Lexikon
CELSO C U N H A & LINDLEY CINTRA
nova
gramática
do português contemporâneo
7a edição
de acordo com a nova ortografia
obras de referência
nova gramática do português contemporâneo
Lexikon
obras de referência
CELSO C U N H A & LINDLEY CINTRA
nova gramática
do português
contemporâneo
7a edição - 2a im pressão
Texto atualizado com a nova ortografia, determ inada pelo
DECRETO N° 6.583, DE 29 DE SETEMBRO DE 2008 que
promulga o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, com
início de sua vigência em Io de janeiro de 2009.
© 2017 by titulares dos direitos de Celso Ferreira da Cunha e Luis
Filipe Lindley Cintra
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7“ edição - 2016
Editor
Paulo Geiger
Revisào
Ana Lúcia Kronemberger
D iagramação
Ilustrarte Design e Produção Editorial
P rodução
Sônia Hey
Capa
Luis Saguar
I magem
de capa
Serigrafia de Gonçalo Ivo - Rio São Francisco (vista de Ibotirania, BA),
7993, prova do autor.
impressão
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C1P-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.
C977n
7.ed.
Cunha, Celso
Nova gramática do português contemporâneo
[recurso eletrônico) / Celso Cunha, Lindley Cintra. - 7.
ed., reimpr. — Rio de Janeiro : Lexikon, 2017.
800 p., recurso digital
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Modo de acesso: world wide web
Inclui índice
ISBN: 978-85-8300-031-0 (recurso eletrônico)
1. Língua portuguesa - Gramática. 2. Livros eletrôni
cos. I, Cintra, Luís F. Lindley
(Luis Filipe Lindley), 1925-1991. II. Titulo.
17-41723
C DD:
CDU: 469.5
81 LI 34.3 >36
À memória de Serafim da Silva Neto,
amigo comum e mestre da
Filologia Portuguesa.
A Joseph M. Piei,
Jacinto do Prado Coelho,
José V. de Pina Martins,
companheiros e amigos.
Sumário
PREFÁCIO, xxiii
ADVERTÊNCIA, xxvii
NOTA DO EDITOR, xxix
Introdução - CONCEITOS GERAIS, 1
Linguagem, língua, discurso, estilo, 1
Língua e sociedade: variação e conservação linguística, 2
Diversidade geográfica da língua: dialeto e falar, 4
A noção de correto, 5
Capítulo 1 - DO LATIM AO PORTUGUÊS ATUAL, 9
O latim e a expansão romana, 9
Latim literário e latim vulgar, 10
As línguas românicas, 11
A romanização da península, 13
O domínio visigótico, 16
O domínio árabe, 17
O português primitivo, 18
Períodos evolutivos da língua portuguesa, 18
Capítulo 2 - DOMÍNIO ATUAL DA LÍNGUA PORTUGUESA,23
Unidade e diversidade, 23
VIII
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
As variedades do português, 24
Os dialetos do português europeu, 25
Os dialetos das ilhas atlânticas, 31
Os dialetos brasileiros, 31
O português de África, da Ásia e da Oceânia, 34
Capítulo 3 - FONÉTICA E FONOLOGIA,37
Os sons da fala, 37
O aparelho fonador, 37
Funcionamento do aparelho fonador, 38
Som e fonema, 40
Descrição fonética e tbnológica, 41
Transcrição fonética e fonológica, 42
Alfabeto fonético utilizado, 42
Classificação dos sons linguísticos, 4
Vogais e consoantes, 45
Semivogais, 45
Classificação das vogais, 45
Articulação, 47
Timbre, 47
Intensidade e acento, 48
Vogais orais e vogais nasais, 48
Vogais tônicas orais, 49
Vogais tônicas nasais, 49
Vogais átonas orais, 50
Classificação das consoantes, 53
Modo de articulação, 54
O ponto ou zona de articulação, 55
O papel das cordas vocais, 56
O papel das cavidades bucal e nasal, 57
Quadro das consoantes, 57
A posição das consoantes, 59
Encontros vocálicos, 60
Ditongos, 60
Ditongos decrescentes e crescentes, 60
Ditongos orais e nasais, 61
Tritongos, 62
Hiatos, 63
Encontros intraverbais e interverbais, 63
Encontros consonantais, 64
Dígrafos, 65
Sílaba, 66
Sílabas abertas e sílabas fechadas, 66
Classificação das palavras quanto ao número de sílabas, 67
SUM ÁRIO
Acento tônico, 67
Classificação das palavras quanto ao acento tônico, 69
Observações sobre a pronúncia culta, 70
Valor distintivo do acento tônico, 71
Acento principal e acento secundário, 71
Grupo acentuai (ou de intensidade), 72
Ênclise e próclise, 73
Acento de insistência, 73
Acento afetivo, 74
Acento intelectual, 74
Distinções fundamentais, 75
Capítulo 4 - ORTOGRAFIA, 77
Letra e alfabeto, 77
Notações léxicas, 78
O acento, 78
O til, 79
O trema, 79
O apóstrofo, 79
A cedilha, 79
O hífen, 79
Emprego do hífen nos compostos, 80
Emprego do hífen nas formações por prefixação, recomposição e sufixação, 81
Emprego do hífen na ênclise, na mesóclise e com as formas do verbo haver, 82
Partição das palavras no fim da linha, 82
Regras de acentuação, 84
Divergências entre as ortografias oficialmente
adotadas em Portugal e no Brasil, 88
Capítulo 5 - CLASSE, ESTRUTURA E FORMAÇÃO DE PALAVRAS, 89
Palavra e morfema, 89
Tipos de morfemas, 90
Classes de palavras, 91
Estrutura das palavras, 92
Radical, 92
Desinência, 92
Afixo, 93
Vogal temática, 94
Vogal e consoante de ligação, 95
Formação de palavras, 96
Palavras primitivas e derivadas, 96
Palavras simples e compostas, 96
Famílias de palavras, 96
IX
X
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Capítulo 6 - DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO, 97
Formação de palavras, 97
Derivação prefixai, 97
Prefixos de origem latina, 98
Prefixos de origem grega, 101
Derivação sufixai, 102
Sufixos nominais, 102
Sufixos verbais, 114
Sufixo adverbial, 115
Derivação parassintética, 116
Derivação regressiva, 117
Derivação imprópria, 118
Formação de palavras por composição, 119
Tipos de composição, 119
Compostos eruditos, 122
Radicais latinos, 122
Radicais gregos, 123
Recomposição, 127
Pseudoprefixos, 127
Hibridismo, 129
Onomatopéia, 230
Abreviação vocabular, 130
Siglas, 130
Capítulo 7 - FRASE, ORAÇÃO, PERÍODO, 133
A frase e sua constituição, 133
Frase e oração, 134
Oração e período, 135
A oração e os seus termos essenciais, 136
Sujeito e predicado, 136
Sintagma nominal e verbal, 137
O sujeito, 138
Representação do sujeito, 138
Sujeito simples e sujeito composto, 140
Sujeito oculto (determinado), 141
Sujeito indeterminado, 142
Oração sem sujeito, 143
Da atitude do sujeito, 145
Com os verbos de ação, 145
Com os verbos de estado, 146
O predicado, 146
Predicado nominal, 146
Predicado verbal, 149
Verbos intransitivos, 149
Verbos transitivos, 150
Predicado verbo-nominal, 151
Variabilidade da predicação verbal, 152
SUM ÁRIO
A oração e os seus termos integrantes, 152
Complemento nominal, 153
Complementos verbais, 154
Objeto direto, 154
Objeto direto preposicionado, 156
Objeto direto pleonástico, 156
Objeto indireto, 157
Objeto indireto pleonástico, 159
Predicativo do objeto, 160
Agente da passiva, 161
Transformação da oração ativa em passiva, 162
A oração e os seus termos acessórios, 163
Adjunto adnominal, 164
Adjunto adverbial, 165
Classificação dos adjuntos adverbiais, 166
Aposto, 169
Valor sintático do aposto, 171
Aposto predicativo, 173
Vocativo, 174
Colocação dos termos na oração, 176
Ordem direta e ordem inversa, 176
Inversões de natureza estilística, 176
Inversões de natureza gramatical, 177
Inversão verbo + sujeito, 177
Inversão predicativo + verbo, 1S1
Entoação oracional, 181
Grupo acentuai e grupo fônico, 182
O grupo fônico, unidade melódica, 182
O grupo fônico e a oração, 183
Oração declarativa, 183
Oração interrogativa, 184
Oração exclamativa, 187
Conclusão, 189
Capítulo 8 - SUBSTANTIVO, 191
Classificação dos substantivos, 192
Substantivos concretos e abstratos, 192
Substantivos próprios e comuns, 192
Substantivos coletivos, 192
Flexões dos substantivos, 194
Número, 194
Formação do plural, 195
Gênero, 202
Quanto à significação, 203
Quanto à terminação, 204
Formação do feminino, 204
XI
XII
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Substantivos uniformes, 209
Mudança de sentido na mudança de gênero, 210
Substantivos masculinos terminados em -a, 211
Substantivos de gênero vacilante, 211
Grau, 212
Valor das formas aumentativas e diminutivas, 212
Especialização de formas, 213
Emprego do substantivo, 213
Funções sintáticas do substantivo, 213
Substantivo como adjunto adnominal, 215
Substantivo caracterizador de adjetivo, 216
Substantivo caracterizado por um nome, 217
O substantivo como núcleo das frases sem verbo, 217
Capítulo 9 - ARTIGO, 219
Artigo definido e indefinido, 219
Formas do artigo, 220
Formas simples, 220
Formas combinadas do artigo definido, 221
Formas combinadas do artigo indefinido, 223
Valores do artigo, 224
A determinação, 224
Emprego do artigo definido, 226
Com os substantivos comuns, 226
Empregos particulares, 226
Emprego genérico, 230
Emprego em expressões de tempo, 231
Emprego com expressões de peso e medida, 234
Com a palavra casa, 234
Com a palavra palácio, 235
Emprego com o superlativo relativo, 236
Com os nomes próprios, 237
Com os nomes de pessoas, 238
Com os nomes geográficos, 240
Com os nomes de obras literárias e artísticas, 243
Casos especiais, 243
Antes da palavra outro, 243
Depois das palavras ambos e todo, 244
Repetição do artigo definido, 247
Com substantivos, 247
Com adjetivos, 248
Omissão do artigo definido, 249
Emprego do artigo indefinido, 251
Com os substantivos comuns, 251
Com os nomes próprios, 253
Omissão do artigo indefinido, 254
Em expressões de identidade, 255
SUM ÁRIO
Em expressões comparativas, 256
Em expressões de quantidade, 256
Com substantivo denotador da espécie, 257
Outros casos de omissão do artigo indefinido, 257
Capítulo 10 - ADJETIVO,259
Nome substantivo e nome adjetivo, 260
Substantivação do adjetivo, 260
Substitutos do adjetivo, 261
Morfologia dos adjetivos, 262
Adjetivos pátrios, 262
Pátrios brasileiros, 262
Pátrios portugueses, 263
Pátrios africanos, 263
Adjetivos pátrios compostos, 263
Flexões dos adjetivos, 264
Número, 264
Plural dos adjetivos simples, 265
Plural dos adjetivos compostos, 265
Gênero, 265
Formação do feminino, 266
Adjetivos uniformes, 267
Feminino dos adjetivos compostos, 267
Graus do adjetivo, 268
Comparativo e superlativo, 268
Formação do grau comparativo, 269
Formação do grau superlativo, 269
Comparativos e superlativos anômalos, 274
Adjetivos que não se flexionam em grau, 275
Emprego do adjetivo, 275
Funções sintáticas do adjetivo, 275
Valor estilístico do adjetivo, 279
Concordância do adjetivo com o substantivo, 284
Adjetivo referido a um substantivo, 284
Adjetivo referido a mais de um substantivo, 285
Adjetivo adjunto adnominal, 285
Adjetivo predicativo de sujeito composto, 287
Capítuloll - PRONOMES,289
Pronomes substantivos e pronomes adjetivos, 289
Pronomes pessoais, 290
Formas dos pronomes pessoais, 291
Formas o, lo e no do pronome oblíquo, 291
Pronomes reflexivos e recíprocos, 293
Emprego dos pronomes retos, 295
Funções dos pronomes retos, 295
XIII
XIV
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Omissão do pronome sujeito, 296
Presença do pronome sujeito, 296
Extensão de emprego dos pronomes retos, 297
Realce do pronome sujeito, 300
Precedência dos pronomes sujeitos, 301
Equívocos e incorreções, 301
Contração das preposições de e em com o pronome reto da 3.a pessoa, 303
Pronomes de tratamento, 303
Emprego dos pronomes de tratamento da 2.a pessoa, 305
Fórmulas de representação da 1.* pessoa, 310
Emprego dos pronomes oblíquos, 310
Formas tônicas, 310
Emprego enfático do pronome oblíquo tônico, 312
Pronomes precedidos de preposição, 312
Formas átonas, 314
O pronome oblíquo átono sujeito de um infinitivo, 316
Emprego enfático do pronome oblíquo átono, 316
O pronome de interesse, 317
Pronome átono com valor possessivo, 317
Pronomes complementos de verbos de regência distinta, 318
Valores e empregos do pronome se, 319
Combinações e contrações dos pronomes átonos, 322
Colocação dos pronomes átonos, 323
Pronomes possessivos, 332
Pronomes pessoais, possessivos e demonstrativos, 332
Formas dos pronomes possessivos, 333
Valores e empregos dos possessivos, 333
Concordância do pronome possessivo, 333
Posição do pronome adjetivo possessivo, 334
Emprego ambíguo do possessivo de 3.“ pessoa, 335
Reforço dos possessivos, 336
Valores dos possessivos, 337
Valores afetivos, 338
Nosso de modéstia e de majestade, 340
Vosso de cerimônia, 340
Substantivação dos possessivos, 341
Emprego do possessivo pelo pronome oblíquo tônico, 341
Pronomes demonstrativos, 342
Formas dos pronomes demonstrativos, 343
Valores gerais, 343
Diversidade de emprego, 345
Empregos particulares, 346
Posição do pronome adjetivo demonstrativo, 347
Alusão a termos precedentes, 348
Reforço dos demonstrativos, 350
Valores afetivos, 350
O(s), a(s) como demonstrativos, 354
SUM ÁRIO
Substitutos dos pronomes demonstrativos, 355
Pronomes relativos, 356
Formas dos pronomes relativos, 356
Natureza do antecedente, 357
Função sintática dos pronomes relativos, 355
Pronomes relativos sem antecedente, 360
Valores e empregos dos relativos, 360
Que, 360
Qual, o qual, 361
Quem, 364
Cujo, 364
Quanto, 365
Onde, 365
Pronomes interrogativos, 366
Flexão dos interrogativos, 367
Valor e emprego dos interrogativos, 367
Que, 367
Quem, 368
Qual, 369
Quanto, 369
Emprego exclamativo dos interrogativos, 370
Pronomes indefinidos, 370
Formas dos pronomes indefinidos, 371
Locuções pronominais indefinidas, 371
Pronomes indefinidos substantivos e adjetivos, 371
Oposições sistemáticas entre os indefinidos, 373
Valores de alguns indefinidos, 374
Algum e nenhum, 374
Cada, 375
Certo, 376
Nada, 377
Outro, 378
Qualquer, 379
Todo, 380
Tudo, 381
Capítulo 12- NUMERAIS , 383
Espécies de numerais, 383
Numerais coletivos, 384
Flexão dos numerais, 384
Cardinais, 384
Ordinais, 385
Multiplicativos, 3S5
Fracionários, 385
Numerais coletivos, 386
Valores e empregos dos cardinais, 3S6
XV
XVI
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Cardinal como indefinido, 387
Emprego da conjunção e com os cardinais, 387
Valores e empregos dos ordinais, 387
Emprego dos cardinais pelos ordinais, 388
Emprego dos multiplicativos, 389
Emprego dos fracionários, 389
Quadro dos numerais, 390
Numerais cardinais e ordinais, 390
Numerais multiplicativos e fracionários, 391
Capítulo 13-VERBO , 391
Noções preliminares, 391
Flexões do verbo, 394
Números, 394
Pessoas, 394
Modos, 394
Tempos, 395
Aspectos, 396
Vozes, 398
Formas rizotônicas e arrizotônicas, 400
Classificação do verbo, 400
Conjugações, 401
Tempos simples, 402
Estrutura do verbo, 403
Formação dos tempos simples, 403
Verbos auxiliares e o seu emprego, 408
Distinção importante, 410
Conjugação dos verbos ter, haver., ser e estar, 413
Modo indicativo, 413
Modo subjuntivo, 414
Modo imperativo, 415
Formas nominais, 415
Formação dos tempos compostos, 416
Modo indicativo, 416
Modo subjuntivo, 417
Formas nominais, 418
Conjugação dos verbos regulares, 419
Conjugação da voz passiva, 419
Modo indicativo, 419
Modo subjuntivo, 420
Formas nominais, 421
Voz reflexiva, 421
Verbo reflexivo e verbo pronominal, 422
Conjugação de um verbo reflexivo, 422
Modo indicativo, 422
SUM ÁRIO
Modo subjuntivo, 424
Modo imperativo, 426
Formas nominais, 426
Conjugação dos verbos irregulares, 427
Irregularidade verbal, 427
Irregularidade verbal e discordância gráfica, 428
Verbos com alternância vocálica, 429
Outros tipos de irregularidade, 436
Verbos de particípio irregular, 455
Verbos abundantes, 456
Verbos impessoais, unipessoais e defectivos, 457
Sintaxe dos modos e dos tempos, 462
Modo indicativo, 462
Emprego dos tempos do indicativo, 462
Modo subjuntivo, 479
Indicativo e subjuntivo, 479
Emprego do subjuntivo, 480
Subjuntivo independente, 480
Subjuntivo subordinado, 482
Substitutos do subjuntivo, 486
Tempos do subjuntivo, 487
Modo imperativo, 490
Formas do imperativo, 490
Emprego do modo imperativo, 491
Substitutos do imperativo, 493
Reforço ou atenuação da ordem, 495
Emprego das formas nominais, 496
Características gerais, 496
Emprego do infinitivo, 498
Emprego do gerúndio, 504
Emprego do particípio, 508
Concordância verbal, 510
Regras gerais, 511
Com um só sujeito, 511
Com mais de um sujeito, 511
Casos particulares, 513
Com um só sujeito, 513
Com mais de um sujeito, 523
Regência verbal, 530
Regência, 530
Regência verbal, 531
Diversidade e igualdade de regência, 531
Regência de alguns verbos, 533
Sintaxe do verbo haver, 551
Capítulo 14 - ADVÉRBIO,555
Classificação dos advérbios, 556
Advérbios interrogativos, 557
XVII
XVIII
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Advérbio relativo, 558
Locução adverbial, 558
Colocação dos advérbios, 559
Repetição de advérbios em -m ente, 561
Gradação dos advérbios, 562
Grau comparativo, 562
Grau superlativo, 562
Outras formas de comparativo e superlativo, 563
Repetição do advérbio, 565
Diminutivo com valor superlativo, 565
Advérbios que não se flexionam em grau, 565
Palavras denotativas, 566
Capítulo 15 - PREPOSIÇÃO, 569
Função das preposições, 569
Forma das preposições, 569
Preposições simples, 596
Locuções prepositivas, 570
Significação das preposições, 570
Conteúdo significativo e função relacional, 572
Relações fixas, 574
Relações necessárias, 574
Relações livres, 575
Valores das preposições, 576
A, 576
Ante, 578
Após, 579
Até, 579
Com, 580
Contra, 581
De, 582
Desde, 583
Em, 584
Entre, 585
Para, 587
Perante, 588
Por (per), 588
Sem, 590
Sob, 590
Sobre, 591
Trás, 592
Capítulo 16 - CONJ U NÇÃO, 593
Conjunção coordenativa e subordinativa, 593
Conjunções coordenativas, 594
SUM ÁRIO
Posição das conjunções coordenativas, 595
Valores particulares, 596
Conjunções subordinativas, 600
Conjunções conformativas e proporcionais, 603
Polissemia conjuncional, 604
Locução conjuntiva, 604
Capítulo 1 7 - INTERJEIÇÃO,605
Classificação das interjeições, 605
Locução interjectiva, 605
Capítulo 18 - O PERÍODO E SUA CONSTRUÇÃO,607
Período simples e período composto, 607
Composição do período, 607
Características da oração principal, 609
Conclusão, 610
Coordenação, 610
Orações coordenadas sindéticas e assindéticas, 610
Orações coordenadas sindéticas, 610
Subordinação, 612
A oração subordinada como termo de outra oração, 612
Classificação das orações subordinadas, 614
Orações subordinadas substantivas, 614
Orações subordinadas adjetivas, 615
Orações subordinadas adverbiais, 618
Orações reduzidas, 623
Capítulo 1 9 - FIGURAS DE SINTAXE,633
Elipse, 633
A elipse como processo gramatical, 634
A elipse como processo estilístico, 636
Zeugma, 638
Pleonasmo, 639
Pleonasmo vicioso, 639
Pleonasmo e epíteto de natureza, 639
Objeto pleonástico, 640
Hipérbato, 641
Anástrofe, 641
Prolepse, 642
Sínquise, 642
Assíndeto, 642
Polissíndeto, 643
Anacoluto, 644
XIX
XX
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Silepse, 645
Silepse de número, 645
Silepse de gênero, 646
Silepse de pessoa, 647
Capítulo20-DISCURSO DIRETO, DISCURSO INDIRETO
E DISCURSO INDIRETO LIVRE, 649
Estruturas de reprodução de enunciações, 649
Discurso direto, 649
Características do discurso direto, 650
Discurso indireto, 651
Características do discurso indireto, 652
Transposição do discurso direto para o indireto, 653
Discurso indireto livre, 655
Características do discurso indireto livre, 656
Capítulo 21 - PONTUAÇÃO, 657
Sinais pausais e sinais melódicos, 657
Sinais que marcam sobretudo a pausa, 658
A vírgula, 658
O ponto, 664
O ponto e virgula, 666
Valor melódico dos sinais pausais, 668
Sinais que marcam sobretudo a melodia, 669
Os dois pontos, 669
O ponto de interrogação, 670
O ponto de exclamação, 671
As reticências, 673
As aspas, 676
Os parênteses, 679
Os colchetes, 681
O travessão, 682
Capítulo 22 - NOÇÕES DE VERSIFICAÇÃO, 685
Estrutura do verso, 685
Ritmo e verso, 685
Os limites do verso, 686
As ligações rítmicas, 687
Sinalefa, elisão e crase, 687
Ectlipse, 688
O
hiato intervocabular, 689
A medida das palavras, 690
Sinérese, 690
Diérese, 691
Crase, aférese, síncope e apócope, 692
A cesura e a pausa final, 693
Cavalgamento (enjambement), 694
O cavalgamento e a pausa final, 681
SUM ÁRIO
Tipos de verso, 696
Os versos tradicionais, 696
Monossílabos, 696
Dissílabos, 697
Trissílabos, 697
Tetrassílabos, 698
Pentassílabos, 698
Hexassílabos, 699
Heptassílabos, 700
Octossílabos, 701
Eneassilabos, 702
Decassílabos, 703
Hendecassílabos, 705
Dodecassílabos, 706
Isossilabismo e versificação flutuante, 708
O verso livre, 709
A rima, 711
A rima e o acento, 711
Rima perfeita e rima imperfeita, 712
Rima pobre e rima rica, 714
Combinações de rimas, 715
Rima interior, 716
Indicação esquemática das rimas, 717
Versos sem rima, 717
Estrofação, 719
O dístico, 719
O terceto, 720
A quadra, 720
A quintilha, 720
A sextilha, 721
A estrofe de sete versos, 722
A oitava, 723
A estrofe de nove versos, 725
A décima, 725
Estrofe simples e composta, 727
Estrofe livre, 727
Poemas de forma fixa, 727
O soneto, 727
ELENCO E DESENVOLVIMENTO DAS ABREVIATURAS USADAS, 731
ÍNDICE ONOMÁSTICO, 745
ÍNDICE DE ASSUNTOS, 753
XXI
Prefácio
Esta gramática foi idealizada há muito tempo, quando, unida a forte amizade,
já nos ligava uma convergência de formação, interesses e objetivos. Sentíamo-la
como uma urgente necessidade para o ensino da língua portuguesa não só em
Portugal, no Brasil e nas nações lusófonas da África, mas em todos os países em que
se estuda o nosso idioma.
Parecia-nos faltar uma descrição do português contemporâneo que levasse
em conta, simultaneamente, as diversas normas vigentes dentro do seu vasto
domínio geográfico (principalmente as admitidas como padrão em Portugal e
no Brasil) e servisse, assim, fosse de fonte de informação, tanto quanto possível
completa e atualizada, sobre elas, fosse de guia orientador de uma expressão
oral e, sobretudo, escrita que, para o presente momento da evolução da língua,
se pudesse considerar “correta”, de acordo com o conceito de “correção” que
adotamos no capítulo 1.
De então para cá várias descrições importantes do português se foram
publicando, entre as quais é justo destacar a Estrutura da língua portuguesa,
de Joaquim Matoso Câmara Júnior (1969); a Gramática simbólica do portu
guês, de Óscar Lopes (1971); a Gramática portuguesa, de Pilar Vázquez Cuesta
e Maria Albertina Mendes da Luz, mormente a partir da 3.a edição refundida
(1971), sobre a qual se fez a tradução portuguesa (1980); e a Gramática da
língua portuguesa, de Maria Helena Mira Mateus, Ana Maria Brito, Inês Silva
Duarte e Isabel Hub Faria (1983). Nenhuma no entanto, e por diversas ra
zões, correspondia ao nosso objetivo inicial. A de Pilar Vázquez Cuesta e
Maria Albertina Mendes da Luz, apesar do seu rigor e qualidade, considera
va as características do português do ponto de vista de um falante da língua
espanhola, com todos os inconvenientes (e também as vantagens) que isso
implica. A de Matoso Câmara Júnior baseava-se no padrão do português do
XXIV
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Brasil1; as outras duas levavam em conta fundamentalmente a norma de Portu
gal e tinham como objetivo, não propriamente o ensino da língua portuguesa,
mas análises e reflexões, do maior interesse, sobre a sua estrutura e funciona
mento interno, expostas numa linguagem técnica de difícil acesso para os não
iniciados.
Digno também de particular menção pelo seu alto nível é o Manuel de la
langue portugaise (Portugal — Brésil)2, de Paul Teyssier, obra em que pela pri
meira vez se apresentam sistematicamente em confronto as normas europeia e
americana do português.
Por outro lado, um de nós, Celso Cunha, elaborou e publicou em sucessivas
edições a sua Gramática do português contemporâneo (l.a ed., 1970 — 10.a ed.,
1983) e a sua Gramática da língua portuguesa (l.a ed., 1972 — 10.a ed., 1983),
que, embora amplamente baseadas, quanto à linguagem escrita, tanto em auto
res portugueses como brasileiros, tinham principalmente em conta a variedade
americana e ainda não correspondiam, portanto, ao projeto primitivo.
Foi esse projeto que há pouco mais de três anos resolvemos retomar, e o
resultado do esforço conjunto é a obra que agora apresentamos ao público.
As características gerais desta Nova gramática do português contemporâneo
são fáceis de definir.
Trata-se de uma tentativa de descrição do português atual na sua forma
culta, isto é, da língua como a têm utilizado os escritores portugueses, brasi
leiros e africanos do Romantismo para cá, dando naturalmente uma situação
privilegiada aos autores dos nossos dias. Não descuramos, porém, dos fatos da
linguagem coloquial, especialmente ao analisarmos os empregos e os valores
afetivos das formas idiomáticas.
Não desejamos discorrer sobre o plano da obra, mas não podemos deixar
de fazer uma breve referência a alguns aspectos metodológicos.
Como esta gramática pretende mostrar a superior unidade da língua por
tuguesa dentro da sua natural diversidade, particularmente do ponto de vista
diatópico, uma acurada atenção se deu às diferenças no uso entre as modali
dades nacionais e regionais do idioma, sobretudo às que se observam entre a
variedade nacional europeia e a americana.
No estudo da fonética e da fonologia, procurou-se estabelecer, sempre que
possível, a equivalência entre os conceitos e a terminologia tradicionais e os da
fonética acústica e da fonologia moderna; no estudo das classes de palavras,
1 Duas gramáticas de inegáveis méritos e de larga difusão no Brasil - a Gramática da língua
portuguesa, de Rocha Lima (23.aed., 1983), e a Moderna gramática portuguesa, de Evanildo
Bechara (27.“ ed., 1982) - são bem anteriores ao nosso projeto.
2 Paris, Klincksieck, 1976.
PREFÁCIO
examinou-se a palavra em sua forma e, a seguir, em sua função, de acordo com
os princípios da morfossintaxe.
Notar-se-á, por outro lado, uma permanente preocupação de salientar e
valorizar os meios expressivos do idioma, o que torna este livro não apenas
uma gramática, mas, de certo modo, uma introdução à estilística do português
contemporâneo.
Embora, a rigor, o estudo da versificação não faça parte de uma descrição
gramatical, incluiu-se um capítulo final sobre o enunciado em verso, comple
mentar, a nosso ver, do estudo da entoação da prosa, a que se deu atenção no
capítulo 7.
Toda a obra foi objeto de exame conjunto e de troca de sugestões entre os seus
autores. Cumpre-nos, no entanto, dizer, para resguardar as responsabilidades
de autoria, que a Lindley Cintra se deve a redação do capítulo 2, da maior parte
do capítulo 3 e do tratamento contrastivo do capítulo 13. A Celso Cunha cabe
a redação dos demais capítulos, bem como a exemplificação aduzida.
Queremos, por fim, expressar a nossa gratidão a todos os que contribuíram
para que esta obra saísse com menos imperfeições, em particular os nossos co
legas Joram Pinto de Lima, Maria do Carmo P. Machado, Edila Viana da Silva,
Sílvia Figueiredo Brandão e Cilene da Cunha Pereira.
Um agradecimento especial endereçamos a Cinira, permanente animadora
da obra, pelo penoso trabalho de ajuda na revisão das provas tipográficas e
de confronto textual da versão brasileira com a portuguesa, assim como pela
elaboração do índice Onomástico; a Maurício Marchevsky, por algumas das
ilustrações; a Sérgio e Sebastião Lacerda, pela confiança e interesse demonstrados
desde o início na execução do projeto.
Rio de Janeiro, 28 de fevereiro de 1985.
C elso C u n h a
Luís F. Lindley C intra
XXV
Advertência
Esta edição da Nova Gramática do Português Contemporâneo vem acrescida
do capítulo “Do Latim ao Português”, de autoria de Celso Cunha, publicado
originalmente sob o título “Noções históricas”, na Gramática da Língua Portu
guesa, editada pela Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), do Ministério
da Educação, na década de 1970.
Ao incorporar ao estudo da gramática o relato do processo de formação e
difusão do nosso idioma, espera-se propiciar, além da compreensão da estrutura,
da funcionalidade e do uso, a percepção de seu papel no contexto linguístico
universal e de como o processo histórico influenciou seus aspectos internos.
Num mundo cada vez mais partilhado e em interação, a visão histórica da
Língua Portuguesa - hoje a língua oficial de cerca de 200 milhões de pessoas
em oito países - é fundamental para compreender sua atual importância geopolítica, social e cultural.
A presente edição está atualizada segundo as mudanças na ortografia
implementadas pelo Acordo Ortográfico de 1990, em vigor no Brasil a partir
de janeiro de 2009.
Rio de Janeiro, dezembro de 2008
Cilene da Cunha Pereira
Nota do Editor
O
Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 é um tratado inter
nacional cujo objetivo é unificar a ortografia do português, para uso de todos
os países que têm o português como língua oficial. O acordo foi assinado por
representantes de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique,
Portugal e São Tomé e Príncipe em Lisboa, em 16 de Dezembro de 1990, ao
fim de uma negociação iniciada em 1980 entre a Academia de Ciências de
Lisboa e a Academia Brasileira de Letras. Depois de obter a sua independência,
Timor-Leste aderiu ao Acordo em 2004. O acordo teve ainda a presença de
uma delegação de observadores da Galícia.
O Acordo Ortográfico de 1990 institui uma ortografia oficial única da
língua portuguesa e com isso interrompe a existência de duas normas or
tográficas oficiais diferentes: uma no Brasil e outra nos restantes países de
língua portuguesa. Os proponentes do Acordo dão como exemplo motivador
a língua espanhola (o castelhano), que apresenta grande variação, quer na
pronúncia quer no vocabulário, entre a Espanha e a América hispânica, mas
sujeita a uma só forma de escrita, regulada pela Associação de Academias da
Língua Espanhola.
A adoção da nova ortografia, de acordo com os dados da Nota Explica
tiva do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (que se baseiam
exclusivamente numa lista de 110.000 palavras da Academia das Ciências de
Lisboa), irá acarretar alterações na grafia de cerca de 1,6% do total de palavras
na norm a euro-afro-asiático-oceânica (em Portugal, PALOP, Timor-Leste e
Região Administrativa Especial de Macau) e de cerca de 0,5% na brasileira.
XXX
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A NOVA ORTOGRAFIA
GUIA RÁPIDO E SIMPLIFICADO
Este é um resumo, em linguagem e organização simples, das disposições do
Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, aprovado pelos oito países lusófonos
(que falam o português como sua língua nacional) em 16 de dezembro de 1990.
O texto completo do Acordo está disponível no site www.filologia.org.br/acordo_ortografico.pdf. Este resumo trata apenas das mudanças inequívocas, e
refere-se somente àquelas que dizem respeito à ortografia adotada no Brasil
(em parte, serão outras as mudanças em relação à ortografia até então adotada
em Portugal e outros países lusófonos).
AS MUDANÇAS
ALFABETO
Ao alfabeto da língua portuguesa acrescem-se as letras K , W e Y , e ele passa
a ter 26 letras*:
A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V W X Y Z
USO DE VOGAIS ÁTONAS E E /
Em palavras com sufixos -ano e -ense que se combinam com um i que per
tence ao tema (havaiano [de Havaí], italiano [de Itália], etc.) ou derivadas de
palavras que têm na última sílaba um e átono (Acre, Açores), escreve-se antes
da sílaba tônica -iano e não -eano: acriano, açoriano, sofocliano, torriense. Mas
escreve-se -eano se a última sílaba da palavra de origem tiver e tônico: daomeano,
guineano ou guineense, etc.
MUDANÇAS NA ACENTUAÇÃO E NO USO DO TREMA
Os ditongos abertos tônicos éi e ói perdem o acento agudo quando caem na
penúltima sílaba (portanto, de palavras paroxítonas):
* Na prática, essas letras já se usavam como símbolos de medidas (km, kg, W) e em pala
vras estrangeiras e suas derivadas em português: know-how, Kant, kantiano, yin-yang,
walkman.
A C O R D O O R T O G R Á F I C O D E 1990
idéia(s)
jóia(s)
geléia(s)
tramóia (s)
epopéia (s)
apóia
diarréico(s)
heróico(s)
hebréia(s)
debilóide(s)
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
ideia(s)
joia(s)
geleia(s)
tramoia(s)
epopeia(s)
apoia
diarreico(s)
heroico (s)
hebreia(s)
debiloide(s)
♦ Cuidado: o acento não cai se incide nesses ditongos em sílabas tônicas de
palavras oxítonas (com acento tônico na última sílaba) ou proparoxítonas (com
acento tônico na antepenúltima sílaba):
anéis
continua
anéis
continua
herói(s)
herói(s)
fiéis
continua
fiéis
anzóis
continua
anzóis
axóideo(s)
continua
axóideo(s)
Cai o acento circunflexo de palavras paroxítonas terminadas em ôo
êem:
vôo
dêem
enjôo
vêem
acôo
crêem
abençôo
lêem
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
voo
deem
enjoo
veem
acoo
creem
abençoo
leem
♦ Cuidado: As flexões dos verbos ter e vir na 3a pess. pl. do pres. do indic. man
têm o acento: têm-, vêm, diferençando das flexões de 3a pess. sing. tem, vem, bem
como os derivados desses verbos, como mantém e mantêm, provém e provêm,
retêm e retêm, convém e convêm, etc.
Não se usa acento gráfico (agudo ou circunflexo) em palavras paroxítonas
para diferençá-las de outras palavras delas homógrafas (com a mesma grafia).
São estas as palavras afetadas:
XXXI
XXXII
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
pára (flexão de parar)
e para (preposição)
passam a ser
péla(s) (subst. fem.),
pelas (flexão de pelar) e
pela(s) contração por + a(s) passam a ser
pélo (fexão de pelar),
pêlo (subst. masc.) e
pelo (contração por + o)
passam a ser
péra(s) (subst, fem.= pedra),
pêra(s) (subst. fem.) e
pera (prep. = para)
passam a ser
pólo(s) (subst. masc.) e
polo(s) (comb. de por + lo(s) passam a ser
para
pela(s)
pelo(s)
pera(s)
polo(s)
♦ Lembre-se: o v.pôr (infinitivo) e pôde (flexão na 3a pes. sing. pret. perf. do
v. poder) mantêm o acento, diferençando respectivamente da preposição por e
da flexão de 3a pess. sing. do pres. indic. pode.
É facultativo usar ou não circunflexo em fôrma (com o fechado) para diferençar
deforma (com o aberto).
Perdem o acento agudo as vogais tônicas i e u de palavras paroxítonas, quando
antecedidas de ditongo:
boiúno
feiura
baiúca
alauíta
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
boiuno
feiura
baiuca
alauita
♦ Cuidado: mantém-se o acento quando a palavra é proparoxítona (feiíssimo,
bauínia) ou oxítona ( tuiuiú, teiú, teiús).
Nos verbos arguir e redarguir deixa-se de usar o acento agudo no u tônico
nas flexões rizotônicas (ou seja, nas quais o acento tônico cai em sílaba do radi
cal), no caso argu e redargu:
arguo
redargúo
argúis
redargúis
argúi
redargúi
argúem
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
arguo
redarguo
arguis
redarguis
argui
redargui
argúem
A C O R D O O R T O G R Á F I C O D E 1990
redargúem
argúa
redargua
reargúas
reargúam
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
redargúem
argua
redargua
redarguas
redarguam
Nos verbos terminados em -guar, -quar, e -quir (aguar, apaziguar, enxaguar,
obliquar, delinquir, etc.), as flexões podem ser pronunciadas com acento tônico na
sílaba do u ou, como no Brasil, na sílaba anterior. No primeiro caso cai o acento
agudo do ií, no segundo, a vogal tônica da sílaba anterior recebe acento agudo:
agúo
averiguo
apropinqúo
delinqúo
passa a ser
aguo ou águo
passa a ser
averiguo ou averíguo
passa a ser apropinquo ou apropínquo
passa a ser
delinquo ou delínquo
O trema deixa de ser usado para assinalar a pronúncia do u* em sílabas como
güe, giii, qüe e qüi. Permanece em palavras estrangeiras e suas derivadas:
agüentar
sagüi
freqüência
tranqüilo
mülleriano
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
continua
aguentar
sagui
frequência
tranquilo
mülleriano
MUDANÇAS NO USO DO HÍFEN EM PALAVRAS COMPOSTAS
Usa-se o hífen em palavras compostas cujos elementos, de natureza nominal,
adjetival, numeral ou verbal compõem uma unidade sintagmática e de signifi
cado e mantêm cada um sua acentuação própria (o primeiro elemento pode
estar em forma reduzida):
ano-luz, arco-íris, decreto-lei, médico-ortopedista, segundo-tenente, guarda-noturno, mato-grossense, afro-brasileiro, quarta-feira, vermelho-claro,
primeira-dama, conta-gotas, marca-passo, tira-teima, bota-fora, etc.
♦ Atenção: o Acordo menciona explicitamente as exceções (em compostos
nos quais se perdeu em certa medida a noção de composição) que se grafam
aglutinadamente:
*mesmo sem o trema, o u continua a ser pronunciado
XXXIII
XXXIV
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista, etc.
♦ Comentário: a definição do conceito da exceção ('em certa medida’, ‘noção
de recomposição’) e o ‘etc.’ final tornam a aplicação desta regra um tanto vaga.
A nova edição do Vocabulário Ortográfico define as dúvidas porventura sub
sistentes. A posição da ABL, no processo de edição do V.O., portanto antes de
sua publicação, era de que o etc. deve ser desconsiderado valendo como exceção
apenas as explicitamente mencionadas (acima). Todas as outras, portanto,
manteriam o hífen: para-lama, para-brisa, lero-lero, marca-passo, tira-teima,
cata-vento, etc. Outra exceção (ABL): passatempo.
Já vigentes na prática, são agora definidos como regras:
a) Nos topônimos (nomes de lugares geográficos) usa-se hífen com os prefixos
Grão- e Grã-, em nomes cujo primeiro elemento é verbal e quando os ele
mentos estão ligados por artigos:
Grão-Pará, Grã-Bretanha, Passa-Quatro, Trás-os-Montes, Todos-os-Santos
b) Têm hífen palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas:
couve-flor, erva-doce, andorinha-do-mar, bem-te-vi, leão-marinho
Usa-se hífen (e não travessão) entre elementos que formam não uma palavra,
mas um encadeamento vocabular:
ponte Rio-Niterói, Alsácia-Lorena, Liberdade-Igualdade-Fraternidade
Não se usa hífen em locuções (alguns exemplos):
substantivas: café da manhã, fim de semana, cão de guarda
adjetivas: cor de açafrão, cor de vinho
pronominais: cada um, ele mesmo, quem quer que seja
adverbiais: à vontade, à parte, depois de amanhã
prepositivas: a fim de, acerca de, por meio de, a par de
conjuncionais: contanto que, no entanto, logo que
♦ Exceções consagradas pelo uso: água-de-colônia, arco-da-velha, cor-de-rosa,
mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa
♦ Comentário: Também é um tanto vaga a noção de ‘consagrada pelo uso’, o
que implica que só com a publicação do V.O. foram definidas todas as locuções
A C O R D O O R T O G R Á F I C O D E 1 990
em que se usa (ou não) hífen, como, p.ex., água que passarinho não bebe, arco
da aliança, água de cheiro, etc. Pressupõe-se que, na lógica de só serem válidas
as exceções explicitamente mencionadas no Acordo, todas perderam o hífen.
Mantêm os hifens locuções que formam nomes de plantas e animais.
MUDANÇAS NO USO DO HÍFEN EM PALAVRAS COMPOSTAS POR
PREFIXAÇÃO E RECOMPOSIÇÃO
Geralmente, a não ser nas exceções que serão estabelecidas na regras seguintes,
em palavras compostas com prefixos ou falsos prefixos (radicais gregos ou lati
nos que ganharam o significado das palavras das quais faziam parte, como aero,
radio, tele, etc.) usa-se hífen se o segundo elemento começa por h:
anti-histórico, super-homem, multi-horário, mini-habitação
♦ Atenção: quando se usam os prefixos des- e in- caem o he o hífen: desumano,
wabitável, desonra, inábil
Também com os prefixos co- e re- caem o h e o hífen: coerdar, coabitar, reabilitar,
reabitar
Passa a se usar hífen entre o prefixo e o segundo elemento quando o prefixo
termina na mesma vogal pela qual começa o segundo elemento:
antiinflacionário
teleeducação
neoortodoxia
passa a ser
passa a ser
passa a ser
anti-inflacionário
tele-educação
neo-ortodoxia
Obs .: nos prefixos terminados em a, já era o uso vigente, agora consolidado pela
regra: contra-almirante, extra-articular, ultra-alto.
♦ Exceção: o prefixo co- se aglutina com segundo elemento começado por o:
cooptar, coobrigação.
re- se aglutina com palavras começadas por e: reeleição, reestudar, reerguer.
Usa-se hífen com circum- e pan- quando seguidos de elemento que começa por
vogal, m e «, além do já citado /?:
circunavegaçao
circumediterrâneo
circumeridiano
passa a ser
passa a ser
passa a ser
circum-navegaçao
circ um-mediterrâneo
circum-meridiano
XXXV
XXXVI
N O V A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Obs.: já era uso vigente para pan- e alguns usos de circum-, agora ratificados
como regra, como por exemplo: pan-africano, circum-adjacente.
Quando o prefixo ou falso prefixo termina em consoante usa-se hífen quando
o segundo elemento começa com a mesma consoante, ou começa por r ou h.
Obs.: São casos desta regra, e também de regra específica do Acordo, o uso de
hífen com os prefixos hiper-, inter-, super, ciber- e nuper- quando o segundo
elemento começa por r ou h (hiper-requintado, inter-resistente, super-radical,
inter-hospitalar); não se usa hífen em outros casos nos quais o prefixo termina
em consoante e o segundo elemento começa por vogal ou consoante diferente
de h ou r. subsequência, sublinear, interativo, hiperativo, superabundante, hiperacidez, interlocução.
Quando o prefixo ou falso prefixo termina em vogal e o segundo elemento
começa por r ou s não se usa mais o hífen e a consoante r o u s é duplicada:
ultra-som
anti-semita
eco-sistema
mini-saia
maxi-resultado
contra-regra
co-seno
semi-reta
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
ultrassom
antissemita
ecossistema
minissaia
maxirresultado
contrarregra
cosseno
semirreta
Não se usa hífen quando o prefixo ou falso prefixo termina em vogal e
segundo elemento começa por vogal diferente ou consoante (se esta for r ou
como visto acima, se duplica):
auto-escola
extra-escolar
co-piloto
supra-estrutura
auto-imune
contra-ordem
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
passa a ser
autoescola
extraescolar
copiloto
supraestrutura
autoimune
contraordem
Obs.: Alguns desses usos (antiaéreo, plurianual, prefixo seguido de consoante,
etc.) já eram vigentes, outros não (exemplos acima), agora todos estão sub
metidos à regra.
A C O R D O O R T O G R Á F I C O D E 1990
Alguns casos que não mudam, mas convém lembrar:
Com os prefixos ou falsos prefixos ex-, sota-, soto-, vice-, vizo-, pré-, pró- e
pós- sempre se usa hífen.
Usa-se hífen antes dos sufixos de função adjetiva de origem tupi-guarani
-açu, -guaçu e -mirim, quando o primeiro elemento acaba em vogal tônicafcajá-mirim, cipó-guaçu) ou quando se necessita separar a pronúncia da vogal final
da do sufixo (anda-açu).
Usa-se hífen nas formas verbais com pronomes átonos (diga-me, vestir-se,
vingá-lo, dizer-lhes).
Se a quebra de linha ocorre onde há um hífen gramatical, recomenda-se
repetir o hífen no início da linha seguinte.
LOCUÇÕES
Como já foi apontado na página XXXIV, não se usa hífen em locuções de
qualquer tipo (nominais, adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas, conjuncionais), com as seguintes exceções: água-de-colônia, arco-da-velha, cor-derosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa.
Assim:
nominais:
água-de-coco,
café-da-manhã
passam a ser
água de coco,
café da manhã, etc.
adjetivas:
cor-de-abóbora,
cor-de-açafrão
passam a ser
cor de abóbora,
cor de açafrão, etc.
passam a ser
à vontade,
antes de ontem
pronominais:
nós mesmos, ela própria
adverbiais:
à-vontade,
antes-de-ontem
prepositivas:
por cima de, a fim de
conjuncionais
ao passo que, logo que
XXXVII
Introdução
Conceitos gerais
LINGUAGEM, LÍNGUA, DISCURSO, ESTILO
1. L in g u a g e m é “um conjunto complexo de processos — resultado de uma certa
atividade psíquica profundamente determinada pela vida social — que torna
possível a aquisição e o emprego concreto de uma l ín g u a qualquer”'. Usa-se
também o termo para designar todo sistema de sinais que serve de meio de
comunicação entre os indivíduos. Desde que se atribua valor convencional
a determinado sinal, existe uma l in g u a g e m . À linguística interessa parti
cularmente uma espécie de l in g u a g e m , ou seja, a l in g u a g e m f a l a d a ou
ARTICULADA.
2. L íngua é um sistema gramatical pertencente a um grupo de indivíduos.
Expressão da consciência de uma coletividade, a língua é o meio por que ela
concebe o mundo que a cerca e sobre ele age. Utilização social da faculdade
da linguagem, criação da sociedade, não pode ser imutável; ao contrário,
tem de viver em perpétua evolução, paralela à do organismo social que a
criou.
3. D iscurso é a língua no ato, na execução individual. E, como cada indivíduo
tem em si um ideal linguístico, procura ele extrair do sistema idiomáti
co de que se serve as formas de enunciado que melhor lhe exprimam o
gosto e o pensamento. Essa escolha entre os diversos meios de expressão
l Tatiana Slama-Casacu. Langage et contexte. Haia, Mouton, 1961, p. 20.
2
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
q u e lh e oferece o ric o re p e rtó rio de p o ssib ilid ad es, q u e é a lín g u a , d e n o m i
n a-se ESTILO.2
4. A distinção entre linguagem, língua e discurso, indispensável do ponto de
vista metodológico, não deixa de ser em parte artificial. Em verdade, as três
denominações aplicam-se a aspectos diferentes, mas não opostos, do fenô
meno extremamente complexo que é a comunicação humana.
A interdependência desses aspectos, salienta-a Tatiana Slama-Casacu, ao
escrever: “A língua é a criação, mas também o fundamento da linguagem
— que não poderia funcionar sem ela —; é, simultaneamente, o instrumento
e o resultado da atividade de comunicação. Por outro lado, a linguagem não
pode existir, manifestar-se e desenvolver-se a não ser pelo aprendizado e pela
utilização de uma língua qualquer. A mais frequente forma de manifestação da
linguagem — constituída de uma complexidade de processos, de mecanismos,
de meios expressivos — é a linguagem falada, concretizada no discurso, ou
seja, a realização verbal do processo de comunicação. O discurso é um dos
aspectos da linguagem — o mais importante — e, ao mesmo tempo (...), a
forma concreta sob a qual se manifesta a língua. O discurso define-se, pois,
como o ato de utilização individual e concreto da língua no quadro do processo
complexo da linguagem . O s três termos estudados — linguagem , língua ,
discurso — designam no fundo três aspectos, diferentes mas estritamente
ligados, do mesmo processo unitário e complexo.”3
LÍNGUA E SOCIEDADE:
VARIAÇÃO E CONSERVAÇÃO LINGUÍSTICA
Embora desde princípios deste século linguistas como Antoine Meillet e
Ferdinand de Saussure tenham chegado a configurar a língua como um fato
social, rigorosamente enquadrado na definição dada por Emile Durkheim4, só
nos últimos vinte anos, com o desenvolvimento da sociolinguística , as relações
entre a língua e a sociedade passaram a ser caracterizadas com maior precisão.
2 Aceitando a distinção de Jules Marouzeau, podemos dizer que a língua é “a soma dos
meios de expressão de que dispomos para formar o enunciado” e o estilo “o aspecto e a
qualidade que resultam da escolha entre esses meios de expressão” (Précis de stylistique
française, 2.a ed. Paris, Masson, 1946, p. 10).
3 Obra cit., p. 20.
A Vejam-se Antoine Meillet. Linguistique historique et linguistique générale, 2.a ed. Paris,
Champion, 1926, p. 16,230passim; Ferdinand de Saussure. Cours de linguistiquegénéraley
édition critique préparée par Ttillio de Mauro. Paris, Payot, 1973, p. 31.
CONCEITOS GERAIS
A sociolinguística, ramo da linguística que estuda a língua como fenômeno
social e cultural, veio mostrar que estas inter-relações são muito complexas e
podem assumir diferentes formas. Na maioria das vezes, comprova-se uma
covariação do fenômeno linguístico e social. Em alguns casos, no entanto, faz
mais sentido admitir uma relação direcional: a influência da sociedade na língua,
ou da língua na sociedade.
É, pois, recente a concepção de língua como instrumento de comunicação
social, maleável e diversificado em todos os seus aspectos, meio de expressão
de indivíduos que vivem em sociedades também diversificadas social, cultural e
geograficamente. Nesse sentido, uma língua histórica não é um sistema linguís
tico unitário, mas um conjunto de sistemas linguísticos, isto é, um diassistema,
no qual se inter-relacionam diversos sistemas e subsistemas. Daí o estudo de
uma língua revestir-se de extrema complexidade, não podendo prescindir de uma
delimitação precisa dos fatos analisados para controle das variáveis que atuam,
em todos os níveis, nos diversos eixos de diferenciação. A variação sistemática
está, hoje, incorporada à teoria e à descrição da língua.
Em princípio, uma língua apresenta, pelo menos, três tipos de diferenças
internas, que podem ser mais ou menos profundas:
Io) diferenças no espaço geográfico, ou variações diatópicas (falares locais, va
riantes regionais e, até, intercontinentais);
2o) d iferen ças e n tre as c a m a d a s so c io c u ltu ra is, o u variações diastráticas (nível
c u lto , lín g u a p a d rã o , nível p o p u la r, etc.);
3o) diferenças entre os tipos de modalidade expressiva, ou variações diafásicas5
(língua falada, língua escrita, língua literária, linguagens especiais, linguagem
dos homens, linguagem das mulheres, etc.).
A p a r tir d a n o v a co n cep ção d a lín g u a c o m o
diassistema, to m
o u - s e possível o
escla re c im e n to d e n u m e ro so s casos d e p o lim o rfism o , d e p lu ra lid a d e de n o rm a s
e d e to d a a in ter-re la ç ã o d o s fato res geográficos, h istó ric o s, sociais e p sicológicos
q u e a tu a m n o co m p le x o o p e ra r d e u m a lín g u a e o rie n ta m a su a deriva.
Condicionada de forma consistente dentro de cada grupo social e parte
integrante da competência linguística dos seus membros, a variação é, pois,
inerente ao sistema da língua e ocorre em todos os níveis: fonético, fonológico,
morfológico, sintático, etc. E essa multiplicidade de realizações do sistema em
nada prejudica as suas condições funcionais.
Veja-se Eugenio Coseriu. Structure lexicale et enseignement du vocabulaire. In Actes du
premier Colloque International de Linguistique Appliquée. Nancy, Université de Nancy,
1966, p. 199.
3
4
NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Todas as variedades linguísticas são estruturadas, e correspondem a sis
temas e subsistemas adequados às necessidades de seus usuários. Mas o fato
de estar a língua fortemente ligada à estrutura social e aos sistemas de valores
da sociedade conduz a uma avaliação distinta das características das suas
diversas modalidades diatópicas, diastráticas e diafásicas. A língua padrão,
por exemplo, embora seja uma entre as muitas variedades de um idioma, é
sempre a mais prestigiosa, porque atua como modelo, como norma, como
ideal linguístico de uma comunidade. Do valor normativo decorre a sua fun
ção coercitiva sobre as outras variedades, com o que se torna uma ponderável
força contrária à variação.
Numa língua existe, pois, ao lado da força centrífuga da inovação, a força
centrípeta da conservação, que, contrarregrando a primeira, garante a superior
unidade de um idioma como o português, falado por povos que se distribuem
pelos cinco continentes.
DIVERSIDADE GEOGRÁFICA DA LÍNGUA:
DIALETO E FALAR
As formas características que uma língua assume regionalmente denominam-se dialetos.
Alguns linguistas, porém, distinguem, entre as variedades diatópicas, o falar
DO DIALETO.
D ialeto seria “um sistema de sinais desgarrado de uma língua comum, viva
ou desaparecida; normalmente, com uma concreta delimitação geográfica, mas
sem uma forte diferenciação diante dos outros da mesma origem”. De modo
secundário, poder-se-iam também chamar dialetos “as estruturas linguísticas,
simultâneas de outra, que não alcançam a categoria de língua”6.
F alar seria a peculiaridade expressiva própria de uma região e que não apre
senta o grau de coerência alcançado pelo dialeto. Caracterizar-se-ia, do ponto
de vista diacrônico, segundo Manuel Alvar, por ser um dialeto empobrecido,
que, tendo abandonado a língua escrita, convive apenas com as manifestações
orais. Poder-se-iam ainda distinguir, dentro dos falares regionais, os falares
locais, que, para o mesmo linguista, corresponderiam a subsistemas idiomáticos
“de traços pouco diferenciados, mas com matizes próprios dentro da estrutura
regional a que pertencem e cujos usos estão limitados a pequenas circunscrições
geográficas, normalmente com caráter administrativo”7.
6 Manuel Alvar. Hacia los conceptos de lengua, dialecto y hablas. Nueva Revista de Filologia
Hispânica, 15:57,1961.
7 Id., ibid., p. 60.
CONCEITOS GERAIS
No entanto, à vista da dificuldade de caracterizar na prática as duas modali
dades diatópicas, empregaremos neste livro — e particularmente no capítulo
seguinte — o termo d i a l e t o no sentido de variedade regional da língua, não
importando o seu maior ou menor distanciamento com referência à língua
padrão.
A NOÇÃO DE CORRETO
Uma gramática que pretenda registrar e analisar os fatos da língua culta
deve fundar-se num claro conceito de norma e de correção idiomática. Permitimo-nos, por isso, uma ligeira digressão a respeito deste controvertido tema.
Os progressos dos estudos linguísticos vieram mostrar a falsidade dos pos
tulados em que a gramática logicista e a latinizante esteavam a correção idio
mática e, com isso, deixaram o preceptismo gramatical inerme diante da reação
anticorretista que se iniciou no século passado e que vem assumindo, em nossos
dias, atitudes violentas, não raro contaminadas de radicalismo ideológico.8
Por outro lado, à ideia, sempre renovada, de que o povo tem o poder criador
e a soberania em matéria de linguagem associa-se, naturalmente, outra — a de
considerar elemento perturbador ou estéril a interferência da força conservadora
ou repressiva dos setores cultos.
Contra essa concepção demolidora do edifício gramatical, pacientemente
construído desde a época alexandrina com base na analogia, levantam-se al
guns linguistas modernos, procurando fundamentar a correção idiomática em
fatores mais objetivos.
Dessa nova linha de preocupações foi precursor Adolf Noreen, o linguista
sueco a cujas ideias geniais hoje se começa a fazer justiça.9
Para Noreen há três critérios principais de correção, por ele denominados
histórico-literário, histórico-natural e racional, o último, obviamente, o seu
preferido.
De acordo com o critério histórico-literário, “a correção estriba-se essencial
mente em conformar-se com o uso encontrado nos escritores de uma época
8 Veja-se, a propósito, Angel Rosenblat. El critério de corrección lingiiística: unidad y pluralidad
de normas en el espanol de Espana y América. Separata de P.I.L.E.I. El Simposio de Indiana.
Bogotá, Instituto Caro y Cuervo, 1967, p. 27. Consulte-se também Celso Cunha. Língua
portuguesa e realidade brasileira, 8.a ed. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1981, p. 35-39,
texto em parte aqui reproduzido.
Leiam-se Björn Collinder, Les origines du structuralisme, Stockholm - Göteborg - Up
sala, Almqvist 8t Wiksell, 1962, p. 6 e ss.; Bertil Malmberg. Les nouvelles tendances de la
linguistique, trad. por Jacques Gengoux. Paris, P.U.F., 1966, p. 42, 52-55, 130, 184-186,
197, 279.
5
6
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
pretérita”, em geral escolhida arbitrariamente. É o critério tradicional de correção,
fundado no exemplo dos clássicos,
O segundo critério, o histórico-natural de Noreen e que Jespersen prefere
chamar anárquico, baseia-se na doutrina, a que nos referimos, de que a linguagem
é um organismo que se desenvolve muito melhor em estado de completa liber
dade, sem entraves. Dentro desse ponto de vista não pode haver, em princípio,
nada correto ou incorreto na língua.
Depois de deixar patente o caráter arbitrário do primeiro critério e o absurdo
do segundo, se levado a suas naturais consequências, Noreen tenta justificar o
único que resta, o dele Noreen, expresso na fórmula: “o melhor é o que pode
ser apreendido mais exata e rapidamente pela audiência presente e pode ser
produzido mais facilmente por aquele que fala”; ou no enunciado mais sintéti
co de Flodstrõm: “o melhor é a forma de falar que reúne a maior simplicidade
possível com a necessária inteligibilidade.”10
Jespersen considera a fórmula de Noreen oportunista, individualista, atomística, “pois que divide demasiado a comunidade linguística em indivíduos
particulares e olvida excessivamente o conjunto”11.
Em nome de que princípio se corrige, então, o falar de uma pessoa? Por que
uma criança aprende de seus pais que não deve dizer sube por soube, fazerei por
farei e, à medida que vai crescendo em anos, continua a ter o seu comportamento
linguístico ora corrigido por outros, ora por esforço próprio?
Para Jespersen nenhum dos critérios anteriormente lembrados — e enumera
sete: o da autoridade, o geográfico, o literário, o aristocrático, o democrático,
o lógico e o estético — o explica. É evidente, no entanto, que existe algo que
justifica a correção, “algo comum para o que fala e para o que ouve”, e que lhes
facilita a compreensão. Este elemento comum é “a norma linguística que ambos
aceitaram de fora, da comunidade, da sociedade, da nação”12.
Todo o nosso comportamento social está regulado por normas a que deve
mos obedecer, se quisermos ser corretos. O mesmo sucede com a linguagem,
apenas com a diferença de que as suas normas, de um modo geral, são mais
complexas e mais coercitivas. Por isso, e para simplificar as coisas, Jespersen
define o “linguisticamente correto” como aquilo que é exigido pela comunidade
linguística a que se pertence. O que difere é o “linguisticamente incorreto”. Ou,
com suas palavras: “falar correto significa o falar que a comunidade espera, e
eno em linguagem equivale a desvios desta norma, sem relação alguma com o
Citados por Otto Jespersen. Humanidad, nación, individuo, desde el punto de vista lingüístico, trad. por Fernando Vela. Buenos Aires, Revista de Occidente, 1947,p. 113 e 114.
11 Obra cit., p. 120.
13 Ibid., p. 120 e ss.
CONCEITOS GERAIS
valor interno das palavras ou formas.” Reconhece, porém, que, independente
mente disso, “existe uma valorização da linguagem na qual o seu valor se mede
com referência a um ideal linguístico”, para cuja formação colabora eficazmente
a “fórmula energética de que o mais facilmente enunciado é o que se recebe
mais facilmente”13.
Entre as atitudes extremadas — dos que advogam o rompimento radical
com as tradições clássicas da língua e dos que aspiram a sujeitar-se a velhas
normas gramaticais — , há sempre lugar para uma posição moderada, termo
médio que represente o aproveitamento harmônico da energia dessas forças
contrárias e que, a nosso ver, melhor consubstancia os ideais de uma sã e eficaz
política educacional e cultural dos países de língua portuguesa.
“Na linguagem é importante o polo da variedade, que corresponde à expres
são individual, mas também o é ò da unidade, que corresponde à comunicação
interindividual e é garantia de intercompreensão. A linguagem expressa o
indivíduo por seu caráter de criação, mas expressa também o ambiente social
e nacional, por seu caráter de repetição, de aceitação de uma norma, que é ao
mesmo tempo histórica e sincrônica: existe o falar porque existem indivíduos
que pensam e sentem, e existem ‘línguas’ como entidades históricas e como
sistemas e normas ideais, porque a linguagem não é só expressão, finalidade
em si mesma, senão também comunicação, finalidade instrumental, expressão
para outro, cultura objetivada historicamente e que transcende ao indivíduo.”14
A hipótese da “linguagem monolítica” não se assenta numa realidade, e a
sua corporificação nas gramáticas não tem sido benéfica ao ensino dos diversos
idiomas. “Sem nenhuma dúvida”, escreve Roman Jakobson, “para qualquer co
munidade linguística, para todo indivíduo falante existe uma unidade de língua,
mas esse código global representa um sistema de subcódigos em comunicação
recíproca; cada língua abarca vários sistemas simultâneos, cada um dos quais
se caracteriza por uma função diferente”.15
Se uma língua pode abarcar vários sistemas, ou seja, as formas ideais de sua
realização, a sua dinamicidade, o seu modo de fazer-se, pode também admitir
várias normas, que representam modelos, escolhas que se consagraram dentro
das possibilidades de realizações de um sistema linguístico. Mas — pondera
,s Ibid., p. 178.
" Eugênio Coseriu. La geografia linguística. Montevideo. Universidad de la República, 1956,
p. 44-45. A propósito, consultem-se também os magistrais estudos do autor: Sistema,
normay habla e Determinación y entorno, agora enfeixados no volume Teoria dei lenguaje
y lingiiística general. Madrid, Gredos, 1962, p. 11-113 e 282-323.
15 Closing Statement: Linguistics and Poetics. In Style in Language. Edited by Thomas A.
Sebeok. New York-London, M.I.T. & John Wiley, 1960, p. 352.
7
8
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Eugênio Coseriu, o lúcido mestre de Tübingen — se“é um sistema de realizações
obrigatórias, consagradas social e culturalmente” a norma não corresponde,
como pensam certos gramáticos, ao que se pode ou se deve dizer, mas “ao que
já se disse e tradicionalmente se diz na comunidade considerada”16.
A norma pode variar no seio de uma mesma comunidade linguística, seja
de um ponto de vista diatópico (português de Portugal / português do Brasil /
português de Angola), seja de um ponto de vista diastrático (linguagem culta /
linguagem média / linguagem popular), seja, finalmente, de um ponto de vista
diafásico (linguagem poética / linguagem da prosa).17
Este conceito linguístico de norma, que implica um maior liberalismo gra
matical, é o que, em nosso entender, convém adotarmos para a comunidade
de fala portuguesa, formada hoje por sete nações soberanas, todas movidas
pela legítima aspiração de enriquecer o patrimônio comum com formas e
construções novas, a patentearem o dinamismo do nosso idioma, o meio de
comunicação e expressão, nos dias que correm, de mais de cento e cinquenta
milhões de indivíduos.
“Não se repreende de leve num povo o que geralmente agrada a todos”,
disse com singeleza o poeta Gonçalves Dias. Com efeito, por cima de todos os
critérios de correção — aplicáveis nuns casos, inaplicáveis noutros — paira o
da aceitabilidade social, a consiietudo de Varrão, o único válido em qualquer
circunstância.
É justamente para chegarem a um conceito mais preciso de “correção” em
cada idioma que os linguistas atuais vêm tentando estabelecer métodos que
possibilitem a descrição minuciosa de suas variedades cultas, seja na forma
falada, seja na escrita. Sem investigações pacientes, sem métodos descritivos
aperfeiçoados nunca alcançaremos determinar o que, no domínio da nossa
língua ou de uma área dela, é de emprego obrigatório, o que é facultativo, o
que é tolerável, o que é grosseiro, o que é inadmissível; ou, em termos radicais,
o que é e o que não é correto.
16 Sincronia, diacronía e historia: elproblema dei cambio linguístico, 2.“ ed. Madrid, Credos,
1973, p. 55.
17
Veja-se Celso Cunha. Língua, nação, alienação. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981, p. 73-74
ess.
Capítulo 1
Do latim ao português atual
0 LATIM E A EXPANSÃO ROMANA
A língua portuguesa provém do latim, que se entronca, por sua vez, na
grande família das línguas indo-europeias, representada hoje em todos os
continentes.
De início, simples falar de um povo de cultura rústica, que vivia no centro
da Península Itálica (o Lácio), a língua latina veio, com o tempo, a desempenhar
um extraordinário papel na história da civilização ocidental, “menos por suas
virtudes intrínsecas do que pelo êxito político do povo que dela se servia”.1
Foram as vitórias de seus soldados e o espírito de organização de seus homens
de governo que estenderam e, em parte, consolidaram o enorme império, que,
no auge de sua expansão, ia da Lusitânia à Mesopotâmia, e do Norte da África
à Grã-Bretanha.
Enumeremos, cronologicamente, as conquistas que dilataram de tal forma
os domínios do Império Romano.
Até meados do IV século antes de Cristo, os romanos pouco haviam ampliado
as fronteiras do antigo Lácio. Foi com a guerra contra os samnitas, iniciada em
326 a.C. e terminada com a decisiva batalha de Sentino (295 a.C.), que come
çou a irresistível penetração romana na parte meridional da Península Itálica,
concluída em 272 a.C., com a anexação de Tarento.
Principia, então, o longo período das conquistas externas. Sucessivamente,
vão sendo subjugados os territórios da Sicília (241 a.C.), da Sardenha e da
1 Edouard Bourciez. Éléments de Linguistique romane. 4e éd. Paris: Klincksieck, 1946, p. 26.
Com razão, afirma Antoine Meillet: “A história política de Roma e a história da civilização
romana explicam a história da língua latina.” (Esquisse d’une histoire de la langue latine.
3e éd. Paris: Hachette, 1933, p. 5.)
10
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Córsega (238 a.C.)> da Ilíria (229 a.C), da costa este e sul da Península Ibérica
(218-197 a.C.), dos reinos helenísticos do Oriente (200-168 a.C.), da Gália
Cisalpina (191 a.C.), da Ligúria (154 a.C.), de Cartago e Norte da África (146
a.C.), da Macedônia e da Grécia (146 a.C.), da Gália Narbonense (118 a.C.), da
Gália do Norte (50 a.C.), da Mésia (29 a.C.), do Noroeste da África (25 a.C.),
do resto da Península Ibérica (19 a.C.), da Nórica (16 a.C.), da Récia (15 a.C.),
da Panônia (10 d.C), do resto da Mauritânia (42 d.C), da Bretanha (43 d.G),
da Trácia (46 d.C.), da Dácia (107 d.C.), da Arábia Petreia, da Armênia e da
Mesopotâmia (107 d.C.).
Com a anexação da Dácia (Romênia) e, sem caráter permanente, dessas
regiões da Ásia Menor, o Império atingia, sob o governo de Trajano, o máximo
de sua expansão geográfica.
Ao mesmo tempo que estendiam os seus domínios, os romanos levavam para
as regiões conquistadas os seus hábitos de vida, as suas instituições, os padrões
de sua cultura. Em contato com outras terras, outras gentes e outras civilizações,
ensinavam, mas também aprendiam. Aprenderam, por exemplo, muito com
os gregos, e isso desde épocas antigas, através dos etruscos e, principalmente,
das colônias helénicas do Sul da Itália, que formavam a Magna Grécia. Lívio
Andrônico, o primeiro que tentou elevar à altura de língua poética aquele rude
idioma de agricultores e pastores, que era então o latim, procurou diretamente
em Homero e nos trágicos gregos os modelos para suas experiências de tra
dução e adaptação literárias. Ele próprio era um grego de Tarento. E, na sua
trilha, Plauto, Ênio, Névio e todos os que, pioneiramente, se impuseram a árdua
tarefa de criar obras de arte na língua nacional não deixaram de inspirar-se nos
estimulantes exemplos da Hélade, cuja influência vai ampliar-se mais ainda, a
partir de 146 a.G, quando, vencida pelas armas, acabou dominando pelo espírito
o cruel vencedor.
“Graecia capta ferwn victorem cepit et artes
Intulit agresti Latio”,2
LATIM LITERÁRIO E LATIM VULGAR
Desde o século III a.C., pois, sob a benéfica influência grega, o latim es
crito com intenções artísticas foi sendo progressivamente apurado até atingir,
no século I a.C., a alta perfeição da prosa de Cícero e César, ou da poesia de
Vergílio e Horácio. Em consequência, acentuou-se com o tempo a separação
entre essa língua literária, praticada por uma pequena elite, e o latim corrente,
:
Entenda-se: “A Grécia subjugada subjugou o cruel vencedor e introduziu as artes no agreste
Lácio.”
DO L A T I M AO P O R T U G U Ê S A T U A L
a língua usada no colóquio diário pelos mais variados grupos sociais da Itália
e das províncias.
Tal diferença era já sentida pelos romanos que opunham ao conservador latim
literário ou clássico (sermo litterarius) o inovador latim vulgar (sermo vulgaris),
compreendidas nesta denominação as inúmeras variedades da língua falada,3
que vão do colóquio polido às linguagens profissionais, e até às gírias (sermo
quotidianus, urbanus, plebeius, rusticus, ruralis, pedestris, castrensis, etc.).
Foi esse matizado latim vulgar que os soldados, colonos e funcionários roma
nos levaram para as regiões conquistadas e, sob o influxo de múltiplos fatores,
diversificou-se com o tempo nas chamadas línguas românicas.
AS LÍNGUAS ROMÂNICAS
Se dos gregos os romanos foram discípulos atentos, dos outros povos ven
cidos souberam ser eles os mestres imitados. Não só na Itália, mas também na
Gália, na Hispânia, na Récia e na Dácia, as tribos mais diversas cedo assimi
laram os seus costumes e instituições, adotaram como própria a língua latina,
romanizaram-se.
É fácil concluir que, falado em tamanha área geográfica, por povos de raças
tão diversas, o latim vulgar não poderia conservar a sua relativa unidade, já
precária como a de toda língua que serve de meio de comunicação a vastas e
variadas comunidades de analfabetos.
Nos centros urbanos mais importantes, o ensino do latim difundia o padrão
literário e, com isso, retardava até certo ponto os efeitos das forças de diferen
ciação. Mas no campo ou nas vilas e aldeias a língua, sem nenhum controle
normativo, ia voando com suas próprias asas.
A partir do século III da nossa era, podemos dizer que a unidade linguística
do Império não mais existia, embora continuassem os contatos políticos entre as
suas diversas partes, interligadas por uma certa comunidade de civilização.4É o
que se entende por Romania, em contraste com Barbaria, as regiões habitadas
por outros povos.
3 A denominação latim vulgar, embora um tanto imprópria, tornou-se termo técnico da
linguística. Por ela devemos entender, de acordo com B. E. Vidos, “a língua falada por todas
as camadas da população e em todos os períodos da latinidade”. (Memuale de linguística
romanza. Traduzione dallblandese di G. Francescato. Firenze: Olschki, 1959, p. 201.)
■l Vj. Georges Straka. Observations sur la chronologie et les dates de quelques modifica
tions phonétiques en roman et en français prélittéraire. In: Revue des Langues Romanes.
Montpellier, 1953, p. 307; Idem, La dislocation linguistique de la Romania et la formation
des langues romanes à la lumière de la chronologie relative des changements phonétiques.
In: Revue de Linguistique Romane, XX, 1956, p. 249-267.
11
12
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Alguns fatos históricos vieram contribuir para ativar o processo de dialetalização. Enumeremos os principais.
Desde 212, o edito de Caracala estendera o direito de cidadania a todos os
indivíduos livres do Império, com o que Roma e a Itália perderam a situação
privilegiada que desfrutavam.
Diocleciano, que governou de 284 a 305, instituiu a obrigatoriedade do latim
como língua da administração. Mas, contraditoriamente, anulou os efeitos dessa
medida unificadora ao descentralizar política e administrativamente o Império
em doze dioceses, caminho aberto para o aguçamento de nacionalismos regionais
e locais.5Não sendo mais capital, Roma deixou, consequentemente, de exercer
a função reitora da norma linguística.
Em 330, Constantino, que se tornara defensor do Cristianismo, transferiu a
sede do Império para Bizâncio, a nova Constantinopla.
Com a morte de Teodósio em 395, o vasto domínio foi dividido entre os
seus dois filhos, cabendo a Honório o Ocidente, e a Arcádio o Oriente. O
Império do Oriente teve vida longa. Conservou-se até 1453. O do Ocidente,
porém, depois de sucessivas invasões de hunos, visigodos, ostrogodos, burguinhões, suevos, alanos e vândalos, sucumbe em 476, quando Odoacro des
trona o imperador fantoche Romulus Augustus, apelidado com o diminutivo
Augustulus, “Augustinho”.
As forças linguísticas desagregadoras puderam então agir livremente, e de
tal forma que, em fins do século V, os falares regionais já estariam mais próxi
mos dos idiomas românicos do que do próprio latim. Começa então o período
do romance ou romanço, denominação que se dá à língua vulgar nessa fase de
transição que termina com o aparecimento de textos redigidos em cada uma das
línguas românicas: francês (séc. IX), espanhol (séc. X), italiano (séc. X),6 sardo
(séc. XI), provençal (séc. XII), rético (séc. XII), catalão (séc. XII, ou princípios*
“O Império foi então dividido em doze dioceses, e é uma coisa surpreendente ver nascer
nesse momento as nacionalidades modernas: houve uma África, uma Espanha, uma GrãBretanha, duas Franças (a de Trèves e a de Viena), duas Itálias (a de Milão e a de Roma).”
(André Piganiol. Histoire de Rome. Paris, 1939, p. 446.)
* O primeiro texto em que o vulgar italiano aparece conscientemente contraposto ao latim
é uma carta capuana de 960 (vj. Bruno Migliorini. Storia delia lingua italiana. Firenze:
Sansoni, 1960, p. 93). Em 1924, porém, Luigi Schiaparelli descobriu o texto de uma adi
vinha popular (o chamado “Indovinello Veronese”), de fins do séc. VIII ou princípios
do séc. IX, que pode ser considerado o mais antigo monumento redigido em um dialeto
românico. Sobre os numerosos problemas que encerra o precioso códice da Biblioteca
Capitolare di Verona, leia-se o informativo estudo de Matilde Matarazzo Gargiulo, O
“Indovinello Veronese”. Estudos em homenagem a Cândido Jucá (filho). Rio de Janeiro
[s. d.], p. 147-158.
DO L A T I M AO P O R T U G U Ê S A T U A L
do séc. XIII), português (séc. XIII), franco-provençal (séc. XIII), dálmata (séc.
XIV) e romeno (séc. XVI).
A ROMANIZAÇÃO DA PENÍNSULA
Os romanos chegaram à Península Ibérica no século III a.C, por ocasião
da 2a Guerra Púnica, mas só conseguiram dominá-la por completo, ao fim de
longas e cruentas lutas, em 19 a.C., quando Augusto venceu a resistência dos
altivos povos das Astúrias e da Cantábria.
Muito pouco se sabe das antigas populações ibéricas. No início da romanização habitava a Península uma complexa mistura racial: celtas, iberos, púnico-fenícios, lígures, gregos e outros grupos mal identificados.
Das línguas desses povos quase nada conservaram os idiomas hispânicos.
Com relativa segurança, atribui-se origem pré-romana apenas a uns quantos
sufixos — como -arra (bocarra), -orro (beatorro), -asco (penhasco) e -ego ( borre
go) — e algumas palavras de significação concreta: arroio, balsa, barro, braga(s),
carrasco, gordo, lama, lança, lousa, manteiga, tamuge, tojo, veiga, etc.
A romanização da Península não se processou uniformemente. Das três
províncias em que Agripa (27 a.C.) dividiu a Hispânia — a Tarraconense, cor
respondente à antiga Hispânia Citerior, a Bética e a Lusitânia, desmembradas
da Hispânia Ulterior — foi a Bética a que mais cedo assimilou a civilização
romana. No alvorecer da nossa era, o geógrafo grego Estrabão testemunhava
que “os turdetanos, especialmente os que habitavam as margens do Bétis,
haviam adotado os costumes romanos, e até já nem se lembravam da própria
língua”. E acrescentava: “Não falta muito para que todos se convertam em
romanos.”7
Por esse tempo, nas outras províncias a romanização estava atrasada. Nas
regiões do Norte, em terras da Galiza, das Astúrias e da Cantábria, ainda não
se fazia sentir a presença de Roma: os seus habitantes conservavam intactos os
rudes costumes transmitidos através de gerações que se perdiam na noite dos
séculos.
Em 216, a Gallaecia et Asturia, que desde a época de Antonino Pio era uma
subdivisão militar e financeira da antiga Hispânia Citerior, tornou-se uma pro
víncia à parte, com o nome de Nova Hispania Citerior Antoniniana. Compreendia
então o Noroeste peninsular até a Cantábria.
Com a reforma de Diocleciano, todas essas províncias — e mais a Baleárica, a
Tingitana e a Cartaginense, destacada da Tarraconense — passaram a constituir
a diocese da Hispânia, que dependia da prefeitura das Gálias.
Cf. Rafael Lapesa. Historia de la lengua espanola. 5. ed. Madrid: Escelicer, 1962, p. 41.
13
NOVA G RA MAT I CA DO P O R T U G U Ê 5 C O N T E M P O R Â N E O
LÍNGUAS ROMÂNICAS
ITALIANO
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DO L A T I M AO P O R T U G U Ê S A T U A L
16
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O DOMÍNIO VISIGÓTiCO
Tal a organização administrativa da Península, quando, em 409, foi invadida
por um grupo heterogêneo de povos germânicos — vândalos, suevos e alanos. Os
alanos desapareceram rapidamente; os vândalos, depois de se haverem fbcado na
Bética, transportaram-se, em 429, para a África, onde fundaram um reino, que
durou cem anos; os suevos estabeleceram-se na Galécia e na Lusitânia, mas no
século VI foram absorvidos pelos visigodos. Estes, que eram os mais civilizados
dos povos germânicos, já mantinham antigos contatos com os romanos. Desde
425 estavam sediados na Aquitânia, ao sudoeste da Gália. Daí atravessaram os
Pirineus e se estenderam por toda a Península, que iriam dominar durante dois
séculos e meio.
Os visigodos cedo se fundiram com a população românica. Três fatos con
correram poderosamente para isso: a) a abolição da lei que proibia o casamento
de godos com hispanos, ato de Leovegildo; b) a conversão, em 586, de Recaredo
ao Cristianismo; c) o código, promulgado por Recesvindo em 654, que não mais
distinguia os direitos das comunidades goda e hispana. Assim, quando Rodrigo,
o último rei godo, não pôde deter, em 711, a invasão árabe, com ele ruía não
apenas o império visigótico, mas o império romano-visigótico, que tinha como
religião o Cristianismo e como língua o hispano-românico, legítimo continuador
do latim vulgar.
