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Fat Fashion

2021, dObra[s] – revista da Associação Brasileira de Estudos de Pesquisas em Moda

Quando fui convidada para organizar um dossiê sobre moda e corpos gordos na Dobra[ s], mal podia imaginar que estaria escrevendo esta apresentação em meio à comoção por uma grande tragédia nacional: a morte da cantora sertaneja Marília Mendonça e de mais quatro pessoas, após a queda de um avião que os transportava para a cidade de Caratinga em Minas Gerais. [...]

[dossiê] dossiê apresentação ] Aliana Aires FAT FASHION: PERSPECTIVAS CULTURAIS Por Aliana Aires Quando fui convidada para organizar um dossiê sobre moda e corpos gordos na Dobra[s], mal podia imaginar que estaria escrevendo esta apresentação em meio à comoção por uma grande tragédia nacional: a morte da cantora sertaneja Marília Mendonça e de mais quatro pessoas, após a queda de um avião que os transportava para a cidade de Caratinga em Minas Gerais. Antes reduto masculino, o estilo musical sertanejo ganhou notoriedade nos últimos tempos pela ascensão de cantoras que abriram espaço para questões femininas, impulsionadas principalmente por Marília Mendonça, considerada líder do novo movimento musical denominado de “feminejo” pela crítica especializada. No entanto, a ruptura que ela promoveu no mercado sertanejo ia muito além disso. Marília era mulher, mas sobretudo era uma mulher gorda. Seu corpo representava uma transgressão provavelmente ainda maior que a de inserir a perspectiva feminina num estilo até então dominado por homens e por uma ideologia machista, impregnada de valores patriarcais materializados nas letras das composições musicais, que apresentam as mulheres sob um olhar e lugar de fala masculinos. Nestas canções, elas são tratadas como objetos de desejo dos homens, que idealizam uma mulher frágil, sentimental, com corpo de “modelo” e comportamento de “dama”, o que significa, entre outras coisas, ser cis, branca, jovem, magra e não beber ou falar alto. Marília era o oposto disso: ela bebia, se apaixonava, traía e era traída e se deixava levar por seus desejos. Na verdade, ela representava a mulher real, que erra muito, acerta às vezes e come em excesso, o que contribuiu para gerar familiaridade e aproximação com o seu público. O “feminejo” promoveu uma ressignificação de subjetividades políticas e identidades marginalizadas entrelaçadas às lógicas do capitalismo, através do consumo musical. Na verdade, o mercado sertanejo tradicional reflete e refrata movimentos de exclusão que se repetem nos mais variados espaços sociais, de um modo macro e micro, portanto este se configura tão somente como um dos possíveis lócus da contemporaneidade onde o corpo fora do padrão foi marginalizado. Outro célebre espaço de exclusão do corpo considerado fora do padrão de beleza ideal na sociedade Ocidental contemporânea é o sistema da moda, o que pode ser facilmente identificado por meio das capas de revistas e desfiles, onde há predominância absoluta de corpos jovens, magros e brancos. E a raiz originária disso está nos microambientes das faculdades de moda, onde o futuro designer vem sendo ensinado a desenhar, modelar e produzir roupas para um único tipo de corpo e público: o magro. Há mais de um século o campo da moda se tornou uma área de estudos acadêmicos, e várias faculdades de renome se estabeleceram no mundo, como o Instituto Berçot na França, a Central Saint Martins em Londres, e a Parsons, em Nova York. No Brasil, as [8] | NÚMERO 33 | SETEMBRO-DEZEMBRO 2021 https://dobras.emnuvens.com.br/dobras | e-ISSN 2358-0003 dossiê apresentação ] Aliana Aires primeiras escolas se instalaram em meados dos anos 80 e hoje temos centenas de cursos espalhados por todo o país. Entretanto, no cenário acadêmico nacional e internacional, o ensino de moda foi centrado no corpo magro: por exemplo, os manequins de moulage usados para ensinar modelagem tridimensional aos alunos são produzidos geralmente para um manequim de tamanho pequeno, nas primeiras disciplinas de desenho do corpo humano, onde os discentes aprendem a traçar as dobras e curvas do