola de Chicago", rótulo aplicado a um grupo de sociólogos investigadores com fun,ões docentes e discentes no departamento de sociologia da Universidade de Chicago, nos mos vinte e trinta, contribuíram enormemente para o desenvolvimento do método de nvestigação que designamos por qualitativo. Ainda que os sociólogos de Chicago diferissem uns dos outros em aspectos imporantes, partilhavam algumas noções teóricas e metodológicas. Do ponto de vista teórico, todos eles entendiam os símbolos e as personalidades como emergentes da interacção social (Faris, 1967). Do ponto de vista metodológico, todos se baseavam no estudo de caso, quer se tratasse de um indivíduo, de um grupo, de um bairro ou de uma comunidade (Wiley, 1979). De entre as numerosas características da metodologia da Escola de Chicago, algumas são essenciais para a compreensão da investigação qualitativa em educação. Em primeiro lugar, os sociólogos de Chicago baseavam-se nos dados IkcQlhiJi_illL@Jl!ÍlIleira_mão-Ilill:ª as suas investigações. Esta técnica estabeleceu-se a partir do trabalho de dois autores: W. r. Thomas e Robert Park. Thomas foi um dos primeiros alunos de pós-graduação do departamento de sociologia. O seu trabalho, juntamente com Florian Znaniecki, The Polish Peasant in Europe and America (Thomas e Znaniecki, 1927), é reconhecido como um "ponto de viragem na história da investigação sociológica", porque se concentrava "na análise qualitativa de documentos pessoais e públicos", e "introduzia novos elementos na investigação e novas técnicas para estudar esses elementos, técnicas não características das investigações empíricas, no sentido tradicional" (Bruyn, 1966). Thomas não entendia os dados em termos quantitativos. Interessante é o facto de ter sido acidentalmente que começou a utilizar as cartas como dados de investigação. Conta-se que um dia, passeando pelo gueto polaco de Chicago, se desviou para não ser atingido por lixo atirado de uma janela. Encontrou, entre o lixo, um maço de cartas e, como sabia ler polaco, começou a lê-las. Deparou-se com uma descrição em primeira mão da vida de um imigrante (Collins e Makowsky, 1978, p. 184). Este incidente, tal como o de Malinowski ter ficado retido durante a Primeira Grande Guerra, teve uma influência profunda no delinear da investigação social. Thomas partilhava com o antropólogo Boas o realçar da importância da compreensão dos pontos de vista e percepções da realidade de diferentes pessoas '. Depois de ter travado conhecimento com Thomas, numa conferência sobre as relações entre as raças, Robert Park foi para a Universidade de Chicago, em 1916 (Hughes, 1971). Apesar de Park se ter tornado numa das figuras principais da Escola de Chicago, esta não foi a sua primeira carreira. Já tinha sido um repórter jornalístico, além de ter trabalhado como relações públicas para a Booker T. Washington. Muitos historiadores da Escola de Chicago associam o encorajamento dado pelo departamento aos estudantes de pós-graduação, para penetrarem nos mundos sociais que queriam estudar, à experiência jornalística de Park (ver, por exemplo, Douglas, 1976; Faris, 1967; Matthews, 1977; Wax, 1971). Park enviava os seus alunos para as ruas de Chicago, nos anos vinte, para que pudessem observar pessoalmente o que se passava. A ênfase na vida da cidade constitui a segunda característica importante dos sociólogos de Chicago. O que quer que estudassem, faziam-no sempre tendo como pano de fundo a comunidade como um todo, abordagem que Becker designou por "o mosaico científico" (Becker, 1970b). Park "encorajava regularmente os seus alunos a fazerem estudos gerais, mas exaustivos, relativos a comunidades particulares, com o objectivo de 26 27 A. SOCIOLOGIA DE CHICAGO ~ago, """'ffl."''''''''"'----e---------------,J.------:;lJM -L."""'-.. III as entender como um todo" (Faris, 1967). Os trabalhos destes alunos, posteriormente publicados, ilustram tanto o interesse por diferentes aspectos da vida comum, como uma preocupação com o estudo da etnicidade. Foram objecto de estudo o gueto judeu (Wirth, 1928), os bailes dos taxistas (Cressy, 1932), o gang dos rapazes (Thrasher, 1927), o ladrão profissional (Sutherland, 1937), o vagabundo (Anderson, 1923), The Gold Coast and the Slum (Zorbaugh, 1929) e o delinquente (Shaw, 1966; publicado inicialmente em 1930). É na ênfase da intersecção entre o contexto social e a biografia que residem as origens das descrições contemporâneas da investigação qualitativa como "holística". Como afirmou um dos sociólogos de Chicago, "o comportamento pode ser estudado, vantajosamente, tomando em consideração a situação em que surge" (Wells, 1939). Os sociólogos de Chicago, como afirmámos anteriormente, assumiram uma abordagem interaccionista relativamente à investigação (Carey, 1975), enfatizando a natureza social e interactiva da realidade. Park, por exemplo, na sua introdução à metodologia de um estudo sobre as relações raciais entre orientais e ocidentais na Califórnia, sugeriu que ele era importante pelo reconhecimento que fazia de que "todas as opiniões, públicas ou privadas, são um produto social" (Bogardus, 1926). Com efeito, os investigadores pretendiam captar as perspectivas daqueles que eram entrevistados. Muitos dos sujeitos partilharam as suas perspectivas relativas às dificuldades que experimentavam como americanos de origem oriental: "Pensava que era americano. Tinha ideais americanos, lutaria pela América, venerava Washington e Lincoln. Depois, no liceu, descobri que me chamavam 'Jap', me tratavam mal e me punham de lado. Afirmei que não conhecia o Japão, não sabia falar a língua nem conhecia heróis ou a história do Japão. Contudo, diziam-me constantemente que eu não era americano, não podia ser americano e não podia votar. Sinto-me profundamente triste. Não sou japonês e não me é permitido ser americano. Pode dizer-me, ao fim de contas, aquilo que sou?" (Bogardus, 1926, p.I64) Os investigadores não só enfatizavam a dimensão humana, mas envolviam-se igualmente em questões políticas importantes. Ainda que os sociólogos de Chicago tenham estudado os problemas sociais e conduzido investigações relativas à vida na cidade, aos problemas comunitários e a carreiras desviantes, eles não eram, na sua grande maioria, defensores da reforma. O primeiro movimento dos levantamentos sociais verificou-se numa altura em que a sociologia ainda não se encontrava suficientemente diferenciada do "movimento organizado de caridade" (que posteriormente veio a ser conhecido como assistência social). Quando a sociologia se diferenciou claramente da assistência social, abandonou a sua vertente reformista e reteve exclusivamente a influência do método de estudo de casos. Esta abordagem não se limitava a ser um método de campo, implicava igualmente o reconhecimento das inter-relações existentes entre os diversos problemas sociais (Taylor, 1919). A sociologia 28 tinha efectivamente alcançado o estatuto de ciência, contudo, aquilo que o grupo sociólogos de Chicago escrevia não era o material árido que Ogburn apresentava encontros da Associação Americana de Sociologia. A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO Dado que o campo da sociologia da educação se desenvolveu numa altura em qu Departamento de Sociologia de Chicago tinha atingido o seu zénite, poderíamos esp( que as estratégias de investigação qualitativa se reflectissem claramente nos planos investigação da sociologia da educação. Contudo, não foi isto que se verificou. O início oficial da sociologia da educação, como campo individualizado, verificO[ em 1915, aquando da inauguração do primeiro curso de "Sociologia da Educação" (Sn den, 1937), mas o Journal of Educational Sociology só surgiu em 1926. Inicialmel dois em cada três dos seus responsáveis vinham da Escola de Chicago: Harvey Zorbm de The Gold Coast and the Slum e Frederick Thrasher, autor de The Gang. Entre os I ponsáveis pela revista encontravam-se três professores do Departamento de Sociologia Chicago: Emory S. Bogardus, ElIsworth Faris e Robert Park. De facto, no início do ! meiro volume, um determinado editorial sugeria que o Journal of Educational Sociol, representava a "perspectiva de Chicago" (1927, 1:4, p. 177). Vários números do volume I sugeriam que a perspectiva de Chicago se encontr presente: alguns artigos fizeram revisões de The Gang de Trasher, seguiram o desem vimento profissional do Professor Bogardus, mencionaram a publicação próxima de : Jack Roller de Shaw e registaram um discurso de Faris. Ainda que esta perspectiva I tenha dominado a revista, estava, sem dúvida, representada. Durante o período relativo ao volume 2 (1928-1929), contudo, a preocupação cc tante com as ciências naturais e com a avaliação quantitativa subiu de tom. No terc( número, por exemplo, o editorial debruçava-se sobre as discussões dos últimos anos n tivas à questão "será a sociologia da educação uma ciência ou poderá vir a transformaI em ciência"? Para se tomar ciência, explicava o editorial, a investigação em sociologia educação tinha de ser experimental. Esta perspectiva, defendida pelo "movimento de medida da escola científica", refle as preocupações essenciais da educação à época. Era o "reinado do empirismo" (Cr bach e Suppes, 1969). O "método científico" em educação identificou-se com a qUal ficação. A sociologia da educação em geral (sempre parente pobre da psicologia da e, cação) e a Revista, em particular, afastaram-se da perspectiva de Chicago, encaJ nhando- se para uma abordagem quantitativa e experimental. Esta indisponibilidade para a Revista considerar outros materiais que não os dados e: tísticos reflecte-se em artigos tais como "The Validity of Life Histories and Diaries" (B. 1929). O autor apresentava várias razões para considerar as histórias de vida e os diáJ como adequados ao trabalho social, mas não à sociologia: estes documentos não er 29 ----------------I..----_. .......J"""""_,..._. j1• suficientemente científicos; não era possível aos investigadores tratar documentos tais como as histórias de vida, estatisticamente; e eles não podiam ser padronizados. "Podem ser 'interessantes e impressionantes''', comentava Bain, "mas também o cinema o é..."'. À medida que os educadores foram aumentando a sua preocupação com a mensuração, quantificação e predição, as estratégias qualitativas tais como a "investigação em primeira mão", a utilização de documentos pessoais e a preocupação do investigador de campo com o contexto social tomaram-se menos relevantes para os educadores (Peters, 1937). Além do mais, como já referimos anteriormente, os psicólogos dominaram a investigação educacional, e estes eram decididamente experimentalistas (Becker, 1983). Existe, possivelmente, uma outra razão para que a sociologia de Chicago tenha tido pouco impacto no desenvolvimento da sociologia da educação. Vamos mencioná-Ia brevemente, na esperança de que os historiadores venham a investigá-Ia com mais cuidado. Entre 1893 e 1935, mais de uma centena de dissertações de doutoramento foram realizadas no Departamento de Sociologia de Chicago. Contudo, só duas delas se relacionavam com a educação (Faris, 1967) 10. Se bem que um maior número de dissertações de mestrado incidissem sobre a educação 11, estas constituíam só uma pequena percentagem dos tópicos. Assuntos mais representados foram a socialização, a vida comunitária, a juventude, o trabalho e a família. Ainda que estes tópicos possam reflectir a educação, no sentido mais amplo do termo, a sua componente mais profissional passou quase despercebida. Em parte, esta falta de interesse podia reflectir o carácter neófito da sociologia da educação. No jantar anual da Sociedade Americana de Sociologia, em 1927, Ellsworth Faris "aproveitou a ocasião para chamar a atenção dos membros presentes para a importância do campo da sociologia da educação, solicitando-lhes apoio na tarefa de alertar os sociólogos para os vários problemas inerentes a este campo" (Journal of Educational Sociology, 1927, I:7). Só recentemente é que as palavras educação e sociologia tinham surgido juntas. Ainda que a quantificação representasse a tendência dominante no tocante à sociologia da educação (Peters, 1937; Snedden, 1937), apareceram algumas excepções, particularmente o trabalho de Willard Waller (Willower e Boyd, 1989). Waller obteve o seu mestrado com Ellsworth Faris no Departamento de Sociologia de Chicago, sendo a sua abordagem da sociologia da educação empírica mas "antiquantitativa", baseando-se num contacto directo com o mundo social, e preocupado com as relações entre as partes e o todo. A importância de Waller para a investigação qualitativa deve-se essencialmente à actualidade da sua obra clássica Sociology ofTeaching (Waller, 1932). Na Sociology ofTeaching, Waller baseou-se em entrevistas em profundidade, em histórias de vida, na observação participante, no registo de casos, em diários, cartas e outros documentos pessoais, para descrever o mundo social dos professores e seus alunos. Para Waller, a ideia base do livro era a crença de que "as crianças e os professores não constituem inteligências incorpóreas, nem máquinas de ensino e de aprendizagem, mas sim seres humanos integrais, enlaçados num labirinto complexo de interconexões sociais. Com poucas excepções de peso, e mesmo que os antropólogos culturais americano tivessem continuado o seu trabalho (Marcus e Fisher, 1986), alguns académicos vêen a investigação realizada entre os anos trinta e os anos cinquenta como um hiato d; abordagem qualitativa. Podem assumir-se diversas perspectivas relativamente a est; posição, dependendo do modo como se define investigação, dos enviesamentos acadé micos e políticos de cada um e das fontes históricas que se utilizam. É sempre possíve fazer inclusões e exclusões. Por exemplo, os historiadores da investigação qualitativ; nunca incluíram Freud e Piaget entre os criadores da abordagem qualitativa, contudo ambos se basearam em estudos de caso, observações e entrevistas em profundidade 30 31 lC'~""""""_"'l!ll'V_D I.a A escola é um mundo social por ser habitada por seres humanos" (Waller, 1932, p. 1 Waller recorreu aos métodos da "antropologia social", do "conto realista" e daquilo qu hoje em dia designaríamos por investigação qualitativa. O seu objectivo era o de auxilü os professores a tomarem consciência das realidades sociais da vida escolar, sentindo qm para alcançar este objectivo, tinha de ser realista e concreto: "Ser concreto significa apresentar os materiais de forma a que os personagens não percam a sua qualidade de pessoas, nem as situações a sua realidade humana intrínseca. A sociologia realista tem de ser concreta. No meu caso pessoal, esta preferência pelo concreto levou a uma descrença relativa nos métodos estatísticos, que me pareceram de pouca utilidade para os meus propósitos. Possivelmente, a compreensão da vida humana avançará tanto pelo estudo directo dos fenómenos sociais como pelo estudo dos símbolos numéricos que são abstraídos desses mesmos fenómenos." Para Waller era o "tomar consciência" que devia orientar o método científico, e não, contrário (Waller, 1934). A importância do trabalho de Waller sobre a vida social das escolas e dos seus interve nientes reside não só na força e rigor das suas descrições, mas também nos conceitos socio lógicos que utilizou. Entre estes era proeminente o conceito de W. I. Thomas de "defini ção da situação" (Thomas, 1923), um conceito claramente interactivo, que sugere que a pessoas examinem e "definam" as situações antes de agirem sobre elas. Estas "defini ções" são exactamente o que toma as situações reais para nós. Outra base importante di trabalho de Waller foi a ideia de Coolley de que eram as "inter-relações dramáticas" qu constituíam o traço distintivo do conhecimento social. Recorrendo à metáfora do jogo d, ténis, Cooley escreveu que um jogador necessita sempre de alguém do outro lado da red para devolver a bola; não é possível jogar ténis sozinho (Cooley, 1927). O mesmo SI passa com o crescimento pessoal e com a dialéctica da compreensão social. DOS ANOS TRINTA AOS ANOS CINQUENTA .}.•]. Há qualquer coisa no trabalho destes dois homens que leva os historiadores da abordagem qualitativa a excluí-los deste domínio. Porém, os académicos de um campo diferente, a psicologia, poderiam incluir estes personagens numa discussão da psicologia qualitativa. Do nosso ponto de vista, não obstante os métodos qualitativos não terem constituído instrumentos populares de investigação durante estas décadas, eles desenvolveram-se e melhoraram. De certa forma, a tradição floresceu; aquilo que essencialmente se modificou foram as pessoas que a utilizavam e os locais onde era utilizada (pelo menos durante os anos trinta e quarenta). À medida que relatamos os acontecimentos desses anos tentaremos permanecer conscientes dos aspectos históricos que são tradicionalmente tomados em consideração pelos sociólogos e antropólogos, bem como aqueles que não o são. O que aconteceu à investigação qualitativa durante algumas décadas, antes de voltar a surgir em força nos finais dos anos sessenta? A influência do departamento de sociologia de Chicago declinou durante os anos trinta, por uma variedade de razões. A Grande Depressão afectou o financiamento dos projectos de investigação e o dinheiro de Laura Spelman Rockefeller, que tinha sido utilizado no financiamento dos estudos da comunidade de Chicago, deixou de estar disponível. A Depressão teve igualmente outro efeito: transferiu a preocupação dos sociólogos pelos imigrantes americanos e outras questões étnicas, preocupação até então dominante na escola de Chicago, para os problemas do desemprego maciço. Desacordos significativos entre os sociólogos americanos relativamente a questões políticas e metodológicas, bem como a reforma ou morte de muitas das figuras principais de Chicago, desempenharam um papel importante neste hiato. (Para uma discussão interessante destas questões, ver Wiley, 1979.) Apesar de tudo isto, os alunos da Escola de Chicago continuaram a desempenhar um papel importante. Particularmente, Everett C. Hughes desenvolveu o campo da sociologia das profissões, tendo os seus alunos se transformado nos líderes da investigação qualitativa durante os anos cinquenta, muitos deles dedicando-se ao estudo de questões educacionais (Becker, Geer, Hughes e Strauss, 1961; Becker, Geer e Hughes, 1968; Geer, 1973). Herbert Blumer criou o termo interaccionismo simbólico em 1937, desenvolvendo-o de forma significativa. A Escola de Chicago também influenciou os antropólogos sociais. Um campo amplamente reconhecido da utilização continuada de abordagem qualitativa foi o trabalho desenvolvido pelos antropólogos sociais, que transportaram os métodos de campo que tinham utilizado no estrangeiro para os estudos conduzidos na cultura americana. Um destes primeiros casos foi o famoso Yankee City Series, conduzido sob a orientação de W. Lloyd Warner, após ter regressado de estudar os aborígenes na Austrália (Warner e Lunt, 1941). Um estudo de monta, este que tentou penetrar na cultura e vida de uma comunidade modema. A investigação iniciou-se em 1930, se bem que os resultados, publicados em seis volumes, só tivessem sido dados à estampa em 1941. Os investigadores de Yankee City reconheceram a sua dívida para com os sociólogos de Chicago 32 _.~-,....~ (Warner e Lundt, 1941, p. 4), explicando que tinham seleccionado como objecto dt estudo uma comunidade pequena, para que não fossem necessárias várias gerações dt investigadores para se alcançar os objectivos: compreender o efeito da comunidade fi( indivíduo, explorar a forma como a comunidade se manifesta através dos seus membro~ individuais e descrever detalhadamente a natureza da comunidade. Uma parte deste estudo debruçou-se sobre a educação em Yankee City, particularmente sobre os aspectm sociais da escolaridade. Outros estudos importantes sobre a comunidade que foram conduzidos durante este período, e que recorreram total ou parcialmente aos métodos qualitativos, foram os estudos dos Lynds sobre Middletown (Lynd e Lynd, 1929, 1937), que tinham partes significativas sobre educação, e o Street Comer Society de Whyte, um estudo sobre a vida entre m homens italianos pobres de Boston (Whyte, 1955). O estudo de Whyte, publicado originalmente em 1943, foi reeditado em 1955, incluindo uma descrição extraordinária da metodologia utilizada". Estes esforços, bem como outros estudos etnográficos da época (Davis e Dollard 1940; Davis, Gardner e Gardner, 1941; Davis e Havighurst, 1947; Dollard, 1937; Hollingshead, 1949), empreenderam aquilo que Charles Horton Cooley considerou o objectivo último das ciências sociais: "Temos como objectivo, presumo, alcançar o significadc humano dos processos inerentes às nossas instituições, na medida em que eles se reflectem nas vidas de homens, mulheres e crianças" (em Stott, 1973). Contudo, não foram sé os sociólogos académicos e os antropólogos que se dedicaram à investigação qualitativa durante este período. A Depressão nos Estados Unidos deu origem a problemas de monta para a maioria dos cidadãos, e muitas pessoas, incluindo aquelas que trabalhavam para as agências governamentais, voltaram-se para a abordagem qualitativa com o objectivo de documentar a natureza e extensão destes problemas. Por exemplo, a Work Projects Administration (WPA) produziu narrativas informativas. These Are Our Lives era composto por biografias orais e por histórias de vida de trabalhadores negros e brancos de três Estados do Sul (Federal Writers' Project, 1939). Os seus autores não eram cientistas sociais; eram escritores que necessitavam de emprego, mas o método utilizado é sociológico. Outros exemplos daquilo que hoje em dia designamos por história oral são: uma história popular da escravatura, uma série de entrevistas com indivíduos que tinham sido escravos, recolhidas em meados dos anos trinta (Botkin, 1945), e ainda um panfleto obscuro, "The Disinheritea Speak: Letrers from Sharecroppers", publicado, em 1937, pela Southern Tenant Farmers' Union (Stott, 1973). Este documento consistia num conjunto de cartas escritas por membros do sindicato e dirigidas aos respectivos delegados, baseando-se no mesmo tipo de documentos que Thomas e Znaniecki (1927) utilizaram no seu monumental estudo, The Polish Peasant in Europe and America. De igual modo, o docümentarismo fotográfico incidindo sobre as dünensões do sofrimento dos americanos sem posses também se desenvolveu (ver, por exemplo, Evans, 1973; Gutman, 1974; e Hurley, 1972) ". Durante este peóodo, os americanos sentiam-se IQE-3 33 1_2 ti,. Uma mãe negra ensinando, em casa, os números e o alfabeto aos seus filhos, 1939 Primeira classe, perto de Montezuma, Geórgia atraídos pela abordagem naturalista na literatura, no jornalismo, na fotografia e na investigação não académica, porque esta documentava de forma personalizada e detalhada o que a Depressão significava para um grande número de americanos - o trabalhador rural do Sul, o trabalhador do Norte e os sem-abrigo de Okie ". Nos anos quarenta, Mirra Komarovsky, uma socióloga que tinha publicado um dos dois estudos qualitativos mais conhecidos sobre a Família e a Depressão (Komarovsky, 1940; ver igualmente Angell, 1936), terminou um estudo sobre as mulheres no ensino superior, que viria a constituir um documento importante para o movimento feminista, no início dos anos setenta. Recorrendo a uma abordagem qualitativa, conduziu oitenta entrevistas em profundidade com mulheres que estudavam no Bamard College e estudou o efeito dos valores culturais nas atitudes das mulheres face aos papéis psicossexuais, sublinhando a dificuldade por elas encontrada na conciliação do "feminino" com o "bem-sucedida" (Komarovsky, 1946). Para a investigação qualitativa, os anos cinquenta pareciam, à primeira vista, continuar negros; contudo, não foi a investigação qualitativa em educação que beneficiou com o Cooperative Research Act. Ainda assim, verificaram-se alguns desenvolvimentos que promoveram e fizeram avançar a investigação qualitativa em educação. Mesmo que a abordagem qualitativa nos anos cinquenta não possa, de modo algum, ser considerada dominante, um conjunto de desenvolvimentos aliaram-se para lhe dar uma alma nova. O trabalho dos antropólogos culturais pode já ser identificado ao longo dos anos cinquenta. O interesse dos antropólogos pela educação aumentou. De novo, recorrendo aos métodos qualitativos, os antropólogos estudaram a educação no início da década de cinquenta" e escreveram sobre o que Philip Jackson (1968) viria a designar, uma décad mais tarde, "o currículo escondido" - as mensagens implícitas sobre socialização, par além das explícitas, que a escola transmite às crianças. Jules Henry importou os método que tinha utilizado no Brasil, Argentina e México para as escolas primárias de Chicag (Henry, 1955b, 1957), articulando-os com o seu interesse relativo ao modo como a pessoas comunicam (Henry, 1955a). É esta a investigação que se encontra na base do se conhecido e popular livro Culture Against Man (Henry, 1963). Durante este período, o antropólogos dedicaram-se a explorar as relações entre as duas disciplinas: realizaran conferências sobre elas (Spindler, 1955), dedicaram-lhe números especiais de revistas, leccionaram sobre tais relações (Mead, 1951; Redfie1d, 1955; Spindler, 1959). Nos anos cinquenta verificaram-se igualmente desenvolvimentos significativos do métodos qualitativos e de trabalho de campo, tanto a nível conceptual como metodológicc Durante o período da "Sociologia de Chicago", as experiências individuais de investigaçã. raramente mereceram publicação. Os próprios procedimentos de trabalho de campo toma ram-se objecto de estudo, à medida que os investigadores qualitativos se tomaram mai introspectivos relativamente às questões metodológicas (ver Becker, 1958; Becker e GeeI 1960; Junker, 1960; Whyte, 1955). A Human Organization, publicação da Society fo Applied Anthropo10gy, voltou a publicar, em 1957, os artigos sobre métodos de campo qUi tinham aparecido na revista nos últimos dezoito a..110S (Adams e Preiss, !960). Os desenvo! vimentos de carácter conceptual avançaram significativamente com a publicação, em 1959 do livro de Erving Goffman, The Presentation of Self in Everyday Life, que examinava o: 34 35 .-------n------'~". _. _<,;.,_: I "; . modos como as pessoas tentam manipular a fonna como os outros as vêem e como estas manobras afectam a realidade social (Goffman, 1959). Goffman designou a sua perspectiva por "dramatúrgica". Outra evolução metodológica importante foi o desenvolvimento da entrevista como uma estratégia central de investigação qualitativa. O American Journal of Sociology devotou-lhe um número especial em 1956 (ver, por exemplo, Benney e Hughes, 1956; Dexter, 1956). Eram descritos os seus diferentes modos de utilização, as vantagens e inconvenientes que oferecia e as diferentes fonnas de que se revestia (ver Hyman, 1954; Jahoda, Deutsch e Cook, 1951; Maccoby e Maccoby, 1954). Além do mais, os sociólogos começaram a tomar em consideração a "entrevista não-directiva", criada pelo psicólogo Carl Rogers para a terapia centrada no cliente (Rogers, 1945, 1951; Whyte, 1960). A mais signiftcativa investigação qualitativa em educação, levada a cabo na década de cinquenta, foi realizada por Howard S. Becker, um aluno de Everett C. Hughes, no departamento de sociologia de Chicago. Becker entrevistou professores de Chicago, com o objectivo de compreender com maior clareza as características das suas carreiras e as perspectivas relativas ao seu trabalho. Três artigos muito conhecidos, e ainda frequentemente citados, tiveram origem nesta investigação de doutoramento (Becker, 1951), e foram publicados no Journal of Educational Sociology (Becker, 1925b e 1953) e no American Journal of Sociology (Becker, 1925a). Um estudo de educação médica que estava destinado a transformar-se num clássico da abordagem qualitativa, Boys in White (Becker et ai., 1961), foi igualmente realizado na década de cinquenta. No retrato que traçava da cultura estudantil médica, os investigadores tomaram seriamente em consideração a noção de perspectiva, uma expressão que faz parte do léxico de palavras-chave dos investigadores qualitativos. Esta investigação era uma tentativa para compreender aquilo que caracterizava a perspectiva dos estudantes de medicina relativamente à escola. Ainda que não se possa afinnar que a abordagem qualitativa fosse "popular" entre os investigadores educacionais da época, ela estava viva e de boa saúde. OS ANOS SESSENTA: UMA ÉPOCA DE MUDANÇA SOCIAL Os anos sessenta chamaram a atenção nacional para os problemas educativos, reavivaram o interesse pela investigação qualitativa e tomaram os investigadores educacionais mais sensíveis a este tipo de abordagem. Até à época, a maioria dos investigadores que utilizavam a abordagem qualitativa no esclarecimento das questões educativas eram académicos treinados em, e pertencentes, outras disciplinas, como a sociologia e a antropologia. Nos anos sessenta, os próprios investigadores educacionais começaram a manifestar interesse por estas estratégias, ao mesmo tempo que as agências estatais começaram a subsidiar a investigação que utilizava métodos qualitativos. 36 Em 1968 já existia um conjunto fonnalizado de investigadores interessados nas aboTl gel1s antropológicas aplicadas à investigação educaciom.ll, que se materializava no COI éü ~n AIrthropology and ÉducatTõ~(Eriékson', 1986). Os anos sessenta foram igualmente uma época de tumulto e mudança soci A atenção dos educadores voltou-se para a experiência escolar das crianças pertence tes a minorias. Uma das razões para este interesse era política: enquanto se veriftcav; tumultos nas cidades e as autoridades procuravam fonnas de evitar futuros protesll associava-se o desempenho escolar deficiente com a afinnação de que os negros recebi; serviços inadequados. Os porta-vozes do movimento dos direitos civis insistiam que e necessário dar a palavra àqueles que eram discriminados. Queria-se saber como eram as escolas para as crianças que não tinham rendiment( muitos educadores queriam ver o tema discutido. Concomitantemente, surgiram vári relatos autobiográficos e jornalísticos relativos à vida nas escolas dos guetos (por exel pio, Decker, 1969; Haskins, 1969; Herndon, 1968; Kohl, 1967; Kozol, 1967). Estes esc tores falavam baseados em conhecimentos em primeira mão, tentando captar a essên< da vida quotidiana das crianças que ensinavam. Reconhecendo o pouco que se sabia sol o processo de escolarização de diferentes grupos de crianças, os programas feder; começaram a subsidiar a investigação relativa a estas questões e que recorria ao que h( designamos genericamente por métodos etnográficos. Os métodos qualitativos de inves gação começavam a ganhar terreno. Um dos maiores projectos subsidiados federalmente foi o Project True, levado a ca em 1963, no Hunter College, e cujo objectivo era o de compreender diferentes aspectos vida nas salas de aula urbanas. Os investigadores basearam-se em entrevistas com dire tores, professores, pais, membros do conselho escolar e membros da comunidade, pa avaliarem o processo de integração na escola (Fuchs, 1966). Recorreram igualmente entrevistas em profundidade para examinar as experiência de novos professores em esc las urbanas (Eddy, 1969; Fuchs, 1969). Utilizaram a observação participante para avali experiências individuais na sala de aula (Roberts, 1971), em escolas primárias (Moo! 1967) e em escolas urbanas integradas no contexto comunitário (Eddy, 1967). Este gru] de sociólogos e antropólogos entendia o seu trabalho como exploratório. Enquan grupo, mantinham a atitude de que a educação tinha fracassado para as crianças m> pobres, de que as cidades estavam em crise e de que estes problemas antigos tinham , ser estudados de fonnas novas. Dois importantes estudos subsidiados iniciaram-se nos anos sessenta e utilizaram un abordagem qualitativa. Um deles incluía um estudo comparativo das escolas urbanas foi realizado pela famosa antropóloga Eleanor Leacock (1969). Este trabalho, que viria transfonnar-se num clássico sobre os efeitos da escola e das expectativas dos professor nas vidas das crianças; constitui, tal como o trabaUlo de Becker na década a..Tlteriof, un referência tanto para os sociólogos como para os antropólogos. O outro estudo que uti zou métodos de trabalho de campo incidiu sobre questões raciais na educação, em escol 37 "~~_"" _ ';:;;h _ ----1---. primárias de St. Louis, e foi dirigido por Jules Henry (ver Gouldner, 1978; Rist, 1970, 1973). Foi em função da sua participação neste projecto que Ray Rist, um importante investigador qualitativo em educação, iniciou as suas investigações. A audiência para a investigação qualitativa em educação cresceu na década de sessenta. Não se encontrando ainda firmemente estabelecido como um paradigma legítimo de investigação, o seu estatuto causou múltiplos problemas aos alunos que o pretendiam utilizar no seu trabalho. Mas as abordagens qualitativas provocavam entusiasmo. Quais as razões para a abordagem qualitativa em educação ter começado a sair de um longo período de hibernação neste preciso período histórico? Podemos apreciar algumas delas. Em P!imeiro lugar, os tumultos sociais da época indicavam claramente que não se sabia o sufici~ntesobre o modo como os alunos experimentavam a escola. Diversos relatos expunham publicamente, em termos de educação, o mesmo que o jornalismo de investigação tinha exposto, no século dezanove, relativamente às condições de vida sociais: desconhecemos o modo como vive grande parte da população. Eram necessárias descrições esclarecedoras. Alguns investigadores pretendiam começar por observar a vida quotidiana nas escolas e entrevistar os professores de melhor reputação (McPherson, 1972). A descrição qualitativa estava na ordem do dia. Em segundo lugar, os métodos qualitativos ganharam popularidade devido aoreconhecimento que emprestiVãmà~persIYectivas dos mais desfavorecidos e excluídos socialmente - os que se encontravam "do outro lado". A ênfase qualitativa na importância das perspectivas de todos os intervenientes num contexto desafia o que tem sido designado por "hierarquia de credibilidade" (Becker, 1970c): a ideia de que as opiniões e perspectivas daqueles que se encontram em posições de comando são mais valiosas do que as dos outros. Como parte integrante de um processo de investigação típico, os investigadores qualitativos que estudam a educação solicitavam a opinião daqueles que nunca eram valorizados ou representados. Os métodos de investigação qualitativa representavam o espírito democrático em ascendência na década de sessenta. O clima da época era propício ao renovar do interesse pelos métodos qualitativos, assim, surgiu a necessidade de professores experientes neste tipo de metodologia de investigação, abrindo-se caminho a inovações e desenvolvimentos metodológicos. Não era exclusivamente o clima político da época que era propício. A sociologi~.~ª antropologia, enquanto disciplinas académicas, também se encontravam em modificaçãg. Os antropólogos constataram que um menor número de comunidades do Terceiro Mundo estavam na disposição de se submeterem a ser investigadas; consequentemente, os financiamentos diminuíram. O número de povos que não tinham sido afectados de forma significativa pelos contactos com o mundo ocidental tinha diminuído, sabotando o empreendimento de descrever as diferentes culturas do mundo antes de serem "estragadas". Progressivamente, os antropólogos viraram-se para o estudo das áreas urbanas na sua própria cultura. Na década de sessenta, o campo da sociologia, que tinha sido dominado pelas ideias da teoria estrutural-funcional durante vinte anos, começou a virar-se para os escritos dos Mesmo que a investigação qualitativa ainda não tivesse atingido a idade adulta, . estava a sair da adolescência. Menos suspeitas para os investigadores educacionais, observação participante e, particularmente, a etnografia ganhavam um número crescen de adeptos. Na década de sessenta, a perspectiva qualitativa era ainda marginal em edl cação, só praticada pelos mais heterodoxos. No início dos anos setenta, ainda que ( métodos qualitativos não fossem, de modo algum, os dominanies~]á não podiam ser vi: tos como marginais. As agências federais de financiamento, tais como o National Inst 'tine ófEducation, manifestaram um enorme interesse por propostas que fizessem uso d~ abordagens qualitativas, apoiando investigações qualitativas de carácter avaliativo. Verificou-se, nas comunicações apresentadas em associações profissionais, como American Educational Research Association, um aumento das que recorriam aos métodc qualitativos, tendo estes métodos obtido um reconhecimento crescente em campos como illYt~!i~gJ!valiativa (ver Guba, 1978; Patton, 1980). Contudo, pfõs~'ttetmtes"metCldotógtêÓsentre os investigadores quantitativc e qualitativos. Defensores de todas as perspectivas participaram nas discussões: "qualité tivos" versus "quantitativos", "jornalismo" versus "investigação" e "científico" versu "intuitivo". Verificou-se uma mudança de atitude dos investigadores quantitativos relati vamente à investigação qualitativa, que passou de desdém para "détente" (Rist, 1977). A tensões entre os investigadores qualitativos e quantitativos diminuíram na sua expressãe Dc facto, iüStaurou-se um clima de diálogo entre os dois grupos. Alguns investigadore que ocupavam posições de grande proeminência nos círculos quantitativos começaram explorar a abordagem qualitativa e a defender a sua utilização (i.e., Bronfenbrenner, 197(' 38 39 --L'~I'$ - fenomenologistas. Grupos de investigadores começaram a praticar o que viria a ser c nhecido por etnometodologia. Outros autores organizaram-se à volta da tradição já estat lecida da jrrtera:cçiiüsimb6lica. O interesse pelos métodos qualitativos foi estimulado pé publicação-de Um" conjunto de livros sobre teoria e métodos. The Human Perspective Sociology (Bruyn, 1966) apresentava as bases filosóficas e metodológicas da observaç; participante, enquanto que The Discovery ofGrounded Theory (Glaser e Strauss, 196 apresentava o processo de reco-lha ariáíísé de"clado~descritivos como base para elabor t~Qfiª, esforços que ilustravam claramente o facto da investigação qualitativa não se lirr tar a ser uma actividade meramente descritiva. Foram igualmente publicadas colectâne de artigos detalhados, relativos a questões mais específicas (Filstead, 1970; McCall Simmons, 1969). Desenvolveu-se uma audiência para aqueles que escreviam com ba na abordagem qualitativa, tendo aumentado significativamente o número de artigos qual tativos (Bogdan e Taylor, 1975; Carini, 1975; Denzin, 1987; Georges e Jones, 198' Schwartz e Jacobs, 1979; Wolf, 1979). e OS ANOS SETENTA: INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO, A DIVERSIDADE 1__.....:. Campbell, 1978; Cronbach, 1975; Glass, 1975). Grande número de investigadores educacionais começaram a sentir que as promessas da investigação quantitativa relativamente às suas possibilidades (os problemas que conseguia resolver) tinham atingido o limite. Os métodos quantitativos, baseados no paradigma científico tradicional, não tinham cumprido. Com a flexibilização das atitudes, as abordagens qualitativas apoderaram-se da imaginação das pessoas (ver Scriven, 1972). Desta forma, a investigação qualitativa explodiu em educação. Efectuar revisões de literatura, até à data uma tarefa relativamente simples, tomou-se cada vez mais complexo, devido parcialmente à diversidade crescente de métodos, estilos e assuntos. Alguns investigadores qualitativos em educação efectuaram "trabalho de campo" observação participante, entrevistas em profundidade ou etnografia - despendendo grandes quantidades de tempo nos locais de investigação e com os sujeitos ou documentos de investigação. Registaram os seus apontamentos por escrito como modo de preservar os dados a analisar, incluindo grande quantidade de descrições, registos de conversas e diálogos. A investigação educacional possui muitos exemplos deste tipo. As observações em escolas deram origem, por exemplo, a estudos sobre integração racial (Metz, 1978; Rist, 1978), a vida de um director de escola (Wolcott, 1973), a experiência de professores em escolas rurais (McPherson, 1972) e inovações na escola (Sussmann, 1977; Wolcott, 1977). Os investigadores educacionais também utilizaram a entrevista em profundidade para estudar as crianças excluídas da escola (Cottle, 1976a), o sistema de transportes escolares (Coule, 1976b), e os papéis das mulheres como dirigentes educativos (Schmuck, 1975). Contudo, alguns investigadores educacionais sentiram que os estudos de campo convencionais eram "demasiadamente descritivos" (Mehan, 1978) ou que a investigação etnográfica deveria assumir uma atitude mais "empírica" nos estudos sobre a escola (McDermott, 1976). Estes investigadores pertenciam a um grupo que defendia o que pode ser designado como uma abordagem mais empirista ao estudo das interacções humanas. Consequentemente, a "etnografia constitutiva" utilizava o vídeo e o filme como suportes de registo dos actos e gestos das pessoas (Mehan, 1978, 1979). Os investigadores que utilizavam este tipo de abordagem estavam preocupados com o facto de, frequentemente, as descrições dos observadores reflectirem mais as noções destes do que as dos participantes, e também com o facto dos participantes não serem capazes de comunicar suficiente informação ao investigador (Florio, 1978). Portanto, tornava-se mais adequado a gravação mecânica dos acontecimentos. Investigadores que trabalharam neste registo foram Erickson (1975) e o sociolinguista Shuy (Shuy e Griffin, 1978; Shuy, Wolfram e Riley, 1967). Ainda assim, estas abordagens variavam no respectivo grau de intrusão e no modo como eram estruturadas. Variava igualmente o modo como a investigação era conduzida e apresentada. Uma diferença estilística residia na tensão entre as abordagens à investigação, cooperativa versus conflituosa. Os autores que defendiam a perspectiva cooperativa defendiam que os investigadores de campo deveriam ser o mais autênticos possível com os sujeitos que 40 ·.·.. .·. ~---- estudavam. Agarravam-se à crença básica e optimista de que as pessoas facilitaria! investigação sempre que lhes fosse possível. Os seguidores desta perspectiva eram aq les que se consideravam herdeiros da Escola de Chicago (ver Bogdan e Taylor, 19~ Por sua vez, os defensores da perspectiva conflituosa entendiam que muitos sujei teriam vontade de encobrir os seus comportamentos reais; os defensores da autenticid e da investigação aberta obteriam menos informação. Particularmente se pretende penetrar no mundo dos grandes negócios, do crime organizado ou de grupos considera, desviantes, o investigador deveria ser circunspecto e não ser autêntico na justificação sua presença. Esta perspectiva era claramente defendida por Douglas (1976). Outra diferença estilística residia na atitude do investigador relativamente aos ini madores ou sujeitos a investigar. Determinado grupo, igualmente herdeiro da Escola Chicago, pode afirmar-se ter tido uma perspectiva "empática"; ou seja, defendia a sim tia e a compreensão face às pessoas estudadas. Deste modo, muitas das suas publicaç patenteavam a humanidade de vidas que, à primeira vista, pareciam destituídas de senti Os defensores desta perspectiva eram, de facto, acusados de se identificarem excessi mente com aqueles que estudavam, quer se tratasse de indivíduos desviantes, margir ou pessoas influentes. No outro extremo deste contínuo encontravam-se aqueles c posição parecia reflectir a noção de que "a sociologia do que quer que fosse era ridícuj Esta perspectiva é claramente reflectida no grupo designado por etnometodólogos (, por exemplo, Garfinkel, 1967; Mehan e Wood, 1975). Os etnometodólogos estudaVa! modo como as pessoas geriam os rituais diários das suas vidas, deixando, com algu frequência, os sentimentos delas de lado. A etnometodologia é uma abordagem relativamente nova à investigação qualitati cujas bases podem ser atribuídas aos filósofos fenomenologistas. Harold Garfin (1967) e os seus colegas utilizaram esta metodologia e cunharam o termo, em meados década de cinquenta. Durante as décadas de sessenta e de setenta, tanto a abordag como a expressão cresceram em popularidade, mas as pessoas não tinham a certeza estarem a falar da mesma coisa. Garfinkel, referindo-se às confusões sobre a expres em 1968, afirmou: "Penso que, na realidade, o termo pode ser errado. Adquiriu uma v própria" (Hill e Crittenden, 1968). Apesar de estar a aumentar em popularidade, não ( xava de estar igualmente sob ataque. Os académicos discutiam se se tratava de algo, dadeiramente diferente das outras abordagens, tal como a interacção simbólica. Os al res que escreviam dentro desta orientação eram criticados por serem obscuros nos s' escritos e utilizarem um estilo esotérico (Coser, 1979). Além do mais, alguns dos se~ dores da etnometodologia tinham tendência para utilizar técnicas de recolha de dados ( eram consideradas irreverentes em termos éticos, manifestando falta de preocupação c o sofrimento das pessoas. Tal facto levou a uma atitude de antagonismo por parte I praticantes mais tradicionais da investigação qualitativa, muitos dos quais utilizavam u abordagem humanista na investigação e tinham uma posição política de carácter liberal 41 21_!- - i i OS ANOS OITENTA E NOVENTA: COMPUTADORES, FEMINISMO E A INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA PÓS-MODERl' ...~ Margaret Mead em Samoa, 1925, com 24 anos de idade, acompanhada pela filha de um chefe local. Estava no início dos seus famosos trabalhos de campo. 42 Muitas das questões debatidas pelos investigadores educacionais na década de setel permaneceram como tópicos fulcrais na década de noventa. Os teóricos da educaç ainda discutem sobre as diferenças entre a investigação quantitativa e qualitativa e se duas podem e devem ser articuladas (Smith, 1983; Stainback e Stainback, 1985; Ho\ 1988; Firestone, 1987; Smith e Heshusius, 1986). Permanecem, de igual modo, algun tendências. Nos anos oitenta, o número de publicações para artigos qualitativos aum( tou. Também na década de oitenta e, presentemente, na de noventa, se verificol aumento desta tendência. Surgiu uma nova revista, exclusivamente dedicada à publicaç de investigação qualitativa em educação (International Journal for Qualitative Studies Education) e várias editoras livreiras iniciaram séries de livros com uma preocupaç semelhante (Transaction Press, Falmer Press, Sage Publications). Desde o académi American Educational Research Journal até à revista de grande tiragem Phi De Kappan, os responsáveis pelas publicações periódicas de educação solicitam activame a apresentação de manuscritos baseados em investigação qualitativa. Persiste a tendên de alguns autores que praticam investigação qualitativa em educação para tomar mais f mal a análise de dados (e.g., Miles e Huberman, 1984), ainda que esta esteja em confl com a posição de alguns pós-modernos que defendem uma abordagem mais criati aberta e "experimentalista" na escrita e análise de dados. Para além deste prolongamento de questões das décadas passadas, observaram-se t últimos quinze anos modificações importantes e novos desenvolvimentos na investigaI qualitativa em educação. Uma inovação significativa, de carácter mais técnico do que CI ceptual, foi a utilização do computador na recolha, gestão e análise dos dados qualitati' ("Computers and Qualitative Data", 1984; Clarck, 1987; Pfaffenberger, 1988; Shell: Sibert, 1986; ver igualmente os escritos de Gerson sobre computadores nos números 19: -1988 de Qualitative Sociology). Antes da década de oitenta muito pouco se tinha fê neste domínio. Hoje em dia, os investigadores qualitativos registam os seus apontamen em processadores de texto, muitos deles utilizando um dos vários bons programas exist, tes (Ethnograph, TAP, Qualpro; QUALOG é um conjunto de programas de mainframe I lizados para análise) para ordenar os muitos parágrafos de dados produzidos num estl qualitativo. Sendo este tipo de tecnologia particularmente importante para projectos larga escala, também não o deixa de ser para muitos esforços individuais, para os quais capacidades de muitos programas são essenciais. Discutiremos este tipo de inovações m detalhadamente no capítulo sobre análise de dados. A teoria e prática feministas também influenciaram, de várias formas, a investigaI qualitativa na década de oitenta. Em primeiro lugar, o feminismo influenciou o tipo sujeitos que os investigadores qualitativos (feministas) estudaram. Os papéis psicossexu emergiram como um tópico central em muitos projectos qualitativos de investigaç (Warren, 1988). Recorrendo à observação participante, à análise de documentos, à inv 43 . . :.....---------_1.....,_ _• ._~._ ~_.'" Rosalie Wax na reserva de Pine Ridge, Dakota do Sul, 1963, com os membros da família Sioux de que fala em Doing Fieldwork. tigação sobre histórias de vida e às entrevistas em profundidade, os investigadores qualitativos tomaram seriamente em consideração actores sociais e categorias de comportamento previamente ignorados. O feminismo afectou o conteúdo das investigações à medida que os investigadores iam estudando a forma como os papéis psicossexuais influenciavam a construção do mundo, enquanto professoras do sexo feminino (Biklen, 1987, 1985, no prelo; Middleton, 1987; Acker, 1989; Weiler, 1988), providenciadoras de sustento (DeVault, 1990), estudantes em subculturas femininas punk (Roman, 1988), leitoras de novelas (Radway, 1984) e consumidoras e intérpretes de conhecimento médico sobre o corpo e a reprodução (Martin, 1987). As feministas tivera.rn um papel importarlte enquanto impulsionadoras da investigação sobre as emoções e os sentimentos (Hochschild, 1983). As investigadoras feministas nas ciências sociais foram atraídas pelos métodos 44 .--.----.-----.--I-i.-a~ qualitativos porque estes possibilitavam que as interpretações das mulheres assumis~ uma posição central. Em segundo lugar, o feminismo afectou igualmente as questões metodológic Alguns destes efeitos surgiram do questionar geral sobre a natureza dos métodos de im tigação feministas nas ciências e nas ciências sociais (e.g., Harding, 1987), mas a prá também promoveu mudanças. Por exemplo, Oakley (1981) centrou-se sobre a questãc poder na relação de entrevista. Smith (1987) desenvolveu a "etnografia institucior como uma estratégia feminista de investigação, para desenvolver uma sociologia pan mulheres em vez de uma sociologia de homens. Para muitos, a questão mais importe era a de saber se as modificações trazidas pelo feminismo à metodologia eram tão absc tas e significativas que tinham modificado o método ao ponto de ser mais adequo designá-lo por feminista e já não qualitativo. Para outros, a questão mais importante ti que ver com a prática metodológica; ou seja, como é que o feminismo influencia o ID< como a investigação é feita. Discutiremos algumas destas questões no capítulo III. Independentemente da forma que utilizemos para abordar a intersecção do femini~ com a investigação qualitativa, as influências mútuas são sempre muito significativas. feministas contribuíram para que no campo se se passasse a preocupar mais com as r ções que os investigadores estabelecem com os seus sujeitos (DeVault, 1990), bem cc para um aumento do reconhecimento das implicações políticas da investigação. Rivalizando em importância com os contributos do feminismo para a investiga qualitativa nas décadas de oitenta e noventa - nalguns casos como aliado e noutros cc opositor - encontram-se os contributos dos sociólogos e antropólogos pós-moder (Marcus e Cushman, 1982; Marcus e Fisher, 1986; Clifford, 1983, 1988; Clifford e 1\ cus, Van Maanen, 1988; Denzin, 1989). O pós-modernismo (também designado por r -estruturalismo e desconstrucionismo) representa uma posição intelectual que reivindic facto de vivermos num período "pós"-moderno, um tempo histórico real que difere modernismo. Durante o modernismo, tentava-se explicar a condição humana e o r gresso pela crença nas virtudes do racionalismo e da ciência, pela ideia de um "eu" e vel, consistente e coerente e pelo recurso a abordagens positivistas do conheciment crenças que se tinham mantido firmes no Ocidente desde a "época das luzes". Por vez, os pós-modernistas defendem que este tipo de fundamentos já não faz sentido. A nuclear afastou a possibilidade do progresso humano baseado no racionalismo e lev01 pessoas, em muitas áreas da vida humana, a questionar a integridade do progresso. arquitectura, a arte, a moda e as produções académicas, todas elas foram tocadas pelo! -modernismo. Os pós-modernistas defendem só ser possível conhecer algo tendo como referêl uma determinada perspectiva. Tal posição desafia a possibilidade de alcançar a verd através do adequado, ou seja, científico uso da razão. Não é possível raciocinar ou ( ceptualizar para além da localização do eu num contexto histórico-social específico; d forma, esta perspectiva enfatiza a interpretação e a escrita como características centrai 45 .JI•._a .:di investigação. Por exemplo, Clifford e Marcus (1989) chamaram à sua colectânea sobre a poética e política da etnografia Writing Culture. Uma das principais influências do pós-modernismo nas metodologias qualitativas foi a modificação no entendimento da natureza da interpretação e no papel do investigador qualitativo como um intérprete. Ao invés de entenderem o material escrito - textos, manuscritos, artigos e livros - pelo seu valor facial, os investigadores qualitativos pós-modernos tomaram-no como objecto de estudo. Os pós-modernos tomam problemático o entendimento de determinado trabalho como "científico", reflectindo sobre quais as convenções e atitudes que fazem determinada forma de entender um trabalho, o discurso da ciência, científico. Examinaremos as implicações desta posição em maior detalhe, no capítulo VI. O pós-modernismo comenta e critica à medida que o conhecimento se constrói. Esta grande diversidade entre os investigadores qualitativos que se dedicam a estudar as questões educacionais reflecte a maturidade e sofisticação crescentes da abordagem. Contudo, apesar das diferenças serem reais, existem pontos comuns nos diferentes registos qualitativos. Na secção seguinte procedemos à listagem destas características comuns. Características da investigação qualitativa launs investiaadores movimentam-se nas escolas munidos de blocos de aponto to to mentos para registarem os dados. Outros recorrem ao equipamento vídeo na sa de aula e não seriam capazes de conduzir uma investigação sem ele. Outros ainc elaboram esquemas e diagramas relativos aos padrões de comunicação verbal entre alun( e professores. No entanto, todos eles têm em comum o seguinte: o seu trabalho corre ponde à nossa definição de investigação qualitativa e incide sobre diversos aspectos ( vida educativa. Na presente secção vamos reflectir sobre os pontos comuns e mostro que, apesar das diferenças, todas ~nvestigações caem na rubrica da investigação qual tativa. Tal como a definimos, a investigação qualitativa possui cinco características. Nel todos os estudos que consideraríamos qualitativos patenteiam estas características COJ igual eloquência. Alguns deles são, inclusivamente, totalmente desprovidos de uma c mais das características. A questão não é tanto a de se determinada investigação é ou ni' totalmente qualitativa; trata-se sim de uma questão de grau. Como referimos anterio mente, os estudos que recorrem à observação participante e à entrevista em profundida( tendem a ser bons exemplos. A \. Na investigação qualitativa a fonte directa de dados é o ambiente natural, const tuindo o investigador o instrumento principal. Os investigadores introduzem-se e despel dem grandes quantidades de tempo em escolas, famílias, bairros e outros locais tentand elucidar questões educativas. Ainda que alguns investigadores utilizem equipament vídeo ou áudio, muitos limitam-se exclusivamente a utilizar um bloco de apontamentos um lápis. Contudo, mesmo quando se utiliza o equipamento, os dados sã recolhidos em situação e complementados pela informação que se obtém através do COI 46 ... -w- ..--..- - - -..'*';.... - 47 I -__• tacto directo. Além do mais, os materiais registados mecanicamente são revistos na sua totalidade pelo investigador, sendo o entendimento que este tem deles o instrumento-chave de análise. Por exemplo, num importante estudo sobre educação médica, os investigadores trabalharam numa escola médica, na qual seguiam os alunos para as aulas, laboratórios, enfermarias e outros locais utilizados para situações de encontros sociais: refeitórios, lares e salas de estudo (Becker et ai., 1961). Num estudo sobre estratificação educacional na Califórnia (Ogbu, 1974), foram necessários 21 meses para que o autor fosse capaz de completar o trabalho de campo: visitas, observações e entrevistas a professores, alunos, directores, famílias e diferentes membros da gestão escolar. Os investigadores qualitativos frequentam os locais de estudo porque se preocupam com o contexto. Entendem que as acções podem ser melhor compreendidas quando são observadas no seu ambiente habitual de ocorrência. Os locais têm de ser entendidos no contexto da história das instituições a que pertencem. Quando os dados em causa são produzidos por sujeitos, como no caso de registos oficiais, os investigadores querem saber como e em que circunstâncias é que eles foram elaborados. Quais as circunstâncias históricas e movimentos de que fazem parte? Para o investigador qualitativo divorciar o acto, a palavra ou o gesto do seu contexto é perder de vista o significado. Como escreveu determinado antropólogo: "Se a interpretação antropológica consiste na construção de uma leitura dos acontecimentos, então, divorciá-Ia do que se passa - daquilo que em determinado momento espácio-temporal pessoas particulares afirmam, fazem, ou sofrem, de entre a vastidão de acontecimentos do mundo - é o mesmo que divorciá-Ia das suas aplicações, tornado-a oca. Uma boa interpretação do que quer que seja - um poema, uma pessoa, uma história, um ritual, uma instituição, uma sociedade - conduz-nos ao coração daquilo que pretende interpretar." (Geertz, 1973) Quer os dados sejam recolhidos sobre interacções na sala de aula, utilizando equipamento vídeo (Florio, 1978; Mehan, 1979), sobre educação científica, recorrendo à entrevista (Denny, 1978a), ou ainda sobre a desagregação, mediante observação participante (Metz, 1978), os investigadores qualitativos assumem que o comportamento humano é significativamente influenciado pelo contexto em que ocorre, deslocando-se, sempre que possível, ao local de estudo. 2. A investigação qualitativa é descritiva. Os dados recolhidos são em forma de palavras ou imagens e não de números. Os resultados escritos da investigação contêm citações feitas com base nos dados para ilustrar e substanciar a apresentação. Os dados incluem transcrições de entrevistas, notas de campo, fotografias, vídeos, documentos pessoais, memorandos e outros registos oficiais. Na sua busca de conhecimento, os investigadores qualitativos não reduzem as muitas páginas contendo narrativas e outros dados a símbolos numéricos. Tentam analisar os dados em toda a sua riqueza, respeitando, tanto quanto o possível, a forma em que estes foram registados ou transcritos. ~ Os relatórios e artigos qualitativos têm sido classificados por alguns autores co "anedóticos". Isto porque contêm frequentemente citações e tentam descrever, de fOI narrativa, em que consiste determinada situação ou visão do mundo. A palavra esc assume particular importância na abordagem qualitativa, tanto para o registo dos da, como para a disseminação dos resultados. Ao recolher dados descritivos, os investigadores qualitativos abordam o mundo forma minuciosa. Muitos de nós funcionamos com base em "pressupostos", insensÍ\ aos detalhes do meio que nos rodeia e às presunções que nos guiam. Não é raro passaI despercebidas coisas como os gestos, as piadas, quem participa numa conversa, a decc ção de uma sala e aquelas palavras especiais que utilizamos e às quais os que nos rodei respondem. A abordagem da investigação qualitativa exige que o mundo seja examinado cor ideia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista que nos I mita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do nosso objecto de estudo. investigador coloca constantemente questões como: Por que é que estas carteiras e~ arrumadas desta maneira? Por que é que algumas salas estão decoradas com gravun outras não? Por que é que determinados professores se vestem de maneira diferente outros? Há alguma razão para que determinadas actividades ocorram em determin; local? Por que é que há uma televisão na sala se nunca é utilizada? Nada é consider como um dado adquirido e nada escapa à avaliação. A descrição funciona bem cc método de recolha de dados, quando se pretende que nenhum detalhe escape ao escrutín 3. Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simp mente pelos resultados ou produtos. Como é que as pessoas negoceiam os significad Como é que se começaram a utilizar certos termos e rótulos? Como é que determina noções começaram a fazer parte daquilo que consideramos ser o "senso comum"? Qu história natural da actividade ou acontecimentos que pretendemos estudar? Por exemJ em estudos relativos ao ensino integrado nas escolas, os investigadores estudaram meiro as atitudes dos professores para com determinadas crianças, estudando poster mente o modo como tais atitudes eram traduzidas nas interacções diárias e como e: representavam as atitudes iniciais (Bruni, 1980; Rist, 1978). Em entrevistas com admil tradores escolares e candidatos a posições administrativas, determinado investigador rr trou o modo como as atitudes que reflectiam baixas expectativas, medos sexuais e ou' estereótipos relativamente às mulheres se traduziam no processo de contratai (Schmuck, 1975). A ênfase qualitativa no processo tem sido particularmente útil na investiga educacional, ao clarificar a "profecia auto-realizada", a ideia de que o desempel cognitivo dos alunos é afectado pelas expectativas dos professores (Rosenthal e Jacob~ 1968). As técnicas quantitativas conseguiram demonstrar, recorrendo a pré e pós-tes que as mudanças se verificam. As estratégias qualitativas patentearam o modo come expectativas se traduzem nas actividades, procedimentos e interacções diários. ~ G . _._ . _._ . _._. _.-1.,.". ---------__1 • exemplo particularmente significativo da "profecia de auto-realização" numa sala de aula de um jardim-escola é-nos dado por um estudo de observação participante realizado com crianças afro-americanas, em SI. Louis. Nos primeiros dias de aulas, as crianças foram divididas em grupos estabelecidos essencialmente com base em critérios socioeconómicos. A professora interagia mais com o grupo de nível mais elevado, dava-lhes mais privilégios e até lhes permitia disciplinarem o grupo mais desfavorecido. O processo de interacção diária encontra-se detalhadamente descrito (Rist, 1970). Este tipo de estudo foca-se no modo como as definições (as definições que os professores têm dos alunos, as definições que os alunos têm de si próprios e dos outros) se formam. 4. 05 investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva. Não recolhem dados ou provas com o objectivo de confirmar ou infirmar hipóteses construídas previamente; ao invés disso, as abstracções são construídas à medida que os dados particulares que foram recolhidos se vão agrupando. Uma teoria desenvolvida deste modo procede de "baixo para cima" (em vez de "cima para baixo"), com base em muitas peças individuais de informação recolhida que são inter-relacionadas. É o que se designa por teoria fundamentada (Glaser e Strauss, 1967). Para um investigador qualitativo que planeie elaborar uma teoria sobre o seu objecto de estudo, a direcção desta só se começa a estabelecer após a recolha dos dados e o passar de tempo com os sujeitos. Não se trata de montar um quebra-cabeças cuja forma final conhecemos de antemão. Está-se a construir um quadro que vai ganhando forma à medida que se recolhem e examinam as partes. O processo de análise dos dados é como um funil: as coisas estão abertas de início (ou no topo) e vão-se tornando mais fechadas e específicas no extremo. O investigador qualitativo planeia utilizar parte do estudo para perceber quais são as questões mais importantes. Não presume que se sabe o suficiente para reconhecer as questões importantes antes de efectuar a investigação. esperança de encontrar pontos comuns, com o objectivo de explorar as suas impli~açi para a escolarização. Ao apreender as perspectivas dos participantes, a investIgaç qualitativa faz luz sobre a dinâmica interna das situações, dinâmica esta qUl frequentemente invisível para o observador exterior. Os investigadores qualitativos fazem questão em se certificarem de que estão a aprel der as diferentes perspectivas adequadamente. Alguns investigadores que fazem uso vídeo mostram as gravações feitas aos participantes para compararem as suas interpre ções com as dos informadores (Mehan, 1978). Outros investigadores po~e~ most: rascunhos de artigos ou transcrições de entrevistas aos informadores pnnclpaIs. Am outros podem conferir verbalmente as suas perspectivas com as dos sujeitos. (Gra 1988). Ainda que se verifique alguma controvérsia relativamente a estes procedlment' eles reflectem uma preocupação com o registo tão rigoroso quanto o possível do mo como as pessoas interpretam os significados. /~ Os investigadores qualitativos em educação estão continuamente a questionar os suj \ tos de investigação, com o objectivo de perceber "aquilo que eles exp~ri~entam, o me i como eles interpretam as suas experiências e o modo como eles propnos estruturan mundo social em que vivem" (Psathas, 1973). Os inve§.tigadores qlJillitativos estabeleco L. estratégias e procedimentos que lhes permitam torna;:'em consideração aS eXpenéiícias ponrÓ<févista do informador. O processo de condução de investigação qualitativa refle uma espécie de diálogo entre os investigadores e os respectivos sujeitos, dado estes r serem abordados por aquele_uk.!1fi1aforma neutra. I ~- _.-~------'.---.--- .... ----_.... ,'- ~---_. 5. O sigmficado é de importância vira/na abordagem qualitatim. Os investigadores que fazem uso deste tipo de abordagem estão interessados no modo como diferentes pessoas dão sentido às suas vidas. Por outras palavras, os investigadores qualitativos preocupam-se com aquilo que se designa por perspectivas participantes (Erickson, 1986; ver Dobbert, 1982, para uma perspectiva ligeiramente diferente). Centram-se em questões tais como: Quais as conjecturas que as pessoas fazem sobre as suas vidas? O que consideram ser "dados adquiridos"? Por exemplo, em determinado estudo educacional o investigador centrou parte do seu trabalho sobre as perspectivas parentais sobre a educação dos seus filhos. Pretendia saber quais as opiniões dos pais sobre as razões para os filhos não terem bom rendimento escolar. Descobriu que os pais que faziam parte do campo de estudo sentiam que os professores não valorizavam as suas opiniões sobre os seus próprios filhos, dada a sua pobreza e a sua falta de escolaridade. Os pais acusavam igualmente os professores que consideravam que estes factores significavam necessariamente que os seus filhos não iam ser bons alunos (Ogbu, 1974). Estudou igualmente as perspectivas dos professores e dos alunos sobre as mesmas questões, na 50 -_._...--l:-+",'_4I"..- 51 ;l • perspectiva fenomenológica. Há muitos debates relativos ao uso da palavra fenomenologi escolhemos, contudo, utilizá-la no seu sentido mais amplo. Iniciámos a discussão sob: fundamentos teóricos apresentando a perspectiva fenomenológica e clarificando alguml das questões que ela levanta. Seguidamente, discutimos o interaccionismo simbólico, urr forma típica e bem estabelecida da perspectiva fenomenológica. A "cultura" enquant orientação, cuja interpretação é o trabalho de muitos antropólogos, é o tópico de discussii seguinte. Seguidamente, apresentámos de forma breve uma abordagem qualitativa recent, a etnometodologia. Descrevemos também um paradigma teórico alternativo, os estude culturais. Este conjunto de tópicos não esgota o universo. Seleccionámos os mai amplamente utilizados e que mais próximos se encontram da fenomenologia. II A ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA A maioria das outras tradições de investigação encontra as suas origens no positivismo e no grande teórico social, Augusto Comte. Enfatizam os factos e as causas do comportamento. Ainda que se possam encontrar diferenças teóricas entre as abordagens qualitativas e mesmo dentro de uma única escola (Gubrium, 1988; Meltzer, Petras e Reynolds, 1975), a maioria dos investigadores qualitativos identificam-se, de uma ou de outra forma, com a No local de um acidente automóvel verificou-se um diálogo que ilustra duas das aba dagens que as pessoas utilizam para compreender o que se passa à sua volta. Num cruz; mento em que todas as ruas tinham sinais de stop, verificou-se a colisão de dois autom! veis. Os condutores estavam a discutir o que se tinha passado quando chegou um políc ao local. Um dos condutores afirmou que o outro não tinha parado no stop, ao que segundo retorquiu que não só tinha parado como tinha mesmo prioridade. Uma testeml nha relutante foi chamada a depor por um dos intervenientes e, ao prestar testemunh, afirmou que era muito difícil relatar aquilo que se tinha exactamente passado do sítio eJ que se encontrava. Ouviram-se frases tais como "como é possível que diga isso? ""factos sao - factos, voce nao paro ui" "passou-se mesmo à frente dos seus olhos, . , "voe estava mas era a olhar para o outro lado". Perguntou-se ao polícia como é que costuma\ resolver estes relatos conflituosos. A sua resposta foi a de que a contradição está sempre verificar-se e que as pessoas envolvidas na discussão não estavam necessariamente faltar à verdade, porque "tudo depende do ponto em que nos encontramos, da nossa per pectiva". A abordagem que o polícia assumiu para lidar com a situação reflecte as abord; gens qualitativas que se baseiam na perspectiva fenomenológica. Fazem uso de UI conjunto de asserções que diferem das que se utilizam quando se estuda o comportamenl humano com o objectivo de descobrir "factos" e "causas". Os investigadores fenomenologistas tentam compreender o significado que e acontecimentos e interacções têm para pessoas vulgares, em situações particulares.. sociologia fenomenológica foi particularmente influenciada pelos filósofos Edmun Husserl e Alfred Schutz. Coloca-se igualmente na tradição weberiana, que enfatiza "verstehen", a compreensão interpretativa das interacções humanas. Os fenomenologist: não presumem que conhecem o que as diferentes coisas significam para as pessoas ql vão estudar (Douglas, 1976). "A investigação fenomenológica começa com o silêncie (Psathas, 1973). Este "silêncio" é uma tentativa para captar aquilo que se estuda. Des modo, aquilo que os fenomenologistas enfatizam é o componente subjectivo c 52 53 Fundamentos teóricos A preocupação que os investigadores qualitativos têm com o "significado", bem como com as outras características que descrevemos como típicas da investigação qualitativa, levam-nos à discussão dos fundamentos teóricos da abordagem. A palavra teoria é utilizada de muitas maneiras. Entre os investigadores qualitativos em educação o seu uso é por vezes limitado a um conjunto de asserções sistemáticas e testáveis sobre o mundo empírico. O modo como utilizamos o conceito está muito mais de acordo com a utilização que lhe é dada em sociologia e antropologia, sendo semelhante ao termo paradigma (Ritzer, 1975). Um paradigma consiste num conjunto aberto de asserções, conceitos ou proposições logicamente relacionados e que orientam o pensamento e a investigação. Quando nos referimos a "orientação teórica" ou a "perspectiva teórica", estamos a falar de um modo de entendimento do mundo, das asserções que as pessoas têm sobre o que é importante e o que é que faz o mundo funcionar. Seja ou não explícita, toda a investigação se baseia numa orientação teórica. Os bons investigadores estão conscientes dos seus fundamentos teóricos, servindo-se deles para recolher e analisar os dados. A teoria ajuda à coerência dos dados e permite ao investigador ir para além de um amontoado pouco sistemático e arbitrário de acontecimentos. Na presente secção procedemos a uma breve análise dos fundamentos teóricos das abordagens qualitativas. " ' H _• • ~. __ ._ •••• --I",-~-- A - I __-_i comportamento das pessoas. Tentam penetrar no mundo conceptual dos seus sujeitos (Geertz, 1973), com o objectivo de compreender como e qual o significado que constroem para os acontecimentos das suas vidas quotidianas. Os fenomenologistas acreditam que temos à nossa disposição múltiplas formas de interpretar as experiências, em função das interacções com os outros e que a realidade não é mais do que o significado das nossas experiências (Greene, 1978). Consequentemente, a realidade é "socialmente construída" (Berger e Luckmann, 1967). Ainda que existam diversas formas de investigação qualitativa, todas partilham, até certo ponto, o objectivo de compreender os sujeitos com base nos seus pontos de vista. Contudo, quando examinamos esta afirmação cuidadosamente, a frase "com base nos seus pontos de vista" apresenta-nos um problema. Trata-se da questão fundamental relativa ao facto de "os seus pontos de vista" não ser uma expressão que os próprios sujeitos utilizem; pode não representar o modo como eles pensam sobre si próprios. "Os seus pontos de vista" é um modo como estes investigadores abordam o seu trabalho. Portanto, "ponto de vista" é um construto de investigação. Entender os sujeitos com base nesta ideia pode, consequentemente, forçar a experiência que os sujeitos têm do mundo a algo que lhes é estranho. Contudo, esta forma de intrusão do investigador no mundo do sujeito é inevitável em investigação. Para todos os efeitos, o investigador faz interpretações, devendo possuir um esquema conceptual para as fazer. Os investigadores qualitativos pensam que o facto de abordarem as pessoas com o fito de compreenderem o seu ponto de vista ainda que não constitua algo de perfeito é o que menos distorce a experiência dos sujeitos. Verificam-se diferença~ no grau em que os investigadores qualitativos se preocupam com estes problemas metodológicos e conceptuais, bem como no modo como os resolvem. Alguns investigadores tentam realizar "descrições fenomenológicas imaculadas"; outros mostram menor preocupação e tentam construir abstracções, interpretando os dados sobre os "seus pontos de vista". Independentemente da posição que se tome, a análise qualitativa tem de estar ciente destas questões teóricas e metodológicas. Ainda que os investigadores qualitativos tendam a ter uma orientação fenomenológica, a maioria deles não é constituída por idealistas radicais. Enfatizam o subjectivo, mas não negam necessariamente a existência de uma realidade "exterior" que se equaciona contra os seres humanos numa resistência tenaz (Blumer, 1980). Determinado professor pode pensar ser capaz de atravessar uma parede de tijolos, mas pensar não chega para ser capaz de o fazer. A natureza da parede é inultrapassável, mas o professor não tem de perceber a "realidade" em toda a sua crueza. Pode continuar a acreditar que é capaz de atravessar a parede, excepto desta vez, ou porque alguém lhe lançou uma maldição, impedindo-o de executar a façanha. Deste modo, a realidade só se dá a conhecer aos humanos da forma como é percebida. Os investigadores qualitativos enfatizam o pensamento subjectivo porque, tal como o entendem, o mundo é composto por objectos menos obstinados do que as paredes. Os seres humanos vivem sob o lema "crer é poder". Vivemos na imaginação, contexto bem mais simbólico do que concreto. ~ A INTERACÇÃO SIMBÓLICA Revendo a história, pode-se concluir que a interacção simbólica existe há bastai tempo. Estava presente na abordagem à investigação da Escola de Chicago, no início de século. John Dewey, o filósofo e educador pragmático, encontrava-se em Chicago nos aI de formação desta perspectiva teórica, contribuindo bastante para o seu desenvolvimento contactos que manteve com autores como Charles Horton Cooley, Robert Park, Florian 21 niecki e, principalmente, com George Herbert Mead. A perspectiva apresentada por Me em Mimi, Self. and Societv (Mead, 1934)16 constitui a fonte original mais citada daquilo ( ficou conhecido por interacção simbólica. Não existe acordo entre os cientistas sociais so a utilização e importância dos diversos conceitos que o termo implica. Muitos utilizam como sinónimo da investigação qualitativa, mas só um pequeno número dos cientistas ( se designam por interaccionistas simbólicos é que efectua investigação qualitativa (i.e Escola de Iowa de interacção simbólica). Na nossa exposição socorremo-nos essenc mente dos estudiosos do trabalho de Mead: Herbert Blumer e Everett Hughes, bem co dos seus alunos. Howard S. Becker e Blanche Geer. Na base desta abordagem, compatível com a perspectiva fenomenológica, encontra a asserção de que a experiência humana é mediada pela interpretação. Nem os object nem as pessoas, situações ou acontecimentos são dotados de significado própno; ao m, o significado é-lhes atribuído. Por exemplo. onde o tecnólogo educacional define um p jector de dezasseis milímetros como um instrumento a ser utilizado pelo professor p passar filmes cujo conteúdo seja relevante para os objectivos educativos, o profes pode, por sua vez, defini-lo como um objecto para entreter os estudantes qua~do se aCi o trabalho planeado ou quando está cansado. Ou ainda se se apresentar o projector a u tribo não-ocidental este pode ser entendido como um ícone a ser venerado (até momento em que chegam os especialistas em audiovisual trazendo, possivelmente, c eles, novas percepções que vão influenciar as definições). O significado que as pess, atribuem às suas experiências, bem como o processo de interpretação, são elemen essenciais e constitutivos, não acidentais ou secundários àquilo que é a experiência. P compreender o comportamento é necessário compreender as definições e o processo ( está subjacente à construção destas. Os seres humanos Cliam activamente o seu mund< compreensão dos pontos de intersecção entre a biografia e a sociedade torna-se essenl (Gerth e Mil1s, 1953). As pessoas não agem com base em respostas predetermmada objectos predefinidos, mas sim como animais simbólicos que interpretam e definem, c comportamento só pode ser compreendido pelo investigador que se introduza no proce de definição através de métodos como a observação participante. . A interpretação não é um acto autónomo, nem é determinada por nenhuma força partI lar, humana ou não. Os indivíduos interpretam com o auxílio dos outros - pessoas do r sado, escritores, família, figuras da televisão e pessoas que se encontram nos seus locais trabalho e divertimento -, mas estes não o fazem deliberadamente. Os significados construídos através das interacções. As pessoas, em situações particulares (por exemplo ~ .__.. --l_u_,.....- --------------l-----.'.II alunos numa sala de aula), desenvolvem frequentemente definições comuns (ou "partilham perspectivas", na terminologia do interaccionismo simbólico) porque interagem regularmente e partilham experiências, problemas e passados comuns; mas o consenso não é inevitável. Ainda que alguns entendam que as "definições comuns" são sinónimo da "verdade", o significado está sempre sujeito a negociação. Pode ser influenciado pelas pessoas que vêem as coisas de modo diferente. Quando se age com base numa definição particular as coisas podem não correr bem. As pessoas têm problemas e estes podem levá-las a construir novas definições, abandonando as anteriores - resumindo, a mudar. O objecto da investigação é o modo como estas definições se desenvolvem. Assim sendo, a interpretação é essencial. A interacção simbólica assume o papel de paradigma conceptual, ocupando o lugar dos instintos, dos traços de personalidade, dos motivos inconscientes, das necessidades do estatuto socioeconómico, das obrigações inerentes aos papéis, das normas culturais, dos mecanismos sociais de controlo ou do meio ambiente físico. Estes factores são alguns dos construtos em que os cientistas sociais se baseiam, na tentativa de compreender e prever o comportamento. O interaccionista simbólico não nega a utilidade destes construtos teóricos; contudo, eles só são relevantes para compreender o comportamento, na medida em que estejam presentes e afectem o processo de definição. Por exemplo, um proponente da teoria não negaria nem a existência de um instinto alimentar nem a existência de certas definições culturais relativas ao que comer, ao modo como comer e a quando comer. Negaria, contudo, que o facto de nos alimentarmos possa ser compreendido exclusivamente em termos de instintos e de definições culturais. A alimentação pode ser compreendida tomando em consideração as inter-relações entre como surgiram as definições de comer e as situações específicas em que se encontram. A alimentação é definida de formas diferentes: o processo é experimentado de modo diferente e as pessoas manifestam comportamentos diferentes quando comem em situações igualmente diferentes. Os professores de uma escola definem as alturas adequadas para comer, o que comer e como comer, de modos muito diversos dos alunos dessa mesma escola. Almoçar pode ser um intervalo no trabalho, uma intrusão indesejada, uma oportunidade para negociar, tempo de dieta ou uma oportunidade para obter as respostas às questões de um exame. (Não estamos a sugerir que se tratem de definições mutuamente exclusivas.) Por exemplo, as refeições de algumas pessoas funcionam como critério do trabalho realizado durante o dia. Neste caso, a alimentação ganha significado ao proporcionar um acontecimento através do qual se pode avaliar aquilo que já foi feito, o que é que falta fazer ou com que brevidade seremos forçados a pôr termo a um excelente dia. Almoçar reveste-se de significados simbólicos que não são explicados por conceitos tais como os instintos e os rituais. A teoria não nega a existência de regras e regulamentos, normas e sistemas de crenças sociais. Sugere, contudo, que estes só são importantes para a compreensão do comportamento, caso as pessoas os tomem em consideração. Além do mais, sugere-se que não são concretamente as regras, regulamentos, normas ou o que quer que seja que é crucial para a compreensão do comportamento, mas sim o modo como 56 'C""~-~"~'-"-~~~~'.iSi'ii estes são definidos e utilizados em situações específicas. Determinada escola secundár pode ter um sistema de avaliação, um quadro organizativo, um ho~ário de au:as, u~ cun culo e um lema oficial sugerindo que o seu objectivo pnmordlal e a educaçao da pess( total". Contudo, as pessoas agem não de acordo com aquilo que a escola é suposta ser c aquilo que a administração diz que é, mas sim de acordo com as suas percepções pessoal Para alguns alunos, o liceu é essencialmente um local para encontrar os amigos ou mesrr um local para "curtir"; para a maioria trata-se de um local para estudar, passar de ~no conseguir o diploma - tarefas que consideram ser necessárias para ir para a umversldac ou para obter um emprego. O modo como os alunos definem a escola.e ~s seus comp nentes determina as suas acções, ainda que as regras e o sistema de avallaçao estabeleça certos limites e imponham custos, afectando assim o comportamento. As organiz~çõ variam no grau em que fornecem significados fixos e no grau em que facultam a cnaç, de significados alternativos. Outra componente importante da teoria da interacção simbólica é o construto do se O self não é visto como residindo no interior do indivíduo, co~o um ego ou u~ conJun organizado de necessidades, motivações e normas ou valores mternos. O self e a_defil ção que as pessoas constroem (através da interacção com os outros) so~re q~em sao. j construir ou definir o self, as pessoas tentam ver-se como os outros as veem, mterpretan. os gestos e as acções que lhes são dirigidas e colocando-se no papel da o~tra pessc Resumindo, as pessoas acabam por se ver, parcialmente, como as outras as veem. De~ modo, o self também é uma construção social, o resultado do facto das pe~soas se perc berem e desenvolverem uma definição através do processo de mteracçao. Este ne permite que as pessoas se modifiquem e cresçam, à medida que vão aprendendo m; sobre elas próprias através deste processo interactivo. Esta forma de conceptualIzar o s conduziu a estudos sobre a "profecia auto-realizável", proporcionando as bases para ~ q viria a ser conhecido pela "abordagem da rotulação" ao comportamento deSViar (Becker, 1963; Erickson, 1962; Rist, 1977). A CULTURA Muitos antropólogos operam com base na perspectiva fenomenológica nos Sé estudos sobre educação (ver, por exemplo, Wolcott, 1973). Essencial para estes estuc antropológicos é o conceito de cultura. A tentativa de descrição da cultur~ ou de ~et' minados aspectos dela designa-se por etnografia. Ainda que os antropologos dl~c' dem frequentemente sobre a definição de cultura, utilizam-na sempre como base teor de trabalho. Algumas das definições ajudam-nos a compreender melhor o modo cOI ela determina a investigação. Alguns antropólogos definem a cultura como "o conhe mento acumulado que as pessoas utilizam para interpretar a experiência e .induzI comportamento" (Spradley, 1980, p. 6). Nesta acepção, a cultura abarca aqUilo que 57 I.._ - . pessoas fazem, aquilo que sabem e ainda os objectos que manufacturam e utilizam (Spradley, 1980, p. 5). Ao descrever a cultura com base nesta perspectiva, um investigador pode pensar sobre os acontecimentos da seguinte forma: "Na sua forma mais perfeita, a etnografIa deve explicar o comportamento das pessoas recorrendo à descrição daquele conheCImento que estas possuem e que lhes permite comportarem-se de forma adequada, dadas as normas de senso comum nas respectivas comunidades" (McDermott, 1976 p. 159). Os investigadores desta tradição entendem que a etnografia é bem sucedid~ quando consegue ensinar aos leitores o modo de comportamento adequado em diferentes contextos culturais, quer se trate de famílias numa comunidade afro-americana (Stack, 1974), do gabmete de um director escolar (WoIcott, 1973) ou de uma turma de jardim infantil (Florio, 1978). , Outra definição de cultura enfatiza o componente semiótica, o estudo dos sinais da Imgua, defendendo que existe uma diferença entre conhecer os comportamentos e jargão de determinado grupo de pessoas e ser, de facto, capaz de os pôr em prática (Geertz, 1973). Nesta perspectIva, a cultura aparenta ser mais complexa e algo diferente: "Siste~as co-construídos de signos (a que, ignorando a linguagem mais técnica, eu chamaria slmbolos), a cultura não é um poder, algo a que possam ser causalmente atribuídos os acontecimentos, comportamentos, instituições ou processos sociais; trata-se antes de um cont~xto, algo no interior do qual estes fenómenos se tornam inteligíveis, ou seja, susceptlVels de serem descritos com consistência" (Geertz, 1973, p. 14). Neste sentido, eXIste uma mteracção entre a cultura e os significados que as pessoas atribuem aos acontecimentos. O tom fenomenológico desta definição é evidente. G::rtz tomou de empréstimo ao filósofo Robert Ryle a expressão "descrição profunda para des.crever a tarefa da etnografia. Geertz utiliza o exemplo dado por Ryle de uma pessoa a pIscar um olho, examinando os diferentes níveis de análise a que tal comportamento pode ser submetido. Piscar o olho pode ser visto como um tique, uma pIscadela, o fl~glr de uma piscadela (tornando-se, assim, cúmplice de um auditório) ou um tremo de pIscadela. Como e a que nível se analisa o comportamento ilustra as diferenças entre as descrições profundas e superficiais: "É entre a... 'descrição superficial' daquilo que o actor (comediante, pestaneJa~or, e ~essoa ~om tiques...) faz ('contrair rapidamente a sua pestana dIreIta) e a descnçao profunda' do mesmo acto ('ensaiar com um amigo uma pIscadela de. olho com o objectivo de levar o ingénuo a pensar que eXiste uma consplTação') que reside o objecto da etnografia: uma hierarquia estratificada de estruturas de significado, nos termos da qual tiques, pIscadelas, falsas piscadelas, paródias e ensaios de paródias são executadas, percebidas e interpretadas, e sem a qual não poderiam (nem mesmo os tiques de ordem zero que, enquanto categoria cultural, constituem tanto un: a não-piscadela como as piscadelas constituem não-tiques), de facto, eXIstIr mdependentemente daquilo que as pessoas fizessem ou deixassem de fazer com as suas pestanas." (Geertz, 1973, p. 7) 58 Assim, a etnografia consiste numa "descrição profunda". Quando se examina a cultu com base nesta perspectiva, o etnógrafo depara-se com uma série de interpretações da vid interpretações do senso comum, que se torna difícil separar umas das outras. Os objectivl do etnógrafo são os de apreender os significados que os membros da cultura têm COIl dados adquiridos e, posteriormente, apresentar o novo significado às pessoas exteriores cultura. O etnógrafo preocupa-se essencialmente com as representações. Uma terceira forma de entender a cultura é apresentada pela antropóloga Rosalie W, (1971). Numa exposição relativa aos pressupostos teóricos do trabalho de campo, W, apresenta as tarefas da etnografia em termos de compreensão. Segundo Wax, a con preensão não é uma instância de "empatia misteriosa" entre as pessoas; trata-se, antes, ( um fenómeno de "significado partilhado". Deste modo, o antropólogo parte sempre c exterior, tanto no sentido literal, em termos das questões relativas à sua aceitação soei, como figurativamente, em termos da compreensão: "Um investigador de campo que começa a trabalhar com pessoas que não conhece apercebe-se rapidamente que estas pessoas dizem e fazem coisas que compreendem, mas que ele não. Uma destas pessoas pode fazer determinado gesto que põe todos os outros a rir. Elas partilham uma compreensão do significado do gesto, mas o investigador não. Quando o começa a partilhar, começa a 'compreender'. Passa a deter parte da 'perspectiva daqueles que estão por dentro'." (Wax, 1971, p. II) Determinado estudo etnográfico de uma turma de jardim infantil (Florio, 1978) ex mina o modo como as crianças que para ele entram se vão tornando "conhecedoras", ( seja, como aprendem a cultura própria e vão desenvolvendo respostas apropriadas i expectativas do professor e da turma. Os sociólogos também utilizam a cultura para basearem teoricamente os seus estudl qualitativos. A descrição que Becker (1986) faz da cultura baseia-se igualmente nos si: nificados partilhados. Recorrendo à metáfora de uma orquestra de dança, Becker suge que se um grupo de músicos individuais são convidados para tocar integrados nurr orquestra de dança, num casamento, e se, nunca se tendo encontrado antes, consegue interpretar as músicas no tom que o maestro sugere (sem que os presentes se aperceba que eles nunca tocaram em conjunto), é na cultura que se baseiam para serem capazes ( tal feito. Becker sugere que é a cultura que permite às pessoas agirem conjuntamente. É o recurso ao conceito de cultura, independentemente da sua definição específic como principal instrumento organizativo e conceptual de interpretação de dados ql caracteriza a etnografia. Os procedimentos etnográficos, ainda que semelhantes ( quase idênticos aos utilizados na observação participante, baseiam-se, de facto, nu vocabulário diferente, tendo-se desenvolvido igualmente em especialidades académic: diferentes. Recentemente, os investigadores educacionais utilizaram o termo etnograf para se referirem a qualquer tipo de estudo qualitativo, mesmo no campo da sociologi 59 · . . .- -1-"-.,,-----------------1·,,--..$--_[1·;,,," Ainda que não se verifique acordo relativo à adequabilidade da utilização da expressão etnografia como a palavra genérica para designar os estudos qualitativos (ver, por exemplo, Wolcott, 1975, 1990), existem algumas provas sugerindo que os sociólogos e os antropólogos se estão a aproximar no modo como conduzem investigação e na orientação teórica que subjaz ao seu trabalho. Um etnógrafo famoso declarou que "o conceito de cultura enquanto conhecimento adquirido tem muito de comum com a interacção simbólica" (Spradley, 1980). A ETNOMETODOLOGIA A etnometodologia não se refere aos métodos que os investigadores utilizam na recolha de dados; refere-se, outrossim, à matéria substantiva a ser investigada. Como Harold Garfinkel conta a história, o termo surgiu-lhe quando trabalhava em Yale, com ficheiros relativos a estudos transculturais que continham palavras tais como etnobotânica. etnofísica, etnomúsica e etnoastronomia. Estas expressões referem-se ao estudo do modo como os indivíduos constroem e compreendem as suas vidas quotidianas _ os seus métodos de realização da vida de todos os dias. Para os etnometodólogos os sujeitos não são os membros de tribos primitivas; são pessoas que se encontram em várias situações na sociedade modema. Garfinkel, dando aquilo a que chama uma definição breve do trabalho dos etnometodólogos, declara: "Diria que empreendemos estudos sobre o modo como as pessoas, enquanto organizadoras do seu quotidiano, utilizam os aspectos mais salientes deste mesmo quotidiano para o fazer funcionar" (Garfinkel, em Hill e Crittenden, 1968, p. 12). Os etnometodólogos tentam compreender o modo como as pessoas percebem, explicam e descrevem a ordem no mundo que habitam. Por exemplo, os etnometodólogos estudaram a forma como as pessoas "constroem" o seu género sexual (West e Zimmerman, 1987). Um número significativo de autores na área da educação foi influenciado por esta perspectiva. Mesmo que, por vezes, seja difícil diferenciar o seu trabalho do de outros investigadores qualitativos, ele tende a lidar mais com microquestões, com conteúdos específicos de conversas e vocabulário e com detalhes relativos à acção e à compreensão. Estes investigadores utilizam frases como "compreensão de senso comum", "vida quotidiana", "realizações práticas", "bases rotineiras de acção social" e "relatos". Os investigadores descritos nas primeiras páginas do presente livro, que questionaram crianças sobre as suas respostas a testes, podem associar-se à abordagem etnometodológica (ver Mehan e Wood, 1975; Turner, 1974). que subjazem à actividade dos investigadores. Exortam os investigadores que trabalhar numa perspectiva qualitativa a serem mais sensíveis à necessidade de "pôr entre parênte ses" ou suspender os seus pressupostos de senso comum, as suas visões do mundo, ai invés de operarem sem consciência deles. OS ESTUDOS CULTURAIS Muitos investigadores que não se consideram fenomenologistas também realizan investigação qualitativa, situando o seu trabalho em quadros conceptuais diferentes. Este incluem o neomarxismo, o materialismo feminista e o feminismo pós-estruturalista Habitualmente utiliza-se a expressão "estudos culturais" para classificar estas abordagens A diferença mais significativa entre estas perspectivas e a fenomenológica é a de qu elas rejeitam a noção de que o mundo é "susceptível de ser conhecido directamente"; eJ, "não se pode apresentar empiricamente", como sugeririam os relatos fenomenológico (Willis, 1977, p. 194). Em primeiro lugar, a perspectiva dos estudos culturais insiste q~' todas as relações sociais são influenciadas por relações de poder que devem ser entendI das mediante a análise das interpretações que os sujeitos fazem das suas própria situações. Em segundo lugar, defendem que toda a investigação se baseia num perspectivação teórica do comportamento humano e social. Deste modo, não é adequad l descrever o processo de análise como indutivo. Por exemplo, Roman e Apple (1990 sugerem que as "convicções teóricas e políticas prévias" do investigador se "baseiam são transformadas pelas experiências vividas pelo grupo que investiga" (p. 62). Os estu dos sociais enfatizam a importância dos métodos qualitativos para apreenderem intersecção entre a estrutura social e a acção humana. UMA HISTÓRIA É demasiado cedo para comentar os contributos da etnometodologia para a investigação educacional. Uma das questões para a qual os etnometodólogos sensibilizaram os investigadores é a de que a própria investigação não constitui exclusivamente um empreendimento científico; pode ser melhor entendida como "uma realização prática". Sugeriram que tomássemos seriamente em consideração os pressupostos de senso comum Resumimos a nossa exposição teórica com uma história. Se tivéssemos de lhe dar un título, chamar-lhe-íamos "Para todo o sempre". Certa noite, num jantar de professores universitários, estando presentes o director d Faculdade de Direito, um professor de Física e outro de Geologia, todos bastante famoso nos seus campos, discutia-se o conceito de "para todo o sempre". A conversa iniciou-s com um deles referindo o facto de se efectuarem alugueres de propriedades por períodos d noventa e nove anos. Alguém perguntou ao professor de Direito se a expressão não er uma convenção da profissão legal para referir a noção de "para sempre". Este respondei "sim, é mais ou menos essa a ideia". Por sua vez, o professor de Geologia referiu que nl seu campo, "para sempre", significava algo completamente diferente - o conceito tinh mais a ver com o tempo presumível de duração da Terra. O professor de Física comento! alto e em bom som que, no seu campo, "para sempre" queria mesmo dizer "para sempre" 60 61 ---,-'-,.,-J.----n- ,I., ..... :&.; .~~. Muitas histórias infantis terminam com a frase "e viveram felizes para sempre" - outra das interpretações possíveis. Por vezes, quando as crianças estão à espera que os pais as levem a qualquer lado, queixam-se de ter esperado "séculos/para sempre". Não esgotámos todas as possibilidades, mas a ideia é clara. A expressão é rica em conotações, daí a diversidade de perspectivas possíveis. Cada uma das pessoas mencionadas utiliza a expressão, "para sempre", com base em diferentes visões do mundo. A criança que afirma "estou à espera há séculos/para sempre" manifesta ser-lhe difícil ver o mundo com os olhos de um físico, tal como o físico desqualifica o uso que a criança faz da expressão com um sorriso paternalista. É possível tentar resolver a discrepância entre as perspectivas dos vários utilizadores da expressão exigindo uma definição mais exacta, ou seja, obter consenso optando por uma definição "real" da expressão. Em grupos de discussão ou reuniões de direcções, é possível que um tal método possa impedir falhas de comunicação, mas o objectivo dos investigadores qualitativos é o de expandir e não o de limitar a compreensão. Não se tenta resolver a ambiguidade entendendo as diferenças como um "erro" que se tenta ultrapassar mediante a elaboração de uma definição. Outrossim, tenta-se estudar os conceitos da forma como eles são entendidos por todos os que os utilizam. De modo semelhante, ao estudar determinada organização, não se tenta resolver as ambiguidades inerentes ao facto de surgirem várias definições da palavra objectivo, ou mesmo quando as pessoas têm diferentes objectivos. O objecto de estudo consiste, exactamente, no modo como as diferentes pessoas envolvidas entendem e experimentam os objectivos. São as realidades múltiplas e não uma realidade única que interessam ao investigador qualitativo. D Nove questões frequentes sobre a investigação qualitativa O Jf contacto inicial com a investigação qualitativa leva a que normalmente se coloquei algumas questões. Consideramos nove das questões mais frequentes. 