Excluindo os nomes próprios de pessoas e de lugares, a contribuição goda
para a formação do léxico português não ascende a mais de quarenta termos,8
dos quais cerca de trinta se encontram em outras línguas românicas.
Seguindo o exemplo de Gamillscheg, o professor Joseph M. Piei distribui por
quatro grupos as palavras godas que se conservaram em português:
Io) palavras de origem gótica que já pertenciam ao latim vulgar ou medieval:
albergue, arrear, bramar, bando, elmo, espora, guarda, guerra, rapar, trégua;
2o) palavras comuns a todas as regiões primitivamente ocupadas pelos godos:
aspa, espeto, espia, estala, garbo, mofo, mofino, roca, taco, ufanar-se;
3o) palavras peculiares à Península Ibérica e à França, ou à Península e à Itália:
agasalhar, brotar, estaca, fato, roupa, sítio, triscar;
4o) palavras privativas dos idiomas ibero-românicos: aio, aia, aleive, enguiçar,
escanção, ganso, guarecer, íngreme, luva, malado (arc.), tascar.9
s Cf. Joseph M. Piei. Opatrimônio visigodo da língua portuguesa. Coimbra, Coimbra Editora,
1942, p. 18.
1J Ibidem, p. 13-17.
DO L A T I M AO P O R T U G U Ê S A T U A L
O DOMÍNIO ÁRABE
Movidas pela guerra santa, as tribos árabes conquistam o Norte da África
e, em 711, desembarcam na Península. Sete anos depois, com exclusão do pe
queno reino do Duque Teodomiro, que por meio século ainda conservou sua
autonomia, e de alguns focos de resistência nas montanhas das Astúrias, de
onde partiria o movimento de Reconquista, o domínio muçulmano cobria toda
a anterior Espanha visigótica.
“Os árabes, sírios e berberes que invadem a Península não trazem mulheres:
casam com hispano-godas, têm escravas galegas e bascas. Entre os muçulmanos
permanecem muitos hispano-godos, os moçárabes, conservadores do saber isidoriano: uns conseguem certa autonomia; os mais exaltados sofrem perseguições
e martírio; outros se islamizam; mas todos influem na Espanha moura, onde se
fala romance ao lado do árabe.”10
Com os árabes floresceram na Península as ciências e as artes: houve grande
incremento da agricultura, da indústria e do comércio; introduziram-se inú
meras palavras para designar novos e variados conhecimentos. Calcula-se em
quatro mil o número de vocábulos espanhóis de origem árabe, excluídos os
topônimos. Em português o léxico de proveniência árabe tem sido estimado
entre quatrocentos e mil termos.
As palavras portuguesas de origem árabe, quase todas substantivos, referem-se, em geral:
a) à organização guerreira: acicate, adail, adarga, alcaide, alfange, alferes, algarada, aljava, ameia, arrebatar, atalaia, ronda, zaga, entre outras;
b) à agricultura e à jardinagem: açafrão, açúcar, açucena, alcachofra, alecrim,
alface, alfafa, alfazema, algodão, almécega, benjoim, berinjela, etc.;
c) ao comércio, a pesos e medidas: aduana, armazém, arroba, quilate, quintal,
etc.;
d) a ofícios, cargos: adail, alfageme, alfaiate, algibebe, almocreve, almotacel,
almoxarife, arrais, califa, emir, etc.;
e) a instrumentos musicais: adufe, alaúde, anafil, arrabil, tambor, etc.;
f) às ciências: álgebra, algoritmo, cifra, zénite, nadir, álcool, álcali, etc.
Em alguns casos os árabes foram apenas os intermediários de palavras que
haviam tomado a outras línguas. São, por exemplo, de origem grega: alambique,
alcaparra, alfândega, alquimia, acelga e arroz; de origem sânscrita: alcanfor e
xadrez; de origem persa: azul, escarlate, jasmim e laranja. Do próprio latim há
uma série de palavras introduzidas sob forma arabizada: abricó, alcácer, albornoz,
almude, alporão.
10 Rafael Lapesa. Op. cit., p. 95-96.
17
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O PORTUGUÊS PRIMITIVO
Foi durante o domínio árabe que se acentuaram as características distintivas
dos romances peninsulares.
Na região que compreendia a Galiza e a faixa lusitana entre o Douro e o
Minho constituiu-se uma unidade linguística particular que conservaria relativa
homogeneidade até meados do século XIV — o galego-português.
O galego-português, provavelmente, teria contornos definidos desde o século
VI, mas é só a partir do século IX que podemos atestar a sua existência através
de palavras que se colhem em textos de latim bárbaro.11
PERÍODOS EVOLUTIVOS DA LÍNGUA PORTUGUESA
Datam do século XIII os primeiros documentos que chegaram até nós inte
gralmente redigidos em galego-português. Inicia-se então a fase propriamente
histórica de nossa língua, que, como todo idioma dotado de vitalidade, não se
tem mantido uniforme nem no tempo, nem no espaço.
Baseando-nos em parte numa conhecida periodização proposta pelo sábio
linguista José Leite de Vasconcelos,12 distinguiremos as seguintes etapas na
evolução do latim ao português atual:
a) latim lusitânico, língua falada na Lusitânia, desde a implantação do latim até
o século V;
b) romance lusitânico, língua falada na Lusitânia, do século VI ao século IX, da
qual, como da fase anterior, não temos nenhum documento escrito;
c) português proto-histórico, língua falada na Lusitânia, do século IX até fins
do século XII, e da qual podemos vislumbrar algumas características nas
palavras intercaladas em textos do latim bárbaro;
11 Chama-se latim bárbaro a língua dos documentos forenses da Idade Média, em que, no
texto latino, se inserem vocábulos do romance regional.
12 Cf. Lições de Filologia Portuguesa. 2. ed. Lisboa, Biblioteca Nacional, 1926, p. 16-17. Advirtase que Leite de Vasconcelos situava o começo da fase histórica da língua portuguesa em fins
do século XII com fundamento em dois textos, originários do Mosteiro de Vairão, datados
respectivamente de 1192 e 1193: o primeiro, um Auto de Partilhas dos bens herdados de
seus pais pelos irmãos Sánchez; o segundo, o Testamento pelo qual Elvira Sánchez deixava
todos os seus bens ao Mosteiro de Vairão. Estudo posterior do ilustre filólogo português
Luís Filipe Lindley Cintra (Cf. Les anciens textes portugais non littéraires — dassement
et bibliographie. In: Les anciens textes romans non littéraires. Paris, Klincksieck, 1963,
p. 169-187), para o qual solicitou a ajuda de dois eminentes paleógrafos, Rui de Azevedo
e o Padre Avelino Costa, veio provar que os textos em causa não passam de falsificações
de fins do século XIII, ou mesmo do século XIV.
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A Península Ibérica no século V, depois de consolidado o domínio político dos
invasores germânicos com a formação do Reino dos Suevos e dos Visigodos.
A Península Ibérica no século X, no auge do domínio árabe através do Califado de Córdoba, com os
cristãos confinados ao norte no Reino de Leão, Castela, Navarra, Urgelo e Condado de Barcelona.
19
20
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A Península Ibérica em meados do século X II, com os progressos da Reconquista Cristã. Portugal já ocupa
uma faixa do Minho ao Tejo, depois da Tomada de Lisboa aos árabes por D. Afonso Henriques (1147).
A Península Ibérica em meados do século XV. 0 domínio árabe reduzido ao Reino de Granada, que ruiria em
1492. Portugal depois da conquista do Algarve (1249) por D. Afonso I I I , havia atingido praticamente o
território atual.
DO L A T I M AO P O R T U G U Ê S A T U A L
d) português arcaico, que vai de princípios do século XIII até a primeira metade
do século XVI, quando a língua começa a ser codificada gramaticalmente;13
e) português moderno, que se estende da segunda metade do século XVI até
os dias que correm.
Os períodos arcaico e moderno da língua portuguesa comportam subdivi
sões, como reconhecia o próprio Leite de Vasconcelos.
Parece-nos particularmente aconselhável distinguir duas épocas no período
compreendido entre o século XIII e a primeira metade do século XVI; uma, a
do português arcaico propriamente dito, que abarcaria a língua dos séculos XIII
e XIV; outra, a do português médio, que iria do século XV a fins da primeira
metade do século XVI e representaria a fase de transição entre a antiga e a
moderna do idioma.
Com os descobrimentos marítimos dos séculos XV e XVI, os portugueses
ampliaram enormemente o império de sua língua, levada que foi para os vastos
territórios por eles conquistados na África, na América, na Ásia e na Oceânia.
Ainda hoje, apesar das consideráveis perdas sofridas, o seu domínio político
abarca mais de dez milhões de quilômetros quadrados, aproximadamente a
sétima parte da Terra. É o português a língua oficial do Brasil, de Portugal,
de Angola, de Cabo Verde, de Guiné-Bissau, de Moçambique, de São Tomé e
Príncipe, e de Timor Leste.
Fora das regiões pertencentes ao domínio político de Portugal, do Brasil,
das Repúblicas africanas e de Timor Leste, o português é falado em povoações
espanholas da zona raiana, tal o caso de Ermisende, na província de Zamora;
em Alamedilla, na província de Salamanca; em San Martin de Trevejo, Eljas,
Valverde dei Fresno, Herrera de Alcântara e Cedillo, na província de Cáceres; em
Olivenza e arredores, na província de Badajoz. Também nas áreas fronteiriças
do Brasil a língua portuguesa tem penetrado em território de língua espanhola,
formando não raro um dialeto misto, como o falado nos departamentos uru
guaios de Artigas, Rivera, Cerro Largo, Salto e Tacuarembó.14
Não levando em linha de conta os usuários desses falares fronteiriços, nem os
do crioulo de Surinam e do papiamento de Curaçau, que o têm por base, nem
os do galego, sua covariante; abstraindo-nos também dos núcleos de imigrantes,
por vezes consideráveis, como acontece nos Estados Unidos, na França e na
Alemanha, ainda assim o português é o meio natural de comunicação de mais
13 A primeira gramática de nossalíngua — a Graminatica da lingpagem portuguesa, de Fernão
de Oliveira — foi impressa em Lisboa, 1536.
14 Este dialeto foi descoberto pelo sábio linguista José Pedro Rona, que dele nos deu uma
excelente descrição em El dialecto “fronterizo”dei norte del Uruguay. Montevideo, Adolfo
Linardi, 1965.
21
22
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
de duzentos milhões de pessoas, o que vale dizer situar-se entre as dez línguas
mais faladas do mundo.
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Capítulo 2
Domínio atual da língua
portuguesa
UNIDADE E DIVERSIDADE
Na área vastíssima e descontínua em que é falado, o português apresenta-se,
como qualquer língua viva, internamente diferenciado em variedades que di
vergem de maneira mais ou menos acentuada quanto à pronúncia, à gramática
e ao vocabulário.
Embora seja inegável a existência de tal diferenciação, não é ela suficiente
para impedir a superior unidade de nosso idioma, fato, aliás, salientado até
pelos dialectólogos.
Com relação a Portugal, observa o professor Manuel de Paiva Boléo: “Uma
pessoa, mesmo alheia a assuntos filológicos, que haja percorrido Portugal de
norte a sul e conversado com gente do povo, não pode deixar de ficar impres
sionada com a excepcional homogeneidade linguística do País e a sua escassa
diferenciação dialectal — ao contrário do que sucede noutros países, quer de
língua românica, quer germânica.”'
Com referência à situação linguística do Brasil, escreve Serafim da Silva Neto:
“Ê preciso ter na devida conta que unidade não é igualdade; no tecido linguístico
brasileiro, há, decerto, gradações de cores. Minucioso estudo de campo deter
minaria, com segurança, várias áreas. O que é certo, porém, é que o conjunto
dos falares brasileiros se coaduna com o princípio da unidade na diversidade e
da diversidade na unidade.”12
1 Manuel de Paiva Boléo e Maria Helena Santos Silva. O “Mapa dos dialectos e falares de
Portugal Continental”. Boletim de Filologia, 20:85,1961.
2 Introdução ao estudo da língua portuguesa no Brasil, 2.a ed. Rio de laneiro, MEC/INL, 1963,
p. 271.
24
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
AS VARIEDADES DO PORTUGUÊS
Excetuando-se o caso especial dos crioulos, que estudaremos adiante, temos,
pois, de reconhecer esta verdade: apesar da acidentada história que foi a sua
expansão na Europa e, principalmente, fora dela, nos distantes e extensíssimos
territórios de outros continentes, a língua portuguesa conseguiu manter até hoje
apreciável coesão entre as suas variedades por mais afastadas que se encontrem
no espaço.
A diversidade interna, contudo, existe e dela importa dar uma visão tanto
quanto possível ordenada.3
OS DIALETOS DO PORTUGUÊS EUROPEU
A faixa ocidental da Península Ibérica ocupada pelo galego-português apresenta-nos um conjunto de dialetos que, de acordo com certas características
diferenciais de tipo fonético, podem ser classificados em três grandes grupos:
a) DIALETOS galegos;
b ) DIALETOS PORTUGUESES SETENTRIONAIS;
C) DIALETOS PORTUGUESES CENTRO-MERIDIONAIS.J
Esta classificação parece ser apoiada pelo sentimento dos falantes comuns
do português-padrão europeu, isto é, dos que seguem a norma ou conjunto dos
usos linguísticos das classes cultas da região Lisboa-Coimbra, e que distinguirão
pela fala um galego, um homem do Norte e um homem do Sul.
A distinção funda-se principalmente no sistema das sibilantes.
3 Veja-se, sobre o conjunto das variedades do português, a Bibliografia dialectal galegoportuguesa. Lisboa, Centro de Estudos Filológicos, 1974. Sobre o português do Brasil, em
particular, possuímos hoje uma bibliografia muito completa: Wolf Dietrich. Bibliografia
da língua portuguesa do Brasil. Tübingen, Gunter Narr, 1980.
11 Quanto à classificação dialetal aqui adotada, veja-se Luís Filipe Lindley Cintra. Nova pro
posta de classificação dos dialectos galego-portugueses. Boletim de Filologia, 22: 81-116,
Lisboa, 1971. Entre as classificações anteriores, duas merecem realce particular: a de José
Leite de Vasconcelos e a de Manuel de Paiva Boléo e Maria Helena Santos Silva. A de Leite
de Vasconcelos, baseada na divisão de Portugal em províncias, é mais geográfica do que
linguística. Foi publicada, inicialmente, no seu Mappa dialectologico do continente portu
guês (Lisboa, Guillard, Aillaud, 1897), depois reproduzida na Esquisse d’une dialectologie
portugaise (Paris-Lisboa, Aillaud, 1901; 2.a ed., com aditamentos e correções do autor,
preparada por Maria Adelaide Valle Cintra, Lisboa, Centro de Estudos Filológicos, 1970)
e, com alterações, nos Opúsculos, IV, Filologia, parte II (Coimbra, 1929, p. 791-796). A de
Manuel de Paiva Boléo e Maria Helena Santos Silva, exposta em: O “Mapa dos dialectos e
falares de Portugal Continental” (Boletim de Filologia, 20:85-112, Lisboa, 1961), assenta-se
em fatos linguísticos, principalmente fonéticos, que se fossem apresentados numa certa e
possível hierarquização permitiriam talvez um mais claro agrupamento das variedades.
D O M Í N I O A T U A L DA L Í N G U A P O R T U G U E S A
Assim:
1. Nos dialetos galegos não existe a sibilante sonora /z/: rosa articula-se com a
mesma sibilante [?] ou [s] (surda) de passo; fazer, com a mesma sibilante [0]
ou [s] (surda) de caça. Inexiste também a fricativa palatal sonora [j] grafada
em português; ou g (antes de e ou i). Em galego, hoxe tem a mesma fricativa
[)) de enxada.
2. Nos dialetos portugueses setentrionais existe a sibilante ápico-alveolar [?],
idêntica à do castelhano setentrional e padrão, em palavras como seis,passo.
A ela corresponde a sonora [?] de rosa.
Em alguns dialetos mais conservadores coexistem com estas sibilantes as prédorsodentais [s] (em cinco, caça) e [z] (em fazer), que, noutros dialetos, com
elas se fundiram, provocando a igualdade da sibilante de cinco e caça com a
que aparece em seis e passo, ou seja [?], bem como a da de fazer com a que se
ouve em rosa, isto é [?].
3. Nos dialetos portugueses centro-meridionais só aparecem as sibilantes prédorsodentais que caracterizam a língua padrão:
a) a surda [s], tanto em seis epasso como em cinco e caça;5
b) a sonora [z], tanto em rosa como em fazer.
As fronteiras entre as três zonas mencionadas atravessam a faixa galego-portuguesa de oeste a leste, ou, mais precisamente, no caso da fronteira entre
dialetos portugueses setentrionais e centro-meridionais, de noroeste a sueste.
Mas há outros traços importantes em que a referida distinção se fundamenta,
sem que, no entanto, as suas fronteiras coincidam perfeitamente com as das
características já indicadas.
São eles:
a) a pronúncia como [b] ou [|3] do v gráfico (emitido como labiodental na
pronúncia padrão e na centro-meridional) na maior parte dos dialetos
portugueses setentrionais e na totalidade dos dialetos galegos: binho, abó
por vinho, avó;
b) a pronúncia como africada palatal [tj] do ch da grafia (emitido como fricativa
[J] na pronúncia padrão e em quase todos os dialetos centro-meridionais)
na maior parte dos dialetos portugueses setentrionais e na totalidade dos
dialetos galegos: tchave, atchar por chave, achar;
D Pronúncia semelhante à do francês ou do italiano padrão, do castelhano meridional edo
hispano-americano.
25
26
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Alguns traços fonéticos diferenciados dos dialetos galego-portugueses
D O M Í N I O A T U A L DA L Í N G U A P O R T U G U E S A
Classificação dos dialetos galego-portugueses
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1. Entre moger (e outras formas em -er) e
mugir, mojar e afins; 2. Entre úbere e amojo;
3. Entre anho e cordeiro;
4. Entre espiga e maçaroca;
A primeira das formas citadas fica sempre
ao Norte e a Oeste da segunda;
5. Área de recobrimento das formas mais
arcaicas;
6. Área de almece; no resto do pais diz-se
soro, exceto no Minho onde não se usa
nenhuma designação.
« . . . . . .
'.W V .W *
•
1
2
3
4
5
6
Alguns limites lexicais
.-7 . -.........
....
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c) a monotongação ou não monotongação dos ditongos [ow] e [ej]: a pronúncia
[o] e [e] desses ditongos (por exemplo: ôru por ouro, ferrêro por ferreiro)
caracteriza os dialetos portugueses centro-meridionais e, no caso de [o], a
pronúncia padrão perante os dialetos portugueses setentrionais e os dialetos
galegos.6
Merecem menção especial — mesmo numa apresentação panorâmica dos
dialetos portugueses — três regiões em que, a par dos traços gerais que acabamos
de apontar, aparecem características fonéticas peculiares que afastam muito
vincadamente os dialetos nelas falados de todos os outros do mesmo grupo.
Trata-se, em primeiro lugar, de uma região (dentro da zona dos dialetos seten
trionais) em que se observa regularmente a ditongação de [e] e [o] acentuados:
pjeso por peso,pworto por porto. Abrange uma grande parte do Minho e do Douro
Litoral, incluindo o falar popular da cidade do Porto e de seus arredores.
Em segundo lugar, temos uma extensa área da Beira Baixa e do Alto Alentejo
(compreendendo uma faixa pertencente aos dialetos setentrionais, mas, princi
palmente, uma vasta zona dos dialetos centro-meridionais) em que se registra
uma profunda alteração do timbre das vogais. Os traços mais salientes são: a)
a articulação do u tônico como [ü] (próximo do u francês), por exemplo: [tü],
['müla], por tu, mula; b) a representação do antigo ditongo grafado ou por [õ]
(também semelhante ao som correspondente do francês), por exemplo: [põka]
por pouca; c) a queda da vogal átona final grafada -o ou sua redução ao som [d],
por exemplo: cop {d), cop (d)s, por copo, copos; tüd (d) por tudo.
Por fim, no ocidente do Algarve situa-se outra região em que se observam
coincidências com a anteriormente mencionada, no que se refere às vogais.
Em lugar de u, encontramos [ü]: [tü], ['müla] (mas o ou está representado por
[o]). Por outro lado, o a tônico evolveu para um som semelhante ao o aberto:
bata é pronunciado quase bota, alteração de timbre que não é estranha a alguns
lugares da mencionada zona da Beira Baixa e Alto Alentejo, embora seja aí mais
frequente a passagem, em determinados contextos fonéticos, de a a um som [á]
semelhante a e aberto [e], por exemplo: afilhédo por afilhado, fumér por fumar.
A vogal átona grafada o também cai ou se reduz a [d]: cop(d), cop(d)s,por copo,
copos; tiid(d) por tudo.
Com referência ao ditongo [ej], a pronúncia padrão e a de Lisboa (nestecaso uma ilhota de
conservação ao sul) coincidem com os dialetos setentrionais na sua manutenção. Note-se
contudo que, devido a um fenômeno de diferenciação entre os dois elementos do ditongo,
este se transformou na referida pronúncia em [otj ].
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Não são, porém, apenas traços fonéticos que permitem opor os diversos
grupos de dialetos galego-portugueses. Se, no que diz respeito a particularidades
morfológicas e sintáticas, a grande variedade e irregularidade na distribuição
parece impedir um delineamento de áreas que as tome como base7, já no que
se refere à distribuição do léxico podemos observar, ainda que num restrito
número de setores e casos, certas regularidades. Não é raro, por exemplo, que
os dialetos centro-meridionais se oponham aos setentrionais e aos galegos por
neles se designar um objeto ou noção com um termo de origem árabe enquanto
nos últimos permanece o descendente da palavra latina ou visigótica. É o caso
da oposição altnece / soro (do queijo), ceifar / segar.
Talvez ainda mais frequente seja a oposição lexical entre os dialetos do sul e
leste de Portugal, caracterizados por inovações vocabulares de vários tipos, e os
dialetos do noroeste e centro-norte, que, como os galegos, se distinguem pelo
conservadorismo, pela manutenção de termos mais antigos na língua. É o caso
da oposição de ordenhar a moger, mugir e arnojar, de amojo a úbere; de borrego
a cordeiro e a anho; de chibo a cabrito; de maçaroca a espiga (de milho), etc.
Advirta-se, por fim, que em relação a muitas outras noções é grande a va
riedade terminológica na faixa galego-portuguesa, sem que se observe este ou
qualquer outro esquema regular de distribuição. É que a distribuição dos tipos
lexicais depende de numerosíssimos fatores, não só linguísticos, mas sobretudo
histórico-culturais e sociais, que variam de caso para caso. A regularidade atrás
observada parece depender, em alguns casos, da ação de um mesmo fator his
tórico: a Reconquista aos mouros do Centro e do Sul do território português,
movimento que teria criado o contraste entre uma Galiza e um Portugal do
Noroeste para Oeste mais conservadores, porque de povoamento antigo, e um
Portugal do Nordeste, Este e Sul mais inovador, justamente o que foi repovoado
em consequência daquele acontecimento histórico.8Trata-se, aliás, de um con
traste que tem o seu paralelo na história da arte. Ao Norte, resistência do estilo
romântico, enquanto ao Sul, a partir do século XIII, se acentua progressiva mente
a penetração e a expansão do estilo gótico.*
Quando muito, poder-se-á dizer, por exemplo, que certos traços, como os perfeitos em -i da
1.“ conjugação (lavi por lavei, canti por cantei), são exclusivamente centro-meridionais.
* Veja-se, a este respeito, principalmente, Luís F. Lindley Cintra. Áreas lexicais no território
português. Boletim de Filologia, 20: 273-307, 1961; e Orlando Ribeiro. A propósito de
áreas lexicais no território português. Boletim de Filologia, 21:177-205,1962-1963 (artigos
reproduzidos em Luís F. Lindley Cintra. Estudos de dialectologia portuguesa. Lisboa, Sá da
Costa, 1983, p. 55-94 e 165-202).
D O M Í N I O A T U A I DA L Í N G U A P O R T U G U E S A
OS DIALETOS DAS ILHAS ATLÂNTICAS
Os dialetos falados nos arquipélagos atlânticos dos Açores e da Madeira
representam — como era de esperar da história do povoamento destas ilhas,
desertas no momento em que os portugueses as descobriram — um prolonga
mento dos dialetos portugueses continentais.
Considerando a maior parte das características fonéticas que neles se obser
vam, pode-se afirmar, com maior precisão, que prolongam o grupo dos dialetos
centro-meridionais. Com efeito, não se encontram nos dialetos açorianos e
madeirenses nem o [?] ápico-alveolar, nem a neutralização da oposição entre
[v] e [b], nem a africada [tj] dos dialetos setentrionais do continente. Quanto
à monotongação dos ditongos decrescentes [ow] e [ej], observam-se as mesmas
tendências da língua padrão: o ditongo [ow] reduz-se normalmente a [o], mas
a redução de [ej] a [e] é fenômeno esporádico; só ocorre como norma na ilha
de São Miguel.
Esta ilha, assim como a da Madeira, constituem casos excepcionais dentro
do português insular. Independentemente uma da outra, ambas se afastam do
que se pode chamar a norma centro-meridional por acrescentar-lhe um certo
número de traços muito peculiares.
No que se refere à ilha de São Miguel, os mais característicos dentre os traços
que afastam os seus dialetos dos das outras ilhas coincidem, curiosamente, com
os traços que, na Península, distinguem a região da Beira Baixa e do Alto Alentejo
(e também, parcialmente, com os que se observam no ocidente do Algarve): a)
o u tônico é articulado como [ü]: tii, mula-, b) o antigo ditongo ou pronuncia-se
como [õ]: põca, lõra; c) o a tônico tende para o o aberto [o]: quase bota por bata;
d) a vogal final grafada -o cai ou reduz-se a [a]: cop(o), cop(o)s, tüd(o),põk(<?),
por copo, copos, tudo, pouco.
Quanto à ilha da Madeira, os seus dialetos apresentam características foné
ticas singulares, que só esporadicamente (e não todas) aparecem em dialetos
continentais. Assim, o u tônico apresenta-se ditongado em [aw], por exemplo:
['law a] por lua\ o i tônico em [aj], por exemplo: ['fajXa] por filha. Por outro
lado, a consoante /, precedida de i, palatiza-se: [VocjÀa] por vila, ['fajXa] por
fila (confundindo-se, portanto, desse modo fila com filha).
OS DIALETOS BRASILEIROS
Com relação ao extensíssimo território brasileiro da língua portuguesa, a
insuficiência de informações rigorosamente científicas sobre as diferenças de na
tureza fonética, morfossintática e lexical que separam as variedades regionais nele
existentes não permite classificá-las em bases semelhantes às que foram adotadas
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na classificação dos dialetos do português europeu. Deve-se reconhecer, contudo,
que a publicação de dois atlas prévios regionais — o do Estado da Bahia9 e o do
Estado de Minas Gerais101— e a anunciada impressão do já concluído Atlas dos
falares de Sergipen, bem como a elaboração de algumas monografias dialetais,
são passos importantes no sentido de suprir a lacuna apontada.
Entre as classificações de conjunto, propostas em caráter provisório, sobreleva,
pela indiscutível autoridade de quem a fez, a de Antenor Nascentes, fundada em
observações pessoais colhidas em suas viagens por todos os estados do país.
A base desta proposta reside — como no caso do português europeu — em
diferenças de pronúncia.
De acordo com Antenor Nascentes, é possível distinguir dois grupos de
dialetos12 brasileiros — o do Norte e o do Sul — , tendo em conta dois traços
fundamentais:
a) a abertura das vogais pretônicas, nos dialetos do Norte, em palavras que não
sejam diminutivos nem advérbios em -mente: pègar por pegar, correr por
correr;
b) o que ele chama um tanto impressionisticamente a “cadência” da fala: fala
“cantada” no Norte, fala “descansada” no Sul.
A fronteira entre os dois grupos de dialetos passa por “uma zona que ocupa
uma posição mais ou menos equidistante dos extremos setentrional e meridional
do país. Esta zona se estende, mais ou menos, da foz do rio Mucuri, entre Espírito
Santo e Bahia, até a cidade de Mato Grosso, no estado do mesmo nome”13.
Em cada grupo, distingue Antenor Nascentes diversas variedades a que chama
subfalares. E enumera dois no grupo Norte:
a) o amazônico ;
b ) o nordestino ;
“ Nelson Rossi. Atlas prévio dos falares baianos. Rio de Janeiro, MHC/INL, 1963.
Iu José Ribeiro et alii. Esboço de um atlas linguístico de Minas Gerais. V.l. Rio de Janeiro,
MEC/Casa de Rui Barbosa/UFJF, 1977.
11 Elaborado por Nelson Rossi, com a colaboração de um grupo de professores da Univer
sidade Federal da Bahia.
12 Empregamos o termo dialeto pelas razões aduzidas no capítulo 1 e para mantermos o
paralelismo com a designação adotada para as variedades regionais portuguesas. Ao que
chamamos aqui dialeto Nascentes denomina subi-ai.ak.
13 Antenor Nascentes. O linguajar carioca, 2.a ed. completamente refundida. Rio de Janeiro,
Simões, 1953, p. 25. Por ser quase despovoada, considerava ele incaracterística a área
compreendida entre a parte da fronteira boliviana e a fronteira de Mato Grosso com
Amazonas e Pará.
D O M Í N I O A T U A L DA L Í N G U A P O R T U G U E S A
Areas linguísticas do Brasil (divisão proposta por Antenor Nascentes)
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e quatro no grupo Sul:
a) o baiano ;
b ) o fluminense;
c) o mineiro ;
d ) O SULISTA.
Assinale-se, por fim, que as condições peculiares da formação linguística do
Brasil revelam uma dialectalização que não parece tão variada e tão intensa como
a portuguesa. Revelam, também, estas condições que a referida dialectalização
é muito mais instável que a europeia.
O PORTUGUÊS DE ÁFRICA, DA ÁSIA E DA OCEÂNIA
No estudo das formas que veio a assumir a língua portuguesa em África, na
dades: as crioulas e as não crioulas.
As variedades crioulas resultam do contacto que o sistema linguístico por
tuguês estabeleceu, a partir do século XV, com sistemas linguísticos indígenas.
Talvez todas elas derivem do mesmo protocrioulo o u língua franca que, durante
os primeiros séculos da expansão portuguesa, serviu de meio de comunicação
entre as populações locais e os navegadores, comerciantes e missionários ao
longo das costas da África Ocidental e Oriental, da Arábia, da Pérsia, da índia,
da Malásia, da China e do Japão. Aparecem-nos, atualmente, como resultados
muito diversificados, mas com algumas características comuns — ou, pelo me
nos, paralelas — , que se manifestam numa profunda transformação da fonologia
e da morfossintaxe do português que lhes deu origem. O grau de afastamento
em relação à língua-mãe é hoje de tal ordem que, mais do que como dialetos,
os crioulos devem ser considerados como línguas derivadas do português.
Os crioulos de origem portuguesa na África, que são os de maior vitalidade,
podem ser distribuídos espacialmente em três grupos:
1.
Crioulos das ilhas do Golfo da Guiné:
a) de São Tomé;
b) do Príncipe;
c) de Ano Bom (ilha que pertence à Guiné Equatorial).
2. Crioulos do arquipélago de Cabo Verde, com as duas variedades:
a) de Barlavento, ao norte, usada nas ilhas de Santo Antão, São Vicente, São
Nicolau, Sal e Boa Vista;
b) de Sotavento, ao sul, utilizada nas ilhas de Santiago, Maio, Fogo e Brava.
D O M Í N I O A T U A L DA L Í N G U A P O R T U G U E S A
3. Crioulos continentais:
a) da Guiné-Bissau;
b) de Casamance (no Senegal).
a)
b)
c)
d)
Dos crioulos da Ásia subsistem apenas:
o de Malaca, conhecido pelas denominações de papiâ cristão, malaqueiro, malaquês, malaquenho, malaquense, serani, bahasa geragau e português basu;
o de Macau, macaísta ou macauenho, ainda falado por algumas famílias de
Hong-Kong;
o de Sri-Lanka, falado por famílias de Vaipim e Batticaloa;
os de Chaul, Korlai, Tellicherry, Cananor e Cochim, no território da União
Indiana.
Na Oceânia, sobrevive ainda o crioulo de Tugu, localidade perto de Jacarta,
na ilha de Java. 14
Quanto às variedades não crioulas, há que considerar não só a presença do
português, que é a língua oficial das repúblicas de Angola, de Cabo Verde, da
Guiné-Bissau, de Moçambique e de São Tomé e Príncipe, mas as variedades
faladas por uma parte da poprilação destes Estados e, também, de Goa, Damão,
Diu e Macau, na Ásia, e Timor, na Oceânia. Trata-se de um português com
base na variedade europeia, porém mais ou menos modificado, sobretudo pelo
emprego de um vocabulário proveniente das línguas nativas, e a que não faltam
algumas características próprias no aspecto fonológico e gramatical.
Estas características, no entanto, que divergem de região para região, ainda
não foram suficientemente observadas e descritas, embora muitas delas— prin
cipalmente no que se refere a Angola, Cabo Verde e Moçambique — transpare
çam na obra de alguns dos modernos escritores desses países. 15
N Sobre o estado atual dos crioulos portugueses, veja-se Celso Cunha. Língua, nação,
alienação. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981, p. 37-106, onde se remete à bibliografia
especializada; veja-se, também, José Gonçalo Herculano de Carvalho. Deux langues créoles:
le criôl du Cap Vert et 1e forro de S. Tomé. Biblos, 57:1-15, Coimbra, 1981.
15 Sobre a linguagem de um deles, do maior significado, o angolano Luandino Vieira, leiam-se: Michel Laban. L'œuvre littéraire de Luandino Vieira, tese de 3.° ciclo, apresentada em
1979 à Universidade de Paris-Sorbonne; eSalvato Trigo. Luandino Vieira, o logoteta. Porto,
Brasília Editora, 1981.
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Capítulo 3
Fonética e fonologia
OS SONS DA FALA
O s so n s d e n o ssa fala re su lta m q u a se to d o s d a ação d e c e rto s ó rg ã o s so b re a
c o rre n te de a r v in d a d o s p u lm õ e s.
P ara a su a p ro d u ç ã o , trê s co n d iç õ e s se fazem necessárias:
a) a c o rre n te d e ar;
b ) u m o b stá c u lo e n c o n tra d o p o r essa c o rre n te de ar;
c) u m a caixa d e resso n ân cia.
E stas c o n d iç õ e s são c ria d a s p elo s órgàos da fala, d e n o m in a d o s , e m seu
c o n ju n to , aparelho fonador .
O APARELHO FONADOR
É c o n s titu íd o das seg u in tes p arte s:
a) o s pulmões, os brônquios e a traqueia - ó rg ão s re sp ira tó rio s q u e fo rn e c e m a
c o rre n te d e ar, m a té ria - p r im a da fo n ação ;
b ) a laringe, o n d e se lo calizam as cordas vocais, q u e p ro d u z e m a e n erg ia s o n o ra
u tiliz a d a n a fala;
c) a s CAVIDADES SUPRA LARÍNGEAS (FARINGE, BOCA e FOSSAS NASAIS), q u e
fu n c io n a m c o m o caixas de resso n ân cia, se n d o q u e a cav id ad e b u c a l p o d e
v a ria r p ro fu n d a m e n te de fo rm a e de v o lu m e, graças aos m o v im e n to s do s
ó rg ão s ativos, s o b re tu d o d a língua, que, d e tã o im p o rta n te n a fo n ação , se
to r n o u s in ô n im o de “id io m a ”.
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Observação:
Quase todos os sons de nossa fala são produzidos na expiração. A inspiração
normalmente funciona para nós como um instante de silêncio, um momento de
pausa na elocução. Línguas há, porém, como o hotentote, o zulo, o boximane e outros
idiomas africanos, que apresentam uma série de consoantes articuladas na inspiração,
os ruídos que se denominam c l i q u e s . Em português praticamos alguns c l i q u e s , mas
sem valor fonético: o beijo, que é uma bilabial inspiratória; o muxoxo, um clique
linguoalveolar; o estalido linguodental com que animamos o andar das cavalgadu
ras; e uns poucos mais. Sobre o assunto consulte-se Rodrigo de Sá Nogueira. Temas
de linguística banta: dos cliques em geral. Lisboa, Agência Geral do Ultramar, 1957.
FUNCIONAMENTO DO APARELHO FONADOR
O ar expelido dos pulmões, por via dos brônquios, penetra na traqueia e
chega à laringe, onde, ao atravessar a glote, costuma encontrar o primeiro
obstáculo à sua passagem.
A glote, que fica na altura do chamado pomo de adão ou gogó, é a abertura
entre duas pregas musculares das paredes superiores da laringe, conhecidas pelo
nome de cordas vocais. O fluxo de ar pode encontrá-la fechada ou aberta, em
virtude de estarem aproximados ou afastados os bordos das cordas vocais. N o
primeiro caso, o ar força a passagem através das cordas vocais retesadas, fazendoas vibrar e produzir o som musical característico das articulações sonoras. N o
segundo caso, relaxadas as cordas vocais, o ar se escapa sem vibrações laríngeas.
As articulações produzidas denominam-se, então, surdas.
A distinção entre sonora e surda pode ser claramente percebida na pronúncia
de duas consoantes que no mais se identificam. Assim:
/b/ [= sonoro ]
/p/ [= surdo ]
Ao sair da laringe, a corrente expiratória entra na cavidade faríngea, uma
encruzilhada, que lhe oferece duas vias de acesso ao exterior: o canal bucal e o
nasal. Suspenso no entrecruzar desses dois canais fica o véu palatino, órgão do
tado de mobilidade capaz de obstruir ou não o ingresso do ar na cavidade nasal
e, consequentemente, de determinar a natureza oral ou nasal de um som.
Quando levantado, o véu palatino cola-se à parede posterior da faringe,
deixando livre apenas o conduto bucal. A s articulações assim obtidas denomi
nam-se orais (adjetivo derivado do latim os, oris, “a boca”). Quando abaixado,
o véu palatino deixa ambas as passagens livres. A corrente expiratória então
divide-se, e uma parte dela escoa-se pelas fossas nasais, onde adquire a resso
nância característica das articulações, por este motivo, também chamadas nasais.
FONÉTICA E FONOLOGIA
(A
LARINGE E AS CAVIDADES SUPRALARÍNGEAS)
produção da fala
co
fã
co
TO
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CO
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O
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«->•
JS
3
U
'€
TO
1. Cavidade nasal
2. Palato duro
3. Véu palatino
4. Lábios
5. Cavidade bucal
6. Língua
»O
TO
O*
7.
.O
TO
C
Faringe oral
8. Epiglote
9. Abóbada palatina
10. Rinofaringe
11. Traqueia
12. Esôfago
—
»O
TO
O
»
e
13. Vértebras
14. Laringe
15. Pomo de adão
'5 l
co
a;
16. Maxilar superior
17. Maxilar inferior
0 APARELHO FONADOR
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Compare-se, por exemplo, a pronúncia das vogais:
/a/ [= oral]
/ã/ [= nasalJ
em palavras como:
lá / lã
mato / manto
É, porém, na cavidade bucal que se produzem os movimentos fonadores
mais variados, graças à maior ou menor separação dos maxilares, das bochechas
e, sobretudo, à mobilidade da língua e dos lábios.
CORDAS VOCAIS
SOM E FONEMA
Nem todos os sons que pronunciamos em português têm o mesmo valor no
funcionamento de nossa língua.
Alguns servem para diferenciar palavras que no mais se identificam.
Por exemplo, em:
erro
a diversidade de timbre (fechado ou aberto) da vogal tônica é suficiente para
estabelecer uma oposição entre substantivo e verbo.
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Na série:
dia
tia
via
fia
mia
pia
temos seis palavras que se distinguem apenas pelo elemento consonântico inicial.
Toda distinção significativa entre duas palavras de uma língua estabelecida
pela oposição ou contraste entre dois sons revela que cada um desses sons re
presenta uma unidade mental sonora diferente. Essa unidade de que o som é
representação (ou realização) física recebe o nome de fonema .
Correspondem, pois, a fonemas diversos os sons vocálicos e consonânticos
diferenciadores das palavras atrás mencionadas.
A disciplina que estuda minuciosamente os sons da fala, as múltiplas reali
zações dos fonemas, chama-se fonética.
A p a rte d a g ra m á tic a q u e e stu d a o c o m p o rta m e n to d o s fonemas n u m a lín g u a
d e n o m in a -s e fonologia , fonemática ou fonémica .
DESCRIÇÃO FONÉTICA E FONOLÓGICA
A descrição dos sons da fala ( descrição fonética ), para ser completa, deveria
considerar sempre:
a) como eles são produzidos;
b) como são transmitidos;
c) como são percebidos.
Sobre a impressão auditiva deveria concentrar-se o interesse maior da descri
ção, pois é ela que nos deixa perceber a variedade dos sons e o seu funcionamento
em representação dos fonemas. A descrição fonolOgica mal se compreende que
não seja de base acústica.
Acontece, porém, que a descrição do efeito acústico de um fonema não se
faz com termos precisos, semelhantes aos que se usam para descrever os movi
mentos dos órgãos que participam da produção de um som. Os progressos da
fonética acústica são, aliás, relativamente recentes. 1
1 Data de 1952, com o trabalho Preliminaries to Speech Analysis, de R. Jakobson, C. G.
M. Fant e M. Halle, a primeira tentativa convincente de uma classificação acústica dos
fonemas. De então para cá, a utilização de uma nova aparelhagem e, principalmente,
o esforço coordenado de foneticistas e engenheiros do som têm permitido progressos
sensíveis no particular, de que nos dão mostras as penetrantes análises acústicas de Pierre
Delattre, enfeixadas em Studies in French and Comparative Phonetics (London - The Ha
gue - Paris, Mouton, 1966), e os estudos recentes sobre a fonética portuguesa de Maria
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A fonética fisiológica, de base articulatória, é uma especialidade antiga e
muito desenvolvida, porque bem conhecidos são os órgãos fonadores e o seu
funcionamento. Daí serem os fonemas frequentemente descritos e classificados
em função das suas características articulatórias, embora se note, modemamente,
uma tendência de associar a descrição acústica à fisiológica, ou de realizá-las
paralelamente.
TRANSCRIÇÃO FONÉTICA E FONOLÓGICA
Para simbolizar na escrita a pronúncia real de um som usa-se um alfabeto
especial, o alfabeto fonético .
Os sinais fonéticos são colocados entre colchetes: [ ].
Por exemplo: ['kaw], pronúncia popular carioca, [ 'kal], pronúncia portuguesa
normal e brasileira do Rio Grande do Sul, para a palavra sempre escrita cal.
Os fonemas transcrevem-se entre barras oblíquas: / /.
Por exemplo: o fonema /s/ pode ser representado ortograficamente por s,
como em saco; por ss, como em osso; por c, como em cera; por ç, como em poço;
por x, como em próximo; e pode ser realizado como [s], no português normal de
Portugal e do Brasil, ou como [?], em regiões do Norte de Portugal e da Galiza,
conforme se disse no capítulo 2 .
ALFABETO FONÉTICO UTILIZADO
Empregamos nas nossas transcrições fonéticas, sempre que possível, o
Alfabeto Fonético Internacional. Tivemos, no entanto, de fazer certas adap
tações e acrescentar alguns sinais necessários para a transcrição de sons de
variedades da língua portuguesa para os quais não existe sinal próprio naquele
Alfabeto.*2
Raquel Delgado Martins, principalmente Aspects de /’accent en portugais. Voyelles toniques
et atones (Thèse de doctorat de troisième cycle, Strasbourg, 1977), publicada em Ham
burger Phonetische Beiträge (Hamburg, Buske Verlag, 1982), e Sept études sur la perception.
Accent et intonation du portugais (2.a ed., Lisboa, Laboratório de Fonética da Faculdade
de Letras da Universidade de Lisboa, 1983) e de Mirian Therezinha da Matta Machado,
Étude articulatoire et acoustique des voyelles nasales du portugais de Rio de Janeiro (Thèse de
doctorat de troisième cycle, Strasbourg, 1981 ). Os dois últimos trabalhos são dissertações
policopiadas.
2 Nessas adaptações e acréscimos seguimos, em geral, o alfabeto fonético utilizado pelo
grupo do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, encarregado da elaboração
do Atlas linguístico-etnográfico de Portugal e da Galiza.
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Eis o elenco dos sinais aqui adotados:
1. Vogais:
[ a ] português normal de Portugal e do Brasil: pá, gato
português normal do Brasil: pedra, fazer
[ a ] português normal de Portugal: cama, cana, pedra, fazer; português de
Lisboa: lei, lenha
português normal do Brasil: cama, cana
[ e ] português normal de Portugal e do Brasil: pé, ferro
[ e ] português normal de Portugal e do Brasil: medo, saber
português normal do Brasil: regar, sedento
[ 9 ] português normal de Portugal: sede, corre, regar, sedento
[ o ] português normal de Portugal e do Brasil: pó, cola
[ o ] português normal de Portugal e do Brasil: morro, força
português normal do Brasil: correr, morar
[ i ] português normal de Portugal e do Brasil: vir, bico
português normal do Brasil: sede, corre
[ u ] português normal de Portugal e do Brasil: bambu, sul, caro
português normal de Portugal: correr, morar
2. Semivogais:
[ j ] português normal de Portugal e do Brasil: pai, feito, vário
[ w ] português normal de Portugal e do Brasil: pau, água
3. Consoantes:
[ b ] português normal de Portugal e do Brasil: bravo (!), ambos
português normal do Brasil: boi, aba, barba, abrir
[ J3 ] português normal de Portugal: boi, aba, barba, abrir
[ d ] português normal de Portugal e do Brasil: dar (!), andar
português normal do Brasil: ida, espada
[ ò ] português normal de Portugal: dar, ida, espada
[ d’ ] português do Rio de Janeiro, de São Paulo e de extensas zonas do Brasil:
dia, sede
[d3 ] português popular do Rio de Janeiro e de algumas zonas próximas: dia,
sede
português dialectal europeu de zonas fronteiriças muito restritas: Jesus,
jaqueta
[ g ] português normal de Portugal e do Brasil: guarda (!), frango
português normal do Brasil: guarda, agora, agrado
43
44
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
[y ]
[p ]
[t ]
[ t’ ]
[tj]
[k ]
[m]
[n ]
[ji ]
[ 1]
[1]
[ X]
[r ]
[f ]
[ R]
[f ]
[V ]
[s]
[z ]
[s ]
[ %]
[0 ]
[J ]
[3 ]
português normal de Portugal: guarda, agora, agrado
português normal de Portugal e do Brasil: pai, caprino
português normal de Portugal e do Brasil: tu, canto
português do Rio de Janeiro, de São Paulo e de extensas zonas do Brasil:
tio, sete
português de extensas zonas do Norte de Portugal e de áreas não bem
delimitadas de Mato Grosso e regiões circunvizinhas, no Brasil: chave,
encher
português popular do Rio de Janeiro e de algumas zonas próximas: tio,
sete
português normal de Portugal e do Brasil: casa, porco, que
português normal de Portugal e do Brasil: mar, amigo
português normal de Portugal e do Brasil: nada, cano
português normal de Portugal e do Brasil: vinha, caminho
português normal de Portugal e do Brasil: lama, calo
português normal de Portugal e de certas zonas do Sul do Brasil: alto,
Brasil
português normal de Portugal e do Brasil: filho, lhe
português normal de Portugal e do Brasil: caro, cores, dar
português normal de várias regiões de Portugal, do Rio Grande do Sul e
outras regiões do Brasil: roda, carro
português normal de Portugal (principalmente de Lisboa), do Rio de
Janeiro e de várias zonas costeiras do Brasil: roda, carro
português normal de Portugal e do Brasil: filho, afiar
português normal de Portugal e do Brasil: vinho, uva
português normal de Portugal e do Brasil: saber, posso, céu, caça
português normal de Portugal e do Brasil: azar, casa
português de certas zonas do Norte de Portugal: saber, posso; e, noutras
zonas, também: céu, caça
português de certas zonas do Norte de Portugal: casa; e, noutras zonas,
também: azar
galego normal: céu, facer (port, fazer), caza (port, caça), azar
português normal de Portugal e do Brasil: chave, xarope
português normal de Portugal, do Rio de Janeiro e de algumas zonas
costeiras do Brasil: este
português normal de Portugal e do Brasil: já, genro
português normal de Portugal, do Rio de Janeiro e de algumas zonas
costeiras do Brasil: mesmo
FONÉTICA E FONOLOGIA
CLASSIFICAÇÃO DOS SONS LINGUÍSTICOS
Os sons linguísticos classificam-se em
vogais, consoantes
e semivogais.
VOGAIS E CONSOANTES
1. Do ponto de vista articulatório, as vogais podem ser consideradas sons for
mados pela vibração das cordas vocais e modificados segundo a forma das
cavidades supralaríngeas, que devem estar sempre abertas ou entreabertas
à passagem do ar. Na pronúncia das consoantes, ao contrário, há sempre na
cavidade bucal obstáculo à passagem da corrente expiratória.
2.
Quanto à função silábica - outro critério de distinção - cabe salientar que,
na nossa língua, as vogais são sempre centro de sílaba, ao passo que as con
soantes são fonemas marginais: só aparecem na sílaba junto a uma vogal.
SEMIVOGAIS
Entre as vogais e as consoantes situam-se as semivogais, que são os fonemas
/il e /u/ quando, juntos a uma vogal, com ela formam sílaba. Foneticamente
estas vogais assilábicas transcrevem-se [j] e [w]. Exemplificando:
Em riso ['rizu] e viu ['viw] o /i/ é vogal, mas em rei ['rej] e vário ['varju] é
semivogal. Também é vogal o /u/ em muro ['muru] e rua ['rua], mas semivogal
em meu ['mew] e quatro ['kwatru].
CLASSIFICAÇÃO DAS VOGAIS
1.
Segundo a classificação tradicional, de base fundamentalmente articulatória,
as vogais da língua portuguesa podem ser:
a) quanto à região de articulação
anteriores ou palatais
centrais ou médias
posteriores ou velares
abertas
b) quanto ao grau de abertura
semiabertas
semifechadas
fechadas
orais
c) quanto ao papel das cavidades bucal e nasal
nasais
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46
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
É de base acústica a classificação em:
[
tônicas
átonas
2. Tem-se difundido recentemente uma classificação das vogais com base em
certo número de traços que são “distintivos” numa perspectiva fonológica
ou fonemática, isto é, que apresentam características capazes por si só de
opor um segmento fônico a outro segmento fônico.
Por exemplo: o traço distintivo abertura, ligado, do ponto de vista fisiológico,
à maior ou menor elevação ou altura da língua no momento da articulação,
opõe só por si peso (substantivo) a peso (forma verbal) e a piso (substantivo ou
verbo). A presença ou a ausência de cada traço é, neste tipo de classificação,
assinalada pelos sinais matemáticos (+) e (-). Assim: /e/ de peso (verbo) será
[+ baixo], e /e/ de peso (substantivo) será [- alto], mas também [- baixo],
ao passo que li / de piso será [+ alto].
Por vezes, torna-se necessário mais do que um traço para descrever a opo
sição entre duas vogais. Por exemplo, a oposição entre /a/ de carro e /o/ de
corro implica a presença em /a/ de um traço distintivo — a maior abertura e
correlativa menor altura da língua [+ baixo] — e a ausência de outro traço,
o arredondamento dos lábios durante a articulação [- arredondado].
Os traços distintivos que devem ser considerados na classificação dos fonemas
vocálicos portugueses dependem: a) da maior ou menor elevação da língua;
b) do recuo ou avanço da região de articulação; c) do arredondamento ou
não arredondamento dos lábios.
De acordo com esta classificação, as vogais da língua portuguesa po
dem ser:
+ altas
a) quanto à maior ou menor elevação da língua
- altas
- baixas
+ baixas
b) quanto ao recuo ou avanço da articulação
+ recuadas
- recuadas
c)
quanto ao arredondamento ou não arredondamen
+ arredondadas
to dos lábios
- arredondadas
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
ARTICULAÇÃO
Dissemos que as vogais são sons que se pronunciam com a via bucal livre.
Mas, como acabamos de ver ao apresentar os vários critérios de classificação, isto
não significa que seja irrelevante para distingui-las o movimento dos diversos
órgãos articulatórios. Pelo contrário. Esses critérios baseiam-se na diversidade
de tal movimento.
Assim:
Ao elevarmos a língua na parte anterior da cavidade bucal, aproximando-a
do palato duro, produzimos a série das vogais anteriores o u palatais, o u seja
[ - recuadas]:
[e]> [e], [i].
Ao elevarmos a língua na parte posterior da cavidade bucal, aproximando-a
do véu palatino, produzimos a série das vogais posteriores o u velares, isto é,
[+ recuadas]:
[o], [o], [u].
Dentro da classificação tradicional, que considera a boca dividida em duas
regiões (anterior e posterior), as vogais [a] e [a], articuladas com a língua baixa,
em posição de repouso, são denominadas médias o u centrais. De acordo com a
classificação mais recente, devem ser incluídas entre as [+ recuadas].
Também importante como elemento distintivo na articulação das vogais é
a posição assumida pelos lábios durante a passagem da corrente de ar expirada.
Podem eles dispor-se de modo tal que formem uma saída arredondada para essa
corrente, e teremos a série das vogais [+ arredondadas]:
[o ], [ o ] , [ u ],
ou permanecer numa posição quase de repouso, e teremos a série das vogais
[ - arredondadas]:
[a], [e],[e],[i].
TIM BRE
Para a distinção do timbre das vogais - qualidade acústica que resulta de uma
composição do tom fundamental com os harmônicos - é ainda determinante, do
ponto de vista articulatório, a forma tomada pela cavidade faríngea e, sobretudo,
pela cavidade bucal, que funcionam como tubo de ressonância.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A maior largura do tubo de ressonância, provocada principalmente pela
menor elevação do dorso da língua em direção ao palato (quer duro, quer mole),
produz as vogais chamadas abertas e semiabertas [+ baixas]:
ABERTA
fa]
SEMIABERTAS
[ g ] , [ o ].
O estreitamento do tubo de ressonância, causado principalmente pela maior
elevação do dorso da língua, produz as vogais chamadas semifechadas [ - altas,
- BAIXAS] e FECHADAS [+ ALTAS] I
SEMIFECHADAS
[e], [a], [o].
FECHADAS
[iU u ].
INTENSIDADE E ACENTO
A intensidade é a qualidade física da vogal que depende da força expiratória
e, portanto, da amplitude da vibração das cordas vocais. As vogais que se en
contram nas sílabas pronunciadas com maior intensidade chamam-se tónicas,
porque sobre elas recai o acento tó n ico , que se caracteriza em português prin
cipalmente por um reforço da energia expiratória. As vogais que se encontram
em sílabas não acentuadas denominam-se átonas.
VOGAIS ORAIS E VOGAIS NASAIS
Finalmente, é de grande importância na produção e caracterização das vogais,
do ponto de vista articulatório, a posição do véu palatino durante a passagem da
corrente expiratória. Se, durante essa passagem, o véu palatino estiver levantado
contra a parede posterior da faringe, as vogais produzidas serão orais:
[i], [e], [e], [a], [o], [o], [u].
Se, pelo contrário, essa passagem se der com o véu palatino abaixado, uma
parte da corrente expiratória ressoará na cavidade nasal e as vogais produzidas
serão nasais:
[i],[e],[a],[o],[u].
FONÉTICA E FONOLOGIA
VOGAIS TÔNICAS ORAIS
Para o português normal de Portugal e do Brasil é o seguinte o quadro das
vogais orais em posição tônica:
A n t e r io r e s
ou P a l a t a is
Fechadas
Semifechadas
Semiabertas
M
ou
é d ia s
C e n t r a is
P o s t e r io r e s
ou
V
ela r es
+ altas
[u]
[i]
- altas
[a]
fe]
[e]
Aberta
to]
- baixas
+ baixas
[0]
ta]
- recuadas
+ recuadas
+ recuadas
- arredondadas
- arrendondadas
+ arredondadas
L.
—
Exemplos: l i / lê, peso (s.) /peso (v.), p é / pá, saco/soco, poça/possa, to d o /
tudo.
Observação:
No português normal do Brasil a vogal [a] só aparece em posição tônica antes
de consoante nasal. Por exemplo: cama ['kam a], cana [ 'k an a], sanha [ 's qjia]. Não
ocorre nunca em oposição a [a] para distinguir segmentos fônicos de significado
diverso. Do ponto de vista fonológico, funciona, pois, como variante do mesmo
fonema, e não como fonema autônomo.
No português europeu normal, [a], quando tônico, também aparece, na maioria
dos casos, antes de consoante nasal, a exemplo de cama, cana e sanha. Mas nessa
mesma situação tônica existe uma oposição de pequeno rendimento entre [a] e
(a]. É a que se observa, nos verbos da l.a conjugação, entre as primeiras pessoas do
plural do presente (ex.: amamos [a m am uj] e do pretérito perfeito do indicativo
(ex.: amamos [a'm am uj]). Neste caso, temos, pois, de considerar a existência de
fonemas diferentes. Além disso, no falar de Lisboa e de outras zonas de Portugal
encontra-se [a] em sílaba tônica antes de semivogal ou de consoante palatal: rei
1'raj], tenho ['tajiu], telha ['taX a].
Advirta-se, por fim, que no português de Portugal, como veremos adiante, o
fonema /a/em posição átona é normalmente realizado como [a].
VOGAIS TÔNICAS NASAIS
Além das vogais orais que acabamos de examinar - correspondentes a oito
fonemas no português normal de Portugal, e a sete no do Brasil-, possui o nosso
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
id io m a , ta n to n a su a v a ria n te p o rtu g u e s a c o m o n a b rasile ira , cin co vogais nasais,
q u e p o d e m ser assim classificadas:
A
n t e r io r e s
o u P a la t a is
Fechadas
Semifechadas
M
é d ia
ou C en tr a l
P o s t e r io r e s
ou V
ela r es
[Û]
[□ ]
+ altas
-altas
m
[«1
[Õ]
- recuadas
+ recuada
+ recuadas
- arredondadas
- arrendondada
+ arredondadas
- baixas
Exemplos: rim, senda, canta, lã, bomba, atum.
Como se vê no quadro acima, as vogais nasais da língua portuguesa são
sempre fechadas ou semifechadas. Só em variedades regionais aparecem vogais
abertas ou semiabertas como as francesas.
Observação:
Do ponto de vista fonológico ou fonemático, as vogais nasais do português
têm sido interpretadas como realizações dos fonemas orais correspondentes em
contacto com um fonema consonântico nasal, que, acusticamente, é imperceptível
ou quase imperceptível. Vejam-se J. Mattoso Câmara Jr. Para o estudo da fonêmica
portuguesa, 2.a ed. Rio de Janeiro, Padrão, 1977, p. 67-72; Jorge Morais Barbosa. Les
Voyelles nasales portugaises: interpretation phonologique. In Proceedings of the Fourth
International Congress of Phonetic Sciences. The Hague, Mouton, 1962, p. 691-708;
-------. Études de phonologie portugaise. Lisboa, Junta de Investigações do Ultramar,
1965, p. 91-104; Maria Helena Mira Mateus. Aspectos da fonologia portuguesa, 2.a
ed. Lisboa, INIC, 1982, p. 44-71 e 87-95.
VOGAIS ÁTONAS ORAIS
Em posição átona, o quadro das vogais orais do português apresenta di
ferenças consideráveis em relação à posição tônica, diferenças que, por nem
sempre coincidirem nas duas normas principais da língua, serão estudadas
separadamente.
1. No português normal do Brasil, em posição átona não final, anulou-se a
distinção entre [e] e [e], tendo-se mantido apenas [e] e [ij, na série das
vogais anteriores ou palatais; paralelamente, anulou-se a distinção entre [d]
FONÉTICA E FONOLOGIA
e [o], com o que ficou reduzida a [o] e [u] a série das vogais posteriores ou
velares.
É , p o is , o s e g u in te o q u a d r o d a s v o g a is á to n a s e m p o s iç ã o n ã o fin a l a b s o lu ta ,
p a r ti c u la r m e n te e m p o s iç ã o
A
pretônica :
n t e r io r e s
o u P a la ta is
Fechadas
M é d ia
o u C en t r a l
P o s t e r io r e s
ou
V ela r es
[i]
Semifechadas
[U]
[e]
Aberta
[0 ]
ta]
Exemplos: ligar [li'gar], legar [le'gar], lagar [la'gar], lograr [lo'grar], lugar
[lu'gar]; álamo ['alctmu], véspera ['vespera], cíclotron ['siklotron], diálogo
[di'alugu].
2. Em posição final absoluta, a série anterior ou palatal apresenta-se reduzida
a uma única vogal [i], grafada e; e a série posterior ou velar também a uma
só vogal [u], escrita o.
Temos, assim, três vogais em situação postôn ica final absoluta :
A
n t e r io r
ou P a la ta l
Fechadas
Aberta
M
é d ia
ou C e n t r a l
P o s t e r io r
ou V e l a r
tu]
[i]
ta ]
Exemplos: tarde [Tardi], povo ['povu], casa ['kaza].
3. No português normal de Portugal, em posição átona não final, também se
anulou a distinção entre [e] e [e], mas, em lugar de qualquer destas vogais
da série das anteriores ou palatais, aparece geralmente a vogal [d], média
ou central, fechada [+ alta + recuada - arredondada], realização que não
ocorre em posição tônica e é completamente estranha ao português do Brasil.
A série fica, assim, representada apenas pela vogal [i]. Por outro lado, tendo
desaparecido a distinção entre [o], [o] e [u], toda a série das vogais posteriores
ou velares está hoje reduzida a [u], grafado o ou u. Finalmente, à vogal média
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
ou central [a], aberta, corresponde a vogal também média ou central, mas
semifechada [a]3, grafada naturalmente a.
O que foi dito pode ser expresso no seguinte quadro:
A
M
n t e r io r
o u P a la t a l
Fechadas
[i]
P o s t e r io r
éd ia s
ou C e n t r a is
oü
[U]
[3]
Semifechada
V êla r
[a ]
Exemplos: ligar [li'gar], legar [la'gar], lagar [la'gar], lugar [lu'gar], lograr
[lu'grar]; álamo ['alam u ], véspera ['vejpera], diálogo [di'alugu].
4. Em posição final absoluta, a série anterior ou palatal desaparece e em seu
lugar surge a vogal já descrita [5], grafada e; e a série posterior ou velar
reduz-se à vogal [u], escrita o. Donde o quadro:
M
P o s t e r io r
é d ia
o u P a la t a is
Fechadas
[e]
Semifechada
[a]
—
1
-------- *
Exemplos: tarde
['ta rd ô ],p o v o f'p o v L i],
ou
V
ela r
[u]
1
casa ['kaza].
Observação:
Cumpre advertir que o fenômeno de redução, ou elevação, ou centralização das
vogais átonas, que afastou o português europeu do português do Brasil, é um fato
que seguramente só se generalizou em Portugal no decurso do século XVIII, embora
dele haja claros indícios em séculos anteriores.
Necessário é ainda ressaltar que algumas vogais átonas, por razões em geral rela
cionadas com a história dos sons ou com a sua posição na palavra, não sofreram esta
redução no português de Portugal. Assim aconteceu com as vogais que provêm:
a) da crase entre duas vogais idênticas do português antigo; é o caso do [a] de padeiro
(< paadeiro), do [e] de esquecer (< esqueecer), do [o] de corar (< coorar);
3 Veja-se o que dissemos sobre vogais tônicas.
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
b) da monotongação de um antigo ditongo, como o [o] que se ouve na pronúncia
normal de dourar, doutrina.
Também não se reduziram as vogais átonas de cultismos, como o [a ] de actor, o
le ] de director; o [o| de adopção, e bem assim o [o] inicial absoluto de ovelha, obter,
opinião; o [e] inicial absoluto de enorme, erguer, que se pronuncia geralmente [i], e
as vogais [a], [e], [o] protegidas por / implosivo de altar, delgado, soldado, colchão,
Setúbal e amável.
Finalmente, também não sofreram, em geral, redução as vogais tônicas de
palavras simples nos vocábulos delas derivados, particularmente com os sufixos
-mente ou -inho (-zinho): avaramente, brevemente, docilmente, docemente, pezinho,
avezinha, amorzinho. Comparem-se, no entanto, casinha, mesinha, folhinha, com
la ), [a] e (u).
CLASSIFICAÇÃO DAS CONSOANTES
1. As consoantes da língua portuguesa, em número de dezenove, sâo tradicio
nalmente classificadas em função de quatro critérios, de base essencialmente
articulatória:
oclusivas
a) quanto ao modo de articulação, em
fricativas
constritivas
laterais
vibrantes
bilabiais
labiodentais
b) quanto ao ponto de articulação, em
linguodentais
alveolares
palatais
velares
c)
quanto ao papel das cordas vocais, em
surdas
sonoras
d) quanto ao papel das cavidades bucal e nasal, em
orais
nasais
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2. Recentemente, porém, difundiu-se, como para as vogais, outro sistema de
classificação, com base em certos traços distintivos.
Os traços que se têm em conta neste sistema relacionam-se também com
características da articulação, mas nem sempre coincidem com os que estão
na base da classificação anterior.
Segundo o novo sistema classificatório, as consoantes podem ser:
[+ contínuas]
a) quanto ao modo de articulação
[- contínuas]
[+ laterais]
[- laterais]
[+ anteriores]
b) quanto à zona de articulação
[- anteriores]
[+ coronais]
[- coronais]
c)
quanto ao papel das cordas vocais
[+ sonoras]
[- sonoras]
d) quanto ao papel das cavidades bucal e nasal
[+ nasais]
[- nasais]
É de base mais acústica do que articulatória a classificação:
e) quanto ao efeito acústico mais ou menos
próximo ao de uma vogal
[+ soante]
[- soante]
MODO DE ARTICULAÇÃO
A articulação das consoantes não se faz, como a das vogais, com a passagem
livre do ar através da cavidade bucal. Na sua pronúncia, a corrente expiratória
encontra sempre, em alguma parte da boca, ou um obstáculo total, que a in
terrompe momentaneamente, ou um obstáculo parcial, que a comprime sem,
contudo, interceptá-la. No primeiro caso, as consoantes dizem-se oclusivas o u
[ - continuas ]; no segundo, constritivas o u [+ contínuas ].
São oclusivas as consoantes [p], [b], [t], [d], [k], [g]: pala, bala, tala, dá-la,
cala, gala.
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Entre
as
constritivas ,
distinguem-se as:
1. F ricativas, c a ra c te riz a d a s p ela p assag em d o a r atrav és d e u m a e stre ita fen d a
fo rm a d a n o m e io da v ia b u c a l, o q u e p r o d u z u m r u íd o c o m p a rá v e l ao de
u m a fricção.
São fricativas as consoantes [f], [v], [s], [z], [J], [3]: fala, vala, selo {passo,
céu, caça,próximo), zelo {rosa, exame), xarope {encher), já {gelo).4
2. L aterais, caracterizadas pela passagem da corrente expiratória pelos dois
lados da cavidade bucal, em virtude de um obstáculo formado no centro
desta pelo contacto da língua com os alvéolos dos dentes ou com o palato.
São laterais as consoantes [1] e [X]: fila, filha.
3. V ibrantes, cara c te riz a d a s p elo m o v im e n to v ib ra tó rio rá p id o d e u m ó rg ão
ativ o elástico (a lín g u a o u o v éu p a la tin o ), q u e p ro v o c a u m a o u v árias b r e
v íssim as in te rru p ç õ e s d a p assag em d a c o rre n te e x p ira tó ria .
São vibrantes as consoantes [r] e [f] ou [r]: caro, carro.
O bservação:
Do ponto de vista acústico, as consoantes laterais e vibrantes têm em comum
um traço que as opõe a todas as outras consoantes: a sua maior proximidade dos sons
vocálicos, o que, em certas línguas, chega a ponto de poderem servir de centro de
sílaba. Esta qualidade, reconhecida desde tempos antigos, trouxe-lhes as denominações
de líquidas ou soantes. A fonética moderna atribui-lhes o traço distintivo [+ soan
tes ]. Acresce salientar que, pelo caráter lateral de sua articulação, [1] e [A] opõem-se
às vibrantes [r], [f] ou [ r]. Esta diferença explicita-se pela indicação [+ lateral]
para [1] e [A], que contrasta com a de [ - lateral] para as vibrantes [r], [f ] ou [ r ].
O PONTO OU ZONA DE ARTICULAÇÃO
O obstáculo (total ou parcial) necessário à articulação das consoantes pode
produzir-se em diversos lugares da cavidade bucal. Daí o conceito de pon to de
articulação , s e g u n d o
o q u a l as c o n so a n te s se classificam em :
1. B ilabiais, formadas pelo contacto dos lábios. São as consoantes [p], [b], [m]:
pato, bato, mato.
2. L abiodentais, formadas pela constrição do ar entre o lábio inferior e os dentes
incisivos superiores. São as consoantes ff], [v]:faca, vaca.
Como dissemos, na pronúncia normal de Portugal, do Rio de janeiro e de alguns pontos
da costa do Brasil, a fricativa palatal surda [J] aparece em formas como três e dez, e a
sonora [3 ] em formas como desde e mesmo.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
3. L inguodentais ( o u dorsodentais), formadas pela aproximação do pré-dorso
da língua à face interna dos dentes incisivos superiores, ou pelo contacto
desses órgãos. São as consoantes [s], [z], [t], [d]: cinco, zinco, tardo, dardo.
4.
formadas pelo contacto da ponta da língua
com os alvéolos dos dentes incisivos superiores. São as consoantes [n], [1],
[r], [f ]: nada, cala, cara, carro (na pronúncia de certas regiões de Portugal e
do Brasil).
A lveolares ( o u
á pic o - alveolares),
5. P alatais, formadas pelo contacto do dorso da língua com o palato duro, ou
céu da boca. São as consoantes [J], [3 ], [À], [ji]: acho, ajo, alho, anho.
6 . V elares,
formadas pelo contacto da parte posterior da língua com o palato
mole, ou véu palatino. São as consoantes [k], [g], [r ]: calo,galo, ralo.
Se considerarmos a zona em que se situam o contacto ou a constrição que
caracterizam a consoante, a classificação com base nos traços distintivos será
a seguinte:
1 . C onsoantes [+ anteriores], formadas na zona anterior da cavidade bucal:
fp], [b], [f], [v], [m], [t], [d], [s], [z], [n], [1], [r] e [f];
2. C onsoantes [ - anteriores], fo rm a d a s n a z o n a p o s te rio r da cav id ad e bu cal:
m . [3], tp], m , w s
3. C onsoantes [+ coronais ], formadas com a intervenção da “coroa”, ou seja,
do dorso (pré-dorso, médio dorso) da língua: [t], [d], [s], [z], [J], [3 ], [n],
Ui], 11], Í K [r];
4. C onsoantes [-
coronais ],
fo rm a d a s sem a in te rv e n ç ã o d o d o rso d a lín g u a:
[ p ] ,[ b ] ,[ m ] , [k], [g], [f], [v], [ r ].
O PAPEL DAS CORDAS VOCAIS
Enquanto as vogais são normalmente sonoras (só excepcionalmente apare
cem ensurdecidas), as consoantes podem ser ou não produzidas com vibração
das cordas vocais.
São surdas ( - sonoras] as consoantes: [p], (t], [k], [f], [s], [J].
São sonoras [+ sonoras] as consoantes: [b], [d], [g], [v], [z], [3 ], [1], [X], [r],
[f], M, [m], [n], t|l].
FONÉTICA E FONOLOGIA
O PAPEL DAS CAVIDADES BUCAL E NASAL
Como as vogais, as consoantes podem ser orais [ - nasais] o u nasais [+ nasais].
Por outras palavras: na sua emissão, a corrente expiratória pode passar apenas
pela cavidade bucal, ou ressoar na cavidade nasal, caso encontre abaixado o
véu palatino.
São nasais as consoantes [m], [n], [ji]: amo, ano, anho.
Todas as outras são orais .
Observação:
Quanto ao modo de articulação (bucal), as consoantes nasais são oclusivas [ continuas]. Atendendo, no entanto, à forte individualidade que lhes confere o seu
traço nasal, costuma-se isolá-las das outras oclusivas, tratando-as como classe à parte.
QUADRO DAS CONSOANTES
Resumindo, podemos dizer que o conjunto das consoantes da língua por
tuguesa é constituído por dezenove unidades, cuja classificação se expõe esque
maticamente no quadro seguinte:
Pa p r
O rais
das cavidades
BUCAL E NASAL
[-
N asais
[+ nasais]
nasais ]
C o n s t r it iv a s
M odo
de
ARTICULAÇÃO
P a pel
das
CORDAS VOCAIS
[+contínuas]
O c lu s iv a s
[- contínuas]
S u rd a s
S o noras
F r ic a t iv a s
[- soantes]
[- laterais]
S o noras
S u rd a s
Ponto ou zona de
articulação
[+soantes] [+soantes]
[+laterais] [- laterais]
S o n o ras
S o n o ras
[-contínuas]
S onoras
[+sonoras]
r
[m]
[b]
[pi
[- coronais]
Labiodentais
'
[+ anteriores]
[f]
[v]
[s]
[z]
[- coronais]
Linguodentais
[+ anteriores]
V ibrantes
Laterais
[-sonoras] [+sonoras] [-sonoras] [+sonoras] [+sonoras] [+sonoras]
Bilabiais
[+ anteriores]
O c lu s iv a s
it]
[d ]
[+ coronais]
■
57
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
1—-—
P apel das cavidades
—• Jt
O rais
-- --------------------------
N asais
[+nasais]
[-nasais]
BUCAL E NASAL
C o n stritivas
M odo
Pa pel
[+ contínuas]
O c lu s iv a s
de
[- contínuas]
ARTICULAÇÃO
S u rd as
das
Sonoras
F r ic a t iv a s
[- soantes]
[- laterais]
Surdas
Sonoras
La ter a is
O c lu s iv a s
V ibran tes
[+soantes] [+soantes]
[+laterais] [-laterais]
Sonoras
Sonoras
Sonoras
[- sonoras] [+sonoras] [-sonoras] [+sonoras] [+sonoras] [+sonoras]
uc '■5 ! i
CORDAS VOCAIS
Alveolares
[+ anteriores]
Ponto ou zona de
articulação
58
[1]
[r]
[n]
[+ coronais]
Palatais
[- anteriores]
LSI
W
(3]
[+ coronais]
Velares
[- anteriores]
[kl
„
[g]
[R]
[- coronais]
Observações:
l.a) Neste quadro, procuramos integrar a classificação por traços distintivos e a
classificação tradicional de base articulatória. Para se fazer a análise em traços dis
tintivos de qualquer som consonântico do português, bastará juntar os vários traços
associados no quadro à sua classificação articulatória corrente.
Por exemplo: as consoantes fp] e [b] serão analisadas deste modo:
~- continu a- sonora
. -nasal
+ anterior
- coronal
[b]
contínuá+ sonora
- nasal
+ anterior
- coronal
[X]
+ contínua
+ soante
+ lateral
- nasal
- anterior
+ coronal
e as consoantes [1] e [X], do seguinte:
-I- contínua
+ soante
+ lateral
-nasal
+ anterior
+ coronal
FONÉTICA E FONOLOGIA
2.
a) Classificamos a vibrante forte ou múltipla [R] como velar ou [ - anterior,
- coronal], por ser esta a sua pronúncia mais corrente no português de Lisboa5e do
Rio de Janeiro6. A antiga vibrante alveolar múltipla [f ] mantém-se, no entanto, viva
na maior parte de Portugal e em extensas zonas do Brasil, como, por exemplo, o Rio
Grande do Sul. Uma realização dorso- uvúlar múitipia ocorre também por vezes em
Lisboa e no português popular do Rio de Janeiro. Aponte-se, por fim, a realização
ungúopalatal velarizada, que se observa na região Norte de São Paulo, Sul de Minas
e outras áreas do Brasil7 e é conhecida por r-caipira. Em Portugal é característica da
fala popular de Setúbal, não só a realização vibrante uvuijvr do r múltiplo de rua,
carro, como a do r simples de caro, andar.
3.
a) Na pronúncia normal do português europeu, a consoante /, quando final
de sílaba, é velarizada; a sua articulação aproxima-se, pelo recuo da língua, à de um
[u] ou [w]. Na transcrição fonética, é costume distinguir este / do / inicial de sílaba,
representando-se o último por [1] e a consoante velarizada por [t]: lado ['laõu],alto
[alitu ], mal [m a i]. Na pronúncia normal do Rio de Janeiro e de vastas zonas do
Brasil, por perder-se o contacto entre os órgãos da articulação, o / final de sílaba
vocaliza-se, ou seja, transforma-se na semivogal [w]: alto ['awtu], mal ['maw].
Anulam-se, deste modo, as oposições entre alto / auto, mal / mau.
4.
a) No português do Brasil, as consoantes t e d, antes de i vogal ou semivogal,
sofrem a sua influência e palatalizam-se em grau maior ou menor, conforme as re
giões e até as pessoas de cada região. Podem ser pronunciadas [t’], [d’], ou realizar-se
como africadas palatais [tj] e [d3]: noite f'nojt’i] ou ['nojtji], tio [Yiju] ou ['tjijuj,
dia ['d’ija] ou f'd3ija],ódio ['od’ju| ou f'od3ju], sede ['sed’i] ou ['sed3ij.
A POSIÇÃO DAS CONSOANTES
Só em posição intervocálica é possível encontrar as dezenove consoantes
portuguesas que acabamos de descrever e classificar. Noutras posições, o número
de consoantes possíveis reduz-se sensivelmente.
Pode-se dizer mesmo que é a pronúncia mais corrente no português normal contemporâ
neo, ao contrário do que sucedia há poucos anos, segundo a descrição dos foneticistas.
6 É a pronúncia normal do Rio de Janeiro e de extensas áreas do país. Sobre o assunto, leiase a importante contribuição de Dinah Maria Isensee Callou: Variação e distribuição da
vibrante na fala urbana culta do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1979 (Tese de doutorado
policopiada).
O professor Brian F. Head vem estudando, ultimamente, a vitalidade do r-caipira em
várias regiões do Brasil. Leiam-se, a propósito, os seus trabalhos: O estudo do “r-caipira”
no contexto social. Revista de Cultura Vozes: 67(8): 43-49, ano 67,1973; Subsídios do Atlas
prévio dos falares baianos para o estudo de uma variante dialetal controvertida (texto policopiado).
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Assim, em posição inicial de palavra, além das consoantes oclusivas e frica tivas, só aparecem: das laterais, o [1]; das vibrantes , o [ r ] o u o[f]; das nasais, o
[m ]eo [n ]. São casos isolados os de empréstimos, principalmente do espanhol,
em que ocorrem [X] ou [)i]: lhano, lhama, nhato.
Em posição final de sílaba ou de palavra, só se encontram normalmente as
consoantes:
a) /, a que correspondem as pronúncias atrás mencionadas [i] ou [w];
b) r, a qUe corresponde, nas pronúncias normais de Portugal e do Brasil, o
[r] simples apical, algumas vezes perdido na pronúncia popular brasileira,
quando em final absoluta;
c) s ou z {esta só em final de palavra), a que correspondem, na pronúncia normal
de Portugal, na do Rio de Janeiro e de outras zonas costeiras do Brasil, as
realizações [J], em posição final absoluta ou se se lhes segue uma consoante
surda, e [3 ], se antepostas a uma consoante sonora.
As grafias m e n nesta posição representam normalmente apenas a nasalidade
da vogal anterior.
Outras consoantes podem ainda aparecer em final de sílaba ou de palavra,
principalmente em formas cultas ou estrangeiras (por exemplo: ritmo, apto,
club, chic). Manifesta-se, então, particularmente no português do Brasil, uma
tendência para apoiar a sua articulação numa breve vogal epentética ou paragógica (por exemplo: ['ritimu], ['apitu], ['klubi], ['jikij. Paralelamente, é possível
encontrar, em final absoluta de palavras cultas, a articulação ápico-alveolar da
consoante n: abdômen, dólmen, regímen.
ENCONTROS VOCÁLICOS
D ITO N GO S
O encontro de uma vogal + uma
vogal recebe o nome de d it o n g o .
Os ditongos podem ser:
semivogal , o u
de uma
semivogal
+ uma
a ) DECRESCENTES e CRESCENTES;
b ) ORAIS e NASAIS.
D ito n g o s d e c re s c e n te s e c re s c e n te s
Quando a vogal vem em primeiro lugar, o
cen te . Assim:
pai
céu
d ito n g o
m u ito
se denomina
decres
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Quando a semivogal antecede a vogal, o
qual
linguiça
d ito n g o
diz-se crescente . Assim:
frequente
Em português apenas os decrescentes são ditongos estáveis. Os ditongos crescen
tes aparecem com frequência no verso. Mas na linguagem do colóquio normal
só apresentam estabilidade aqueles que têm a semivogal [w] precedida de [k]
(grafado q) ou de [g]. Assim:
quase
equestre
quota
igual
goela
quiproquó
quando
lingueta
tranquilo
enxaguando
quinquênio
saguiguaçu
D ito n g o s o ra is e n a s a is
Como as vogais, os d ito n g o s podem ser orais e
oral ou nasal dos seus elementos.
nasais ,
segundo a natureza
1. São os seguintes os ditong os orais decrescentes :
[ aj ] pai
[ aj ] sei, no português normal de Portugal
[aw] mau
[ ej ] sei, no português normal do Brasil
[ ej ] papéis
[ew] meu
[ew] céu
[iw] viu
[ oj ] boi
[ oj ] herói
[ uj ] azuis
Observações:
1.
a) Nem na pronúncia normal de Portugal nem na do Brasil se conserva o antigo
ditongo [ow], que ainda se mantém vivo em falares regionais do Norte de Portugal e
no galego. Na pronúncia normal reduziu-se a [o|, desaparecendo assim a distinção
de formas como poupa / popa, bouba / boba.