corpo, são usadas mulheres magras como modelo vivo, e nas disciplinas de ilustração de moda os alunos são ensinados a desenhar croquis estilizados na menor medida corporal possível. Isso, somado ao fato de as agências de modelos terem padronizado o corpo magro como ideal para desfiles e produções, fez da moda e do seu ensino um monopólio da magreza. Como os alunos poderiam pensar e produzir roupas voltadas para corpos que eles não conheceram, não estudaram e simplesmente ignoraram nos seus aprendizados? A pergunta que fica é: se os corpos gordos existem há décadas, já que pelo menos desde 1970 se fala em epidemia da obesidade no contexto mundial, por que esses corpos foram invisibilizados por tanto tempo no mercado de moda e na pesquisa e literatura de estudos da moda? Como homens e mulheres gordas se vestiam antes da recente ascensão global do mercado de moda plus size? As respostas para perguntas como essas só começaram a ser investigadas na última década, em que verificamos o início de estudos sobre o corpo gordo no campo da moda, especialmente nos EUA, influenciado pelos Fat Studies, área de investigação interdisciplinar que ganhou força ao investigar a história, a cultura e a teoria sobre o corpo gordo e a gordura. No campo dos estudos da moda/Fashion Studies, o crescente interesse acadêmico pelo corpo gordo tem se manifestado em um pequeno grupo de pesquisas interdisciplinares que examinam a história, a teoria e a produção de moda para corpos gordos, geralmente centrados na experiência estadunidense (e, em menor grau, na britânica e canadense). A união dos estudos da moda/Fashion Studies e dos estudos sobre o corpo gordo, chamados de Fat Studies, originou um campo de estudos que algumas acadêmicas norte-americanas chamam de Fat Fashion. De acordo com Deborah Christel (2014), o Fat Fashion reivindica que professores e designers tenham a responsabilidade de assegurar a indivíduos de todos os tamanhos e corpos que possam encontrar roupas conforme desejam e precisam disponíveis no mercado1. Cameron e Watkins (2018) afirmam que a prática pedagógica voltada a estudar e entender as necessidades do corpo gordo emergiu porque os educadores entenderam que é preciso haver uma disrupção na reprodução, legitimação e promoção dos discursos dominantes sobre “obesidade”, e oferecer abordagens alternativas que promovam a aceitação corporal e a saúde para pessoas de todos os tamanhos2. Assim, estudiosos que trabalham no campo Fat Fashion têm examinado temas como revistas e blogs de moda sobre positividade corporal, a história inicial da indústria de vestuário para tamanhos grandes, a [9] 1 CHRISTEL, Deborah. Fat Fashion: Fattening pedagogy in apparel design. Fat Studies: Estados Unidos, 2014. 2 CAMERON, Erin. LOU WATKINS, Patti. Fat pedagogy: Improving teaching and learning for everybody. Fat Studies: Estados Unidos, 2018. | NÚMERO 33 | SETEMBRO-DEZEMBRO 2021 https://dobras.emnuvens.com.br/dobras | e-ISSN 2358-0003 dossiê apresentação ] Aliana Aires representação de corpos gordos na mídia de moda e a experiência de compras no mercado de moda plus size, entre outros tópicos enraizados na mídia Ocidental, como arquivos, histórias de marcas e espaços de varejo. Amanda Czerniawski (2015) foi uma das acadêmicas pioneiras a estudar o tema, tendo investigado o mercado de modelos gordas nos EUA a partir de uma pesquisa etnográfica, publicada no livro Fashioning Fat: Inside Plus-Size Modeling (O corpo gordo na moda: por dentro do mercado de modelos plus size, tradução nossa). A acadêmica norte-americana Lauren Downing Peters (2018) escreveu sua tese de Doutorado sobre a História da Moda para corpos grandes nos EUA e está trabalhando na publicação de um livro completo sobre o tema, a estudiosa Deborah Christel, também norte-americana, tem diversos artigos publicados em revistas acadêmicas importantes e vem advogando por uma educação inclusiva quanto ao tamanho na Moda. Na Europa, o professor italiano Paolo Volonté (2021) acaba de lançar o livro Fat Fashion: The Thin Ideal and the Segregation of Plus Size Bodies (Fat Fashion: o ideal do corpo magro e a segregação