1. Será possív~l a utilização. conjunta das abordagens qualitativ~ e quantitativa Alguns autores utilizam-nas conjuntamente (Cronbach et ai., 1980; Miles e Hubermai 1984; Reichardt e Cook, 1974). Por exemplo, tal é prática comum quando inicialmente ~ constroem questionários para entrevistas abertas. Pode utilizar-se a observação ei profundidade para descobrir por que é que duas variáveis estão estatisticamenl relacionadas. Existem estudos que integram co~poiientes qualitativos e quantitativo F;~q~~~temente, a estatística descritiva e os resultados qualitativos têm sido apresentade COl~.iliIl~1I:!J1.t:!1te (Mercurió:T979):Amdaq~e seja possível, e milguns casos desejáve utilizar as duas ãbõrdage-nscoiljuntamente (Fielding e Fielding, 1986), tentar conduzir Ul estudo quantitativo sofisticado ao mesmo tempo que um estudo qualitativo aprofundad pode causar grandes problemas. Particularmente os investigadores inexperientes qu tentem combinar um bom plano experimental quantitativo com outro qualitativ deparam-se com sérios problemas. Ao invés de conseguirem um produto híbrido d características superiores acabam, normalmente, com algo que não preenche os requisite de qualidade para nenhuma das abordagens (Locke, Spirduso e Silverman, 1987, p. 96 As duas abordagens baseiam-se em pressupostos diferentes (Smith e Heshusus, 1986 Ainda que seja conveniente verificar-se uma interacção entre dados competitivo. 62 ""~.--l._\..c_YílIíIlIIIIi"lll! 63 .I. IIIIII••..... &i frequentemente, tais estudos acabam por ser estudos mais sobre método do que sobre o tópico que o investigador queria originalmente estudar. 2. Será que a abordagem qualitativa é verdadeiramente cientifica? No passado, os investigadores educativos baseavam o seu trabalho nas investigações feitas pelos "colegas das ciências exactas". Alguns autores entendiam medida como sinónimo de ciência, e tudo o que saísse deste registo era considerado suspeito. A ironia reside no facto dos cientistas das ciências exactas (por exemplo, a física e a química) não definirem ciência de uma forma tão estreita como aqueles que tentam imitar o seu trabalho. O físico Nobel P. W. Bridgeman afirma o seguinte sobre o método científico: "O método científico não existe como tal. A característica mais importante dos procedimentos do cientista tem sido meramente o utilizar a sua mente da melhor forma possível, sem quaisquer restrições" (Dalton, 1967, p. 60). Dalton (1967) afirma que "muitos físicos, químicos e matemáticos eminentes questionam a existência de um método susceptível de replicação, que todos os investigadores possam ou devam adoptar. As suas investigações têm mostrado que utilizam formas muito diversas e, por vezes, de difícil explicitação, de descoberta e resolução de problemas" (p. 60). Alguns autores podem utilizar definições muitos estritas de ciência, apenas considerando científica a investigação dedutiva e de teste de hipóteses. Contudo, parte significativa da atitude científica, como a entendemos, passa por uma mente aberta no respeitante ao método e às provas. A investigação científica implica um escrutínio empírico e sistemático que se baseia em dados. A investigação qualitativa preenche estes requisitos e, no presente livro, procedemos à descrição de algumas das convenções desta tradição científica, que explicitam aquilo que implica a investigação rigorosa e sistemática. 3. Em que é que a investigação qualitativa difere daquilo que pessoas como os professores, jornalistas e artistas fçzzem? Consideremos primeiramente os professores. Muitas pessoas inteligentes e leigas são bons observadores do mundo que as rodeia, procedem a formas sistemáticas de questionação e chegam a conclusões. Os bons professores fazem-no de forma consistente. O que eles fazem é, de certo modo, investigação qualitativa, mas difere nalguns aspectos. Em primeiro lugar, o dever principal do observador é o de conduzir investigação; não tem de perder tempo a elaborar currículos, a dar aulas e a disciplinar os alunos. O investigador pode, pois, devotar-se à investigação de alma e coração. De igual modo, os investigadores procedem com rigor no que diz respeito ao registo detalhado daquilo que descobrem. Conservam os seus dados. Os professores também têm registos, mas este são muito menos detalhados e de tipos diferentes. Além do mais, os investigadores não têm tanto interesse pessoal nas observações que fazem e nos resultados que obtêm. A vida, carreira e autoconceito do professor estão sempre intimamente ligados ao modo particular como ele desempenha as suas tarefas. Isto não significa que os professores não possam ultrapassar estas questões, de modo a poderem conduzir investigação, ou que os investigadores não tenham qualquer 64 .......-IL...<iA2"""" interesse pessoal nos estudos que realizam. Contudo, para os investigadores o sucesso definido por realizarem o que se caracteriza por boa investigação, e não por conteúd, ou resultados específicos. Outro aspecto em que o investigador e o professor diferem que o investigador foi treinado no uso de um conjunto de procedimentos e técnica desenvolvidos ao longo dos anos, com o objectivo de recolher e analisar dados. Muit< destes procedimentos e técnicas encontram-se descritos ao longo do presente Iivr, Finalmente, o investigador baseia-se em teorias e resultados anteriores de investigaçã, que funcionam como um pano-de-fundo que fornece pistas para dirigir o estudo permite contextualizar os novos resultados. E relativamente aos jornalistas? Algut autores associam a investigação qualitativa ao jornalismo com objectivos depreciativo Não é este o nosso caso. Como sugere a resenha histórica que apresentámos, algum. das tradições da investigação qualitativa estão associadas ao jornalismo. Os jornalist: partilham alguns dos objectivos e normas dos cientistas sociais, chegando mesm alguns deles, a efectuarem investigações de maior valor para a ciência social do ql aqueles que exibem os seus certificados e títulos académicos (Levine, 1980a). Mesrr assim, acreditamos que os investigadores académicos, de uma forma geral, trabalham ( modo diferente dos jornalistas (Grant, 1979). Os jornalistas tendem a interessarem-: mais por acontecimentos e questões particulares e a duvidarem das pessoas que fazem, notícias. Os jornalistas trabalham constrangidos por prazos. Ao invés de passarem anos recolher e a analisar cuidadosamente os dados, escrevem, normalmente, com base nUl menor número de provas - "a pressão da notícia". Escrevem também, geralmente, pm uma audiência diferente, preocupando-se mais em contar do que em analisar urr história. Os jornalistas também não se baseiam numa teoria social. ,Sendo assim, n2 existe uma relação entre o que escrevem e as questões teóricas. E evidente que ( jornalistas também estão interessados em vender jornais, o que coloca algumas restriçõe ao que escrevem e ao modo como escrevem. Contudo, por vezes, é muito difícil, se nã impossível, traçar a linha entre a investigação em ciências sociais e o bom jornalismo d investigação (ver Douglas 1976; Levine, 1980a). E os artistas? Alguns novelistas e poetas são excelentes observadores do palc humano. Também eles podem não ser tão formais e rigorosos como os investigadore qualitativos no tocante às técnicas de recolha de dados, permitindo-se mais liberdad relativamente aos dados que recolhem. Contudo, muito do que dizem tem interesse paI os cientistas sociais. Algumas pessoas encontram-se na intelface da ciência social e d arte. Escrevem com um estilo muito envolvente, baseando-se, para escrever, na tradiçã da ciência social (Coles, 1964; Cottle, 1976a). Possivelmente, os cientistas sociais têl muito a aprender com os novelistas e os ensaístas. Fariam melhor se não os ignorassem tentassem aprender com eles (ver Eisner, 1980). 4. Será que os resultados qualitativos são generalizáveis? Quando os investigadore utilizam o termo generalização estão normalmente a referir-se ao facto de os resultados d um estudo particular serem aplicáveis a locais e sujeitos diferentes. Por exemplo, se s IQE-5 65 I.:__----II1II,., a estudar uma turma particular, é importante saber até que ponto as outras turmas são semelhantes à que foi estudada. Nem todos os investigadores qualitativos se preocupam com as questões da generalização, tal como a definimos. Os que se preocupam, fazem questão em explicitá-lo. Por exemplo, caso conduzam um estudo de caso em determinada turma, isto não significa necessariamente que tenham intenção, ao relatarem os resultados do estudo, de sugerir que todas as turmas se lhe assemelham. Outros autores que se preocupam com a generalização, tal como a apresentámos até ao momento, podem basear-se noutros estudos para determinarem a representatividade do que encontraram, ou mesmo conduzir um maior número de estudos mais pequenos para mostrar o carácter não idiossincrático do seu trabalho. Por exemplo, num estudo de centros de dia, após ter realizado observações exaustivas num deles durante quatro meses, um investigador que conhecemos pessoalmente efectuou visitas a três outros centros, com o objectivo de perceber as semelhanças e diferenças entre o centro estudado e os outros (Freedman, 1980). Alguns investigadores qualitativos não pensam na questão da generalização em termos convencionais. Estão mais interessados em estabelecer afirmações universais sobre processos sociais gerais do que considerações relativas aos pontos comuns de contextos semelhantes como turmas. Neste caso, a ideia é a de que o comportamento humano não é aleatório ou idiossincrático. Deste modo, a preocupação central não é a de se os resultados são susceptíveis de generalização, mas sim a de que outros contextos e sujeitos a eles podem ser generalizados. Num estudo que efectuámos numa unidade de cuidados intensivos de um hospital universitário, estudámos o modo como o pessoal e os pais comunicavam sobre a situação das crianças. À medida que o estudo prosseguia, fomos chegando à conclusão que o pessoal não só diagnosticava as crianças, como também classificava as famílias. Estas avaliações dos pais funcionavam como critério para os profissionais decidirem que informação lhes prestar e como a prestar. Ao reflectir sobre os encontros entre pais e professores em escolas públicas e outras situações em que os profissionais detêm informações sobre as crianças a que os pais podem desejar ter acesso, começámos a identificar paralelos. Resumindo, começámos a centrar-nos num processo social geral que surgia claramente num contexto particular. Uma das vias que nos encontramos presentemente a prosseguir é a possibilidade de generalização dos resultados da unidade de cuidados intensivos, não a outros locais semelhantes, mas a outros contextos, tais como as escolas, nos quais os profissionais interagem com os pais. A abordagem à generalização que acabámos de descrever é adoptada pelos investigadores que se interessam pelo desenvolvimento do que se designa por uma teoria fundamentada. Por sua vez, ainda outros investigadores qualitativos pensam sobre as questões da generalização, entendendo que o seu trabalho é o de documentar cuidadosamente um determinado contexto ou grupo de sujeitos e que é tarefa dos outros aperceber o modo como isto se articula com o quadro geral. Mesmo uma descrição de algo particular tem valor, porque as logia, têm sido acusados ao longo dos anos do facto de ser excessivamente fácil que ( seus preconceitos e atitudes influenciem os dados. Particularmente quando os dados tê de ser "processados" pela mente do investigador antes de serem postos no papel, surge; as preocupações relativas a riscos de subjectividade. Será que o observador se limita registar aquilo que pretende ver e não o que de facto se passa? Os investigadores qualitat vos preocupam-se com os efeitos que a sua subjectividade possa ter nos dados que prodl zem (LeCompte, 1987). Contudo, aquilo que os investigadores qualitativos tentam fazer é estudar objectiv, mente os estados subjectivos dos seus sujeitos. Ainda que a ideia de que os investigadon sejam capazes de ultrapassar alguns dos seus enviesamentos possa, inicialmente, ser dif cil de aceitar, os métodos que eles utilizam auxiliam neste processo. Por um lado, os estl dos qualitativos não são ensaios impressionísticos elaborados após uma visita rápida determinado local ou após algumas conversas com uns quantos sujeitos. O investigadc passa uma quantidade de tempo considerável no mundo empírico recolhendo laboriosi mente e revendo grandes quantidades de dados. Os dados carregam o peso de qualque interpretação, deste modo, o investigador tem constantemente de confrontar as suas opiniõe próprias e preconceitos com eles. Além do mais, muitas das opiniões e preconceitos sã bastante superficiais. Os dados recolhidos proporcionam uma descrição muito mais deti Ihada dos acontecimentos do que mesmo a mente mais criativamente preconceituos poderia ter construído, antes do estudo ser efectuado. Adicionalmente, o objectivo principal do investigador é o de construir conhecimento não o de dar opiniões sobre determinado contexto. A utilidade de determinado estudo é capacidade que tem de gerar teoria, descrição ou compreensão. O facto de determinad 66 67 ----.. .I . . - teorias necessitam de saber explicar todos os acontecimentos. Entendem o seu trabalho con tendo o potencial para criar anomalias que cabe aos outros investigadores explicar. Parte' explicação pode implicar a necessidade de alargar a noção que temos do fenómeno estudad Antes dos gorilas terem sido estudados mediante uma observação detalhada, no SI ambiente natural, agindo como lhes é próprio, eram considerados extremamente agressiv e perigosos para os humanos e outros animais. George Schaller foi estudar os gorilas no SI ambiente natural e descobriu que o modo como se comportavam não se assemelhava ao pe fil estabelecido, com base nos gorilas em cativeiro. Constatou que eram tímidos e enverg nhados, preferindo fugir ou evitar as pessoas em vez de as atacar. Contudo, erguer-se-iam bateriam no peito de forma ritual quando desafiados. As questões relativas ao modo con os gorilas são e em que circunstâncias eles se comportam da forma descrita não podem s respondidas por uma investigação de estudo de caso tão limitada, mas os gorilas de Schall têm necessariamente de ser tomados em consideração em quaisquer discussões futuras sob o comportamento desta espécie (Schaller, 1965; Waldorf e Reinarman, 1975). 5. E os efeitos nos dados das opiniões, preconceitos e outros enviesamentos do inveSl gador? Os investigadores qualitativos, tanto no âmbito da sociologia como no da antrop' .I.. I iSIII_-••••••- _-_Q.•• ,;~ I•• estudo conduzir à acusação de alguém por determinado estado de coisas ou à rotulagem de uma determinada escola como "boa" ou "má", ou, ainda, à apresentação de uma análise prejudicial, pode levar a considerá-lo como superficial. Os investigadores qualitativos acreditam que as situações são complexas, e, deste modo, tentam descrever muitas dimensões e não restringir o campo de observação. Além do mais, como vamos discutir detalhadamente no capítulo III, os investigadores qualitativos protegem-se dos seus enviesamentos registando notas de campo detalhadas que incluem reflexões sobre a sua própria subjectividade. Alguns investigadores qualitativos trabalham em equipa e sujeitam as suas notas de campo às críticas dos colegas como forma de se protegerem dos enviesamentos. Deve ser acentuado que nos estamos a referir ao limitar dos enviesamentos dos investigadores, não à sua total eliminação. Os investigadores qualitativos tentam identificar os seus estados subjectivos e o efeito destes nos dados, mas não acreditam que possam ser 100% bem sucedidos. Todos os investigadores são presa dos enviesamentos inerentes ao observador. Quaisquer questões ou questionários, por exemplo, reflectem os interesses daqueles que os constroem, o mesmo se passando nos estudos experimentais. Os investigadores qualitativos tentam reconhecer e tomar em consideração os seus enviesamentos, como forma de lidar com eles. do que a uma sessão formal de perguntas e respostas entre um investigador e um sujei Esta é a única maneira de captar aquilo que é verdadeiramente importante do ponto vista do sujeito. Nunca é possível ao investigador eliminar todos os efeitos que produz nos sujeitos I obter uma correspondência perfeita entre aquilo que deseja estudar e - o "meio ambier natural" - e o que de facto estuda - "um meio ambiente com a presença do investigadol Pode, contudo, compreender os efeitos que produz nos sujeitos, mediante um conh cimento aprofundado do contexto, utilizando-o para construir uma consciência mais amp da natureza da vida social. Os investigadores aprendem a interpretar alguns dos seus dad, em função do contexto (Deutscher, 1973). É frequente que os sujeitos tentem manipular impressões e actividades dos investigadores, particularmente nas fases iniciais do projec (Douglas, 1976). Os professores, por exemplo, podem não gritar com os alunos na pr sença do investigador e, em geral, terem um comportamento mais reservado. É importan tomar em consideração o facto de que existe um observador exterior. Os directores pode agir do modo que pensam ser mais consentâneo com o seu papel, modificando as suas rol nas habituais. É, pois, muito conveniente saber aquilo que os directores consideram SI consentâneo com o seu papel (ver Morris e Hurwitz, 1980). As pessoas revelam tanto de próprias nas suas reacções aos que habitualmente as rodeiam, como aos estranhos, des( que estejamos cientes das diferenças. 6. Será que a presença do investigador não vai modificar o comportamento das pessoas que pretende estudar? A resposta é afirmativa e tais modificações são designadas por "efeito do observador". Praticamente todas as investigações são afligidas por este problema. Por exemplo, os inquéritos que pretendem obter a opinião das pessoas. O facto de pedir às pessoas que se sentem e que preencham um questionário modifica o seu comportamento. Será que perguntar às pessoas a sua opinião não pode levar à elaboração de uma opinião? Alguns estudos experimentais criam um mundo totalmente artificial (no laboratório) para observar o comportamento das pessoas. O facto das outras abordagens à investigação também padecerem do mesmo problema não significa que os investigadores qualitativos tomem o "efeito do observador" de ânimo leve. A história dos métodos qualitativos mostra-nos que os seus proponentes têm tomado o problema em consideração e desenvolvido procedimentos com o objectivo de o minimizar. Os investigadores qualitativos tentam interagir com os seus sujeitos de forma natural, não intrusiva e não ameaçadora. Quanto mais controlada e intrusiva for a investigação, maior a probabilidade de se verificarem "efeitos do observador" (Douglas, 1976, p. 19). Se as pessoas forem tratadas como "sujeitos de investigação", comportar-se-ão como tal, o que é diferente do modo como normalmente se comportam. Como os investigadores qualitativos estão interessados no modo como as pessoas normalmente se comportam e pensam nos seus ambientes naturais, tentam agir de modo a que as actividades que ocorrem na sua presença não difiram significativamente daquilo que se passa na sua ausência. De modo semelhante, como os investigadores neste tipo de investigação se interessam pelo modo como as pessoas pensam sobre as suas vidas, experiências e situações particulares, as entrevistas que efectuam são mais semelhantes a conversas entre dois confidentes 7. Será que dois investigadores que estudem independentemente o mesmo local ou ( mesmos sujeitos chegarão às mesmas conclusões? Esta questão está associada com o cOi ceito de garantia. Nalgumas abordagens de investigação existe a expectativa de que se verif cará consistência entre os resultados de observações feitas por diferentes investigadores o pelo mesmo investigador ao longo do tempo. Os investigadores qualitativos não partilhai totalmente esta expectativa (Agar, 1986, pp. 13-16; Heider, 1988). Os investigadores em educação são oriundos de uma diversidade de posições e tê! interesses diversos. Alguns estudaram psicologia, outros sociologia, outros desenvo vimento infantil e ainda outros antropologia ou assistência social. O treino académic influencia as questões que o investigador coloca. Por exemplo, ao estudar determinad escola, os assistentes sociais podem estar interessados na origem social dos alunos, os socié logos podem centrar a atenção na estrutura social da escola e os psicólogos desen volvimentistas podem desejar estudar o autoconceito dos alunos mais jovens. Deste mod( assistentes sociais, sociólogos e psicólogos, em função dos seus interesses diferentes podem passar períodos de tempo diferentes em diferentes locais da escola ou a falar con diferentes pessoas. Recolherão diferentes tipos de dados e chegarão a conclusões diferen teso De igual modo, as perspectivas teóricas que os orientarão implicarão que os modos d estruturar o respectivo trabalho serão diferentes. Nos estudos qualitativos os investigadores preocupam-se com o rigor e abrangênci dos seus dados. A garantia é entendida mais como uma correspondência entre os dado que são registados e aquilo que de facto se passa no local de estudo do que como um: 68 69 _laR Ma. 1 iU...... ' - - - -. . . . &111:._,1.>. ti~ consistência literal entre diferentes observações. Como pode ser visto pela exposição feita, dois investigadores que estudem o mesmo local podem obter dados diversos e chegar a conclusões diferentes. Ambos os estudos podem ser consistentes. Só se poderiam levantar dúvidas sobre a sua consistência se os resultados fossem contraditórios ou incompatíveis. 8. Qual o objectivo da investigação qualitativa? Como sugerimos anteriormente, existe variedade no trabalho feito sob a designação de investigação qualitativa. Nem todos os investigadores qualitativos partilham o mesmo objectivo. Alguns entendem o seu trabalho como uma tentativa para desenvolver "teorias fundamentadas" (grounded theory). Outros acentuam a necessidade de construir conceitos heurísticos. A descrição é também outro dos objectivos. Se incluirmos a investigação qualitativa aplicada na discussão dos objectivos a diversidade destes será ainda maior. Ainda que existam diferenças óbvias nas diferentes abordagens à investigação qualitativa, verifica-se algum acordo entre os investigadores no tocante aos objectivos do seu trabalho. Em contraste com os investigadores quantitativos, os qualitativos não entendem o seu trabalho como consistindo na recolha de "factos" sobre o comportamento humano, os quais, após serem articulados, proporcionariam um modo de verificar e elaborar uma teoria que permitisse aos cientistas estabelecer relações de causalidade e predizer o comportamento humano. Os investigadores pensam que o comportamento humano é demasiadamente complexo para que tal seja possível, considerando a busca de causas e predições negativamente, no sentido de que esta dificulta a capacidade de apreender o carácter essencialmente interpretativo da natureza e experiência humanas. O objectivo dos investigadores qualitativos é o de melhor compreender o comportamento e experiência humanos. Tentam compreender o processo mediante o qual as pessoas constroem significados e descrever em que consistem estes mesmos significados. Recorrem à observação empírica por considerarem que é em função de instâncias concretas do comportamento humano que se pode reflectir com maior clareza e profundidade sobre a condição humana. Alguns investigadores qualitativos (incluindo investigadores feministas e de investigação-acção) que se dedicam ao estudo de pessoas marginalizadas têm, também, como objectivo, a intenção de contribuir para as condições de vida dos seus sujeitos (Roman e Apple, 1990; Lather, 1988). Estabelecem diálogos com os sujeitos relativamente ao modo como estes analisam e observam os diversos acontecimentos e actividades, encorajando-os a conseguirem maior controlo sobre as suas experiências. outras fontes relativas à discussão das diferenças entre as duas abordagens (v CampbeIl, 1978; Eisner, 1980; Guba e Lincoln, 1982; Lincoln e Guba, 1985; Smitll Heshusius, 1986). Ainda que não tenhamos sido exaustivos na discussão de tais diferenças, a figura I (pp. 72-74) sumaria as características de ambas as abordagens. A figura serve igualmer como um sumário útil das diferentes questões que fomos levantando ao longo do presen capítulo, muitas das quais vamos desenvolver nas páginas seguintes. 9. Em que é que diferem a investigação qualitativa e quantitativa? Muitos autores se debruçaram sobre as diferenças teóricas, técnicas e estratégicas entre as abordagens qualitativa e quantitativa. É frequente a abordagem qualitativa ser apresentada como contrastando com a quantitativa (Bruyn, 1966; Rist, 1977). Ainda que um certo número de comparações seja inevitável, tentamos, no presente livro, concentrarmo-nos nas questões referentes à descrição e condução da abordagem qualitativa. Sugerimos-lhe 71 70 o--i'''''.. . _,.""'A - .,IJJJ. :JJJ6._$.6_.21~, Figura 1-1 CARACTERÍSTICAS DAS ABORDAGENS QUALITATIVA E QUANTITATIVA t-I-----~ --l ....., QUALITATIVA QUANTITATIVA Expressões/frases associadas com a abordagem - etnográfico - observação participante - trabalho de campo - fenomenológico - dados qualitativos - Escola de Chicago - interacção simbólica - documentário - perspectiva interior - história de vida - naturalista - estudo de caso - etnometodológico - ecológico - descritivo -émico Expressõesifrases associadas com a abordagem - experimental - positivista - dados quantitativosl--- factos sociais - perspectiva exterior - estatística - empírica - ética Conceitos-chave associados com a ahordagem - significado - processo - compreensão de senso comum - ordem negociada - pôr entre parênteses - para todos os propósitos - compreensão práticos - definição da situação - construção social - vida quotidiana - teoria fundamentada Conceitos-chave associados com a ahordagem - variável ! - validade - operacionalização - significãncia estatística - garantia - replicação - predição - hipóteses Afiliaçào teórica - interacção simbólica - etnometodologia - fenomenologia Afiliação teórica - funcionalismo estrutural - realismo, positivismo - comportamentalismo - cultura - idealismo Afiliação académica - sociologia - história AJiliaçào académica - antropologia - psicologia -cconomia - teoria fundamentada - desenvolver a compreensão - teste de teorias - encontrar factos ../ - descrição estatística - sociologia - ciência política Ohjectivos Objectivos - desenvolver conceitos sensíveis - descrever realidades múltiplas II - encontrar relações entre variáveis v - predição Plano Plano - progressivo, flexível, geral --l W - empirismo lógico - teoria dos sistemas - intuição relativa ao modo de avançar Elahoração das propostas de investigaçào - breves - parcas em revisão de literatura - especulativas - descrição geral da abordagem - sugere áreas para as quais a investigação possa ser relevante - normalmente escritas após a recolha de alguns dados Dados _ descritivos vi - documentos pessoais - notas de campo - fotografias - o discurso dos sujeios V - documentos oficiais e outros Amostra - estrutumdo, predeterminado, formal, específico V - plano detalhado de trabalho Elahoração das propostas de investigação - extensas - detalhadas e específicas nos objectivos v - detalhadas e específicas nos procedimentos -longa revisão de literatura V - escritas antes da recolha V de dados - especificação de hipóteses L/ Dados - quantitativos \I - codificação quantificávelv - contagens, medidas \/ - variáveis operacionalizadas\..! - estatística V' Amostra V -pequena - não representativa - amostragem teórica -ampla - estratificada - grupos de controlo -precisa V - observação participante - entrevista aberta - experimentos - inquéritos Técnicas ou métodos - observação - estudo de documentos vários - selecção aleatória - controlo de variáveis extrínsecas Técnicas ou métodos - quase experimentos - observação estruturada V A ética al como as palavras sexo e cobras, a ética é uma palavra com uma forte carga eml cional e plena de significados ocultos. Nada pode ser mais devastador para u profissional do que ser acusado de uma prática pouco ética. Ainda que a palav sugira imagens de uma autoridade suprema, em investigação, a ética consiste nas norm: relativas aos procedimentos considerados correctos e incorrectos por determinado grup A maioria das especialidades académicas e profissões têm códigos deontológicos ql estabelecem tais normas (ver, por exemplo, American Sociological Association, 1989 Alguns destes códigos são fruto de considerável reflexão e sensibilizam os respective membros para dilemas e questões morais com as quais se podem defrontar; outros s~ menos ambiciosos e funcionam mais como forma de protecção do grupo profissional à que como repositórios de normas de conduta. Duas questões dominam o panorama recente no âmbito da ética relativa à investigaçii com sujeitos humanos; o consentimento informado e a protecção dos sujeitos contra qua quer espécie de danos. Tais normas tentam assegurar o seguinte: T 1. Os sujeitos aderem voluntariamente aos projectos de investigação, cientes d natureza do estudo e dos perigos e obrigações nele envolvidos. 2. Os sujeitos não são expostos a riscos superiores aos ganhos que possam advir. Estas directrizes são normalmente postas em prática mediante o recurso a formuláric contendo a descrição do estudo, o que será feito com os resultados e outras informaçõe pertinentes. A assinatura do sujeito aposta no formulário é prova de um consentiment informado. Hoje em dia, existem comissões relativas aos direitos dos sujeitos humanos n ~ ,.. ---1"""00'' ' '"""'--Il'I!l4.--- ~ ,I.<_,III,lIl'... 1II,1IIlIl34I11SlI!IIlIlIIit2lllll ';SS", ,iú.~' maioria das instituições, cujo objectivo é o de considerar as propostas de investigação, certificando-se que a investigação proposta assegura o consentimento informado e a segurança dos participantes. Esta resposta burocrática à preocupação com a possível exploração e dano trazido aos sujeitos resultou da denúncia pública de projectos de investigação que eram perniciosos para os sujeitos humanos de formas extremas. Por exemplo, descobriu-se que ao serem admitidos na Willowbrook State School para deficientes mentais, estes eram injectados com o vírus da hepatite como parte de um estudo sobre vacinas. Noutra zona do país, foi denunciado que, sem o seu conhecimento, um grupo de homens com sífilis não recebia tratamento. A outros sujeitos experimentais mentiu-se quando participavam num estudo e assistiam àquilo que pensavam ser a administração de choques eléctricos a outros seres humanos que, na realidade, eram actores contratados pelo projecto. É evidente que tem que se pôr cobro a tais abusos. Contudo, não são tão evidentes as relações entre as regulamentações existentes e aquilo que os investigadores qualitativos fazem (Duster, Matza e Wellman, 1979; Thorne, 1980; Wax, 1980; Taylor, 1987). Nos últimos anos surgiram propostas relativas a um código deontológico para os investigadores qualitativos (CasseI, 1978; CasseI e Wax, 1980; Punch, 1986). Muitos investigadores qualitativos têm chegado à conclusão de que a relação entre sujeito e investigador é tão diferente nas abordagens qualitativa e quantitativa que o seguimento dos procedimentos habituais de consentimento informado e protecção de danos pouco mais parece ser do que um ritual. No tipo de investigação para o qual tais procedimentos foram estabelecidos os sujeitos têm uma relação muito limitada com o investigador; limitam-se a preencher questionários ou a participar em experimentos específicos. É possível informar explicitamente os sujeitos relativamente ao conteúdo e possíveis danos inerentes ao estudo. Por outro lado, na investigação qualitativa a relação é continuada; desenvolve-se ao longo do tempo. Conduzir investigação qualitativa assemelha-se mais ao estabelecimento de uma amizade do que de um contrato. Os sujeitos têm uma palavra a dizer no tocante à regulação da relação, tomando decisões constantes relativamente à sua participação. Os procedimentos de controlo fazem mais sentido nos estudos em que é possível delinear o plano experimental completo antes do seu início. Como já vimos, na investigação qualitativa estes planos não existem. Por exemplo, ao submeter-se um projecto de investigação a determinada comissão sobre sujeitos humanos, só é possível incluir uma descrição esquemática do que se irá passar. relativas aos princípios éticos noutros capítulos, mas, de momento, pretendemos expl citar alguns princípios gerais que orientam a investigação da maioria dos investigadon qualitativos. Tais princípios aplicam-se mais às pessoas que conduzem investigaçi básica. Como iremos sugerir no capítulo VII, os princípios éticos seguintes podem s< irrelevantes para algumas formas de investigação aplicada, particularmente naquilo qu designamos por investigação-acção. I. As identidades dos sujeitos devem ser protegidas, para que a informação que o ir vestigador recolhe não possa causar-lhes qualquer tipo de transtorno ou prejuíz< O anonimato deve contemplar não só o material escrito, mas também c relatos verbais da informação recolhida durante as observações. O investigadc não deve revelar a terceiros informações sobre os seus sujeitos e deve ter partict lar cuidado para que a informação que partilha no local da investigação não venh a ser utilizada de forma política ou pessoal. 2. Os sujeitos devem ser tratados respeitosamente e de modo a obter a sua coop, ração na investigação. Ainda que alguns autores defendam o uso da investigaçã dissimulada, verifica-se consenso relativo a que na maioria das circunstâncias c sujeitos devem ser informados sobre os objectivos da investigação e o se consentimento obtido. Os investigadores não devem mentir aos sujeitos neI registar conversas ou imagens com gravadores escondidos. 3. Ao negociar a autorização para efectuar um estudo, o investigador deve ser claro explícito com todos os intervenientes relativamente aos termos do acordo e dev respeitá-lo até à conclusão do estudo. Se aceitar fazer algo como moeda de troe pela autorização, deve manter a sua palavra. Se concordar em não publicar c seus resultados, deve igualmente manter a palavra dada. Dado que os investig, dores levam a sério as promessas que fazem, deve-se ser realista nas negociações 4. Seja autêntico quando escrever os resultados. Ainda que as conclusões a qu chega possam, por razões ideológicas, não lhe agradar, e se possam verific, pressões por parte de terceiros para apresentar alguns resultados que os dado não contemplam, a característica mais importante de um investigador deve ser sua devoção e fidelidade aos dados que obtém. Confeccionar ou distorcer dado constitui o pecado mortal de um cientista. Mesmo que as considerações relativas ao consentimento informado e protecção dos sujeitos humanos, tal como são tradicionalmente formuladas, não se adequem muito à abordagem qualitativa, as questões éticas são obviamente de interesse (Burgess, 1984). Mesmo que os investigadores qualitativos não tenham escrito um código deontológico específico, existem convenções de ordem ética para o trabalho de campo (Punch, 1986). Como sugerimos no capítulo IV, diferentes estilos e tradições de trabalho de campo operam sob princípios éticos igualmente diferentes. Vamos fazer sugestões específicas Apesar de termos apresentado quatro princípios éticos, tal como se passa com toda as regras, existem excepções e problemas que levam a que, nalguns casos, estas possar parecer inadequadas ou de difícil implementação, ou mesmo impossíveis de pôr er prática. Por vezes, quando se efectua investigação, é difícil ou impossível proteger identidade dos sujeitos. Além do mais, os sujeitos envolvidos podem afirmar que lhes indiferente a divulgação das suas identidades. Nestas circunstâncias, a regra do anoni mato pode ser ignorada. Algumas situações apresentam problemas delicados, porqu 76 77 n-'' ' ' ' .'f\l'~.'l!'i'mli4MI!\ I~ ..... .I.$--------.X.a: --~;,;: M1J? colocam o investigador numa posição em que as suas obrigações como investigador podem colidir com as suas obrigações como cidadão. Pode acontecer-lhe, por exemplo, deparar-se com corrupção ou uso indevido de fundos públicos, ao estudar determinada escola. Em estudos que realizámos em instituições estatais para os deficientes mentais, assistimos a casos de abuso físico dos residentes. Quais as responsabilidades éticas dos investigadores em casos semelhantes (Taylor, 1987)? Devem ignorá-los, em nome da investigação? No caso do abuso físico, a decisão pode, à primeira vista, parecer óbvia: seja-se ou não investigador, deve-se intervir para acabar com os abusos. Foi exactamente esta a nossa reacção inicial, mas viemos a saber que se tratava de uma prática generalizada à maioria das instituições nacionais semelhantes e não a prerrogativa de uma única instituição. Terá o acto de denúncia pública sido uma forma responsável de lidar com o problema ou terá antes constituído um modo de nos livrarmos do problema? O facto de intervir pode levar ao fim da investigação. Será que continuar a investigação, publicar os resultados, escrever relatórios a denunciar este abuso nacional e proporcionar elementos de investigação a testemunhas em tribunal (ou depor como perito) não fariam mais para modificar a situação do que um acto isolado de intervenção? Não terá a denúncia funcionado como uma desculpa para evitar um envolvimento maior? Os dilemas como este não se resolvem facilmente, em função de um conjunto de prescrições normativas. Ainda que possam existir linhas de orientação para a tomada de decisão de carácter ético, as decisões éticas complexas são da responsabilidade do investigador, baseiam-se nos valores deste e na sua opinião relativa ao que pensa serem comportamentos adequados. Enquanto investigador é importante que o leitor tenha consciência de si próprio, dos seus valores e crenças. Tem de saber definir a sua responsabilidade para com outros seres humanos quando estiver em contacto com o sofrimento destes (Taylor, 1987). A investigação qualitativa possibilita tais contactos. Para muitos investigadores qualitativos as questões éticas não se restringem ao modo de comportamento durante o trabalho de campo. A ética é mais entendida em termos de uma obrigação duradoira para com as pessoas com as quais se contactou no decurso de toda uma vida como investigador qualitativo. As questões éticas assumem diferentes formas consoante surjam em momentos diferentes do trabalho de campo e do processo de investigação. Como discutiremos no capítulo III, por exemplo, as feministas têm vindo a demonstrar uma preocupação crescente com as questões éticas associadas à entrevista. Em que consiste o presente livro pós termos elaborado uma,\. ntrodução geral aos fundamentos da .investi~ação q~a tativa, o nosso objectivo para o resto do livro é o de apresentar mstruçoes relau\ A ao "modo de a efectuar". Ainda que os investigadores mais experientes o pOSSl achar útil, servindo para relembrar diversas questões e clarificar aspectos particulares q não foram apresentados de forma tão clara noutras fontes, escrevemos essencialment( pensar nos "noviços", as pessoas que se encontram a fazer uma cadeira introdutória investigação qualitativa em educação. O resto do livro foi elaborado com base nas cinco características que discutimos presente capítulo. Consideramos, em primeiro lugar, as questões do plano de investigaç1 acentuando a natureza indutiva da abordagem. O capítulo III contempla o trabalho campo. O carácter naturalista da investigação, bem como a predominância da pessoa investigador enquanto instrumento de investigação, será particularmente evidente longo da exposição. No capítulo IV, reserva-se um papel central à natureza descritiva d dados que o investigador qualitativo recolhe. Descrevemos as diversas formas que dados podem assumir e algumas sugestões para a sua recolha. Voltando ao carácter ind tivo da abordagem, centramo-nos exaustivamente na análise dos dados, no capítulo V. r capítulo VI, a natureza narrativa e descritiva da análise qualitativa orienta a discuss sobre a escrita e divulgação dos resultados. Por sua vez, dadas as preocupações aplicad da investigação educacional, o capítulo VII é dedicado à aplicação dos métodos qualita vos à avaliação, à mudança social e ao trabalho pedagógico. n .,-'~.,'"'-', "- - ~ .-L_&22_.__,;, ,.~~~ NOTAS 1. A expressão "investigação de campo" tem, em educação, um significado polissémico. Os investigadores nO campo da educação que tiveram formação psicológica utilizam-na para se referir a qualquer investigação, incluindo a experimental, que é conduzida em contextos não laboratoriais. Os outros, com formação em antropologia e sociologia, utilizam-na de forma mais específica e restritiva, para se referirem exclusivamente ao tipo de investigação que temos vindo a descrever. 2. Contudo, só em 1957 é que surgiram as verbas. II 3. Para histórias interessantes relativas a diferentes aspectos da investigação qualitativa. ver Bumett (J 978). Carey (1975), Faris (1967), Matthews (1977) e Wax (1971). 4. Roy Stryker da "Unidade de Fotografia" da Farrn Security Administration. 5. Wax, de facto, sublinha que Robert Park recomendou o livro aos seus alunos de sociologia, na Universidade de Chicago. 6. Comentam, por exemplo: "Especializámo-nos no estudo comparativo do funcionamento de instituições sociais particulares, num país específico, mediante observação e análise, observação ou participação pessoal no funcionamento da organização, registo de relatos proporcionados por terceiros, estudo de todos os documentos disponíveis e consulta da literatura mais geral" (Webb e Webb, 1932). 7. A presente exposição baseia-se em Ban1ett er ai. (1939), Roberts (1976) e Wax (1971). 8. O próprio Thomas reconhece ter sido influenciado pelos escritos de Boas (Baker, 1973). 9. O ponto de vista oposto, naquilo que fui um debate duradouro, foi apresentado por E. T. Krueger (que fez a sua tese em Chicago sobre documentos pessoais) em dois números do Journal ofApplied Sociology: The Technique of Securing Life History Documents 9" (1925): 290-298; e "The Value of Life History Documents for Social Research 9" (1925): 196-201. 10. Foram ambas realizadas por mulheres na década de 1890: por Hanna B. Clark, The Puhlic Schools Df Chicago: A Soci%gical Srudy (1897) e por Ira W. Howerth, The Social Aim Df Educarion (1898). 11. Faris (1967) apresenta a listagem de todas as dissertações de mestrado e doutoramento em sociologia realizadas na Universidade de Chicago entre 1893 e 1935, bem como dos respectivos autores. 12. O estudo de Whyte constitui um excelente exemplo de observação participante. O termo observação participante foi inicialmente utilizado em 1925, por Eduard Lindeman (1925), no seu trabalho Social DiscovelY, mas originalmente o termo descrevia o que se pode designar por um informador. Para Lindeman o observador participante, como oposto do que ele designava por "observador objectivo", participava activamente nas actividades ou contexto a estudar e não na projecto de investigação. A descrição que faz do observador participante assenta como uma luva a "Doe", o seu principal informador em Comervilles. 13. Curiosamente, um dos mais famosos fotógrafos documentaristas, Lewis Hine, realizou trabalho fotográfico para o Levantamento de Pittsburgh e trabalhou, novamente, para Paul Kellog, quando este era director da revista, Chariry and rhe Commons (posteriOlmente, The Survey). 14. Stott (1973), ao discutir o documentário como forma de expressão, nos anos trinta., sugere que uma dimensão importante dos documentos, particulannente dos documentos humanos, reside na sua capacidade de eliciar não só uma reacção intelectual, mas também uma emocional. Os documentos, sugere Stott, proporcionam um testemunho "de uma existência interior, de um eu privado". É, muito possivelmente, este aspecto dos documentos pessoais, que os sociólogos de Chicago dos anos vinte e trinta consideraram como dados, que criaram grandes problemas aos investigadores em educação, que estavam particulannente preocupados com o rigor e com o carácter aparentemente irrefutável dos números. Se a quantificação era a pectra-de-toque científica, então este tipo de documentos era suspeito. 15. À época ainda não existiam antropólogos da educação, como George Spindler declarou numa conferência sobre educação e antropologia, em 1954 (Spindler, 1955), ainda que tettha sido publicado na Harvard Educariona/ Revie..., nesse mesmo ano, um artigo com as palavras "antropologia da educação" no título (Rosensteil. 1954). 16. Mead não escreveu livro~ foi compilado pelos seus alunos, com base nas aulas. PLANO DE ,., INVESTIGAÇAO ° 81 IQE-6 80 -1-. ...... ..........".",.""WiN"''''iAl!lIlIIIllll.4141! li I ----.. $ -. . . . . . . c. - $ $ e interrogarmos uma das nossas melhores amigas acerca do lugar onde passará a férias, dirá para onde se dirige e concluirá: "logo vejo, à medida que for andandc como se passarão as coisas". Uma outra fará projectos detalhados, programandc antecipadamente, todas as etapas (incluindo os restaurantes) e o respectivo percurso. En investigação, o termo "plano" é utilizado como um guia do investigador em relação ao passos a seguir. Na investigação qualitativa em educação, o investigador comporta-s mais de acordo com o viajante que não planeia do que com aquele que o faz meticulo samente. Em investigação qualitativa, uma das estratégias utilizadas baseia-se no pressuposV de que muito pouco se sabe acerca das pessoas e ambientes que irão constituir o object, de estudo. Os investigadores esforçam-se, intelectualmente, por eliminar os seus pre conceitos. Seria ambicioso, da sua parte, preestabelecer, rigorosamente, o método par. executar o trabalho. Os planos evoluem à medida que se familiarizam com o ambiente pessoas e outras fontes de dados, os quais são adquiridos através da observação directa Após a conclusão do estudo efectua-se a narração dos factos, tal como se passaram, e , elaborado, em retrospectiva, um relatório detalhado do método utilizado. Quando inician um trabalho, ainda que os investigadores possam ter uma ideia acerca do que irão fazeI nenhum plano detalhado é delineado antes da recolha dos dados. Além disso, o investi gador qualitativo evita iniciar um estudo com hipóteses previamente formuladas para tes tar ou questões específicas para responder, defendendo que a formulação das questõe deve ser resultante da recolha de dados e não efectuada a priori. É o próprio estudo qUi estrutura a investigação, não ideias preconcebidas ou um plano prévio detalhado. Os investigadores qualitativos têm um plano, seria enganador negar tal facto. A formo como procedem é baseada em hipóteses teóricas (que o significado e o processo são cruciai: na compreensão do comportamento humano; que os dados descritivos representam o materia mais importante a recolher e que a análise de tipo indutivo é a mais eficaz) e nas tradições dó recolha de dados (tais como a observação participante, a entrevista não estruturada e a anális( de documentos). Estas fornecem os parâmetros, as ferramentas e uma orientação gera para os passos seguintes. Não se trata de negar a existência do plano, mas em investigaçãl S 82 ··J.-*'-""""""- 83 I a ___ a lU \~ qualitativa trata-se de um plano flexível. Os investigadores qualitativos partem para um estudo munidos dos seus conhecimentos e da sua experiência, com hipóteses formuladas com o único objectivo de serem modificadas e reformuladas à medida que vão avançando. Os investigadores tradicionais definem o plano como o produto final da fase de planeamento da investigação. Este plano é, então, posto em prática, procede-se à recolha e análise de dados e, em seguida, passa-se à fase da escrita. Embora as investigações qualitativas decorram de forma semelhante, as diferentes fases não são tão individualizadas. O planeamento é efectuado ao longo de toda a investigação. A análise dos dados verifica-se ao longo de toda a investigação, se bem que seja normalmente nas fases finais que os dados são analisados de forma mais sistemática. Esta análise e a elaboração do plano podem ser feitas em simultâneo. O presente capítulo, sobre o plano, contém informações que podem contribuir para a compreensão da análise; da mesma forma que o capítulo V (Análise de Dados) contém conceitos importantes para a concepção do plano. A descrição geral do plano representa uma plataforma aceite pela maioria dos investigadores qualitativos, mas isso não significa que todos estejam de acordo com a definição que acabámos de apresentar. Alguns concebem-no de forma mais estruturada. Podem elaborar um modelo de entrevista que seguem à risca. Outros são ainda menos estruturados, vagueando entre os dados sem nunca elaborar, de forma consciente, um plano. É o método próprio que utilizam nos seus trabalhos, assim como os objectivos e a sua experiência de investigação, que vai definindo as etapas. O presente capítulo é sobre o plano. A nossa discussão inicia-se com os factores a considerar na escolha de um objecto de estudo. Trataremos, então, do plano e sua articulação com estudos específicos de "caso" e "fontes múltiplas de dados". Desenvolvendo o tópico do plano quando aplicado a estudos de fontes múltiplas de dados, apresentamos dois planos utilizados para elaborar teoria fundamentada: a indução analítica e o método comparativo constante. 84 D A escolha de um estudo um estudo analítico as decisões são tom~das à med.ida ~ue este a:,ança. As prime ras poderão ser: Qual será o tema da mmha mvestlgaçao? Que tIpo de dados de\ procurar? Que perspectiva devo adoptar? Não desanime tentando encontrar as re postas "certas" a estas questões. Embora seja importante que lhes responda não deve COi siderar as suas escolhas como certas ou erradas. Se, para efectuar o seu estudo, escolh uma escola e preterir outra, as conclusões a que chegará poderão ser diferentes, mas nã necessariamente, mais ou menos válidas. As decisões que tomar nem sempre são determ nantes, mas é indispensável que as tome. Os investigadores experientes têm, frequentemente, uma agenda de investigação. Es consiste num planeamento das suas carreiras de investigação - os temas que gostariam ( estudar e os objectivos que se propõem cumprir. Procuram, activamente, as oportunidadl para executar o seu trabalho. Alguns seguem tão fielmente essa agenda que recu.sam ?PO tunidades de investigação por não se enquadrarem no seu plano geral. Para o pnnclplant no entanto, a escolha de um tema de investigação é mais inquietante. A agenda de u: investigador desenvolve-se a partir de várias fontes. Frequentemente, a própria biograf pessoal influencia, de forma decisiva, a orientação de um trabalho. Certos pormenore ambientes ou pessoas tomam-se objectos aliciantes porque intervieram, de forma dec siva, na vida do investigador. Outros iniciam-se numa determinada área porque u· professor ou alguém que conhecem se dedica a um projecto afim. Por vezes, a escolha ainda mais acidental: surge uma oportunidade; acorda-se com uma ideia; no desempent de uma tarefa de rotina encontra-se algum material que desperta curiosidade. Independel temente da forma como surge um tópico, é essencial que ele seja importante e estimulan N 85 .-L__, -------------------I-------.i:.i~~ -.'*'"-""-M .• para si. Em investigação, a autodisciplina só o pode levar até um certo ponto. Sem um toque de paixão pode não ter fôlego suficiente para manter o esforço necessário à conclusão do trabalho ou limitar-se a realizar um trabalho banal. Se alguém lhe pedir para se encarregar de um estudo, certifique-se de que este é suficientemente interessante para o manter entusiasmado. Com os milhares de assuntos e fontes de dados disponíveis não se sobrecarregue com um assunto que considere maçador. Sendo as hipóteses de escolha infinitas, tomam-se necessários alguns conselhos. Em primeiro lugar, seja prático. Escolha um assunto cuja extensão e dificuldade lhe pareçam razoáveis, a fim de que este possa ser concluído com as fontes existentes e dentro do prazo previsto. Leve também em conta as suas capacidades, as quais, nesta fase, ainda não foram testadas nem puderam ser desenvolvidas. Mais tarde, daremos sugestões mais concretas relacionadas com aspectos práticos de alguns estudos específicos. Regra geral a investigação qualitativa é demorada; é um trabalho intensivo. Tente limitar o número de horas que a ele se dedica, bem como a extensão da revisão que faz. Tente obter informação sólida e concentrada e não artigos abrangendo uma área muito vasta. A localização das suas fontes de dados pode ser determinante. Antes de iniciar um projecto, pode não considerar muito importante o facto de ser obrigado a atravessar a cidade para chegar a uma escola, ou de se deslocar a outra cidade para consultar documentos oficiais ou entrevistar professores. Mas, à medida que avança no seu trabalho, a necessidade de viajar pode tomar-se difícil de suportar. Poderá prolongar, desnecessariamente, o trabalho, dificultar-lhe o acesso e, consequentemente, diminuir o seu empenho. Se a fonte de dados não lhe for facilmente acessível não lhe será possível entrar e sair, rapidamente, do campo de observação. A segunda sugestão consiste na conveniência de não escolher um assunto em que esteja pessoalmente envolvido. Se ensina numa escola, por exemplo, não deve escolhê-Ia como local da pesquisa. Apesar de alguns investigadores já terem efectuado, com sucesso, estudos em que se encontravam, pessoalmente, envolvidos (ver, por exemplo, McPherson, 1972; Rothstein, 1975), aconselhamos, ao principiante, a escolha de locais onde seja, em maior ou menor grau, um estranho. "Porquê? Não terei vantagens, em relação a alguém estranho, se estudar a minha própria escola? Tenho relações excelentes e acesso garantido". Por vezes, isto pode ser verdade, e podem ser razões suficientes para ignorar o nosso conselho, mas, sobretudo num primeiro estudo, as razões para não o fazer são muito fortes. As pessoas intimamente envolvidas num ambiente têm dificuldade em distanciar-se, quer de preocupações pessoais, quer do conhecimento prévio que possuem das situações. Para estas, muito frequentemente, as suas opiniões são mais do que "definições da situação", constituem a verdade. Os outros protagonistas, no local onde efectua a sua pesquisa, se o conhecem bem, dificilmente o poderão considerar um observador imparcial. Mais facilmente o consideram como um professor ou um membro de um grupo específico, como uma pessoa que representa determinada corrente de opinião e determinados interesses. Podem não se sentir à 86 .--I,-~ --.-. . """'.'!il"". vontade para falar despreocupadamente, como o fariam com outro investigador. Estu dando a sua própria escola, por exemplo, um professor não pode esperar que o directo discuta consigo objectivamente as suas opiniões acerca de outros colegas ou decisões qUi tomou no que diz respeito a contratações e despedimentos. Conduzir uma investigação com pessoas que conhece pode ser confuso e embaraçoso O treino de um investigador, mais do que a aprendizagem de competências e proce dirnentos específicos, consiste na análise de impressões acerca de si próprio e da sua rela ção com os outros. Implica que se sinta confortável no papel de "investigador". Se o~ objectos do seu estudo são pessoas que conhece, a transferência da sua personalidade pró pria para a de investigador faz-se de forma ambígua. Apesar de lhe termos dado todos estes conselhos não é obrigatório adoptá-los di forma rígida. Você, principiante, pode achar que é suficientemente experiente ou que ten com os seus colegas uma relação tal que não vai ter de se preocupar com as questões refe ridas. Força! Pode tentar: se obtiver bons resultados, óptimo; se não o conseguir não Ihl prometemos não dizer "já o tínhamos avisado". Ainda outra sugestão: tenha preferências, mas não seja obstinado nas escolhas. J princípio, não pode saber o que vai encontrar. Não adira, rigidamente, a planos preestabe lecidos. Considere as suas primeiras visitas como oportunidades para avaliar o que é pos sível efectuar. Se tem algum interesse específico, pode escolher indivíduos ou ambiente: onde pensa que este será patente, podendo chegar, posteriormente, à conclusão de que nã< encontrou o que esperava. Esteja preparado para modificar as suas expectativas ou o sei plano, caso contrário pode passar demasiado tempo procurando algo que pode não existir o "estudo certo". Temos tratado o questão da escolha de um tema como se este fosse indiferente. Os in vestigadores qualitativos partilham, geralmente, a convicção de que, independentemente di contexto, um investigador qualitativo encontrará sempre material importante. Esta atitudl contrasta com o receio do principiante de que só ambientes "muito especiais" possam pro porcionar material interessante. Pode haver alguma verdade no optimismo do investigado qualitativo, mas nem todos os ambientes são igualmente acessíveis ou estimulantes. Alguns temas e ambientes são difíceis de estudar porque os responsáveis pel: respectiva autorização ou os próprios sujeitos são hostis a pessoas estranhas. Nestas cir cunstâncias, pode levar meses até se conseguir autorização e um esforço aturado par, conseguir cooperação. Como investigador principiante, é natural que queira evitar este~ ambientes. A escolha do que estudar implica sempre ter acesso aos sujeitos envolvidm no estudo, bem como a avaliação das possibilidades de conseguir esse acesso. Querr são, por exemplo, os responsáveis pelos ficheiros (ou pelos contextos e indivíduos err que está interessado) e quais as probabilidades de a eles ter acesso? No capítulo III, ne qual focamos as relações dos investigadores, discutiremos o problema da "abordagem' e a forma de negociar as relações iniciais com patrocinadores e sujeitos. Até lá, não nm preocupemos com esta questão. 87 .I.us_------_i;." JU_ _ ".iill Para alé~ das consideraçõ.es a propósito da acessibilidade, a importância potencial de u~ estudo ~ um facto a considerar. Uma investigação pode contribuir para tirar concluso:s que sejam de crucial importância para a educação ou para a sociedade, em geral. Alem diSSO, alguns temas.e contextos foram repetidamente estudados enquanto que outros c~ntmuam ~elatJv~ente mexplorados. Ainda que na escolha de um tópico de investigaçao a ques:ao dos mteresses seja de importância capital, o leitor pode desejar tomar em conslderaçao o "estado da arte" do campo em que trabalha e as questões mais relevantes dos nossos tempos na escolha de um problema a investigar. D Estudos de caso té ao momento, abordámos o primeiro problema: a escolha de um estudo. Uma da A sugestões apresentadas dizia respeito à necessidade de espírito prático na escolh deste e à escolha de fontes de dados que fossem compatíveis com os seus recursc e competência. Não é por acaso que a maioria dos investigadores escolhe, para o seu pr meiro projecto, um estudo de caso. O estudo de caso consiste na observação detalhada d um contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de documentos ou de um aconteciment específico (Merriam, 1988). Os estudos de caso podem ter graus de dificuldade variáve tanto principiantes como investigadores experientes os efectuam, apresentando com caracteristica o serem mais fáceis de realizar do que os estudos realizados em múltiplc locais simultaneamente ou com múltiplos sujeitos (Scott, 1965). Comece por um estud de caso. Tenha uma primeira experiência gratificante e prossiga, se assim o desejar, pai estudos mais complexos. O plano geral do estudo de caso pode ser representado como um funil. Num estud qualitativo, o tipo adequado de perguntas nunca é muito específico. O início do estudo representado pela extremidade mais larga do funil: os investigadores procuram locais c pessoas que possam ser objecto do estudo ou fontes de dados e, ao encontrarem aqui] que pensam interessar-lhes, organizam então uma malha larga, tentando avaliar o intl resse do terreno ou das fontes de dados para os seus objectivos. Procuram indícios c como deverão proceder e qual a possibilidade de o estudo se realizar. Começam pela rec( lha de dados, revendo-os e explorando-os, e vão tomando decisões acerca do objectivo c trabalho. Organizam e distribuem o seu tempo, escolhem as pessoas que irão entrevistar quais os aspectos a aprofundar. Podem pôr de parte algumas ideias e planos iniciais desenvolver outros novos. À medida que vão conhecendo melhor o tema em estudo, I 88 89 .__._. . .,.,. . . .-.----------__1 ,,, planos são modificados e as estratégias seleccionadas. Com o tempo acabarão por tomar decisões no que diz respeito aos aspectos específicos do contexto, indivíduos ou fonte de dados que irão estudar. A área de trabalho é delimitada. A recolha de dados e as actividades de pesquisa são canalizadas para terrenos, sujeitos, materiais, assuntos e temas. De uma fase de exploração alargada passam para uma área mais restrita de análise dos dados coligidos. Esta fase do processo será tratada, mais detalhadamente, no capítulo V. Existem muitos tipos diferentes de estudos qualitativos (Wemer e Schoepfle, 1978a, b). Cada um deles implica métodos específicos para avaliar a possibilidade da sua realização, bem como os procedimentos a adoptar. ESTUDOS DE CASO DE ORGANIZAÇÕES NUMA PERSPECTIVA HISTÓRICA Estes estudos incidem sobre uma organização específica, ao longo de um período determinado de tempo, relatando o seu desenvolvimento. Por exemplo, pode efectuar o estudo de uma determinada "escola aberta", investigando como se deu o seu aparecimento, como decorreu o seu primeiro ano, que modificações se operaram ao longo do tempo, como se encontra actualmente (se ainda se encontra em funcionamento) ou as razões pelas quais foi encerrada. O seu estudo irá basear-se em entrevistas com pessoas que tenham estado relacionadas Com a organização, na observação da escola e nos registos escritos existentes. Se é sua intenção efectuar este tipo de estudo, faça alguma investigação preliminar, no sentido de se informar quais as pessoas disponíveis para entrevistar e sobre os documentos que foram preservados. Muitas vezes, este tipo de estudos não pode efectuar-se, unicamente, porque as fontes de informação são insuficientes para realizar um trabalho minimamente aceitável. A constatação, na fase inicial do seu inventário de pessoas e documentos, de que existe material suficiente fornece-lhe não só um ponto de partida como um plano para a sua recolha de dados. ESTUDOS DE CASO DE OBSERVAÇÃO Neste tipo de estudos, a melhor técnica de recolha de dados consiste na observação participante e o foco do estudo centra-se numa organização particular (escola, centro de reabilitação) ou nalgum aspecto particular dessa organização. Os sectores da organização que, tradicionalmente, se focam nestes estudos são os seguintes: I. Um local específico dentro da organização (a sala de aulas, a sala de professores, o refeitório). 2. Um grupo específico de pessoas (membros da equipa de basquetebol do liceu, professores de um determinado departamento académico). 3. Qualquer actividade da escola (planeamento do currículo ou o "namoro"). Frequentemente, os estudos utilizam uma combinação dos aspectos atrás referidos p~a neles concentrar os seus esforços. Por exemplo, num estudo efectuado em liceus, Cuslck (1973) focou-se na sociabilidade (uma actividade) entre os estudantes (um grupo). Freq,u~n­ temente os estudos de casos que recorrem à observação incluem um tratamento hlstonco do ambi~nte, o que representa um esforço suplementar de compreensão da situação ~ctual. Normalmente, o investigador escolherá uma organização, como a escola, e Ira concentrar-se num aspecto particular desta. A escolha de um determinado foco, seja ele u~ local na escola um grupo em particular, ou qualquer outro aspecto, é sempre um acto artIficial, uma vez' que implica a fragmentação do todo onde ele está integrado. O investigador qualitativo tenta ter em consideração a relação desta parte com o todo, mas, pela necessidade de controlar a investigação, delimita a matéria de estudo. Apesar de o lllvestigador tentar escolher uma peça que constitua, por si só, uma unidade, esta s~paração conduz sempre a alguma distorção. (A parte escolhida é considerada pelos própnos partIcipantes como distinta e, pelo observador, como tendo uma identida?e própria.) O investigador tem de observar a organização para escolher quaIs os locaIS, grupos ou programas ~ue proporcionam agrupamentos realizáveis. Após várias, visitas à escola poderá fazer as suas escolhas. Um ambiente fí~ico bom para estudar e aq~ele que um mesmo grupo de pessoas utiliza repetidamente. E evidente que nas escolas publIcas pode contar com as salas de aula, um gabinete, e geralmente uma sala de professores, mas, mesmo assim, não pode ter a certeza de que o estudo seja realizável. Algumas escolas, por exemplo, não têm sala de professores. Noutras, as salas de aulas podem não representar unidades físicas nas quais alunos e professores se organizem. . . As unidades físicas não são os únicos focos de estudo possíveis. Alguns lllvestlgadores, ao abordar numa organização, levam ideias muito precisas ac:rca do que pretendem estudar, por exemplo, um novo programa de leitura. Ao chegar a escola constatam que o professor que, supostamente, ia aplicar o programa se mudou, e o novo professor pôs o plano de parte. Isto acontece com maior frequência do que podemos pensar. Tenha as suas preferências, mas deixe que o foco lhe seja sugerido pelo contexto. Quando falamos acerca de um grupo, numa organização, como f?co de estudo, estamos a utilizar a palavra numa perspectiva sociológica, para nos refenrmos a pessoas que interagem, que se identificam umas com as outras e que partilham expect~tivas .em relação ao comportamento umas das outras. Pessoas que partilham características taIs como: idade, raça, sexo ou posição organizacional podem, contudo, não pertencer a u~ mesmo "grupo". Estas características comuns podem favorecer a amizade ou a coloqUlahdade, mas as pessoas que as partilham não formam, obrigatoriamente, um grupo. ~requente­ mente, as pessoas entram num ambiente, planeando um estudo de observaçao de, por exemplo, professores de origem mexicana, acabando por chegar à co~cluSão de que, na escola que escolheram, aqueles professores não passam o seu tempo Juntos e, aparentemente, não partilham uma identidade de grupo. Antes de decidir estudar um grupo deve informar-se acerca da estrutura informal da escola. 90 -'-----~_•. . . .-~.,-." 'ij." "'- - - - - - 91 •••.••1......._$& :_.---1----------_.. • __ .0$21 .•. Os indivíduos que partilham uma característica particular, mas que não formam grupos, podem ser sujeitos de um estudo qualitativo, mas, regra geral, a entrevista representa, neste caso, uma melhor forma de abordagem do que a observação participante. Aquilo que partilham entre si revelar-se-á mais claramente quando solicitar, individualmente, as suas perspectivas e não enquanto observa as suas actividades. Da mesma forma, o facto de partilharem as mesmas funções na organização não significa, necessariamente, que as pessoas formem um grupo. Num liceu todos os professores de Ciências têm algo em comum, mas nalgumas escolas o contacto entre eles pode verificar-se de forma tão esporádica que não podemos considerá-los como um grupo. Noutra escola, contudo, o departamento de Ciências pode ter reuniões regulares, tomar as refeições em conjunto e formar uma boa unidade para estudo. Na escolha de um ambiente ou grupo como foco de um estudo de caso de observação, recorde-se de que quanto menor for o número de indivíduos maior a probabilidade de que o comportamento destes seja alterado pela sua presença. É óbvio que seria uma intromissão escolher para o seu estudo dois estudantes vivendo uma relação romântica, e mesmo partindo do princípio de que tal intromissão seria tolerada, iria, com certeza, modificar significativamente aquilo que se estava a passar. Um maior número de indivíduos, por outro lado, toma normalmente menos intrusiva a sua presença. O que se toma difícil é a necessidade de recolher informação de toda a gente e trabalhar todos os dados e relações. Para o seu primeiro estudo tente escolher um ambiente ou um grupo que seja suficientemente grande para que você não sobressaia, mas suficientemente pequeno para que não se deixe submergir pela tarefa. Contudo, esta regra simples no que diz respeito ao tratamento de um contexto nem sempre funciona. As escolas proporcionam problemas relacionais particulares que desafiam a regra. Por exemplo, embora possa ter 25 pessoas numa sala de aula de escola primária só uma delas é adulta. O facto de o investigador ser o segundo adulto irá alterar as relações existentes, tomando-se difícil que a sua presença não seja intrusiva. (Para discussões desta questão, ver Fine e Glassner, 1979; Smith e Geoffrey,1968). HISTÓRIAS DE VIDA Neste tipo de estudo de caso, o investigador leva a efeito entrevistas exaustivas com uma pessoa, tendo como objectivo coligir uma narrativa na primeira pessoa (Helling, 1988). Quando este tipo de entrevista é feito por historiadores designada-se por tradição oral (Taylor e Bogdan, 1984, esp. cap. N). Frequentemente, os historiadores que se dedicam a este tipo de trabalho entrevistam pessoas famosas (presidentes e generais) a fim de obterem detalhes da história directamente dos que nela participaram. Quando entrevistam gente menos famosa (por exemplo, domésticas ou lavradores), estão mais interessados na forma como é vista a história na perspectiva do "cidadão comum". Os depoimentos sociológicos ou psicológicos, na primeira pessoa, obtidos através de entrevistas de estudos de caso estão, 92 geralmente, destinados a ser utilizados como veículos para a compreensão de aspect básicos do comportamento humano ou das instituições existentes, e não como mater, histórico. Aqui, o conceito de "carreira" é usado, frequentemente, para organizar a recol e apresentação dos dados. O termo "carreira" diz respeito às diversas posições, estádio~ formas de pensar dos indivíduos, ao longo das suas vidas (Hughes, 1934). As histórias I vida sociológicas são, frequentemente, uma tentativa para reconstituir a carreira dos inc víduos, enfatizando o papel das organizações, acontecimentos marcantes e outras pesso com influências significativas comprovadas na moldagem das definições de si próprios das suas perspectivas sobre a vida. A possibilidade de elaborar um estudo de caso de uma história de vida é determinad sobretudo, pela natureza do sujeito potencial. Trata-se de uma pessoa estruturada e co uma boa memória? Terá a pessoa tido os tipos de experiências e participado nas org nizações e acontecimentos que você deseja investigar? Terá ele ou ela disponibilidade I tempo? Regra geral, os investigadores que realizam este tipo de estudos de caso enco tram-nos por acaso. Não decidem qual o "tipo" de sujeito que desejam entrevistar partind em seguida, em busca de alguém que corresponda ao modelo. Pelo contrário, encontra uma pessoa que os impressiona como sendo um objecto interessante e resolvem, depo prosseguir o estudo. Geralmente, a facilidade e o plano desse tipo de estudo são detem nados, ora com base na conversa inicial, ora durante as primeiras entrevistas. Na elabor ção de um estudo de história de vida, quando o sujeito e o entrevistador não se conhece bem, a conversa gira em torno de assuntos neutros. Com a passagem do tempo, conteúdo toma-se mais revelador, o investigador sonda mais intimamente, e acaba p aparecer um foco. As entrevistas de história de vida podem ocupar mais de cem horas encontros gravados e mais de mil páginas transcritas. Enquanto que algumas entrevist de histórias de vida são dirigidas para abarcar a vida inteira do sujeito, desde o nas( mento até ao presente, outras são mais limitadas. Aqui procuram-se dados referentes a u período específico da vida da pessoa, tal como a adolescência ou a escola primária, ( sobre um aspecto particular, tal como as relações de amizade ou o namoro. (Para a di cussão do método da história de vida ver Becker, 1970b; Denzin 1970, cap. X; Dolla 1935; Plummer, 1983. Para a tradição oral ver McAdoo, 1976; e Shumway e Hartle 1973.) Existem muitas outras formas de estudos de caso. Alguns investigadores realiza estudos comunitários. Estes são semelhantes aos estudos de caso de organizações ou I observação, excepto pelo facto de o objecto do estudo ser um bairro ou uma comunidal e não uma escola ou outra instituição. Outra forma de estudo de caso foi designada p análise situacional. Neste tipo de estudo é investigado um determinado acontecimen (por exemplo, a expulsão de um aluno da escola) do ponto de vista de todos os pi ticipantes (o aluno, os seus amigos, os pais, o director e o professor que desencadeou acção). Os registos do caso podem ser utilizados de forma alargada. A microetnografia um termo utilizado com vários significados, mas, normalmente, refere-se a estudos, < 93 ._.~_. _."-L"..,' '. -------------------I..--,..- - _'U,""."'.._ ". . . u_'" .,,}ii caso realizados seja em unidades muito pequenas de uma organização (uma parte de uma turma), seja numa actividade organizacional muito específica (crianças aprendendo a desenhar). Tal como os antropólogos em educação utilizam esta designação, também os etnometodólogos a ela recorrem (ver Erickson, 1975; Smith e Geoffrey, 1968). Seja qual for o tipo de estudo de caso que escolha, a avaliação da viabilidade de execução do projecto é, em geral, muito óbvia. Não é possível, por exemplo, efectuar um estudo de caso ou utilizar registos relativos a alunos aos quais não tenha acesso. Algumas questões de carácter geral, no contexto da abordagem dos estudos de caso, merecem ser discutidas. Referimos uma delas, no primeiro capítulo, durante a discussão das possibilidades de generalização. Quando se procura um contexto ou um tema para um estudo de caso sente-se, frequentemente, um dilema quanto ao local onde encontrar a chamada situação "típica" (aquela que mais se assemelha com a maioria das do mesmo tipo), ou a situação "atípica" (claramente um caso excepcional). Suponhamos que decide estudar uma terceira classe em meio urbano. Será que, previamente, deveria tentar descobrir qual a lotação média das terceiras classes nas cidades dos Estados Unidos, a média de anos de experiência que os professores destas classes possuem, a composição racial e étnica típica destas classes e escolher a classe baseado nestes dados? Ou deveria escolher uma classe onde o professor aplica um novo método de leitura ou uma nova distribuição em grupos ou, talvez, escolher a única turma, na cidade, onde se encontra uma criança com síndroma de Down? Deverá escolher um professor de grande prestígio ou um que parece estar a experimentar alguns problemas? Todas as características que acabámos de mencionar como podendo estar associadas com a terceira classe sugerem a dificuldade na escolha de uma turma deste nível que possa, indiscutivelmente, ser considerada típica. Mesmo assim, alguns investigadores tentarão escolher um local que não seja, aparentemente, muito atípico a fim de evitar a acusação de que se trata de uma situação excepcional. Os investigadores que escolhem o "caso típico" estão interessados na possibilidade de generalização tal como ela é, tradicionalmente, definida. Pretendem retirar algumas conclusões a propósito das terceiras classes em geral, através do estudo de uma só delas. Tal como já sugerimos, é provável que se tomem polémicos ao tomar estas decisões e, consequentemente, não as tomem ou deixem que os leitores tirem as suas próprias conclusões no que diz respeito à possibilidade de generalização. Alguns investigadores reclamam o direito à generalização baseando-se nas semelhanças dos seus resultados com outros referidos na literatura. A escolha intencional de um caso invulgar ou a escolha aleatória deixa em aberto a possibilidade de generalização. Como será possível articular o contexto escolhido com a diversidade do comportamento humano? A resposta a esta questão não se obtém directamente por selecção, mas tem de ser considerada como parte integrante do estudo. O investigador tem de definir o objecto do seu estudo; isto é, de que tipo de caso está a tratar? De qualquer forma, a maioria dos investigadores qualitativos é céptica em relação às categorias convencionalmente definidas e não aceita que coisas designadas com o mesmo 94 I nome ou aparentando as mesmas características sejam, obrigatoriamente, idênticas. S de opinião que o investigador deveria questionar os pressupostos acerca do que perten às categorias, em vez de permitir que esses pressupostos definam o plano da investigaç1 Tal como dissemos no início do presente capítulo, algumas decisões não podem ser con deradas correctas ou incorrectas, em si; representam apenas uma escolha. A decis relativa ao "típico" ou ao "invulgar" constitui, provavelmente, um exemplo desse tipo escolha. Temos vindo a discutir a abordagem geral que os investigadores adoptam nos plan de estudos de caso, mas não nos referimos à amostragem interna. Por amostragem inter entendemos as decisões que são tomadas a partir de uma ideia geral daquilo que se pI tende estudar, as pessoas com quem quereremos falar, qual a hora do dia em que o faI mos, quantos documentos e de que tipo iremos rever. Ao delimitar o foco do seu estw poderá, em muitos casos, examinar a população que lhe interessa, na sua totalidade; is é, falará com todas as pessoas do grupo e reverá todos os documentos disponíveis. Se n puder ver tudo e falar com todos os sujeitos vai querer certificar-se de que a sua amostl gem é suficientemente vasta, de modo a explorar a diversidade de tipos. Vai querer COI preender a variedade de material e a variedade de perspectivas existentes. Contudo, i também fazer escolhas com base na qualidade dos dados obtidos. Como discutiremos] capítulo IV, alguns sujeitos estão mais dispostos a falar, têm mais experiência do contex ou são particularmente intuitivos em relação às situações. Estas pessoas tomam-se infc madores-chave e, frequentemente. irá falar com eles por períodos de tempo muito maiOl do que com os outros. Existe um risco em confiar, exclusivamente, num pequeno núme de indivíduos, mas não deve abordar a amostragem interna com a ideia de que deve pass períodos de tempo iguais com todos eles. Deve manter a mesma atitude no que diz f( peito a documentos e outro material; algumas fontes de dados são, realmente, mais rica~ merecem maior atenção. No que diz respeito à amostragem de tempo, o tempo durante o qual visita um loe ou está com uma pessoa influenciará o tipo de dados que irá obter. As escolas são diJ rentes no início e no fim do ano. De forma semelhante, também a rotina matinal nur turma pode ser bastante diferente daquela que ocorre à tarde. Os documentos são diJ rentes consoante o momento histórico em que são elaborados. O periodo de tempo repl sentado pelos dados dependerá das limitações de tempo do investigador, bem como I interesse que a investigação lhe suscita. Se o estudo se centra numa turma em particul poderá querer obter uma amostragem alargada de diversos períodos do dia, semana e ar Se decide estudar um recreio, antes do início do dia escolar, as exigências de amostrage diferem. Tal como na maioria das decisões que os investigadores qualitativos deve tomar, as relacionadas com a escolha de informadores e distribuição do tempo são seI pre tomadas no contexto do estudo. Estas escolhas, na sua situação particular, devem s coerentes com os seus objectivos. Resultam logicamente tanto das premissas da abord gem qualitativa como das contingências do estudo, à medida que estas se vão toman. 95 um • evidentes no decurso do trabalho. Muitas vezes o investigador pára para se perguntar: "Se escolher fazer isto .desta maneira, o que estarei a perder? E o que poderei ganhar?". Quanto mais consciente estiver das ramificações das escolhas, melhores possibilidades tem de fazer as escolhas mais sensatas. Outra dificuldade no planeamento está relacionada com a quantidade de tempo que deve dlspon~bllizar para um estudo de caso. Na maioria dos casos, você sabe de quanto tempo dlspoe ou quer dedicar ao estudo, e planeia-o tendo em conta estes limites. ~ncurta o estudo, tentando encontrar uma peça que consiga completar no tempo que lhe tmha destmado. Pode, por exemplo, decidir que quer completar a recolha de dados dentro de quatro meses e destina dois dias por semana para se dedicar ao trabalho. Frequentemente~ passado algum tempo após ter iniciado a recolha de dados, terá a noção de que subestimou o tem~o de que necessitava. Faça alguns ajustamentos para corrigir o engano, ou aum:nte o ~enodo de. tempo semanal em que trabalha nele ou prorrogue o prazo de conclusao ou, aJnda, estreite mais o foco de trabalho. Algumas pessoas iniciam os trabalhos dedicando-lhes algum tempo por semana e deixan~o no ar a questão de qual será a sua duração. Nesta forma de abordagem (e, em certa medida: ajustando as etapas do estudo ao tempo que para ele dispõe), os investigadores qualitativos afere~ a altura em que terminaram o estudo quando atingem aquilo que designam por :aturaçao de dados, o ponto da recolha de dados a partir do qual a aquisição de mformaçao se toma redundante. Evidentemente que quanto mais tempo se mantiver no mesmo trabalho ~ais informação acumula, mas o q?e se verifica é que atingiu um ponto em que a aqmslçao de mformação nova é diminuta. E o período em que, comparado com o tempo despendIdo, a aquisição de informação é mínima. O segredo está em descobrir esse ponto e parar. Claro que se o objectivo do seu estudo não é muito concreto pode continuar, mdefimdamente, mudando de assunto e colhendo dados de forma mais ou menos aleatória. Uma das dificuldades dos estudos de caso é a mudança constante de matéria substantiva. Quan~o acontece algo de novo que possa ser interessante, aumenta a tentação de redefinir os obJectivos e continuar o estudo. Seja flexível, mas para fazer a análise de resultados e completar o estudo tem de definir um ponto final. É bom que se aperceba de que muitos mve~tlgadores recolhem demasiados dados. Têm mais dados do que, alguma vez, consegmrao analisar. Os dados necessários à dissertação típica andam à volta de 700 a 1500 páginas de notas de campo e transcrições de entrevistas. Acabámos de apresentar uma revisão geral relativa à abordagem dos estudo de caso. ~xlste grande. diversidade no tipo de estudos de caso que tratámos. Uma das diferenças Jmportantes diZ respeito ao mteresse manifestado pelo investigador em chegar a conclusões substantivas ou conclusões teóricas. Por exemplo, um estudo centrado, sobretudo numa sala de aula deveria ter como objectivo a compreensão da dinâmica do comportam~nto da classe e a relação entre professor e alunos. Contudo, também poderia voltar a utilizar a sala de aula Para estudar processos sociais mais básicos, tais como os acordos disciplinares entre os vanos grupos. No primeiro caso, está a utilizar investigação qualitativa que lhe 96 I dirá alguma coisa a propósito de escolas; no segundo, a sala de aula fornece um local pan conduzir investigação destinada a gerar uma teoria acerca das relações humanas em geral A escolha da escola como ambiente de pesquisa é de importância capital no primeir< caso, e é relativamente irrelevante, no segundo. A maioria das pessoas pensa que todos os estudos de caso são descritivos. Embon eles sejam, tendencialmente, descritivos, podem assumir uma grande diversidade de for· mas e objectivos - o teórico e o abstracto, bem como o muito concreto. (Para exemplos d< estudo de caso ver Erickson, 1976; Floria, 1978; Rist, 1973; Smith e Geoffrey, 1968; < Wolcott, 1973.) Quando os investigadores estudam dois ou mais assuntos, ambientes, ou bases d< dados, realizam estudos de caso múltiplos. Os estudos de caso múltiplos assumem umf grande variedade de formas. Alguns começam sob a forma de um estudo de caso únic< cujos resultados vão servir como o primeiro de uma série de estudos, ou como piloto par, pesquisa de casos múltiplos. Outras investigações consistem, essencialmente, em estudo~ de caso único, mas compreendem observações menos intensivas e menos extensas nou· tros locais com o objectivo de contemplar a questão da generalização. Outros inv~stiga dores fazem estudos de caso comparativos. Dois ou mais estudos de casos são efectuado: e depois comparados e contrastados (ver, por exemplo, Lightfoot, 1978; McIntyre, 1969) Estes estudos de caso múltiplos seguem a maior parte das sugestões que já oferecemos Se se dedica a fazer uma recolha adicional de dados para demonstrar a possibilidade dI generalização ou da diversidade, a sua principal preocupação deverá ser a recolha en locais adicionais que possam ilustrar a variedade de ambientes ou de sujeitos à qual s{ possa aplicar a sua observação inicial. Se estiver a fazer um segundo estudo de caso par; comparar e contrastar, escolha um segundo local baseado na amplitude e na presença 01 ausência de algumas características particulares do estudo original. Por exemplo, se o seI tema é a integração, poderá querer observar uma terceira classe urbana, racialmente equi librada se, anteriormente, tinha estudado uma terceira classe suburbana onde era míniml o número de estudantes pertencentes a minorias. Após a conclusão do seu primeiro caso, descobrirá que nos estudos de caso múltiplo: os casos subsequentes são mais fáceis; levam menos tempo que o primeiro. Não só evo luiu a sua técnica como também o primeiro estudo de caso lhe forneceu o foco para defi nir os parâmetros para os outros. IOE-7 97 IJ Estudos realizados simultaneamente em múltiplos locais xistem plan.os de in~e~tigação utilizados em investigação qualitativa que requerem locaiS e. sUjeitos multiP.los e que sã? consideravelmente diferentes daqueles que temos vmd~ a tratar ate agora. Utilizam uma lógica diferente da abordagem dos estudos de caso multiplos porque se encontram orientados mais no sentido ·le desenvolver teon~ e re~u~rem, geralmente, vários locais ou sujeitos, e não apenas um ou dois. Quem deseje realiza-los deve ter tanto experiência de raciocínio teórico como também alguma na recolha ?e dados. Este tipO de pesquisa é difícil de realizar numa primeira tentativa. ~esmo assim apresentamos uma breve descrição de dois destes tipos de abordagem não so para lh~ dar algumas noções se insistir em arriscar, mas também para o familiarizar c~m a vanedade de planos que a investigação qualitativa compreende. Ainda que possa nao querer conduzir um estudo completo utilizando estes modelos, muitos dos elementos destes planos podem ser incorporados nos estudos de caso. E INDUÇÃO ANALÍTICA MODIFICADA A indução analítica é, não só, uma forma de abordar a recolha e análise de dados mas também uma forma de desenvolver e testar a teoria. Tem tido uma história longa ~ controversa (Becker, 1963; Denzin, 1970; McCall e Simmons, 1969; Robinson, 1951; Turner, 1953); ~ontudo, a modalidade de abordagem que aqui apresentamos difere um pouco da maneira como foi, inicialmente, utilizada (Cressey, 1950; Lindesmith, 1947: Znaniecki, 1934). O método de indução analítica é utilizado quando algum problema ou questão específica se transforma no foco da pesquisa. Procede-se à recolha e análise dos dados a fim de desenvolver um modelo descritivo que englobe todos as instâncias do fenómeno. Este método tem sido largamente utilizado nas entrevistas abertas, mas pode ser aplicado na observação participante, bem como na análise documentada. Para exemplificar, ilustraremos o método com um estudo hipotético. Jonah Glenn está interessado em avaliar a eficácia dos professores. Segundo pensa, alguns desempenham melhor a tarefa do que outros; o objectivo do seu trabalho será a compreensão deste fenómeno (Blase, 1980). Começa o seu estudo com uma entrevista aprofundada a uma professora que lhe recomendaram como sendo particularmente "eficiente". Tem, com ela, uma longa e detalhada entrevista da qual faz um registo magnético. Encoraja-a a falar da sua carreira, das suas ideias a propósito do método de ensino, da forma como estas têm evoluído ao longo do tempo e sobre as questões da eficácia. Durante a entrevista a professora descreve, detalhadamente, o seu desencanto durante as primeiras semanas em que leccionou, quando o seu entusiasmo (relacionado com as expectativas de realização pessoal, os planos que fizera em relação à forma de se comportar e ao tipo de relação criada com os alunos) foi confrontado com a "realidade" do seu novo emprego. Sendo professora há vinte anos descreve uma série de questões: os altos e baixos da sua carreira, as alterações do seu papel no desempenho das suas funções, algumas das suas primeiras experiências no ensino, as relações do trabalho com a sua vida pessoal e o seu conceito do que deve ser uma boa professora. Refere, ainda, algumas escolas onde leccionou e de que forma alguns aspectos particulares destas contribuíram para a sua realização bem como para os seus desempenhos nas aulas. Descreve a sua posição actual atribuindo-a ao reconhecimento da sua eficácia. Como complemento da entrevista Jonah visita a escola, observando a professora no desempenho das suas funções. Tomando como ponto de partida a entrevista e a observação inicial, Jonah Glenn desenvolve uma vaga teoria descritiva da eficácia do professor. Esta consiste num modelo da carreira, organizada em estádios, no qual o conceito de eficácia é definido de forma diferente nas diferentes fases da carreira do professor. Fazem parte da teoria os problemas enfrentados, bem como as decisões tomadas para os resolver. Relaciona, também, a vida pessoal do professor com a sua vida profissional, a fim de explicar a eficácia. Também foram considerados alguns aspectos particulares das escolas e as relações do professor com os outros. A teoria consiste em afirmações proposicionais e num diagrama da carreira, e das contingências desta, na sua relação com a eficácia. Além do mais, a formulação define a eficácia, explicando as suas dimensões. Após ter esboçado a teoria, Jonah escolheu um segundo professor para entrevistar. Na escolha que efectuou dos primeiros professores, Jonah utilizou a técnica da amostragem de bola de neve; isto é, pediu à primeira pessoa que entrevistou que lhe recomendasse outras. Entrevistou a segunda de uma forma semelhante à primeira (entrevista aberta), mantendo a teoria que tinha desenvolvido com base na sua primeira entrevista. 99 Após a segunda entrevista, Jonah reescreve e modifica a teoria de modo a contemplar o segundo caso. E assim por diante, continuando a escolher e a entrevistar novas pessoas, modificando a teoria de modo a contemplar cada novo caso. Depois de algumas entrevistas, Jonah escolhe indivíduos que espera possam constituir exemplos de casos negativos, professores que, segundo pensa, não se ajustarão ao modelo que se encontra em desenvolvimento. Por exemplo, as primeiras entrevistas foram, todas elas, feitas a professores nascidos e criados na cidade em que trabalhavam. O autor suspeita que os professores deslocados apresentam padrões de carreira diferentes e definem eficácia de forma também diferente. Jonah procura, deliberadamente, professores deslocados para testar a sua teoria. Procederá desta forma escolhendo novos indivíduos, alargando a teoria, até que não encontre nenhum caso que não seja contemplado pela teoria. No final do estudo terá uma teoria sobre os professores eficazes. Frequentemente, as teorias desenvolvidas por este processo incluem algumas afirmações que se aplicam a todos os professores entrevistados e outras que se aplicam, somente, a certos "tipos" de professores. Os "tipos" surgem como parte da teoria que se desenvolve. Assim, a teoria contém uma tipologia dos professores e mostra como estes tipos diferem entre si em relação às carreiras e às perspectivas e noções de eficácia. Provavelmente, o estudo hipotético que acabámos de apresentar não decorreria exactamente da forma como o descrevemos. Muitas vezes colocamos uma questão e fazemos uma entrevista, constatando que a nossa ideia inicial do assunto não condiz com os dados que estamos a obter. Por exemplo, os professores podem não pensar em termos de eficácia. Normalmente, as primeiras entrevistas conduzem à formulação da questão ou do problema, mais do que a afirmações proposicionais específicas. Além do mais, a estratégia do método consiste no recurso a entrevistas até que não se encontre nenhum caso que não seja contemplado pela teoria, processo este que é demasiado moroso para a maioria dos investigadores cumprirem no tempo de que dispõem. Assim, alguns investigadores delimitam estreitamente o seu estudo, definindo a população abrangida pela teoria. Pode decidir, por exemplo, entrevistar os professores de uma só escola. A teoria desenvolvida seria, então, a propósito da eficácia dos professores naquela escola. De forma semelhante, alguns investigadores decidem, antes de iniciar o estudo, qual o número de indivíduos que calculam ter tempo e recursos para entrevistar. Desenvolvem uma teoria baseada nesse número, sem preocupações de generalização. Tal como a teoria é modificada durante o processo de investigação para contemplar todos os factos que aparecem de novo, também a questão pode ser redefinida para excluir os casos que desafiam a explicação. A escolha de quais as categorias a excluir ou a incluir controla também a amplitude do trabalho, limitando a extensão da teoria. O tipo de plano que estamos a debater não lhe permite pronunciar-se acerca da frequência da distribuição dos diversos tipos incluídos na sua teoria. Pode achar importante para compreender a eficácia dos professores, por exemplo, pensar em termos de eficácia de professores principiantes, de professores a meio da carreira e de professores à beira da reforma. Este método de pesquisa assegura a inclusão de vários tipos de indivíduos, ma não lhe diz quantos ou em que proporção esses tipos aparecem na população. O métod de amostragem na indução analítica designa-se por amostragem de conveniência. Decide -se pela inclusão de indivíduos particulares porque se pensa que estes facilitam a expan são da teoria em formação. Não se trata aqui de amostragem aleatória, isto é, destinada assegurar que as características dos indivíduos no nosso estudo apareçam na mesma pro porção que na população geral. Robinson (1951) esquematizou esta versão modificada da indução analítica d seguinte forma: 1. No início da pesquisa desenvolva uma definição e uma descrição grosseira do fe nómeno escolhido. 2. Compare a definição e/ou a explicação com os dados, à medida que estes são reco Ihidos. 3. Modifique a definição e/ou a explicação, à medida que encontrar novos casos qu não sejam contemplados pela definição e explicação tal como foram formuladas. 4. Procure, deliberadamente, casos que pense não serem contemplados pela formu lacào elaborada. 5. R~defina o fenómeno e reformule a explicação até ser estabelecida uma relação universal, usando cada caso negativo como sinal da necessidade de uma redefi nição ou reformulação. Este plano não segue o modelo de funil que apresentámos anteriormente. A anális torna-se, de facto, mais abrangente, à medida que são apresentados novos casos e a teori em desenvolvimento torna-se, geralmente, mais fina. Os passos que acabámos de delinear representam um método de raciocinar e trabalha com dados. A maioria dos estudos qualitativos socorre-se de fragmentos do procediment geral, empregando-o de modo mais flexível. O termo hipótese de trabalho é, por veze~ utilizado pelos observadores participantes e algumas das técnicas da indução analític estão-lhe estreitamente ligadas. MÉTODO COMPARATIVO CONSTANTE Tal como temos vindo a referir, os planos de todos os estudos qualitativos implicam combinação da recolha de dados com a sua análise. Isto foi claro na versão modificada d indução analítica que apresentámos. A análise e recolha de dados desenrolaram-se alter nadamente - primeiro a entrevista, em seguida a análise e o desenvolvimento teóricc outra entrevista, e depois mais análise, e assim sucessivamente - até a investigação se completada. Na maioria dos tipos de estudos de caso são os temas emergentes que orien tam a recolha de dados, mas só quase no final desta se inicia a análise formal e o desen volvimento da teoria. O método comparativo constante (Glaser e Strauss, 1967; Straus~ 101 100 I ·c"""""~''T--· ~L-'fI'fI!II'll'l,1~"'II9M . . . . . .. II!.'I!I. r 1987) é um plano de investigação para fontes múltiplas de dados, no qual, tal como na indução analítica, a análise formal se inicia precocemente e está, praticamente, concluída no final da recolha de dados. Como se irá ver na nossa discussão, o método comparativo constante difere da indução analítica em vários aspectos. Começaremos com um exemplo hipotético e, de certa forma, demasiado simples relativamente à maneira como poderá proceder um investigador educacional, utilizando esta abordagem complexa. Mary Schriver está prestes a chegar a uma escola primária na qual irá iniciar um estudo bastante longo, utilizando o método comparativo constante. Ainda que não tenha seleccionado nenhum tópico específico, está interessada nos professores e, por isso, decide (e obteve autorização) proceder à observação da sala de professores. Planeia começar por aí e estar atenta ao que possa surgir. O primeiro dia no local é embaraçoso, mas, apesar de todas as apresentações e explicações acerca do que faz ali, tem oportunidade de ouvir muitas das conversas dos professores. Fica de imediato surpreendida porque a maior parte das conversas que escuta são sobre outras pessoas: os professores falam acerca dos alunos, dos outros professores e do pessoal administrativo. O tom da conversa varia entre o humorístico e o zangado, e algumas das conversas são interrompidas quando certas pessoas entram na sala. No dia seguinte, a senhora Schriver volta à mesma sala e ouve mais conversas do mesmo tipo. Decide estudar estas conversas e, deliberadamente, designa-as por "mexericos". Daí em diante, Mary concentra a sua actividade de recolha de dados nos episódios de mexeriquice. Tenta arranjar material na diversidade de géneros. Embora a sala de professores seja o local central de recolha de informação, à medida que vai conhecendo os professores sai da sala com eles para recolher dados noutros locais, dentro e fora da escola. Descobre locais especiais, menos conspícuos do que a sala de professores, nos quais alguns destes se encontram e conversam. Passa a ouvir estas conversas. Começa a observar de que forma as pessoas falam umas das outras, acabando por descobrir que o mexerico não é senão um tipo de uma categoria mais vasta que decide designar por "conversas sobre as pessoas". À medida que o trabalho avança os dados sugerem-lhe um certo número de áreas para explorar. Estas incluem: membros do pessoal da escola que se dedicam às "conversas sobre as pessoas"; o conteúdo das conversas sobre as pessoas, por exemplo, as pessoas visadas; os níveis de intensidade das conversas sobre as pessoas; e o comportamento resultante das conversas sobre as pessoas. Enquanto vai recolhendo dados sobre os diferentes temas, começa a delinear outros tipos de conversas sobre as pessoas para além dos mexericos. Começa a observar, por exemplo, que alguns tipos de conversas sobre as pessoas só se desenrolam entre professores que se consideram "íntimos". Designa este tipo por "conversas entre íntimos". Outros tipos de conversas sobre as pessoas ocorrem em grupos mistos - "conversas em grupos mistos". Anota a grande variedade de indivíduos que é objecto de conversa: o pessoal da secretaria, o director, professores pertencentes a grupos, professores isolados, estudantes que são alunos excepcionais e alunos que obtêm maus resultados. Repara que algumas das conversas significam "más notícias" e outras "boas notícias". 