2.
a) No português do Rio de Janeiro e de algumas outras regiões do Brasil,
devido à vocalização do l em final absoluta ou em final de sílaba, ouvem-se os di
tongos [ow] e [owj em palavras como gol ['gow], soltar [sow'tar],sol ['sowj, molde
1'môwdi].
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
3.«) Normalmente, se representam por i e u as semivogais dos ditongos orais.
Observe-se, porém, que:
a) as l.a, 2.a e 3.a pessoas do singular do presente do subjuntivo, bem como a 3.a
pessoa do singular do imperativo dos verbos terminados em -oar escrevem-se
com -oe, e não -oi:
abençoe
amaldiçoes
perdoe
b) as mesmas pessoas dos verbos terminados em -uar escrevem-se com -ue, e não -ui:
cultue
habitues
preceitue
2. Existem os seguintes ditong os nasais decrescentes :
[ aj ]
correspondente às grafias ãe, ãi e, no português normal de Portugal,
em (em posição final absoluta) e en (no interior de palavras derivadas):
mãe, cãibra; no português normal de Portugal: vem, levem, benzinho.
[ cew ] correspondente às grafias ão e am: mão, vejam.
[ èj 1
correspondente, no português do Brasil e em falares meridionais de
Portugal, às grafias em (em posição final de palavra) e en (no interior
de palavras derivadas): vem, levem, benzinho.
[ õj ] correspondente à grafia õe: põe, sermões.
[ üj ] correspondente à grafia ui: muito.
TR ITO N G O S
Denomina-se t r it o n g o o encontro formado de semivogal + vogai. + semivo gal . De acordo com a natureza (oral ou nasal) dos seus componentes, classifi
cam-se também os trito n g o s em orais e nasais.
1. São TRITONGOS ORAIS:
[ waj ] Uruguai
[ waj ] enxaguei, no português normal de Portugal
[ wej ] enxaguei, no português normal do Brasil e em falares meridionais de
Portugal.
[ wiw ] delinquiu
2. São TRITONGOS NASAIS:
[ wõw ] correspondente às grafias uão, uam: saguão, enxáguam.
[ wõcj ] correspondente, no português normal de Portugal, à grafia nem (em
posição final de palavra): delinquem.
FONÉTICA E FONOLOGIA
[ wêj ]
correspondente, no português normal do Brasil e em falares meridionais
de Portugal, à grafia uem (em posição final de palavra): delinquem.
[ wòj ] correspondente à grafia uõe: saguões.
HIATOS
Dá-se o nome de h ia t o ao encontro de duas vogais. Assim, comparando-se
as palavras pais (plural de pai) epaís (região), verificamos que:
a) na primeira, o encontro ai soa numa só sílaba: ['pajJJ.
b) na segunda, o a pertence a uma sílaba e o i a outra: [pa'ij].
O bservação:
Quando átonos finais, os encontros escritos - ia , - ie , - io , - oa , - ua , -u e e -ao são
normalmente d it o n g o s c r e s c e n t e s : gló - ria , cá - rie , vá - rio , niá - goa , á - g u a , tê- m ie ,
ár - duo . Podem, no entanto, ser emitidos com separação dos dois elementos, forman
do assim um h ia t o : gló - rí - a , cá - ri- e, vá - ri - o, etc. Ressalte-se, porém, que na escrita,
em hipótese alguma, os elementos desses encontros vocálicos se separam no fim da
linha, como salientamos no capítulo 4.
EN CO N TRO S IN T R A V E R B A IS E IN T E R V E R B A IS
Os e n c o n t r o s vocAucos podem ocorrer no interior do vocábulo ou entre dois
vocábulos, isto é , podem ser in t r a v e r b a is (= in t r a v o c a b u l a r e s ) o u i n t e r v e r b a i s
( = in t e r v o c a b u l a r e s ) .
Há e n c o n t r o s absolutamente estáveis. Assim, quer no verso, quer na prosa,
a palavra lua possuirá sempre duas sílabas, ao passo que as palavras mau e quais
terão invariavelmente uma. O hiato [ua], da primeira, bem como o ditongo [aw],
da segunda, e o tritongo [wajj, da terceira, são, pois, as únicas pronúncias que
a língua admite para tais e n c o n t r o s nessas palavras.
Muitos, porém, são instáveis. Por exemplo: numa pronúncia normal, as
palavras luare reais são dissílabos: [lu'ar], [Ri'ajJ]. Emitidas rapidamente, po
dem elas, no entanto, passar a monossílabos pela transformação do hiato [ua]
no ditongo [wa] e pela criação do tritongo [jaj]. Por outro lado, palavras como
vaidade e saudade, trissílabos na língua viva atual, costumam aparecer no verso
com quatro sílabas métricas.
À passagem de um hiato a ditongo no interior da palavra dá-se o nome de
siN ÉR ES E. E chama-se d ié r e s e o fenômeno contrário, ou seja, a transformação de
um ditongo normal em hiato.
Quando a ditongação do hiato se verifica entre vocábulos, diz-se que há
SINALEFA.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Esses fenômenos têm importância particular no verso, e deles tratamos com
o necessário desenvolvimento no capítulo 22.
ENCONTROS CONSONANTAIS
Dá-se o nome de encontro consonantal ao agrupamento de consoantes num
vocábulo. Entre os encontros consonantais, merecem realce, pela frequência com
que se apresentam, aqueles inseparáveis cuja segunda consoante é / ou r.
Assim:
E n c o n tro
E x e m p l if ic a ç ã o
CONSONANTAL
E x e m p l if ic a ç ã o
E n c o n tro
CONSONAN1AL
bl
bloco,
abluir
gi
glutão,
aglutinar
br
branco,
rubro
gr
grande,
regra
cl
claro,
tecla
pi
plano,
triplo
cr
cravo,
Acre
pr
prato,
sopro
dr
dragão,
vidro
tl
t
atlas
fl
flor,
rufiar
tr
tribo,
atrás
fr
francês,
refrão
vr
»
E nco ntros
consonantais
palavra
como gn, rnn, pn, ps, pt, tm e outros não apare
cem em muitos vocábulos.
Quando iniciais, são naturalmente inseparáveis:
gno-mo
mne-mô-ni-co
pneu-má-ti-co
psi-có-lo-go
pti-a-li-na
tme-se
Quando mediais, em pronúncia tensa, podem ser articulados numa só süaba,
ou em sílabas distintas:
a-pto
ap-to
di-gno
dig-no
ri-tmo
rit-mo
Na linguagem coloquial brasileira há, porém, como dissemos, uma acentuada
tendência de destruir estes encontros de difícil pronúncia pela intercalação da
vogal i (ou e):
dí-gui-no
pe-neu
rí-ti-mo
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Não raro, temos de admitir a existência desta vogal epentética, embora não
escrita, para que versos de poetas brasileiros conservem a regularidade. Por
exemplo, nestes setissílabos:
Deixa-me ouvir teus cantores,
Admirar teus verdores.
(Gonçalves Dias, PCPE, 376.)
A tua carne não fremia
A ideia da dança inerte
Que teu corpo dançaria
No pélago submerso?
(V. de Moraes, PCP, 342.)
as palavras admirar e submerso devem ser emitidas em quatro sílabas (a-dimi-rar e su-bi-mer-so) para que os versos a que pertencem mantenham aquela
medida.
DÍGRAFOS
Não é demais recordar ainda uma vez que não se devem confundir c o n so
antes e vocais com letras , que são sinais representativos daqueles sons.
Assim, nas palavras carro, pêssego, chave, malho e canhoto não há e n
c o n t r o c o n so n a n ta l , pois as letras r r , ss, ch, lh e nh representam uma só
consoante. Também não se pode afirmar que exista e n c o n t r o c o n so n a n ta l
em palavras como campo e ponto, embora a análise de palavras como estas,
em fonética experimental, revele a existência de um resíduo de consoante
nasal imperceptível ao ouvido; o m e o n funcionam portanto nelas essen
cialmente como sinal de nasalidade da vogal anterior, equivalendo, no caso,
a um til (cãpo, põto).
A esses grupos de letras que simbolizam apenas um som dá-se o nome de
DÍGRAFOS.
São DÍGRAFOS, pois:
a) ch, que simboliza a palatal [J] também representada por x: ficha (compare-se
com lixa);
b) lh e nh, únicas formas de representar na língua a lateral [A] e a nasal palatal
[)i]: velho, tenho;
c) rr e ss, que só se empregam entre letras-vogais para representar os mes
mos sons ( [ r ] ou [r] e [s]) que se escrevem com r e s simples no início de
palavra: prorrogar (compare-se com rogar), assimetria (comparece-se com
simetria).
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Entre os dígrafos devem ainda ser incluídas as combinações de letras:
a) gu e qu antes de e e i, quando representam os mesmos sons oclusivos que se
escrevem, respectivamente, ge c antes de a, o e u: guerra, seguir (comparar
a: galo, gole, gula); querer, quilo (comparar a: calar, cobre, cubro);
b) sc, sç e xc, que, entre letras-vogais, podem representar, no português normal
do Brasil e no de algumas regiões de Portugal, o mesmo som que se transcreve
também por c ou ç: florescer (comparar a: amanhecer), desça (comparar a:
pareça), exceder (comparar a: preceder);
c) am, an, em, en, im, in, om, on, um, un, que servem para representar as vogais
nasais: tampo, tanto, tempo, tento, limbo, lindo,pombo, tonto, comum, mundo.
SÍLABA
Quando pronunciamos lentamente uma palavra, sentimos que não o fazemos
separando um som de outro, mas dividindo a palavra em pequenos segmentos
fônicos que serão tantos quantos forem as vogais. Assim, uma palavra como
alegrou,
não será por nós emitida
a-l-e-g-r-o-u
mas sim:
a-le-grou
A cada vogal ou grupo de sons pronunciados numa só expiração damos o
nome de sílaba .
A sílaba pode ser formada:
a) por uma vogal, um ditongo ou um tritongo:
é
eu
uai!
b) por uma vogal, um ditongo ou um tritongo acompanhados de consoantes:
a-plau-dir
trans-por
U-ru-guai
SÍLABAS ABERTAS E SÍLABAS FECHADAS
1. Chama-se
aberta
a-pa-ga-do
a sílaba que termina por uma vogal:
FONÉTICA E FONOLOGIA
2. Diz-se fechada a sílaba que termina por uma consoante:
al-tar
op-tar
CLASSIFICAÇÃO DAS PALAVRAS QUANTO
AO NÚMERO DE SÍLABAS
Quanto ao número de
sílabas,
classificam-se as palavras em
monossílabas ,
DISSÍLABAS, TRISSÍLABAS e POL1SSÍLABAS.
M onossílabas, q u a n d o c o n s titu íd a s de u m a só sílaba:
a
ti
eu
g ro u
m ão
q u ais
D issílabas, q u a n d o c o n stitu íd a s de d u a s sílabas:
ru -a
á -g u a
h e -ró i
li-v ro
sa-g u ão
s o -n h a r
T rissílabas, q u a n d o c o n stitu íd a s d e trê s sílabas:
a-lu-no
cri-an-ça
P o L issíL A B A S ,
Eu-ro-pa
por-tu-guês
ban-dei-ra
en-xa-guou
quando constituídas de mais de três sílabas:
e s -tu -d a n -te
li-b e r-d a -d e
u -n i-v e r-s i-d a -d e
e m -p re -e n -d i-m e n -to
O bservação:
Embora a sua unidade seja normalmente percebida pela competência linguística
dos usuários de um idioma, a sílaba não é uma noção caracterizada de modo pacífico
pelos foneticistas. Uma breve introdução à problemática da sílaba pode ler-se em
Bohuslav Hála. La sílaba: su naturaleza, su origen y sus transformaciones. Trad. de E.
R. Palavecino y A. Quilis. Madrid, C.S.I.C., 1966.
ACENTO TÔNICO
Examinemos este período de Raul Bopp:
Dias e noites os horizontes se repetem.
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
N ele d istin g u im o s , n u m a an álise fo n é tic a e le m e n ta r, as sílabas acentuadas
(em n e g rito ) das inacentuadas (e m ro m a n o ).
A p e rc e p ç ã o d is tin ta das sílab as a c e n tu a d a s (tô n ic a s ) d a s in a c e n tu a d a s
(á to n a s) p ro v é m d a d o sag em m a io r o u m e n o r de certas q u a lid a d e s físicas que,
v im o s, c a ra c te riz a m os so n s d a fala h u m a n a :
a) a intensidade, isto é, a fo rça e x p ira tó ria c o m q u e são p ro n u n c ia d o s;
b ) o tom (o u a ltu ra m u sic a l), isto é, a fre q u ê n c ia c o m q u e v ib ra m as co rd as
vocais em su a em issão;
c) o timbre (o u m e ta l d e voz), isto é, o c o n ju n to s o n o ro d o to m fu n d a m e n ta l
e d o s to n s se c u n d á rio s p ro d u z id o s pela re sso n â n c ia d a q u e le n a s cavidades
p o r o n d e passa o ar;
d ) a quantidade, isto é, a d u ra ç ã o c o m q u e são em itid o s.
A ssim , p e la intensidade , o s so n s p o d e m s e r fortes (tô n ic o s ) o u fracos
( á to n o s ) ; p e lo to m , s e rã o agudos (a lto s ) o u graves (b a ix o s); p e lo timbre ,
ABERTOS OU FECHADOS; pela QUANTIDADE, LONGOS OU BREVES.
Em geral, p o ré m , esses e lem en to s estão in tim a m e n te associados, e o c o n ju n to
deles, c o m p re d o m in â n c ia da in te n sid a d e , d o to m e da q u a n tid a d e , é q u e se
c h a m a acento tônico .
Observações:
1.
a) Tanto a Nomenclatura Gramatical Brasileira como a Nomenclatura Gramatical
Portuguesa classificam as sílabas, quanto à intensidade, em t Onicas, subtõnicas e
Atonas ( pretònicas e postOnicas). Pela nomenclatura aconselhada nos dois países,
tom é, pois, o mesmo que acento de intensidade. Cabe advertir, no entanto, que,
se na maioria dos casos os dois elementos vêm unidos, por vezes eles não coincidem.
“Na linguagem, como na música, qualquer som, seja agudo ou grave, pode tornar-se
forte ou débil, segundo convenha” (Navarro Tomás. Manual deprominciación espanola,
14.a ed., Madrid, C.S.I.C., 1968, p. 25, nota 1).
2.
a) A quantidade longa ou breve das vogais, fundamental em latim, não tem
valor distintivo em português. Os contrastes que nos oferecem, numa pronúncia
tensa, pares de formas como caatinga / catinga, coorte / corte explicam-se não pela
oposição de quantidade vocálica, mas pela de duas vogais em face de uma vogal. Sobre
fenômeno semelhante em espanhol, veja-se A. Quilis. Phonologie de la quantité en
espagnol. Phonetica, 13:82-85,1965.
Em nosso idioma, como nas demais línguas românicas, a duração maior de uma
vogal é recurso de ênfase, e está condicionada pelo acento, pelo contexto fonético ou
por múltiplas razões de ordem afetiva.
FONÉTICA E FONOLOGIA
CLASSIFICAÇÃO DAS PALAVRAS QUANTO AO ACENTO TÔNICO
1. Quanto ao acento, as palavras de mais de uma sílaba classificam-se em oxtTONAS, PAROXÍTONAS e PROPAROXÍTONAS.
O xítonas, q u a n d o o a c e n to recai n a ú ltim a sílaba:
café
funil
Niterói
P aroxítonas, q u a n d o o a c e n to recai n a p e n ú ltim a sílaba:
b a ía
escola
r e to m o
P roparoxítonas, q u a n d o o a c en to recai n a a n te p e n ú ltim a sílaba:
e x é rc ito
p ê n d u lo
q u ilô m e tro
2. Quando se combinam certas formas verbais com pronomes átonos, formando
um só vocábulo fonético, é possível o acento recuar mais uma sílaba. Diz-se
bisesdrüxula a acentuação dessas combinações:
a m á v a m o -lo
faç a -se -lh e
3. O s monossílabos p o d e m ser átonos ou tônicos .
são aqueles pronunciados tão fracamente que, na frase, precisam
apoiar-se no acento tônico de um vocábulo vizinho, formando, por assim
dizer, uma sílaba deste. Por exemplo:
Á tonos
Diga-me / o preço / do livro.
São monossílabos átonos:
as) e o in d e fin id o (um, uns);
os pronomes pessoais oblíquos me, te, se, o, a, lhe, nos, vos, os, as, lhes e suas
combinações: mo, to, lho, etc.;
o pronome relativo que;
as p rep o siçõ es a, com, de, em, por, sem, sob;
as combinações de preposição e artigo: à, ao, da, do, na, no, num, etc.;
as conjunções e, mas, nem, ou, que, se;
as formas de tratamento dom, frei, são, seu (= senhor).
a) o a rtig o d e fin id o (o, a , os,
b)
c)
d)
e)
f)
g)
T ônicos são aqueles emitidos fortemente. Por terem acento próprio, não
necessitam apoiar-se noutro vocábulo. Exemplos: cá, flor, mau, mão, mês,
mim, pôr, vou, etc.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
OBSERVAÇÕES SOBRE A PRONÚNCIA CULTA
1. A ten te-se n a ex a ta p r o n ú n c ia das seg u in tes p alav ras, p a ra e v ita r u m a silabada, q u e é a d e n o m in a ç ã o q u e se dá ao e rro d e p ro só d ia :
a) sãooxíTONAs:
aloés
G ib ra lta r
N o b el
novel
recém
refém
su til
u re te r
efebo
e ru d ito
esta lid o
êx u l
fila n tro p o
gólfão
grácil
g ra tu ito (ú i)
hosana
H u n g ria
ib e ro
in a u d ito
leu cem ia
m a q u in a ria
m a tu la
m is a n tro p o
m e rc a n c ia
m e n ú fa r
N o rm a n d ia
o n a g ro
o p im o
pegada
p le to ra
p o lic ro m o
p u d ic o
q u iro m a n c ia
refrega
ru b ric a
S alo n ica
tá ctil
têx til
T ib u lo
tu lip a
a re ó p a g o
a ríe te
a rq u é tip o
a u tó c to n e
azáfam a
az ê m o la
b áteg a
b áv aro
b íg a m o
b ím a n o
b ó lid o (-e)
b râ m a n e
cáfila
cânham o
C é rb e ro
c o tilé d o n e
é d ito (o rd e m
ju d ic ia l)
égide
e tío p e
êx o d o
fac-sím ile
fagócito
fa râ n d u la
féru la
g á rru lo
h é jira
h ip ó d ro m o
id ó la tra
ím p ro b o
ín c lito
ín te rim
in v ó lu c ro
leu có cito
N iá g a ra
n ú m id a
ôm ega
p á ra m o
P égaso
p é rip lo
p lê ia d e
p rís tin o
p ró fu g o
p ro tó tip o
q u a d rú m a n o
re v é rb e ro
sá tra p a
T â m isa
trâ n sfu g a
végeto
zéfiro
zén ite
b ) são paroxítonas:
alan o s
av aro
avito
aziago
b a rb a ria
b atav o
c a rto m a n c ia
ciclo p e
decano
d ia trib e
e d ito (lei)
c) são proparoxítonas:
ád v en a
a e ró d ro m o
a e ró lito
ág ap e
álacre
álcali
alcío n e
alc o ó la tra
âm a g o
a m á lg a m a
a n á te m a
a n d ró g in o
aném ona
a n ó d in o
a n tífo n a
an tíffa se
a n tístro fe
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Prefiram-se ainda as pronúncias:
barbárie
boêmia
estratégia
sinonímia
2. Para alguns vocábulos há, mesmo na língua culta, oscilação de pronúncia.
É o caso de:
ambrosia ou ambrósia
anidrido ou anídrido
crisântemo ou crisântemo
hieróglifo ou hieróglifo
Oceania ou Oceânia
ortoepia ou ortoépia
projétil ou projétil
reptil ou réptil
soror ou sóror
zangão ou zângão
Observação:
Há por vezes discordância na pronúncia mais corrente entre Portugal e o Brasil.
Os portugueses dizem comumente pudico e rúbrica; os brasileiros, apegados à acen
tuação que a etimologia recomenda, pronunciam pudico e rubrica.
VALOR DISTINTIVO DO ACENTO TÔNICO
Pela variabilidade de sua posição, o acento pode ter em português valor
distintivo, fonológico.
Comparando, por exemplo, os vocábulos:
dúvida / duvida
percebemos que a posição do acento tônico é suficiente para estabelecer uma
oposição, uma distinção significativa.
Observação:
Este fato ocorre com mais frequência no português do Brasil, pois, no de Portugal,
a mudança de posição do acento se faz acompanhar normalmente de uma alteração no
timbre das vogais tônicas que passam a átonas. Assim sendo, a distinção significativa
assenta também nessa variação. Por exemplo, no português do Brasil correram opõe-se
a correrão, válido a valido, apenas pela posição do acento; no português de Portugal,
porém, a oposição se dá entre [ku'Rerãw] e [kuR3'rãw], ['validu] e [voflidu).
ACENTO PRINCIPAL E ACENTO SECUNDÁRIO
Normalmente os vocábulos de pequeno corpo só possuem uma sílaba acentu
ada em que se apoiam as demais, átonas. Os vocábulos longos, principalmente os
derivados, costumam no entanto apresentar, além da sílaba tônica fundamental,
uma ou mais subtônicas.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Dizemos, por exemplo, que as palavras d ecid id a m en te e inacreditavelm ente
são paroxítonas, porque sentimos que em ambas o acento básico recai na penúl
tima sílaba ( m e n ). Mas percebemos também que, nas duas palavras, as sílabas
restantes não são igualmente átonas. Em d ecid id a m en te , a sílaba -d i-, mais fraca
do que a sílaba -m e n -, é sem dúvida mais forte do que as outras. Em inacredi
tavelm ente, as sílabas -cre- e -ta -, embora mais débeis do que a sílaba -m e n -,
são sensivelmente mais fortes do que as demais. Daí considerarmos prjncipal
o acento que recai sobre a sílaba -m e n - (nos dois exemplos) e secundários os
que incidem sobre a sílaba -d i- (em d ecididam ente) ou sobre as sílabas -cre- e
-ta - (em inacreditavelm ente).
GRUPO ACENTUAL (OU DE INTENSIDADE)
As palavras não costumam vir isoladas. Geralmente se unem, articulando-se
umas com as outras, pai a formar frases, que são as verdadeiras unidades da fala.
Materialmente, a frase constitui uma cadeia sonora com seus acentos prin
cipais e secundários a que pode estar subordinado mais de um vocábulo. Cada
segmento de frase dependente de um acento tônico chama-se grupo acentual
OU DE INTENSIDADE.
Por exemplo, no período atrás mencionado:
Dias e noites os horizontes se repetem.
há sete vocábulos que, de acordo com a rapidez ou lentidão da pronúncia, podem
agrupar-se debaixo de três ou quatro acentos principais.
Numa emissão pausada, que ressalte os elementos significativos, o período
em exame terá quatro grupos acentuais:
/ Dias / e noites / os horizontes / se repetem./
Se imprimirmos, porém, ritmo acelerado à pronúncia dos dois primeiros
grupos:
— / Dias / e noites/ —,
verificamos que a sílaba tônica da palavra dias se enfraquece, e esse enfraqueci
mento impede que ela continue a servir de suporte fônico de um grupo acentual.
O acento que nela recai de principal torna-se secundário e, consequentemente, o
grupo que o tinha por centro de apoio passa a integrar o seguinte, subordinado
ao acento da palavra noites:
/ Dias e noites /
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
ÊNCLISE E PRÓCLISE
Denomina-se ênclise a situação de uma palavra que depende do acento
tônico da palavra anterior, com a qual forma, assim, um todo fonético. P róclise
é a situação contrária: a vinculação de uma palavra átona à palavra seguinte,
a cujo acento tônico se subordina. São proclíticos , por exemplo, o artigo, as
preposições e as conjunções monossilábicas. São geralmente e n c lític o s os
pronomes pessoais átonos.
A ênclise e, sobretudo, a próclise são responsáveis por frequentes altera
ções vocabulares. Perdendo o seu acento tônico (a “alma da palavra”, no dizer
de Diomedes), um vocábulo perde o seu centro de resistência e fica sujeito a
reduções violentas.8Vejam-se, por exemplo, estes versos de Raul Bopp:
— Vamos p r á s índias!
— Olha! Melhor mesmo é buscar vento mais p r o fundo.
em que aparecem as formas prás e pro, abreviações de para as e para o provo
cadas pela próclise . Também a forma seu (por senhor), que ocorre neste passo
de Marques Rebelo:
Segura esta, seu Fagundes!...
é um caso de redução proclítica. Se disséssemos, por exemplo:
Fagundes, o senhor segura esta!...
não seria mais possível a substituição de senhor por seu, já que a autonomia
acentuai da palavra a resguardaria de qualquer mutilação.
ACENTO DE INSISTÊNCIA
Além dos acentos normais ( principal e secundário ), uma palavra pode receber
outro, chamado de insistência , que serve para realçá-la em determinado con
texto, quer impregnando-a de afetividade (emoção), quer dando ênfase à ideia
que expressa. Daí distinguirmos dois tipos de acento de insistência : o acento
afetivo e O ACENTO INTELECTUAL.
8 Explicam-se também como consequência da p r ó c l i s e as formas cem (por cento),grão (por
grande), quão (por quanto),são (por santo), tão (por tanto) e frequentes elisões, sinalefas e
sinéreses, que se observam no enunciado versificado ou na linguagem popular. Veja-se, a
propósito, Sousa da Silveira. Fonética sintática. Rio de Janeiro, Simões, 1952, especialmente
p. 86-125.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A c e n to a fe t iv o
Se enunciarmos calmamente, sem intenção particular, a frase:
É um homem miserável,
a pronúncia da palavra m iserável caracteriza-se por apresentar acentuada apenas
a sílaba -rá-. É ela emitida com maior intensidade, com maior altura e, às vezes,
com maior duração que as demais.
Mas a mesma frase pode ser enunciada num momento em que nos acha
mos presos de certa emoção. Podemos, por exemplo, estar possuídos de um
sentimento de cólera ou de desprezo em relação ao indivíduo que conside
ramos m iserável. Esse nosso sentimento exprime-se então foneticamente por
um realce particular dado à sílaba inicial m i -, que passa a competir na palavra
com a tônica -rá-. Chega a igualá-la, quanto à intensidade e à altura, e até a
superá-la, quanto à duração da vogal e, principalmente, da consoante que a
antecede.
No primeiro caso, a palavra recebe apenas um acento; no segundo, ela possui
dois, quase equivalentes. A esse novo acento, de caráter emocional, chamamos
ACENTO AFETIVO.
A c e n to in te le c tu a l
Com o acento afetivo impressionamos determinada palavra de emoção
particular. É ele uma espécie de comentário sentimental que fazemos a um
elemento do enunciado.
Mas nem sempre o realce sonoro de uma sílaba diversa da tônica normal
põe em jogo a nossa sensibilidade aguçada. É por vezes um recurso eficaz de
que dispomos para valorizar uma noção, para defini-la, para caracterizá-la,
geralmente contrastando-a com outra. Por sua função, denominamos acento
intelectual a esse tipo de acento de insistência .
Exemplifiquemos com os seguintes dizeres:
Esta medida é arbitrária.
Fez uso exclusivo e abusivo do carro.
Não se trata de um ato imoral, mas amoral.
Quero razões objetivas e não subjetivas.
Se quisermos dar relevo significativo às palavras arbitrária, exclusivo, abusivo,
im oral, am oral, objetivas e subjetivas, imprimimos à sílaba inicial de cada uma
delas maior duração, maior altura e, sobretudo, maior intensidade.
FO N ÉTICA E FONOLOGIA
Tal como o acento afetivo, o acento intelectual é inesperado, brusco, violen
to, características que os estremam do acento tônico normal, suporte do grupo
rítmico e, portanto, esperado, regular. São justamente essas peculiaridades dos
dois tipos de acento de insistência que fazem ressaltar vivamente num contexto
as palavras sobre as quais eles incidem.
D is tin ç õ e s fu n d a m e n ta is
O acento intelectual d istin g u e -se d o acento afetivo n ão só p ela fu n ç ã o , m as
ta m b é m p o r p a rtic u la rid a d e s fo n éticas.
Assim:
a) O acento intelectual recai sempre na primeira sílaba da palavra, seja ela
iniciada por consoante, seja por vogal. O acento afetivo incide na primeira
sílaba da palavra quando esta se inicia por consoante, mas pode recair na sílaba
seguinte, se ela começar por vogal. Nas palavras de pequeno corpo o acento
afetivo costuma coincidir com o acento tônico normal. Comparem-se:
A cento intelectual
São razões subjetivas!
Foi uma ação arbitrária!
Trata-se de ato ilegal!
A cento afetivo
É um homem miserável!
É uma pessoa abominável!
Esta criança é um amor!
b) Ambos reforçam a consoante inicial da sílaba sobre que recaem, mas o realce
que dão à vogal seguinte é de natureza diversa. O acento intelectual aumen
ta-a em duração, em altura e, sobretudo, em intensidade. O acento afetivo
aumenta-a em intensidade, mas principalmente em duração e altura.
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Capítulo 4
Ortografia
(segundo o Acordo Ortográfico de 1990)
LETRA E ALFABETO
1. Para reproduzirmos, na escrita, as palavras de nossa língua, empregamos
certo número de sinais gráficos chamados letras.
O conjunto ordenado das letras de que nos servimos para transcrever os
sons da linguagem falada denomina-se alfabeto.
2. O
alfabeto
da língua portuguesa consta fundamentalmente das seguintes
letras:
abcdefghijklmnopqrstuvwxyz
As letras k, w, e y, só se empregam em dois casos:
a) na transcrição de nomes próprios estrangeiros e de seus derivados portu
gueses:
Franklin
frankliniano
Wagner
wagneriano
Byron
byroniano
b) nas abreviaturas e nos símbolos de uso internacional:
K (= potássio)
W. (= oeste)
Observações:
O h usa-se apenas:
kg (= quilograma)
w (= watt)
km (= quilômetro)
yd. (= jarda)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
a) no início de certas palavras:
haver
hoje
homem
b) no fim de algumas interjeições:
ah!
oh!
uh!
c) no interior de palavras compostas, em que o segundo elemento, iniciado por h, se
une ao primeiro por meio de hífen:
anti-higiênico
pré-histórico
super-homem
talho
banho
d) nos dígrafos ch, lh e nh:
chave
NOTAÇÕES LÉXICAS
Além das letras do alfabeto, servimo-nos, na língua escrita, de certo número
de sinais auxiliares, destinados a indicar a pronúncia exata da palavra. Esses sinais
acessórios da escrita, chamados notações léxicas, são os seguintes:
O ACENTO
O
1. O
acento
p o d e ser
ag udo
('),
grave
(' )e
circunflexo
( A ).
é empregado para assinalar:
a) as vogais tônicas fechadas i e u:
acento ag udo
aí
baú
h o r r ív e l
açúcar
b ) as v o g a is tô n ic a s a b e r ta s e s e m ia b e r ta s
há
pé
am ável
tiv é sse is
pó
h e ró i
físic o
lú g u b r e
a, e e o:
p á lid o
e x é rc ito
in ó s p it o
é empregado para indicar a crase da preposição a com a
forma feminina do artigo (a, as) e com os pronomes demonstrativos a(s),
aquele(s), aquela(s), aquilo:
2. O
acento grave
à
às
àquele(s)
àquela(s)
à q u ilo
ORTOGRAFIA
3. O acento circunflexo é empregado para indicar o timbre semifechado das
vogais tônicas a, e e o:
câmara
mês
avô
cânhamo
têxtil
pôs
hispânico
fêmea
cômoro
O TIL
O
til
( ~ ) emprega-se sobre o a e o para indicar a nasalidade dessas vogais:
maçã
caixões
mãe
põe
pão
sermões
O TREMA
Não se usa trema ( " ) na ortografia da língua portuguesa, a não ser em no
mes e palavras estrangeiras e suas derivadas em português. Assim:
aguentar
tranquilo
Mülller e mülleriano
mas
frequente
Günter
sanguíneo,
stürmer
O APÓSTROFO
O apóstrofo ( ’ ) serve para assinalar a supressão de um fonema — geralmen
te a de uma vogal — no verso, em certas pronúncias populares e em palavras
compostas ligadas pela preposição de:
c’roa
pau-d’alho
esp’rança
pau-d’arco
’tá bem! (popular)
galinha-d’água
A CEDILHA
A cedilha ( , ) coloca-se debaixo do c, antes de a, o e u, para representar a
fricativa linguodental surda [s]:
caçar
praça
maciço
poço
açúcarmuçulmano
O HÍFEN
O
hífen
(-) u sa -se :
a ) p a r a lig a r o s e le m e n to s d e p a la v ra s c o m p o s ta s o u d e riv a d a s p o r p re fix a ç ã o :
79
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
couve-flor
pré-escolar
guarda-marinha
super-homem
beija-flor
ex-diretor
b) para unir pronomes átonos a verbos:
ofereceram-me
retive-o
levá-la-ei
c) para, no fim da linha, separar uma palavra em duas partes, ou sej a, translinear
uma sílaba:
estudan- / te
estu- / dante
es- / tudante
E m p re g o d o h ífe n n o s c o m p o s to s
O emprego do hífen é uma convenção. Estabeleceu-se que “só se ligam por
hífen os elementos das palavras compostas em que se mantém a noção da com
posição, isto é, os elementos das palavras compostas que guardam a sua inde
pendência fonética, conservando cada um a sua própria acentuação, porém
formando o conjunto perfeita unidade de sentido”. Dentro desse princípio,
deve-se empregar o h ífen :
1.
°) nos compostos cujos elementos, reduzidos ou não, perderam a sua sig
nificação própria: água-marinha, arco-íris, para-choque, bel-prazer, és-sueste,
monta-carga, marca-passo, lero-lero, mata-mata etc.;
Nos seguintes casos os elementos se aglutinam, sem hífen portanto: giras
sol, madressilva, mandachuva, passatempo, pontapé, paraquedas, paraquedismo,
paraquedista;
2.
°) nos compostos com o primeiro elemento de forma adjetiva, reduzida ou
não: afro-asiático, dólico-louro, galego-português, greco-romano, histórico-geográ
fico, ínfero-anterior, latino-americano, luso-brasileiro, lusitano-castelhano;
3.
°) nos topônimos compostos iniciados pelos adjetivos Grã, Grão, ou por
forma verbal, ou quando os elementos estão ligados por artigo: Grã-Bretanha,
Grão-Pará, Passa-Quatro, Todos-os-Santos, mas Belo Horizonte, Cabo Verde,
Santa Catarina (estes sem hífen porque não se enquadram na regra) etc.;
4.
°) em palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas
estejam ou não ligadas por preposição ou por qualquer outro elemento: bem-me-quer, ervilha-de-cheiro, formiga-branca, bem-te-vi etc.
Obs.: malmequer já se escrevia aglutinadamente, e essa exceção é mantida;
5.
°) nos compostos com os advérbios bem- e mal-, quando o elemento se
guinte começa por vogal ou h: bem-educado, bem-humorado, mal-agradecido,
mal-habituado;
O advérbio bem, ao contrário de maL, pode não se aglutinar com o segundo
elemento quando ele começa por consoante: bem-nascido, malnascido, bem-falante,
ORTOGRAFIA
malfalante, bem -m andado, m alm andado etc.; mas, em muitos compostos, bem aglu
tina-se com o segundo elemento; benfazejo, benfeito, benfeitor, benquerença etc.;
6.
°) nos compostos com sem , além , a q u ém e recém: sem -cerim ônia, a lém -m ar, aquém -fronteiras, recém -casado;
7.
°) não se usa hífen em locuções de qualquer tipo, sejam, substantivas,
adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, salvo as se
guintes exceções: água-de-colônia, arco-da-velha, cor-de-rosa, m a is-q u e-p erfeito, p é -d e -m e ia (pecúlio), ao deus-dará, à q u eim a -ro u p a . Portanto: fim de se m a
na, sala de ja n ta r, cor de café, cada u m , q u em quer q u e seja, à vontade, depois de
a m a n h ã , a fim de, acerca de, contanto que, visto que etc.
E m p re g o d o h ífe n n a s fo rm a ç õ e s p o r p re fix a ç ã o ,
re c o m p o s iç ã o e s u fix a ç ã o
l.°) Nas formações com prefixos, como ante-, a n ti-, circum -, co-, contra-,
entre- extra-, hiper-, infra-, in tra -, pós-, pré-, sobre-, su b -, super-, ultra- etc., e
em formações por recomposição com falsos prefixos ou pseudoprefixos (de
origem grega ou latina) como aero-, agro-, arqui-, a u to -, hio-, eletro-, geo-,
hidro-, inter-, m acro-, m a x i-, m icro-, m in i-, m u lti-, neo-, p a n -, p lu rí-, p ro to -,
p seudo-, retro-, sem i-, tele- etc, só se usa hífen ;
a) nas formações em que o segundo elemento começa por h: a n ti-h ista m ín ico ,
pan-helênico, sobre-h u m a n o , sub-hepático, su p e r-h o m e m etc.;
Obs.: como exceção a essa regra, co-, des-, dis-, in - e re se aglutinam com o
segundo elemento, eliminando o h: coabitar, coerdeiro, desum ano, disidria,
inábil, reabilitar, reospitalizar etc.;
b) nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina na mesma vogal
pela qual começa o segundo elemento: anti-inflacionário, neo-ortodoxo, sem iinterno, supra-auricular, arqui-inim igo, sobre-edificar, ante-estreia’,
Obs.: são exceções a essa regra co- e re-: coordenar, coobrigação, reeleição,
reerguer etc;
c) nas formações com o prefixo circum- e o pseudoprefixo pan- quando o
segundo elemento começa por vogal, m o u n (além do h já mencionado na
regra geral): circum -navegação, circum -m editerrâneo, circum -oceânico, p a n oftálm ico, p a n -n a c io n a lism o ’,
d) nas formações com os prefixos hiper-, inter- e super-, quando o segundo
elemento começa por r: hiper-religioso, inter-relacionado, super-resistente;
e) nas formações com os prefixos ex- (estado anterior, cessamento), sota-, soto-,
vice- (ou vizo): ex-aluno, ex-presidente, sota-piloto, soto-m estre, vice-alm irante,
vice-governador, vizo-rei
f) nas formações com os prefixos tônicos pós-, pré- e p ró - (as formas átonas
se aglutinam com o segundo elemento): pós-graduação (mas pospor), p réuniversitário (mas p red izer),p ró -a frica n o (mas p ro a tiv o );
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
g) com ab-, ad-, ob-, sob-, e sub-, quando seguidos de radical iniciado por r ou
pela mesma consoante em que termina o prefixo: ab-rogar, ad-rogação, obreptício, sob-roda sub-reino, a d -digital, sub-bibliotecário;
2.°) Não se u s a h ífen :
a) nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina em vogal, e o
segundo elemento começa por r ou s, que devem ser duplicados: contrarregra,
suprarrenal, pseudorreação, antisséptico, ultrassom , m inissaia;
b) nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina em vogal, e o
segundo elemento começa por vogal diferente ou consoante (com exceção
dos casos particulares já mencionados de h, r e s : extraescolar, antiaéreo, a u toeducação, a u to d id a ta , extracurricular, supram encionado, hidroeletricidade,
m icrocâm era, intracelular etc.
c) em locuções, de qualquer tipo, com exceção de água-de-colônia, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa e em nomes de plantas ou animais.
3.°) Nas formações por sufixação, só se emprega o hífen em vocábulos termi
nados em sufixos de origem tupi-guarani que representam formas adjetivas
(como -açu, -g u a ç u ,-m ir im ) quando o primeiro elemento termina em vogal
acentuada graficamente ou quando a pronúncia exige a distinção gráfica dos
dois elementos: am oré-guaçu, andá-açu, C ea rá -M irim , capim -açu.
E m p re g o d o h ífe n n a ê n c lis e , n a m e s ó c lis e
e co m a s fo r m a s d o v e rb o h a v e r
1.
°) Emprega-se o hífen na ênclise e na mesóclise (ou tmese): am á-lo, faz-se,
dizer-lhe, am á -lo -em o s, enviar-lhe-ei.
2.
°) Usa-se hífen nas ligações de formas pronominais enclíticas ao advérbio
eis e nas combinações de formas pronominais quando em próclise:
eis-m e, ei-lo, eis-nos;
no-lo, vo-las.
3.
°) Não se usa hífen nas ligações da preposição de às formas monossilábi
cas do presente do indicativo do verbo haver: hei de, hás de, há de, hão de.
P a r t iç ã o d a s p a la v ra s n o fim d a lin h a
Quando não há espaço no fim da linha para escrevermos uma palavra inteira,
podemos dividi-la em duas partes. Essa separação, que se indica por meio de
um h ífen , obedece às regras de silabação. São inseparáveis os elementos cons
tituintes de cada sílaba.
Convém, portanto, serem respeitadas as seguintes normas:
l.a) Não se separam as letras com que representamos:
a) os ditongos e os tritongos, bem como os grupos ia, ie, io, oa, ua, ue e uo, que,
quando átonos finais, soam normalmente numa sílaba ( d it o n g o crescente ),
mas podem ser pronunciados em duas ( hiato ):
ORTOGRAFIA
au-ro-ra
mui-to
par-tiu
a-guen-tar
Pa-ra-guai
gló-ria
cá-rie
Má-rio
má-goa
ré-gua
tê-nue
con-tí-guo
b) os encontros consonantais que iniciam sílaba e os dígrafos ch, lh e nh:
pneu-má-ti-co
psi-có-lo-go
mne-mô-ni-co
a-bro-lhos
es-cla-re-cer
re-gre-dir
ra-char
fi-lho
ma-nhã
2.a) Separam-se as letras com que representamos:
a) as vogais de hiatos:
co-or-de-nar
ca-í-eis
fi-el
mi-ú-do
ra-i-nha
sa-ú-de
b) as consoantes seguidas que pertencem a sílabas diferentes:
ab-di-car
abs-tra-ir
bis-ne-to
oc-ci-pi-tal
sub-ju-gar
subs-cre-ver
3.a) Separam-se também as letras dos dígrafos rr, ss, sc, sç e xc:
ter-ra
pro-fes-sor
des-cer
abs-ces-so
cres-ça
ex-ce-der
Observações:
l .a) Quando a palavra já se escreve com
- quer por ser composta, quer
por ser uma forma verbal seguida de pronome átono e coincidir o fim da linha
com o lugar onde está o hífen, recomenda-se repeti-lo, por clareza, no início da
linha seguinte.
Assim:
hífen
couve-flor = couve- / -flor
unamo-nos - unamo- / -nos
Observe-se a diferença de significado que ocorre em separação do pronome
sem a indicação do hífen:
Prazer de ver-me
e não
Prazer de verme
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2.“) Embora o sistema ortográfico vigente o permita, não se deve escrever no
princípio ou no fim da linha uma só vogal. Evite-se, por conseguinte, a partição de
vocábulos como água, aí, aqui, baú, rua, etc. Melhor será também que se dividam
vocábulos como abrasar, aguentar, agradar, equidade, ortografia, pavio e outros apenas
nos lugares indicados pelo hífen :
abra-sar
equi-da-de
aguen-tar
or-to-gra-fia
agra-dar
pa-vio
REGRAS DE ACENTUAÇÃO
A acentuação gráfica obedece às seguintes regras:
l.a) Assinalam-se com acento agudo os vocábulos oxítonos que terminam em a
aberto,e e o semiabertos,e com acento circunflexo os que acabam em e e o semifechados, seguidos, ou não, de s: cajá, hás, jacaré, pés, seridó, sós; dendê, lês, trisavô; etc.
Observação:
Nesta regra se incluem as formas verbais em que, depois de a, e, o, se assimilaram
o r, o s e o z ao l dos pronomes lo, la, los, las, caindo depois o primeiro /: dá-lo, contá-la, fá-lo-á, fê-los, movê-las-ia, pô-los, qué-los, sabê-lo-emos, trá-lo-ás, etc.
2.
a) Todas as palavras proparoxítonas devem ser acentuadas graficamente:
recebem acento agudo as que têm na antepenúltima sílaba as vogais a aberta,
e ou o semiabertas, i ou u; e levam acento circunflexo aquelas em que figuram
na sílaba predominante as vogais a, e ou o semifechadas: árabe, exército, gótico,
lím pido, louvaríam os, público, úm brico; lâ m in a , lâm pada, devêssemos, lêm ures,
p êndula, fôlego, recôndito, etc.
Observações:
1.
a) Incluem-se neste preceito os vocábulos terminados em encontros vocálicos
que costumam ser pronunciados como ditongos crescentes: área, espontâneo, igno
rância, imundície, lírio, mágoa, régua, vácuo, etc.
2.
a) Nas palavras proparoxítonas que têm, na antepenúltima sílaba, as vogais ct.ee
o seguidas de m ou n, estas são, no português-padrão do Brasil, sempre semifechadas
(em geral nasalizadas), razão por que levam acento circunflexo. No português-padrão
de Portugal, podem ser semifechadas ou semiabertas, pelo que a ortografia em vigor
faculta que se lhes ponha acento circunflexo, se forem semifechadas, e acento agudo,
se semiabertas. Por isso, de acordo com a pronúncia-padrão, escrevem-se no Brasil:
âmago, ânimo, fêmea, sêmola, cômoro e, da mesma forma, acadêtnico, anémona, cêni
co, Amazônia, Antônio, fenômeno, quilômetro; ao passo que em Portugal, também de
acordo com a pronúncia-padrão, se adotam as grafias âmago, ânimo, fêmea, sêmola,
cômoro, mas académico, anémona, cénico, Amazónia, António, fenómeno, quilómetro.
3.
a) Os vocábulos paroxítonos finalizados em i ou w, seguidos, ou não, de s,
marcam-se com acento agudo quando na sílaba tônica figuram a aberto, e ou
ORTOGRAFIA
o semiabertos, i ou u fechados; e com circunflexo quando nela figuram a, e e o
semifechados: lápis, beribéri, miosótis, íris, júri, dândi, tênis, bônus.
Observações:
1.
a) Paralelamente ao que ocorre com as palavras proparoxítonas, nas paroxítonas, que têm na penúltima sílaba as vogais a, e e o seguidas de m ou n, estas são, no
português-padrão do Brasil, sempre semifechadas (em geral nasalizadas), pelo que
levam acento circunflexo. No português-padrão de Portugal podem ser ou semife
chadas ou semiabertas, pelo que recebem acento circunflexo, se são semifechadas, e
acento agudo, se semiabertas - essas as razões por que se adotam, no Brasil, as grafias
ânus, certâmen, e também fêmur, Fênix, tênis, ônus, bônus; ao passo que, em Portugal,
se escrevem ânus, certâmen (como no Brasil), mas fémur, Fénix, ténis, ónus, bónus.
2.
a) Entre as palavras paroxítonas, cumpre ressaltar o caso da l.a pessoa do plu
ral dos verbos da I a conjugação, que, no presente e no pretérito perfeito do indi
cativo, apresentam a tônico seguido de m. No português-padrão do Brasil (e em
vários dialetos portugueses meridionais) a vogal é igualmente semifechada nos dois
tempos, enquanto no português-padrão de Portugal ela é semifechada no presente
e aberta no pretérito perfeito do indicativo.1Assim sendo, nenhuma das formas é
acentuada no Brasil, mas admite-se, facultativa mente, o acento agudo na Ia pessoa
do plural do pretérito perfeito: amamos (presente), amámos (pretérito perfeito).
3.
a) Também no português-padrão do Brasil, a forma demos pronuncia-se com e
semifechado [e], seja ela l.a pessoa do presente do subjuntivo ou do pretérito perfeito do
indicativo, razão por que não recebe nenhum acento gráfico. É facultativa a forma dêmos
no presente do subjuntivo. Já no português-padrão europeu, a vogal é semifechada no
presente do subjuntivo [e] e semiaberta no pretérito perfeito do indicativo [£], pelo
que a ortografia portuguesa admite apor-lhe um acento agudo no segundo caso. Daí
as grafias demos (presente do subjuntivo) e dêmos (pretérito perfeito do indicativo).
4.
“) No português-padrão do Brasil, não há mais acento gráfico nas vogais e t o
semiabertas dos ditongos ei e oi quando em sílaba tônica de palavras paroxítonas: as
sembleia, hebreia, ideia, epopeico, joia, tipoia, heroico, apoio; as mesmas vogais, quando
semifechadas, tampouco recebem acento: meia, cheia, maneira, apoio, joio, açoite.
No português-padrão de Portugal, não se diferenciam fonicamente éi e ei, razão
por que o e nunca foi acentuado. O ditongo é no caso sempre pronunciado [aj].
Os ditongos semiabertos éi, éu, ói, quando tônicos em palavras oxítonas, pro
paroxítonas e paroxítonas terminadas em ditongos crescentes, recebem o acento:
bacharéis, chapéu, rouxinóis, herói, aracnóideo, etc.
5.
a) As palavras paroxítonas terminadas em -oo, que têm a mesma pronúncia (fe
chada) em todo o domínio do idioma, não são acentuadas graficamente: enjoo, voo.
6.
a) Emprega-se o acento circunflexo sobre a vogal tônica semifechada da forma
pôde, do pretérito perfeito do indicativo, para distingui-la de pode, do presente do
indicativo, com vogal tônica semiaberta. Também recebe acento o verbo pôr para
distingui-lo da preposição por. É facultativo o acento circunflexo em fôrma(s), para
distinguir do substantivo formas e das flexões formas e forma, do verbo formar.
1 Em certos dialetos portugueses setentrionais, a vogal a é, em geral, aberta nos dois
tempos.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
7.a) As palavras paroxítonas terminadas em -um, -uns recebem acento agudo na
sílaba tônica: álbum, álbuns, etc.
8.1') Não se acentuam os pseudoprefixos paroxítonos terminados em -i: semioficial, etc.
4.
a) P õ e-se a c e n to a g u d o n o i e n o u tô n ic o s q u e n ã o fo rm a m d ito n g o c o m
a vogal a n te rio r: aí, balaústre, cafeína, caís, contraí-la, distribuí-lo, egoísta, faís
ca, heroína, juízo, país, peúga, saía, saúde, timboúva, viúvo, etc.
Observações:
1.
a) Não se coloca o acento agudo no i e no u quando, precedidos de vogal que, com
eles, não forma ditongo, e são seguidos de l, m, n, r ou z que não iniciam sílabas e, ain
da, nlr. adail, contribuinte, demiurgo, juiz, paul, retribuirdes, ruim, tainha, ventoinha, etc.
2.
a) Quando as vogais i e u ocorrem na sílaba tônica de palavras paroxítonas,
não recebem acento gráfico se são precedidas de ditongo: baiuca, boiuno, feiura.
Atenção: essa regra não incide em palavras oxitonas e proparoxítonas, como
aiúbida, bauínia, teiú, tuiuiús.
3.
“) Também não se assinala com acento agudo a base dos ditongos tônicos iu e
ui quando precedidos de vogal: atraiu, contribuiu, pauis, etc.
5.
a) N ã o receb e a c e n to a g u d o o u tô n ic o p re c e d id o de g o u q e se g u id o d e
o u i n a s flexões riz o tô n ic a s d o s v e rb o s arguir, redarguir, aguar, apaniguar, apa
e
ziguar, apropinquar, averiguar, obliquar, desaguar, enxaguar, obliquar, delinquir
e afins: argui, arguis, redargui, redargúem etc.
N os v erb o s aguar, apaniguar, apaziguar, apropinquar, averiguar, obliquar,
desaguar, enxaguar, obliquar, delinquir, as fo rm a s riz o tô n ic a s o u são a c e n tu a d a s
n o u , m a s se m a c e n to gráfico (c o m o e m arguir e redarguir) o u tê m as fo rm a s
averíguo, averigues, enxáguo, eivxágues, delínquo, delínquem etc.
6.
a) M arca-se c o m o a c e n to a g u d o o e d a te rm in a ç ã o em o u ens d as p alav ras
o x ito n as: alguém, armazém, convém, convéns, detém-no, mantém-na, parabéns,
retém-no, também, etc.
O bservação:
1.
a) Não se acentuam graficamente os vocábulos paroxítonos finalizados por
em ou ens: ontem, origem, imagens, jovens, nuvens, etc.
2.
a) A terceira pessoa do plural do presente do indicativo dos verbos ter, vir e
seus compostos recebe acento circunflexo no e da sílaba tônica: (eles) contêm, (elas)
convêm, (eles) têm, (elas) vêm, etc.
3.
a) Não recebem acento circunflexo oriundo do singular crê, dê, lê, vê as formas
plurais desses verbos e de seus compostos: creem, deem, leem, veem, descreem, desdeem, releem, reveem, etc.
ORTOGRAFIA
7.
a) Sobrepõe-se o acento agudo ao a aberto, ao e ou o semiabertos e ao i ou
u da penúltima sílaba dos vocábulos paroxítonos que acabam em /, n, r, e x; e o
acento circunflexo ao a, e e o semifechados: açúcar, afável, a lú m e n , córtex, éter,
h ífen , aljôfar, â m b a r, cânon, êxu l, etc.
Observações:
Não se acentuam graficamente os prefixos paroxítonos terminados em r. inter-humano, super-homem, etc.
8.
a) Marca-se com o competente acento, agudo ou circunflexo, a vogal da
sílaba tônica dos vocábulos paroxítonos acabados em ditongo oral: ágeis, devê
reis, escrevêsseis, faríeis, férteis, fósseis, fôsseis, im óveis, jó q u ei, pênseis, pusésseis,
quisésseis, tínheis, túneis, úteis, variáveis, etc.
9.
a) Usa-se o til para indicar a nasalização, e vale como acento tônico se ou
tro acento não figura no vocábulo: afã, capitães, coração, devoções, p õ e m , etc.
Observação:
Se é átona a sílaba onde figura o til, acentua-se graficamente a predominante:
acórdão, bênção, órfã, etc.
10.
a) Como já mencionado, não se usa trema para indicar a pronúncia do u
quando precedido deg e de q, a não ser em palavras e nomes estrangeiros e suas
derivadas em português; mantém-se a pronúncia do u mas grafa-se: aguentar,
arguição, eloquente, tranquilo, fre q u e n te etc.
1l.a) Não têm acento diferencial as palavras homógrafas paroxítonas
p ara (flexão de p arar), para (preposição)
p ela (s) (s.fi), p ela (s) (flexão de pelar), pela(s) [è] (por+a[s])
pelo (flexão d e p e la r), pelo(s)[ê] (s.m.), p elo(s)[ê] (por+o[s])
pera(s)[é] (s.f.), pera(s)[ê] (s.f), pera [é] (prep. para)
polo(s)[ó] (s.m.), polo(s)[ô] (p o v+ \o [s]),p o lo (s)[ô ] (s.m .) (‘falcão’, ‘gavião*)
Em Portugal, a ortografia oficialmente adotada é a do Acordo ortográfico de 1945, assinado
em Lisboa, a 10 de agosto de 1945, por uma Comissão composta de membros da Academia
das Ciências de Lisboa e da Academia Brasileira de Letras. Esse Acordo não entrou em
vigor no Brasil por não ter sido ratificado pelo Congresso Nacional.
i No Brasil vigoram oficialmente as normas do Formulário ortográfico de 1943, consubstan
ciadas no Vocabulário ortográfico, publicado no mesmo ano, com as leves alterações
determinadas pela Lei n.° 5.765, de 18 de dezembro de 1971.
4 Há, porém, no portugués-padrão de Portugal, vogais pretônicas, provenientes de antiga
crase, que conservam o timbre aberto ([a]) ou semiaberto ([e], [o]), sem que o fato seja
assinalado na escrita. Assim: padeiro, pegada, corar.
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12.a) O acento grave assinala as contrações da preposição a com o artigo
a e com os pronomes demonstrativos a, aquele-, aqueloutro, aquilo, as quais se
escreverão assim: à, às, àquele, àqueles, àquelas, àquilo, àqueloutro, àqueloutra,
àqueloutros, àqueloutras.
DIVERGÊNCIAS ENTRE AS ORTOGRAFIAS
OFICIALMENTE ADOTADAS EM PORTUGAL E NO BRASIL
Além das divergências atrás mencionadas que dizem respeito à diversidade
de pronúncia de certas vogais tônicas - em virtude da qual admite-se a dupla
grafia — , persiste ainda uma importante diferença entre os sistemas ortográfi
cos oficialmente adotados em Portugal e no Brasil': o tratamento das chamadas
“consoantes mudas”
No Brasil, por disposição do Form ulário ortográfico de 1943, as consoantes eti
mológicas finais de sílaba (implosivas), quando não articuladas — ou seja, quan
do “mudas” — deixaram de se escrever. Em Portugal, no entanto, em conformi
dade com o texto do Acordo de 1945, continuaram a ser grafadas sempre que se
seguem às vogais átonas a (aberta), e ou o (semiabertas), como forma de indicar
a abertura dessas vogais. Por uma razão de coerência, mantêm-se tais consoantes
em sílaba tônica nas palavras pertencentes à mesma família ou flexão.
Essa forma de distinguir, no português europeu, as pretônicas abertas ou se
miabertas das reduzidas não se justifica no Português do Brasil, em cuja pronún
cia-padrão não há pretônicas reduzidas, tendo-se as vogais nesta posição neutrali
zado num a aberto e num e ou num o semifechados. Daí escrever-se em Portugal:
acto, acção, accionar, accionista, baptism o, baptizar, director, conecto, correcção,
óptim o, optim ism o, adaptar, adopção; e no Brasil: ato, ação, acionar, acionista, ba
tismo, batizar, diretor, correto, correção, ótim o, otim ism o, adotar, adoção.
Existe, no entanto, certo número de palavras em que a consoante final de
sílaba é articulada tanto em Portugal como no Brasil e, nesse caso, a ortografia
dos dois países é uniforme. Assim: autóctone, com pacto, apto, inepto, etc.
Raríssimos são os exemplos que se apontam em que esta consoante é efeti
vamente pronunciada em Portugal e não no Brasil, como fa c to (em Portugal)
e fa to (no Brasil).
Finalmente, há casos em que se verifica uma oscilação em ambas as varian
tes do português e nos quais a ortografia brasileira (e não a portuguesa) admite
grafias duplas: aspecto / aspeto, dactilografia / datilografia, infecção / infeção, etc.
(em Portugal as únicas grafias admitidas são aspecto, dactilografia, infecção etc.)
5 As regras ortográficas para o Brasil, Portugal e todos os países lusófonos foram modificadas
pelo Acordo Ortográfico de 1990, que entrou em vigor no Brasil a partir de 2009, e que
admite esses casos de dupla grafia.
Capítulo 5
Classe, estrutura
e formação de palavras
PALAVRA E MORFEMA
1. Uma língua é constituída de um conjunto infinito de frases. Cada uma delas
possui uma face sonora, ou seja a cadeia falada, e uma face significativa, que
corresponde ao seu conteúdo. Uma frase, por sua vez, pode ser dividida em
unidades menores de som e significado — as p a l a v r a s — e em unidades
ainda menores, que apresentam apenas a face significante — os f o n e m a s .
As palavras são, pois, unidades menores que a frase e maiores que o fonema.
Assim, na frase
Évora! Ruas ermas sob os céus
Cor de violetas roxas...
(F. Espanca, S, 149)
distinguimos dez palavras, todas com independência ortográfica. E em cada
uma dessas palavras identificamos um certo número de fonemas.
Por exemplo, cinco em Évora:
fel M foi Irl /a/,
e quatro em ruas:
/r/ /u/ /a/ /s/
2. Existem, no entanto, unidades de som e conteúdo menores que as palavras.
Assim, em ruas temos de reconhecer a existência de duas unidades significati
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vas: rua e -5.0 primeiro elemento - rua - também se emprega como palavra
isolada ou serve para formar outras palavras isoladas: arruaça, arruamento,
etc. Já a forma plural -s, que vai aparecer no final de muitas outras palavras
(ermas, céus, violetas, roxas, etc.), nunca poderá realizar-se como palavra
individual, autônoma.
A essas u n id a d e s s ig n ific a tiv a s m ín im a s d á - s e o n o m e d e m o rfem a .
3. Os morfemas podem apresentar variação, por vezes acentuada, em suas rea
lizações fonéticas. É o caso do morfema plural do português, cuja pronúncia
está sempre condicionada à natureza do som seguinte.
Nos falares de Lisboa e do Rio de Janeiro, por exemplo, o -s plural de casas
assume forma fonética diferente em cada um dos três enunciados:
Casas amarelas.
Casas bonitas.
Casas pequenas.
Realiza-se:
a) como [z], ao ligar-se à vogal inicial da palavra amarelas;
b) como [3 ], antes da palavra bonitas, iniciada por consoante sonora;
c) como [J], antes da palavra pequenas, iniciada por consoante surda.
A última realização [J] é também a que apresenta o morfema de plural diante
de pausa, como podemos observar nas formas amarelas, bonitas e pequenas
dos exemplos citados.
A essas manifestações fonéticas diferentes de um único morfema dá-se o
nome de variante de morfema o u alom orfe .
T IP O S D E M O RFEM A S
1. Quando, na análise da palavra ruas, distinguimos dois morfemas, observamos
que um deles - rua - forma por si só um vocábulo, enquanto o morfema -s
não tem existência autônoma, aparecendo sempre ligado a um morfema an
terior. Os linguistas costumam chamar morfemas livres os que podem figurar
sozinhos como vocábulos, e morfemas presos aqueles que não se encontram
nunca isolados, com autonomia vocabular.
2. Quanto
à
natureza da significação, os morfemas classificam-se em
lexicais
e GRAMATICAIS.
Os morfemas lexicais têm significação externa, porque referente a fatos do
mundo extralinguístico, aos símbolos básicos de tudo o que os falantes dis
tinguem na realidade objetiva ou subjetiva.
C L A S S E , E S T R U T U R A E F O R M A Ç Ã O DE P A L A V R A S
Assim:
Évora
erma
céu
cor
roxa
rua
tristeza
violeta
Já a significação dos morfemas gramaticais é interna, pois deriva das relações
e categorias levadas em conta pela língua. Assim, em nossa frase-exemplo, o
artigo o, as preposições de e sob, a marca de feminino -a (rox-a, erm-a) e a
de plural -s ( rua-s, erma-s, o-s, céu-s, violeta-s, roxa-s).
3. Outras características, não semânticas, opõem os morfemas lexicais aos
gramaticais. Aqueles são de número elevado, indefinido, em virtude de
constituírem uma classe aberta, sempre passível de ser acrescida de novos
elementos; estes pertencem a uma série fechada, de número definido e restrito
no idioma. Em decorrência, se os examinarmos num dado texto, verifica
remos que os primeiros apresentam frequência média baixa, em contraste
com a frequência média alta dos últimos.
Observações:
1.
a) O s m o rfe m a s le x ic a is são ta m b é m c h a m a d o s lf.xf.mas ou semantemas. A os
m o rfe m a s g ra m a tic a is lin g u is ta s m o d e rn o s c o s tu m a m d a r o n o m e de gramemas
OU de EORMANTES.
2.
a) Não se deve confundir o conceito de significação linguística interna, aplicável
aos morfemas gramaticais, com a ideia de morfema vazio, desprovido de conteúdo,
infelizmente muito vulgarizada. Basta atentarmos nos efeitos que a autora do texto
abaixo obtém da oposição entre as preposições em, com, para e por para nos certifi
carmos de que os morfemas gramaticais têm a sua significação própria:
Hoje eu queria andar lá em cima,
nas nuvens,
com as nuvens,
pelas nuvens,
p a ra as n u v e n s .
(C. Meireles, Q, 1,119.)
C LA SSES D E PA LA VRAS
1. Estabelecida a distinção entre morfema lexical e morfema gramatical, po
demos agora relacionar cada um deles com as c l a s s e s d e p a l a v r a s .
São morfemas lexicais os substantivos, os adjetivos, os verbos e os advérbios
de modo. São morfemas gramaticais os artigos, os pronomes, os numerais,
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as preposições, as conjunções e os demais advérbios, bem como as formas
indicadoras de número, gênero, tempo, modo ou aspecto verbal.
2.
As dasses de palavras podem ser também agrupadas em v a r iá v e is e in v a r iá v e is ,
de acordo com a possibilidade ou a impossibilidade de se combinarem com
os morfemas flexionais ou desinências.
São variáveis os substantivos, os adjetivos, os artigos e certos numerais e
pronomes, que se combinam com morfemas gramaticais que expressam o
gênero e o número; o verbo, que se liga a morfemas gramaticais denotadores
do tempo, do modo, do aspecto, do número e da pessoa.
São invariáveis os advérbios, as preposições, as conjunções e certos pronomes,
classes que não admitem se lhes agregue uma desinência.
A interçeição, vocábulo-frase, fica excluída de qualquer das classificações.
ESTRUTURA DAS PALAVRAS
R A D IC A L
Ao que chamamos até agora m o r f e m a l e x i c a l dá-se tradicionalmente o nome
de r a d i c a l . É o radical que irmana as palavras da mesma família e lhes transmite
uma base comum de significação.
A ele se agregam, como vimos, os morfemas gramaticais , que podem ser
uma d e s in ê n c ia ( o u m o r fe m a fl e x io n a l ), um afixo ( o u m o r fe m a d e r iv a cio n a l ) o u uma vogal tem ática .
D ESIN ÊN C IA
As desinências , o u morfemas flexionais, servem para indicar:
a) o gênero e o número dos substantivos, dos adjetivos e de certos pronomes;
b) o número e a pessoa dos verbos.
Assim, no adjetivo ermas e numa forma verbal como renovamos, temos as
seguintes desinências:
-a,
-s,
-mos,
para caracterizar o feminino (em ermas)',
para denotar o plural (em ermas)-,
para expressar a l.a pessoa do plural (em renovamos).
Há, por conseguinte, em português
verbais .
desinências n o m in a is
e
desinências
C L A S S E , E S T R U T U R A E F O R M A Ç A O DE P A L A V R A S
D esinências
n o m in a is .
G
São:
N ú m ero
ên ero
M asculino
Fem inino
-0
-a
Singular
Plural
-s
—
O singular caracteriza-se pela ausência de qualquer desinência, ou melhor,
pela desinência - zero , pois a falta, no caso, é um sinal particularizante.
de pessoa e número são expressas nos verbos
por desinências especiais, que podemos distribuir por três grupos: desinências
do presente do indicativo, do pretérito perfeito do indicativo e do infinitivo
pessoal (= futuro do subjuntivo):
D
esinências verbais . As flexões
P
P r e t é r it o P e r f e it o
resen te
I n f in it iv o P e s s o a l
Fur. o o
S u b j u n t iv o
Pessoa
Singular
Plural
Singular
Plural
Singular
Plural
1.a
-0
-m o s
-i
-m o s
—
-m o s
2.a
-s
-is (-d e s)
-ste
-ste s
-e s
-d e s
3.a
—
-m
-u
-ra m
—
-e m
Nas outras formas finitas, as desinências são as mesmas do presente do indi
cativo, salvo na primeira pessoa do singular, que, como a terceira, se caracteriza
pela falta de qualquer desinência.
Observação:
Para facilitar a aprendizagem, dissemos que a desinência da 3.a pessoa do plu
ral é -m (ou -ram, -em). Mas, em verdade, o -m que aí aparece é um mero símbolo
gráfico, pois nestas formas verbais as terminações -am e -em são apenas modos de
representar, na escrita, os ditongos nasais átonos [ãw] e [ej ].
A FIX O
Os a fix o s , ou m o r fe m a s DERivAciONAis, são elementos que modificam
geralmente de maneira precisa o sentido do radical a que se agregam. Os a fi
xos que se antepõem ao radical chamam-se prefixos ; os que a ele se pospõem
denominam-se sufixos .
93
94
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Assim, em desterrar e renovamos aparecem os prefixos:
des-,
re-,
que empresta ao primeiro verbo a ideia de separação;
que ao segundo acrescenta o sentido de repetição de um fato.
Os sufixos , como as desinências, unem-se à parte final do radical. Mas, en
quanto estas caracterizam apenas o gênero, o número ou a pessoa da palavra, sem
lhe alterar o sentido lexical ou a classe, os sufixos transformam substancialmente
o radical a que se juntam.
Assim, em terroso, terreiro, novinho e novamente, encontramos os sufixos:
-oso,
que do substantivo terra forma um adjetivo (terroso);
-eiro,
que do substantivo terra forma outro substantivo (terreiro);
-inho,
que do adjetivo novo forma um diminutivo (novinho);
-mente, que do feminino do adjetivo novo forma um advérbio (novamente).
O bservação:
Esta distinção entre sufixo e desinência, nem sempre observada pelos linguistas
modernos, pertence à análise mórfica tradicional.
Poderíamos simplificar a classificação desses morfemas gramaticais:
1.
°) considerando-os apenas sob o aspecto formal, caso em que a denominação
de sufixo, com abarcá-la, dispensaria a de desinência;
2.
°) distinguindo-os pelo aspecto funcional: as desinências identificar-se-iam com
os morfemas flexionais, e os sufixos seriam somente morfemas derivacionais.
Nesta última hipótese, as características de tempo e modo e, por extensão, as das
formas nominais do verbo ficariam incluídas nas desinências.
VO G AL T E M Á T IC A
Na análise da forma verbal renovamos, distinguimos três elementos forma
tivos:
a) o radical : novb) a desinência n ú m er o - pessoal: -mos
c) o prefixo : reFalta identificarmos apenas a vogal a, que aparece entre o radical nov- e a
desinência -mos, vogal que encontramos também na forma de infinitivo fumar,
entre o radical fum- e a desinência -r.
Nos dois casos, vemos, ela está indicando que os verbos em causa pertencem
à 1 .a conjugação. A essas vogais que caracterizam a conjugação dos verbos dá-se
o nome de vogais tem áticas . São elas:
C L A S S E , E S T R U T U R A E F O R M A Ç Ã O DE P A L A V R A S
-a -,
-e -,
-i-,
para os verbos da l.a conjugação (fum-a-r, renov-a-mos);
para os da 2.a (dev-e-r, faz-e-mos);
para os da 3.® (part-i-r, constru-í-mos).
O radical acrescido de uma vogal tem At ic a , isto é, pronto para receber uma
desinência (ou um sufixo), denomina-se tem a .
O bservação:
Não há acordo entre os linguistas quanto à inclusão das vogais temáticas
entre os morfemas. Parece-nos que, assim como as desinências, elas fazem parte dos
morfemas gramaticais categóricos, pois também distribuem os radicais em classes.
Por si mesmas nada significam, mas poder-se-ia talvez dizer que, no caso, a função
é a significação.
V O G A L E CO N SO AN TE DE LIGAÇÃO
Os elementos mórficos até aqui estudados entram sempre na estrutura do
vocábulo com determinado valor significativo externo ou interno. Há, porém,
outros que são insignificativos, e servem apenas para evitar dissonâncias (hiatos,
encontros consonantais) na juntura daqueles elementos.
Se examinarmos, por exemplo, os vocábulos gasómetro e cafeteira, verifica
remos que:
a) o primeiro é formado de dois radicais gás- + -metro, ligados pela vogal -o-,
sem valor significativo;
b) o segundo é constituído do radical café- + o sufixo -eira, entre os quais aparece
a consoante insignificativa -t- para evitar o desagradável hiato -éê-,
A esses sons, empregados para tornar a pronúncia das palavras mais fácil ou
eufônica, dá-se o nome de vogais e consoantes de ligaçào .
O bservação:
Observa-se na linguística moderna a tendência generalizada de não isolar tais
elementos na análise mórfica, preferindo-se considerá-los como parte do radical
ou do afixo, que, então, se apresentariam sob a forma de variantes (ou alomorfes)
relativamente a outras ocorrências suas em contextos diversos. Com efeito, à se
melhança dos fonemas, os morfemas podem apresentar variantes em sua forma,
embora se mantenham semântica e funcionalmente inalterados. Assim, do prefixo
in- (im-) há uma variante i-, fonologicamente condicionada, porquanto ocorre tão
somente antes de consoante nasal, lateral e vibrante: infeliz, imbatível, mas imoral,
ilegal, irregular.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
FORMAÇÃO DE PALAVRAS
PA LA VRAS P R IM IT IV A S E D ER IV A D A S
Chamam-se p r im it iv a s as palavras que não se formam de nenhuma outra e que,
pelo contrário, permitem que delas se originem novas palavras no idioma.
Assim:
fumo
mar
novo
pedra
Denominam-se d e r iv a d a s as que se formam de outras palavras da língua
mediante o acréscimo ao seu radical de um prefixo ou um sufixo.
Assim:
fumoso
defumar
marinha
marear
novinho
renovar
pedreiro
empedrar
PA LA VRAS S IM P LE S E COM POSTAS
As palavras que possuem apenas um radical, sejam primitivas, sejam deri
vadas, denominam-se s i m p l e s .
Assim:
mar
marinha
pedra
pedreiro
São c o m p o s t a s as que contêm mais de um radical:
quebra-mar
aguardente
guarda-marinha
pernalta
pedra-sabão
pontapé
pedreiro-livre
vaivém
O bservação:
Note-se que, na língua atual, muitas formas compostas não são mais sentidas
como tais pelos falantes. É o caso de aguardente, de pontapé, etc.
FAMÍLIAS DE PALAVRAS
Denomina-se f a m í l i a d e p a l a v r a s o conjunto de todas as palavras que se
agrupam em torno de um radical comum, do qual se formaram pelos proces
sos de derivação ou de composição que estudaremos desenvolvidamente no
capítulo seguinte.
Capítulo 6
Derivação e composição
FORMAÇÃO DE PALAVRAS
Deixando de lado a viva controvérsia entre linguistas contemporâneos sobre
a área a que efetivamente pertence a f o r m a ç ã o d e p a l a v r a s - se à morfologia, o
seu domínio tradicional, se ao léxico ou à semântica, ou, mesmo, se à sintaxe
- , procuraremos tratar a matéria deste capítulo interligada com a do anterior e
com respaldo na seguinte conceituação:
“Chama-se f o r m a ç ã o d e p a l a v r a s o conjunto de processos morfossintáticos
que permitem a criação de unidades novas com base em morfemas lexicais.
Utilizam-se assim, para formar as palavras, os afixos de derivação ou os proce
dimentos de composição” 1.
Observação:
Cumpre advertir que a d e r iv a ç ã o e a c o m p o s iç ã o não são os únicos processos
de formação de palavras. Como bem salienta um estudioso do assunto, além destes
dois processos mais comuns, há outros de uso restrito, sendo particularmente
curiosos os ONiôNiM os, os a c r ô n im o s e as a m á l g a m a s . (Veja-se a respeito J. R.
Fontenele Bessa. Por uma conceituação do termo “opacidade”. Educação, 3 1 :17-22,
Brasília, julho/ setembro, 1979.)
DERIVAÇÃO PREFIXAL
Os p r e f ix o s são mais independentes que os s u f ix o s , pois se originam, em geral,
de advérbios ou de preposições que têm ou tiveram vida autônoma na língua.
I
Jean Dubois et alii. Dictiomire de linguistique. Paris, Larousse, 1973, s. v.
98
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A rigor, poderíamos até discernir as formações em que entram prefixos que são
meras partículas, sem existência própria no idioma (como d e s - em d e s fa z e r , ou
re - em r e p o r ) , daquelas de que participam elementos prefixais que costumam
funcionar também como palavras independentes (assim: c o n tr a - em c o n tr a d iz e r ,
e n t r e - em e n t r e a b r i r ). No primeiro caso haveria derivação ; no segundo, seria
justo falar-se em c o m po siç ã o .
Mas nem sempre é fácil estabelecer tal diferença, razão por que preferimos
considerar a formação de palavras mediante o emprego de prefixos um tipo de
derivação — a derivação prefixal . Tanto os sufixos como os prefixos formam
novas palavras que conservam de regra uma relação de sentido com o radical
derivante; processo distinto da composição, que forma palavras não raro dis
sociadas pelo sentido dos radicais componentes.
Feitas estas considerações, passemos ao exame dos prefixos que aparecem
em palavras portuguesas .2
São eles de origem latina ou grega, embora normalmente não sejam senti
dos como tais. Alguns sofrem apreciáveis alterações em contacto com a vogal e,
principalmente, com a consoante inicial da palavra derivante. Assim, o prefixo
grego a n - , que indica “privação” (a n - ô n i m o ), assume a forma a - antes de con
soante: a -p a t i a ; i n - , o seu correspondente latino, toma a forma i - antes delem :
i n -f e l i z , i n - a t i v o ; mas i - le g a l , i - m o r a l .
Não se devem confundir tais alterações com as formas vernáculas, oriundas
de evolução normal de certos prefixos latinos. Assim: a -, de a d - ( a - d o ç a r ); e m ou e n - , de i n - ( e m - b a r c a r , e n - te r r a r ).
Na lista abaixo, colocaremos em chave as formas que pode assumir o mesmo
prefixo: em primeiro lugar, daremos a forma originária; em último, a vernácula,
quando houver.
P r e fix o s d e o rig e m la tin a
P r e f ix o
ab-
S e n t id o
a fa s ta m e n t o , s e p a r a ç ã o
E x e m p l if ic a ç ã o
a b d ic a r , a b ju r a r
ab s-
a b ste r, a b s t r a ir
a-
a m o v ív e l, a v e rs ã o
ada- (ar-, a s-)
a p r o x im a ç ã o , d ir e ç ã o
a d ju n t o , a d v e n t íc io
a b e ir a r , a r r ib a r , a s s e n t ir
■ Quanto à vitalidade dos prefixos utilizados na língua contemporânea, leia-se Li Ching.
Sobre a formação de palavras com prefixos no português atual. Boletim de Filologia, 22:
117-176 e 197-234, Lisboa, 1971-1973.
A exemplo de alguns linguistas, os autores observam a distinção entre prefixos e pseudoprefixos, como se verá adiante.