dos corpos plus size, tradução nossa), publicado pela editora Bloomsbury. Embora estes importantes trabalhos preencham uma lacuna na literatura de moda, que há muito marginaliza “Outros” corpos, também perpetuam a ideia incorreta de que a moda é uma construção dos países ricos e Ocidentais, como se as regiões consideradas não-Ocidentais não fossem capazes de produzir uma moda relevante e de qualidade e tampouco fossem capazes de pensar sobre sua produção, fato que ignora a grande quantidade de centros de estudos e universidades de Design e Moda fora do circuito Ocidental, como no Brasil, que conta com vários programas de graduação, pós- graduação latu sensu e alguns stricto sensu ao longo de todo o seu território3. É importante destacar que o que chamamos aqui de países “Ocidentais” se refere aos que estiveram no centro dos estudos da moda, como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e a maioria dos países da Europa, enquanto os “não-Ocidentais” incluem regiões marginalizadas ou esquecidas dentro da literatura de moda publicada, especialmente a América Latina, Ásia e África. Ainda há poucos estudos no Brasil que exploram as relações entre moda e corpo gordo, mas já é possível identificar o interesse de alguns pesquisadores no tema, embora a maior parte das pesquisas direcionadas ao estudo do corpo gordo partam da perspectiva da Sociologia, Antropologia e da Comunicação. Destaco minha tese de Doutorado como um dos estudos pioneiros em nosso país, buscando desvendar o consumo de moda para tamanhos grandes numa perspectiva histórica e comparativa entre Brasil e EUA. O resultado desta foi publicado em 2019 pela editora Estação das Letras e Cores em um livro intitulado “De gorda a plus size: a moda do tamanho grande”. Também chamo atenção para a pesquisa da filósofa Maria Luiza Jimenez-Jimenez sobre gordofobia que deu origem ao projeto “Lute como uma gorda”. No campo da comunicação, as pesquisas de Agnes Arruda e Carolina Roveda também são importantes por debaterem as representações do corpo gordo veiculadas na mídia. 3 [10] BONADIO, Maria Cláudia. A produção acadêmica sobre moda na pós-graduação stricto sensu no Brasil. IARA: Revista de Moda, Cultura e Arte: São Paulo, 2010. | NÚMERO 33 | SETEMBRO-DEZEMBRO 2021 https://dobras.emnuvens.com.br/dobras | e-ISSN 2358-0003 dossiê apresentação ] Aliana Aires Desse modo, tendo em vista a necessidade de trazer à tona a história da Moda para tamanhos grandes em contextos fora do eixo dominante e inter-relacionar os estudos sobre corpo gordo e moda em contextos Ocidentais e não-Ocidentais, eu e Lauren Downing Peters, pesquisadora norte-americana que iniciou a organização deste dossiê comigo, buscamos investigações sobre o fenômeno da moda para tamanhos grandes em regiões marginalizadas nos estudos da Moda, observando como locais com pouca visibilidade internacional de sua produção acadêmica tem se posicionado a respeito da inclusão do corpo gordo na moda, especialmente os países latinos. Nossa intenção era identificar semelhanças e diferenças em relação ao tratamento dado ao tema em países Ocidentais. No entanto, por não ter havido submissões de artigos em inglês e por todos os artigos escolhidos para o dossiê serem centrados na experiência brasileira de consumo de moda plus size, Lauren decidiu se afastar da organização e eu passei a organizar o dossiê sozinha, intitulando-o “Fat Fashion: perspectivas culturais”. Os dez textos que compõe o Dossiê “Fat Fashion: Perspectivas Culturais” apresentam um rico estudo sobre a indústria da moda, o corpo gordo e suas relações na História, Sociologia, Design, Comunicação e Consumo, evidenciando o quanto a moda produzida para “corpos que não estão na moda” influencia e é influenciada pela cultura em que está inserida. Os textos refletem sobre a cultura brasileira no que diz respeito ao corpo gordo, e em alguns trechos apresentam associações com aspectos culturais de países da Europa e EUA. O artigo que abre o dossiê “Toda gordinha tem o direito de se vestir bem e estar na moda”: consumo, dissenso e insurgência em grupos sobre moda plus size no