102 I Mary examina os dados, codificando e reorganizando-os na tentativa de identificar a: relações entre quem fala e do que se fala, de forma a aperceber-se das dimensões ineren tes às conversas entre as pessoas. Ao longo do trabalho regista aquilo que vai descobrind( e tenta expandir a sua categoria, elaborando modelos e escrevendo sobre eles. Encontra-st em desenvolvimento uma teoria sobre as conversas sobre as pessoas, mas está limitada, um único contexto. Embora tenha estado numa só escola, Mary ambientou-se a diverso~ locais desta e conversou com diferentes grupos para aumentar o número de incidente: observados e chegar a novas propriedades e dimensões da categoria geral das "conversa: sobre as pessoas". Mary começa também a constatar, como parte da sua teoria emergente, que quem fal< com quem e aquilo que é dito nas conversas sobre as pessoas está relacionado COIl padrões vigentes de amizade, bem como com a hierarquia formal presente nesta região es· colar. Após a sua observação na primeira escola, dirige-se a outra, escolhendo, delibe radamente, uma que abriu recentemente, no mesmo distrito. A razão de ser da sua escolh, decorre da possibilidade dos padrões de relacionamento poderem ser diferentes nest, nova escola, fornecendo um ambiente favorável à expansão da teoria em embrião sobre a: conversas sobre as pessoas. Da mesma forma, Mary escolhe, posteriormente, uma escol< privada, que se orgulha da sua estrutura democrática na tomada de decisões, como UIl local adequado para recolher mais incidentes de conversas de professores sobre as pes soas, para expandir a sua teoria. Em cada um destes novos locais, limita a sua recolha de dados a incidentes relacio nados com conversas sobre as pessoas, tentando desenvolver novas dimensões da cate goria e trabalhando para integrar essas novas dimensões na teoria emergente, de forma, expandi-la. Até à presente fase tem escrito com base nos dados que recolhe, com o objec tivo de desenvolver alguns aspectos da teoria das conversas sobre as pessoas. Agora vamos deixar a Mary, mas, se continuássemos a acompanhá-Ia na sua jornad, de investigação, vê-Ia-íamos seleccionar novos locais para ampliar a sua teoria, à medid, que ia integrando o material novo na teoria emergente. Pode continuar a utilizar este sis tema em mais quarenta locais. A decisão de parar seria baseada na constatação de qm esgotara as dimensões das categorias - o ponto de "saturação teórica" - e tinha elaborad( uma teoria sobre conversas sobre as pessoas nas escolas. (Poderia continuar a alargar, sua categoria e desenvolver uma teoria sobre conversas sobre as pessoas em geral.) Glaser (1978) recapitula os passos do método comparativo constante no desenvolvi menta de teorias da seguinte forma: I. inicie a recolha de dados; 2. procure situações-chave, acontecimentos recorrentes ou actividades com base nm dados que constituam categorias a estudar; 3. recolha dados que proporcionem muitos incidentes das categorias em estudo, procu rando a diversidade das dimensões subjacentes às categorias; 4. escreva sobre as categorias que está a explorar, tentando descrever e justificar todm 103 os incidentes que possui nos seus dados enquanto procura, incessantemente, novos incidentes; 5. trabalhe com os dados e com o modelo emergente para descobrir processos sociais e relações básicas; 6. ocupe-se da amostragem, codificação e escrita, à medida que a análise se concentra nas categorias principais. Tal como Glaser salienta, ainda que se possa considerar o método comparativo constante como uma série de etapas, tudo aquilo que acabámos de descrever decorre em simultâneo e a análise mantém-se como apoio para mais recolha e codificação de dados. O método descrito atrás é complexo e requer capacidade de raciocínio analítico (as categorias e as suas características são difíceis de identificar). mas trata-se de uma forma importante de controlar a amplitude da recolha de dados e de efectuar estudos em múltiplos locais simultaneamente com relevância teórica. O método comparativo constante, embora possa basear-se em dados descritivos para estruturar a teoria, ultrapassa os objectivos dos estudos de caso descritivos. Se bem que os autores do método comparativo constante (Glaser e Strauss, 1967) sugiram que a sua abordagem possa ser aplicada a qualquer tipo de dados, ela é mais utilizada conjuntamente com estudos de observação participante em múltiplos locais simultaneamente. D Questões adicionais relacionadas com o plano REDACÇÃO DA PROPOSTA / E frequente pedir às pessoas, antes de iniciarem uma pesquisa, que escrevam urr declaração formal acerca do modo como vão conduzir o seu estudo e qual será contributo potencial do seu trabalho. Trata-se das propostas. Os alunos elaboran -nas para os seus professores ou para as comissões de tese; os investigadores fazem-n< para potenciais financiadores. Como certamente já adivinhou, aqueles que escolhem UI plano de investigação qualitativa têm por vezes uma tarefa difícil ao tentar descrever que vão fazer antes de iniciar a investigação (ver Locke et ai., 1987; Dobbert, 198: Krathwohl, 1988, p. 135). Frequentemente, isto cria problemas, especialmente quand aqueles que querem apreciar a proposta não estão familiarizados com o carácter evoluti~ do plano qualitativo (Burgess, 1984, pp. 34-35). Normalmente, as propostas para estudos qualitativos são mais sucintas do que as e investigação quantitativa. Além de estar fora de questão uma discussão detalhada de métodos e procedimentos, é, geralmente, desnecessária uma longa revisão de literatur Nas fases iniciais de um estudo não se pode saber qual a literatura a articular com e dados relevantes que venha a obter. Alguns investigadores qualitativos experientes aco! selham os principiantes a não efectuar revisões substanciais de literatura antes da recaIr de dados, mesmo que estejam certos da relevância da literatura. A revisão de literatul pode influenciar, demasiadamente, a escolha de temas e, assim, limitar a análise indutiva uma vantagem importante da abordagem qualitativa. As propostas qualitativas são tratadas de duas formas. A primeira, a abordagem ql preferimos, consiste em realizar algum trabalho de campo antes de escrever a propost 104 I 105 .""",.,-"',,L,"""",, _ Anselm Strauss (1987), famoso pela "teoria fundamentada", falando sobre as propostas em investigação qualitativa, declara, peremptoriamente: "nenhuma proposta deveria ser escrita sem uma prévia recolha e análise de dados" (p. 286). Após ter passado algum tempo no campo, encontra-se em muito melhor situação para discutir quais os seus planos e o que poderá retirar dos seus dados. Pode, então, discutir alguns temas emergentes. Evidentemente que não terá certezas sobre a evolução do estudo, nem acerca da forma como irá efectuá-lo, mas está numa melhor posição para fazer suposições fundamentadas. Além disto, a discussão que efectuar pode ser muito mais concreta e, por conseguinte, muito mais capaz de satisfazer a curiosidade dos leitores da proposta (Strauss, 1987). Frequentemente, esta recolha de dados prévia à elaboração da resposta entra em conflito com os hábitos de alguns departamentos universitários. De facto, temos encontrado professores que ficam incrédulos com a mera sugestão de tal abordagem. Alguns departamentos exigem mesmo que os capítulos de uma tese relativos à revisão de literatura e ao método sejam escritos antes do aluno candidato ao doutoramento efectuar a investigação. Estas regras têm de ser modificadas porque são limitativas da execução de uma boa investigação qualitativa e implicam que os estudantes abdiquem da lógica da abordagem à investigação que estão a aprender. A segunda escolha consiste em escrever uma proposta sem observações ou entrevistas preliminares. Estas propostas são, necessariamente, muito especulativas; na melhor das hipóteses constituem um palpite grosseiro acerca da forma como vai proceder e quais poderão ser as questões a examinar. Este tipo de proposta, mais do que uma descrição do que irá fazer, é uma espécie de exercício para mostrar a quem o lê que conhece a literatura de investigação qualitativa e que é imaginativo na forma de pensar acerca dos problemas. Estas propostas podem proporcionar-lhe uma oportunidade para rever a literatura sobre teoria e métodos, mas, frequentemente, não são muito úteis para a conceptualização do estudo. As propostas relativas a estudos qualitativos diferem, significativamente, umas das outras, mas apresentam pontos comuns. Existem perguntas específicas que todas as boas propostas formulam. As respostas às perguntas variam em extensão e em grau de detalhe. As respostas nem sempre são dadas pela ordem que aqui apresentamos: I. O que pretende fazer? 2. Como o vai fazer? 3. Por que o vai fazer? 4. De que forma aquilo que vai fazer se relaciona com o que outros já fizeram? 5. Qual é o contributo potencial (para a investigação básica e/ou prática) do seu trabalho? Inclui-se, também, uma lista das referências consultadas para a execução da proposta. Para além destas perguntas existem outras destinadas às pessoas que tenham procedido a uma recolha prévia de dados e que são as seguintes: 1. O que é que já fez? 2. Que temas, preocupações ou tópicos surgiram do seu trabalho preliminar? Que questões analíticas vai aprofundar? 106 I Frequentemente, os investigadores que fizeram uma recolha prévia de dados elabora um esboço da monografia que vão efectuar. Na resposta às duas primeiras perguntas "O que pretende fazer?" e "Como pensa faz -lo?", deveria incluir informação relativa ao local onde vai efectuar o seu estudo, que serão os sujeitos do seu estudo, como decidirá quais deles incluir, quanto tempo pen gastar com cada uma das actividades (entrevistas, observação participante), que Outrl dados irá incluir e como fará a sua análise. Mencione, também, que tipo particular de pr blemas poderá encontrar no decurso do seu trabalho e como pensa poder ultrapassá-los. As propostas devem também incluir uma lista de questões de investigação, isto questões que ajudem a enquadrar o foco do seu estudo. As questões de investigação ni são questões de entrevista. Por outras palavras, elas não são as questões que irá coloc aos informadores para avaliar as suas perspectivas. Mais precisamente, são questões abt: tas que tentam reflectir o terreno que vai examinar. A proposta orienta o seu trabalho. Idealmente, seria como um pai levando uma crian, para o recreio. Sabemos o que ele irá encontrar, na generalidade (baloiços e caixas l areia), mas não os aspectos particulares. A criança poderá pensar se os outros garotos, I recreio, serão amigáveis. O mesmo se passa com os investigadores qualitativos. Com çamos a investigação com perguntas do tipo: "Qual a opinião dos professores acerca ( seu próprio trabalho?" (Biklen, 1985), sabendo que obteremos resposta. Mas não sabem de que forma será enquadrada nem os aspectos particulares de que se revestirá. Os cal tulos seguintes fornecerão informação que o ajudará a compreender estas perguntas e forma de lhes responder. As pessoas que se dedicam à revisão de propostas qualitativas devem compreender q estas não são contratos rígidos dos quais o investigador não se possa desviar. As propost qualitativas são muito mais flexíveis do que as propostas quantitativas; representam esp culações ponderadas acerca da estruturação da investigação e da direcção em que se orie tará o estudo. A abertura da proposta qualitativa permite ao investigador flexibilidade, m também envolve riscos. Nem você nem a entidade que aceita a sua proposta pode ter un ideia definida dos aspectos particulares ou do produto final. A existência de um produ final que preencha as exigências de um trabalho competente depende muito mais da forr como o estudo é executado e da facilidade relativa à expressão conceptual e à escrita p parte do investigador do que da especificidade do plano de investigação. Não admira q os avaliadores de propostas qualitativas tendam a dar muito peso ao trabalho anterior d autores para a avaliação das possibilidades de sucesso do projecto proposto. GRELHAS DE ENTREVISTA E GUIÕES DO OBSERVADOR Temos tratado o plano de investigação como um processo evolutivo, no qual as pergunt a ser colocadas e os dados a ser recolhidos decorrem do próprio processo da investigaçã Contudo, há ocasiões em que os investigadores entram no campo com uma grelha, 107 ,.L'_""__ 1811iIUIlllI _ entrevista e um guião do observador (Schneider e Conrad, 1980). Mantendo fidelidade à tradição qualitativa de tentar captar o discurso próprio do sujeito, deixando que a análise se tome evidente, as grelhas de entrevista permitem, geralmente, respostas e são suficientemente flexíveis para permitir ao observador anotar e recolher dados sobre dimensões inesperadas do tópico do estudo. Frequentemente, os guiões são utilizados em estudos com múltiplos sujeitos e em equipas de investigação em múltiplos locais, isto é, em estudos de observação participante onde grupos de investigadores trabalham em diversos locais. Os guiões são utilizados sobretudo para recolher dados em vários locais susceptíveis de serem comparados. Se, em cada local ou com cada sujeito, são recolhidos dados semelhantes, podem fazer-se afirmações respeitantes à distribuição dos factos reunidos. Ainda que em certos estudos tal seja importante, a preocupação com o cumprimento de um programa, em detrimento da compreensão dos dados, pode neutralizar as potencialidades da abordagem qualitativa. Os estudos qualitativos que relatam quantas pessoas fazem isto ou quantas fazem aquilo, em vez de gerar conceitos e conhecimento, não são muito bem vistos pelos investigadores qualitativos. Mais precisamente, representam um desperdício dos recursos qualitativos, já que tais dados podem ser recolhidos mais fácil e economicamente utilizando outros métodos. INVESTIGAÇÃO EM EQUIPA E INVESTIGAÇÃO DO "CAVALEIRO SOLITÁRIO" A grande maioria das investigações qualitativas são aquilo que se designa por investigação do "cavaleiro solitário", isto é, o investigador enfrenta, isoladamente, o mundo empírico, partindo só, para voltar com os resultados. Contudo, cada vez mais a investigação qualitativa é feita em equipa. De facto, alguns trabalhos tradicionais de investigação qualitativa em educação foram realizados em equipa. Boys in White (Becker et ai., 1961) e Making lhe Grade (Becker et ai., 1968), o primeiro, um estudo sobre estudantes de medicina, o segundo, um estudo sobre estudantes universitários, utilizavam três ou quatro investigadores para recolher os dados. A não ser que se integre num estudo financiado, é mais provável que o realize isoladamente, mas é importante que saiba que o trabalho em equipa pode ser gratificante e produtivo. Tal como em qualquer actividade de equipa, é importante estar associado a pessoas com as quais se sinta à vontade - pessoas que trabalhem tão arduamente como você e que partilhem os seus valores e a sua noção de divisão de tarefas na tomada de decisões. (Para mais informações sobre investigação em equipa ver o capítulo VII.) Conclusão nossa discussão do plano de investigação não proporciona instruções precisas ou um fórmula para elaborar o seu trabalho desde o princípio até ao fim. Demos alguma sugestões e apresentámos algumas opiniões de investigadores qualitativos a propósit do plano. O próximo capítulo, relacionado com o trabalho de campo, deverá contribuir par melhor levar à prática o tipo de raciocínio utilizado em investigação qualitativa. A 109 108 I , .•• ~~ m"""''l'i''''"'~''''II'Il!'!t''l •• o aMIMJl III TRABALHO DE CAMPO 110 _I 111 -,.,;"Lp,.,,,,,'' '._._ .... _ O termo trabalho de campo lembra algo ligado à terra. É esta a forma que a maiori dos investigadores qualitativos utiliza para recolher os seus dados. Encontram-s com os sujeitos, passando muito tempo juntos no território destes - escola~ recreios, outros locais por eles frequentados ou nas suas próprias casas. Trata-se de locai onde os sujeitos se entregam às suas tarefas quotidianas, sendo estes ambientes natmai: por excelência, o objecto de estudo dos investigadores. À medida que um investigador v, passando mais tempo com os sujeitos, a relação torna-se menos formal. O objectivo d investigador é o de aumentar o nível de à vontade dos sujeitos, encorajando-os a fali sobre aquilo de que costumam falar, acabando por lhe fazer confidências. Este terá de lhe dar provas, de forma a merecer a confiança que os sujeitos depositam nele, tornando elar que nunca irá utilizar o que descobrir para rebaixar ou magoar alguém. (Este estilo d investigação é denominado naturalista.) Se, por um lado, o investigador entra no mundo do sujeito, por outro, continua a est; do lado de fora. Regista de forma não intrusiva o que vai acontecendo e recolhe, simult. neamente, outros dados descritivos. Tenta aprender algo através do sujeito, embora ni! tente necessariamente ser como ele. Pode participar nas suas actividades, embora c forma limitada e sem competir com o objectivo de obter prestígio ou estatuto. Aprende modo de pensar do sujeito, mas não pensa do mesmo modo. É empático e, simultane: mente, reflexivo. O trabalho de campo refere-se ao estar dentro do mundo do sujeito da forma acin descrita - não como alguém que faz uma pequena paragem ao passar, mas como quem v fazer uma visita; não como uma pessoa que sabe tudo, mas como alguém que quer apre] der; não como uma pessoa que quer ser como o sujeito, mas como alguém que procu saber o que é ser como ele. Trabalha para ganhar a aceitação do sujeito, não como um fi em si, mas porque isto abre a possibilidade de prosseguir os objectivos da investigaçi (Geertz, 1979, p. 241). Podemos ser acusados de distorção por romancearmos as relações que os invest gadores qualitativos estabelecem com os seus sujeitos (ver Douglas, 1976; Johnso 1975). Pode dizer-se que a relação estabelecida no trabalho de campo se adequa melhor 112 I IQE-S 113 observação participante e, mesmo aí, este ideal, tal como o descrevemos, nunca é alcançado. Além do mais, podemos ser acusados pelo facto de o termo trabalho de campo não se aplicar a outras formas de investigação qualitativa (entrevista e análise de documentos, por exemplo). Qualquer uma destas acusações tem algum fundamento, mas afigura-se-nos importante a compreensão da forma como a noção das relações no trabalho de campo estabelece o perfil da maioria das investigações qualitativas. A qualidade do trabalho de campo passa pelo estabelecimento de relações, quer o método de investigação seja a observação participante, a entrevista ou a busca de documentos. No caso da entrevista, o investigador visita regularmente os seus sujeitos, entrevistando-os, por vezes, durante várias horas. Mesmo quando a entrevista é menos extensa, a tónica é colocada na qualidade e proximidade da relação em detrimento do formalismo. Mesmo quando se trabalha com registos de casos e com materiais de arquivo, o investigador, sempre que possível, desenvolve uma relação do tipo "trabalho de campo" com as pessoas que guardam o material. Esta relação não só maximiza o acesso às fontes, como também envolve as pessoas que guardam o material na realização do estudo. Estas podem facilitar ao investigador a percepção do contexto em que os materiais, sob análise, foram produzidos. Como discutiremos no capítulo IV, a maioria dos estudos qualitativos envolve mais do que uma técnica de recolha de dados. É raro o estudo qualitativo que não envolva trabalho de campo. Neste capítulo discutiremos o trabalho de campo. Realçaremos o modo como o leitor, na sua qualidade de investigador, se deve organizar - desde a obtenção do acesso até à retirada do campo -, para além de tudo quanto está envolvido na manutenção e no estabelecimento de uma relação harmoniosa. 114 I n Como obter acesso ao campo primeiro problema com que o investigador se depara no trabalho de campo é autorização para conduzir o estudo que planeou. Há quem o ultrapasse f~enl uma investigação dissimulada, ou seja, a recolha de dados sem o consentlmer dos sujeitos. Poderá, por exemplo, candidatar-se a um em?re~o numa escola ou frequenl um curso sem informar as respectivas direcções do seu mtUlto. Embora se tenham rea zado algumas excelentes investigações clandestinamente ~Cusick, 1:73; McPhersc 1972) o nosso conselho para o investigador mexpenente e o de utlhzar ~ abordag( objec;iva. Nesta, o investigador explicita os seus interesses e tenta que os ~uJeltos que 1 estudar cooperem consigo. Na maioria dos casos, se a autorização for dev~damente ne~ ciada a investigação não dissimulada proporciona a vantagem de se ficar hvre das obnl ões 'de um participante normal e, consequentemente, a liberdade de se e~trar e s ~uando se quiser. Por exemplo, é difícil fazer investigação se se tiver de e?smar o pi grama do 3.° ano de escolaridade a trinta e três alunos. Este papel proporCIOna tambl um maior acesso a todas as pessoas inseridas no contexto. O pape~ de profe~sor pode n constituir a posição ideal para entrevistar o director da es~o.la relatlvam~nt~ as suas ver~ deiras opiniões sobre o castigo corporal ou sobre os ment~s da_ava~laçao do Q. I. último, e não menos importante para alguns autores, a mentua nao so traz proble~as consciência, como também pode constituir uma ofensa. Um outro aspecto rela~IO~~ com este último é que ser-se apanhado no desempenho .de um falso papel nao embaraçoso como devastador para a relação investigador-~u~elto. . _ . . A posição que acabámos de assumir no que concerne a mvestlgaçao diSSimulada, b como ao estilo de investigação que apresentámos no nosso de?ate sobre o trabalho campo, não é adoptada por todos os investigadores quahtatlvos. E, provavelmente, a ab O 115 . c,."""cLr~ ......,.~~"'~_ll':l>l""'-_._-- dagem mais utilizada e, embora não exista um termo específico para ela, pode ser designada de estilo cooperativo. Esta abordagem já foi objecto de crítica, tendo sido feito um apelo aos investigadores no sentido de serem mais confrontantes e sub-reptícios (Douglas, 1976; Garfinkel, 1967; Adler e Adler, 1987). (Alguns investigadores tais como as metodólogas feministas têm defendido que estes se devem aproximar mais dos seus sujeitos.) No que respeita à condução do trabalho de campo, o estilo cooperativo tem origem tanto na antropologia como na tradição sociológica da Escola de Chicago. (Ver Geertz, 1979, pp. 225-243, para uma discussão das limitações.) Por vezes, mesmo pessoas que trabalham dentro destas tradições utilizaram uma abordagem dissimulada, mas apenas quando não era possível realizar uma abordagem objectiva. Por outro lado, os etnometodólogos utilizam frequentemente uma abordagem de confronto, acreditando que, ao perturbarem o mundo diário das pessoas, poderão pôr em causa aquilo que aceitamos como verdadeiro. Uma vez decidido o estudo que gostaria de realizar, como vai abordar a questão da autorização? Existem várias maneiras de o fazer (Burgess, 1984, pp. 38-50). A mais adequada dependerá de quem você é, do que pretende estudar e do que espera conseguir. Apenas como ilustração, vamos supor que está interessado em fazer um estudo de observação participante numa escola primária da zona onde reside. Como sabe, não há dois sistemas escolares que estejam organizados exactamente do mesmo modo. A maioria deles contempla procedimentos específicos para conceder autorização aos investigadores. O primeiro passo para a negociação do acesso consiste em clarificar os pormenores da hierarquia e das regras da escola em questão. Peça conselhos a terceiros - um professor, um amigo ou outra pessoa que conheça bem o sistema - sobre os passos a seguir. Se possível, consulte várias pessoas. Pode até telefonar para secretaria da referida escola. Não diga que quer obter já autorização para fazer a investigação; limite as perguntas aos passos que teria de dar para obter a dita autorização caso decidisse fazer uma investigação. Ponha a sua imaginação a funcionar a fim de obter mais ideias. Ao fazer este inquérito preliminar, tenha em conta que não só quer obter informação sobre o sistema formal, mas também sobre o sistema informal. Está à procura de informações úteis, como o nome de alguém dentro do sistema, particularmente receptivo e pronto a ajudar. Se obtiver tais informações, o que deve ser provável, contacte ou visite essa pessoa para discutir os seus planos e para ouvir o que ela tem para lhe dizer. Poderá ser enviado ao coordenador pedagógico ou ao director da escola; muito frequentemente o director tem uma palavra importante a dizer sobre este tipo de assuntos. Embora não seja a autoridade final, a sua influência é sentida de várias maneiras. Se for necessário preencher formulários para pedir autorização a uma entidade escolar regional, a influência do director da escola irá certamente ter muito peso. Geralmente, é esta a figura que tem a última palavra nesse consentimento superior. Do mesmo modo, ela só o ajudará se souber que os professores implicados estão dispostos a participar. Um passo necessário para obter aprovação poderá ser uma reunião ou conversa com os professores e outras pessoas que pretenda envolver no projecto de investigação. Por exemplo, se já sabe de antemão que pretende estudar a turma de um determinado professor, contactá-lo I obter o seu apoio no projecto poderá ser vantajoso antes da aproximação ao director. SI no caso de projectos extensos e subsidiados é que os investigadores começam por se diri gir a instâncias superiores. Raramente é concedida um autorização a nível superior sen ter lugar uma consulta aos níveis inferiores. Mesmo no caso da autorização ser dada por instâncias superiores sem as inferiore terem sido consultadas, é seu dever encontrar-se com os membros pertencentes à parti inferior da hierarquia, a fim de conseguir o seu apoio. Se entrasse em cena com um: autorização formal passada por um gabinete oficial, provavelmente iria ferir susceptibili dades, a não ser que trabalhasse o necessário para sensibilizar os seus potenciais sujeitos Poderia obter a autorização oficial, mas o estudo ser sabotado por sujeitos melindrados A obtenção da autorização para realizar o estudo envolve mais do que uma bênção ofi cial. Passa por desbravar o caminho para uma relação sólida a estabelecer com aquele com quem irá passar tempo, de molde a que o aceitem a si e àquilo que pretende fazeI Será útil para a sua investigação fazer com que os outros sintam que o ajudaram. Os investigadores qualitativos encontram-se numa posição muito particular par negociar a sua entrada, já que a maioria das pessoas não está familiarizada com este tip' de abordagem. Muitas pessoas acham que a investigação é sinónimo de experiência controladas ou inquéritos. Se por um lado esta percepção pode causar problemas d comunicação com os responsáveis da escola, por outro, pode trazer vantagens. Po exemplo, quando disser às pessoas que pretende passar algum tempo no edifício de um forma não intrusiva, que não vai pedir a ninguém para preencher formulários, responde a perguntas específicas ou alterar a sua rotina normal, a resposta provavelmente ser~ "afinal não está a fazer uma investigação formal". Proporciona-se, assim, ao investigado a oportunidade de negociar a sua entrada de forma discreta. Queremos com isto realça que o corpo docente - os professores, o director e os outros funcionários - não o tratan como se estivesse a realizar uma investigação e por isso não lhe exigem que siga o procedimentos de formalização oficial. Podem deixá-lo prosseguir com o seu trabalh, ou, talvez, seguir um processo de entrada menos complicado. Quase que pode ter acess, ao local do estudo pela "porta do cavalo". Ao procurar aprovação, pode facilitar este tip' de entrada dando uma explicação pouco elaborada e não insistindo no seu papel d investigador. Geralmente, os investigadores menos experientes são alunos que se encontram a tra balhar no seu primeiro projecto qualitativo, necessário para completar o curso. Depois d ouvir as explicações destes alunos em relação ao seu trabalho, o pessoal escolar geral mente trata o pedido como se fosse um pedido para a colocação de um aluno. Se conse guir entrar assim, óptimo - óptimo, isto é, se o que é esperado de si não for sufocante Deve evitar ter responsabilidades específicas, como ser tutor de alunos ou ser colocad, numa posição em que o pessoal escolar tenha muito controlo sobre o seu tempo e a su mobilidade. 116 117 I . ,~,.",.."--",L' . . :W1I I -"'~I !I!·O!l!;:alll'M'" a •• A maior parte dos alunos não são vistos como ameaçadores. Os responsáveis percebem que os professores precisam de ser colocados nas escolas; de qualquer modo, acham que é uma boa ideia as pessoas saberem de antemão como funciona uma escola. Em suma, geralmente são receptivos a alunos. É bom acentuar que você é um aluno e que pretende que cooperem consigo. Existem. outras maneiras de negociar uma entrada discreta. Há quem utilize amigos dentro do sistema para entrar pela "porta do cavalo". Uma entrada discreta é geralmente oportuna embora, para alguns, possa proporcionar problemas éticos equiv~entes aos envolvidos na investigação dissimulada. Sentem que, se não realçarem que estão a realizar uma investigação, estarão a faltar à verdade. Nós não concordamos com esta maneira de pensar. Se concordar, terá de utilizar uma abordagem mais oficial para obter aprovação. Formalizar leg~lmente uma autorização pode ser, nalguns sistemas educativos, um processo moroso. E habitual passarem-se várias semanas, senão meses, entre o momento do p~dido e o da autorização. Muitos distritos escolares têm comissões responsáveis pela revlsao das propostas. Por vezes, os sindicatos também as têm de rever. Alguns distritos têm mesmo um formulário específico. Se o distrito for grande, terá mesmo um departamento responsável pelas questões relativas à investigação. Os responsáveis poderão ajudá-lo no preenchimento do formulário e prestar-lhe outros tipos de ajuda. Por vezes, a ap:ovação não passa de um mero formalismo. Alguns funcionários escolares já nos têm deixado começar a trabalhar na investigação, em termos não oficiais, sem a autorização estar legalmente formalizada. Pergunte se não existe mesmo maneira de acelerar o processo. Se tiver de seguir todas as formalidades, faça uma estimativa do tempo que irá demorar e tente saber se conseguirá a aprovação antes do começo da investigação. Pelo f~cto de. a autorização levar o seu tempo a ser concedida, é sensato começar as negociaçoes mUlto antes da data prevista para o início do trabalho. Até agora falámos do acesso como se fosse algo que só ocorresse no início do estudo ainda que em muitas investigações sejam necessárias sucessivas autorizações e tentativa~ de cooperação, à medida que se vão invadindo novos territórios e trabalhando com novas pessoas. Quando fizer as suas explicações no início e no decurso da investigação, os sujeitos colocarão várias perguntas, muitas das quais surgirão novamente. Segue-se uma lista de perguntas com sugestões de resposta. I. O que é que vai fazer exactamente? Uma regra de ouro para se responder a qualquer pergunta é ser honesto. Não minta, mas não seja demasiado específico ou moroso nas suas explicações. Os alunos ficam geralmente espantados com a pouca quantidade de informação que as pessoas querem obter. Não utilize muito a linguagem educacional. Pode assustar ou afugentar as pessoas. Pode começar por dizer qualquer coisa do género: "O que eu quero fazer é uma coisa chamada observação participante. Isso envolverá visitar a sua sala de aula algumas vezes durante a semana. Quero tentar perceber o que é ser-se professor." Se lhe pedirem para ser mais específico, tente responder, mas confesse que o que irá fazer evoluirá à medida que for investigando. Na sua explicação realce que quer aprender algo com a pessoa, mas não seja demasiado solícito a ponto de ela s poder mostrar paternalista. 2. Irá causar perturbação? Esta é uma preocupação frequente das pessoas que traba lham em qualquer escola. Receiam que a sua presença interfira na sua rotina e no seu tra balho. É importante pôr de parte estes receios. Partilhe com eles a ideia de que neste tip' de investigação é importante não se ser intrusivo e não se interferir com aquilo que as pes soas geralmente fazem. Parte do sucesso provém de não se ser perturbador. Assegure-lhe que não irá fazer exigências excessivas e que se esforçará por ser sensível aos seus proble mas e às suas exigências. Partilhe a intenção de submeter os seus horários aos deles. 3. O que é que vai fazer com os resultados? A maioria das pessoas colocam esta ques tão porque receiam uma publicidade negativa ou uma utilização política da informaçã, que o investigador recolheu. Como sugerimos na nossa discussão sobre ética (capítulo I: deverá chegar a uma conclusão sobre o modo como tenciona usar o material e partilhá-l com os sujeitos. Se tiver interesses a curto prazo, como escrever o relatório final para disciplina, mencione este facto e diga-lhes que lhes irá lê-lo. Assegure-lhes que não v, usar o seu nome ou que vai disfarçar a morada. Se tiver interesses a longo prazo, como publicação de uma tese, mencione essa possibilidade, mas sugerimos que adie a autoriz2 ção para tal, até ter estabelecido relações no local. Encare as observações iniciais que fize como um estudo-piloto. Dê aos sujeitos oportunidade de o conhecerem melhor e, após te avaliado as hipóteses de levar a cabo um projecto mais alargado nessa instituição, renegc cie a sua posição. Se não tiver a certeza da forma como vai encaminhar os resultado~ explique-lhes e assegure-lhes que irá discutir com eles os seus planos depois de ter trab, lhado um pouco mais os dados. 4. Porquê nós? Não é raro as pessoas quererem saber porque é que elas e a sua organ zação foram eleitas. Se já tiver escolhido essa organização por ter ouvido comentáric positivos a seu respeito pode, por exemplo, dizer: "Disseram-me que o vosso ensino eI excelente e, em parte, foi por isso que vos escolhi." "Estava à procura de professore experientes com quem falar e por isso escolhi-vos." "Ouvi dizer que vocês faziam cois, muito interessantes no domínio das dificuldades de leitura." A não ser que pretendesse observar um determinado grupo, em particular, por ter um reputação exemplar, é geralmente importante comunicar às entidades responsáveis que interesse do estudo não se centra propriamente naquelas pessoas em particular ou na org, nização específica onde irá recolher os dados. Os seus interesses centram-se, de facto, n figura global do professor ou na educação, em geral, ou noutro qualquer aspecto esp( cífico que esteja a investigar. Não vai fazer uma reportagem do Liceu de Salém. É UI investigador educacional a tentar estudar o Liceu de Salém de forma a compreend( melhor o processo educativo. 5. Quais são os benefícios do estudo? A maior parte dos conselhos directivos d, escolas esperam reciprocidade. Acham que já que lhe facultaram o acesso têm direito 118 119 I ,I,,,,,,,,,,,,,,,,,,,, ..,,,,, receber algo em troca. A sua tarefa consiste em decidir o que lhes quer oferecer. Alguns querem ser informados dos resultados, sob a forma de um relatório ou numa reunião consigo depois do trabalho estar completo. Outros querem, claro, tudo. Tente não prometer demasiado. Uma reunião ou um sumário dos resultados que encontrou pode ser suficiente, não sendo de aconselhar a apresentação de um relatório extenso. Quando as pessoas descobrem que a investigação envolve registos escritos, por vezes exigem lê-los. Menospreze as notas. Não diga aos sujeitos que se esforça por registar todas as palavras que são proferidas. Nunca lhes prometa mostrar os seus apontamentos. O facto de saber que vai partilhar as notas de campo com os sujeitos irá limitar aquilo que escreve. Em certos casos, os responsáveis escolares podem-lhe pedir para prestar apoio à escola em troca do acesso. Pode-lhes dar uma ajuda, mas certifique-se de que o tempo que lhes vai dispensar na prestação de serviços não irá afectar a sua investigação. Embora muito do que referimos sobre a forma de se obter uma autorização corresponda melhor aos estudos de observação participante, muito do que se disse também se aplica a outros estudos qualitativos. A obtenção de documentos oficiais envolve frequentemente os procedimentos atrás discutidos. Na maioria dos estudos que implicam entrevistas, terá de pedir individualmente a cada um dos entrevistados para cooperar, ainda que geralmente os sujeitos estejam ligados à mesma instituição. Poderão ser professores de determinada escola ou pais ligados a uma determinada associação. Nestes casos, terá de pedir autorização à própria organização. Poderá evitar esta situação abordando individualmente os sujeitos (ou seja, não como membros dessa organização). Se na maior parte das vezes isto é oportuno, há ocasiões em que se toma necessário uma autorização oficial. A administração poderá, por exemplo, ter na sua posse listas de potenciais sujeitos com as respectivas moradas. Os membros da organização poderão querer saber a opinião da administração, antes de aderir ao estudo. Os membros de organizações educativas são, na maior parte dos casos, muito paternalistas em relação aos seus alunos. É frequente mostrarem relutância em relação a entrevistas com os seus alunos, por recearem a falta de aprovação destes ou, no caso dos alunos mais novos, dos respectivos pais. Regra geral, o pedido de autorização para entrevistar alunos resulta num conjunto complicado de procedimentos que inclui a permissão dos pais, bem como a passagem por outros canais formais de legalização da investigação. A maioria dos responsáveis gosta de evitar este tipo de problemas. Prefere que o investigador trate pais e alunos como se não fossem membros daquela escola específica. Outros, porém, manifestam a sua preocupação a partir do momento em que o investigador se dirige directamente aos alunos e respectivos encarregados de educação, achando-se responsáveis pela protecção da privacidade destes. Tal como acontece com as escolhas do plano de investigação, normalmente não existem respostas certas ou abordagens correctas. Em certas formas de investigação qualitativa, os dados que procura encontrar estão, à primeira vista, acessíveis e disponíveis. A título de exemplo, algumas sociedades histó- ricas não só deixam os investigadores estudarem o seu material, como também disponib lizam a ajuda dos seus funcionários ou de outros serviços. Mesmo nesta situação, aplic, -se parcialmente o que sugerimos em relação à obtenção do acesso. Afigura-se, n entanto, importante a compreensão da estrutura da sociedade histórica e dos seus merr bros antes de se iniciar uma aproximação. Nalgumas, por exemplo, certos elementos sã mais receptivos e prestáveis do que outros. Existem determinados materiais que os arqu vistas só disponibilizam para certos visitantes seleccionados. É importante descobrir que é necessário para se fazer parte dessa "elite", para se poder obter o acesso. Nalgur arquivos históricos regionais, os investigadores provenientes de outras zonas não sã bem-vindos, a não ser que tenham alguém que testemunhe a favor do seu carácter e c sinceridade dos seus intuitos. Nestes casos é preciso ter-se um padrinho. Como teve oportunidade de constatar, negociar a autorização pode ser complicad( Oferecemos três conselhos. Seja persistente. Muitas vezes a diferença entre a pessoa ql consegue o acesso e a que não consegue reside na duração e habilidade das suas tentativ, de entrada. Seja flexível. Se a sua primeira ideia não for bem aceite, tente uma táctic diferente ou uma nova abordagem. Seja criativo. Regra geral as pessoas gostam de nov, ideias. Um investigador que nós conhecemos ofereceu pequenas lembranças (botões c rosas) aos sujeitos, de uma forma consistente com a sua personalidade. Cartões de Nat ou de Páscoa não estão fora de questão e embora possam não lhe proporcionar o aces~ manterão a porta aberta. 120 121 I I Os primeiros dias no campo de investigação C om a autorização em mãos, já será possível começar a trabalhar com empenho. Os primeiros dias poderão ser duros se não tiver sentido de humor e se não estiver preparado para cometer erros. Rosalie Wax, uma distinta investigadora qualitativa no campo da educação, numa tradição antropológica, refere a propósito da observação participante em geral: "Uma pessoa que não consegue suportar sentir-se atrapalhada ou deslocada, que se sente esmagada sempre que comete um erro - embaraçoso ou não -, que não é psicologicamente capaz de ser, ou ser tratada como, parva, não apenas por um dia ou uma semana, mas durante meses sem conta, deverá pensar duas vezes antes de decidir ser um observador participante" (Wax, 1971, p. 370). Achamos que esta opinião é mais representativa do primeiro dia do investigador ou do aluno de investigação no novo local do que das experiências profissionais do investigador qualitativo. Passar a ser um investigador qualitativo é como aprender a desempenhar qualquer outro papel na sociedade (professor, pai, artista, aluno universitário). Não é só preciso aprender os aspectos técnicos da forma como deve proceder, como também é preciso sentir que esse papel é autêntico e que se ajusta a si. Nas primeiras vezes, os investigadores pouco experientes ainda não tiveram experiências suficientes para retirar delas as devidas comparações e sentem-se desconfortáveis com o rótulo de "investigador". Não têm a certeza se querem ficar associados a esse rótulo ou, noutros casos, não sabem se merecem esse título tão distinto. Para além disso, não compreendem que a sensação de desconforto faz parte deste tipo de trabalho. Como em qualquer papel que se desempenha, no papel de investigador, vai-se desenvolvendo uma confiança crescente à medida que se ganha prática. Ser-se investigador é algo que se desenvolve em si, embora a princípio possa ser extremamente difícil. Uma investigadora descreveu a sua primeira experiência de observação de uma forma que lhe pode dar uma ideia de como os primeiros dias de trabalho de campo podem seI desconcertantes. Ao observar uma aula de engenharia comenta: "Lembro-me de ter entrado aqui e só ter visto homens. Senti que todos estavam a falar ao mesmo tempo. Senti-me deslocada. Entrei em pânico. Tenho de me lembrar de tudo o que se disse, pensei eu? Tentei centrar-me em qualquer coisa e fiquei ainda mais nervosa. Desisti e decidi ficar sentada e quieta à espera de ver o que acontecia". E este não foi o fim da sua atrapalhação. Durante a aula, o monitor utilizou uma palavra com duplo sentido, com uma conotação lúbrica e sexual. Os homens da aula riram-se com o monitor. A pessoa sentada ao lado da investigadora virou-se para ela tentando ver a sua reacção. A este propósito, diz: "Lembro-me de ter feito um sorriso amarelo." No final da aula o monitor apresentou-a e explicou aos alunos o propósito da investigação. No final, ela levantou-se e pronunciou algumas palavras; o monitor voltou-se, fez uma pausa e disse relutantemente: "Bom, acho que vamos acabar por nos habituarmos a si". E habituaram-se, e ela habituou-se a eles. Embora nunca tivesse conseguido ser "um dos gajos", acabou por desenvolver uma relação suficientemente boa com eles para poder continuar a sua investigação, que tinha come objectivo a exploração das semelhanças e diferenças entre os locais oferecidos pelas universidades em regime de residência interna ou externa. Outro investigador, interessado em estudar o treino de paramédicos num laboratório. dirigiu-se à secretaria a fim de pedir um cartão de acesso ao parque de estacionamento. A secretária disse: "Nós não damos cartões a vendedores". O investigador retorquiu: "Nãc sou um vendedor. Sou um investigador e vou passar a vir cá muitas vezes". A secretária olhou-o e disse: "Também não damos cartões a investigadores". Nos primeiros dias do trabalho de campo começa-se a estabelecer a relação, aprendem-se "os cantos à casa", passa-se a ficar mais à vontade e a trabalhar no sentido de os sujeitos ficarem mais à vontade connosco. É a altura de se ficar confuso - mesmo aflito com tanta informação nova. Ainda há muito para aprender. O sentimento de incompetência prevalece. Os comentários dos sujeitos, como os que foram atrás referidos, têm muitc peso; são interpretados como sinais de rejeição ou mesmo de hostilidade. É uma altura de paranóia. Eis algumas sugestões para tomar os seus primeiros dias no campo menos dolorosos: I. Não interprete o que acontece como uma ofensa pessoal. Aquilo porque está a passar faz parte do trabalho de campo. 2. Na primeira visita tente arranjar alguém que o apresente. Pode recorrer a uma das pessoas que lhe concedeu a autorização ou esta pode encaminhá-lo para outrem. Peça a essa pessoa para lhe facilitar a entrada. 3. Nos primeiros dias, não tente fazer de mais. Tente fazer, aos poucos, uma entrada tranquila no ambiente do trabalho. No primeiro dia visite a instituição por pouco tempo (uma hora ou menos); tente utilizar esse tempo para ficar com um panorama geral do ambiente. Há tantas caras e coisas novas para aprender; não tenha pressa. 122 123 I I Lembre-se que terá de tirar notas após cada vez que visitar a instituição. Se tiver observado de mais, não terá tempo suficiente para escrever tudo. 4. Mantenha-se relativamente passivo. Mostre interesse e entusiasmo por aquilo que está a aprender, mas não faça demasiadas perguntas específicas, especialmente em áreas que possam ser controversas. Faça perguntas gerais que permitam aos sujeitos falarem. 5. Seja amigável. À medida que for sendo apresentado, sorria e seja delicado. Cumprimente as pessoas que passarem por si nos corredores. Nos primeiros dias, os sujeitos vão perguntar o que é que anda ali a fazer. Informe-os de que já falou com os responsáveis, tentando ser o mais breve possível. A maioria das sugestões sobre o comportamento no campo de investigação é semelhante à do comportamento não ofensivo geral. Para se ser um bom investigador é necessário conhecer e praticar esse tipo de competências sociais. Os primeiros dias representam a primeira fase do trabalho de campo. A sensação de desconforto e de não se pertencer àquele mundo, que caracteriza esta fase, geralmente acaba com uma indicação clara de aceitação por parte dos sujeitos. Um convite para um acontecimento social ou um pedido para participar numa actividade normalmente restrita aos membros da instituição podem representar essa aceitação. Outro indício poderá ser dizerem-lhe que sentiram a sua falta numa das vezes em que não pôde ir. 124 I II o contínuo participante/observador té que ponto ede que forma é que os investigadores devem participar nas actividades da mstItUlção? Gold (1958) discutiu uma gama de papéis possíveis que os observadores podem desempenhar. Num dos extremos situa-se o observador completo. Neste caso, o investigador não participa em nenhuma das actividades do local onde decorre o estudo. Olha para a cena, no sentido literal ou figurativo, através de um espelho de um só sentido. No extremo oposto, situa-se o observador que tem um envolvimento completo com a instituição, existindo apenas uma pequena diferença discernível entre os seus comportamentos e os do sujeito. Os investigadores de campo situam-se algures entre estes dois extremos. A sua participação exacta varia ao longo do estudo. Nos primeiros dias de observação participante, por exemplo, o investigador fica regra geral um pouco de fora, esperando que o observem e aceitem. À medida que as relações se desenvolvem, vai participando mais. Nas fases posteriores da investigação, poderá ser importante ficar novamente de fora, em termos de participação. Um investigador que participe demasiado poderá passar a ser um indígena (Gold, 1958), expressão utilizada em antropologia para referir os investigadores que ficam tão envolvidos e activos com os sujeitos que perdem as suas intenções iniciais. (Ver Levine, 1980b, para uma descrição de como a intenção de expor a falsidade dos xamãs foi, assim, subvertida.) É necessário calcular a quantidade correcta de participação e o modo como se deve participar, tendo em mente o estudo que se propôs elaborar. Muitos observadores da sala de aula têm restrições situacionais que os levam a participar pouco nas actividades da turma; preferem sentar-se e estar atentos a tudo quanto se passa (ver Rist, 1978; Smith e Geoffrey, A 125 I 1968). Os que, de facto, participam nas actividades, debatem-se com o dilema de como participar. Perguntam-se a si próprios: "Deverei agir como um professor?" "E se agisse como um ajudante de professor?" Nenhuma destas escolhas parece ser a correcta. Poderão existir pressões, algumas que provêm da altura em que o acesso foi negociado, para que o segundo adulto presente na sala de aula funcione como um ajudante do professor. Como já sugerimos, uma participação moderada poderá ser eficaz, mas não permita que o tempo de que dispõe seja dominado por essa participação. Para além disso, tenha em conta que, ao agir como ajudante do professor, as crianças formam determinada opinião sobre si. As crianças apresentam um desafio especial em termos relacionais (Fine e Sandstrom, 1988). Os adultos têm alguma dificuldade em levar as crianças a sério, dadas as atitudes culturais em relação a elas. Os adultos têm tendência para conduzir as conversas que têm com as crianças, hábito este que o investigador qualitativo tem de quebrar. Alguns adultos utilizam piadas convencionadas para estabelecerem uma relação. As crianças poderão olhar para os adultos de diversos modos; podem procurar a sua aprovação ou inibir-se. Terá de ter em conta estes factos ao participar no contexto e ao tentar compreender os dados que recolheu. Uma alternativa consiste em participar com as crianças, não enquanto figura de autoridade (um adulto), mas como um quase-amigo (ver Fine e Glassner, 1979; Mercurio, 1972). É difícil conseguir que uma criança aceite um adulto como igual, embora seja possível que o tolere como membro de um grupo de crianças. Os observadores que conhecemos têm tido graus variados de sucesso ao observarem crianças. Uma observadora estudou grupos da infantil e do 1. 0 ano da primária, participando, brincando e agindo como as crianças, enquanto trabalhavam e brincavam. Ao fazer isso (fazer desenhos, jogar) e ao abster-se de "os ajudar", achava que as crianças passariam a agir com mais naturalidade à sua frente. Outro observador, ao estudar a "escola livre", achava que as suas conversas com as crianças ficavam sempre afectadas pelo facto de o perceberem como um adulto e consequentemente como uma pessoa de fora. Teve de passar a fazer coisas diferentes para conseguir entrar no mundo das crianças. Estava interessado em crianças com idades compreendidas entre os 10 e os 14. Foi beber sumos e refrigerantes com elas e outras coisas mais, mas os seus esforços não surtiram qualquer efeito. Tentou mesmo suborná-Ias. Ao tentar estabelecer uma relação, é necessário ter-se em conta a idade (não só quando se é adulto e os sujeitos são crianças, mas mesmo quando se está na casa dos 20 e se quer entrevistar os dirigentes escolares regionais). O género sexual é outra das características do investigador a ter em conta no estabelecimento de relações no trabalho de campo. Na cultura ocidental, o género sexual constitui uma entidade organizadora essencial e, como tal, os sujeitos tratam um investigador ou uma investigadora de forma diferente, e, consequentemente, os investigadores ou as investigadoras passam a conhecer aspectos diferentes dos mundos que estudam (Wan'en, 1988, p. 5). Por exemplo, mulheres em ambientes exclusivamente masculinos têm sido forçadas a desempenhar papéis tradicionalmente femininos como o da "despassarada engraçada", da "insignificante", do objecto de conquista sexual ou do objecto de piadas relacionadas com o género sexual (Warren, 1988; Easterday, Papademas, Shorr e Valentine, 1977). Algl investigadores têm acentuado as relações próximas que as entrevistadoras feminir facilmente estabelecem com outras mulheres, contrastando com as dificuldades dos ent vistadores masculinos face a sujeitos femininos. De novo, e como aconteceu na nossa discussão sobre as relações estabelecidas trabalho de campo, podemos apenas dar-lhe informação sobre alguns dos aspect importantes ou problemáticos e proporcionar algumas sugestões, havendo, no entan muitos aspectos do trabalho de campo que só poderão ser resolvidos por si. Por não ex tir uma bibliografia extensa sobre as diversas formas de trabalho de campo nos difere tes contextos que os investigadores estudam, fica aberta a oportunidade de publicação artigos metodológicos nos quais poderá expor a sua experiência e aconselhar colegas. As questões relativas à duração, aos sujeitos e à forma de participação tendem a s\ gir à medida que o trabalho se desenvolve. Se, por exemplo, o seu objectivo for compreensão do funcionamento da sala de aula tal como o aluno a vê, poderá optar ç participar mais com os alunos do que com o professor. Se decidir passar muito tem com os participantes, neste caso, os alunos, é importante que os outros participantes pt cebam que não os está a desprezar. Partilhe com o professor a sua estratégia de se cent] mais nos alunos, para que este não se sinta desprezado ou ofendido. A participação sala de aula propriamente dita poderá ser embaraçosa, embora os estudos sejam muil vezes mais alargados, incluindo entrevistas ou sessões de observação com o profess fora do contexto. Deste modo a participação toma-se menos problemática. A tentativa de equilíbrio entre a participação e a observação pode também sUfl como particularmente difícil noutras situações. Temos constatado que pequenos gruP( cujos membros tentam intencionalmente ser "abertos" e "partilharem", são particuh mente difíceis. Em grupos de sensibilização, de encontro e noutras situações afins, cor tata-se uma pressão para angariar membros efectivos. Os investigadores de cam sentem-se culpados por estarem à margem, especialmente se partilharem os valores d membros desse grupo. Mesmo em actividades de grupo menos intensas, surgem decisõ complicadas ou embaraçosas. Um observador pretendia estudar uma turma de um cur de formação de professores, em que estes estavam a estudar como se ensinava os alun a terem um "comportamento pró-social". Como parte do treino, pedia-se aos professor para dramatizarem um grupo de alunos perturbadores. Este episódio ocorreu no início· observação e o investigador ainda não sabia bem o que tinha de fazer. Deveria pass quando chegasse a sua vez? Como é que deveria agir se decidisse participar? Até q ponto deveria ficar visível? Embora achasse que estava com sorte em relação ao q estava a observar, porque os professores revelavam aquilo que pensavam sobre os alun perturbadores, ao mesmo tempo a situação criava-lhe ansiedade. Quando chegou a s vez de participar na dramatização decidiu simular o papel de um aluno isolado e m, -humorado em vez de um mais gregário. Ao fazer esta escolha, participou, mas de un forma não controversa. 126 127 I I Como sugere este último exemplo, a forma como se participa depende de quem se é, dos seus valores e da sua personalidade. Pode ajustar o seu comportamento típico à tarefa de investigação, estando, ao fazer aquilo que costuma fazer, a estabelecer parâmetros para o seu comportamento. Pessoas que são muito faladoras têm de controlar o seu gregarismo e, apesar de mostrarem esta restrição, poderão mesmo assim ser mais participativas do que pessoas que normalmente são caladas. Uma pessoa muito tímida poderá ter de treinar ser mais assertiva ao iniciar conversas e a apresentar-se aos outros. Não há uma personalidade "certa" para o trabalho de campo. Ser-se investigador significa interiorizar-se o objectivo da investigação, à medida que se recolhem os dados no contexto. Conforme se vai investigando, participa-se com os sujeitos de diversas formas. Dizem-se-lhes piadas e é-se sociável em diversos aspectos. Pode-se mesmo ajudá-los a desempenharem as suas obrigações. Estas coisas são feitas sempre com o intuito de promover os objectivos da investigação. Leva-se consigo uma tabuleta imaginária que se coloca em cada sujeito e em cada parede, muro ou árvore. A tabuleta diz: "A minha meta prioritária é a de recolher dados. Em que medida o que eu faço se relaciona com este objectivo?" Se aquilo que se faz não se relaciona com a recolha de dados, é necessário interpretar isso como um aviso de que se está a abandonar o papel de investigador. No entanto, isso não significa que se tenha de passar cada minuto a fazer sistematicamente investigação. Por vezes, estabelecer uma boa relação requer andar pelas redondezas e apenas conviver com os sujeitos. Pode-se mesmo ir com eles ao cinema ou beber um copo. Ir com os sujeitos ao cinema pode não produzir grandes dados, mas esta actividade pode desenvolver a relação e colocar o investigador numa boa posição para futuramente recolher mais dados. SEJA DISCRETO A esperança dos investigadores de campo "cooperativos" é integrarem-se no contexto, tomando-se mais ou menos parte "natural" do cenário. Há uma série de facilitadores desta integração. O aspecto físico é um deles. As pessoas escolhem roupas que comunicam aquilo que são. Não sugerimos que abandone o seu estilo pessoal, mas que tenha consciência do impacto que o seu vestuário pode ter nos sujeitos. Se estiver num local onde as pessoas se vestem informalmente, vista-se também de uma maneira informal. Numa escola, o facto de se vestir formalmente poderá transmitir aos outros a sua maneira de ser e as pessoas com quem se identifica. O pessoal administrativo poderá usar fatos ou vestidos, os professores poderão ser menos formais, ao passo que os alunos e o pessoal auxiliar poderão vestir T-shirts e calças de ganga. Esteja ciente dos códigos de vestuário implícitos e, se não se sentir desconfortável, vista-se de uma maneira que pareça apropriada ao seu estatuto naquela situação. Não imite o padrão de vestuário do seu anfitrião, a não ser que se sinta à vontade. Se conduzir a sua investigação de uma forma sistemática e rigorosa e se desenvolver confiança, ser-lhe-ão f~mecidas informações e opiniões que nem mesmo os intervenientes 128 I conhecem. Importa, contudo, não revelar aquilo que sabe quando fala com os sujeitos que estes podem ficar melindrados com a presença de um "sabe-tudo". Não discuta c ninguém nada que um sujeito lhe tenha revelado. Quer ser considerado como uma pes com discrição. Mesmo se encontrar pessoas cujas crenças e opiniões não estão totalme correctas - ou que até são ridículas à luz daquilo que sabe -, não as tente corrigir dan -lhes a informação de que dispõe. Um investigador relatou que a sua aceitação, por pi dos professores da escola que observou, foi facilitada, em grande parte, pela sua reputa de pessoa em quem se podia confiar; apesar de não terem a certeza do que ele preten fazer ou fazia, "pelo menos não era mexeriqueiro" (Smith e Geoffrey, 1968). A sugestão de evitar os mexericos também se alarga às pessoas que não são seus su tos. Embora seja importante discutir com os seus colegas ou com o seu professor os I blemas que está a ter e quais os resultados do seu estudo, evite utilizar de forma impe nente a informação que possui. Não deverá, por exemplo, ser o tópico de uma conve numa ocasião festiva. Pergunte a si próprio, quando discutir com outra pessoa a sua ex riência, "o que é que as pessoas do local que estou a estudar pensariam se me ouvis, falar?" Se achar que ficaria embaraçado, o melhor é conter-se. O que disser poderá che aos ouvidos dos seus sujeitos e afectar seriamente as suas relações com eles. Tal comI tamento pode quebrar a confiança. Enquanto que muitos professores acham os observadores não perturbadores e um ' mento adicional interessante para a sua aula, outros sugerem que pode ser desgastante constantemente alguém a observá-los. Se a sensação de se estar dentro de um aqu; pode ser difícil para alguns professores, então a sensação de se ser o tema de uma, cussão universitária intensifica muito mais esse desconforto. Os alunos que estão a f; trabalho de campo com professores deverão ter constantemente presente esta prec pação. Como uma professora pronta a cooperar disse a um investigador colocado na turma: "os professores universitários dizem que os professores em formação nos deI observar para aprenderem, mas o que, de facto, parece é que eles nos criticam. Já me s suficientemente incompetente para lidar com todos estes miúdos, e a última coisa que apetece é ser criticada. Eles não estão cá todo o dia com os trinta e três miúdos." ( Sarason et ai. 1966, pp. 74-97, para uma discussão deste tema.) As notas de campo que tira, com certeza, contêm informação inofensiva sobre aq que está a aprender. Mas, uma vez que também contêm citações de pessoas, para além suas reflexões pessoais, é importante ter cuidado com este material. Certifique-se que as deixa num sítio onde alguém da instituição as possa encontrar. Do mesmo modo, I fins de anonimato, utilize nomes falsos para as pessoas sobre quem escreve, mude o fi( da escola (se estiver a estudar uma escola) e disfarce toda e qualquer informação possa dar a conhecer ao leitor onde e junto a quem recolheu os dados. Embora na abordagem objectiva os sujeitos conheçam os objectivos da investigai uma vez estabelecida a relação, acabam por se esquecer do facto de que são objecto de vestigação. Encoraje-os a aceitarem-no tal como é e a não ficarem demasiado ciente: IOE-9 sua presença. Tirar notas de campo extensas faz parte integrante de uma investigação qualitativa. Descrevê-Io-emos com detalhe no capítulo IV. Sugerimos que tire as notas após ter saído do local, no final do período de observação. Recomendamos que evite tomar notas à frente dos sujeitos. Existem, contudo, alturas em que tirar notas é inteiramente adequado. Por exemplo, quando as pessoas da instituição estão elas próprias a tomar notas. Ao assistir às aulas, os alunos de liceu tiram frequentemente apontamentos. Numa ocasião destas seria inteiramente adequado tirar também notas. Do mesmo modo, quando alguém está a dar uma explicação elaborada e detalhada, tirar notas à sua frente não será perturbador. Quando um director, por exemplo, descreve o funcionamento organizacional da escola, é perfeitamente aceitável tirar o seu bloco e escrever alguns apontamentos. Muitas vezes os sujeitos mostram-se curiosos em saber aquilo que o investigador escreve. Tentam espreitar. Certifique-se que aquilo que regista é de uma natureza tal que não se importaria que os sujeitos vissem. Alguns investigadores criam códigos para assegurar tal privacidade. Evite andar sempre de papel e lápis na mão, embora quando necessário possa fazer rapidamente um rascunho. Uma estratégia que os observadores muitas vezes utilizam durante o período de observação é a de se retirarem para um local privado (como a casa de banho) e escreverem alguns tópicos ou frases que o ajudam a relembrar o que observaram. Se o fizer, tente não se comportar como um detective ou aparecer aos sujeitos de uma forma fantasmagórica. CONTEXTOS EDUCATIVOS EM CONFLITO Não é invulgar que uma organização tenha as suas discórdias. Debates intensos e furiosos sobre políticas e procedimentos acendem-se constantemente nas escolas. Como tal, podem causar problemas ao investigador. As pessoas podem competir para que fique aliado a uma das facções. Ao conduzir a maioria das investigações, é mais eficaz manter-se neutro. Se se identificar com um dos lados, será difícil compreender ou ter acesso ao outro. Embora o conflito numa escola possa causar problemas ao investigador, pode simultaneamente proporcionar uma oportunidade para o observador astuto compreender a dinâmica do confronto e da negociação. Em tempos de conflito, as pessoas podem abertamente revelar as suas perspectivas sobre o que acham importante. Como tal, o estudo de uma escola em conflito pode transformar-se numa experiência particularmente produtiva. Os conflitos podem ser menos intensos e cingirem-se a um pequeno segmento da população escolar. Muitas vezes, os professores não concordam sobre a forma de resolver os problemas do dia-a-dia. Alguns investigadores no contexto da escolaridade primária, por exemplo, verificaram que determinados professores discordavam em relação às razões que levavam certos alunos a serem colocados na "sala de apoio". Uma professora do primeiro ano da primária relatou a um investigador que um dos seus alunos precisava de apoio por apresentar "dificuldades de aprendizagem". Contudo, a professora de apoio 130 I achava que o problema do aluno se situava a um nível comportamental e não académi "Ele finge e a professora manda-mo para mim." As duas professoras interpretaram o cc portamento do aluno de maneiras diferentes e estas perspectivas contraditórias gerar muita discussão. Em controvérsias deste tipo, ouvir os vários lados da disputa proporcil ao investigador dados importantes. SENTIMENTOS No capítulo introdutório mencionámos os sentimentos e preconceitos do prór investigador que podem ser fontes possíveis de enviesamentos. No capítulo seguinte ( cutiremos a forma como os investigadores qualitativos registam os seus sentimen como método de controlar o enviesamento. Neste capítulo, abordaremos o tópico I sentimentos sob uma luz diferente - o seu impacto positivo na investigação. Os sei mentos são um importante veículo para estabelecer uma relação e para julgar as persp tivas dos sujeitos. Não se podem reprimir sentimentos. Pelo contrário, se tratai devidamente, podem constituir um importante auxiliar da investigação qualitat (Rosaldo, 1989). Relataremos em seguida duas experiências de investigação que ilustram o uso de s timentos que conduzem à compreensão. A primeira vez que uma observadora visito cantina do liceu onde conduzia a sua investigação ficou submergida por um sentimento falta de controlo - "caos", como ela descreveu: o barulho ensurdecedor, o cheiro a com e a lixo, os empurrões e a gritaria. Assim que chegou sentiu que, se não fugisse, teria berrar. Os professores estudados também descreveram sentimentos semelhantes em [( ção à primeira vez que foram à cantina. De facto, um professor dirigiu-se à observad no meio do caos e perguntou: "Como é que está a sua cabeça? A minha parece o jarc zoológico." Mais tarde, quando na sala de professores alguém mencionou a cantim observadora mencionou que tinha lá entrado e ficado em "estado de choque". Os prol sores começaram a lembrar-se do martírio que foram as primeiras semanas em que tinh a seu cargo o controlo da cantina. Mas, asseguraram-lhe, "há-de habituar-se. Alguns nós até achamos piada agora". Ao partilhar os seus sentimentos, esta observadora con guiu entrar em contacto com os professores. Numa unidade de cuidados intensivos para recém-nascidos de um hospital univ sitário, os médicos do internato tinham muita dificuldade em encontrar artérias para es tar agulhas nos seus minúsculos doentes. (Muitos eram bebés prematuros, alguns com peso de meio quilo.) Isto significava que tinham de espetar muitas vezes os bebés encontrarem sangue. As primeiras vezes que o observador assistiu a este processo tf problemas em controlar os seus sentimentos de compaixão quando os bebés choravi mexiam e fugiam da dor aparente. Passado algum tempo, o observador ia achando Ci vez menos difícil assistir a tais procedimentos. Os médicos internos raramente mostrav qualquer tipo de emoção, a não ser o desespero por não conseguirem completar a tar( 131 I podiam encolher de medo quando os tratamentos envolviam agulhas. Também percebiam como os pais se sentiam em relação à dor do seu bebé e conseguiam oferecer-lhes explicações que facilitavam tais sentimentos: os nervos ainda não desenvolvidos dos bebés não eram como os dos adultos e os bebés não se iriam lembrar. Como ambos os relatos sugerem, os sentimentos do observador podem constituir um importante indicador dos sentimentos do sujeito e, como tal, uma fonte de ret1exão. Podem também ajudar o investigador a formular questões que o conduzam às experiências dos sujeitos. Neste sentido. as reacções emocionais do observador são uma fonte de intuições de investigação. Se cuidadosamente separadas, selectivamente apresentadas e apropriadamente expressas, podem também ser uma maravilhosa via para desenvolver uma relação. (É evidente que se os seus sentimentos forem opostos aos dos seus sujeitos, se revelados. podem criar hostil idade.) Afinal. passar a fazer parte de um grupo significa partilhar as reacções dos seus membros (ver Everhart, 1977). Muitos dos que trabalham em escolas dizem que alguém de fora nunca poderá vir a saber "o que é de facto" ser-se professor. Esta conclusão refere-se, em parte, à incapacidade de um estranho experimentar a frustração, a raiva, a alegria e os sentimentos de sucesso do professor. Não queremos sugerir que o investigador possa vir a sentir tudo isto do mesmo modo que o professor ou outro grupo de sujeitos o sente, mas queremos dizer que poderá experimentar alguns desses sentimentos e desenvolver empatia. Se estiver presente num dia mau. quando o ar que se respira transpira tensão, ou no último dia de aulas, quando todos se despedem, poderá ter oportunidade de partilhar parte do mundo emocional dos professores e poderá sentir-se mais próximo deles e eles de si. QUANTO TEMPO DEVE DURAR UMA SESSÃO DE OBSERVAÇÃO? No entanto, os pais reagiam ao tratamento dos bebés aparentando muito desconforto. O observador partilhou os seus sentimentos com os médicos, que lhe explicaram as dificuldades que tinham tido nas primeiras vezes e as estratégias que tinham desenvolvido para as controlar. Uma delas consistia em dizer insistentemente para si próprios que aquilo que estavam a fazer ajudava o bebé. Explicaram ainda que tinham tendência para não olhar para os bebés que tratavam como uma pessoa e que esse sentimento os perturbava. Os seus doentes estavam a transformar-se em objectos de tratamento. Sentiam que não se Como sugerimos, nos primeiros dias limite as sessões a uma hora ou menos. À medida que a confiança e os conhecimentos crescem, aumente também as horas do período de observação. Sendo o que se refere no parágrafo seguinte a única excepção, não deve ficar no local mais tempo do que aquilo que a sua memória lhe permite ou do que o tempo de que dispõe para redigir as notas após a sessão. Geralmente o trabalho de campo é mais divertido do que a redacção das notas, existindo, por isso, uma tendência para se passar no local mais horas do que as necessárias. O trabalho de campo exige disciplina. Contenha-se - lembre-se da tabuleta. Por vezes, após algumas sessões no campo de investigação, os investigadores acham que não estiveram com os sujeitos o tempo necessário para o estabelecimento de uma relação firme. Podem decidir passar com eles um período maior de tempo, um dia inteiro, por exemplo, mesmo que saibam que não é possível redigir todos os dados daí resultantes. Neste caso, estão dispostos a sacrificar as notas detalhadas à relação que se conquista. Isto parece ser razoável. 132 133 I I Paragem cardíaca numa unidade de neonatologia. O instrumento médico utilizado é inspirado numa escova de dentes eléctrica. uase todos nós já fizemos entrevistas. O processo parece-nos tão familiar que as fazemos sem pensar. Uma entrevista consiste numa conversa intencional, geralmente entre duas pessoas, embora por vezes possa envolver mais pessoas (Morgan, 1988), dirigida por uma das pessoas, com o objectivo de obter informações sobre a outra. No caso do investigador qualitativo, a entrevista surge com um formato próprio (Burgess, 1984, pp. 101-121). Em investigação qualitativa, as entrevistas podem ser utilizadas de duas formas. Podem constituir a estratégia dominante para a recolha de dados ou podem ser utilizadas em conjunto com a observação participante, análise de documentos e outras técnicas. Em todas estas situações, a entrevista é utilizada para recolher dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo. Nos estudos de observação participante, o investigador geralmente já conhece os sujeitos, de modo que a entrevista se assemelha muitas vezes a uma conversa entre amigos. Neste caso, não se pode separar facilmente a entrevista das outras actividades de investigação. Quando o sujeito tem um momento disponível, o investigador pode, por exemplo, pedir-lhe: "Tem uns minutos livres? Ainda não falei sozinho consigo." Por vezes, a entrevista não tem uma introdução; o investigador transforma simplesmente aquela situação numa entrevista. Contudo, especialmente no final do estudo, quando se procura informação específica, o observador participante determina momentos para se encontrar com os sujeitos, com vista a conduzir uma entrevista mais formal. O mesmo se aplica aos estudos qualitativos que envolvem investigação documental. Em estudos que confiam predominantemente na entrevista, geralmente, o sujeito considerado como um estranho. (Contudo, em estudos que envolvem entrevistas long com um ou poucos sujeitos, é frequente os investigadores conhecerem o sujeitos antes investigação começar.) Grande parte do trabalho envolve a construção de uma relaçã investigador e sujeito passarem a conhecer-se e o investigador pôr o sujeito à vontal (Whyte, 1984, esp. cap. VI). A maior parte das entrevistas começam por uma conversa banal. Os tópicos pode passar pelo futebol ou pela cozinha. Esta amena cavaqueira serve para desenvolver u acordo: procurar um interesse ou um tópico em comum, uma oportunidade para se com çar a construir uma relação. Em situações em que já conhece o sujeito, passe logo à entr vista, mas em situações em que não conhece o sujeito terá provavelmente de quebrar gelo inicial, o que, nalguns casos, demora o seu tempo. Em projectos de entrevista long poderá levar uma sessão inteira, embora várias entrevistadoras tenham comentado o à-vo tade com que as mulheres entrevistadas se abrem com mulheres que conduzem entrevist aprofundadas (DeVault, 1990; Stacey, 1988; Pinch, 1984; Oakley, 1981). No início da entrevista, tenta-se informar com brevidade o sujeito do objectivo e g rantir-lhe (se necessário) que aquilo que será dito na entrevista será tratado confidencie mente. Muitos sujeitos, a princípio, ficam apreensivos, negando a existência de algun coisa importante para dizer. Nestes casos, o entrevistador tem de ser encorajador e apoia te. Com menos frequência, o potencial sujeito pode desafiá-lo, questionando os ser métodos e a coerência e seriedade do seu estudo. Nestes casos, terá de mostrar f;rmez sem se mostrar defensivo. As entrevistas qualitativas variam quanto ao grau de estruturação. Algumas, embo relativamente abertas, centram-se em tópicos determinados ou podem ser guiadas p questões gerais (Merton e Kendall, 1946). Mesmo quando se utiliza um guião, as entr vistas qualitativas oferecem ao entrevistador uma amplitude de temas considerável, ql lhe permite levantar uma série de tópicos e oferecem ao sujeito a oportunidade de mold o seu conteúdo. Quando o entrevistador controla o conteúdo de uma forma demasiac rígida, quando o sujeito não consegue contar a sua história em termos pessoais, pelas su: próprias palavras, a entrevista ultrapassa o âmbito qualitativo. No outro extremo do contínuo estruturada/não estruturada situa-se a entrevista mui1 aberta. Neste caso, o entrevistador encoraja o sujeito a falar sobre uma área de interesse em seguida, explora-a mais aprofundadamente, retomando os tópicos e os temas que respondente iniciou. Neste tipo de entrevista, o sujeito desempenha um papel crucial r definição do conteúdo da entrevista e na condução do estudo. Alguns autores colocam a questão de qual dos dois tipos de entrevista é o mais eficaz, estruturado ou o não estruturado. Nas entrevistas semiestruturadas fica-se com a certeza ( se obter dados comparáveis entre os váriOS sajeitos, embora se perca a oportunidade c compreender como é que os próprios sujeitos estruturam o tópico em questão. Se bem ql este tipo de debates possa animar a comunidade de investigação, a nossa perspectiva é a ( 134 135 I I. D Entrevistas Q que não é preciso optar por um dos partidos. A escolha recai num tipo particular de entrevista, baseada no objectivo da investigação. Para além disso, podem-se utilizar diferentes tipos de entrevista, em diferentes fases do mesmo estudo. Por exemplo, no início do projecto pode parecer importante utilizar a entrevista mais livre e exploratória, pois nesse momento o objectivo é a compreensão geral das perspectivas sobre o tópico. Após o trabalho de investigação, pode surgir a necessidade de estruturar mais as entrevistas de modo a obter dados comparáveis num tipo de amostragem mais alargada. (Para uma outra discussão da estrutura e dos tipos de entrevista, ver a secção sobre a indução analítica no capítulo IL) As boas entrevistas caracterizam-se pelo facto de os sujeitos estarem à vontade e falarem livremente sobre os seus pontos de vista (para uma discussão compreensiva, ver Biggs, 1986). As boas entrevistas produzem uma riqueza de dados, recheados de palavras que revelam as perspectivas dos respondentes. As transcrições estão repletas de detalhes e de exemplos. Um bom entrevistador comunica ao sujeito o seu interesse pessoal, estando atento, acenando com a cabeça e utilizando expressões faciais apropriadas. O entrevistador poderá pedir uma clarificação no caso do respondente mencionar algo que lhe pareça mais estranho, utilizando frases como: "O que quer dizer com isso?" "Não tenho a certeza se estou a seguir o seu raciocínio." "Pode explicar melhor?" O entrevistador estimula também o entrevistado a ser específico, pedindo-lhe para ilustrar com exemplos alguns dos aspectos que mencionou. Por exemplo, quando o entrevistador pergunta algo sobre o passado, sugere ao entrevistado que regresse a esse momento particular e o tente reviver. Pode-lhe pedir para citar o que foi dito. As pessoas que são entrevistadas tendem a oferecer uma retrospectiva dos acontecimentos. Podem, no entanto, ser ensinadas a responder de forma a satisfazer os interesses do entrevistador em relação a pormenores. Precisam de ser encorajadas a elaborarem. É evidente que uma estratégia-chave para o entrevistador qualitativo no campo de trabalho consiste em evitar, tanto quanto possível, perguntas que possam ser respondidas com "sim" e "não". Os pormenores e detalhes particulares são revelados a partir de perguntas que exigem exploração. A pergunta "era bom aluno na escola primária?" pode ser respondida com uma só palavra se o entrevistado o desejar, mas "diga-me que tipo de aluno era quando andava na primária" exige uma descrição mais minuciosa. Como corolário, os entrevistadores não precisam de temer o silêncio. Os silêncios criam a oportunidade para os sujeitos organizarem os seus pensamentos e dirigirem parte da conversa. Constitui um mau hábito os entrevistadores interromperem e desviarem a conversa. Nem todas as pessoas são igualmente articuladas e perspicazes e, por isso, é importante que o investigador qualitativo não desista de uma entrevista à primeira. Precisa de deixar que alguns entrevistados se habituem a si. Num projecto de entrevista qualitativa a informação é cumulativa, isto é, cada entrevista, determina e liga-se à seguinte. O que conta é o que se retira do estudo completo. Embora se possa aprender mais com umas entrevistas do que com outras, e embora não se possa usufruir da mesma intensidade com toda as pessoas entrevistadas, mesmo uma má entrevista pode proporcionar informação útil. 136 I Não existem regras que se possam aplicar constantemente a todas as situações entrevista, embora possam ser feitas algumas afirmações gerais. O que se revela m importante é a necessidade de ouvir cuidadosamente. Oiça o que as pessoas dize Encare cada palavra como se ela fosse potencialmente desvendar o mistério que i modo de cada sujeito olhar para o mundo. Se a princípio não conseguir compreende que o sujeito está a tentar dizer, peça-lhe uma clarificação. Faça perguntas, não con intuito de desafiar, mas sim de clarificar. Se não conseguir compreender, encan defeito como seu. Assuma que o problema não reside na falta de sentido do qU( sujeito está a dizer, mas que reside em si, que não o conseguiu compreender. Vo atrás, oiça e pense um pouco mais. O processo de entrevista requer flexibilida< Experimente diferentes técnicas, incluindo piadas e desafios ligeiros. Pode ter de pe aos entrevistados para elaborarem histórias e, por vezes, partilhar com eles as SI experiências. Algumas discussões entre os investigadores qualitativos têm-se centrado na dúv relativa ao facto de a entrevista constituir uma forma de persuasão ou de sedução; istc persuadimos ou seduzimos pessoas a falarem de si próprias e a revelarem-se? Fir (1984), por exemplo, preocupa-se sobre o "à-vontade extremo" com que as investigai ras podem recolher informação sobre mulheres entrevistadas, particularmente se a ent vistadora lhes tiver dado oportunidade de falarem sobre aspectos centrais das suas vid O entrevistador tem de ter cuidado para não abusar da confiança (Stacey, 1988). U forma dos investigadores contrabalançarem esta preocupação consiste em dar ênfas< importância da auto-revelação quando entrevistam (DeVault, 1990; Lather, 1988). As fotografias e os objectos ligados a recordações podem servir de estímulo par conversa. Ao entrevistar pessoas nas suas residências ou na sala de aula, faça-lhes p guntas sobre os objectos e os quadros pendurados ou expostos na sala. Num estl sobre os pensamentos que os pais têm acerca do desenvolvimento dos seus filhos, investigador perguntou intencionalmente aos pais se tinham alguns retratos dos filh As entrevistas foram realizadas em casa e a maior parte dos pais ficaram encantai por poderem mostrar o álbum de família. As fotografias serviram de pretexto par. estrutura da conversa. Peça fotografias e faça perguntas sobre os objectos expostos. Ser flexível significa responder à situação imediata, ao entrevistado sentado à ; frente e não a um conjunto de procedimentos ou estereótipos predeterminados. Nu investigação com os professores da Escola de Chicago, Becker (1951) descreveu diferentes abordagens que desenvolveu com diferentes professores. Achou que com professores mais novos podia ser mais directo sobre os seus sentimentos polític Porém, com os mais velhos teve de ser mais cauteloso. Ao pedir a alguém que partilhe parte de si próprio consigo, é importante que nã< avalie, para o não fazer sentir-se de alguma forma diminuído. Mesmo se, por exemç os comentários racistas do professor sobre os seus alunos o perturbarem, terá de Ci trolar as suas reacções, recordando que o objecto da investigação é a compreensão i 137 .1."". diferentes perspectivas pessoais e não uma lição aos sujeitos. Poderão existir conflitos de valores em relação aos pontos de vista que ouviu, mas o que realmente se pretende é encorajar os entrevistados a expressarem aquilo que sentem. O seu papel, enquanto investigador, não consiste em modificar pontos de vista, mas antes em compreender os pontos de vista dos sujeitos e as razões que os levam a assumi-los l • Muitas vezes, os sujeitos acreditam em perspectivas estereotipadas sobre, por exemplo, o mundo universitário. Muitos acham que na universidade todos são "super1iberais" ou "radicais" e, podem, por isso, ter relutância em falarem das perspectivas mais conservadoras com que concordam. Importa criar uma atmosfera onde os entrevistados se possam sentir à vontade para expressarem as suas opiniões. Os sujeitos poderão iniciar uma frase do tipo: "Eu sei que vocês lá na Universidade não pensam assim, mas não tiveram as experiências que eu tive .....; "Poôe achar que eu estou a dizer meia dúzia de disparates, mas.....; "Existe uma grande diferença entre o que se lê nos livros e o que se aprende directamente...... Por outro lado, parece difícil formar uma boa relação com os sujeitos quando o entrevistador não respeita os seus pontos de vista nem se sente livre para expressar os seus. Pode, em quase todas as situações de entrevista, contrariar os pontos de vistas estereotipados que os sujeitos têm de si, embora nem sempre tal seja necessário. Uma vez que as entrevistas formais envolvem uma relação entre duas pessoas, a raça, o sexo, a idade e outras características do entrevistador podem influenciar o tipo de relação que se estabelece (Warren, 1988; Fine e Sandstrom, 1988; Wax, 1979). O efeito específico que as suas características pessoais têm nos sujeitos varia com os sujeitos e com os contextos. Se bem que alguns homens falem abertamente com investigadoras femininas, outros, porém, não se abrem. É importante que seja sensível aos efeitos que as suas características pessoais possam ter numa entrevista. Todavia, é raro que estas sejam tão pronunciadas que o desqualifiquem (embora uma mulher que estude um dormitório de homens ou um grupo minoritário que estude o Ku-Klux-Klan possa ter dificuldades). As entrevistas de grupo podem ser úteis para transportar o entrevistador para o mundo dos sujeitos. Nesta situação, várias pessoas juntas são encorajadas a falarem sobre um tema de interesse (Morgan, 1988). Podem juntar-se professores, pais ou directores para falarem sobre o seu trabalho ou sobre os que trabalham com as suas crianças. Geralmente, revela-se uma boa forma de obter novas ideias sobre temas a discutir em entrevistas individuais. Ao reflectir sobre um tópico, os sujeitos podem estimular-se uns aos outros, avançando ideias que se podem explorar mais tarde. As entrevistas de grupo podem também ser partilhadas por professores de línguas, directores ou auxiliares. Os problemas das entrevistas de grupo incluem o seu início e o controlo das pessoas que insistem em dominar a sessão. Um problema adicional surge quando as entrevistas de grupo são gravadas. É difícil reconstruir uma entrevista, a não ser que as cassetes sejam transcritas pouco depois da sessão ter sido gravada. Um dos aspectos que toma a transcrição difícil é o reconhecimento de quem fala, quando existem várias pessoas a falar ao mesmo tempo. A utilização de um gravador durante uma entrevista levanta algumas consideraçõ especiais, em termos das relações de investigação. Discutiremos a utilização de gravad res no capítulo IV, onde nos centraremos nas suas implicações para a relação investig dor-sujeito. Se decidir utilizar um gravador, pergunte aos sujeitos se se importam. A altu em que pede a autorização pode ser melindrosa. Ou por timidez ou por medo de n; serem aceites, é frequente surgirem problemas quando se levanta a questão. Nunca gra' sem autorização. Force-se a si próprio a perguntar. Alguns sujeitos nem sequer se impc tam que a entrevista seja gravada. Outros podem querer saber o que vai fazer com as gr vações. Querem que a informação privada que partilharam consigo não seja revelada outrem em seu detrimento. Também há quem pense que uma vez gravadas as suas pai vras podem tomar-se objecto de perseguição (ou podem vir a causar problemas, como p exemplo, revelar alguma coisa que tenha sido feita de uma forma menos legal). Há q: tranquilizar estas pessoas. Alguns sujeitos dirão simplesmente "não", sendo, então, co veniente aceitar a sua vontade. Quando as entrevistas forem curtas e fizerem parte de u estudo de observação participante, as notas de campo podem ser tiradas depois da sessã Quando as entrevistas forem longas, podem-se tirar umas notas rápidas durante a sessã como auxiliares de memória. Por vezes, as pessoas que inicialmente mostraram recm mudam de ideias quando começam a falar. Dê-lhes oportunidade para mudarem de ideia Que lugar deve ocupar o gravador na relação sujeito-investigador? Edward Iv (1974), historiador oral que faz recolha de folclore, sugere que durante a entrevista o gr vador deverá ser visto como uma terceira presença que não se consegue ver. Quando, sujeitos gesticulam ou fazem sinais com as mãos, estes indícios não verbais têm de s traduzidos em linguagem verbal, para que possam ser impressos quando se passa a e trevista do gravador para o papel. O entrevistador deve evitar alimentar as respostas dos sujeitos e fazê-los sentiremdesconfortáveis relativamente aos seus pensamentos. Durante uma entrevista sobre o d senvolvimento sexual, a entrevistada afirmou achar que tinha começado a desenvolv características sexuais secundárias no final do 3.° ano de escolaridade. Mais tarde eme dou: "Deve ter sido no final do 4.°", tendo o investigador retorquido "assim parece m~ provável". Este comentário foi interpretado pela entrevistada como revelador da desco fiança que o entrevistador tinha em relação a ela e, de facto, mais tarde, a entrevistai revelou que estava a ter problemas em se lembrar das coisas porque tinha ficado confu face às "dúvidas" do entrevistador. O comentário impensado do entrevistador, que av liava a entrevistada, comparando-a com uma linha imaginária de "desenvolvimento ne mal", causou-lhe perturbação (Biklen, 1973). Necessariamente, as boas entrevistas revelam paciência. Se não souber porque é ql os sujeitos respondem de uma determinada maneira, terá de esperar para encontrar explicação total. Os entrevistadores têm de ser detectives, reunindo partes de convers~ histórias pessoais e experiências, numa tentativa de compreender a perspectiva pessoal ( sujeito. 138 139 I I nas fotografias transparecem muitos risinhos e piadas durante uma aula de História não deve atribuir esses comportamentos a aspectos contextuais que se prendem com a aula de História. Compensa a avaliação da sessão, tomando em consideração o facto de o fotógrafo ter estado presente. Fotografia e trabalho de campo as mãos de um investigador, uma máquina fotográfica pode ser utilizada de uma forma simples, para fazer o inventário dos objectos no local de investigação. O quadro das notícias, os conteúdos da estante dos livros, o que está escrito no quadro e a disposição do mobiliário podem ser registados para futuro estudo e análise. As fotografias de inventário podem ser tiradas em qualquer altura que seja conveniente e podem ser certamente adiadas, dando oportunidade à condução cuidadosa da entrevista e da observação. Nesta ocasião, o investigador deve apontar o que quer fotografar ou as categorias de detalhes que são demasiado numerosas ou ambíguas para registar verbalmente e que precisam, posteriormente, de estar visualmente disponíveis. As fotografias podem ser tiradas rapidamente, sempre que surja uma oportunidade, não necessitando de perícia técnica. Se tencionar obter mais do que um inventário fotográfico, a questão torna-se um pouco mais complicada. Todos os assuntos interpessoais relacionados com a observação e a entrevista surgem de novo na versão especial da fotografia. A presença de um fotógrafo também os altera, mas de forma diferente e mais dramática. Nunca se conseguem eliminar estas consequências, mas pode-se contar com elas quando se concebe o plano do estudo. Existem, basicamente, três maneiras diferentes de o fazer. O efeito da presença da máquina pode ser (1) compensado, (2) explorado ou (3) minimizado. N 2. Alguns investigadores preferem explorar o efeito que as máquinas têm nas pessoas. Por exemplo, o objecto de um estudo poderá ser o modo como as pessoas reagem às máquinas fotográficas em contextos onde não é frequente a sua presença, ou o modo como as pessoas interagem umas com as outras quando sabem que estão a ser fotografadas. Noutras ocasiões, os investigadores poderão utilizar o impacto de uma máquina fotográfica como um abre-latas social para desenvolver a relação com os seus sujeitos. Neste caso, deve ser realçado que o primeiro intuito não é fotográfico - o mesmo resultado poderia ser conseguido com truques de magia ou uma máscara de elefante. Todavia, as fotografias obtidas podem proporcionar informação sobre o comportamento dos sujeitos, a sua interacção e sua forma de apresentação em determinadas situações. O efeito da presença de uma máquina fotográfica também pode ser explorado de forma a desencadear informação sobre o "melhor" que os sujeitos têm ou querem mostrar. Aqui, o "melhor" não significa um julgamento absoluto, mas aquilo que os sujeitos valorizam e consideram digno de ser fotografado, como as suas "melhores" roupas e adereços, haveres, posturas e assim por diante. Os exemplos mais claros podem ser vistos em retratos formais, fotografias de grupo, fotografias com troféus ou prémios, entre outros. Tendo em consideração o objectivo de certos estudos, pode ser desejável fotografar deliberadamente certas realizações "melhores", como a decoração da sala de aula, actividades especiais, costumes, exposições e afins. \. Se se tirarem fotografias (por exemplo, numa sala de aula) onde as pessoas têm consciência da presença da máquina fotográfica, os investigadores poderão utilizar a informação do modo como as pessoas modificam o seu comportamento em função desta presença para filtrarem a sua interpretação. Por exemplo, se um investigador verificar que 3. Em ambas as abordagens anteriores, a única coisa que as fotografias não proporcionavam era uma ideia do que é típico e natural num determinado contexto. Se o estudo tiver como preocupação central as ocorrências típicas, terá de se encontrar uma forma de minimizar a distorção das rotinas causada pela presença do fotógrafo. O investigador fotográfico tem de passar a ser, tanto quanto possível, invisível. Há duas maneiras de se chegar a esse objectivo: através da familiaridade e da distracção. As pessoas acabam por se acostumar e ficar indiferentes a qualquer coisa no seu meio ambiente, e o fotógrafo não constitui excepção. Ao estar "sempre" presente e integrado, o fotógrafo acaba por deixar de ser um estímulo especial. Um fotógrafo recorda ter estado o tempo suficiente numa sala de aula para quando uma criança nova se integrou na turma e perguntou de quem se tratava lhe dizerem cordialmente: "Oh, é apenas o fotógrafo" e não se ligou mais às suas actividades. Este tipo de indiferença pode instalar-se de uma forma incrivelmente rápida. Nalguns contextos, como em grupos de crianças activas, o fotógrafo pode deixar de ser novidade em menos de quinze minutos e pode passar ao esquecimento em meia hora. Noutros contextos, pode levar dois ou três dias de sessões de uma hora para que as pessoas deixem de agir para a máquina e passem a ser "elas próprias". Este 140 141 I. I "tempo de extinção" deverá ser tido em conta no planeamento de qualquer estudo que se centre em acontecimentos típicos e terá de ser proporcionado o tempo necessário para o efeito. É evidente que as visitas fotográficas ao local deverão ser planeadas com uma proximidade suficiente, para que a familiaridade e a indiferença não se percam e tenham de ser trabalhadas de novo, cada vez que se fotografa. Uma segunda maneira de o investigador fotográfico se tomar invisível é através da distracção. Se houver actividades suficientemente interessantes no local, os sujeitos darão pouca atenção à máquina fotográfica. Contudo, de uma forma geral, é importante fazer planos e chegar a um acordo de forma a que as actividades regulares possam prosseguir. É frequente, quando um fotógrafo chega ao local, as pessoas quererem saber o que é "suposto" que ele faça. Se esta incerteza não se resolver, os sujeitos poderão ter relutância em proceder como habitualmente. Se houver alguém claramente "no comando", como um professor na sala de aula, o investigador deverá combinar, na altura em que for apresentado aos presentes, que o objectivo da visita seja definido como não intrusivo ("Ele só quer saber o que costumamos fazer todos os dias" ou "Não lhe vamos ligar nada"). Em ambientes menos estruturados, é melhor que alguém da instituição faça as apresentações e "descontamine" o investigador, explicando aos sujeitos que não é "suposto" fazerem nada em especial. Na situação rara de não existir alguém disponível para apresentar e definir a natureza da visita de fotografia, o investigador deverá certificar-se que responde às dúvidas dos sujeitos, mesmo que estes não as verbalizem ("Quem é?" "O que é que vem fazer?" e, mais importante para o estudo, "O que é que quer que eu faça?"). À medida que o fotógrafo prossegue com o seu trabalho, os sujeitos, pouco a pouco, farão o mesmo. A maior parte destas considerações relacionam-se com estudos que envolvem grupos de pessoas em contextos definidos. Algumas das sugestões não seriam úteis para estudos que se centram em pessoas individuais e/ou onde os sujeitos se deslocam em várias actividades e locais. Seria praticamente impossível um fotógrafo tomar-se "invisível" se fosse a única pessoa na sala, para além do sujeito. Seria impossível, ou muito difícil, continuar a ser invisível se o ou os sujeitos se deslocassem para outros contextos onde as outras pessoas não conhecessem o propósito ou a natureza da sessão fotográfica. Em geral, estas situações indicam os limites do investigador fotográfico para trabalhar invisivelmente. Não seria excessivamente difícil um observador acompanhar um sujeito durante um dia inteiro de actividades, desde o pequeno-almoço à ceia, incluindo ir às compras e fazer visitas, bem como períodos de solidão. Mas fazê-lo com uma máquina fotográfica, fotografando cada episódio, rapidamente passaria a ser grotesco e certamente intrusivo. A questão é que, como com qualquer outro método de investigação (ou qualquer outra coisa), existem limites para o que é ridículo registar. Não significa que o investigador qualitativo nunca queira fotografar o sujeito a fazer compras ou a andar de autocarro, mas a intensidade e o grau de intrusão da fotografia (isto é, a precisão e a validade do método) diminuem em certos contextos. Ao conceber um plano de estudo, estes limites devem seI reconhecidos e compensados. Existe, contudo, uma maneira de tornar um estudo fotográfico de um único sujeite minimamente perturbador. É uma técnica útil para os grupos que não têm as suas própria~ actividades (distractivas) para os entreter. Consiste na introdução de um segundo investi· gador cujo papel é interagir com o ou os sujeitos de modo a lhes facilitar "que sejam ele~ próprios", enquanto que o primeiro investigador os fotografa. O segundo investigadO! pode - e deve - ser mais do que um mero "fantoche" ou um "pateta". As suas actividade~ devem ser planeadas como parte do projecto de investigação qualitativa, com vista a pro· duzir e a aumentar o tipo de informação a ser estudada. Na medida em que esta sugestão de colaboração surge da discussão das dificuldade: de planos de investigação puramente fotográficos, pode ser recomendada de uma form; mais fundamentada. Basicamente, o problema é: um fotógrafo não é um bom observador e mais, um fotógrafo não é bom em termos de interacção. Poderá parecer um paradoxe dizer-se que um fotógrafo não observa bem - afinal, a fotografia não constitui a melho forma de observação? De facto, um fotógrafo é um observador humano que pode ser sen sível e lembrar-se (dentro dos limites, obviamente) da totalidade da cena. Um fotógraf< funciona de uma maneira diferente. As duas operações básicas da fotografia consistem ne enquadramento (decidir o que deve ser incluído na fotografia e sob que perspectiva) e n: temporização (decidir quando carregar no botão). Não que um método de investigaçã, seja melhor do que o outro, o que de facto acontece é que existem diferentes formas di recolher os dados. Um bom fotógrafo pode isolar e congelar relações ou comportamento de uma forma que não pode ser recriada verbalmente; mas um observador humano podl proporcionar o sentido de toda a textura de relações que não podem ser veiculadas foto graficamente. Assim, a colaboração pode ser o modo de elaboração ideal para algun estudos. Tratam-se de regras muitos gerais; existem alturas em que todas elas devem ser e tên sido negligenciadas. Há estudos de sujeitos únicos baseados integralmente em fotografia~ com pouca elaboração verbal. O seu estatuto científico tem sido posto em causa, mas ter igualmente sido defendido. Também existem estudos onde os investigadores alternan entre períodos de entrevista e observação e períodos de fotografia. Outros têm observad enquanto fotografam. Por isso, as considerações aqui discutidas pretendem ser algo a te em conta na planificação de estudos envolvendo fotografia, e não ser tidas como regra que devem ou não ser cumpridas. 