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
P r e f ix o
S e n t id o
E x e m p l if ic a ç ã o
a n te -
a n t e r io r id a d e
a n te -
a n t e r io r id a d e
c ir c u m -
m o v im e n t o e m t o r n o
c irc u m -a d ja c e n te , c irc u n v a g a r
c is -
p o s iç ã o a q u é m
c is a lp in o , c is p la t in o
c o m - (c o n -)
c o n t ig u id a d e , c o m p a n h ia
c o m p o r, c o n t e r
a n te b ra ço , a n te p o r
( c ir c u n - )
c o - (co r-)
c o o p e ra r, c o r r o b o r a r
co n tra -
o p o s iç ã o , a ç ã o c o n ju n t a
c o n t r a d iz e r , c o n t r a s s e la r
de-
m o v im e n to de c im a para baixo
d e c a ir , d e c r e s c e r
d es-
s e p a r a ç ã o , a ç ã o c o n t r á r ia
d e s v ia r, d e s fa z e r
d is -
s e p a r a ç ã o , m o v im e n t o p a ra
d is s id e n t e , d is t e n d e r
d i- (d ir-)
d iv e r s o s la d o s , n e g a ç ã o
d ila c e r a r , d ir im ir
e n tre -
p o s iç ã o in t e r m e d iá r ia
e n t r e a b r ir , e n t r e lin h a
ex-
m o v im e n t o p a ra fo ra ,
e x p o rta r, e x t r a ir
e s-
e s ta d o a n t e r io r
e s c o rr e r , e s t e n d e r
e-
e m ig r a r , e v a d ir
e x tra -
p o s iç ã o e x t e r io r (fo ra d e )
e x t r a o fic ia l, e x tra v ia r
in-1 (im -)
m o v im e n t o p a ra d e n tr o
in g e r ir , im p e d ir
i- ( i r )
im ig ra r , ir r o m p e r
e m - (e n -)
e m b a rca r, e n te rra r
in-2 (im -)
n e g a ç ã o , p r iv a ç ã o
i- ( ir - )
in a t iv o , im p e r m e á v e l
ile g a l, ir r e s t r it o
in t r a -
p o s iç ã o in t e r io r
in tr a d o r s o , in tr a v e n o s o
in t r o -
m o v im e n t o p a ra d e n tr o
in t r o v e r s ã o , in t r o m e t e r
ju s t a -
p o s iç ã o a o lad o
ju s t a p o r , ju s t a lin e a r
ob-
p o s iç ã o e m f r e n t e , o p o s iç ã o
o b je t o , o b s t á c u lo
o-
o c o rre r, o p o r
p e r-
m o v im e n t o a tra v é s
p e rc o rre r, p e r fu r a r
p o s-
p o s t e r io r id a d e
p o sp o r, p o s t ô n ic o
p re -
a n t e r io r id a d e
p re fá c io , p re tô n ic o
99
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
P r e fix o s d e o rig e m g re g a
Eis os principais prefixos de origem grega com as formas que assumem em
português:
S e n t id o
P r e f ix o
E x e m p l if ic a ç ã o
a n - (a-)
p riv a ç ã o , n e g a ç ã o
a n a r q u ia , a te u
aná-
a ç ã o o u m o v im e n t o in v e rs o ,
a n a g r a m a , a n á fo ra
r e p e t iç ã o
a n fi-
d e u m e o u tr o lad o, e m to rn o
a n f íb io , a n fit e a t r o
a n ti-
o p o s iç ã o , a ç ã o c o n t r á r ia
a n t ia é r e o , a n t íp o d a
a pó-
a fa s ta m e n t o , s e p a r a ç ã o
a p o g e u , a p ó s ta ta
a r q u i- (a rc-,
s u p e r io r id a d e
a r q u id u q u e , a r c a n jo
a r q u e - , a rc e -)
c a tá -
a r q u é t ip o , a r c e b is p o
m o v im e n to de c im a para baixo,
c a t a d u p a , c a t a c re s e
o p o s iç ã o
d iá - ( d i- )
m o v im e n t o a tr a v é s d e,
d ia g n ó s t ic o , d io c e s e
a fa s ta m e n t o
d is-
d if ic u ld a d e , m a u e s ta d o
d is p n e ia , d is e n t e r ia
ec- (ex -)
m o v im e n t o p a ra fo ra
e c lip s e , ê x o d o
e n - (e m -, e-)
p o s iç ã o in t e r io r
e n c é f a lo , e m p la s t r o , e lip s e
e n d o - (e n d -)
p o s iç ã o in te r io r,
e n d o t é r m ic o , e n d o s m o s e
m o v im e n t o p a ra d e n tr o
e p i-
p o s iç ã o s u p e r io r ,
e p id e r m e , e p ílo g o
m o v im e n t o p a ra ,
p o s t e r io r id a d e
eu- (ev-)
b em , bom
e u f o n ia , e v a n g e lh o
h ip e r -
p o s iç ã o s u p e r io r , e x c e ss o
h ip é r b o le , h ip e r t e n s ã o
h ip ó -
p o s iç ã o in fe r io r, e s c a s s e z
h ip o d é r m ic o , h ip o t e n s ã o
m e t á - (m e t-)
p o s t e r io r id a d e , m u d a n ç a
m e t a c a r p o , m e tá te s e
p a r á - (p a r-)
p r o x im id a d e , a o la d o d e
p a r a lo g is m o , p a r a m n é s ia
p e r i-
p o s iç ã o o u m o v im e n t o
p e r ím e t r o , p e r íf r a s e
e m to rn o
p ró -
p o s iç ã o e m f r e n t e , a n t e r io r
p ró lo g o , p ro g n ó s tic o
s in - ( s im - ,s i - )
s im u lt a n e id a d e , c o m p a n h ia
s in f o n ia , s im p a t ia , s íla b a
100
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
P r e f ix o
S e n t id o
E x e m p l if ic a ç ã o
p ro -
m o v im e n t o p a ra a fre n te
p ro g re s s o , p r o s s e g u ir
re-
m o v im e n to para trás, re p e tiçã o
re flu ir, r e fa z e r
re tr o -
m o v im e n t o m a is p a ra trá s
re tro c e d e r, r e t r o s p e c t iv o
s o to -
p o s iç ã o in fe r io r
s o to - m e s tre , s o t o p o r
so ta -
so ta -v e n to , so ta -v o g a
su b -
m o v im e n t o d e b a ix o p a ra
s u b ir , s u b a lt e r n o
SUS-
c im a , in f e r io r id a d e
su sp e n d e r, su ste r
su -
s u c e d e r, s u p o r
so b -
s o b e s t a r ,s o b p o r
so -
s o e rg u e r, s o t e r r a r
su p er-
p o s iç ã o e m c im a , e x c e s s o
so b re -
su p e rp o r, su p e rp o v o a d o
s o b re p o r, so b re c a rg a
su p ra -
p o s iç ã o a c im a , e x c e s s o
s u p r a d it o , s u p r a s s u m o
tra n s-
m o v im e n t o p a ra a lé m d e ,
t r a n s p o r , t r a n s a lp in o
tra s-
p o s iç ã o a lé m de
t r a s la d a r , t r a s p a s s a r
trè s -
t r e s v a r ia r , t r e s m a lh a r
u ltr a -
p o s iç ã o a lé m d o lim it e
u ltr a p a s s a r, u ltr a s s o m
v ic e -
s u b s t it u iç ã o , e m lu g a r d e
v ic e -re ito r, v ic e - c ô n s u l
v is - (v iz o - )
v is c o n d e , v iz o -re i
Observações:
1.
a) As alterações sofridas pelos prefixos são provocadas quase sempre pelo
fenômeno chamado a s s i m i l a ç ã o , que consiste em absorver um fonema as caracte
rísticas de outro que lhe está contíguo. Como, em geral, a a s s i m i l a ç ã o identifica os
dois fonemas, é comum o desaparecimento de um deles: in -leg a l > il-legal > ilegal .
Advirta-se, em tempo, que a a s s i m i l a ç ã o é um fato fonético, e não deve ser con
fundida com as acomodações que, na escrita, sofrem certos prefixos por exigência do
nosso sistema ortográfico. Assim, in -fie l , mas im - p r o d u tiv o ; i-m ig ra r , mas ir - ro m p e r ,
etc. São essas variantes puramente gráficas que colocamos entre parênteses.
2.
a) Cumpre não confundir os dois prefixos que aparecem sob a mesma forma
in - (ou í-). Um indica “movimento para dentro” ( ingerir , im ig ra r )-, o outro denota
“privação, negação” ( in a tivo , ilegal ).
3.
a) As formas numerais u n i - ( u n ip e sso a l ), bis - ou b i - ( bisneto , b im e stra l ) e seme
lhantes são, pela maioria dos gramáticos, tidas por prefixos. Como, pelo emprego,
não se diferenciam substancialmente dos elementos numerais que ocorrem em
compostos aritméticos e geométricos— a exemplo de deci - , c e n ti - (latinos), d eca -,
q u ilo - (gregos) — julgamos mais acertado considerá-los verdadeiros r a d i c a i s , e o
processo formativo de que participam um caso de c o m p o s i ç ã o .
102
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Para um estudo do prefixo cmti- em relação com os seus concorrentes no âmbito
do francês, mas com possibilidade de aplicação ao português, consulte-se A. Rey. Un
champ préfixal: les mots ffançais en anti. Cahiers de Lexicologie, 12:37-57, Paris, 1968.
DERIVAÇÃO SUFIXAL
Pela derivação suFixAL3 formaram-se, e ainda se formam, novos substantivos,
adjetivos, verbos e, até, advérbios (os advérbios em -mente). Daí classificar-se
o sufixo em:
a)
no m ina l ,
q u a n d o se a g lu tin a a u m r a d ic a l p a r a d a r o r ig e m a u m s u b s ta n tiv o
o u a u m a d je tiv o :
b)
verbal ,
pont-eira, pont-inha,pont-udo;
q u a n d o , lig a d o a u m ra d ic a l, d á o r ig e m a u m v e rb o :
bord-ejar, suav
izar, amanh-ecer;
c)
a d v e r b ia l ,
que é o sufixo -mente, acrescentado à forma feminina de um
adjetivo: bondosa-mente, fraca-mente, perigosa-mente.
S u fix o s n o m in a is
Entre os
aumentativos
mencionaremos em primeiro lugar os
e dim inutivos , cujo valor é mais afetivo do que lógico.
sufixos n o m in a is ,
sufixos
Sufixos aumentativos
Eis os principais sufixos aumentativos usados em português:
S u fix o
E x e m p l if ic a ç ã o
S u fix o
E x e m p l if ic a ç ã o
-ã o
c a ld e ir ã o , p a re d ã o
- a n z il
c o r p a n z il
- a lh ã o
g r a n d a lh ã o , v a g a lh ã o
-a ré u
fo g a r é u , p o v a ré u
- (z )a rrã o
g a t a r rã o , h o m e n z a r r ã o
-a rra
b o c a r ra , n a v ia r r a
- e ir ã o
a s n e ir ã o , t o le ir ã o
-o rr a
b e iç o r r a , c a b e ç o r ra
-a ça
b a r b a ç a , b a rc a ç a
-a stro
m e d ic a s t ro , p o e ta s tro
-a ç o
a n im a la ç o , r ic a ç o
-a z
lo b a z , ro a z
- á z io
c o p á z io , g a tá z io
- a lh a z
fa c a lh a z
-u ç a
d e n tu ça , ca rd u ça
-a rra z
p ra ta r r a z
3 Sobre a origem e a vitalidade dos sufixos empregados em português, veja-se especialmente
Joseph H. D. Allen Jr. Portuguese Word-Formation with Suffixes. Supplement to Language,
vol. 17, n.° 2. Baltimore, 1941.
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
Observação:
Nem sempre o sufixo aumentativo se junta ao radical de um substantivo. Há
derivações feitas sobre adjetivos (ricaço, de rico; sabichão, de sábio) e também sobre
radicais verbais (chorão, de chorar; mandão, de mandar).
Valor e emprego dos sufixos aum entativos
1. -ão. É, por excelência, o formador dos aumentativos em português. Pode
juntar-se a radicais de substantivos (papel-ão), de adjetivos (solteir-ão) e de
verbos (chor-ão), quer diretamente, como nos exemplos citados, quer por
intermédio de consoantes de ligação ( chape-l-ão) ou de outros sufixos {-alho,
-arro, -eiro, -il), donde os sufixos compostos -alhão (grand-alhão), -arrão
{gat-arrão), -eirão ( voz-eirão), -ilão {com-ilão).
Advirta-se também que, nos aumentativos em -ão, o gênero normal é o
masculino, mesmo quando a palavra derivante é feminina.
Assim:
a parede - o paredão
uma mulher - um mulherão
Só os adjetivos fazem diferença entre o masculino e o feminino, diferença
que, naturalmente, conservam quando substantivados:
solteirão - solteirona
chorão - chorona
2. -aça, -aço, -uça e -ázio. Formam substantivos com força aumentativa e
pejorativa. Prendem-se a radicais de outros substantivos e, mais raramente,
a de adjetivos, sendo de notar que -uça apresenta acentuado valor coletivo.
Saliente-se ainda que -ázio parece ser adaptação do espanhol -azo.4
3. -anzil. Este sufixo, que ocorre em corpanzil, deve ser composto de -ão + -il,
com a consoante de ligação -z-. Quanto ao valor, é nitidamente pejorativo.
4. -aréu. De origem obscura, este sufixo nem sempre é aumentativo. Em mastaréu {= pequeno mastro suplementar), por exemplo, é antes diminutivo.
Em fogaréu, fumaréu, mundaréu e povaréu sente-se que o valor aumentativo
está associado ao coletivo.
Sobre o assunto, veja-se o fundamental estudo de Y. Malkiel. The Two Sources of the
Hispanic Suffix -azo, -aço. Language, 35: p. 193-258,1959.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
5. -arra e -orra. Formas femininas dos sufixos -arro e -orro, ligam-se a radicais
de substantivos de qualquer gênero:
bocarra
naviarra
beiçorra
cabeçorra
Nas formações de adjetivos, com base em radicais de verbos ou de outros
adjetivos, há, segundo a regra geral, oposição de gênero:
bebarro - bebarra
beatorro - beatorra
Em épocas mais antigas, estes sufixos não tinham o forte valor depreciativo
de hoje. A forma - orro, por exemplo, aparece em cachorro, palavra que, na
acepção primitiva de “filhote de cão e de algumas feras”, deveria ter sido um
diminutivo.
6.
-astro. Neste sufixo, que aparece em poucas palavras portuguesas, o valor
pejorativo é o mais saliente: medicastro “médico ruim, charlatão”; poetastro
“mau poeta, versejador ordinário”. O sufixo assume a forma -asto, -asta, em
padrasto e madrasta.
7. -az. Como o sufixo -ão, pode juntar-se diretamente ao radical (lob-az), ou
admitir a inserção de uma consoante eufônica ( ladra-v-az), ou de outros
sufixos {-alho, -arro), com os quais passa a formar os compostos: -alhaz
{fac-alhaz), -arraz {prat-arraz).
Sufixos diminutivos
São estes os principais
S ufixo
sufixos dim inutivos
empregados em português5:
E xemplificação
SüFÍXÕ
E xemplificação
- in h o , -a
t o q u in h o , v o z in h a
- e lh o , -a
f o lh e lh o , r a p a z e lh o
- z in h o , -a
c ã o z in h o , r u a z in h a
-e jo
a n im a le jo , lu g a r e jo
- in o , -a
p e q u e n in o , c r a v in a
- ilh o , -a
p e c a d ilh o , t r o p ilh a
-im
e s p a d im , fo rt im
5 Sobre a formação dos diminutivos nas línguas românicas em geral, leiam-se: Reino
Hakamies. Étude sur l’origine et l’évolution du diminutif latin et sa survie dans les langues
romanes. Helsinki, Academiae Scientiarum Fennicae, 1951; Bengt Hasserlot. Études sur
la formation diminutive dans les langues romanes. Upsala, Acta Universitatis Upsaliensis,
1957. Quanto ao seu valor e emprego na língua portuguesa, consultem-se especialmente:
Silvia Skorge. Os sufixos diminutivos em português. Boletim de Filologia, 16:50-90 e 222305,1956-1957; 17:20-53,1958; Max Léopold Wagner. Das Diminutivin Portugiesischen.
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
S u fix o
E x em p lific a ç ã o
-acho, -a
-icho, a
-ucho,-a
f o g a c h o , r ia c h o
g o v e r n ic h o , b a r b ic h a
p a p e lu c h o , c a s u c h a
-ebre
ca se b re
-eco, -a
-ico, -a
liv r e c o , s o n e c a
-ela
iS u f ix o*
E x em p lific a ç ã o
-ete
-eto, -a
-ito, -a
-zito, -a
-ote, -a
a r t ig u e t e , le m b r e t e
e s b o c e t o , s a le t a
r a p a z it o , c a s it a
j a r d in z it o , f lo r z it a
v e lh o t e , v e lh o t a
c h u v is c o , t a l is c a
b u r r ic o , m a r ic a ( s )
-isco, -a
-usco, -a
r u e la , v ie la
-ola
f a z e n d o la , r a p a z o la
c h a m u s c o , v e lh u s c o
Valor e emprego dos sufixos dim inutivos
1. -(z)inho, -ino, -im. Os sufixos -inho e -mo provêm do latim -inus. A forma
tipicamente portuguesa é - inho; -ino, variante erudita, só aparece com valor
diminutivo em um restrito número de palavras; -im é importação do francês
- in, ou do italiano -ino, através da forma francesa. Compare-se: tamborim, do
francês tambourin; festim, do francês festin, por sua vez derivado do italiano
festino.
O sufixo -inho (-zinho) é de enorme vitalidade na língua6, desde tempos
antigos. Junta-se não só a substantivos e adjetivos, mas também a advérbios
e outras palavras invariáveis:
agorinha
devagarinho
sozinho
adeusinho!
OrbiSy 1: 460-476, 1952; Delmira Maçãs. O sufixo -inho junto a adjetivos na linguagem
familiar portuguesa. Boletín de Filologia de la Universidad de Chile, 8:219-232,1954-1955;
Th. Henrique Maurer Jr. Um sufixo de comportamento original: o diminutivo em -zinho.
In Estudos em homenagem a Cândido Jucá (filho). Rio de Janeiro, Simões, s./d., p. 233-246.
De importante leitura, à vista da relação com o português, são os seguintes estudos sobre
os diminutivos espanhóis: Amado Alonso. Noción, emoción, acción y fantasia en los
diminutivos. In Estúdios linguísticos: temas espanoles. Madrid, Gredos, 1951, p. 195-229;
Fernando González Ollé. Los sufijos diminutivos en castellano medieval. Madrid, C.S.I.C.,
1962; Emilio Nánez Fernández. El diminutivo: historia y fimciones en el espafwl clásico y
moderno. Madrid, Gredos, 1973. (As duas últimas obras trazem extensa bibliografia.)
n J. G. Herculano de Carvalho propõe a designação de sufjxoide para o sufixo -(z)inho
pelas razões que o levaram a adotar a de prefixoide para certos elementos formativos
que não se comportam como prefixos (vj. adiante nossas considerações sobre os pseudoprefixos). Lembra o ilustre linguista o caráter sintagmático deste sufixo, evidenciado
morfologicamente pelas variações de gênero e número, que se manifestam duplamente
nos derivados: corpozinho - corpozinhos, cãozinho - cãezinhos, bonzinho - boazinha (cf.
Teoria da linguagem, t. II, Coimbra, Atlântida, 1974, p. 551-552).
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Excetuando-se o caso das palavras terminadas em -s e -z, que naturalmente
exigem a forma -inho (pires-inho, rapaz-inho), não é fácil indicar as razões
que comandam a escolha entre - inho e -zinho. Sente-se que muitas vezes a
seleção está ligada ao ritmo da frase. Por outro lado, verifica-se uma prefe
rência na linguagem culta pelas formações com -zinho, no evidente intuito
de manter íntegra a pronúncia da palavra derivante; a linguagem popular,
no entanto, simplificadora por excelência, tende para as formações com -inho.
Camparem-se, por exemplo, as formas alternantes baldezinho - baldinho,
xicarazinha - xicrinha, etc.
Do ponto de vista morfológico, acentue-se que, ao contrário dos aumen
tativos em -ão, os diminutivos em -inho (e também em -ito) não sofrem
mudança de gênero. O diminutivo conserva o gênero da palavra derivante:
casa - casinha - casita
cão - cãozinho - canito
Em formações com outros sufixos, não é, porém, estranha tal mudança:
ilha - ilhote - ilhéu
chuva - chuvisco
Convém notar ainda que nas formações em que o sufixo -inho se junta a
particípios, caso estes sejam irregulares, tornam-se regulares.
Exemplo:
Esse dinheiro foi bem ganhadinho e bem gastadinho por mim.
2. -acho, -icho, ucho. Originam-se da acumulação dos sufixos latinos -asm
(-iscu e -usai) + -ulus, e têm geralmente valor pejorativo. As variantes -echo e
-ocho são de emprego raro. Ocorrem em formas dialetais portuguesas, como
ventrecha “posta de peixe imediata à cabeça”, bagocho “novelo pequeno” e
realocho “moeda antiga”. A última provavelmente entra no brasileirismo
cabrocha “moça mestiça escura”.
3. -ebre. O sufixo -ebre, de origem desconhecida, aparece apenas em casebre,
onde tem caráter pejorativo.
4. -eco, -ico. Também não está suficientemente esclarecida a origem dos sufixos
-eco e -ico. O primeiro tem acentuado valor pejorativo: folheca, jomaleco,
Jivreco, etc. Não possui, no entanto, a mesma conotação em guatemalteco,
provavelmente empréstimo do espanhol. O segundo aparece como diminu
tivo afetivo não só de substantivos comuns (abanico, amorico, burrico), mas
também de nomes próprios: Anica, Joanico, etc.
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
5. -ela. Continua o latim -ella, que tinha força diminutiva e largo emprego na
língua vulgar (assim: dominicella “senhorita” > port. donzela). No português
moderno é pouco produtivo; só nas formas nominais em -dela apresenta
vitalidade: entaladela, mordidela, etc.
6.
-elho, -ilho. Os sufixos -elho e -ilho representam, em português, a evolução
normal dos sufixos diminutivos latinos -ículus e -leulus, respectivamente. A
forma -ejo é o desenvolvimento de -ículus para o espanhol. Importada dessa
língua, tornou-se, em certos casos, autônoma em português. Assim: lugarejo,
quintalejo, etc.
7. -ete, -eto, -(z)ito, -ote. É um tanto obscura a origem destes sufixos. Deles
o mais usado, principalmente em Portugal e no Sul do Brasil, é -ito, com a
variante -zito. O sufixo -eto, como diminutivo, não apresenta vitalidade em
português; as palavras que o possuem são, em geral, empréstimos do italiano:
poemeto, verseto, etc. Já as formas -ete e -ote, provavelmente originárias do
francês, aparecem hoje em derivações genuinamente portuguesas: artiguete,
lembrete, malandrete, meninote, serrote, velhote, etc. As formas -ato e -oto são
de emprego raro e, hoje, praticamente improdutivas. Ocorrem nuns poucos
substantivos que, de regra, designam crias de animais. Assim: chibato, loba
to, lebroto e perdigoto são nomes que se dão, respectivamente, ao filhote da
chiba (= cabra nova), do lobo, da lebre e da perdiz (masculino = perdigão).
Perdigoto emprega-se também na acepção de “salpico de saliva que se lança
ao falar”.
8.
-isco, -usco. O sufixo -isco é forma erudita do latim -iscus, provavelmente
originado da fusão do grego -iskós com o germânico -isk. O descendente
popular é -esco, que forma adjetivos denotadores de “referência ou seme
lhança” (burlesco, principesco), sentido que também possui -isco em palavras
como levantisco, mourisco. Por analogia com -isco, a língua criou -usco:
chamusco.
9. -ola. Este sufixo não deve ser em português o representante direto do latim
-ola. Chegou-nos provavelmente por intermédio do italiano -ola, ou do
francês -ole. Comparem-se, por exemplo, as palavras portuguesas bandeirola
e camisola às italianas banderuola e camiciuola, ou às francesas banderole e
camisole. Hoje, porém, generalizou-se o emprego de -ola no idioma, prin
cipalmente na formação de substantivos sobrecomuns de caráter irônico-pejorativo: gabarola, mariola, etc.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
D im inutivos eruditos
Na língua literária e culta, especialmente na terminologia científica, apa
recem formações modeladas no latim em que entram os sufixos -ulo {-ida) e
-culo {-cuia), com as variantes -áculo (-ácida), -ículo {-ícida), -úsculo {-úscula)
e -únculo (- úncula):
corpo
febre
globo
gota
grão
homem
modo
monte
nó
—
corpúsculo
febrícula
glóbulo
gotícula
grânulo
homúnculo
módulo
montículo
nódulo
nota
obra
parte
pele
questão
raiz
rei
verme
verso
—
—
nótula
opúsculo
partícula
película
questiúncula
radícula
régulo
vermículo
versículo
Observações:
1.
a) Como vemos, nestas formações latinas, ou feitas em idênticos moldes, o sufixo
-culo{-a) e sua variante-únculo{-a) podem juntar-se ao radical diretamente (mús-culo,
hom-únculo), ou por intermédio da vogal de ligação -i- {vers-í-culo, quest-i-úncula).
2.
a) A forma primitiva deste sufixo latino, derivado do indo-europeu *-lo *olo, era -ulo, que encontramos empregado com substantivos (ancillula) e adjetivos
(acutulus). O acréscimo do -c ao sufixo é geralmente explicado como “um reforço
da expressividade, fenômeno comum nos diminutivos”. Ernout, porém, acha que foi
a existência de muitas palavras de radical em -c que provocou uma falsa análise do
sufixo diminutivo, dando origem a -culus (Veja-se Fernando González Ollé. Obra
cit, p. 177-179).
Outros sufixos nominais
1.
Que formam substantivos de outros substantivos:
S u f ix o
-ada
S e n t id o
E x e m p l if ic a ç Ao
a ) m u lt id ã o , c o le ç ã o
b o ia d a , p a p e la d a
b ) p o rç ã o c o n t id a n u m o b je to
b o c a d a , c o lh e r a d a
c) m a rc a fe ita c o m u m in s tr u m e n t o
p e n a d a , p in c e la d a
d ) f e r im e n t o o u g o lp e
d e n t a d a , fa c a d a
e ) p ro d u t o a lim e n t a r , b e b id a
b a n a n a d a , la r a n ja d a
0 d u r a ç ã o p ro lo n g a d a
in v e r n a d a , t e m p o r a d a
g ) a to o u m o v im e n t o e n é r g ic o
c a r t a d a , s a ra iv a d a
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
S u fix o
•a d o
S
e n t id o
E x e m p l if ic a ç ã o
a ) t e r r it ó r io s u b o r d in a d o a t it u la r
b is p a d o , c o n d a d o
b ) in s t it u iç ã o , t it u la t u r a
a lm ir a n t a d o , d o u to r a d o
a ) in s t it u iç ã o , t it u la t u r a
b a r o n a t o , c a r d in a la t o
b ) n a n o m e n c la t u r a q u ím ic a = sa l
c a r b o n a t o , s u lfe to
a ) n o ç ã o c o le tiv a
f o lh a g e m , p lu m a g e m
b ) a to o u e s ta d o
a p r e n d iz a g e m , la d ro a g e m
a ) id e ia d e r e la ç ã o , p e r t in ê n c ia
d e d a l, p o rta l
b ) c u lt u r a d e v e g e ta is
a r r o z a l, ca fe z a l
c ) n o ç ã o c o le tiv a ou d e q u a n t id a d e
a r e a l, p o m b a l
- a lh a
c o le tiv o - p e jo ra t iv o
c a n a lh a , g e n ta lh a
-am a
n o ç ã o c o le tiv a e d e q u a n t id a d e
d in h e ir a m a , m o u ra m a
-am e
n o ç ã o c o le tiv a e d e q u a n t id a d e
—
v a s ilh a m e , v e la m e
- a r ia
a ) a t iv id a d e , r a m o d e n e g ó c io
c a r p in t a r ia , liv r a r ia
b ) n o ç ã o c o le tiv a
g r it a r ia , p e d r a ria
c ) a çã o p ró p ria d e ce rto s in d iv íd u o s
p a t if a r ia , p ir a t a ria
a ) o c u p a ç ã o , o fíc io , p ro fiss ã o
o p e r á r io , s e c r e t á r io
b ) lu g a r o n d e se g u a r d a a lg o
h e r b á r io , v e s t iá r io
a ) lu g a r o n d e c r e s c e m v e g e ta is
o liv e d o , v in h e d o
b ) n o ç ã o c o le tiv a
la je d o , p a s s a re d o
a ) o c u p a ç ã o , o fíc io , p ro fiss ã o
b a r b e ir o , c o p e ir a
b ) lu g a r o n d e se g u a r d a a lg o
g a lin h e ir o , t in t e ir o
c ) á r v o r e e a rb u s to
la r a n je ir a , c r a v e ir o
d ) id e ia d e in t e n s id a d e , a u m e n t o
n e v o e iro , p o e ira
e ) o b je to d e u so
c in z e ir o , p u ls e ir a
f ) n o ç ã o c o le tiv a
b e r r e ir o , f o r m ig u e ir o
a ) p ro fis s ã o , t it u la t u r a
a d v o c a c ia , b a r o n ia
b) lu g a r o n d e se exerce u m a a tiv id a d e
d e le g a c ia , r e it o r ia
c ) n o ç ã o c o le tiv a
c a v a la r ia , c le r e z ia
-io
n o ç ã o c o le tiv a , r e u n iã o
g e n tio , m u lh e r io
-ite
in f la m a ç ã o
b ro n q u ite , g a s t rite
-u g e m
s e m e lh a n ç a ( p e jo r a t iv o )
fe rru g e m , p e n u g e m
-a to
-ag e m
-al
- á r io
-e d o
- e ir o ( a )
-ia
-u m e
■
-
n o ç ã o c o le tiv a e d e q u a n t id a d e
A
— — — —
---
ca rd u m e , n e g ru m e
109
110
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Na terminologia científica empregam-se sufixos com valor particular. Na química,
por exemplo, usam-se:
a) -a to , -eto , -ito - na formação dos nomes de sais: clorato , cloreto , clorito ;
b) -m a - na dos alcaloides e álcalis artificiais: cafeína , a n ilin a ;
c) -io - na dos corpos simples: potássio , só d io -,
d) -o l - na dos derivados de hidrocarbonetos: fe n o l , n a fto l .
A nomenclatura da mineralogia e da geologia adota os sufixos:
a) -ita - para os nomes das espécies minerais: p ir ita ;
b) -ito - para os das rochas: g ra n ito ;
c) -ite - para os dos fósseis: a m o n ite .
A linguística moderna faz largo uso do sufixo -e m a com o sentido de “menor
unidade distintiva” ou “significativa”: fo n e m a , “menor segmento distintivo numa
enunciação”; m o rfe m a , “menor unidade gramatical de forma”.
2. Que formam substantivos de adjetivos:
Os substantivos derivados, geralmente nomes abstratos, indicam qualidade,
propriedade, estado ou modo de ser:
E x e m p l if ic a ç ã o
S u fix o
S u f ix o
E x e m p l if ic a ç ã o
-d a d e
c r u e ld a d e , d ig n id a d e
-ic e
to lic e , v e lh ic e
-(i)dão
g r a tid ã o , m a n s id ã o
- íc ie
c a lv íc ie , im u n d íc ie
-e z
a lt iv e z , h o n r a d e z
-or
a lv o r, a m a r g o r
-e z a
b e le z a , r iq u e z a
- ( i) t u d e
a lt itu d e , m a g n it u d e
-ia
a le g r ia , v a le n t ia
-ura
a lv u ra , d o ç u r a
Observações:
1.
") Antes de receberem o sufixo - d a d e , os adjetivos terminados em - a z , - iz , -o z
e -vel retomam a forma latina em - a c ( i ), - ic ( i ), - oc ( i ) e - b il ( i ):
sagaz > sagacidade
feliz > felicidade
2.
atroz > atrocidade
amável > amabilidade
a) O sufixo -ície só aparece em palavras modeladas sobre o latim: calvície (latim
calvities),p la n íc ie (latim p la n ifie s ), e tc . Também ju stiç a não apresenta propriamente o
sufixo - iça , porque a palavra é continuação do latim ju s titia . Da mesma forma cobiça
(do baixo-latim c u p id itia ), preguiça (do latim p ig r itia ), etc.
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
3. Que formam substantivos de substantivos e de adjetivos:
S u fix o
S e n t id o
a ) d o utrin as ou sistem as
- is rn o
E x e m p l if ic a ç ã o
artístico s
realism o , sim bolism o
filosóficos
kantism o, positivism o
políticos
fed eralism o , fascism o
religiosos
budism o, calvinism o
b ) modo de proceder ou pensar
heroísm o, servilism o
c) form a p ecu liar da língua
g alicism o , neologism o
d ) na term ino lo g ia cie n tífica
daltonism o, reum atism o
4. Que formam substantivos e adjetivos de outros substantivos e adjetivos:
S ufixo
- is t a
E x em plific a ç ã o
S en tid o
a ) p artid ário s ou
artístico s
realista, sim bolista
sectários de
filosóficos
kantista, p o sitivista
d o u trin as ou
políticos
federa lista , fascista
sistem as (em - is m o )
religiosos
budista, calvinista
b ) ocupação, ofício
d en tista, pianista
c) nom es p átrio s e gentílicos
no rtista, paulista
Observação:
Nem todos os designativos de sectários ou partidários de doutrinas ou sistemas
em - isrno se formam com o sufixo - ista . Por exemplo: a p ro te sta n tism o corresponde
p ro te sta n te ; a m a o m e tis m o , m a o m e ta n o -, a isla m ism o , isla m ita .
5. Que formam substantivos de verbos:
S u fix o
S e n t id o
-an ça
E x e m p l if ic a ç ã o
le m b r a n ç a , v in g a n ç a
- â n c ia
o b s e r v â n c ia , t o le r â n c ia
a ç ã o o u o r e s u lta d o d e la , e s ta d o
-en ça
d e s c r e n ç a , d if e r e n ç a
- ê n c ia
a n u ê n c ia , c o n c o r r ê n c ia
-a n te
e stu d a n te , n a v e g a n te
- e n te
- in te
a g e n te
a flu e n t e , c o m b a t e n t e
o u v in t e , p e d in te
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
S e n t id o
S u f ix o
-(d )o r
E x e m p l if ic a ç ã o
jo g a d o r , r e g a d o r
< t)o r
a g e n te , in s t r u m e n t o d a a ç ã o
-(s)o r
in s p e to r, in t e r r u p t o r
a g re s s o r, a s c e n s o r
■
-çã o
a ç ã o o u o r e s u lta d o d e la
-sã o
-d o u ro
n o m e a ç ã o , t r a iç ã o
a g r e s s ã o , e x te n s ã o
lu g a r o u in s t r u m e n t o d a a ç ã o
-tó rio
b eb ed o u ro , su a d o u ro
la v a tó rio , v o m it ó r io
-(d )u ra
r e s u lta d o o u in s t r u m e n t o d a a ç ã o ,
p in t u r a , a ta d u ra
-<t)ura
n o ç ã o c o le tiv a
fo r m a t u r a , m a g is t r a t u r a
- (s )u ra
-m e n to
c la u s u r a , t o n s u r a
a ) a ç ã o o u r e s u lt a d o d e la
a c o lh im e n t o , f e r im e n t o
b ) in s t r u m e n t o d a a ç ã o
o r n a m e n t o , in s t r u m e n t o
c ) n o ç ã o c o le tiv a
a rm a m e n to , fa rd a m e n to
Observações:
1.
*) Os sufixos -ância e -ência são semieruditos. Aparecem em palavras de criação
recente e modeladas sobre o latim.
2.
a) Os sufixos -ante, -ente e -inte procedem das terminações do particípio presente
latino, com aglutinação da vogal temática da conjugação correspondente.
3.
a) Em -dor, -tore -sor, bem como em -dura,-tura e -sura, os sufixos são propria
mente -or e -ura. As consoantes d,tes pertencem ao tema do particípio latino. Apenas
as formas -dor e -dura são evolutivas; as demais são eruditas: só ocorrem em palavras
latinas ou formadas sobre o seu modelo.
4.
a) Os sufixos -ção e -são depreendem-se de substantivos deverbais, quase todos
formados no próprio latim.
6.
Que formam adjetivos de substantivos:
S u fix o
S e n t id o
E x e m p l if ic a ç ã o
-a c o
e s ta d o ín t im o , p e r t in ê n c ia , o rig e m
m a n ía c o , a u s t r ía c o
-a d o
a ) p ro v id o o u c h e io d e
b a rb a d o , d e n te a d o
b) q u e t e m o c a r á t e r d e
a d a m a d o , a m a r e la d o
- a ic o
r e f e r ê n c ia , p e r t in ê n c ia
ju d a ic o , p ro s a ic o
-al
r e la ç ã o , p e r t in ê n c ia
c a m p a l, c o n ju g a l
-a r
e s c o la r, fa m i lia r
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
S ufixo
-a n o
-ão
S en tid o
E xem plific a ç ã o
a ) p r o v e n iê n c ia , o r ig e m , p e r te n ç a
ro m a n o , se rra n o
b) s e c t á r io o u p a r t id á r io d e
lu te r a n o , p a r n a s ia n o
c ) s e m e lh a n t e o u c o m p a r á v e l a
b ila q u ia n o , c a m o n ia n o
p r o v e n iê n c ia , o rig e m
a le m ã o , b e irã o
-ário
d iá r io , f r a c io n á r io
re la ç ã o , p o s s e , o rig e m
-e iro
c a s e ir o , m in e ir o
-e n g o
re la ç ã o , p e r t in ê n c ia , p o sse
m u lh e r e n g o , s o la re n g o
-e n h o
s e m e lh a n ç a , p r o c e d ê n c ia , o r ig e m
fe r r e n h o , e s t r e m e n h o
-e n o
r e fe r ê n c ia , o rig e m
t e r r e n o , c h ile n o
-e n se
re la ç ã o , p r o c e d ê n c ia , o rig e m
-ês
-(l)e n to
-eo
-esco
fo re n s e , p a r is ie n s e
co rtê s, n o ru e g u ê s
a ) p ro v id o o u c h e io d e
c iu m e n t o , c o r p u le n t o
b) q u e te m o c a r á t e r d e
b a r r e n t o , v id r e n t o
re la ç ã o , s e m e lh a n ç a , m a t é r ia
ró se o , fé rr e o
r e fe r ê n c ia , s e m e lh a n ç a
-isco
b u rle s c o , d a n te sc o
le v a n t is c o , m o u r is c o
-este
re la ç ã o
a g r e s t e , c e le s te
-e stre
re la ç ã o
ca m p e stre , te rre stre
-eu
re la ç ã o , p r o c e d ê n c ia , o rig e m
e u r o p e u , h e b re u
-ício
re fe rê n c ia
a lim e n t íc io , n a t a líc io
-ico
p a r t ic ip a ç ã o , r e fe r ê n c ia
g e o m é t r ic o , m e la n c ó lic o
-H
r e f e r ê n c ia , s e m e lh a n ç a
f e b r il, s e n h o r il
-ino
r e la ç ã o , o r ig e m , n a tu re z a
lo n d r in o , c r is t a lin o
-ita
p e r t in ê n c ia , o rig e m
is m a e lit a , is ra e lita
-o n h o
p r o p r ie d a d e , h á b ito c o n s t a n t e
e n fa d o n h o , r is o n h o
-o so
p ro v id o o u c h e io de
b rio s o , v e n e n o s o
-tico
re la ç ã o
a r o m á t ic o , r ú s t ic o
-udo
p ro v id o o u c h e io de
p o n t u d o , b a rb u d o
Observações:
1.
a) Alguns desses sufixos servem também para formar adjetivos de outros adje
tivos. Por exemplo: -al junta-se a angélico, formando angelical; -ento liga-se a cinza,
originando cinzento; -onho acrescenta-se a triste, produzindo tristonho.
2.
®) São peculiares aos adjetivos os sufixos eruditos -imo e -íssimo, que se ligam a
radicais latinos: humtt-imo,fidel-íssimo. Do seu valor e emprego tratamos no capítulo
10, em GRAUS do adjetivo.
114
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
7. Que formam adjetivos de verbos:
S u fix o
E x e m p l if ic a ç ã o
S e n t id o
-a n te
- e n te
s e m e lh a n t e , to le r a n t e
d o e n t e , r e s is te n te
a ç ã o , q u a lid a d e , e s ta d o
- in te
c o n s t i tu i n te , s e g u i n te
- (á )v e l
p o s s ib ilid a d e d e p r a t ic a r o u
d u r á v e l, lo u v á v e l
- (í)v e l
s o fr e r u m a a ç ã o
p e r e c ív e l, p u n ív e l
-io
a ç ã o , r e f e r ê n c ia , m o d o d e s e r
fu g id io , t a r d io
-(t)iv o
a fir m a t iv o , p e n s a tiv o
-(d )iç o
p o s s ib ilid a d e d e p r a t ic a r o u s o f r e r u m a
m o v e d iç o , q u e b r a d iç o
-(t)fc io
a ç ã o , r e fe r ê n c ia
a c o m o d a t íc io , fa c t íc io
- (d )o u ro
a ç ã o , p e r t in ê n c ia
d u ra d o u ro , casad o u ro
- ( t ) ó r io
p r e p a r a t ó r io , e m ig r a t ó r io
O bservação:
Os sufixos -ante, -ente e -inte provêm, como dissemos, das terminações do
particípio presente latino com aglutinação da vogal temática de cada uma das con
jugações. Servem para formar substantivos e, com mais frequência, adjetivos, que
se substantivam facilmente.
S u fix o s v e r b a is
Os verbos novos da língua formam-se em geral pelo acréscimo da terminação
-ar a substantivos e adjetivos.
Assim:
esqui-ar
nivel-ar
radiograf-ar
telefon-ar
(a)doç-ar
(a)fin-ar
(a)frances-ar
(a)portugues-ar
A terminação -ar, já o sabemos, é constituída da vogal temática -a-, caracte
rística dos verbos da l.a conjugação, e do sufixo -r, do infinitivo impessoal.
Por vezes, a vogal temática -a- liga-se não ao radical propriamente dito, mas
a uma forma dele derivada, ou, melhor dizendo, ao radical com a adição de um
sufixo. É o caso, por exemplo, dos verbos:
afug-ent-ar
bord-ej-ar
lamb-isc-ar
cusp-inh-ar
ded-ilh-ar
depen-ic-ar
salt-it-ar
amen-iz-ar,
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
em que encontramos alguns sufixos anteriormente estudados: -ent(o), -ej(o),
-isc(o), -inh(o), -ic(o), e -it(o).
São tais sufixos que transmitem a esses verbos matizes significativos espe
ciais: FREQUENTATivo (ação repetida), factitivo (atribuição de uma qualidade ou
modo de ser), d im inutivo e pejorativo . Mas, como neles a combinação de sufixo
+ vogal tem ática ( - a - ) + sufixo d o infinitivo (-r) vale por um todo, costuma-se
considerar não o sufixo em si, mas o conjunto daqueles elementos mórficos,
o verdadeiro sufixo verbal. Esta conceituação, por simplificadora, apresenta
evidentes vantagens didáticas, razão por que a adotamos aqui.
Eis os principais sufixos verbais, com a indicação dos matizes significativos
que denotam:
S u fix o
S e n t id o
E x e m p l if ic a ç ã o
-e a r
fr e q u e n t a t iv o , d u r a t iv o
c a b e c e a r, f o lh e a r
- e ja r
fr e q u e n t a t iv o , d u r a t iv o
g o te ja r, v e le ja r
-e n ta r
f a c t it iv o
a fo rm o s e n t a r , a m o le n t a r
-< i)ficar
f a c t it iv o
c la rif ic a r , d ig n if ic a r
- ic a r
fr e q u e n t a ti v o -d i m i n u tiv o
b e b e ric a r, d e p e n ic a r
- ilh a r
f r e q u e n t a t iv o - d im in u t iv o
d e d ilh a r , f e r v ilh a r
- in h a r
fr e q u e n t a t i v o -d i m i n u t iv o - p e jo r a t iv o
e s c r e v in h a r , c u s p in h a r
- is c a r
f r e q u e n t a t iv o - d im in u t iv o
c h u v is c a r , la m b is c a r
- it a r
f r e q u e n t a t iv o - d im in u t iv o
d o r m it a r , s a lt it a r
- iz a r
f a c t it iv o
c iv iliz a r , u t iliz a r
Das outras conjugações apenas a 2.a possui um sufixo capaz de formar ver
bos novos em português. É o sufixo -ecer (ou - escer), característico dos verbos
chamados incoativos , o u seja, dos verbos que indicam o começo de um estado
e, às vezes, o seu desenvolvimento:
alvor-ecer
anoit-ecer
amadur-ecer
embranqu-ecer
envelh-ecer
escur-ecer
flor-escer
rejuven-escer
Em verdade, também -ecer não é sufixo. Decompõe-se esta terminação em:
SUFIXO (-e[s]c-) + VOGAL TEMÁTICA (-C-) + SUFIXO (-r).
S u fix o a d v e r b ia l
O único sufixo adverbial que existe em português é -mente, oriundo do
substantivo latino mens, mentis “a mente, o espírito, o intento”. Com o sentido
116
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
de “intenção” e, depois, com o de “maneira”, passou a aglutinar-se a adjetivos
para indicar circunstâncias, especialmente a de modo.
Assim:
boamente = com boa intenção, de maneira boa.
Como o substantivo latino mens era feminino (compare-se o português a
mente), junta-se o sufixo à forma feminina do adjetivo:
bondosa-mente
fraca-mente
nervosa-mente
pia-mente
Desta norma excetuam-se os advérbios que se derivam de adjetivos termi
nados em - ês: burguês-mente, português-mente, etc. Mas o fato tem explicação
histórica: tais adjetivos eram outrora uniformes, uniformidade que alguns deles,
como pedrês e montês, ainda hoje conservam. Assim: um galo pedrês, uma galinha
pedrês; um cabrito montês, uma cabra montês. A formação adverbial continua a
seguir o antigo modelo.
D ERIV A ÇÃ O P A R A S S IN T ÉTIC A
Numa análise morfológica do adjetivo desalmado e do verbo repatriar, ve
rificamos imediatamente que:
a) o primeiro é constituído do prefixo des- + o radical alm{a) + o sufixo -ado.
b) o segundo é formado do prefixo re- + o radical pátri(a) + o sufixo -ar.
Um exame mais cuidadoso mostra-nos, porém, que, nos dois casos, o prefixo
e o sufixo se aglutinaram a um só tempo aos radicais alm(a) e pátri(a), pois que
não existem - e não existiram nunca - os substantivos desalma e repatria, nem
tampouco o adjetivo almado e o verbo patriar.
Os vocábulos formados pela agregação simultânea de prefixo e sufixo a
determinado radical chamam-se parassintéticos , palavra derivada do grego
pará- (= justaposição, posição ao lado de) e synthetikós (= que compõe, que
junta, que combina).
A parassíntese é p a r t i c u la r m e n te p r o d u tiv a n o s v e rb o s , e a p r in c ip a l f u n ç ã o
d o s p re fix o s v e r n á c u lo s
a- e em- (en-)
é a d e p a r t i c i p a r d e s s e tip o e s p e c ia l d e
d e riv a ç ã o :
abotoar
embainhar
amanhecer
ensurdecer
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
D ERIV A ÇÃ O R EG R E S S IV A
Nos tipos de derivação até aqui estudados a palavra nova resulta sempre do
acréscimo de a f ix o s ( p r e f ix o s o u s u f ix o s ) a determinado r a d i c a l . Neles h á , pois,
uma constante: a palavra derivada amplia a primitiva.
Existe, porém, um processo de criação vocabular exatamente contrário. É
a chamada d e r iv a ç ã o r e g r e s s iv a , que consiste na redução da palavra dérivante
por uma falsa análise da sua estrutura.
Um exemplo: proveniente da linguagem dos ciganos espanhóis, entrou na
gíria portuguesa o termo gajão com o significado de “indivíduo finório, velhaco”.
Por causa deste sentido pejorativo e da presença da final -ão, passou ele, com o
tempo, a ser considerado simples aumentativo de um suposto substantivo gajo,
que é hoje a forma corrente.
A d e r iv a ç ã o r e g r e s s iv a tem importância maior na criação dos s u b s t a n t iv o s
d e v e r b a is ou Pós-V ERBA is, formados pela junção de uma das vogais -o, -a ou -e
ao radical do verbo.
Exemplos:
V
erbo
D
V erbo
everba l
D ev erba l
V erbo
D ev erba l
abalar
abalo
am ostrar
am ostra
alcançar
alcance
adejar
adejo
ap arar
apara
atacar
ataque
afagar
afago
buscar
busca
co rtar
corte
am parar
am paro
caçar
caça
debater
debate
apelar
apelo
censurar
censura
en laçar
enlace
a rrim a r
arrim o
ajudar
ajuda
levantar
levante
chorar
choro
com prar
com pra
rebater
rebate
errar
erro
perder
perda
resgatar
resgate
recuar
recuo
pescar
pesca
to car
toque
sustentar
sustento
vender
venda
sa car
saque
Alguns deverbais possuem forma masculina e feminina:
V
D ev erba l
erbo
D
V erbo
ev erba l
am eaçar
am eaço
am eaça
g ritar
grito
grita
custar
custo
custa
trocar
troco
troca
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Nem sempre é fácil saber se o substantivo se deriva do verbo ou se este se origina
do substantivo. Há um critério prático para a distinção, sugerido pelo filólogo Mário
Barreto: “Se o substantivo denota ação, será palavra derivada, e o verbo palavra pri
mitiva; mas, se o nome denota algum objeto ou substância, verificar-se-á o contrário”.
(De Gramática e de linguagem, II, Rio de Janeiro, 1922, p. 247.) Assim: dança, ataque
e amparo, denotadores, respectivamente, das ações de dançar, atacar e amparar, são
formas derivadas; âncora, azeite e escudo, ao contrário, são as formas primitivas, que
dão origem aos verbos ancorar, azeitar e escudar.
Há, no entanto, quem não considere relevante a origem da base, mas a relação
geral verbo / nome, que obedeceria, em princípio, a um padrão derivacional, segundo o
qual,“dada a existência de um verbo no léxico do Português, é previsível uma relação
lexical entre este verbo e um nome X’”. Este padrão pode ser assim formalizado:
[X]v-------- [X]v--------- [X’]N
Acrescente-se ainda que esse padrão derivacional “pode abarcar o fato de que os
verbos muitas vezes se relacionam a nomes morfologicamente básicos, e não apenas a
nomes deverbais” (cf. Margarida Basílio. Padrões derivacionais gerais — o fenômeno da
nominalização em português. Revista Brasileira de Linguística, 5(l):80-8l, 1978).
D ERIV A ÇÃ O IM P R Ó P R IA
As palavras podem mudar de classe gramatical sem sofrer modificação na
forma. Basta, por exemplo, antepor-se o artigo a qualquer vocábulo da língua
para que ele se torne um substantivo.
Assim:
Ele examinou os prós e os contras da proposta.
Esperava um sim e recebeu um não.
A este processo de enriquecimento vocabular pela mudança de classe das
palavras dá-se o nome de derivação im pró pria , e por ele se explica a passagem:
a) de substantivos próprios a comuns: damasco, macadame (de MacAdam),
quixote;
b)
c)
d)
e)
f)
g)
de substantivos comuns a próprios: Coelho, Leão, Pereira;
de adjetivos a substantivos: capital\ circular, veneziana;
de substantivos a adjetivos: burro, (café)-concerto, (colégio)-modelo;
de substantivos, adjetivos e verbos a interjeições: silêncio! bravo! viva!
de verbos a substantivos: afazer, jantar, prazer;
de verbos e advérbios a conjunções: quer... quer, já... já;
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
h) de particípios (presentes e passados) a preposições: mediante, salvo;
i) de particípios (passados) a substantivos e adjetivos: conteúdo, resoluto.
Observação:
A rigor, a derivação imprópria (também denominada conversão, habilita
ção ou HiPôsTASE por linguistas modernos) não deve ser incluída entre os processos
de formação de palavras que estamos examinando, pois pertence à área da semântica,
e não à da morfologia.
FO RM AÇÃO D E PA LA VRAS PO R CO M PO SIÇÃO
A c o m po siç ã o , já o sabemos, consiste em formar uma nova palavra pela
união de dois ou mais radicais. A palavra composta representa sempre uma
ideia única e autônoma, muitas vezes dissociada das noções expressas pelos seus
componentes. Assim, criado-mudo é o nome de um móvel; mil-folhas, o de um
doce; vitória-régia, o de uma planta.
T ip o s d e c o m p o s iç ã o
1.
Quanto à form a , os elementos de uma palavra composta podem estar:
a) simplesmente justapostos, conservando cada qual a sua integridade:
beija-flor
segunda-feira
bem-me-quer
pé-de-meia
madrepérola
tira-teima
b) intimamente unidos, por se ter perdido a ideia da composição, caso em que
se subordinam a um único acento tônico e sofrem perda de sua integridade
silábica:
aguardente (água + ardente)
embora (em + boa + hora)
pernalta (perna + alta)
viandante (via + andante)
Daí distinguir-se a com po sição por justaposição da com posição por agluti
nação , diferença que a escrita procura refletir, pois que na justaposição os
elementos componentes vêm em geral ligados por hífen, ao passo que na
aglutinação eles se juntam num só vocábulo gráfico.
O bservação:
Reitere-se que o emprego do hífen é uma simples convenção ortográfica. Nem
sempre os elementos justapostos vêm ligados por ele. Há os que se escrevem unidos:
119
120
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
passatempo, varapau, etc.; como há outros que conservam a sua autonomia gráfica:
pai defamília, fim de semana, Idade Média, etc.
2.
Quanto ao
distingue-se numa palavra composta o elemento d e
t e r m i n a d o , que contém a ideia geral, do d e t e r m i n a n t e , que encerra a noção
particular. Assim, em escola-modelo, o termo escola é o d e t e r m i n a d o , e modelo
o d e t e r m i n a n t e . Em mãe-pátria, ao inverso, mãe é o d e t e r m i n a n t e , e pátria o
s e n t id o
d e t e r m in a d o
,
.
Nos compostos tipicamente portugueses, o d e t e r m i n a d o de regra precede o
d e t e r m i n a n t e , mas naqueles que entraram por via erudita, ou se formaram
pelo modelo da composição latina, observa-se exatamente o contrário - o
primeiro elemento é o que exprime a noção específica, e o segundo a geral.
Assim:
agricultura
= cultivo do campo,
suaviloquência = linguagem suave,
mundividência = visão do mundo,
etc.
O bservação:
Como o determinante encerra a noção mais característica, muitas vezes por
si só designa o objeto. Assim: capital (por cidade capital), vapor (por barco a vapor).
3. Quanto à c l a s s e g r a m a t i c a l dos seus elementos, uma palavra composta pode
ser constituída de:
l . ° ) s u b s t a n t iv o + s u b s t a n t iv o :
manga-rosa
2.
arco-da-velha
cor-de-rosa
°) s u b s t a n t iv o + a d j e t i v o :
com o adjetivo posposto ao substantivo:
aguardente
b)
tamanduá-bandeira
° ) s u b s t a n t iv o + p r e p o s iç ã o + s u b s t a n t iv o :
pé-de-meia
3.
a)
porco-espinho
amor-perfeito
criado-mudo
com o adjetivo anteposto ao substantivo:
alto-forno
belas-artes
gentil-homem
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
4.°)
a d je t iv o
+ a d je t iv o :
azul-marinho
5.°)
luso-brasileiro
tragicômico
segunda-feira
trigêmeo
NUMERAL + SUBSTANTIVO:
mil-folhas
6 . ° ) PRONOME + s u b s t a n t iv o :
meu-bem
7.°)
guarda-roupa
cata-vento
perde-ganha
vaivém
mal-educado
sempre-viva
VERBO + v e r b o :
corre-corre
9.°)
Nosso Senhor
VERBO + s u b s t a n t iv o :
beija-flor
8 .° )
nossa-amizade
ADVÉRBIO + AD IETIVO :
bem-bom
10.°) ADVÉRBIO
(O U ADJETIVO EM FUNÇÀO A D VER BIA L) + VERBO:
bem-aventurar
maldizer
vangloriar-se
Observações:
°) No último grupo poderíamos incluir os numerosos compostos de bem e mal
+ substantivo ou ADiETivo, porque, neles, tanto o substantivo como o adjetivo são
quase sempre derivados de verbos, cuja significação ainda conservam. Assim: bem1.
-aventurança, bem-aventurado, benquerença, bem-vindo, maldizente, mal-encarado,
malfeitor, malsoante, etc.
2.
°) Nem todos os compostos da língua se distribuem pelos tipos que enume
ramos. Há, ainda, uma infinidade de combinações, por vezes curiosas, como as se
guintes: bem-te-vi, bem-te-vi-do-bico-chato, louva-a-deus, malmequer, não-me-deixes,
não-me-toques, não-te-esqueças-de-mim (miosótis), etc.
3.
°) Empregamos muitas palavras compostas que não são, propriamente, forma
ções portuguesas. Assim, couve-flor é tradução do francês chou-fleur, café-concerto
122
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
é também de origem francesa; bancarrota provém do italiano bancarotta; vinagre
chegou-nos, provavelmente, por intermédio do espanhol vinagre, originário, por
sua vez, de uma forma catalã idêntica.
4.°) Algumas palavras de importação que aparentam forma simples são com
postas nas línguas de origem. É o caso, por exemplo, de oxalá, derivado do árabe
wa sa llàh (= e queira Deus); e de aleluia, proveniente do hebraico hallelu Yah (=
louvai ao Senhor).
COM POSTOS ER U D ITO S
A nomenclatura científica, técnica e literária é fundamentalmente constituída
de palavras formadas pelo modelo da composição greco-latina, que consistia
em associar dois termos, o primeiro dos quais servia de determinante do se
gundo.
Examinaremos, a seguir, os principais radicais latinos e gregos que par
ticipam dessas formações, distribuindo-os por dois grupos, de acordo com a
posição que ocupam no composto.
R a d ic a is la tin o s
1. Entre outros, funcionam como primeiro elemento da composição os seguin
tes radicais latinos, em geral terminados em -i:
F orm a
O
r ig e m la t in a
S en t id o
E x e m p lo
a m b i-
am bo
am bos
a m b id e s t r o
a r b o r i-
a rb o r, - o ris
á rv o re
a rb o ríc o la
a v i-
a v is ,- is
ave
a v ifa u n a
d u a s vezes
b isa v ô
b is-
b is
bi-
b íp e d e
c a lo r i-
ca lo r, -o ris
c a lo r
c a lo r ífe ro
c r u c i-
c r u x ,- u c is
cru z
c r u c ifix o
c u r v i-
c u r v u s , -a ,-u rn
cu rv o
c u r v ilín e o
e q u i-
a e q u u s , - a ,- u m
ig u a l
e q u ilá t e r o
fe rro
fe rrífe ro
f e r r if e r r u m ,- i
fe rro -
fe rro v ia
ig n i-
ig n is ,- is
fo g o
ig n ív o m o
lo c o -
lo c u s , -i
lu g a r
lo c o m o tiv a
m o r ti-
m o rs , m o r t is
m o rte
m o r tífe r o
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
v*
O r ig e m
Fo r m a
o le i-
o le u m ,-i
E x em plo
S e n t id o
la tin a
o le íg e n o
a z e it e , ó le o
o le o -
o le o d u to
o n i-
o m n is ,- e
to d o
o n ip o t e n t e
p e d i-
p e s, p e d is
pé
p e d ilú v io
p ise i-
p is e is ,- is
p e ix e
p is c ic u lt o r
q u a t tu o r
q u a tro
q u a d r i-
q u a d r i m o to r
q u a d ru -
q u a d rú p e d e
re ti-
r e c t u s ,- a ,- u m
reto
r e t ilín e o
s e s q u i-
s e s q u i-
u m e m e io
s e s q u ic e n t e n á r io
t r i-
tre s , t r ia
trê s
t r ic o lo r
u n i-
u n u s ,- a ,- u m
um
u n ís s o n o
v e r m i-
v e r m i s ,-is
v e rm e
v e r m ífu g o
2. Como segundo elemento da composição, empregam-se:
F orm a
S e n t id o
E x EMPIjOS
- c id a
q u e m a ta
r e g ic id a , f r a t r ic id a
-c o la
q u e c u lt iv a , o u h a b ita
v it íc o la , a r b o r íc o la
- c u lt u r a
a to d e c u lt iv a r
a p ic u lt u r a , p is c ic u lt u r a
-fe ro
q u e c o n té m , ou p ro d u z
a u r ífe r o , fia m ífero
-fico
q u e f a z , o u p ro d u z
b e n é fic o , fr ig o r íf ic o
-fo rm e
q u e t e m fo rm a d e
c u n é if o r m e , u n if o r m e
-fu g o
q u e fo g e , o u f a z f u g ir
c e n tr íf u g o , fe b r ífu g o
- g e ro
q u e c o n t é m , o u p ro d u z
a r m íg e r o , b e líg e ro
-p a ro
q u e p ro d u z
m u lt íp a r o , o v íp a r o
-p e d e
pé
p a lm íp e d e , v e lo c íp e d e
-so n o
q u e so a
h o r r ís s o n o , u n ís s o n o
-v o m o
q u e e x p e le
f u m ív o m o , ig n ív o m o
- v o ro
que com e
c a r n ív o r o , h e rb ív o ro
R a d ic a is g re g o s
1. Mais numerosos são os compostos eruditos formados de elementos gregos,
fonte de quase todos os neologismos filosóficos, literários, técnicos e cientí
ficos.
123
124
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Entre os mais usados, podemos indicar os seguintes, que servem geralmente
de primeiro elemento da composição:
F orm a
S e n t id o
E xem plo s
anem o-
v e n to
a n e m ó g ra fo , a n e m ó m e t r o
a n tro p o -
hom em
a n tr o p ó fa g o , a n tr o p o lo g ia
a rq u e o -
a n t ig o
a r q u e o g r a fia , a rq u e o lo g ia
b ib lio -
liv ro
b ib lio g r a fia , b ib lio te c a
caco -
m au
c a c o f o n ia , c a c o g ra fia
c a li-
b e lo
c a lifa s ia , c a lig r a fia
co sm o -
m undo
c o s m ó g ra fo , c o s m o lo g ia
cro m o -
co r
c r o m o lit o g r a f ia , c r o m o s s o m o
cro n o -
te m p o
c r o n o lo g ia , c r o n ô m e t r o
d a ( c ) t ilo -
dedo
d a ( c ) t ilo g r a f ia , d a (c )t ilo s c o p ia
d eca-
dez
d e c a e d r o .d e c a lit r o
di-
d o is
d ip é t a lo , d is s fla b o
enea-
nove
e n e á g o n o , e n e a s s íla b o
e tn o -
ra ç a
e t n o g r a f ia , e t n o lo g ia
fa rm a co -
m e d ic a m e n t o
f a r m a c o lo g ia , f a r m a c o p e ia
f is io -
n a tu re z a
f is io lo g ia , f is io n o m ia
h e lio -
so l
h e lio g r a f ia , h e lio s c ó p io
h e m i-
m e ta d e
h e m is f é r io , h e m is t íq u io
san g u e
h e m o g lo b in a , h e m a t ó c r it o
h e p ta -
s e te
h e p tá g o n o , h e p t a s s íla b o
hexa-
s e is
h e x á g e n o , h exâ m e tro
h ip o -
c a v a lo
h ip ó d r o m o , h ip o p ó t a m o
h o m (e )o -
s e m e lh a n t e
h o m e o p a t ia , h o m ó g ra fo
ic tio -
p e ix e
ic tió fa g o , ic t io lo g ia
iso -
ig u a l
is ó c r o n o , is ó s c e le (s )
lito -
p e d ra
lito g r a fia , lito g r a v u r a
m e g a (lo )-
g ra n d e
m e g a t é r io , m e g a lo m a n ía c o
m e lo -
c a n to
m e lo d ia , m e lo p e ia
m eso -
m e io
m e s ó c lis e , M e s o p o t â m ia
hem oh e m a to -
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
F orm a
S e n t jp q
E xem plo s
m ir ia -
d e z m il
m ir iâ m e t r o , m ir ía d e
m is o -
q u e o d e ia
m is ó g in o , m is a n t r o p o
m it o -
fá b u la
m it o lo g ia , m it ô m a n o
n e cro -
m o rto
n e c r ó p o le , n e c r o t é r io
neo-
n o vo
n e o la t in o , n e o lo g is m o
n e rv o
n e u r o lo g ia , n e v r a lg ia
o cto -
o ito
o c t o s s íla b o , o c t a e d r o
o d o n to -
d e n te
o d o n to lo g ia , o d o n ta lg ia
o f t a lm o -
o lh o
o ft a lm o lo g ia , o fta lm o s c ó p io
o n o m a to -
nom e
o n o m a t o lo g ia , o n o m a t o p é ia
o ro -
m o n ta n h a
o r o g e n ia , o ro g ra fia
o rto -
reto , ju s t o
o r t o g r a f ia , o rto d o x o
o x i-
ag u d o , p e n e tra n te
o x íg o n o , o x íto n o
p a le o -
a n tig o
p a le o g r a fia , p a le o n to lo g ia
pan-
to d o s , tu d o
p a n t e ís m o , p a n - a m e r ic a n o
p a to -
( s e n t im e n t o ) d o e n ç a
p a to g e n é tic o , p a to lo g ia
pedo-
c r ia n ç a
p e d ia t r ia , p e d o lo g ia
p o ta m o -
rio
p o t a m o g r a f ia , p o t a m o lo g ia
p s ic o -
a lm a , e s p ír it o
p s ic o lo g ia , p s ic a n á lis e
q u ilo -
m il
q u ilo g r a m a , q u ilô m e t r o
q u ir o -
m ão
q u ir o m a n c ia , q u ir ó p t e r o
r in o -
n a riz
r in o c e r o n t e , r in o p la s t ia
r iz o -
r a iz
r iz ó filo , r iz o t ô n ic o
s id e r o -
fe rro
s id e r ó lit a , s id e r u r g ia
t a q u i-
rá p id o
t a q u ic a r d ia , t a q u ig ra fia
te o -
deus
t e o c r a c ia , te ó lo g o
te tra -
q u a tro
te tra rc a , te tra e d ro
t ip o -
f ig u r a , m a r c a
t ip o g r a f ia , t ip o lo g ia
to p o -
lu g a r
t o p o g r a fia , t o p o n ím ia
xeno-
e s t r a n g e ir o
x e n o fo b ia , x e n o m a n ia
x ilo -
m a d e ir a
x iló g ra fo , x ilo g r a v u r a
zo o-
a n im a l
z o ó g ra fo , z o o lo g ia
n e u ro n e vro -
125
126
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Como vemos, a maioria destes radicais assume na composição uma forma termi
nada em -o. Alguns empregam-se também como segundo elemento do composto. É
ocaso, por exemplo, de -antropo (filantropo),-crono (isócrono), -dáctilo (pterodáctilo),
-filo (germanófilo), -lilo (aerólito), -pótamo (hipopótamo) e outros.
2. Funcionam, preferentemente, como segundo elemento da composição, entre
outros, estes radicais gregos:
Form a
S e n t id o
E xem plo s
-a g o g o
que cond uz
dem ag og o, pedagogo
- a lg ia
dor
c e f a la lg ia , n e v r a lg ia
-a rc a
que co m an d a
h e r e s ia r c a , m o n a r c a
- a r q u ia
c o m a n d o , g o v e rn o
a u t a r q u ia , m o n a r q u ia
- a s t e n ia
d e b ilid a d e
n e u r a s t e n ia , p s ic a s t e n ia
- c é f a lo
cab eça
d o lic o c é fa lo , m ic r o c é fa lo
- c r a c ia
poder
d e m o c r a c ia , p lu t o c r a c ia
-d o x o
q u e o p in a
h e te ro d o x o , o rto d o x o
-d ro m o
lu g a r p a r a c o r r e r
h ip ó d r o m o , v e ló d r o m o
-e d ro
b a s e , fa ce
p e n t a e d r o , p o lie d ro
-fa g ia
a to d e c o m e r
a e r o fa g ia , a n tr o p o fa g ia
-fa g o
qu e com e
a n tro p ó fa g o , n e c ró fa g o
- f ilia
a m iz a d e
b ib lio filia , lu s o filia
-fo b ia
in im iz a d e , ó d io , te m o r
fo to fo b ia , h id ro fo b ia
-fo b o
q u e o d e ia , in im ig o
x e n ó fo b o , z o ó fo b o
-fo ro
q u e leva o u c o n d u z
e le c tró fo ro , fó sfo ro
- g a m ia
ca sa m e n to
m o n o g a m ia , p o lig a m ia
-g a m o
q u e ca sa
b íg a m o , p o líg a m o
-g ê n eo
q u e g e ra
h e te ro g ê n e o , h o m o g ê n e o
- g lo ta ,- g lo s s a
lín g u a
p o lig lo ta , is o g lo s s a
-g o n o
â n g u lo
p e n tá g o n o , p o líg o n o
- g r a f ia
e s c r it a , d e s c r iç ã o
o rt o g ra fia , g e o g ra fia
-g ra fo
q u e e s c re v e
c a líg ra fo , p o líg ra fo
-g ra m a
e s c r it o , p e s o
t e le g r a m a , q u ilo g r a m a
-lo g ia
d is c u r s o , tra ta d o , c iê n c ia
a r q u e o lo g ia ,f ilo lo g ia
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
F orm a
S e n t id o
E xem plo s
-lo g o
que fala ou trata
diálogo, teólogo
- m a n e ia
adivinhação
n ecro m an cia, q uiro m an cia
- m a n ia
loucura, tendência
m egalom ania, m onom ania
-m an o
louco, inclinad o
bibliôm ano, m itôm ano
- m a q u ia
com bate
lo g o m aq u ia,tau ro m aq u ia
- m e t r ia
m edida
an tro p o m etria, biom etria
-m e tro
que mede
hidrôm etro, pentâm etro
-m o rfo
que tem a form a
antropom orfo, polim orfo
- n o m ia
lei, regra
agronom ia, astronom ia
-n o m o
que regula
autônom o, m etrônom o
- p e ia
ato de fazer
m elopeia, onom atopéia
- p ó lis , - p o le
cidade
Petrópolis, m etrópole
-p te ro
asa
díptero, helicóptero
- s c o p ia
ato de ver
m acroscopia, m icroscopia
- s c ó p io
instrum ento para ve r
m icroscópio, telescópio
•so fia
sabedoria
filosofia, teosofia
- s t ic o
verso
d ístico, m onóstico
-te ca
lugar onde se guarda
biblioteca, discoteca
- t e r a p ia
cura
fisio terap ia, hidroterapia
- to m ia
corte, divisão
dicotom ia, nevrotom ia
-to n o
tensão, tom
barítono, monótono
RECOMPOSIÇÃO
P s e u d o p re fíx o s
Certos radicais latinos e gregos adquiriram sentido especial nas línguas
modernas. Assim auto- (do grego autós = próprio, de si mesmo), que ainda
se emprega com o valor originário em numerosos compostos (por exemplo:
autodidata = que estudou por si mesmo; autógrafo = escrito do próprio autor),
passou, com a vulgarização de auto, forma abreviada de automóvel (= veículo
movido por si mesmo), a ter este significado em uma série de novos compos
tos: autoestrada, autódromo, etc. Também o radical electro- (do grego eléctron
= âmbar), pela propriedade que apresenta o âmbar de atrair os corpos leves,
128
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
veio a aplicar-se a tudo o que se relaciona com a “eletricidade”: electrodinâmica,
electroscópio, electroterapia, etc.
Estes radicais que assumem o sentido global dos vocábulos de que antes eram
elementos componentes denominam-se pseudoprefixos o u prefixoides J
Os pseudoprefixos caracterizam-se:
a) por apresentarem um acentuado grau de independência;
b) por possuírem “uma significação mais ou menos delimitada e presente à
consciência dos falantes, de tal modo que o significado do todo a que perten
cem se aproxima de um conceito complexo, e portanto de um sintagma”;78
c) por terem, de um modo geral, menor rendimento do que os prefixos pro
priamente ditos.
Cumpre-nos, pois, fazer distinção entre os pseudoprefixos e os radicais
eruditos que não apresentam esse comportamento especial. O critério básico
para tal distinção é a deriva semântica que se evidencia quando, processada a
“decomposição”, os elementos ingressam noutras formações com sentido diverso
do etimológico.
A deriva semântica desses elementos decorre, portanto, de um procedi
mento especial, denominado recom posição por André Martinet, termo que lhe
pareceu necessário para batizar “uma situação linguística particular que não se
identifica nem com a composição propriamente dita, nem tampouco, de um
modo geral, com a derivação, que supõe a combinação de elementos de estatuto
diferente”.9
Eis uma lista de pseudoprefixos , ilustrada com exemplos:
PSEUDOPREFIXO
E x em p lo s
a e ro -
aeroclube, aerom oça
ag ro -
ag ro in d u strial, agropecuária
a r q u i-
arquibanco, arq u im ilio n á rio
a stro -
astronauta, astronave
a u to -
autoestrada, autopeça
bio-
b io ciência, biodegradável
7 Leiam-se, a propósito, as considerações de Iorgu Jordan e Maria Manoliu. Manual dc lin
guística românica. Revision, reelaboración parcial y notas por Manuel Alvar, t. II, Madrid,
Gredos, 1972, p. 44-49; J. G. Herculano de Carvalho. Teoria da linguagem, t. II, Coimbra,
Atlântida, 1974, p. 547-554; Li Ching. Boletim de Filologia, 22:213-225.
8 j. G. Herculano de Carvalho. Obra cit., p. 554.
9 Eléments de linguistique générale. Paris, Armand Colin, 1967, p. 135.
OERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
PSEUDOPREFIXO
E x em plo ?
c in e -
c in e c lu b e , c in e r a m a
dem o-
d e m o f ilia ,d e m o lo g ia
e le c t r o -
e le c t r o d o m é s t ic o , e le c t r o m a g n é t ic o
fo n o -
f o n o e s t ilís t ic a , fo n o v is ã o
fo to -
fo to m o n t a g e m , fo to n o v e la
geo-
g e o e c o n ô m ic o , g e o p o lít ic o
h e te ro -
h e te ro a g r e s s ã o , h e te ro r re la ç ã o
h id r o -
h id r o e lé c t r ic a , h id r o g e n iz a ç ã o
in te r-
in t e r e s t a d u a l, in te r-ra c ia l
m a cro -
m a c r o e c o n o m ia , m a c r o b ió t ic a
m a x i-
m a x id e s v a lo r iz a ç ã o , m a x is s a ia
m ic r o -
m ic r o f ilm e , m ic r o - o n d a
m in i-
m in if ú n d io , m in is s a ia
m ono-
m o n o b lo c o , m o n o m o t o r
m o to -
m o t o m e c a n iz a ç ã o , m o to n a v e
m u lt i-
m u lt ifa c e ta d o , m u lt in a c io n a l
p lu r i-
p lu r i p a r t id a r is m o , p lu r is s e r ia d o
p o li-
p o lic lín ic a , p o lim o r fis m o
p ro to -
p r o to -h is tó ria , p r o t o m á r t ir
p seu d o -
p s e u d o in t e le c t u a l, p s e u d o r r e a lis m o
r a d io -
r a d io jo r n a l, ra d io te a t ro
re tro -
r e t r o c o n t a g e m , r e t r o v is o r
s e m i-
s e m io f ic ia l, s e m iv o g a l
t e le -
t e le g u ia d o , t e le v is ã o
te rm o -
t e r m o d in â m ic a , t e r m o n u c le a r
HIBRIDISMO
São palavras híbridas, ou hibridismos, aquelas que se formam de elementos
tirados de línguas diferentes. Assim, em automóvel o primeiro radical é grego e o se
gundo latino, em sociologia, ao contrário, o primeiro é latino e o segundo grego.
As formações híbridas são em geral condenadas pelos gramáticos, mas exis
tem algumas tão enraizadas no idioma que seria pueril pretender eliminá-las. É
o caso das palavras mencionadas e de outras, como
bicicleta
bígamo
endovenoso
monóculo
neolatino
oleograíia
129
130
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Com razão, observa Matoso Câmara Jr.: “Esses compostos decorrem, em princí
pio, da circunstância de os elementos se terem integrado no mecanismo da língua que
faz a composição, e a sua origem diversa só ter um sentido diacrônico” (Dicionário
de filologia e gramática, 2* ed., Rio de Janeiro, J. Ozon, 1964, p. 180).
ONOMATOPÉIA
As onom atopéias são palavras imitativas, isto é, palavras que procuram re
produzir aproximadamente certos sons ou certos ruídos:
tique-taque
zás-trás
zum-zum
Em geral, os verbos e os substantivos denotadores de vozes de animais têm
origem onomatopeica.
Assim:
ciciar
coaxar
cicio (da cigarra)
coaxo (da rã, do sapo)
ABREVIAÇÃO VOCABULAR
O ritmo acelerado da vida intensa de nossos dias obriga-nos, necessariamente,
a uma elocução mais rápida. Economizar tempo e palavras é uma tendência
geral do mundo de hoje.
Observamos, a todo momento, a redução de frases e palavras até limites que
não prejudiquem a compreensão. É o que sucede, por exemplo, com os vocábu
los longos, e em particular com os compostos greco-latinos de criação recente:
auto (por automóvel), foto (por fotografia), moto (por motocicleta), ônibus (por
auto-ônibus), pneu (por pneumático), quilo (por quilograma), etc. Em todos eles
a forma abreviada assumiu o sentido da forma plena.
S ig la s
Também moderno - e cada vez mais generalizado - é o processo de criação
vocabular que consiste em reduzir longos títulos a meras siglas, constituídas das
letras iniciais das palavras que os compõem.
Atualmente, instituições de natureza vária - como organizações internacio
nais, partidos políticos, serviços públicos, sociedades comerciais, associações
operárias, patronais, estudantis, culturais, recreativas, etc. - são, em geral, mais
conhecidas pelas siglas do que pelas denominações completas. Assim:
DERIVAÇÃO E COMPOSIÇÃO
AD
APU
CD
CGT
DEM
DVD
Enem
EU (EU)
FIFA
FRELIMO
Inep
MPLA
OEA
ONU
OUA
PAIGC
PC
PCP
PDS
PDT
PMDB
PP
PPM
PPS
PS
PSB
PSD
PSDB
PT
PTB
PV
STF
TAP
UNE
UNESCO
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
—
Aliança Democrática
Aliança Povo Unido
Compact Disc
Confédération Générale du Travail
Democratas
Digital Video Disc
Exame Nacional de Ensino Médio
European Union (União Europeia)
Fédération Internationale de Football Association
Frente de Libertação de Moçambique
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Movimento Popular de Libertação de Angola
Organização dos Estados Americanos
Organização das Nações Unidas
Organização de Unidade Africana
Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde
Personal Computer
Partido Comunista Português
Partido Democrático Social
Partido Democrático Trabalhista
Partido do Movimento Democrático Brasileiro
Partido Progressista
Partido Popular Monárquico
Partido Popular Socialista
Partido Socialista
Partido Socialista Brasileiro
Partido Social Democrático
Partido da Social Democracia Brasileira
Partido dos Trabalhadores
Partido Trabalhista Brasileiro
Partido Verde
Supremo Tribunal Federal
Transportes Aéreos Portugueses
União Nacional dos Estudantes
United Nations Educational, Scientific and Cultural Orga
nization
E não é só . Uma vez criada e vulgarizada, a sigla passa a ser sentida como
uma palavra primitiva, capaz, portanto, de formar derivados: cegetista, petebista, etc.
131
O bservação:
Nem sempre uma instituição é conhecida pela mesma sigla em Portugal e no Brasil. No
Brasil, por exemplo, denomina-se OTAN (= Organização do Tratado do Atlântico Norte)
o organismo que em Portugal se chama NATO (= North Atlantic Treaty Organization),
por ter-se aí vulgarizado a sigla inglesa.
Por vezes há diferença de acentuação da sigla nos dois países. Diz-se, por exemplo, ONÚ
em Portugal e ÔNU no Brasil.
Capítulo 7
Frase, oração, período
A FRASE E SUA CONSTITUIÇÃO
1. F rase é u m e n u n c ia d o d e se n tid o c o m p le to , a u n id a d e m ín im a de c o m u n i
cação.
A parte da gramática que descreve as regras segundo as quais as palavras se
combinam para formar frases denomina-se sintaxe .
2. A frase pode ser constituída:
1. °) de uma só palavra:
Fogo!
Atenção!
Silêncio!
2. °) de v árias p alav ras, e n tre as q u ais se in clu i o u n ã o u m v erb o :
a)
c o m v erb o :
Alguns anos vivi em Itabira.
(C. Drummond de Andrade, R, 45.)
b)
sem verbo:
Que inocência! Que aurora! Que alegria!
(Teixeira de Pascoaes, OC, III, 140.)
3. A frase é sempre acompanhada de uma melodia, de uma entoação. Nas
frases organizadas com verbo, a entoação caracteriza o fim do enunciado,
geralmente seguido de forte pausa. É o caso destes exemplos:
134
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Bate o vento no postigo... /
Cai a chuva lentamente...
(Da Costa e Silva, PC, 307.)
Se a frase não possui verbo, a melodia é a única marca por que podemos
reconhecê-la. Sem ela, frases como
Atenção! Que inocência! Que alegria!
seriam simples vocábulos, unidades léxicas sem função, sem valor gramatical.
O bservação:
O estudo da frase e o da organização dos elementos que a constituem pressupõem
o conhecimento de alguns conceitos nem sempre taceis de definir. Essa dificuldade
resulta não só da própria natureza do assunto, mas também das diferenças dos
métodos e técnicas de análise adotados pela linguística clássica e pelas principais
correntes da linguística contemporânea.
Neste capítulo, evitar-se-ão discussões teóricas que não tragam esclarecimentos ao
estudo descritivo-normativo da sintaxe portuguesa, que é o nosso objetivo principal.
FRASE E ORAÇÃO
A frase p o d e c o n te r u m a o u m ais orações.
1. °) Contém apenas uma oração, quando apresenta:
a) u m a só fo rm a verb al, clara o u o cu lta:
O dia decorreu sem sobressalto.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 491.)
Na cabeça, aquela bonita coroa.
(J. Montello, A, 32.)
b) duas ou mais formas verbais, integrantes de uma
locuçào verbal:
— Podem vir os dois...
(V. Nemésio, MTC, 446.)
Tudo de repente entrou a viver uma vida secreta de luz.
(Autran Dourado, TA, 13.)
2.
°) Contém mais de uma oração, quando há nela mais de um verbo (seja
na forma simples, seja na locução verbal), claro ou oculto:
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Fechei os olhos, / meu coração doía.
(Luandino Vieira, NANV, 75.)
Busco, / volto, / abandono, / e chamo de novo.
(A. Bessa Luís, AM, 38.)
O Negrinho começou a chorar, / enquanto os cavalos iam pastando.
(Simões Lopes Neto, CGLS, 332.)
Os anos são degraus; / a vida, a escada.
(F. de Castro, ANE, 73.)
O bservação:
A
é o conjunto formado de um verbo
principal . Enquanto o últim o vem sempre numa forma
gerúndio , particípio), o primeiro pode vir:
a)
locução verbal
num a
auxiliar
+ um
nominal
forma finita ( indicativo, imperativo, subjuntivo):
A viticultura foi-se alargando talvez a partir do terceiro século.
(A. Sérgio, E, VIII, 65.)
— Vá deitar-se, / vá coçar as pulgas / e descansar.
(G. Ramos, AOH, 117.)
— Você crê deveras que / venhamos a ser grandes homens?
(Machado de Assis, OC, 1, 984.)
b) num a
forma nominal ( infinitivo ou gerúndio ):
Ah, não poder subir na sombra
Como um ladrão que escala um muro!
(Ribeiro Couto, PR, 333.)
Doente, quase não podendo andar, fiii ter com o Evaristo.
(A. Nobre, Cl, 156.)
ORAÇÃO E PERÍODO
1.
a)
a frase organizada em oração ou orações. Pode ser:
simples , quando constituído de uma só oração:
P eríodo é
Cai o crepúsculo.
(Da Costa e Silva, PC, 281.)
verbo
( infinitivo ,
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Nunca mais recobrou por inteiro a saúde.
(A. Bessa Luís, S, 186.)
b ) composto , q u a n d o fo rm a d o de d u a s o u m ais oraçõ es:
Não bulia uma folha, / não cintilava um luzeiro.