Facebook”, escrito por Luís Mauro Sá Martino e Ângela Cristina Salgueiro Marques, investiga o consumo de moda para tamanhos grandes, por meio de um estudo sobre as representações dos corpos em grupos virtuais de troca e páginas de lojas especializadas na rede social Facebook, identificando discursos de dissenso em relação ao modelo de representação corporal vigente nos dias de hoje. Os autores vislumbram uma ruptura na produção midiática de sentidos sobre o corpo gordo, em que há uma ressignificação deste, possibilitando enxergar a moda como uma prática política e identitária. Ainda voltado ao consumo de moda, mais precisamente direcionando seu olhar para as espacialidades físicas, o segundo artigo “A Disneylândia das gordas: o Pop Plus e as feiras de moda plus size no Brasil”, de autoria de Bruna Salles, analisa a evolução da moda plus size na capital paulista nos últimos anos, focando especialmente na Feira Pop Plus, considerada a maior feira plus size do mundo, e nas ruas paulistanas Domingos de Moraes, José Paulino e suas mediações, além da região do Brás, tecendo uma crítica relevante a respeito do desenvolvimento do segmento de varejo plus size no cenário urbano paulista. O terceiro artigo do dossiê “Entrelaçamentos: moda plus size e biopolíticas do consumo para o corpo gordo”, escrito por Tânia Hoff, traz uma contribuição consistente ao relacionar duas marcas presentes em contextos culturais distintos (Brasil e EUA), buscando diferenças e semelhanças na abordagem ao corpo gordo. A autora identifica a presença do que chama de uma “biopolítica do consumo” em algumas práticas de mercado, caracterizando o fenômeno. Em seguida, o artigo “O nome dela é Jenifer: representatividade gorda importa” de Agnes Arruda traz um estudo a respeito das representações midiáticas de mulheres gordas, [11] | NÚMERO 33 | SETEMBRO-DEZEMBRO 2021 https://dobras.emnuvens.com.br/dobras | e-ISSN 2358-0003 dossiê apresentação ] Aliana Aires a partir do clip da música “O nome dela é Jenifer” de Gabriel Diniz, onde verificamos uma alteração nos sentidos pré-estabelecidos, que se dá por meio da inserção de uma mulher curvilínea, interpretada pela atriz Mariana Xavier, no papel de protagonista do vídeo musical e objeto de desejo masculino, num espaço onde tradicionalmente aparecia uma mulher magra. O que mais chama atenção é que essa protagonista gorda é apresentada de um modo naturalizado, sem qualquer menção ao tamanho do seu corpo, marcando uma ruptura no tratamento midiático estereotipado que é frequentemente conferido ao personagem gordo em produções midiáticas. Em “Atrizes gordas também usam figurino”, Márcia Mertz propõe uma reflexão sobre a relação atrizes gordas/figurinos/figurinistas, trazendo depoimentos de atrizes com dificuldades vivenciadas para se vestirem dentro do mundo teatral, além de relatar suas vivências pessoais. A autora reivindica que as atrizes gordas tenham os mesmos direitos das magras no que diz respeito ao acesso ao figurino e a todas as questões que envolvem este espaço ainda tão hegemônico em termos de representação corporal. No sexto artigo, “Subalternas e marginalizadas: as mulheres gordas e a moda nas capas da revista Donna”, Carolina Roveda Pilger e Ana Gruszynski apresentam o corpo gordo sob a perspectiva interseccional, que pensa o gênero atravessado pelas categorias de raça, classe, sexualidade, faixa etária, estética e deficiência. Analisando várias capas da revista Donna publicadas num período que compreende vinte e sete anos, as autoras investigam como e em que condições o corpo feminino gordo ganha visibilidade na revista, desvelando seu lugar de fala neste espaço de poder marcado por desigualdades. O sétimo artigo “Sociedade gordofóbica: discursos relativos ao vestuário de gordas” de Cynthia de Holanda Sousa Matos e Humberto Pinheiro Lopes, novamente volta sua atenção para as espacialidades físicas das lojas de moda plus size, mas desta vez o palco é a cidade de Fortaleza, capital do Estado do Ceará. O artigo analisa a construção social do corpo das mulheres magras e gordas neste lugar, relatando as terminologias usadas para