142 143 I I sujeitos e de outras situações. Por vezes, os sujeitos tornam-se amigos para sempre. Inve~ tigadores qualitativos têm relatado que entram e saem periodicamente de um determinad local, estudando-o longitudinalmente. O investigador qualitativo não só precisa de saber trabalhar e recolher os dados, com também de ter uma boa ideia sobre o que os dados são. Abandonar o campo de investigação os primeiros dias de ~rabalho de campo a tendência é para se sentir pouco à vontade e não desejado. A medida que o tempo passa, começa a sentir-se mais confortável e a fazer parte do cenário. Chega, então, o momento em que já completou aquilo que se tinha proposto fazer e em que tem de abandonar o campo. A saída pode ser difícil (Maines, Shaffir e Turowetz, 1980). Geralmente, os investigadores interessam-se pelas pessoas que estudaram e passam a afeiçoar-se a elas. Pode sentir-se como se as estivesse a abandonar, especialmente se estiverem a trabalhar sob condições adversas e a servirem populações desvalidas. Este sentimento continua de tal modo que, ao partir, sente que está a perder algo importante - dados novos que o conduzirão a novas descobertas. Podem surgir mil e uma desculpas para não abandonar o local onde trabalhou, mas, uma coisa é certa, esta procrastinação vai ter de acabar. Em vez de acabar esta parte da investigação abruptamente, muitas pessoas tornam mais fácil a sua saída, passando a ir com menos frequência até que acabam por não voltar. Esta transição é psicologicamente eficaz tanto para os investigadores como para os sujeitos. Frequentemente, os investigadores param de recolher dados e verificam, mais tarde, que é necessário continuar o trabalho de campo, precisando, por isso, de voltar. Para se preparar para esta contingência, ao terminar o trabalho de campo é importante deixar uma porta aberta. Dependendo do que negociou com os responsáveis escolares, pode haver obrigações a cumprir, como um relatório final ou a discussão da sua experiência com os membros da organização, antes de se despedir. Muitos investigadores relatam que ainda mantêm laços com as pessoas com quem estiveram envolvidos, regressando ao local periodicamente para saber das actividades dos N 144 I NOTAS 1. Poderá estar a efectuar uma investigação-acção com vista a mudanças sociais. num tópico corno o racismo n educação norte-americana, mas para o fazer terá de compreender as fontes das perspectivas em questão. Discut mos estes problemas no capítulo I e no capítulo VII. 2. Este ponto foi escrito por Andrejs Ozolins. IOE·10 145 I IV DADOS QUALITATIVOS 146 _. 1 147 I o andar num campo, uma pessoa vê um pássaro amarelo no momento em que e~ retira uma amora de um arbusto, mas vai a outro arbusto, deixa cair a prime amora e apanha uma segunda. Caso o observador fosse um ornitologista a estue os hábitos alimentares, podia ser que estivesse a tomar notas detalhadas - a recolt dados. Se se tratasse de um investigador educacional a passear num dia de folga, os dei lhes podiam passar despercebidos e não serem registados. De modo semelhante, os : queólogos chamam dados ao que os outros consideram lixo (antigos depósitos de lixo s um dos locais favoritos para este tipo de investigação). Um memorando do director uma escola pode constituir um dado valioso se o investigador o considerar como talou compreender o seu potencial. Tal como um mineiro apanha uma pedra, perscrutando-a busca de ouro, também o investigador procura identificar a informação importante I entre o material encontrado durante o processo de investigação. Num certo sentido, acontecimentos vulgares tomam-se dados quando vistos de um ponto de vista particula o do investigador. O termo dados refere-se aos materiais em bruto que os investigadores recolhem mundo que se encontram a estudar; são os elementos que formam a base da análise. i dados incluem materiais que os investigadores registam activamente, tais como traI crições de entrevistas e notas de campo referentes a observações participantes. Os dae também incluem aquilo que outros criaratn e que o investigador encontra, tal como d rios, fotografias, documentos oficiais e artigos de jornais. Os dados são simultaneamente as provas e as pistas. Coligidos cuidadosamen servem como factos inegáveis que protegem a escrita que possa ser feita de uma eSI culação não fundamentada. Os dados ligam-nos ao mundo empírico e, quando sistemát e rigorosamente recolhidos, ligatn a investigação qualitativa a outras formas de ciênc Os dados incluem os elementos necessários para pensar de forma adequada e profun acerca dos aspectos da vida que pretendemos explorar. No presente capítulo, discutiremos os dados e a sua recolha. Este tópico está intin mente ligado à nossa discussão do trabalho de CatnpO (ver capítulo III), mas, aqui, a no~ ênfase centra-se mais no conteúdo e nos aspectos mecânicos da recolha de dados. Alguns estudos qualitativos baseiam-se exclusivamente num tipo de dados, transc ções de entrevistas, por exemplo, mas a maior parte usa uma variedade de fontes de dad, Embora discutamos diferentes tipos de dados separadamente, é importante salientar q eles raramente se encontram isolados na pesquisa. Começamos por uma discussão prole gada de um dos dados mais importantes da pesquisa qualitativa - as notas de campo. A 148 149 I I n Notas de campo D epois de voltar de cada observação, entrevist.a, ou qualquer outra sessão de investigação, é típico que o investigador escreva. de preferência num processador de texto ou computador, o que aconteceu. Ele ou ela dão uma descrição das pessoas, objectos, lugares, acontecimentos, actividades e conversas. Em adição e como parte dessas notas, o investigador registará ideias, estratégias, reflexões e palpites, bem como os padrões que emergem. Isto são as notas de campo: o relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê, experiencia e pensa no decurso da recolha e reflectindo sobre os dados de um estudo qualitativo. O resultado bem sucedido de um estudo de observação participante em particular, mas também de outras formas de investigação qualitativa, baseia-se em notas de campo detalhadas, precisas e extensivas. Nos estudos de observação participante todos os dados são considerados notas de campo; este termo refere-se colectivamente a todos os dados recolhidos durante o estudo, incluindo as notas de campo, transcrições de entrevistas, documentos oficiais, estatísticas oficiais, imagens e outros materiais. Usamos aqui o termo no seu sentido mais estrito. Embora os investigadores saibam que as notas de campo são fundamentais para a observação participante, alguns esquecem que podem ser um suplemento importante a outros métodos de recolha de dados. Na condução de entrevistas gravadas, por exemplo, o significado e contexto da entrevista podem ser capturados mais completamente se, como suplemento a cada entrevista, o investigador escrever notas de campo. O gravador não capta a visão, os cheiros, as impressões e os comentários extra, ditos antes e depois da entrevista. As notas de campo podem originar em cada estudo um diário pessoal que ajuda o investigador a acompanhar o desenvolvimento do projecto, a visualizar comI que o plano de investigação foi afectado pelos dados recolhidos, e a tomar-se conscie] de como ele ou ela foram influenciados pelos dados. Na nossa discussão de outras formas de dados (mais à frente neste capítulo), discl remos brevemente os aspectos específicos das notas de campo que são únicos para es técnicas. Aqui concentrar-nos-emos nas notas de campo tomadas em conjunto com l estudo de observação participante. Embora retiremos as notas de campo das observaçê participantes para discussão, muito do que aqui é dito é directamente relevante para notas de campo escritas em conjunto com outras abordagens, tais como a entrevista. A figura 4-1 reproduz um conjunto de notas de campo recolhidas como parte de l estudo dirigido a estudantes com necessidades educativas especiais ou portadores de de ciências de uma escola secundária urbana!. Estas notas foram tiradas após a sexta obs vação feita na escola. Foram ligeiramente rescritas e editadas para os objectivos de livro. Incluímos estas notas para dar um exemplo da riqueza dos dados e para ilustra discussão que se segue. Sugerimos-lhe que leia a figura 4-1 rapidamente antes de cor nuar a leitura, e depois tome como referência essa figura à medida que for lendo. ComI nossa discussão indica, existem muitos estilos de notas de campo. As notas da figura L são apenas o exemplo de uma abordagem. Uma palavra de encorajamento antes de prosseguir. Observando o exemplo de no de campo da figura 4-1, pode pensar que é impossível escrever tanto baseado numa obs vação tão curta - que a sua memória, capacidade de escrita e/ou a sua energia não ~ suficientes para o desafio. Tenha coragem, não desista antes de tentar. Alguns de voe sairão unicamente uma vez e nunca completarão um conjunto de notas; para outros, cc tudo, a disciplina e a capacidade que o tomar notas de campo exercitam será estimulan Alguns pessoas tornam-se dependentes da observação e tomada de notas. A sua capa dade de tomar notas aumentará; a aparentemente impossível natureza da tarefa parecI bastante manejável se se passar por um conjunto de passos. Recomendamos que todas as notas de campo sejam escritas num computador utiliu do um programa comum de processamento de texto. Dessa maneira, podem registardados muito mais facilmente. No capítulo V discutiremos a outra vantagem de utilizaJ computador na análise e classificação dos dados. Existe pelo menos um benefício adicional na elaboração de notas de campo. Pode rr lhorar a qualidade da sua escrita como também aumentar a velocidade. Qualquer escril lhe dirá que a maneira mais eficaz de aprender a escrever é escrevendo frequentemen Raramente as pessoas têm oportunidade de escrever página após página de descriçê completas. Mesmo a quantidade de escrita requerida na maior parte das cadeiras mais e: gentes dos cursos é pequena comparada com aquilo que lhe é pedido aqui. Um aspe( agradável das notas de campo é não requererem tantas exigências como a generaIida dos textos escritos. Espera-se que as notas de campo fluam, que saiam directamente sua cabeça e que representem o seu estilo particular. Adicionalmente, você é encorajadc 150 151 I I escrever na primeira pessoa. Ninguém verá as suas notas à procura de uma fraca construção de frases ou de erros; as notas devem ser simplesmente completas e claras. Em adição, não terá o problema de não ter nada sobre que escrever. O que você verá no campo será a fonte de frases e parágrafos intermináveis. Algumas pessoas libertaram-se do seu medo de escrever e do limite de velocidade de meia página por hora que se impõem ao ser-lhes dada a oportunidade de escrever notas de campo. O CONTEÚDO DAS NOTAS DE CAMPO Como a nossa definição sugere, as notas de campo consistem em dois tipos de materiais. O primeiro é descritivo, em que a preocupação é a de captar uma imagem por palavras do local, pessoas, acções e conversas observadas. O outro é reflexivo - a parte que apreende mais o ponto de vista do observador, as suas ideias e preocupações. Discutiremos estes dois aspectos das notas de campo em separado. A parte descritiva das notas de campo. A parte descritiva das notas de campo. de longe a mais extensa, representa o melhor esforço do investigador para registar objectivamente os detalhes do que ocorreu no campo. O objectivo é captar uma fatia da vida. Consciente (cont. na p. 163) Figura 4-1· EXEMPLO DE NOTAS DE CAMPO 24 de Março, 1980 Jae McCloud Ilh - l2h30m Westwood High 6. o conjunto de notas o QUARTO TEMPO AULA NA SALA DA MARGE Cheguei à Westwood High quando faltavam cinco minutos para as onze, a altura em que Marge me tinha dito que começava o quarto tempo. Estava vestido como habitualmente: camisa desportiva, calças de algodão e uma parka Woolrich. O quarto tempo é o único período durante o dia em que todos os estudantes que estão no programa para os "diminuídos neurológicos / com dificuldades de aprendizagem", mais conhecido como o "programa da Marge", se encontram. Durante os outros tempos, alguns estudantes do programa, dois ou três ou no máximo quatro, vêm à sua sala para ela os ajudar com o trabalho que lhes é destinado nas suas outras classes integradas do ensino secundário. Figura 4-1 (continuação) meu carro. um homem de cerca de quarenta anos e a ficar calvo, vestido com um unifonne dc Exército saiu, do edifício, dirigiu-se ao carro e sentou-se. Quatro rapazes e uma rapariga também saíram da escola. Eram todos brancos. Tinham vestidos velhos fatos de macaco e I-shirts coloridas com casacos de primavera sobre as I-shirts. Um dos rapazes, o mais alto, fez o som "oinc. oinc, oinc". Fez isto quando viu o carro da Polícia. C.o.: Isto foi muito estranho para mim pois não pensava que os miúdos vissem "os polícias como porcos." De algum modo associei isso com outra altura, o princípio dos anos 70. Tenho que me entender com os meus preconceitos acerca da escola secundária devidos à minha experiência. Algumas das vezes penso que Westwood é completamente diferente da minha escola secundária e, no entanto, este incidente com o carro da Polícia lembrou-me a minha escola. Estava-se no intervalo das aulas quando desci os corredores. Como de costume lá estavam c rapaz e a rapariga em pé, aqui ou ali, perto dos caci fos. Vi três casais. Ouvia-se o berro ocasional. Não se viam professores do lado de fora das salas. C.O.: Os corredores pareciam relativamente sem supervisão durante os intervalos. Lembro-me de duas raparigas negras que desciam o corredor juntas. Eram altas e magras e tinham o cabelo arranjado com contas de forma elaborada. Parei na secretaria para dizer à secretária do Sr. Talbot (o director) que me encontrava no edifício. Ela mostrou um sorriso acolhedor. C.O.: Agora sinto-me bastante confortável na escola. Sinto-me como se pertencesse a ela. Quando passo nos corredores alguns professores saúdam-me. Tenho-me desviado dc meu caminho para dizer "olá" a alguns dos miúdos que passam. Por duas vezes já fui olhado de alto a baixo pelos miúdos que iam a passar. Dizer-lhes "como é que estás?' parece desanná-Ios. Entrei na classe da Marge e ela estava de pé na parte da frente da sala com mais pessoas de que as que alguma vez tinha visto na sala. excepto na sua própria aula, que é logo após o segunde tempo. Parecia que estava a falar para a classe ou que se preparava para começar. Estava vestid2 como na altura das minhas outras visitas - limpa, agradável, bem vestida mas de fonna prática. Hoje tinha um blazer às riscas, uma blusa branca e calças escuras. Olhou para mim e disse: "Ah. hoje tenho muito mais pessoas aqui do que da última vez". C.O.: Isto era uma referência às minhas outras visitas, alturas essas em que estão poucos estudantes. Ela parece muito consciente do facto de ter um pequeno grupo de estudante, por que é responsável. Talvez se compare com os professores regulares que têm classes com trinta ou mais alunos. Havia a promessa de um quente dia de Primavera. Uma carrinha da Polícia, do tipo das que têm banco atrás, utilizadas para as grandes rusgas, estava estacionada do enonne parque de estacionamento que existe em frente à escola. Ninguém se encontrava sentado dentro dela e nunca soube da razão para ela ali estar. Na circular em frente da escola estava estacionado um carro do Exército dos Estados Unidos. Tinha insígnias de lado e era de uma cor caqui. Quando me afastava do Estavam duas mulheres com vinte e muitos anos sentadas na sala. Só restava uma cadeira. Marge disse algo do tipo: "Hoje temos duas visitas dos serviços centrais. Uma é uma conselheira vocacional e a outra uma fisioterapeuta", mas não me lembro se essas foram as suas palavras. Senti-me embaraçado por ter chegado tarde. Sentei-me na única cadeira disponível ao lado de uma das mulheres dos serviços centrais. Vestiam saias e traziam as suas agendas, estando muitc mais arranjadas do que as professoras que tinha visto. Estavam sentadas e observavam. 152 153 I I Figura 4-1 (continuação) Figura 4-1 (continuação) Em baixo está a disposição dos lugares na classe de hoje: I secretária~ e perguntou-lhe se conseguia pensar em algo mais. Ele disse: "Sim, podíamos perguntar quant( produtos fazem em cada ano." A Marge disse: "Sim, podíamos perguntar acerca da produção. quanto ao Leroy, tens algumas ideias, Leroy?" Ele disse: "Não." O Sr. Armstrong estava em pé , canto e a dizer ao Phil em voz baixa: "Agora já sabes quais as perguntas a fazer quando pr< curares um emprego?" O Phil disse: "Treino, que tipo de treino é preciso ter?" A Marge diss, "Sim, é verdade, treino." Jason disse alto mas sem gritar: "Qual a escolaridade que é precisa paI arranjar o emprego?" A Marge continuou a fazer a lista. C.O.: A Marge estava bastante animada. Se não a tivesse já visto assim anteriormente pens. ria que ela estava a exibir-se para as pessoas dos serviços centrais. Alfred Fisioterapeuta I Conselheira vocacional Alfred (Sr. Armstrong, o auxiliar da professora) deu uma volta à sala mas quando parou foi ao pé do Phil e do Jeff. Marge circulou junto à sua secretária durante a conversa em que começou por dizer à classe: "Lembrem-se, amanhã haverá uma visita de estudo à Rollway Company. Encontramo-nos no sítio habituaL ao pé do autocarro, em frente da entrada principal, às 8h30m. A Sr.' Sharp quis que eu vos dissesse que a visita à Rollway não é especificamente para vocês. Não é como a visita à G.M. Eles levaram-vos a lugares onde vocês poderiam vir a arranjar trabalho. Neste caso trata-se de uma visita geral, vai toda a gente. Muitos dos empregos que irão ver não são para vocês. Alguns são apenas para pessoas com qualificação em engenharia. É melhor usarem sapatos confortáveis pois irão andar durante duas ou três horas." Maxine e o Mark disseram "ooh" em protesto por terem de andar. Ela fez uma pausa e disse numa voz inquiridora: "OK, alguma questão" Vocês irão todos. (Pausa). Quero que peguem num cartão em branco e que escrevam algumas questões para que possam ter coisas para perguntar na fábrica." Começou a distribuir cartões e nesta altura o Jason, que estava sentado ao meu lado, expressou a sua aversão e disse "temos de fazer isto?". Marge disse: "Eu sei que isto é demasiado fácil para ti. Jason." Isto foi dito de uma forma sarcástica mas não como algo para dim inuir a pessoa. C.O.: Foi como o sarcasmo entre duas pessoas que se conhecem bem. A Marge conhece mui- tos destes miúdos há vários anos. Tenho que explorar as implicações deste facto em relação ao convívio que ela mantém com eles. A Marge continuou: "Bom, escreveram todas estas perguntas? Têm-nas escritas em caJ1õe~ Conseguem fazer pelo menos uma pergunta quando lá estiverem? Não ponham a mesma questi que a pessoa à vossa frente, mas têm todos uma pergunta que possam fazer? Vocês sabem que Srª Sharp gosta que façam perguntas e depois da visita terão de ouvi-Ia se não as fizerem. Esti todos dispensados do quinto tempo de amanhã. Se voltarmos tarde, eu dispenso-os durante o pr meiro tempo de almoço e podem almoçar durante o segundo tempo." Olhei à volta da sala e notei a maneira como alguns dos estudantes estavam vestidos. Maxine tinha uma I-shirt preta com algumas letras. Era uma inscrição muito bem feita e a cam sola parecia cara. Tinha vestido umas calças Levis e ténis Nike. O Mark tem cerca de 1,75m e I,SOm. Tinha um colete de mangas compridas com um aligátor na frente, cheio de estilo, mas. calças estavam enrugadas e calçava ténis de basquetebol pretos e enlameados, com ambos os co dões partidos, um deles em dois sítios. A Pam vestia uma camisola de veludo lilás sobre uma sa às riscas abotoada até baixo. O seu cabelo parecia muito cuidado e dava a ideia que tinha sid arranjado num cabeleireiro caro. O Jeff estava sentado ao seu lado na sua cadeira de rodas. TinI' um pé no ar, sem o sapato, como se tivesse sido deslocado. O Sr. Armstrong (Alfred) tinha urr camisa branca e lustrosa abeI1a à frente em dois botões. Tinha vestidas calças claras, do tipo seI cinto. Phil tinha uma camisola bege sobre uma camisa branca, calças escuras e ténis de basquet' boi curtos. Os ténis eram vermelhos e estavam sujos. Tinha um anel de sujidade à volta do colar nho. Era o menos bem vestido de todo o grupo. O Jae tinha uma velha e normal I-shirl branca jeans. O seu longo cabelo louro estava despenteado. Tem acne na cara e mais de I,S5m. TinIuns ténis de jogging limpos e com aspecto de novos. Era o único rapaz com ténis de jogging. C restantes tinham ténis de basquetebol. O Jim tinha provavelmente 1,75m ou I,SOm. Vestia un~ camisola vermelha. Jason tinha um barrete preto de golfe e um casaco bege de Primavera sobl uma I-shirl da universidade. Vestia calças escuras e uma t-shirl com um decote em V. Esta, desbotada das lavagens. Os olhos de Jason estavam visivelmente vermelhos. C.O.: Dois dos miúdos disseram-me que a Westwood High era um desfile de moda. Tenh A Marge continuou: "OK, quais são algumas das questões que vocês vão põr?", Jason gritou: "Seguro", e a Marge disse: "Estava a perguntar à Maxine e não ao Jason." Isto foi dito de uma forma casual sem qualquer ira em relação ao Jason. A Maxine disse: " As horas - as horas de trabalho e o salário." Outra pessoa gritou: "Benefícios." A Marge escreveu essas coisas no quadro. Foi ao pé do Phil que estava sentado ao pé do Jeff. Penso que passou à frente do Jeff. O Sr. Armstrong estava sentado ao lado do Bill. E disse: "Tens uma pergunta')" O Phil disse: "Não consigo pensar em nenhuma." Ela disse: "Francamente. Phil. Acorda." Depois foi ao pé do Jae, o rapaz branco. O Jae e o Jeff são os únicos rapazes brancos que eu vi frequentando este programa. As duas raparigas são brancas. Ele disse: "Não consigo pensar em nenhuma." Foi ao pé do Jason Marge disse: "OK, agora vamos fazer o teste." E passou uma folha com problemas. Num de lados estava uma conta em branco com algumas instruções sobre o que pôr nos espaços. Tambér estava um talão de depósito e uma folha de balanço de um livro de cheques com muitos númere em baixo. Era suposto que pusessem os números no lugar certo, fizessem o balanço do livro d cheques e passassem um cheque, bem como preenchessem um talão de depósito. Uma grand parte do tempo foi gasta nesta actividade. A Marge disse: "Comecem. Lembrem-se de que isto 154 155 I dificuldade em compreender o que é que está na moda. O Jason usou essa expressã( Parece-me a pessoa mais preocupada com a roupa. I Figura 4·1 Figura 4·1 (continuação) um teste." A Maxine fez-lhe uma pergunta. Ela disse: "Lembrem-se que é um teste. Não vos posso dizer isso." O Jason disse: " Pode ao menos dizer-nos como é que se escreve uma palavra? Como é que se escreve vinte?" A Marge ignorou a pergunta. Foi ao pé do Leroy e disse: "Leroy, é suposto utilizares um lápis e não uma caneta. Se fizeres um erro não podes apagá-lo. Onde é que está o teu lápis?" Ele olhou para o Jason e este devolveu-lhe o lápis. Marge deu ao Jason um lápis da sua secretária. Foi ao outro lado da sala. O Bob estava também a utilizar uma caneta. Ela disse: "Bob, um lápis e não uma caneta." O Jason disse algumas vezes: "Miss Katz, Miss Katz", tentando fazer com que ela fosse ao pé de si e o ajudasse. Conseguiu chamar a atenção do Sr. Armstrong e fez-lhe algumas perguntas acerca de como preencher o talão de depósito. Armstrong disse-lhe: "Se eu responder a essa questão estou a responder ao teste por ti." Debrucei-me para a pessoa que era conselheira vocacional e fiz-lhe perguntas acerca do seu trabalho. Disse que trabalhava para as autoridades da cidade há dois anos mas que também frequentava a Universidade. Perguntei-lhe qual a razão da visita. "Ouvi falar acerca deste programa. Queria explorar se as crianças com D.A. (Dificuldades de Aprendizagem) são elegíveis para aconselhamento. Não tinha visto este grupo por isso quis vir e dar uma olhada, ver que tipo de serviços é que têm e quais os que podem vir a ter." Perguntei-lhe acerca da senhora que vinha com ela e disse-me que era uma fisioterapeuta que tinha vindo para ver se existia algum tipo de serviços que os fisioterapeutas poderiam prestar. Era nova no distrito escolar. C.O.: Sinto que estas pessoas estão deslocadas. A maneira de vestir não é apropriada e são como peixes fora de água. Durante o teste a Marge andava à volta da sala observando o que estavam a fazer. Disse: "Vocês são todos tão espertos. Agora o que precisam é de dinheiro para pôr no banco." Três ou quatro vezes durante o teste ela utilizou a frase "vocês são tão espertos" como forma de elogio. Numa certa altura Marge olhou à volta e disse: "Onde está o Mac? Ah. sim, disse-lhe para não vir sem a sua mãe. Bom, é o que se arranja, ele não está aqui e acho que a mãe não pôde vir." A Marge dirigiu-se para ao pé de nós e falou com a conselheira vocacional. A conselheira vocacional perguntou-lhe: "Porque não integrar estes miúdos com os outros~" A Marge respondeu-lhe. "Ah, eles frequentam as classes integradas com os outros miúdos. Esta é a única classe em que estão juntos." A conselheira perguntou: "E quanto à ginástica e ao Jeff?" A Marge disse: "Eles frequentam as aulas normais de ginástica. O Jeff pode utilizar a piscina. Está construída de maneira a poder ser utilizada por deficientes." A conselheira perguntou: "Alguma das crianças recebe algum tipo de terapia fora das aulas?" A Marge disse: "O Jeff vai à clínica de Paralisia Cerebral (P.c.) uma vez por semana." Quando Marge falava fazia-o num sussurro mas a sua voz ouvia-se, e tenho a certeza que o Jason, que estava sentado ao meu lado, conseguia ouvir tudo o que estava a ser dito. A conselheira vocacional disse: "Estive a observar ali o Bob. Tem uma preensão quase primitiva do lápis." A Marge respondeu: "Ah, todos têm isso. Escrever é um verdadeiro problema, não é só o ler." A Marge disse: "Antes desta classe ser formada a maior parte destes miúdos não eram classificados como D.A., ou, se eram classificados, eram como perturbações emocionais. Não havia realmente lugar para eles. Quer dizer. eles estariam neste ou naquele programa, mas não num de que eles realmente necessitassem." Nesta altura, ela levantou a voz e tenho a certeza que o Jason a podia ouvir dizer: "Perturbações emocionais." C.o.: Ponho-me a imaginar se os estudantes serão tão sensíveis a estas classificações como eu. Sinto-me terrível quando são utilizadas em frente dos estudantes. (continuação) A conselheira vocacional disse:" Existem outras crianças para além daquelas em cadeira de rodas que possam utilizar a terapia~" Marge disse: "Realmente, não sei. Que tipo de coisas é que estão a pensar fazer?" A conselheira vocacional disse: "Oh, consultas, fisioterapia. Não podemos fazer milagres mas há certas coisas que podemos fazer. Lembro-me dos pais de um miúdo com P.c. dizerem que a primeira palavra que a nossa criança disse foi carro. Como é que ela lhe vai dizer que ele não pode ser mecânico~" C.O: Este comentário caiu do céu. Não consegui perceber a que é que estava ligado. Tenho a sensação que a conselheira vocacional estava nervosa. Ela era nova e a Marge estava a ser agradável sem ser calorosa. Numa altura durante a aula, a Marge disse numa voz que interrompeu a classe: "Esqueci-me de distribuir isto à minha classe (a sua classe é constituída por estudantes típicos). Oh. como é que pude ser tão idiota." Estava a segurar uma folha de papel. O Jeff perguntou: "Sobre o que é~" A Marge disse: "Um programa de Verão. É acerca de visitas a faculdades. Visitas a faculdades em que possam estar interessados." Jeff fez um gesto com a mão como se não estivesse interessado. C.O : Esta é a segunda referência que a Marge faz hoje às faculdades. Faz-me pensar o quanto a escola secundária é orientada para a entrada na faculdade. Imagino o que é que os miúdos pensam quando ouvem pronunciar a palavra "faculdade". Marge começou a falar com a conselheira vocacional acerca de alguns dos problemas criados pela maneira como as escolas estavam organizadas. Disse: "O problema são os estúpidos créditos mais os testes que têm de passar para obter um diploma. É-se quase forçado a pô-los a estudar assuntos académicos, quando não é isso de que necessitam. Deveriam ter programas baseados em competências em que se podia avaliá-los em capacidades vitais, e ter qualquer coisa para lhes oferecer no final do programa. Não deviam estar aqui quatro anos a perder o seu tempo." A conselheira vocacional perguntou quais as matérias em que os estudantes estavam inscritos. Marge disse: "Temos um miúdo em biologia. Temos alguém em álgebra." A conselheira vocacional disse: "Uau, isso é qualquer coisa. Alguma vez precisam de coisas como uma máquina de escrever~" C.O.: A conselheira vocacional não acompanhava as preocupações de Marge. Marge, um pouco irritada, disse: "Bom, se tivéssemos uma máquina de escrever podíamos dar-lhe uso. Temos cassetes e tentamos tê-las disponíveis." A conselheira vocacional disse: "Estamos a receber algumas máquinas de escrever no nosso escritório. Não prometo que as possam utilizar mas elas estão a funcionar." Marge disse: "Um dos miúdos entrega os trabalhos passados à máquina. A mãe é que faz a parte da dactilografia. Ele quer ir para a universidade, mas não vejo como, a não ser que leve a mãe com ele." Marge baixou a voz e disse: "Ele não é realista, quer ser guarda florestal". Marge continuou a falar com a conselheira vocacional: "A maior parte dos miúdos estão no C.E.T.A. Bom, o C.E.T.A. não é uma carreira mas pelo menos é um trabalho, algo para eles fazerem. O problema são os diplomas. Só os A.M.E. (Atrasos Mentais Educáveis) podem ter diplomas activos. Os meus miúdos podem fazer os testes de competência mínima como testes orais, mas vão ter que passar todas as partes desse teste, a escrita, a leitura e a matemática. Não quero ser pessimista, mas no próximo ano sei que nenhum dos meus miúdos conseguirá passá-lo." Durante o tempo em que falaram, talvez quinze ou vinte minutos, todos estavam a trabalhar muito, muito arduamente. Na verdade, a mulher quase não disse uma palavra. Depois de abando- 156 157 I I Figura 4-1 (continuação) narem a sala, Marge disse à turma: "Estas duas mulheres pertenciam aos serviços centrais. Uma é conselheira vocacional e a outra é fisioterapeuta. Eu tinha-as apresentado a vocês, mas não sabia o nome de uma das senhoras, e era embaraçoso. O Joe McCloud (apontando para mim) está sentado ali. Vocês sabem que ele nos visita regularmente. Está interessado em classes como esta. Ele pertence à Universidade." Marge disse: "Façam as adições e as subtracções o melhor que souberem. Se tivessem feito isto em casa, teriam a vossa calculadora e seria muito mais fácil." C.O.: A maior parte dos miúdos da classe são pobres. Não imagino que possuam calculadora, mas penso que ela disse isto como forma de encorajamento. O senhor Armstrong chegou-se ao pé do Leroy e disse: "Para que é que tens isto? Isto é um teste." Leroy olhou para ele com um sorriso na cara e disse: "Bom, queria aprender como fazê-lo." Aparentemente, Leroy estava a utilizar um livro que não era suposto utilizar para resolver o seu teste. A conversa ficou por ali. Jason terminou e devolveu o seu teste dizendo: "Tive cem por cento. era fácil." Perguntou se podia ir à casa de banho e saiu enquanto Marge dizia: "Cinco minutos." Um pouco mais tarde ele voltou e tinha o lápis na boca. Marge disse: "O que é que estás a fazer com o meu lápis na tua boca?" Jason disse: "Estou a segurá-lo." Ela disse:" Dá-mo." Ele tirou-o da boca e devolveu-o. Marge disse: "Olha para isto, as marcas dos teus dentes no meu lápis. Bonita maneira de o devolver." C.O.: O tom desta observação era ligeiramente zangado, mas não confrontativo - Marge tem uma relação com Jason em que é muito directa com ele, mas são velhos amigos. Marge recolheu os testes e Jason disse: "Vamos ver quem tem as respostas erradas. Eu sei que não fiz nenhuma errada." À medida que recolhia os testes Marge disse para o Jeff: " Bom, podes terminar o teste durante o sexto tempo e alguns de vocês podem tenniná-lo amanhã." C.O.: Isto deu-me a impressão de que era um teste fingido. e não um verdadeiro teste. Jason disse: "Como é que eles o podem acabar amanhã se partimos às 8h30m de autocarro?" A Marge respondeu: "Algumas das pessoas vêm noutros tempos para além do quarto tempo." A campainha soou e toda a gente começou a sair. Não me lembro de quem estava a empurrar a cadeira de rodas de Jeff ou se ele o estava a fazer sozinho. mas Philip notou que a perna de Jeff estava no ar e perguntou: "O que aconteceu') Descolaste a perna? Queria dizer deslocaste. Marge disse: "Descolaste a perna, muito bem. Philip. Tenta deslocaste." Mark e Laura riram-se. C.O.: Marge fala de uma forma brincalhona devido ao seu tom de voz. Não penso que tenha sido um comentário pejorativo. É mais a brincar. O tom da sua voz não é hostil e os miúdos parecem gostar dela. Ela procede da mesma maneira com os miúdos que não estão no programa. Os miúdos devolvem-lhe as piadas. Todos saíram e o Sr. Armstrong aproximou-se, bem como a Marge. Sentaram-se ao pé de mim e começámos a falar. Perguntei onde estava o Mac. Marge disse: "O Mac é um verdadeiro problema. Simplesmente não aparece. No outro programa em que você esteve também não apareceu. Continuo a tentar falar com o pai mas não consigo. Também não consigo encontrar a mãe. No outro dia telefonei e o Mac estava ao telefone. Ouvi a mãe dele dizer que não podia vir ao telefone porque estava muito cansada. O pai trabalha todo o dia e à noite é pastor. Vivem em Hollow Street." Perguntei: "Que tipo de pastor é que ele é?" Marge disse: "Alfred, talvez tu saibas." Figura 4-1 (continuação) C.O.: O Alfred vive na vizinhança do Mac. O Alfred respondeu: "É uma igreja a tempo inteiro e tudo. É muito pequena." Perguntei: "Porque é que as pessoas dos serviços centrais estavam aqui?" Marge disse: "Bor ela disse que vinha às dez e meia e não apareceu até às llh 45m. Às lOh 30m podia ter falado COI ela. Tinha algum tempo livre. Não queria dizer que não podia assistir à aula, por isso disse para v e para arranjar um lugar. Não sei se ela viu muito. Não sei o que é que ela vai fazer." Perguntei à Marge o que sentia acerca dos serviços centrais e ela disse: "Eles não sabem que E estou aqui. Eles não sabem que eu existo." Eu disse: "A quem se dirige nos serviços centrais'7" E disse: "Bem, na verdade. a ninguém. Joe Carroll é a pessoa. Mas, Bullard é quem dirige a Educ: ção Especial. Deixa-me ver, o Carroll dirige alguns programas especiais, penso que os novos pr< gramas que eles começaram. Realmente não sei o que faz o Bullard. De certeza que ele não ton quaisquer decisões. Eu vou ter com o CarrolL Ele é o supervisor dos programas especiais." Perguntei-lhe se as pessoas vinham à escola e observavam o programa. Ela disse: "Bem, Claire Minor que é uma professora em destacamento especial veio uma vez para ver se estávame bem e de saúde mas nunca mais a vi. Telefonei uma vez ao Carroll porque necessitava de urr coisa e ele veio. mas não continuou a vir. Eles não vêm ver o que eu estou a fazer. Eles não sabe o que eu estou a fazer. Não me importo. Devem pensar que eu estou bem e que consigo lidar co as minhas próprias coisas. mas se estivessem cá professores novos talvez viessem, pois de certe; que teriam de descobrir o que se estava a passar e o que é que eles estavam a fazer. Sinto que: tivesse um problema poderia obter ajuda. mas realmente eles não andam em cima do que eu faç Você há-de ouvir as pessoas. Não se consegue obter uma decisão sobre qualquer coisa." Eu disse: "Pode-me dar alguns exemplos de não conseguir obter decisões?". Ela disse: "BOI no caso do Jeff tenho telefonado para a central para tentar obter um autocarro especial de modo poder ir connosco a Rollway e não consigo encontrar o Mike. Vai acabar por não ir porque ni temos o autocarro." Pedi outros exemplos. Ela disse: "No início do ano, com o auxiliar. O auxiliar que eu tini desistiu e eu telefonei-lhes e informei-os e o Carroll disse-me que não iria conseguir um auxili este ano. Disseram-me que iria partilhar um auxiliar com o professor de recursos que está r outro lado do edifício. Ora, isso é impossível pois ele tem o mesmo problema que eu. Nunca consegue saber quantos miúdos estão na classe dele ou na minha, por isso fiquei louca. Gritei berrei. Finalmente fui ver o Sr. Talbot, o director. Ele também é bom a gritar e a berrar mas tar bém não parecia conseguir chegar a lado algum. Finalmente, mencionei a Associação dos Profe sores. Disse-lhes que ia contactá-los. Eles têm muito medo do sindicato. Antes que desse por is: recebi um telefonema c disseram-me que me iam enviar o Alfred. Isso foi por volta de OutuDr Este é suposto ser um programa-piloto. Como é que eles têm um programa-piloto se não têm u auxiliar para o programa? Sim, telefonaram-me quando mencionei o sindicato e disseram-me qr existia um rapaz novo para trabalhar comigo." Perguntei a Marge acerca de como começou o programa. Disse-lhe que não tinha entendic bem da última vez. Ela disse: "Deixa-me ver, tu conheces o Leroy, estás a ver o Leroy. Ele é tipo com o nível mais baixo de funcionamento da turnla. Tem cinco anos em regime de prova p' causa de furto e também por assalto. Eu tinha o Leroy no início do ano passado. O Lou Wim fez-lhe testes e descobriu que ele tinha uma diminuição neurológica. Ninguém sabia que ele tinI um problema. Ele ia frequentando mas sem conseguir nada. Existe uma professora de ensir Figura 4-1 Figura 4-1 (continuação) especial que não conseguia acreditar como ele tinha percorrido o sistema escolar funcionando ao nível que ele tem agora. Ele foi classificado como tendo uma perturbação emocional. Ele é muito, muito desconfiado. Mesmo se se levanta a voz. ele fica todo excitado. Uma vez na biblioteca mencionei o seu vigilante e ele começou a gritar comigo e a dizer "não digas isso em frente de toda a gente." É como se ninguém soubesse. Toda a gente sabe que ele tem um vigilante. Eles puseram o Leroy a ser avaliado pelo comité distrital. Eles disseram que precisavam de um programa para miúdos como este, falaram com o Lou acerca do assunto e eu ofereci-me como voluntária. Também tinha o Mel na sala de apoio. Eu fui professora de apoio no ano passado. Espero que conheças o Mel antes de terminares o trabalho. Ele não tem vindo." O Alfred disse: "Sim, ele arranjou trabalho numa loja de comidas qualquer." Marge disse: "De qualquer modo, as pessoas começaram a falar sobre a necessidade de um programa. O Lou Brown na Miron Junior High tem uma classe mais homogénea para diminuídos neurológicos e crianças com dificuldades de aprendizagem, e sabíamos que alguns dos miúdos viriam para aqui. Por isso existia uma necessidade e calhou acontecer." Mencionei quão arduamente me parecera que os miúdos tinham trabalhado no teste. Ela disse: "Sim, dá-se-lhes uma tarefa e eles agarram-se a ela. Mas não a fazem toda bem. Como o Leroy, por exemplo, em vez de assinar o seu nome assinou camisola e calças." Mencionei que o Mark me parecia vestido de um modo muito chique e que tinha vestida uma camisa cara. Ela disse: "Não é sempre assim. No outro dia tinha uma camisa que parecia um destroço. Fui à casa dele. É na East Streel. Eles mudaram-se. O Mark nunca esteve numa classe integrada, tem sempre estado na Educação Especial. Em Rosetree estava com o Alfred no programa que ele tem. O Comité dos Diminuídos, que na altura era local, observou-o e encorajaram a mãe a mover um processo porque não existia nenhum programa que fosse ao encontro das suas necessidades. A mãe não teve que fazer muito antes de eles dizerem que iria haver um programa disponível para ele. Quero dizer, não foi como se o comité lhe tivesse dito oficialmente para ela iniciar um processo. Foi mais do género de eles ficarem de fora. A Mary Willow é a pessoa com quem o Alfred costumava trabalhar e ela é realmente boa." Marge começou a falar acerca de Luca Meta que eu ainda não conheci. Disse: "Há um rapaz que não devia estar aqui. O pai dele fez a velha pressão sobre o Bulllard e queria uma classe especial para o filho e ele aqui está. O Luca não necessita de aprendizagens fundamentais. Ele parece retirar algo do programa vocacional, e depois diz que quer ser guarda florestal. Bom, não sei nada acerca disso." Disse à Marge e ao Alfred que tinha estado na peça de teatro da Westwood High School no sábado à noite. Perguntei-lhes acerca dos miúdos que entravam na peça em comparação com os miúdos do programa especial. Fiz perguntas gerais sobre as amizades na escola secundária. Ela disse: "Bom, da maneira como vejo as coisas, existe o muito alto e o muito baixo. Não temos realmente um meio termo. Essa é a minha impressão. Deves ter reparado que só havia uma pessoa negra na peça. Os miúdos negros gostam de vir para aqui porque existem muitos outros negros. Algumas outras escolas não têm tantos. Mas realmente não se misturam como se pode pensar. Na quinta-feira foi o dia dos anos 50. Todas as pessoas deveriam vestir-se como nos anos 50. A peça era do estilo peça dos anos 50. Muito poucos negros apareceram assim vestidos. Eles não andam exclusivamente uns com os outros, mas à hora do almoço. se fores à cafetaria, os brancos estão a comer com os brancos e os negros com os negros. Mas a classe média superior dos negros mistura-se com os brancos. Isso é diferente." 160 I (continuação) Numa certa altura Marge disse-me que se tinha oferecido como treinadora para a equipa e voleibol. Ela disse: "Tenho que me habituar a falar com miúdos num nível diferente. Aqui fa sempre tão devagar e não utilizo palavras complicadas. A equipa de voleibol tem de ser boa. I também jogo e dá-me uma oportunidade de praticar." Continuámos a falar acerca do muito alto e do muito baixo. Marge disse: "Os professor com quem eu falo dizem que nas suas classes há uma mistura daqueles que conseguem fazer trabalho com aqueles que não o conseguem." Perguntei-lhe se eles tinham os miúdos da assistê cia social do interior da cidade e os filhos de profissionais liberais. Ela disse: "Sim, é como est a dizer." Não está muito claro quando isto foi dito, mas lembro-me que numa certa altura ela disse: " etiqueta de D.A. põe-te numa classe melhor." Queria dizer que ter uma classe D.A. proporCiOI miúdos com menos problemas. Não sei o que começou a conversa mas ela começou a falar do background social dos miúd da classe. Ela disse: "A Pam vive perto daqui, logo além, por isso vem de uma família de profi sionais liberais. Com a Maxine é diferente. Ela vive na zona leste. É uma entre seis filhos e o f não é assim tão rico. De facto, está na manutenção, dirigindo as equipas de limpeza. Bom, o J( vive em Dogwood. É da classe média." Perguntei-lhe acerca do Lou. Ela disse: "Pobre Lou, p falar em diminuídos neurológicos, não sei o que fazer com esse tipo. Bom, ele tem uma irmã q acabou a escola secundária há dois anos. Preocupa-me mais do que qualquer um dos outros. N sei o que vai ser dele. Ele é tão lento. Não conheço nenhum trabalho que ele possa fazer. O f veio cá e parece-se exactamente com ele. O que é que se lhe vai dizer" O que é que ele vai pod fazer? O que é que ele vai fazer? Lavar aviões? Falei com o conselheiro vocacional. Disse-r que existiam empregos nos aeroportos a lavar aviões. Quero dizer, como é que ele vai lavar u avião? E que tal a varrer os hangares? Talvez ele possa fazer isso. A mãe é diferente. A m pensa que o Lou é a sua punição. Consegues imaginar esta atitude? Tenho imaginado o que que ela poderá ter feito para pensar que merece o Lou? "Bom, o Luca Meta é totalmente classe alta. O Leroy é o lado baixo do espectro. Não i quantos miúdos têm, mas têm muitos. A mãe tirou um rim recentemente. Toda a gente sabe q ele está em regime de prova. A propósito, quando há algum roubo na escola olham logo para e Ele costumava ir ao ginásio, e de cada vez que ia alguma coisa era roubada. Agora já não o di xam ir ao ginásio. O seu vigilante esteve doente. No próximo ano não estará cá." Nesta altura era cerca de meio-dia e eu mencionei que me ia embora e que queria combir outra altura para voltar. Ela disse: "Podes vir sempre que quiseres. Temos uma visita na quinl -feira." Disse-lhe que provavelmente viria no quarto tempo de quarta-feira. Ela disse algo acer de eles começarem a ler anúncios de apartamentos. Ela disse: "A propósito, estava a falar e talvez me tenhas ouvido acerca do que necessitame um programa baseado em competências. Já terminei um programa baseado em competências alguma vez eles o quiserem aproveitar. É estúpido gastar quatro anos dos miúdos aqui, quan não faz sentido em termos do que eles são. Eles deviam estar a trabalhar. Se eles não vão acat a escola secundária, o que deviam era fazer algumas aprendizagens fundamentais como o q fizemos com o saber passar um cheque. As pessoas lá fora não lhes vão ensinar isso, por is eles podiam fazer isso. Quando tivessem aprendizagens suficientes, aprendizagens básicas, p, se conseguirem manter sozinhos, então deviam poder sair. Isto não tem sentido." A certa altura ela estava a falar da família do Philip. Disse: "Essa é uma bonita família. El( um rapaz muito agradável, um rapaz da classe média." IQE-ll Figura 4-1 (continuação) Numa certa altura durante a minha visita perguntei acerca das Forças Armadas como possível carreira. Ela disse: "Isso é outro problema. A maior parte dos miúdos não conseguem passar o teste para entrar para as Forças Armadas. Houve um programa dos "Sixty Minutes" acerca de como eles deixam os miúdos entrar fazendo batota. Eles não conseguem um diploma. Eles não conseguem entrar para a tropa. Quem me dera que houvesse uma maneira de deixarem estes miúdos fazer batota, porque estes miúdos podiam dar um bom uso a um diploma. Se o Phil não conseguir um diploma vai-se sentir muito, muito mal, mas não consigo vê-lo a obter o diploma. Quanto à Pam, isso vai destruí-la. Se ela não conseguir terminar o secundário vai ser devastador. Ela tem um grupo de amigos que vão conseguir obter os diplomas e pertence à equipa de atletismo. Deixámos a sala. a Alfred e a Marge acompanharam-me ao longo do corredor vazio. Perguntei-lhe como é que o~ miúdos se sentiam por estar nesta classe. Ela disse: " Bem, depende. A Pam preocupa-se muito. E como ela reprovar a História e ter de fazer a disciplina em época especial. A razão porque ela reprovou foi porque não disse que estava neste programa, por isso não obteve ajuda extra e chumbou." Marge acompanhou-me à porta. O Alfred deixou-nos perto da sala dos professores. No caminho para a porta ela disse-me: "Lembras-te do rapaz que falei que vai estar connosco? O filho do dentista, o rapaz do Swenson? Bom, tenho ouvido histórias acerca dele. Descobri que ele é realmente um A.M.E. (Atrasado Mental Educável) e um miúdo hiperactivo. Vai manter-me muito ocupada. Se no próximo ano estiverem vinte no programa vou mesmo necessitar de outro auxiliar." Disse-lhe adeus e andei na direcção do meu carro. caMENTÁRIaS ADICIONAIS Na penúltima noite encontrei uma mulher numa festa, que ensina em Westwood. Ela perguntou-me o que é que eu fazia em Westwood. Eu expliquei. Ela disse-me que nãoinha tido tantos miúdos do programa na sua classe. Disse-me que tinha tido o Luca e que ele era muito bom. Lembro-me de ela dizer algo como: "Ele não consegue ler muito bem mas está intelectualmente ao mesmo nível dos outros miúdos da turma". Disse-me que ele lhe tinha escrito um relatório dactilografado. Disse-me ainda que tinha o Leroy numa turma mas que não o via muito. Eu disse-lhe que havia de marcar um encontro com ela para falar. C.O.: Esta manhã estava a falar com o Hans acerca do ensino integrado. Começámos a falar da Jones Markey School e de como talvez ter um ou mais diminuídos numa turma isso torne a situação mais fácil para os miúdos diminuídos. À medida que falávamos comecei a aperceber-me que talvez muito do que estávamos a ver em termos de hostilidade em relação ao ensino integrado tivesse pouco a ver com os miúdos ou com os estudos integrados. Talvez aquelas escolas que estão em fase de pressão e de transição sejam as que mais são contra o ensino integrado. a ensino integrado não deve ser entendido como uma coisa face à qual as pessoas são contra. Deve-se compreender que em alturas diferentes as escolas enfrentam problemas diferentes. Na Macri Jr. High um dos professores vê a instalação da turma de educação especial como um indicador de que a escola vai fechar. O director pode ver isso como significando que a escola vai continuar. A educação especial pode aliviar ou causar problemas em função da maneira como é percebida. É muito importante. de que qualquer descrição até um certo grau representa escolhas e juízos - decisões ace do que anotar, sobre a utilização exacta de palavras - o investigador qualitativo em edu ção procura ser preciso dentro destes limites. Sabendo que o meio nunca pode ser comI tamente capturado, ele ou ela dedicam-se a transmitir o máximo possível para o paI dentro dos parâmetros dos objectivos de investigação do projecto. Quando dizemos que o investigador tenta ser o mais descritivo possível, queremos di que aquilo que ele ou ela observam deve ser apresentado em detalhe em vez de ser resum ou avaliado. Por exemplo, em vez de dizer, "a criança dava um aspecto de desleixo", por -se escolher algo como "a criança, que tinha 7 ou 8 anos, usava um fato-macaco gasto e s com ambos os joelhos rasgados. O nariz escorria até à boca e a sua cara estava limpa sítio em que tinha passado com os dedos molhados. Em vez de dizer "a classe estava clima de festa", descrever o que estava pendurado das paredes e do tecto, o que estava quadro, que sons e movimentos se podiam observar. Sempre que se possa, é importa citar as pessoas em vez de resumir o que elas dizem. É particularmente importante quando se trabalha com descrições evitar o uso de p: vras abstractas (a não ser, como é evidente, quando se está a citar alguém). Não diga, exemplo, que o professor estava em frente à sua turma a "ensinar". O que é que ele ou estavam realmente a fazer? Seja específico. Se o professor estava a falar faça uma citaç1 descreva-a. Você pode estar interessado em quando e em que condições os professores lizam a palavra ensinar para descrever o seu próprio comportamento, mas deve evitar u zar esse termo. Em geral, substitua palavras como disciplinar, brincar, leccionar, pratú boa pessoa, bom estudante e fazer nada por descrições exactas do que as pessoas est1 fazer e a dizer e de como é que essas pessoas lhe parecem. Você quer entrar no mundo está a observar e as palavras abstractas levam-no a polir esse mundo em vez de o dissec: Pode ser difícil abandonar descrições superficiais ou explicitamente avaliativas. apêndice deste livro providenciámos algumas questões que podem ser úteis para o tn para um nível de inquérito mais profundo. Fornecemo-Ias de modo a sensibilizá-lo I alguns aspectos das escolas que pode estudar, mas não como um conjunto de quest para levar consigo e para as quais procura respostas. Essas questões servem para aumel a curiosidade e para alargar a amplitude da sua visão. Como pode ver pela análise das notas de campo da figura 4-1, os aspectos descriti das notas de campo englobam as seguintes áreas: I. Retratos dos sujeitos. Inclui a sua aparência física, maneira de vestir, maneirism( estilo de falar e de agir. Você deve procurar os aspectos particulares das pessoas qm separem de outras pessoas ou que sejam informativos acerca da sua afiliação. Dado ql conjunto de notas incluído na figura 4-1 é o scxto de um estudo, as descrições das pess não são tão extensas como o seriam num conjunto de notas tomado numa fase inicial estudo. Isto porque as pessoas desta situação já foram descritas anteriormente. Depoi; primeira descrição completa, apenas se anotam as mudanças nas notas de campo sul quentes. 163 .Ig 2. Reconstruções do diálogo. Tanto as conversas que decorrem entre os sujeitos como aquilo que os sujeitos lhe dizem em privado são registadas. As notas conterão paráfrases e sumários das conversas mas, tal como sugerimos anteriormente, deve tentar que as palavras do sujeito apareçam de forma generosa. Cite os seus sujeitos. Deve estar particularmente preocupado em escrever as palavras e as frases que são únicas para a situação ou que têm uma especial utilização. Gestos, pronúncias e expressões faciais também devem ser anotados. Os investigadores inexperientes preocupam-se muitas vezes por não saberem exactamente quando colocar as aspas no diálogo das suas notas de campo. Parte-se do princípio que você não captou exactamente. palavra a palavra, o que os sujeitos disseram. Em vez de indicarem uma transcrição exacta, literal e palavra a palavra, as aspas significam que a conversa é uma aproximação bastante daquilo que foi dito. Se pensa que capturou as palavras de forma precisa ponha aspas nessas palavras. Se não estiver certo do que o sujeito disse, antes da citação indique que não tem a certeza do que foi dito. Use uma frase como, por exemplo, "Jae disse algo para o efeito de" e escreva a sua transcrição. Se está realmente incerto, anote este facto e depois sumarie aquilo que crê lembrar-se. 3. Descrição do espaço físico. Desenhos a lápis do espaço e do arranjo da mobília são úteis nas notas. Descrições verbais de coisas como o quadro, os conteúdos dos quadros de avisos, a mobília e os chãos e paredes também podem ser incluídos. Também deve tentar apreender a sensação do edifício ou local que está a observar. Por exemplo, que imagem é que a escola que você está a estudar projecta em si à medida que se aproxima dela? 4. Relatos de acontecimentos particulares. As notas incluem uma listagem de quem esteve envolvido no acontecimento, de que maneira e qual a natureza da acção. 5. Descrição de actividades. Para esta categoria você incluirá descrições detalhadas do comportamento, tentando reproduzir a sequência tanto dos comportamentos como de actos particulares. 6. O comportamento do observador. Em investigação qualitativa os sujeitos são as pessoas entrevistadas e que se encontram no meio em que decorre a investigação, mas você deve também considerar-se a si próprio como objecto de escrutínio. Porque você é o instrumento da recolha de dados é muito importante que esteja atento ao seu comportamento, suposições e tudo o que possa afectar os dados que são recolhidos e analisados. A maior parte do material que é discutido na secção "A Parte Reflexiva das Notas de Campo" dirige-se a esta preocupação, mas a parte descritiva das notas deve conter materiais acerca do seu modo de vestir, acções e conversas com os sujeitos. Embora você tente minimizar o seu efeito no meio, espere sempre que exista algum impacto. Mantendo um registo cuidadoso do seu comportamento pode ajudar a avaliar as influências indirectas. "Dados férteis" ou "notas de campo férteis" são frases utilizadas pelos investigadores de campo experimentados para se referirem às notas de campo que oferecem boa descrição e diálogos relevantes para o que acontece no meio e qual o seu significado para os participantes. Os dados férteis estão recheados de provas, com as pistas que você come a pôr junto para fazer um juízo analítico daquilo que está a estudar. A Parte Reflexiva das Notas de Campo. Em adição ao material descritivo as notas ( campo contêm frases e parágrafos que reflectem um relato mais pessoal do curso < inquérito. É nesta parte que é registada a parte mais subjectiva da sua jornada. A ênfase na especulação, sentimentos, problemas, ideias, palpites, impressões e preconceito Também se inclui o material em que você faz planos para investigação futura bem con clarificações e correcções dos erros e incompreensões das suas notas de campo. Esperaque você deixe sair tudo: confesse os seus erros, as suas inadequações, os seus preconce tos, os seus gostos e aversões. Especule acerca daquilo que pensa que está a aprende aquilo que vai fazer a seguir, e qual será o resultado do estudo que está a empreender. objectivo da reflexão não é o de fazer terapia. Embora algumas pessoas indiquem que trabalho de campo tem benefícios terapêuticos, o objectivo de toda esta reflexão é melh rar as suas notas. Porque você é tão importante para a colecção e análise dos dados, porque não existem instrumentos, máquinas ou procedimentos cuidadosamente coe ficados, deve estar extremamente consciente acerca da sua relação com o meio e acerl da evolução do plano e análise. De modo a realizar um bom estudo, você deve ser aut -reflexivo e manter um registo preciso dos métodos, procedimentos e das análises que desenvolvem. É difícil encontrar um equilíbrio entre a parte descritiva e a parte reflexi' do material. Alguns investigadores excedem-se no lado reflexivo e escrevem as suas a tobiografias. É importante lembrar que as reflexões são um meio para a realização de u estudo melhor, e não um fim em si próprias. As partes reflexivas das notas de campo são designadas por uma convenção de not ção. O conjunto de notas da figura 4-1 usa parênteses e a notação "CO.", que quer diz comentários do observador. Como pode ver no nosso exemplo, os comentários do obse vador encontram-se espalhados ao longo das notas. No final de um conjunto de notas ( campo, o autor deverá tirar o tempo necessário para contemplar a experiência desse di especular acerca do que ele ou ela estão a teorizar, escrever informações adicionais e pi near a próxima observação. De tempos a tempos, e não como parte de um conjunto parl cular de notas, o investigador escreverá "fragmentos de pensamentos" adicionais acen do progresso da investigação. Estes fragmentos mais longos, adicionados ou colocados r final de um conjunto de notas, são chamados memorandos (Glaser e Strauss, 1967 Deve-se notar que alguns investigadores, particularmente os treinados em algumas tr dições antropológicas de investigação qualitativa, preferem manter as partes descritivas reflexivas das notas completamente separadas (Werner e Schoepfle, 1978a, b, p. 32). Eh têm dois conjuntos de notas, introduzindo as suas reflexões pessoais num diário c campo. Já lhe demos uma ideia acerca do que é que está contido na parte reflexiva das not, de campo, mas categorizamos os materiais para elaboração e clarificação. Os comentári< do observador, memorandos e matérias semelhantes contêm: 164 165 I I 1. Reflexões sobre a análise. Nesta altura especule a cerca daquilo que está a aprender, os temas que estão a emergir, padrões que podem estar presentes, conexões entre pedaços de dados, adição de ideias e de pensamentos que lhe ocorrem. As reflexões longas que focam na análise são referidas como memorandos analiticos (Glaser e Strauss, 1967). A importância e o papel dos seus comentários e memorandos é discutida em mais detalhe no capítulo V. Ilustrações destes tipos de reflexões podem ser encontradas nesse capítulo bem como na figura 4-1. Como observador deve estar preocupado com os seus pressupostos. Contudo, pensa· mos que as suas notas de campo revelarão que os pensamentos e suposições iniciais chocam contra o mundo empírico que você encontra. A investigação qualitativa requer um contacto de longo prazo com pessoas e lugares. As provas que continuamente se acumulam podem destronar as asserções sem base. As reflexões sobre este processo podem ajudá-lo ao mesmo tempo que se constituem como documentos. 2. Reflexões sobre o método. As notas de campo contêm material acerca dos procedimentos e estratégias empregues no estudo e decisões tomadas sobre o plano do estudo. É também o lugar para incluir comentários sobre a sua relação com sujeitos particulares, bem como as alegrias e problemas encontrados no estudo. Problemas específicos que possa ter com um sujeito ou qualquer outro dilema podem ser um tópico de reflexão. Inclua as suas ideias acerca de como lidar com o problema. Avalie o que é que foi realizado e o que ainda falta fazer. As suas reflexões sobre o método podem ajudá-lo a pensar os problemas metodológicos e a tomar decisões acerca deles. Quando tiver terminado a sua experiência de investigação, estas discussões metodológicas permitir-lhe-ão fazer um relato escrito daquilo que fez. 5. Pontos de clarificação. Em adição a toda a pesada ponderação que lhe sugerimos que faça, como observador você também adiciona frases nas notas que são simples comentários ou que destacam ou clarificam algo que pode estar confuso. Você corrige erros de informação que foram registados noutras alturas. Pode anotar, por exemplo, que não sabe como é que isto aconteceu, mas na anterior sessão de observação confundiu os nomes de dois professores. E depois continua a corrigir esse erro. 3. Reflexões sobre conflitos e dilemas éticos. Dado que o trabalho de campo o envolve com a vida dos seus sujeitos, surgem constantemente preocupações relacionais entre os seus valores e responsabilidades para com eles bem como para com a sua profissão. Discutimos alguns dos dilemas éticos no capítulo 1. Os comentários do observador e os memorandos ajudam-no não só a ter um registo destas preocupações, mas também a resolvê-los. Antes de passarmos para outros aspectos das notas de campo, é importante compreender que os investigadores qualitativos não são ingénuos. Eles sabem que nunca podem atingir um nível de compreensão e reflexão que possa resultar em notas puras, isto é. notas que não reflictam a influência do observador. O seu objectivo é propositadamente tomar em conta quem são e como pensam, o que aconteceu no curso do estudo, e de onde é que as suas ideias surgiram. Eles dedicam-se a registar estes aspectos de modo a conseguirem um melhor estudo. Todos os métodos de investigação têm as suas forças e as suas limitações. Alguns dizem que a fraqueza da abordagem qualitativa reside na excessiva confiança no investigador como instrumento. Por outro lado, outros dizem que este é o seu aspecto forte. Em nenhuma outra forma de investigação o processo de fazer o estudo e as pessoas que o fazem são tão conscienciosamente considerados e estudados como parte do projecto. A parte reflexiva das notas de campo é uma forma de tentar dar conta e de controlar o efeito do observador. A parte reflexiva das notas de campo insiste que a investigação, como todo o comportamento humano, é um processo subjectivo. Antes de passarmos do conteúdo das notas de campo para o processo de recolha das notas de campo, gostaríamos de oferecer algumas sugestões em relação ao formato das notas e depois responder a algumas questões que possam ter neste ponto. 4. Reflexões sobre o ponto de vista do observadO/: Embora tentem evitá-lo, os investigadores começam os seus estudos com certos pressupostos acerca dos sujeitos e do meio que estão a estudar. Alguns destes pressupostos relacionam-se com crenças religiosas, ideologias políticas, background cultural, posição na sociedade, experiência nas escolas, raça ou sexo. Esta lista poderia continuar. Como qualquer pessoa, os investigadores qualitativos têm opiniões, crenças, atitudes e preconceitos, e tentam revelá-los reflectindo sobre a sua maneira de pensar expressa nas notas. De interesse especial são os encontros que você tem durante a recolha dos dados que provocam rupturas conducentes a novos meios de pensar e revelações acerca das asserções. Na fase inicial da investigação essas rupturas surgem de forma rápida e intensa. O que você pensava não se verifica quando confrontado com o mundo empírico que está a estudar (Geer, 1964). Os sujeitos com atraso mental não são tão estúpidos como pensava, os adolescentes não são tão loucos como você sabia que eram, você gosta de escolas que pensava que iria odiar, as escolas que pensava que eram extraordinárias perdem todo o seu brilho, e programas que pensava que realizavam certas coisas não o fazem. As primeiras reflexões são usualmente tomadas antes de entrar no campo. Nestas notas, você descreve, de forma mais completa possível, as suposições acerca do que pensa que vai encontrar e expectativas para o resultado do estudo. Quando são apresentadas de início, elas podem ser confrontadas e medidas (comparadas) com o que emerge no decurso do estudo. A primeira página. Enquanto que o formato e o conteúdo exacto podem variar, sugerimos que a primeira página de cada conjunto de notas (por conjunto entendemos as notas escritas para uma sessão de observação específica) contenha um cabeçalho com a seguinte informação: quando é que a observação foi feita (data e hora); quem a fez; onde é que a observação teve lugar; e o número deste conjunto de notas no total do estudo. Como veremos, você deve tentar registar as notas de campo no mesmo dia da observa- 166 167 I. O FORMATO DAS NOTAS DE CAMPO .1.. ".. . Num estudo em que participámos estávamos interessados em como os médicos J dentes e internos aprendiam a falar com os pais, à medida que desenvolviam o seu tn no departamento pediátrico de um hospital universitário. Íamos a longas reuniões I discussão de casos em que apenas um paciente era discutido, mas tomávamos pOI páginas de notas após cada uma das sessões. Não só a discussão era demasiado técl para a conseguirmos seguir na sua dimensão médica, como também o que era importo para nós - o facto de que se fazia muito pouca referência aos pais - poderia ser COI guido sem muitas horas de anotações sobre traqueotomia, síndroma de Turner e ou assuntos semelhantes. Você tomaria provavelmente nota do conteúdo de uma reunião de professore~ escola primária se estivesse a estudar professores. Embora pudesse não estar interes> nas características exactas que diferenciam Houghton Mifflin da Open Court Basal} ding Series, você estará interessado em quem é que dirige a discussão e que informaç: apresentada e de que maneira. Pode achar importante compreender o que é que no ( teúdo destas séries de base contrastantes atrai diferentes professores. Adicionalment conteúdo dos comentários do director para os professores, embora talvez intrinsecam interessante, pode ser importante, pois, assim, você aprende algo acerca do directo] directora e da sua relação com o pessoal da escola. ção mas, se for impossível, a data do registo da observação também deve ser indicada. Também gostamos de dar um título a cada conjunto de notas. O título é uma forma rápida de lembrar a sessão - uma pista acerca do que se trata o conjunto de notas. Os cabeçalhos ajudam-no a manter as notas em ordem e um registo das condições em que as notas foram tiradas, tornando também mais fácil a recuperação da informação. Parágrafos e margens. A maior parte dos métodos de análise de dados qualitativos requer um procedimento chamado codificação. (Veja o capítulo V sobre Análise de Dados.) A codificação e outros aspectos da análise de dados são mais facilmente realizados se as notas de campo consistirem em muitos parágrafos. Quando escrever notas, cada vez que uma mudança ocorrer - no tópico de uma conversa, quando uma nova pessoa entra no local ou qualquer outra coisa - comece um novo parágrafo. Outra maneira de tornar as suas notas úteis para a análise é deixando uma margem no lado esquerdo da página. Esta margem fornece o espaço para anotações e codificação. Alguns métodos de codificação requerem páginas em que as linhas de um dos lados estão numeradas de alto a baixo. Antes de começar a tomar notas de campo deve ler o capítulo V para observar as opções analíticas que podem afectar a forma como toma as suas notas. Pensando sobre estes assuntos, e com um olho nas notas de campo da figura 4-1. você pode estar a pensar: Qual a dimensão de um conjunto típico de notas? Quão detalhadas devem ser as notas? Qual a dimensão total das notas de campo de um estudo? Os variados estilos de trabalho de campo e os diferentes objectivos de estudos específicos afectam as respostas. Se você tiver um foco mais específico, as suas notas podem ser mais curtas e talvez em menor quantidade. Além disso, à medida que se torna mais experiente, tenderá a desenvolver uma análise no próprio campo e a tirar menos notas ao acaso ou de grande dimensão. Normalmente os investigadores tomam notas mais extensas durante as primeiras poucas visitas a um novo local. É durante este período que o foco da investigação é usualmente pouco claro, e por isso o observador ainda não decidiu o que é importante no meio. Como investigador há que lançar a rede de uma forma abrangente, tomando notas copiosas, e passando muito mais horas a escrever do que a observar. À medida que o foco diminui para cobrir temas particulares, ou que você faz observações mais dirigidas para ter uma noção do todo, pode inverter a sua prática anterior e gastar muito mais tempo a observar do que a escrever. O que você observa afecta muitas vezes a quantidade de notas de campo que tira de uma sessão particular. Quando se estuda uma turma universitária, por exemplo, você não tira notas sobre o conteúdo das lições (exactamente aquilo que está a ser dito na aula de anatomia, por exemplo). Em vez disso, anotará as questões que foram postas, os comentários que os estudantes fazem entre si, o formato geral da aula. frases-chave ou palavras que o professor utilizou para descrever os trabalhos a realizar e outros materiais do género. Assim, uma hora de classe pode não dar tantas páginas de notas como uma observação de vinte minutos depois da classe, na sala de convívio dos estudantes. o PROCESSO DE ESCRITA DAS NOTAS DE CAMPO Você esteve na aula do 1.0 ano do ciclo básico perto de uma hora. Muitas coisa estão a passar. Por duas vezes, enquanto as crianças se encontravam a trabalhar, a pro sora foi ter consigo e explicou-lhe quais as suas preocupações acerca do que acontece estas crianças no próximo ano. Ela foi muito explícita em relação a algumas das crian As crianças parecem estar muito menos conscientes da sua presença e você crê qUi observa a brincar tal como o fazem normalmente. Já presenciou muita coisa e sabe deve deixar a sala de modo a ter tempo para registar as suas notas de campo antes suas actividades para a noite. Sente-se tenso por ter de se concentrar tanto para se lem do que observou. A ansiedade cresce à medida que você se interroga se está à altun tarefa laboriosa que tem à sua frente. Despede-se, anda na direcção da porta e vai direito para o seu carro. Preferiria f: outras coisas do que tomar notas. Pensa em parar em casa de um amigo ou em ir a I loja, mas afasta esses pensamentos. Sentado no carro, toma rapidamente notas em fo de tópico daquilo que observou. Inclui frases-chave e tópicos importantes. bem como uma lista da sequência de acontecimentos que ocorreram. Luta com a tentação de ced ideia de que "agora que tenho os tópicos da minha observação, posso fazer as notas campo completas em qualquer altura". Volta para o seu apartamento. Senta-se sozinho numa sala sossegada com o seu CI putador. Resiste à tentação de telefonar a um amigo que está a trabalhar num estudo sei 1 I . . _~~l-_"~.,, .~~."._. 169 , .. 1. ". n.''''.. ·..·,· " .. Ihante para lhe contar o que aconteceu hoje. Fica à frente do computador e, trabalhando a partir dos tópicos, começa a reconstruir com palavras a observação de uma hora que acabou de realizar. Fá-lo de forma cronológica, tentando reviver os acontecimentos e as conversas. Pensamentos acerca de erros ou de oportunidades perdidas interrompem a linha da sua reconstrução. Estas reflexões são escritas como parte dos comentários do observador. Você começou a escrever à uma da tarde e às três horas olha sem saber para onde foi o tempo que passou. Esqueceu-se de comer. Embora tenha sido difícil forçar-se a sentar e a começar, agora é difícil abandonar a sua cadeira. As frases desprendem-se dos seus dedos de uma forma nunca igualada quando está a trabalhar noutras coisas. Perdeu a sua autoconsciência acerca da escrita e as palavras fluem. Arrepende-se de ter combinado um encontro para jantar. Detestaria deixar este trabalho sem o acabar, e no entanto desejaria já ter acabado para se ver livre da carga de ter de terminá-lo. Trabalha duramente e acaba cerca das cinco horas, deixando mesmo o tempo necessário para se aprontar para o encontro. Enquanto toma duche continua a pensar sobre aquilo que aprendeu hoje e como é que se liga a outras coisas. Lembra-se de ter deixado a conversa com o John, o ajudante da professora, de fora das suas notas. Assim que sai do duche volta ao computador e regista a conversa, bem como outras ideias que teve. Levanta-se pela última vez, decidindo que é mais do que suficiente. Mantém o texto com a excepção de uma ou duas notas que rapidamente escreveu no guardanapo durante o jantar. Na manhã seguinte introduz essas notas no conjunto que tinha completado no dia anterior. Embora não saibamos quão típico é este relato da escrita de um conjunto de notas de campo, soa-nos a verdadeiro. Destaca muitas das lutas e práticas envolvidas na conclusão do trabalho. Um problema com que toda a gente se preocupa é a memória. A memória pode ser disciplinada. Mas, mais importante e mais imediatamente útil no aproveitamento da sua capacidade presente, são algumas pistas a empregar quando se escrevem as notas de campo. A pessoa da nossa história ilustra algumas dessas pistas: 6. 7. 8. 9. grama do local e utilizam-no para percorrer a experiência desse dia. Como o nc amigo, algumas pessoas escrevem as notas imediatamente depois de terem deix o campo e mais tarde trabalham a partir dessas notas. Outros escrevem esqueI completos quando se sentam ao computador. Tente seguir o curso da sessão de observação de forma cronológica. Embora ai mas pessoas façam as suas notas por tópicos, o fluir natural de uma cronolc pode ser o melhor esquema organizador. Deixe que as conversas e os acontecimentos fluam da sua mente para opaAlgumas pessoas até repetem as conversas à medida que escrevem. Se, depois de ter terminado uma secção de notas, perceber que se esqueceu de a acrescente. Igualmente, se concluir o seu conjunto de notas e se lembrar de ~ que não foi incluído, acrescente no fim. Não se preocupe em pôr tudo da prim vez. Há sempre tempo para adicionar depois. Compreender a tomada de notas é um processo laborioso e penoso mas, como d um lavrador do Vermont quando falava acerca do Inverno num dia quente: "É sofrimento doce. É como se se pagasse pela Primavera." Analisámos a escrita das notas de campo como se os investigadores as fizessem s' pre no computador. Claro que algumas pessoas usam máquina de escrever, mas també comum para as pessoas com experiência de trabalho de campo ditarem as suas notas I um ditafone ou um gravador. Pode ser uma maneira eficaz de registar notas rapidame mas os observadores esquecem muitas vezes que para que o material possa ser codific e analisado tem de ser transcrito. Se tiver de passar à máquina as suas fitas, o process( registar o material em papel tomará mais tempo do que registá-Ias logo directamentt transcrição de fitas é um trabalho laborioso, o que é uma boa explicação para o alto pI pago às pessoas que fazem este tipo de trabalho. Se dispuser de serviços de secretariado, o método de gravar pode resultar bast, bem. A não ser que o projecto que está a trabalhar seja fortemente financiado, raram' terá esse apoio de secretariado. Mesmo se tiver a sorte de ter o dinheiro para pag alguém para transcrever as notas, é normalmente muito difícil encontrar um dactilóg com experiência e que faça o trabalho da forma que pretende. Os dactilógrafos não tão precisos na transcrição das fitas como a pessoa que tomou as notas. Os investigad. gostam de ler amiúde os conjuntos de notas depois da sessão de observação em que fo tomadas. Muito raramente os dactilógrafos profissionais acompanham o passo do est que está a decorrer. Como pode ver, aconselhamo-lo a que dactilografe ou escreva as suas próprias ne Embora consumidora de tempo, a dactilografia e a escrita das notas tem vantagens. F melhorar a sua escrita, e quando faz as suas notas aprende a conhecer melhor os ~ dados. Quando está a recolher dados no local, saber que tem de escrever as notas de' de deixar o local força-o a concentrar-se enquanto recolhe provas. Reviver a experiê: linha a linha à medida que escreve as notas intensifica ainda mais a concentraçãe I. Vá direito à tarefa. Não adie. Quanto mais tempo passar entre a observação e o registo das notas, pior é a lembrança e menos provável se toma que faça o registo. 2. Não fale acerca da sua observação antes de a registar. Falar acerca da observação torna-a mais difusa. Além disso, introduz confusão pois pode começar a perguntar-se sobre o que pôs no papel e o que disse ao seu colega. 3. Encontre um local sossegado, longe de distracções, e com equipamento adequado para registar e se entregar ao trabalho. 4. Dedique um montante adequado de tempo para completar as suas notas. É necessário prática para julgar adequadamente quanto tempo leva a completar um conjunto de notas. Especialmente para as suas primeiras observações dê pelo menos três vezes mais tempo para escrever do que para observar. 5. Comece por deitar para o papel algumas notas. Esboce um esquema com frases-chave e acontecimentos que se passaram. Algumas pessoas desenham um diaI 170 .1 I 171 ..,..~,L-~~~, ,,~_.,~.l_~ '=,_ ........- ......-, tomar de notas encoraja o observador a rever os acontecimentos: ver e ouvir as coisas pela segunda vez deve aumentar a recordação. O processo também ajuda o observador a interiorizar, a memorizar aquilo que foi observado. O computador preserva os dados, mas a mente do investigador armazena o processo de pensamento utilizado para relembrar os dados. É como se tivéssemos uma fonte extra de dados. As notas de campo da figura 4-1 foram escritas depois de uma sessão de observação formal. Deve ser notado que as notas de campo também são escritas depois de encontros mais casuais. Se for a uma festa, por exemplo, e tiver uma conversa com um professor acerca do que é que a escola significa para ele ou ela, pode ir para casa e escrever notas acerca da conversa. As conversas ao telefone que teve com os sujeitos durante o curso do estudo também devem ir para as notas. Muitas vezes, o primeiro conjunto de notas de campo relata o telefonema inicial que fez para saber acerca da acessibilidade para o estudo. As notas de campo devem ser detalhadas e descritivas, mas não devem assentar nas suposições que o investigador faz acerca do meio. Um estudante apercebeu-se, por exemplo, de que não sabia se a frase que escrevera no primeiro conjunto de notas de campo das suas observações na sala de emergência reflectia uma relação ou a sua suposição. Ele tinha escrito "O marido dela levantou-se". Depois mudou a frase de modo a ler-se "O homem que estava com ela levantou-se". Também aprendeu como capturar o detalhe. Reviu a frase "Eu voltei-me para a rapariga do meu lado direito" de forma a ler-se "A rapariga do meu lado direito estava vestida com uma camisa de flanela castanha ejeans azuis. Estava sentada com as mãos fechadas sobre o colo, a cabeça puxada para trás, os olhos fechados. Eu virei-me para falar com ela". As suas notas reflectiam maior observação e menos inferências. TRANSCRIÇÕES DAS ENTREVISTAS GRAVADAS Alguns investigadores tomam notas de campo extensas depois de uma entrevista para registar as frases dos seus sujeitos. Confiam na sua capacidade de se lembrar e não num gravador. Mas as entrevistas longas são difíceis de captar de forma completa. Quando um estudo envolve entrevistas extensas ou quando a entrevista é a técnica principal do estudo, recomendamos que use um gravador. Chamaremos às entrevistas dactilografadas transcrições. As transcrições são os principais "dados" de muitos estudos de entrevista. No capítulo III entrámos em algum detalhe sobre o processo de conduzir entrevistas gravadas. Aqui apontamos apenas algumas questões técnicas e oferecemos alguns avisos. Algumas das pistas dadas na secção prévia sobre as notas de campo da observação participante aplicam-se às transcrições. O formato das transcrições. Na figura 4-2 incluímos a primeira página de uma entrevista conduzida com uma mulher na idade dos 40 em que ela reflecte sobre os seus anos como professora primária. Esta entrevista foi obtida como parte de um estudo mais alargado que examinava as perspectivas que os professores do sexo feminino do ensino pri- 172 "I mário tinham sobre o seu trabalho'. O formato em que as transcrições são dactilogn varia (ver Ives, 1974; Wood, 1975). A página que mostramos ilustra um formato típil Tal como com as notas de campo, um cabeçalho no princípio de cada entrevista a organizar os seus dados e a recuperar segmentos específicos quando tem necess deles. Aqui, o cabeçalho consiste no nome da pessoa entrevistada, a data em que a I vista ocorreu, o local da entrevista, e qualquer outra informação que possa ajudá-lo ~ brar-se do conteúdo da entrevista. Em estudos em que existem sujeitos múltiplos e eI conduz mais do que uma entrevista com cada um dos sujeitos, é útil marcar os cabeç de forma a indicar qual é a ordem da entrevista que se está a realizar. Tal como nas de campo, os títulos podem ser úteis, especialmente quando se faz entrevistas sobre tória de vida. Escolha títulos que sumariam o material coberto na entrevista, por exe "Início da Vida", "O Primeiro Dia de Escola" ou "O ano com a senhora Brown". Na dactilografia dos manuscritos certifique-se que, cada vez que uma pessoa fala, começa uma nova linha anotando do lado esquerdo quem é a pessoa que fi transcrição deve, em paralelo com a entrevista, ser dominada pelos comentári sujeito. Isto não quer dizer que as suas questões e comentários não estão incluíC necessário ter esse material para pesar os comentários do respondente de forma priada. Quando um sujeito fala por um longo período de tempo, corte o monólo~ parágrafos frequentes para facilitar a codificação. Adicionalmente, deixe espaço na gem do lado esquerdo para a codificação e os comentários. Os gravadores podem criar a ilusão de que a pesquisa se faz sem esforço. Para das curtas notas de campo descrevendo o meio e o sujeito, o entrevistador usualmenl tem de se preocupar com escrever extensamente após a sessão. Por causa disto, o i tigador pode pensar que a máquina faz o trabalho todo. Como já avisámos na noss cussão acerca do registo das notas de campo, acumular fitas de entrevistas sem um ma adequado para as transcrever pode determinar o falhanço do projecto. Anl ganhar alguma prática, é difícil estimar quanto é que demora uma transcrição. É fác xar as sessões de gravação alongarem-se, fornecendo-lhe mais diálogo em fita d aquele que pode possivelmente transcrever. Se você escolher registar e transcrever as entrevistas, uma boa regra a seguir é " curto". É claro que as entrevistas qualitativas são supostas serem abertas e fluidas queremos dizer com isto que deve forçar a entrevista a um formato de resposta curt vez disso, sugerimos que limite o comprimento da entrevista. Arranje um número raí de sujeitos e gaste um conjunto de tempo em cada entrevista que faça sentido em tem trabalho envolvido na sua transcrição. Você não quer que o respondente divague por sos campos, mas que se centre numa área particular. Deve aperceber-se que uma entr de uma hora, quando dactilografada, fica em cerca de vinte a quarenta páginas de dad planear transcrever você próprio as fitas, isto significa centenas de horas do seu trai Se for outra pessoa a dactilografar pode significar uma grande despesa para si. Figura 4-2 • TRANSCRIÇÃO DE UMA ENTREVISTA (EXCERTO) Entrevista com Kate Bridges 9 de Janeiro de 1981 Kate Bridges concordou em deixar-me entrevistá-Ia para o meu projecto. Está de sabático pela Vista City Elementary School durante este semestre e vai partir dentro de pouco tempo para a Califórnia. Convidei-a para almoçar e ela aceitou com entusiasmo. Tem muito a dizer. I: O que sente acerca de ter de falar enquanto comemos? K: Adoraria comer e falar se não se importar. I: Óptimo! Vamos a isso. Há quanto tempo é que ensina? K: Comecei em 1961. Adorei os primeiros vinte anos. Quer dizer, você apanhou-me mesmo num ponto de viragem. I: Óptimo. K: Sentia que o ensino era um chamamento. Quero dizer que não era apenas um trabalho em que eu encalhei, que era bom para conciliar com o ser mãe e com tudo o resto. Estava em pé à janela do meu dormitório no meu terceiro ano e estava a olhar para um belo jardim, e de repente ocorreu-me que devia ser professora. I: Uh-huh. K: Eu sabia. Só sabia. E nunca houve qualquer questão na minha mente. Ainda não existe qualquer questão na minha mente acerca de ser professora. A pergunta para mim é: É possível ser professor nas circunstâncias existentes nas escolas públicas daqui? I: Sim? K: E ser o tipo de professor que se quer ser. I: Sim. K: Quando penso nas alternativas ao ensino, não consigo ver-me noutra carreira. Posso pensar num milhão de coisas que posso fazer e que pensei, como aconselhamento familiar. Tenho amigos que foram para aí e falámos acerca da possibilidade de o fazer em conjunto. Se eu começasse de novo aos vinte anos posso imaginar que isso seria outro campo, e posso imaginar-me a fazer uma data de coisas de que gosto. Mas, para algo que eu queira realmente fazer, venho dar ao ensino, e ao ensino primário. Gosto de ensinar miúdos pequenos. A minha mãe foi professora do 5.° ano durante vinte anos e começou quando eu estava no secundário. Ela reformou-se recentemente e sempre sentiu que não foi suficientemente bom. I: Que o ensino não foi suficientemente bom? K: Que o ensino na escola primária não era suficientemente bom. Ela pensava que devia ensinar no secundário ou na universidade. I: A questão do estatuto. K: Sim. Certo. Exactamente. Ela disse-me recentemente: "Por que é que não continuas para ser uma professora universitária?" Eu não quero ir para o ensino universitário. Nem sequer estou remotamente interessada no ensino universitário. Poderia gostar de supervisionar professores na fase de aprendizagem. Já o fiz no passado. I: Sim. K: Mas o que eu quero realmente fazer é ensinar os miúdos de 9 anos. Temos algumas sugestões acerca do equipamento de gravação (ver Ives, 1974; Wood, 1975). Um bom equipamento de gravação é inestimável. Não tem de ser caro, mas deve ser fácil de operar, em bom estado, e capaz de produzir gravações claras. Dado que mu tos dos gravadores caros são construídos de modo a gravarem música, fazem mais do ql se necessita. A qualidade tonal da fita tem pouco interesse (a não ser que, por exempl esteja a gravar como é que um professor usa música de folclore nas suas aulas), e um gr vador caro construído para a gravação de música raramente é necessário. O gravador deve estar a funcionar bem. Precisa de verificar o seu equipamento antes durante a entrevista. Embora seja incomodativo, a verificação do equipamento pode s' feita de forma casual e vale a pena. Perdemos demasiadas entrevistas por causa do mi funcionamento do equipamento que ocorreu quando julgávamos que o equipamen estava a funcionar. Temos sido particularmente importunados por problemas com grav dores que funcionam com pilhas. A frustração de ter que dactilografar fitas que mal : ouvem é extremamente custosa. Pode prevenir estes e outros problemas certificando-: antecipadamente que o seu equipamento está bem limpo e em boas condições, ou pedinc emprestado ou comprando um novo gravador. Também vale a pena dar atenção à qual dade das fitas que compra. Se planeia fazer a transcrição por si próprio, tente utilizar um transcritor. (Vale a pel comprar um se conseguir juntar o dinheiro.) Um transcritor não faz o trabalho por si fi; reduz consideravelmente o tempo que esse trabalho lhe tomará. Um transcritor é a par de reprodução de um gravador com pedais para controlar a paragem, rebobinagem e iníc de marcha. Alguns modelos têm características especiais que permitem tomar a voz ma lenta ou ajustar o número de linhas que a máquina salta quando se carrega no peda Embora existam adaptadores que permitem que alguns modelos normais de gravador< possam ser utilizados com pedais, não temos tido muito sucesso com eles. Se alguém for fazer a transcrição por si, deve trabalhar de perto com essa pessoa e modo a certificar-se de que o seu trabalho é exacto. Dar conta da pontuação que dá sei tido àquilo que ouviu é especialmente difícil, por isso podem encontrar-se diferenças COI sideráveis quando duas pessoas dactilografam o mesmo manuscrito. É claro que a vers~ mais exacta do que ocorreu está na fita. Se tiver o dinheiro necessário para comprar fit: suficientes, recomendamos-lhe que guarde as fitas de maneira a poder verificar as tran crições acabadas. Dado o imenso tempo e a despesa envolvida na transcrição de entrevistas, as pesso: que trabalham sem fundos para a investigação optam muitas vezes por atalhos. Um dessl atalhos consiste em dactilografar você as transcrições, mas deixando de fora o materi que não diz respeito às suas preocupações. Embora existam riscos envolvidos nes método, vale a pena corrê-los tendo em conta os ganhos. Outra alternativa é transcrevI algumas das primeiras entrevistas de forma mais ou menos completa (quando dizeme "completa" significa que está certo deixar de fora longas discussões sobre receitas c basebol) e depois limitar o que transcreve nas entrevistas posteriores. À medida que estudo se desenvolve, deve possuir uma ideia melhor de qual o seu foco e ser mais sele, tivo de forma sensível àquilo que dactilografa. 175 I DOCUMENTOS PESSOAIS Os textos escritos pelos sujeitos o s dados que discutimos até agora consistem em materiais em que os investigadores têm um papel principal na produção. Eles escrevem as notas de campo e conduzem as entrevistas que se tornam transcrições. Embora não sejam tão utilizados, os materiais que os sujeitos escrevem por si próprios também são usados como dados. Coisas como autobiografias, cartas pessoais, diários, memorandos, minutas de encontros, boletins informativos, documentos sobre políticas, propostas, códigos de ética, declarações de filosofia, livros do ano, comunicados à imprensa, livros de recortes, cartas ao editor, cartas "Dear Abby", artigos de jornal, ficheiros pessoais e registos individuais de estudantes e processos também são incluídos. Na maior parte dos casos, o investigador utiliza o material que já existe. Esse material encontra-se nos ficheiros das organizações, nas gavetas das secretárias dos directores, nos sótãos dos edifícios e nos arquivos das sociedades históricas. A tarefa principal é localizar e ter acesso ao material. A qualidade deste tipo de material varia. Alguns dos materiais fornecem apenas detalhes factuais tais como as datas em que ocorreram reuniões. Outros servem como fontes de férteis descrições de como as pessoas que produziram os materiais pensam acerca do seu mundo. Os dados produzidos pelos sujeitos são utilizados como parte dos estudos em que a tónica principal é a observação participante ou a entrevista, embora às vezes possam ser utilizados em exclusivo. Vamos agora rever os diferentes tipos de dados escritos pelos sujeitos. Na maior parte das tradições de investigação qualitativa, a frase documentos pesso é usada de forma lata para se referir a qualquer narrativa feita na primeira pessoa que d creva as acções, experiências e crenças do indivíduo (Plummer, 1983; Taylor e Bogd 1984). O critério para chamar ao material escrito documentos pessoais é de que é al -revelador da visão que a pessoa tem das suas experiências (Allport, 1942). O object de recolher este tipo de materiais é de "obter provas detalhadas de como as situaç sociais são vistas pelos seus actores e quais os significados que vários factores têm p os participantes" (Angell, 1945, p. 178). Utilizados desta forma, os documentos pesse incluem materiais coligidos através de entrevistas, e assim muitos dos dados que anali mos como sendo transcrições seriam considerados documentos pessoais. No entanto, a só discutimos os materiais que os próprios sujeitos escreveram. Os documentos pessoais que os sujeitos escreveram por si próprios são normalme descobertos em vez de serem solicitados pelo investigador. Em algumas ocasiões investigadores pedem às pessoas que os escrevam ou que outras pessoas os ajudem a I duzir esse tipo de material. Clifford Shaw (1966) pediu a delinquentes juvenis com ql trabalhava para passarem para o papel as suas histórias de vida, que mais tarde utilizol sua investigação. Os professores pedem frequentemente que os alunos escrevam comp' ções acerca de certos aspectos das suas vidas (por exemplo, "A minha família" ou, n comummente, "O que é que fiz durante o Verão"). Embora levante algumas questões cas, os professores podem ser úteis ao dirigirem as crianças para escrever sobre tópi que o investigador está a estudar. Jules Henry relata resultados baseados em respo escritas de 200 crianças que frequentavam a escola à questão: "Do que é que gostas ma do que é que gostas menos acerca do teu pai (e mãe)?". Os professores colaboraram n· investigação fazendo estas questões aos seus estudantes (Henry, 1963). Num estude como a vida escolar e a vida doméstica dos professores interagiam, pediu-se aos profe: res para elaborarem um diário durante um ano para dar ao investigador - e eles fizer -no (Spencer, 1986). Alguns investigadores promoveram concursos em que davam mias ao melhor ensaio sobre um tópico particular (Allport, 1942). Uma vantagem de, citar composições é de que o investigador pode ter alguma interferência em dirigir o f dos autores e por isso, conseguir que um certo número de pessoas escreva sobre mesmo acontecimento ou tópico. Gostaríamos de discutir brevemente alguns tipos de documentos pessoais que não solicitados pelo investigador. Diários Íntimos. Como Allport (1942) declarou "o diário íntimo e espontâneo é documento pessoal por excelência" (p. 95). Estava-se a referir ao produto de uma) soa que mantém uma descrição regular e contínua e um comentário ret1exivo sobn acontecimentos da sua vida. A imagem que Allport tem de um documento íntimo é t jovem rapariga ou mulher a escrever em detalhe sobre vários aspectos da vida adc 176 177 .1 I cente que está a experienciar pela primeira vez. Embora esta caracterização possa ser um estereótipo, é o reflexo de um tipo de diário. Adultos com famílias e empregos podem ter menos tempo para reflectirem nas suas vidas e para registarem esses pensamentos. Qualquer que seja a fonte do diário, os investigadores educacionais não são conhecidos por os empregar na sua investigação. Porque um diário é normalmente escrito debaixo da influência imediata de uma experiência, pode ser particularmente eficaz em capturar o humor das pessoas e os seus pensamentos mais íntimos. Mas, como é claro, os diários não estão sempre disponíveis para serem utilizados. A intimidade que os toma tão valiosos também faz com que não venham parar às mãos de estranhos. Os diários podem vir à superfície no decurso de entrevistas ou de observações participantes. Os sujeitos com quem desenvolveu uma relação podem mencionar espontaneamente que escrevem um diário ou que o fizeram no passado. Pode ser necessário coragem da sua parte para perguntar: "Como é que se sentiria se eu o lesse?". Mas este esforço pode constituir a única maneira deste tipo de documentos lhe ser revelado. Se você vai ver ou não esse diário dependerá da relação com o sujeito bem como do valor pessoal do diário para a pessoa que o escreveu. Existe uma boa oportunidade de que, se o documento foi mencionado por um informador, o sujeito esteja a considerar a ideia de o mostrar, e por isso deve tentar a sua sorte. Embora possa parecer uma sugestão ridícula, uma das formas de localizar diários é através de um anúncio num jornal ou anunciar publicamente de outras formas o seu interesse em ver certos tipos de materiais e quais os usos que tem em mente para eles (Thomas e Znaniecki, 1927).3 Você ficará surpreso como as pessoas estão disponíveis para partilhar os seus pensamentos mais íntimos com pessoas que possam demonstrar serem dignas de confiança, bem como os seus interesses puros em fazer investigação. Os historiadores são investigadores que dependem muito de diários e de documentos pessoais. Eles encontram estes materiais em sociedades históricas locais e vários arquivos, bem como em caixas de recordações que as pessoas guardam nos seus sótãos. Para os investigadores educacionais, os diários de professores que registam em detalhe as primeiras experiências de ensino, problemas com os estudantes, e materiais semelhantes são descobertas importantes. Existem outros materiais semelhantes a diários, mas muito menos íntimos. São registos para um fim especial tais como os que os professores podem guardar. Planos de lição com as notas que as acompanham são interessantes, especialmente se contiverem comentários individuais. Também por vezes os pais escrevem um diário de desenvolvimento e progresso das suas crianças. Alguns fazem mesmo registos semanais acerca do que a criança está a fazer. Este tipo de material pode ser uma importante fonte de compreensão de como os pais percepcionam os seus filhos e quais as suas expectativas acerca deles. Diários de viagem e outros tipos de registos escritos das actividades das pessoas, embora não íntimos e reveladores como um diário, podem dar algumas pistas acerca de como é a vida para as pessoas que está interessado em estudar. Cartas pessoais. As cartas pessoais entre amigos e membros da família dão-nos outr fonte de dados qualitativos muito ricos. Estes materiais podem ser especialmente útei para revelar as relações entre as pessoas que se correspondem. Quando as cartas repre sentam uma tentativa do autor para partilhar os seus problemas ou experiências. poder fornecer revelações acerca das experiências do autor. Muitas pessoas saem de casa par irem para a escola ou viajam para conseguirem lugares em instituições educacionais. A cartas que escrevem para casa a descrever a sua vida e a natureza das suas experiência dão-nos dados muito ricos acerca do sistema educacional. Muito do que foi dito acerca d forma como localizar diários também se aplica às cartas, embora as cartas sejam um forma de comunicação mais comum do que os diários. O aumento da utilização do tele fone para comunicar pode desencorajar a escrita de cartas e por isso este tipo de dadc serem apenas úteis para pessoas com interesses históricos. Embora não possam ser classificadas como pessoais, as cartas escritas aos editores d jornais acerca de assuntos escolares são outra fonte possível de informação para o invest gador qualitativo. Outro tipo de problemas são as cartas mais pessoais escritas a pessm como Ann Landers e Dear Abby. Examinar atentamente esse tipo de materiais pod aumentar a nossa compreensão acerca de, por exemplo, os problemas que os adolescente enfrentam. É claro que se deve ter em mente que as cartas publicadas não são seleccione das ao acaso. Elas representam a escolha da pessoa que escreve a coluna ou do pessoal d colunista. Autobiografias. As autobiografias publicadas fornecem uma fonte prontamente disp( nível de dados para o investigador qualitativo com capacidade de discernimento (DenziJ 1989). Milhares desses documentos são publicados e a maior parte contém discussõ, extensas das experiências educacionais das pessoas. Existem autobiografias escritas p< pessoas que abandonaram a escola, grandes professores, líderes mundiais, adolescente investigadores, médicos, forjadores de cheques, dependentes de drogas e gente comun As autobiografias variam consideravelmente desde o íntimo e pessoal (contendo materia como os que se encontram em diários mais reveladores) ao superficial e trivial. Com todos os documentos pessoais é importante tentar compreender o objectivo ( pessoa que escreveu na produção do documento. Os objectivos do autobiógrafo podei variar muito. Algumas das razões para se dedicar a essa tarefa incluem: 1. Defesa especial de si próprio ou de uma causa. 