(A. Ribeiro, ES, 21L)
O se n h o r tiro u o cigarro, / b a te u -o n a ta m p a d a cigarreira, / lev o u -o ao
c a n to d o s láb io s, / p re m iu a m o la d o isq u eiro .
(J. Montello, SC, 173.)
2. O período te rm in a se m p re p o r u m a p a u sa b e m d efin id a , q u e se m a rc a n a
escrita c o m p o n to , p o n to d e ex clam ação , p o n to d e in te rro g a ç ã o , reticên cias
e, alg u m as vezes, c o m d o is p o n to s .
A ORAÇÃO E OS SEUS TERMOS ESSENCIAIS
SUJEITO E PREDICADO
1. São termos essenciais da oração o sujeito e o predicado .
O suiEiTO é o ser sobre o qual se faz uma declaração; o predicado é tudo aquilo
que se diz do sujeito. Assim, na oração
Este aluno obteve ontem uma boa nota,
temos:
oração
Este aluno
obteve ontem uma boa nota
2. Nem sempre o sujeito e o predicado vêm materialmente expressos. Assim, em
Andei léguas de sombra
Dentro em meu pensamento.
(F. Pessoa, OP, 59.)
o sujeito de andei é eu, indicado apenas pela desinência verbal.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Já em
Boa cidade, Santa Rita.
(M. Palmério, VC, 298.)
é a forma verbal è que está subentendida.
Chamam-se elípticas as orações a que falta um termo essencial. E, conforme
o caso, diz-se que o suieito o u o predicado estão elípticos.
SINTAGMA NOMINAL E VERBAL
1. Na oração:
Este aluno obteve ontem uma boa nota,
distinguimos duas unidades maiores:
a) o suieito : este aluno;
b ) o predicado :
obteve ontem uma boa nota.
Examinando, porém, o sujeito, vemos que ele é formado de duas palavras:
este aluno
O demonstrativo este é um determinante (DET) do substantivo (N) aluno,
palavra que constitui o nücleo da unidade.
Toda unidade que tem por núcleo um substantivo recebe o nome de sin
tagma NOMINAL (SN).
A o ração q u e esta m o s e stu d a n d o ap resen ta, assim , dois sintagmas nominais:
a) SN' = este aluno;
b) SN2 = uma boa nota.
2. Podem ocorrer muitos
(SN) na oração, mas somente
um deles será o suieito. E, como veremos adiante, a sua posição, na ordem
direta e lógica do enunciado, é à esquerda do verbo. Os demais sintagmas
nominais encaixam-se no predicado .3
sintagmas nominais
3. O su b sta n tiv o , n ú c le o de u m sin ta g m a n o m in a l, a d m ite a p resen ça de deter
minantes (DET) — q u e são os artig o s, os n u m e ra is e os p ro n o m e s adjetivos
— e de modificadores (MOD), q u e, n o caso, são os ad jetiv o s o u expressões
adjetivas.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Os dois sintagmas nominais da oração em exame podem ser assim esque
matizados:
SN2
DET
N
1
1
Este
aluno
DET
N
1
1
1
1
uma
nota
MOD
I
1
boa
4. O sintagma verbal (SV) constitui o predicado. Nele há sempre um verbo,
que, quando significativo, é o seu núcleo.
O sintagma verbal pode ser complementado por sintagmas nominais e
modificado por advérbios ou expressões adverbiais (MOD).
A oração que nos serve de exemplo obedece, pois, ao seguinte esquema:
O
DET
N
Este
aluno
O SUJEITO
REPRESENTAÇÃO DO SUJEITO
Os sufEiTOS da 1.® e da 2.® pessoa são, respectivamente, os pronomes pes
soais eu e tu, no singular; nós e vós (ou combinações equivalentes: eu e tu, tu e
ele, etc.), no plural.
Os sujeitos da 3.a pessoa podem ter como núcleo:
a) um substantivo:
Matilde entendia disso.
(A. Bessa Luís, OM, 170.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Os olhos dela estavam secos.
(Machado de Assis, OC, 1,495.)
b) os pronomes pessoais ele, ela (singular); eles, elas (plural):
Estavam de braços dados, ele arrumava a gravata, ela ajeitava o chapéu.
(É. Veríssimo, LS, 128.)
— Esperam que eles as tomem?...
(Alves Redol, BC, 333.)
c) um pronome demonstrativo, relativo, interrogativo, ou indefinido:
Isto não lhe arrefece o ânimo?
(A. Abelaira, NC, 35.)
Achava consolo nos livros, que o afastavam cada vez mais da vida.
(É. Veríssimo, LS, 131.)
Quem disse isso?
(F. Botelho, X, 150.)
Tudo parara ao redor de nós.
(C. Lispector, BF, 81.)
d) um numeral:
Os dois riram-se satisfeitos.
(L. B. Honwana, NMCT, 65.)
Ambos alteraram os roteiros originais.
(N. Pinon, FD, 8 6 .)
e) uma palavra ou uma expressão substantivada:
Infanta, no exílio amargo,
só o existirdes me consola.
(T. da Silveira, PC, 367.)
O por fazer é só com Deus.
(F. Pessoa, OP, 16.)
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f) uma oração substantiva subjetiva:
Era forçoso / que fosse assim.
(A. Sérgio, E, IV, 245.)
Valeria a pena / discutir com o Benício?
(J. Montello, SC, 16.)
SUJEITO SIM PLES E SUJEITO COMPOSTO
Sujeito simples. Quando o sujeito tem um só núcleo, isto é, quando o verbo
se refere a um só substantivo, ou a um só pronome, ou a um só numeral, ou
a uma só palavra substantivada, ou a uma só oração substantiva, o sujeito é
s im p les . Esse o caso do sujeito de todos os exemplos atrás mencionados.
Sujeito composto . É composto o su je ito q u e te m m a is de u m n ú c le o , o u
seja, o su jeito c o n s titu íd o de:
a) m ais de u m su b stan tiv o :
As vozes e os passos aproximam-se.
(M. da Fonseca, SV , 248.)
Pai jovem, mãe jovem não deixam menino solto.
(G. Amado, HMI, 49.)
b) mais de um pronome:
Ele e eu somos da mesma raça.
(D. Mourão-Ferreira, 1,98.)
Não vivo sem a sua sombra, você e eu sabemos.
(N. Pinon, CC, 12.)
c) mais de uma palavra ou expressão substantivada:
Falam por mim os abandonados de justiça, os simples de coração.
(C. Drummond de Andrade, R, 148.)
Quantos mortos e feridos não me precederam ali.
(N. Pinon, CC, 16.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
d) mais de uma oração substantiva:
Era melhor esquecer o nó e pensar numa cama igual à de seu Tomás
da bolandeira.
(G. Ramos, VS, 83.)
Dir-se-ia que o pano do palco se havia levantado e que iam surgir,
pelas entradas laterais, as demais figuras da peça.
(J. Montello, LE, 108.)
Observação:
Outras combinações podem entrar na formação do suinrro composto, sendo
particularmente comum a de pronome + substantivo, ou vice-versa:
Éramos, meu pai e eu
E um negro, negro cavalo.
(V. de Morais, PCP, 286.)
SUJEITO OCULTO (DETERMINADO)
É aquele que não está materialmente expresso na oração, mas pode ser iden
tificado. A identificação faz-se:
a) pela desinência verbal:
Ficamos um bocado sem falar.
(L. B. Honwana, NMCT, 10.)
[O sujeito de ficamos, indicado pela desinência -mos, é nds.]
b) pela presença do sujeito em outra oração do mesmo período ou de período
contíguo:
Soropita ali viera, na véspera, lá dormira; e agora retornava a casa.
(Guimarães Rosa, CB, II, 467.)
[O sujeito de viera, dormira e retornava é Soropita, mencionado na primeira
oração, antes de viera.]
Guilhermina bocejou. Iria adormecer? Pôs-se a calcular as horas.
(C. de Oliveira, CD, 115.)
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[O sujeito de bocejou, iria adormecer e pôs-se a calcular é Guilhermina, mencio
nado no primeiro período, antes de bocejou.]
Observação:
Pode ocorrer que o verbo não tenha desinência pessoal e que o sujeito venha
sugerido pela desinência de outro verbo. Por exemplo, neste período:
Antes de comunicai--vos uma descoberta que considero de algum interesse
para o nosso país, deixai que vos agradeça.
o sujeito de considero, indicado pela desinência -o, é eu, também sujeito de comunicar,
verbo na forma infinitiva sem desinência pessoal.
Vejamos um caso similar, com o verbo na forma finita:
Hoje, à tardinha, acabado o jantar, enquanto esperava a chegada de João,
estirei-me no sofá e adormeci.
Eu, sujeito de estirei-me e adormeci, é também o sujeito de esperava, forma verbal
finita sem desinência pessoal.
SUJEITO INDETERMINADO
Algumas vezes, o verbo não se refere a uma pessoa determinada, ou por se
desconhecer quem executa a ação, ou por não haver interesse no seu conheci
mento. Dizemos então, que o sujeito é indeterminado .
Nestes casos em que o sujeito não vem expresso na oração nem pode ser
identificado, põe-se o verbo:
a) ou na 3.a pessoa do plural:
— Contaram-me, quando eu era pequenina, a história duns náufra
gos, como nós.
(A. Ribeiro, SBAM, 265.)
Reputavam-no o maior comilão da cidade.
(C. dos Anjos, MS, 44.)
b) ou na 3.a pessoa do singular, com o pronome se:
Ainda se vivia num mundo de certezas.
(A. Bessa Luís, OM, 296.)
Precisa-se do carvalho; não se precisa do caniço.
(C. dos Anjos, MS, 381.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Comia-se com a boca, com os olhos, com o nariz.
(Machado de Assis, OC, 1,520 P.)
Os dois processos de indeterminação podem concorrer num mesmo período:
Na Casa pisavam sem sapatos, e falava-se baixo.
(A. M. Machado, JT, 13.)
ORAÇÃO SEM SUJEITO
Não deve ser confundido o sujeito indeterminado , que existe, mas não se
pode ou não se deseja identificar, com a inexistência do sujeito.
Em orações como as seguintes
Chove.
Anoitece.
Faz frio.
interessa-nos o processo verbal em si, pois não o atribuímos a nenhum ser. Diz-se, então, que o verbo é impessoal; e o sujeito, inexistente.
Eis os principais casos de inexistência do sujeito:
a) com verbos ou expressões que denotam fenômenos da natureza:
Anoitecia e tinham acabado de jantar.
(É. Veríssimo, IS, 147.)
De volta, com a garrafa na mão, apenas chuviscava.
(L. Jardim, MP, 49.)
Amanheceu a chover.
(A. Botto, AO, 235.)
Era março e ainda fazia frio.
(M. Torga, NCM, 120.)
b) com o verbo haver na acepção de “existir”:
Ainda há jasmins, ainda há rosas,
Ainda há violões e modinhas
Em certas ruas saudosas.
(Ribeiro Couto, PR, 315.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Na sala havia ainda três quadros do pintor.
(R Namora, DT, 206.)
c) com os verbos haver, fazer e ir, quando indicam tempo decorrido:
Morava no Rio havia muitos anos, desligado das coisas de Minas.
(C. dos Anjos, MS, 327.)
Faz hoje oito dias que comecei.
(A. Abelaira, B, 133.)
Vai para uns quinze anos escrevi uma crônica do Curvelo.
(M. Bandeira, PP, II, 338.)
d) com o verbo ser, na indicação do tempo em geral:
Era inverno na certa no alto sertão.
(J. Lins do Rego, ME, 57.)
Era por altura das lavouras.
(A. Bessa Luís, S, 187.)
Observações:
1.
a) Nas orações impessoais, o verbo ser concorda em número e pessoa com o
predicativo. Veja-se, a propósito, o capítulo 13.
2. “) Também ocorre a impessoalidade nas locuções verbais:
Como podia haver tantas casas e tanta gente?
(G. Ramos, VS, 114.)
Devo estar esfacelada, deve haver pedaços de mim por todos os cantos.
(M. J. de Carvalho, AV, 56.)
3.
a) Na linguagem coloquial do Brasil é corrente o emprego do verbo ter como
impessoal, à semelhança de haver. Escritores modernos — e alguns dos maiores
— não têm duvidado em alçar a construção à língua literária.
Comparem-se estes passos:
Hoje tem festa no brejo!
(C. Drummond de Andrade, R, 16.)
Em Pasárgada tem tudo,
É outra civilização...
(M. Bandeira, PP, 222.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
O uso de ter impessoal deve estender-se ao português das nações africanas. De sua
vitalidade em Angola há abundante documentação na obra de Luandino Vieira.
Comparem-se, por exemplo, estes passos:
Não tem morte para o riso, não tem morte.
(NM, 74.)
— Aqui tem galinha, tem quintal...
(1,63.)
Verdes amores não tem mais, nunca mais.
(NM, 62.)
4.a) Em sentido figurado, os verbos que exprimem fenómenos da natureza podem
ser empregados com sujeito:
Dormiu mal, mas amanheceu alegre.
(É. Veríssimo, LS, 146.)
Choviam os ditos ao passo que ela seguia pelas mesas.
(Almada Negreiros, NG, 92.)
DA ATITUDE DO SUJEITO
C o m o s v e rb o s d e a ç ã o
Quando o verbo exprime uma ação, a atitude do sujeito com referência ao
processo verbal pode ser de atividade, de passividade, ou de atividade e passi
vidade ao mesmo tempo.
Neste exemplo,
Maria le v a n to u o m e n in o ,
o su je ito Maria ex ecu ta a ação expressa p e la fo rm a v erb al
é, pOÍS, O AGENTE.
levantou. O
su je ito
a ação n ã o é p ra tic a d a pelo sujeito o menino, m as p elo ag en te da passiva —
O sujeito, n o caso, sofre a ação; é d ela o paciente.
Maria.
Neste exemplo,
O menino foi levantado por Maria,
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Neste exemplo,
Maria levantou-se,
a ação é s im u lta n e a m e n te exercida e so frid a p elo su jeito
a u m te m p o , o agente e o paciente dela.
Maria. O su jeito é en tã o ,
Observação:
Como vemos, na voz ativa, o termo que representa o agente é o sujeito do verbo;
o que representa o paciente é o obieto direto. Na voz passiva, o obieto (paciente)
torna-se o sujeito do verbo.
C o m o s v e rb o s d e e s ta d o
Quando o verbo evoca um estado, a atitude da pessoa ou da coisa que dele
participa é de neutralidade. O sujeito, no caso, não é o agente nem o paciente,
mas a sede do processo verbal, o lugar onde ele se desenvolve;
Pedro é magro.
Antônio permanece doente.
O porteiro fico u pálido.
O bservação:
Incluem-se naturalmente entre os verbos que evocam um estado, ou melhor, uma
mudança de estado, os incoativos como adoecer, emagrecer, empalidecer, equivalentes
a ficar doente, ficar magro, ficar pálido.
O PREDICADO
O predicado p o d e ser nominal , verbal ou verbo- nominal .
PREDICADO NOMINAL
O predicado nominal é formado por um verbo de ligação +
O verbo de ligação pode expressar:
a) estado permanente:
1.
Hilário era o herdeiro da quinta.
(C. de Oliveira, CD, 90.)
Eu sou a tua sombra.
(N. Pinon, FD, 38.)
predicativo.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
b) estado transitório:
O velho esteve entre a vida e a morte durante uma semana.
(Castro Soromenho, TM, 236.)
— Você não anda um pouco fatigado pelo excesso de trabalho?
(C. Drummond de Andrade, CA, 139.)
c) mudança de estado:
Receava que eu me tornasse ingrato.
(A. Abelaira, NC, 14.)
Amaro ficou muito perturbado.
(É. Veríssimo, LS, 137.)
d) continuidade de estado:
Calada estava, calada permaneceu.
(J. Condé, C,4.)
O Barbaças continuava alheado e sorridente.
(F. Namora, TJ, 177.)
e) aparência de estado:
Ela parecia uma figura de retrato.
(Autran Dourado, TA, 14.)
Os ventos pareciam quietos naquela noite.
(Alves Redol, BC, 62.)
O bservação:
Os verbos de UGAÇÀO (ou cõPULATivos) servem para estabelecer a união entre
duas palavras ou expressões de caráter nominal. Não trazem propriamente ideia nova
ao sujeito; funcionam apenas como elo entre este e o seu predicativo.
Como há verbos que se empregam ora como copulativos, ora como significativos,
convém atentar sempre no valor que apresentam em determinado texto a fim de
classificá-los com acerto.
Comparem-se, por exemplo, estas frases:
Estavas triste.
Andei muito preocupado.
Fiquei pesaroso.
Continuamos silenciosos.
Estavas em casa.
Andei muito hoje.
Fiquei no meu posto.
Continuamos a marcha.
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Nas primeiras, os verbos estar, andar, ficar e continuar são verbos de ligação; nas
segundas, verbos significativos.
2.
O predicativo pode ser representado:
a) por substantivo ou expressão substantivada:
— O boato é um vício detestável.
(C. de Oliveira, AC, 183.)
Todo momento de achar é um perder-se a si próprio.
(C. Lispector, PSGH, 12.)
b) por adjetivo ou locução adjetiva:
A praia estava deserta.
(Branquinho da Fonseca, MS, 11.)
— Esta linha é de morte.
(C. Drummond de Andrade, CB, 93.)
c) por pronome:
Vou calar-me e fingir que eu sou eu...
(A. Renault, LSL, XVIII.)
O mito é o nada que é tudo.
(F. Pessoa, OP, 8 .)
d) por numeral:
Nós éramos cinco e brigávamos muito, recordou Augusto, olhos
perdidos num ponto X, quase sorrindo.
(C. Drummond de Andrade, CA, 5.)
Tua alma o um que são dois quando dois são um...
(F. Pessoa, OP, 298.)
e) por oração substantiva predicativa:
A verdade é / que eu nunca me ralara muito com isso.
(M. J. de Carvalho, AV, 107.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Uma tarefa fundamental é / preservar a história humana.
(N. Pinon, PD, 73.)
Observações:
1. a) O pronome o, quando funciona como
predicativo,
é demonstrativo:
Cada coisa é o que é.
(F. Pessoa, OP, 175.)
Eu era o que eles me designassem.
(N. Pinon, CC, 13.)
2. a) O predicativo pode referir-se ao obieto, aplicação esta que estudaremos adiante.
3. a) Quando se deseja dar ênfase ao predicativo, costuma-se repeti-lo:
— Arquiteto do Mosteiro de Santa Maria, já o não sou.
(A. Herculano, LN, I, 282.)
Tive depois motivo para crer que o perverso e a peste fora-o ele próprio, na
intenção de fazer valer um bom serviço.
(R. Pompeia, A , 50.)
É o q u e se ch am a
predicativo pleonástico.
PREDICADO VERBAL
O predicado verbal te m c o m o n ú cleo , isto é, c o m o e le m e n to p rin c ip a l d a
d eclaração q u e se faz d o su jeito , u m verbo significativo.
V erbos significativos são aqueles que trazem uma ideia nova ao sujeito.
Podem ser intransitivos e transitivos.
V e rb o s in t r a n s it iv o s
Nestas orações de Da Costa e Silva,
Sobe a névoa... A sombra desce...
(PC, 281.)
verificamos que a ação está integralmente contida nas formas verbais sobe e
desce. Tais verbos são, pois, intransitivos, ou seja, não transitivos: a ação não
vai além do verbo.
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V e rb o s t r a n s it iv o s
Nestas orações de Fernanda Botelho,
Ele não me agradece, / nem eu lhe dou tempo.
{X, 41.)
vemos que as formas verbais agradece e dou exigem certos termos para comple
tar-lhes o significado. Como o processo verbal não está integralmente contido
nelas, mas se transmite a outros elementos (o pronome me na primeira oração,
o pronome lhe e o substantivo tempo na segunda), estes verbos chamam-se
TRANSITIVOS.
Os verbos transitivos podem ser
diretos ao mesmo tempo.
diretos , indiretos , ou diretos e in
1. V erbos transitivos diretos
Nestas orações de Agustina Bessa Luís,
Vou ver o doente.
(OM, 206.)
Ela invejava os homens.
(OM, 207.)
a ação expressa por vou ver e invejava transmite-se a outros elementos (o
doente e os homens) diretamente, ou seja, sem o auxílio de preposição. São,
por isso, chamados verbos transitivos diretos, e o termo da oração que
lhes integra o sentido recebe o nome de objeto direto .
2. V erbos transitivos indiretos
Nestes exemplos,
Da janela da cozinha, as mulheres assistiam à cena.
(R. de Queirós, TR, 15.)
Perdoem ao pobre tolo.
(C. dos Anjos, DR, 235.)
a ação expressa por assistiam e perdoem transita para outros elementos da
oração (a cena e o pobre tolo) indiretamente, isto é, por meio da preposição
a. Tais verbos são, por conseguinte, transitivos indiretos. O termo da oração
que completa o sentido de um verbo transitivo indireto denomina-se objeto
indireto .
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
3. V erbos simultaneamente transitivos diretos e indiretos
Nestes exemplos,
O sucesso do seu gesto não deu paz ao Lomba.
(M. Torga, NCM, 51.)
Apenas lhe aconselho prudência.
(C. de Oliveira, CD, 94.)
a ação expressa por deu e aconselho transita para outros elementos da oração, a
um tempo, direta e indiretamente. Por outras palavras: estes verbos requerem
simultaneamente objeto direto e indireto para completar-lhes o sentido.
O bservação:
Seguimos aqui a distinção estabelecida pela Nomenclatura Gramatical Brasileira.
Não é pacífica, ainda hoje, a conceituação de objeto indireto, embora desde o
século XV11I gramáticos, filólogos e linguistas tenham procurado precisá-la. Leia-se,
a propósito, o que escreve André Chervel, na Histoire de la grammaire scolaire. Paris,
Payot, 1981, p. 76,120, 121,172-176,178-184,245,268.
PREDICADO VERBO-NOMINAL
Não são apenas os verbos de ligação que se constroem com predicativo do
sujeito. Também verbos significativos podem ser empregados com ele.
Nestes exemplos,
Paulo riu despreocupado.
(A. Peixoto, RC, 191.)
Amélia saiu da igreja, muito fatigada, muito pálida.
(Eça de Queirós, OC, 1,421.)
os verbos rir e sair são significativos. Na primeira oração, despreocupado referese ao sujeito Paulo, qualificando-o. Também muito fatigada e muito pálida são
qualificações de Amélia, o sujeito da segunda oração.
A este predicado misto, que possui dois núcleos significativos (um verbo e
um predicado), dá-se o nome de verbo - n o m in a l .
O bservação:
No predicado verbo- nominal, o predicativo anexo ao sujeito pode vir ante
cedido de preposição, ou do conectivo como\
O ato foi acusado de ilegal.
Carlos saiu estudante e voltou como doutor.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
VARIABILIDADE DA PREDICAÇÃO VERBAL
A análise da transitividade verbal é feita de acordo com o texto e não iso
ladamente. O mesmo verbo pode estar empregado ora intransitivamente, ora
transitivamente, ora com objeto direto, ora com objeto indireto.
Comparem-se estes exemplos:
Perdoai sempre.
Perdoai as ofensas.
Perdoai aos inimigos.
Perdoai as ofensas aos inimigos.
Por que sonhas, ó jovem poeta?
Sonhei um sonho guinholesco.
[=
intransitivo ]
[ = TRANSITIVO DIRETO]
[= TRANSITIVO INDIRETO]
[= TRANSITIVO DIRETO E INDIRETO]
[=
intransitivo ]
[= TRANSITIVO DIRETO]
A ORAÇÃO E OS SEUS TERMOS INTEGRANTES
Examinemos as partes assinaladas nas orações abaixo:
Alguns colegas mostravam interesse por ele.
(R. Pompeia, A , 234.)
Tinha os olhos rasos de lágrimas.
(A. Bessa Luís, QR, 272.)
Tenho escrito bastantes poemas.
(F. Pessoa, OP, 175.)
Não sei que diga do marido relativamente ao baile da ilha.
(Machado de Assis, OC, 1,935.)
No primeiro exemplo, o pronome ele está relacionado com o substantivo
interesse por meio da preposição por; no segundo, o substantivo lágrimas rela
ciona-se com o adjetivo rasos através da preposição de\ no terceiro, o substantivo
poemas, modificado pelo adjetivo bastantes, integra o sentido da forma verbal
tenho escrito; no quarto, o baile da ilha prende-se ao advérbio relativamente por
intermédio da preposição a.
Vemos, pois, que há palavras que completam o sentido de substantivos, de
adjetivos, de verbos e de advérbios. As que se ligam por preposição a substan
tivo, adjetivo ou advérbio chamam-se com plem entos n o m in a is . Denominam-se
com plem entos verbais as que integram o sentido do verbo.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
COMPLEMENTO NOMINAL
O c o m plem en to no m ina l vem, como dissemos, ligado por preposição ao
substantivo, ao adjetivo ou ao advérbio cujo sentido integra ou limita. A palavra
que tem o seu sentido completado ou integrado encerra “uma ideia de relação
e o complemento é o objeto desta relação” 1.
O
com plem en to nom inal
p o d e s e r r e p r e s e n ta d o p o r :
a ) s u b s ta n tiv o ( a c o m p a n h a d o o u n ã o d o s se u s m o d if ic a d o r e s ) :
O pior é a demora do vapor.
(V. Nemésio, MTC, 361.)
Só Joana parecia alheia a toda essa atividade.
(F. Namora, T/, 231.)
b) pronome:
Tinha nojo de si mesma.
(Machado de Assis, OC, 1,487.)
Ninguém teve notícia dele.
(J. Condé, TC, 101.)
c) numeral:
A vida dele era necessária a ambas.
(Machado de Assis, OC, 1,393.)
Era um repasto de lágrimas de ambos.
(C. Castelo Branco, OS, 1,563.)
d) palavra ou expressão substantivada:
Passo, fantasma do meu ser presente,
Ébrio, por intervalos, de um Além.
(F. Pessoa, OP, 392)
Os dois adversários na luta do sim e do não trataram do que então
lhes interessava, numa conversa breve.
(A. F. Schmidt, AP, 105.)
I Jean Dubois et alii. Dictionnaire de linguistique. Paris, Larousse, 1973, p. 103.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
e) oração completiva nominal:
Comprei a consciência de que sou
Homem de trocas com a natureza.
(M. Torga, CH, 11.)
Estou com vontade de suprimir este capítulo.
(Machado de Assis, OC, 1,509.)
Observações:
1.
a) O complemento nominal pode estar integrando o sujeito, o predicativo,
o objeto direto, o objeto indireto, o agente da passiva, o adjunto adverbial, o aposto
e o vocativo.
2.
a) Convém ter presente que o nome cujo sentido o complemento nominal
integra corresponde, geralmente, a um verbo transitivo de radical semelhante:
amor da pátria
ódio aos injustos
amar a pátria
odiar os injustos
COMPLEMENTOS VERBAIS
OBJETO DIRETO
1. O bjeto direto é o c o m p le m e n to de u m v e rb o tra n s itiv o d ire to , o u seja,
o c o m p le m e n to q u e n o rm a lm e n te v em lig ad o ao v e rb o sem p re p o siç ã o e
in d ica o ser p a ra o q u a l se d irig e a ação v erb al.
Pode ser representado por:
a) su b stan tiv o :
Vou descobrir mundos, quero glória e fama!...
(Guerra Junqueiro, S, 12.)
Não recebo dinheiro nenhum.
(C. Drummond de Andrade, CB, 82.)
b) pronome (substantivo):
O s jo rn a is nada p u b lic a ra m .
(C. Drummond de Andrade, CA, 135.)
Nunca o interrompi.
(Alves Redol, BSL, 68.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
— Visto-me num instante e vou te levar de carro.
(Vianna Moog, T, 80.)
c) numeral:
— Já tenho seis lá em casa, que mal faz inteirar sete?
(C. Drummond de Andrade, CB, 31.)
Nunca achou dois ou três?
(A. Abelaira, NC, 62.)
d) palavra ou expressão substantivada:
Tem um quê de inexplicável.
(Gonçalves Dias, PCPE, 230.)
Como quem compõe roupas
O outrora compúnhamos.
(F. Pessoa, OP, 206)
Perscrutava na quietude o inútil de sua vida.
(Autran Dourado, IA, 36.)
e) oração substantiva (objetiva direta):
Não quero que fiques triste.
(J. Régio, SM, 295.)
Veja se consegue o mapa dos caminhos.
(A. M. Machado, C/, 244.)
2. Saliente-se, ainda, que na constituição do objeto direto podem entrar mais
de um substantivo ou mais de um dos seus equivalentes:
Tomara-lhe a mulher e a terra, mas mandara-lhe entregar o milho e
as abóboras que nela encontrara.
(Castro Soromenho, C, 3.)
Discreto e cauteloso, raramente diz “sim” ou “não”categóricos; prefere
o vamos ver protelatório e reflexivo.
(A. M. Machado, /T, LI.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
OBJETO DIRETO PREPOSICIONADO 2
costuma vir regido da preposição a:
a) com os verbos que exprimem sentimentos:
1. O objeto
direto
Não amo a ninguém, Pedro.
(C. dos Anjos, M, 196.)
Só não amava a Jorge como amava ao filho.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 156.)
b) para evitar ambiguidade:
Sabeis, que ao Mestre vai matá-lo.
(M. Mesquita, LT, 66.)
c) quando vem antecipado, como nos provérbios seguintes:
A homem pobre ninguém roube.
A médico, confessor e letrado nunca enganes.
2. O objeto direto é o b rig a to ria m e n te p re p o s ic io n a d o q u a n d o ex p resso p o r
p ro n o m e p esso al o b líq u o tô n ic o :
Não a ti, Cristo, odeio ou te não quero.
(F. Pessoa, OP, 218.)
Rubião viu em duas rosas vulgares uma festa imperial, e esqueceu a
sala, a mulher e a si.
(Machado de Assis, OC, 1,679.)
OBJETO DIRETO PLEONÁSTICO
1. Quando se quer chamar atenção para o objeto direto que precede o verbo,
costuma-se repeti-lo. É o que se chama obieto direto pleonástico, em cuja
constituição entra sempre um pronome pessoal átono:
:
Sobre o emprego do ouieto direto preposicionado em português, veja-se a excelente
monografia de Karl Heinz Delille. Die geschichtliche Entwicklung des präpositionalen
Akkusativs im Portugiesischen. Bonn, Romanisches Seminar der Universität, 1970.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Palavras cria-as o tempo e o tempo as mata.
(J. Cardoso Pires, D, 300.)
Árvore, filho e livro, queria-os perfeitos.
(Vianna Moog, T, 330.)
2. O objeto direto PLEONÁSTico pode também ser constituído de um pro
nome átono e de uma forma pronominal tônica preposicionada:
A mim, ninguém me espera em casa.
(J. Régio, CL, 52.)
Quantas vezes, viandante, esta incolor paisagem
Não te mirou a ti, a ti também sem cor!
(A. de Guimaraens, OC, 194.)
Mas não encontrou Marcelo nenhum. Encontrou-nos a nós.
(D. Mourão-Ferreira, 1,23.)
OBJETO INDIRETO
1. O bjeto indireto é o c o m p le m e n to de u m v e rb o tra n sitiv o in d ire to , isto é,
o c o m p le m e n to q u e se liga ao v e rb o p o r m e io d e p rep o siç ã o .
Pode ser representado por:
a) substantivo:
Duvidava da riqueza da terra.
(N. Pinon, CC, 190.)
Necessitamos de uma cabeça bem firme na terra, bem fincada na
terra!
(A. Abelaira, NC, 74.)
b ) p r o n o m e (su b sta n tiv o ):
Que ela afaste de ti aquelas dores
Que fizeram de mim isto que sou!
(F. Espanca, S, 24.)
Inserir-se em Roma é mais difícil do que incorporar a si o sentimento
de Roma.
(A. A. de Melo Franco, AR , 25.)
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c) numeral:
Os domingos, porém, pertenciam aos dois.
(E Namora, GS, 113.)
Se o meu barbeiro é, como creio, verdadeiro, a viúva do defunto com
pôs-se com o matador, e o ministério público com ambos, de modo
que o homicida granjeou pacificamente suas terras.
(C. Castelo Branco, OS, 1,93.)
d) palavra ou expressão substantivada:
Mas — quem daria dinheiro aos pobres?
(C. Lispector, BF, 138.)
Seu formidável vulto solitário
Enche de estar presente o mar e o céu.
(E Pessoa, OP, 14.)
e) oração substantiva (objetiva indireta):
— Não te esqueças de que a obediência é o primeiro voto das noviças.
(J. Montello, DP, 236.)
A mãe contava e recontava as duas malas tentando convencer-se de
que ambas estavam no carro.
(C. Lispector, LF, 90.)
2. Como o o b j e t o d i r e t o , o o b j e t o i n d i r e t o pode ser constituído de mais
de um substantivo ou mais de um dos seus equivalentes:
Fechada a porta da Casa Verde, entregou-se ao estudo e à cura de si
mesmo.
(Machado de Assis, OC, II, 288.)
Embora, não perceba grande coisa do que ouve, está sempre a precisar
disto e daquilo.
(M. J. de Carvalho, AV, 54.)
O bservação:
Não vem precedido de preposição o o b j e t o i n d i r e t o representado pelos pro
nomes pessoais oblíquos me, te, lhe, nos, vos, lhes, e pelo reflexivo se. Note-se que o
pronome oblíquo lhe (lhes) é essencialmente o b i e t o i n d i r e t o :
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
— Você não me está insinuando que não vai aceitar?
(Vianna Moog, T, 390.)
As noites não lhe trouxeram repouso, mas deram-lhe, em contrapartida,
tempo para a meditação.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 1177.)
Luís Garcia dera-se pressa em visitar o filho de Valéria.
(Machado de Assis, OC, 1,336.)
A propósito do emprego dos pronomes oblíquos (tônicos e átonos), bem como
do modo por que se podem combinar, leia-se o que dizemos no capítulo 11.
OBJETO INDIRETO PLEONÁSTICO
Com a finalidade de realçá-lo, costuma-se repetir o objeto indireto . Neste
caso, uma das formas é obrigatoriamente um pronome pessoal átono. A outra
pode ser um substantivo ou um pronome oblíquo tônico antecedido de pre
posição:
A mim ensinou-me tudo.
(F. Pessoa, OP, 145.)
— Quem lhe disse a você que estavam no palheiro?
(C. de Oliveira, AC, 119.)
Aos meus escritos, não lhes dava importância nenhuma.
(G. Amado, HMI, 190.)
O bservação:
Enquanto a preposição que encabeça um a d j u n t o a d v e r b i a l possui claro valor
significativo, a que introduz um o b i e t o i n d i r e t o apresenta acentuado esvaziamento
de sentido. Comparem-se estes exemplos:
Cantava para os amigos.
Viajou para São Paulo.
Não duvides de mim.
Não saias de casa.
Nas duas primeiras orações, em que introduzem o b j e t o i n d i r e t o , as preposi
ções para e de são simples elos sintáticos. Nas duas últimas, introduzindo a d i u n t o s
a d v e r b i a i s , servem para indicar, respectivamente, o lugar para onde e o lugar donde.
A propósito, leia-se o que escrevemos no capítulo 15.
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PREDICATIVO DO OBJETO
1. Tanto o
objeto direto
como o
O predicativo
- nominal , e é expresso:
a) por substantivo:
predicativo .
podem ser modificados por
só aparece no predicado verbo -
indireto
do obieto
Uns a nomeiam primavera. Eu lhe chamo estado de espírito.
(C. Drummond de Andrade, FA, 125.)
Chamo-me Aldemiro.
(I. Lisboa, MCN, 94.)
b) por adjetivo:
Os trabalhadores da Gamboa julgam-no assombrado.
(O. Mendes, P, 140.)
Naquele ano Ismael achou o avô mais macambúzio.
(Autran Dourado, TA, 41.)
2. Como o predicativo do sujEiTO, o
preposição, ou do conectivo como:
do obieto
pode vir antecedido de
Quaresma então explicou porque o tratavam por major.
(Lima Barreto, TFPQ, 215.)
Considero-o como o primeiro dos precursores do espírito moderno.
(A. de Quental, C, 313.)
Observação:
Somente com o verbo chamar pode ocorrer o p r e d i c a t i v o
d o o b je t o
in d ir e t o
:
A gente só ouvia o Pancário chamar-lhe ladrão e mentiroso.
(Castro Soromenho, V. 220.)
Chamam-lhe fascista por toda a parte.
(C. dos Anjos, M, 277.)
Com os demais verbos que admitem esse predicativo (por exemplo: crer, eleger,
encontrar, estimar, fazer, julgar, nomear, proclamar e sinônimos), ele é sempre um
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
modificador do o b j e t o d i r e t o . Baseados nesse fato, filólogos como Epifânio da
Silva Dias e Martinz de Aguiar preferem considerar o complemento no caso — seja
expresso pelo pronome lhe, seja por um substantivo antecedido de preposição —
c o m o OBJETO DIRETO.
AGENTE DA PASSIVA
1.
o complemento que, na voz passiva com auxiliar, designa
o ser que pratica a ação sofrida ou recebida pelo sujeito. Este complemento
verbal — normalmente introduzido pela preposição por (ou per) e, algumas
vezes, por de — pode ser representado:
a) por substantivo ou palavra substantivada:
A gente
da passiva
é
— Esta carta foi escrita p o r um m a r i n h e i r o americano.
(F. Namora, DT, 120.)
Um jornal é lido p o r muita g e n te .
(C. Drummond de Andrade, CB, 30.)
b) por pronome:
Ele d e la é ignorado.
Ela para ele é ninguém.
(F. Pessoa, OP, 117.)
A mesma oração foi p o r m i m proferida em São José dos Campos,
minha cidade natal.
(Cassiano Ricardo, VTE, 26.)
c) por numeral:
Tudo quanto os leitores sabem de um e de outro foi ali exposto
a m b o s , e p o r a m b o s ouvido entre abatimento e cólera.
(Machado de Assis, OC, II, 212-213.)
Não devem ser escutadas por todos; têm de ser ouvidas p o r
(J. Paço d’Arcos, CVT, 350.)
por
um .
d) por oração substantiva:
E se a primeira pode não encontrar partidários incondicionais, a
segunda é certamente subscrita p o r q u a n t o s t e n h a m u m a e x p e r i ê n
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
cia análoga, e não pensam a América, mas se incorporam nela, sem
deixarem de ser Europeus.
(M. Torga, TU, 48.)
Mariana era apreciada por todos quantos iam a nossa casa, homens
e senhoras.
(Machado de Assis, OC, II, 746.)
TRANSFORMAÇÃO DA ORAÇÃO ATIVA EM PASSIVA
1.
Quando uma oração contém um verbo construído com objeto direto, ela
pode assumir a forma passiva, mediante as seguintes transformações:
a) o objeto direto passa a ser sujeito da passiva;
b) o verbo passa à forma passiva analítica do mesmo tempo e modo;
c) o sujeito converte-se em agente da passiva.
Tomando-se como exemplo a seguinte oração ativa,
A inflação corrói os salários,
poderíamos colocá-la no esquema:
oração
a inflação
corrói
Convertida na oração passiva, teríamos:
Os salários são corroídos pela inflação.
os salários
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
O seu esquema seria então:
oração
os salários
2.
verbo
agente da passiva
são corroídos
pela inflação
Se numa oração da voz ativa o verbo estiver na 3.a pessoa do plural para indicar
a indeterminação do sujeito, na transformação passiva cala-se o agente.
Assim:
VOZ ATIVA
Aumentaram os salários.
Contiveram a inflação.
VOZ PASSIVA
Os salários foram aumentados.
A inflação foi contida.
Observações:
1.
a) Cumpre não esquecer que, na passagem de uma oração da voz ativa para a
passiva, ou vice-versa, o agente e o paciente continuam os mesmos; apenas desem
penham função sintática diferente.
2. a) Na voz passiva pronominal, a língua moderna omite sempre o agente:
Aumentou-se o salário dos gráficos.
Conteve-se a inflação em níveis razoáveis.
A ORAÇÃO E OS SEUS TERMOS ACESSÓRIOS
Chamam-se acessórios os term os que se juntam a um nome ou a um verbo
para precisar-lhes o significado. Embora tragam um dado novo à oração, não são
eles indispensáveis ao entendimento do enunciado. Daí a sua denominação.
São term os acessórios :
a) o
a d ju n to a d nom inal ;
b) o
a d jun to adverbial ;
c) O APOSTO.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
ADJUNTO ADNOMINAL
Adjunto adnominal é o te rm o d e v a lo r ad jetiv o q u e serve p a ra esp ecificar o u
d e lim ita r o significad o de u m su b sta n tiv o , q u a lq u e r q u e seja a fu n ç ã o deste.
O adjunto
a) adjetivo:
a d nom inal
pode vir expresso por:
Na areia podemos fazer até castelos s o b e r b o s , onde abrigar o nosso
í n t i m o sonho.
(R. Braga, CCE, 251.)
— Tenho pensado que toda esta geringonça
g r a n d e volta.
(C. de Oliveira, CD, 93.)
s o c ia l
precisa de uma
b) locução adjetiva:
Tinha uma memória d e p r o d í g i o .
(J. Lins do Rego, ME, 104.)
Era um homem
d e c o n s c iê n c ia .
(A. Abelaira, NC, 15.)
O homem já estava acamado
Dentro da noite s e m c o r.
(M. Bandeira, PP, I, 339.)
c) artigo (definido ou indefinido):
O
ovo é a cruz que a galinha carrega n a vida.
(C. Lispector, FC, 51.)
As ondas rebentavam com estrondo, formando u m a muralha de
espuma, para lá da qual o mar era u m lago sereno e azul.
(Branquinho da Fonseca, MS, 10.)
d ) p ro n o m e adjetivo:
Deposito a m i n h a dona no limiar da s u a moradia.
(F. Botelho, X, 118.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Vários vendedores de artesanato expunham suas mercadorias.
(R. Fonseca, C, 76-77.)
e) numeral:
Casara-se havia duas semanas.
(C. Drummond de Andrade, CB, 29.)
Tinha uns seis a oito meses e eu, proporcionalmente, devia orçar
pela sua idade.
(A. Ribeiro, CRG, 17.)
f) oração adjetiva:
Os cabelos, que tinha fartos e lisos, caíram-lhe todos.
(M. J. de Carvalho, AV, 116.)
Venho cumprir uma missão do sacerdócio que abracei.
(Machado de Assis, OC, II, 155.)
O bservação:
O m e s m o su b sta n tiv o p o d e estar a c o m p a n h a d o p o r m ais de u m
a d iu n to
a d n o m in a l:
Ante o meu embezerramento, o paizinho sorria um sorriso benévolo e
desenfadado.
(A. Ribeiro, CRG, 11.)
Um Cristo barroco pendia da cruz, num altar lateral.
(Vianna Moog, T, 8 6 .)
ADJUNTO ADVERBIAL
A d iu n to
adverbial
é, c o m o o n o m e in d ic a , o t e r m o d e v a lo r a d v e rb ia l q u e
d e n o ta a lg u m a c irc u n s tâ n c ia d o fa to e x p re s s o p e lo v e rb o , o u in te n s ific a o s e n tid o
d e s te , d e u m a d je tiv o , o u d e u m a d v é rb io .
O
a d iu n to adverbial
p o d e v ir r e p r e s e n ta d o p o r:
a ) a d v é rb io :
Aqui não
p a s s a n in g u é m .
(F. Namora, TJ, 205.)
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Amou-a perdidamente.
(L Fagundes Telles, DA, 118.)
b) por locução ou expressão adverbial:
De súbito, eu, o Barão e a criada começamos a dançar no meio da
sala.
(Branquinho da Fonseca, B, 61.)
Lá embaixo aparece Jacarecanga sob o sol do meio-dia.
(É. Veríssimo, ML, 13.)
c) por oração adverbial:
Fechemos os olhos até que o sol comece a declinar.
(A. M. Machado, C/, 82.)
Quando acordou, já Lisa ali estava.
(M. J. de Carvalho, AV, 141.)
C la s s ific a ç ã o d o s a d ju n to s a d v e r b ia is
É difícil enumerar todos os tipos de adjuntos adverbiais . Muitas vezes, só
em face do texto se pode propor uma classificação exata. Não obstante, convém
conhecer os seguintes:
a) de causa :
Por que lhes dais tanta dor?!
(A. Gil, I /, 25.)
Não havia de perder o esforço daqueles anos todos, por causa de um
exame só, o derradeiro.
(C. dos Anjos, MS, 343.)
b)
de co m pa n h ia :
Lanchas, ide com Deus! Ide e voltai com ele
Por esse mar de Cristo...
(A. Nobre, S, 32.)
Vivi com Daniel perto de dois anos.
(C. Lispector, BF, 79.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
c) DE dü v id a :
Talvez Nina tivesse razão...
(V. Nemésio, MTC, 105.)
Acaso meu pai entenderia mesmo de poemas?
(L. Jardim, MPM, 89.)
d)
de f im :
Há homens para nada, muitos para pouco, alguns para muito, ne
nhum para tudo.
(Marquês de Maricá, M, 87.)
Viaja então para se contrafazer, por penitência?
(A. Abelaira, NC, 19.)
e)
de in stru m en to :
Anastácio estava no alto, na orla do mato, juntando, a ancinho, as
folhas caídas.
(Lima Barreto, TFPQ, 156.)
Dou-te com o chicote, ouviste!
(Luandino Vieira, L, 41.)
f)
DE intensidade :
Gosto muito de ti.
(M. Torga, NCM , 32.)
— Ou ele estuda demais, ou não come bastante de manhã, disse a
mãe.
(C. Lispector, LF, 104.)
g)
DE LUGAR AONDE ':
Cheguei à taberna do velho ao fim da tarde.
(Alves Redol, BSL, 330.)
Sobre o emprego indiscriminado de onde e aonde, veja-se p. 355-6.
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Veja aonde vai.
(A. M. Machado, CJ, 243.)
h)
DE LUGAR ONDE:
No mês passado estive algumas horas em Cartago.
(A. Abelaira, NC, 19.)
O vulto escuro entrou no jardim, sumiu-se em meio às árvores.
(É. Veríssimo, LS, 133.)
i)
DE LUGAR DONDE:
Dos mares da China não mais virão as quinquilharias.
(M. Rubião, D, 144.)
— Some-te daqui, ingrato!
(F. Namora, TJ, 99.)
j)
DE LUGAR PARA ONDE:
Levaram a defunta numa rede para o cemitério de S. Caetano.
(L. Jardim, MP, 25.)
A chuva levou-os para casa.
(C. de Oliveira, AC, 166.)
1)
DE LUGAR POR ONDE:
Atravessou o Campo da Aclamação, enfiou pela Rua de São Pedro e
meteu-se pelo Aterrado acima.
(Machado de Assis, OC, II, 569.)
Por sobre o navio voejavam ainda gaivotas, com movimentos lentos,
ritmados.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 593.)
m ) d e m a t é r ia :
Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da me
lancolia.
(Machado de Assis, OC, 1,413.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
Cheguei de Paris, e encontrei uma carta de Irene, escrita na véspera
do casamento. Era um adeus com raiva e lágrimas.
(C. Castelo Branco, OS, II, 298.)
n ) de meio :
Estarei talvez confundindo as coisas, mas Aníbal ainda viajava de
bicicleta, imaginem!
(A. Abelaira, NC, 19.)
Voltamos de bote para a ponta do Caju.
(Lima Barreto, REIQ 287.)
o)
de m o d o
:
Vagarosamente ela foi recolhendo o fio.
(L. Fagundes Telles, ABV, 7.)
Henriqueta subiu a escada, pé ante pé, como um ladrão.
(V. Nemésio, MTC, 79.)
p)
de negação :
— Não, senhor Cônego, vejo. Mas não concordo, não aceito.
(B. Santareno, TPM, 109.)
— Não partas, não. Aqui todos te querem!
(Castro Alves, £F, 154.)
q ) de tem po :
Todas as manhãs ele sentava-se cedo a essa mesa e escrevia até as
dez, onze horas.
(P.Nava, £0,330.)
A Custódia esteve cinco anos na clausura.
(A. Ribeiro, CRG, 28.)
APOSTO
1. A posto é o te rm o d e c a rá te r n o m in a l q u e se ju n ta a u m su b stan tiv o , a u m p r o
n o m e , o u a u m eq u iv alen te destes, a títu lo de explicação o u de apreciação:
169
170
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Eles, os pobres desesperados, tinham uma euforia de fantoches.
(F. Namora, DT, 237.)
Mas como explicar que, logo em seguida, fossem recolhidos José
Borges do Couto Leme, pessoa estimável, o Chico das Cambraias,
folgazão emérito, o escrivão Fabrício, e ainda outros?
(Machado de Assis, OC, II, 269.)
2. Entre o aposto e o termo a que ele se refere há em geral pausa, marcada na
escrita por uma vírgula, como nos exemplos acima.
Mas pode também não haver pausa entre o aposto e a palavra principal, quando
esta é um termo genérico, especificado ou individualizado pelo aposto .
Por exemplo:
A cidade de Lisboa
O poeta Bilac
O rei D. Manuel
O mês de junho
Este a po st o , chamado de espec ific a ç ã o , não deve ser confundido com
certas construções formalmente semelhantes, como
O clima de Lisboa
O soneto de Bilac
A época de D. Manuel
As festas de junho
em que de Lisboa, de Bilac, de D. Manuel e de junho equivalem a adjetivos
(= lisboeta, bilaquiano, manuelina e juninas) e funcionam, portanto, como
atributos o u adiuntos ad nom inais .
3, O aposto pode também:
a) ser representado por uma oração:
A outra metade tocara aos sobrinhos, com uma condição expressa:
que o legado só lhes fosse entregue trinta anos depois.
(J. Montello, LE, 202.)
A verdade é esta: não fala a bem dizer com acento algum.
(M. de Sá-Carneiro, CF, 108.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
b) referir-se a uma oração inteira:
Pediu que lhe fornecessem papel de carta e que lhe restituíssem a sua
caneta, o que lhe foi concedido.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 1183.)
O importante é saber para onde puxa mais a corredeira— coisa, aliás,
sem grandes mistérios.
(M. Palmério, VC, 375.)
c) ser enumerativo, ou recapitulativo:
Tudo o fazia lembrar-se dela: a manhã, os pássaros, o mar, o azul
do céu, as flores, os campos, os jardins, a relva, as casas, as fontes,
sobretudo as fontes, principalmente as fontes!
(Almada Negreiros, NG, 112.)
Os porcos do chiqueiro, as galinhas, os pé de bogari, o cardeiro da
estrada, as cajazeiras, o bode manso, tudo na casa de seu compadre
parecia mais seguro do que dantes.
(J. Lins do Rego, FM, 289.)
V a lo r s in t á t ic o d o a p o s to
O aposto tem o mesmo valor sintático do termo a que se refere. Pode,
assim, haver:
a) aposto no sujeito:
Ela, Dora, foi, de resto, muitíssimo discreta.
(M. J. de Carvalho, AV, 105.)
A espingarda lazarina, a melhor espingarda do mundo, não mentia
fogo e alcançava longe, alcançava tanto quanto a vista do dono; a mu
lher, Cesária, fazia renda e adivinhava os pensamentos do marido.
(G. Ramos, AOH, 25.)
b) aposto no predicativo:
As escrituras eram duas: a do distrate da hipoteca e a da venda das
propriedades.
(J. Paço d ’Arcos, CVL, 550.)
172
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O meu projeto é este: podíamos obrigar toda a gente a ter manchas
no rosto.
(G. Ramos, AOH, 143.)
c) aposto no complemento nominal:
João Viegas está ansioso por um amigo que se demora, o Calisto.
(Machado de Assis, OC, II, 521.)
A vida é um contínuo naufrágio de tudo: de seres e de coisas, de
paixões e de indiferenças, de ambições e temores.
(A. F. Schmidt, F, 72.)
d) aposto no objeto direto:
Assim, apontou com especialidade alguns personagens célebres, Só
crates, que tinha um demônio familiar, Pascal, que via um abismo à
esquerda, Maomé, Caracala, Domiciano, Calígula...
(Machado de Assis, OC, II, 262.)
Jogamos uma partida de xadrez, uma luta renhida, quase duas ho
ras...
(A. Abelaira, JVC, 54.)
e) aposto no objeto indireto:
Devorador da vida lhe chamaram,
A ele, artista, sábio e pensador,
Que denodadamente se procura!
(M. Torga, CH, 79.)
Meu pai cortava cana para a égua, sua montaria predileta.
(J. Amado, MG, 13.)
Foi o que sucedeu ao seu maior amigo, ao Abel, quando andavam na
traineira do Domingos Peixe.
(Alves Redol, FM, 173.)
f ) aposto no agente da passiva:
Esta frase foi proposta por Sebastião Freitas, o vereador dissidente,
cuja defesa dos Canjicas tanto escandalizara os colegas.
(Machado de Assis, OC, II, 274.)
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
As paredes foram levantadas por Tomás Manuel, avô do Engenheiro.
(J. Cardoso Pires, D, 63.)
g) aposto no adjunto adverbial:
Uma vez empossado da licença começou a construir a casa. Era na
rua nova, a mais bela de Itaguaí.
(Machado de Assis, OC, H, 256-257.)
Foi em 14 de maio de 1542, uma segunda-feira.
(A. Ribeiro, PST, 272.)
h) aposto no aposto:
As crônicas da vila de Itaguaí dizem que em tempos remotos vivera
ali um certo médico, o Dr. Simão Bacamarte, filho da nobreza da
terra e o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Espanhas.
(Machado de Assis, OC, II, 255.)
No Recolhimento morreram umas, ficaram desfeadas outras para
todo o sempre, cegou a filha do Floriano, fidalgo de Rape, cunhado de
meu padrinho, D. Nicéforo da Ula Monterroso Barbaleda Fernandes,
moço fidalgo da Casa Real e par do Reino.
(A. Ribeiro, CRG, 29.)
i) aposto no vocativo:
Razão, irmã do Amor e da Justiça,
Mais uma vez escuta a minha prece.
(A. de Quental, SC, 71.)
Tu, Deus, o Inspirador, Taumaturgo e Adivinho,
Dá-me alívio ao pesar, prodigando-me o Vinho
Que é o néctar celestial da eterna Moradia.
(A. de Guimaraens, OC, 313.)
A p o s to p re d ic a tiv o
Com o aposto atribui-se a um substantivo a propriedade representada por
outro substantivo. Os dois termos designam sempre o mesmo ser, o mesmo
objeto, o mesmo fato ou a mesma ideia.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Por isso, o aposto não deve ser confundido com o adjetivo que, em função
de predicativo , costuma vir separado do substantivo que modifica por uma
pausa sensível (indicada geralmente por vírgula na escrita). Numa oração como
a seguinte
E a noite vai descendo muda e calma...
(F. Espanca, S, 60.)
que também poderia ser enunciada
E a noite, muda e calma, vai descendo...
ou
E, muda e calma, a noite vai descendo...,
muda e calma é predicativo
d e u m p r e d ic a d o v e r b o - n o m in a l.
O mesmo raciocínio aplica-se à análise de orações elípticas, cujo corpo se
reduz a um adjetivo, que nelas desempenha a função de predicativo .
É o c a s o d e fra se s d o tip o :
Rico, desdenhava dos humildes.
em que rico não é a posto . Equivale a uma oração adverbial de causa [= porque
era rico], dentro da qual exerce a função de predicativo .
O adjetivo, enquanto adjetivo, “não pode exercer a função de aposto , por
que ele designa uma característica do ser ou da coisa, e não o próprio ser ou a
própria coisa”'1.
VOCATIVO
1. Examinando estes versos de A. Nobre,
Manuel, tens razão. Venho tarde. Desculpa.
(5,51.)
Ó sinos de Santa Clara,
Por quem dobrais, quem morreu?
(5,47.)4
4 Georges Galichet. Grammaire structurale du français moderne. 2.» ed. Paris-Limoges,
Charles-Lavauzelle, 1968, p. 135.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
vemos que, neles, os termos Manuel e Ó sinos de Santa Clara não estão su
bordinados a nenhum outro termo da frase. Servem apenas para invocar,
chamar ou nomear, com ênfase maior ou menor, uma pessoa ou coisa perso
nificada.
A estes termos, de entoação exclamativa e isolados do resto da frase, dá-se o
nome de vocatívo .
2. Embora não subordinado a nenhum outro termo da oração e isolado do
resto da frase, o vocatívo pode relacionar-se com algum dos termos.
Assim, neste exemplo,
E, ao vê-la, acordarei, meu Deus de França!
(A. Nobre, S, 43.)
o vocatívo meu Deus de França! não tem relação alguma com os demais
termos da frase.
Já nestes exemplos,
Dizei-me vós, Senhor Deus!
(Castro Alves, OC, 281.)
Ó lanchas, Deus vos leve pela mão!
(A. Nobre, S, 31.)
o
Senhor Deus! r e la c io n a - s e c o m o s u je ito vós, d a p r im e ir a
vocatívo Ó lanchas c o m o o b je to d ir e t o vos, d a s e g u n d a .
vocatívo
e o
o ra ç ã o ;
Observações:
a) Quando se quer dar maior ênfase à frase, costuma-se preceder o
da interjeição ó!, como neste exemplo de Vinícius de Morais:
1.
vocatívo
Ó minha amada,
Que olhos os teus!
(PCP, 334.)
2.
“) Na escrita, o vocatívo vem normalmente isolado por vírgula, ou seguido de
ponto de exclamação, como nos mostram os exemplos acima.
3.
a) Cumpre distinguir o vocatívo do substantivo que, acompanhado ou não de
determinação, constitui por si mesmo o predicado em frases exclamativas do tipo:
Silêncio! [= Faça silêncio!)
Mãos ao alto! [= Ponha as mãos ao alto!)
175
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
COLOCAÇÃO DOS TERMOS NA ORAÇÃO
ORDEM DIRETA E ORDEM INVERSA
1. Em português, como nas demais línguas românicas, predomina a ordem direta,
isto é, os termos da oração dispõem-se preferencialmente na sequência:
SUJEITO + VERBO + OBJETO DIRETO + OBJETO INDIRETO
OU
SUJEITO + VERBO + PREDICATIVO
Essa preferência pela o rd em direta é mais sensível nas
tivas ou declarativas (afirmativas ou negativas). Assim:
orações en u n c ia
Carlos ofereceu um livro ao colega.
Carlos é gentil.
Paulo não perdoou a ofensa do colega.
Paulo não é generoso.
2. Ao reconhecermos a predominância da ordem direta em português, não
devemos concluir que as inversões repugnem ao nosso idioma. Pelo contrá
rio, com muito mais facilidade do que outras línguas (do que o francês, por
exemplo), ele nos permite alterar a ordem normal dos termos da oração. Há
mesmo certas inversões que o uso consagrou, e se tornaram para nós uma
exigência gramatical.
INVERSÕES DE NATUREZA ESTILÍSTICA
Dos fatores que normalmente concorrem para alterar a sequência lógica dos
termos de uma oração, o mais importante é, sem dúvida, a ênfase.
Assim, o realce do sujeito provoca geralmente a sua posposicão ao verbo :
Quero levar-te a dédalos profundos,
Onde refervem sóis... e céus... e mundos...
(Castro Alves, £F, 44.)
És tu! És tu! Sempre vieste, enfim!
(F. Espanca, S, 140.)
Não vês o que te dou eu?
(V.de Morais, PCP, 297.)
FRASE, ORAÇÃO, PERÍODO
Ao contrário, o realce do predicativo , do objeto ( direto o u in d ir eto ) e do
a d jun to adverbial é expresso de regra por sua antecipação ao verbo:
Fraca foi a resistência.
(C. dos Anjos, MS, 313.)
Minha espada, p e s a d a a b r a ç o s la sso s,
Em mãos viris e calmas entreguei.
(F. Pessoa, OP, 67.)
A ela devia o meu estado psíquico cinzento e melindroso.
(F. Namora, DT, 59.)
Acolá, na entrada do Catongo, é uma festa de mutirão.
(Adonias Filho, LP, 30.)
INVERSÕES DE NATUREZA GRAMATICAL
Em outros lugares deste livro tratamos da colocação de termos da oração.
Nos capítulos 10,11 e 14 estudamos, respectivamente, a posição:
a) d o
adjetivo
b) dos
de
c) d o
com o
prono m es,
adjunto a d n o m in a l ;
em p a rtic u la r d o s
pr o n o m es pessoais á to n o s
q u e serv em
objeto direto o u in d ireto ;
advérbio
e d e o u tr a s c la sse s d e p a la v ra s e m s u a f u n ç ã o o r a c io n a l.
No capítulo 19 examinamos as figuras de sintaxe denominadas hipérbato ,
anástrohe e síNQuiSE. Por isso, vamos restringir-nos aqui apenas a algumas
considerações quanto à posição do verbo relativamente ao sujeito e ao predi
cativo .
In v e rs ã o v e rb o + s u je ito
1. A inversão verbo + sujeito verifica-se em geral:
a) nas orações interrogativas:
Que fazes tu de grande e bom, contudo?
(A. de Quental, SC, 64.)
Onde está a estrela da manhã?
(M. Bandeira, PP, 1,233.)
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178
NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b) nas orações que contêm uma forma verbal imperativa:
Ouve tu, meu cansado coração,
O que te diz a voz da natureza:
(A. de Quental, SC, 51.)
Dize-me tu, ó céu deserto,
dize-me tu se é muito tarde.
(C. Meireles, OP, 502.)
c) nas orações em que o verbo está na passiva pronominal:
Formam-se bolhas na água...
(F. Pessoa, OP, 160.)
Servia-se o almoço às dez.
(C. dos Anjos, MS, 4.)
d) nas orações absolutas construídas com o verbo no subjuntivo para denotar
uma ordem, um desejo:
— Que venha essa coisa melhor!
(M. Rubião, D, 17.)
Chovam lírios e rosas no teu colo!
(A. de Quental, SC, 35.)
Durma, de tuas mãos nas palmas sacrossantas,
O meu remorso.
(O. Bilac, T, 192.)
e) nas orações construídas com verbos do tipo dizer, sugerir, perguntar, respon
der e sinônimos que arrematam enunciados em discurso direto o u neles se
inserem:
— Isso não se faz, moço, protestou Fabiano.
(G. Ramos, V5,6 6 .)
— Traz-se-lhe as duas coisas — disse o Barão aflorando a cabeça no
ombro da consorte, de mão na porta escura.
(V. Nemésio, MTC, 363.)
FRASE, ORAÇÃO, PERÍODO
f ) nas orações reduzidas de infinitivo, de gerúndio e de participio:
Pelas madrugadas de São João, ao começarem a morreras fogueiras,
mocinhas postavam-se diante do Solar.
(G. França de Lima, JV, 5.)
Tendo adoecido o nosso professor de português, padre Faria, ele o
substituiu.
(J. Amado, MG, 112.)
Acabada a lenga-lenga, pretendi que bisasse.
(A. Ribeiro, CRG, 16.)
g) nas orações subordinadas adverbiais condicionais construídas sem con
junção:
Tivesse eu tomado em meus braços a rapariga e pagaria dentro em
pouco em amarguras os momentos fugazes de felicidade.
(A. F. Schmidt, AP, 68.)
Viesse a ocasião, e ele havia de mostrar de que pau era a canoa...
(Machado de Assis, OC, I, 505.)
h) em certas construções com verbos unipessoais:
Aconteceu no Rio, como acontecem tantas coisas.
(C. Drummond de Andrade, CB, 30.)
Basta o amor ao trabalho...
(A. Abelaira, NC, 14.)
Zuzé aproveitou para meter a parte dele, ainda doía-lhe no coração
a cabeçada antiga.
(Luandino Vieira, L, 48.)
i) nas orações que se iniciam pelo predicativo, pelo objeto (direto ou indireto)
ou por adjunto adverbial:
Este é o destino dos versos.
(F. Pessoa, OP, 165.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Essa justiça vulgar, porém, não me soube fazer o meu velho mestre.
(R. Barbosa, R, 86.)
A nós, homens de letras, impõe-se o dever da direção deste movi
mento.
(O. Bilac, DN, 112.)
Num paquete como este não existe a solidão!
(A. Abelaira, NQ 41.)
2. A oração subordinada substantiva subjetiva coloca-se normalmente depois
do verbo da principal:
É provável que te sintas logo muito melhor.
(A. O’Neill, SO, 37.)
Parece que vamos ter um belo dia de sol, depois de uma noite de
vento e chuva.
(J. Montello, A, 178.)
É preciso que eles nos temam.
(Castro Soromenho, V, 116.)
3. Em princípio, os verbos intransitivos podem vir sempre antepostos ao seu
sujeito:
Desponta a lua. Adormeceu o vento,
Adormeceram vales e campinas...
(A. de Quental, SC, 114.)
Correm as horas, vem o Sol descambando; refresca a brisa, e sopra
rijo o vento. Não ciciam mais os buritis...
(Visconde de Taunay, /, 33.)
Observações:
1.
“) Embora nos casos mencionados a tendência da língua seja manifestamente
pela inversão v e r b o + s u j e i t o , em quase todos eles é possível — e perfeitamente
correta — a construção s u j e i t o + v e r b o .
2.
a) O pronome relativo coloca-se no princípio da oração, quer desempenhe a
função de sujeito, quer a de objeto.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
In v e rs ã o p re d ic a tiv o + v e rb o
1. O predicativo segue normalmente o verbo de ligação. Pode, no entanto,
precedê-lo:
a) nas orações interrogativas e exclamativas:
Que monstro seria ela?
(J. Lins do Rego, E, 255.)
Que lindos eram os lagartos nos terraços de suas luras a divisar-me
com as duas gotas de ônix líquido dos olhos pequeninos!
(A. Ribeiro, CPG, 91.)
b) em construções afetivas do tipo:
Orgulhoso, apaixonado pela própria imagem — isso ele o foi!
(A. F. Schmidt, F, 131.)
Probidade — essa foi realmente a qualidade primacial de Veríssimo.
(M. Bandeira, PP, II, 415.)
2. Na voz passiva analítica, o particípio vem normalmente posposto às formas
do auxiliar ser. Costuma, no entanto, precedê-las em frases afetivas denotadoras de um desejo:
Abençoados sejam os nossos maiores, que nos deram esta Pátria
livre e formosa!
(O. Bilac, DN, 81.)
Amaldiçoados sejam eles, caiam-lhes as almas nas profundezas do
inferno.
(J. Saramago, LC, 121.)
ENTOAÇÃO ORACIONAL
1. Dos elementos constitutivos da voz humana é o t o m , o u altura musical, o
mais sensível às modificações emocionais. Agrada-nos ou desagrada-nos
o tom de voz de uma pessoa. Percebemos imediatamente se ela fala em tom
alto ou baixo, ou se, pobre de inflexões, a sua elocução é monótona, isto é, de
um “só tom”, o que vale dizer “enfadonha”. A fala expressiva exige variedade
de tons e sua adequação ao pensamento.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A linha ou curva melódica descrita pela voz ao pronunciar palavras, orações
e períodos chama-se entoaçào .
2 , Os diferentes problemas suscitados pelas tentativas de interpretação da curva
melódica têm posto à prova a argúcia dos linguistas contemporâneos.
Entre esses problemas de solução delicada, sobreleva o de caracterizar o
valor da entoação na frase, isto é, o de saber se nela a entoação desempenha
uma função linguística (significativa ou distintiva) determinada. Por outras
palavras: interessa-nos saber preliminarmente se, pela simples diversidade
da curva melódica, duas mensagens — no mais foneticamente idênticas
— podem ser interpretadas de maneira distinta pelos usuários de uma mesma
língua.
Pelas razões que aduziremos a seguir, parece-nos lícito reconhecer a fun
cionalidade linguística da entoação em nosso idioma.
GRUPO ACENTUAL E GRUPO FÔNICO
Dissemos que grupo acentual é todo segmento de frase que se apoia em
um acento tônico principal. A um ou vários grupos acentuais compreendidos
entre duas pausas (lógicas, expressivas, ou respiratórias) dá-se o nome de grupo
FO N IC O .
Por exemplo, numa elocução lenta, o seguinte período de Marques Rebelo
O aguaceiro / desabou, / com estrépito, / mas a folia / persistiu.
apresenta cinco g ru po s a c en tu a is , cujos limites marcamos com um traço
inclinado. Mas encerra apenas três grupos fô n ic o s :
O aguaceiro desabou, // com estrépito, // mas a folia persistiu.
que separamos por dois traços.
Já numa elocução rápida, que omitisse a pausa (indicada pela vírgula) entre
o verbo desabou e o seu adjunto adverbial com estrépito, o período em exame
passaria a ter somente dois grupos fó n ico s :
O aguaceiro desabou com estrépito, // mas a folia persistiu.
O GRUPO FÔNICO, UNIDADE MELÓDICA
A unidade m elódica é o segmento mínimo de um enunciado com sentido
próprio e com forma musical determinada. Os seus limites coincidem com os
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
do
grupo fô n ic o .
Podemos, pois, considerar o
gru po fô n ico o
equivalente da
UNIDADE MELÓDICA.5
O bservação:
Em poesia, os versos curtos (até sete sílabas) constam geralmente de um só grupo
fônico. Os versos longos costumam apresentar intemamente uma deflexão da voz
( c e s u r a ) , que os divide em hemistíquios. Cada hemistíquio corresponde, de regra,
a um grupo fônico.
O GRUPO FÔNICO E A ORAÇÃO
Caracterizada a unidade melódica, passemos à análise das diferenças que se
observam na curva tonal descrita por três tipos de oração: a declarativa , a
INTERROGATIVA e ã EXCLAMATIVA.
O ra ç ã o d e c la ra tiv a
1. Examinando a seguinte oração, constituída de um só grupo fônico:
Os alunos chegaram tarde
observamos que a voz descreve, aproximadamente, esta curva melódica:
lu
ga
nos
che
tar
ram
Os
de
que poderíamos simplificar no esquema:
Sobre a identificação do grupo fônico à unidade melódica leiam-se especialmente os es
tudos de T. Navarro Tomás: El grupo fónico como unidad melódica. Revista de Filologia
Hispânica. Buenos Aires-New York, 1(1 ):3-19,1939; Manual de entonación espanola. New
York, Hispanic Institute, 1948, particularmente p. 37 e ss.
183
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2. Notamos, com base no traçado acima, que o grupo fônico em exame com
preende três partes distintas:
a) a p a r t e in ic ia l ( o u
a scen dente ),
q u e c o m e ç a e m u m n ív e l t o n a l m é d io , c a
r a c te r ís tic o d a s fra s e s a firm a tiv a s , e a p r e s e n ta , e m s e g u id a , u m a a s c e n s ã o d a
v o z, q u e a tin g e o s e u p o n t o c u lm in a n te n a p r im e ir a s íla b a tô n ic a (/w);
b ) a p a r te m e d ia l, e m q u e a v o z, c o m lig e ira s o n d u la ç õ e s , p e r m a n e c e , a p r o x i
m a d a m e n te , n o n ív e l to n a l a lc a n ç a d o ;
c) a p a r te fin a l ( o u
d a s íla b a
descendente ),
( tar), a tin g in d o
e m q u e a v o z cai p r o g r e s s iv a m e n te a p a r t i r
u m n ív e l t o n a l b a ix o n o fin a l d a fra se .
3. Dessas três partes, a inicial e a final são as mais importantes da figura da
entoação. Toda oraçào declarativa completa encerra uma parte inicial as
cendente e uma parte final descendente, ambas muito nítidas.
4. No caso de ser a oração declarativa constituída de mais de um grupo fônico,
o primeiro grupo começa por uma parte ascendente, e o último finaliza com
uma descendente.
O ra ç ã o in t e r r o g a t iv a
No estudo da
entoação interrogativa ,
temos de considerar previamente o
fa to d e in ic ia r-s e o u n ã o a fra s e p o r p r o n o m e o u a d v é r b io in te r r o g a tiv o , p o is
que a curva tonal é distinta nos dois casos.
Orações não iniciadas por pronome ou advérbio interrogativo
1. Tomando como exemplo a mesma oração declarativa, enunciada, porém, de
forma interrogativa,
Os alunos chegaram tarde?
observamos que ela descreve a curva melódica
tar
ram
de
nos
a
Os
FR A SE, ORAÇÃO, PERÍODO
que poderíamos assim representar esquematicamente:
2 . São características deste tipo de interrogação, em que se espera sempre uma
resposta categórica sim, ou não:
a) o ataque da frase começar por um nível tonal mais alto do que na oração
declarativa;
b) na parte medial do segmento melódico, haver uma queda da voz, que, embora
seja mais acentuada do que nas orações declarativas, não altera o caráter
ascendente desta modalidade de interrogação;
c) subir a voz acentuadamente na última vogal tônica, ponto culminante da
frase; em seguida, sofrer uma queda brusca, apesar de se manter em nível
tonal elevado.
3. Comparando esta curva à da oração declarativa estudada, verificamos que
elas se assemelham por terem ambas a parte inicial ascendente e a parte
medial relativamente uniforme.
Distinguem-se, porém:
a) quanto à parte final: descendente, na declarativa; ascendente, na interroga
tiva;
b) quanto ao nível tonal: médio e baixo, na declarativa; alto e altíssimo, na
interrogativa;
c) quanto à queda da voz a partir da última sílaba tônica: progressiva, na de
clarativa; brusca, na interrogativa.
4. Por ser a curva melódica descrita pela voz o único elemento que, na frase
em exame, contribui para o caráter interrogativo da mensagem, temos de
reconhecer que, em casos tais, a entoação apresenta inequívoco valor fun
cional em nossa língua.
Orações iniciadas por pronome ou advérbio interrogativo
Tomemos como exemplo a oração:
Como soube disto?
186
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Em sua enunciação, a voz descreve a seguinte curva melódica,
Co
sou
mo
be
to
que poderíamos assim esquematizar:
São características das orações interrogativas deste tipo:
a) o ataque da frase que, iniciado em um nível tonal muito alto, sobe, às vezes,
bruscamente, até a primeira sílaba tônica, sílaba esta que, na maioria dos
casos, pertence ao pronome ou ao advérbio interrogativo, ou seja, ao elemento
que realiza a função interrogativa da oração;
b) a curva melódica, que, após a primeira sílaba tônica, decresce progressiva
mente e de maneira mais acentuada do que nas frases declarativas.
Interrogação direta e indireta
1. Vimos que a interrogação pode ser expressa:
a) ou por meio de uma oração em que a parte final apresenta entoação ascen
dente, como em:
Os alunos chegaram tarde?
b) ou por uma oração iniciada por pronome ou advérbio interrogativo, em que
a parte final apresenta entoação descendente, pelo exemplo:
Como soube disto?
Nestes casos dizemos que a interrogação é direta .
2. Existe, porém, um outro tipo de interrogação, chamada indireta , que se faz
por meio de um período composto, em que a pergunta está contida numa
oração subordinada de entoação descendente.
Exemplo:
Diga-me como soube disto.
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
3. Nas orações interrogativas indiretas a entoação apresenta as seguintes ca
racterísticas:
a) o ataque da frase começa por um nível tonal alto; há uma elevação da voz
na primeira sílaba tônica, seguida de um lento declínio da curva melódica
até o final da frase;
b) o nível tonal da frase é, em geral, mais baixo que o da interrogação direta;
c) a queda da curva melódica é progressiva, semelhante à que se observa nas
orações declarativas.
4. A escrita procura refletir a diferença tonal entre essas formas de interrogação
com adotar o po n to de interrogação para marcar o término da interro
gação direta, e o simples po n t o , para o da indireta.
O ra ç ã o e x c la m a t iv a
Nas exclamações, a entoação depende de múltiplos fatores, especialmente
do grau e da natureza da emoção de quem fala.
É a expressão emocional que faz variar o tom, a duração e a intensidade de
uma interjeição monossilábica, tal como acontece com a interjeição oh! nestes
dois versos de Castro Alves:
Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Oh! ver não posso este labéu maldito!
Nas formas exclamativas de maior corpo, a expressão emocional concentra-se
fundamentalmente ou na sílaba que recebe o acento de insistência (se houver),
ou na sílaba em que recai o acento normal. Como o primeiro não tem valor
rítmico, é o acento normal o ápice da curva melódica.
Assim, nas exclamações,
Bandido! Insolente! Fantástico!
a voz eleva-se até a sílaba tônica e, depois de alguma demora, decai bruscamente.
Obedecem elas, pois, ao esquema
semelhante ao da entoaçao declarativa.
188
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Já em exclamações como
Jesus! Adeus! Imbecil!
o grupo fônico é ascendente e aproxima-se do esquema da entoação interro
gativa:
2. Maior variedade em matizes de entoação encontramos, naturalmente, nas
frases exclamativas constituídas de duas ou mais palavras. A curva melódica
dependerá sempre da posição da palavra de maior conteúdo expressivo, por
que é sobre a sua sílaba acentuada que irão incidir o tom agudo, a intensidade
mais forte e a maior duração.
Como a sílaba forte da palavra de maior valor expressivo pode ocupar a posição
inicial, medial ou final da oração, três soluções devem ser consideradas:
1.
a) Se a sílaba em causa for a inicial, todo o resto do enunciado terá entoação
descendente.
Exemplo:
Deus de minha alma!
2. a) Se for a final, a frase inteira terá entoação ascendente:
Meu amor!
3.
a) Se for uma das sílabas mediais, a entoação será ascendente até a referida
sílaba e descendente dela até a final, como nos mostram estes exemplos colhidos
em obra de Marques Rebelo:
Sai da frente!
Todo o mundo!!!
A linha tonal de cada um desses casos poderia ser assim esquematizada:
l.a
2.8
3.a
FRA SE, ORAÇÃO, PERÍODO
C o n c lu s ã o
Do exposto, verificamos que a linha melódica tem uma função essencialmente
oracional. Com uma simples mudança de tom, podemos reforçar, atenuar ou,
mesmo, inverter o sentido literal do que dizemos. É, por exemplo, a entoação
particular que permite uma forma imperativa exprimir todos os matizes que
vão da ordem à súplica. Pela entoação que lhes dermos, frases como:
Pois não!
Pois sim!
podem ter ora valor afirmativo, ora negativo.
Enfim a entoação reflete e expressa nossos pensamentos e sentimentos. Se o
acento é a “alma da palavra”, devemos considerá-la a “a alma da oração”.6
" As características da entoação portuguesa estão hoje melhor conhecidas graças sobretudo
às infatigáveis pesquisas do eminente foneticista de Coimbra, o professor Armando de
Lacerda, que em 1975 publicou a sua obra-mestra no particular: Objectos verbais e signi
ficado elocucional. Toemas e entoemos. Entoação. Coimbra, Instituto de Alta Cultura. Mais
recentemente, a mesma matéria voltou a ser tratada, numa nova perspectiva e segundo
métodos diversos, por Maria Raquel Delgado Martins na sua obra, anteriormente citada,
Sept études sur la perception. Accent et intonation du portugais. Lisboa, Laboratório de
Fonética da Faculdade de Letras, 1983.
Capítulo 8
Substantivo
1. S ubstantivo é a p a la v r a c o m q u e d e s ig n a m o s o u n o m e a m o s o s se re s e m
g e ra l.
São, por conseguinte, substantivos:
a) os nomes de pessoas, de lugares, de instituições, de um gênero, de uma espécie
ou de um dos seus representantes:
homem
Pedro
Maria
cidade
Lisboa
Brasil
Senado
Fórum
clero
árvore
animal
Acaiaca
cedro
cavalo
Rocinante
b) os nomes de noções, ações, estados e qualidades, tomados como seres:
justiça
verdade
glória
colheita
viagem
opinião
velhice
doença
limpeza
largura
otimismo
caridade
bondade
doçura
ira
2. Do ponto de vista funcional, o substantivo é a palavra que serve, privativa
mente, de núcleo do sujeito, do objeto direto, do objeto indireto e do agente
da passiva. Toda palavra de outra classe que desempenhe uma dessas funções
equivalerá forçosamente a um substantivo (pronome substantivo, numeral
ou qualquer palavra substantivada).
192
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
CLASSIFICAÇÃO DOS SUBSTANTIVOS
SUBSTANTIVOS CONCRETOS E ABSTRATOS
Chamam-se concretos os substantivos que designam os seres propriamente
ditos, isto é, os nomes de pessoas, de lugares, de instituições, de um gênero, de
uma espécie ou de um dos seus representantes:
homem
Pedro
Maria
cidade
Lisboa
Brasil
Senado
Fórum
clero
árvore
animal
Acaiaca
cedro
cavalo
Rocinante
Dá-se o nome de abstratos aos substantivos que designam noções, ações,
estados e qualidades, considerados como seres:
justiça
verdade
glória
colheita
viagem
opinião
velhice
doença
limpeza
largura
otimismo
caridade
bondade
doçura
ira
SUBSTANTIVOS PRÓPRIOS E COMUNS
Os substantivos podem designar a totalidade dos seres de uma espécie ( de
sig naçã o g e n é r ic a ) o u um indivíduo de determinada espécie ( d esig n a ç ã o
específica ).
Quando se aplica a todos os seres de uma espécie ou quando designa uma
abstração, o substantivo é chamado c o m u m .
Quando se aplica a determinado indivíduo da espécie, o substantivo é
pr ó pr io .
Assim, os substantivos homem, país e cidade são comuns, porque se empre
gam para nomear todos os seres e todas as coisas das respectivas classes. Pedro,
Brasil e Lisboa, ao contrário, são substantivos próprios, porque se aplicam a um
determinado homem, a um dado país e a uma certa cidade.