identificá-las e tratá-las no varejo popular. Em seguida, o artigo “Adaptações de conforto para o vestuário de mulheres idosas de tamanho grande”, escrito pelas estudiosas Artemísia Lima Caldas e Nelymar Gonçalves do Nascimento, avalia como gênero, faixa etária e tamanho influenciam na experiência de consumo de moda, apresentando sugestões adaptáveis ao vestuário voltadas a promover conforto. No penúltimo artigo do dossiê, “Se não me cabe, não me serve: gordofobia na moda plus size”, Maria Luisa Jimenez-Jimenez e Luciana Pionório fazem uma crítica ao mercado de moda plus size e denunciam a gordofobia estrutural que elas consideram estar presente em todo o circuito de consumo dos corpos gordos no Brasil, desde a produção até a recepção, revelando como um mercado que deveria abraçar e naturalizar esses corpos repete e muitas vezes até reforça os significados negativos associados à identidade gorda na nossa cultura. O décimo e último artigo do dossiê “A moda plus size pela lente das desigualdades sociais” aproxima o campo das Ciências Sociais e do Design para evidenciar como o marcador identitário de classe social se apresenta impacta no consumo de moda de mulheres gordas e de baixa renda, evidenciando as desigualdades enfrentadas pelas mulheres desses grupos no acesso ao produto material resultante da produção voltada para tamanhos grandes. As [12] | NÚMERO 33 | SETEMBRO-DEZEMBRO 2021 https://dobras.emnuvens.com.br/dobras | e-ISSN 2358-0003 dossiê apresentação ] Aliana Aires autoras tecem uma discussão original que nos permite avaliar a moda plus size como uma manifestação cultural abrangente, espelhando as desigualdades existentes em nossa própria cultura. Também realizamos uma entrevista com o professor e historiador norte-americano Christopher E. Forth, em “Sentidos do corpo gordo e da gordura na cultura material: ‘além do visual, além do humano, e até mesmo além dos corpos”. Ele fala a respeito de suas obras e estudos sobre o corpo gordo e a gordura em uma perspectiva histórica, revelando lógicas antagônicas e ambíguas, que em alguns momentos contradizem ideias plenamente aceitas e estabelecidas nos estudos sobre o corpo gordo, adicionando sentidos ao cadeirão semiótico que a palavra gordo carrega historicamente. Ao olhar mais de perto para a emergência do consumo de moda plus size identificamos um movimento duplo: por um lado, este mercado reproduz e reforça lógicas de exclusão da nossa própria sociedade, e por outro, proporciona liberdade aos indivíduos gordos de experimentarem a moda e o empoderamento que ela traz, muitas vezes se conectando a objetivos e agendas ativistas mais amplas que desafiam as relações hegemônicas de poder e desigualdade. No entanto, como educadores e agentes da cadeia têxtil, devemos ter cautela ao comemorar e abraçar a moda plus size e o consumo como expressões legítimas do ativismo gordo, capazes de promover a redefinição da identidade dos corpos gordos em nossa sociedade4. É preciso ficarmos atentos aos movimentos das marcas no sentido de incluírem tamanhos grandes e investigarmos se a positividade corporal é de fato ou não o seu objetivo final, ou se estamos apenas diante de uma estratégia mercantil de marcas que se apropriam da causa do corpo gordo, apresentando imagens de todos os tamanhos corporais em suas campanhas, mas sem o interesse legitimo em atender a estes corpos e às suas necessidades de modo apropriado. Como considerações finais, gostaríamos de reafirmar nosso principal objetivo ao propor esse dossiê, que é expandir e descentralizar a pesquisa sobre Fat Fashion para além do contexto Ocidental, buscando explorar a moda para tamanhos grandes dentro dos contextos globais e locais — considerando como as ideias sobre beleza, corpo, identidade e moda mudam através das fronteiras culturais, evoluem ao longo do tempo e afetam diferentes grupos de diferentes maneiras. Boa leitura! 4 [13] LEBESCO, Kathleen. Revolting Bodies: The Struggle to Redefine Fat Identity. University of Massachusetts Press: Boston, 2004. | NÚMERO 33 | SETEMBRO-DEZEMBRO 2021 https://dobras.emnuvens.com.br/dobras | e-ISSN 2358-0003