2. Exibicionismo. 3. Desejo de dar ordem à vida pessoal. 4. Prazer literário. 5. Assegurar uma perspectiva pessoaL 6. Alívio da tensão. 7. Ganhos monetários. 8. Pressões exteriores para escrever a autobiografia. 9. Como ajuda para a terapia. 10. Redenção e reincorporação social. II. Interesse científico. 12. Serviço público e exemplo. 13. Desejo de imortalidade (Allport, 1942, p. 69). A motivação afectará o conteúdo do documento. Uma autobiografia, rica em detalhes, escrita com o objectivo de contar a história da pessoa tal como ele ou ela a experienciaram, é semelhante ao papel que um informador-chave tem para um investigador. Pode ser uma introdução para o mundo que quer estudar. Autobiografias feitas por categorias particulares de pessoas, minorias étnicas, por exemplo, em particular as secções que descrevem a sua escolarização, podem introduzir o investigador interessado neste assunto à variedade de experiências educacionais que o grupo específico encontrou. Os r.omances não devem ser deixados de fora como potenciais fontes de compreensão qualItativa,. embora ponham mais problemas do que as autobiografias porque se torna difícIl discernir as descrições exactas dos retratos imaginários. (Ver Eisner, 1980, sobre a compreensão artística.) Os romances não podem ser tidos como uma representação verdadeira das experiências do autor. Podem, no entanto, fornecer revelações quando não são usados como dados no sentido estrito do termo. DOCUMENTOS OFICIAIS As escolas e outras organizações burocráticas têm a reputação de produzir uma profus.ão. de comunicações escritas e ficheiros. A maior parte das pessoas fala depreCiativamente destes montes de papel e pode olhar-nos de soslaio por chamarmos a estes documentos oficiais "dados". Estamos a falar de coisas como memorandos, minutas ~~ encontros, boleti~s informativos, documentos sobre políticas, propostas, códigos de etica, dosslers, registos dos estudantes, declarações de filosofia, comunicados à imprensa e coisas semelhantes. Estes materiais têm sido encarados por muitos investigadores como extremamente subjectivos, representando os enviesamentos dos seus promotores e, quando escritos para consumo externo, apresentando um retrato brilhante e irrealista de como funciona a organização. Por esta razão, muitos investigadores não os consi~eram importantes, excluindo-os da categoria de "dados". É exactamente por estas propnedades (e outras) que os investigadores qualitativos os vêem de forma favorável. Lembre-se que os investigadores não estão interessados na "verdade" como é convencionalmente con~ebida. Eles não estão à procura do "verdadeiro retrato" de qualquer escola. O seu mteresse na compreensão de como a escola é definida por várias pessoas Impele-os para a literatura oficial. Nesses documentos os investigadores podem ter acesso à "perspectiva oficial", bem como às várias maneiras como o pessoal da escola comunica. Muito do que chamamos documentos oficiais está facilmente disponível para o mvestlgador, embora alguns estejam protegidos por serem privados ou secretos. Discutiremos brevemente alguns tipos de documentos oficiais, o seu uso e problerr especiais que pode encontrar na sua obtenção. Documentos Internos. Existem memorandQs e outras comunicações que circulam d, tro de uma organização, tal como o sistema escolar. Esta informação tende a seguir 1 curso hierárquico, circulando para baixo desde a repartição central até aos professore outro pessoal. A informação flui no sentido oposto, como é evidente, mas rarame' iguala a maré que vem de cima. As minutas das reuniões de departamento e de outros ( contros semelhantes são muitas vezes passadas horizontalmente. Os documentos inten podem revelar informações acerca da cadeia de comando oficial e das regras e regu mentos oficiais. Podem também fornecer pistas acerca do estilo de liderança e revelaçi potenciais acerca de qual o valor dos membros da organização. Embora existam n morandos secretos, a informação secreta não é, em geral, passada sob a forma escrita. um investigador estabeleceu uma boa relação, ele ou ela terão acesso à maior parte, documentos produzidos internamente. Comunicação Externa. As comunicações externas referem-se a materiais produzi, pelo sistema escolar para consumo público: boletins, comunicados à imprensa, anuári as notas enviadas para casa, afirmações públicas da filosofia, materiais utilizados para Dias Abertos à Comunidade. Como sugerimos anteriormente, este material é útil na cc preensão das perspectivas oficiais sobre os programas, da estrutura administrativa e outros aspectos do sistema escolar. Deve-se ter em mente que, cada vez mais, os sisten escolares contratam peritos em relações públicas para produzir esses materiais de mam a que não saiam directamente das canetas das pessoas que estão no comando. Prova\ mente, a maior parte dos administradores escolares revêem e aprovam esses documenl Você pode ser capaz de dar uma melhor utilização aos documentos externos se sou algo acerca de quem os produziu e por que razões, por outras palavras, o seu conte social. Alguns documentos externos são bons indicadores das estratégias do sistema es lar para aumentar o apoio fiscal, enquanto que noutros casos eles representam u expressão directa dos valores daqueles que administram as escolas. Usualmente os documentos externos são fáceis de obter. De facto, são muitas ve produzidos em quantidades tais que excedem largamente a sua procura. Muitas vezes secretarias administrativas mantêm livros de recortes e ficheiros para recolha destes r teriais à medida que são produzidos ao longo dos anos. Os livros de recortes podem c ter a cobertura dos jornais locais acerca dos acontecimentos relacionados com a esc( Peça para ver esses documentos pois podem poupar-lhe tempo. Registos sobre os Estudantes e Ficheiros Pessoais. Em adição aos documentos ofic que já analisámos, as escolas têm ficheiros individuais de cada estudante e, na maior p, dos casos, de cada empregado. Os ficheiros sobre os estudantes são particularmente ( 181 " .,"." " ~'. "'" ,I,., borados e importantes. Incluem relatórios psicológicos, registos de todos os testes registos de frequência das aulas, comentários ocasionais dos professores, informação ac~rca d~s outras escolas frequentadas pelo estudante e perfis da família. Este ficheiro segue a cnança ao longo da sua carreira escolar. Muitas vezes, os investigadores tradicionais utilizam estes registos de casos para conduzir a investigação, mas tomam a posição de que não são muito úteis porque não dão informação precisa acerca da criança. Os investigadores qualitativos concordariam com esta afirmação totalmente. Embora possam ocasionalmente retirar um resultado de um teste ou uma lista de professores de um ficheiro, os investigadores qualitativos na sua maioria não tomam os registos sobre os estudantes por aquilo que eles dizem acerca da criança, mas sim pelo que revelam acerca das pessoas que fazem esses registos (psicólogos, administradores, professores). Nesta perspectiva, a informação que os ficheiros contêm - as cartas, os comentários dos professores, os resultados dos testes - representam ferspectivas sobre a criança. Apresentam um lado da questão. Raramente contêm citações malteradas dos estudantes ou dos seus pais. Justapor os registos de um estudante com as entrevistas com o estudante ou com os pais pode ser revelador. II Fotografia fotografia está intimamente ligada à investigação qualitativa e, como iremos eXj rar aqui, pode ser usada de maneiras muito diversas. As fotografias dão-nos fo dados descritivos, são muitas vezes utilizadas para compreender o subjectivo e frequentemente analisadas indutivamenle. Quase desde o seu advento, a fotografia foi utilizada em conjunção com a investigé em ciências sociais. Um dos primeiros fotógrafos que fez documentários fotográfico: cariz social foi John Thomson, cujo livro Street Life in London, um retrato dos pobre: Londres, foi publicado em 1877 (Thomson e Smith, 1877). Uma década mais tarde, 11< dade de Nova Iorque, o trabalho fotográfico de Jacob Riis sobre os imigrantes inc retratos dos interiores de escolas delapidadas. Ele educou as pessoas acerca das condi\ urbanas (Riis, 1890). Lewis Hine, um sociólogo, foi um dos primeiros cientistas sacie utilizar uma câmara fotográfica para mostrar ao povo americano a pobreza no seu pró país. Os seus fotodocumentários do trabalho infantil foram muito influentes na introdl das primeiras leis e legislação sobre trabalho infantil dirigidas à educação compulsiva. afirmou: "Se eu pudesse contar a história por palavras não teria tido necessidade de aI tar uma câmara fotográfica." (StoU, 1973). Embora as ciências sociais e a fotografia tenham estado ligadas desde há longo ten só recentemente as fotografias capturaram a atenção de um número significativo de in tigadores (Becker, 1986b; Wagner, 1979). Este interesse pela fotografia tem sido ( troverso. Alguns defendem que a fotografia é quase inútil como um meio de conhecin to objectivo porque distorce aquilo que diz iluminar (Sontag, 1977; Tagg. 1988). Ou contrapõem com a noção de que representa um significativo avanço na pesquisa, dado A 183 I permite que os investigadores compreendam e estudem aspectos da vida que não podem ser investigados através de outras abordagens; fazem eco da sugestão de Hine de que as imagens dizem mais do que as palavras. Embora uns quantos sejam partidários destas posições extremas, a maior parte dos cientistas sociais não aceita ou rejeita de imediato a fotografia e perguntam: "Qual o valor que tem para mim e como é que posso utilizá-Ia no meu trabalho?". Fazem estas questões em relação a problemas específicos de investigação e com fotografias particulares em mente. As fotografias que podem ser utilizadas em investigação educacional qualitativa podem ser separadas em duas categorias: as que foram feitas por outras pessoas e aquelas em que o investigador produziu. FOTOGRAFIAS ENCONTRADAS As fotografias que caem dentro desta categoria estão disponíveis porque foram tiradas por outras pessoas (Dowdell e Golden, 1989). Muitas escolas e agências de serviços possuem colecções extensas de fotografias, muitas vezes datadas do lançamento da primeira pedra. Tanto os anuários como as fotografias das diversas classes e fotos amadoras tiradas em acontecimentos anuais estão disponíveis para os investigadores. Frequentemente os estudantes têm as suas colecções de fotografias, algumas das quais transportam consigo em bolsas ou carteiras. Os jornais também têm arquivos de fotografias, embora o acesso a este material seja muitas vezes limitado. Os departamentos de planeamento municipais têm fotografias aéreas de todos os terrenos debaixo da sua jurisdição. Por outras palavras, somos uma sociedade fotográfica. As máquinas fotográficas são comuns e produzem milhões e milhões de imagens em cada ano. Muitas vezes, depois de tiradas, as fotografias são classificadas ou colocadas em algum arquivo ou colecção. Um investigador tem de perguntar acerca desse tipo de recursos pessoais tais como álbuns de fotografias e desdobráveis publicitários, bem como os que são usados de forma mais técnica. As fotografias que aparecem num meio que se está a estudar podem dar uma boa percepção dos indivíduos que já não estão presentes, ou de como certos acontecimentos particulares desse meio eram. Tal como sugerido, frequentemente as escolas têm colecções de fotografias, anuários e, algumas vezes, álbuns que oferecem a sua própria história visual. As fotografias que o pessoal possa ter tirado de antigos alunos ou de outros membros do pessoal fornecem uma percepção de como eram essas pessoas embora nunca as tenha encontrado. Não sendo um substituto para a presença, as fotografias podem oferecer-nos uma visão histórica do meio e dos seus participantes. Para além disso, essas fotografias podem ser incorporadas em relatórios de investigação de forma a comunicar essa perspectiva. Embora as fotografias dêem uma percepção geral do meio, também podem oferecer-nos informação factual específica que pode ser usada em conjunção com outras fontes. Por exemplo, as fotografias tiradas em festas para comemorar a reforma podem mostrar quem foi à festa e indicar algo acerca do arranjo dos lugares, sugerindo possivelmente a estrutura informal. As fotos aéreas de uma comunidade que se está a estudar podem sugerir relações entre a distribuição da população, localização geográfica e sistema educacional. Embora as fotos forneçam informação factual, é importante compreender que as fotografias que os investigadores encontram ou que lhes são dadas foram tiradas com um objectivo ou de um ponto de vista particular. Para as podermos utilizar de uma forma que vá para além da superficial, temos de saber o objectivo e qual a perspectiva do fotógrafo (Fancher, 1987). Desta forma, uma fotografia é como todas as outras formas de dados qualitativos. Para utilizá-Ia temos de a colocar no seu contexto próprio e compreender o que ela é capaz de nos dizer antes de extrairmos informação e compreensão (Fox e Lawrence, 1988). As fotografias podem representar a visão do que o fotógrafo considera importante, as ordens que foram dadas a ela ou ele por um superior ou as exigências das pessoas retratadas. Embora alguns possam dizer que isto os coloca no reino do subjectivo e que pode ser detractor do seu valor "factual", dá-nos uma outra utilização das fotografias, uma utilização muito mais alinhada com a perspectiva qualitativa; isto é, quando estudamos fotografias retiramos pistas acerca do que as pessoas valorizam e quais as imagens que preferem. 184 185 I Miss Blanche Lamont na sua escola em Hecla, Montana, Outubro de 1893 ... "''''h .. ,. . . ,. ",. ".,. . ,. .~"." "'.t~".;r· ·'-.~· :'N.!C.',,. , ) ,.. Escola oficial, Valdez, Outubro de 1902 Embora as fotos possam não provar nada de fonna conclusiva, quando usadas em conjunção com outros dados podem adicionar-se a uma pilha crescente de provas (Bogdan, 1988). As fotografias também servem para outra função. Elas podem apresentar anomalias, imagens que não se encaixam nos construtos teóricos que o investigador está a fonnar. Quando as imagens fotográficas não são compatíveis com a análise em desenvolvimento, elas podem levar a análise e as revelações muito para além do que teria sido conseguido. Num estudo recente que fizemos com fotografias tiradas nos anos 20 numa escola estadual para crianças deficientes mentais notámos como todas as fotografias apresentavam os estudantes como jovens limpos e bem-educados da classe média. Esta imagem oferecia um contraste dramático com o que os profissionais diziam durante este período acerca das pessoas com atrasos. Era a altura em que o movimento eugénico atingiu o seu pico e em que os profissionais concordavam que as pessoas com atrasos mentais representavam as pessoas malévolas da sociedade - um terrivel perigo para o bem-estar de toda a gente. A nossa tentativa de pensar esta contradição entre as palavras escritas e as imagens facilitou uma discussão multidimensional destes aspectos. Os investigadores também usam as fotografias para investigar acerca de como as pessoas definem o seu mundo; podem revelar aquilo que as pessoas têm como adquirido, o que elas assumem que é inquestionável. Por exemplo, as escolas e as agências de serviços tiram muitas vezes fotografias para divulgar à imprensa em conjunção com os acon- Antiga escola para rapazes, 1905. Será que esta fotografia captura uma típica cena de sala de aula de uma antiga escola para rapazes ou será uma posse enganadora? A interpretação das fotografias é complexa. tecimentos que patrocinam. Também fotografam estudantes e clientes para inclusão nos registos oficiais da agência. O estudo pode eliciar as suposições organizacionais acerca dos estudantes e clientes revelados nas fotografias: o que é que os clientes vestem quando são fotografados? Em que posições é que se colocam em pose? Por exemplo, quando exa- 187 .1 maticamente fotografias cada dez minutos numa janela de um edifício em frente à praç A câmara foi dirigida de forma a incluir toda a área de cada vez que o obturador abria fechava. Este tipo de técnica pode facilmente ser empregue em conjunção com outros m. todos para estudar a utilização de recreios, pátios ou vários espaços interiores. A utilização mais comum da câmara fotográfica é talvez em conjunção com a obse vação participante. Nesta qualidade é a maior parte das vezes utilizada como um meio c lembrar e estudar detalhes que poderiam ser descurados se uma imagem fotográfica nã estivesse disponível para os reflectir. As fotografias tiradas pelos investigadores no camç fornecem-nos imagens para uma inspecção intensa posterior que procura pistas sobre rel; ções e actividades. Insígnias e "pins" que indicam filiações organizacionais, a aparênc das pessoas que participaram em acontecimentos especiais, a disposição de lugares sent: dos, a disposição de escritórios e os conteúdos das prateleiras podem ser estudados utilizados como dados quando se emprega uma câmara fotográfica como parte da técnie de colecção de dados. Fotografar completamente uma sala de aula pode facilitar a cOI dução de um inventário cultural. Há que dizer uma palavra sobre a utilização da câmara e o seu efeito na relaçã' Existe alguma controvérsia acerca do efeito de uma câmara nas mãos do investigadc No nosso próprio trabalho temos sido relutantes na utilização de câmara porque penso mos que são prejudiciais para o trabalho de campo. A nossa impressão é que, sobretuc nas fases iniciais de uma investigação, a câmara enfatiza o papel do investigador corr um membro exterior ou dá a impressão que ele ou ela são espiões. Pode ainda imiscui -se na relação sujeito-investigador de outra forma. Os fotógrafos podem distanciar-se de outros substituindo a conversa e a interacção que permitem ao investigador desenvolvI a empatia com um sujeito por uma tomada de fotografias. O investigador deve-se pr< venir contra isto. A nossa regra tem sido evitar tirar fotografias no início da investigaçã, antes dos sujeitos terem tido a oportunidade de nos conhecer e confiar em nós. E alguns casos nunca é a altura apropriada para tirar fotografias, pois isso é simplesmen ofensivo para os sujeitos. Uma boa regra tem sido a que encontra paralelo no nosso COI selho acerca do questionamento: fotografe primeiro aquilo em que as pessoas do me têm mais orgulho (Collier, 1967). Outros não partilham a nossa precaução acerca da tomada de fotografias. Por exempl, Collier (1967) discute a câmara como um excelente meio de estabelecer relação. E refere-se a ela como o "abre-latas" ou a "chave dourada" dos antropólogos, encorajando sua utilização no primeiro dia. A sua posição é a de que a câmara pode fornecer ao inve tigador um objectivo legítimo e uma ocupação no local. Depois das fotografias sere· tiradas e reveladas, fornecem uma razão para juntar as pessoas para uma discussão, o ql produz bons dados - dados sobre as reacções das pessoas às fotografias. Os seus comeI tários são especialmente dirigidos para a sua utilização em culturas muito diferentes da c investigador. Não pensamos que tirar fotografias no primeiro dia seja apropriado na mail parte das situações em que os investigadores educacionais se encontram, mas você de\ minámos fotografias tiradas para campanhas de recolha de fundos por uma escola cujos estudantes são definidos como deficientes mentais verificámos que os estudantes são retratados a desempenhar o papel de crianças, palhaços ou desamparadas. Se tivesse contratado um avaliador exterior para melhorar a qualidade dos serviços apontando estas imagens específicas poderia ser uma estratégia para encorajar a mudança. Tocámos apenas a superfície dos usos possíveis das fotografias disponíveis. Para as localizar e usar é necessário imaginação e cuidado (Dowdell e Golden, 1989). FOTOGRAFIAS PRODUZIDAS PELO INVESTIGADOR Nas mãos de um investigador educacional uma máquina fotográfica pode produzir fotografias para utilização em algumas das maneiras que já foram discutidas. Elas podem simplificar o recolher da informação factual. Por exemplo, os investigadores podem tirar fotografias aéreas para melhor entenderem a distribuição da população e a sua relação com a localização da escola. A um cientista social que conhecemos foi pedido que ajudasse os planeadores da cidade a desenvolver planos para redesenhar uma praça pública da baixa da cidade. Para ter a percepção de como as pessoas utilizam o espaço em dadas alturas durante o dia, colocou-se uma câmara fotográfica com um aparelho que tirava auto- Aprendizagem de ofícios numa instituição para deficientes, 1920 188 __~'_~~_'_""_"~ ~ "_'''_., ._I'''e>.''_._~ __'_~_''''''''''''''''''''''--'''''''''''''~_."" _'_._',-" _.,'_', , ,"'e>' - . . . . . "".-;"'''f.;~_; ;'"~' .<J':""'''_!,,"_ -c. '-',,"-"~"'- ...•. . _.... . estar aberto ao seu potencial para estabelecer relações. Ela pode, por exemplo, ser uma ferramenta útil para estabelecer relação com uma criança. No decurso do trabalho de campo, deve pesar os prós e os contras de tirar fotografias, tomando decisões de como e quando o fazer. Em certas ocasiões, por exemplo, quando outros estão a utilizar câmaras, pode ser perfeitamente seguro fotografar. Noutras ocasiões, se tiver dúvidas acerca de ser ou não apropriado tirar fotografias, peça a opinião a um informador de confiança. Teremos mais para dizer acerca da utilização das câmaras e da relação no próximo capítulo. Outra forma de utilização da câmara como ferramenta de investigação é quando o investigador dá a câmara aos sujeitos pedindo-lhes que tirem fotografias. Embora não tenhamos utilizado esta técnica, aqueles que o fizeram sugerem que pode ser uma forma de se aperceberem de como os sujeitos vêem o seu mundo. Num projecto, prenderam-se câmaras a uma cadeira de rodas num complexo de apartamentos projectados para indivíduos deficientes. Estas fotografias tiradas à medida que a pessoa se movia pelo complexo foram utilizadas para sensibilizar os arquitectos acerca de como as suas realizações eram sentidas por aqueles que as utilizavam. As fotografias tiradas por investigadores ou escolhidas por eles e mostradas a sujeitos podem ser usadas como um estímulo para a colecção de dados (Schwartz, 1989). Num estudo no qual o investigador estava a tentar perceber como é que os estudantes típicos (crianças sem deficiências) pensavam acerca das crianças com deficiências profundas que tinham sido incluídas nas suas classes, as crianças foram entrevistadas e pediu-se que falassem dos outros estudantes das suas classes (Barnes, 1978). Em vez de nomear as crianças ou de as descrever, o investigador mostrou diapositivos às crianças e pediu-lhes para descrever e falar sobre as crianças que eram mostradas. Noutro estudo, em que vários geógrafos estavam a tentar compreender como é que diversas pessoas pensavam acerca de certos tipos de meios, projectaram-se num ecrã fotografias de áreas de floresta selvagem. Grupos de habitantes urbanos, incluindo estudantes do ensino básico do centro da cidade, foram convidados a discutir essas fotografias. FOTOGRAFIAS COMO ANÁLISE Até aqui discutimos as fotografias como dados ou como estímulos para a produção de dados. Nos debates correntes que dizem respeito ao papel da fotografia na investigação em ciências sociais, estas utilizações são as menos controversas. O assunto de grande controvérsia é o da utilização analítica das fotografias; isto é, quando o investigador afirma que a imagem basta por si só como uma afirmação abstracta ou como uma representação objectiva de um meio ou de um assunto (Goffman, 1979; Trachtenberg, 1979). Têm-se posto muitas questões sobre esta preocupação: será que as fotografias tiradas por um investigador, ou qualquer outra pessoa, podem captar a vida interior de, por exemplo, uma escola? Será que podem captar uma essência que foge a outras abordagens~ Será que as 190 ."_~.__ _._. _." _ _.I" _ ._ . fotografias que as pessoas tiram tendem a dar uma perspectiva sentimental daquilo que é suposto mostrar ou será que distorcem por se concentrarem nos aspectos rigorosos e nas cicatrizes infligidas pela vida? Será que imortalizam aquilo que é apenas um momento num fluxo contínuo de acontecimentos? Será a câmara como uma máquina de escrever (Becker, 1978) que não tem nada a dizer de si própria? Será apenas um instrumento, dependente da perícia e da capacidade de revelação pessoal da pessoa que a segura? Ou existirá algo na relação entre a pessoa que fotografa, a câmara e a compreensão que é transcendente? Estas são as questões que os investigadores qualitativos interessados em fotografia têm de enfrentar. Na procura dos investigadores educacionais pela compreensão, as fotografias não são respostas, mas ferramentas para chegar às respostas. A invenção da máquina fotográfica e o seu uso alargado mudaram a maneira como vemos e experienciamos o mundo. Embora tenhamos discutido as utilizações da fotografia em investigação educacional, é também importante ver a fotografia e o mundo das pessoas que tiram fotografias como um importante campo de estudo por si só. Temos de compreender como a sociedade afecta e é afectada pela iniciativa fotográfica. Só quando fizermos isto de forma mais completa do que até aqui poderemos explorar de forma aprofundada o valor analítico das fotografias. A fotografia pode ser uma ferramenta do investigador educacional, mas deve ser entendida como um produto cultural e como uma produtora de cultura. TÉCNICA E EQUIPAMENTO' Precisa de ser um bom fotógrafo para utilizar a fotografia em investigação qualitativa? Sim e não. A fortuna de George Eastman foi feita por cumprir a promessa de que "você carrega no botão, nós fazemos o resto". Em investigação não é tão simples, mas sob certas condições pode ser muito aproximado. A primeira questão a ser respondida é a seguinte: "O que devem mostrar as fotografias?". Se o objectivo é ter fotografias de "inventário" do meio a investigar é necessária muito pouca perícia (embora possa ser necessário equipamento sofisticado - a ser discutido mais tarde). Se é necessário captar os acontecimentos subtis do comportamento interpessoal torna-se importante bastante disciplina e prática para aprender a capturá-los com a câmara. A chave está em saber especificar antecipadamente qual será o conteúdo da fotografia desejada. Algo que pode ser claramente especificado pode também ser fotografado por qualquer pessoa. Por isso, o truque é saber do que se está à procura, especialmente nas fases exploratórias da investigação, de modo a reconhecer o que procuramos quando aparece. A perícia fotográfica especial que é requerida quando se trabalha com dados mais complexos do que um inventário é a capacidade de julgar como é que uma cena aparecerá quando convertida num rectângulo pequeno e liso. Esta capacidade é particularmente importante quando se trabalha com meios a preto e branco. Existe uma abundância de ins- tantâneos de amadores para demonstrar como uma tradução de um mundo real para um mundo liso de oito-por-doze pode correr mal. As mais óbvias incluem o corte de cabeças, falta de pessoas, sol a bater nas lentes causando um escurecimento do primeiro plano, ou pessoas pequenas num mundo de pormenores indesejados. É possível ultrapassar estes erros sabendo simplesmente o que deve estar na figura e certificando-se disso através do visor - e que pouco mais está presente. A um nível mais complexo, também terá de desenvolver um sentido daquilo que "aparecerá" na fotografia. O olho consegue isolar detalhes que uma fotografia não faz. Coisas como subtilezas de cor, textura ou brilho podem não aparecer ou podem ficar exageradas. Os pequenos detalhes podem não ter uma boa resolução e ficarem indecifráveis. Se constituírem dados importantes devem ser fotografados de perto. Um projecto de investigação não deve ser a sua primeira experiência a tirar fotografias. Nenhuma destas perícias é difícil de aprender, mas têm de ser aprendidas. Será provavelmente suficiente, e valerá bem o tempo, arranjar um conjunto de exercícios que se aproximam do tipo de fotografias que pretende no estudo. Especifique qual o conteúdo da fotografia e depois procure uma situação em que tentará fotografá-la. Mas não se fique pelas boas fotografias - exija de si próprio a obtenção das fotografias que se propôs fazer. Você não pode confiar em boas fotografias acidentais para fazer uma boa investigação. Com o tempo tomará o jeito. Que tipo de equipamento é necessário? Infelizmente o conselho é igual ao que demos para os gravadores - bom equipamento. Dado que a investigação séria é normalmente realizada com pelo menos uma ideia de publicação eventual, os dados fotográficos devem ser tão bons quanto possível. Dado que a qualidade da imagem se deteriora com a reprodução, começar com maus negativos pode ser desastroso. Assim, as câmaras miniaturas de bolso devem ser excluídas. O seu filme é tão pequeno que a máxima ampliação que se consegue é de 8xl2 e os pequenos detalhes não se conseguem salvar. O mais pequeno formato aceitável é a câmara de 35 mm. As câmaras maiores devem ser excluídas dado o seu custo - tanto da câmara como do filme. Se as exigências postas à câmara não forem demasiadas, qualquer boa câmara de 35 mm será suficiente. Contudo, acontece muitas vezes que se desejam fotografias aproximadas ou fotografias de grande angular de espaços que não se conseguem encaixar numa lente normal. Por isso, se possível, a câmara deve ser do tipo reflexo de lente única, com objectivas intermutáveis. Uma lente de grande angular com um comprimento focal de 24 a 28 mm serve para os objectivos de realização de "inventários". Uma lente "de retrato" (cerca de 100 mm de comprimento focal) permitirá ao fotógrafo enquadrar apenas uma cabeça sem trabalhar desconcertantemente perto do sujeito. As lentes standard (50 mm) servirão para grupos alargados ou para mostrar uma perspectiva mais ampla. Uma solução económica poderá ser uma lente de zoam que varie entre a grande angular e o retrato (e.g., 23-85 mm ou 35-100 mm), permitindo ao fotógrafo mudar o enquadramento sem mudar (ou transportar) lentes extras. A câmara deverá ter um controlo de exposição automático. 192 _I. Excepto se a publicação for excluída do estudo, a fotografia deve ser a preto e brancc Os custos de produção são tão elevados para a cor que quase nunca é utilizada em revista ou livros profissionais. 5 Para espaços interiores, um filme rápido a preto e branco - Koda Tri-X, Ilford HP-5 ou semelhantes - é a escolha melhor e necessária. Estes filmes sã adequados para a maior parte dos meios iluminados artificialmente e tomam desnecess2 ria a utilização do flash - com certeza uma vantagem, pois é muito difícil não se intrusivo quando se produz um relâmpago em, quase, cada segundo. É claro que o equipamento fotográfico é muito caro e estas sugestões podem parece proibitivas. Contudo, apesar da despesa, este equipamento parece estar disponível e pod talvez ser pedido emprestado. Para além disso, também se pode alugar, mais comurr mente, em lojas afiliadas com as universidades. O impedimento final à realização de investigação qualitativa com fotografia tem a ve com a "autorização". Para publicar é imperativo que cada indivíduo reconhecível el cada fotografia assine um documento que dê permissão para publicar a sua fotografia. ( pais ou tutores devem assinar pelos menores. Deve iniciar-se o processo de obtenção de: sas autorizações assim que o projecto se desenvolver, dado que é um processo que ln muito mais tempo e é mais difícil do que seria de supor. Ao projectar um estudo e a obter acesso a um local, terá tido permissão para visitar e fotografar, o que não quer diz! que tenha obtido as autorizações para publicação. Assim, a não ser que as autorizaçõe tenham sido obtidas, você pode acabar com um monte de dados fotográficos que não poe utilizar. Uma nota final sobre os estudos fotográficos deve acautelar os não iniciados acen dos riscos destas tentativas. É geralmente mais difícil conseguir o consentimento pai tirar fotografias do que para fazer qualquer outro tipo de estudos. Em parte isto deve-se ~ facto de que uma câmara é uma maior ameaça à privacidade e ao anonimato. També pode ser porque normalmente não se pensa nas câmaras como instrumentos de inve tigação. Mas também existe um conjunto de concepções negativas acerca do que as câm ras podem fazer. Podem ser utilizadas para embaraçar ou mesmo humilhar as pessoas como no programa "Apanhados". Os administradores de um local- directores, profess res, supervisores - não desejam, compreensivelmente, ser humilhados. Estes sentimentl são aumentados pela crença quase mística de que qualquer pessoa pode ser humilhada p' uma câmara, de que de algum modo a câmara pode gerar uma visão negativa da pessl mais digna de louvor. Dado que nenhum meio humano é perfeito, talvez as pessoas n: confiem que o fotógrafo seja "justo". E dificilmente as porá à vontade saber que o til mais conhecido de estudo fotográfico é a exposição fotojomalística. Quando se aborda um meio procurando permissão para fotografar, estes e outr, receios têm de ser reconhecidos e lidados. Com qualquer método de investigação, I sujeitos precisam de estar seguros de que o projecto é bom e tem intenções sérias; quam a fotografia está envolvida, essa segurança é mais difícil de estabelecer. l D Estatísticas oficiais e outros dados quantitativos mindo que esses registos indicam de forma empírica a seriedade com que se segue o programa. Não deve utilizar os registos de presenças para provar aquilo que encontrou, mas para explorar as implicações da sua ideia num aspecto particular do programa. Se os registos de presenças não forem tão altos para as mulheres como para os homens, pode ser forçado a explicar o facto. Analisar as estatísticas oficiais actuais e compará-las com o que os sujeitos relatam verbalmente pode ser uma maneira útil de explorar percepções. Por exemplo, recentemente um investigador que estava a estudar a execução de um novo programa de leitura ouviu com frequência os professores fazerem referência ao crescimento dos níveis de leitura entre os alunos desde que o novo programa tinha sido incorporado. Quando a investigadora explorou esta afirmação descobriu que os níveis de leitura na escola não tinham subido; de facto, os professores nunca tinham visto os dados sobre níveis de leitura. O apoio entusiástico dos professores ao novo programa reflectia-se no seu relato dos dados, mas não nos próprios dados. Embora os dados quantitativos recolhidos por outras pessoas (avaliadores, administradores e outros investigadores) possam ser convencionalmente úteis tal como foram descritos, os investigadores qualitativos dispõem-se à recolha de dados quantitativos de forma crítica. Não é que os números por si só não tenham valor. Em vez disso, o investigador qualitativo tende a virar o processo de compilação na sua cabeça perguntando-se o que é que os números dizem acerca das suposições das pessoas que os usam e os compilam. Em vez de confiarem nos dados quantitativos como um caminho para descrever com precisão a realidade, os investigadores qualitativos estão preocupados em como é que a enumeração é utilizada pelos sujeitos para construírem a realidade (Gepart, 1988). Estão interessados em como as estatísticas revelam a compreensão de senso comum dos sujeitos. Os investigadores qualitativos são inflexíveis em não tomar os dados quantitativos pelo seu valor facial. Ele vêem o processo social envolvido na colecção de dados numéricos e os efeitos que a quantificação tem na maneira como as pessoas pensam e agem os assuntos importantes para o estudo. Este interesse pelo estudo do processo de geração de números não deve ser confundido com o estudo que os estatísticos fazem para melhorar a computação e a estimação. A abordagem qualitativa aos dados quantitativos incide na compreensão de como é que o processo de computação se realiza, e não como é que se devia realizar. Os pontos seguintes descrevem oito maneiras de pensar acerca dos dados quantitativos que você pode encontrar numa escola ou numa organização de serviços humanos (Bogdan, 1980; Bogdan e Ksander, 1980) para sensibilizá-la à perspectiva qualitativa: o conduzir estudos o investigador qualitativo encontra muitas vezes dados quantitativos que outras pessoas compilaram. As escolas, como já dissemos, mantêm e gerem uma quantidade enorme de dados. Os professores podem optar por ter dados para os seus fins pessoais. A administração recolhe dados acerca da composição racial, línguas que são faladas, condições causadoras de deficiência, o número de ferimentos causados por actividades atléticas, contagens de presenças, taxas de abandono escolar, classificações, número de actos de violência e suspensões e todo um conjunto de computações numéricas. Em certas alturas o investigador qualitativo acha útil gerar os seus próprios dados numéricos. O que é que um investigador qualitativo pensa e faz com esse material? Os dados quantitativos podem ter utilizações convencionais em investigação qualitativa. Podem sugerir tendências num local se, por exemplo, o número de estudantes que é coberto tem aumentado ou diminuído. Podem também fornecer informação descritiva (idade, raça, sexo, estatuto socioeconómico) acerca da população servida por um programa educacional em particular. Estes tipos de dados podem abrir novos caminhos a explorar e questões a responder. Os dados quantitativos são muitas vezes incluídos na escrita qualitativa sob a forma de estatística descritiva. Os dados estatísticos podem também servir como verificação para as ideias que desenvolveu durante a investigação. Através da observação pode descohrir que os aprendizes brancos de sexo masculino num programa de treino de emprego não falam do treino como algo de importante nas suas vidas, tal como o fazem os do sexo feminino. Você pode manter esta "hipótese de trabalho" e confrontá-la com os registos oficiais de presenças, assu- 1. O conceito de "taxas reais" é enganoso. O processo de quantificação produz taxas e medidas. Elas não aparecem naturalmente no mundo. As taxas e as computações representam um ponto de vista que os sujeitos tomam acerca das pessoas, objectos e acontecimentos. E ainda porque os sujeitos tomam uma atitude numérica em relação a certas categorias de pessoas, objectos ou acontecimentos, isso não quer dizer que haja um consenso 194 195 I 1 A natural no que diz respeito à forma de chegar a essas taxas e computações. Por exemplo, os actos de violência nas escolas estão dependentes da forma como as pessoas que compilam os números num dado tempo e lugar definem o fenómeno e realizam o seu trabalho. Não podemos gerar uma taxa de actos violentos até desenvolvermos uma perspectiva em relação a acções específicas que as tornem quantificáveis ou importantes para a contagem (Ver o National Institute of Education, 1978, para um exemplo de como os distritos escolares definem violência de forma diferente). Um cientista social, um investigador de políticas ou um membro das autoridades governativas podem escolher arbitrariamente uma maneira de contar e desenvolver um conjunto de convenções para chegar a um método de construir uma "taxa real", mas aquilo que é derivado é o produto das suposições utilizadas, os conceitos empregues e o processo que é desenvolvido. Afirmar que se tem a "verdadeira medida" é uma afirmação de supremacia de uma definição e de um método sobre outro, e não deve ser confundido com a "verdade" no seu sentido absoluto. Quais são as diversas maneiras como as pessoas definem e quantificam as coisas que são requeridas elas contarem? Quais os factores que parecem influenciar as definições e as maneiras de proceder? Existem variações entre as pessoas que recolhem os dados acerca de como proceder? Como é desenvolvida a compreensão acerca do que contar e de como contar? 2. Escolher pessoas, objectos e acontecimentos para quantificar muda o seu significado. A quantificação tem o potencial de tornar aquilo que se tomava por garantido saliente e de tornar aquilo que era amorfo em algo de concreto. Os requisitos para manter estatísticas sobre as origens raciais e étnicas, por exemplo, podem aumentar a atenção que as pessoas dão à raça das crianças, mudando as suas ideias acerca de quem pertence a que categoria. Os dados estatísticos sobre minorias ou crianças deficientes e sobre o número de ferimentos produzidos por actividades atléticas, actos de violência ou a incidência de uso de drogas nas escola faz mais do que dar uma imagem numérica do fenómeno; muda a forma como o experienciamos. Quais os efeitos específicos que a computação tem no significado dos acontecimentos e das pessoas? as nossas taxas. Sarason e Davis (1979), na sua discussão da educação obrigatória e c aumento da deficiência mental, sugerem que as taxas de deficiência mental têm de SI compreendidas em relação à definição em mudança acerca de quem deve ser educado. 4. A quantificação envolve muitos participantes diferentes e só pode ser entendü.. como um fenómeno de multinível. A maneira como um assunto é visto em Washington como as pessoas ao nível nacional o medem pode não corresponder com a maneira com se pensa ao nível do estado ou ao nível local. De forma igual, os superintendentes podei interpretar uma directiva de forma diferente da dos directores. É claro que o público eJ geral pode receber os dados de uma maneira que é desconcertante para aqueles que c geraram. Como um jornalista de um jornal local disse: "Uma criança não é necessari< mente uma criança da maneira como o State Education Department a vê... Da maneiJ como os educadores contam uma criança pode ser metade de uma criança, uma crianç inteira, uma criança e um quarto, uma criança e quatro décimos ou, em alguns casos, urr criança ser na realidade duas crianças." Qual a intenção original de iniciar uma computação? Como é que a motivação e a or gem são entendidas pelos vários níveis que são percorridos? Como é que as pessoas ql estão nos níveis que recebem os dados compreendem o significado daquilo que obtêrr Como é que esse resultado corresponde ao que colectores de dados compreendiam ql estavam a fazer? 3. A quantificação tem uma dimensão temporal. Qualquer tentativa de quantificar tem uma história. Qualquer geração ou discussão de uma medida ou computação de algo é localizada num momento histórico particular. Por outras palavras, os números não existem por si só, mas estão associados com o contexto social e histórico que os gerou. As mudanças nos níveis relatados - seja de presenças, utilização de drogas, níveis de realização ou o número de crianças com dificuldades de aprendizagem - não correspondem necessariamente às mudanças actuais de comportamento ou às características das pessoas que estão a ser contadas. É prematuro fazer generalizações, mas as nossas observações referentes à estimativa de crianças com dificuldades sugerem-nos que quanto maior é a nossa preocupação com um fenómeno particular, mais nos focamos nele e maiores serão 5. Tanto a pessoa como a sua motivação para computar afectam o significado, pn cesso e números que são gerados. Esta suposição, embora intimamente ligada à últim encontra-se aqui separada para enfatizar o papel importante que têm aqueles que iniciam computação e quais são as sanções disponíveis. Por exemplo, quando o financiament federal para uma organização está ligado a servir certas categorias de pessoas aumenta .tendência para esses números serem alcançados, independentemente das mudanças rea relativas a quem é servido e o que é feito. Quando a quantidade de dinheiro atribuída uma escola depende de gerar computações, estas computações tenderão a aproximar-, dos níveis que são mais favoráveis para a agência que procura financiamento. De form crescente, os governos locais e estaduais estão a desenvolver sistemas elaborados d relato de dados devido às ordens para produzir computações. Estas ordens e os seus resu tados merecem um estudo cuidadoso. As relações que os profissionais têm com a produção de taxas são fundamentais po: que estes iniciam as computações e têm um papel na produção da taxa. Um estudo de se: viços de pessoas invisuais revela que a definição legal de cegueira em que geralmenl assenta a computação de crianças invisuais, e que foi produzida por profissionais, result na produção de uma categoria de pessoas cuja maioria esmagadora consegue ver (Scot 1969). A categoria diagnóstica "dificuldade de aprendizagem" ilustra a importância d estudar as pessoas que iniciam a computação. Alguns especialistas relatam que se tem at cerca de 40% de todas as crianças com dificuldades de aprendizagem, enquanto algun 196 197 _ 1. . . . -..__. >Oc.,._" ,", ", -~. . . . . . .,.,. ,. ._.,.,.,.,. - ., _ "~ .... .• """"..•• ,,~~". 1,- 'w", •• profissionais não associados com esta especialidade dizem que a "dificuldade de aprendizagem" corresponde a um diagnóstico inventado, O que é que as pessoas que geram computações entendem que são as consequências das suas acções? Como é que o facto de ter o financiamento ligado à obtenção de certos números afecta a contagem? Como é que os vários grupos profissionais afectam a computação? Como é que a computação feita por pessoas "leigas" na matéria difere das computações profissionais? trada da quantificação em organizações educacionais nos chama para o estudo da comr tação e das suas ramificações de uma perspectiva qualitativa, uma perspectiva que n move de uma posição em que tomamos as coisas como adquiridas para uma que as estu no seu contexto. Esta discussão dos dados quantitativos com que um investigador depara no curso de um estudo foi realizada para o sensibilizar para uma perspectiva qua tativa sobre os "dados brutos", 6. A computação liberta processos sociais dentro do meio em que essa toma lugar, em adição e para além das actividades directamente ligadas com a computação. A computação pode moldar o que as pessoas consideram importante e com significado e designar certas actividades específicas como úteis. Por exemplo, aplicar testes estandardizados no final de uma disciplina pode mudar o conteúdo da disciplina e as actividades em que a classe se envolve durante o ano, A geração de taxas de sucesso pode-se tornar a maior actividade dos agentes educacionais. Como é que a computação afecta as actividades normais em que as pessoas se envolvem no contexto educacional? Qual a relação entre a medida do sucesso e ser bem sucedido? 7. As pessoas que produzem dados em meio educacional estão sujeitas aos processos sociais e às forças estruturais semelhantes às que operam sobre outros grupos de trabalho. Estudos sobre trabalhadores fabris e outros grupos de trabalho forneceram-nos conceitos úteis como os de restrição de quotas, evitamento do trabalho, auto-exaltação, cooptação e deslocação de objectivos para descrever os efeitos dos processos de grupo e as forças estruturais que actuam sobre a produção do trabalho. Quais os conceitos que clarificam a produção dos dados oficiais? Algumas das frases mais comummente ouvidas entre os colectores de dados são factor de engano, jogo de números, massajar os dados e empolamento. O que é que estes termos significam? Quais os processos sociais subjacentes e as forças sociais que actuam sobre os que geram os dados? 8. A enumeração e os seus produtos têm um forte significado afectivo e ritualístico no sistema educacional dos Estados Unidos. Outras sociedades, ao tentar explicar a vida de todos os dias, basearam-se em sistemas rigorosos. Nos Estados Unidos baseamo-nos na ciência, cujo símbolo é o número. Os resultados das computações e a produção de taxas são sinónimos de ser racional. Qual o significado simbólico da computação para as várias pessoas do sistema educacional? Como é que os números são utilizados para comunicar para o mundo exterior? Como é que são usados internamente pelos administradores? Quais as funções que os números servem para além das que comummente dizemos que servem? Não advogamos o término da recolha de dados quantitativos: o sistema educacional dos Estados Unidos ruiria. Em vez disso, o nosso objectivo é sugerir que a natureza infil- 198 I 199 "_,I,__ ,~,~--",---~_""","~_, __L_"_,,,,~,,,,,,~,,.,,,",,-,,.",,~,,,,,, " ",",~" ,<;", , , .,. , ., , ,., , l, .. decer a este sinal. Chega-se a um ponto em que se tem dados suficientes para real aquilo que nos propusemos, e a explicação do porquê permanece vazia. É essa a ai! de dizer adeus e de passar para a análise dos dados. Comentários finais escrevemos a abordagem qualitativa dos dados bem como as várias formas que os dados podem tomar. Não fomos exaustivos. Algumas pessoas fazem um uso alargado de equipamento de vídeo e de filme para proceder à investigação qualitativa; não cobrimos as suas actividades. Outros fazem uma análise indutiva dos temas e imagens das mulheres e grupos minoritários tais como representados nos meios de comunicação de massas bem como em manuais escolares. Também foram esquecidos. Os anuários escolares e revistas literárias fornecem-nos outra área de dados que apenas tocámos ao de leve na nossa discussão. Embora existam estes e outros tipos de dados, iremos continuar, esperando que tenha compreendido a perspectiva de que os dados não são apenas aquilo que se recolhe no decurso de um estudo, mas a maneira como as coisas aparecem quando abordadas com um espírito de "investigação". Tomar-se um bom investigador qualitativo é, em parte, aprender esta perspectiva; os detalhes específicos são pistas úteis para a compreensão do mundo dos sujeitos. A investigação qualitativa envolve pegar nos objectos e acontecimentos e levá-los ao instrumento sensível da sua mente de modo a discernir o seu valor como dados. Significa aperceber-se da razão por que os objectos foram produzidos e como isso afecta a sua forma bem como a informação potencial daquilo que está a estudar. Também envolve saber quando descartar certos conjuntos de dados como sendo de valor duvidoso e quando os manter. Lembre-se do sinal: "Eu estou aqui para recolher dados. Como é que o que eu faço se relaciona com o objectivo?". Se você interiorizou o papel de investigador, deve obe- D ~=~~.:;o,~~~~_,_, NOTAS 1. Este projecto faz parte de um estudo mais alargado apoiado por uma bolsa do National Institute of Educa Bolsa n.o 400-79-0052. 2. Este projecto foi apoiado por fundos do Nationa! lnstitute of Educatio!1. 3. Ives (1974) dá a mesma sugestão para a localização de sujeitos para histórias orais. 4. Esta secção foi escrita por Andrejs Ozolins. 5. Adicionalmente, os problemas de equilíbrio de cor são muito severos e uma distracção desnecessária paI investigadores cuja preocupação primária é o estudo e não a fotografia. 200 _I~~ . . __~ __"...__ .. .~ 201 .",. _" " " " "",-, , , . . . . . ~, ., ~-l~MY"" ."" .. ,. ... ._.~.~;,n"" v ANÁLISE DE DADOS análise de dados é o processo de busca e de organização sistemático de tran~ ções de entrevistas, de notas de campo e de outros materiais que foram sendo. mulados, com o objectivo de aumentar a sua própria compreensão desses mes materiais e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo que encontrou. A análise env o trabalho com os dados, a sua organização, divisão em unidades manipuláveis, sín\ procura de padrões, descoberta dos aspectos importantes e do que deve ser aprendidc decisão sobre o que vai ser transmitido aos outros. Em última análise, os produtos fi da investigação constam de livros, artigos, comunicações e planos de acção. A anális dados leva-o das páginas de descrições vagas até estes produtos finais. A tarefa analítica, ou seja, a tarefa de interpretar e tomar compreensíveis os mate recolhidos, parece ser monumental quando alguém se envolve num primeiro project investigação. Para quem nunca empreendeu uma tarefa destas, a análise afigura-se m truosa, sendo o seu primeiro impulso evitá-Ia, continuando a recolha de dados no ca de investigação, quando já a deveria ter terminado. A ansiedade aumenta: "Não cons encontrar nada de jeito." "Foi uma perda de tempo." "Este trabalho é impossÍ\ "A minha carreira vai acabar com este monte de notas de campo por analisar em cim minha secretária." Estes medos já nos assolaram a todos, na primeira vez que fomos frontados com a análise. Apesar da análise ser complicada, constitui, igualmente, um cesso que pode ser dividido em várias fases. Se for encarada como uma série de deci e tarefas, em vez de ser vista como um imenso esforço de interpretação, a anális dados surge como algo mais agradável. Neste capítulo, o nosso objectivo consiste em ajudá-lo a lidar com a análise. Se que alguns autores se tenham debruçado sobre a análise de dados e nós o remeta para as suas obras (Becker, 1970a; CasseI!, 1978a; Lofland, 1971; Schatzman e Stn 1973; Sprad1ey, 1980; Strauss, 1987; Miles e Huberman, 1984), na literatura s investigação qualitativa, a análise nunca recebeu a atenção suficiente. A inform que lhe proporcionamos neste capítulo é de natureza mais rudimentar do que sol cada, mais prática do que teórica. O objectivo da nossa discussão é o de o inicia análise de dados. Apresentamos algumas sugestões concretas sobre a forma como ( A 204 205 I I.,e-.. proceder para tomar a análise conceptualmente manipulável, bem como mecanicamente praticável. Antes de começar, lembramos-lhe as conclusões dos capítulos anteriores. Existem muitos estilos diferentes de investigação qualitativa e uma variedade de maneiras de trabalhar e analisar os dados. Poderá ser útil pensar em dois modos de enquandrar as abordagens à análise. Numa das abordagens, a análise é concomitante com a recolha dos dados e fica praticamente completa no momento em que os dados são recolhidos. Esta é a abordagem mais frequentemente utilizada pelos investigadores de campo experientes. Ela revela-se tanto mais eficaz e eficiente quanto melhor souber aquilo que está a fazer. A outra abordagem envolve a recolha dos dados antes da realização da análise. No entanto, os investigadores nunca a utilizam na sua forma mais pura, aproximando-se apenas dela, dado que a reflexão, sobre aquilo que se vai descobrindo enquanto se está no campo de investigação, é parte integrante de todos os estudos qualitativos. Em nossa opinião, o investigador inexperiente deve utilizar estratégias referentes ao modo de análise no campo de investigação, deixando a análise mais formal para quando a maior parte dos dados tiverem sido recolhidos. As dificuldades no estabelecimento da relação e no acesso ao campo de investigação consomem demasiado tempo ao investigador inexperiente, para que ele possa envolver-se activamente na análise. Para além disso, os investigadores inexperientes, quando se encontram pela primeira vez no campo de investigação, não possuem, frequentemente, um quadro de referência teórico e suficientemente sólido que lhes permita dar-se conta de aspectos e temas relevantes para a sua investigação. Para realizar a análise concomitantemente, mostra-se necessário ter a capacidade de se aperceber de aspectos conceptuais e substantivos que vão surgindo - algo que não é provável estar tão desenvolvido num investigador inexperiente como numa "velha raposa" da investigação. Apesar de recomendarmos alguma contenção nas tentativas de mergulhar na análise concomitante, alguma análise tem de ser realizada durante a recolha de dados. Sem isto, a recolha de dados não tem orientação; se assim não o fizer, os dados que recolher podem não ser suficientemente completos para realizar posteriormente a análise. Se bem que habitualmente recolha mais dados do que aqueles que necessita ou que alguma vez possa vir a usar, uma certa orientação tomará a tarefa manipulável. Após realizar um ou dois estudos, já poderá começar a utilizar mais cedo os procedimentos analíticos concomitantemente à recolha de dados. 206 I n Análise no campo A s sugestões que se seguem ajudá-Io-ão a fazer a análise como parte integrante recolha de dados e a ficar em boa posição para a análise final, depois de ter aba donado o campo de investigação: 1. Obrigue-se a tornar decisões que estreitem o âmbito do estudo. Como referim anteriormente, na maioria dos estudos, a recolha de dados assemelha-se a um funil. P meiramente, recolhe os dados de uma forma mais ampla, escolhendo vários sujeit( explorando espaços físicos para obter uma compreensão alargada dos parâmetros do cc texto, sujeitos e temas em que está interessado. Depois de ter encontrado um assunto pi investigar, baseado tanto naquilo que é possível realizar como naquilo que lhe interes: estreite o âmbito da recolha de dados. Faça isto após três ou quatro visitas ao local da i vestigação ou após algumas primeiras entrevistas. Poderá tomar decisões do tipo: "Ce trar-me-ei na terceira classe desta escola." "Vou explorar mais aprofundadamente recordações das mulheres sobre a puberdade." "A minha preocupação central será o mo como as crianças experienciam o programa." "Irei entrevistar professoras que ensinam e liceus com uma grande população escolar." "O meu principal objectivo será a comUl cação entre professor e aluno." Goze a liberdade inicial da exploração, mas obrigue-se tomar decisões relativamente cedo. Dado que tudo é interessante e o universo que quer ( tudar parece não ter limites, as escolhas mostram-se difíceis. Tem de se disciplinar no se tido de não querer estudar tudo e precisa de colocar alguns limites à sua mobilidade físi< porque, se assim não for, obterá dados demasiado difusos e inapropriados para aquilo q se propôs fazer. Quanto mais dados tiver sobre um tópico, contexto ou grupo de sujeit 207 específico, mais fácil será pensar aprofundadamente sobre ele e maior será a probabilidade de ser produtivo quando realizar a análise final. 2. Obrigue-se a tomar decisões relativas ao tipo de estudo que quer realizar. Nos capítulos I e II discutimos vários tipos de estudos qualitativos: estudos de caso de organizações, estudos de observação, história de vida, entre outros. Alguns investigadores fazem parte de tradições de investigação que privilegiam um destes tipos em detrimento dos outros e, nesse sentido, procuram automaticamente dados orientados para a produção de um desses tipos. Outros investigadores experientes são mais ecléticos, não deixando no entanto de tomar decisões conscientes sobre o tipo de estudo que querem empreender. Como investigador pouco experiente, poderá ainda não estar associado a uma tradição específica ou não ter conhecimento suficiente para recolher determinado tipo de dados. Por exemplo, deve clarificar se deseja uma descrição completa da situação ou se está interessado em conceber uma teoria sobre um determinado aspecto dessa mesma situação. Está mais interessado em detalhes minuciosos da interacção ou mais preocupado com aspectos gerais dos processos sociais? Apesar de recomendarmos que se deve decidir pelo tipo de estudo a realizar, reconhecemos que fazê-lo à partida pode ser difícil. Ainda que consiga distinguir os diferentes tipos, poderá ainda não se sentir suficientemente seguro em relação ao seu projecto para fazer mais do que simplesmente sobreviver. Tente orientar o seu trabalho de acordo com algum modelo, mas não se preocupe se não o conseguir. 3. Desenvolva questões analíticas. Na nossa discussão acerca do plano de investigação referimos que alguns investigadores incluem questões gerais nos seus estudos. Este tipo de questões é importante, visto orientar e ajudar a organizar a recolha de dados à medida que a investigação vai decorrendo. As questões que formula estão intimamente relacionadas com o tipo de estudo que pretende realizar. Logo após ter iniciado o seu trabalho no campo de investigação, sugerimos que, de entre as questões que formulou, avalie quais as mais relevantes e quais as que devem ser reformuladas para orientar o seu trabalho. Quando iniciámos um estudo sobre um programa de formação profissional para desempregados crónicos, levantámos a questão: "Que factores presentes no programa alteram significativamente os formandos de modo a aumentar a sua possibilidade futura de emprego?". As observações iniciais permitiram clarificar que algumas pessoas que faziam parte do programa não eram propriamente "desempregados crónicos" e que a maior parte daquilo que era veiculado no programa não trazia qualquer preparação para a actividade profissional. Abandonámos a primeira questão e substituímo-la por: "Por que razão é que o programa prossegue, apesar daquilo que é realizado estar tão longe dos objectivos oficiais?". Outro exemplo de uma questão organizadora é ilustrado por uma questão levantada por uma investigadora, quando começou a observar uma sala de um jardim infantil: "O que é que estas crianças fazem todos os dias na escola?". Num estudo que realizámos numa unidade de cuidados intensivos para recém-nascidos num hospital universitário, ini- 208 I ciámos o nosso trabalho de campo sem qualquer tipo de orientação em mente, mas rapid mente o organizámos em torno de uma questão: "Quais as características da comunicaç~ entre os pais e o pessoal médico, nesta unidade?". Mais tarde, esta questão originou outró três questões relacionadas: "Quem fala sobre as crianças com os pais? O que é ql dizem? O que é que os pais ouvem?". Por vezes, os investigadores qualitativos mais inexperientes formulam questões ql não podem ser eficazmente respondidas por meio desta abordagem. Estas questões sã muitas vezes, resultado de uma formação inicial de tradição quantitativa e são orientad: para a procura da "causa" ou da frequência de um determinado fenómeno. Por exempl uma investigadora com vários anos de experiência de enfermagem começou a fazer obse vações e entrevistas a vítimas de recentes enfartes do miocárdio que faziam parte de u programa de educação de pacientes, concebido para reduzir o risco de futuros problema Esta investigadora estava interessada na adesão dos pacientes às regras ditadas pelo pr grama. Se bem que o interesse geral pela relação entre o programa e os comportament, do paciente tenha sido facilmente explorado de uma forma qualitativa, a investigado orientou-se incorrectamente ao formular duas outras questões: "Quem aderia melhor; programa, os homens ou a mulheres?" e "Quais as diferenças em termos de frequência I adesão?". As questões desenvolvidas para orientar um estudo qualitativo devem ser, natureza mais aberta e devem revelar maior preocupação pelo processo e significado, não pelas suas causas e efeitos. Num estudo sobre um programa em que técnicos de ensino fomentaram o uso mz eficaz de meios audiovisuais por parte dos professores, a questão formulada consist em: "O que é que acontecia quando os especialistas em meio audiovisuais tentava convencer os professores a comportarem-se de forma diferente relativamente a ess mesmos meios?". Num estudo de entrevista sobre pessoas rotuladas de "deficient mentais" perguntámos: "O que é que as pessoas, assim rotuladas, pensam de si pI prias?". Frequentemente, os investigadores qualitativos distinguem as questões teóricas sul tantivas das questões teóricas formais. As questões que acabámos de referir são substs tivas; isto é, centram-se numa determinada situação ou em determinados temas que est a ser estudados. Para transformar uma questão substantiva numa questão teórica fom basta modificar a sua redacção; na maioria dos casos, isto pode fazer-se pela simpJ omissão de frases ou adjectivos (Glaser e Strauss, 1967, p. 80). "Por que razão é que programa prossegue, apesar daquilo que é realizado estar tão longe dos objectivos o ciais?" transforma-se em "Por que razão é que os programas cujas actividades estão t longe dos objectivos a que se propõem continuam a existir?". "Quais as características comunicação entre os pais e o pessoal médico, nesta unidade?" toma a forma de "Quais características da comunicação entre pais e profissionais?". "O que é que aconte( quando os especialistas em meio audiovisuais tentavam convencer os professores a co portarem-se de forma diferente relativamente a esses mesmos meios?" passa a ser fom IOE-14 209 lada da seguinte fonua: "O que é que acontece quando especialistas externos tentam modificar o comportamento dos professores?". As questões substantivas transfonuam-se naturalmente em questões teóricas nas investigações em que se observam diversas situações e em estudos nos quais se utilizam amostragens teóricas. Se realizar uma grande parte da análise no campo de investigação e desenvolver estas questões e respostas à medida que se vai deslocando por diversos locais, estará a envolver-se naquilo que se designou por teoria com suporte formal (Glaser e Strauss, 1967). Como sugerimos, a realização desta análise sofisticada no campo de trabalho é difícil para os principiantes. A maior parte dos investigadores inexperientes conduzirá o seu estudo dentro de uma situação ou coorte de sujeitos. Sugerimos que fonuule as questões a um nível substantivo com o objectivo de orientar a sua recolha de dados, mas que nos comentários e memorandos do observador especule sobre a relação entre a teoria substantiva e a teoria formal. Na análise formal, após a recolha de dados, pode especular ainda mais. Ao redigir as suas conclusões pode, dependendo da audiência, tentar associar os seus resultados substantivos a temas teóricos formais, isto é, reflectir sobre o impacto que as suas conclusões podem ter no comportamento humano em geral. Para além da fonuulação das questões, consideramos útil tecer afinuações que revelem a intenção do projecto. Estas afirmações devem ser simples e limitar-se a uma ou duas frases. Imagine que um leigo inteligente que não sabe nada sobre os seus interesses ou sobre a sua área de estudo, lhe pergunta: "O que é que está a tentar encontrar na sua investigação?". Deverá tentar ter as ideias suficientemente claras para conseguir dar uma resposta satisfatória a essa pessoa, sem a confundir, nem a aborrecer. Pense neste tipo de afinuações; se conseguir encontrar uma, está a caminho da clarificação adequada dos seus próprios objectivos - uma chave para a análise. Como discutimos no capítulo IV, os comentários do observador consistem em secções da notas de campo destinadas ao registo do que o investigador vai pensando e sentindo, medida que faz as suas observações. Geralmente, nos primeiros projectos, os investigadc res não dedicam tempo suficiente à especulação. Em vez de penuitir que o registo da de~ crição detalhada domine as suas actividades a ponto de excluir a fonuulação de nove propostas, registe insights importantes que vai tendo durante a recolha de dados para nã os perder. Sempre que considerar que um acontecimento a que assistiu ou um diálogo er que se envolveu é relevante, anote as imagens que estes lhe despoletam. Quando acontc cer alguma coisa que lhe faça lembrar incidentes ocorridos noutras situações, registe esta associações (isto é particulanuente importante para a passagem da teoria substantiva teoria fonual). Sempre que palavras, acontecimentos ou circunstâncias sejam recorrente: mencione-os nos comentários do observador e especule sobre o seu significado. Se ach; que se fez luz na compreensão de alguma coisa que previamente não estava clara para s registe este facto. Se se der conta que há sujeitos que têm algo em comum, saliente est; semelhanças nos comentários do observador. O objectivo é o de estimular o pensament crítico sobre aquilo que observa e o de se tomar em algo mais que uma mera máquina c registo. A figura 5-1 contém exemplos de comentários do observador sobre um estudo c integração que se revelaram úteis à análise. 4. Planifique as sessões de recolha de dados à luz daquilo que detectou em observações prévias. Em função do que encontra quando, periodicamente, revê as suas notas de CO.: O director da Escola Primária de Fairview refere que a escola tem professores regular (que não são do ensino especial) que se deslocam a esta turma de crianças autistas pa ensinarem música como uma forma de "integração". Nunca ouvi ninguém lá na faculdal dizer que a integração se faz assim. Até parece que o professor está a ser integrado J turma. campo, planeie desenvolver tarefas específicas para a sua próxima sessão de recolha de dados. Pergunte a si próprio: "O que é que eu ainda não sei?". Para responder a esta questão, terá de pensar sobre o que já sabe e sobre a fonua que o seu estudo está a tomar. Decida se prefere passar mais tempo num determinado local do que noutro, arranje maneira de ver uma actividade específica ou planeie entrevistar um detenuinado sujeito tendo em mente questões particulares. Embora tenhamos vindo a sugerir que o planeamento das sessões de observação se faça em função das sessões anteriores, estes planos podem mostrar-se desajustados. Poderá ir para a situação e conseguir apenas aperceber-se de que é impossível fazer aquilo a que se tinha proposto. Se bem que não haja nenhuma fonua de controlar aquilo que os sujeitos fazem no campo, os planos podem ajudá-lo a orientar e sedimentar o seu projecto, independentemente da sua capacidade para us incrementar. 5. Escreva uma grande quantidade de "comentários do observador" acerca das ideias que lhe vão surgindo. As notas de campo são supostas conter comentários do observador. 210 I Figura 5·1· EXEMPLOS DE COMENTÁRIOS DO OBSERVADOR Seguem-se alguns exemplos de comentários do observador extraídos de um estudo sobre a int gração de crianças com dificuldades em turmas do ensino regular. Se as suas notas incluírem vári, parágrafos deste tipo, a análise final mostrar-se-á mais simples. CO.: Normalmente, Ben Shotland faz comentários negativos sobre os esforços de integraçi realizados pela delegação escolar, no entanto, nas suas aulas lida muito bem com as cria ças rotuladas de "deficientes". Ele está a concorrer ao quadro e pode estar a sentir es pressão. Parece ser antiadministração e o que diz sobre a integração pode ser um refie: da sua insatisfação geral pelo papel que os professores ocupam na escola ou pela admml tração. I -". .~ IL~ '-~'--~':..,""--::"-'~=-,_:-dk_Ifii,--J.: ,NA ....., CO.: Achei estranho que a professora tivesse dito que a criança que estava numa cadeira, rodas, no átrio, não era deficiente. O que ela queria dizer era que a criança não estava receber qualquer tipo de apoio especial e que ainda não tinha sido elaborado um pj sobre ela. De acordo cum a administração, a criança não é deficiente, mas, segundo qu< quer pessoa que a veja, ela parece sê-lo. Tenho de desenvolver ideias diferentes s~bre que é uma deficiência. Alguns garotos não parecem sofrer de nada; no entanto, estao Ir critos como tendo dificuldades. Tenho de obter mais informação sobre o assunto. • ;;.;u«UmQ4.WkWAt&.H.&MtÚ';;; ,_L~,,_ CO.: Esta é a terceira vez que fontes diferentes me informam que os horários das crianças integradas são concebidos de forma a que certos professores não tenham crianças com dificuldades nas suas turmas. Por que é que isto acontece? O que é que os outros professores pensam sobre isto? Parece que a escola se divide em duas forças. uma a favor da integração e outra contra. CO.: A Sr.' May não tem uma boa opinião sobre os cursos que fez com vista à sua preparação para integrar crianças com dificuldades nas suas turmas. O facto da sua preocupação fundamental ser "o que é que eu devo fazer?"' em vez de tentar definir as características das crianças com problemas, parece estar de acordo com a orientação do Sr. Reese, da Sr' Jones e da Sally Bartlett. O Lowell Sharp e o Minguei parecem muito mais interessados em conhecer as causas do problema. É significativo que aqueles que estão preocupados com o aqui e agora nunca tenham mencionado uma possível mudança. Os outros estão todos a tirar cursos na faculdade e conversam acerca da mudança de emprego. Pergunto-me se as minhas percepções serão verdadeiras e, se o forem, o que é que tudo isto significa. 6. Escreva para si próprio memorandos sobre o que vai aprendendo. Depois de cinco ou seis idas ao campo de investigação, obrigue-se a ler os seus dados e a escrever um resumo de uma ou duas páginas sobre aquilo que considera estar a emergir. Nestes resumos construa ligações com os comentários do observador. Não perca este hábito de regularmente escrever ou sumariar. Estes memorandos podem proporcionar um momento de reflexão sobre aspectos que surgiram na situação e sobre a forma como eles se relacionam com aspectos teóricos, metodológicos e substantivos. Os memorandos ilustrados na figura 5-2 foram escritos depois de seis observações de um programa de integração para adolescentes com "deficiências neurológicas" e "dificuldades de aprendizagem" num liceu urbano. A forma e o conteúdo destes memorandos podem variar muito e o exemplo seleccionado tem apenas como objectivo ilustrar uma das várias formas possíveis. Habitualmente, os memorandos só fazem sentido para aqueles que estão intimamente envolvidos na investigação, razão pela qual este memorando pode não ser compreensível ou não ter o mesmo significado que tem para o autor. Como salientámos no capítulo IV, os memorandos também contêm material sobre a técnica do trabalho de campo e sobre as estratégias de investigação. Apresentamos este exemplo na figura 5-3. À medida que a investigação continua, os seus memorandos podem tornar-se mais analíticos. Alguns podem dizer respeito a uma única ideia. Outros podem ser "construções intelectuais" mais especulativas, revelando associações entre aquilo que encontra e outras situações e dados. Não deve preocupar-se particularmente com a linguagem utilizada nestes memorandos, ao contrário do que faz quando escreve um artigo mais fornlal. Use um estilo mais livre, uma linguagem informal e deixe que as ideias fluam. Terá muito tempo para ponderar sobre aquilo que escreveu quando chegar o momento de fazer a análise mais formal, ou seja, quando terminar a recolha de dados. 212 __. -1. 7. Ensaie ideias e temas junto dos sujeitos. No capítulo III acerca do trabalho de campo examinámos os informadores-chave, ou seja, os sujeitos que são particularmente perspicazes e articulados. Estas pessoas podem ser perscrutadas como fontes para uma análise preliminar. Por exemplo, num estudo sobre integração, as primeiras observações podem revelar a existência de professores a favor ou contra essa integração. O investigador poderá confrontar o informador-chave com este facto, dizendo: "Já reparei que se podem agrupar os professores de acordo com as ideias que têm acerca da integração.". Veja se esta ideia suscita alguma resposta do professor (informador-chave). Este pode concordar ou discordar e, desta forma, ajudá-lo a perceber se a sua ideia inicial está ou não correcta. No estudo sobre residentes e internos numa unidade de cuidados intensivos para recém-nascidos de um hospital universitário, partilhámos, com certos membros da equipa, a concepção que tínhamos desenvolvido de forma a compreendermos o esquema de classificação não oficial que o pessoal da unidade elaborara sobre os pais dos bebés. Constatámos que existiam "tipos" de pais que não tínhamos mencionado, que havíamos sido demasiado categóricos ao fazermos distinções entre os pais e, ainda, que se tivéssemos elaborado um continuum teríamos ilustrado melhor as concepções existentes sobre eles. Ainda que possa utilizar os sujeitos como uma fonte de informação, é importante que não confie neles completamente. Eles tendem a ver as coisas de uma forma muito própria, podendo enviesar as suas capacidades para ajudar a clarificar e a analisar uma situação. Por exemplo, neste estudo sobre o hospital universitário, um médico perspicaz negou que fosse problemático o facto de se fazerem julgamentos sobre bebés "não viáveis". Defendeu a posição de que as características específicas do critério de não viabilidade minimizavam o julgamento individual. No entanto, as notas de campo estavam repletas de referências à natureza problemática de tais decisões. A sua recusa em falar sobre esta matéria não impedia que ela não precisasse de ser explorada; significava apenas que ele não era a pessoa ideal para nos ajudar a desvendar esta questão. . . Como referimos no último capítulo, pode ser pouco sensato revelar a certos sUjeItos tudo o que está a descobrir sobre determinada situação, na medida em que eles podem deixar de colaborar. Seja selectivo em relação às pessoas a quem pede ajuda. Se bem que nem toda a gente seja útil, nem tudo o que ouve o possa ajudar, os informadores-chave, em circunstâncias apropriadas, podem ajudá-lo a progredir na análise, em especial a preencher lacunas das suas descrições. Figura 5·2 • MEMORANDO DAS NOTAS DE CAMPO Até ao momento, já surgiram vários temas, ideias e áreas para investigar mais aprofundadamente. Vou listá-Ias: 1. A utilização que os estudantes fazem da aula e da sua rotulação na negociação da sua posição na escola. Por vezes, alguns miúdos não querem estar associados ao programa porque dizem ter vergonha de estarem incluídos na educação especial. Quando estão na sala de aula, o 213 . I Phil e a Pam querem a porta fechada, embora falem sobre a negociação com os professores a cujas classes assistem, revelando que o facto de estarem associados ao programa lhes traz algumas vantagens. O programa proporciona-lhes a oportunidade de não participarem nalgumas actividades. A opinião do Phil durante a discussão sobre o destacamento militar foi a de que se quisessem recrutá-lo, ele diria que era deficiente, mas não revelaria isso a uma rapariga com quem quisesse sair. Isto ilustra o uso selectivo da "deficiência". Esta opinião relaciona-se com a do Alfred quando diz que os miúdos envolvidos no programa deveriam ser vistos como pessoas com menores capacidades intelectuais e não como tendo algo de errado, que é justamente o que está a acontecer. Tenho que procurar mais material sobre a forma como os miúdos utilizam estes rótulos e a sua turma e quando optam por identificar-se ou não com eles. 2. O uso do conceito de integração, por parte dos professores. Quando comecei este estudo achava que os professores do ensino regular quereriam ou não estar envolvidos com crianças com dificuldades com base nos sentimentos e experiências que tinham tido com miúdos "rotulados". Se bem que isto seja verdade nalguns casos, muita da disponibilidade para aderir ao programa parece não estar relacionada com as suas características ou com a população que serve. Alguns professores consideram que, em geral. a administração não é apoiante e abordam aquilo que consideram ser problemas "adicionais" com a ideia de que "já tenho a minha conta". Quando digo "administração", refiro-me ao ministério, isto é, aqueles que eles consideram ser os responsáveis pelas vantagens contratuais que podem vir a obter. Outros professores centram-se no director e acham que já que ele trabalha muito para que as coisas funcionem bem, se for seu desejo, estão na disposição de aceitarem um esforço suplementar. Isto dá muito que pensar, mas pode ser útil continuar a procurar informação sobre a posição que cada um tem relativamente à integração e a forma como falam sobre ela, pois isto pode revelar-se uma manifestação de interesses conflituosos e competitivos na escola. Isto também me lembra a forma como certos professores encaram as diversas turmas de ensino especial. A Marge confessou-me que gosta de miúdos com dificuldades de aprendizagem porque eles não são tão perturbadores como aqueles que têm perturbações emocionais e que assistem às aulas de apoio. 3. Categorias de miúdos com dificuldades. Em muito pouco tempo já obtive muita informação sobre a maneira como os professores entendem as diversas categorias. Acabei de referir o comentário da Marge, mas os professores responsáveis pelos programas têm uma maneira própria de classificar os miúdos. O Sr. O'Rourke, ao descrever os "seus meninos", referiu que havia três crianças que de facto não pertenciam ao programa. Dois deles estavam lá porque os pais os tinham obrigado (um é "demasiado esperto" para o programa; o outro é "demasiado lento") e o outro pertencia ao grupo porque ele já o conhecia do ano anterior e não havia outra alternativa para ele. Depois há os miúdos que nunca aparecem. Há doze miúdos inscritos. Como três não pertencem e três quase nunca aparecem, restam seis. Isto levanta dúvidas relativamente a quem se destina o programa. Existem ainda os miúdos que são vistos como "tendo realmente problemas". Miúdos que "vão conseguir". Miúdos que os "preocupam". Miúdos que "já cá não vão estar para o ano ou que vão fazer 16 anos". Também ouço os termos "bom rapaz" e "fora de série". Tenho que ser mais sistemático na compreensão disto e na maneira como os professores do ensino regular classificam os alunos quando os comparam com os estudantes referidos para o ensino especial. Tenho ideia de que estas classificações podem ser diferentes. Também seria interessante saber como é que o psicólogo classifica os miúdos comparativamente à forma como os professores o fazem. descrevem-na como sendo frequentada por dois tipos de estudantes: muito bons alunos e alunos fracos. Já me disseram que os alunos muito bons são filhos de pais diferenciados que vivem nas cercanias da escola, ao passo que os alunos mais fracos provêm, na sua maioria, do centro da cidade e muitas das suas famílias encontram-se à mercê da Segurança Social. Esta percepção é interessante, mas devem existir muitos estudantes que não se enquadram em nenhuma destas categorias. Gostaria de saber em que medida é que esta percepção sobre quem são os alunos afecta aquilo que os professores fazem. A que categoria pertencem as crianças que fazem parte do programa para dificuldades de aprendizagem? Também já fui informado e já pude constatar que, embora não haja hostilidade entre brancos e negros, os padrões de amizade entre as crianças são ditados por factores raciais. Os alunos brancos sentam-se ao pé uns dos outros no refeitório. Parece-me que os estudantes brancos e negros se aproximam quando ambas as raças são provenientes de famílias diferenciadas. As crianças do programa para superar dificuldades de aprendizagem são licas e pobres, negras e brancas. É importante explorar em que medida os estatutos racial e económico na escola se reflectem, grosso modo, neste programa. 8. Comece a explorar a literatura existente enquanto se encontra no campo de investigação. Se bem que existam perspectivas diferentes sobre o momento ideal para o investigador qualitativo começar a fazer a revisão de literatura (Glaser, 1978), acreditamos que, depois de ter estado algum tempo no campo de investigação, a leitura da bibliografia substantiva sobre a área que está a estudar contribuirá mais significativamente para a análise. Quais são os aspectos mais relevantes da bibliografia? Que resultados já encontrados por outros investigadores têm pertinência para o seu estudo? Em que medida a sua perspectiva difere da apresentada pelos autores que está a ler? Em que medida se aproxima? Que aspectos foram negligenciados na literatura? Para além dos artigos relacionados com a sua área de estudo, a leitura de material menos circunscrito ao tema poderá ajudá-lo na sua análise. Verificámos que pode ser muito útil para os investigadores a leitura de estudos qualitativos sobre áreas não relacionadas com o seu tema, pois familiariza-os com o modo como outros investigadores trabalharam os seus dados, podendo, ainda, proporcionar modelos para o seu próprio trabalho. O perigo criado pelas leituras realizadas durante a realização do estudo diz respeito à possibilidade de encontrar conceitos, ideias ou modelos que podem ser tão persuasivos que não o deixem ver outras fonuas de olhar para os seus dados. Evite espartilhar os seus dados em esquemas conceptuais preformados. As leituras que faz devem estimular ideias e não impedir que pense por si próprio. É perfeitamente respeitável fazer investigação que ilustre os esquemas analíticos de outros investigadores, mas tente distanciar-se o suficiente para fonuular os seus próprios conceitos ou para alargar o trabalho dos outros. 4. A relação do programa com a estrutura e o ambiente escolar. Já tenho uma série de pistas nas minhas notas no que se refere a informações já divulgadas sobre a escola. Duas pessoas 9. Brinque com metáforas, analogias e conceitos. Na maioria das investigações a rigidez de pensamento constitui uma praga. Envolvemo-nos com a recolha de dados num local específico e ficamos tão agarrados ao que lhe é particular, isto é, aos seus ponuenores, que não conseguimos estabelecer relações com outras situações ou com todo o arsenal de experiências pessoais que trazemos connosco. Relativamente à situação, pergunte-se: 214 215 I~--~-~--~_ . . . _ . _._~._ . -~~_.~"_ . ,..,.--I,,.'i'~'~""-" o diagnóstico toma-se exequível e os sintomas deixam de ter fronteiras, quer estejamos; Figura 5-3 • UM MEMORANDO METODOLÓGICO Memorando O entrevistador como um camaleão 31 de Março de 1981 Os professores são tão diferentes uns dos outros' Embora já tenha verificado que partilham muitas perspectivas em comum, ao passar o tempo que passo na Vista City, fico sempre surpreendido com as diferenças entre eles. Entrevistar estes professores e estabelecer uma relação com eles significa que o investigador tem mesmo de se comportar como um camaleão durante as entrevistas. Por um lado, nunca queremos fingir coisas que não sentimos, mas por outro, nesta tentativa de compreender o ponto de vista do outro, dou por mim a interagir e a agir de uma forma diferente em cada uma das entrevistas. Quando comparo as entrevistas que fiz ontem à Brigit e ao Bill, quase que me vejo como duas pessoas diferentes. Com a Brigit, quando lhe fazia uma pergunta ela dava-me uma resposta extensa. Eu abanava a cabeça, dizia "hum-hum", e sentia-me muito interessado pelos seus comentários. Se bem que a entrevista não tenha sido propriamente formal, esteve centrada na tarefa e foi bastante ortodoxa. A entrevista com o Bill foi muito mais informal. Ele fazia uso de calão nas suas respostas e não seguimos de todo um protocolo. Percebi que estava a ir atrás do seu discurso. Ele estava sempre a dizer "que se lixe isto", "que se lixe aquilo". Eu quase que adoptei o seu modo de falar como havia feito com a Brigit, e até disse que uma coisa era "treta". Não considero que o Bill tenha sido tão rígido na entrevista como o foi a Brigit, e daí talvez algumas das diferenças encontradas no tom das duas entrevistas. A partir desta impressão, concluo que o entrevistador age como um camaleão. Preciso de me adaptar (de certa maneira) aos diferentes estilos de pessoas que entrevisto para obter um bom material. De facto, acho que esta estratégia me permite colocar questões de uma natureza mais desafiante. Se nos adaptarmos aos seus estilos, os sujeitos podem-nos ver como um amigo e podemos pôr em causa algumas das coisas que dizem. Os sujeitos parecem querer responder a estes desafios "tu-cá-tu-lá". e não como se estivessem a falar com alguém que não pertence ao seu universo. Claro que tem também de ter cuidado com esta estratégia. Se tentar ser aquilo que não é, as pessoas podem-no ver como falso. Por isso é que eu penso que isto é mais uma questão de flexibilidade do que de contorcionismo. "O que é que isto me faz lembrar?". Num estudo sobre a integração de estudantes com dificuldades em escolas do ensino regular, comparámos conceptualmente aquilo que estávamos a observar com aquilo que sabíamos sobre a integração racial, com o objectivo de nos apercebermos das diferenças e semelhanças. Numa atitude mais aventureira, abstraímo-nos de um quadro de referência histórico. Num estudo a nível nacional que envolveu a observação dos avaliadores do número de crianças com dificuldades num dos programas Head Start, questionámo-nos sobre a forma como, em 1600, as pessoas de Salém teriam discriminado o número de bruxas existentes. Os nossos sujeitos recorreram a indicadores empíricos, a julgamentos de especialistas e a autodescrições - métodos talvez não muito diferentes dos utilizados em Salém. Visto nesta perspectiva, os profissionais podem diagnosticar crianças mesmo quando os sintomas são imaginados. 216 I diagnosticar bruxas ou perturbações emocionais. Se bem que isto lhe possa soar distante enriquece a forma como poderá entender os problemas da investigação. Outra forma de expandir os seus horizontes analíticos prende-se com a tentativa di elevar a um outro nível de abstracção as relações concretas e os acontecimentos observa dos numa situação específica. Como já foi referido anteriormente, a alteração da formu lação de uma afirmação é uma maneira de conseguir isto. Outra forma de o fazer consisti em tentar dizer em poucas palavras o que se pretende, com vista a captar o espírito d; generalização que está a desenvolver. Por exemplo, as observações que realizámos nun programa para desempregados crónicos, levaram-nos a concluir que os desempregado mais competentes, mais talentosos e com maiores possibilidades de obter emprego rece biam mais atenção por parte dos membros do programa. Brincando um pouco com est relação encontrada, criámos a expressão "o princípio do preferido do professor" para des crever o facto dos que precisavam menos obterem mais. Numa unidade pediátrica de um hospital universitário, constatámos que o pessoal d equipa não só diagnosticava as crianças como avaliava os pais. Com base nas opiniõe acerca dos pais, tomava decisões relativamente ao tipo de informação que iria dar sobre estado físico dos seus filhos e como os iriam envolver no tratamento. Desenvolvemos expressão "diagnóstico da terceira pessoa" para ilustrar a ideia de que os médicos nã diagnosticam só os seus pacientes. Depois de encontrar uma expressão deste tipo, dev estipular sob que circunstâncias e em que outras situações este facto tem probabilidade d ocorrer. Este processo ajudá-lo-á a pensar mais profundamente sobre vários aspec~os d situação em que está envolvido e sobre as suas semelhanças com outras situações. E atn vés deste processo que uma ideia se transforma num conceito. 10. Utilize auxiliares visuais. Uma técnica de análise que tem recebido cada vez ma atenção diz respeito à utilização de auxiliares visuais (Strauss, 1987; Miles e Hubermm 1984). Figuras como diagramas, matrizes, tabelas e gráficos podem ser utilizadas er todas as fases da análise, desde o planeamento até aos produtos finais. Podem variar n seu grau de sofisticação, indo desde gráficos desenhados à mão numa folha de rascunh até modelos profissionais cuidadosamente elaborados. Alguns auxiliares visuais sã meros gatafunhos nas notas de campo que ilustram relações ou que dão forma a nov~ ideias que vão surgindo. Um dos autores utiliza, frequentemente, caixas desenhadas pm representar as categorias de sujeitos, colocando setas para representar os seus pontos c vista face aos vários elementos da situação. Estes rabiscos infantis ajudam-no, habitua mente, a visualizar aspectos mais complexos que são difíceis de atingir através de paI< vras. Podem ajudá-lo a resumir o seu pensamento, permitindo-lhe apresentar mais faci mente os seus resultados a outras pessoas (colegas, professores). Alguns investigadon nunca fazem uso deste tipo de auxiliares, ao contrário de outros que não podem pass1 sem eles, chegando mesmo a incluir esquemas sofisticados nos seus manuscritos. 217 --~------'~-- ~~-";.;-'!!"j,",I,;~~. ideias. Não têm de demonstrar as ideias para as poder afirmar; têm de ser pl~usíveis err função daquilo que observaram. Não abdique de "pensar" só porque amda nao possuerr todas as provas. Pense com os dados que têm. . . , A nossa segunda sugestão prende-se com a abertura a noras Idews (Glaser, 1978~. A; ideias e a compreensão surgirão regularmente à medida que realtza.a sua mvestIg~çao. ~ provável que se entusiasme com o processo criativo. Pode ser hilanante. Rummar a. ideias cria a energia necessária ao arejamento dessas mesmas Ideias. EXistem duas ma· neiras de o fazer: falar sobre elas com amigos e colegas ou escrever memorandos, comen tários do observador e, posteriormente. redigir um texto. No entanto: falar com os out~o; poderá impedir a análise, embora não pretendamos parecer antI-SOCIaiS com esta .sugestao Contudo, fica o aviso de que a conversa sobre a análise pode reduZlf a energia de qw necessita para o trabalho árduo que constitui a passagem das su~s Ideias para o papel Uma vez verbalizada, uma ideia pode reduzir a vontade de a registar; ton;a-se em alg( que "toda a gente já sabe". A análise de dados precisa de tempo quando esta sozmho con D Outras sugestões sobre a análise no campo de investigação ão queremos deixar de assinalar três aspectos gerais antes de iniciarmos a pró- N o seu computador. Finalmente, sugerimos que à medida que revê os seus dados durante a fase de recol? da investigação os assinale. Escreva as ideias nas margens d.as suas nota~ de campo. Cu cunde palavras-chave e frases que os sujeitos utilizam. Sublmhe as secçoes que lhe pare cem particularmente importantes. Os dados devem ter um ar usa?o - repl~tos de Itnhas anotações, folhas dobradas e manchas de café. Sugerimos que utilize um \apls de forma poder apagar, mais tarde, as anotações mais confusas. xima secção "Análise após a Recolha de Dados". Tal como descrevemos para algumas das ideias e procedimentos sob o título "Análise no Campo de Investigação", estes aspectos são extremamente pertinentes, tanto para a análise realizada durante como no final do estudo. O primeiro aspecto já aflorado anteriormente merece atenção suplementar. Não tenha medo de especular. A falta de confiança que o investigador geralmente sente na sua primeira tentativa de investigação toma-o muitas vezes demasiado cauteloso relativamente à elaboração de ideias. A preocupação em clarificar pormenores e factos pode oprimir o investigador. Não estamos a sugerir que os pormenores e os factos não sejam importantes, pois as ideias têm de ser fundamentadas com os dados, mas são apenas um meio para clarificar o pensamento e gerar ideias e não um fim em si mesmo. Como C. Wright Mills nos recorda, "os factos disciplinam a razão; mas a razão é a guarda avançada em qualquer campo de aprendizagem" (Mills, 1959, p. 205). Bamey Glaser, personagem determinante no desenvolvimento da análise qualitativa, sugere-nos que a maior contribuição para a ciência do comportamento humano advém das boas ideias. "Os resultados são rapidamente esquecidos, mas as ideias permanecem." (Glaser, 1978, p. 8) Os que se iniciam na investigação qualitativa sentem-se muitas vezes culpados ao especularem, aconselhados que foram a não fazerem afirmações até terem a certeza de que estas são verdadeiras. Contudo, a especulação é produtiva para esta abordagem de investigação. Ajuda-os a assumirem os riscos necessários para o desenvolvimento de novas 219 218 "~~- -..~...,..,.."".,~~-".~~- . ~.--~_I- ----~-_. ."""",_ _ .-A~"""' -_'" ' ' ' ' " ' ' ' ' ' ' ~' . ,.,.,,),,',..........