SUBSTANTIVOS COLETIVOS
C o letivo s s ã o o s s u b s t a n t i v o s c o m u n s q u e , n o s in g u la r , d e s ig n a m u m
c o n j u n t o d e s e re s o u c o isa s d a m e s m a e sp é c ie .
Comparem-se, por exemplo, estas duas afirmações:
Cento e vinte milhões de brasileiros pensam assim.
O povo brasileiro pensa assim.
SUBSTANTIVO
Na primeira enuncia-se um número enorme de brasileiros, mas representados
como uma quantidade de indivíduos. Na segunda, sem indicação de número,
sem indicar gramaticalmente a multiplicidade, isto é, com uma forma de sin
gular, consegue-se agrupar maior número ainda de elementos, ou seja, todos os
brasileiros como um conjunto harmônico.
Além desses coletivos que exprimem um todo, há na língua outros que
designam:
a) uma parte organizada de um todo, como, por exemplo, regimento, batalhão,
companhia (partes do coletivo geral exército);
b) um grupo acidental, como grupo, multidão, bando: bando de andorinhas,
bando de salteadores, bando de ciganos;
c) um grupo de seres de determinada espécie: boiada (de bois), ramaria (de
ramos).
Costuma-se também incluir entre os coletivos os nomes de corporações
sociais, culturais e religiosas, como assembleia, congresso, congregação, concílio,
conclave e consistório. Tais denominações afastam-se, no entanto, do tipo normal
dos coletivos, pois não são simples agrupamentos de seres, antes representam
instituições de natureza especial, organizadas em uma entidade superior para
determinado fim.
Eis alguns coletivos que merecem ser conhecidos:
a lc a t e ia ( d e lo b o s )
c o n s t e la ç ã o (d e e s t r e la s )
a r m e n t o ( d e g a d o g r a n d e : b o is, b ú fa lo s , e tc.)
c o r ja (d e v a d io s , d e t r a t a n t e s , d e v e lh a c o s ,
a r q u ip é la g o (d e ilh a s )
d e la d rõ e s )
a t ilh o (d e e s p ig a s )
c o ro (d e a n jo s , d e c a n t o r e s )
b a n c a (d e e x a m in a d o r e s )
e le n c o (d e a to re s )
b a n d a ( d e m ú s ic o s )
fa la n g e (d e s o ld a d o s .d e a n jo s )
b a n d o (d e a v e s, d e c ig a n o s .d e m a lfe ito re s ,
fa râ n d u la (d e la d rõ e s ,d e d e s o r d e ir o s ,d e a ssa s
e t c .)
s in o s , d e m a lt r a p ilh o s e d e v a d io s )
c a c h o (d e b a n a n a s , d e u v a s , e tc .)
fa to (d e c a b r a s )
c á fila (d e c a m e lo s )
fe ix e (d e le n h a , d e c a p im )
c a m b a d a (d e c a r a n g u e jo s , d e c h a v e s , d e
fro ta (d e n a v io s m e r c a n t e s , d e ô n ib u s )
m a la n d r o s , e tc .)
c a n c io n e ir o ( c o n ju n t o d e c a n ç õ e s , d e p o e
s ia s lír ic a s )
c a r a v a n a (d e v ia ja n t e s , d e p e r e g r in o s , d e
e s t u d a n t e s , e tc .)
c a r d u m e (d e p e ix e s )
c h o ld r a ( d e a s s a s s in o s , d e m a la n d r o s , d e
m a lfe ito r e s )
c h u sm a (d e g e n te , de p e sso a s)
g irâ n d o la ( d e fo g u e te s )
h o rd a (d e p o v o s s e lv a g e n s n ô m a d e s , d e d e
s o r d e ir o s , d e a v e n t u r e ir o s .d e b a n d id o s ,
d e in v a s o r e s )
ju n t a (d e b o is , d e m é d ic o s , d e c r e d o r e s , d e
e x a m in a d o r e s )
le g iã o (d e s o ld a d o s , d e d e m ô n io s , e tc .)
m a g o te (d e p e s s o a s , d e c o is a s )
m a lta (d e d e s o r d e ir o s )
194
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
m anada (de bois, de búfalos, de elefantes)
rebanho (de ovelhas)
m atilha (de cães de caça)
récua (de bestas de carga)
m atula (de vadios, de desordeiros)
réstia (de cebolas, de alhos)
mó (de gente)
roda (de pessoas)
m olho (de chaves, de verd ura)
rom anceiro (co n ju n to de poesias n arrativas)
m ultidão (de pessoas)
súcia (de velhacos, de desonestos)
ninhada (de p intos)
talha (de lenha)
penca (de bananas, de chaves)
tropa (de m uares)
plêiade (de poetas, de artista s)
turm a (de estudantes, de trabalhado res, de
m édicos)
q u ad rilha (de ladrões, de bandidos)
vara (de porcos)
ram alhete (de flo res)
Observações:
1.
a) Excluímos dessa lista os numerais coletivos, como novena, década, dúzia,
etc., que designam um número de seres absolutamente exato. Leia-se, a propósito,
o que dizemos na p. 384.
2.
a) O coletivo especial geralmente dispensa a enunciação da pessoa ou coisa a que
se refere. Tal omissão é mesmo obrigatória quando o coletivo é um mero derivado
do substantivo a que se aplica. Assim, dir-se-á:
A ramaria balouçava ao vento.
A papelada estava em ordem.
Quando, porém, a significação do coletivo não for específica, deve-se nomear
o ser a que se refere:
Uma junta de médicos, de bois, etc.
Um feixe de capim, de lenha, etc.
FLEXÕES DOS SUBSTANTIVOS
Os substantivos podem variar em
n ú m ero , g ên ero
e grau.
NÚMERO
Quanto à flexão de n ú m e r o , o s substantivos podem estar:
a) no s in g u l a r , quando designam um ser único, ou um conjunto de seres con
siderados como um todo ( s u b s t a n t iv o c o l e t i v o ) :
aluno
cão
mesa
povo
manada
tropa
SUBSTANTIVO
b ) n o plural, q u a n d o d esig n a m m ais d e u m ser, o u m ais d e u m desses c o n ju n to s
org ân ico s:
povos
m anadas
a lu n o s
cães
m esas
tro p a s
F o rm a ç ã o d o p lu ra l
Substantivos terminados em vogal ou ditongo
R egra geral: O p lu ra l do s su b sta n tiv o s te rm in a d o s e m vogal o u d ito n g o
fo rm a -se a c re sc e n ta n d o -se -s ao singular.
S in g u l a r
P lu ra l
S in g u l a r
P lu ra l
m esa
m esas
p ai
p a is
e s ta n t e
e s ta n te s
p au
paus
t in t e ir o
t in t e ir o s
lei
le is
ra já
r a já s
chapéu
ch apéus
boné
bonés
c a m a fe u
c a m a fe u s
ja v a li
ja v a lis
h e ró i
h e ró is
c ip ó
c ip ó s
boi
b o is
p e ru
p e ru s
m ãe
m ães
Incluem-se nesta regra os substantivos terminados em vogal nasal. Como a
nasalidade das vogais /e/, /i/, /o/ e /u/, em posição final, é representada grafica
mente por -m, e não se pode escrever -ms, muda-se o -m em -n. Assim: bem faz
no plural bens; flautim faz flautins; som faz sons; atum fàz atuns.
R egras especiais:
1.
Os substantivos terminados em -ão formam o plural de três maneiras:
a) a maioria muda a terminação -ão em -ões:
S in g u l a r
P lu r a l
S in g u l a r
P lu r a l
b a lã o
b a lõ e s
g a v iã o
g a v iõ e s
b o tã o
b o tõ e s
le ã o
le õ e s
canção
canções
nação
naçõ es
c o n fis s ã o
c o n fis s õ e s
o p e ra çã o
o p e ra çõ e s
co ração
co raçõ e s
o p in iã o
o p in iõ e s
e le iç ã o
e le iç õ e s
q u e s tã o
q u e stõ e s
e s ta ç ã o
e s ta ç õ e s
tu b a rão
tu b a rõ es
fr a ç ã o
fr a ç õ e s
v u lc ã o
v u lc õ e s
*
196
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Neste grupo se incluem todos os aumentativos:
S in g u l a r
P lu ra l
S in g u l a r
P lu r a l
am igalhão
am igalhões
m oleirão
m oleirões
bobalhão
bobalhões
narigão
narigões
casarão
casarões
paredão
paredões
chapelão
chapelões
pobretão
pobretões
dram alhão
dram alhões
rapagão
rapagões
espertalhão
espertalhões
sabichão
sabichões
facão
facões
vagalhão
vagalhões
figurão
figurões
vozeirão
vozeirões
b) um reduzido número muda a terminação
S in g u l a r
P lu r a l
-ã o
S
em
in g u l a r
- ã es :
P lu r a l
alem ão
alem ães
charlatão
charlatães
bastião
bastiães
escrivão
escrivães
cão
cães
guardião
guardiães
capelão
capelães
pão
pães
capitão
capitães
sacristão
sacristães
catalão
catalães
tabelião
tabeliães
c) um número pequeno de oxítonos e todos os paroxítonos acrescentam sim
plesmente um -s à forma singular:
P lu ra l
S in g u l a r
P lu ra l
cidadão
cidadãos
acórdão
acórdãos
cortesão
cortesãos
bênção
bênçãos
cristão
cristãos
gólfão
gólfãos
desvão
desvãos
órfão
órfãos
irm ão
irm ãos
órgão
órgãos
pagão
pagãos
sótão
sótãos
S
in g u l a r
-
Observações:
1.
a) Neste grupo se incluem os monossílabos tônicos chão, grão, mão e vão, que
fazem no plural chãos, grãos, mãos e vãos.
2.
a) Artesão, quando significa “artífice”, faz no plural artesãos; no sentido de
“adorno arquitetônico”, o seu plural pode ser artesãos ou artesões.
SUBSTANTIVO
2. Para alguns substantivos finalizados em -âo, não há ainda uma forma de
plural definitivamente fixada, notando-se, porém, na linguagem corrente,
uma preferência sensível pela formação mais comum, em -ões. É o caso dos
seguintes:
S in g u l a r
alão
P lu ra l
alãos
alazão
S in g u l a r
erm itão
erm itãos
alães
erm itões
alazães
hortelão
aldeãos
aldeães
refrão
ancião
rufião
sultão
sultões
anciões
sultães
truão
tru ães
truões
castelãos
verão
corrim ãos
corrim ões
deão
rufiões
sultãos
castelões
co rrim ão
rufiães
anciãos
anciães
castelão
refrães
refrãos
anãos
anões
hortelãos
hortelões
aldeões
anão
erm itães
alões
alazões
aldeão
P lu ra l
verões
verãos
vilão
vilãos
vilões
deães
deões
O bservação:
Corrimão, como composto de mão, devia apresentar apenas o plural corrimãos;
a par desse, existe também corrimões, por esquecimento da formação original da
palavra.
Plural com alteração de timbre da vogal tônica
1. Alguns substantivos, cuja vogal tônica é o fechado, além de receberem a
desinência -s, mudam, no plural, o o fechado [o] para aberto [o].
Apontem-se os seguintes:
abrolho
caroço
escolho
esforço
olho
osso
rogo
sobrolho
198
NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
c o n to rn o
corcovo
co ro
c o rn o
c o rp o
co rv o
d esp o jo
d e stro ç o
e sto rv o
fogo
fo rn o
fo ro
fosso
im p o s to
jo g o
m io lo
OVO
poço
p o rc o
p o rto
p o s to
p ovo
re fo rç o
re n o v o
so c o rro
tijo lo
to co
to jo
to rd o
to m o
tro c o
tro ç o
2. Note-se, porém, que muitos substantivos conservam no plural o o fechado
do singular. Entre outros, não alteram o timbre da vogal tônica:
acordo
adorno
bojo
bolo
cachorro
coco
colmo
consolo
dorso
encosto
engodo
estojo
ferrolho
globo
golfo
gosto
lobo
logro
moço
molho
morro
mosto
namoro
piloto
piolho
poldro
polvo
potro
reboco
repolho
restolho
rolo
rosto
sopro
suborno
topo
3. Por vezes diverge, na formação desses plurais, a norma culta de Portugal e
a do Brasil. É o caso, por exemplo, dos substantivos almoço, bolso e sogro,
que, no plural, apresentam a vogal aberta [o] em Portugal e fechada [o] no
Brasil.1
Cumpre advertir, por fim, que, no curso histórico da língua, certos subs
tantivos alteraram o timbre da vogal tônica no plural e que outros, ainda hoje,
vacilam no preferir uma das duas soluções.
Observação:
Atente-se na distinção entre molho “condimento” (por ex.: o molho da carne)
e molho “feixe” (por ex.: um molho de chaves), palavras que conservam no plural a
mesma diferença de timbre da vogal tônica: molhos e molhos.
' A propósito da formação desses plurais, vejam-se, especialmente: A. d’Almeida Cavacas.
A língua portuguesa e a sua metafonia. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1921; Edwaldo Cafezeiro. A metafonia portuguesa: aspectos sincrônicos e diacrônicos. Rio de Janeiro,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1981 (texto policopiado).
SUBSTANTIVO
Substantivos terminados em consoante
1.
Os substantivos terminados em -r, -ze-n formam o plural acrescentando -es
ao singular:
S in g u l a r
P
S in g u l a r
lu r a l
P lu ra l
S in g u l a r
P lu ra l
m ar
mares
rapaz
rapazes
abdôm en
abdôm enes
açú car
açúcares
xadrez
xadrezes
cânon
cânones
colher
colheres
raiz
raízes
dólm en
dólm enes
reito r
reitores
cru z
cruzes
líquen
líquenes
Observações:
1.
a) O plural de caráter (escrito carácter na ortografia portuguesa) é, tanto no
Brasil como em Portugal, caracteres, com deslocação do acento tônico e articulação
do c que possuía de origem.
2.
a) Também com deslocação do acento é o plural dos substantivos espécimen,
Júpiter e Lúcifer: espedmenes, Júpiteres e Lucíferes.
Advirta-se, porém, que, a par de Lúcifer, há Lucifer, forma antiga no idioma, cujo
plural é, naturalmente, Luciferes.
2.
Os substantivos terminados em -s, quando oxítonos, formam o plural acres
centando também -es ao singular; quando paroxítonos, são invariáveis:
S in g u l a r
P lu ra l
S in g u l a r
P lu ra l
o ananás
os ananases
o atlas
os atlas
o português
os portugueses
o pires
os pires
o revés
os reveses
o lápis
os lápis
o país
os países
o oásis
os oásis
o retrós
os retroses
o ônibus
os ônibus
Observações:
1.
a) O monossílabo caisé invariável. Cósé geralmente invariável, mas documenta-se também o plural coses.
2.
a) Como os paroxítonos terminados em -s, os poucos substantivos existentes
finalizados em -x são invariáveis: o tórax — os tórax, o ônix — os ônix.
3. Os substantivos terminados em -al, -el, -ol e -ul substituem no plural o -/
por -is:
199
200
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
S
P lu r a l
in g u l a r
S in g u l a r
P lu ra l
an im al
an im a is
farol
faróis
papel
papéis
lençol
lençóis
móvel
m óveis
álcool
álcoois
níquel
níqueis
paul
pauis
O bservação:
Excetuam-se as palavras mal, real (moeda), cônsul e seus derivados, que fazem,
respectivamente, males, réis, cônsules e, por este, procônsules, vice-cônsules.
4. Os substantivos oxítonos terminados em -il mudam o -/ em -s:
S
5.
S in g u l a r
P lu ra l
ardis
fu n il
fu n is
b arril
b arris
fu zil
fu zis
covil
covis
redil
redis
in g u l a r
P lu ra l
ardil
Os substantivos paroxítonos terminados em
por -eis:
S in g u l a r
P
fóssil
lu ra l
fósseis
S
-;7
substituem esta terminação
in g u l a r
Plu r a l
réptil
répteis
Observações:
1
.a) Além de projétil, pronúncia mais generalizada no Brasil, há na língua a variante
paroxítona projétil, com o plural projéteis, que é a pronúncia normal portuguesa.
2.a) Réptil, pronúncia que postula a origem latina da palavra, tem a variante
reptil, cujo plural é, naturalmente, reptis.
6.
Nos diminutivos formados com os sufixos - z in h o e -z ito , tanto o substantivo
primitivo como o sufixo vão para o plural, desaparecendo, porém, o -s do
plural do substantivo primitivo.
Assim:
S in g u l a r
P lu ra l
balãozinho
balõe(s) + zinhos > balõezinhos
papelzinho
p ap éi(s) + zin h o s > papeizinhos
colarzinho
co lare(s) + zin h o s > colarezinhos
cãozito
cãe(s) + zitos > càezitos
SUBSTANTIVO
Substantivos de um só número
1. Há substantivos que só se empregam no plural.
Assim:
alvíssaras
anais
antolhos
arredores
belas-artes
calendas
cãs
condolências
esponsais
exéquias
fastos
férias
fezes
matinas
núpcias
óculos
olheiras
pêsames
primícias
víveres
copas (naipe)
espadas (naipe)
ouros (naipe)
paus (naipe)
2. Outros substantivos existem que se usam habitualmente no singular. Assim
os nomes de metais e os nomes abstratos: ferro, ouro, cobre; fé, esperança,
caridade. Quando aparecem no plural, têm de regra um sentido diferente.
Comparem-se, por exemplo, cobre (metal) a cobres (dinheiro ), ferro (metal)
a ferros (ferramentas, aparelhos).
Substantivos compostos
Não é fácil a formação do plural dos substantivos compostos. Observem-se,
porém, as seguintes normas, com fundamento na grafia:
1.
a) Quando o substantivo composto é constituído de palavras que se es
crevem ligadamente sem hífen, forma o plural como se fosse um substantivo
simples:
aguardente(s)
varapau(s)
claraboia(s)
ferrovia(s)
malmequer(es)
pontapé(s)
lobisomem(-mens)
vaivém(-véns)
2.
a) Quando os termos componentes se ligam por hífen, podem variar todos
ou apenas um deles:
S
in g u l a r
P
lu ra l
S in g u l a r
P
lu ra l
c o u v e -flo r
c o u v e s-flo re s
g r ã o - m e s tr e
g r ã o - m e s tr e s
o b r a - p r im a
o b r a s - p r im a s
g u a r d a - m a r in h a
g u a r d a s - m a r in h a
s a lv o - c o n d u t o
s a lv o s - c o n d u t o s
g u a rd a -ro u p a
g u a rd a - ro u p a s
Note-se, porém, que:
a) quando o primeiro termo do composto é verbo ou palavra invariável e o
segundo substantivo ou adjetivo, só o segundo vai para o plural:
202
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
S in g u la r
P lu r a l
S in g u la r
P lu r a l
guarda-chuva
guarda-chuvas
bate-boca
bate-bocas
sem pre-viva
sem pre-vivas
abaixo-assinado
abaixo-assinados
vice-presidente
vice-presidentes
grão-duque
grão-duques
b) quando os termos componentes se ligam por preposição, só o primeiro toma
a forma de plural:
S in g u la r
P lu r a l
S in g u la r
P lu r a l
chapéu de sol
chapéus de sol
peroba-do-cam po
perobas-d o-cam po
pão de ló
pães de ló
joão-de-barro
joões-de-barro
pé de cabra
pés de cabra
m ula sem cabeça
m ulas sem cabeça
c) também só o primeiro toma a forma de plural quando o segundo termo da
composição é um substantivo que funciona como determinante específico:
S in g u la r
P lu r a l
S in g u la r
P lu r a l
navio-escola
navios-escola
banana-prata
bananas-prata
salário -fam ília
salário s-fam ília
m anga-espada
m angas-espada
d) geralmente ambos os elementos tomam a forma de plural quando o
composto é constituído de dois substantivos, ou de um substantivo e um
adjetivo:
S in g u la r
P lu r a l
S in g u la r
P lu r a l
carta-bilhete
cartas-bilhetes
gentil-hom em
gentis-hom ens
tenente-coronel
tenentes-coronéis
água-m arinha
águas-m arinhas
am or-perfeito
am ores-perfeitos
vitó ria-rég ia
vitó rias-rég ias
GÊNERO
1. Há d o is g ê n e ro s e m p o r tu g u ê s : o masculino e o fem in in o .
O masculino é o termo não marcado; o feminino o termo marcado.
2. Pertencem ao gênero masculino todos os substantivos a que se pode antepor
o artigo o:
o a lu n o
o pão
o poem a
o j a b u ti
SUBSTANTIVO
Pertencem ao gênero feminino todos os substantivos a que se pode antepor
o artigo a:
a casa
a mão
a ema
a juriti
3. O gênero de um substantivo não se conhece, de regra, nem pela sua signifi
cação, nem pela sua terminação.
Para facilidade de aprendizado, convém, no entanto, saber:
Q u a n to à s ig n ific a ç ã o
1. São geralmente masculinos:
a) os nomes de homens ou de funções por eles exercidas:
João
mestre
padre
rei
gato
peru
b) os nomes de animais do sexo masculino:
cavalo
galo
c) os nomes de lagos, montes, oceanos, rios e ventos, nos quais se subentendem
as palavras lago, monte, oceano, rio e vento, que são masculinas:
o Amazonas
o Atlântico
o Ládoga
o Minuano
os Alpes
[= o rio Amazonas]
[= o oceano Atlântico]
[= o lago Ládoga]
[= o vento Minuano]
[= os montes Alpes]
d) os nomes de meses e dos pontos cardeais:
março findo
setembro vindouro
o Norte
o Sul
2. São geralmente femininos:
a) os nomes de mulheres ou de funções por elas exercidas:
Maria
professora
freira
rainha
gata
perua
b) os nomes de animais do sexo feminino:
égua
galinha
203
204
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
c) os nomes de cidades e ilhas, nos quais se subentendem as palavras cidade e
ilha, que são femininas:
a antiga Ouro Preto
a Sicília
as Antilhas
Observação:
Alguns nomes de cidades, como Rio de Janeiro, Porto, Cairo, Havre, são masculinos
pelas razões que aduzimos no capítulo seguinte, ao tratarmos do emprego do artigo.
Q u a n to à te r m in a ç ã o
1. São masculinos os nomes terminados em -o átono:
o aluno
o livro
o lobo
o banco
2. São geralmente femininos os nomes terminados em -a átono:
a aluna
a caneta
a loba
a mesa
Excetuam-se, porém, clima, cometa, dia,fantasma, mapa,planeta, telefonema,
fonema e outros mais, que serão estudados adiante.
3. Dos substantivos terminados em -ão, os concretos são masculinos e os abs
tratos femininos:
o agrião
o balcão
o algodão
o feijão
a educação
a produção
a opinião
a recordação
Excetua-se mão, que, embora concreto, é feminino.
Fora desses casos, é sempre difícil conhecer-se pela terminação o gênero de
um dado substantivo.
F o rm a ç ã o d o fe m in in o
Os substantivos que designam pessoas e animais costumam flexionar-se em
gênero, isto é, têm geralmente uma forma para indicar os seres do sexo masculino
e outra para indicar os do sexo feminino.
Assim:
SU B 5 T A N T I VO
M ascu lin o
F em in in o
M ascu lin o
F em in in o
homem
m ulher
bode
cabra
aluno
aluna
galo
galinha
cidadão
cidadã
leitão
leitoa
cantor
cantora
barão
baronesa
profeta
profetisa
lebrão
lebre
Dos exemplos acima verifica-se que a forma do feminino pode ser:
a) completamente diversa da do masculino, ou seja, proveniente de um radical
distinto:
bode
cabra
homem
mulher
b) derivada do radical do masculino, mediante a substituição ou o acréscimo
de desinências:
aluno
aluna
cantor
cantora
Examinemos, pois, à luz desses dois processos, a formação do feminino dos
substantivos de nossa língua.
Masculinos e fem ininos de radicais diferentes
Convém conhecer os seguintes:
M ascu u n o
F em in in o
M asc u u n o
F em in in o
bode
cabra
genro
nora
boi (ou touro)
vaca
hom em
m ulher
cão
cadela
macho
fêm ea
carneiro
ovelha
m arido
m ulher
cavalheiro
dam a
padrasto
m adrasta
cavalo
égua
padrinho
m adrinha
com padre
com adre
pai
mãe
frei
só ror (ou soror)
zangão
abelha
205
206
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Femininos derivados de radical do masculino
R eg ras
g e r a is :
l.a) Os substantivos terminados em -o átono formam normalmente o femi
nino substituindo essa desinência por -a\
M ascuun o
F e m in in o
g a to
g ata
pom bo
pom ba
lo b o
lo b a
a lu n o
a lu n a
M
ascuun o
F e m in in o
O bservação:
Além das formações irregulares que vimos, há um pequeno número de subs
tantivos terminados em -o que, no feminino, substituem essa final por desinências
especiais.
Assim:
M ascuun o
F e m in in o
M
ascuun o
F e m in in o
d iá c o n o
d ia c o n is a
m a e stro
m a e s t r in a
g a lo
g a lin h a
s ilfo
s ílfid e
2.a) Os substantivos terminados em consoante formam normalmente o
feminino com o acréscimo da desinência -a.
Exemplos:
M ascuun o
F e m in in o
M
camponês
camponesa
leitor
leitora
freguês
freguesa
pintor
pintora
ascuun o
F e m in in o
R eg ras E s p e c ia is :
Os substantivos terminados em -ão podem formar o feminino de três
maneiras:
a) mudando a terminação -ão em -oa:
l . a)
M ascuun o
F e m in in o
M
ascuun o
F e m in in o
ermitão
ermitoa
leitão
leitoa
hortelão
horteloa
patrão
patroa
—
—
—
- - ________________________________.
SUBSTANTIVO
b) mudando a terminação
M
-ã o
em -ã:
F e m in in o
M
aldeão
aldeã
castelão
castelã
anão
anã
cidadão
cidadã
ancião
anciã
cirurgião
cirurgiã
anfitrião
anfitriã
cortesão
cortesã
campeão
campeã
irmão
irmã
ascuun o
c) mudando a terminação
M
ascuun o
-ã o
em
ascuun o
F e m in in o
-o n a :
F e m in in o
M
ascuun o
F e m in in o
bonachão
bonachona
moleirão
moleirona
comilão
com Mon a
paspalhão
paspalhona
espertalhão
espertalhona
pobretão
pobretona
figurão
figurona
sabichão
sabichona
folião
foliona
solteirão
solteirona
Observações:
1.
a) Como se vê, os substantivos que fazem o feminino em - o n a são os aumen
tativos ou adjetivos substantivados.
2.
a) Além dos anômalos cã o e z a n g ã o , a que já nos referimos, não seguem estes
três processos de formação os substantivos seguintes:
M
ascuun o
M
F e m in in o
ascuun o
F e m in in o
barão
baronesa
maganão
magana
ladrão
ladra
perdigão
perdiz
lebrào
lebre
sultão
sultana
Usa-se às vezes la d r o n a por la d ra .
2.a) Os substantivos terminados em - o r formam normalmente o feminino,
como dissemos, com o acréscimo da desinência -a :
M
ascuun o
pastor
F e m in in o
M
pastora
ascuun o
remador
Alguns, porém, fazem o feminino em
-e ir a .
Assim:
F e m in in o
remadora
c a n ta d o r - c a n ta d e ir a ,
c e r z id o r - c e r z id e ir a .
Outros, dentre os finalizados em
- t r i z . Assim: a t o r - a t r i z , i m p e r a d o r -
-d o r
e - t o r , mudam estas terminações em
im p e r a tr iz .
207
208
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
De embaixador há, convencionalmente, dois femininos: embaixatriz (a esposa
de embaixador) e embaixadora (funcionária chefe de embaixada).
3.a) Certos substantivos que designam títulos de nobreza e dignidades for
mam o feminino com as terminações -esa, -essa e -isa:
M
F e m in in o
M
abade
abadessa
diácono
diaconisa
barão
baronesa
duque
duquesa
conde
condessa
sacerdote
sacerdotisa
ascuun o
ascuun o
F e m in in o
O bservação:
De prior há o feminino prioresa (superiora de certas ordens) e priora (irmã de
Ordem Terceira). Príncipe faz no feminino princesa.
4.a) Os substantivos terminados em -e, não incluídos entre os que acabamos
de mencionar, são geralmente uniformes. Essa igualdade formal para os dois
gêneros é, como veremos adiante, quase que absoluta nos finalizados em - nte,
de regra originários de particípios presentes e de adjetivos uniformes latinos. Há,
porém, um pequeno número que, à semelhança da substituição -o (masculino)
por -a (feminino), troca o -e por -a.
Assim:
M
ascuun o
F e m in in o
M
ascuun o
F e m in in o
elefante
elefanta
mestre
mestra
governante
governanta
monge
monja
infante
infanta
parente
parenta
Observação:
Os femininos giganta (de gigante), hóspeda (de hóspede) e presidenta (de presi
dente) têm ainda curso restrito no idioma.
5.a) São dignos de nota os femininos dos seguintes substantivos:
M ascuun o
F e m in in o
M
ascuun o
F e m in in o
avô
avó
maestro
maestrina
cônsul
consulesa
piton
pitonisa
czar
czarina
poeta
poetisa
felá
felaína
profeta
profetisa
SU B 5 T A N T I VO
M
a s c u l in o
F e m in in o
M
F e m in in o
a s c u l in o
fra d e
f r e ir a
ra já
ra n i
g ro u
g ru a
ra p a z
r a p a r ig a , m o ç a
h e ró i
h e ro ín a
rei
r a in h a
jo g r a l
jo g r a le s a
réu
ré
Observação:
é o feminino de r a p a z mais usado em Portugal. No Brasil, prefere-se
em razão do valor pejorativo que, em certas regiões, o primeiro termo adquiriu.
R a p a r ig a
m oça
S u b s ta n t iv o s u n ifo rm e s
Substantivos epicenos
Denominam-se epicenos os nomes de animais que possuem um só gênero
gramatical para designar um e outro sexo.
Assim:
a águia
a baleia
a borboleta
a cobra
a mosca
a onça
a pulga
a sardinha
o besouro
o condor
o crocodilo
o gavião
o polvo
o rouxinol
o tatu
o tigre
O bservação:
Quando há necessidade de especificar o sexo do animal, juntam-se então ao
substantivo as palavras m a c h o e fê m e a : c ro c o d ilo m a c h o , c ro c o d ilo fê m e a ; o m a c h o
ou a f ê m e a d o ja c a r é .
Substantivos sobrecomuns
Chamam-se sobrecomuns os substantivos que têm um só gênero gramatical
para designar pessoas de ambos os sexos.
Assim:
o algoz
o apóstolo
o carrasco
o cônjuge
o indivíduo
o verdugo
a criança
a criatura
a pessoa
a testemunha
a vítima
Observação:
Neste caso, querendo-se discriminar o sexo, diz-se, por exemplo: o c ô n ju g e f e m i
n in o ; u m a p e s s o a d o se x o m a s c u lin o .
209
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Substantivos comuns de dois gêneros
A lg u n s su b sta n tiv o s a p re se n ta m u m a só fo rm a p a ra os d o is g ê n ero s, m as
d istin g u e m o m a sc u lin o d o fe m in in o pelo g ên ero d o a rtig o o u de o u tro d e te rm i
n ativ o a c o m p a n h a n te . C h a m a m -se co m u n s de dois gêneros estes su b sta n tiv o s.
E xem plos:
M a s c u lin o
F e m in in o
M ascu u n o
F em in in o
o a g e n te
a a g e n te
o h e re g e
a h e re g e
o a r t is t a
a a r t is t a
o im ig r a n t e
a im ig r a n t e
o ca m a ra d a
a ca m a ra d a
o in d íg e n a
a in d íg e n a
o c o le g a
a c o le g a
o in té r p r e te
a in t é r p r e t e
o c o le g ia l
a c o le g ia l
o jo v e m
a jo v e m
o c lie n t e
a c lie n t e
o jo r n a lis t a
a jo r n a lis t a
o c o m p a t r io t a
a c o m p a t rio t a
o m á r t ir
a m á r t ir
o d e n tis t a
a d e n tis t a
o s e lv a g e m
a s e lv a g e m
o e stu d a n te
a e stu d a n te
o se rv e n te
a se rv e n te
o g e re n te
a g e re n te
o s u ic id a
a s u ic id a
Observações:
l.a) São c o m u n s d e d o i s g ê n e r o s todos os substantivos ou adjetivos substantivados terminados em -ista : o p ia n is ta , a p i a n i s t a ; u m a n a r q u is ta , u m a a n a r q u is ta .
2.a) Diz-se, indiferentemente, o p e r s o n a g e m ou a p e r s o n a g e m com referência ao
protagonista homem ou mulher.
M u d a n ç a d e s e n tid o n a m u d a n ç a d e g ê n e ro
Há um certo número de substantivos cuja significação varia com a mudança
de gênero:
M ascu u n o
F em in in o
M a scu u n o
F em in in o
o cab eça
a cab eça
o g u a rd a
a g u ard a
o c a ix a
a c a ix a
o g u ia
a g u ia
o c a p ita l
a c a p ita l
o lente
a le n te
o c is m a
a c is m a
o lín g u a
a lín g u a
o c o rn e ta
a co rn e ta
o m o ra l
a m o ra l
o c u ra
a c u ra
o voga
a voga
SUBSTANTIVO
S u b s ta n t iv o s m a s c u lin o s t e r m in a d o s e m -a
Vimos que, embora a terminação -a seja de regra denotadora do feminino, há
vários masculinos com essa terminação: artista, camarada, colega, poeta, profeta,
etc. Alguns destes substantivos apresentam uma forma própria para o femini
no, como poeta (poetisa) e profeta (profetisa); a maioria, no entanto distingue
o gênero apenas pelo determinativo empregado: o compatriota, a compatriota;
estejornalista, aquela jornalista; meu camarada, minha camarada.
Um pequeno número de substantivos em -a existe, todavia, que só se usa no
masculino por designar profissão ou atividade própria do homem.
Assim:
jesuíta
monarca
nauta
papa
patriarca
pirata
heresiarca
tetrarca
Observações:
l .a) Entre os substantivos que designam coisas, são masculinos os term inados
em -ema e -oma que se originam de palavras gregas:
anátem a
cinema
diadem a
dilema
emblema
edema
estratagema
fonema
poem a
problem a
sistema
telefonema
tema
teorema
trema
diplom a
idiom a
arom a
axioma
coma
2.a) Em bora a palavra grama se use tam bém no gênero fem inino (quinhentas
gramas), os seus com postos m antêm -se no gênero m asculino: um miligrama, o
quilograma.
S u b s ta n tiv o s d e g ê n e ro v a c ila n t e
S u b stan tiv o s h á e m c u jo e m p re g o se n o ta v acilação de g ên ero . Eis alguns,
p a ra os q u ais se re c o m e n d a a se g u in te p referên cia:
a) GÉNERO masculino :
ág ap e
a n tílo p e
caudal
clã
c o n tra lto
d ia b e te (s)
g en g ib re
la n ç a -p e rfu m e
p ra ç a (so ld a d o )
sa n d u íc h e
s o p ra n o
su é te r
á sp id e
fácies
filoxera
ja ç a n ã
ju riti
o m o p la ta
o rd e n a n ç a
se n tin e la
s u c u ri
b) GÊNERO feminino :
a b u sã o
alcío n e
alu v ião
212
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
G RAU
Um substantivo pode apresentar-se:
a) com a sua significação normal: chapéu, boca;
b) co m a su a sign ificação ex ag erad a, o u in te n sific a d a d isfo rm e o u d esp reziv el
m e n te ( grau aumentativo): chapelâo, bocarra; chapéu grande, boca enorme;
c) com a sua significação atenuada, ou valorizada afetivamente ( grau diminu
tivo ): chapeuzinho, boquinha; cltapéu pequeno, boca minúscula.
Vemos, portanto, que a
por dois processos:
gradação
do significado de um substantivo se faz
a) sinteticamente, m e d ia n te o e m p re g o d e sufixos especiais, q u e e s tu d a m o s
n o c a p ítu lo 6; assim : chape-l-ão, boc-arra; chapeu-zinho, boqu-inha;
b ) analiticamente , ju n ta n d o - lh e u m a d je tiv o q u e in d iq u e a u m e n to o u d i
m in u iç ã o , o u asp ecto s re la c io n a d o s c o m essas noções: chapéu grande, boca
enorme; chapéu pequeno, boca minúscula.
V a lo r d a s fo r m a s a u m e n t a t iv a s e d im in u t iv a s
Convém ter presente que o que denominamos aumentativo e diminutivo
nem sempre indica o aumento ou a diminuição do tamanho de um ser. Ou
melhor, essas noções são expressas em geral pelas formas analíticas, especial
mente pelos adjetivos grande e pequeno, ou sinônimos, que acompanham o
substantivo.
Os sufixos aumentativos de regra emprestam ao nome as ideias de despro
porção, de disformidade, de brutalidade, de grosseria ou de coisa desprezível.
Assim: narigão, beiçorra, pratalhaz ou pratarraz, atrevidaço, porcalhão, etc.
Ressalta, pois, na maioria dos aumentativos, esse valor depreciativo ou peio rativo .
“O emprego dos sufixos diminutivos indica ao leitor ou interlocutor que
aquele que fala ou escreve põe a linguagem afetiva no primeiro plano. Não
quer comunicar ideias ou reflexões, resultantes de profunda meditação, mas
o que quer é exprimir, de modo espontâneo e impulsivo, o que sente, o que o
comove ou impressiona — quer seja carinho, saudade, desejo, prazer, quer,
digamos, um impulso negativo: troça, desprezo, ofensa. Assim se encontra
no sufixo diminutivo um meio estilístico que elide a objetividade sóbria e
a severidade da linguagem, tornando-a mais flexível e amável, mas às vezes
também mais vaga.” 2
3 Silvia Skorge. B o le tim d e F ilologia, Lisboa, 17:50-51,1958.
SUBSTANTIVO
Observação:
A rigor, a flexão de g r a u é pertinente ao adjetivo. Admitimos, porém, a existência
de três graus para o substantivo — o n o r m a l , o a u m e n t a t i v o e o d i m i n u t i v o — em
consonância com a Nomenclatura Gramatical Brasileira e a Nomenclatura Gramati
cal Portuguesa, que, neste ponto, seguem uma longa tradição no ensino do idioma.
E s p e c ia liz a ç ã o d e fo r m a s
Muitas formas originariamente aumentativas e diminutivas adquiriram, com
o correr do tempo, significados especiais, por vezes dissociados do sentido da
palavra derivante. Nestes casos, não se pode mais, a rigor, falar em aumentativo
ou diminutivo. São, na verdade, palavras em sua acepção normal.
Assim:
cartão
ferrão
florão
portão
cartilha
cavalete
corpete
flautim
folhinha
(= calendário)
lingueta
pastilha
vidrilho
EMPREGO DO SUBSTANTIVO
FUNÇÕ ES SIN TÁ TIC A S DO SU BSTA N TIVO
O
substantivo
pode figurar na oração como:
1. S uieito :
Samuel está desolado.
(C. Drummond de Andrade, CA, 127.)
O pasmo e a felicidade transtomaram-no.
(C. de Oliveira, AC, 122.)
2. P redicativo:
a) d o suieito :
Eu já não sou funcionário.
(Castro Soromenho, TM, 243.)
De maneiras finas, era um fidalgo.
(N. Pinon, FD, 61.)
213
214
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b ) DO OBJETO direto :
De toda parte, aclamavam-no herói.
(R. Pompeia, A ,108.)
O amor... Como adora o marido, como deve ser bom tê-la por esposa.
(A. Abelaira, NC, 25.)
c)
d o objeto in d ir eto :
Eram capazes de me chamar sacristão.
(F. Namora, TJ, 214.)
Irmão lhe chamaria, mas irmão
por quê, se a vida nova
se nutre de outros sais, que não sabemos?
(C. Drummond de Andrade, R, 169-170.)
3. O bjeto direto :
Eu arranjo umas velinhas.
(A. de Alcântara Machado, NP, 203).
O velho não desvia os olhos.
(Alves Redol, FM, 195.)
4. O bjeto indireto :
O que Amélia, naquele instante, pediria a Deus?
(J. Lins do Rego, FM, 236.)
Aos marteleiros, dá-se um salário, aos estivadores e saibreiros outro,
negócio de “pinchas” outro.
(A. Ribeiro, V, 41.)
5. C omplemento nominal :
O talento é um complexo de virtudes, às vezes inseparáveis de defeitos.
(F. Namora, E, 119.)
Lúcia era particularmente sensível à nota humana.
(A. Peixoto, RC, 49.)
SUBSTANTIVO
6. A djunto adverbial:
De Braga voltamos às Caldas.
(C. Castelo Branco, OS, 1,11.)
Contemplaram-se em silêncio.
(É. Veríssimo, LS, 153.)
7. A gente
da passiva:
Fomos apresentados um ao outro por Silva Jardim.
(R. Correia, PCP, 559.)
A investida é observada de longe pelos sitiantes.
( J. Paço d ’Arcos, CVL, 355.)
8. A posto :
Ia haver um baile na Faculdade de Direito, o baile dos calouros, o
meu baile.
(C. dos Anjos, MS, 345.)
Os dois, governador e filho, encarregaram-se de todos os aprestos da
sua viagem para o Paraguai.
(J. Cortesão, IHB, II, 104.)
9. V ocativo :
— Prima, venha conhecer o compadre.
(J. C. de Carvalho, CL, 69.)
Eu tenho, Amor, a cinta esbelta e fina...
(F. Espanca, S, 96.)
SU BSTA N TIVO COMO AD JU N TO A D N O M IN A L
1. Precedido de preposição, pode o substantivo formar uma
tiva, que funciona como adjunto adnominal .
Assim:
uma vontade de ferro [= férrea]
um menino às direitas [= correto]
uma pessoa sem entranhas [= perversa]
uma força de Hércules [= hercúlea]
locução adje
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216
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2. Em função de a d iunto a d n o m in a l , pode também o
diretamente a outro substantivo .
Comparem-se expressões do tipo:
um riso canalha
um ar província
substantivo
referir-se
uma recepção monstro
uma atitude povo
Exemplos literários:
Durante essas ruas paris
de Barcelona, tão avenida
entre uma gente meio londres
urbanizada em mansas filas,
chegava a desafio
seu caminhar sevilha:
que é levando a cabeça
em flor que fosse espiga.
(J. Cabral de Melo Neto, PC, 87-88.)
Évora! Ruas ermas sob os céus
Cor de violetas roxas... Ruas frades
Pedindo em triste penitência a Deus
Que nos perdoe as míseras vaidades!
(F. Espanca, S, 149)
SU BSTA N TIV O C A R A C T E R IZ A D O R DE A D JETIV O
Os adjetivos referentes a cores podem ser modificados por um
que melhor precise uma de suas tonalidades, um de seus matizes.
Assim:
amarelo-canário
azul-petróleo
substantivo
verde-garrafa
roxo-batata
Neste emprego o substantivo equivale a uma advérbio de modo .3
'
Cf. R. L. Wagner - J. Pinchon. G r a m m a ir e d u fr a n ç a is classique et m o d e rn e . Paris, Hachet
te, 1962, p. 76. Sobre a interpretação e a duvidosa vernaculidade das expressões do tipo
ra m a g en s verd e-g a rra fa , olh o s v e rd e -m a r, leiam-se as observações de Mário Barreto, em
SUBSTANTIVO
SU BSTA N TIV O C A R A C T ER IZ A D O PO R UM NOM E
Recurso expressivo, generalizado nas línguas românicas1, é a caracterização
de um substantivo por meio de um n o m e (substantivo ou adjetivo) anteposto,
ligado pela preposição de, num sintagma nominal do tipo:
O raio do menino
A desgraçada da mulher
Em que pese às divergências quanto à interpretação dos valores semânticos e
sintáticos que entram em jogo nessa estrutura nominal, todos reconhecem a in
tensidade afetiva de sua caracterização antecipada. A feição particular desta parece
advir de, ao mesmo tempo, estar ligada pelo estreito vínculo de uma preposição
e gozar do realce significativo que seria o de um aposto ou de uma predicação
nominal.
O SU BSTA N TIVO COMO N Ú CLEO DAS FR A S ES SEM V ER B O
As frases n o m in a is , organizadas sem verbo, têm o substantivo como centro.
É o que se verifica, por exemplo:
a) nas exclamações:
Ó minha amada,
Que olhos os teus!
(V. de Morais, PCP, 334.)
N o vo s estu d o s d a lín g u a p o rtu g u e sa , 2.“ ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1921, p. 375-377;
e de Sousa da Silveira, em Trechos seletos, 4.a ed. São Paulo, Companhia Editora Nacional,
1938, p. 68.
É já numerosa a bibliografia relativa a esta construção. Citamos aqui apenas as contribui
ções mais importantes: Alf Lombard. Li fel d’anemis. Ce fripon de valet. S tu d ie r i M o d e r n
S p a ra k v e te n sk a p , Upsala, 2:145-215,1931; André Eskénazi. Quelques remarques sur le type
ce fr ip o n d e v a le t et sur certaines fonctions syntaxiques de la préposition de. L e F rançais
M o d e rn e , 35: 184-200,1967; Mariana Tutescu. Le Type nominal ce fr ip o n d e va let. R e v u e
de L in g u is tiq u e R o m a n e , 33:299-316,1969; M. Regula. Encore une fois “ce fripon de valet”.
Ib id . 36:107-111,1972.
Sobre o uso da construção em espanhol, veja-se Rafael Lapesa. Sobre las construcciones
E l d ia b lo d ei toro, E l b u e n o d e M in a y a , ;A y d e m il, jP obre d e Jüan!, P or m a io s d e p ecados.
F ilologia, 8:169-184,1962. Quanto ao emprego em português, consulte-se M. M. Moreno
de Oliveira. Processos d e in ten sifica çã o n o p o r tu g u ê s c o n te m p o râ n e o . Lisboa, Centro de
Estudos Filológicos, 1962, p. 111-121.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Ó bendita paisagem! Terra estranha
De antigos pinheirais e alegres campos,
Ei-la silêncio, solidão, montanha!
(Teixeira de Pascoaes, OC, IV, 34.)
b) nas indicações sumárias:
Fim da tarde, boquinha da noite
com as primeiras estrelas
e os derradeiros sinos.
(J. de Lima, OC, I, 225.)
Canto litúrgico em latim abastardado: vozes rurais e gritadas, quase
todas femininas. Sobe o pano. Escuro total. Silêncio.
(B. Santareno, TPM, 9.)
c) em títulos como:
Amanhã, Benfica e Flamengo no Maracanã.
Nova crise no Oriente Médio.
Terremoto no Japão.
Capítulo 9
Artigo
ARTIGO DEFINIDO E INDEFINIDO
Dá-se o nome de artigos às palavras o (com as variações a, os, as) e um (com
as variações uma, uns, umas), que se antepõem aos substantivos para indicar:
a) que se trata de um ser já conhecido do leitor ou ouvinte, seja por ter sido
mencionado antes, seja por ser objeto de um conhecimento de experiência,
como nestes exemplos:
Levanta-se, vai à mesa, tira um cigarro da caixa de laca, acende o
cigarro no isqueiro, larga o isqueiro, volta ao sofá.
(F. Botelho, X, 183.)
Atravessaram o pátio, deixaram na escuridão o chiqueiro e o curral, va
zios, de porteiras abertas, o carro de bois que apodrecia, os juazeiros.
(G. Ramos, VS, 161.)
b) que se trata de um simples representante de uma dada espécie ao qual não
se fez menção anterior:
Vi que estávamos num velho solar, de certa imponência. Uma fachada
de muitas janelas perdia-se na escuridão da noite. No alto da escada
saía das sombras um alpendre assente em grossas colunas.
(Branquinho da Fonseca, B, 21.)
Era uma casinha nova, a meia encosta, com trepadeiras pela varanda.
Tinha um pomar pequeno de laranjeiras e marmeleiros e mais uma
hortazinha, ao longo do rego que descia do morro.
(R. M. F. de Andrade, V, 119.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
No primeiro caso, dizemos que o artigo é
definido ;
no segundo, ind efinido .
O bservação:
“O artigo é um signo que exige a presença de outro (ou outros) com o qual se
associa em sintagma: um signo dependente. Por outra parte, pertence ao tipo de
signos que se agrupam em paradigmas ou inventários limitados, fechados: os signos
morfológicos, cujos conteúdos — os morfemas — constituem o sistema gramatical,
em oposição aos signos léxicos, caracterizados por constituírem inventários abertos,
ilimitados” (E. Alarcos Llorach. El artículo en espanol. In To Honor Roman fakobson:
Essays on the Occasion of His Seventieth Birthday, 1. The Hague-Paris, Mouton,
1967, p. 19).
FORMAS DO ARTIGO
F o rm a s s im p le s
1. São estas as formas simples do artigo:
A r t ig o d e f in id o
A r t ig o in d e f in id o
i
Singular
Singular
Plural
Plural
Masculino
0
OS
um
uns
Feminino
a
as
uma
umas
2. No português antigo havia as formas lo (la, los, las) e el do artigo definido.
Lo (e suas variações) só aparece hoje, como artigo, em construções este
reotipadas do tipo mai-lo (= mais o), ocorrentes em falares de Portugal, e
que alguns escritores têm incorporado a suas obras, como nos mostra este
passo:
Veio da terra, mai-lo seu moinho.
(A. Nobre, S, 26.)
Há resquício da antiga forma feminina la em alfim (aglutinação de a lafim),
mas em certas expressões como a la cria, a lafresca, usadas por alguns escri
tores gaúchos, o artigo é um mero espanholismo, de introdução moderna.
Veja-se este exemplo:
A la fresca!... que ninho!
(Simões Lopes Neto, CGLS, 185.)
ARTIGO
3. A forma arcaica d do artigo masculino fossilizou-se na titulatura el-rei , talvez
por influência da conservadora linguagem da Corte:
Então o terceiro a El-Rei rogou
Licença de os buscar, e El-Rei negou.
(F. Pessoa, OP, 25.)
Vejam-se topônimos atuais, como S ã o João d e l-R e i , e outros antigos, como
S ã o José d e l-R e i (hoje T ir a d e n te s ) e S e rg ip e d el-R ei:
Dos Azevedos, família antiga na província de Sergipe d’El-Rei, viviam
na Estância três irmãs, Felicidade, Turíbia, Umbelina e um irmão
padre.
(G. Amado, H M I , 4.)
F o rm a s c o m b in a d a s d o a r t ig o d e fin id o
1. Quando o substantivo, em função de complemento ou de adjunto, se constrói
com uma das preposições a, de, e m e p o r, o artigo d efin id o que o acom
panha combina-se com essas preposições, dando:
P r e p o s iç õ e s
A r t ig o d e f in id o
a
O
as
OS
a
ao
à
aos
às
de
do
da
dos
das
em
no
na
nos
nas
p o r (p e r)
p e lo
p e la
p e lo s
p e la s
2. Crase. O artigo definido feminino quando vem precedido da preposição a,
funde-se com ela, e tal fusão (= crase ) é representada na escrita por um
acento grave sobre a vogal (à).
Assim:
Vou a
preposição que
introduz o adjunto adverbial
do verbo ir.
+
a cidade
artigo que determina o substantivo cidade
Vou à cidade
—
craseado, a que
se aplica o acento grave.
a
221
222
NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Não raro, o à vale como redução sintática da expressão à moda de (= à ma
neira de, ao estilo de):
As bordaduras e os recamos de oiro, os veludos e sedas de fora, talhados
à francesa, resplandeciam constelados de pérolas e diamantes.
(Rebelo da Silva, CL, 175.)
Mas o major? Por que não ria à inglesa, nem à alemã, nem àfrancesa,
nem à brasileira? Qual o seu gênero?
(Monteiro Lobato, U, 117.)
O bservação:
Como se vê, o conhecimento do emprego da forma feminina do artigo definido
é de grande importância para se aplicar acertadamente o acento grave denotador da
crase com a preposição a. Tal conhecimento torna-se mesmo imprescindível no caso
dos falantes do português do Brasil, que não distinguem, pela pronúncia, a vogal
singela a (do artigo ou da preposição) daquela proveniente de crase. Convém, por
isso, atentar-se sempre na construção de determinada palavra com outras preposições
para se saber se ela exige ou dispensa o artigo. Assim, escreveremos:
Vou à feira e, depois, irei a Copacabana,
porque também diremos:
Vim da feira e, depois, passei por Copacabana.
3. Quando a preposição antecede o artigo definido que faz parte do título de
obras (livros, revistas, jornais, contos, poemas, etc.), não há uma prática
uniforme. Na língua escrita, porém, deve-se neste caso:
a) ou evitar a contração, pelo modelo:
Camões é o autor de Os Lusíadas.
A notícia saiu em O Globo.
b) ou indicar pelo apóstrofo a supressão da vogal da preposição:
Camões é o autor d’Os Lusíadas.
A notícia saiu n’0 Globo.
Tenha-se presente que as grafias dos Lusíadas e no Globo — talvez as mais
frequentes — deturpam o título do poema e do jornal em causa.
ARTIGO
Observação:
As duas soluções apontadas são admitidas pela ortografia portuguesa. No Brasil,
porém, o Formulário Ortográfico de 1943 não preceitua o emprego do apóstrofo
para indicar a supressão da vogal da preposição.
4. Quando a preposição que antecede o artigo está relacionada com o verbo,
e não com o substantivo que o artigo introduz, é aconselhável que os dois
elementos fiquem separados, embora não faltem exemplos de sua aglutinação
na prática dos melhores escritores:
A circunstância de as vindimas juntarem a família prestava-se a uma
reunião anual na Junceda.
(M. Torga, V, 159.)
— Estou-me esforçando, Sr. Juiz, por conservar o jeito especial de o
garoto falar.
(A. M. Machado, HR, 27.)
Dona Rosa, Dona Rosa,
Quando eras inda botão
Disseram-te alguma cousa
De a flor não ter coração?
(F. Pessoa, QGP, nü. 160.)
5. A antiga preposição per contraía-se com lo{s), la{s), formas primitivas do ar
tigo definido, produzindo pelo{s),pela(s). Estas contrações vieram substituir
polo{s) e pola(s), de emprego normal no português clássico, como ilustram
estes versos camonianos:
Pois polos doze pares dar-vos quero
Os doze de Inglaterra, e o seu Magriço.
(
1 , 1, 12. )
Da Lua os claros raios rutilavam
Polas argênteas ondas Neptuninas.
(1 ,1 ,58.)
F o rm a s c o m b in a d a s d o a r t ig o in d e fin id o
1. O
artigo indefinido
pode contrair-se com as preposições em e de, originando:
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
num a
num a
nuns
num as
dum
dum a
duns
dum as
2. As preposições em e de, antepostas ao artigo indefinido que integra o título
de obras, separam-se dele na escrita:
Sofríamos do que, em Um Olhar sobre a Vida, qualifiquei de “insônia
internacional”.
(Genolino Amado, RP, 21.)
Ou no caso da outra Maria, a de Um Capitão de Voluntários, criatura
esta “mais quente e mais fria do que ninguém”.
(A. Meyer, SE, 45.)
3. Também não é aconselhável a contração do artigo indefinido com a prepo
sição que se relaciona com o verbo, e não com o substantivo que o artigo
introduz:
A obra atrasou-se em virtude de uns operários se terem acidentado.
VALORES DO ARTIGO
A DETERMINAÇÃO
1. Comparando-se esta frase de Alceu Amoroso Lima,
Foi chegando um caboclinho magro, com uma taquara na mão.
(AA, 40.)
às seguintes,
Foi chegando o caboclinho magro, com a taquara na mão.
Foi chegando este caboclinho magro, com esta taquara na mão.
v e rific a -s e q u e a d e te r m in a ç ã o d o s s u b s ta n tiv o s c a b o c lin h o e t a q u a r a se v a i
to r n a n d o m a is p re c isa , à m e d id a q u e se p a s s a d o
p a ra o
artigo d efin id o ( o , a )
e, d e p o is , p a r a o
artigo ind efinido ( u m , u m a )
demonstrativo (e s te , e s ta ).
No primeiro caso, indica-se apenas a e sp é c ie dos substantivos que são apre
sentados ao ouvinte. No segundo, restringe-se a extensão do significado dos
substantivos, com i n d i v i d u a l i z á - l o s , d e fin i- lo s . No terceiro, limita-se ainda
ARTIGO
mais o sentido dos substantivos, que aparecem situados no espaço e no tempo.
Exemplificando: este caboclinho magro não é um caboclinho magro qualquer
( i n d e f i n i d o ) , nem o caboclinho magro, que o interlocutor conhece ( d e f i n i d o ) ,
mas o que está no momento perto da pessoa que feia.
Por outras palavras: o a r t i g o d e f i n i d o é, essencialmente, um sinal de noto
riedade, de conhecimento prévio, por parte dos interlocutores, do ser ou do
objeto mencionado: o a r t i g o i n d e f i n i d o , ao contrário, é por excelência
um sinal da falta de notoriedade, de desconhecimento individualizado, por
parte de um dos interlocutores (o ouvinte), do ser ou do objeto em causa.
2. Quer seja d e f i n i d o ( o e suas variações a, os, as), quer seja i n d e f i n i d o (um
e suas variações uma, uns, umas), o a r t i g o caracteriza-se por ser a palavra
que introduz o substantivo indicando-lhe o gênero e o número.
Assim sendo:
a) qualquer palavra ou expressão antecedida de artigo se torna substantivo:
O ato literário é o conjunto do escrever e do ler.
(F. Namora, E, 111.)
Tudo no mundo comecou com um sim.
(C. Lispector, HE, 15.)
9
Que motivo é este do “não sei quê”, pergunta o Leitor.
(A. Meyer, CM, 79.)
b) o artigo faz aparecer o gênero e o número do substantivo:
o Amazonas
o pires
o pianista
um quilograma
o pão
o clã
as amazonas
os pires
a pianista
a ama
a mão
a irmã
o cliente
as bibliotecas
um pirata
o jabuti
um barão
um poema
a cliente
os astecas
uma gravata
a juriti
a produção
a ema
Com isso, permite a distinção de substantivos homônimos, tais como:
o cabeça
o caixa
o capital
o cisma
o corneta
o cura
a cabeça
a caixa
a capital
a cisma
a corneta
a cura
o guarda
o guia
o lente
o língua
o moral
o voga
a guarda
a guia
a lente
a língua
a moral
a voga
225
226
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
EMPREGO DO ARTIGO DEFINIDO
COM OS SU BSTA N TIV O S COM UNS
Na língua de nossos dias, o artigo d efin id o é, em geral, um mero designa
tivo. Anteposto a um substantivo comum, serve para determiná-lo, ou seja, para
apresentá-lo isolado dos outros indivíduos ou objetos da espécie.
Assim:
O aparelho de chá, o faqueiro, os cristais e os tapetes tinham ficado
com ele.
(L. Fagundes Telles, ABV, 13.)
Sumiu-se a rapariga.
(C. de Oliveira, AC, 123.)
Este seu valor costuma ser enfatizado, quando se pretende acentuar o caráter
único ou universal do elemento representado pelo substantivo, como nestes
passos:
Tive, há alguns meses, um momento crítico, ou talvez, por certos lados,
o momento crítico, da minha vida.
(A. de Quental, C, 357.)
Não era uma loja qualquer: era a Loja.
(C. dos Anjos, MS, 350.)
É o q u e se c h a m a
artigo de notoriedade .
E m p re g o s p a rtic u la r e s
Entre os empregos particulares do artigo
os seguintes:
d efin id o
devem ser mencionados
Emprego como demonstrativo
1.
O artigo definido provém do pronome demonstrativo latino ille-, illa, illud
(= aquele, aquela, aquilo). Este valor demonstrativo foi-se perdendo pouco
a pouco, mas subsiste ainda, embora enfraquecido, em alguns casos. É o que
se observa em frases do tipo:
ARTIGO
Permaneceu a [= esta, ou aquela] semana inteira em casa.
Partimos no [= neste] momento para São Paulo.
Levarei produtos da [—desta] região.
2.
É também sensível o valor demonstrativo do artigo que faz evocar o subs
tantivo como algo presente no espírito do locutor ou do ouvinte, situado,
portanto, no tempo e no espaço.
Sirva de exemplo esta frase:
Pedro foi um ativista desde a Faculdade.
[Isto é: aquela Faculdade que os interlocutores sabem qual seja.]
Emprego do artigo pelo possessivo
Este emprego do
designam:
a) partes do corpo:
artigo d e fin id o
é
frequente antes de substantivos que
Passei a mão pelo queixo.
(L. Fagundes Telles, ABV, 15.)
Ela repeliu-o então e firmou-se nos cotovelos, enfurnando a cara
nas mãos.
(U. Tavares Rodrigues, TO, 71.)
b) peças de vestuário ou objetos de uso marcadamente pessoal:
Abel Matias, calado, veste as calças e a camisa.
(O. Mendes, P, 130.)
Ao anoitecer vestiu o impermeável, enfiou o chapéu e saiu.
(É. Veríssimo, LS, 138.)
c) faculdades do espírito:
Chegou a tomar balanço para as habituais meditações.
(A. Abelaira, D, 19.)
O velho embalava o pensamento.
(Autran Dourado, TA, 42.)
227
228
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
d) relações de parentesco:
Nunca mais pude separar a lembrança da prima da sensação cromática
das escalas musicais.
(P. Nava, BO, 365.)
— Já não chamou pela mãe!...
(M.Torga, V, 186.)
O bservação:
Não se emprega, porém, o artigo quando estes nomes formam com as preposições
de ou a uma locução adverbial.
Pus-me de joelhos.
Emagrece a olhos visto s.
Emprego do artigo antes dos possessivos
Antes de pronome substantivo possessivo
Em português, o emprego ou a omissão do artigo definido antes de pos
sessivos que funcionam como pronomes substantivos não tem apenas valor
estilístico, mas corresponde a uma clara distinção significativa.
Comparem-se, por exemplo, as frases seguintes:
Este cinto é meu.
Este cinto é o meu.
Com a primeira, pretende-se acentuar a simples ideia de posse. Equivale a
dizer-se: “Este cinto pertence-me, é de minha propriedade”.
Com a segunda, porém, faz-se convergir a atenção para o objeto possuído,
que se evidencia como distinto de outros da mesma espécie, não pertencentes à
pessoa em causa. O seu sentido será: “Este é o meu cinto, o que possuo”.
Antes de pronome adjetivo possessivo
1. Quando trazem claros os seus substantivos, os possessivos podem usar-se
com artigo ou sem ele:
Meu amor é só teu.
O meu amor é só teu.
ARTIGO
A presença do artigo antes de pronome adjetivo possessivo ocorre com menos
frequência no português do Brasil do que no de Portugal, onde, com exceção
dos casos adiante mencionados, ela é praticamente obrigatória.
Comparem-se estes exemplos:
— A minha irmã e o meu cunhado costumam receber os seus amigos
mais íntimos.
(A. Abelaira, D , 107.)
Meu avô materno foi verdadeiramente minha primeira amizade,
companheiro de brinquedo da minha primeira infância.
(G. Amado, HMI, 4.)
2.
O artigo é sistematicamente omitido quando o possessivo:
a) é parte integrante de uma fórmula de tratamento ou de expressões como
Nosso Pai (referente ao Santíssimo), Nosso Senhor, Nossa Senhora:
Sua Excelência Reverendíssima escusou-se de recebê-los pessoal
mente.
(B. Santareno, TPM, 37.)
V. Ex“. é sempre lisonjeiro.
(Castro Alves, OC, 604.)
Nosso Senhor tinha o olhar em pranto.
Chorava Nossa Senhora.
(A. de Guimaraens, OC, 121.)
b) faz parte de um vocativo:
— Morrer, meu Amo, só uma vez!
(A. Nobre, S, 106.)
— É neto, meu padrinho?
(J. Lins do Rego, MVA, 251.)
c) pertence a certas expressões feitas: em minha opinião, em meu poder, a seu
hel-prazer, por minha vontade, por meu mal, etc.
d) vem precedido de um demonstrativo:
— Não aguento mais esse teu silêncio antipático.
(U. Tavares Rodrigues, TO, 162.)
229
230
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
— Isto, aliás, seria benefício a este seu criado.
(C. dos Anjos, M, 173.)
O bservação:
Se o possessivo estiver posposto ao substantivo, este virá nonnalmente precedido
de a r t ig o :
Quanto mistério
N os olhos teus...
(V. de Morais, PCP, 334.)
Pode, no entanto, dispensá-lo, quando nos referimos a algo de modo impreciso
ou vago:
Tenho estado à espera de n o tícias tuas, mas vejo que não chegam nunca.
(A. Nobre, Cl, 117.)
E m p re g o g e n é ric o
Usa-se às vezes o a r t i g o d e f i n i d o junto a um substantivo no singular para
exprimir a totalidade específica de um gênero, de uma categoria, de um grupo,
de uma substância:
O guarani fez-se aliado do espanhol.
(J. Cortesão, IHB, II, 126.)
O relógio é um objeto torturante: parece algemado ao tempo.
(C. Lispector, SV, 113.)
Este emprego é frequente nos provérbios:
O homem não é propriedade do homem.
O avarento não tem e o pródigo não terá.
Se o substantivo é abstrato, o artigo serve, ademais, para personalizá-lo:
Sacrificou um pouco, sobretudo no exórdio, a articulação do seu
discurso para evitar o brilho, a saliência, a ênfase.
(M. Bandeira, AA, 306.)
Era o deus vivo que os tinha na sua mão, o amigo-inimigo donde lhes
vinha todo o bem e todo o mal, a miséria e o pão, o luto e a alegria.
(Branquinho da Fonseca, MS, 173.)
ARTIGO
Entre os abstratos incluem-se naturalmente os adjetivos substantivados:
Eu trabalho com o inesperado.
(C. Lispector, SV, 14.)
O pior é que nos apareceram outros doentes.
(E Namora, CS, 157.)
Observação:
Nestes casos pode-se dispensar o artigo, principalmente quando o substantivo
é abstrato, ou quando faz parte de provérbios, frases sentenciosas e comparações
breves:
Pobreza não é vileza.
Cão que ladra não morde.
Homem não é bicho.
Preto como azeviche.
E m p re g o e m e x p re s s õ e s d e te m p o
Os nomes de meses não admitem
panhados de qualificativo:
l.° )
artigo ,
a menos que venham acom
Estou seguro de ir até o Rio em fins de junho ou princípios de julho.
(M. de Andrade, CMB, 102.)
Descobria afinal a manhã carioca, no abril de Botafogo, manhã que
antes nunca me dera o ar de sua graça.
(Genolino Amado, RP, 22.)
Era um setembro puro.
(M. Torga, NCM, 63.)
Observação:
Omite-se em geral o a r t ig o antes das datas do mês:
A 28 de setembro, por vinte e sete votos, sai ele vitorioso.
(J. Montello, PMA, 276.)
O parecer é de 28 de janeiro de 1640.
(J. Cortesão, IHB, II, 218.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Costuma-se, no entanto, usá-lo:
a) antes de datas célebres (que adquirem o valor de um substantivo composto de
NUM ERAI. + PREPOSIÇÃO + SUBSTANTIVO):
Por ser predsamente um dos feriados extintos, o 19 de Novembro faz lembrar
hoje, aos marmanjos do começo do século, não só a bandeira como a própria
infância, tão perdida quanto esse feriado.
(C. Drummond de Andrade, FA, 116.)
b) antes de datas mencionadas no curso de uma narração:
Constituiu-se assim livremente a Academia e a primeira sessão se realizou
aos 15 de dezembro de 1896, aclamados presidente Machado de Assis e
secretários Rodrigo Otávio e Pedro Rabelo.
(M. Bandeira, PP, II, 1132.)
2 .°) O s n o m e s d o s d ia s d a s e m a n a v ê m p r e c e d id o s d e
artigo , p r in c ip a lm
e n te
q u a n d o e n u n c ia d o s n o p lu ra l:
Queres ir comigo à Itália no domingo?
(A. Abelaira, D, 45.)
Aos domingos saíam cedo para a missa.
(Coelho Netto, OS, 1,33.)
Mas podem dispensá-lo (juntamente com a preposição a que se aglutinam),
quando funcionam como adjunto adverbial.
Assim:
Sexta-feira fui vê-la sair.
(Machado de Assis, OC, III, 593.)
— Domingo à tarde. Domingo será a vez do teu moinho...
(F. Namora, DT, 221.)
3.°) Não se usa o a r t i g o nas designações das horas do dia, nem com as ex
pressões m eio-dia e m eia-noite:
meio-dia e dez...
(A. Abelaira, D, 124.)
O re ló g io m a rc a v a
ARTIGO
Meia-noite? Não se teria enganado?
(J. Montello, SC, 25-26.)
O
artigo
é, p o r é m , d e r e g ra q u a n d o , a n te c e d id a s d e p r e p o s iç ã o , ta is fo r m a s
se e m p r e g a m a d v e rb ia lm e n te :
Já não se almoça às 9 da manhã
e não se janta às 4.
(C. Drummond de Andrade, MA, 99.)
Ao meio-dia já as águas do porto eram prata fundida.
(U. Tavares Rodrigues, /E, 47.)
4.°) Os nomes das quatro estações do ano são precedidos de artigo:
As névoas anunciam o Inverno.
(R. Brandão, P, 52.)
Talvez tenha acabado o verão.
(R. Braga, CC£, 293.)
Será goivo no outono, assim como era,
Eternamente mal-aventurada,
A alma, que lírio foi na primavera...
(A. de Guimaraens, OC, 342.)
Podem, no entanto, dispensá-lo quando, antecedidos da preposição de, fun
cionam como complemento nominal ou como adjunto adnominal:
Que noite de inverno! Que frio, que frio!
Gelou meu carvão:
Mas boto-o à lareira, tal qual pelo estio,
Faz sol de verão!
(A. Nobre, S, 13.)
Num meio-dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
(F. Pessoa, OP, 143.)
Hora sagrada dum entardecer
De outono, à beira-mar, cor de safira.
(F. Espanca, S, 22.)
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234
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
5.°) Os nomes de datas festivas dizem-se com artig o :
o ano-bom
o carnaval
o Natal
a Páscoa
É, p o r é m , d e re g ra a o m is s ã o d o
artigo
c o m o a d j u n to a d n o m in a l d a s p a la v r a s
q u a n d o e ste s n o m e s f u n c io n a m
dia, noite, semana, presente, etc.:
O primeiro dia de carnaval.
A noite de Natal.
A semana de Páscoa.
Um presente de ano-bom.
E m p re g o co m e x p re s s õ e s d e p e so e m e d id a
O
artigo d efin id o
é u s a d o c o m f o rç a d is tr ib u tiv a e m fra se s d o ti p o
O feijão está a cento e trinta cruzeiros o quilo (= cada quilo)
Este tecido custa dois mil escudos o metro (= cada metro),
nas quais se expressa por unidade de peso ou medida o custo ou o valor de
determinada coisa.
C o m a p a la v ra ca sa
1. Dispensam o artigo
os
adjuntos adverbiais de lugar em que entra a palavra
casa:
a) desacompanhada de determinação ou qualificação, no sentido de “residência”,
“lar”:
Às quatro da madrugada entrou em casa.
(M. Torga, CM, 32.)
Voltou para casa e ficou à espera da hora insuportável.
(C. Drummond de Andrade, CA, 105.)
b) em sentido vago, embora acompanhada de qualificação:
Estava em casa própria lá para Ipanema.
(A. Ribeiro, M, 356.)
ARTIGO
A vida na casa de Sinhô era mesquinha como em casa de pobre, mas
havia lá dentro a bela Pérola.
(J. Lins do Rego, MVA, 306.)
2. Mas a palavra casa vem de regra antecedida de artigo :
a) quando usada na acepção própria de “prédio”, “edifício”, “estabelecimento”:
J[osé] 0[lympio] em geral não emprega a primeira pessoa; diz: a
casa. A casa não pode editar um livro nessas condições, a casa ficou
magoada, a casa está feliz...
(C. Drummond de Andrade, M , 52.)
Estou cansado, preciso de um sócio, alguém que me dirija a casa.
(A. Abelaira, D, 28.)
b) quando está particularizada por adjunto adnominal:
Foi um golpe esta carta; não obstante, apenas fechou a noite, corri à
casa de Virgília.
(Machado de Assis, OC, 1,484.)
Na sua própria casa, Horácio pressentia que a mãe lhe ocultava
alguma coisa.
(Ferreira de Castro, OC, 1,451.)
Observação:
Diz-se o dono (ou a dona) da casa para indicar, com precisão, seja o proprietário
do prédio, seja o chefe da família. Em sentido vago, dir-se-á, porém: uma boa dona
de casa.
C o m a p a la v ra p a lá c io
1. A p a la v r a palácio u s a -s e
com
artigo :
Absorvendo-me nos exames, suspendi as idas ao Palácio.
(Genolino Amado, RP> 124.)
Só perto do palácio enxugou os olhos.
(Alves Redol, BC, 342.)
2. Costuma, no entanto, dispensá-lo, no português do Brasil, quando, em função
de adjunto adverbial, designa a residência ou o local de despacho do chefe da
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236
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Nação ou do Estado e vem desacompanhada da competente determinação
ou qualificação. Poder-se-á dizer, por conseguinte:
O Governador chamou-o a Palácio, pedindo-lhe que desse um termo
à luta.
(J. Lins do Rego, MVA, 134-135.)
— Olhe, nos Governos de gente nossa, não se pode nem comer em
Palácio...
(A. Deodato, POBD, 55.)
Mas dir-se-á sempre com artigo, quando determinada ou qualificada:
Paladino do amor, busco anelante
O palácio encantado da Ventura!
(A. de Quental, SC, 42.)
Benício tornou a acercar-se da janela, alongou a vista na direção do
Palácio Laranjeiras.
(J. Montello, SC, 25.)
E m p re g o co m o s u p e rla tiv o re la tiv o
O a r t i g o d e f i n i d o é de emprego obrigatório com o superlativo relativo.
Pode preceder o substantivo:
Era o aluno mais estudioso da turma.
ou o superlativo:
Era o mais estudioso aluno da turma.
Era aluno o mais estudioso da turma.
Mas não deve ser repetido antes do superlativo quando já acompanha o
substantivo, como neste exemplo:
Era o aluno o mais estudioso da turma.
Observações:
l . a) É líc ita , n o e n ta n to , a r e p e tiç ã o d o
p e la p a la v r a
ainda o u
a r t ig o
a n te s d o s u p e rla tiv o r e fo rç a d o
s in ô n im a , p o is n e s te c a s o se p o d e s u b e n te n d e r o s u b s ta n tiv o
d e p o is d o s e g u n d o a rtig o :
ARTIGO
Essa façanha os marinheiros ainda os mais audazes não ousariam cometè-la.
istoé: ainda os [marinheiros) mais audazes.
O a r t ig o aparece por vezes com valor intensivo em frases da linguagem
coloquial de entoação particular. Por exemplo:
2 .a )
Ele é o fim!
COM OS NO M ES P R Ó PR IO S
Sendo por definição individualizante, o nome próprio deveria dispensai- o
artigo . Mas, no curso da história da língua, razões diversas concorreram para
que esta norma lógica nem sempre fosse observada e, hoje, há mesmo grande
número de nomes próprios que exigem obrigatoriamente o acompanhamento
do artigo d efin id o . Entre essas razões, devem ser mencionadas:
a) a intenção de reforçar a ideia de individualidade, de um todo intimamente
unido, como se concebe, em geral, um país, um continente, um oceano:
o Brasil
a França
a América
a Europa
o Atlântico
o Pacífico
b ) a d e se r o n o m e p r ó p r io o r ig in a r ia m e n te u m s u b s ta n tiv o c o m u m , c o n s tr u íd o
com o
artig o :
a Guarda
o Porto
o Cairo (árabe El-Kahira = a vitoriosa)
o Havre (francês Le Havre = o porto)
c) a in f lu ê n c ia s in tá tic a d o ita lia n o , lín g u a e m q u e o s n o m e s d e fa m ília , q u a n d o
e m p r e g a d o s is o la d a m e n te , v ê m p r e c e d id o s d e
o Tasso
artigo :
o Ticiano
aBesanzoni
d) a de cercar o nome próprio de uma atmosfera afetiva ou familiar:
(...) A Carlota! A Carlota!
Boa velhinha, como ela é meiga e devota!
(A. Nobre, S, 166.)
— Aqui é o Custódio. Olhe, achei melhor dizer ao Cantídio que você
tinha chegado e queria vê-lo.
(C. dos Anjos, M, 160.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Feitas essas considerações preliminares, particularizemos, agora, os principais
casos de emprego do artigo definido com os nomes próprios.
C o m o s n o m e s d e p e sso a s
Os nomes próprios de pessoas (de batismo e de família) não levam a r t i g o ,
principal mente quando se aplicam a personagens muito conhecidos:
Camões
Dante
Napoleão
Emprega-se, porém, o a r t i g o d e f i n i d o :
1. °) quando o nome de pessoa vem precedido de qualificativo:
O romântico Alencar.
O divino Dante.
2.
°) quando o nome de pessoa vem acompanhado de determinativo ou
qualificativo denotadores de um aspecto, de uma época, de uma circunstância
da vida do indivíduo:
Era o Daniel de outrora que eu tinha diante de mim.
(J. Montello, DVP, 237.)
Estas palavras eram de Raul, o Raul adolescente.
(A. Abelaira, D, 130.)
3.
°) quando se pretende atribuir ao nome próprio um sentido depreciativo,
como neste passo de A. Nobre, em que o Carlos é o rei D. Carlos I, de Portugal:
Nada me importas, País! seja meu Amo
O Carlos ou o Zé da T’resa...
(S, 118.)
4. °) quando o nome de pessoa vem enunciado no plural:
a) seja para indicar indivíduos do mesmo nome:
Os dois Plínios.
Os três Horácios.
b) seja para designar uma coletividade familiar:
Os Andradas.
Os Braganças.
ARTIGO
239
c) seja para caracterizar, enfaticamente, classes ou tipos de indivíduos que se
assemelham a um vulto ou personagem célebre, caso em que o nome próprio
vale por um nome comum:
Eu vejo os Cipiões, vejo os Emílios.
(C. M. da Costa, OP, II, 122.)
Que importa isso tudo, se, aqui, os Clemenceaus andam a monte,
os Hindemburgos rolam aos tombos, os Gladstones pululam aos
cardumes, os Bismarcks se multiplicam em ninhadas, e os Thiers
cobrem o sol como nuvens de gafanhotos.
(R. Barbosa, EDS, 484.)
d) para designar obras de um artista (geralmente quadros de um pintor):
Os Goyas do Museu do Prado.
Observações:
1.
a) Na linguagem popular e no trato familiar é muito frequente no Brasil e está
praticamente generalizada na linguagem corrente de Portugal a anteposição do a r
t i g o d e f in id o a nomes de batismo de pessoas, o que lhes dá, como dissemos, um
tom de afetividade ou de familiaridade. Comparem-se, por exemplo, estas duas frases:
Geraldo saiu agora.
O Geraldo saiu agora.
Na primeira (só possível, em Portugal, na linguagem escrita), a pessoa menciona
da vem envolta de certa distinção, sentimo-la mais distante. Na segunda, apontamos
a pessoa como conhecida dos presentes, como um elemento familiar, caseiro.
2. a) As alcunhas são comumente precedidas de a r t i g o :
— Morreu o Palhaça...
(M. Torga, NCM, 59.)
Gomes Ribeiro, que não se misturava com quem quer que fosse, era conhe
cido como o Fonema.
(A. F. Schmidt, GB, 107.)
3.
a) O artigo definido antecede as palavras senhor, senhora e senhorita quando
citamos uma pessoa por seu nome ou por seu título:
240
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O senhor Fontes está adoentado.
Falei com a senhora Baronesa.
Não vi a senhorita Joana.
Não empregamos, porém, o artigo quando nos dirigimos à própria pessoa:
— Como vai, senhor Fontes?
— Adeus, senhora Baronesa.
— Obrigado, senhorita Joana.
4.“) O adjetivo santo (ou são e santa) não vem precedido de artigo quando acom
panha um nome próprio do qual consideramos ser parte integrante:
Assim conversam, gloriosos,
Santa Clara e São Francisco.
(C. Meireles, OP, 903.)
— O senhor formulara um conceito heterodoxo das epístolas de São Paulo
e do evangelho de São Marcos...
(A. Ribeiro, ES, 17.)
O artigo é, porém, de regra, se com o nome do santo, precedido do adjetivo em
causa, quisermos designar a época em que se festeja:
Já a trago debaixo de olho desde o Santo Antônio.
(M. Torga, V, 21.)
Ainda há um ano precisamente, assistia eu no Porto ao São João mais fan
tástico deste mundo.
(A. F. Schmidt, GB, 146.)
C o m o s n o m e s g e o g rá fic o s
O e s ta d o a t u a l d o u s o d o
artigo
c o m o s n o m e s g e o g rá fic o s é o s e g u in te :
1.°) Emprega-se normalmente o artigo definido:
a) com os nomes de países, regiões, continentes, montanhas, vulcões, desertos,
constelações, rios, lagos, oceanos, mares e grupos de ilhas:
o Brasil
o Himalaia
a França
os Alpes
os Estados Unidos o Teide
o Nilo
o Lemano
o Atlântico
ARTIGO
a Guiné
o Nordeste
a África
o Atacama
o Saara
o Cruzeiro do Sul
241
o Báltico
o Mediterrâneo
os Açores
b) com os nomes dos pontos cardeais e os dos colaterais, quer no sentido pró
prio, quer no de regiões ou ventos:
O promontório tapava para o norte.
