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Folkcomunicação, a mídia dos marginalizados

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Preocupado com o acesso à informação pelas comunidades marginalizadas, Luiz Beltrão realizou, em meados do século passado, observações empíricas que o levaram a questionar a tese da onipotência dos mass media. Sua hipótese de trabalho foi assim enunciada: "a mídia consegue mobilizar a atenção coletiva dos usuários, mas seus efeitos são mediados por líderes de opinião que filtram as mensagens segundo os padrões consensuados nos grupos primários". (BELTRÃO: 2001, p. 14)

Folkcomunicação, a mídia dos marginalizados Maria Isabel Amphilo Rodrigues de Souza Preocupado com o acesso à informação pelas comunidades marginalizadas, Luiz Beltrão realizou, em meados do século passado, observações empíricas que o levaram a questionar a tese da onipotência dos mass media. Sua hipótese de trabalho foi assim enunciada: “a mídia consegue mobilizar a atenção coletiva dos usuários, mas seus efeitos são mediados por líderes de opinião que filtram as mensagens segundo os padrões consensuados nos grupos primários”. (BELTRÃO: 2001, p. 14) O pensador pernambucano concebeu a teoria da folkcomunicação, atribuindo ao líder de opinião imprescindível importância a ser considerada no processo comunicacional, pois ele é o receptor imediato dos mass media. O feedback foi então considerado o termômetro da capacidade de persuasão do líder de opinião, na medida em que o folkcomunicador recodifica a mensagem midiática e reinterpreta a informação, de acordo com os valores comunitários. Portanto, quando se fala em Folkcomunicação, fala-se em processo, em intercâmbio de informações, de inter-ação entre as culturas folk (popular) e cult (de elite) com a cultura de massa (industrial). Trata-se daquele mesmo fenômeno que CANCLINI1 mais tarde rotularia como processo de hibridização da cultura. Não é sem razão que TRIGUEIRO identifica na pós-modernidade o mediador ativista, ou melhor, agentes culturais que assumem uma nova forma de atuação “em prol de uma melhor qualidade de vida local”. Dessa forma, o mediador ativista (que nós entendemos ser o folkcomunicador) tem o papel criativo de reinventar maneiras de proporcionar qualidade de vida a uma comunidade. Este mantém contato com uma outra realidade globalizada, onde se vive como se o mundo fosse uma única e grande casa (oikoumene) Numa realidade globalizada o mundo é percebido como uma Aldeia Global (McLuhan), ou melhor, como uma grande ilha, onde o folkcomunicador tem a responsabilidade social de transmitir à sua comunidade informações de um mundo não acessível, proporcionando uma melhor qualidade de vida. A pergunta que fica no ar é a seguinte: de que forma o folkcomunicador pode ser o interlocutor de uma sociedade pós-moderna globalizada, de modo a produzir uma melhor maneira de viver, maior expectativa e qualidade de vida, através dos meios de comunicação folk ? ROBERTO BENJAMIN (2000, p. 101-103) procura responder com o resgate da discussão internacional sobre o uso integrado dos folk media e dos mass media em 1 A maior contribuição de Canclini está relacionada ao conceito de hibridização das culturas contemporâneas. A proposta de Culturas Híbridas era elaborar uma noção de hibridação capaz de abarcar os diferentes processos onde o erudito, o popular e o massivo se inter-relacionam. programas de planejamento familiar. Em novembro de 1972, em Londres, reuniram-se experts de várias partes do mundo, com a finalidade de aprofundar o debate sobre temas relacionados com aqueles processos sócio-culturais que Beltrão havia denominado folkcomunicação. Os objetivos desse encontro foram publicados pelo Expert Group Meeting, PPF/UNESCO, London, 1972, nº 12 do Instructional Technology Report, (Washington-USA, 1975). Outro importante encontro, dois anos depois, em Nova Delhi, estabeleceu dez princípios para a dinamização dos folk media. Seu foco esteve concentrado no desenvolvimento rural, cultural, social, tendo, como estratégia mais efetiva, o estimulo ao uso integrado dos folk media e dos mass media para obter o impacto e o feedback desejados. Assim sendo, as estratégias de comunicação para o desenvolvimento passaram a valorizar a participação e a colaboração dos portadores de folclore, reforçando os processos de comunicação hegemônicos, ou seja, através dos mass media. Seus formuladores ancoravam-se na evidência de que os folk media, com grande poder persuasivo, são facilmente aceitos pela população. Uma forma de baixo custo e acessível às camadas populares brasileiras seria a Literatura de Cordel, que tem o poder de trabalhar questões políticas, ideológicas, e difíceis de entendimento do meio popular com uma linguagem simples, direta e objetiva. Podemos reforçar, lembrando que o comunicador folk, encarnado no poeta de cordel, é um dos incontáveis assistentes da película cinematográfica Farrapo Humano, produzido em Hollywood, focalizando o tema alcoolismo. Como a audiência desse poeta do povo não freqüenta cinema, cuja linguagem pelo menos não lhe é familiar, ele transforma a história na trama de um folheto em verso, adaptando a mensagem cinematográfica ao universo simbólica das comunidades periféricas. Nesse sentido a Folkcomunicação é um campo fértil para a propagação de mensagens em prol do desenvolvimento. De forma bem humorada e criativa, seus agentes proporcionam o acesso à informação aos milhões de cidadãos iletrados de nosso país, que ainda não tem acesso à leitura e à informação clara e imediata. BIBLIOGRAFIA BELTRÃO, LUIZ. FOLKCOMUNICAÇÃO. UM ESTUDO DOS AGENTES E DOS MEIOS POPULARES DE INFORMAÇÃO DE FATOS E EXPRESSÃO DE IDÉIAS. EDUPURS E FAMECOS, COLEÇÃO. COMUNICAÇÃO Nº 12, PORTO ALEGRE, 2001. BELTRÃO, LUIZ. FOLKCOMUNICAÇÃO: 2004. TEORIA E METODOLOGIA. SÃO PAULO: UMESP, BENJAMIN, R. FOLKCOMUNICAÇÃO: NO CONTEXTO DE MASSA, ED. CCHLA, UFPB, JOÃO PESSOA/PB, 2000. BENJAMIN, R. (ORG.) ITINERÁRIO DE LUIZ BELTRÃO. PERFIS PERNAMBUCANOS – 9, PERNAMBUCO: AIP/UNICAP, 1998. CANCLINI, Nestor G. Culturas Híbridas: Estratégias para entrar y salir de la modernidad, México, Grijalbo, 1989. LUYTEN, Joseph M. A notícia na literatura de cordel. São Paulo, Estação Liberdade, 1992. LUYTEN, Joseph M. Folkmídia. INTERCOM 2002 – XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Salvador, 2002. LUYTEN, Joseph M. Sistemas de Comunicação Popular. São Paulo, Ática, 1998. MARQUES DE MELO, José. Mídia e folclore. Cátedra UNESCO/UMESP de Comunicação, Maringá, 2001