• DESENVOLVIMENTO DE CATEGORIAS DE CODIFICAÇÃO As discussões sobre a duração ideal do intervalo e as vantagens de se deixarem de lado os dados são esotéricas para os investigadores que têm prazos a cumprir, "cadeiras" para terminar ou encontros destinados a partilhar os resultados. Imagine-se num grande ginásio com milhares de brinquedos espalhados pelo chão. Fo incumbido de os arrumar em pilhas de acordo com um esquema que terá de desenvolver. Pas seia-se pelo ginásio, olhando para os brinquedos, pegando neles e examinando-os. Há vária: maneiras de os arrumar em montes. Pode organizá-los por tamanhos, cores, país de origem data de fabrico, fabricante, material de que são feitos, tipo de brincadeira que sugerem, gruP( etário a que se destinam ou, ainda, pelo facto de representarem seres vivos ou objectos inani mados. Este tipo de actividade ilustra o que o investigador qualitativo faz ao desenvolver um sis tema de codificação para organizar os dados, embora a tarefa seja mais difícil. As situaçõe são mais complexas, os materiais a organizar não são tão facilmente separáveis em unidades não existem apenas objectos, nem o sistema de categorização se mostra tão auto-evidente 01 delimitado como no caso acima descrito. À medida que vai lendo os dados, repetem-se ou destacam-se certas palavras, frase, padrões de comportamento, formas dos sujeitos pensarem e acontecimentos. O desenvol virnento de um sistema de codificação envolve vários passos: percorre os seus dados na pro cura de regularidades e padrões bem como de tópicos presentes nos dados e, em seguida escreve palavras e frases que representam estes mesmos tópicos e padrões. Estas palavras 01 frases são categorias de codificação. As categorias constituem um meio de classificar o dados descritivos que recolheu (os símbolos segundo os quais organizaria os brinquedos), d forma a que o material contido num determinado tópico possa ser fisicamente apartado do outros dados. Algumas das categorias de codificação surgir-lhe-ão à medida que for reco lhendo os dados. Deve anotar estas categorias para as utilizar mais tarde. Como discutiremo em seguida, um passo crucial na análise dos dados diz respeito ao desenvolvimento de um lista de categorias de codificação depois de ter recolhido os dados e de se encontrar preparad l para os organizar. Quando nos referimos aos brinquedos no ginásio, mencionámos alguns esquemas qu podem ser utilizados na classificação. Os esquemas incluíam, por exemplo, os fabricantes e cor. Os símbolos (ou as categorias de codificação) para os fabricantes seriam algo com Mattel, Fisher Price, Creative Playthings; os símbolos para as cores seriam cor-de-rosa, azui vermelho, amarelo e multicoloridos. Se no ginásio lhe dissessem qual era o objectivo da clas sificação dos brinquedos - vamos imaginar que era, por exemplo, o de reenviar os brinquedo aos respectivos fabricantes -, a tarefa de desenvolver os códigos estaria simplificada (po fabricante). O desenvolvimento de sistemas de codificação na investigação qualitativa encerr parâmetros semelhantes. Determinadas questões e preocupações de investigação dão origem determinadas categorias. Algumas abordagens teóricas e disciplinas académicas sugerer determinados esquemas de codificação. Ultrapassa o âmbito deste livro a descrição de todas a categorias de codificação e as abordagens teóricas que podem ser utilizadas no desenvolvi mento dos sistemas de codificação. Iremos fomecer-lhe uma lista de famílias de códigos, con o intuito de lhe mostrar algumas das formas através das quais a codificação pode ser realizada 220 221 IJ Análise após a recolha de dados A cabou de dactilografar as notas de campo relativas à sua última observação e começa a arquivá-las. À sua frente está todo o material que diligentemente recolheu. Instala-se um sentimento de vazIO quando pergunta a si próprio "E agora, o que é que eu faço?". Muitos observadores experientes sabem o que fazer - fazem um intervalo. Deixam o material assentar, partem para férias ou fazem as coisas que não puderam fazer por estarem tão ocupados com a recolha de dados, e só voltam depois, frescos e mais descansados. Há muito a dizer quanto a não atacar o trabalho de análise imediatamente. Pode distanciar-se dos detalhes do trabalho de campo e ter assim a oportunidade de perspectivar as relações entre os assuntos. Ganhará um entusiasmo renovado pelos dados que se podem ter tomado, entretanto, aborrecidos. Tem, igualmente, a oportunidade de ler e de digerir outras ideias. Contudo, fazer um intervalo demasiado longo tem os seus contras. Adiar o trabalho mais difícil pode transformar-se numa armadilha. Pode, também, fazer com que perca o contacto com o conteúdo das suas notas. O pior revés diz respeito à possibilidade de ter de voltar ao campo de investigação para recolher mais dados, e retomar esse trabalho será tanto mais problemático quanto maior for o intervalo. Os sujeito são difíceis de localizar, podem já não se encontrar no local ou a situação pode não ser igual à que deixou. I As famílias ou os tipos de códigos que iremos apresentar foram elaborados expressamente para esta discussão. Não representam convenções de codificação universalmente definidas. As famílias sobrepõem-se. Não se preocupe em perceber a que família pertencem os códigos particulares que desenvolveu. O nosso objectivo consiste em ajudá-lo a compreender o que são códigos e a desenvolver algumas ideias particulares sobre as possibilidades de codificação e não em apresentar-lhe um esquema exaustivo de que se possa servir. Relativamente a cada família de codificação definiremos o que queremos dizer por tipo, discutiremos os tipos de dados que podem ser classificados através dela, explicaremos quando é que cada uma destas famílias pode ser mais utilizada e apresentaremos um exemplo de um conjunto de dados que pode ser adequadamente codificado sob categorias que representam a família. Em certos estudos e em presença de determinadas preocupações, enquanto investigador, poderá basear-se apenas num dos tipos mencionados, excluindo todos os outros. Noutros estudos, as categorias são mistas. Não se esqueça que cada conjunto de dados pode ser codificado de acordo com mais de uma categoria de codificação extraída de mais de uma família de codificação. As famílias de codificação apresentadas deverão proporcionar-lhe alguns instrumentos para o desenvolvimento de categorias de codificação que lhe serão úteis na classificação dos seus dados. Códigos de contexto. Este termo refere-se aos códigos segundo os quais a maior parte da informação sobre o contexto, a situação, o tópico ou os temas podem ser classificados. O material que lhe permite contextualizar mais amplamente o seu estudo pode ser encontrado sob estes códigos. Na maior parte dos estudos, um código é suficiente para abarcar este material. Sob este tipo de códigos pode ser colocada a maioria da bibliografia descritiva (panfletos, brochuras, anuários) sobre a situação, tema ou tópico, bem como os artigos dos jornais locais e outros meios de divulgação. Para além disto, as afirmações gerais que as pessoas fazem ao descreverem a situação, o tema ou a forma como a situação se adequa à comunidade envolvente também podem ser incluídos nestes códigos. De igual modo, a estatística descritiva e outros dados quantitativos que descrevem a situação também podem ser codificados sob esta rubrica. Certos códigos desta família poderão ser rotulados como: "Descrições de Escolas Primárias"; "Liceu Midcity". A denominação específica da codificação dependerá do seu tema. Segue-se um exemplo de um conjunto de dados que pode ser codificado nesta categoria. Consiste numa afirmação proferida por um director de um liceu, o qual descreve a escola que dirige a um investigador no seu primeiro dia de trabalho: escola da região. Nesta escola o sucesso escolar é maior do que em qualquer outra. Relativamente ao futebol a história muda de figura. Tem-nos dado muito trabalho treinar uma equipa. Deixe-me dar-lhe uma lista dos nossos alunos que foram colocados no ensino universitário. Vou-lhe dar, igualmente, em brochura, uma descrição da nossa filosofia, objectivos e programas." Este material cedido ao investigador também seria codificado de acordo com o código de contexto. Códigos de definição da situação. Neste tipo de código o objectivo é o de organizar conjuntos de dados que descrevam a forma como os sujeitos definem a situação ou tópicos particulares. Está interessado na visão que os sujeitos têm do mundo e na forma como se vêem a si próprios em relação à situação ou ao tópico em causa. O que é que eles esperam atingir? Como definem aquilo que fazem? O que é importante para eles? Têm determinadas convicções que influenciam a forma como definem a sua participação (religiosas, políticas, de classe social, feministas, movimento pela vida)? Há vários tipos de participantes: estudantes universitários, alunos de liceu, administradores, bem como pais. Poderá ter necessidade de formar uma categoria de codificação para cada tipo de participantes. É possível existirem outras características distintivas entre os vários participantes que venham a servir de base para a construção das categorias de codificação. Alguns códigos de "Definição da Situação" construídos num estudo sobre as percepções que as mulheres tinham sobre as suas próprias experiências na escola primária incluíam "Consciência Feminista", "Imagens do Eu Actual" e "Influências na Interpretação do Passado" (Biklen, 1973). Um exemplo de dados que encaixam nesta família é ilustrado pela seguinte afiImação de uma professora, a qual foi codificada dentro da categoria "Percepções do Professor acerca do seu Trabalho"; "Para mim, o ensino é a minha vida. Não separo ambos. Muitas vezes no duche penso: "E se eu apresentasse o material desta maneira e não da maneira que apresentei o ano passado?". Por vezes. passam-se vinte minutos no duche sem eu dar por isso. O meu marido pensa que eu sou louca, mas ele é exactamente como eu. Não somos Ias de festas, nem de férias; o trabalho é realmente a razão de ser das nossas vidas." "O Liceu Johnson tem 850 alunos. Cerca de noventa por cento destes conseguem entrar na universidade. A comunidade que servimos pertence essencialmente a uma classe média-alta, cuja educação foi particularmente estimulante e que deseja o mesmo tipo de educação para os seus filhos. Despendemos mais dinheiro por aluno do que qualquer outra Perspectivas tidas pelos sujeitos. Esta família inclui códigos orientados para formas de pensamento partilhadas por todos ou alguns sujeitos, mas que não são tão gerais como as perspectivas que têm sobre a definição geral da situação, embora revelem convicções concernentes a aspectos específicos da situação. Incluem regras e normas partilhadas, bem como pontos de vista mais gerais. Muitas vezes estas perspectivas são reveladas em certas 222 223 I frases que os sujeitos utilizam. As duas frases que expomos seguidamente foram muitas vezes proferidas num estudo sobre uma unidade de cuidados intensivos de um hospital universitário. Elas revelam ideias partilhada, tomado-se códigos para classificar os dados: o excerto que se segue faz parte de um estudo sobre um liceu urbano que contém material codificado de acordo com "pensamentos dos sujeitos sobre pessoas e objectos"; neste caso, relativo "às definições que fazem uns sobre os outros": "Nunca se sabe" (referindo-se ao facto de não ser possível prever o que vai acontecer ao paciente). "Seja honesto, mas não cruel" (referindo-se à necessidade de informar os pais, sem utilizar um discurso que os possa preocupar). Seguidamente apresentamos um conjunto de dados obtidos no estudo e que foram codificados como "Nunca se sabe": "A Jody começou a conversar sobre os outros professores da escola. Afirmou: 'Os professores nesta escola são todos boa gente. Não estou a ver nenhum com quem não gostasse de conversar. É claro que existem diferenças. Há aqueles que passam a vida a queixar-se - acham que os miúdos vão todos parar ao inferno - eles fazem o que devem fazer, os miúdos é que são insuportáveis. Normalmente não fazem nada para ajudar os miúdos que descarrilam - neste liceu há um grupo como este. Andam sempre juntos - são todos homens. Alguns gozam - são mesmo conservadores. Depois há aqueles que tapam os buracos - nunca desistem e estão sempre prontos a fazer mais do que a sua obrigação... '" "Eu estava com a Carol, uma médica interna. Ela estava a trabalhar com o 'bebé Hopkins' tentando aplicar-lhe o soro. A enfermeira Joan entrou e disse-me 'se quiser perceber o que é que isto é, venha aqui para fora'. Segui-a até ao átrio onde se encontravam mais três enfermeiras perto do gabinete de enfermagem. debruçadas sobre uma miúda a gatinhar. Ao seu lado encontrava-se uma mulher que supus ser a sua mãe. Ela usava um bonito vestido. A criança vestia um macacão e uma camisa a condizer. A Joan segredou-me: 'Ela está a evoluir muito bem. Veio à consulta. Quando cá entrou não era maior que o bebé Hopkins. Não sabíamos se sobreviveria. Olhe para ela - está a ver, com estes miúdos nunca se sabe.'" Pensamentos dos sujeitos sobre pessoas e objectos. Esta família aponta para códigos que revelam a percepção que os sujeitos têm uns dos outros, das pessoas estranhas ao serviço e dos objectos que constituem o seu mundo. Por exemplo, os professores detêm definições sobre as características dos seus alunos. Aos seus olhos há vários tipos de alunos. Num estudo realizado num jardim infantil, um investigador verificou que as educadoras viam alguns dos seus alunos como "imaturos" e outros como "prontos para o ensino primário". Para além disto, as crianças eram categorizadas de acordo com aquilo que vestiam e de acordo com a avaliação que as educadoras faziam sobre o ambiente familiar. "A Forma das Educadoras Verem os Alunos" foi uma categoria de codificação para este estudo. No nosso estudo sobre a unidade de cuidados intensivos para recém-nascidos num hospital universitário, verificámos que os membros da equipa categorizavam os bebés de acordo com um esquema sofisticado, baseado em algumas classificações relevantes para determinadas fases da passagem do recém-nascido por essa unidade. Algumas das categorias referidas foram: "comem e dormem", "não viáveis", "muito doentes", "bonzinhos", "crónicos" e "mamões". No mesmo contexto, os pais eram vistos como "cooperativos", "não cooperativos" e "perturbadores". Neste estudo, "os pacientes aos olhos do pessoal médico" e "os pais aos olhos do pessoal médico" constituíram categorias de codificação. Não são só as pessoas que são alvo de classificação; num outro estudo chegou-se a classificar diferentes tipos de lixo. 224 I Códigos de processo. Os códigos de processo referem-se à codificação de palavras e frases que facilitam a categorização das sequências de acontecimentos, mudanças ao longo do tempo ou passagens de um tipo ou género de estatuto para outro. Para a utilização de um código de processo o investigador deve ver a pessoa, grupo, organização ou actividade num contínuo temporal e percepcionar a mudança que ocorre numa sequência de pelo menos duas partes. Os códigos de processo típicos apontam para períodos de tempo, estádios, fases, passagens, passos, carreiras e cronologia. Adicionalmente, os pontos-chave de uma sequência (e.g. pontos de viragem, transições) podem ser incluídos na família dos códigos de processo (ver Roth, 1963). Os esquemas de codificação de processo são comummente usados na ordenação das histórias de vida. As categorias de codificação são os períodos da vida do sujeito que parecem separar segmentos importantes. Uma história de vida de uma pessoa que dê ênfase à sua educação pode incluir categorias de codificação como: (1) infância, (2) mudança para Nova Jérsia, (3) o primeiro dia de escola, (4) a Sr.ª Nélson, (5) escola primária depois da Sr.ª Nélson, (6) as primeiras semanas no ciclo, (7) tomar-se adolescente e (8) para além do ciclo. Note que os códigos que aqui se sugerem reflectem o modo como o sujeito ordenou a sequência da sua vida. Os códigos não são o reflexo de períodos uniformes de tempo ou outro tipo de períodos impostos pelo investigador. No desenvolvimento de sistemas de codificação de histórias de vida o esquema de classificação do sujeito dita normalmente os códigos. Os esquemas de codificação de processo são também comummente usados para elaborar os dados em estudos de caso organizacionais. Neste caso, a mudança na organização ao longo do tempo é o foco de interesse. De modo semelhante, estudos de intervenção social planeada podem ser codificados com um esquema de codificação cronológica. A codificação cronológica é da história. Enquanto que em alguns estudos dominam as categorias de codificação de processo, noutros, estas são apenas uma de entre outras abordagens utilizadas. No estudo de uma IQE-15 225 sala de aula, por exemplo, os seguintes cabeçalhos sugerem categorias de codificação que podem ser usadas em adição a códigos de outras famílias: "estádios na carreira de um professor", "o ano escolar", "a semana escolar", "passos na aceitação por um grupo de colegas adolescentes" e "o processo de abandono da escola". Um exemplo de uma unidade de dados que pode ser codificada na categoria de processo "estádios na carreira de um professor" é o seguinte: "Já aqui estou há cinco anos. Embora não me sinta uma veterana como a Marge e a Sue, também não sou ingénua. Quando vejo estes professores a chegar digo para mim própria: 'Hão-de aprender. Eu também aprendi'" Códigos de actividade. Os códigos que são dirigidos a tipos de comportamento que ocorrem regularmente designam-se por "códigos de actividade". Estes comportamentos podem ser relativamente informais e proporcionar códigos, tais como "estudantes a fumar", "brincadeiras" ou "mostrar filmes", ou comportamentos que ocorrem regularmente e que são uma parte formal do meio, tais como "exercícios matinais na escola", "almoço", "presença", "idas dos estudantes ao gabinete do director", "viagens da turma" e "conferência sobre casos individuais de educação especial". As unidades de dados que podem ser codificadas dentro destas categorias são bastante óbvias. Apresenta-se de seguida uma unidade tirada de um estudo de um programa de educação especial numa escola do ensino básico. Diz respeito a uma reunião sobre a colocação de uma criança numa turma para crianças com perturbações emocionais. "Embora a reunião fosse suposta começar às 11 horas. não estavé'ünguém na sala quando cheguei, às 11 horas e 5 minutos. (C.O.: Este é o terceiro encontro a que venho e os outros começaram dez minutos mais tarde, com metade das pessoas presentes.) A primeira pessoa a chegar foi o Dr. Brown." ção: "o despedimento de um professor", "uma greve de professores", "o motim" e " uma festa da escola". Um exemplo de uma unidade de dados codificada como código de acontecimento, "o motim", aparece a seguir. Foi tirada de uma conversa com um professor. "No dia em que tivemos sarilho havia mais carros da Polícia do que alguma vez se tinha visto. A maior parte dos miúdos não soube o que aconteceu. O sargento Brown não estava para brincadeiras. As coisas tinham ido longe de mais. A escola ainda não se restabeleceu." Códigos de estratégia. As estratégias referem-se a tácticas, métodos, caminhos, técnicas, manobras, tramas e outras formas conscientes de as pessoas realizarem várias coisas. Os professores, por exemplo, empregam estratégias para controlar o comportamento dos estudantes, para ensinar a ler, para completarem o ano, para se livrarem de tarefas burocráticas ou para conseguirem as turmas que desejam. Os estudantes empregam estratégias para passar nos testes, para conhecerem amigos ou para negociar exigências conflituosas. Os directores utilizam estratégias para se livrarem de professores, para criarem novos lugares ou para reduzir o absentismo. Seguidamente apresenta-se uma citação do que pode ser codificado como um código de estratégia do tipo "técnicas para controlar a turma": "A Sr.' Drake entrou na turma. Ninguém estava no seu lugar. Estavam todos em pé a falar, alguns deles alto. A Jamie tinha o rádio ligado. A Sr' Drake disse, num tom de voz de quem fala normalmente, mas que indicava que estava aborrecida: 'Vamos começar'. Esperou um momento; não aconteceu nada. Então, debruçou-se para o Jason e disse algo que eu não consegui ouvir. Nessa altura ele disse, numa voz alta e cantada: 'Anúncio! Anúncio' Vou fazer um anúncio!'. Todos pararam de falar e olharam para o Jason. Ele disse: 'A aula começou. Acalmem-se.' Todos se sentaram. Leon disse alto: 'Jason, meu, devias ganhar um ordenado'. A Sr.' Drake disse, com um sorriso: 'Não sabiam?'." Códigos de acontecimento. Estes tipos de código são dirigidos a unidades de dados que estão relacionados com actividades específicas que ocorrem no meio ou na vida dos sujeitos que está a entrevistar. Os códigos de acontecimento apontam para acontecimentos particulares que ocorrem com reduzida frequência ou apenas uma vez. Por exemplo, num estudo que um dos autores realizou, que envolveu a entrevista de mulheres acerca das suas experiências na escola primária, o início da menstruação foi um acontecimento mencionado por todas as mulheres (Biklen, 1973). Este acontecimento tomou-se uma categoria de codificação. No decurso de estudos de observação participante, os acontecimentos que se transformaram em categorias de classificação são aqueles que suscitam uma boa parte da atenção e de discussão pelos sujeitos. Os acontecimentos que ocorreram antes da sua investigação podem ser tópicos frequentes. Em alguns estudos de observação participante os acontecimentos seguintes tornaram-se categorias de codifica- Códigos de relação e de estrutura social. Os padrões regulares de comportamento entre pessoas não oficialmente definidos pelo mapa organizacional são aqueles que agrupamos como "relações". As unidades de dados que o dirijam para cliques, amizades, romances, coligações, inimigos e mentores/estudantes são o que designamos por códigos de relação. As relações definidas de forma mais formal, aquilo que os cientistas sociais designam por papéis sociais, meios sociais e posições, representam outra parte desta famí- 226 227 I É importante não imputar motivos aos comportamentos das pessoas ou, se o fizer, ter consciência de que se está a fazê-lo. Se percepcionar os comportamentos como estratégias e tácticas, certifique-se que diferencia entre o seu juízo e o dos outros. lia de codificações. A descrição total das relações num meio é a "estrutura social". A codificação neste domínio leva ao desenvolvimento de uma descrição de estrutura social. A seguinte unidade de dados está relacionada com relações e podia ser codificada num código de relações/estrutura social como "amizades dos estudantes": pessoas para explorar programas particulares ou aspectos de um meio ou de um sujei Nesse caso, as categorias de codificação podem ser mais ou menos determinadas. Nl estudo que fizemos sobre o ensino integrado de jovens com deficiências, desenvolverr uma lista de tópicos (figura 5-4) acerca dos quais as pessoas que faziam a investigaç deveriam recolher dados. Mais tarde, estes tópicos transformaram-se em categorias codificação. Muitos esquemas de codificação da investigação avaliativa são afectados I (e às vezes são) um reflexo directo do acordo estabelecido entre os patrocinadores da vestigação e as pessoas que a realizam. Neste caso, os códigos são estabelecidos 1 acordo. "A tunna veio da sua sala de aula. Um grupo de quatro rapazes - Tim, Harry, Peter e Brian - estava à porta, meio sentados sobre as carteiras e a falar. Fizeram a mesma coisa ontem. A Mary e a Sue entraram juntas e sentaram-se ao lado uma da outra, tal como a Beth e a Allison. (C.O.: Os rapazes parecem andar em grupos. Por outro lado, as raparigas parecem fonnar pares. Tenho de verificar isto. Alguns dos miúdos parece não terem a ver uns com os outros, enquanto outros estão juntos regulannente...)" INFLUÊNCIAS NA CODIFICAÇÃO E NA ANÁLISE Códigos de métodos. Esta família de códigos identifica material pertinente para os procedimentos de investigação, problemas, alegrias, dilemas e coisas semelhantes. Para a maior parte dos estudos, basta um código, "métodos". No entanto, alguns investigadores tomam a sua investigação num estudo da metodologia, focando-se na maneira como conduzem a investigação, em vez de num tópico substantivo ou teórico do meio (Johnson, 1975). Neste caso, todas as categorias de codificação se relacionam com os métodos. Os vários títulos de capítulo e secções deste livro poderiam ser códigos de um tipo de estudo desse género. De facto, este livro é o produto das nossas experiências de investigação e, na sua preparação, lemos do princípio ao fim os dados que nós e os nossos estudantes recolhemos. Por isso, de certa maneira, as divisões deste livro são um sistema de codificação com o qual organizamos os nossos dados. Como sugerimos anteriormente, em qualquer estudo utiliza-se mais do que uma família de codificação. As pessoas que fazem estudos metodológicos podem utilizar "códigos de processo" para organizar os seus dados; a sequência das actividades de investigação são os códigos (plano, escolha de um local, estabelecimento da relação, análise). Usualmente, os comentários do observador formam a parte principal das unidades de dados que são codificadas como "métodos". A seguir, apresenta-se um exemplo de um comentário do observador relativo a um estudo de um programa pré-escolar que pode ser codificado como "métodos": Propusemos categorias de codificação para lhe dar ideias acerca do que procu' quando proceder a codificações. Tais sugestões oferecem apenas alternativas acerca que procurar. Contudo, isto não implica que a análise surja exclusivamente a partir c dados e não das perspectivas que o investigador possui. Pois são os valores sociais e maneiras de dar sentido ao mundo que podem influenciar quais os processos, actividad acontecimentos e perspectivas que os investigadores consideram suficientemente imp' tantes para codificar. Figura 5-4 - GUIA DE OBSERVAÇÃO PARA O ESTUDO DE CASOS [ ENSINO INTEGRADO* A seguir apresentam-se as áreas gerais em que deve recolher dados com tópicos específi( listados dentro de cada área geral. Estamos ínteressados em informação relativa a detemüm área apenas se ela se relacionar com o ensino integrado e com crianças com deficiências. I exemplo, se a escola tem uma reputação de ser, em geral, inovadora, estamos interessados nela, medida em que nos pode dar infonnação acerca da disposição do pessoal para a mudança. DESCRiÇÃO DA ESCOLA (PARA PROPORCIONAR ALGUMAS PÁGINAS, AFIRMAÇÃO RELATIVA AO CONTEXTO) Sinto-me tão estranho neste meio com todas estas crianças de 3 e 4 anos. Não tenho responsabilidades fonnais, o que me faz sentir pouco à vontade. Ontem, quando fomos visitar um museu, tentei ser como uma das crianças. Fiz um comboio com elas, etc. Não resultou. Senti-me particulannente desconfortável quando o meu pequeno companheiro de comboio se recusou a pegar na minha mão quando eu lha dei. Todos os outros parceiros estavam a dar as mãos.) (C.O.: -Físico ·Histórico ·População estudantil .Vizinhança ·Professores ·Distinções especiais ·Reputação ·Pessoas conhecidas que andaram na escola ou que estão ligadas à escola •Localização Sistemas de codificação preestabelecidos. Como discutimos no capítulo II sobre o planeamento e a investigação avaliativa, os investigadores podem ser empregues por outras 228 229 r~-'-"'-~~-----~"""~"~-' ~_._.~_._, _.~ .... .......s.,. """' - .......- ~~_.,'~iiMI iOIIl_nf.líIiIl·IIUílillII ' " . , , '• • A TURMA OU PROGRAMA •Localização na escola 'A sua história - como e quando começou com as crianças com deficiências (e.g .. procedimento de colocação, como é que a criança foi escolhida, envolvimento dos professores, escolha dos pais) -Descrição física da sala -uso do espaço (e.g., centros de aprendizagem, compartimentos separados, etc.) 'adaptação do espaço e equipamento da sala para crianças deficientes -coisas nas paredes .arranjo dos lugares/localização da secretária do professor -Organização - incluindo autoridade (tomada de decisão), dispersão das pessoas ligadas aos recursos, etc. ·Resultados escolares -Programas e oportunidades de formação O PROFESSOR E/OU OUTRO PESSOAL -Estilo -Descrição física •História do professor -Perspectiva que tem sobre o que está a fazer, especialmente como é que ele tenta integrar as crianças com deficiências .Perspectiva sobre a integração, sobre as crianças com deficiências, a administração, pais, etc. O que é que contribui para uma integração bem sucedida? -O que é que o levou a ver as coisas tal como as vê? -Dia típico -Relação com as crianças normais e com as crianças com deficiências -Pessoal adicional na sala (auxiliares, professores em fase de aprendizagem) -Pessoal dos recursos que se relaciona com a sala (o seu papel, perspectiva) 'Utilização de professores "especiais" - arte, música, ginástica -, como é que se relacionam, perspectiva, importância para o programa de ensino integrado -Relação com outros colegas dos professores regulares (como são vistos, equipa, apoio) -Quem é que o professor percepciona como apoiante AS CRIANÇAS DEFINIDAS COMO DEFICIENTES -Até que ponto aquilo que eles fazem é igualou diferente do que fazem as crianças normais -Relação com os colegas - quem são eles (sociometria); como são afectados pelos professores -Dia típico -Descrição física -Descrição clínica (severidade da deficiência; independência) -História escolar e familiar ·Como é que os outros membros da sala os tratam e o que pensam acerca deles 'Localização física - onde estão sentados. etc., em relação aos professores e às outras crianças ·Palavras que os outros usam para os descrever 230 _-I 'Como é que o professor define o progresso da criança (igualou diferente dos outros), equilíbrio entre os objectivos académicos e os objectivos sociais 'PEI (Plano de Ensino Individualizado) 'Quantidade e natureza do contacto com o professor (comparar com os normais) CRIANÇAS NORMAIS -Descrição física -Descrição académica 'Modo de vestir 'Backgroulld -Como se dão umas com as outras e com o professor CURRÍCULO 'Conteúdo (materiais utilizados, qualquer equipamento para promover a adaptação, equipamento individualizado") 'Processo (todo o grupo, pequenos grupos, individualizado, um a um, integrado ou os deficientes têm atenção separadamente) ·Quantidade de tempo passado com os deficientes em comparação com os estudantes normais ·PEI (existe um, quem o escreveu, é executado, é apropriado?) PAIS ·Natureza e quantidade de contacto do professor com os pais ·Os pais foram consultados sobre a colocação da criança no programa integrado" -Contribuição dos pais para a classe e para o programa das crianças -Participação dos pais no PEI da criança deficiente 'Perspectiva dos pais em relação ao ensino integrado e ao sucesso do programa DIRECTOR E OUTRO PESSOAL DE APOIO E ADMINISTRATIVO -Qual a sua parte e relação com o programa (incluindo a iniciação, colocação da criança, contacto com os pais, etc.) -A sua definição da turma e do programa, incluindo se e porque é que é um sucesso -Descrição das coisas feitas ou não em apoio à turma ou ao programa (incluindo materiais, recursos com o pessoal, relações públicas positivas, desenvolvimento de oportunidades de formação) * Esta figura foi compilada por Robert Bogdan e Ellen Bames. Os fundos para esta investigação foram obtidos através de uma bolsa do National Institute ofEducation, NIE N.o. 400-79-0052. As diferentes perspectivas teóricas dos investigadores modelam a forma como abordam, consideram e dão sentido aos dados. O feminismo, por exemplo, considerado como 231 Como é que se manipulam os dados depois de terem sido recolhidos~ Lembre-se de que por "dados" entendemos as páginas de materiais descritivos recolhidos no processo de trabalho de campo (transcrições de entrevistas, notas de campo, artigos de jornal, dados oficiais, memorandos escritos pelos sujeitos, etc.). Os seus próprios memorandos, notas de pensamentos que teve, comentários do observador, diagramas e a compreensão que adquiriu e registou devem ser manipulados da mesma maneira. Por manipulação mecânica dos dados entendemos as maneiras de classificar o material em pilhas, pastas separadoras ou ficheiros de computador, de modo a facilitar o acesso às suas notas. Deve organizá-Ias de modo a ser capaz de ler e recuperar os dados à medida que se apercebe do seu potencial de informação e do que pretende escrever. As técnicas de trabalhar mecanicamente com os dados são inestimáveis porque dão uma direcção aos seus esforços após o trabalho de campo, e, por isso, tomam manejável algo de potencialmente complexo. Ter um esquema é crucial; não importa o esquema particular que escolher. Descreveremos duas maneiras de classificar os materiais. Têm muito em comum e a que escolher depende de quão detalhada é a sua análise, da sua preferência pessoal, dos recursos que terá disponíveis (ajuda de um secretariado, dinheiro, computador, tempo), da quantidade de dados que tiver, bem como dos seus objectivos. Existem outras maneiras de manipular a análise para além destas três. Alguns investigadores não fazem muito trabalho mecânico com os seus dados. Têm uma visão de conjunto, o que quer dizer que observam os dados e escrevem de memória. Esta técnica pode scr eficaz se se trata de um pequeno conjunto de dados e se os objectivos são limitados mas, mesmo assim, não lhe recomendamos esta abordagem. É difícil, se não impossível, pensar profundamente acerca dos dados sem que estes tenham sido classificados. Partimos do princípio que seguiu as nossas sugestões quando discutimos as notas de campo, por isso as suas notas e transcrições têm uma margem larga e o texto está dividido em muitos parágrafos. O primeiro passo de ambos os métodos envolve uma tarefa relativamente simples: rever todas as páginas e numerá-Ias sequencialmente. Os dados são usualmente numerados por ordem cronológica de acordo com o momento em que foram recolhidos mas, se tiver diferentes tipos de dados (de entrevistas, notas de campo, documentos oficiais), pode querer numerá-los de modo a juntar tipos de material semelhantes. Não faz muita diferença. O objectivo é facilitar a localização do material que deseja. O mais importante é não ter mais do que uma página com o mesmo número. Depois dos dados estarem ordenados numericamente no papel, certifique-se de que os revê pelo menos duas vezes. Recomendamos que não seja perturbado durante a realização desta tarefa porque se a sua concentração é continuamente perturbada por outras tarefas é pouco provável que consiga obter uma noção da totalidade dos seus dados. Dê particular atenção aos comentários do observador e aos memorandos. Enquanto está a ler deve começar a desenvolver uma lista preliminar de categorias de codificação. Tenha um bloco de papel ao seu lado e, à medida que os possíveis códigos surgem, escreva-os. Também deve escrever notas para si próprio que possam incluir listas de ideias e diagramas que esbocem as relações de que se aperceber (Miles e Huberman, 1984). Ao desenvolver códigos procure as palavras e frases que os sujeitos utilizam e que não lhe sejam familiares, ou que são utilizadas de uma forma a que não está habituado. Este vocabulário especial pode indicar aspectos do meio que possam ser importantes explorar. Se as frases não constituírem por si só categorias de codificação, destaque palavras específicas e tente agrupá-Ias dentro de um código genérico. (Para uma boa discussão de uma forma de realizar esta tarefa ver Spradley, 1980.) Depois de criar as categorias preliminares de codificação, dê-lhes abreviaturas (ou números) e depois leia novamente os seus dados por inteiro, atribuindo as abreviaturas (ou números) das categorias de codificação às unidades de dados, à medida que faz a leitura. Por unidades de dados queremos dizer partes das suas notas de campo, transcrições ou documentos que caem dentro de um tópico particular representado pela categoria de codificação. As unidades de dados são usualmente parágrafos das notas de campo e das transcrições de entrevistas, mas por vezes podem ser frases ou uma sequência de parágrafos. A sua primeira tentativa para atribuir as categorias de codificação aos dados é na realidade um teste da viabilidade das categorias que criou. As categorias de codificação podem ser modificadas, podem-se desenvolver novas categorias, e as categorias anteriores podem ser abandonadas durante este teste. É importante reconhecer que você não está a tentar arranjar o sistema de codificação certo, ou mesmo o melhor. O que está certo ou o que é melhor difere de acordo com os seus objectivos. Pode olhar novamente para os dados, depois de ter completado mais projectos de investigação, e codificá-los de fOfila diferente. 232 233 um conjunto liberto de valores sociais, tem mudado a forma como consideramos o sexo enquanto categoria de análise. Smith (1987) tem argumentado que o feminismo não afectou apenas os escrúpulos e a sensibilidade ao fazer entrevistas, tal como sugerimos no capítulo IV, mas, mais importante do que isso, afectou a análise, isto é, o sentido que os investigadores dão aos dados. Sempre que fazemos análises somos, usualmente, parte do diálogo acerca do tópico que estamos a considerar. Por isso, podemos analisar e codificar o nosso tópico de várias formas diferentes. Um dos autores efectuou um estudo acerca das perspectivas que professoras do ensino básico tinham do seu trabalho. A sua análise foi conduzida tendo como pano de fundo uma literatura sociológica que diminuía o trabalho das mulheres enquanto professoras porque, comparado com o dos homens, as mulheres não pareciam mostrar dedicação ao seu trabalho (Biklen, 1987, no prelo). Por isso, a análise é moldada pelas perspectivas e posições teóricas do investigador e pelas ideias que este partilha acerca do assunto. AS FORMAS DE TRABALHAR OS DADOS ~-,- 0''''~~-'.T---_'_-'_7_ -"",,-~_- ~,I~_~ . _------~------------,~-~"""' __ -.. .. ---~,,""".-~4:na .·iiíTi"'iiiT--CiWl"'- , Tente desenvolver um sistema de codificação com um número limitado de códigos, por exemplo, entre trinta e cinquenta. Os códigos devem englobar tópicos para os quais haja muito material, bem como tópicos que quer explorar. Ensaie diferentes possibilidades de codificação. Depois de ter arranjado uma nova lista, volte a testá-la. Pense sobre as possibilidades de escrita que o novo esquema lhe proporcionar. Pode até tentar esboçar um artigo com as categorias de codificação como tópicos ou secções e ver se resultam para si. Pode sentir-se indeciso. Os dados que tem podem ser vagos para os seus interesses. Reformule tendo em vista aquilo de que já dispõe; pode ficar com uma lista de códigos que é extremamente longa. Tente encurtá-la. Se tiver mais do que cinquenta categorias principais, elas provavelmente vão se sobrepor. Embora seja difícil deitar fora dados e categorias, a análise é um processo de redução de dados. As decisões para limitar os códigos são imperativas. E numa certa altura - de preferência nesta altura do processo analítico - os seus códigos devem tomar-se definitivos, ao menos para este projecto de investigação. Os códigos categorizam a informação a diferentes níveis. Os códigos principais são mais gerais e abrangentes, incorporando um vasto leque de actividades, atitudes e comportamentos. Os subcódigos dividem os códigos principais em categorias mais pequenas. Num estudo de carreiras de mulheres com vida profissional e familiar relativamente a ter filhos depois dos 30 anos, o código principal "cuidados com as crianças" também incluía cinco subcódigos: história das; finanças; negociação das; preferências; e responsabilidade por. Um estudo relativo às relações entre o sexo e o ensino incluía um código principal de "relações colegiais". Os subcódigos para esta categoria, -apoio, cont1ito, e transição analisavam mais pormenorizadamente as relações dos professores entre si em diferentes tipos. Para desenvolver subcódigos, decida primeiramente quais os códigos principais e depois leia todo o material incluído dentro de cada código. Se o código consistir em material que se pode dividir para manipular de forma mais conveniente, desenvolva subcódigos para levar a sua análise mais longe (ver Strauss e Corbin, 1990). Depois de ter desenvolvido as categorias de codificação, faça uma lista e atribua a cada uma abreviatura ou um número. Algumas pessoas organizam a lista por ordem alfabética ou por categorias relacionadas com o grupo, antes de fazer as abreviaturas ou de atribuir os números. Tal procedimento pode ser útil porque facilita a memorização do sistema de codificação. (Ver na figura 5-5 o sistema de codificação usado num estudo de um programa de treino para desempregados crónicos.) Agora, percorra todos os dados e marque cada unidade (parágrafo, frase, etc.) com a categoria de codificação apropriada. Isto envolve escrutinar as frases cuidadosamente e decidir a que códigos pertence o material. Envolve tomar decisões que dizem respeito ao final de cada unidade e início de outra. Muitas vezes as unidades de dados sobrepõem-se e unidades específicas de dados cabem em mais do que uma categoria. Por isso muitas, se não a maioria, das unidades de dados terão mais do que uma abreviatura ou número de código ao seu lado. Quando atribuir abreviaturas ou números, certifique-se que indica com caneta ou lápis quais as frases que são exactamente englobadas pelo código. Incluí- mos um exemplo de notas de campo codificadas (figura 5-6) que indicam um método de como proceder. Normalmente, marcamos a cópia original das notas com as categorias de codificação, reproduzimo-la numa fotocopiadora, e depois guardamos o original para servir como cópia-mestra não adulterada. Depois deste ponto, as duas abordagens para a classificação dos dados tomam-se diferentes. A abordagem de cortar-e-colocar-em-pastas-separadoras. Uma forma de abordar a manipulação dos dados após este ponto é a de pegar numa tesoura e cortar as notas de modo a que as unidades de dados possam ser colocadas em pastas desdobráveis de cartão em que cada uma das divisões foi etiquetada com um código. Se utilizar este método precisa de realizar mais algum trabalho antes de começar a cortar. Veja todas as notas e coloque um número ao pé de cada unidade de dados codificada que corresponda ao número da página em que a nota aparece. É menos confuso se fizer um círculo à volta desse número ou qualquer outra marca, de modo a não confundir os números de codificação com os números das páginas. Os números das páginas permitir-Ihe-ão voltar a referir-se à cópia-mestra se surgir confusão no que diz respeito ao contexto original. Se os seus dados consistirem em transcrições de entrevistas, outro método possível é o de atribuir a cada entrevista um número e utilizá-lo para referência em vez dos números das páginas. Utilizar outros números que não os da codificação ajuda a evitar confusões (como 101, 102,103,104). Dado que algumas unidades de dados serão codificadas em mais do que uma categoria, será necessário mais do que uma cópia das notas. Faça isto depois de colocar o número da página ou da entrevista. Percorra todos os dados e veja quantas das unidades são multicodificadas. Se tiver muitas com, por exemplo, três códigos, e algumas com quatro códigos, pode querer fazer três e quatro cópias apenas das páginas que têm unidades com codificação múltipla. Isto poupa a despesa de ter de fazer diversas cópias completas. Tudo o que falta fazer é etiquetar as pastas desdobráveis de cartão com os códigos e encontrar uma caixa ou qualquer outro tipo de contentor para as guardar. Depois, é só cortar e meter nas pastas. A sugestão de uma caixa ou de qualquer outro contentor para guardar as pastas pode parecer bastante trivial, mas muitas das pastas conterão muitos pedaços de papel que cairão para o fundo, tomando-as difíceis de manipular e difíceis de manter na vertical. Algumas vezes, esclarecer pequenos assuntos como este pode poupar-lhe energia que pode ser dedicada a assuntos mais complexos da análise. Com todas as unidades de codificação nas respectivas pastas, pode querer reagrupá-las de acordo com algum esquema. Assim, tire as pastas para fora e estude atentamente o conteúdo de cada uma delas (discutiremos este aspecto de forma mais alargada no próximo capítulo). Não importa qual a que vai analisar em primeiro lugar. Pode querer pegar numa sobre a qual julgue saber bastante ou acerca da qual tem algumas ideias. Pode, por outro lado, querer ver a pasta mais cheia. À medida que trabalha com uma pasta específica e vê que padrões e temas surgem, pode classificar esses dados em pilhas e trabalhar (cont. na p. 237) 234 I 235 Figura 5-5 • CÓDIGOS UTILIZADOS NUM ESTUDO DE UM PROGRAMA DE TREINO PARA "DESEMPREGADOS CRÓNICOS" I. Presença dos estagiários 2. O centro de treino (aspectos físicos, reputação. outros programas) 3. Companhias que participam no programa 4. A definição que o pessoal dá do seu envolvimento S. Os estagiários vistos pelo pessoal 6. Os estagiários vistos pelos gestores de pessoal das companhias 7. Os empregos vistos pelos estagiários 8. Perspectivas dos estagiários sobre o emprego e o trabalho 9. Maneira como os estagiários vêem o pessoal 10. Visão que os estagiários têm dos outros estagiários e de si próprios II. Recrutamento dos estagiários (como e por que é que estão no programa) 12. Background dos estagiários 13. "As sobras" 14. Viagens a fábricas IS. O sucesso do programa (medição do sucesso, como é que o sucesso é visto por várias pessoas) 16. Método (entrada, etc.) 17. Cronicidade 18. Brincadeiras 19. Follow-up (seguimento) 20. Relacionamento entre os estagiários 21. "Mentiras" 22. "Abandonos" 23. Aconselhamento 24. Encontros para referenciação 2S. Chatices 26. "Matar o tempo" 27. Programas para a pobreza 28. "Treino no local de trabalho" 29. História do programa 30. Dificuldades dos estagiários 31. Pressas 32. "O custo do trabalho" 33. Crianças 34. Condições de vida da vizinhança 3S. Envolvimento das grandes empresas 36. "Aconselhamento" 37. Serviço de emprego do estado 38. Tempo (definição pelos estagiários do) 39. Dispersão 40. Dinheiro 41. O director 42. A televisão roubada 43. A Câmara do Comércio 44. Actividades de treino 236 .1 com eles. Se existir uma grande quantidade de dados num ficheiro, pode ser útil desenvolver subcategorias de codificação. Enquanto faz isto, esboce diferentes maneiras de pôr as coisas juntas, escrevendo listas e diagramas. Quando sentir que compreendeu os conteúdos de uma pasta, escreva brevemente sobre ela. Existirão conexões entre as pastas e quererá anotar estas conexões, por isso adie a escrita formal até examinar e ensaiar um certo número de pastas. As pessoas que utilizam esta abordagem para manipularem os dados recorrem, por vezes, a um grande quadro e dispõem os dados de cada pasta no quadro à medida que trabalham com eles. Necessitará de um grande espaço quando começar a examinar as pastas. o sistema dos cartões de ficheiro. Para manipular os dados com este método, o papel em que dactilografar as suas notas de campo originais e as transcrições tem de ter cada linha da página numerada consecutivamente, começando na primeira linha com o número I. O papel numerado desta maneira pode ser facilmente elaborado. Também precisa de um maço de cartões com o número de código, a frase correspondente e palavra escritas no topo. A seguir percorre os dados, registando nos cartões em que página e em que linhas na página se encontram as unidades de dados relevantes para a categoria. Pode ser útil pôr não só o número da página e a linha, mas também fazer uma nota ao lado da anotação no cartão que lhe diga algo sobre a unidade. Pode marcar "memorando", ou "comentário do observador" ou "citação". Se pensar que a unidade é particularmente valiosa, a anotação pode ser do género "p. 89 1.7-14 óptima citação" (ver CasseI!, 1978a). Este método tem diversas vantagens. Não requer o trabalho de ter de fazer múltiplas cópias, e não envolve a confusão de cortar e de ter ficheiros cheios. Algumas das desvantagens são: é difícil passar os olhos pelos dados porque tem de se encontrar cada pedaço dos dados, em vez de o ter mesmo à sua frente; a recuperação dos dados é laboriosa e. quando se tiram páginas de notas que contêm unidades de dados de um código específico, tem de se voltar a metê-Ias na ordem para tomá-Ias acessíveis no caso de haver uma codificação cruzada. Recomendamos esta abordagem quando se tem um pequeno conjunto de dados e um pequeno número de categorias de codificação. Dado que nenhum destes métodos recorre ao computador, uma das principais preocupações é a de manter os dados acessíveis. A indexação dos dados pode ajudar neste processo. Sanjek (1990) oferece-nos vários exemplos de diferentes tipos de índices usados por antropólogos. Num, os números de página das notas de campo são listados ao lado dos códigos individuais (e.g., nascimento ou crianças). Noutro, os números de página são listados ao lado das descrições do subcódigo de um código específico (classificações por idades do grupo da aldeia), em que a descrição poderia ser "discussão sobre o pagamento no mercado" (pp. 125, 129). Nesta forma de indexação, os números das páginas são listados ao lado das categorias de codificação. Outra forma de índice de codificação é apresentada na figura 5-7. Este exemplo é mais um quadro de conteúdos relativo aos dados, do que um verdadeiro índice, mas ajuda 237 A UTILIZAÇÃO DO COMPUTADOR PARA A ANÁLISE Figura 5-6 • NOTAS DE CAMPO CODIFICADAS o investigador a encontrar os códigos principais e subcódigos na narrativa e localiza-os no contexto do tipo de dados em que se encontram, e em que sessão de recolha de dados foram elaborados. O índice de codificação que utilizamos como exemplo é a primeira página de um usado num estudo sobre o sexo e o ensino. A maior mudança na metodologia de investigação na última década e meia tem sido a utilização de computadores para ajudar a registar, classificar e recuperar os dados (ver o número especial da Qualitati\'e Soci%gy sobre este tópico (Y. 7, n. o 1-2, 1984)). A Qualitative Soci%gy e a /nternationa/ Journa/ for Qualitative Studies in Education têm ambas textos regulares dedicados às aplicações dos computadores à investigação qualitativa. Já em 1987, um inquérito feito aos investigadores qualitativos revelou que 77% das pessoas que responderam diziam que usavam computadores na investigação (Brent, Scott e Spencer, 1987). Este número é actualmente indubitavelmente mais elevado. A utilização dos computadores na investigação qualitativa vai desde o simples processamento de texto até sofisticadas classificações e recuperações de dados (Tesch, 1989). A maior parte dos programas de processamento de texto têm opções de procura de palavras ou capacidades de indexação que permitem ao investigador localizar palavras ou códigos-chave em ficheiros de texto. Alguns programas têm gestores de bases de dados que podem ser úteis para os investigadores qualitativos. Estas são as formas mais simples de investigadores qualitativos; e as mais simples de utilização dos computadores para a classificação e recuperação mecânica. As formas mais sofisticadas e mais complexas envolvem programas especialmente concebidos para investigadores qualitativos que utilizam computadores mainframe de grande capacidade, como os grandes computadores de uma companhia ou universidade a que estão ligados os terminais (Shelly e Sibert, 1986). Os auxiliares mais utilizados na classificação, recuperação e noutras dimensões da análise mecânica de dados são os programas de software que foram concebidos especificamente para este fim. Existem programas para serem utilizados em computadores PC standard, tais como os IBM e IBM compatíveis (e.g., QUALPRO, TAP e ETHNOGRAPH) e programas concebidos para computadores Macintosh (HYPERQUAL). Aos estudantes que fazem cadeiras sobre investigação qualitativa pede-se-lhes, muitas das vezes, que utilizem o processamento de texto para registar e guardar os seus dados. Alguns professores encorajam mesmo os seus estudantes a fornecerem os seus dados em disquete (Becker, 1986a). A rapidez com que se consegue escrever as notas e as vantagens na gestão dos dados que o computador proporciona tornam o seu uso imperioso. Existem diferentes opiniões quanto à utilização, por parte de investigadores qualitativos inexperientes, de programas de computador concebidos especialmente para os vários aspectos mecânicos da análise de dados. Alguns que tentaram, juram que vale a pena; outros, amaldiçoam-nos. Há quem defenda que o tempo gasto na sua aprendizagem é equivalente ao tempo que se poupa. (Existem outros argumentos; ver Pfaffenberger, 1988 e Clark, 1987.) Se estiver familiarizado com os computadores e quiser aprender a utilizar novos programas, e se o software adequado estiver à disposição utilize um programa para o ajudar a classificar e a recuperar os dados no seu primeiro projecto. Se este for muito importante, por exemplo, uma dissertação em que espera ter centenas de páginas de notas e transcrições, utilize um programa para os vários aspectos mecânicos da 238 239 Notas de campo Sala dos professores da Escola Primária de Vista City 3 de Fevereiro de 1981 Depois fui à sala de professores para ver se estava alguém. Estava com sorte. A Jill Martin estava sentada na primeira mesa a corrigir testes; a Kathy Thomas também estava lá, andando de um lado para o outro e fumando. Eu disse: "Olá Jill, olá Kathy. Posso fazer-vos companhia?", "Com certeza", disse a Jill. "Tu e o teu marido foram à China, não foi?", perguntei eu. "Sim. Porquê?", nessa altura a Jill virou-se para a Kathy e disse: "Já estudaram a China? A Sari tem diapositivos que pode mostrar.". A Kathy disse-me que ia dar as comunidades mundiais, embora "eles" tenham tirado essa matéria do ~ograma de estudos sociais do sexto ano. "Podes dizer-me quem é ~ 'eles' são?", perguntei-lhe. Ela disse: "Tu conhece-los': 'eles"'. Tanto Jill como Kathy estavam zangadas pela forma como tinha sido indicado o que os professores podiam ensinar nas suas aulas. "Eles" eram os do inistériO' que tinham comunicado qual o programa revisto do Estado para o curriculo de Ciências Sociais do sexto ano. O Estado "tirou todas as coisas que consideramos importantes" do programa e substituiu pelo tema de "geografia económica" para os alunos do sexto ano estudarem. ~ Tanto Jill como a Kathy pensam que "os alunos do sexto ano não conseguem compreender bem a geografia económica", e pensam que as comuniI.....H ~ [des mundiais de África e da Ásia são mais importantes. Disseram q~e de U-:h"~ ~ qualquer maneira planeavam ensmar o que quenam. A Kathy dIsse: Eles ~4 A.iJI vêm cá um destes dias.", "Oh, Kathy, és uma rebelde?", perguntei. "Não", O~ respondeu ela, "só faço aquilo que penso ser o melhor". Depois de conversarmos um pouco, a Jill virou-se para mim: "Estás interessada no que nos preocupa. Penso que uma das coisas são os pais". Continuou e descreveu uma reunião de pais em que tinha participado, na tarde do dia anterior, com os pais e o psiquiatra de uma criança. Disse: "O que realmente me preocupa é a responsabilidade que me atribuíram para mudar o comportamento da criança". Pareciam não ligar ao que se disse, contou ela, relativamente ao "controlo" que tem de vir da criança, quando disseram que "é difícil os pais verem que as crianças têm de assumir responsabilidade pelas suas acções." I ,.,...", ....._ ..... IlIlIIIl'I~~ . ..._ ~""'Mm_III!II .• ... J_N'_;:;;;IIN'!III!44I1l111#_. .- a . . ._ _ Figura 5-7 • ÍNDICE DE CODIFICAÇÃO (PÁGINA DE EXEMPLO) REFERÊNCIA* PALAVRAS DE CÓDIGO T1PO+ análise de dados. Se acredita fortemente que a sua primeira tentativa de investigação qualitativa não será a última - que a utilizará ao longo da sua carreira -, aprenda um programa imediatamente. Se vai utilizar um programa, use um que as pessoas à sua volta conheçam e que recomendem. Como é que funciona a análise de dados assistida por computador? Funciona de forma muito semelhante às duas outras abordagens para a classificação mecânica dos dados que analisámos. Lê-se os dados várias vezes, com o objectivo de criar uma lista de códigos. Com a ajuda de um dos programas, pode estabelecer os limites ou unidades de dados e atribuir símbolos de código (abreviaturas ou números) a essas unidades. Depois de colocar os símbolos de código no local apropriado nos ficheiros de texto, o computador, utilizando uma instrução própria, extrai cada segmento de palavras a que foi atribuído o mesmo código. Pode rever os seus dados no ecrã do computador ou imprimi-los. Quando os dados são extraídos, o programa indica, automaticamente, a que segmento pertencem (a página e a linha do ficheiro de texto). Às unidades de dados podem ser atribuídas códigos múltiplos, e os segmentos de codificação podem sobrepor-se. Os segmentos de texto podem ser, simultaneamente, classificados em várias categorias diferentes. Os programas também contam quantas vezes cada código ocorre nos ficheiros de dados. Estes programas eliminam a necessidade de múltiplas cópias em papel ou de maços de cartões especiais e de pastas desdobráveis cheias de notas recortadas. Se preferir trabalhar com um suporte mais sólido, pode imprimir em qualquer altura parte ou a totalidade dos dados. Como os dados são facilmente recodificados, pode desenvolver sistemas de codificação durante a análise e mudá-los à medida que prossegue. Os professores que ensinam investigação qualitativa podem ajudá-lo a localizar e a escolher um programa. Frequentemente, os centros de computadores da universidade possuem esta informação. PÁGINA ANOTAÇÃO Pais (vizinhança) P E June Miller 5 Pais (diferentes escolas) P E June Miller 5 Contradições P E June Miller 5 Pais (perspectivas sobre o director) D E June Miller 5 Pais C E June Miller 5 Artifícios D O Apresentação 69 aos professores D Pais O Apresentação aos professores D Pais O 71 Apresentação aos professores 71 Pais P O Sala dos professores 80 Comunidade P O Sala dos professores 83 Padrões de carreira D O Sala dos professores 83 E Kate Bridges(2) 87 P Director (estilo) Director (estilo) P E Kate Bridges(2) 87 Professor (auto-imagem) C O Sala dos professores 92 Padrões de carreira D O Sala dos professores 92 Pais (falta de autonomia) P O Sala dos professores 93 Pais P O Sala dos professores 93 Pais D O Sala dos professores 93 Relações colegiais P O Sala dos professores 94 Pais C O Sala dos professores 99 Sessão de "aperto" C O Sala dos professores 107 Relações colegiais (apoio) C O Encontro de Relações colegiais (apoio) D O Um comentário final equipa do 4.° ano *C ::: Citação III Encontro de equipa do 4.° + E ::: Entrevista D a.T)O T erminámos a nossa discussão da análise de dados bastante abruptamente. O verdadeiro processo acontece de forma diferente. A análise continua até à fase da escrita, que abordamos no próximo capítulo. Se se está a sentir bloqueado com pilhas de dados codificados, o próximo capítulo ajudá-lo-á um pouco mais a atingir o produto final. 111 O = Observação P ::: Paráfrase O = Descrição 240 I ... IQE,,16 241 "-"",~,,,,-~_ _-_--~_---I_A_----_.a.,w. VI "" REDACÇAO DA "" INVESTIGAÇAO 242 I 243 Embora já possua o esqueleto daquilo que o artigo será, pode abordar a tarefa com base numa variedade de formas de organização e de estilos. Se bem que, por vezes, seja a própria tarefa que dita aquilo que tem para fazer (i.e., um pedido para fazer uma investigação e escrevê-la segundo o estilo de um determinado jornal), na maior parte das vezes existe uma amplitude tal que lhe permite decidir sobre o melhor procedimento. Quanto mais escrever, mais longe chegará e mais fácil se tomará. Apesar de não sermos especialistas na palavra escrita, temos de facto muita experiência na escrita e publicação de investigações qualitativas em jornais e revistas de educação. Neste capítulo, iremos dar-lhe pistas e ensinar-lhe o que é preciso para se escrever bem sobre investigação qualitativa. A gora que já está preparado para redigir a sua investigação, pode .optar por várias maneiras de o fazer. De facto, ao sentar-se à frente do computador. pode ficar com a sensação de ter demasiadas decisões para tomar. Provavelmente, aquilo que o assustará mais será a falta de controlo sobre a situação, isto é, não saber escolher o vocabulário, como construir as frases, quando aplicar a voz activa ou passiva ou ainda como organizar o seu texto de modo a reflectir as suas intenções. Poderá, contudo, ganhar controlo sobre a situação se dominar tais técnicas e se encarar a tarefa de apresentação escrita da investigação como uma série de decisões discretas e não como um empreendimento enorme que tem de ser realizado num curto espaço de tempo. Escrever com base em dados qualitativos é mais simples do que escrever uma obra conceptual. O trabalho de campo e a sua análise produzem muitas descrições codificadas que proporcionam um ponto de partida - algumas palavras no papel. Não só tem à sua frente dados descritivos, como também tem uma lista de comentários de observador e memorandos analíticos que podem servir de esqueleto para futuros capítulos do seu trabalho. Trata-se de uma base que pode rever e alargar, à medida que vai progredindo na produção do relatório, monografia, artigo ou livro. O que planeia produzir com os dados afecta aquilo que escreve e a forma como organiza a sua escrita. Por exemplo, se estiver a fazer uma dissertação tem de ter em conta determinadas convenções. Os artigos ou relatórios de investigação geralmente oferecem mais liberdade estilística, embora precisem de ter um princípio, ou introdução, um meio, ou desenvolvimento, e um fim, ou conclusão. A introdução explica aquilo em que consiste o artigo: apresenta os seus conteúdos. O desenvolvimento discute e apresenta o seu argumento. Discute as ideias originais ou novas, dispondo os dados de forma a convencer o leitor da veracidade das provas que apoiam as suas convicções. A conclusão pode resumir aquilo que se disse, associar duas opiniões díspares ou sugerir implicações para a investigação ou para a prática; é uma arrumação final, como a sobremesa ou o café, após a refeição. (Alguns manuais que o poderão ajudar na elaboração escrita incluem Baker, 1966; Kierzek e Gibson, 1968; Strunk e White, 1972; ver também Friedman e Steinbert, 1989.) 244 I 245 I tZi Udt o D Por onde começar Um bom manuscrito o U s escritores inexperientes tendem a ser procrastinadores. Encontram inúmeras desculpas para não começarem. Mesmo quando finalmente se sentam à secretária parecem sempre encontrar algo que os distraia: ir fazer café, afiar o lápis, ir à casa de banho, folhear mais bibliografia ou, às vezes, levantar-se e voltar ao local de investigação. Lembre-se que nunca se está verdadeiramente "pronto" para começar; quando escrevemos temos de tomar uma decisão consciente de começar e de nos disciplinarmos para continuarmos. Muitas pessoas que acham que temos muita sorte dizem: "Tem tanta facilidade em escrever.". Nem nós, nem muitos outros, temos facilidade em escrever; escrever exige muito esforço, dá muito trabalho (Becker, 1986c). Como refere um autor, "escrever é fácil; a única coisa que é preciso fazer é olhar para uma folha de papel em branco e esperar que bolhas de sangue se formem na testa". Há quem seja excelente: essas pessoas desenvolveram bons padrões de trabalho, confiança e determinadas competências, mas escrever nunca é tão fácil quanto possa parecer. Só muito esporadicamente surge com naturalidade. Geralmente, as pessoas sentem-se muito conscientes e receosas de si próprias antes de começarem a escrever; as suas mãos suam e experimentam ansiedade (Woods, 1985). Por onde é que deve começar? Já começou. Se seguiu o nosso conselho - se estreitou o seu campo de atenção, se procurou temas, se tomou decisões sobre o tipo de estudo que vai fazer, se escreveu memorandos e comentários de observador, se classificou mecanicamente os dados presentes na revisão de literatura - vai no bom caminho. Mas o que dizer relativamente à escrita propriamente dita: o estilo, a forma e o conteúdo? lidade e realiza essa promessa. Encontrar um objectivo significa decidir o que se quer dizer ao leitor. Deverá dizê-lo numa ou duas frases. Um bom texto centra-se num só aspecto, existindo, no entanto, vários tipos de focos. Um dos focos possíveis é a tese, isto é, uma proposta que se avança e que se defende. Uma tese pode partir da comparação entre aquilo que a sua investigação revelou e aquilo que a literatura profissional refere sobre o assunto (e.g., "vários investigadores têm assumido a posição..." ou "a nossa investigação revelou outra dimensão..."). Ou contrasta o que os práticos defendem e o que a sua investigação revela (e.g., "o modelo de... apresentado no manual revela-se diferente quando aplicado na sala de aula."). A tese pode defender que as consequências imprevistas de determinada mudança instituída por pessoas externas é mais importante do que o efeito planeado. Uma tese constitui uma boa focalização da atenção; consiste numa discussão e pode captar o interesse. Contudo, quem inicia discussões acaba por ser geralmente atacado. Quando se desenvolve uma tese provocadora, frequentemente exagera-se, atacando a posição que ninguém tomaria. (Este fenómeno é conhecido como a construção de "um homem de palha" (sic)) Se optar por atacar algo que já foi refutado, as suas afirmações soarão a repetição. Os académicos são particularmente sensíveis a teses forjadas. Tomam esta asserção à letra em vez de a entender como uma questão de estilo. Escreva cuidadosamente a tese, tendo em conta o público a que se destina. O tema poderá também constituir um tipo de foco. Falta-lhe o tom claramente controverso e provocador da tese, embora partilhe alguma das tonalidades da "grande ideia". 246 247 I m bom texto que não seja de ficção tem um objectivo claro. Explicita a sua fina- Um tema é um conceito ou uma teoria que emerge dos dados: "uma tendência indicadora, uma concepção dominante ou uma distinção-chave" (Mills, 1959, p. 216). Os temas podem ser formulados a diferentes níveis de abstracção, desde afirmações sobre determinados tipos de contextos, até afirmações universais sobre os seres humanos, o seu comportamento e as situações envolventes (Spradley, 1980). Apresentámos alguns temas potenciais na nossa discussão sobre análise de dados. O "princípio do menino querido do professor" e o "diagnóstico da terceira pessoa" constituem temas potenciais que poderiam servir para artigos. Os investigadores académicos que estão interessados em fazer teoria vêem o desenvolvimento de "temas genéricos" (Glazer e Strauss, 1967) como a meta de investigação mais louvável. Como explica Lofland, um tema genérico (estrutura) surge "quando a estrutura ou o processo explicado é escolhido e elevado a um nível de abstracção que o toma aplicável genericamente, em vez de ser aplicado apenas a um determinado âmbito institucional ou debate ideológico, ou a outra preocupação localizada" (Lofland, 1974, p. 103). O tópico proporciona um terceiro tipo de foco. Tal como o tema, o tópico está presente nas suas notas, consistindo essencialmente numa unidade de um aspecto particular do objecto de estudo e não numa ideia sobre esse objecto. Um tema é conceptual; um tópico é descritivo. Sugerimos igualmente alguns tópicos na nossa discussão sobre a análise de dados; por exemplo: "O que é um bom professor?". Dados os objectivos da apresentação, distinguimos tese, tema e tópico como exemplo de possíveis focos. No entanto, raramente se aplicam estas palavras com um carácter definitivo ao foco de um artigo. Muitas vezes o foco é híbrido, apresentando elementos dos três tipos apresentados. Não descrevemos todos os tipos possíveis, existem outros. Por exemplo, o foco de um artigo poderá consistir em ilustrar a utilidade dos conceitos ou temas que já foram descritos. De um modo geral, se estiver envolvido numa investigação avaliativa, o foco consistirá na questão que optou por explorar ao iniciar o seu contrato de trabalho. Qual o melhor tipo de foco - a tese, o tema, o tópico, um dos híbridos ou ainda outro tipo? A tradição escrita com base na qual trabalha poderá ter preferência. Os jornalistas escrevem utilizando teses argumentativas, tal como os ensaístas, enquanto que a literatura académica tende a ser mais orientada para o tema. Os praticantes de qualquer profissão tendem a utilizar um foco do tipo tópico. No entanto, ninguém utiliza um único tipo excluindo todos os outros. A decisão sobre qual o tipo mais adequado ao seu trabalho depende da sua familiaridade com o campo de estudo. O que é preciso? (Obviamente que a sua decisão poderá também ser determinada pelas solicitações do seu professor ou da pessoa que o contratou.) Se não houver boas descrições sobre como é, por exemplo, um dia na vida de um professor, um trabalho sobre este tema-tópico constituiria um importante contributo para o estudo do ensino. Por outro lado, se estiver a trabalhar numa área que esteja descrita na literatura, um tema ou uma tese como foco tomariam o seu trabalho mais valorizado. A uti- lização, como foco, de um quadro de referência conhecido e já utilizado em estudos similares ao seu, pode-lhe proporcionar uma boa experiência de investigação, embora possa não suscitar grande interesse. Um tema teórico poderá não ser bem aceite se tiver decidido fazer uma avaliação da eficácia de um programa para alguém que o contratou. O tipo de foco que utiliza também depende das suas competências. Frequentemente, um investigador inexperiente irrompe escrevendo com um foco do tipo tópico ou do tópico a caminhar para tema. Os escritores mais experientes e as pessoas com larga experiência em investigação e nas suas áreas de trabalho têm tendência para escrever uma tese ou um tema, embora também possam escolher um tópico. O que deve ter mais peso na decisão relativa ao que será a sua tese, tema ou tópico específico são os dados que recolheu, analisou e codificou. Não pode centrar-se numa área onde os dados que recolheu foram escassos. Uma maneira simples de encontrar um foco consiste em analisar as categorias de codificação que obteve e identificar aquelas que têm o maior número de dados. Se tiver escolhido o "método do ficheiro" em que se seleccionam mecanicamente os dados, dê uma vista de olhos pelos ficheiros e escolha os mais volumosos. Se tiver alguns com muita informação, analise-os rapidamente e verifique se têm algum ponto em comum. Leia também os memorandos que escreveu para ver se consegue encontrar relações entre códigos ou se já identificou temas. Quando começa a escrever tendo por objectivo encontrar um foco, aquilo com que primeiro se depara poderá não servir, à medida que prossegue com a redacção do texto. Deverá encarar a sua selecção inicial como uma hipótese a ser testada. Terá de verificar se funciona. Esteja preparado para os falsos começos, reformulações e melhoramentos. Esteja aberto à descoberta e a novas perspectivas que não seriam passíveis de ser alcançadas no campo de investigação ou durante a análise dos resultados, porque nessa altura ainda se encontrava suficientemente próximo dos dados. Por vezes, é necessário fazer um rascunho do trabalho antes de poder vislumbrar um foco com o qual seja possível trabalhar. O título do trabalho deve revelar o foco. Em "Julgados, Não Juízes: Uma Visão Interna da Debilidade Mental" (Bogdan e Taylor, 1976), os autores apresentam os pontos de vista de uma pessoa rotulada de "atrasada" e colocada num regime de educação especial, bem como outros aspectos de programas para pessoas rotuladas de "deficientes mentais". "Seja Honesto, Mas Não Cruel: Comunicação Profissionais/pais Numa Unidade de Neonatalagia" preocupa-se com o que os profissionais dizem aos pais das crianças internadas numa unidade de cuidados intensivos para recém-nascidos. "Seja Honesto, mas Não Cruel" consiste numa perspectiva que o pessoal dessa unidade partilha em relação à comunicação com os pais. Embora os títulos sejam decididos após a versão final da redacção, tentar encontrá-los antes de iniciar a escrita pode facilitar a procura de um foco. Um bom manuscrito possui uma estrutura e um plano coerentes que permitem desenvolver o objectivo contido no foco. Como referimos anteriormentc, o plano básico da escrita não fictícia consiste num princípio, ou seja, numa introdução, num meio ou desenvolvimento e num final ou conclusão. O que acabámos de explicar poderá parecer óbvio, 248 249 I mas é frequentemente esquecido. Demasiados trabalhos têm vários princípios e assemelham-se mais a um descarrilamento de um comboio do que a uma fila de carruagens dirigidas por uma locomotiva com uma chaminé donde sai o vapor, anunciando a sua passagem. O desenvolvimento de um artigo constitui o esqueleto do manuscrito e advém directamente do foco. Passa-se à execução do que se anunciou fazer: discutir a tese, apresentar o tema ou iluminar o tópico. A sua capacidade de conseguir escrever o desenvolvimento constitui um bom teste ao seu foco. Pode, por exemplo, verificar que não possui dados suficientes para redigir o desenvolvimento do trabalho, situação que o forçará a alargar ou a modificar o seu foco. Pode, por outro lado, constatar que tem dados em excesso ou demasiado para dizer em função da dimensão do artigo que se propôs elaborar. Nesta situação é necessário restringir o foco. Ao escrever a parte central do trabalho, pode verificar que o foco o mantém nos carris. Tudo o que for incluído deve estar directamente relacionado com o foco. Os "recheios" têm secções; partes que têm cabeçalhos. Para testar se deve ou não incluir cada secção, deve perguntar a si próprio: "Esta secção relaciona-se directamente com o meu foco?". A natureza de cada secção, o que se inciui e como se relaciona com as outras desenvolve-se a partir da análise dos dados que codificou. Depois de ter seleccionado algumas das categorias de codificação contidas no foco. deve começar a trabalhá-las, a relê-las e a descobrir padrões, partes ou elementos comuns. Pode tratá-las como tratou a totalidade dos dados na altura em que os seleccionou mecanicamente pela primeira vez. A quanti dade de material será muito menor e, por isso, a sua manipulação revela-se mais simples O objectivo da selecção mecânica consiste em reduzir os dados a pequenas unidades, tor nando-os passíveis de serem trabalhados. Ao estudar os dados de uma categoria particular de codificação, deve procurar divi· sões subsequentes (subcategorias). Por exemplo, uma das categorias de codificação que pode surgir num estudo de observação participante na sala de aula pode ser "a definiçãe que os professores fazem dos alunos". Ao ler o material arquivado num ficheiro sob este código, pode verificar que o professor utiliza diferentes expressões para descrever os alunos. O professor pode ter uma tipologia em mente - um sistema de classificação de "tipm de alunos", "bons alunos", "empecilhos", "pobres diabos", "baldões", "pestes" e "perturbadores" poderão ser algumas das expressões que se repetem. Pode trabalhar, come desenvolvimento, o sistema de classificação do professor. Aí, a "definição que o professol faz dos alunos" constitui o termo geral; "tipos de alunos" constitui a subcategoria do sis tema de categorização onde as expressões do tipo "bons alunos" representam os "subcódi gos" (Spradley, 1980). Estas categorias podem transformar-se em cabeçalhos maiores Ol menores para as diferentes secções do seu trabalho l • Seja qual for o conteúdo específico do desenvolvimento, cada secção deve ser estrutu rada da mesma forma em todo o manuscrito. Cada uma deve conter uma introdução, urr desenvolvimento e uma conclusão. Na introdução explicam-se os conteúdos da secçãe que se associam ao foco e às secções anteriores. O desenvolvimento descreve o que a in trodução prometeu e a conclusão sumaria o que foi tratado nessa secção, associando-o i secção seguinte. Para manter relevante o conteúdo da secção, pergunte-se a si próprio se e que está a escrever se relaciona com o que disse que ia fazer no início da secção. Existem várias maneiras de encarar o que os investigadores qualitativos fazem quande descrevem um estudo. Spradley (1979) chama-lhe uma tradução. Este modo de compreensão sugere que aquilo que os investigadores fazem é captar o que viram e ouviram passando-o para o papel, de modo a fazer tanto sentido para o leitor como para o investigador. Modos alternativos de conceptualizar este processo sugerem que a metáfora di tradução está muito próxima de considerar o investigador como um "recipiente" vazio que apenas transpõe para o papel, para o leitor, as perspectivas dos sujeitos (Clifford e Marcus, 1986). Clifford (1986) argumenta que o escritor capta "verdades principais" que são moldadas não só pelas provas visíveis, mas também pela linguagem de quem escreve. As provas tomam as generalizações parte integrante do pensamento do leitor. Corr efeito, a mensagem de um investigador qualitativo para o leitor é a seguinte: "Eis o que el encontrei e também os detalhes que apoiam esta perspectiva." A tarefa implica decidiJ quais as provas que devem ser utilizadas para ilustrar a sua opinião; é um acto de balanceamento entre o particular e o geral. O que escreveu deve claramente ilustrar o fundamente das suas generalizações (de facto, os sumários daquilo que viu), ou seja, aquilo que vil (os detalhes que, no seu conjunto, constituem a generalização). Qual é o seu objectivo~ 250 251 A INTRODUÇÃO A introdução geralmente começa pelos antecedentes gerais necessários à compreensão da importância do foco. Uma das estratégias consiste em colocar o trabalho no contexto da literatura ou do debate actual; outra consiste em explicitar a tarefa que vai realizar. Geralmente, a introdução termina com a descrição do plano do restante trabalho. A discussão dos métodos de investigação pertence à introdução, embora a sua extensão e localização específicas variem. Na escrita jornalística, geralmente não se inclui uma discussão da metodologia. Nos artigos de investigação é imperativo explicar aos leitores quais as técnicas que foram utilizadas, a duração e extensão do estudo, o número de sujeitos investigados e em que contextos, a natureza dos dados, as relações investigador-sujeitos, a verificação dos dados e outras informações que permitam avaliar a validade dos procedimentos e a natureza do estudo. Por vezes, este tipo de informação é apresentado no apêndice, como no caso dos livros. Podem encontrar-se importantes contribuições para os métodos literários em apêndices de livros como Slreel Comer Society (Whyte. 1955) e Tally's Comer (Liebow, 1967). o DESENVOLVIMENTO I Como sugeriu um etnógrafo, "uma boa tradução etnográfica mostra; uma pobre apenas conta" (Spradley, 1979). Vejamos mais especificamente o que está envolvido no balanceamento entre o particular e o geral: a utilização e o número de citações, bem como o modo como se chega aos exemplos. Um bom trabalho qualitativo é documentado com boas descrições provenientes dos dados para ilustrar e substanciar as asserções feitas. Não existem convenções formais para estabelecer a verdade de um artigo de investigação qualitativa. A tarefa que tem em mãos consiste em convencer o leitor da plausibilidade do que expõe. Citar os sujeitos e apresentar pequenas secções das notas de campo e de outros dados ajuda a convencer o leitor e a aproximá-lo das pessoas que estudou. As citações não só descrevem as afirmações dos sujeitos, como também a forma como as transmitiram e a sua maneira de ser. No exemplo que se segue, a autora de um artigo sobre a experiência de escola, vivida por imigrantes italianos no Canadá, mistura no mesmo parágrafo citações dos sujeitos e a sua própria descrição e análise. "Para as crianças que aprendem a respeitar a escola e a levar a sério as suas responsabilidades académicas, a experiência de imersão total num ambiente de língua estrangeira pode ser extremamente devastadora. 'Senti-me como um tronco de madeira', diz um rapaz de 15 anos. E um de 13 anos, de Cantanzaro: 'Foi como se estivesse num canto, escondido e todos os outros acabassem por me encontrar, não conseguindo perceber que eu não percebia inglês e que, lá no meu canto, não conseguia captar as suas mensagens'. Mesmo a pergunta mais simples constituía uma tortura: 'O professor perguntou-me o meu nome e eu tinha medo de o dizer porque eles diziam de uma forma diferente daquela que eu o diria e isto era horrível'. Isto dito por uma rapariga de 12 anos, de Molise." (Ziegler, 1980, p. 265) As citações e as interpretações da autora entrelaçam-se, formando um parágrafo fluente que articula harmoniosamente o particular com o geral. Outra forma de apresentar os dados consiste em fazer uma afirmação, ilustrando-a com vários exemplos. Frequentemente, esta forma de ilustrar material abstracto é escolhida na investigação mais formalizada, como no caso da dissertação. Segue-se um exemplo deste estilo, a partir de uma dissertação baseada em entrevistas com mulheres adultas recordando as suas experiências de escola. O exemplo em questão é extraído de um capítulo sobre professores. "Outro tipo de prova que os sujeitos utilizavam para avaliar os seus professores consistia em saber se a preocupação e o interesse que estes revelavam pelo seu trabalho era visível para os alunos. Os professores eram julgados como fracos se os alunos achassem que não gostavam de crianças ou de ensinar: 'Na 2' classe foi uma mulher nova, que estava grávida, e eu acho que ela não estava mesmo à altura do ensino naquela fase da sua vida e que tinha dois ou três alunos preferidos, ambos rapazes e talvez uma rapariga, e eu e ela dávamo-nos horrivelmente mal.' (# 320) 'Na 4' classe, a Miss Aldan. Não sei o que hei-de dízer sobre ela. De novo, era uma mulher que estava no papel de professora sem se importar muito como aquilo que fazia e acabava por se tomar muito chata. Tinha uma voz monocórdica e falava sem parar. Sonhei muitas vezes acordada.' (#325)" Cada um destes exemplos oferece um aspecto ligeiramente diferente da afirmação geral a ser ilustrada (Biklen, 1973). Neste caso, os dados são apresentados independentemente das generalizações. No exemplo anterior, o particular e o geral eram apresentados alternadamente. Nos exemplos que utilizámos como ilustração da possibilidade de se articular o particular e o geral, também pode verificar como se chega aos dados. Novamente, podem-se misturar a análise e o exemplo (como na discussão da escolaridade canadiana) ou podem-se apresentar os exemplos a partir das afirmações gerais. Em qualquer dos casos, é necessário indicar sempre o objectivo com que se utilizam os dados. Seguem-se alguns exemplos que lhe podem dar uma ideia da variedade de formas de apresentação da descrição e das citações. No excerto que se segue, a autora confia no método "como não sei quem disse", reforçando-o com outro exemplo: "Mas na sua posição de polícia estava limitada a lidar com aquilo que era observável. Como a Sr' Preston, furiosa, disse a Lewis quando ele lhe ripostou no recreio: 'Não quero saber a tua opinião. Não digas nada, nem olhes:'. Ou a Sr' Crane: 'Quem me dera que Jae não insistisse sempre em ter a última palavra. Se ao menos ele não discutisse, eu podia ignorá-lo'. Desde que o aluno aparentasse conformar-se, desde que ele não a desafiasse directamente, a professora podia manter o controlo." (McPherson, 1972, p. 84) Com certeza que se apercebeu que depois de a autora ter apresentado o exemplo completou-o com uma interpretação concludente. Esta frase de remate pode reforçar a interpretação ou oferecer uma tendência ligeiramente nova. O exemplo que se segue indica outro método de apresentação dos dados - o uso dos dois pontos (:). Os dois pontos implicam que o material apresentado posteriormente ilustre a(s) frase(s) precedente(s): 'A professora que tive no ano seguinte foi a Sr' Lolly. E ela não gostava mesmo de miúdos. Foi mesmo um erro ter escolhido a profissão de professora.' (# 104) "O observador também tem tido impacto no sistema Geoffrey tem mostrado relutãncia em ser tão punitivo como por vezes se vê a si próprio ser. O próprio Geoffrey admite tal nas suas notas: 252 253 I Quando os problemas surgem na aula, como o comportamento de Pete, o facto de um observador estar presente parece afectar o meu comportamento mais do que normalmente. A começar amanhã, e embora consciente do que ele possa pensar, vou comportar-me como me comportaria normalmente ou tão próximo quanto me for possível." (9/11 )(Smith e Geoffrey,1968,p.61) Neste exemplo, o observador que participa na aula, Louis Smith, regista uma parte do diário do professor (Geoffrey), como um exemplo dos dados. Com a utilização dos dois pontos, a transição não precisa de ser tão bem construída como no caso de uma outra que dependesse da construção da frase. Outra maneira de apresentar os dados consiste em incorporá-los directamente no texto, de forma a serem parte integrante daquilo que se está a descrever. Nesta técnica, incorpora-se directamente o diálogo e a descrição na mesma narrativa. O leitor tem a sensação de estar a ouvir uma história que lhe contam, ficando muito menos distanciado do material. O exemplo que se segue reflecte o que o autor concluiu depois de entrevistar crianças numa prisão, sendo o caso "A criança (que) vai acabar por matar alguém"; "Bobbie Dijon sempre fora a rapariga mais alta da sua aula; poucos rapazes eram mais altos do que ela. No 3.º, 4.º e S.º anos alguns dos colegas gozavam com ela. Mas quando chegou aos 12, era tão grande e forte, que nunca se metiam consigo por terem medo que ela se enfurecesse e lhes desse um mUITO, como já era hábito. Segundo os professores não era propriamente uma rapariga violenta ou má. Havia uma parte de si que era violenta, mas era apenas uma pequena parte que vivia dentro dela, contente por não se revelar a não ser que a provocassem seriamente." (Caule, 1977, p. I) Ihadas constitui geralmente um golpe para evitar refinar o pensamento e partilhar com leitor a complexidade do que se concluiu. No relato da investigação existe, ainda, lugar para a narrativa pura. Esta é muitl vezes utilizada na apresentação de histórias de vida na primeira pessoa. Neste caso, prat camente todo o manuscrito pode ser redigido nas próprias palavras do sujeito, elaborand o autor uma pequena introdução e, talvez, uma pequena conclusão. Mas, mesmo nas hi: tórias de vida que utilizam os verbos na primeira pessoa, o material é cuidadosamenl revisto e reorganizado antes da sua publicação. Grande parte do material das notas de campo proporciona bons diálogos para peças d teatro e pequenas histórias. A nossa discussão escrita não contempla esta forma de apn sentação. No entanto, a possibilidade de utilizar dados qualitativos desta maneira parec aliciante. Mas o seu trabalho deve ser aquilo que é pelas opções que faz face aos object vos e plano e nãô fruto do engano. Ao redigir uma investigação qualitativa deverá apresentar o seu ponto de vista, a Se análise, a sua explicação e a sua interpretação daquilo que os dados revelam. O lei(( atento pode ser céptico. Mesmo que ilustre a sua discussão com citações dos dados e apn sente outras provas que corroborem a sua análise, as pessoas terão perguntas a faze "Não existe uma explicação alternativa para aquilo que encontrou?", "Essa é sua maneiJ de interpretar os dados, mas que tal isto como alternativa?", "Todos os sujeitos express, ram sempre esse ponto de vista?". É importante levantar questões que o leitor possa ter e apresentá-Ias como parte int( grante do produto final escrito do seu trabalho. Isso é geralmente feito na parte do deser volvimento. Apresente perspectivas alternativas e discuta por que é que a escolhid parece ser a mais consistente com os dados. Mencione os sujeitos que possam defendt um ponto de vista minoritário ainda não discutido. Deve fazer de conta que você próprio o pior crítico do seu trabalho - coloque todas as questões difíceis e discuta-as uma a um Seja qual for o estilo que escolher, certifique-se que ele lhe permite o confronto de expi cações alternativas para os seus resultados. Neste exemplo, as citações e as descrições extraídas das entrevistas não são isoladas ou apresentadas separadamente na narrativa; dimanam directamente no decurso da história, criando uma atmosfera informal de apresentação. É claro que existem muitas maneiras diferentes de incorporar exemplos dos dados. Apostar em mais de uma maneira proporciona variedade ao produto escrito. Simultaneamente, para ganhar controlo sobre a escrita, é preciso ter-se a certeza de que o estudo reflecte a sua intenção de escrita, reflecte a audiência a quem se destina e, mais importante, reflecte aquilo que se quer transmitir. Afirmámos que o trabalho escrito deveria ser bem documentado com base em dados obtidos nas notas de campo e outros materiais. O que não significa que deva incluir extensas secções de dados sem discutir ou propor uma razão clara para a sua inclusão. Alguns autores inexperientes, ao ficarem tão fascinados e intrigados com a riqueza dos seus dados, pensam que estes são evidentes para qualquer pessoa, mesmo sem os retocar. O leitor fica muitas vezes com uma sensação de frieza e de distância. A escrita e o uso de citações são extremamente trabalhosos. A apresentação das notas de campo não traba- Estilos de apresentação. Os investigadores qualitativos têm a sorte de não terem UI modo único de apresentar os resultados (Lofland, 1974). Certas escolas de investigaçã qualitativa produzem manuscritos com um estilo muito próprio, podendo ser identificadl pelas frases que utilizam. Reina, contudo, a diversidade. Pode, porém, querer associar-se uma determinada escola, como os grupos que fazem "etnografia", "etnografia const tutiva" ou "microetnografia", apenas para referir alguns dos tipos existentes. Estude estilo dessa escola e modele, com base nesse estilo, aquilo que escreve. É uma boa técnic a seguir caso não esteja certo de ser capaz de desenvolver um estilo próprio. No entantt com a prática, o seu estilo particular de apresentação acabará por surgir. Os estilos de apresentação podem ser visualizados num contínuo. Num dos seus extn mos encontram-se os modos formais ou tradicionais de organizar uma apresentação. Este 254 255 .I.~ estilos podem ser didácticos. No extremo oposto podem encontrar-se os modos de escrita mais informais ou não tradicionais. Os artigos que utilizam este estilo poderão primeiro contar uma história e, só no final, extrair as conclusões que são apresentadas de forma indutiva. Analisemos o que faria se se situasse em cada um dos extremos do contínuo. Existem vários formatos estabelecidos para apresentar a informação. Se optar por um terá de abranger vários materiais e de os organizar de forma a preencher determinados requisitos. Se, por exemplo, optar por fazer microetnografia, provavelmente centrar-se-á em comportamentos íntimos num só contexto. Ao levar a cabo a investigação dirigirá a sua atenção para aspectos mais específicos das interacções, de modo a fragmentar cada vez mais o contexto. Para escrever, pode tirar partido deste factor organizativo, desta constante fragmentação e dissecação dos acontecimentos, utilizando-os para organizar a sua apresentação escrita. (Alguns bons exemplos de microetnografias são Florio, 1978, e Smith e Geoffrey, 1968.) Do mesmo modo, na macroetnografia, expõe-se o âmbito de uma situação complexa, assegurando a cobertura de todos os aspectos que têm relevância para o tema. Não que a escolha de um determinado formato automaticamente organize o artigo, mas pode tirar partido dos requisitos necessários à condução de um destes modos de investigação qualitativa para organizar a apresentação. Nas formas de apresentação mais tradicionais, os resultados ou as perspectivas são geralmente apresentados em termos didácticos. O autor anuncia algures na introdução aquilo que o artigo, o capítulo, o livro ou a dissertação discutirá e prossegue, apresentando aos leitores os aspectos essenciais dessa perspectiva, documentando-os com exemplos extraídos dos dados. Curiosamente, neste estilo, os dados são descobertos indutivamente, embora sejam apresentados dedutivamente, de forma que o autor tem de fazer um esforço real para mostrar que não os recolheu com o intuito de provar um ponto de vista já assumido. Um excelente exemplo de um estilo claramente dependente do método de apresentação dedutivo é a ilustração de uma teoria já existente. A perspectiva teórica pode ter sido escolhida após a recolha dos dados, por parecer explicar o que o investigador encontrou (ver, por exemplo, McPherson, 1972). Existem muitos exemplos para ilustrar a teoria em investigação qualitativa contemporânea no domínio da educação britânica (ver, por exemplo, Sharp e Green, 1975). Aquilo a que se chama "teoria do rótulo" constitui também um conceito de ilustração muito popularizado (ver Rist, 1977b). No extremo mais não tradicional e informal do contínuo situam-se os modos de apresentação que se podem denominar por escrita retratual ou narração de histórias (Denny, 1978b). Constituem géneros mais controversos em contextos académicos e, se tentasse escrever adoptando um deles para apresentar como trabalho formal para a universidade, é provável que fosse aconselhado a verificar cuidadosamente o trabalho de antemão, com o seu orientador, para ver se podia ser aceite. A leitura deste tipo de investigação assemelha-se à leitura de uma história; o escritor cria uma atmosfera. No seu livro sobre segregação, Cottle retrata os sentimentos das pessoas envolvidas em ambos os lados da situação de segregação* em Boston. Cottle ajuda os leitores a compreenderem os contrastes das perspectivas. No exemplo que se segue, um pai reage à notícia da segregação do seu filho: "Se Eillen McDonough ficou arreliada com a notícia, o seu marido Clarence, um homem alto e de boa aparência, de cabelos arruivados e encaracolados e de nariz direito e comprido, ficou furioso: 'Fizeram-me isso uma vez', gritou uma noite que eu fui a sua casa. 'Eles fizeram-me mesmo isso, aqueles grandes filhos da mãe. Eu disse-te que eles iam fazer isso. Expliquei-te que não se conseguia evitar. Uma pessoa leva uma vida transparente, vai à missa, trabalha quarenta horas por semana no mesmo emprego, ano após ano, guarda para si as suas queixas e, mesmo assim, têm a lata de lhe fazer uma coisa destas.'" (Cottle, 1976, pp. 111-112) O autor pintou, por palavras, um retrato. Uma característica das apresentações menos formais é a presença do autor. O trabalho não é tão distante e o autor não hesita em utilizar o artigo "eu"'. A CONCLUSÃO Um artigo termina com uma conclusão. Pode fazer-se uma série de coisas. Muitas vezes o foco é reafirmado incisivamente e os argumentos revistos. Pode elaborar-se as implicações daquilo que se acabou de apresentar. Muitas relatórios de investigação terminam com uma proposta de investigação subsequente. Não existe nenhum tema que não precise de ser mais investigado; é esta crença que dá sentido à vida de investigador. No entanto, os psicoterapeutas defendem que mais pessoas devem recorrer à terapia e os fabricantes de televisões entendem que se devem comprar mais televisões. A sinceridade das suas crenças não exclui o facto de se estar a lidar com um cliché. Trata-se de um lugar-comum perigoso, na medida em que essa conclusão banal pode surgir em lugar de uma descrição inequívoca das suas conclusões e da importância do seu trabalho. A proposta de investigação subsequente consiste numa táctica frequentemente utilizada pelos autores que já esgotaram o seu vigor, quando já não têm energia suficiente para chegar ao fim da viagem, ou seja, para completar com coerência um bom artigo. Na conclusão, o fim está à vista; prossiga-o. * (Nota do tradutor: no original "busing" - termo utilizado nos Estados Unidos da América e no Canadá para designar a prática segregativa de deslocar de autocarro crianças que pertencem a uma zona escolar para outra, frequentada exclusivamente por alunos da sua raça.) IOE-17 257 azemos votos para que a nossa discussão sobre o que faz um bom artigo lhe tenha proporcionado algumas sugestões relativas a procedimentos a seguir. É muito importante dividir a tarefa em partes passíveis de serem manipuladas. Primeiro, tente arranjar um foco e, em seguida, esboce o desenvolvimento do artigo. Tente escrever a introdução ou uma das secções. Repita para si próprio que aquilo que está a escrever não é o produto final, que está apenas a escrever o rascunho. Force-se a começar a escrever, isto é, a passar para o papel aquilo que pensa. Mais tarde, pode sempre rescrever ou modificar o que fez. A designação de "rascunho" é um truque que alivia a tensão, uma forma de suspender a leitura excessivamente crítica daquilo que escreveu, uma maneira de pôr de lado os sentimentos de incompetência. Muito frequentemente, acrescentando ou apagando algumas palavras, os "rascunhos" são facilmente convertidos em produtos finais. Muitas vezes, os primeiros esboços pecam por serem demasiado elaborados. Têm demasiadas palavras e contêm informação que escapa ao interesse do leitor. Os autores têm tendência para achar que tudo é importante, e, com efeito, para eles pode ser, mas não o é para o leitor. É extremamente difícil um escritor deitar fora aquilo que escreveu. Abra um ficheiro para frases, parágrafos e secções que escreveu durante o processo de produção do texto, mas que não tenham sido utilizados. Leia desapaixonadamente o seu manuscrito à procura de material para meter nesse ficheiro. Tente encurtar o que escreveu. Embora o medo inicial seja o de não existirem coisas suficientes para escrever, frequentemente a preocupação do leitor é que o manuscrito nunca mais acaba. Se o trabalho escrito tiver mais de quarenta páginas, repense a situação porque provavelmente deveria ter feito dois trabalhos, ou, então, se calhar está a caminho de um livro. Tente decidir, por alto, quantas páginas quer escrever e decida-se sobre o foco e o desenvolvimento, tendo como alvo esse limite. Leia em diagonal o rascunho, procurando palavras e frases que possam ser eliminadas sem mudar o sentido ou procurando palavras cuja eliminação tome o sentido mais claro (Becker, 1986c). Evite escrever as frases na voz passiva, tentando ao máximo utilizar a voz activa. Diga aquilo que quer dizer, de uma só vez, com clareza, em vez de se repetir na tentativa de se redimir das explicações deficientes. O dicionário ou o thesaurus constituem instrumentos importantes. Muitas vezes, a diferença entre o claro e o vago reside na escolha de uma palavra. Se tiver a sensação de não estar a dizer aquilo que pretende, procure no dicionário essa palavra para ver se a pode substituir por outra mais precisa. Leia artigos e livros de investigação qualitativa que estejam bem escritos. Este processo permite-lhe aperceber-se da variedade dos modos de apresentação, para além de lhe proporcionar modelos de boa escrita. Como já referimos, a variedade é enorme, desde a apresentação tradicional da investigação de um modo formal, até aos exemplos que se situam mais fora do tradicional. Leia muito para perceber como é que os autores apresentam os dados, constroem os argumentos, organizam frases e formatos. Quando pensamos em exemplos contrastantes, mas bem escritos de investigação qualitativa, no extremo mais formal situam-se títulos como o Small Town Teacher (McPherson, 1972), The lnvisible Children (Rist, 1978), e Everything in lts Path (Erikson, 1976). Num estilo menos tradicional (isto é, pessoal e impressionista) temos os trabalhos de Thomas Cottle, que incluem Segregation. Bar· red fram School, Children in fail (Coltle, 1976b, 1976, a, 1977) e as séries de Robert Coles sobre Children ofCrisis (ver, por exemplo, Coles, 1964, 1977). Muitos autores referem que a escrita auxilia o pensamento. Contudo, este não constitui a única razão da escrita. A maior parte das pessoas escreve para obter um produto - um manuscrito que partilha com os outros. Ainda que a razão de ser dos seus esforços iniciais de investigação possa residir na resposta a uma proposta de um professor, não há razão para se ficar por aí. Procure uma audiência maior. Não permita que o seu estatuto de investigador inexperiente o afaste da publicação do seu trabalho. As pessoas que escrevem etnografias ou outras variantes de manuscritos qualitativos raramente têm consciência de que aquilo que dizem e a forma como o dizem é influenciado por outros factores que se situam para além dos dados que recolheram. A audiência para quem escrevem, a época histórica e o género particular em que escrevem, forças políticas e sociais e as suas próprias biografias, tudo se adiciona na construção do texto. O facto de se escrever na primeira ou na terceira pessoa ("eu" ou "o investigador"), a descrição dos métodos utilizados, o ponto de vista que se assume, a estrutura do argumento, as metáforas que se utilizam e a autoridade a que se recorre podem ser interpretados como uma questão de construção do texto e não como uma manifestação imaculada da abordagem "científica" do conhecimento. Na última década, movidos pelo debate pós-moderno e pelo trabalho de eruditos no campo dos estudos culturais e da crítica literária 258 259 Considerações finais sobre a escrita F J (particularmente os desconstrucionistas), os cientistas sociais passaram a estudar os textos que produzem, tendo em vista uma melhor compreensão da produção de "conhecimentos" (em antropologia, ver Marcus e Cushman, 1982; Clifford e Marcus, 1986; em sociologia, ver Van Maanen, 1988; Denzin, 1989). A atenção dada ao foco de um texto tem tomado os investigadores qualitativos mais conscientes da forma como os valores intervêm na criação dos estudos. Esta ênfase também alertou para uma das tarefas mais importantes do investigador qualitativo: a escrita. A maior parte dos livros e artigos sobre metodologia tinham como hábito realçar o trabalho de campo ou o plano de estudo. No entanto, os cientistas sociais pós-modernos mostraram que a "mesma" história pode ser escrita de diferentes maneiras e, por isso, desdobrada em "diferentes" histórias (Van Maanen, 1988). Pode assumir esta irreverência face aos textos qualitativos como uma tentativa de denegrir a legitimidade da escrita em ciências sociais - as etnografias não são científicas, são apenas ficções. Mas pode também encará-la como uma oportunidade de alargar as escolhas sobre como escrever. Se compreendermos que ao escrevermos resultados qualitativos estamos a envolvermo-nos numa espécie de artesanato interpretativo e que o texto pode assumir uma variedade de formas, estamos a libertar os investigadores de algumas das convenções que inibiram a sua expressão criativa (McCa!! e Becker, 1990; Becker, 1986c). Ao reflectirem sobre o interesse actual dos cientistas sociais pela desconstrução dos textos, alguns antropólogos referiram o presente estado da escrita nas ciências humanas como "um momento experimental" (Marcus e Fischer, 1986). VII INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA APLICADA EM EDUCAÇÃO: AVALIAÇÃO, PEDAGOGIA EACÇÃO NOTAS 1. Pode fazer o tipo de análise que acabámos de discutir a partir de várias categorias diferentes de codificação. Frequentemente, utilizam-se "tipos de" sistemas de codificação de subcategorias, mas outros como "passos de", <'foImas de chegar a", "resultados de", "razões para", "sítios onde"', "usos de" e "características de" também podem funcionar como categorias de codificação. O sistema de subcategorias constitui um instrumento que o ajuda a organizar melhor os dados, pois facilita a antevisão das secções do desenvolvimento. Por exemplo, o desenvolvimento do seu trabalho pode apresentar a tipologia e os seus elementos. Se tiver como foco uma tese, as secções podem apresentar-se de uma forma diferente - uma apresentação, ponto por ponto, das componentes do seu estudo que apoiam a sua tese. 2. Investigadores qualitativos famosos na tradição académica também sugeriram que o investigador deve falar sobre o papel que desempenha. Rosalie Wax (1971), por exemplo. refere que um autor deve explicar a maneira como foi pessoalmente afectado pela investigação que realizou. 