(Branquinho da Fonseca, MS, 104.)
Os nossos companheiros de viagem — gente do Sul— tasquinhavam,
cantavam e beberricavam.
(U. Tavares Rodrigues, JE, 21.)
Também os ventos nordestinos se acharam presentes: o Nordeste e
o Sudeste...
(J. Cardoso, SE, 60.)
Observações:
1.
a) Certos nomes de países e regiões costumam, no entanto, rejeitar o artigo.
Entre outros: Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Macau,
Timor, Andorra, Israel, São Salvador, Aragão, Castela, Leão.
2.
a) Alguns nomes de países, como Espanha, França, Inglatena, Itália e poucos mais,
podem construir-se sem artigo, principalmente quando regidos de preposição:
Viveu muito tempo em Espanha, casada.
(F. Namora, CS, 93.)
Aquela que reside na esperança
Foi quem me recompôs o sonho antigo
Numa canção de músico mendigo
Pelas estradas líricas de França.
(J. Cardoso, SE, 49.)
3.
a) Quando indicam apenas direção, os nomes de pontos cardeais podem vir
sem artigo:
Marcha para oeste
Vento de leste
2.°) Não se usa em geral o a r t ig o d e f in id o :
a) com os nomes de cidades, de localidades e da maioria das ilhas:
242
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Barbacena
Lisboa
Paris
Águeda
Campo Grande
Topázio
Creta
Cuba
Malta
b) com os nomes de planetas e de estrelas:
Marte
Saturno
Vénus
Canópus
Sírius
Vega
Observações:
1.
“) Alguns nomes de cidades que se formaram de substantivos comuns conser
vam o artigo: a Guarda, o Porto, o Rio de Janeiro, a Figueira da Foz. O mesmo se dá,
como vimos, com o nome de certas cidades estrangeiras: o Cairo, a Haia, o Havre.
2.
“) À semelhança dos nomes de países, usam-se com artigo alguns nomes de
ilhas: a Córsega, a Madeira, a Sardenha, a Sicília.
3.°) Não é uniforme o emprego do a r t ig o d e f in id o com os nomes dos
estados brasileiros e das províncias portuguesas. A maioria leva a r t ig o .
Assim:
o Acre
o Amazonas
a Bahia
o Ceará
o Espírito Santo
o Maranhão
o Mato Grosso do Sul
o Pará
a Paraíba
o Paraná
o Piauí
o Rio de Janeiro
o Rio Grande do Norte
o Rio Grande do Sul
o Alentejo
o Algarve
a Beira
o Douro
a Estremadura
o Minho
o Ribatejo
Não se usam, porém, com artigo:
Alagoas
Goiás
Mato Grosso
Minas Gerais
Pernambuco
Rondônia
Santa Catarina
São Paulo
Sergipe
Trás-os-Montes
Observação:
Diz-se também as Alagoas.
4.°) Como os nomes de pessoas, os nomes geográficos passam a admitir o
artigo desde que acompanhados de qualificação ou de determinação:
ARTIGO
Ai canta, canta ao luar, minha guitarra,
A Lisboa dos Poetas Cavaleiros!
(A. Nobre, D, 68.)
Gosto da Ouro Preto de Guignard.
(M. Bandeira, AA, 57.)
De novo, ungindo-me de Europa, alastrando-me da sua vibração, se
encapelava dentro de mim Paris — o meu Paris, o Paris dos meus
vinte e três anos...
(M. de Sá-Carneiro, CL, 131.)
Patriota, desejava sem dúvida nos fazer conscientes da grandeza de
Portugal, o Portugal das descobertas e dos clássicos.
(J. Amado, MG, 113.)
C o m o s n o m e s d e o b ra s lit e r á r ia s e a r t ís tic a s
Emprega-se em geral o artigo, mesmo quando não pertença ao título:
Ontem, à noite, comecei a ler a Ana Karenina.
(A. Abelaira, D, 64.)
A chegada de José Veríssimo ao Rio, em 1891, coincide com o apare
cimento do Quincas Borba, primeiro romance de Machado de Assis
depois das Memórias Póstumas.
(J. Montello, PMA, 216.)
CASOS ESPECIAIS
A n te s d a p a la v ra o u t r o
1. Emprega-se o artigo definido quando a palavra outro tem sentido determi
nado:
Tirei do colégio os meus dois filhos: o mais velho era um demônio,
o outro um anjo.
(C. Castelo Branco, 0 5 ,1,290.)
Não era pela outra, não, dizia ela consigo, pela centésima vez, era por
ele, era pelo outro.
(A. Peixoto, RC, 517.)
243
244
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Um era careca, o outro tinha bigode.
(A. M. Machado, HR, 72.)
2. Cala-se, porém, o artigo quando o seu sentido é indeterminado:
A uns amei, a outros estimei, aborreci alguns e alguns mal conheci
— mas todos! ai! todos, me impregnaram de suas vidas.
(R Nava, BC, 228.)
Na estrada, os homens apartaram-se, uns grupos para a Covilhã,
outros para a Aldeia do Carvalho, como nos demais dias.
(Ferreira de Castro, OC, 1,463.)
D e p o is d a s p a la v ra s a m b o s e t o d o
Ambos e todo são as únicas palavras que, em português, antecedem o artigo
pertencente ao mesmo sintagma.
1. Se o substantivo determinado pelo numeral ambos estiver claro, é de regra
o emprego do artigo definido:
Eram centenares de pessoas de ambos os sexos.
(C. Castelo Branco, OS, 1,573.)
Vasco apoiou os cotovelos nela e segurou o rosto com ambas as mãos.
(É. Veríssimo, LS, 166.)
2. A presença ou a ausência do artigo depois da palavra todo depende, obvia
mente, de admitir ou rejeitar o substantivo aquela determinação.
Diremos, por exemplo:
Todo o Brasil pensa assim.
Todo Portugal pensa assim.
por se construírem de modo diverso esses dois nomes geográficos.
3. Há casos, porém, que precisam de ser considerados particularmente.
Assim:
l.°) No plural, anteposto ou posposto ao substantivo, todos vem acompa
nhado de artigo, a menos que haja um determinativo que o exclua:
Conheceu todos os salões e todos os antros.
(C. Castelo Branco, OS, II, 302.)
ARTIGO
Os discípulos amavam-na, prontos a todos os obséquios.
(A. Ribeiro, CRG, 100.)
Iam-se-me as esperanças todas; terminava a carreira política.
(Machado de Assis, OC, 1,536.)
Mas:
Todos estes costumes vão desaparecer.
(R. Brandão, P, 165.)
Todos esses dons do meu amigo ficarão perdidos para sempre.
(A. R Schmidt, AP, 98.)
2 . °) Não se usa o artigo antes do numeral em aposição a todos:
Vi-os felizes a todos quatro.
(Machado de Assis, OC, 1,1126.)
Elas são, todas duas, minhas irmãs que eu ajudei a criar.
(R. M. R de Andrade, V, 67.)
Se, no entanto, o substantivo estiver claro, o artigo é de regra:
Vi-os felizes a todos os quatro meninos.
Todas as duas irmãs eu ajudei a criar.
3. °) No SINGULAR, todo:
a) virá acompanhado de artigo, quando indicar a totalidade das partes:
Toda a praia é um único grito de ansiedade.
(Alves Redol, PM, 306.)
Esteia assistiu à lição toda, com a paciência da curiosidade.
(Machado de Assis, OC, 1,373.)
b) poderá vir ou não acompanhado de artigo quando exprimir a totalidade
numérica:
Falava bem como todo francês.
(G. Amado, PP, 168.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
— Verdade, a atribuição é lógica: todo o homem é bicho, embora nem
todo o bicho seja homem.
(A. Ribeiro, AFPB, 33.)
Neste último caso é obrigatória a sua anteposição ao substantivo.
O bservação:
Advirta-se que o uso do artigo neste último caso é muito mais frequente na
língua contemporânea de Portugal do que na do Brasil, onde, no ensino médio,
de um modo geral, os professores procuram estabelecer uma distinção entre todo
“qualquer”, “cada” e todo o “inteiro”, “total”, pelo modelo:
Toda casa |= qualquer casa] cedo ou tarde precisa de reforma.
Toda a casa [= a casa inteira] foi reformada.
4.°) Anteposto ao artigo indefinido, todo significa “inteiro”, “completo”:
Para conseguir o seu intento cobriu de ridículo toda uma geração, e
lançou as bases de toda uma remodelação social.
(G. Amado, TL, 29.)
Pelo chão, pelos sofás, alastrava-se toda uma literatura em rumas de
volumes graves.
(Eça de Queirós, OF, II, 71.)
5.°) Quando todo (ou toda) está empregado com força adverbial, não admite
naturalmente o acompanhamento do artigo:
Todo barbeado de fresco, as cordoveias do pescoço luziam-lhe grossas
como calabres.
(A. Ribeiro, CRG, 228.)
Vi então um homem todo amarrado de cordas a carregar uma cruz,
com outro de chicote na mão batendo nele.
(J. Rins de Rego, MVA, 13.)
6 .°) Em numerosas locuções do português contemporâneo, todo (ou toda)
vem seguido de artigo. Entre outras, mencionam-se as seguintes:
a todo o custo
a todo o galope
a todo o instante
a todo o momento
em todo o caso
a toda a brida
a toda a hora
a toda a pressa
em toda a parte
por toda a parte
ARTIGO
Observação:
Quanto a outros valores e empregos do indefinido todo, veja-se p. 380-1.
REPETIÇÃO DO ARTIGO DEFINIDO
C o m s u b s ta n tiv o s
1. Quando empregado antes do primeiro substantivo de uma série, o artigo
deve anteceder os substantivos seguintes, ainda que sejam todos do mesmo
gênero e do mesmo número:
Cantava para os anjos, para os presos, para os vivos e para os mortos.
(J. Lins do Rego, MVA, 347.)
Para ganhar o céu, vendeste a ira, a luxúria,
A gula, a inveja, o orgulho, a preguiça e a avareza.
(Olavo Bilac, T, 239.)
Depois, a iniciação, a mudança de traje, o banho, o perfume, a visi
ta de belos cavalheiros, o primeiro café, o licor, a queda e algumas
lágrimas.
(J. de Araújo Correia, FX, 93.)
2. Mas a alternância de sequências com artigo e sem ele pode, em certos casos,
apresentar efeitos estilísticos apreciáveis:
Não viram sumo bem ao derredor,
Mas sim o mal, a tentação, o crime,
Orgulho, humilhações, remorso e dor.
(A. Corrêa d’01iveira, VSVA, 213.)
Observação:
Não se repete, porém, o artigo:
a) quando o segundo substantivo designa o mesmo ser ou a mesma coisa que o
primeiro:
Presenteou-me este livro o compadre e amigo Carlos.
A fruta-de-conde, ou ata, é deliciosa.
b) quando, no pensamento, os substantivos se representam como um todo estrei
tamente unido:
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O estudo [do folclore] era necessitado pela existência das histórias, contos de
fadas, fábulas, apólogos, superstições, provérbios, poesia e mitos recolhidos
da tradição oral.
(J. Ribeiro, Fl, 6.)
C o m a d je tiv o s
1. Repete-se o artigo antes de dois adjetivos unidos por uma das conjunções
e e ou quando os adjetivos acentuam qualidades opostas de um mesmo
substantivo:
Conhecia o novo e o velho Testamento.
A boa ou a má fortuna não o alteraram.
2. Não se repete, porém, o artigo se os dois adjetivos ligados pelas conjunções e,
ou (e mas) se aplicam a um substantivo com o qual formam um conceito único:
Mas por que não lhe telefona logo à noite, por que não recomeçam a
velha e quase esquecida amizade?
(A. Abelaira, D, 22.)
Esqueceu que já não tinha mais a sua tristonha mas bela solidão.
(É. Veríssimo, LS, 148.)
3. Se os adjetivos não vêm unidos pelas conjunções e e ou, deve-se repetir o
artigo. Tal construção empresta ao enunciado ênfase particular:
Era o próprio, o exato, o verdadeiro Escobar.
(Machado de Assis, OC, 1,867.)
É o povo, o verdadeiro, o nobre, o austero povo português.
(A. F. Schmidt, F, 102.)
4. Se um mesmo substantivo vem qualificado por uma série de superlativos
relativos, deve-se antepor o artigo a cada membro da série:
Que o mais belo, o mais forte, o mais ardente
Destes sujeitos é precisamente
O mais triste, o mais pálido, o mais feio.
(E. da Cunha, OC, 1,659.)
ARTIGO
249
Vi pela primeira vez a Eleita de minlialma,
a grande Flor subtil, inigualável alma,
A Maior, a mais Bela, a mais Amada, a Única!
(E. de Castro, OP, 1,30.)
OMISSÃO DO ARTIGO DEFINIDO
Do que foi estudado nas páginas anteriores, verificamos que o artigo definido
limita sempre a noção expressa pelo substantivo.
1. O seu emprego é, pois, evitado em certos casos:
1.
°) Quando o gênero e o número do substantivo já estão claramente determi
nados por outras classes de palavras (pronomes demonstrativos, numerais, etc.).
Assim, diremos:
Na revolução de 17 muito sofrera este padre.
(J. Lins do Rego, M \A, 281.)
Antes, ainda no automóvel, Ramiro achara duas novas pérolas.
(A. Abelaira, D, 121.)
2.
°) Quando queremos indicar a noção expressa pelo substantivo de um
modo geral, isto é, na plena extensão do seu significado.
Comparem-se, por exemplo, estas três frases:
Foi acusado do crime [acusação precisa].
Foi acusado de um crime [acusação vaga].
Foi acusado de crime [acusação mais vaga ainda].
3.
°) Quando, nas enumerações, pretendemos obter um efeito:
a) de acumulação:
Samuel, a princípio com relutância, depois com fúria, finalmente
com resignação, pôs-se a morder e a mastigar tudo: lápis, borrachas,
pedacinhos de pau, gomos de cana-de-açúcar.
(C. Drummond de Andrade, CA, 143-144.)
b) de dispersão:
Volteiam dentro de mim,
Em rodopio, em novelos,
250
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Milagres, uivos, castelos,
Forças de luz, pesadelos,
Altas torres de marfim.
(M. de Sá-Carneiro, P, 75.)
O bservação:
No exemplo acima, o poeta português M. de Sá-Carneiro procura conjugar num
sentido superior (o tema da “incoerência1*ou “dispersão”) coisas apresentadas em
série desconexa. Trata-se de um caso da chamada enumeração caótica, recurso
estilístico de alto efeito expressivo em alguns escritores modernos. Leia-se a propósito
Leo Spitzer. La enumeraríón caótica en la poesia moderna. Trad. de Raimundo Lida,
Buenos Aires, Instituto de Filologia, 1945.
2. Além desses casos gerais e de outros particulares, anteriormente examinados,
omite-se o artigo definido:
a) nos vo cativos:
Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
(C. de Abreu, 0 , 94.)
b) nos apostos que indicam simples apreciação:
Tardes da minha terra, doce encanto,
Tardes duma pureza de açucenas.
(F. Espanca, S, 35.)
c) antes de palavras que designam matéria de estudo, empregadas com os verbos
aprender, estudar, cursar, ensinar e sinônimos:
Aprender inglês.
Cursar direito.
Estudar latim.
Ensinar geometria.
d) antes das palavras tempo, ocasião, motivo, permissão, força, valor, ânimo (para
alguma coisa), complementos dos verbos ter, dar, pedir e seus sinônimos:
Não houve tempo para descanso.
Não dei motivo à crítica.
Pedimos permissão para sair.
Não tive ânimo para viajar.
ARTIGO
EMPREGO DO ARTIGO INDEFINIDO
O artigo indefinido provém do numeral latino unus, una, unum , que exprime
a unidade.
Esse valor numeral, embora enfraquecido em “um certo”, transpare
ce ainda hoje nos diversos empregos das formas do singular (um, uma),
principalmente no mais comum deles, qual seja, o de apresentar o ser ou o
objeto expresso pelo substantivo de maneira imprecisa, indeterminada ou
desconhecida.
Desse valor fundamental decorrem certos empregos particulares do artigo
indefinido, alguns dos quais devem ser conhecidos.
C o m o s s u b s ta n tiv o s c o m u n s
1. O artigo indefinido — já o dissemos — serve principalmente para a apre
sentação de um ser ou de um objeto ainda não conhecido do ouvinte ou do
leitor.
Retomemos o exemplo de A. Amoroso Lima anteriormente citado:
Pouco depois, atraído também pelo espetáculo, foi chegando um
caboclinho magro, com uma taquara na mão.
(AA, 40.)
Uma vez apresentados o ser e o objeto, não há mais razão para o emprego
do artigo indefinido, e o escritor ou o locutor deverá usar daí por diante o
artigo definido. É o que se observa na continuação do texto em causa:
Pupilas acesas vinham espiar entre as árvores, como que também
atraídas pela melodia da taquara do caboclinho.
(Ibid.)
2. Para se precisar a classe ou a espécie de um substantivo já determinado por
artigo definido, costuma-se repeti-lo, na aposição, com o artigo indefinido:
Ele sentia o cheiro do impermeável dela: um cheiro doce de fruta
madura.
(É. Veríssimo, LS, 140.)
A chuva continuava, uma chuva mansa e igual, quase lenta, sem
interesse em tombar.
(M. J. de Carvalho, AV, 153.)
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
3. Por sua força generalizadora, o artigo indefinido pode atribuir a um subs
tantivo no singular a representação de toda a espécie:
— Aquele, digo-vos eu, aquele é um homem.
(Branquinho da Fonseca, MS, 165.)
Uma mulher não gosta de profissão nenhuma. Uma mulher só gosta
sinceramente de duas coisas: casar e ter filhos.
(I. Losa,E O , 106.)
4. A anteposição do plural uns, umas, a cardinais é a forma preferida do idioma
para indicar a aproximação numérica:
O sítio em que nos instalamos ficava a uns oito quilômetros de Barbacena, pela estrada que vai para Remédios.
(R. M. F. de Andrade, V, 119.)
Teria, quando muito, uns doze anos.
(U. Tavares Rodrigues, PC, 168.)
Com o mesmo sentido aparece a forma singular uma antes da fracionária
meia:
Decorreu uma boa meia-hora.
(J. de Alencar, OC, II, 569.)
Indaguei de Virgília, depois ficamos a conversar uma meia hora.
(Machado de Assis, OC, 1,507.)
5. Antes dos nomes de partes do corpo ou de objetos que se consideram aos
pares, usa-se o plural do artigo indefinido para designar um só par:
Ao parar nos últimos degraus da escada para conversar com alguém
que conhecia, dei com uns pés enormes ao nível de meus olhos.
(A. M. Machado, HR, 146.)
Trazia uns sapatos rasos, uns olhos verdes.
(A. Abelaira, CF, 207.)
O b serva çã o:
O artigo indefinido aparece com acentuado valor intensivo em certas frases da
linguagem coloquial caracterizadas por uma entoação particular:
ARTIGO
Ela é de uma candura!...
Tens umas ideias!...
A suspensão final da voz faz subentender um adjetivo denotador de qualidade
ou defeito de caráter excepcional. Equivale a dizer-se:
Ela é de uma candura admirável (ou comovente).
Tens umas ideias estapafúrdias (ou ótimas).
Ressalte-se que a força intensiva do indefinido permite que se complete a estrutura
consecutiva com o aparecimento de uma oração iniciada por que.
Ela é de uma candura, que comove.
Entenda-se:
Ela é de uma candura tal, que comove.
C o m o s n o m e s p ró p rio s
1. Emprega-se o artigo indefinido antes de um nome de pessoa:
a) para acentuar a semelhança ou a conformidade de alguém com um vulto ou
um personagem célebre, caso em que o nome próprio passa a ser um nome
comum:
Papai era um Quixote.
(C. dos Anjos, MS, 298.)
— É uma Ofélia, mas, depravada...
(J. de Araújo Correia, FX, 128.)
b) para indicar ser o indivíduo verdadeiro símbolo de uma espécie:
A fortuna, toda nossa, é que não temos um Kant.
(J. Ribeiro, F, 36.)
Nazaré merecia bem um Cézaime ou outro grande pintor a rondarlhe os sítios, a pintar-lhe os tipos.
(A. F. Schmidt, F, 103.)
c) para designar um indivíduo pertencente a determinada família:
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
José Bonifácio era um Andrada.
D. Pedro I do Brasil, que foi D. Pedro IV de Portugal, era um Bragança
d) para evocar aspectos geralmente imprevistos de uma pessoa:
Apesar disso tudo, um Joaquim risonho, a satisfação em pessoa.
(Genolino Amado, RP, 115.)
Raul Brandão, nas Memórias, evocou um Fialho torturado, através
do estilo imprevisto, “escorrendo sangue, aflição, miséria”.
(J. do Prado Coelho, PHL, 247.)
e) para designar obras de um artista (geralmente quadros de um pintor):
Também disse, é verdade, como era necessário aprender a distinguir
o fado de uma sinfonia, um Picasso de um calendário.
(V. Ferreira, A, 28.)
2. Como o artigo definido, o indefinido pode acompanhar os nomes geográficos,
se qualificados:
Mais tarde, haveria de ouvir-lhe pessoalmente a sua visão dum Egeu
de deuses vivos.
(L. Forjaz Trigueiros, ME, 269.)
Numa Europa mecanizada, a Espanha surge-nos intemporal.
(U. Tavares Rodrigues, JE, 21.)
OMISSÃO DO ARTIGO INDEFINIDO
Apesar de sua generalização crescente, há circunstâncias que, ainda hoje,
pedem ou favorecem a omissão do artigo indefinido.
Assim:
1.
°) A existência de outro elemento determinativo anteposto ao nome, como,
por exemplo, uma forma de identidade ou de comparação:
De você não esperava semelhante gesto.
Não é possível pior exemplo do que esse.
2.
°) O fato de um substantivo ser empregado no singular para exprimir não
a ideia de unidade, mas uma noção partitiva, ou para designar toda a espécie
ou categoria a que pertence:
ARTIGO
A grande parte do público irritou a cena.
Amigo fiel e prudente é melhor que parente.
O bservação:
Não existe propriamente omissão do artigo indefinido, mas casos onde ele nunca
se empregou de forma regular.
Na fase primitiva das línguas românicas, o artigo indefinido era de uso restrito.
Com o correr do tempo, esse determinativo foi-se introduzindo em numerosas
construções e, hoje, os variados matizes do seu emprego constituem uma inestimável
riqueza estilística de todas elas.
Contra essa generalização e valorização progressiva do indefinido se manifes
taram sempre os nossos gramáticos, que nela veem uma simples e desnecessária
influência do francês, onde, em verdade, poucas são atualmente as interdições ao
uso do determinativo em causa. Mas tal guerra se tem revelado inútil, e inútil pre
cisamente porque não se trata, no caso, de um mero galicismo extirpável, e sim de
uma tendência geral dos idiomas neolatinos em busca de formas mais expressivas,
de maior clareza e vigor para o enunciado.
E m e x p re s s õ e s d e id e n tid a d e
1. Evita-se, em geral, empregar o artigo indefinido quando já existe, anteposto
ao substantivo, um dos pronomes demonstrativos igual, semelhante e tal; ou
um dos indefinidos certo, outro, qualquer e tanto:
Certo amigo meu já usou de igual argumento.
Em outra circunstância eu aprovaria semelhante atitude.
Se continuares com tal inapetência e com tanta febre, podes tomar
o remédio a qualquer hora.
2. Advirta-se, porém, que algumas dessas formas, quando pospostas a um
substantivo, passam a ser adjetivos, caso em que se constroem normalmente
com artigo indefinido:
Ele disse uma coisa certa.
Quero um livro igual a esse.
Uma hora qualquer irei vê-lo.
Tens um modo semelhante de falar.
Costuma-se, no entanto, calar o artigo indefinido, quando a frase é negativa
ou interrogativa:
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Nunca li coisa igual.
Jamais se ouviu barbaridade tal!
Já viste trejeitos semelhantes?
E m e x p re s s õ e s c o m p a ra tiv a s
1. Em princípio, as fórmulas comparativas podem admitir a exclusão do artigo
indefinido. É o caso:
a) dos comparativos de igualdade formados com tão ou tanto:
Nunca passei por lugar tão perigoso como aquele.
Trabalhava com tanto cuidado como o pai.
b) dos comparativos de superioridade ou de inferioridade, principalmente
quando expressos sob a forma negativa ou interrogativa:
Não encontrarias melhor amigo nesta emergência.
Conseguiste maior renda este mês?
2 . É dispensável também o artigo indefinido em comparações do tipo:
Qual furacão, revolveu tudo.
Bailava como nume da floresta.
E m e x p re s s õ e s d e q u a n tid a d e
Costuma-se evitar o artigo indefinido antes de expressões denotadoras de
quantidade indeterminada, constituídas seja por substantivos (como: coisa, gente,
infinidade, multidão, número, parte, pessoa, porção, quantia, quantidade, soma e
equivalentes), seja por adjetivos (como: escasso, excessivo, suficiente e sinônimos):
Havia grande número de pessoas no casamento.
Reservou para si boa parte do lucro.
Disponho de escasso capital para o empreendimento.
Não há suficiente espaço para o móvel.
O bservação:
A presença do numeral fracionário meio exclui normalmente a do artigo in
definido:
Comprou meio quilo de pão.
Tomou meia dose do remédio.
ARTIGO
Mas, como vimos, o feminino meia constrói-se com o indefinido nas designa
ções de quantidade aproximada. E também pode admiti-lo quando forma com o
substantivo uma unidade de uso corrente:
Só tenho uma meia libra.
No caso, basta um a meia-palavra sua.
C o m s u b s ta n tiv o d e n o ta d o r d a e s p é c ie
Quando um substantivo no singular é concebido sob o aspecto de categoria de
espécie, e não sob o de unidade, pode-se calar o artigo indefinido. Esta omissão
aparece frequentemente em provérbios:
Cão ladrador nunca é bom caçador.
Espada na mão de sandeu, perigo de quem lha deu.
Advirta-se que, na língua de nossos dias, esta construção é mais frequente
no Brasil do que em Portugal.
Comparem-se estes exemplos:
Criança tem amigos e inimigos.
(G. Amado, HM7,8.)
— Noivo não se deixa na solta.
(J. Lins do Rego, MVA, 270.)
Vida não tem adjetivo.
(C. Lispector, SV , 18.)
O u tro s c a so s d e o m is s ã o d o a rtig o in d e fin id o
Além dos casos mencionados, a língua portuguesa admite a omissão do artigo
indefinido em muitos outros. Como o artigo definido, ele pode faltar:
a) nas enumerações:
Desde aí, os campos-santos não cessaram de recolher os mortos
meus: avô, tios, amigos de infância, companheiros queridos — a
lista é aterradora...
(A. F. Schmidt, GB, 151.)
Casas, árvores, nuvens desagregavam-se numa melancólica paisagem
de Outono.
(F. Namora, TJ, 232.)
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b) nos apostos:
Meu pai, homem de boa família, possuía fortuna grossa, como não
ignoram.
(G. Ramos, AOH, 28.)
Chega, hoje, aqui o meu amigo Costa Cabral, filho do Conde de To
mar, meu antigo condiscípulo em Coimbra e no Laranjo.
(A. Nobre, C/, 74.)
E sempre que a clareza ou a ênfase não o exigirem.
Capítulo 10
Adjetivo
O a d je t iv o é essencialmente um modificador do substantivo. Serve:
1.
°) para caracterizar os seres, os objetos ou as noções nomeadas pelo subs
tantivo, indicando-lhes:
a) uma qualidade (ou defeito):
inteligência lúcida
homem perverso
b) o modo de ser:
pessoa simples
rapaz delicado
c) o aspecto ou aparência:
céu azul
vidro fosco
d) o estado:
casa arruinada
laranjeira florida
2.
°) para estabelecer com o substantivo uma relação de tempo, de espaço,
de matéria, de finalidade, de propriedade, de procedência, etc. ( adietivo de
relação ):
nota mensal
movimento estudantil
casa paterna
vinho português
(= nota relativa ao mês)
(= movimento feito por estudantes)
(= casa onde habitam os pais)
(= vinho proveniente de Portugal)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Os adjetivos de relação, derivados de substantivos, são de natureza classificatória, ou seja, precisam o conceito expresso pelo substantivo, restringindo-lhe, pois,
a extensão do significado. Não admitem graus de intensidade e vêm normalmente
pospostos ao substantivo. A sua anteposição, no caso, provoca uma valorização de
sentido muito sensível.
NOME SUBSTANTIVO E NOME ADJETIVO
muito estreita a relação entre o substantivo (termo determinado) e o
adjetivo (termo determinante). Não raro, há uma única forma para as duas
classes de palavras e, nesse caso, a distinção só poderá ser feita na frase.
Comparem-se, por exemplo:
É
Uma preta velha vendia laranjas.
Uma velha preta vendia laranjas.
Na primeira oração, preta é substantivo, porque é a palavra-núcleo, carac
terizada por velha, que, por sua vez, é adjetivo na medida em que é a palavra
caracterizadora do termo-núcleo. Na segunda oração, ao contrário, velha é
substantivo e preta adjetivo.
Como vemos, a subdivisão dos nomes portugueses em substantivos e adje
tivos obedece a um critério basicamente sintático, funcional.
SUBSTANTIVAÇÃO DO ADJETIVO
Sempre que a qualidade referida a um ser, objeto ou noção for concebida
com grande independência, o adjetivo que a representa deixará de ser um ter
mo subordinado para tornar-se o termo nuclear do sintagma nominal. Dá-se,
então, o que se chama su bstan tiva ção d o a d je t iv o , fato que se exprime,
gramaticalmente, pela anteposição de um determinativo (em geral, do artigo)
ao adjetivo. 1
Comparem-se, por exemplo, estas orações:
O céu cinzento indica chuva.
O cinzento do céu indica chuva.
Na primeira, cinzento é adjetivo; na segunda, substantivo.
1
Veja-se o que a respeito dissemos no capítulo 9.
ADJETIVO
SUBSTITUTOS DO ADJETIVO
1. Palavras ou expressões de outra classe gramatical podem também servir
para caracterizar o substantivo, ficando a ele subordinadas na frase. Valem,
portanto, por verdadeiros adjetivos, semântica e sintaticamente falando.
Costuma-se, por exemplo, com tal finalidade:
a) associar ao substantivo principal outro substantivo em forma de aposto:
O tio Joaquim
b ) e m p r e g a r lo c u ç õ e s f o r m a d a s q u e r d e
Moça cabeça de vento
preposição
+
substantivo :
barco a vela (= veleiro )
coração de anjo (= angélico)
indivíduo sem coragem (= medroso)
q u er de
preposição
+
advérbio :
jornal de hoje (= hodierno)
patas de trás (= traseiras)
c) substituir o adjetivo por um substantivo abstrato, que passa a ter como
complemento nominal o antigo substantivo nuclear.
Comparem-se, por exemplo, estas frases:
Sofreu o destino cruel.
Sofreu a crueldade do destino.
2. A caracterização do substantivo pode fazer-se ainda por meio de uma oração:
a) seja desenvolvida (quando encabeçada por pronome relativo):
Susana, que não se sentia bem, estava de cama.
(M. Torga, V, 178.)
Há homens que não acham nunca a sua expressão.
(G. Amado, TI, 9.)
b) seja reduzida:
Jorge via a dor andando no corpo, a febre queimando, o pai já apo
drecia por dentro.
(Adonias Filho, IP, 53.)
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N OV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Surge ao longe um bananal, osdlando suas folhas tostadas de vento frio.
(A. M. Machado, HR, 73.)
MORFOLOGIA DOS ADJETIVOS
Poucos são os adjetivos que podemos considerar prim itivos , o u seja, “que
designam por si mesmos uma qualidade, sem referência a uma substância ou
ação que a representem”2. É, por exemplo, o caso de, entre outros, brando, claro,
curto, grande, largo, liso, livre, triste e de boa parte dos adjetivos referentes a cor:
azul, branco, preto, verde, etc.
A maioria dos adjetivos é constituída por aqueles que derivam de um subs
tantivo ou de um verbo, com os quais continuam a relacionar-se do ponto de
vista semântico .3
ADJETIVOS PÁTRIOS
Entre os adjetivos derivados de substantivos cumpre salientar os que se refe
rem a continentes, países, regiões, províncias, estados, cidades, vilas e povoados,
bem como aqueles que se aplicam a raças e povos. Os primeiros chamam-se
pátrios ; os segundos, gentílicos , denominações estas que foram omitidas na
Nomenclatura Gramatical Brasileira e na Nomenclatura Gramatical Portuguesa,
mas que nos parecem necessárias.
PÁTRIOS BRASILEIROS
R eferentes
ao pais e aos estados :
Brasil - brasileiro, -a
Acre - acriano, -a
Alagoas - alagoano, -a
Amazonas - amazonense (m. e f.)
Bahia - baiano, -a
Ceará - cearense (m. e f.)
Espírito Santo - espírito-santense
(m. e f.)
Goiás -goiano, -a
Maranhão - maranhense (m. e f.)
Mato Grosso - mato-grossense (m. e f.)
Mato Grosso do Sul - mato-grossense-do-sul (m. e f.)
Minas Gerais - mineiro, -a
Pará - paraense (m. e f.)
Paraíba - paraibano, -a
Paraná - paranaense (m. e f.)
Pernambuco - pernambucano, -a
1 Gonzalo Sobejano. El epíteto en la lírica espanola. 2.“ ed. Madrid, Gredos. 1970, p. 83.
3 Quanto aos sufixos que entram na formação destes adjetivos, veja-se o que dissemos no
capítulo 6, p. 112-3.
ADJETIVO
Piauí - piauiense (m. e f.)
Rio de Janeiro - fluminense (m. e f.)
Rio Grande do Norte - norte-rio-grandense (m. e f.)
Rio Grande do Sul - sul-rio-grandense (m. ef.)
Rondônia - rondoniano, -a
Santa Catarina - catarinense (m. e f.)
São Paulo - paulista (m. e f.)
Sergipe - sergipano, -a
PÁTRIOS PORTUGUESES
R eferentes
ao país e a algumas regiões :
Portugal - português, -a
Alentejo - alentejano, -a
Algarve - algarvio, -a
Beira - beirão, -oa
Douro - duriense (m. e f.)
Estremadura - estremenho, -a
Minho - minhoto, -a
Ribatejo - ribatejano, -a
Trás-os-Montes - trasmontano, -a ou
transmontano, -a
PÁTRIOS AFRICANOS
Angola - angolano, -a
Cabo Verde - cabo-verdiano, -a
Guiné-Bissau -guineense (m. e f.)
Moçambique - moçambicano, -a
São Tomé - são-tomeense
ou são-tomense (m. e f.)
Observações:
1.8) Além de brasileiro, que é o pátrio normal, há as formas alatinadas, de emprego
mais raro: brasiliano, brasílico e brasiliense. Sirvam de exemplo: Coleção Brasiliana,
da Companhia Editora Nacional; Corografia Brasílica, livro de Aires do Casal; Correio
Brasiliense, nome do célebre jornal de Hipólito José da Costa.
2.a) Fluminense é derivado do latim flumen,fluminis “rio”.
3.8) Chamamos também rio-grandense-do-norte e rio-grandense-do-sulos naturais
dos Estados do Rio Grande do Norte e do Rio Grande do Sul, mais conhecidos pelas
alcunhas coletivas de potiguar e gaúcho, que normalmente não têm, como outras,
valor pejorativo.
ADJETIVOS PÁTRIOS COMPOSTOS
Quando dizemos:
a civilização portuguesa
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
referimo-nos à civilização própria do povo português. Se, no entanto, quiser
mos indicar aquela civilização que é comum ao povo português e ao brasileiro,
diremos:
a civilização luso-brasileira
assumindo o primeiro adjetivo uma forma alatinada e reduzida.
Entre as formas alatinadas e reduzidas que se empregam como primeiro
elemento desses pátrios compostos, as mais frequentes são:
anglo (= inglês)
austro (= austríaco)
euro (= europeu)
franco (= francês)
greco (= grego)
hispano (= hispânico, espanhol)
indo (= indiano)
ítalo (= italiano)
galaico (= galego)
luso (= lusitano, português)
nipo (= nipônico, japonês)
sino (= chinês)
teuto (= teutônico, alemão)
Amizade anglo-americana
Império austro-húngaro
Relações euro-africanas
Falares franco-provençais
Antiguidade greco-romana
Literatura hispano-americana
Línguas indo-europeias
Atlas ítalo-suíço
Trovadores galaico-portugueses
Glossário luso-asiático
Comércio nipo-brasileiro
Guerra sino-japonesa
Ginásio teuto-brasileiro
Observação:
Hispano e hispânico, embora usados frequentemente como sinônimos de espa
nhol (isto é, relativo à Espanha, país), são, em verdade, equivalentes de ibérico, pois
se referem à Hispania, nome que os romanos davam à província que abarcava toda
a Península Ibérica.
FLEXÕES DOS ADJETIVOS
Como os substantivos, os adjetivos podem flexionar-se em
n ú m ero
,
g ên ero
e GRAU.
NÚMERO
O a d je tiv o to m a a f o r m a
aluno estudioso
mulher hindu
perfume francês
s in g u l a r
ou
plu r a l
d o s u b s ta n tiv o q u e ele q u a lific a :
alunos estudiosos
mulheres hindus
perfumes franceses
ADJETIVO
P lu r a l d o s a d je tiv o s s im p le s
Na formação do plural, os adjetivos simples seguem as mesmas regras a que
obedecem os substantivos.
P lu r a l d o s a d je t iv o s c o m p o sto s
Nos adjetivos compostos, apenas o último elemento recebe a forma de plural:
consultórios médico-cirúrgicos
institutos afro-asiáticos
letras anglo-germânicas
O bservação:
Excetuam-se:
a) surdo-mudo., que faz surdos-mudos;
b) os adjetivos referentes a cores, que são invariáveis quando o segundo elemento
da composição é um substantivo:
uniformes verde-oliva
saias azul-ferrete
canários amarelo-ouro
blusas vermelho-sangue
GÊNERO
O s u b s ta n tiv o te m s e m p r e u m
gênero , o
q u e n ã o s u c e d e c o m o a d je tiv o ,
q u e a s s u m e o g ê n e r o d o s u b s ta n tiv o .
Do ponto de vista morfológico, o único traço que, na verdade, singulariza
o adjetivo como uma parte do discurso diversa das demais é o de poder, na
maioria das vezes, apresentar duas terminações de gênero, sem que, com isso,
seja uma palavra de gênero determinado e sem que o conceito por ele designado
corresponda a um gênero real.
Observação:
Assinale-se que mesmo os adjetivos uniformes, quando no superlativo absoluto
sintético, passam a apresentar os morfemas de gênero -o, -a. Assim:
um exercício fácil
uma questão fácil
o momento feliz
a solução feliz
um exercício facílimo
uma questão facílima
o momento felicíssimo
a solução felicíssima
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
F o rm a ç ã o d o fe m in in o
1. Como dissemos, os adjetivos são geralmente b i f o r m e s , isto
formas, uma para o masculino e outra para o feminino:
possuem duas
F e m in in o
M a s c u lin o
bom
boa
m au
má
form oso
form osa
nu
nua
lindo
linda
português
portuguesa
M a s c u lin o
2.
é,
F em in in o
O processo de formação do feminino destes adjetivos é idêntico ao dos
substantivos. Assim:
1. °) Os terminados em -o átono formam o feminino mudando o -o em -a:
belo
bela
ligeiro
ligeira
2.
°) Os terminados em -u, -ês e -or formam geralmente o feminino acres
centando -a ao masculino:
cru
francês
encantador
crua
francesa
encantadora
nu
inglês
morador
nua
inglesa
moradora
Excetuam-se, porém:
a) dos finalizados em - u: os gentílicos hindu e zulu, que são invariáveis;
b) dos finalizados em -ês: cortês, descortês, montês e pedrês, que são invariáveis;
c) dos finalizados em -or: os comparativos melhor,pior, maior, menor, superior,
inferior, interior, exterior, anterior, posterior, ulterior, citerior e, ainda, formas
como multicor, incolor, sensabor e poucas mais, que são invariáveis; gerador,
motor e outros terminados em -dor e - tor, que mudam estas sílabas em triz: geratriz, motriz, etc.; e um pequeno número que substitui -or por -eira:
trabalhador, trabalhadeira, etc.
3. °) Os terminados em -ão formam o feminino em -ã ou em -ona:
são
sã
chorão
chorona
Beirão, no entanto, iaz no feminino beiroa.
4. °) Os terminados em -eu (com e fechado) formam o feminino em -eia:
ADJETIVO
europeu
hebreu
europeia
hebreia
plebeu
pigmeu
plebeia
pigmeia
Excetuam-se judeu e sandeu, que fazem, respectivamente, judia e sandia.
5. °) Os terminados em -éu (com e aberto) formam o feminino em -oa:
ilhéu
ilhoa
tabaréu
tabaroa
°) Alguns adjetivos que no masculino possuem o tônico fechado [o ], além de
receberem a desinência -a, mudam o o fechado para aberto [o], no feminino:
6.
brioso
disposto
briosa
disposta
formoso
grosso
formosa
grossa
Outros, porém, conservam no feminino o o fechado [o] do masculino:
chocho
fofo
chocha
fofa
fosco
oco
fosca
oca
A d je t iv o s u n ifo r m e s
Há adjetivos que têm uma só forma para os dois gêneros.
São de regra u n i f o r m e s o s adjetivos:
a) terminados em -a, muitos dos quais funcionam também como substantivos:
hipócrita, homicida, indígena; asteca, celta, israelita, maia, persa; agrícola,
silvícola, vinícola, cosmopolita, etc.;
b) terminados em -e: árabe, breve, cafre, doce, humilde, terrestre, torpe, triste e
c)
d)
e)
f)
g)
muitos outros, entre os quais se incluem todos os formados com os sufixos
-ense, -ante, -ente e -inte; cearense, constante, crescente, pedinte, etc.;
terminados em -/: cordial, infiel, amável, pueril, ágil, reinol, azul, êxul, etc.;
terminados em -ar e em -or (neste caso apenas os comparativos em - or):
exemplar, ímpar, maior, superior, etc.;
paroxítonos terminados em -s: reles, simples, etc;
terminados em -z\ audaz, feliz, atroz, etc.;
terminados em -m gráfico: virgem, ruim, comum, etc.
O bservação:
Fazem exceção: andaluz, fem. andaluza; bom, fem. boa; espanhol, fem. espanhola;
e a maior parte dos terminados em -ês e -or.
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F e m in in o d o s a d je tiv o s c o m p o sto s
Nos ad jetiv o s
forma feminina:
com po stos,
apenas o segundo elemento pode assumir a
hispano-americana
in te r v e n ç ã o médico-cirúrgica
a lite r a tu r a
um a
A única exceção é
su rd o -m u d o ,
que faz no feminino
su rd a -m u d a :
surdo-mudo
c r ia n ç a surda-muda
u m m e n in o
um a
GRAUS DO ADJETIVO
A gradação pode ser expressa em português por processos sintáticos ou
morfológicos.
C o m p a ra tiv o e s u p e r la t iv o
Dois são os graus do adjetivo: o comparativo e o superlativo .
1. O
a)
comparativo
p o d e in d ic a r:
q u e u m se r p o s s u i d e t e r m in a d a q u a lid a d e e m g r a u s u p e r io r , ig u a l o u in fe r io r
a o u tr o :
Pedro é mais estudioso do que Paulo.
Álvaro é tão estudioso como [ou quanto] Pedro.
Paulo é menos estudioso do que Álvaro.
b ) q u e n u m m e s m o s e r d e t e r m in a d a q u a lid a d e é s u p e r io r , ig u a l o u in f e r io r a
o u tr a q u e p o s s u i:
Paulo é mais inteligente que estudioso.
Pedro é tão inteligente quanto estudioso.
Álvaro é menos inteligente do que estudioso.
Daí a existência de u m co m pa r a tiv o de s u p e r io r id a d e , de
rativo de igualdade e de u m comparativo de inferioridade .
2.
O
superlativo
p o d e d e n o ta r :
um
co m pa
ADJETIVO
a) que um ser apresenta em elevado grau determinada qualidade
( superlativo
absoluto ):
Paulo é inteligentíssimo.
Pedro é muito inteligente.
b) que, em comparação à totalidade dos seres que apresentam a mesma quali
dade, um se sobressai por possuí-la em grau maior ou menor que os demais
( superlativo
relativo ):
Carlos é o aluno mais estudioso do Colégio.
João é o aluno menos estudioso do Colégio.
No prim eiro exemplo, o
segundo, de inferioridade .
su per la tiv o relativo
é
de s u p e r io r id a d e ;
no
F o rm a ç ã o d o g ra u c o m p a ra tiv o
1. Forma-se o comparativo de superioridade antepondo-se o advérbio mais e
pospondo-se a conjunção que ou do que ao adjetivo:
Pedro é mais idoso do que Carlos.
João é mais nervoso que desatento.
2. Forma-se o comparativo de igualdade antepondo-se o advérbio tão e pos
pondo-se a conjunção como ou quanto ao adjetivo:
Carlos é tão jovem como Álvaro.
José é tão nervoso quanto desatento.
3. Forma-se o comparativo de inferioridade antepondo-se o advérbio menos e
pospondo-se a conjunção que ou do que ao adjetivo:
Paulo é menos idoso que Álvaro.
João é menos nervoso do que desatento.
F o rm a ç ã o d o g ra u s u p e r la t iv o
Vimos que h á duas espécies de superlativo : absoluto e relativo .
O
superlativo absoluto
p o d e ser:
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
a)
b)
sin tético ,
se e x p re s s o p o r u m a só p a la v r a (a d je tiv o + su fix o ):
a m ic ís s im o
a c é r r im o
e s tu d io s ís s im o
fa c ílim o
tr is tís s im o
s a lu b é r r im o
analítico ,
se f o r m a d o c o m a a ju d a d e o u t r a p a la v ra , g e r a lm e n te u m a d
v é r b io i n d i c a d o r d e e x c e sso -
muito, imensamente, extraordinariamente,
excessivamente, grandemente, etc.:
m u i to e s tu d io s o
e x c e s s iv a m e n te fácil
im e n s a m e n te tr is te
e x t r a o r d i n a r ia m e n te s a lu b r e
g r a n d e m e n te p r e ju d ic ia l
e x c e p c io n a lm e n te c h e io
Superlativo absoluto sintético
1. Forma-se pelo acréscimo ao adjetivo do sufixo -íssirno:
fé rtil
fe r tilís s im o
o r ig in a l
o r ig in a lís s im o
v u lg a r
v u lg a rís s im o
Se o adjetivo terminar em vogal, esta desaparece ao aglutinar-se o sufixo:
belíssimo
lindíssimo
tristíssimo
b e lo
lin d o
tr is te
2. Muitas vezes o adjetivo, ao receber o sufixo -tssimo, reassume a primitiva
forma latina.
Assim:
a) os adjetivos terminados em -ve/ formam o superlativo em -bilíssimo:
am ável
a m a b ilís s im o
in d e lé v e l
in d e le b ilís s im o
te rrív e l
te rr ib ilís s im o
m óvel
m o b ilís s im o
v o lú v e l
v o lu b ilís s im o
b ) o s te r m in a d o s e m
-z fa z e m
o s u p e r la tiv o e m - císsitno:
capaz
c a p a c ís s im o
feliz
fe lic ís s im o
a tr o z
a tro c ís s im o
ADJETIVO
c) os terminados em vogal nasal (representada com -m gráfico) formam o
superlativo em - níssimo:
comum
comuníssimo
d) os terminados no ditongo -ão fazem o superlativo em -antssimo:
pagão
vão
paganíssimo
vaníssimo
3. Não raro a forma portuguesa do adjetivo difere sensivelmente da latina, da
qual se deriva o superlativo. Assim:
Norm al
S u p e r l a t iv o
N orm al
S
u p e r l a t iv o
a m a rg o
a m a r ís s im o
m a g n íf ic o
m a g n if ic e n t ís s im o
a m ig o
a m ic ís s im o
m a lé fic o
m a le f ic e n t ís s im o
a n t ig o
a n t iq u ís s im o
m a lé v o lo
m a le v o le n t ís s im o
b e n é fic o
b e n e f ic e n t ís s im o
m iú d o
m in u t ís s im o
b e n é v o lo
b e n e v o le n t ís s im o
n o b re
n o b ilís s im o
c r is t ã o
c r is t ia n ís s im o
p esso al
p e r s o n a lís s im o
cru e l
c r u d e lís s im o
p ró d ig o
p r o d ig a lís s im o
do ce
d u lc ís s im o
s á b io
s a p ie n t ís s im o
fie l
f id e lís s im o
sag rad o
s a c r a t ís s im o
f r io
f r ig id ís s im o
s im p le s
s im p lic ís s im o (o u
g e ra l
g e n e r a lís s im o
in im ig o
in im ic ís s im o
s im p lís s im o )
s o b e rb o
s u p e r b ís s im o
4. Também os superlativos em -imo e -rimo representam formações latinas.
Com exclusão de facílimo, dificílimo e paupérrimo (superlativos de fácil, difícil
e pobre), que pertencem à linguagem coloquial, são todos de uso literário e
um tanto precioso. Anotem-se os seguintes:
NORMAL
S u p e r l a t iv o
acre
a c é r r im o
c é le b re
c e le b é r r im o
h u m ild e
h u m ílim o (o u
N orm al
m a g ro
in t e g é r r im o
liv r e
lib é r r im o
s a lu b r e
s a lu b é r r im o
m a c é r r im o (ou
m a g r ís s im o )
n e g ro
h u m ild ís s im o )
ín te g ro
S u p e r l a t iv o
n ig é r r im o (o u
n e g r ís s im o )
p o b re
p a u p é r r im o (o u
p o b r ís s im o )
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Em lu g ar das form as superlativas seriíssim o, necessariíssim o e o u tras sem elhantes,
a língua atual prefere seríssim o, necessaríssim o, com u m só i.
Outras formas de superlativo
Pode-se também formar o superlativo com:
a) o acréscimo de um prefixo ou de um pseudoprefixo, como arqui-, extra-,
hiper-, super-, ultra-, etc. (arquimilionário, extrafino, hipersensível, superexaltado, ultrarrápido):
Manuel Torres saiu-lhe ao encontro, prazenteiro, como ultraprazenteiro caminhava para ele o eclesiástico.
(A. Ribeiro, V, 32.)
b) a repetição do próprio adjetivo:
É um Abril de pureza: — é lindo, lindo!
(A. Patrício, P, 130.)
A avó, que tem oitenta anos,
está tão fraca e velhinha...
Teve tantos desenganos:
ficou branquinha, branquinha,
com os desgostos humanos. —
(O. Bilac, PI, 7.)
c) uma comparação breve:
— Isso é claro como água.
(Castro Soromenho, TM, 101.)
— Estava escuro como breu, e à distância de dez passos um vulto
mal se via a negrejar.
(A. Ribeiro, V, 393.)
d) certas expressões fixas, como podre de rico [- riquíssimo], de mão cheia [=
excelente, de grandes recursos técnicos], e outras semelhantes:
A Zorilda era uma pianista de mão cheia.
(H. Sales, DBFM, 120.)
ADJETIVO
Podre de rico! Nem sabe o que tem de seu!
(V. Nemésio, NPM, 102.)
e) o artigo definido, marcado por uma tonicidade e uma duração particular,
em frases do tipo:
Ela não é apenas uma excelente cantora, ela é a cantora [= a incom
parável, a melhor de todas].
Diz-se, como vimos, de notoriedade este emprego do artigo.
Superlativo relativo
1.
O superlativo relativo é sempre analítico.
O de superioridade forma-se pela anteposição do artigo definido ao com
parativo de superioridade:
Este aluno é o mais estudioso do Colégio.
João foi o colega mais leal que conheci.
O de inferioridade forma-se pela anteposição do artigo definido ao com
parativo de inferioridade:
Este aluno é o menos estudioso do Colégio.
Jorge foi o colega menos leal que conheci.
2.
O termo da comparação é expresso por um complemento nominal intro
duzido pela preposição de (e também entre, em e sobre), ou por uma oração
adjetiva restritiva, como nos exemplos mencionados.
3. O superlativo relativo denotador dos limites da possibilidade forma-se com
a posposição da palavra possível ou uma expressão (ou oração) de sentido
equivalente4:
O arraial era o mais monótono possível,
(Guimarães Rosa, S, 264.)
4
Sobre os diversos processos de intensificação do superlativo relativo no português con
temporâneo, veja-se Maria Manuela Moreno de Oliveira. Processos de intensificação no
português contemporâneo. Lisboa, Centro de Estudos Filológicos, 1962, p. 191-202.
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Era a pessoa mais cortês deste mundo, e não deu corpo às suas aversões.
(A. Ribeiro, V, 34.)
Nos livros que eu lia estes todos eram os mais ricos que se conhecia.
(Simões Lopes Neto, CGLS, 297.)
O bservação:
A função de superlativo relativo pode ser também desempenhada por um numeral
ordinal ou por adjetivos que denotem posições extremas. Assim:
Bartolomeu Dias foi o primeiro navegante que dobrou o cabo das Tormentas.
O Amazonas é o principal rio do Brasil.
C o m p a ra tiv o s e s u p e r la tiv o s a n ô m a lo s
Quatro adjetivos - bom, mau, grande e pequeno - formam o comparativo e
o superlativo de modo especial:
A d j e t iv o
C o m p a r a t iv o
S u p e r l a t iv o
de
5UPERIORIDADE
A b so lu to
RELATIVO
bom
m e lh o r
ó t im o
o m e lh o r
m au
p io r
p é s s im o
o p io r
g ra n d e
m a io r
m á x im o
o m a io r
pequeno
m enor
m ín im o
o m enor
Observações:
1.a) Quando se compara a qualidade de dois seres, não se deve dizer m a is b o m , m ais
m a u e m a is grande; e sim: m elhor, p io r e m a io r. Possível é, no entanto, usar as formas
analíticas desses adjetivos quando se confrontam duas qualidades do mesmo ser:
Ele foi mais mau do que desgraçado.
Ele é bom e inteligente; mais bom do que inteligente.
Em lugar de m e n o r usa-se também m a is p e q u e n o , que é a forma preferida em
Portugal.
2.
a) A par de ó tim o , péssim o, m á x im o e m ín im o , existem os superlativos absolutos
regulares: b o n íssim o e m u ito bom , m a líssim o e m u ito m a u , g ra n d íssim o e m u ito grande,
p e q u e n íssim o e m u ito p eq u en o .
3.
a) G rande e p e q u e n o possuem dois superlativos: o m a io r ou o m á x im o e o m en o r
ou o m ín im o .
ADJETIVO
4.a) Alguns comparativos e superlativos não tèm forma normal usada:
C o m p a r a t iv o
S u p e r l a t iv o
s u p e r io r
s u p r e m o (o u s u m o )
in f e r io r
ín fim o
a n t e r io r
—
p o s t e r io r
p ó stu m o
u lt e r io r
ú ltim o
As formas superior e inferior, supremo (ou sumo) e ínfimo podem ser empregadas
como comparativo e superlativo de alto e baixo, respectivamente.
A d je t iv o s q u e n ã o se fle x io n a m e m g ra u
Vimos que os chamados adjetivos de relação não se flexionam em grau. O
mesmo se dá com os outros adjetivos de tipo classificatório, entre os quais se
incluem os pertencentes às terminologias científicas, que se caracterizam por
seu sentido específico, unívoco. Assim: a tm o s fé r ic o , m o r fo ló g ic o , o v íp a r o , r u m i
n a n te , s in c r ô n ic o , etc.
Para que um adjetivo tenha comparativo e superlativo, é obviamente indis
pensável que o seu sentido admita variação de intensidade.
EMPREGO DO ADJETIVO
F u n ç õ e s s in t á t ic a s d o a d je t iv o 5
A rigor, o adjetivo só existe referido a um substantivo. Conforme se estabe
leça a relação entre os dois termos na frase, o adjetivo desempenhará as funções
sintáticas de adjunto a d nom inal o u de predicativo .
Adjetivo em função de adjunto adnominal
Neste caso, o adietivo refere-se, s e m i n t e r m e d i á r i o , ao substantivo, a que
pode vir posposto ou anteposto. Formam ambos um conjunto significativo,
marcado pela u n i d a d e d e a c e n to e e n to a ç ã o e pela i d e n t i d a d e d e f u n ç ã o s in tá t ic a .
5 Sobre a sintaxe do adjetivo em português, veja-se o trabalho fundamental de João Malaca
Casteleiro. Sintaxe transformacional do adjectivo: regência das construções completivas.
Lisboa, INIC, 1981.
275
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Assim, no exemplo
Seus olhos negros me encantam,
o sujeito da oração é não apenas olhos, mas toda a unidade significativa e acentuai
Seus olhos negros.
É d e n t r o d e s te c o n j u n to q u e o
acessória ,
p o r t a n t o s e c u n d á r ia , d e
adjetivo
d e s e m p e n h a r á a f u n ç ã o s in tá tic a
a d jun to a d nom inal
d o s u b s ta n tiv o
olhos,
n ú c le o d o s u je ito .
Adjetivo em função predicativa
Neste caso, a qualidade expressa pelo adjetivo transmite-se ao substantivo
por intermédio de um verbo, que pode estar explícito ou implícito.
Temos o adjetivo em função predicativa nas seguintes construções:
1. P redicativo
do sujeito,
com verbo de ligação explícito:
A cidade parece encantada.
(C. Drummond de Andrade, CM, 138.)
Doce e brando era o seio de Jesus...
(A. de Quental, SC, 57.)
2. P redicativo do sujeito, c o m v e rb o de ligação im p lícito :
Misterioso e mau, o Urucanã. Traiçoeiro, aquele jeito inofensivo de
correr macio entre os barrancos altos.
(M. Palmério, VC, 27.)
Estranho aquele casal.
(J. Condé, TC, 33.)
3. P redicativo do objeto direto , c o m v e rb o n o c io n a l tra n sitiv o :
Afasto-me para que ele não se sinta tolhido, quero-o livre.
(L. Fagundes Telles, DA, 144.)
Alguns julgaram-no inocente do crime assacado.
(C. Castelo Branco, OS, 1,1127.)
ADJETIVO
4. P redicativo do obieto indireto , c o m v e rb o n o c io n a l tra n sitiv o :
Na escola a professora também lhe chama teimoso.
(Alves Redol, C, 24.)
A mulher, Juliana Gouveia, toma ar aborrecido e chama-lhe antipático.
(C. dos Anjos, DR, 10.)
5. P redicativo do sujeito, c o m v erb o n o c io n a l in tra n sitiv o :
A casa-grande respirava tranquila.
(J. Lins do Rego, MVA, 275.)
As palavras rolaram nítidas, desamparadas.
(C. de Oliveira, AC, 10.)
O m ar
p a lp ita
enorme.
(A. F. Schmidt, GB, 411.)
Nesta última construção, o
tuada, uma noção adverbial.
adjetivo
encerra sempre, mais ou menos acen
Diferença fundam ental:
A d if e r e n ç a
e m fu n ç ã o d e
e n tre o
predicativo
l .° ) O p r im e ir o é
integrante
adjetivo
e m fu n ç ã o d e
adjunto adnom inal
e o
adjetivo
b a s e ia -s e , p r in c ip a lm e n te e m d o is p o n to s :
term o acessório
d a o ra ç ã o , p a r te d e u m
d e la ; o s e g u n d o é, p o r si p r ó p r io , u m
term o essencial o u
term o essencial
d a o ra ç ã o .
Se disséssemos, por exemplo:
O campo é imenso,
o adjetivo predicativo não poderia faltar, pois, sendo
a oração não teria sentido.
term o essencial ,
sem ele
Se disséssemos, no entanto:
O campo imenso está alagado,
o a d je tiv o
imenso se ria p a r te
d o s u je ito , u m a d is p e n s á v e l q u a lific a ç ã o d o s u b s ta n
tiv o q u e lh e se rv e d e n ú c le o , u m
term o ,
p o r c o n s e g u in te ,
acessório
d a o ra ç ã o .
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2.°) A q u a lid a d e
ex p ressa p o r u m a d je tiv o e m fu n ç ã o
predicativa
v e m m a rc a d a
n o te m p o , e p o r e ssa re la ç ã o c r o n o ló g ic a e n t r e a q u a lid a d e e o se r é re s p o n s á v e l
o v e r b o q u e lig a o a d je tiv o a o s u b s ta n tiv o .
Comparem-se estas frases:
O bom a l u n o e s tu d a .
Ele está nervoso, mas era calmo.
Na primeira, acrescentamos a noção de bom à de aluno sem termos em mente
qualquer referência à ideia de tempo. Já, na segunda, as noções expressas pelos
adjetivos nervoso e calmo são por nós atribuídas ao sujeito com a situação de
tempo marcada pelo verbo: nervoso, no presente; calmo, no passado.
Emprego adverbial do adjetivo
1. Examinemos as seguintes orações:
O menino dorme tranquilo.
A menina dorme tranquila.
Os meninos dormem tranquilos.
As meninas dormem tranquilas.
Vemos que, nelas, o adjetivo em função predicativa concorda em gênero e
número com o substantivo sujeito. Mas verificamos, por outro lado, que,
servindo embora de predicativo do sujeito, com o qual concorda, o adjetivo
modifica em todas elas a ação expressa pelo verbo e assume, de alguma forma,
um valor também adverbial.
Esse valor naturalmente será preponderante se, em lugar daquelas constru
ções, usarmos as seguintes:
O menino dorme tranquilamente.
A menina dorme tranquilamente.
Os meninos dormem tranquilamente.
As meninas dormem tranquilamente.
Aqui, a forma adverbial, invariável, impede a possibilidade de concordância,
justamente o elo que prendia o adjetivo ao sujeito, e, com isso, faz aflorar com
toda a nitidez o modo por que se processa a ação indicada pelo verbo dormir.
2. É esse e m p r e g o d o a d je tiv o e m p r e d ic a d o s v e r b o - n o m in a is , c o m v a lo r f r o n
te iriç o d e a d v é rb io , q u e n o s v a i e x p lic a r o fe n ô m e n o , h o je m u ito g e n e ra liz a d o ,
d a a d v e rb ia liz a ç ã o d e a d je tiv o s s e m o a c r é s c im o d o s u fix o
-mente.
ADJETIVO
Por exemplo, nestas orações,
D. Felismina sorriu amarelo.
(Machado de Assis, OC, II, 519.)
Tinham-se habituado a falar baixo.
(C. de Oliveira, CD, 56.)
as palavras amarelo e baixo são advérbios.
Observação:
Embora o adjetivo adverbializado deva permanecer invariável, não faltam
abonações, mesmo em bons autores, de sua concordância com o sujeito da oração,
fato justificável pela ampla zona de contacto existente, no caso, entre o adjetivo e
o advérbio.
O adjetivo meio, por exemplo, tornado advérbio quando modifica outro adjetivo,
aparece não raro em concordância com um substantivo da oração:
Estes homens rudes combatiam meios nus e desprezavam todas as precau
ções de guerra.
(A. Herculano, E, 93.)
Maria necessitava de apoio, meia espantada, meia grata, deixou-se levar.
(M. de Andrade, OI, 64.)
V a lo r e s t ilís t ic o d o a d je t iv o
Como elemento fundamental para a caracterização dos seres, o a d j e t i v o
(ou qualquer expressão adjetiva) desempenha importante papel naquilo que
falamos ou escrevemos.
É ele que nos permite configurar os seres ou os objetos tal como a nossa
inteligência os distingue, nomeando-lhes as peculiaridades objetivamente
apreensíveis. Ex.:
rapaz alto
muro de pedra
mesa redonda
templo barroco
É ele que nos permite expressar os seres e os objetos enriquecidos pelo que
nossa imaginação e sensibilidade lhes atribui. Assim:
moça exuberante
caráter difícil
estupenda paisagem
ambiente acolhedor
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Portanto, quer para a precisão do enunciado, quer para a sua expressividade,
o adjetivo impõe-se como termo imprescindível, mas a exigir de quem dele se
utilize cuidados especiais, principalmente bom senso e bom gosto.
C o lo c a ç ã o d o a d je tiv o a d ju n to a d n o m in a l
1. Sabemos que, na oração declarativa, prepondera a o r d e m d i r e t a , que corres
ponde à sequência progressiva do enunciado lógico.
Como elemento acessório da oração, o adjetivo em função de a d j u n t o a d n o m i n a l deverá, portanto, vir com maior frequência depois do substantivo
que ele qualifica.
2. Mas sabemos, também, que ao nosso idioma não repugna a o r d e m chamada
i n v e r s a , principalmente nas formas afetivas da linguagem, e que a anteposição
de um termo é, de regra, uma forma de realçá-lo.
3. Podemos, então, estabelecer previamente que:
a) sendo a sequência s u b s t a n t i v o + a d j e t i v o a predominante no enunciado
lógico, deriva daí a noção de que o adjetivo posposto possui valor obje
tivo:
noite escura
rapaz bom
dia triste
campos verdes
b) sendo a sequência a d j e t i v o + s u b s t a n t i v o provocada pela ênfase dada ao
qualificativo, decorre daí a noção de que, anteposto, o adjetivo assume um
valor subjetivo:
escura noite
bom rapaz
triste dia
verdes campos
Adjetivo posposto ao substantivo
Colocam-se normalmente depois do substantivo:
a) os adjetivos de natureza classificatória, como os técnicos e os de relação, que
indicam uma categoria na espécie designada pelo substantivo:
animal doméstico
flor silvestre
água mineral
deputado estadual
ADJETIVO
b) os adjetivos que designam características muito salientes do substantivo, tais
como forma, dimensão, cor e estado:
terreno plano
homem baixo
calça preta
mamoeiro carregado
c) os adjetivos seguidos de um complemento nominal:
um programa fádl de cumprir
uma providência necessária ao ensino
Adjetivo anteposto ao substantivo
1. De um modo constante, só se colocam antes do substantivo:
a) os superlativos relativos: o melhor, o pior, o maior, o menor.
O melhor meio de ganhar é poupar.
O maior castigo da injúria é havê-la feito.
b) certos adjetivos monossilábicos que formam com o substantivo expressões
equivalentes a substantivos compostos:
O pior cego é o que não quer ver.
O menor descuido pode ser fatal.
O mar palpita enorme.
bom dia
má hora
c) adjetivos que nesta posição adquiriram sentido especial, como simples (=
mero, só, único); comparem-se:
Nessa ocasião ele era um simples escrevente [= um mero escrevente].
Este escritor tem um estilo simples [= um estilo não complexo].
2. Afora esses casos, o adjetivo anteposto assume, em geral, um sentido figurado.
Comparem-se, por exemplo:
um grande homem [= grandeza figurada]
um homem grande [= grandeza material]
uma pobre mulher [= uma mulher infeliz]
uma mulher pobre [= uma mulher sem recursos]
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C o lo c a ç ã o d o e p ít e t o r e tó r ic o
O cham ado
a)
epíteto retórico
serv e:
p a r a a c e n tu a r u m a p a r te d o s ig n ific a d o d o s u b s ta n tiv o c o m o q u a l se re la c io n a
( epíteto
de natureza ),
e, n e s te c a so , p o d e v ir p o s p o s t o o u a n t e p o s t o a o
s u b s ta n tiv o , e m b o r a a p r im e ir a c o lo c a ç ã o s e ja a m a is f re q u e n te :
a
branca n e v e
a n o ite
escura
b ) p a r a e x p r im ir u m a c o n h e c id a q u a lid a d e d is tin tiv a e in d iv id u a l d e u m n o m e
p r ó p r i o ( epíteto
característico ),
caso em q u e v em s e m p re a n te p o s to ao
s u b s ta n tiv o :
o sábio Nestor
a fiel Penélope
A posposição do qualificativo, nesses exemplos, transformaria o epíteto
característico num mero adjetivo classificatório.
Observação:
Encontrar o adjetivo preciso e colocá-lo adequadamente junto ao substantivo que
qualifica é sempre uma operação artística. Com razão dizia o poeta Vicente Huidobro:
“O adjetivo, quando não dá vida, mata.”
A propósito, convém meditar nesta advertência de Samuel Gili y Gaya: “A pre
ferência por uma ou outra posição [do adjetivo], quando as condições lógicas não
exigem colocação fixa, é um elemento de caracterização de um estilo, sempre que
esteja internamente vivida; ocorre não raro, porém, que apenas pelo afã de dar à lin
guagem um matiz literário, próprio do estilo elevado e declamatório, alguns escritores
principiantes, ou pouco sinceros, antepõem sistematicamente os adjetivos.” (Curso
superior de sintaxis espahola, 5.a ed., Barcelona, Ediciones Spes, 1955, p. 195.)
O u tra s f o r m a s d e r e a lc e d o a d je tiv o
1. Para realçar a caracterização do ser ou do objeto, costumam os escritores
não só antepor o adjetivo ao substantivo, mas também:
a) e s ta b e le c e r u m a p a u s a e n t r e o a d je tiv o e o s u b s ta n tiv o , o q u e se m a r c a , n a
e s c rita , p e la c o lo c a ç ã o d o a d je tiv o e n t r e v írg u la s :
A 15 de novembro Floriano Peixoto, doente, deixou o governo.
(G. Ramos, AOH, 183.)
ADJETIVO
E o Negrinho, sarado e risonho, pulando de em pelo e sem rédeas,
no baio, chupou o beiço e tocou a tropilha a galope.
(Simões Lopes Neto, CGLS, 334.)
b) repetir intencionalmente o adjetivo, que é, como vimos, uma das formas de
superlativá-lo:
Por teus olhos negros, negros
Trago eu negro o coração
(Almeida Garrett, O, II, 127.)
Oh que duro, duro, duro
ofício de se exprimir!
(C. Drummond de Andrade, R, 160.)
c) separar o adjetivo do substantivo, colocando-o no fim da frase:
D. Quitéria levou a mão ao bolso, pensativa.
(F. Namora, T/, 215.)
Baleia ficou passeando na calçada, olhando a rua, inquieta.
(G. Ramos, V 5,109.)
d) acentuar o sentido do adjetivo por meio de um advérbio:
Deixo nessas pobres linhas a minha saudade do homem Camus, tão
simples, tão simpático, tão despretensioso na sua glória mundial.
(M. Bandeira, AA, 342.)
Trá-la muito bem tratada, muito bem fechada, restos da vida moura.
(R. Brandão, P, 164.)
2 . O adjetivo, ou particípio, que modifica um pronome substantivo vem sempre
numa situação enfática, em razão da pausa nítida que separa os dois termos.
Por isso, escreve-se isolado por vírgulas:
Eu, louco, amara-te, estátua!
(Guimarães Passos, VS, 37.)
Mas eu, Senhor!... Eu, triste, abandonada
Em meio das areias esgarrada,
Perdida marcho em vão!
(Castro Alves, OC, 291.)
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CONCORDÂNCIA DO ADJETIVO COM O SUBSTANTIVO
O
adjetivo ,
o n ú m e ro do
d is s e m o s , v a ria e m g ê n e r o e n ú m e r o d e a c o r d o c o m o g ê n e ro e
substantivo
a o q u a l se re fe re .
É por essa correspondência de flexões que os dois termos se acham inequi
vocamente relacionados, mesmo quando distantes um do outro na frase.
Assim:
Eu amo a noite solitária e muda;
Como formosa dona em régios paços,
Trajando ao mesmo tempo luto e galas
Majestosa e sentida.
(Gonçalves Dias, PCP, 250.)
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso...
(F. Pessoa, OP, 17.)
Os homens continuam a passar, indiferentes.
(O. Mendes, P, 124.)
A d je t iv o re fe rid o a u m s u b s ta n tiv o
O
adjetivo ,
predicativo ,
q u e r em fu n ç ã o de
d e s d e q u e se re fira a
a d ju n to a d n o m in a l ,
q u e r e m fu n ç ã o de
um único substantivo, c o m
ele c o n c o r d a e m
g ên e ro e n ú m e ro .
Assim:
O Barão continuava a contar aventuras, pequenos casos que revivia
com um prazer doentio.
(Branquinho da Fonseca, B, 27.)
Saiu de cabeça baixa, as mãos cerradas no fundo dos bolsos.
(L. Fagundes Telles, ABV, 51.)
O Antunes andava encantado por todas as razões.
(Almada Negreiros, NG, 70.)
A casa ficou vazia.
(A. M. Machado, HR, 231.)
ADJETIVO
A d je t iv o re fe rid o a m a is d e u m s u b s ta n tiv o
Quando o adjetivo se associa a mais de um substantivo, importa considerar:
a) o
gênero
d o s s u b s ta n tiv o s ;
b) a
funçào
d o a d je tiv o ( adjunto
a d nom inal
ou
predicativo );
c) a PosiçÀo do adjetivo (anteposto ou posposto aos substantivos), condições
essas que permitem a concordância do adjetivo com os substantivos englo
bados, ou apenas com o mais próximo.
Examinemos as diversas possibilidades, exemplificando-as.
A d je t iv o a d ju n to a d n o m in a l
O a d je tiv o v e m a n te s d o s s u b s ta n tiv o s
O adietivo concorda em gênero e número com o substantivo
mais próximo, ou seja, com o primeiro deles:
R egra
geral :
Vivia em tranquilos bosques e montanhas.
Vivia em tranquilas montanhas e bosques.
Tinha por ele alto respeito e admiração.
Tinha por ele alta admiração e respeito.
Observação:
Quando os substantivos são nomes próprios ou nomes de parentesco, o a d ie t iv o
vai sempre para o plural:
Conheci ontem as gentis irmã e cunhada de Laura.
Portugal cultua os feitos dos heroicos Diogo Cão e Bartolomeu Dias.
O a d je tiv o v e m d e p o is d os s u b s ta n tiv o s
Neste caso, a concordância depende do gênero e do número dos substan
tivos.
1. Se os substantivos são do mesmo gênero e do singular, o adjetivo toma o
gênero (masculino ou feminino) dos substantivos e, quanto ao número, vai:
a) para o singular (concordância mais comum):
A professora estava com um vestido e um chapéu escuro.
Estudo a língua e a literatura portuguesa.
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b) para o plural (concordância mais rara):
A professora estava com um vestido e um chapéu escuros.
Estudo a língua e a literatura portuguesas.
2 . Se os substantivos são de gêneros diferentes e do singular, o adjetivo pode
concordar:
a) com o substantivo mais próximo (concordância mais comum):
A professora estava com uma saia e um chapéu escuro.
Estudo o idioma e a literatura portuguesa.
b) com os substantivos em conjunto, caso em que vai para o masculino plural
(concordância mais rara):
A professora estava com uma saia e um chapéu escuros.
Estudo o idioma e a literatura portugueses.
3. Se os substantivos sào do mesmo gênero, mas de números diversos, o adjetivo
toma o gênero dos substantivos, e vai:
a) para o plural (concordância mais comum):
Ela comprou dois vestidos e um chapéu escuros.
Estudo as línguas e a civilização ibéricas.
b) para o número do substantivo mais próximo (concordância mais rara):
Ela comprou dois vestidos e um chapéu escuro.
Estudo as línguas e a civilização ibérica.
4. Se os substantivos são de gêneros diferentes e do plural, o adjetivo vai:
a) para o plural e para o gênero do substantivo mais próximo (concordância
mais comum):
Ela comprou saias e chapéus escuros.
Estudo os idiomas e as literaturas ibéricas.
b) para o masculino plural (concordância mais rara):
Ela comprou chapéus e saias escuros.
Estudo os idiomas e as literaturas ibéricos.
ADJETIVO
5. Se os substantivos são de gêneros e números diferentes, o adjetivo pode ir:
a) para o masculino plural (concordância mais comum):
Ela comprou saias e chapéu escuros.
Estudo os falares e a cultura portugueses.
b) para o gênero e o número do substantivo mais próximo (concordância que
não é rara quando o último substantivo é um feminino plural):
Ela comprou saias e chapéu escuro.
Estudo o idioma e as tradições portuguesas.
O bservação:
Quando está em concordância apenas com o substantivo mais próximo, o adjetivo
nem sempre caracteriza de forma precisa o substantivo dele distanciado. Por isso,
em todas as hipóteses mencionadas, pode-se e deve-se, caso a concordância origine
qualquer dúvida, repetir o adjetivo para cada um dos substantivos:
Ela comprou uma saia escura e um chapéu escuro.
Estudo os falares portugueses e a cultura portuguesa.
A d je t iv o p re d ic a tiv o d o s u je it o c o m p o s to
Quando o adjetivo serve de predicativo a um sujeito múltiplo, constituído
de substantivos (ou expressões equivalentes), observa, na maioria dos casos, as
mesmas regras de concordância a que está submetido o adjetivo que funciona
como adjunto adnominal.
Convém salientar, no entanto, que:
a) se os substantivos sujeitos são do mesmo gênero, o adjetivo toma o gênero dos
substantivos e vai, preferentemente, para o plural, ainda que os substantivos
estejam no singular:
O livro e o caderno são novos.
A porta e a janela estavam abertas.
b ) se os substantivos sujeitos são de gêneros diversos, o adjetivo vai, normalmente,
para o masculino plural:
O livro e a caneta são novos.
A janela e o portão estavam abertos.
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Mas, nos dois casos, é também possível que o adjetivo predicativo concorde
com o núcleo do sujeito mais próximo se o verbo de ligação estiver no singular
e anteposto ao sujeito composto, como nos exemplos abaixo:
Era novo o livro e a caneta.
Estava aberta a janela e o portão.
Observações:
1.
“) O adjetivo predicativo do objeto direto obedece, em geral, às mesmas regras
de concordância observadas pelo adjetivo predicativo do sujeito.
2.
a) Como as orações, e as palavras tomadas material mente, se consideram do
número singular e do gênero masculino, quando o sujeito é expresso por uma oração
(plena ou reduzida), o adjetivo predicativo fica no masculino singular:
É justo que uma nação venere os seus poetas.
É honroso morrer pela pátria.
Capítulo 11
Pronomes
PRONOMES SUBSTANTIVOS E PRONOMES ADJETIVOS
1. Os
desempenham na oração as funções equivalentes às exercidas
pelos elementos nominais.
Servem, pois:
a) para representar um substantivo:
pronom es
Os campos, que suportaram a longa presença solar a queimá-los inces
santemente, recebem agora a água abundante com uma gula feliz.
(A. Frederico Schmidt, GB, 294.)
b) para acompanhar um substantivo determinando-lhe a extensão do signifi
cado:
— Quanto valem, és capaz de dizer? Leques espanhóis, de seda, de al
guma bisavó do meu tio cônego, com estas pérolas de prata e oiro!
(F. Namora, T/, 103.)
No primeiro caso desempenham a função de um substantivo e, por isso,
recebem o nome de pronom es substantivos; no segundo chamam-se pr o n o
mes adjetivos , porque modificam o substantivo, que acompanham, como se
fossem adjetivos.
2. Facilmente, aliás, se distinguem na prática essas duas classes de pronomes,
porque os pronom es substantivos aparecem isolados na frase, ao passo que
os pronomes adjetivos se empregam sempre junto de um substantivo, com o
qual concordam em gênero e número.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Assim, nas frases:
Lembranças a todos os teus.
(E. da Cunha, OC, II, 646.)
Teus olhos s ã o
d o is d e s e jo s .
(R. Correia, PCP, 109.)
a palavra teus é pronome substantivo, na primeira, e pronome adjetivo, na
segunda.
3. Há
s e is e s p é c i e s d e p r o n o m e s :
pe s so a is , po ss e s siv o s , d e m o n s t r a t iv o s ,
RELATIVOS, INTERROGATIVOS e INDEFINIDOS.
PRONOMES PESSOAIS
Os pronom es pessoais caracterizam-se:
1.
°) p o r d e n o ta r e m a s trê s p e s s o a s g r a m a tic a is , is to é, p o r te r e m a c a p a c id a d e
d e in d ic a r n o c o ló q u io :
a) quem fala = l.a pessoa: eu (singular), nós (plural);
b)
c)
com quem se fala = 2 .a pessoa : tu ( s in g u la r ) , vós ( p lu r a l) ;
de quem se fala = 3.a pessoa: ele, ela ( s in g u la r ) ; eles, elas ( p lu r a l) ;
2.
°) por poderem representar, quando na 3.a pessoa, uma forma nominal
anteriormente expressa:
Santas virtudes primitivas, ponde
Bênçãos nesta Alma para que ela se una
A Deus, e vá, sabendo bem por onde...
(A. de Guimaraens, OC, 149.)
Levantaram Dona Rosário, quiseram levantá-la, embora ela se opusesse,
choramingasse um pouco, dissesse que não lhe era possível fazê-lo.
(M. J. de Carvalho, AV, 137.)
3. °) por variarem de forma, segundo:
a) a f iu iç ã o q u e d e s e m p e n h a m n a o r a ç ã o ;
b) a acentuação que nela recebem.
O bservação:
A pessoa com quem se fala pode ser expressa também pelos chamados pronomes
d e t r a t a m e n t o , que se constroem com o verbo na 3.a pessoa. Veja-se o que sobre
essas formas e o seu emprego escrevemos adiante.
PRONOMES
FORMAS DOS PRONOMES PESSOAIS
Quanto à função, as formas do pronome pessoal podem ser retas o u obli
quas . R etas , quando funcionam como sujeito da oração; oblíquas , quando
nela se empregam fundamentalmente como objeto (direto ou indireto).
Quanto à acentuação, distinguem-se nos pronomes pessoais as formas
TÔNICAS d a s ÁTONAS.