260 I., 261 -'-"''''''~''''''''''''''''''l!'!!IlIII! '' • I E difícil conceber que o facto de ensinar analfabetos a ler e a escrever possa levar à deportação, contudo, foi exactamente isto que aconteceu a Paulo Freire, durante os anos sessenta no Brasil. Freire entendia que o analfabetismo e a pobreza conduziam à depreciação pessoal. Ensinar as pessoas a ler era sinónimo de as ensinar a valorizarem-se a si próprias, O método que Paulo Freire desenvolveu para alfabetizar aumentava a consciência e estimulava a formação de grupos organizados e politizados onde quer que fosse posto em prática, A ditadura brasileira ressentiu-se deste facto, Para ensinar a ler, Freire e os seus colaboradores tinham necessidade de se aperceber do modo como os estudantes percebiam os acontecimentos e as acções que os rodeavam. Parte do método incluía discussões de grupo que incidiam sobre temas que se relacionavam com o quotidiano dos aprendizes. O professor mostrava a um grupo de agricultores uma gravura e era-lhes pedido que discutissem o significado que esta tinha para eles. Desta forma, o professor apercebia-se das palavras que eram mais importantes para o grupo, e estas iriam constituir o conteúdo da primeira aula. Posteriormente, quando o programa se desenvolveu, Freire sabia, em função da sua investigação, quais os temas que iriam surgir, mas, quando iniciou a formulação do método, necessitava constantemente de investigação. Um acontecimento particular que Freire refere revela a seriedade deste estádio do processo. Um dos seus colaboradores mostrou aos alunos uma gravura representando um homem embriagado, cambaleando nas ruas de uma cidade. O professor, esperando que a gravura levasse a uma discussão sobre o alcoolismo, ficou surpreendido com a primeira reacção do grupo, quando disseram: "O homem deve ter emprego." "Deve ganhar um ordenado para poder gastar em bebida." (Freire, 1968). A gravura não lhes sugeria o mesmo que ao instrutor. No exemplo anterior a perspectiva qualitativa é clara: Freire nunca pretendeu saber aquilo que os estudantes pensavam antes de os estudar. Contudo, não os estudou por estar meramente interessado em aumentar o seu repertório de conhecimento; necessitava de aprender, com o objectivo de melhorar os seus métodos de ensino. Trata-se de um exemplo de investigação aplicada. Faz-se investigação por várias razões e para diferentes audiências. Tradicionalmente, os académicos categorizaram a investigação em dois tipos: fundamental e aplicada. 262 I 263 o objectivo da investigação fundamental é o de aumentar o nosso co~hecimento ~eral. A audiência para este tipo de investigação são as comumdades academlca e CIentIfica. Tal como no exemplo brasileiro, os esforços de investigação aplicada visam resultados que possam ser directamente utilizados na tomada de decisões práticas ou na .melhona de programas e sua implementação (Schein, 1987). A investigação aplicada dmge-se a vários tipos de audiências (professores, administradores, políticos, pais e alunos), possuindo, contudo, em comum a preocupação pelas implicações práticas imediatas. O título do presente capítulo pode sugerir que aceitamos a distinção comum, e por vezes antagónica, entre investigação fundamental e aplicada. Esta tensão entre os Jnvestigadores dos dois tipos de pesquisa reflecte alguns dos valores patentes na umversldade e nas comunidades científicas. Nestas, a investigação fundamental é maIs prestlglada e implica um estatuto mais elevado, por ser vista como mais "pura" e menos contaminada pelas confusões da vida quotidiana. A sua linguagem é mais abstracta e menos acessível para o comum dos leitores. _ Ambas as investigações, fundamental e aplicada, são frequentes no campo da educaçao. Idealmente, a educação deveria ser o resultado de uma articulação entre a teoria e a prática, mas, em muitos casos, constata-se hostilidade onde deveria existir cooperação. Os educadores enfrentam problemas quando a teoria e a prática se encontram rigidamente separadas; ~ desprezo que muitos professores e formadores de professores mamfestam uns pelos outros e um exemplo desta tensão. Na universidade, o departamento de educação é frequentemente visto como um parente pobre, por esta ser considerada uma disciplina eminentemente aplicada e não académica. Os professores destes departamentos tomam-se, por Isto, defenSIVOs. Uma outra consequência manifesta-se no facto dos próprios investigadores em educação diferenciarem de forma antagónica a investigação aplicada e fundamental, afastando-se assim dos seus colegas mais práticos. Preferimos pensar sobre estes dois tipos de investigação de forma não conflituosa, como complementos frequentemente articulados, e não necessariamente antagónicos. Alguma investigação aplicada aumenta a compreensão teórica, alargando o leque de conheCImentos. Uma parte da investigação fundamental, tal como a investigação sobre a teona da, aprendIzagem, pode ser imediatamente utilizada e aplicada a um aluno ou turma espeCIfica. Por vezes, os investigadores qualitativos com maior experiência podem sImultaneamente servlf os interesses da investigação fundamental e aplicada: assumir ambos os papéis. Os dados que recolhem podem ser utilizados para os dois objectivos. Isto não significa, certamente, que o mesmo artigo se dirija, simultaneamente, ao praticante e ao teórico, contudo, o material escrito e conceptualizado com um dos objectivos pode ser retrabalhado tendo o outro em vista. No nosso próprio caso, já nos aconteceu retomar relatórios práticos que tínhamos escrito com um objectivo específico em vista e sermos capazes de os conceptuahzar numa perspectiva de investigação fundamental (Bogdan, 1976; Bogdan e Ksandar, 1980). De igual modo, muito do que aprendemos na condução de investigação fundamental tem tldo aplicações práticas, depois da informação ter sido devidamente trabalhada. 264 I Em que circunstâncias se faz investigação qualitativa em educação? Debrucemo-nos sobre alguns exemplos: Uma instituição estatal financia dez distritos escolares espalhados pelo país com o objectivo de se iniciarem programas experimentais. Contratam-se investigadores qualitativos para observar o progresso da investigação e para elaborar directrizes que possam auxiliar na modificação das actividades habituais. Um programa de formação de professores quer reelaborar o seu currículo. Recorre a estudantes graduados para entrevistarem e fazerem observação participante junto de pessoas que se encontram presentemente a frequentar o programa, com o objectivo de compreender o que é que eles consideram ser os seus pontos fortes e fracos. Estes dados serão utilizados no desenvolvimento do novo modelo. Um grupo de pais preocupa-se com a possibilidade de se verificar segregação em função da classe social, dado o facto de a escola ter passado a receber estudantes de outras áreas residenciais. O investigador começa sistematicamente a entrevistar outros pais e membros da direcção da escola, bem como a ler documentos oficiais e relatos de jornais, com o objectivo de fundamentar as suas expectativas. Eis exemplos práticos da abordagem qualitativa. Ainda que os objectivos sejam diferentes em cada um dos casos, além do facto de serem úteis no momento presente, todos eles se centram na mudança. No caso dos investigadores e dos programas experimentais a mudança é planeada, voluntária e tem como objectivo a inovação. No programa de formação de professores, a mudança tem como objectivo um treino mais eficaz. A mudança, no caso do grupo activista de pais, tem como objectivo influenciar a tomada de decisões políticas. A mudança é uma coisa séria porque o objectivo é sempre o de melhorar a vida das pessoas. Mas, é igualmente complicada porque as crenças, os estilos de vida e o comportamento podem estar em conflito. Os indivíduos que tentam modificar a educação, quer seja numa dada sala de aula ou em todo o sistema educativo, raramente sabem o que pensam as pessoas envolvidas no processo. Consequentemente, são incapazes de antecipar com precisão a forma como os participantes irão reagir. Caso desejemos que a mudança seja efectiva, temos que compreender a forma como os indivíduos envolvidos entendem a sua situação, pois são eles que terão que viver com as mudanças. É exactamente a estes aspectos humanos da mudança que as estratégias de investigação qualitativa explanadas no presente livro se dirigem. A ênfase na visão pessoal e a preocupação com o proces'O permitem ao investigador antecipar as dificuldades inerentes à mudança. A orientação qualitativa permite ao investigador lidar com os participantes na mudança, quer se trate de uma única turma ou dos muitos e diferentes níveis da burocracia educacional. Esta perspectiva obriga-nos a ver o comportamento no seu contexto e não privilegia os resultados em detrimento dos processos. 265 Organizámos a discussão do presente capítulo sob três tipos de investigação qualitativa aplicada: investigação avaliativa e decisória, investigação pedagógica e investigação-acção. Estas distinções têm como objectivo proporcionar uma forma útil de organizar a discussão, mas cada categoria não deve ser entendida como totalmente distinta, nem se deve pensar que a discussão é completa e exaustiva. Como teremos oportunidade de verificar, as categorias no mundo real raramente são tão evidentes e independentes como as que são apresentadas nos livros. Os três tipos de investigação aplicada a que nos referimos têm, cada um deles, diferentes relações com o processo de mudança, sendo executados por diferentes pessoas e por diferentes razões. Na investigação avaliativa e decisória o investigador é frequentemente contratado com o objectivo de proceder à descrição e avaliação de um determinado programa de mudança, com o intuito de o melhorar ou eliminar. A investigação avaliativa representa a forma mais conhecida de investigação aplicada. O resultado deste tipo de investigação é normalmente um relatório escrito (Guba, 1978; Guba & Lincoln, 1981; Patton, 1980, 1987; Fetterman, 1984, 1987). Na investigação decisória o investigador é normalmente contratado por um organismo governamental ou por uma organização privada interessada num problema ou serviço social específico. Normalmente, a tarefa do investigador é a de conduzir investigação que forneça informação, de forma a auxiliar os indivíduos que possuem a autoridade a desenvolverem programas e a tomar outras decisões políticas. O resultado traduz-se habitualmente num relatório escrito (ou, menos frequentemente, num relatório oral). Na investigação pedagógica, frequentemente, o investigador é um praticante (um professor, administrador ou especialista educacional) ou alguém próximo da prática, que pretende utilizar a abordagem qualitativa para optimizar aquilo que faz. O indivíduo deseja tomar-se mais eficaz no trabalho pedagógico ou clínico, sendo determinados aspectos da abordagem qualitativa um contributo para a reflexão sobre a eficácia pessoal e sua optimização. Ou, ainda, o indivíduo recorre à investigação qualitativa na sua prática pedagógica, por exemplo, auxiliando os alunos a explorar as suas próprias comunidades, inserindo-os em projectos que os levam à recolha de descrições e de relatos orais das pessoas relativos ao seu dia-a-dia. Os beneficiados com a mudança são os clientes imediatos do praticante, os alunos ou os supervisores. As pessoas que se dedicam a este tipo de investigação nem sempre escrevem relatórios. Traduzem-na em mudanças práticas imediatas, introduzem-na em livros escolares ou reflectem sobre os dados, com o objectivo de criar programas de formação, seminários e novos currículos. Na investigação-acção os investigadores agem como cidadãos que pretendem influenciar o processo de tomada de decisão através da recolha de informações. O objectivo é o de promover mudança social que seja consistente com as süas crenças. Recorrendo aos dados recolhidos, realizam-se folhetos, conferências de imprensa, discursos, pareceres legais, programas de televisão e outro tipo de exposições com o propósito de promover a mudança (ver figura 7-1). Até ao momento, as considerações que temos vindo a tecer basearam-se no pressuposto de que o leitor se encontra no processo de aprendizagem da investigação qualitativa e quel começar o seu primeiro estudo. Normalmente, o primeiro estudo que um investigador conduz nunca é de carácter aplicado. Sendo assim, temos vindo a enfatizar a investigação fimdamental em detrimento da investigação aplicada, mas as diferenças não são tão grandes como isso. A maior parte dos conteúdos já apresentados aplica-se directamente ou pode seI modificada para servir a investigação aplicada. Contudo, existem diferenças e problemas específicos que podem surgir. No presente capítulo vamos examinar os diferentes tipos de investigação aplicada, reflectindo sobre os problemas inerentes a esta investigação. 266 267 I Podemos ser acusados de, ao englobar um leque tão amplo de actividades sobre a rubrica d~ in.vestigação, estar a alargar de tal forma a nossa definição, que ela acaba por perder o slgmfJcado. De facto, estamos a englobar mais coisas do que a maioria dos investigadores f~zem, particularmente no que se refere à inclusão da investigação-acção e pedagógica. E evidente que isto se encontra em desacordo com a investigação tradicional em diversos aspectos, necessitando de uma explicação adicional. Contud~, o nosso objectivo não é o de adornar estas actividades com a seriedade do título de "investigação", mas sim o de enfatizar a importância de promover a perspectiva qualitativa nestas áreas. Figura 7·1 • INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA APLICADA EM EDUCAÇÃO TIPO QUEM É QUE O INVESTIGADOR SERVE OBJECTIVO FORMA DE APRESENTAÇÃO DOS DADOS Avaliativo e Decisório Contratante Descrever, documentar e/ou avaliar uma mudança educativa planeada. Fornecer infonnação aos que tomam decisões. Relatório escrito Exposição oral Pedagógico Aprendiz ou programa Promover a mudança individual através da educação. Programa de fonnação Seminário Currículo Acção Causa social Promover mudança social na educação. Folheto Conferência de imprensa Parecer legal Programa de televisão Sociodrama Exposição Relatório programa de educação de crianças na primeira infância, o Head Start, subsidiado pelo Estado, foi iniciado por decisão governamental em 1972, com o objectivo de aumentar, em pelo menos 10%, o número de crianças deficientes abrangidas. Os directores deste programa em todo o país receberam directivas que, entre outras coisas, definiam, num sentido amplo, o que se entendia por "crianças deficientes" e estabeleciam o Outono de 1973 como a data de entrada em vigor. O objectivo das directrizes era o de aumentar os serviços de que as crianças com deficiências dispunham e o de promover a integração destas nos programas gerais. O organismo federal responsável pelo programa fez uma SP (Solicitação de Propostas)' com o objectivo de avaliar a eficácia do programa. Desejavam saber se os programas Head Start tinham sido cumpridos. O trabalho foi atribuído a determinada empresa e o contrato assinado. A investigação organizou-se em duas partes distintas que foram conduzidas de uma forma mais ou menos autónoma. O aspecto essencial da primeira parte consistiu no envio postal de questionários aos directores do programa. A estes foi solicitada informação sobre o número e tipo de crianças deficie~tes que tinham presentemente nos seus programas, comparativamente com o ano antenor. Com base nos dados recolhidos, concluiu-se que o número de crianças deficientes tinha duplicado desde que os regulamentos entraram em vigor, e que pelo menos 10,1% das crianças que frequentavam actualmente os programas Head Start tinham algum tipo de deficiência. Um segundo aspecto da investigação consistiu numa série de visitas aos locais onde os programas Head Start estavam em funcionamento, realizadas por equipas de observadores que utilizavam uma abordagem qualitativa. Recorrendo a um plano aberto executaram o trabalho, observando e falando com pais e pessoal escolar. As obser- vações iniciais consistiram numa recolha de dados em função de um conjunto de questões tais como: "Como é que as directrizes foram recebidas pelos pais e pessoal do Head Start?" e "O que é que se modificou, se é que alguma coisa se modificou, como resultado do programa?". A conclusão a que este grupo chegou foi algo diferente. Além do mais, os relatórios que foram enviados ao organismo financiador também eram substancialmente diferentes. As equipas de investigação qualitativa concluíram que o número de crianças deficientes não tinha aumentado significativamente; o que se tinha verificado era uma mudança na definição do conceito. Sugeriram que a ideia de que o Head Start servia 10,1 % das crianças estava errada. Estes relatórios tinham a forma de uma narrativa que pretendia reflectir todo um conjunto de proposições relativas aos efeitos das directrizes. Incluía-se um relato da confusão gerada pelo termo "deficiência", a forma como o pessoal escolar entendia as directrizes à luz da opinião geral sobre "as ordens de Washington", variações de programa para programa relativamente à adesão (desde a adesão "meramente no papel", até aos "esforços de recrutamento activo"), bem como as consequências não antecipadas das directrizes (desde a rotulação de crianças que previamente não o eram até à melhoria geral do planeamento individual para todas as crianças do programa). O organismo financiador ficou insatisfeito com o relatório qualitativo. Estavam interessados em conhecer os factos: "Qual a percentagem de crianças deficientes servida pelo Head Start?". Os financiadores queriam apresentar ao Congresso um relatório que fosse claro e preciso e, como os investigadores perceberam mais tarde, queriam que os resulta-dos fossem elogiosos para com o Head Start. A história da experiência do Head Start ilustra uma série de aspectos da abordagem qualitativa na investigação avaliativa e decisória. Estas características reflectem a abordagem qualitativa em geral, tal como foi descrita no capítulo L Os dados que são recolhidos tendem a ser descritivos, consistindo em relatos mais ou menos vívidos que as pessoas fazem dos acontecimentos e actividades. A apresentação dos resultados também envolve a sua descrição. A investigação tende a ser conduzida nos locais onde os progra-mas se estão a desenrolar. Embora em menor escala do que na investigação fundamental, o investigador dedica bastante tempo àqueles que está a avaliar, no seu próprio território. A análise e o plano desenrolam-se indutivamente. Ao contrário de partir de objectivos predefinidos ou extrapolados das descrições oficiais do programa, o investigador descreve-o, à medida que observa o seu funcionamento. Enfatiza-se o processo - como é que as coisas acontecem e não como é que um resultado específico foi alcançado; e existe uma preocupação pelo significado - como é que os vários participantes no programa vêem e entendem o que aconteceu. Relativamente a este aspecto, as pessoas de todos os níveis e de todas as posições no programa fornecem dados sobre o que este significa para elas. Às perspectivas dos administradores sobre o que aconteceu ou sobre o que correu mal não é dado nem maior nem menor peso do que à maneira como o pessoal pensa como decorreram as coisas. A ênfase consiste em relatar o que aconteceu, sob diferentes perspectivas, e conhecer as consequências da intervenção, tanto as não esperadas como as desejadas. 268 269 n Investigação avaliativa e decisória O I o exemplo do Head Start também evoca os problemas relativos à aplicação da perspectiva qualitativa em investigação avaliativa e decisória. Falaremos destes e de outros problemas na presente secção. CONSEGUIR SUBSÍDIOS Nos nossos dias, a investigação avaliativa e decisória é um grande negócio. Em I %4, o Decreto dos Direitos Civis afectou a educação, conseguindo subsídios para melhorar a qualidade desta junto de minorias raciais e da população mais pobre. O Governo federal quis acompanhar estes programas experimentais e, desta forma, os esforços de avaliação aumentaram. Esta avaliação subsidiada pelo Governo e os esforços de investigação decisória tinham como preocupação o impacto e eficácia de novas práticas educativas. As mudanças instituídas foram bem sucedidas? Os objectivos, tal como definidos pelos planificadores do programa, foram alcançados? Na sua maioria, a utilização em larga escala da investigação avaliativa e decisória durante os anos sessenta foi dominada por técnicas que empregaram procedimentos estatísticos, pré e pós-testes e outros planos quase-experimentais'. Apesar da investigação avaliativa quantitativa ainda dominar, por um determinado número de razões, a comunidade educativa começou a interessar-se cada vez mais por métodos qualitativos, na procura de instrumentos mais úteis para a avaliação e tomada de decisão. Como é que se pode fazer investigação avaliativa e decisória' ? Existem três maneiras. A primeira faz-se através da via SP, tal como no estudo Head Start. Escreve-se uma proposta para o organismo que solicitou o trabalho de avaliação e compete-se com outros concorrentes pelo contrato. Uma segunda maneira consiste em ser-se solicitado directamente por um organismo para lhe prestar serviço. Neste caso, estabelece-se um contrato que seja aceitável para ambos. A terceira maneira consiste em submeter a um organismo um pedido para avaliar um programa para o qual eles estão a tentar encontrar financiamento; a avaliação será subsidiada como parte de um subsídio mais amplo. Encontrando-se algures entre o procedimento SP e a solicitação directa, o organismo e o investigador trabalham conjuntamente para escrever a proposta. Um dos problemas com os quais se confrontam os investigadores qualitativos na procura de financiamento diz respeito ao plano de investigação. Algumas das SP que vêm de Washington transmitem uma mensagem bastante clara: não vale a pena os investigadores qualitativos candidatarem-se. As questões relativas à investigação são escritas de forma a excluir a abordagem qualitativa. Os interessados nos subsídios têm de identificar os sinais e saber que perseguir estas fontes de financiamento é uma tarefa em vão. Algumas das avaliações SP não transmitem mensagens claras sobre se os potenciais financiadores procuram um método particular de investigação. Neste caso, frequentemente os investigadores recorrem a pessoas que fornecem esta informação. Apesar de algumas delas seguirem estritamente as regras de não fornecerem informação relativa à competição pelos fundos, contactar com alguém de Washington permite compreender melhor o que pensam estas pessoas. 270 _I. I . Apesar de alguns organismos se mostrarem claramente antagonistas para com a investigação qualitativa, outros já expressaram um interesse genuíno por esta metodologia. É a estes grupos que as propostas devem ser submetidas. Contudo, ainda aqui, pode surgir um problema. Os avaliadores da proposta, nestes organismos mais receptivos, podem não ter tido a oportunidade de serem treinados em abordagens qualitativas e, por isso, não compreenderem aspectos importantes do plano de investigação qualitativo. Como educar estes avaliadores~ Como descrever em detalhe a metodologia e as questões da investigação, se a abordagem mdullva requer que as especificidades de como proceder surjam no decurso da investigação? Abordámos esta questão de uma forma sucinta no capítulo II, sugerindo que se conduza um estudo-piloto antes de escrever a proposta, de forma a tomar o plano mais claro. ObViamente, este procedimento não funciona em avaliação. É necessário responder com rapidez às SP. Mais uma vez, os avaliadores sem treino adequado tendem a mostrar-se cépticos se um candidato a investigador não puder descrever em detalhe a sequência do estudo antes de ele se realizar, mostrar a tecnologia que vai ser utilizada, indicar c1arame~te quais as contribuições que os seus resultados irão ter e mostrar na base de que cnteno o tratamento será considerado eficaz. Obviamente que não poderá satisfazer tal avaliador, mas pode responder a este desafio, fazendo uma revisão de literatura ampla e substanllva antes de escrever a proposta, usando esta revisão para gerar uma lista de questões específicas susceptíveis de serem utilizadas para começar a investigação. Pode discutir a forma como irá proceder relativamente as estas questões, mas sublinhe a possibilidade do plano poder vir a ser alterado se as questões se mostrarem inúteis ou parcas de senlldo. Para além disto, pode ainda apresentar os problemas específicos relativos ao estabelecimento da relação e outros, para mostrar aos avaliadores que está bem consciente dos problemas que pode vir a encontrar. Seja mais explícito do que seria habitualmente no respeitante à análise dos dados e outros procedimentos, de modo a que o avaliador da proposta, pouco familiarizado com a abordagem, possa ter uma visão concreta do que está envolvido. Lembre-se que a escrita de uma proposta de investigação para realizar um estudo qualitativo e a execução da avaliação qualitativa exigem duas abordagens distintas. A proposta representa uma hipótese de como proceder, de forma a dar ao avaliador uma ideia do que quer fazer. Não é um guião rígido sobre o modo como vai conduzir a investigação. Quando vai para o local de investigação pode querer comportar-se como se não soubesse nada acerca das escolas, de maneira a que a sua mente esteja "virgem"; mas quando escreve uma proposta quer que o avaliador o veja como uma pessoa competente e mformada, que Irá dar a sua contribuição para a melhoria das práticas educativas. Até ao momento, discutimos as respostas formais a dar às SP. No caso dos organismos solicitarem a sua ajuda, elaborar um contrato em que haja uma compreensão mútua relativamente àquilo que vai ser feito e à forma como vai proceder é o procedimento mais adequado. Para além disso, tem habitualmente a oportunidade de se encontrar com os potenciais contratantes, de ouvir as suas ideias e de lhes prestar informações sobre a abordagem qualitativa. 271 RELAÇÕES ENTRE O CONTRATANTE E O INVESTIGADOR O que coloca os investigadores avaliativos e decisórios numa posição diferente da dos outros investigadores é o facto dos seus serviços serem pagos. Eles são guiados não só pelas regras da investigação, mas também pelas expectativas dos contratantes. Apesar de não ser inevitável, e certamente ultrapassável mediante uma negociação cUidadosa e uma compreensão explícita, as normas do investigador, no que diz respeito ao rigor e concepção da investigação, podem entrar em conflito com as expectativas do contratante. "Os trabalhadores por conta de outrem" têm uma obrigação para com o contratante que deve ser balanceada com as responsabilidades de um investigador. Iremos delinear algumas das áreas de desacordo encontradas com frequência entre investigadores qualitativos e contratantes e apresentaremos algumas sugestões sobre a forma de as evitar ou lidar com elas. 1. Pertença dos dados. Se não for acordado antes do estudo começar a quem pertencem e quem tem acesso às notas de campo e a outros dados qualitativos, isto pode tomar-se uma fonte de discórdia. É compreensível que aqueles que lhe pagam considerem estes materiais como seus, mas a ética da investigação recomenda uma posição contrária. Os sujeitos devem ser protegidos do escrutínio de pessoas que podem tomar decisões quanto ao seu futuro, e o que se passa entre investigador e sujeitos é confidencial. Os contratantes podem, por vezes, não querer os dados em si, mas sim que lhes preste informações relatIvas ao funcionamento de programas particulares ou indivíduos específicos. Evidentemente o facto de lhes dar ou não esta informação depende do acordo que estabeleceu com os 'sujeitos. Mas, de forma a recolher dados significativos, os sujeitos devem sentir que o que lhe dizem a si não lhes será imputado nos relatórios ou nas suas conversas com outras pessoas. Se pensarem que o que lhe dizem vai ser directamente transmitido às autoridades, tal irá enviesar o que relatam. A investigação qualitativa é rica em relatos realizados pelos próprios sujeitos. Expressões coloquiais, calão, reparos críticos e até a maledicência abundam nestas páginas. A natureza dos apontamentos pode transformá-los em blasfémias; consequentemente, se lidos fora do contexto, e mesmo dentro do contexto, podem criar condições para uma acção administrativa violenta contra aqueles que as proferiram. Deverá tomar-se claro, desde o início, tanto para o contratante como para os sujeitos, que você é alguém contratado, mas não um espião. Agir como um espião violaria os objectivos e ética da inves- Alguns contratantes sentem-se ameaçados quando os objectivos do programa são questionados. Afinal de contas, sentem que como administradores são eles que estabelecem os objectivos. Pretendem que faça considerações sobre os seus objectivos, dado ser esta a razão pela qual lhe pagam. Existem várias formas de evitar este conflito. Em primeiro lugar, a melhor cura é a prevenção. Torne tão claro quanto possível, no início da investigação, que o foco do seu trabalho é a descrição ou documentação e não juízos relativos ao sucesso ou ao fracasso. Por outras palavras, tente reiterar, no acordo que estabelecer, que o seu objectivo não é o de fornecer informação sobre a qualidade intrínseca do programa (Everhart, 1975). Uma tal posição não invalida a avaliação do impacto de um programa, como se demonstra no exemplo seguinte. Um dos autores participou num estudo cujo objectivo era o de descrever um programa educacional no qual os indivíduos mais violentos, internados numa instituição estatal para deficientes, eram retirados e realojados em albergues para pequenos grupos. Este programa era um sucesso? Desde o início, que as conversas com o contratante acentuaram a noção de que os avaliadores não abordariam o estudo com uma definição preestabelecida do que seria um programa "bem sucedido". Não avaliariam o programa com o objectivo de ver se ele correspondia a determinadas normas. Ao invés, começaram com a atitude de que, como observadores exteriores, não seriam capazes de reconhecer o "sucesso" por mais evidente que ele fosse. À medida que os avaliadores qualitativos estudavam os albergues para pequenos grupos, foram-se apercebendo que os participantes em diferentes níveis do programa e com diferentes tipos de relações com as pessoas envolvidas definiam o sucesso de formas diferentes. Quando os investigadores entravam numa das salas e observavam que a mobília e os candeeiros se encontravam nos seus devidos lugares, não entendiam tal facto como uma indicação de sucesso. Quando entravam num quarto e viam as roupas nas gavetas, também não entendiam isto como um sinal de sucesso. Contudo, para o director da unidade de adolescentes na qual Johnny tinha passado muitos anos de violência, factos tão simples como estes constituíam indicações bem claras. Uma entrevista proporcionou as seguintes observações: "Quando ele cá estava passou muito tempo na sala de reclusão para indivíduos violentos. Nela havia muito poucas mesas, não existiam quadros e todo o material era indestrutível. No albergue existem quadros e candeeiros em boas condições, mobiliário normal no qual vi uma única marca de dentes, a qual, tenho a certeza, foi feita pelo Johnny. Normalmente éramos capazes de adivinhar o estado do Johnny pelas cicatrizes no pessoal e não vi nenhumas no pessoal do albergue. Quando me dírígi recentemente ao albergue para fazer a avaliação, espreítei para o quarto no qual o Johnny tinha uma gaveta cheía de roupa, e isto diz-me que não tem havido desrespeito por normas de higiene ou o rasgar de roupas, como acontecia frequentemente. Quando ele aqui estava nunca havia roupa nas gavetas." tigação. 2. Os objectivos do programa como objecto de estudo. As normas de um bom plano de investigação qualitativa sugerem que esta não seja conduzida com o objectivo de responder a questões específicas, tais como: "Será que o programa tem sucesso?". O contratante que exige respostas para a questão "Será que o programa funciona bem?" terá de ficar satisfeito com a resposta "Isso depende do modo como encaramos a questão". 272 I IOE-1S 273 "Frequentemente não compreendemos que não compreendemos" aquilo que vimos ou o que nos foi dito (Becker e Geer, 1957), Resultados evidentes podem facilmente ser negligenciados por avaliadores exteriores ou investigadores decisórios não habituados às indicações de sucesso ou que funcionam exclusivamente sob a perspectiva das definições fomecidas pelo contratante, 3. A hierarquia de credibilidade. O investigador qualitativo, ao considerar todas as fontes de informação como igualmente importantes, frequentemente abala a hierarquia de credibilidade de uma organização. Tal facto pode constituir um pólo de conflitos entre o contratante e o investigador. Por vezes, os relatos sobrepõem, por exemplo, à perspectiva do director de um liceu sobre este a opinião dos alunos. As perspectivas dos estudantes surgem como tão credíveis e frequentemente tão lógicas como as do director. A autoridade e a estrutura organizativa significam, para alguns, que as palavras das pessoas que se encontram no topo da hierarquia são mais informativas e fidedignas do que as dos que se encontram na base, mesmo quando as pessoas no topo estão a dar-nos a sua opinião sobre as da base. Apresentar as perspectivas do "outro lado" de uma forma credível pode fazer com que as figuras de autoridade se tornem defensivas e fiquem incomodadas com o portador desta mensagem. Os investigadores qualitativos podem apresentar as perspectivas dos indivíduos em diferentes posições hierárquicas com tacto. Os investigadores que pretendem que o seu trabalho seja seriamente considerado, devem consequentemente controlar o modo como apresentam aquilo que descobrem, evitando, por um lado, uma linguagem inflamada e, por outro, um relato excessivamente diplomático. 4. "Só sabe criticar". A abordagem qualitativa em investigação avaliativa e decisória examina de forma crítica as práticas organizativas, mas isto não significa que tenha de ser excessivamente negativista. Frequentemente, as organizações não fazem aquilo que dizem que fazem ou o que os seus objectivos indicam dever ser feito. Contudo, aquilo que realmente fazem pode ser importante e louvável. Os contratantes incomodam-se frequentemente com os relatórios que se limitam a assinalar aquilo que está errado, sem preocupações de elogiar o que está bem. Todas as pessoas funcionam melhor com reforços positivos. Não é necessário mentir para se ser útil, mas um tom optimista e positivo não o compromete. apresentar uma perspectiva distorcida. Pode culpar as vítimas da incompetência dos níveis superiores da organização. Os contratantes podem ficar incomodados quando o investigador se afasta do programa específico, contudo, esta linha de investigação pode mostrar-se importante. Negociar um acesso mais alargado aos programas, quando a negociação da investigação ainda está a ter lugar, pode proteger o investigador deste pólo de conflito. 6. A quem pertence e quem recebe o relatório? A investigação avaliativa e decisória pode constituir uma faca de dois gumes para os contratantes. Estes, frequentemente, não querem que as consequências indesejadas ou o modo de funcionamento de uma organização sejam tornados públicos. Por vezes, pretendem mesmo ocultar alguns resultados a determinados membros da organização. Quem é suposto receber o relatório final? Será que é pertença de alguém? Estas questões podem ser particularmente delicadas. De novo, estabelecer um acordo com o financiador pode eliminar futuros problemas. Gostaríamos, contudo, de o aconselhar a não se desfazer de muitos dos seus direitos (de publicação, reprodução, etc ...). Os relatórios elaborados pelos investigadores avaliativos e decisórios têm implicações de carácter político, podendo afectar os financiamentos, a vida das pessoas e os serviços de que beneficiam. É necessária muita ponderação, tacto e integridade para conduzir este tipo de investigação sem fazer inimigos. Como escreve o investigador veterano J. W. Evans (1970), "é importante ter em mente que o avaliador vai ter de desempenhar um papel incómodo e controverso e que aqueles que pretendem prosseguir uma carreira neste campo devem ter uma consciência antecipada de tal facto". É importante que o investigador avaliativo e decisório tenha consciência dos problemas potenciais que pode encontrar, e tente evitar alguns deles através de um planeamento e discussão cuidadosos, antes de iniciar o estudo. No entanto, os investigadores têm uma série de necessidades que os torna vulneráveis à pressão dos contratantes e à de outros grupos de interesse e que os pode levar a desviarem-se do seu trabalho. A primeira destas necessidades é o dinheiro. Desta forma, uma boa salvaguarda para manter a sua integridade intacta é a de evitar contratos de investigação se está (ou vai ficar) dependente da remuneração da investigação para viver. Por outras palavras, só se pode permitir fazer investigação avaliativa ou decisória se puder ter meios para não a fazer. 5. Limites impostos pelo contratante. Os investigadores qualitativos dedicam-se a observar os seus sujeitos num contexto natural. Quando avaliam um programa, pretendem constatar a forma como ele se relaciona com a organização global de que faz parte. Por vezes, os contratantes impõem limites relativamente àquilo que pode ser estudado. Estes limites podem, por vezes, excluir os escalões mais elevados de uma organização. Quando as tarefas avaliativas são estabelecidas de forma limitada, com o objectivo de incluir exclusivamente as pessoas directamente envolvidas no programa, o relatório avaliativo pode Discutimos no capítulo III o modo como os investigadores se devem comportar no local da investigação. As considerações que tecemos sobre as acções, o estabelecimento da relação, as competências de entrevista, etc., são também relevalltcs para este ponto. Contudo, dado que o contexto da investigação é um local de avaliação ou de decisão, surgem outros aspectos importantes. 274 275 I LOCAL DA INVESTIGAÇÃO Quando está a ser pago para avaliar um programa, deve avaliar um programa específico e fornecer informação sobre este ao organismo que o contratou. As pessoas sentem-se desconfortáveis ao serem avaliadas. Sentem, justificadamente, que existe algo em jogo. Alguns sujeitos podem sentir mais confiança naquilo que fazem e, por isso, voluntariamente participar e partilhar informação consigo. Outros sujeitos podem sentir-se mais ameaçados numa avaliação e fornecer respostas mais circunspectas. Os informadores podem recear que faça um relatório negativo acerca deles e que por isso venham a perder subsídios ou os seus empregos. Quais são algumas das coisas que pode fazer para reduzir este mal-estar? Em primeiro lugar, pode comunicar de forma clara que o objectivo da sua presença é o de aprender com eles - como se sentem face ao que fazem e o que entendem ser os pontos fortes e fracos. Por exemplo, se está numa determinada escola para estudar como é que funciona o programa "voltar ao B-A-BÁ", é importante saber o que os professores pensam sobre o "B-A-BÁ". Tal deve ser comunicado aos sujeitos. Você não está no local para decidir se o "B-A-BÁ" é "bom"; está ali para obter as perspectivas das pessoas envolvidas. Numa avaliação que um dos autores efectuou sobre um programa de tecnologia audiovisual nas escolas, o investigador não se apresentou como interessado em aprender se os professores utilizavam os filmes adequadamente ou "da melhor maneira". Explicou que a equipa estava interessada em descobrir como é que a maquinaria era usada, por que razões, e como é que estas "ajudas" eram vistas. Existe uma diferença entre conduzir um estudo dentro das hipóteses da ideologia do programa e o tomar esta ideologia como parte do conteúdo a ser avaliado. É importante que os sujeitos percebam as diferenças, bem como o facto de você não ter como objectivo defender aprioristicamente nenhuma perspectiva. Algo que pode pôr as pessoas mais à vontade é o tomar claro que você não é controlado pela "hierarquia de credibilidade" (Becker, 1970a) da organização. Leva as pessoas a sério; considerará a opinião tanto dos alunos, como dos professores, directores e superintendente. Os seus modos devem mostrar que valoriza de igual modo as perspectivas de todos eles. É importante que as pessoas saibam que você não é um espião. Normalmente, querem assegurar-se que as suas identidades serão protegidas e que os seus nomes não poderão ser identificados. Problemático na investigação avaliativa é o facto de o contratante poder saber qual o local particular em que você se encontra; deste modo, pode fazer perigar o anonimato dos seus sujeitos. O anonimato dos participantes individuais torna-se muito mais difícil, fazendo com que as pessoas se sintam menos à vontade. Não existem formas de minimizar as dificuldades de tal situação. As pessoas que realizam trabalho de campo sentem-se frequentemente intrusivas e vulneráveis. Pode dizer aos sujeitos aquilo que irá ou não revelar sobre eles, mas não lhes pode assegurar que não serão afectados pelo relatório que irá fazer. Se, por exemplo, lhe acontecer encontrar-se em determinada escola com o objectivo de avaliar um programa de leitura específico e observar dois professores a agir de forma inadequada com uma criança no recreio, pode optar por não fornecer esta informação ao contratante ou ao director; os professores sentir-se-ão mais à vontade sabendo isto, mas você terá sempre de fornecer informações sobre o programa de leitura que poderão, obviamente, vir a ret1ectir-se no pessoal escolar. É particularmente útil tornar claro, antecipadamente, qual o seu papel, tanto para o contratante como para os sujeitos que vai investigar. Contudo, não há forma de eliminar os sentimentos de vulnerabilidade dos sujeitos. Preocupados com a possibilidade dos seus empregos poderem depender da informação que lhe prestam, esta terá um carácter restrito. Nem todos os projectos implicam situações ameaçadoras. O trabalho dos investigadores não é sempre o de avaliar, mas também o de descrever e comentar aquilo que se passa. Determinado organismo pode pretender exclusivamente um registo relativo ao modo como uma instância particular de mudança é iniciada, desenvolvida e finalizada. Avaliações deste tipo provocam menos stress. Vamos contrastar dois exemplos de avaliações que discutimos anteriormente. A avaliação do Head Start decolTeu num clima algo tenso, porque muitos dos programas se preocuparam com a possibilidade do seu financiamento ser cancelado e do pessoal ficar sem emprego, caso não preenchessem as normas relativas às crianças deficientes. Contudo, nas avaliações relativas ao uso da tecnologia na sala da aula, os professores sentiram que o papel dos avaliadores era o de compreenderem o modo como a tecnologia e os equipamentos eram entendidos e utilizados. Não se preocuparam com a possibilidade de serem despedidos por não usarem o equipamento de forma adequada. FEEDBACK Quando a equipa de investigação qualitativa estudou a utilização do equipamento audiovisual por parte dos professores, entregou-lhes o seu primeiro relatório na mesma altura em que o apresentou aos administradores. Quando os professores viram que a intenção dos investigadores de campo era a de compreender as suas perspectivas acerca da tecnologia, tornaram-se desejosos de as partilhar. Nesta situação, os avaliadores deram feedback àqueles que se encontravam no local da investigação durante o desenrolar do programa. Esta forma de investigação é denominada, na gíria avaliativa,jormativa. Significa que o propósito da avaliação é o de melhorar o desenrolar de um programa, através de um relatório contínuo sobre os resultados a que os avaliadores vão chegando. A informação é partilhada rapidamente aos participantes, de uma forma informal e num espírito de harmonia. Os avaliadores podem encontrar-se com os sujeitos numa base de regularidade, apresentar os resultados e discutir as implicações que estes têm para a mudança. Uma segunda forma de avaliação é denominada sumativa. Tem sido, tradicionalmente, a forma mais habitual de avaliação. Neste caso, uma avaliação é realizada na íntegra, sendo, posteriormente, o relatório final apresentado ao contratante. Estes relatórios são utilizados para tomar decisões relativas à reorganização do programa e à distribuição dos 277 recursos. Neste tipo de avaliação, o feedback raramente é fornecido enquanto a investigação está a ter lugar. Visto que se trata de um tipo mais formal de avaliação com implicações a longo prazo, existe maior probabilidade de surgirem tensões entre um avaliador e os participantes no projecto. Para o avaliador qualitativo, o feedback é uma preocupação metodológica essencial. Uma vez que um dos objectivos da investigação é o de construir as múltiplas realidades que os participantes experimentam, o investigador necessita de encontrar formas de verificar junto dos informadores se as suas construções reflectem o mundo tal como eles o vêem. A abordagem qualitativa exige que se confie no feedback como uma estratégia de investigação. A implicação deste facto é a dos investigadores qualitativos poderem sentir-se mais à vontade quando se envolvem numa avaliação 1. Deve ser tomado claro, desde o início do projecto, quais as responsabilidades indi- 1 viduais de cada investigador de campo. Por quantos locais cada indivíduo será responsável? Existe ajuda por parte de um secretariado para reproduzir as notas de campo ou cada membro é responsável pela sua dactilografia? Esta é uma questão importante visto que leva muito mais tempo dactilografar ou escrever as notas do que gravá-las. Uma vez que tenha informação sobre esta questão pode planear o seu tempo de acordo com ela. 2. É muito útil saber a calendarização do projecto e ser capaz de estabelecer um plano provisório sobre a forma como o relatório final será completado. Ainda que possa ser difícil cumprir os prazos previamente estabelecidos, estes criam uma linha de base, permitindo aos investigadores corresponder simultaneamente ao calendário do projecto e às necessidades individuais. 3. É útil estabelecer quais são as responsabilidades individuais para a escrita do relatório final. Serão os líderes do projecto os responsáveis pela escrita? Serão diferentes investigadores de campo responsáveis pelo rascunho dos capítulos? Qual será o seu próprio papel? Este conhecimento irá afectar a sua participação, por exemplo, em encontros realizados para apresentar e discutir a análise dos dados. 4. Apesar dos horários sobrecarregados, encontros de equipa marcados com regularidade podem ajudar na construção de um espírito de grupo. Se um líder do grupo identifica desacordos, a oportunidade para os resolver ocorrerá mais frequentemente se existirem momentos específicos em que o grupo se encontra. 5. Se possível, vale a pena contratar alguém para investigar os investigadores. Esta pessoa tem a responsabilidade de tomar notas de campo e de ser um observador participante dos encontros da equipa. A história oral do grupo é preciosa para a clarificação destas preocupações, tais como, o enviesamento por parte do observador, conflitos de grupo e inclinações intelectuais deste. Se o seu grupo faz diligências no sentido de ter um membro deste tipo, é importante que este papel não seja construído como o de um espião ao serviço do líder da equipa. As equipas de investigação qualitativa, habitualmente, também possuem hierarquias, e o investigador deve estar disponível para todos eles da mesma forma. formativa. TRABALHO EM EQUIPAS A investigação avaliativa e decisória em larga escala é, frequentemente, conduzida em equipa. Para o investigador qualitativo habituado à abordagem do "cavaleiro solitário", tal facto pode implicar algumas adaptações e, por isto, voltamos a falar em ambas as vantagens e inconvenientes da investigação em equipa para os investigadores de campo. Uma das vantagens do trabalho em equipa é a de proporcionar a um grupo de investigadores de campo a possibilidade de realizarem avaliações em múltiplos locais simultaneamente. Outra vantagem é a das pessoas trazerem, cada uma delas, diferentes competências e perspectivas para a investigação (Wax, 1979; Cassell, 1978a). Alguns investigadores podem ser especialmente competentes em estabelecer relações, outros podem escrever de forma espectacular, alguns podem ser particularmente persistentes na investigação de fenómenos problemáticos, enquanto que outros, ainda, podem primar na escrita de notas de campo detalhadas. Apesar destas serem competências que qualquer investigador de campo ambiciona, alguns de nós somos melhores a estabelecer relações enquanto outros são técnicos magníficos. O trabalho em equipa permite-nos maximizar os nossos resultados. No entanto, também existem desvantagens a ultrapassar. Urna equipa, corno qualquer conjunto de pessoas, pode ter problemas. As pessoas podem agir irresponsavelmente, podem surgir conflitos devido a personalidades diferentes, a liderança de grupo pode ser fraca ou a comunicação ser pouco clara. Além disto, tal corno nas equipas desportivas, se os membros da equipa agirem de urna forma demasiadamente individualista, os jogadores individuais não formarão um todo coerente. Deve-se trabalhar para alcançar um equilíbrio que ajude uma equipa a trabalhar junta, mas permita a cada indivíduo espaço suficiente para ser criativo. Capacidade de prcvisão e comunicação eficaz desde o início podem aju- r Tradicionalmente, tal como referimos nos capítulos anteriores, os investigadores de campo entram sozinhos no mundo para o observar. Na medida em que alguns investigadores de campo se vêem a si próprios como artistas, têm dificuldade em conciliar a sua pessoa com um processo de grupo. Quanto mais conscientes os membros da equipa estiverem destas questões, menor a probabilidade de virem a surgir problemas e maior a probabilidade da criatividade pessoal se vir a manifestar. AUDIÊNCIA dar a ultrapassar algumas destas dificuldades. Apesar de todos os grupos serem diferentes e outros autores terem desenvolvido estratégias para lidar com as situações de grupo, sugerimos as seguintes directrizes: A investigação avaliativa e decisória, corno dissemos, é aplicada porque é utilizada para fornecer informação aos praticantes ou aos que tomam decisões, de maneira a que 278 279 ".,.=" , , , , .,., ,. "l.,~, ".,.c, , , , , ", . . . .,.,_, ~_. . . . . _ estes possam educar melhor. Assim, a primeira audiência para o relatório da investigação avaliativa é o grupo que contrata o investigador, seja uma escola, um programa individual de educação, um organismo estatal ou um centro de treino. Visto que o relatório escrito é suposto encorajar ou conduzir à acção, em vez de simplesmente proporcionar mais leitura, o relatório deve ser escrito de uma forma que encoraje exactamente o que se pretende. Deve ser curto e não excessivamente elaborado, escrito de uma forma simples em vez de recheado de terminologia técnica. Ainda que a maioria destas sugestões não deva ser problemática para os investigadores qualitativos, a natureza dos dados qualitativos pode levar a que a brevidade não seja óbvia para aqueles que não dependem das apresentações estatísticas, quadros, gráficos e listas. Os relatórios qualitativos são, por necessidade, recheados de exemplos e descrições. Isto, no entanto, tende a alongá-los. Enquanto que no capítulo anterior discutimos o modo de escrever um relatório de investigação qualitativa, aqui, fornecemos sugestões com o objectivo de facilitar a discussão e a acção por parte dos praticantes. A investigação deve incluir no início do relatório um resumo dos resultados (ver Patton, 1980). Ainda que possa vir a sentir-se livre das suas obrigações depois de terminada a escrita do relatório final e do último encontro com a pessoa que o contratou, caso esteja interessado na divulgação do seu trabalho, pode querer escrever e rescrever os seus resultados de modo a serem publicados. Como afirmámos anteriormente, é possível reanalisar os dados recolhidos em projectos de investigação aplicada com o objectivo de escrever artigos para revistas profissionais. Para conseguir isto, é necessário ser claro que você detém direitos de publicação relativamente aos dados. Ainda que possa parecer trivial, alguns organismos estatais podem recusar aos investigadores de campo o direito de publicação do seu trabalho ou a apresentação dos resultados em conferências. Certifique-se que não é apanhado em nenhuma destas situações. ramo Os estilos de investigação no registo qualitativo aplicado são flexíveis. É importante que estabeleça prazos realistas para os seus objectivos, contudo, estes podem ser bastante mais modestos do que os necessários para um bom vinho. Se bem que seja importante ser explícito no relatório de investigação relativamente à quantidade de tempo passado no local, não é necessário transformar cada estudo numa tarefa para a vida inteira. Ainda que alguns autores tenham condenado a "etnografia apressada", uma investigação qualitativa realizada com rapidez (Rist, 1980) pode ser bastante útil se os dados forem apresentados cuidadosamente e com honestidade. o FUTURO DA INVESTIGAÇÃO AVALIATIVA E DECISÓRIA "A etnografia é como um bom vinho - necessita de preparação cuidada e envelhecimento", afirmou Steve Arzivu, um antropólogo educacional da Califórnia. Esta perspectiva tem sido a dominante no trabalho de campo qualitativo em educação, particularmente entre aqueles que têm recorrido à observação participante. Em concordância com tal ideia, alguns investigadores qualitativos sugeriram que se deve planear atribuir à escrita do relatório o dobro do tempo que se atribui à recolha dos dados (Wolcott, 1975). O investigador qualitativo que se vê mais como um artista do que como um técnico necessita de tempo para a inspiração e para a contemplação. Contudo, o investigador avaliativo e decisório é suposto fornecer a informação rapidamente - os resultados são de valor imediato. A nossa experiência é a de que a investigação qualitativa não precisa de ser excessivamente longa. Já nos aconteceu completar estudos avaliativos, na sua totalidade, em menos de quatro meses. Ainda que o nosso relatório final não constituísse uma monografia publicável de qualidade insuperável, foi bem recebido e útil para aqueles que nos contrata- Entendemos o futuro das abordagens qualitativas na avaliação educacional como promissor, mas espinhoso. Alguns autores parecem não ter ainda a certeza sobre se a abor·· dagem qualitativa se integra no "paradigma de investigação". Para os administradores escolares e para aqueles que tomam decisões educacionais, habituados a analisar relatórios de investigação estatísticos, o trabalho etnográfico realizado nas suas escolas não se assemelha a investigação: "Muitos administradores educacionais ainda encaram os estudos antropológicos realizados nas escolas como descrições empáticas e esclarecedoras nas quais não confiam por serem tão compreensíveis, enviando-os inevitavelmente ao professor de Estudos Sociais para que este os utilize na sala de aula." (Ianni, 1978). A linguagem de todos os dias utilizada pelos investigadores qualitativos e que faz com que os seus relatários sejam facilmente acessíveis aos praticantes transforma-se por vezes no seu inimigo. Por vezes, o investigador individual, sentindo-se sozinho no campo junto a sujeitos que nunca ouviram falar da abordagem qualitativa, pode ser tentado a pô-la em causa. Um colega partilhou connosco as suas experiências de avaliação de um dos primeiros projectos de Escola Experimental realizado num estado do Sul. Recorda claramente, passados vários anos, a complexidade de efectuar uma avaliação, quão diferente do laboratório o local de trabalho era e o desgaste inerente a estas ambiguidades. Para tomar as coisas ainda mais complicadas, deparava-se continuamente com o facto de ser apelidado de yankee. Contudo, enquanto discutia os problemas inerentes ao uso da abordagem qualitativa no processo avaliativo, os seus olhos brilhavam. Contou-nos como a orientação da investigação se modificou completamente em função das descrições que realizou. O distrito escolar tinha modificado drasticamente o seu processo de escolarização, continuando, no entanto, a existir pouca mudança no que tradicionalmente constituía um dos focos centrais na avaliação desta mudança - "os resultados dos alunos". Habitualmente, os investigadores avaliam os resultados dos alunos em função do domínio cognitivo: com base no aumento dos resultados em testes de realização, leitura e outras medidas. No distrito em questão, os resultados da leitura melhoraram iigeiramente, mas nada àe radicalmente diferente se verificou. "O que é que se passa?" Esta questão assolava o avaliador. Desta forma dirigiu-se a outras fontes de informação. Um professor afirmou: "Bom, os resultados nos 280 281 PRAZOS testes podem não estar a aumentar, mas notámos modificações na turma no domínio afectivo.". Os pais afro-americanos diziam: "Pode ser que os resultados não estejam a aumentar rapidamente, mas os nossos filhos já não permanecem nas ruas durante o horário escolar.". Outro professor comentou: "Os alunos estão a assumir responsabilidades pela sua aprendizagem de uma forma que não faziam anteriormente. Agem de uma maneira que nos diz que se sentem bem com eles próprios."'. Neste exemplo de avaliação da mudança, os avaliadores modificaram o comportamento de examinar os resultados dos testes dos alunos para uma atitude de diálogo com os professores, pais e alunos sobre as suas experiências. Consequentemente, a sua perspectiva alargou-se. Têm surgido outros pontos fortes das abordagens qualitativas na investigação avaliativa e decisória. Os métodos de campo representam uma abordagem eficaz na investigação de crises educativas, porque as partes envolvidas estão frequentemente tão absorvidas pela situação imediata que não são capazes de se distanciar e compreender as diferenças no modo como os problemas são percebidos pelos outros. Quando se verificam conflitos de valores é porque existem igualmente conflitos de perspectivas. O planeamento de determinadas situações - por exemplo, o de que determinada escola deva funcionar de forma regular, integrada ou em regime de compensação educativa - levará necessariamente a conflitos de valores. Deste modo, os investigadores qualitativos são chamados à cena porque se espera que eles sejam capazes de utilizar eficazmente os seus instrumentos para estudar os conflitos que possam surgir. Contudo, existem outros problemas, tais como o financiamento, o pessoal, a gestão e as questões relativas à prestação de serviços, problemas que não aparentam ser importantes, mas que são o resultado de conflitos não reconhecidos e não resolvidos (Ianni, 1978). De igual modo, estas questões necessItam ser estudadas pela abordagem qualitativa, alargando, assim, o campo de investigação. 282 II Utilizações pedagógicas da investigação qualitativa utilização da investigação qualitativa na avaliação não se afasta muito das definições tradicionais de investigação, mas na presente secção vamos afastar-nos daquilo que é habitual. O que nos propomos discutir não é normalmente considerado como investigação, podendo ser talvez melhor caracterizado por uma palavra diferente. Ainda que estejamos de acordo com isto, vemos vantagens na sua utilização. Aquilo que discutiremos é a aplicação da abordagem qualitativa, ou seja, o modo de pensar e a recolha de dados qualitativo relativos à vida diária dos professores e de outros agentes educativos. Iremos referir o modo como os praticantes podem utilizar, eles próprios, esta abordagem. Que uso lhe podem dar enquanto educadores? Como discutimos anteriormente, a palavra "investigação" enfatiza a recolha e análise sistemáticas dos dados. Ao utilizá-la no presente capítulo, é possível que estejamos a alargar o uso do conceito, o que significa acreditarmos na necessidade dos praticantes serem mais disciplinados e exaustivos na recolha de informações nos seus contextos naturais. Além do mais, acreditamos que todos os educadores podem ser mais eficazes se utilizarem a investigação qualitativa para o seu trabalho. Como já tinha sido acentuado na discussão relativa às origens teóricas da investigação qualitativa, os professores vêem aquilo que se passa na sala de aula a partir de uma perspectiva muito diferente da dos seus alunos. De igual modo, o director vê a escola de forma diferente dos professores (ou pais, encarregados de educação, enfermeira escolar ou assistente social). Não só as pessoas que ocupam diferentes posições em detenuinada organização tendem a ter perspectivas diferentes, como também se verifica uma grande diversidade entre aqueles que ocupam posições semelhantes. Nem todos os professores A 283 vêem os alunos da mesma maneira; as experiências individuais do professor, o seu passado e a sua vida pessoal fora da escola contaminam a sua perspectiva individual. À medida que vivemos as nossas vidas vamos construindo asserções sobre o modo como os outros pensam (ou não pensam), e fazemo-lo com base em parca ou nenhuma prova. É frequente deixar que os estereótipos tomem o lugar de uma verdadeira compreensão. Desta forma, ouvimos dizer que alguns alunos não estão a corresponder na universidade porque "são preguiçosos", ou "não vieram de um bom liceu", ou "pensam que já sabem tudo" ou, ainda, "estão habituados a que lhes dêem tudo de bandeja". Os directores pouco populares são vistos como "demasiadamente medrosos para agir", ou "mais interessados na sua promoção do que em apoiarem os outros", ou, ainda, "à beira de um esgotamento". Quando os praticantes recorrem à abordagem qualitativa, tentam sistematicamente compreender as diferentes pessoas integrantes das suas escolas, em função da maneira como estas se vêem a si próprias. Tal abordagem requer que os educadores sejam mais rigorosos e observadores na recolha da informação, no sentido de reconhecerem os seus próprios pontos de vista e de neutralizarem as imagens estereotipadas que podem estar a determinar o seu comportamento face aos outros. Para além disso, requer que se tome consciência de padrões de comportamento e características do meio físico, no sentido de se conseguir ser mais analítico relativamente às regularidades que podem estar despercebidamente a governar as suas vidas. A crença de que os praticantes podem melhorar a sua eficácia mediante o recurso à perspectiva qualitativa baseia-se no modo como a abordagem qualitativa encara a mudança. Quando se apresenta a alguns professores determinada inovação a ser experimentada nas aulas, eles afirmam: "Não vai funcionar. Não tem nada a ver com o mundo real.". Não questionamos o facto de muitas inovações não fazerem sentido e de que estes professores tenham frequentemente razão. Contudo, grande número de praticantes considera o "mundo real" como algo de absoluto, quase impossível de modificar. Muitos vêem as situações como não susceptíveis de negociação. A partir deste ponto de vista, as pessoas não sentem que têm uma participação activa na construção e criação do significado. A perspectiva teórica que subjaz à investigação qualitativa é diferente. A realidade é construída pelas pessoas, à medida que vão vivendo as suas vidas. As pessoas podem ser activas na construção e modificação do "mundo real". Podem promover modificações e afectar o comportamento dos outros. Os professores e os seus alunos definem conjuntamente o mundo real de cada vez que interagem diariamente nas salas de aula. Ainda que o possível seja negociado com base em limites inerentes à hierarquia escolar, a recursos disponíveis e a bases culturais de entendimento, o modo como professores e estudantes se definem mutuamente e as formas que os contextos educativos assumem tomam-se transaccionais (Sarason e Doris, 1979). A nossa crença na utilidade da perspectiva qualitativa para os praticantes relaciona-se com o facto de vermos todas as pessoas como possuindo o potencial para se modificarem, tanto a elas próprias como ao meio, e de se transformarem em agentes de mudança nas organizações em que trabalham. As competências inerentes à 2" 1'~'~·~ __"_·"__'.1"""""",,·,..,.,,.·· investigação qualitativa, ao proporcionarem informação sobre o modo como o mundo é num dado momento, podem ter um papel importante para ajudar as pessoas a viverem num mundo mais compatível com as suas esperanças. A abordagem qualitativa pode ser incorporada na prática educativa de diversas maneiras. Em primeiro lugar, pode ser utilizada pelos indivíduos (professores, outros agentes educativos e conselheiros) que têm contacto directo com os clientes (nas escolas os clientes são os alunos) para se tomarem mais eficazes. Em segundo lugar, quando a abordagem qualitativa começa a fazer parte do treino dos futuros professores, facilita-lhes o tornarem-se observadores mais atentos do meio escolar como um todo, auxiliando a transformar a sua formação num esforço mais consciente. Por último, a investigação qualitativa pode ser incorporada no currículo da escola, no sentido dos próprios alunos começarem a efectuar estudos baseados em entrevistas e na observação participante. COMO UTILIZAR A INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA PARA MELHORAR A SUA EFICÁCIA ENQUANTO PROFESSOR Como é que os praticantes podem incorporar as perspectivas qualitativas nas suas actividades diárias? Como é que podem acrescentar a investigação ao seu trabalho? Sabemos que os praticantes são pessoas ocupadas; não podem ter a veleidade de tomar notas detalhadas sobre tudo o que vêem ou ouvem, nem ter a extravagância de seguir pistas e ter acesso a uma ampla variedade de sujeitos da mesma forma que um investigador. Mas os professores podem integrar uma atitude de investigação no seu papel. Apesar de nunca tomarem notas de campo detalhadas, podem ser mais sistemáticos na escrita das suas experiências. Escrever as anotações num bloco de notas específico ajuda a recolher os materiais. Apesar de não poderem entrevistar as pessoas da mesma maneira que um investigador o faz, podem transformar as conversas que habitualmente têm em sessões de recolha de informação mais úteis. Incorporar a perspectiva qualitativa não significa mais do que tornar-se autoconsciente, pensar activamente e agir de maneira semelhante a um investigador qualitativo. Quais são algumas das coisas que pode fazer de forma diferente se assumir esta posição? Adoptar esta perspectiva quer dizer que começará a ter menos certezas sobre si próprio e a ver-se mais como um objecto de estudo. Tornar-se-á mais reflexivo. Observe-se enquanto agente educativo. Como é que se movimenta? Onde é que pára? Como é que a sala está arranjada? Com quem é que passa a maior parte do seu tempo? Como é que o seu dia está estruturado? Quem é que evita? Qual a perspectiva que tem do seu trabalho? Que momentos do dia mais receia? Que momentos do dia antecipa com agrado? Até que ponto aquilo que faz está de acordo com aquilo que pensa que deveria fazer ou gostaria de fazer? Que obstáculos define como interpondo-se entre o que é e o que gostaria de ser? Existem algumas pessoas com as quais se sinta particularmente ineficaz? O que pensa delas? O que é que pensa que elas pensam? J """"l"""_,,,,_,$IQ_:;:- - -. . . . . . . . 285 22 J.. z _z._. • A ABORDAGEM QUALITATIVA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES Que benefícios existem para os professores que utilizam uma abordagem qualitativa desta maneira clínica? Na medida em que os professores, ao agirem como mvestlgadores, não só desempenham os seus deveres, mas também se observam a si próprios, dão um passo atrás e distanciam-se dos conflitos imediatos, tomam-se capazes de ganhar uma visão mais ampla do que se está a passar. Uma determinada professora partICIpou num estudo onde lhe foi pedido que fosse um observador participante de uma das crianças da sua turma. A criança que escolheu para observar era uma com a qual ela "habitualmente tmha dificuldade em lidar". Observou a criança de perto e foi fazendo um registo sobre o que ouvia e via. Por altura do fim do projecto, a sua relação "melhorou significativamente". Ela passou a "gostar" do rapaz, percebendo, para sua surpresa, que antes não gostava dele. Contou que este sentimento se desenvolveu porque começou a compreender a forma como o mundo era percebido pelo seu aluno e como ele dava sentido ao que via. Come~ou a perceber onde é que as suas formas de pensar convergiam e onde entravam em conflito. Este exemplo reflecte um problema particular que um professor escolheu abordar, mas representa um bom modelo para a utilização da abordagem qualitativa ao servIço da A abordagem qualitativa requer que os investigadores desenvolvam empatia para com as pessoas que fazem parte do estudo e que façam esforços concertados para compreender vários pontos de vista. O objectivo não é o juízo de valor; mas, antes, o de compreender o mundo dos sujeitos e detenninar como e com que critério eles o julgam. Esta abordagem é útil em programas de formação de professores porque oferece aos futuros professores a oportunidade de explorarem o ambiente complexo das escolas e simultaneamente tomarem-se mais autoconscientes acerca dos seus próprios valores e da forma como estes influenciam as suas atitudes face aos estudantes, directores e outras pessoas. Apercebemo-nos que os futuros professores com quem trabalhámos, frequentemente, não estavam conscientes dos valores e crenças que traziam para a sala de aula. Apesar dos valores influenciarem o trabalho de qualquer pessoa e poderem fortalecer as capacidades de ensino e de interacção, a consciência destes valores ajuda-nos a ver como eles moldam as nossas atitudes face aos estudantes (e a outros educadores). As pessoas tomam-se mais conscientes da forma como participam na criação do que lhes acontece. Como parte de uma experiência de treino formativa, relativa a "como ser professor do ensino primário e secundário", um dos autores utilizou extensivamente a abordagem da investigação qualitativa. Como parte do treino, os estudantes todas as semanas passavam algum tempo numa escola. A abordagem qualitativa foi empregue de forma a ajudá-los a clarificar perspectivas conflituosas acerca da educação e a estimulá-los a questionar as suas hipóteses, até ao momento inquestionadas, sobre a forma como as escolas funcionam. Treinámo-los nalgumas estratégias da observação participante e, como parte do seu trabalho de campo, exigimos que conduzissem uma investigação em pequena escala na sala de aula ou na escola em que tinham sido colocados. Organizámos as suas "notas de campo" fornecendo-lhes uma lista de questões gerais de "investigação". Cada questão funcionou como pólo aglutinador de um conjunto de apontamentos. A lista de "questões do observador" incluiu perguntas como: melhoria da eficácia do ensino: ].º Passo. Escolha um problema que queira analisar: uma relação problemática com um aluno, um hábito particular da sua parte que queira modificar ou um estilo espe- ._ cífico que queira desenvolver. 2'º Passo. Tome notas detalhadas sobre o assunto em causa, regIste observaçoes e diálogos sempre que possível. Tente enfatizar interacções que ocorram à volta ?este assunto. Registe o que o aluno faz e diz aos outros e a si. Registe quando eXIbe o comportamento que quer modificar e com quem o tem. Quais são as reac,ções ?os alunos a ele? Descreva detalhadamente as ocorrências da turma quando esta a eXlblf o estilo que quer desenvolver. Deu conta de algum aluno a reforçar este comportamento? 3.º Passo. Quando terminar o registo a longo prazo dos acontecimento, procur.e um padrão que emerja dos seus dados. Coloque questões relativas ao que sobressaI,' Por que é que reagi desta maneira quando o aluno solicitou informação? O que e que aconteceu na turma quando manifestei aquele comportamento? E assIm por diante. 4'º Passo. Utilize os dados para tomar decisões se for necessário. Por vezes o próprio processo de investigação produz melhorias na situação (can;o no caso ~a professora para quem o surgir de apreço pelo aluno tomou mais faCll a relaçao co~ ele). No entanto, noutras circunstâncias, pode precisar de utilizar o seu conheCImento para planear acções. Talvez deva partilhar, em privado com o aluno, algumas coisas que descobriu acerca da sua relação com ele. Pode também marcar uma reunião com os alunos ou falar com outros professores ou, ainda, pedir sugestões específicas a um conselheiro. Esta tomada de decisão é característica das circuns- Como é que o professor organizou a aula? O que é que o professor que você está a observar entende por "disciplina", e como é que ele age de acordo com esse significado? Como é que caracterizaria a atmosfera que se vive na sala de aula 7 O que é que os professores dessa escola sentem acerca da sua profissão? Que tipo de estudantes são mais valorizados na sala de aula que está a observar? Como é que os problemas educacionais são analisados pelo pessoal? (Estes problemas podem ser de leitura, de disciplina, etc.). Como é que se manifesta a responsabilidade? Como é que se procuram as soluções? Estas questões foram planeadas em torno do conteúdo particular deste curso. Mas, pode planear questões em tomo de outros conteúdos. Os objectivos destas questões do tãncias particulares. j 1 m i m r"-'--~---'-.--1.,,,,,,,,",--,·,_., _WW,_; Mi4_A;_4.ilillll!!ll J I s_ _ •• observador foram os de: (l) melhorar as competências dos estudantes para descrever antes de avaliarem; (2) criar um nível superior de autoconsciência sobre os seus próprios valores e perspectivas; e (3) encorajá-los a verem de forma mais clara as perspectivas daqueles que possuem diferentes papéis na escola. Apercebemo-nos de que enfatizar o conceito de "perspectivas" como um meio para considerar a vida da escola permitiu aos estudantes questionarem o conjunto de asserções que tinham sobre o papel de professor. Alguns destes potenciais professores, por exemplo, pensavam que os estudantes eram difíceis para os professores porque vinham de meios pobres ou economicamente desfavorecidos ou que os problemas "culturais" levavam os alunos a tomarem-se perturbadores dentro da sala de aula. As observações podem ajudar os estudantes universitários a distanciarem-se do comportamento que ocorre na escola ou na sala de aula. A abordagem qualitativa exige que a pessoa cuja perspectiva os formandos tentam compreender fale em defesa própria. Isto significa que os formandos devem escutar as palavras dos sujeitos de forma isenta de teorias educativas que se tomaram populares, tais como a "privação cultural", ou metáforas baseadas na saúde mental, tais como "hiperactivo". O trabalho de campo sistemático permite aos formandos começar a constatar o modo como o poder está instituído, os tipos de pressões a que os professores estão submetidos, o nível de apoio que um administrador proporciona ou o modo como os alunos interpretam a vida escolar. Sublinhamos que o objectivo é o de auxiliar os formandos a distanciarem-se das suas concepções relativas à vida escolar - em primeiro lugar, examinando-as e, por fim, conseguindo ver a escola através dos olhos dos outros. Como se ilustra nos dois exemplos seguintes, o uso da abordagem qualitativa permitiu aos futuros professores alargar o seu conceito sobre as "verdades" educativas. Determinado formando, em trabalho de observação numa creche, sentiu no início do semestre que as crianças eram pouco disciplinadas. Um dia ele viu Betsy roubar uma boneca a outra criança que estava a brincar com ela. A pequenina que perdeu a boneca começou a chorar. Quando a professora se aproximou das duas meninas e perguntou à Betsy porque é que tinha roubado a boneca, Betsy respondeu "porque eu a queria", fugindo de seguida. Quando o observador tentou parar a Betsy, com o objectivo de lhe tirar a boneca e de a devolver à outra criança, foi-lhe dito pela professora: "Deixe-a em paz. Vou buscar outra boneca para a Joann.". Incomodado com aquilo que entendeu ser um exemplo de falta de disciplina, decidiu entrevistar a professora sobre estes actos. A professora explicou ao observador que sentia não ser adequado um adulto intrometer-se sempre para defender o direito de uma criança a determinado objecto. A professora explicou que se procedesse desta maneira receava que a criança pudesse ficar dependente dela para a defesa dos seus direitos. "Sinto ser muito importante que a criança aprenda que deve ser ela e não a professora a defender os seus direitos. A criança tem necessidade de aprender a desenvenci1har-se sozinha. Aquilo que necessitamos fazer é ensinar-lhe competências para defender o que é seu, em caso de necessidade". Deste modo, o observador compreendeu a perspectiva r--.". ' , i ,"._","'." *!I\'O.~I!\J;:I O L.""!"""" .• ,"""."'''''' ..'''''''''''' ·"'t.k!lW'lll!l\!k.4' , 1!1!14__ ,,4i.;;.i4. .. da professora. Onde julgava ter observado o caos, começou a identificar método. Podia não estar totalmente de acordo com isto, mas foi obrigado a rever a sua perspectiva sobre o que se passava. Por outras palavras, a sua percepção da realidade modificou-se. Contudo, a compreensão da perspectiva de determinado professor é só um dos objectiv~s; por vezes, os formandos aprenderam que o facto de confiarem nas suas próprias descnções lhes permitia clarificar aquilo que aceitar "ingenuamente" o ponto de vista do professor não permitia. Neste exemplo, um observador aceitou os comentários da professora sobre o facto das crianças da sua sala de aula se "distraírem com muita facilidade devido a capacidad.e~ limitadas de atenção". As notas do formando pareciam de princípio emprestar credIbIlidade a esta avaliação: "Observei o seguinte durante a hora de aula. Uma das crianças indianas não estava sequer a prestar atenção ao que a professora estava a dizer. Tudo o que fazia era olhar para fora da janela ou entreter-se com as suas tranças". Contudo, mais tarde nas suas notas, o formando fazia comentários sobre outro aspecto da vida da sala de aula: "Algumas crianças da turma não sabem falar inglês. Não conseguem compreender o que a professora diz. A criança indiana é um exemplo disto. Só chegou recentemente aos Estados Unidos e ainda não fala a língua.". O formando constatou então, como a sua perspectiva sobre o que estava a acontecer na turma se modificou. ' Temos vindo a descrever uma forma como a perspectiva qualitativa pode ser empregue em programas de formação de professores. O método qualitativo auxilia os educadores a tomarem-se mais sensíveis a factores que afectam o seu próprio trabalho e a sua mteracção com os outros. Utilizada pedagogicamente, a abordagem qualitativa pode ser IDcorporada tanto na formação contínua como em seminários e sessões informais de treino. Um antropólogo educacional, por exemplo, foi encarregue de treinar professores de Chicago para serem etnógrafos. O objectivo do projecto era o de aumentar a consciência dos professores acerca da forma como os factores culturais influenciam o seu próprio comportamento e o dos seus alunos. De forma a atingir estes objectivos, os professores eram colocados em situações de campo muito diferentes daquelas a que estavam habituados. Tinham de ganhar aceitação, estabelecer confiança e atravessar todos os estádios com os quais o investigador de campo habitualmente se depara, na sua tentativa de compreender esta "cultura" diferente. O programa estimulava uma busca pessoal e também os ajudava a aprender a analisar os organismos e as estruturas com as quais eles e os seus estudantes se têm continuamente que confrontar 5. MÉTODOS QUALITATIVOS NO CURRÍCULO ESCOLAR Quando os métodos qualitativos são utilizados como parte do currículo escolar chamamos a isto a abordagem Foxfire. A F oxfire, uma revista iniciada por um profe~sor e pela sua turma de inglês do ensino secundário na Geórgia, nos meados dos imos sessenta (ver Wigginton, 1972a), tomou-se um modelo para muitas revistas deste- tipo, por todos os Estados Unidos. O que todos estes esforços têm em comum é o facto dos estudantes reco- .J.~.. '.9. '.QE•. i . __. a ••••••• s mação dev: ser gu~dada, seja por que razão for, que seja guardada agora; e os seus investigadores loglcos sao os netos e não os investigadores universitários estranhos à comuni~ade. No processo de recolha, estes netos ganham um conhecimento insubstituível e umco acerca das suas próprias origens, herança e cultura" (Wigginton, I 972a) , A abordagem Foxfire fortalece os laços entre as gerações e reduz a alienação, Os chineses também utlltzaram esta ab~rdagem quando mandaram os estudantes para a província, a fim de recolhe~~m as hlstonas de vida das pessoas mais velhas que viveram durante o "passado amargo ou tmham partiCipado na Longa Marcha ou noutros acontecimentos históricos. Os sobreViventes da bomba atómica de Hiroxima também foram abordados pelas suas cnanças de forma a que as suas experiências não morressem com eles, Em todos estes casos, preservamos com o objectivo de compreender diferentes formas de dar sentido à Vida. Muit~s professores podem sentir que por mais interessados que estejam nestas actividades nao possuem ltberdade curricular para tentar este tipo de projectos em tão larga escala. A abordagem FoxfIre pode ser modificada para ser utilizada na sala de aula. Os estudantes podem sair, um de cada vez ou poucos ao mesmo tempo, para entrevistar membros dIferentes do pessoal da escola. Este processo deve ser continuado, dado que os a~u.nos necessitam de estabelecer uma relação com as pessoas que entrevistam. Se a secretaria do director trabalha na escola há muito tempo, poderá saber muito sobre a forma como as coisas mudaram - ou não mudaram - ao longo dos anos. Por exemplo, porteiros, condutore~ de autocarros e comerciantes da zona, todos constituem boas fontes. Os estudantes terao de trabalhar afincadamente para darem vida às suas histórias. A abordagem qualitativa, aplicada pedagogicamente, não constitui nem uma técnica terapêutica nem uma téc~ica de relações humanas. É, sim, um método de investigação que procura desc~ever e analtsar experiências complexas. Partilha semelhanças com os métodos de relaçoes humanas na medida em que, como parte do processo de recolha dos dados, devemos escutar correctamente, colocar questões pertinentes e observar detalhes. Mas os seus objectivos não são terapêuticos. A ênfase interaccionista simbólica na compreensão da for;na como um conjunto de pessoas, numa determinada situação, dá sentido ao q~e lhes esta a ~conte~er, encoraja uma compreensão empática dos diferentes pontos de vista. O foco do mvestlgador qualitativo no "como as coisas são na realidade" (Becker et ai" 1961) oferece uma oportunidade para fazer emergir pontos de vista díspares e habitualmente desconhecidos. lherem usos e costumes das suas comunidades, saindo da escola, entrevistando ;:,essoas ;obre o que fazem e sabem, observando-as enquanto estão a falar e/ou trabalhar nas suas tarefas ou ofícios e possivelmente fotografando-as também. Os estudantes recolhem informação em primeira mão de e sobre as pessoas que conhecem os hábitos, contos populares e artesanato de uma região. Estas são habitualmente pessoas idosas, e, desta forma, os estudantes conhecem-nas e desenvolvem amizades com pessoas mais velhas da sua comunidade. Os estudantes "estão a preservar histórias, a registar competências e a explicar formas de fazer determinadas coisas conhecidas das pessoas mais idosas da sua comunidade, pessoas para as quais as raízes são profundas e as memórias vão mais fundo do que para qualquer outra pessoa." (Wood, 1975) O conhecimento das histórias, competências e formas de fazer as coisas que os estudantes recolhem é específico às diferentes regiões do país, A revista Foxfire original, por exemplo, incluía descrições sobre como fazer cestos de tiras de carvalho branco, práticas artesanais de fazer álcool, mantas de retalhos, abatimento de suínos e sobre a história da vida da Tia Arie (Wigginton, 1972a). Mas os estudantes em Kennebunkport, no Maine, aprenderam coisas sobre pesca e agricultura na Costa do Maine e os estudantes em Washington, D.C., aprenderam coisas sobre "a zona negra" da sua cidade (Wood, 1975). De forma a realizarem o que foi chamado por jornalismo cultural, os estudantes necessitam de aprender não só as competências do trabalho de campo, mas também as competências relativas à redacção da informação para uma revista. As competências do trabalho de campo incluem aprender a observar, a entrevistar, a usar uma câmara e um audiogravador, a tomar notas e a obter histórias de vida (o que o jornalismo cultural designa por "histórias sobre personalidades"), resumindo, implicam a aprendizagem dos instrumentos da investigação qualitativa. Construir a revista contendo estas entrevistas, histórias, descrições e fotografias implica um trabalho de equipa, competências de escrita, revelação de fotografias, formatação e esforços infindáveis na tomada de decisão. (Um excelente guia sobre como fazer jornalismo cultural nas escolas é o de Wood, 1975.) Mais uma vez, estas são as competências que os investigadores qualitativos utilizam quando têm de escrever os seus dados e produzir um artigo, relatório ou livro. A aquisição de competências é apenas um dos benefícios alcançados quando a abordagem Foxfire é incluída no currículo escolar. Estas competências incluem algumas das tradicionais que nós valorizamos, tais como aprender a escutar, a escrever e a calcular (esta última envolvida na angariação e despesa do dinheiro para a publicação da revista), O que, por sua vez, também implica competências, tais como a tomada de decisão, a organização e o trabalho em grupo. Além do mais, existem igualmente benefícios para outras pessoas que não só os estudantes, e o principal reside na possibilidade de preservar conhecimentos que de outra maneira se perderiam quando os avós da nossa comunidade morressem. Dado que em muitas regiões do país este conhecimento tem sido transmitido oralmente através de gerações, ele nunca foi elaborado de forma escrita. Como o responsável da Foxfire diz: "Se esta infor- 290 1 291 j------I---_ r--MM.1......".".""'-.,"'--i@,@""-Jw:;:--A--. . . . '. do presente capítulo, procura resultados que possam ser utilizados pelas pessoas pa tomarem decisões práticas relativas a detenninados aspectos da sua vida. A investigaçã< -acção é um tipo de investigação aplicada no qual o investigador se envolve activamen na causa da investigação. Tanto os métodos qualitativos como os quantitativos podem ser utilizados na invest gação-acção. Os métodos qualitativos baseiam-se na observação, na entrevista aberta e n recurso a documentos. Nesta secção debruçar-nos-emos sobre a investigação-acção r educação em tennos qualitativos: as suas características, a natureza dos dados da inve: tigação-acção e as suas utilizações. IJ INVESTIGAÇÃO PARA A ACÇÃO De tarde, numa escola primária suburbana, uma mãe folheia um livro enquanto espeJ para ter uma conversa com o professor da sua filha. O facto do livro descrever as rapar gas como "não sendo divertidas" e "piegas" e as gravuras as representarem de forma pa~ siva, enquanto que os rapazes saltam, trepam e correm, deixam-na surpreendida. Nã podia imaginar que as raparigas ainda recebessem um tratamento tão díspar nos livre escolares. Fica tão irritada com este facto que reúne um grupo de mulheres da coml nidade, apresentando-lhes a situação. O grupo questiona-se sobre quão divulgada est prática é e decide examinar sistematicamente os livros escolares utilizados por todas a escolas primárias da cidade para ver como representam as raparigas. Decidem examina descrições, gravuras e conteúdos relativos às raparigas e às mulheres. Após este trabalhe descobrem que praticamente todos os livros repetem a situação com a qual a primeir mulher deparou. Fazem cópias de alguns dos exemplos mais gritantes e elaboram um rela tório. Este relatório descreve aquilo que descobriram, inclui cópias das gravuras e suges tões para a mudança. As mulheres dão um nome ao seu grupo e reservam algum temp' nas reuniões do Conselho Pedagógico, da Associação de Pais, do Clube Rotário e do Con selho de Directores de Biblioteca para apresentarem os seus resultados e as suas recomen dações para a mudança. Após um conjunto de reuniões emotivas com a Direcção d; escola, um seminário no YWCA e uma manifestação em frente da casa do director, ; Direcção da escola aceita as recomendações do grupo. Eis um exemplo de investigação -acção. Nancy Beth Bowen e outras nove crianças com deficiência mental ganharam o direit< à educação, em 1973, no famoso caso Pennsylvania Association for Retarded Citizen (PARC) versus The Commonwealth ofPennsylvania. O resultado do processo jurídico err tribunal foi o de que as crianças com deficiências profundas tivessem direito a "uma edu· cação apropriada", com o menor número possível de restrições. Foi estipulado um borr contacto entre o programa da escola e a família, como elemento importante para um~ Investigação-acção uando pensamos na palavra "investigação" funcionamos habitua!ment.e ,com~ cavalos a quem o dono colocou vendas nos olhos para impedu a vlsao penfenca a Q medida que caminha pela estrada. Uma das vendas, neste caso, é a nossa Ideia_de , m anos de treino adquiridos nas universidades, corporaçoes , que so as pessoas co de investi ação ou organismos governamentais, podem conduzir investigação. ~ outra, e a de que aginvestigação deve ser sempre independente, ou seja, não estar ao serviço de .~e­ nhuma causa Como a investigação-acção não reflecte nenhuma destas pre~lssa~ mUI os académicos ~radicionalistas não a entendem como "verdadeira" investlgaçao. o n~sso onto de vista, a investigação é uma atitude - uma perspectiva que as pessoas tomam ace p. . 'd d Académicos e investigadores profisSIOnaiS lllvestlgam aspectos ~ d h' 't a objectos e actlVI a es. pelos quais nutrem interesse. Fonnulam o objectivo do seu estudo, e~ fo~a e ~po ~~: ou de uestões a investigar. Não só se espera que conduzam a lllveStl~aça~, ~as am que a iaçam segundo os critérios estabelecidos pela tradiçãoda lllvestlgaçao, llldepend~ne de ser quantitativa ou qualitativa. Ainda que não haja consenso, eXistem oplmod~s tement .' . - Fora do melO aca esemelhantes relativamente ao que significa condUZir lllveStlg.açao. . _ . . _ . d "mundo real" também podem conduzir lllvestlgaçao - lllvestlgaçao miCO, as pessoas o d . m como lllSque seja prática, dirigida às suas preocupações e, para aqueles que o eseJe , , . b .ec A investigação-acção consiste na recolha de informações sistematlcas com o o 1 '\,O de promover mudanças sociais. Os seus praticantes reúnem dad~s ou provas patra tl . b" objectiVo de apresen ar trumento de mudança social. denunciar situações de injustiça ou pengos am lentaIs, .com o d' 'nício recomendações tendentes à mudança. A investigação aphcada, como Issemos no I 292 I "-"~" "'"' ' ' ' '_' '_'i M_' '.i i .....,.. ~ .. 293 --_i,'2-'1_ I_.2.3 Devemosreit~rar neste momento que a investigação tem sempre consequências políti c:s. A Investlgaça~ retIra o seu :ignificado dos objectivos a que se propõe e a sua impor tan~la das, utlhzaçoes que dela sao feitas. Contudo, só nos apercebemos de que a investi. gaçao esta ao serVIço de um objectivo particular, quando esse objectivo desafia um qual quer componente do status quo. Muitos burocratas também recolhem dados e conduzerr investIgação com um objectivo particular em mente: documentar quão bem se estão, dese~penhar,de forma a obter subsídios contínuos. Esta é uma função habitual da inves. tlgaçao orgamzacLOnal~ Por vezes, os dados recolhidos podem revelar que uma ligein reforma pode ser deseJavel. Deste modo, o organismo necessita dos subsídios para pode! faz~r um trabalho melhor. Não é por acaso que as organizações apresentam anualmente a~ r~zoes pelas quais necessitam de mais dinheiro e como conseguiram realizar tanto corr tao pouco. educação apropriada para a criança deficiente profunda. Alguns anos mais tarde, a comunicação entre os pais e a escola pareceu deteriorar-se e, em função disto, os advogados preocuparam-se com a possibilidade das crianças não estarem a receber uma educação apropriada. Desta forma, um grupo de investigadores qualitativos deslocou-se a Filadélfia, a pedido dos advogados das crianças, para realizar observações nas escolas, bem como entrevistas abertas com os pais destas crianças deficientes profundas. Os advogados queriam dados sobre a qualidade e as características do programa escolar da criança e sobre as interacções entre os pais e as escolas. O objectivo desta investigação era o de recolher provas para colocar à consideração dos tribunais num caso que iria mostrar a cidade de Filadélfia em desobediência para com a lei. Eis um exemplo de investigação-acção. Um professor universitário e um fotógrafo visitaram instituições estatais de grandes dimensões para pessoas com deficiência mental, de forma a documentarem as condições degradantes nas quais as pessoas viviam (condições que tinham observado em visitas prévias). Na sua visita a uma instituição, o fotógrafo tirou secretamente várias fotografias das condições institucionais, de forma a que a vida destas pessoas se tornasse pública. Enquanto isso, o professor desviava a atenção do guia conversando com ele e fazendo-lhe perguntas. As fotografias, vendidas à revista Look, transformaram-na no número de maior sucesso. Na forma de livro, Christmas in Purgatory (Blatt e Kaplan, 1974) vendeu mais de 50 000 cópias, aumentando a consciência nacional, tomando-se um factor primordial para o desenvolvimento do movimento a favor da "desinstitucionalização" nos Estados Unidos. Eis um exemplo de investigação-acção. Em todos estes exemplos, a investigação foi realizada com o objectivo de precipitar a mudança relativa a um qualquer assunto particular. Os próprios investigadores assumiram um papel activista, ou seja, de agentes de mudança, tenham eles sido pais preocupados com a educação dos seus filhos ou investigadores profissionais empenhados num determinado assunto. A investigação-acção está sempre preocupada com questões importantes. Pode focar-se em crianças que se encontram fora da escola (Children's Defense Fund, 1974), nas condições prisionais nos Estados Unidos (Mitford, 1971), nas punições corporais nas escolas (Center for Law and Education, 1978) ou na neutralização dos desperdícios tóxicos (Levine, 1980b). Ao preocuparem-se com estes assuntos, os investigadores da investigação-acção assumem sempre que a investigação irá reflectir os seus próprios valores. A investigação académica também reflecte valores. Os académicos, ao utilizarem a abordagem qualitativa, estão preocupados com um determinado problema social. Podem estudá-lo e escrever um livro onde expressam os pontos de vista de alguns grupos com poucos recursos. Alguns dos melhores exemplos incluem os trabalhos de Robert Coles (1964), Thomas CoUle (1976a, 1976b, 1977) e Lillian Rubin (1976). Os valores destes escritores também se encontram claramente reflectidos nos seus trabalhos, mas, apesar de se tratarem de investigações muito válidas, não estamos perante investigação-acção, na medida em que não se associam directamente à acção para a mudança. esttmulo tendente à realização da investigação relativa às condições de vida. Mas o relato dessas condições é orientado pela preocupação de ser honesto, de descrever detalhadamente aquilo que se observou e de se ser rigoroso. 294 295 Provavelmente o leito~ questiona-se: será a investigação-acção objectiva? É impor. tante clarIficar esta questao, partIcularmente se o leitor é um aluno de pós-graduação é trabalha: nu~ contexto académico no qual as preocupações com a objectividade em investlgaçao sao grandes. A objectividade é frequentemente definida como o facto de dal peso igual a toda a informação que se recolhe ou de não assumir nenhum ponto de vista partIcular. qua~do se conduz investigação. Tradicionalmente, no jornalismo, a objectlVIdade sIgmflca~a r~colhe~ ambos os lados de uma história (Wicker, 1978). Aqueles que conduzem Inve~tIgaçao-acçao acreditam que a objectividade se relaciona com a integridade enquanto investigador e com a honestidade posta no relato das descobertas. Debrucemo-nos sobre alguns exemplos de como estes investigadores têm encarado a questão. . Determinado manual de investigaçào-acção, dirigido às pessoas com interesse em investigar escolas estatais para deficientes mentais, reflecte sobre a objectividade no contexto da preparação de relatórios descritivos: "O objectivo destes relatórios não é o de manifestar uma visão 'objectiva' de detenmnada instituição, se por 'objectivo' se pretende significar o prestar a mesma atenção aos seus aspectos positivos e negativos. Os folhetos institucionais, as notícias para a imprensa e as declarações públicas apresentam sempre quadros positivos das instituições. Como estratég~a de base, os relatórios descritivos devem dar particular atenção à violaçao dos d!rellOS legais e morais - algo que raramente é referido e que necessita de ser modifIcado. Em função desta consideração o observador deve relatar as suas observações tão honesta, completa e objectivamente quanto lhe seja possível." (Taylor, 1980) Sendo o investigador da investigação-acção deste exemplo um advogado dos direitos da~ pessoas institucionalizadas, é exactamente o papel de advogado que funciona como -~-~~~----_~~-~-~ """"'''·-''·''-~·-''-··._---~m~~o~ ~. ~_ ~I •• o' o' .....00· '. o... ' __ _ _• • • • • ••••••••••••••••• • • Uoi •. ,• ......•.. r . :Z1 . . . frma não ser objectiva, se por . ubliJessica Mitford, a famosa jornahsta de mvesttgaçao, a I a bjectividade se entende abdicar de um ponto de vi~ta. Esforça-se por ser ngoros e s ha a importância de tal facto para a sua investtgaçao: "O rigor é essencial, não só para a inlegridade do Irabalho, mas lambém ara evilar processos por difamação. pode ser desastroso lenlar adaplar os , . .. e a nossa perspecliVa P factos às nossas concepções prevIas ou perrnl1lr qu impeça a busca dos faclos. . . Tenlo cultivar a aparência de objectividade, part~cularrnenle pela ;e~i~~c: da citação directa, evitando quaisquer modIficaçoes naqUIlo que.. . deixando os entrevistados, por exemplo, os admImstradores pnsIOnals, enlerrarem-se,por eles próprios," (Mitford, 1979, p. 24) , I 't mas ela nunca falta à ver'd d O enviesamento de Mitford é sempre eVidente para o el or, . f d Nunca se deve faltar a ver a e. :lade ou distorce as palavras dos seus l~ ~rma ores. "a hierarquia de credibili- ~~tra :~~~~~~~:~:::~2~~~~:::e:~~~~::liza forma o jornalismo objectivo dade , sobre a q J, f ficiais Até aos anos sessenta, sugere, o jornahsmo como sendo o Jornahsmo das ont~~i~is era' considerado subjectivo. Contudo, as expe- ;i~:C~:~~: ~~i~;:~o:;:~::~e~i:~~::~:ec~:~~~~u::~:i:a:::t;~~~;~:~ã~e~~eP~~:~ pecttva, porque os repo e .' . d aram a movimentar-se nas províncias era prestada pelas fontes oftcta~s. Quan o começ de baixa patente, não ficaram com o entre o povo vietnamita e os mlhtares amencanos d molar' "Estes repór. . . d a guerra se estava a ese mesmo quadro oPtlml~~a~o:~~~~i~::Oc;:~ objectivo possível- observando por eles pró· teres come~aram a rea IZ,. seando as suas considerações nas observações que 'd a I'ra do Governo Nestas circunstânprios, avahando eles propnos e ba I . . t ' cando a pe e e a Vl a e , os embaixadores e dos porta-vozes começavam a fazlam, frequente:uen e arns 8 Na ers ectiva de Wicker os repórteres cias, as aftrmaçoes dos g:ner~ls, d parecer ocas e exag~r~~a~ (Wlc~erd~ix7~~~ d~' se b~se: nas fontes oficiais (aquilo que ganharam em obJecttvl a e quan o lver directamente com o mundo social que os rodeava. lhes era dito) e se começa~am a ~nv~ _ a objectividade significa ser honesto, recolher Para os investtgadores da mvesttgaçao-acçao I .d s questões os dados na fonte e obter as perspectivas de todas as partes envo VI as na . O QUE A INVESTIGAÇÃO-ACÇÃO PODE FAZER . - ecolhem os dados a bem de determl. . Quando os investigadores da mve~~lg~~ao-::~~;ificar as práticas existentes de discri., ~ .••a n " , n ir ~. nada causa SOCial, fazem-no com o o Jec IVO , _ . b' nte Isto é consegmuo de ullC",utes ...a..e.. a.. mmaçao e ameaça ao melO am le . Ih I. . t mática de informação pode auxiliar na identificação de pessoas e tns~~t~~çõ:ss~u: contribuem para tomar intolerável a vida de grupos particulares de pessoas. Por exemplo, Geraldo Rivera denunciou as condições da escola estatal Willowbrook, em Nova Iorque, com o objectivo de modificar o modo como eram tratadas as pessoas com deficiências (Rivera, 1972). Os críticos dos serviços para pessoas com deficiências notaram que, frequentemente, tais instituições eram construídas em locais isolados, fora das comunidades, para limitar o acesso público. Rivera socorreu-se da câmara de televisão para aumentar o acesso ao público. 2. Pode facultar·nos informação, compreensão e factos, com o objectivo de tomar a posição e planos do investigador mais credíveis para audiências mais vastas, facul· tando, ainda, pontos susceptíveis de negociação, quando chegar o momento das decisões serem tomadas. Por exemplo, os testemunhos perante os legisladores relativos aos perigos inerentes às punições físicas nas escolas são reforçados quando se incluem detalhes resultantes de entrevistas e observações. 3, Pode auxiliar na identificação de aspectos do sistema que podem ser desafiados tanto legalmente como através de acções comunitárias. 4. Permite que as pessoas se conheçam melhor, aumentem a consciência que têm dos problemas, bem como o empenho na sua resolução. Ter conhecimento directo dos factos significa aumentar a consciência e dedicação relativamente a questões particulares. Por exemplo, Geraldo Rivera modificou-se extraordinariamente como pessoa depois da cobertura da história relativa a Willowbrook. Nunca mais quis fazer histórias ligeiras, como tinha feito no passado: "Dada a resposta obtida no caso de Willowbrook e a responsabilidade que sinto para com as crianças das escolas estatais, sinto uma imensa culpa quando não me estou a dedicar a assuntos importantes." (Rivera, 1972). 5. A investigação-acção pode servir como estratégia organizativa para agregar as pessoas activamente face a questões particulares, A própria investigação constitui uma forma de acção. Donas de casa que habitavam nas cercanias do Love Canal, em Nova Iorque, o qual era utilizado para descargas de substâncias tóxicas pela Hooker Chemical Company, organizaram uma associação para denunciar os padrões ambientais de envenenamento, preocupadas que estavam com os perigos para a saúde dos seus filhos na escola (localizada nas margens do canal). O processo de entrevista de residentes na vizinhança e a observação de doenças na casa das pessoas levou-as a empreender acções para assegurar a saúde das suas famílias. Foi essencial a identificação de outras pessoas que experimentavam problemas semelhantes. Como C. Wright Mills (1959) escreveu, o primeiro passo para a mudança social é a identificação de outros que se encontrem nas mesmas circunstâncias. 6. Ajuda-nos a ganhar confiança. É difícil empenharmo-nos entusiasticamente num determinado objectivo quando só nos baseamos em sentimentos, sem dados para basear as nossas posições. A recolha de dados auxilia-nos no planeamento da estratégia e no desenvolvimento de programas de acção comunitária. A investigação-acção fortalece o empenhamento e encoraja a prossecução de objectivos sociais particulares. A ABORDAGEM DOS DADOS NA INVESTIGAÇÃO-ACÇÃO Quando se conduz investigação-acção deve-se pensar neste processo como se de investigação se tratasse e designar as provas recolhidas por dados. QU~~~ se encara esta tarefa como a de um investigador e se colocam "questões de mvestlgaçao , for~ar~o-nos a uma atitude de trabalho mais sistemática, Isto pode parecer um Jogo de semantlca, m~s colocar a questão "qual a investigação que necessito :azer?" toma a tarefa mUlto maiS séria do que colocar a questão alternativa "o que e que eu deVia saber sobre este assunto?". " ' Os investigadores da investigação-acção são exaustivos ~a ~usca de matenals de - Muito do material que se pode vir a necessitar nao e secreto e pode ser endocumen taçao, , , ' . P I estiver a contrado em bibliotecas, tribunais e escntonos de advogados. or exemp o, se , ' . trabalhar num caso de punições corporais numa escola oficial, pode recorrer aos Jornais locais relativos aos últimos cinquenta anos para saber como é que se lidou com o castlgo corporal no passado. , Os factos nunca falam por si próprios. Enquanto se consultam os registos e outros ma, -" é que posso fazer com este , ' teriais é importante colocar contmuamente a questao o que material para tomar o meu caso mais convincente?", Se todos os mvest~gadore= t~nta;n documentar as suas posições de forma consistente, o mvestlgador da mvestlgaçao-acçao tem além disso, de sugerir recomendações para a mudança. Consequentemente, dev~mos , t' narmo nos sobre a melhor forma de transformar o matenal que possUlmos sempre ques lO . num estímulo encorajador de acções colectlvas. ," ' I Um tipo de documentação de particular importanCla e normalmente menos acessIVe ao úblico. Trata-se de documentos, revistas e outras public~ções do grupo ~artlcular que p " ( M'tford 1979) O anúncio a farmacos pSlcotroplcos nas re" , " pretendemos mvestlgar ver I vistas de saúde mental ou de sistemas de segurança escolar em revistas de admlmstraçlao escolar ou, ainda, artigos em jornais sobre escolas privadas podem proporclOnar e~emp os esclarecedores de pontos de vista particulares. Tratam-se de dados em ?rJIl~elra m_ao. - s Outro tipo de dados convincentes para os mvestlgadores da mv~stlgaçao-acçao sao o testemunhos de consumidores, Pessoas que foram enganadas, dlscnmmadas ou que fora~ de alguma forma vítimas, proporcionam testemunhos partJcular~ente poderosos. , estudo sobre jovens excluídos da escola contra a sua vontade por razo~s ~als como gra~­ dez deficiência "atitude" e incontinência, levado a cabo pela AssoClaçao de Defesa a "'C" o no1o,"o o,,, tovens, Estes mvestlCrian a, utilizou documentos poaerosos, pOlljUÇ u u ~ p~'~"- -~ç b 'm se frequentemente na estratégia qualitatIVa relativa a obtençao das pers gadores asela , , "d pectivas dos consumidores, mesmo quando se trata de pessoas defiCientes, mUlto ~ ~sas ou muito jovens _ pessoas que normalmente assumimos que não podem falar em e esa , , • __ o _ • ""~",_... ;"",,,,,,..,I.."""'_'MjjM_"h_?J;; J: _ _ , I IJ..., própria, Tais indivíduos podem tomar-se parte do movimento e não só "os objectos a serem servidos", Trata-se de um processo de humanização, Quando Geraldo Rivera fez a sua denúncia de Willowbrook, entrevistou para um programa de televisão Bernard Carabello, um jovem de 21 anos com paralisia cerebral, a quem foi incorrectamente diagnosticada uma deficiência mental quando tinha 3 anos e que passou os restantes dezoito anos da sua vida em Willowbrook. Rivera recorda a entrevista com Bernard como o momento mais dramático deste seu trabalho, Se bem que difícil de compreender, mas desejoso de comunicar, Bernard contou o seu desejo de ir para a escola aprender a ler e descreveu a deterioração das condições com que se defrontava sempre que se verificavam cortes orçamentais (Rivera, 1972). Bernard simbolizou, para os espectadores do noticiário de fim de tarde, o indivíduo, a humanidade inerente a uma pessoa institucionalizada. Testemunhos de consumidores como este contradizem a noção administrativa típica de que as pessoas de fora não sabem como aquilo "é na realidade". Uma outra característica dos dados da investigação-acção, como acabámos de ilustrar, é a de que eles são habitualmente obtidos e usados para serem apresentados como denúncia. Se bem que isto não se aplique a toda a investigação-acção, esta tradição de denúncia tenta desmascarar a corrupção, os escândalos e a injustiça, Esta tendência é particularmente evidente quando a investigação-acção é realizada em grandes instituições como escolas, hospitais, departamentos governamentais ou instituições de saúde mental. Contrariamente à investigação avaliativa, por exemplo, na tradição de denúncia não devemos procurar manter a confidencialidade sobre o local, mas sim chamar a atenção pública, Um investigador avaliativo está habitualmente preocupado com a relação com os informadores e não a quer fazer perigar. Ao contrário, na investigaçâo-acção, o objectivo deve ser o de denunciar as práticas de forma a modificá-las. Se quiser mudar a política de negócios de uma determinada comunidade, afectar as influências cooperativas no desenvolvimento de um currículo numa certa escola ou alterar alguma instituição particular ou prática numa determinada área geográfica, não poderá escolher o anonimato como táctica. Se os seus objectivos forem mais orientados para o país como um todo, deve tomar uma decisão táctica mais sofisticada aquando da revelação de nomes. Por exemplo, após a recolha de um número de instâncias específicas relativas a um problema social existente por todo o país, pode decidir revelar, de forma geral, onde é que estes exemplos ocorreram (em que locais do país ou em que escolas), mas a sua ênfase não se centrará agora nos indivíduos responsáveis pelas práticas injustas, Ao contrário, procura informar as pessoas da existência de um problema nacional. Neste tipo de investigação podem estar muitas coisas em jogo, A vida das pessoas, os empregos e os estilos de vida, tanto para aqueles que são vítimas das práticas injustas, como para os que trabalham e presidem às burocracias que as perpetuam. Por estas razões, é particularmente importante ser sistemático, completo e rigoroso na recolha de dados. Se o alvo da sua preocupação for uma determinada prática escolar, certifique-se de que visita o local durante um período de tempo suficientemente alargado para documentar • --1..- _ a sua preocupação. As suas observações, tal como as notas de qualquer observação participante, deverão ser descritas de uma forma detalhada. Se, por exemplo, como investigador de uma investigação-acção, planeia estudar algum incidente ou padrão de tratamento num contexto residencial para pessoas com deficiências mentais, a recolha sistemática de notas de campo poderá ser facilitada se a instituição for visitada por equipas de pais (ou outros grupos de acompanhamento) que recolham e compilem as suas notas. Estas estratégias não são diferentes daquelas já descritas anteriormente neste livro; reiteramo-las, na medida em que muita gente considerará os objectivos de mudança social tão ameaçadores que é essencial ser honesto, exacto e completo, na prossecução destes objectivos. Ainda que a recolha de dados possa levar mais tempo, isso permite-lhe estar menos vulnerável a quaisquer desafios de distorção e, a longo prazo, poderá alcançar os seus objectivos mais rapidamente. Um problema adicional com que os investigadores de investigação-acção se podem deparar diz respeito à acusação de que não têm os graus académicos ou o treino formal necessário à investigação e, por isso, os seus dados não devem ser levados a sério. Quando a senhora Gibbs, a dona de casa que se tomou a líder da luta no Love Canal, apresentou os dados sobre os padrões de envenenamento ambiental aos médicos, eles desvalorizaram-nos, afirmando que se tratava de uma recolha realizada por donas de casa (Levine, 1980b). Se for sistemático, completo e se basear nas provas que foram obtidas em primeira mão, como a senhora Gibbs, será capaz de refutar acusações semelhantes. Encontramos estes mesmos esforços a emergir novamente nos anos trinta, quando fotógrafos como Dorothea Lange e Lewis Hine utilizaram a fotografia para revelar os níveis de pobreza e desespero na América dos tempos da depressão. Nos anos sessenta, vemos novamente a investigação-acção na forma de grupos como os NARMIC, National Action Research Against the Military Industrial Complex, orientados para as políticas militares dos ~stados Unidos. As décadas de oitenta e noventa testemunharam a investigação-acção em areas taIS como desastres ambientais (e.g., Love Canal), políticas de saúde (e.g., o uso excessivo da cesariana para o nascimento das crianças) e problemas sociais (e.g., o mau trato das pessoas sem lar). A investigação qualitativa sempre incluiu tanto o trabalho básico como o aplicado. Durante alguns períodos históricos estas tendências conjugaram-se; noutros, separaram-se. Recentemente, um conhecido antropólogo educacional disse que o papel do etnógrafo relativamente à mudança social era o de "atingir um nível de descrição documentada e articulada sobre o que os participantes sentem, mas não conseguem descrevem e definir"6 Em conjunto com outras pessoas preocupadas com a mudança, quer esta mudança ocorra na avaliação, pedagogia ou modos de acção, os investigadores qualitativos podem ajudar as pessoas a viverem uma vida melhor. CONCLUSÃO: A INVESTIGAÇÃO APLICADA E A TRADIÇÃO QUALITATIVA A investigação-acção, tal como a investigação avaliativa, decisória e pedagógica, alicerça-se sobre o que é fundamental na abordagem qualitativa. Baseia-se nas próprias palavras das pessoas, quer para compreender um problema social, quer para convencer outras pessoas a contribuírem para a sua remediação. E, em vez de aceitar as ideias oficiais dominantes e habitualmente aceites, tais como "a escola educa" ou "os hospitais curam", questiona estas afirmações e transforma-as em objectos de estudo. Dado que o objectivo principal da investigação aplicada é a acção, o treino e a tomada de decisão, existem algumas diferenças entre esta e a investigação fundamental. As origens da investigação-acção são profundas. Como o capítulo sobre a história da investigação qualitativa em educação sugere, os métodos qualitativos surgiram numa época de tumulto social. Os objectivos do jornalismo de investigação, que precedeu o levantamento social, eram os de denunciar os maiores problemas que as pessoas tinham de enfrentar nas comunidades industrializadas dos Estados Unidos e, seguidamente, apresentar os dados de forma a que as pessoas agissem para impedir a poluição das águas, a expansão dos bairros de lata nas cidades ou a discriminação dos pobres nas escolas. 2. A investigação av~liativa também conheceu uma popularidade efémera nos fim dos anos trinta e quarenta. 3. Naturalmente, mUItas pessoas fazem estudos de programas e reflectem sobre a fonna como estão a trabalhar sem serem pagas.. Exi~tem e~celentes e,studos deste tipo. São conduzidos da mesma maneira que a investigação fundament~l .0 sena, so ~ue te.m como toco específico uma intervenção planeada. A nossa preocupação nesta sec~ão é espeCIfIcamente a Investigação avaliativa subsidiada. '>' 4. Entrevista com Joseph Mercurio, 1980. 5. Descrit~ por Steve Arzivu numa comunicação no Encontro da American Educational Research Association, Boston, MaIO de 1980. 6. Courtney Cazden proferiu estas afinnações durante um discurso no American Educational Research Association, em Boston, Maio de 1980. 300 301 ~'!'I':'~"~' :"! fI.~ !'l'1'",I'lPI'IlI' ' ';I:MI I!' ' '.J' ' $''~",'A''ii.HO;,";;;ii; _ _•• I 23 ::143 ai NOTAS 1. É a competição que d~termina quem é que o Governo Federal financia em termos de investigação. Os departamentos ~~vernamentals .fazem, uma Solicitação de Propostas, descrevendo a investigação que querem ver realizada. ~ anos centros de InveStlg~ção, p:rtencentes quer a empresas quer a universidades, descrevem os seus plan?s, metados e custos de execuçao. Apos as propostas terem sido recebidas são avaliadas e os contratos estabeleCidos. 1----.b.A",._,~:)1;. . ·.·.·.".:i:{o/ . . APÊNDICE Exemplos de questões relativas àobservação em contextos educacionais 302 r-'-'-" _.'__WL.L,-",." " •.__- ~ 303 1 _ aMIIII AMBIENTE ESCOLAR MEIO FÍSICO Quais as características da arquitectura da escola? Quais as dimensões do edifício? Será o edifício suficientemente espaçoso para albergar os estudantes de forma adequada? Quãp antigo é o edifício? Em geral, em que condições se encontra o edifício? Existem muros e vedações em redor da escola? Quais as características dos terrenos circundantes? Qual o aspecto geral das instalações? Estarão os acessos ao edifício preparados para alunos e professores com deficiências físicas? As pessoas em cadeira de rodas podem aceder ao edifício? Em que local da comunidade se encontra a escola? Quais as características desse local? Que tipo de transportes estão à disposição da e para a escola? Existem sinalizações claras que permitam a novos visitantes encontrar o que desejam? Qual a temperatura na escola? Encontra-se adequadamente aquecida no Inverno e refrigerada no Verão? A temperatura pode ser controlada em cada uma das salas? É possível abrir as janelas ou estas encontram-se permanentemente fechadas? Quais as características do sistema de ventilação? Que portas existem na escola? Como se encontra ordenado o espaço na escola como um todo? Como é que os professores definem o seu espaço? Existe algum espaço que os professores e outro pessoal considerem como territóric privado? m r'lll'!'A.' ""!I_""'''_'..''''''4"'IIII'I,U4''''t4'''''''''''.P.I' ""'4•I •••4.44111i4i1141_;""'$$I!!I1I.4- - - - - - - - k!!lll!:;awn'''''t ~ 11I ~ .1 22._,_* _ Os alunos têm cacifos privados onde possam guardar os seus objectos pessoais? Quais os alunos que se encontram nos melhores locais da escola? É permitido aos estudantes decorar as salas e/ou corredores? Quais as características destas decorações? Existem partes do edifício que sejam inacessíveis a pessoas em cadeira de rodas? Caso a escola tenha diferentes pisos, existem elevadores ou rampas 7 Os objectos e a mobília do edifício permanecem nos mesmos locais para que os estudantes invisuais se possam orientar? As portas e cubículos das casas de banho são suficientemente amplos para dar acesso a pessoas em cadeira de rodas? As sanitas estão limpas e livres de odores desagradáveis? Existem sabonetes e toalhas nas casas de banho? Existem portas nos sanitários para assegurar a privacidade? Quais as características dos "grafittis" existentes (caso existam)? Que tipo de equipamento audiovisual existe? Onde se encontra guardado? Como é que se lhe tem acesso? Existem pessoas que acumulam equipamentos? O que acontece ao equipamento danificado? O equipamento é usado frequentemente? Os docentes e pessoal auxiliar comem com os estudantes? Quanto tempo é dado aos professores, pessoal auxiliar e alunos para comerem? Existe tempo suficiente para uma refeição calma? Qual é a atmosfera durante a refeição? Como é que a comida é servida? Em que tipo de serviço? Que utensílios são utilizados pelos estudantes para comer? Que tipo de comida é servida? Como é servida? Os docentes e o pessoal auxiliar dizem mal da comida dos estudantes na sua presença? Existem programas de refeições em que alguns jovens não tenham que pagar? Como é que funcionam? Existe um estigma associado ao usufruto de refeições gratuitas? Quais as regras e regulamentos do refeitório? Qual a disposição do refeitório? De que é que os jovens falam durante as refeições? É permitido aos jovens sentarem-se onde desejam durante as refeições? O que é que os professores pensam sobre a cantina? De que é que os professores e demais funcionários falam durante as refeições? Onde é que os professores se sentam durante as refeições? O local é o mesmo todos os dias? MEIO ECONÓMICO, SOCIAL E CULTURAL Qual a reputação da escola na comunidade (boa, rigorosa, perigosa)? A que é que as pessoas se referem exactamente quando utilizam estes adjectivos? 306 r..i•._.*1I>'41!!111i44....Cl!!lllii$1I44_iII'I'l_=_:.,• •;:_ _l444''',,"*, Quais alguns dos problemas principais com que a escola se defrontou nos últimos cinco anos? Como é que os professores e pessoal auxiliar reagem às críticas vindas do exterior? Qual o tipo de coisas pelas quais a escola é criticada pelo exterior? Qual a composição racial da escola? Quais as semelhanças e diferenças entre a sua composição racial e a das outras escolas da área? Quais os sentimentos dos professores, administradores, estudantes e pais face à composição racial? Verificou-se ou verifica-se alguma controvérsia relativamente à composição racial da escola? Como se distribuem na escola os alunos e professores pertencentes a grupos minoritários? As turmas tendem a ser equilibradas ou os alunos pertencentes a minorias acabam por ficar todos na mesma turma? Quais as características das relações entre os diferentes grupos étnicos na escola (g:upos à parte ou integração)? Quais as palavras que os membros dos diferentes grupos étnicos utilizam para descrever os outros grupos? E eles próprios? Qual a composição socioeconómica da escola? Qual o suporte económico da escola? MEIO SEMÂNTICO Até que ponto os professores e pessoal auxiliar utilizam expressões do género rapaz, puto, gaiato ou miúda quando se dirigem aos alunos? Em que tom e circunstâncias se utilizam estas expressões? Alguma vez se referem aos alunos em função de características comportamentais ou psicológicas (i.e., débil mental, fala-barato, vaidosa)? Quais as alcunhas que professores e pessoal auxiliar dão aos alunos? Quais os estereótipos que os professores e o pessoal auxiliar utilizam quando falam sobre os alunos? Alguns exemplos podem ser os seguintes: "dá-se-lhes a mão e querem logo o braço", "chicote poupado, menino estragado". Quais as alcunhas que os alunos têm para os professores e pessoal auxiliar? Quais as expressões que os alunos utilizam para várias actividades, objectos e locais (i.e., em determinada escola o almoço era designado por "javardice")? Quais as palavras que os alunos utilizam para se referir aos professores e ao pessoal auxiliar em privado? Como é que os alunos se tratam entre si? Até que ponto expressões tais como "conselheiro" ou "reabilitação" se referem a actividades reais da escola? Quais as palavras ou frases que se utilizem na escola e que você não tenha ouvido anteriormente? 307 itsll!!ll'''';'''Q- - - - - - - - ---ISSI----.. a__ & 'ILIJI ../ I _ Serão exclusivas desta escola? Qual o seu significado? Será que os professores e o pessoal auxiliar utilizam vocabulário esotérico para se referirem a actividades, comportamentos, objectos e locais, em vez de utilizarem palavras usuais que possam descrever mais adequadamente essas diferentes categorias? Serão os professores e o pessoal auxiliar capazes de definir ou explanar claramente o vocabulário esotérico que utilizam? O que é que especificamente significam para os professores e pessoal auxiliar as expressões "modificação do comportamento", "aconselhamento" e "treino ocupacional"? Como é que os professores descrevem a escola? Como é que os alunos descrevem a escola? AMBIENTE HUMANO PROFESSORES De que é que os professores se queixam? O que é que eles enaltecem? Como é que os professores explicam os fracos resultados dos estudantes? Como é que os professores explicam os bons resultados dos estudantes? Será que os professores têm alunos favoritos? Quais as suas características? Será que os professores fazem distinção entre "o meu tempo" e "o tempo da escola"? Como é que os professores encaram as faltas por doença e as férias? Como é que os professores definem um comportamento pouco profissional? Será que as raparigas são tratadas de forma diferente dos rapazes? Existirão normas sobre aquilo que rapazes e raparigas podem fazer? Quais as representações de rapazes, raparigas, homens e mulheres nos livros de estudo? Como se reflectem as normas relativas ao comportamento apropriado para rapazes e raparigas naquilo que os professores dizem? Quais os professores mais populares da escola? O que é que parece fazê-los populares entre os professores? E entre os alunos? Quais os professores de quem menos se gosta na escola? Por que razões? OUTRO PESSOAL Quais as diferentes categorias profissionais do pessoal que trabalha na escola? Quais as tarefas dos diferentes especialistas? Como é que se pode saber qual o grau hierárquico das diferentes pessoas? 308 1~.~'~"""""""'L."", ...,,,,.,,,..,,,.. ,,,,.,,,,,.!tlI"'O!!I_.tllll';1!!l1 Quais as habilitações específicas necessárias para as diferentes categorias profissionais' Que tipo de formação recebem os membros do pessoal antes de assumirem as suas re ponsabilidades? Quais as razões dadas pelos membros do pessoal para trabalharem na escola ("gos de crianças", "o vencimento", "dá jeito")? O que é que os diferentes membros do pessoal pensam do seu trabalho? O que é que os estudantes, professores, pais e administradores pensam sobre os di! rentes especialistas (conselheiro, técnico de instrução)? O que é que se passa na biblioteca? A quem é que o bibliotecário considera que os livros pertencem? Qual o aspecto do seu trabalho que os diferentes membros do pessoal consideram m, importante? De que é que os diferentes membros do pessoal gostam particulamente? De que é q; não gostam? Quais as razões? Existem alguns membros do pessoal que sejam "mais preguiçosos" do que os outros~ Quais as regras e regulamentos a que os membros do pessoal não fazem caso? Quem é responsável pela vigilância e manutenção da escola? O que é que esses responsáveis consideram ser o seu trabalho? Como é que a administração os caracteriza? Como é que os alunos os caracterizam? E os professores? Quais as características da relação entre o pessoal de vigilância e manutenção e outros elementos da escola? O que é que o pessoal de vigilância e manutenção pensa sobre os vários professore E alunos? Onde se encontra o pessoal de vigilância e manutenção? Sobre o que é que conversarr Existem alunos que auxiliam o pessoal de vigilância e manutenção? Quem são eles? PROFESSORES, PESSOAL AUXILIAR E ESTUDANTES: COMUNICAÇÃO Os professores e o pessoal auxiliar dizem coscuvilhices acerca dos estudantes? E d próprios colegas? Em caso afinnativo, qual a natureza das coscuvilhices? Até que ponto os alunos são provocados? Pelos professores e pelo pessoal auxilia Uns pelos outros? Relativamente a que assuntos? Até que ponto os alunos são vituperiados? Pelos professores e pelo pessoal auxilia Uns pelos outros? Relativamente a que assuntos? Em que medida é que os aiunos são objecto de quaisquer outros menosprezos verbai: Será que o tempo dos alunos é considerado como importante ou os professores e pessoal auxiliar negligenciam os encontros com eles ou os fazem esperar? 309 Ad;;;:::;it I· 4 1---_.i.Lt_ Em que medida é que os professores ou o pessoal auxiliar levantam a voz quando falam com alguns alunos? Quais os alunos com quem isto se passa? Até que ponto os alunos são ignorados pelos professores e pessoal auxiliar? Até que ponto os alunos são tratados como se não existissem? Em que circunstâncias? Como é que os professores, o pessoal auxiliar e os alunos falam sobre as sextas-feiras ("Graças a Deus é sexta-feira?") e sobre os outros dias da semana? O espírito da escola parece ser diferente em dias diferentes? E em diferentes épocas do ano? O que é que se pensa sobre o fim dos períodos escolares? Será que as características do trabalho diferem em diferentes alturas do ano? Como é que os professores e o pessoal auxiliar avaliam o seu grau de sucesso na escola? Como é que os alunos avaliam o seu grau de sucesso? Quais os objectivos que os professores e o pessoal auxiliar dizem pretender alcançar? Como é que equacionam as suas actividades em função desses objectivos? Será que aos estudantes e aos professores e pessoal auxiliar é perguntado se se incomodam com o facto de existirem observadores exteriores ou pessoas estranhas à escola que se movimentam nas áreas de trabalho? Os professores e o pessoal auxiliar batem às portas antes de entrar? Pensa que lhe seria difícil manter um sentimento de dignidade se fosse aluno da escola? Como é que os professores e o pessoal auxiliar encaram os estudantes? Como seres humanos capazes? Como bebés? Perigosos? Até que ponto os professores e o pessoal auxiliar utilizam estereótipos para com os alunos? Em que medida os professores e o pessoal auxiliar conhecem as experiências passadas dos alunos e a história familiar? Como é que esta informação é tratada? Será que os professores e o pessoal auxiliar agem de forma diferente na presença de visitantes? Como? Até que ponto os estudantes tentam propositadamente tomar a vida difícil aos professores e ao pessoal auxiliar? Como é que o fazem e o que é que pensam sobre isso? Os estudantes fazem troça dos professores e do pessoal auxiliar? Se assim for, de que forma? Como é que os estudantes comunicam entre si nos intervalos? Será que os estudantes abordam mais os professores e o pessoal auxiliar do que estes o fazem? Até que ponto existe comunicação livre e aberta entre os estudantes e os professores e o pessoal auxiliar? Será que os professores e o pessoal auxiliar escondem informação dos estudantes e vice-versa? Relativamente a que tipo de coisas? O que é que os estudantes pensam dos professores e do pessoal auxiliar? 310 r'i' ' ' ' ' ' ' ' ' ;' ' ~' ' ' ' ' ' ' ' ' ' '-",", ' ' ' ' -' ' ' ' ' ' ' ' _A_4i' ~' ' ' ' O que é que os professores e o pessoal auxiliar pensam dos estudantes? Quais as designações utilizadas para os grupos de estudantes que se destacam pelos seus desempenhos? Quais os tipos de actividades extracurriculares existentes? Quem participa nelas? Professores e pessoal auxiliar? Estudantes? Qual o tipo de desempenhos mais premiado na escola? Atlético? Académico? Outros? Até que ponto os estudantes têm poder para tomar decisões? ESTUDANTES Com que frequência e quando é que os estudantes têm oportunidade para praticar exercício físico? Será que alguns estudantes praticam mais exercício físico do que outros? Quais e porquê? Qual o tipo de actividades a que os estudantes gostam de se entregar? E qual o tipo de que não gostam? O que é que os estudantes, os professores e o pessoal auxiliar vestem? Será que o estilo de vestuário proporciona informação relativamente a estatutos ou à pertença a grupos informais? E o estilo de penteado? Sobre o que é que os estudantes lutam entre si? Quem parece ser os jovens mais populares da turma? Por que razões? E os menos populares? Por que razões? Como é que se comportam os delegados de turma? Como são seleccionados? Quando há jovens perturbados a quem se dirigem para receber auxílio? Qual o número de alunos que frequentam programas para a redução do consumo de drogas? Qual o papel que a escola teve para que os jovens fossem submetidos a tratamento? Alguma vez a medicação foi usada como substituto do programa de tratamento? ADMINISTRAÇÃO Há quanto tempo é que o director ocupa este lugar e qual a opinião das pessoas acerca do director anterior? Como é que os professores se comportam quando o director entra nas salas? O que é que os administradores definem como pouco profissional? Como é que os administradores controlam os professores? Quais são os estilos dos administradores? Existem reuniões onde participa toda a escola? 311 "",!!,'""""",*"",,c " "'".illll!liV!lAli 4 I!'!l1iUI!IIIC_• • I.. .. _ d Como é que elas são? Como é que a administração é vista pelos professores e pelo pessoal auxiliar? E pelos estudantes? Como é que as turmas se movimentam pelo edifício? Quais os horários diários, semanais e mensais da escola? Quais as variações de turma para turma? Até que ponto a vida diária da escola é determinada mais pelas necessidades dos estudantes, dos professores e do pessoal auxiliar do que pelos horários da escola? Até que ponto as necessidades básicas como a alimentação e a utilização da casa de banho são feitas colectivamente? Em que medida existem espaços para os estudantes, professores e pessoal auxiliar poderem estar sozinhos sem qualquer tipo de vigilãncia? Quais os regulamentos relativos a vestuários formais e informais para os estudantes? E para os professores e pessoal auxiliar? Em que medida os estudantes têm acesso às casas de banho, ao telefone, ao recreio, etc.? Quem utiliza altifalantes e com que objectivos? Quais os critérios que um aluno tem de preencher (idade, local de residência) para poder frequentar a escola? Como é que as turmas se encontram organizadas - quem decide quem é que vai para cada turma? Como é que esta decisão é feita? Como é que se encontra distribuída entre os estudantes a participação em programas e acontecimentos especiais (viagens, peças de teatro)? Equitativamente? Como prémio? Será que a participação nestes acontecimentos reflecte distinções de classe ou étnicas? Quem determina o conteúdo destas actividades? Os alunos participam no seu planeamento? Em que é que diferem as actividades realizadas para cada um dos anos de escolaridade? As salas de aula dos diferentes anos de escolaridade estão decoradas de formas diferentes? De que forma? Até que ponto os alunos mudam de turma sem serem consultados ou sem o seu conhecimento prévio? Quais as características dos registos relativos aos estudantes? Os registos têm espaço para as queixas dos pais? Será que os registos enfatizam os episódios idiossincráticos em vez de apresentarem um quadro geral do aluno como um todo? Existem nos registos itens que sejam menosprezantes e que levem ao descrédito do aluno? Em caso afirmativo, será que lhes é dada oportunidade para responderem a essas considerações? Os professores e o pessoal auxiliar discutem os registos dos estudantes em público? Até que ponto é fácil aos pais ter acesso aos registos com informações relativas aos seus filhos? ~"~4Z;P" ", I ,.,;;...,..",;"'!P"".:"'A_""'.Killll!,tlllhk lIIIIl Qual o tipo de comunicação existente entre a escola e os pais? Os pais são consultados nas decisões que afectam os seus filhos? Quais as regras relativas a visitantes? Existe uma Associação de Pais? O que é que a Associação de Pais faz? Quantas pessoas estão normalmente presentes nas reuniões? Que "tipo" de pessoas estão presentes? Quais os programas para a Associação de Pais? Como se lida com as queixas dos pais? Que tipo de literatura ou instruções são dadas aos pais e/ou encarregados de educação pela escola? Quais as características deste material? Com que frequência é que os pais têm contactos com a escola e quais as características destes contactos? Quais as características e extensão do programa de voluntariado? Existem conflitos entre os professores, o pessoal auxiliar e os voluntários? Sobre que assuntos? Quais as tarefas que os voluntários efectuam? Qual a política de visitas da escola? As visitas à escola são habituais? Como é que se caracterizam os dias em que a escola se abre ao público para que este a possa conhecer e visitar? Será que a caracterização da escola que é apresentada durante estes dias corresponde adequadamente àquilo que a escola é num dia típico de trabalho? AMBIENTE DE APRENDIZAGEM CONTEXTO DE APRENDIZAGEM Quais as decorações das salas de aula? Os estudantes interagem entre si? São elogiados ou penalizados por estas interacções? Qual é a amplitude do nível da turma avaliada através de testes objectivos e classificações passadas? Em que circunstâncias é que os jovens são elogiados? As salas de aula são espaçosas ou acanhadas? Encontram-se em boas condições ou degradadas? Sombrias ou alegres? Mortiças ou atarefadas? 313 312 rI!llI!ll1'l'4'''' ......I'l'HiiiNffl!P ..''''''; PAIS MM Ma ..kU Ui $ a. 1.- ---...IlII!SQ.i~_ Quais os estudantes da tunna que tiveram um bom desempenho nas avaliações académicas passadas? E deficiente? Estas medidas reflectem com exactidão as capacidades dos jovens? Qual é o número médio de alunos por tunna? Os grupos de interesses especiais estão contemplados nas tunnas~ Todos os estudantes se dedicam à mesma actividade simultaneamente? Os alunos oferecem-se rápida e voluntariamente para dar respostas nas discussões? Falam uns com os outros, bem como com o professor~ A dinâmica da tunna optimiza a cooperação ou a competição? Quão frequentemente os alunos trabalham em projectos de grupo? Quão bem os alunos fazem um trabalho de fonna independente ou executam tarefas a longo prazo? Qual a experiência que têm de trabalho em pequenos grupos? As mesas e as cadeiras da sala de aula podem ser deslocadas e são-no de facto? Como é que os estudantes percebem que serão recompensados pelo esforço~ Todos os alunos são responsivos ao sistema de reforços? A tunna é heterogénea ou homogénea? Neste último caso, qual é o critério utilizado para este tipo de agrupamento? RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO Quantas vezes o professor repete a mesma coisa, durante o dia na sala de aula~ Os alunos têm tempo livre quando acabam o trabalho? O professor prepara materiais para serem utilizados na ocupação dos tempos livres? Que tipo de actividades em grupo é proporcionado? Qual o papel do professor durante as actividades de grupo? Onde está localizada a secretária do professor na sala de aula? Quais são os movimentos do professor durante o dia, relativamente à sua secretária? Que tipos de materiais curriculares são utilizados (i.e., textos, outros materiais de leitura, jogos, etc...). O material de instrução é essencialmente constituído pelos textos, sendo o restante material utilizado meramente como complemento? Que tipo de material didáctico se encontra nas paredes, no tecto, etc.? Quais as personagens ilustradas nesse material? Como são divididas as tarefas na sala de aula? O que é que detennina o ritmo da tunna? Que tipo de ensino-aprendizagem individualizado tem lugar? Para quem? Quais os estudantes que têm maior contacto com o professor? Quais os estudantes que têm menor contacto com o professor? Quais os estudantes que são mais e menos tocados pelo professor? 314 ....-"-'"_$_a DISCIPLINA E CONTROLO Os estudantes podem escolher onde se querem sentar na sala? Até que ponto se sente a autoridade no dia-a-dia da escola? E nas diferentes tunnas? Que tipo de restrições são colocadas à mobilidade dos estudantes na escola? Que métodos de controlo são usados pelos professores e pelo pessoal auxiliar? Quais são as características da punição na escola? Como e quando são administrados os castigos? Como é que os alunos fazem pedidos? Qual o tom de voz que os professores e o pessoal auxiliar utilizam quando se dirigem aos estudantes? A que tipo de coisas os administradores propositadamente não dão importância? A que tipo de coisas os professores propositadamente não dão importância? Quais são as características e extensão dos castigos corporais? A integridade física dos alunos, dos professores e do pessoal auxiliar é assegurada na escola? Existe perigo de assaltos? Existe uma comissão independente para receber queixas por parte dos alunos sobre problemas surgidos com os professores e com o pessoal auxiliar? São feitas ameaças aos estudantes? Quais as ameaças mais habituais? Quantos estudantes expressam hostilidade? Quais os comportamentos dos alunos que dão origem a castigos? Quais os professores e pessoal auxiliar que têm autoridade para disciplinar os alunos? Em que medida as recompensas e os castigos da escola se aproximam do sistema de castigos e recompensas do mundo em geral? 315 'J.3------------------I- J_:;,_ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BECKER, H. S. (1970a). Sociological work. Chicago: Aldine. BECKER, H.S. (l970b). "The !ife history and the scientific mosaic". Sociological work. Chicago: Aldine. ACKER, S. (ed.) (1989). Teachers. gender & careers. New York: Falmer Press. ADAMS, R. N. & PREISS, J. J. (eds.). (1960). Human organi:arion research. Homewood, IL: Dorsey Press. ADLER, P. A. & ADLER, P. (1987). Membership roles in field research. Newbury Park, CA: Sage. AGAR, M. H. (1986). Speaking of ethnography. Newbury Park, CA: Sage. ALLPORT, G. (1942). The use ofpersonal documents in psychological science. New York: Social Science Research Council. AMERICAN SOCIOLOGICAL ASSOCIATlON (1989). Code of ethics. Washington, DC: American Sociological Association. ANDERSON, N. (1923). The hobo. Chicago: University ofChicago Press. ANGELL, R. ( 1936). The family encounters the depression. New York: Scribner's. ANGELL, R. (1945). "A criticaI review of lhe development of the personal document method in sociology 1920-1940". ln L. Gottschalk, C. Kluckholn & R. Angell (eds.), The use ofpersonal documents in history, anthropology and sociology. New York: Social Science Research Council. ANYON, J. (1984). "Intersections of gender and e1ass: Accommodation and resistance by working e1ass and amuent females to contradictory sex-role ideologies'·. Journal of Education, 166( 1), 25-48. ATKINSON, P. (1990). The ethnographic imagination. London: Routledge. BECKER, H. S. (I 970c). "Whose side are we on?". Sociological work. Chicago: Aldine. BECKER, H. S. (1978). "Do photographs tell the truth 7 ". After Image, 5, 9-13. BECKER, H. S. (1983). "Studying urban schools". Anthropology & Education Quarterly, 14(2), 99-106. BECKER. H. S. (l986a). "Computing in qualitative sociology". Qualitative Sociology, 9(1) 100-103. BECKER. H. S. (l986b). Doing things together. Evanston, IL: Northwestern University Press. BECKER, H. S. (1986c). Writing for social scientists. Chicago: University of Chicago Press. BECKER, H. S. & GEER, B. (1957). "Participant observation and interviewing: A comparison". Human Organization, 16,28-32. BECKER, H. S. & GEER, B. (1960). "Participant observation: The analysis of qualitative field data". ln R. Adams & 1. Preiss (eds.), Human organization research. Homewood, IL: Dorsey Press. BECKER, H. S.; GEER, B. & HUGHES, E. (1968) Making the grade. New York: Wiley. BECKER, H. S.; GEER. B.; HUGHES, E. C. & STRAUSS, A. (1961). Boys in white:. student culture in medical school. Chicago: University of Chicago Press. BEHAR, R. (1990, Summer). "Rage and redemption: Reading the life story of a Mexican marketing woman". Femini.S! Studies, 16(2), 223-258. BENNEY, M. & HUGHES, E. (1956). "Of sociology and the interview." American Journal of Sociology, 62(2),137-142. BERGER, P. & LUCKMANN, T. (1967). The social cOl1struction ofreality. Garden City, NY: Doubleday. BAIN, R. (1929). "The validity of!ife histories and diaries". Journa/ ofEducational Sociology, 3, 150-164. BAKER, P. (1973). "The life histories of W. I. Thomas and Robert E. Park". American Journal of Soci%gy, 79,243-261. BAKER, S. (1966). The complete stylist. New York: Crowell. BARKER, R. D. (1968). Ecological psych%gy. Stanford, CA: Stanford University Press. BARNES, E. (1978). Peer interacrion beMeen typical and special children in an integrated setting: An observational study. Unpublished doctoral dissertation, Syracuse University. BARTLETT, F. c.; GINSBERG, M.; LlNDGREN, E. S. & THOULESS, R. H. (eds.). (1939). The study of society. London: Kegan Paul, Trench, Trubner & Co. BECKER, H. S. (1951). Role and career problems of the Chicago public school teacher. Unpublished doctoral dissertation, University of Chicago. BECKER, H. S. (l952a). "The career of the Chicago public school teacher". American Journa/ of Soci%gy, 57, 470-477. BECKER, H. S. (l952b). "Social-e1ass variations in the teacher-pupil relationship". Journal of Educationa/ Sociology, 25, 451-465. BECKER, H. S. (1953). "The teacher in the authority system of the public school". Journa/ of Educational Sociology, 27,128-141. BECKER, H. S. (1958). "Problems of inference and proof in parlicipant observation". American Soci%gical Review, 23, 652-660. BECKER, H. S. (1963). Outsiders: Studies in the soci%gy of del'iance. New York: The Free Press. BLUMER, H. (1980). "Comment, Mead and Blumer: the convergent methodological perspectives of social behaviorism and symbolic interaction". American Sociological Review, 45. 409-419. BOGARDUS, E. (1926). The new social research. Los Angeles: Jesse Ray Miller. 316 317 r····'···Wlllll!llQ._....:..,l$IIIilIII\IIIU_w._.:._ _l._ill$IlI§ BERTAUX, D. (ed.) (1981). The life history approach in the social sciences. Bever1y Hills, CA: Sage. BIKLEN, D. & BOGDAN, R. (1977). "Media portrayals of disabled people: A study in stereotypes". Interracial Books for Children Bulletin, 8(#6&7). BIKLEN, S. (1973). Lessons of consequence: Women' s perceptions of their elementary school experience; a retrospective study. Unpublished doctoral dissertation, University of Massachusetts. BIKLEN, S. (1985). "Can elementary school teaching be a career 7 ". 1ssues in Education, 3, 215-231. BIKLEN, S. (1987, Spring). "Schoolteaching, professionalism and gender". Teacher Education Quarterly, 14, 17-24. BIKLEN, S. (in press). School work: The cultural construction of gender and teaching. New York: Teachers College Press. BLASE, J., Jr. (1980). On the meaning of being a teacher: a study of teacher' s perspective. Unpublished doctoral dissertation, Syracuse University. BLATT, B. & KAPLAN, F. (1974). Christmas in purgatory. Syracuse, NY: Human Policy Press. BLUMER, H. (1969). Symbolic interactionism: perspective and method. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall. -------------------I.::---,.2•.t-5_ !!44.J$Q"""$ii$lll!W4lI!IiS• • CAMPBELL, D. (1978). "Qualitative knowing in action research." ln M. Brenner. P. Marsh. & M. Brenner (eds.), The social contexs of method. New York: SI. Martins. CAREY, J. T. (1975). Sociology and public affairs, the Chicago school. Beverly Hills. CA: Sage. CARINI, P. (1975). Observation and description: an alternative methodology for the investigarion of human phenomena. North Dakota Study Group on Evaluation Monograph Series. Grand Forks: University 01' North Dakota. CASE, C. (1927). "A crisis in anthropological research". Sociology and Social Research, 12(1), CASSELL, J. ( 1978b). "Risk and benefit to subjects offieldwork". The American Sociologist, 13, 134-144. CASSELL,1. & WAX, M. (eds.) (1980). Ethical probIems in fieldwork [Special issue]. Social Problems, 27(3). CAZDEN, c.; JOHN, V. & HYMES, D. (eds.). (1972). Functiol1s of language in the cfassroom. New York: Teachers College Press. CENTER FOR LAW ANO EDUCATION (1978, September). "Corporal punishment". Inequality in Education, #23. CHILDREN'S DEFENSE FUND. (1974). Out of school in America. Washington, DC: Author. CLARK, C. M. (1987). "Computer storage and manipulations 01' field notes and verbal protocols: Three cautions" Anthropology & Education Quarterly, 18, 56-58. CLIFFORD, J. (1983). "On ethnographic authority." Reflections, 1(2), 118-146. CLIFFORD, J. (1986). "Introduction: Partial truths". ln J. Clifford & G. Marcus (eds.), Writing culture: the poetics and politics of ethnography. Berkeley: University of Califomia Press: 1-26. CLIFFORD, J. (1988). The predicament ofculture. Cambridge, MA: Harvard University Press. CLIFFORD, J. & MARCUS, G. E. (eds.) (1986). Wriring culture: The poetics and politics of ethnography. Berkeley: University 01' Califomia Press. COLES, R. (1964). Children ofcrisis. Boston: Little, Brown. COLES, R. (1977). Privileged ones. Boston: Little, Brown. COLLIER, J., Jr. (1967). Visual anthropology: Photography as a research method. New York: HolL COLLINS, R. & MAKOWSKY, M. (1978). The discovery ofsociety (2nd ed.). New York: Random House. COMPUTERS ANO QUALITATIVE DATA [Special issue] (1984). Qualitative Sociology. 7(1&2). COOLEY, C. H. (1926). "The roots of social knowledge". The American Journal of Soci%gy. 32,59-79. COSER, L. (1979). 'Two methods in search 01' a substance". ln W. Snizek, E. Fuhrman & M. Miller (eds.), Contemporary issues in theory and research, a metasociological perspective. Westport, CT: Greenwood Press. COTTLE, T. (l976a). Barredfrom school. Washington, DC: New Republic. COTTLE, T. (I 976b). Busing. Boston: Beacon Press. COTTLE, T. (1977). Children in jail. Boston: Beacon Press. CRESSEY, D. (1950). "Criminal violation of financial trust". American Sociological Review, 15, 738-743. CRESSY, P. (1932). The taxi-dance hal!o Chicago: University 01' Chicago. CRONBACH, L. (1975). "Beyond the two disciplines of scientific psychology". American Psychologist, 30(2), I16-ln CRONBACH, L. & SUPPES, P. (eds.) (1969). Research for tomorrow's schools. New York: Macmillan. CRONBACH, L. et ai. (1980). Toward reform ofprogram evaluatiol1. San Francisco: Jossey-Bass. CUSICK, P. A. (1973). Inside high school: The student's world. New York: Holt, Rinehart & Winston. 26-34. CASSELL, J. (1978a). A field manual for studyil1g desegregated schools. Washington DC: The National Institute 01' Education. DALTON, M. (1967). "Preconceptions and methods in Men who manage". ln P. Hammond (ed.), Sociologists at work. New York: Anchor. 318 319 BOGDAN, R. (1971). A forgotten organizational type. Unpublished doctoral dissertation, Syracuse University. BOGDAN, R. (1972). Participant observation in organizational settings. Syracuse, NY: Syracuse University Division of Social Education and Rehabilitation. BOGDAN, R. (1976). "National policy and situated meaning: Head Start and the handicapped". American Journal of Orthopsychiatry, 46(2) 229-235. BOGDAN, R. (1980). "The soft side ofhard data". Phi Delta Kappan, 61,411-412. BOGDAN, R. (1983). "Teaching fieldwork to education researchers". Anthropology and Education Quarterly, 14(3),171-178. BOGDAN, R. C. (1988). Freak show: Presenting human oddities for amusement and profit. Chicago: University of Chicago Press. BOGDAN, R. & KSANDER, M. (1980). "Policy data as a social processo a qualitative approach to quantitative data". Human Organization, 39(4) 302-309. BOGDAN, R. & TAYLOR, S. (1975).lntroduction to qualitative research methods. New York: Wiley. BOGDAN, R. & TAYLOR, S. (1976). "The judged not the judges: an insider's view 01' mental retardation". American Psychologist, 31,47-52. BOGDAN, R. & TAYLOR, S. (1982). Inside out. lhe social meaning of mental retardation. Toronto: University 01' Toronto Press. BOTKIN, B. A. (ed.) (1954). Lay my burden down: afolk history ofslavel)'. Chicago: University 01' Chicago Press. BRENT, E.; SCOTT, J. & SPENCER, J. (1987). "Computing in qualitative sociology: Guest column". Qualitative Sociology, 10(3), 309-313. BRIGGS, C. L. (1986). Learning to ask: a sociolinguistic appraisal ofthe role ofthe interview in social science research. New York: Cambridge University Press. BRONFENBRENNER, U. (1976). "The experimental ecology of education". Educational Researcher, 5. BRUNI, S. (1980). The class and them: social interaction of handicapped children in integrated primary classes. Unpublished doctoral dissertation, Syracuse University. BRUYN, S. (1966). The human perspective in sociology. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall. BURGESS, R. G. (1984). ln the field: an introduction to field research. London: Allen & Unwin. BURGESS, R. G. (1985). Issues in educational research: qualitative methods. Philadelphia: Falmer Press. BURNETT, J. H. (1978). "Commentary on an historical overview 01' anthropology and education: a bibliographic guide".ln The Committee on Anthropology and education, Anthropology and education: Report and working papers. New York: National Academy 01' Education. r--.-""·---.-ti..4J&--I..J4----------------.I._3_.L.l).~.i_ DANIELS, A. K. (1983). "Self-deception and self-discovery in fieldwork". Qualitative Sociology, 6(3),195-214. DAVIS, A. & DOLLARD, J. (1940). Children of bondage. Washington, DC: American Council on Education. DAVIS, A.; GARDNER, B. B. & GARDNER, M. R. (1941). Deep south. Chicago: University of Chicago Press. DAVIS, A. & HAVIGHURST, R. J. (1947). Father of the mano Boston: Houghton MiffJin. DECKER, S. (1969). An empty spoon. New York: Harper & Row. DENNY, T. (l978a). Some still do: River Acres, Texas. (Report #3 in Evaluation Report Series.) Kalamazoo, MI: Evaluation Center, Westem Michigan University, College of Education. DENNY, T. (l978b, May). Story telling and educational understanding. Paper presented at meeting of the International Reading Association, Houston, Texas. (ERIC Document Reproduction Service No. ED 170314) DENZIN, N. (1978). The research act (2nd ed.). New York: McGraw-Hill. DENZIN, N. K. (1989). lnterpretive biography. Newbury Park, CA: Sage. DEUTSCHER,1. (1973). What we say/what we do. Glenview, IL: Scott, Foresman. DeVAULT, M. L. (1990). "Talking and Iistening from women's standpoints: Feminist strategies for interviewing and analysis". Social Problems, 37( I), 96-116. DEVINE, E. T. (1906-1908). "Results of lhe Pittsburgh survey". American Sociological Society, Papers and Proceedings, 3, 85-92. DEXTER, L. A. (1956). "Role relationships and conceptions of neutrality in interviewing". American Journal of Sociology, 62(2), 153-157. DIDION, J. (1979). The white album. New York: Simon & Schuster. DOBBERT, M. L. (1982). Ethnographic research: Theory and application for modern schools and societies. New York: Praeger. DOLLARD, J. (1935). Criteriafor the life history. New Haven, CT: Yale University Press. DOLLARD, J. (1937). Caste and c/ass in a southern town. New York: Harper. DOUGLAS, 1. (1976). lnvestigative social research. Beverly Hills, CA: Sage. DOWDELL, G. W. & GOLDEN, J. (1989). "Photographs as data: an analysis of images from a mental hospital". Qualitative Sociology, 12(2),183-214. DU BOIS, W. E. B. (1967/1899). The Philadelphia negro: a social study. New York: Benjamin Blom, distributed by Arno Press. DUSTER, T.; MATZA, D. & WELLMAN, D. (1979). "Fieldwork and the protection of human subjects". The American Sociologist, 14,136-142. EASTERDAY, 1.; PAPADEMAS, D.; SHORR, L. & VALENTINE, C. (1977). "The making ofa female researcher: Role problems in fieldwork". Urban Life, 6, 333-348. EDDY, E. (1967). Walk the white line. Garden City, NY: Doubleday. EDDY, E. (1969). Becoming a teacher. New York: Teacher's College Press. EISNER, E. (1980, April). On the differences between scientific and artistic approaches to qualitative research. Paper presented at the meeting of the American Educational Research Association, Boston. EISNER, E. (1991). The enlightcned eye: qualitative inquiry and the enhancPment of educational practice. New York: Macmillan. EISNER, E. & PESHKIN, A. (eds.). (1990) Qualitative inquiry in education: the continuing debate. New York: Teachers College Press. 320 r_-:S :_:Z!\II.IIIlICM4M:Mu.aWIlIISII.iIll$MIlIISI!!SIIIM_••a.aa.:-aalr..l!!.a.!IIasac.c.! M ERICKSON, F. (1973). "What makes school ethnography 'ethnographic''!''. Anthropology and Education Quarterly, 4(2) 10-19. ERICKSON, F. (1975). "Gatekeeping and the melting pot". Harvard Educational Review, 45. 44-70. ERICKSON, F. (1986). "Qualitative methods in research on teaching". ln M. C. Wittrock (ed.), Handbook of research on teaching (3rd ed.). New York: Macmillan. ERIKSON, K. (1962). "Notes on the sociology of deviance". Social Problems, 9, 307-314. ERIKSON, K. (1976). Everything in its path. New York: Simon & Schuster. EVANS, J. W. (1970). "Evaluating social action programs".1n L. Zurcher & C. Bonjean (eds.), Planned social intervention. Scranton, PA: Chandler. EVANS, W. (1973). Photographsfor the Farm Security Administration, 1935-1938. New York: Da Capo Press. EVERHART, R. (1975). "Problems of doing fieldwork in educational evaluation". Human Organization, 34(2), 205-215. EVERHART, R. (1977). "Between stranger and friend: Some consequences of 'Iong term' fieldwork in schools". American Educational Research Journal, 14(1), 1-15. FANCHER, R. E. (1987). "Henry Goddard and the Kallikak family photographs". American Psychologist, 42(6),585-590. FARIS, R. E. L. (1967). Chicago sociology, 1920-1932. Chicago: University of Chicago Press. FEDERAL WRITER'S PROJECT (1939). These are our lives. ChapeI Hill: University of North Carolina. FETTERMAN, D. M. (ed.) (1984). Ethnography in educational evaluation. Newbury Park, CA: Sage. FETTERMAN, D. M. (1987). "Ethnographic educational evaluation". ln G. Spindler & L. Spindler (eds.), 1nterprctive ethnography of education. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum. FIELDING, N. G. & FIELDING, J. L. (1986). Linking data. Newbury Park, CA: Sage. FILSTEAD, W. (ed.) (1970). Qualitative methodology. Chicago: Markham. FINCH, J. (1984). "'It's great to have someone to talk to': The ethics and politics of interviewing women". ln C. Bell and H. Roberts (eds.), Social researching (pp. 70-87). London: Routledge and Kegan Paul. FINE, G. (1987). With the boys. Chicago: University of Chicago Press. FINE, G. A. & GLASSNER, B. (1979). "Participant observation with children". Urban Life, 8(2), 153-174. FINE, G. A. & SANDSTROM, K. L. (1988). Knowing children: Participant observations with minors. Newbury Park, CA: Sage. FIRESTONE, W. A. (1987). "Meaning in method: The rhetoric of quantitative and qualitative research". Educational Researcher, 16(6),16-21. FLORIO, S. E. (1978). Learning how to go to school: An ethnography of interaction in a kindergarten/first grade c/assroom. Unpublished doctoral dissertation, Harvard University. FOX, D. M. & LAWRENCE, C. (1988). Photographing medicine: 1mages and power in Britain and America since 1840. New York: Greenwood Press. FREEDMAN, P. (1980). Day care as a work setting: An ethnographic description. Unpublished ma.T"Juscript, Syracuse University. FREIRE, P. (1968). Pedagogy ofthe oppressed. New York: Herder and Herder. FRIED, A. & ELMAN, R. (eds.) (1968). London (Excerpts from life and labour of the people in London. C. Booth). New York: Pantheon. 321 IQE21 1...••••.: :12_ ••••••••••••••••••••• FRIEDMAN, S. & STEINBERT, S. (1989). Writing and thinking in the social sciences. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall. FUCHS, E. (1966). Pickets at the gates. New York: The Free Press. FUCHS, E. (1969). Teachers talk. Garden City, NY: Doubleday. GARFINKEL, H. (1967). Sudies in ethnomethodology. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall. GEER, B. (1964). "First days in lhe field". ln P. Hammond (ed.), Sociologists at work. Garden City, NY: Doubleday. GEER, B. (ed.). (1973). Learning to work. Beverly Hills, CA: Sage. GEERTZ, C. (1979). "From the native's point of view: On the nature of anthropological understanding". ln P. Rabinow and W. Sullivan (eds.), lntelpretive social science. Berkeley: University of California Press. GEERTZ, C. (1973). "Thick description: Toward an interpretive theory of cullure". ln The interpretation of cultures. New York: Basic Books. GEORGES, R. A. & JONES, M. O. (1980). People studying people; the human element infieldwork. Berkeley: University of California Press. GEPART, R. P., Jr. (1988). Ethnostatistics: Qualitative foundations for quantitative research. Newbury Park, CA: Sage. GERTH, H. & MILLS, C. W. (1978). Character and social structure. New York: Harcour! Brace. GLASER, B. (1978). Theoretical sensitivity: Advances in the methodology of grounded theory. Mill Valley, CA: Sociology Press. GLASER, B. & STRAUSS, A. L. (1967). The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research. Chicago: Aldine. GLASS, G. (1975). "A paradox about excellence of the schools and the people in them". Educational Researcher, 4, 9-13. GOETZ, J. P. & LeCOMPTE, M. D. (1984). Ethnography and qualitative design in educational research. New York: Academic Press. GOFFMAN, E. (1959). The presentation of self in everyday life. Garden City, NY: Anchor. GOFFMAN, E. (1979). Gender advertisements. New York: Harper. GOLD, R. (1958). "Roles in sociological field observations". Social Forces, 36,217-223. GOULDNER, H. (1978). Teachers' pets, troublemakers, and nobodies. Westport, CT: Greenwood Preess. GRANT, G. (1979). "Journalism and social science: Continuities and discontinuities". ln H. Gans, N. Glazer, J. Gusfield & C. Jenks (eds.), On the making of Americans: Essays in honor of David Riesman (pp. 291-313). Philadelphia: University ofPennsylvania Press. GRANT, G. (1988). The world we created at Hamilton High. Cambridge, MA: Harvard University Press. GREENE, M. (1978). Landscapes of learning. New York: Teachers College Press. GROCE, N. (1985). Everyone here spoke sign language. Cambridge, MA: Harvard University GUBRIUM, J. (1988). Analyzing field reality. Beverly Hills, CA: Sage. GEIGER, S. (1986). "Women's life histories: Method and content". S/GNS. 1/(2),334-351. GUTMAN, J. M. (1974). Lewis Hine, 1974-/940: Two perspectives. New York: Grossman. HARDING, S. (ed.) (1987). Feminism and methodology. Bloomington: Indiana University Press. HARRISON, S. (1931). The social survey. New York: Russell Sage Foundation. HASKINS, J. (1969). Diary of a Harlem schoolteacher. New York: Grave Press. HEATH, S. B. (1983). Ways with words: Language, life and work in communities and class rooms. Cambridge, UK: Cambridge University Press. HEIDER, K. G. (1988). "The Rashomon effect: When ethnographers disagree". Americal Anthropologist, 90, 73-81. HELLING, r. K. (1988). "The life history method". ln N. K. Denzin (ed.), Studies in symboli< interaction. Greenwich, CT: JAr. HENRY, 1. (l955a). "Culture, education and communications theory". ln G. Spindler (ed.) Education and anthropology. Stanford, CA: Stanford University Press. HENRY, 1. 0955b). "Docility, or giving teacher what she wants". The Journal of Social lssues II (2), 33-41. HENRY, J. (1957). "Attitude organization in elementary school classrooms". American Journa, of Orthopsychiatry. 27, J 17-123. HENRY, 1. (1963). Culture against man. New York: Random House. HERNDON, J. (1968). The way it spozed to be. New York: Simon & Schuster. HERRI0TT, E. (1977). "Ethnographic case studies in federally funded mulli-disciplinary polic} research: Some design and implementation issues". Anthropology and Education Quarterly. 8(2),106-115. HILL, R. J. & CRITTENDEN, K. (1968). Proceedings ofthe Purdue symposium on ethnomethodology. Purdue, lN: Institute for the Study of Social Change, Purdue University. HOCHSCHILD, A. R. (1983). The managed heart: Commercialization of human feelings. Berkeley: University of Califomia Press. HOLLINGSHEAD, A. B. (1949). Elmstown's youth. New York: Wiley. HOWE, K. R. (1988). "Against the quantitative-qualitative incompatibility thesis or dogmas die hard". Educational Researcher. 17(8), 10-16. HUGHES, E. (1934). "Institutional office and lhe person". American Journal of Sociology. 43, 404-413. HUGHES, E. C. (1971). The sociological eye. Chicago: Aldine. HURLEY, F. 1. (1972). Portrair of a decade; Roy Stryker and the development of documentary photography in the thirties. Baton Rouge: Louisiana State University Press. HYMAN, H. (1954). lnterviewing in social research. Chicago: University ofChicago Press. IANNI, F. (1978). "Anthropology and educational research: A repor! on federal agency programs, policies and issues". ln lhe Committee on Anthropology and Education (eds.), Report and working papers. National Academy ofEducation, 427-488. IVES, E. (1974). The tape-recorded interview: A manual for fieldworkers infolklore and oral history. Knoxville: The University of Tennessee Press. Press. GUBA, E. G. (1978). Toward a methodology of naturalistic inquiry in educational evaluation. CSE Monograph Series in Evaluation, 8. Los Angeles: Center for the Study of Evaluation, University of California. GUBA, E. & LINCOLN, Y. (1981). Effective evaluation: Improving the usefulness of evaluation results through responsive and naturalistic approaches. San Francisco: Jossey-Bass. GUBA, E. & LINCOLN, Y. (1982). "Epistemological and methodological bases of naturalistic inquiry". Educational Communication and Technology Journal, 30, 233-252. JACKSON, P. (1968). Life in classrooms. New York: Holl, Rinehart & Winston. JACOB, E. (1987). "Qualitative research traditions: A review". Review of Educational Research, 57(1), 1-50. 322 323 r~---_I:aiua4' I.-__.l."•.;~_ JAHODA, M.; DEUTSCH, M. & COOK, S. (1951). Research methods in social relations (Part I). New York: Dryden. JüHNSON, J. M. (1975). Doingfield research. New York: The Free Press. Journal of Educational Sociology, 1927, 1(4). Journal of Educational Sociology, 1927, 1(7). JUNKER, B. (1960). Fieldwork. Chicago: University ofChicago Press. LOFLAND, J. (1976). Doing sociallife. New York: Wiley. LORBER, J. (1988). "From the editor". Gender and Society, 2(1), 5-8. LUTZ, F & GRESSON, A. (1980). "Local school boards as politicai councils". Educationai Studies, 2,125-143. LYND, R. S. & LYND, H. M. (1929). Middletown. New York: Harcourt Brace. LYND, R. S. & LYND, H. M. (1937). Middletown in transition. New York: Harcourt Brace. KELLOGG, P. (1911-1912). 'The spread of the survey idea". Proceedings of the Academy of Politicai Science, vol. 2, part 4, 475-491. KELLY, J. G. (1969). "Naturalistic observations in contrasting social environments.". ln E. P. Willens & H. L. Raush (eds.), Naturalistic viewpoints in psychological research. New York: Holt, Rinehart & Winston. KIERZEK, J. & GIBSON, W. (1968). The Macmil/an handbook ofEnglish. New York: Macmillan. KOHL, H. (1967). 36 chi/dreno New York: New American Library. KOMAROVSKY, M. (1940). The unemployed mail and his family. New York: Dryden. KOMAROVSKY, M. (1946). "Cultural contradictions and sex roles". American Journal of Sociology, 52, 184-189. KOZOL, J. (1967). Death at an early age. New York: Bantam. KRATHWOHL, D. R. (1988). How to prepare a research proposal. Syracuse, NY: Syracuse University Press. KRIEGER, S. (1985). "Beyond subjectivity: The use ofthe self in social science". Qualitative Sociology, 8(4), 309-324. KRUEGER, E. T. (1925a). "The technique of securing life history documents". Journal of Applied Sociology, 9, 290-298. KRUEGER, E. T. (1925b). 'The value of life history documents for social research". Journal of Applied Sociology, 9, 196-201. LATHER, P. (1988). "Feminist perspectives on empowering research methodologies". Womens Studies lnternational Forum, 11(6), 569-581. LEACOCK, E. (1969). Teaching and learning in city schools. New York: Basic Books. LeCOMPTE, M. D. (1987). "Bias in the biography: Bias and subjectivity in ethnographic research". Anthropology & Education Quarterly, 18, 43-52. LEVINE, M. (1980a). "Investigative reporting as a research method: An analysis of Bernstein and Woodward's Al/ the president's menu. American Psychologist, 35, 626-638. LEVINE, M. (1980b, September). Method or madness: On the alienation of the professional. Invited Address, Division 12, Meeting of the American Psychological Association, Montreal. LIEBOW, E. (1967). Tal/y's comer. Boston: Little, Brown. LIGHTFOOT, S. (1978). Worlds apart: Relationships betweellfami/ies and schools New York: Basic Books. LINCOLN, Y. S. & GUBA, E. G. (1985). Naturalistic inquiry. Beverly Hills CA: Sage. LINDEMAN, E. C. (1925). Social discovery. New York: Republic. LINDESMITH, A. R. (1947). Addiction and opiates. Chicago: Aldine. LOCKE, L. F; SPIRDUSO, W. W. & SILVERMAN, S. J. (1987). Proposals that work: A guide for planning dissertations and grallt proposals. Newburj Park, CA: Sage. LOFLAND, J. (1971). Analyzing social settings. Belmont, CA: Wadsworth. LOFLAND, J. (1974). "Styles of reporting qualitative field research". The American Sociologist, 9, 101-111. MACCOBY, E. & MACCOBY, N. (1954). "The interview: A tool of social science".ln G. Lindzey (ed.), Handbook of social psychology (vol. 1). Cambridge, MA: Addison-Wesley. MAINES, D. R.; SHAFFIR, W. & TUROWETZ, A. (1980). "Leaving the field in ethnographic, research: Reflections on the entrance-exit hypothesis". ln W. B. Shaffir, R. A. Stebbins, & A. Turowetz (eds.), Fieldwork experience: Qualitative approaches to social research. New York: St. Martin's. MALINOWSKI, B. (1922). Argonauts of the western Pacifico New York: Dutton. MALINOWSKI, B. (1960). A scientific theory of culture and other essays. New York: Oxford University Press. MARCUS, G. E. & FISHER, M. M. (1986). Anthropology as cultural critique: An experimental moment in the human sciences. Chicago: University of Chicago Press. MARCUS, G. M. & CUSHMAN, D. (1982). "Ethnographies as texts". Annual Review of Anthropology, lI, 25-69. MARTIN, E. (1987). The woman in the body. Boston: Beacon Press. MASCIA-LEES, F. E.; SHARPE, P. & COHEN, C. B. (1989). "The postmodemist tum in anthropology: Cautions from a feminist perspective". Signs.15(1), 7-33. MATTHEWS, F. (1977). Quest for an American sociology: Robert E. Park and the Chicago school. Montreal: McGill-Queens University Press. McADOO, H. (1976, April). Oral history and educational research. Paper presented at the meeting of the American Educational Research Association. (ERIC Document Reproduction Service No. ED 171 831) McCALL, G. J. & SIMMONS, J. L. (eds.) (1969). lssues in participant observarion. Reading, MA: Addison-Wesley. McCALL, M. M. & BEEKER, H. S. (1990). "Perfonnance science". Social Problems, 37(1), 117-132. McCRACKEN, G. (1988). The long interview, Newbury Park, CA: Sage. McDERMOTT, R. (1976). Kids make sense: An ethnographic account ofthe interactional management of success and failure in one first grade classroom. Unpublished doctoral dissertation, Stanford University. McDERMOTT, R. P., GOSPODINOFF, K. & ARON, J. (1978). "Criteria for an ethnographically adequate description of concerted activities and their contexts". Semiotica, 24, 245-275. McINTYRE, D. (1969). "Two schools, one psychologist".ln F Kaplan and S. Sarason (eds.), The psycho-educational clinic; papers and research studies. Boston: Massachusetts Department of Mental Health. McPHERSON, G. (1972). Smal/ town teacher. Cambridge, MA: Harvard University. MEAD, G. H. (1934). Mind, selfand society. Chicago: University of Chicago Press. MEAD, M. (1942). "An anthropologist looks at the teacher's role". Educational Method, 21, 219-223. MEAD, M. (1951). The school in American culture. Cambridge, MA: Harvard University Press. MEHAN, H. (1978). Structuring school structure. Harvard Educational Review, 48, 32-64. ~4 m r-i__=_'_14_;; L_..- &---- 1 21_ .• IEHAN, H. (1979). Learning lessons. Cambridge, MA: Harvard Universit Press. IEHAN, H. & WOOD, H. (1975). The reality of ethnomethlodology. New York: Wiley. IELTZER, B. & PETRAS, J. (1970). "The Chicago and Iowa schools of symbolic interactionism". ln T. Shibutani (ed.), Human nature and collective behavior. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall. IELTZER, B.; PETRAS, J., & REYNOLDS, L. (1975). Symbolic interactionism: Genesis varieties and criticismo London: Routledge and Kegan Paul. IERCURIO, J. A. (1972). Caning: Educational rie and radirion. Syracuse, NY: Syracuse University. IERCURIO, J. A. (1979). "Community involvement in cooperative decision making: Some lessons learned". Educational Evaluation and Policy Analysis, 6, 37-46. lERRIAM, S. B. (1988). The case study research in education. San Francisco: Jossey-Bass. lERTON, R. K. & KENDALL, P. L. (1946). "The focused interview". American Journal of Sociology, 51,541-557. lESSERSCHMIDT, D. A. (1984). "Federal bucks for local change: On the ethnography of experimentaI schools". ln D. M. Fetterman (ed.), Ethnography in educational evaluation. Newbury Park, CA: Sage. lETZ, M. H. (1978). Classrooms and corridors: The crisis of authority in desegregated secondary schools. Berkeley: University of Califomia. 1IDDLETON, S. (1987). "Schooling and radicalization: Life histories ofNew Zealand feminist teachers". British Journal ofSociology of Education 8(2), 169-189. lILES, M. & HUBERMAN, M. (1984). Qualirative data anaiysis. Beverly HiIIs, CA: Sage. lILLS, C. W. (1959). The sociological imagination. London: Oxford University Press. lITFORD, J. (1971). Kind and usual punishment. New York: Knopf. lITFORD, J. (1979). Poison penrnanship. New York: Knopf. lOFFATT, M. (1989). Coming of age in New Jersey. New Brunswick, NJ: Rutgers University Press. 100RE, G. A. (1967). Realities ofthe urban c/assroom. Garden City, NY: Anchor. 10RGAN, D. L. (1988). Focus groups as qualitative research. Newbury Park, CA: Sage. 10RRIS, V. C. & HURWITZ, E. (1980, April). The Heisenberg problem: How to neutralize the effect of the observer on observed phenomena. Paper presented at the meeting of lhe American Educational Research Association, Boston. 1USELLO, C. (1979). "Family photograph". ln J. Wagner (ed.), Images ofinformation. Beverly Hills, CA: Sage. PATTON, M. Q. (1980). Qualitative evaluation methods. Beverly Hills, CA: Sage. PATTON, M. Q. (1987). How to use qualitative methods in evaluation. Newbury Park, CA: Sage. PETERS, C. C. (1937). "Research technics in educational sociology". Review of educational research 7(1), 15-25. PFAFFENBERGER, B. (1988). Microcomputer applications in qualitative research. Newbury Park, CA: Sage. PLUMMER, K. (1983). Documents of life: An introduction to the problems and literature of a humanistic method. London: George Allen & Unwin. POPKEWITZ, T. S. (1984). Paradigm & ideology in educatiol1al research. New York: Falmer. PORTER-GEHRIE, C. (1980). "The ethnographer as insider". Educatiol1ai Studies 2,123-124. PORTER-GEHRIE, C. & CROWSON, R. L. (1980, April). Al1aiyzil1g ethl10graphic data Strategies al1d results. Paper presented to the meeting of the American Educational Research Association, Boston. PSATHAS, G. (ed.) (1973). Phenomenological sociology. New York: Wiley. PUNCH, M. (1986). The politics al1d ethics Dffieldwork. Newbury Park, CA: Sage. lAKLEY, A. (1981). "Interviewing women: A contradiction in terms". ln H. Roberts (ed.), Doingfeminist research (pp. 30-61). London: Routledge and Kegan Paul. >DUM, H. (1951). American sociology: The story of socioiogy in the ünired States thruugh 1950. New York: Greenwood. lGBU, J. (1974). The next generation: An ethnography of educatiol1 il1 an urbal1 neighborhood. New York: Academic Press. RADWAY, J. (1984). Readil1g the romal1ce. ChapeI Hill: University of North Carolina Press. REDFIELD, R. (1955). The educational experiel1ce. Pasadena, CA: Fund for Adult Education. REICHARDT, C. S. & COOK, T. D. (1979). "Beyond qualitative versus quantitative methods". 111 T. D. Cook & C. S. Reichardt (eds.), Qualitative al1d quantitative methods in evaluatiol1 research. Beverly Hills, CA: Sage. RICHARDSON, L. (1990, April). "Narrative and sociology". Journal of Contemporary Ethnography, 19(1),116-135. RIESSMAN, C. (1987, June). "When gender is not enough: Women interviewing women". Gender al1d Society, 1(2), 172-207. RIIS, J. (1890). How the other half lives. New York: Scribner's. RILEY, J. J. (1910-1911). "Sociology and social surveys". Americal1 Journal of Sociology, 16, 818-836. RIST, R. (1970). "Student social class and teacher expectations: The self-fulfilling prophecy in ghetto education". Harvard Educational Review, 40, 411-451. RIST, R. (1973). The urban school: A factory for failure. Cambridge: Massachusetts Institute of Technology Press. RIST, R. (I 977a). "On the relations among educational research paradigms: From distain to detente". Al1thropology al1d Education Quarterly, 8, 42-49. RIST, R. (1977b). "On understanding the processes of schooling". 111 J. Karabel & A. H. Halsey (eds.), Power and ideology il1 education. New York: Oxford University Press. RIST, R. (1978). The il1visible chi/dreno Cambridge, MA: Harvard University. RIST, R. (1980). Blitzkrieg ethnography. Educational Researcher, 9(2), 8-10. RITZER, G. ( 1975). Sociology: A mutiple paradigm sciel1ce. Boston: Allyn and Bacon. RIVERA, G. (1972). Willowbrook: A report on how ir is and why ir doesn't have to be that way. New York: Vintage. ROBERTS, J. (1976). "An overview of anthropology and education". ln J. Roberts & S. Akinsanya (eds.), Educational patterns and cultural configurations (pp. 1-20). New York: David McKay. ROBERTS, J. (1971). Scene ofthe battle. Garden City, NY: Doubleday. ROBERTS, J. I. & AKINSANYA, S. K. (eds.) (l976a). Educational patterns and cultural configurations. New York: David McKay. 326 327 lATIONAL INSTITUTE OF EDUCATION (1978). Violent schools-Safe schools; The safe school study report to the Congresso Washington, DC: Author. IORTH, L. V. (1909, March 6). "The elementary public schools of Pittsburgh". Charity and the Commons, 21,1175-1191. ,IIII------I..--------...-- •••I._.,.u..,%,_ . book of organizations. Chicago: Rand McNally. SCOTT, R. (1969). The making ofblind men. New York: Russell Sage. SCRIVEN, M. (1972). "Objectivity and subjectivity in educational research". ln L. G. Thomas (ed.), Philosophical redirection of educational research. The seventy-firts yearbook of the National Society for the Study ofEducation. Chicago: University of Chicago Press. SHARP, R. & GREEN, A. (1975). Education and social controlo London: Routledge and Kegm Paul. SHAW, C. (1966). The Jack roller (2nd ed.). Chicago: University of Chicago Press. SHELLY, A. & SIBERT, E. (1986). "Using logic programming to facilitate qualitative dat: analysis". Qualitative Sociology, 9(2), 145-161. SHERMAN, R. & WEBB, R. B. (eds.) (1988). Qualitative research in education: Focus anc methods. Philadelphia, PA: Falmer Press. SHUMWAY, G. & HARTLEY, W. (1973). Oral history primer. Fullerton: California State Uni· versity. SHUY, R. & GRIFFIN, P. (eds.) (1978). The study of children's functionallanguage and educa· tion in the early years. Final Report to the Carnegie Corporation of New York. Arlington, VA: Center for Applied Linguistics. SHUY, R.; WOLFRAM, W. & RILEY, W. K. (1967). Field techniques for an urban language study. Washington, DC: Center for Applied Linguistics. SMITH, D. (1987). The everyday world as problematic. Boston: Northeastern University Press. SMITH, J. K. (1983). "Quantitative versus qualitative research: An attempt to elarify the issue". Educational Researcher, 12, 6-13. SMITH, J. K. & HESHUSruS, L. (1986). "Closing down the conversation: The end ofthe quantitative-qualitative debate among educational inquirers". Educational Researcher, 15(1), 4-12. SMITH, L. & GEOFFREY, W. (1968). The complexities of an urban classroom: An analysis toward a general theory ofteaehing. New York: Holt, Rinehart & Winston. SNEDDEN, D. (1937). "The field of educational sociology". Review of Educational Research. 7(1),5-14. SONTAG, S. (1977). On photography. New York: Farrar, Strauss and Giroux. SPENCER, D. A. (1986). Contemporary women teachers. New York: Longman. SPINDLER, G. (ed.) (1955). Education and anthropology. Stanford, CA: Stanford University Press. SPINDLER, G. (1959). The transmission of American culture. Cambridge, MA: Harvard University Press. SPINDLER, G. E. (ed.) (1982). Doing the ethnography of schooling: Educational anthropology ln act1On. New York: Holt, Rinehart & Winston. SPRADLEY,1. ( 1979). The ethnographic interview. New York: Holt, Rinehart & Winston. SPRADLEY, J. P. (1980). Participant observation. New York: Holt, Rinehart & Winston. STACK, C. (1974). Ali our kin: Strategiesfor survival in a black community. New York: Harpet & Row. STACEY, J. (1988). "Can there be a feminist ethnography?". Women's Studies International Forum, 11. 21-27. STAINBACK, S. & STAINBACK, W. (1985). "Quantitative and qualitative methodologies: Competitive or complementary?". Exceptional Children, 51, 330-334. STAKE, R. E. (1978). "The case study method in a social inquiry". Educational Researcher, 7. STEFFENS, L. (1904) The shame of he cities. New York: McClure, Phillips. STEFFENS, L. (1931). The autobiography of Lincoln Steffens. New York: Harcourt Brace. STOTf, ''Al. (1973). Documentai)' expression ünd thiriies Arnerica. New York: OxfonJ üniversity Press. STRAUSS, A. (1987). Qualitative analysis for social scientists. New York: Cambridge University Press. 328 329 ROBERTS, J. L & AKINSANYA, S. K. (eds.) (1976b). Schooling in the cultural context Anthropological studies of education. New York: David McKay. ROBINSON, W. S. (1951). "The logical structure of analytic induction". American Sociological Review, 16, 812-818. ROGERS, C. (1945). "The nondirective method as a technique for social research". American fournal ofSociology, 50, 279-283. ROGERS, C. (1951). Client-centered therapy. Boston: Houghton Miff1in. ROMAN, L. G. (1988). "Intimacy, labor and elass: Ideologies of feminine sexuality in the puni< slam dance". ln L. G. Roman & L. C. Christian-Smith with E. Ellsworth (eds.), Becoming feminine: The politics ofpopular cullUre (pp. 143-184). London: Falmer Press. ROMAN, L. & APPLE, M. (1990). "Is naturalism a move away from positivism? Materialist and feminist approaches to subjectivity in ethnographic research". ln E. Eisner & A. Peshkin (eds.), Qualitative inquiry in education: The continuing debate. New York: Teachers College Press, 38-73. ROSALDO, R. (1989). Culture and truth: The remaking of social analysis. Boston: Beacon Press. ROSENSTEIL, A. (1954). "Educational anthropology: A new approach to cultural analysis". Harvard Educational Review, 24,28-36. ROSENTHAL, R. & JACOBSON, L. (1968). Pygmalion in the classroom. New York; Holt, Rinehart & Winston. ROTH, J. (1963). Timetables. Indianapolis, lN: Bobbs-Merrill. ROTHSTEIN, W. R. (1975). "Researching the power structure: Personalized power and institutionalized charisma in the principal ship".lnterchange, 6(2), 41-48. RUBIN, L. (1976). Worlds ofpain. New York: Basic Books. SANJEK, R. (ed.) (1990). Fieldnotes. Ithaca, NY: Cornell University Press. SARASON, S. & DORIS, J. (1979). Educational handicap public poliey and social history. New York: The Free Press. SARASON, S.; LEVINE, M.; GOLDENBERG, L; CHERLIN, D. & BENNETT, E. (1966). Psychology in community settings. New York: Wiley. SCHALLER, G. (1965). The year of the gorilla. Chicago: University of Chicago Press. SCHATZMANN, L. & STRAUSS, A. (1973). Field research Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall. SCHEIN, E. H. (1987). The clinical perspective infieldwork. Newbury Park, CA: Sage. SCHMUCK, P. (1975). "Deterrents to women's careers in school management". Sex Roles. 1,339-353. SCHNEIDER, J. & Conrad, P. (1980). Having epilepsy. Philadelphia, PA: Temple University Press. SCHWARTZ, D. (1989). "Visual ethnography: Using photography in qualitative research". Qualitative Sociology, 12(2),119-154. SCHWARTZ, H. & JACOBS, J. (1979). Qualitative sociology. New York: The Free Press. SCOTT, R. W. (1965). "Field methods in the study of organizations".ln J. G. March (ed.), Hand- r-.--.------l ....--------_.111\---------,I,u :H&'ilie- STRAUSS, A. CORBIN, J. (1990). Basics of qualitative research: Grounded theory procedures and techniques. Newbury Park, CA: Sage. STRUNK, W., Jr. & WHITE, E. B. (1972). The elements of style. New York: Macmillan. SUSSMANN, L. (1977). Tales out of school. Philadelphia, PA: Temple University. SUTHERLAND, E. (1937). The professional thief. Chicago: University of Chicago Press. VANDEWALKER, N. (1898). "Some demands of education upon anthropology". American Journal ofSociology. 4.69-78. VAN MAANEN, J. (1988). Tales of the field: On writing ethnography. Chicago: University of Chicago Press. WAGNER, 1. (ed.) (1979). Images ofinformation. Beverly Hills, CA: Sage. WALDORF, D. & REINARMAN, C. (1975). "Addicts-Everything but human beings". Urban Life 4(1),30-53. WALLER, W. (1932). Sociology of teaching. New York: Wiley. WALLER, W. (1934). "Insight and scientific method". American Journal of Sociology, 40(3), 285-295. WARNER, W. L. & LUNT, P. S. (1941). The social life of a modern community. New Haven, CT: Yale University Press. WARREN, C. A. B. (1988). Gender infield research. Newbury Park: CA: Sage. WAX, M. (1980). "Paradoxes of 'consent' in the practice of fieldwork". Social Problems, 2 265-272. WAX, R. (1971). Doing fieldwork: Warning and advice. Chicago: University of Chicago Press. WAX, R. (1979). "Gender and age in fieldwork ood fieldwork education: No good thing is dor by any moo alone". Social Problems, 26, 509-523. WEBB, B. (1926). My Apprenticeship. New York: Longmoos, Green & Coo WEBB, S. & WEBB, B. (1932). Methods of social study. London: Longmans, Green & Coo WEILER, K. (1988). Women teaching for change. South Hadley, MA: Bergin Garvey. WELLS, A. F. (1939). "Social surveys". ln F. C. Bartlett, M. Ginsberg, E. S. Lindgren & R. I Thouless (eds.), The study of society. London: Kegoo Paul, Trench, Trubner & Coo WERNER, O. & SCHOEPFLE, G. M. (1987a). Systematicfieldwork: volume I, Foundations, ethnography and interviewing. Newbury Park, CA: Sage. WERNER, O. & SCHOEPFLE, G. M. (1987b). Systematic fieldwork: volume 2, Ethnograpl analysis and data management. Newbury Park, CA: Sage. WEST, C. & ZIMMERMAN, D. (1987, June). "Doing gender". Gender and Society. 1(2), 12: -151. WHYTE. W. F. (1955). Street corner society. Chicago: University of Chicago Press. WHYTE, W. F. (1960). "Interviewing in field research". ln R. H. Adams & J. J. Press (eds. Human organization research. Homewood, IL: Dorsey Press. WHYTE, W. F. (1984). Learningfrom thefield. Beverly Hills, CA: Sage. WHYTE, W. H. (1979). "On making the most of participoot observation". The American Sociol, gist, 14, 56-66. WICKER, T. (1978). Onpress. New York: Berkeley Publishing. WIGGINTON, E. (ed.) (1972a). Thefoxfire book. Garden City, NY: Anchor. WIGGINTON, E. (ed.). (1972b). Foxfire 2. Garden City, NY: Anchor. WILEY. N. (1979). "The rise and fali of dominating theories in American sociology". J W. Snizek, E. Fuhrman & M. Miller (eds.), Contemporary issues in theory and research. metasociological perspective. Westport, CT: Greenwood. WILLIS, P. (1977). Learning to labor. New York: Columbia University Press. WILLOWER, D. 1. & BOYD, W. L. (eds.) (1989). Willard Waller on education and school Berkeley, CA: McCutchan. WILSON, S. (1977). "The use of ethnographic techniques in educational research". Review , Educational Research. 47, 245-265. WIRTH, L. (1928). The ghetto. Chicago: University of Chicago Press. WOLCOTT, H. (1973). The man in the principal's office. New York: Holt, Rinehart & Winston. WOLCOTT, H. (1975). "Criteria for 00 ethnographic approach to research in schools". Hume Organization, 34, 111-127. WOLCOTT, H. (1977). Teachers vs. technocrats: An educational innovation in anthropologic, perspective. Eugene, OR: Center for Educational Policy ood Mooagement. WOLCOTT, H. W. (ed.) (1983). "Teaching fieldwork to educational researchers: A symposium Anthropology & Educational Quarterly 14(3), 171-212. WOLCOT, H. (1990). "Making a study 'more ethnographic"'. Journal of ContemporaJ Ethnography 19(1), 44-72. WOLF, R. L. (1979a, April). An overview of conceptual and methodological issues in naturalist evaluation. Paper presented at the meeting of American Educational Research Associatio San Francisco. 330 331 TAGG, J. (1988). The burden of representation: Essays on photographies and histories. Amherst: The University of Massachusetts Press. TAYLOR, C. (1919). The social survey. Its history and methods. Columbia: University of Missouri (Social Science Series 3). TAYLOR, S. (1980). A guide to monitoring and investigating residential settings. Syracuse. NY: Human Policy Press. TAYLOR, S. J. (1987). "Observing abuse: Professional ethics and personal morality in field research". Qualitative Sociology, /0(3), 288-301. TAYLOR, S. J. & BOGDAN, R. C. (1984). Introduction to qualitative research and methods: The searchfor meaning. New York: Wiley. TESCH, R. (1989). Qualitative research: Analysis types and software tools. London: Falmer. TESCH, R. (n.d.). "Software for the computer-assisted analysis of text". Mimeographed. THOMAS, W. L (1923). The unadjusted girl. Boston: Little, Brown. THOMAS, W. L & ZNANIECKI, F. (1927). The Polish peasant in Europe and America. New York: Knopf. THOMSON, J. & SMITH, A. (1877). Street izfe in London. London: Sampson Low, Murston, Searle & Rurington. THORNE, B. (1980). "'You still takin' notes~ Fieldwork and problems of informed consent". Social Problems, 27,272-284. THRASHER, F. (1927). The gang. Chicago: University ofChicago Press. THRACHTENBERG, A. (1979). "Introduction: Photographs as symbolic history". ln The American image: Photographsfrom the National Archives, 1860-1960. New York: Pantheon. TRAVERS, R. (1978). An introduction to educational research (4th ed.). New York: Macmillan. TURNER, R. H. (1953). "The quest for universais in sociological research". American Sociological Review, 18,604-611. TURNER, R. (ed.) (1974). Ethnomethodology. Middlesex, UK: Penguin. TYLER, R. (ed.) (1976). Prospects for research and development in educations. Berkeley, CA: McCutcheon. r-------..l ..--------------------,I.L'.:: t . g _ lIiJ.•.. NOLF, R. L. (1979b). Strategies for conducting naturalistic evaluation in socio-educational settings: The naturalistic interview. Paper prepared for publication in the Occasional Paper Series, Evaluation Center, Western Michigan University. NOOD, P. (1975). Vou and Aunt Arie: A guide to culturaljournalism based on Foxfire and its descendents. Washington, DC: Institutional Development and Economic Affairs Service, lnc. NOODS, P. (1985). "New songs played skillfully: Creativity and technique in writing up qualitative research". ln R. G. Burgess (eds.), lssues in educational research: Qualitative methods. Philadelphia, PA: Falmer Press. ,IEGLER, S. (1980). "School for life: The experience of Italian immigrants in Canadian schools". Human Organization, 39(3), 263-267. ~IMMERMAN, C. & FRAMPTON, M. (1935). Family society, a study of the sociology of reconstruction. New York: D. Van Nostrand. ~NANIECKI, F. (1934). The method of sociology. New York: Farrar and Rinehart. ~ORBAUGH, H. (1929). The gold coast and the slum. Chicago: University of Chicago Press. ÍNDICE REMISSIVO Abertura a novas ideias, 219 Abordagem Foxfire, 289-291 Acesso, 115-121 American Educational Research Association, 39 Amostragem aleatória, 101 Amostragem de bola de neve, 99 Amostragem de tempo, 95 Amostragem de conveniência, 10 I Amostragem interna, 95 Análise: após a recolha de dados, 217-241 de dados no campo de investigação, 207-217 Análise situacional, 93 Antropologia, 25-26 Arzivu, Steve, 280 Autobiografias, 179-180 Autorização, 193 Auxiliares visuais, 217 Avaliação formativa, 277 Avaliação sumativa, 277 Comunicação externa, 181 Cooley, Charles Horton, 33, 55 Cooperative Research Act, 34 Cotde, Thomas, 259 Council on Anthropology and Education, 37 Cultura, 57-61 Dados, 149 análise, 168,207-241 categorização, 221-222 codificação, 168,222-229 documentos oficiais, 180-182 documentos pessoais, 177-180 escritos pelos sujeitos, 176-180 estatísticas oficiais, 194-199 fotográficos, 183-194 investigação-acção, 296-300 notas de campo, 150-175 pertença dos, 272 qualitativos (soft), 16 quantitativos, 194-199 saturação de, 96 tipos de processamento de, 232-238 utilização do computador e, 239-241 Decreto dos Direitos Civis de 1964, 270 Diários, 177-178 Diário de campo, 165 Documentarismo fotográfico, 33-34 DuBois, W. E. B., 22 Becker, Howard S., 36, 55 Blumer, Herbert, 32, 55 Boas, Franz, 25, 27 Bogardus, Emory S., 29 Booth, Charles, 20 Bowen, Nancy Beth, 293 Câmaras (Ver Fotografia) Cartas, 179 Codificação, 168 categorias, 221-229 influências na, 229, 232 Códigos de acontecimento, 226-227 Códigos de actividade, 226 Códigos de contexto, 222 Códigos de definição da situação, 223 Códigos de estratégia, 227 Códigos da estrutura social, 227 Códigos de métodos, 228 Códigos de processo, 225-226 Códigos de relação, 227 Coles, Robert, 259 Comentários do observador, 165-167, 21 0-212 Computadores, 43, 239, 241 Comte, August, 52 Empirismo, 40 Entrevistas, 16-17, 134-139 Escola de Chicago, 26-29, 32 Escrita, 244-260, 280 Escrita da proposta de estudo, 105-107,270-271 Estudos de caso: comparativos, 97 de análise situacional, 93 de observação, 90-92 organizacionais, 225 de organizações numa perspectiva histórica, 90 estudos comunitários, 93 histórias de vida. 92-93, 225 e microetnografia, 93-94 múltiplos, 97 plano geral de, 89 333 r---------i----------------------J.. tU-tf_ '.SL.U•......• udos realizados simultaneamente em múltiplos ais: COLECÇÁO MARIA TER PEDAGOGIA, CIÊNCIA DA EDUC! ALBANO ESTRELA RELAÇÃO PEDAGÓGICA, DISC\ E INDISCIPLINA NAAULA MARIA TERESA ESTRELA PROFISSÃO PROFESSOf ANTÓNIO NÓVOA (o'g.) VIDAS DE PROFESSORE ANTÓNIO NÓVOA (mg.) APRENDIZAGEM E FORMA JEAN BEFl6AUM ELABORAÇÃO DE PROJEC1 ACÇÃO E PlANIFICAÇJl JEAN-MARIE BARBIER A ANÁLISE DE NECESSID! NA FORMAÇÃO DE PROFES ÂNGELA RODRIGUES· MANUELA ESl SABER ESTUDAR E ESTUDAR filARA SAB ADELiNA LOPES DA SILVA • ISABEL [ comparativo constante, 10 1-104 indução analítica modificada, 98-101 ca,75-78 lOgrafia institucional, 45 lOmetodologia, 39, 41, 60-61 ans, J. W., 275 is, Ellsworth, 29-30 ninismo,44-45 10menologia, 53-54 rmação do professor, 287-289 tografia, 140-143 autorização, 193 documentário, 33-34 investigação educacional e, 183-193 técnica e equipamento, 191-193 tografias: em análise, 190-191 encontradas, 184-188 produzidas pelo investigador, 188-190 ,ire, Paulo, 263-264 rantia,69 rfinkel, Harold, 41, 60 er, Blanche, 55 lser. 218-219 '[fman, Erving, 35-36 elha de entrevista, 107-108 upo,91 iões do observador, 107-108 ad Start, 268-270 my, Jules, 35, 38 õrarquia de credibilidade, 274, 276, 296 oe, Lewis, 183 pótese de trabalho, 101 ,tória de vida, 17, 225 19hes, Everett c., 32, 36, 55 lsserl, Edmund, 53 lução analítica, 98-10 I 'ormadores-chave, 95, 213 luérito de Pittsburgh, 22-23 eracção simbólica, 32, 41, 55-57 lentário cultural, 189 restigação: abordagem do "Cavaleiro Solitário" à, 108, 278 abordagem da equipa à, 108,278-279 aplicada, 264 cooperativa, 116 dissimulada, 115 escrita, 244-260,280 estilo, 40-41 local, 275-277 naturalista, 17, 113 Investigação-acção, 77, 266, 292-300 Investigação avaliativa, 266-282 Investigação de campo, 17 Investigação decisória, 266, 267-282 Investigação etnográfica, 17, 37. 57-60 Investigação pedagógica, 266, 283-291 Investigação qualitativa: abordagem teórica à, 52-62 características da, 47-51 combinada com a quantitativa, 23 computadores e, 43, 239-241 definição de, 16-18 em educação, 39-41. 244-30 I entrevista em profundidade, 16 ética e, 75-78 exemplos de, 15-16 observação participante, 16 tradições da, 19-46 Investigação qualitativa aplicada em educação, 263-277 investigação-acção, 266, 292-300 investigação avaliativa e decisória, 266, 267-282 utilizações pedagógicas da, 266, 283-291 Ives, Edward, 139 Jackson, Philip, 35 Jornalismo cultural, 290 Jornalismo sensacionalista, 20 Jaurnal af Educacional Socialagy, 29 Komarovsky, Mirra, 34 Leacock, Eleanor, 37 LePlay, Frederik, 20 Malinowski, Bronislaw, 25 rv1ayhew. Henri, 20 Mead, George Herbert, 55 Mead, Margaret, 26 Memorandos, 165, 181,212 Schutz, Alfred, 53 Sistemas de codificação preestabelecidos, 228--229 Small, Albion, 26 Sociedade Americana de Sociologia, 30 Sociologia de Chicago, 26 Sociologia da educação, 29-31 Solicitação de propostas (SP), 268 Steffens, Lincoln, 20, 23-24 Strykes, Roy, 21 Subsídios, 270-271 Método comparativo constante, 10 l-I 04 Microetnografia, 93-94 Mills, C. Wright, 218, 297 Mitford, Jessica, 296 Narrativa, 256 Notas de campo, 150-152 conteúdo das, 152, 163-167 descritivas, 164-165 formato das, 167- 169 processo das, 169-172 reflexivas, 165-167 e transcrições, 172, 175 Natianallnstitute af Educatian, 39 Observação participante, 16, 125-139 Ogburn, William, 24 Paradigma, 52 Park, Robert, 27-28, 29, 55 Perspectiva, 36 Perspectivas participantes, 50 Pessoais, documentos, 177-180 Plano de investigação, 83-84 escolha do estudo, 85-88 escrita da proposta, 105-107 estudos de caso, 89-97 estudos em múltiplos locais simultaneamente, 98-104 grelhas de entrevista e guiões do observador, 107-108 investigação em equipa, 108 Pós-modernismo, 45-46 Prazos, 280-281 Project True, 37 Questões analíticas, 208-211 Questões em desenvolvimento, 208-211 Redfield, Robert, 26 Registos sobre o estudante, 181-182 Registos magnéticos (Ver Transcrições) Relativismo cultural, 25 Responsáveis escolares, 116 Retrato escrito, 256 Riis. Jacob, 20, 183 Rist, Ray, 38 Rivera, Geraldo, 299 Rogers, Carl, 36 334 r~-----_·I._--------------_.1&.j Taxas reais, 195-196 Tema, 247-248 Teoria: cultura, 57-60 estudos culturais, 61 etnometodologia, 60-61 fenomenologia, 53-54 interacção simbólica, 55-57 Teoria fundamentada, 50, 66 Teoria com suporte formal, 210 Tese, 247 Thomas, W. L, 27, 31 Thomson, John, 183 Thrasher, Frederick, 29 Tópico, 248 Trabalho de campo, 113-114 entrevistas, 134-139 fotografia e, 140-143 ganhar experiência, 122-124 observação participante, 125-139 obter acesso, 115-121 técnicas, 25 Tradição oral, 92 Transcrições, 172-175 Vandewalker, Nina, 25 Waller, Willard, 30-31 Wamer, W. Lloyd, 32 Wax, Rosalie, 25-26, 59 Webb, Beatrice (Potter), 21-22 Wicker, Tom, 296 Work Projects AdministraLion (WPA), 33 Yankee City Series, 32 Znaniecki, Florian, 27, 55 Zorbaugh, Harvey, 29 335 dS.5·~_--1i_