O quadro abaixo mostra claramente a correspondência entre essas formas:
P
P
ro n o m es
r o n o m e s p e s s o a is o b l íq u o s
NÃO REFLEXIVO S
p e s s o a is
Á to n o s
R ETQ S
Sin g u lar
Plural
T
ô n ic o s
1 .a pessoa
eu
me
m im , comigo
2.
a pessoa
tu
te
ti, contigo
3.
a pessoa
ele, ela
o, a, lhe
ele, ela
1 .a pessoa
nós
nos
nós, conosco
2 .a pessoa
vós
vos
vós, convosco
3 .a pessoa
eles, elas
os, as, lhes
eles, elas
FORMAS O, LO E NO DO PRONOME OBLÍQUO
Quando o pronome oblíquo da 3.a pessoa, que funciona como objeto direto,
vem antes do verbo, apresenta-se sempre com as formas o, a, os, as.
Assim:
Não o ver para mim é um suplício.
Nunca a encontramos em casa.
João ainda não fez anos; ele os faz hoje.
Eles as trouxeram consigo.
Quando, porém, está colocado depois do verbo e se liga a este por hífen
( prono m e en c l ític o ), a sua forma depende da terminação do verbo.
Assim:
l . ° ) Se a forma verbal terminar em vogal o u d ito n g o oral , empregam-se
o, a, os, as:
Louvo-o
Louvava-a
Louvei-os
Louvou-as
2.°) Se a forma verbal terminar em -r, -s ou -z, suprimem-se estas consoantes,
e o pronome assume as modalidades lo, la, los, las, como nestes exemplos:
292
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Vê-lo para mim é um suplício.
Encontramo-la em casa.
João ainda não fez anos; fá-los hoje.
Não quero vendê-las.
O mesmo se dá quando ele vem posposto ao designativo eis ou aos pronomes
nos e vos:
Ei-lo sorridente.
O nome não vo-lo direi.
3.°) Se a forma verbal terminar em
modalidades no, na, nos, nas.
d ito n g o nasal, o
Dão-no
Põe-na
pronome assume as
Tem-nos
Trouxeram-nas
São também estas as formas que o pronome costuma apresentar, na lin
guagem popular e na literária popularizante de Portugal, depois dos advérbios
não e bem, assim como dos pronomes quem, alguém, ninguém e outras palavras
terminadas em ditongo nasal:
E assim pedia, num dó tamanho,
Não no tirassem lá donde estava.
(A. Nobre, S, 77.)
Neto sou de quem no sou!
(J. Régio, F, 13.)
Observações:
l . 8) As fo rm as an tig as d o p ro n o m e o b líq u o objeto d ire to eram lo(s) e la (s),
provenientes do acusativo do d em o n strativ o latin o ille, illa, illu d (= aquele, aquela,
aquilo). Pospostas a fo rm as verbais te rm in ad as em -r, -s ou -z, o seu /- inicial assi
m ilo u aquelas consoantes, q u e depois desapareceram :
fazer-lo
fazes-lo
fiz-lo
>
>
>
fazel-lo
fazel-lo
fil-lo
>
>
>
fazê-lo
faze-lo
fi-lo
Igual assim ilação sofreu o -s de eis, nos e vos, q u a n d o em co n tacto com o /- do
p ro n o m e.
PRONOMES
2.
a) Com as formas verbais terminadas em nasal, a nasalidade transmitiu-se ao
Z- do pronome, que passou a n-:
fazem-lo
façam-lo
>
>
fazem-no
façam-no
3.
a) No futuro do presente e no futuro do pretérito o pronome oblíquo não
pode ser encütico , isto é, não pode vir depois do verbo. Dá-se, então, a mesôclise
do pronome, ou seja, a sua colocação no interior do verbo. )ustifica-se tal colocação
por terem sido estes dois tempos formados pela justaposição do infinitivo do verbo
principal e das formas reduzidas, respectivamente, do presente e do imperfeito do
indicativo do verbo haver. O pronome empregava-se depois do infinitivo do verbo
principal, situação que, em última análise, ainda hoje conserva. E, como todo infi
nitivo termina em -r, também nos dois tempos em causa desaparece esta consoante
e o pronome toma as formas lo, la, los, las.
Assim:
F
u tu ro d o presente
Futu ro
d o p r e t é r it o
vender-(h)ei
vendê-lo-ei
vender-(h)ia
vendê-lo-ia
vender-(h)ás
vendê-lo-ás
vender-(h)ias
vendê-lo-ias
vender-(h)á
vendê-lo-á
vender-(h)ia
vendê-lo-ia
vender-(h)em os
vendê-lo-emos
vender-(h)íam os
vendê-lo-íamos
vender-(h)eis
vendê-lo-eis
vender-(h)íeis
vendê-lo-íeis
vender-(h)ão
vendê-lo-ão
vender-(h)iam
vendê-lo-iam
4.a) Quanto às normas que se observam no emprego proclítico, enclítico ou mesoclítico destes pronomes, veja-se o que dizemos adiante, ao tratarmos da C olocacào
DOS PRONOMES OBLÍQUOS ÁTONOS.
PRONOMES REFLEXIVOS E RECÍPROCOS
1. Quando o objeto direto ou indireto representa a mesma pessoa ou a mesma
coisa que o sujeito do verbo, ele é expresso por um pronom e reflexivo .
O reflexivo apresenta três formas próprias — se, si e consigo — , que se aplicam
tanto à 3.a pessoa do singular como à do plural:
Ele vestiu-se rapidamente.
Ela fala sempre de si.
O pintor não trouxe o quadro consigo.
Eles vestiram-se rapidamente.
Elas falam sempre de si.
Os pintores não trouxeram os quadros consigo.
294
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Nas demais pessoas, as suas formas identificam-se com as do pronome oblí
quo: me, te, nos e vos.
Eu me feri.
Tu te lavas.
Nós nos vestimos.
Vós vos levantais.
2. As formas do reflexivo nas pessoas do plural (nos, vos e se) empregam-se
também para exprimir a reciprocidade da ação, isto é,para indicar que a ação
é mútua entre dois ou mais indivíduos. Neste caso, diz-se que o pronome é
RECÍPROCO.
Carlos e eu nos abraçamos.
Vós vos queríeis muito.
José e Antônio não se cumprimentam.
3. Como são idênticas as formas do pronome recíproco e do reflexivo, pode
haver ambiguidade com um sujeito plural. Por exemplo, uma frase como a
seguinte:
Joaquim e Pedro enganaram-se.
pode significar que o grupo formado por Joaquim e Pedro cometeu o engano,
ou que Joaquim enganou Pedro e este a Joaquim.
Costuma-se remover a dúvida fazendo-se acompanhar tais pronomes de
expressões reforçativas especiais.
Assim:
a) para marcar expressamente a ação reflexiva, acrescenta-se-lhes, conforme a
pessoa, a mim mesmo, a ti mesmo, a si mesmo, etc.:
Joaquim e Pedro enganaram-se a si mesmos.
b) para marcar expressamente a ação recíproca, junta-se-lhes, ou uma expressão
pronominal, como um ao outro, uns aos outros, entre si:
Joaquim e Pedro enganaram-se entre si.
Joaquim e Pedro enganaram-se um ao outro.
ou um advérbio como reciprocamente, mutuamente:
Joaquim e Pedro enganaram-se mutuamente.
PRONOMES
Não raro, a reciprocidade da ação esclarece-se pelo emprego de uma forma
verbal derivada com o prefixo entre-:
As duas entreolharam-se e Luísa atendeu.
(Coelho Netto, OS, 1,67.)
Marido e mulher entreolharam-se.
(V. Nemésio, MTC, 360.)
EMPREGO DOS PRONOMES RETOS
FUNÇÕES DOS PRONOMES RETOS
1.
Os pronom es
a)
su ieito :
retos
empregam-se como:
Eu era a desdenhosa, a indiferente.
(F. Espanca, S, 55.)
Nós vamos em busca de luz.
(Agostinho Neto, SE, 36.)
Se és tu, meu pai, eu vou contigo...
(A. de Guimaraens, OC, 58.)
b ) PREDICATIVO DO SUJEITO:
Trata-se do seguinte: eu não sou mais eu! Revoguei-me a mim mesmo.
(A.M. Machado, CJ, 150.)
Meu Deus!, quando serei tu?
(J. Régio, ED, 157.)
2. Tu e vós p o d e m
ser
vocativos :
Ó tu, Senhor Jesus, o Misericordioso,
De quem o Amor sublime enaltece o Universo...
(A. de Guimaraens, OC, 313.)
Ó vós, que, no silêncio e no recolhimento
Do campo, conversais a sós, quando anoitece...
(O. Bilac, P, 158.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Na linguagem popular ou popularizante de Portugal aparece por vezes um pro
nome ele expletivo, que funciona como sujeito gramatical de um verbo impessoal,
à semelhança do francês il (ily a):
— Ele haveria no mundo nada mais acertado.
(M. Torga, CM, 24.)
— Pois ele pode haver maior colondrina por esses mundos fora.
(A. Ribeiro, M, 102.)
— Ele há tanta mulher por aí!...
(F. Namora, TJ, 258.)
É provável que este pronome expletivo tenha vitalidade em outras áreas do
idioma, pois aparece na pena de um escritor angolano:
Ele há tantas amarguras!
(Agostinho Neto, SE, 99.)
Os raríssimos exemplos que dele se colhem em escritores brasileiros, como este
de Machado de Assis:
Que ele também há eleições no Amazonas; é o tempo da salga política, a
quadra das barracas e dos regatões.
(OC,II, 698.)
representam simples imitação da construção portuguesa.
OMISSÃO DO PRONOME SUJEITO
Os pronomes sujeitos eu, tu, ele (ela), nós, vós, eles (elas) são normalmente
omitidos em português, porque as desinências verbais bastam, de regra, para
indicar a pessoa a que se refere o predicado, bem como o número gramatical
(singular ou plural) dessa pessoa:
ando
rimos
escreves
partistes
PRESENÇA DO PRONOME SUJEITO
Emprega-se o pronome sujeito:
dormiu
voltaram
PRONOMES
a) quando se deseja, enfaticamente, chamar a atenção para a pessoa do sujeito:
Eu, náufraga da vida, ando a morrer!
(F. Espanca, S, 31.)
Sim! tu sabes ligar-me a todos os teus crimes. Tu me sopras todos os
pensamentos maus, tu me apontas o abismo...
(Castro Alves, OC, 643.)
b) para opor duas pessoas diferentes:
Abraçamo-nos ambos contristados,
Ele, porque há de ser, como eu, um velho,
E eu, por ter sido já, como ele, um moço.
(E. de Castro, UV, 6 8 .)
Eu calo-me — tu descantas,
Eu rojo — tu te levantas,
Tu és livre — escrava eu sou!...
(Castro Alves, OC, 273.)
c) quando a forma verbal é comum à l.a e à 3.a pessoa do singular e, por isso,
se toma necessário evitar o equívoco:
É preciso que eu repita o que ele disse?
Ê preciso que ele repita o que eu disse?
EXTENSÃO DE EMPREGO DOS PRONOMES RETOS
Na linguagem formal, certos pronomes retos adquirem valores especiais.
Enumeremos os seguintes:
1. O plural de modéstia. Para evitar o tom impositivo ou muito pessoal de suas
opiniões, costumam os escritores e os oradores tratar-se por nós em lugar
da forma normal eu. Com isso, procuram dar a impressão de que as ideias
que expõem são compartilhadas por seus leitores ou ouvintes, pois que se
expressam como porta-vozes do pensamento coletivo. A este emprego da
l.a pessoa do plural pela correspondente do singular chamamos plural de
MODÉSTIA.
Comparem-se estes exemplos:
Algumas [cantigas], mas poucas, foram por nós colhidas da boca do
Povo.
(J. Cortesão, CP, 1 2 .)
297
298
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
As ocupações oficiais em que nos achamos desde 1861 a 1867, quer
nas repúblicas de Venezuela, Equador, Peru e Chile, quer nas próprias
Antilhas, não nos deram muita ocasião de pensar em semelhante
edição, para a qual até aí nos faltavam auxílios.
(E A. Varnhagen, CIA, 9.)
Advirta-se que, quando o sujeito nós é um plural d e m o d é s t ia , o predicativo
ou particípio, que com ele deve concordar, costuma ficar no singular, como
se o sujeito fosse efetivamente eu. Assim, em vez de:
Fiquei perplexo com o que ele disse.
podemos dizer:
Ficamos perplexo com o que ele disse.
2. O plural de majestade. O pronome nós era usado outrora pelos reis de Por
tugal — e ainda hoje o é pelos altos dignitários da Igreja — como símbolo
de grandeza e poder de suas funções:
Nós, Dom Fernando, pela graça de Deus Rei de Portugal e do Algarve,
fazemos saber...
É o q u e se c h a m a
plural de majestade .
O bservação:
De início, o nós majestático deveria ser uma fórmula de modéstia: o rei a confúndir-se com a nação, que falava por sua boca. Também na Igreja seria, no princípio,
uma forma de humildade: os prelados a solidarizarem-se com os seus fiéis dentro
de uma comunidade mediante o emprego do nós. Mas, perdido o valor originário,
este plural com que superiores se dirigiam a inferiores veio a ser sentido como uma
enfática expressão de grandeza, de poder, de majestade do cargo.
3. Fórmula de cortesia (3.apessoa pela l.a). Quando fazemos um requerimento,
por deferência à pessoa a quem nos dirigimos, tratamo-nos a nós próprios
pela 3.a pessoa, e não pela l.a:
Fulano de tal, aluno desse Colégio, requer a V. S.a se digne de mandar
passar por certidão as notas mensais por ele obtidas no presente ano
letivo.
O emprego da l.a pessoa:
Eu, Fulano de tal, requeiro...
PRONOMES
soa-nos como uma descortesia de nossa parte para com aquele a quem nos
endereçamos. Não seria propriamente um pedido que lhe faríamos, e sim
uma exigência ríspida de igual para igual.
4. O v ó s de cerimônia. O pronome vós praticamente desapareceu da linguagem
corrente do Brasil e de Portugal. Mas em discursos enfáticos alguns oradores
ainda se servem da 2 .a pessoa do plural para se dirigirem cerimoniosamente
a um auditório qualificado.
Veja-se este passo com que Olavo Bilac termina o seu discurso de ingresso
na Academia das Ciências de Lisboa:
Ainda de longe, pensarei em vós, e pensarei convosco. Serei um dos
menores sacerdotes do culto que nos congrega: o da nossa história
e da nossa língua. E, à míngua do brilho que vos posso dar, poderei
dar-vos o fervor da minha crença e a honestidade do meu labor.
(D N , 56.)
Observações:
1.
a) Vós, com referência a uma só pessoa, normal como tratamento de cerimô
nia em português antigo e clássico, emprega-se ainda, vez por outra, em linguagem
literária de tom arcaizante, para expressar distância, apreço social:
Por vós e todo o nosso temor. Por vós, que sois o nosso rei!
(J. Régio, ERS, 93.)
— Não percebeis vós que a prudência é para mim um dever?
(Gonçalves Dias, PCPE, 709.)
2.
a) Vós foi, durante muito tempo, a forma normal por que os católicos portu
gueses e brasileiros se dirigiam a Deus, tratamento que ainda prevalece entre eles:
Pai nosso que estais no Céu...
No culto reformado, adota-se a forma tu:
Pai nosso que estás no céu...
Na linguagem poética, este tratamento alterna com vós, desde a época medieval,
e é o predominante no português contemporâneo:1
I
Veja-se, a propósito, Luís Filipe Lindley Cintra. Sobre “formas de tratamentona língua
portuguesa. Lisboa, Horizonte, 1972, p. 75-122.
299
300
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Não é mortal o que eu em ti adoro.
Que és tu aqui? olhar de piedade,
Gota de mel em taça de venenos...
(A. de Quental, S, 3.)
Se te pedir piedade, dá-me lume a comer.
Que com pontas de fogo o podre se adormenta.
O teu perdão de Pai ainda não pode ser.
Mas lembre-te que é fraca a alma que aguenta.
('V. Nemésio, VM, 90.)
Tu, Senhor, tu meu Deus, tu me recebes
Na tua santa glória, alarga as asas
Do teu santo perdão, que ao teu conspecto
Humilhado me sinto, como a grama.
(Gonçalves Dias, PCPE, 467.)
Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?
Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes
Embuçado nos céus?
(Castro Alves, OC, 290.)
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus...
(Castro Alves, OC, 281.)
R EA LC E DO PRO N O M E SU JEITO
Para dar ênfase ao pronome sujeito, costuma-se reforçá-lo:
a) seja com as palavras mesmo e próprio:
— Tu mesmo serás o novo Hércules.
(Machado de Assis, OC, II, 548.)
Muitas vezes eu próprio me sinto ser o que ela pensa que eu sou.
(A. Abelaira, B, 129.)
b) seja com a expressão invariável é que:
— Eu é que lhe devia pedir desculpas de minha irritação.
(R. M. F. de Andrade, V, 124.)
PRONOMES
Vocês é que morrem, meu alferes, mas nós é que pagamos.
(Luandino Vieira, NM, 63.)
As dores é que eram de matar...
(M. Torga, CM, 72.)
P R E C E D Ê N C IA DOS PRO N O M ES SU JEITO S
Quando no sujeito composto há um da l.a pessoa do singular {eu), é boa
norma de civilidade colocá-lo em último lugar:
Carlos, Augusto e eu fomos promovidos.
Se, porém, o que se declara contém algo de desagradável ou importa respon
sabilidade, por ele devemos iniciar a série:
Eu, Carlos e Augusto fomos os culpados do acidente.
O bservação:
Convém usar com extrema parcimônia as formas pronominais da 1.a pessoa do
singular, especialmente a forma reta eu. O seu emprego imoderado deixa-nos sempre
uma penosa impressão de imodéstia de quem o pratica.
Não nos devemos esquecer de que as palavras que designam sentimentos exa
gerados da própria personalidade começam sempre por ego, que era a forma latina
do pronome eu.
Assim:
egoísmo, egocêntrico, ególatra, egotismo.
EQUÍVOCOS E IN C O RR EÇ Õ ES
1. Como o pronome ele {ela) pode representar qualquer substantivo anterior
mente mencionado, convém ficar bem claro a que elemento da frase ele se
refere.
Por exemplo, uma frase como:
Álvaro disse a Paulo que ele chegaria primeiro,
é ambígua, pois ele pode aplicar-se tanto a Álvaro como a Paulo.
2. Por outro lado, não devemos empregar o pronome ele {ela) para substituir
um substantivo que, com sentido indeterminado, se fixou em expressões
feitas, como falar verdade, pedir perdão, etc.
302
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Assim, não estariam bem construídas as frases:
Falaste verdade; ela me comoveu.
Pedi perdão; ele me foi concedido.
3. Se, no entanto, o substantivo estiver determinado, isto é, se não mais per
tencer a uma daquelas fórmulas fixas, tem perfeito cabimento o emprego do
pronome.
Assim:
Falaste a verdade; ela me comoveu.
Pedi o seu perdão; ele me foi concedido.
4. Na fala vulgar e familiar do Brasil2 é muito frequente o uso do pronome
ele(s), ela{s) como objeto direto em frases do tipo:
Vi ele.
Encontrei ela.
Embora esta construção tenha raízes antigas no idioma, pois se documenta
em escritores portugueses dos séculos XIII e XIV3, deve ser hoje evitada.
5. Convém, no entanto, não confundir tal construção com outras, perfei
tamente legítimas, em que o pronome em causa funciona como objeto
direto.
Assim:
a) quando, antecedido da preposição a, repete o objeto direto enunciado pela
forma normal átona (o, a, os, as):
Não sei se elas me compreendem
Nem se eu as compreendo a elas.
(F. Pessoa, OP, 160.)
J Veja-se especialmente J. Mattoso Câmara Jr. Ele comme un accusatif dans le portugais du
Brésil. In M isc e lâ n e a h o m e n a je a A n d r é M a r tin e t: e stru c tu ra lism o e h isto ria , 1.1. La Laguna,
Universidad de La Laguna, 1957, p. 39-46; artigo reproduzido, em tradução portuguesa,
nos D ispersos. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1972, p. 47-53.
3 Sobre o emprego do pronome ele(s), ela (s) como objeto direto em português arcaico,
leiam-se: Epifânio Dias. S y n ta x e h istó rica p o rtu g u e sa , 2.a ed. Lisboa, Clássica Editora, 1953,
p. 71; Joseph Huber. A ltp o rtu g ie sisc h e s E le m e n ta rb u rc h . Heidelberg, Carl Winter, 1933, p.
150; Sousa da Silveira, Trechos seletos, 4.d ed., São Paulo, Companhia Editora Nacional,
1938, p. 40 e 50.
PRONOMES
Temia-a, a ela, à mulher que o guiava.
(Guimarães Rosa, PE, 126.)
b) quando precedido das palavras todo ou só:
Ricas prendas! Todas elas
Me deu ele; sim, donzelas...
Que não vo-lo negarei!
(J. de Deus, CF, 65.)
— Conheço bem todos eles.
(H. Sales, DBFM, 150.)
CO N TRAÇÃO DAS P R EP O SIÇ Õ ES DE E EM COM O
PRO N O M E R ETO D A 3.a PESSO A
As preposições de e em contraem-se com o pronome reto da 3.®pessoa ele(s),
ela{s), dando, respectivamente, dele(s), dela(s) e nele{s), nela(s).
A pasta é dele, e nela está o meu caderno.
É de norma, porém, não haver a contração quando o pronome é sujeito; ou,
melhor dizendo, quando as preposições de e em se relacionam com o infinitivo,
e não com o pronome.
Assim:
O milagre de ele existir tinha-se dado já, no momento em que a mulher
lhe anunciara a gravidez.
(M. Torga, CM, 74.)
— Para que há de ele desconfiar de nós e maltratar-te?
(Machado de Assis, CO, 1,690.)
Pouco depois de eles saírem, levantei-me da mesa.
(L. B. Honwana, NMCT, 96.)
PRONOMES DE TRATAMENTO
1. Denominam-se p r o n o m e s d e t r a t a m e n t o certas palavras e locuções que
valem por verdadeiros pronomes pessoais, como: você, o senhor, Vossa Ex
celência.
303
304
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Embora designem a pessoa a quem se fala (isto é, a 2.a), esses pronomes
levam o verbo para a 3.a pessoa:
— Onde é que vocês vão?
(Luandino Vieira, NM, 78.)
— Vossa Reverendíssima faz isso brincando, disse o principal dos
festeiros.
(Machado de Assis, OC, II, 550.)
— Vossa Senhoria, senhor Comendador, terá de perdoar.
(A. Ribeiro, M, 354.)
2. Convém conhecer as seguintes formas de tratamento reverente e as abrevia
turas com que são indicadas na escrita:
A
b r e v ia t u r a
T
U sa d o
r a ta m en to
para
V. A.
Vossa Alteza
Príncipes, arquiduques, duques
V. Em.a
Vossa Eminência
Cardeais
V. Ex.a
Vossa Excelência
No Brasil: altas autoridades do go
verno e oficiais generais das Forças
Armadas; em Portugal: qualquer
pessoa a quem se quer manifestar
grande respeito.
V. Mag.a
Vossa Magnificência
Reitores das universidades
V.M.
Vossa Majestade
Reis, imperadores
V. Ex.a Rev.1™
Vossa Excelência Reverendíssima
Bispos e arcebispos
V.P.
Vossa Paternidade
Abades, superiores de conventos
V. Rev.a
Vossa Reverência ou
Sacerdotes em geral
V. Rev.ma
Vossa Reverendíssima
v.s.
Vossa Santidade
Papa
V.S.a
Vossa Senhoria
Funcionários públicos graduados,
oficiais até coronel; na linguagem
escrita do Brasil e na popular de
Portugal, pessoas de cerimônia.
PRONOMES
Observações:
1.
a) Como dissemos, estas formas aplicam-se à 2.a pessoa, àquela com quem
falamos; para a 3.“ pessoa, aquela de quem falamos, usam-se as formas Sua Alteza,
Sua Eminência, etc. Mas as últimas podem empregar-se com o valor das primeiras,
como expressão de máxima cerimônia, mormente quando seguidas de aposto que
contenha um título determinado por artigo. Assim, em lugar de:
Vossa Excelência, Senhor Ministro, aprova a medida?
é lícito dizer-se:
Sua Excelência, o Senhor Ministro, aprova a medida?
2.
a) Em princípio, os pronomes de tratamento da 2.a pessoa devem acompanhar
o verbo para evitar confusão com o sujeito da 3.® pessoa:
Seu irmão cantava, e você acompanhava.
Vossa Reverência já leu este livro?
Esta norma é naturalmente observada com maior rigor na linguagem escrita,
pois na comunicação oral as possíveis dúvidas são muitas vezes eliminadas pela
própria situação.
Não é, porém, necessário repetir tais pronomes quando funcionam como sujeito
de vários verbos consecutivos.
Você parece que não está com nenhuma vontade de ver aquele finório, não é?
(A. Callado, MC, 104.)
— Quer V. Exa. dizer que antes queria escrever uma bonita página do que
receber assim perto de quinhentas libras?
(Eça de Queirós, O, II, 176-177.)
EM P R EG O DOS PRO N O M ES DE TRA TA M EN TO DA 2.a PESSO A
1. Tu e você. No português europeu normal, o pronome tu é empregado como
forma própria da intimidade. Usa-se de pais para filhos, de avós ou tios para
netos e sobrinhos, entre irmãos ou amigos, entre marido e mulher, entre
colegas de faixa etária igual ou próxima. O seu emprego tem-se alargado,
nos últimos tempos, entre colegas de estudo ou da mesma profissão, entre
membros de um partido político e até, em certas famílias, de filhos para
pais, tendendo a ultrapassar os limites da intimidade propriamente dita,
305
306
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
em consonância com uma intenção igualitária ou, simplesmente, aproxi
mativa.
No português do Brasil, o uso de tu restringe-se ao extremo Sul do país e a
alguns pontos da região Norte, ainda não suficientemente delimitados.J Em
quase todo o território brasileiro, foi ele substituído por você como forma de
intimidade. Você também se emprega, fora do campo da intimidade, como
tratamento de igual para igual ou de superior para inferior.
É este último valor, de tratamento igualitário ou de superior para inferior
(em idade, em classe social, em hierarquia), e apenas este, o que você possui
no português normal europeu, onde só excepcionalmente — e em certas
camadas sociais altas — aparece usado como forma carinhosa de intimidade.
No português de Portugal não é ainda possível, apesar de certo alargamento
recente do seu emprego, usar você de inferior para superior, em idade, classe
social ou hierarquia.
2. O senhor. O senhor, a senhora (ea senhorita, no Brasil, a menina, em Portugal,
para a jovem solteira) são, nas variantes europeia e americana do português,
formas de respeito ou de cortesia e, como tais, se opõem a tu e você, em
Portugal, e a você, na maior parte do Brasil.
Em Portugal, quando uma pessoa se dirige a alguém que possui um título
profissional ou exerce determinado cargo, costuma fazer acompanhar as
formas o senhor e a senhora da menção do respectivo título ou cargo:
o senhor doutor
a senhora doutora
o senhor engenheiro
o senhor capitão
o senhor ministro
o senhor presidente
Mais raramente, usa-se como tratamento o título não precedido de senhor,
senhora, o que é considerado menos respeitoso que a forma anterior:
o doutor
o engenheiro
Neste caso, é mais frequente apor-se ao título o nome próprio (primeiro
nome — o que implica certa proximidade — ou o nome de família do in
terpelado):
o doutor Orlando
o engenheiro Silva4
4 Ressalte-se, porém, que o emprego das formas obliquas te, ti, contigo apresenta uma difosão
bastante maior.
PRONOMES
No Brasil, estas formas de tratamento são inusitadas. Aliás, o emprego dos
títulos específicos, no tratamento ou fora dele, é sensivelmente maior em
Portugal do que no Brasil, onde só em casos especialíssimos vêm precedidos
de o senhor.
Sistematicamente, só se mencionam no Brasil, seguidos dos nomes próprios:
a) a patente dos militares:
O Tenente Barroso
O Coronel Proença
O General Osório
O Major Fagundes
O Almirante Jaceguai
O Brigadeiro Eduardo Gomes
b) os altos cargos e títulos nobiliárquicos:
O Presidente Bemardes
O Príncipe D. João
O Embaixador Ouro Preto
A Condessa Pereira Carneiro
c) o título Dom (escrito abreviadamente D.), para os membros da família real
ou imperial, para os nobres, para os monges beneditinos e para os dignitários
da Igreja a partir dos bispos:
D. Pedro
D. Duarte
D. Clemente
D. Hélder
Observe-se que, se Dom tem emprego restrito no idioma, tanto em Portugal
como no Brasil, o feminino Dona (também abreviado em D.) se aplica, em
princípio, a senhoras de qualquer classe social.5
De uso bastante generalizado em Portugal e no Brasil é o título de Doutor.
Recebem-no não só os médicos e os que defenderam tese de doutorado, mas,
indiscriminadamente, todos os diplomados por escolas superiores.
Também o emprego de Professor é muito frequente tanto em Portugal como
no Brasil. Mas, enquanto no Brasil se aplica ao docente de qualquer grau de
ensino, em Portugal usa-se sobretudo para os docentes do ensino primário
e do ensino superior.
Observações:
l.a) As fonnas você e o senhor (a senhora) empregam-se normalmente nas funções
de sujeito, de agente da passiva e de adjunto:
’ Em Portugal, omite-se ainda, por vezes, com os nomes de senhoras das classes sociais mais
h u m ild e s .
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
— Você amanhã não vá às ceifas.
(A. Ribeiro, M, 354.)
Estava desfeiteado, um portador dele fora maltratado pelo senhor,
(J. Lins do Rego, P, 59.)
— Deixem-me ir com vocês!
(Luandino Vieira, NM, 78.)
As formas vo cê (no Brasil) e o s e n h o r , a s e n h o r a (tanto em Portugal como no
Brasil) estendem-se também às funções de objeto (direto ou indireto), substituindo
com frequência as correspondentes átonas o, a e lhe:
— Há uma hora estou esperando você sozinha, neste escritório.
(C. dos Anjos, DR, 32.)
— Devo a você e ao doutor Rodrigo.
Q. Amado, MM, 229.)
— Eu aprecio muito o senhor e era incapaz de ofendê-lo voluntariamente.
(R. M. F. de Andrade, V, 124.)
2.
a) O pronome tu era até bem pouco tempo, no português de Portugal, a forma
própria de marcar as distâncias de superior para inferior hierárquico. Este tratamento
caiu em quase total desuso e, hoje, tanto na variante idiomática brasileira como na
portuguesa, é a forma o s e n h o r que, na referida situação, se usa com este valor.
3.
a) Pelas razões aduzidas no capítulo 3, p. 73, quando anteposta a um nome
próprio, a palavra s e n h o r assume na linguagem corrente de Portugal e, principal
mente, do Brasil a forma seu:
— Seu Malhadas, seu Malhadas, fosse você cavalheiro, não aceitava o meu
copo!
(A. Ribeiro, M, 67.)
— Seu Firmino, o senhor duvida da minha palavra?
— Deus me livre, seu Alexandre. Quem é que duvida?
(G. Ramos, AOH, 111.)
— Seu Coronel não me verá mais, não senhor.
(A. Peixoto, RC, 938.)
Observe-se, nos dois últimos exemplos, a concorrência da forma proclítica e da
forma plena, esta sob o acento tônico.
PRONOMES
3. Tratamento cerimonioso. As formas de tratamento propriamente cerimo
nioso usam-se muito menos no Brasil do que em Portugal.
1.
°) Vossa Excelência ( V. Ex.a). Embora o seu emprego, no português europeu,
se tenha restringido bastante nas últimas décadas, e em particular nos últimos
anos, ainda se usa a forma Vossa Excelência, na linguagem oral, em determinados
ambientes (por ex.: academias, corpo diplomático) ou situações (empregado
de comércio dirigindo-se a cliente, telefonista dirigindo-se a quem solicita uma
ligação, etc.), sem que haja qualquer discriminação nítida quanto à categoria da
pessoa interpelada. Por vezes aparece reduzida à forma coloquial Vossência.
Na linguagem escrita, sob a forma abreviada V. Ex.a, é largo o seu uso, prin
cipalmente na correspondência oficial e comercial.
No Brasil só se emprega para o Presidente da República, ministros, gover
nadores dos estados, senadores, deputados e oficiais-generais. E assim mesmo
quase que exclusivamente na comunicação escrita e protocolar. Em requerimen
tos, petições, etc., o seu uso costuma estender-se a presidentes de instituições,
diretores de serviço e altas autoridades em geral.
2.
°) Vossa Senhoria {V. S.a). É um tratamento praticamente inexistente na
língua falada de Portugal e do Brasil. Na língua escrita, emprega-se ainda em
ambas as variedades idiomáticas — mas cada vez menos — em cartas comer
ciais, em requerimentos, em ofícios, etc., quando não é próprio o tratamento
de Vossa Excelência.
3.
°) As outras formas — Vossa Eminência, Vossa Magnificência, Vossa San
tidade, etc. — são protocolares e só se aplicam aos ocupantes dos cargos atrás
indicados. Por vezes, no tratamento direto, é possível substituí-las por formas
também respeitosas, mas menos solenes. A um sacerdote, por exemplo, é comum
tratar-se, em lugar de Vossa Reverência ou Vossa Reverendíssima, por o senhor,
ou, no português europeu, por o senhor Padre.
4. Outras formas de tratamento. Frequente no português de Portugal, e muito
raro no do Brasil, é o emprego das formas nominais antecedidas de artigo
em vez das formas pronominais ou pronominalizadas de tratamento.
São exemplos dessas formas nominais:
a) o nome próprio, seja o de batismo, seja o de família:
— O Manuel já leu este livro?
— O Martins já leu este livro?
b) os nomes de parentesco ou equivalentes:
— O pai já leu este livro?
— A mãe já leu este livro?
— O meu filho já leu este livro?
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
c) outros nomes que situam o interlocutor em relação à pessoa que fala:
— O meu amigo já leu este livro?
— O patrão já leu este livro?
— O cavalheiro já leu este livro?
FÓRMULAS DE REPRESENTAÇÃO DA 1.a PESSOA
No colóquio normal, emprega-se a gente por nós e, também, por eu:
Houve um momento entre nós
Em que a gente não falou.
(R Pessoa, QGP, n.° 270.)
— Não culpes mais o Barbaças, compadre! A gente só queria gastar
um bocadito do dinheiro.
(F. Namora, 77, 165.)
— Você não calcula o que é a gente ser perseguida pelos homens.
Todos me olham como se quisessem devorar-me.
(C. dos Anjos, DR, 41.)
Como se vê dos exemplos acima, o verbo deve ficar sempre na 3.a pessoa
do singular. Também na 3.a pessoa do singular deve ficar o verbo que tem por
sujeito outras expressões substantivas que representam a 1.a pessoa do singular,
como o brasileirismo o degas, que às gerações mais novas já se afigura um tanto
antiquado:
— Então, adeus. Mande cá no degas...
(J. Amado, MM, 101.)
Não sendo pexote, e soltando arame, que vida supimpa a do degas!
(C. Drummond de Andrade, CJB, 69.)
EMPREGO DOS PRONOMES OBLÍQUOS
FORMAS TÔNICAS
Sabemos que as formas oblíquas tônicas dos pronomes pessoais vêm acompa
nhadas de preposição. Como pronomes, são sempre termos da oração e, de acordo
com a preposição que as acompanhe, podem desempenhar as funções de:
PRONOMES
3)
COMPLEMENTO NOMINAL:
Vou ver-me livre de ti...
(B. Santareno, TPM, 24.)
O meu ódio a ela crescia dia a dia.
(J. Lins do Rego, ME, 54.)
b ) o b je t o in d ir e t o :
— Posso mandar incumbi-la de mostrar a ti os pontos pitorescos de
Piratininga...
(C. dos Anjos, M, 302.)
Não a diria a ninguém,
Nem a ti se eu a soubesse!
(A. Botto, C, 261.)
c)
(antecedido da preposição a e dependente, em geral, de verbos
que exprimem sentimento):
o b ie t o d ir e t o
Paciente, obreira e dedicada, é a ela que em verdade eu amo.
(J. Rodrigues Miguéis, GTC, 159.)
Rubião viu em duas rosas vulgares uma festa imperial, e esqueceu a
sala, a mulher e a si.
(Machado de Assis, OC, 1,679. )
d ) a g e n t e d a p a s s iv a :
Eu sou daqueles que foram por ele consolados.
(Graça Aranha, OC, 79.)
Os nossos amores não serão esquecidos nunca— por mim, está claro,
e estou certo que nem por ti.
(Machado de Assis, OC, 1,688.)
e)
ADJUNTO a d v e r b i a l :
Eu já te vejo amanhã a colher flores comigo pelos campos.
(F. Pessoa, OP, 167.)
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Contigo, Antônio, Antônio Machado,
contigo quisera passear,
por manhã de serra, por noite de rio,
por nascer de luar.
(C. Meireles, OP, 344.)
O bservação:
Do cruzamento das duas construções perfeitamente corretas:
Isto não é trabalho para eu fazer
e
Isto não é trabalho para mim,
surgiu uma terceira:
Isto não é trabalho para mim fazer,
em que o sujeito do verbo no infinitivo assume a forma oblíqua.
A construção parece ser desconhecida em Portugal, mas no Brasil ela está muito
generalizada na língua familiar, apesar do sistemático combate que lhe movem os
gramáticos e os professores do idioma.
E m p re g o e n fá tic o d o p ro n o m e o b líq u o tô n ic o
Para se ressaltar o objeto (direto ou indireto), usa-se, acompanhando um
pronome átono, a sua forma tônica regida da preposição a:
Ele não via nada, via-se a si mesmo.
(Machado de Assis, OC, 1,431.)
O Abravezes dava-lhe razão a ela, em princípio...
(U. Tavares Rodrigues, PC, 202.)
P ro n o m e s p re c e d id o s d e p re p o s iç ã o
As formas oblíquas tônicas mim, ti, ele (ela), nós, vós, eles (elas) só se usam
antecedidas de preposição.
Assim:
Fez isto para mim.
Gosto de ti.
A ele cabe decidir.
PRONOMES
Orai por nós.
Confiamos em vós.
Não há discordância entre elas.
Se o pronome oblíquo for precedido da preposição com, dir-se-á comigo,
contigo, conosco e convosco. É regular, no entanto, a construção com ele (com ela,
com eles, com elas):
Estive com ele agora mesmo.
Fui com elas visitar o irmão.
Normal é também o emprego de com nós e com vós quando os pronomes vêm
reforçados por outros, mesmos, próprios, todos, ambos ou qualquer numeral:
Terá de resolver com nós mesmos.
Estava com vós outros.
Saiu com nós três.
Contava com todos vós.
Observações:
1
.a) Empregam-se as formas eu e tu depois das preposições acidentais afora, fora,
exceto, menos, salvo e tirante:
Afinal, todos exceto eu, sabem o que sou...
(C. dos Anjos, DR, 43.)
— Toda a gente desconfiava disso, menos eu.
(Alves Redol, BC, 336.)
2.a) A tradição gramatical aconselha o emprego das formas oblíquas tônicas
depois da preposição entre. Exemplo:
— Foi um duelo entre mim e a velhice.
(Machado de Assis, OC, I, 1085.)
Que diferença há entre mim e um fidalgo qualquer?
(Sttau Monteiro, FL, 29.)
Por que vens, pois, pedir-me adorações quando entre mim e ti está a cruz
ensanguentada do calvário?
(A. Herculano, E, 44.)
31B
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Na linguagem coloquial predomina, porém, a construção com as formas retas,
construção que se vai insinuando na linguagem literária:
Entre eu e tu,
Tão profundo é o contrato
Que não pode haver disputa.
(J. Régio, ED, 91.)
Entre eu e minha mãe existe o mar.
(Ribeiro Couto, PR, 365.)
3.“) Com a preposição até usam-se as formas oblíquas mim, ti, etc.:
Curvam-se, agarram a rede, erguem-na até si.
(R. Brandão, P, 154.)
Um grito do velho Zé Paulino chegou até mim.
(I. Lins do Rego, D, 255.)
Se, porém, até denota inclusão, e equivale a mesmo, também, inclusive, constrói-se
com a forma reta do pronome:
Pois é de pasmar, mas é verdade. E até eu já tive hoje quem me oferecesse
champanhe.
([. Régio, SM, 156.)
Até eu, que sou muito avesso a esses corre-corres, a esse espevitamento de
tomar o cheiro dos famanazes em trânsito, saí-me dos meus cuidados e fui
até o Ministério.
(M. Bandeira, AA, 341.)
FORMAS ÁTONAS
1. São formas próprias do
o b ie t o d i r e t o
o, a, os, as:
Eu avisei-o.
(B. Santareno, TPM, 20.)
Ele olhou-a, espantado.
(Ferreira de Castro, OC, 1,481.)
PRONOMES
Ângela dominava-os a todos, vencia-os.
(R. Pompeia, A, 222.)
É preciso acompanhá-las.
(Coelho Netto, OS, 1,45.)
2 . São formas próprias do
o b ie t o in d ir e t o
:
lhe, lhes:
O capitão lhe garantira que tudo fora um mal-entendido.
(M. Palmério, VC, 286.)
Soube inspirar-lhes confiança.
(B. Santareno, TPM, 84.)
3. Podem empregar-se como o b i e t o
a)
o b ie t o d i r e t o
d ir e t o o u i n d i r e t o
:
me, te, nos e vos.
:
Queres ouvir-me um instante, sensatamente?
(U. Tavares Rodrigues, PC, 153.)
Queria-te ver lá em cima.
(Luandino Vieira, ATM, 3.)
Vinde e contemplai-nos, que entardece.
(C. Meireles, OP, 318.)
Ninguém vos abandona, senhor.
(). Régio, ERS, 90.)
b ) o b je t o in d ir e t o :
Chamava-me o seu alferes.
(Machado de Assis, OC, II, 234.)
— Ninguém te vai agradecer.
(Alves Redol, BSL, 355.)
Só a leitura dos grandes livros nos pode trazer a compensação das
misérias de certos homens de letras.
(A. R Schmidt, GB, 331.)
— Ouvis o que vos pergunto?
(J. Régio, ERS, 186.)
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O p ro n o m e o b líq u o á to n o s u je it o d e u m in fin it iv o
Se compararmos as duas frases:
Mandei que ele saísse...
Mandei-o sair.
verificamos que o objeto direto, exigido pela forma verbal mandei, é expresso:
a) na primeira, pela oração que ele saísse;
b) na segunda, pelo pronome seguido do infinitivo: o sair. E verificamos, tam
bém, que o pronome o está para o infinitivo sair como o pronome ele para
a forma finita saísse, da qual é sujeito. Logo, na frase acima o pronome o
desempenha a função de sujeito do verbo sair.
Construções semelhantes admitem os pronomes me, te, nos, vos (e o reflexivo
se, que estudaremos à parte). Exemplo:
Deixe-me falar.
Mandam-te entrar.
Fez-nos sentar.
E m p re g o e n fá tic o d o p ro n o m e o b líq u o á to n o
1. Para dar realce ao objeto direto, costuma-se colocá-lo no início da frase e,
depois, repeti-lo com a forma pronominal o (a, os, as), como nestes passos:
Verdades, quem é que as quer?
(F. Pessoa, OP, 530.)
O meu avô, nunca o vi rezando.
(J. Lins do Rego, ME, 83.)
Note-se que, se o objeto direto for constituído de substantivos de gêneros di
ferentes, o pronome que os resume deve ir para o masculino plural — os:
Se Paulo desejava mesmo escândalo e agitação, teve-os à vontade.
(M. Palmério, VC, 307.)
Salas e coração, habita-os a saudade!
(A. de Oliveira, P, III, 109.)
PRONOMES
2 . Também o pronome lhe (lhes) pode reiterar o objeto indireto colocado no
início da frase. Comparem-se os conhecidos provérbios:
Ao pobre não lhe prometas e ao rico não lhe faltes.
Ao médico e ao abade, fala-lhes sempre a verdade.
O p ro n o m e d e in te re s s e
Em frases como as seguintes:
Olhem-me para ela: é o espelho das donas de casa!
(A. Ribeiro, M, 101.)
Ânimo, Brás Cubas, não me sejas palerma.
(Machado de Assis, OC, 1,534.)
o pronome me não desempenha função sintática alguma. É apenas um recurso
expressivo de que se serve a pessoa que fala para mostrar que está vivamente
interessada no cumprimento da ordem emitida ou da exortação feita.
Este p r o n o m e d e i n t e r e s s e , também conhecido por d a t iv o é t i c o o u d e
p r o v e i t o , é de uso frequente na linguagem coloquial, mas não raro aparece na
pena de escritores.
Por vezes o seu valor se dilui num me expletivo, produzindo belos efeitos:
Desde menino me choro
E ainda não me achei fim!
(F. Pessoa, OP, 543.)
Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
(V. de Morais, PCP, 333.)
P ro n o m e á to n o co m v a lo r p o ss e s s iv o
Os pronomes átonos que funcionam como objeto indireto (me, te, lhe, nos,
vos, lhes) podem ser usados com sentido possessivo, principalmente quando se
aplicam a partes do corpo de uma pessoa ou a objetos de seu uso particular:
Escutaste-lhe a voz? Viste-lhe o rosto?
Osculaste-lhe as plantas?
Tocaste-lhe os vestidos resplendentes?
(Fagundes Varela, PC, II, 272.)
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O barro que em quimeras modelaste
Quebrou-se-te nas mãos.
(C. Pessanha, C, 64.)
Duas lágrimas toldam-lhe a vista, um soluço prende-se-lhe no peito.
(O. Mendes, P, 166.)
P ro n o m e s c o m p le m e n to s d e v e rb o s d e re g ê n c ia d is tin ta
Podemos empregar um só pronome como complemento de vários verbos
quando estes admitem a mesma regência, ou seja, quando o pronome em causa
desempenha idêntica função com referência a cada verbo.
Assim, a frase:
Só Roberto m e viu e cumprimentou.
está perfeita, porque os verbos ver e cumprimentar pedem objeto direto, que, no
caso, vem expresso pelo pronome me.
Se disséssemos, porém:
Só Roberto m e viu e deu as costas,
a frase não estaria bem construída, porque o me ficaria sendo, a um tempo,
objeto direto de ver e indireto de dar.
Nesse caso, é de boa norma repetirmos o pronome:
Só Roberto m e viu e m e deu as costas,
ainda que da construção abreviada se tenham servido alguns dos melhores
escritores da língua.6
O bservação:
Ainda quando complemento de verbos que tenham a mesma regênda, o pronome
só deve ser omitido com o segundo verbo e seguintes se estiver proclítico ao primeiro
da série, como no exemplo citado:
6 Com razão, diz Mário Barreto que esta regra “não é artificial, e não a combate, nem destrói
a infração dela em certos casos, em que praticamente o autorizam os usos e modismos da
língua, como as locuções entrar e sair do carro, vão e vêm do campo, chegar ou sair de casa,
empregadas por muitos e bons escritores”. (Novíssimos estudos da língua portuguesa. 2.a
edição revista. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1924, p. 112-113, nota).
PRONOMES
Só Roberto m e viu e cumprimentou.
Vindo enclítico ao primeiro, convém repeti-lo com os demais. Dir-se-á, pois:
Viu-me e cumprimentou-me
ou
Viu-me e me cumprimentou (construção desusada em Portugal)
e não
Viu-me e cumprimentou
O que se disse do pronome enclítico aplica-se ao mesoclítico.
Assim:
Procurar-me-ão e encontrar-me-ão
ou
Procurar-me-ão e me encontrarão (desusada em Portugal)
e não
Procurar-me-ão e encontrarão
V a lo re s e e m p re g o s d o p ro n o m e s e
O pronome se emprega-se como:
a) o b j e t o d i r e t o (emprego mais comum):
Ao sentir aquela robustez nos braços, meu pai tranquilizou-se e
tranquilizou-o.
(G. Amado, HMI, 124.)
Viu-se ao espelho, cadavérico.
(U. Tavares Rodrigues, NR, 107.)
b)
o b je t o in d ir e t o
:
Sofia dera-se pressa em tomar-lhe o braço.
(Machado de Assis, OC, 1,656.)
Perguntava-se a si mesma Teresa se aquela horrorosa situação seria
um sonho.
(C. Castelo Branco, OS, 1,390.)
Emprego menos raro quando exprime a reciprocidade da ação:
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Os nossos olhos muito perto, imensos
No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
(J. Régio, PDD, 83.)
Os estudantes passavam diante dos examinadores aglomerados,
chocando-se uns aos outros como gado saindo em redemoinho da
porta do curral.
(G. Amado, HMJ, 191.)
C) SUJEITODEUMINFINITIVO:
Virgüia deixou-se cair, no canapé, a rir.
(Machado de Assis, OC, 1,497.)
Moura Teles deixou-se conduzir passivamente.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 607.)
d ) PRONOME a p a s s iv a d o r :
Ouve-se ainda o toque de rebate.
(B. Santareno, TPM, 121.)
Fez-se novo silêncio.
(Coelho Netto, 0 5 ,1,97.)
e)
(junto à 3.3 pessoa do singular
de verbos intransitivos, ou de transitivos tomados intransitivamente):
s ím b o l o
de
iN D ETER M iN A Ç À O d o s u j e i t o
Vive-se ao ar livre, come-se ao ar livre, dorme-se ao ar livre.
(R. Brandão, P, 165.)
Martelava-se, serrava-se, acepilhava-se.
(Coelho Netto, 0 5 ,1, 131.)
f)
palavra expletiva (para
realçar, com verbos intransitivos, a espontaneidade
de uma atitude ou de um movimento do sujeito):
As estrelas dirão: — “Ai! nada somos,
Pois ela se morreu, silente e fria...”
(A. de Guimaraens, OC, 258.)
PRONOMES
Foi-se embora e à passagem, mascando o charuto, mediu Maria
Antônia de alto a baixo.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 929.)
...Vão-se as situações, e eles com elas.
(A. Magalhães, OC, 798.)
g)
p a r t e in t e g r a n t e
de certo s verbo s
que geralmente exprimem sentimen
to, ou mudança de estado: admirar-se, arrepender-se, atrever-se, indignar-se,
queixar-se; congelar-se, derreter-se, etc.
— Atreva-se. Atreva-se, e verá.
(M. Torga, NCM, 48.)
D. Adélia queixava-se baixinho.
(G. Ramos, A, 136.)
Leonel arrependeu-se da frase inútil e dura.
(J. Paço d ’Arcos, CVL, 846.)
Observações:
1.
a) No português antigo e médio usava-se normalmente a passiva pronominal
com agente expresso, como ilustra este passo camoniano:
Aqui se escreverão novas histórias
Por gentes estrangeiras que virão.
(Ltis., VII, 55.)
Na língua moderna evita-se tal prática. Daí soar-nos artificial uma construção
como a seguinte:
Este verbo, em nossa língua, nunca se usou pelos escritores vernáculos senão
como equivalente de amar.
(R. Barbosa, R, n.° 384.)
2. a) Em frases do tipo:
Vendem-se casas.
Compram-se móveis.
consideram-se casas e móveis os sujeitos das formas verbais vendem e compram, razão
por que na linguagem cuidada se evita deixar o verbo no singular.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
C o m b in a ç õ e s e c o n tra ç õ e s d o s p ro n o m e s á to n o s
Quando numa mesma oração ocorrem dois pronomes átonos, um objeto
direto e outro indireto, podem combinar-se, observadas as seguintes regras:
l.a) Me, te, nos, vos, lhe e lhes (formas de objeto indireto) juntam-se a o, a,
os, as (de objeto direto), dando:
mo
= me + o
ma
= me + a
mos
= me + os
m as
= me + as
to
= te + o
ta
= te + a
tos
= te + os
tas
= te + as
lho
= lhe + o
lha
= lhe + a
lhos
= lhe + os
lhas
= lhe + as
no-lo = nos + [l]o
no-la = nos + [l]a
no-los = nos + [l]os
no-las = nos + [l]as
vo-lo = vos + [l]o
vo-la = vos + [l]a
vo-los = vos + [l]os
vo-las = vos + [l]as
lha
lhos
lhas
lho
= lhes + o
= lhes + a
= lh e s + os
= lhes+ as
a) O pronome se associa-se a me, te, nos, vos, lhe, e lhes (e nunca a o, a, os,
as). Na escrita, as duas formas conservam a sua autonomia, quando antepostas
ao verbo, e ligam-se por hífen, quando lhe vêm pospostas:
2.
O coração se me confrange...
(O. Mariano, TVP, 1,216.)
A aventura gorou-se-lhe aos primeiros passos.
(C. de Oliveira, AC, 155.)
3.
a) As formas me, te, nos e vos, quando funcionam como objeto direto, ou
quando são parte integrante dos chamados verbos pronominais, não admitem
a posposição de outra forma pronominal átona. O objeto indireto assume em
tais casos a forma tônica preposicionada:
— Como me hei de livrar de ti?
(J. Régio, JA, 85.)
Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!
(F. Espanca, S, 71.)
Observações:
l.a) As combinações lho, lha (equivalentes a lhes + o, lhes + a) e lhos, lhas (equi
valentes a lhes + os, lhes + as) encontram sua explicação no fato de, na língua antiga,
PRONOMES
a forma lhe (sem -s) ser empregada tanto para o singular como para o plural. Originariamente, eram, pois, contrações em tudo normais.
2.a) No Brasil, quase não se usam as combinações mo, to, lho, no-lo, vo-lo, etc. Da
língua corrente estão de todo banidas e, mesmo na linguagem literária, só aparecem
geralmente em escritores um tanto artificiais.
C o lo c a ç ã o d o s p ro n o m e s á to n o s
1. Em relação ao verbo, o pronome átono pode estar:
a) E N C L íT ico, isto é , depois dele:
Calei-me.
b)
pr o clítico ,
is to é, a n te s d ele;
Eu me calei.
c)
m esoc Ut ic o ,
do
o u se ja , n o m e io d e le , c o lo c a ç ã o q u e só é p o s sív e l c o m f o r m a s
FUTURO DO PRESENTE OU
do
FUTURO DO PRETÉRITO:
Calar-me-ei.
Calar-me-ia.
2. Sendo o pronome átono objeto direto ou indireto do verbo, a sua posição
lógica, normal, é a énclise :
Agarraram-na conseguindo, a muito custo, arrastá-la do quarto.
(Coelho Netto, OS, 1,43.)
Na segunda-feira, ao ir ao Morenal, parecera-lhe sentir pelas costas
risinhos a escarnecê-la.
(Eça de Queirós, 0 , 1 , 124.)
Há, porém, casos em que, na língua culta, se evita ou se pode evitar essa
colocação, sendo por vezes conflitantes, no particular, a norma portuguesa
e a brasileira.
Procuraremos, assim, distinguir os casos de pr ô c u se que representam a
norma geral do idioma dos que são optativos e, ambos, daqueles em que se
observa uma divergência de normas entre as variantes europeia e americana
da língua.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
R e g ra s g e r a is
Com um
só
verbo
1. Quando o verbo está no futuro d o presente o u no futuro
dá-se tão somente a prôclise o u a mesOclise do pronome:
d o pretérito ,
Eu me calarei.
Eu me calaria.
Calar-me-ei.
Calar-me-ia.
2. É , a in d a , p r e f e r id a a
prôclise :
a) Nas orações que contêm uma palavra negativa {não, nunca, jamais, ninguém,
nada, etc.) quando entre ela e o verbo não há pausa:
— Não lhes dizia eu?
(M. de Sá-Carneiro, CF, 348.)
Nunca o vi tão sereno e obstinado.
(C. dos Anjos, M, 316.)
— Ninguém me disse que você estava passando mal!
(A. M. Machado, JT, 208.)
b) nas orações iniciadas com pronomes e advérbios interrogativos:
Quem me busca a e s ta h o r a ta rd ia ?
(M. Bandeira, PP, 1,406.)
— Por que te assustas de cada vez?
(J. Régio, JA, 98.)
Como a julgariam os pais se conhecessem a vida dela?
(U. Tavares Rodrigues, NR, 23.)
c) nas orações iniciadas por palavras exclamativas, bem como nas orações que
exprimem desejo (optativas):
Que o vento te leve os meus recados de saudade.
(F. Namora, RT, 89.)
PRONOMES
— Que Deus o abençoe!
(B. Santareno, TPM, 18.)
— Bons olhos o vejam! exclamou.
(Machado de Assis, OC, 1,483.)
d) nas orações subordinadas desenvolvidas, ainda quando a conjunção esteja
oculta:
Quando me deitei, à meia-noite, os preços estavam à altura do pes
coço.
(C. Drummond de Andrade, BV, 20.)
— Prefiro que me desdenhem, que me torturem, a que me deixem só.
(U. Tavares Rodrigues, NR, 115.)
— Que é que desejas te mande do Rio?
(A. Peixoto, RC, 174.)
e) com o gerúndio regido da preposição em:
Em se ela anuviando, em a não vendo,
Já se me a luz de tudo anuviava.
(J. de Deus, CF, 205.)
— Em lhe cheirando a homem chulo é com ele.
(Machado de Assis, OC, 1,755.)
3. Não se dá a énclise nem a prõclise com os pa r tic ípio s . Quando o par t ic Ipio vem desacompanhado de auxiliar, usa-se sempre a forma oblíqua
regida de preposição.
Exemplo:
Dada a mim a explicação, saiu.
4. Com os infinitivos soltos, mesmo quando modificados por negação, é lícita
a prõclise ou a énclise , embora haja acentuada tendência para esta última
colocação pronominal:
E ah! que desejo de a tomar nos braços...
(O. Bilac, P, 72.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Canta-me cantigas para me embalar!
(Guerra Junqueiro, S, 118.)
Para não fitá-lo, deixei cair os olhos.
(Machado de Assis, OC, 1,807.)
Para assustá-lo, os soldados atiravam a esmo.
(C Drummond de Andrade, CA, 82.)
A ÊNCLISE é
m e s m o d e r ig o r q u a n d o o p r o n o m e te m a f o r m a o ( p r in c i p a l
m e n te n o f e m in in o
a) e
o
infinitivo
v e m r e g id o d a p r e p o s iç ã o
a:
Se soubesse, não continuaria a lê-lo.
(R. Barbosa, EDS, 743.)
Logo os outros, Camponeses e Operários, começam a imitá-la.
(B. Santareno, TPM, 120.)
5. Pode-se dizer que, além dos casos examinados, a língua portuguesa tende à
PRóCLiSb pronominal:
a ) q u a n d o o v e rb o v e m a n te c e d id o d e c e rto s a d v é rb io s
pre, só, talvez, e tc.)
(bem, mal, ainda, já, sem
o u e x p re ssõ e s a d v e rb ia is e n ã o h á p a u s a q u e o s se p a re :
Até a voz, dentro em pouco, já me parecia a mesma.
(Machado de Assis, OC, 1,858.)
Só depois se senta no chão a chorar.
(Alves Redol, MB, 255.)
Ao despertar, ainda as encontro lá, sempre se mexendo e discutindo.
(A. M. Machado, CJ, 174.)
Talvez Elisabeth se decidisse.
(Ferreira de Castro, OC, II, 261.)
Nas pernas me fiava eu.
(A. Ribeiro, M, 8 8 .)
b ) q u a n d o a o r a ç ã o , d is p o s ta e m o r d e m in v e rs a , se in ic ia p o r o b je to d ir e to o u
p re d ic a tiv o :
Tiram mais que na ceifa; isso te digo eu.
(Alves Redol, G, 108.)
PRONOMES
— A grande notícia te dou agora.
(E Namora, NM, 162.)
Razoável lhe parecia a solução proposta.
c) quando o sujeito da oração, anteposto ao verbo, contém o numeral ambos
ou algum dos pronomes indefinidos (todo, tudo, alguém, outro, qualquer,
etc.):
Ambos se sentiam humildes e embaraçados.
(R Namora, TJ, 293.)
Alguém lhe bate nas costas.
(A. M. Machado, JT, 208.)
Todos os barcos se perdem,
entre o passado e o futuro.
(C. Meireles, OP, 37.)
d) nas orações alternativas:
— Das duas uma: ou as faz ela ou as faço eu.
(Sttau Monteiro, APJ, 39.)
Maria, ora se atribulava, ora se abonançava.
(Ó. Ribas, EMT, 18.)
6.
Observe-se por fim que, sempre que houver pausa entre um elemento capaz
de provocar a pr ó cu se e o verbo, pode ocorrer a ênclise :
Pouco depois, detiveram-se de novo.
(Ferreira de Castro, OC, 1,403.)
A ênclise é naturalmente obrigatória quando aquele elemento, contíguo ao
verbo, a ele não se refere, como neste exemplo:
— Sim, sim, disse ela desvairadamente, mas avisemos o cocheiro que
nos leve até a casa de Cristiano.
— Não, apeio-me aqui...
(Machado de Assis, OC, 1,690.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Costumam os escritores do idioma, principalmente os portugueses, inserir uma
ou mais palavras entre o pronome átono em próclise e o verbo, sendo mais comum
a intercalação da negativa não:
Era impossível que lhe não deixasse uma lembrança.
(Machado de Assis, OC, I, 563.)
Conformado pelas suas palavras, o tio calara-se, só para lhe não dar assen
timento.
(Alves Redol, F, 310.)
Elá tanto tempo que o não via!
(Luandino Vieira, Cl, 64.)
Com uma locução verbal
1. Nas
locuções verbais
gerún dio
1.
em que o verbo principal está no
in fin itiv o o u
no
pode dar-se:
°) Sempre a
énclise
a o in f in itiv o o u a o g e r ú n d io :
O r o u p e ir o veio interromper-me.
(R. Pompeia,A,37.)
— Que poderá dizer-nos aquele rato de biblioteca?
(A. Ribeiro, AFPB, 215.)
Só quero preveni-lo contra as exagerações do Prólogo.
(A. de Quental, C, 314.)
Nós íamos seguindo; e, em tomo, imensa,
Ia desenrolando-se a paisagem.
(R. Correia, PCP, 304.)
2.
°) A
próclise
a o v e r b o a u x ilia r, q u a n d o o c o r r e m as c o n d iç õ e s e x ig id a s
p a r a a a n te p o s iç ã o d o p r o n o m e a u m s ó v e rb o , is to é:
a) quando a locução verbal vem precedida de palavra negativa, e entre elas não
há pausa:
Tempo que navegaremos
Não se pode calcular.
(C. Meireles, OP, 141.)
PRONOMES
Rita é minha irmã, não me ficaria querendo mal e acabaria rindo
também.
(Machado de Assis, OC, 1,1051.)
— Ninguém o havia de dizer.
(A. Ribeiro, M, 6 8 .)
Jamais me hão de chamar outro mais doce.
(F. Espanca, S, 49.)
b) nas orações iniciadas por pronomes ou advérbios interrogativos:
— Que mal me havia de fazer?
(M. Torga, NCM, 47.)
Que é que me podia acontecer?
(G. Ramos, A, 152.)
— Em que lhe posso ser útil, senhor Petra?
(A. Ribeiro, M, 268.)
Como te hei de receber em dia tão posterior?
(C. Meireles, OP, 406.)
c) nas orações iniciadas por palavras exclamativas, bem como nas orações que
exprimem desejo (optativas):
Como se vinha trabalhando mal!
Deus nos há de proteger!
d) nas orações subordinadas desenvolvidas, inclusive quando a conjunção está
oculta:
O sufrágio que me vai dar será para mim uma consagração.
(E. da Cunha, OC, II, 634.)
Ega subiu ao seu quarto, onde outro criado lhe estava preparando
o banho.
(Eça de Queirós, O, II, 329.)
Eram orações extraordinariamente tocantes, que N. lamenta não ter
guardado na memória, ou registrado à proporção que as ia ouvindo.
(A. F. Schmidt, F, 171.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Ao cabo de cinco dias, minha mãe amanheceu tão transtornada que
ordenou me mandassem buscar ao seminário.
(Machado de Assis, OC, 1,800.)
3.°) A
ÊNCLiSE a o v e r b o a u x ilia r, q u a n d o n ã o se v e rific a m essas c o n d iç õ e s
q u e a c o n s e lh a m a
prôclise :
Vão-me buscar, sem mastros e sem velas,
Noiva-menina, as doidas caravelas,
Ao ignoto País da minha infância...
(F. Espanca, S, 179.)
Ia-me esquecendo dela.
(G. Ramos, AOH , 40.)
A cidade ia-se perdendo à medida que o veleiro rumava para São
Pedro.
(B. Lopes da Silva, C, 207.)
2. Quando o verbo principal está no particípio , o pronome átono não pode
vir depois dele. Virá, então, proclítico o u enclítico ao verbo auxiliar, de
acordo com as normas expostas para os verbos na forma simples:
— Tenho-o trazido sempre, só hoje é que o viste?
(M. J. de Carvalho, TM, 152.)
— Arrependa-se do que me disse, e tudo lhe será perdoado.
(Machado de Assis, OC, 1,645.)
Que se teria passado?
(Coelho Netto, OS, I, 1412.)
Queria mesmo dali adivinhar o que se tinha passado na noite da
sua ausência.
(Alves Redol, F, 195.)
A c o lo c a ç ã o d o s p r o n o m e s á to n o s n o B ra s il
A colocação dos pronomes átonos no Brasil, principalmente no colóquio
normal, difere da atual colocação portuguesa e encontra, em alguns casos, similar
na língua medieval e clássica.
PRONOMES
Podem-se considerar como características do português do Brasil e, também,
do português falado nas Repúblicas africanas:
a) a possibilidade de se iniciarem frases com tais pronomes, especialmente com
a forma me:
— Me desculpe se falei demais.
(É. Veríssimo, A, II, 487.)
Me arrepio todo...
(Luandino Vieira, NM, 138.)
b) a preferência pela próclise nas orações absolutas, principais e coordenadas
não iniciadas por palavra que exija ou aconselhe tal colocação:
— Se Vossa Reverendíssima me permite, eu me sento na rede.
(J. Montello, TSL, 176.)
O usineiro nos entregava o açúcar pelo preço do dia, pagava a co
missão e armazenagem e nós especulávamos para as praças do Rio
e São Paulo.
(J. Lins do Rego, 17,251.)
— A sua prima Júlia, do Golungo, lhe mandou um cacho de bana
nas.
(Luandino Vieira, NM, 54.)
c) a próclise ao verbo principal nas locuções verbais:
Será que o pai não ia se dar ao respeito?
(Autran Dourado, SA, 6 8 .)
— Não, não sabes e não posso te dizer mais, já não me ouves.
(Luandino Vieira, NM, 46.)
Outro teria se metido no meio do povo, teria terminado com aquela
miséria, sem sangue.
(J. Lins do Rego, U, 222.)
Tudo ia se escurecendo.
(J. Lins do Rego, [/, 338.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Justificando essa última colocação, escreve Martinz de Aguiar:
“Numa frase como ele vem-me ver, geral em Portugal, literária no Brasil, o
fator lógico deslocou o pronome me do verbo vem, para adjudicá-lo ao verbo ver,
por ser ele determinante, objeto direto, do segundo e, não, do primeiro. Isto é:
deixou a língua falada no Brasil de dizer vem-me ver (fator histórico por ser mera
continuação do esquema geral português), para dizer vem me-ver, que também
vigia na língua, ligando-se o pronome ao verbo que o rege (fator lógico). Esta
colocação de tal maneira se estabilizou, que pouco se diz vem ver-me e trouxe
consequências imprevistas:
1.
a) Pôde-se juntar o pronome ao particípio procliticamente: Aqueles haviam
se-corrompido.
2.
a) Pôde-se pôr o pronome depois dos futuros (do presente e do passado):
Poderá se-reduzir, poderia se-reduzir. Deixando de ligar-se aos futuros, para
unir-se ao infinitivo, deixou igualmente de interpor-se-lhes aos elementos
constitutivos.
3.
a) Em frases como vamo-nos encontrar, deixando o pronome de pospor-se
à forma verbal pura, para antepor-se à nominal, deixou igualmente de deter
minar a dissimilação das sílabas parafônicas, podendo-se então dizer vamos
nos-encontrar”.7
PRONOMES POSSESSIVOS
PRONOMES PESSOAIS, POSSESSIVOS E DEMONSTRATIVOS
Estreitamente relacionados com os pronomes pessoais estão os pronom es
possessivos e OS DEMONSTRATIVOS.
Os pro n o m es pessoais, vimos, denotam as pessoas gramaticais; os outros
dois indicam algo determinado por elas:
a) os
possessivos , o
q u e lh e s c a b e o u p e r te n c e ;
b) os demonstrativos , o que delas se aproxima ou se distancia no espaço e no
tempo.
Podemos, assim, estabelecer estas correspondências prévias:
1 .a P
esso a
2 .a P
esso a
3 .a P e s s o a
Pronom e pessoal
eu
Pronom e possessivo
meu
teu
seu
Pronom e dem onstrativo
este
esse
aquele
tu
ele
Notas de português de Filinto a Odorico. Rio de Janeiro, Simões, 1955, p. 409.
PRONOMES
FORMAS DOS PRONOMES POSSESSIVOS
Os pronom es possessivos apresentam três séries de formas, correspondentes
à pessoa a que se referem. Em cada série, estas formas variam de acordo com o
gênero e o número da coisa possuída e com o número de pessoas representadas
no possuidor.
Um p o s s u i d o r
Vários possuidores
U. '
Um o b je t o
V á r io s
-■—. —-
Um o b j e t o
O B JETO S
1.a pessoa masc.
V á r io s
O BJETO S
meu
m inha
m eus
m inhas
nosso
nossa
nossos
nossas
2.a pessoa masc.
fem.
teu
tu a
teus
tu as
vosso
vossa
vossos
vossas
3.a pessoa masc.
fem.
seu
sua
seus
suas
seu
sua
seus
suas
fem.
VALORES E EMPREGOS DOS POSSESSIVOS
Os pronom es possessivos acrescentam à noção de pessoa gramatical uma
ideia de posse. São, de regra, pronomes adjetivos, equivalentes a um adjunto
adnominal antecedido da preposição de (de mim, de ti, de nós, de vós, de si), mas
podem empregar-se como pronomes substantivos:
Por exemplo:
Meu livro é este.
Este liv ro é o meu.
Sempre com suas histórias!
Fazer das suas.
Concordância do pronome possessivo
1. O pr o n o m e possessivo c o n c o r d a e m g ê n e r o e n ú m e r o c o m o s u b s ta n tiv o
q u e d e s ig n a o o b je to p o s s u íd o ; e, e m p e s s o a , c o m o p o s s u id o r d o o b je to e m
c a u sa :
Cada um tratava de si, do seu corpo, da sua alma, dos seus ódios.
(M. Torga, NCM, 204.)
Eu estava na porta da minha casa, casa de passeio-alto, com a minha
mãe e o meu pai.
(Luandino Vieira, NANV, 178.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Suas mudanças súbitas, seu jeito provocante, sua mímica muito femi
nina me fazem lembrar a Jandira mulher, que tantas vezes desaparece
a meus olhos, em nossas conversações.
(C. dos Anjos, DR, 124.)
2. Quando um só possessivo determina mais de um substantivo, concorda
com o que lhe esteja mais próximo:
Rubião estacara o passo; ela pôde vê-lo bem, com os seus gestos e
palavras, o peito alto, e uma barretada que deu em volta.
(Machado de Assis, OC, 1,715.)
E o meu corpo, minh’alma e coração,
Tudo em risos poisei em tua mão...
(F. Espanca, S, 177.)
Posição do pronome adjetivo possessivo
O
pr o n o m e adjetivo possessivo
p r e c e d e n o r m a l m e n t e o s u b s t a n ti v o q u e
d e t e r m in a , c o m o n o s m o s t r a m o s e x e m p lo s a té a q u i c ita d o s .
Pode, no entanto, vir posposto ao substantivo:
1. °) quando este vem desacompanhado do artigo definido:
Esperava notícias tuas para de novo te escrever.
(A. Nobre, C7,119.)
Soube por José Veríssimo que estranhou a ausência de cartas mi
nhas.
(E. da Cunha, OC, II, 707.)
2.
°) q u a n d o o s u b s ta n tiv o já e s tá d e te r m in a d o ( p e lo a r tig o in d e fin id o o u p o r
n u m e r a l, p o r p r o n o m e d e m o n s tr a tiv o o u p o r p r o n o m e in d e f in id o ) :
Recebi, no Rio, no dia da posse no Instituto, um telegrama seu, de
felicitações...
(E. da Cunha, OC, II, 639.)
Note este erro seu: não há em mim (que eu seja consciente) o menor
espírito de renúncia ou de esquecimento de mim próprio.
(J. de Figueiredo, C, 177.)
PRONOMES
Como tu foste infiel
A certas ideias minhas!
(F. Pessoa, QGP, n.° 186.)
3.°) nas interrogações diretas:
Onde estais, cuidados meus?
(M. Bandeira, PP, 23.)
Em todo o caso... Agora ouve-se menos ou é impressão minha?
(A. Abelaira, NC, 15.)
4.°) quando há ênfase:
— Tu não lustras as unhas! tu trabalhas! tu és digna filha minha!
pobre, mas honesta!
(Machado de Assis, OC, 1,672.)
Ninguém, senhores meus, que empreenda uma jornada extraordi
nária, primeiro que meta o pé na estrada, se esquecerá de entrar em
conta com as suas forças, por saber se o levarão a cabo.
(R. Barbosa, EDS, 685.)
A alternância de colocações presta-se a efeitos estilísticos, como nos mostra
este exemplo:
És meu único desejo,
Ah! fosse o desejo teu!
(Guimarães Passos, V5,24.)
Emprego ambíguo do possessivo de 3.a pessoa
As formas seu, sua, seus, suas aplicam-se indiferentemente ao possuidor da
3.a pessoa do singular ou da 3.® do plural, seja este possuidor masculino ou
feminino.
O fato de concordar o possessivo unicamente com o substantivo denotador
do objeto possuído provoca, não raro, dúvida a respeito do possuidor.
Para evitar qualquer ambiguidade, o português nos oferece o recurso de
precisar a pessoa do possuidor com a substituição de seu(s), sua(s), pelas formas
dele(s), dela(s), de você(s), do(s) senhor(es), da(s) senhora(s) e outras expressões
de tratamento.
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Por exemplo, a frase:
Em casual encontro com Júlia, Pedro fez comentários sobre os seus
exames.
tem um anunciado equívoco: os comentários de Pedro podem ter sido feitos
sobre os exames de Júlia; ou sobre os exames dele, Pedro; ou, ainda, sobre os
exames de ambos.
Assim sendo, o locutor deverá expressar-se, conforme a intenção que tenha:
Em casual encontro com Júlia, Pedro fez comentários sobre os exa
mes dela.
Em casual encontro com Júlia, Pedro fez comentários sobre os exa
mes dele.
Em casual encontro com Júlia, Pedro fez comentários sobre os exa
mes deles.
Reforço dos possessivos
O valor possessivo destes pronomes nem sempre é suficientemente forte.
Quando há necessidade de realçar a ideia de posse — quer visando à clareza,
quer à ênfase — , costuma-se reforçá-los:
a) com a palavra próprio ou mesmo:
Mais unidos sigamos e não tarda
Que eu ache a vida em tua própria morte.
(Guimarães Passos, V5,46.)
Era ela mesma; eram os seus mesmos braços.
(Machado de Assis, OC, II, 484.)
b) com as expressões dele{s), dela{s), no caso do possessivo da 3.®pessoa:
Montaigne explica pelo seu modo dele a variedade deste livro.
(Machado de Assis, OC, II, 556.)
Domingos Botelho, avisado da rejeição do filho, respondeu que fizesse
ele a sua vontade; mas que a sua vitória dele, sobre os protetores e
os corrompidos pelo ouro do fidalgo de Viseu, estava plenamente
obtida.
(C. Castelo Branco, OS, 1,415.)
PRONOMES
Valores dos possessivos
O pronom e possessivo não exprime sempre uma relação de posse ou pertinên
cia, real ou figurada. Na língua moderna, tem ele assumido múltiplos valores,
por vezes bem distanciados daquele sentido originário.
Mencione-se o seu emprego:
a) como indefinido:
Tinha tido o seu orgulho, a sua calma, a sua certeza.
(M. Torga, V, 216.)
Tenho tido os meus vícios.
(Alves Redol, BC, 43.)
A senhora há de ter tido seus apertos de dinheiro, disse Rubião.
(Machado de Assis, OC, 1,630.)
b) para indicar aproximação numérica:
Revejo sempre uma rapariga que só uma vez fitei, tinha eu meus
vinte anos.
(A. F. Schmidt, GB, 251.)
Ela media, como um marchante, o meu metro e oitenta de altura e
pesava, com o mesmo rigor, os meus setenta e sete quilos.
(F. Namora, RT, 90.)
Entrou uma mulherzinha de seus quarenta anos, decidida e de passo
firme.
(F. Sabino, HN, 164.)
c) para designar um hábito:
Neste instante, a Judite voltou-se e, abandonando as companheiras,
veio desfazer o cumprimento com um repente dos seus.
(Almada Negreiros, NG, 110.)
Nos nossos dias, a baianinha chegava logo depois do almoço, muito
leve e flexível, a passo rápido.
(Ribeiro Couto, NC, 89.)
PRONOMES
— Não sei para onde vou mandar o meu herói... — disse com um
falso sorriso.
(É. Veríssimo, LS, 139.)
Ora bem, deixa-me transcrever o meu Saint-Exupéry.
(F. Namora, RT, 190.)
Isto feito, meteu-se na cama, rezou uma ode do seuHorácio e fechou
os olhos. Nem por isso dormiu. Tentou então uma página do seu
Cervantes, outra do seu Erasmo, fechou novamente os olhos, até
que dormiu.
(Machado de Assis, OC, 1,953.)
— Onde está o meu Tenentes do Diabo?
(J. Lins do Rego, E, 282.)
d) de ironia, de malícia, de sarcasmo:
Todos aqueles santos varões comiam, bebiam o seu vinho do Porto
na copa.
(Eça de Queirós, O, II, 17.)
Na mesa do major jantei o meu frango, comi a minha boa posta de
robalo, trabalho que afundou em mais de duas horas.
(J. C. de Carvalho, CL, 133.)
Em casa de Norberto, as senhoras tinham as delicadezas do sexo,
bebiam seu chá, faziam sua malha e eram madrinhas das filhas dos
criados mais próximos.
(J. Saramago, LC, 54.)
Observe-se que, nos dois últimos casos, o
acompanhado do artigo definido.
possessivo
vem normalmente
2. De acentuado caráter afetivo é também a construção em que uma forma
feminina plural do pronome completa a expressão fazer (ou dizer) uma
das = praticar uma ação ou dizer algo particular, geralmente passível de
crítica:
Com aquele gênio esquentado é capaz de fazer uma das dele.
(Castro Soromenho, TM, 175.)
339
338
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Era lindo o bicho, com sua calma de passarinho manso.
(R. Braga, CCE, 85.)
Sente-se em todos esses empregos do possessivo uma certa carga afetiva,
mais acentuada nos que passamos agora a examinar.
Valores afetivos
1.
Variados são os matizes afetivos expressos pelos
vezes, para acentuar um sentimento:
a) de deferência, de respeito, de polidez:
p o s s e s s iv o s .
Servem, por
u— Quer alguma coisa, minha senhora?”
(Eça de Queirós, OF, 1,1037.)
Adeus! — Bons dias, meu Comandante,
A nossa sorte... morrer, talvez...
E o rude velho segue pra diante
E o rude velho segue pra diante:
— Morrer, meu Amo, só uma vez!
(A. Nobre, S, 106.)
— Não posso deixá-lo um instante, meu Fidalgo.
(A. Arinos, OC, 436.)
— Não é assim, meus respeitáveis senhores?
(0 . Ribas, EMT, 123.)
b) de intimidade, de amizade:
— Hoje, meu caro Antônio, temos de festejar a presença do meu rapaz.
(Sttau Monteiro, APJ, 203.)
— Dispõe de mim, meu velho, estou às suas ordens, bem sabes.
(A. Azevedo, CEM, 6 .)
— Não há nada mais certo, meu amigo — respondia D. Clara.
(A. de Assis Júnior, SM, 76.)
c) de simpatia, de interesse (com referência a personagem de uma narrativa,
a autor de leitura frequente, a clubes ou associações de que seja sócio ou
aficionado, etc.):
340
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
As criadas, junto da porta, casquinaram uns risinhos abafados e o
Barbaças voltou-se para elas, disposto a dizer uma das suas.
(E Namora, TJ, 210.)
— Você andou por aí fazendo das suas.
(J. Lins do Rego, MR , 229.)
Nosso
de modéstia e de majestade
Paralelamente ao emprego do pronome pessoal nós por eu nas fórmulas de
modéstia e de majestade que estudamos, aparece o do possessivo nosso(a) por
meu (minha).
Comparem-se estes exemplos:
a) de modéstia:
Este livro nada mais pretende ser do que um pequeno ensaio. Foi
nosso escopo encontrar apoio na história do Brasil, na formação
e crescimento da sociedade brasileira, para colocar a língua no seu
verdadeiro lugar: expressão da sociedade, inseparável da história da
civilização.
(S. da Silva Neto, IELPB, 11.)
b) de majestade:
Mandamos que os ciganos, assi homens como mulheres, nem outras
pessoas, de qualquer nação que sejam, que com eles andarem, não
entrem em nossos Reinos e Senhorios.
(Ordenações Filipinas, livro V, título 69.)
Vosso
de cerimônia
O uso do pronome pessoal vós como tratamento cerimonioso aplicado a um
indivíduo ou a um auditório qualificado leva, naturalmente, a igual emprego
do possessivo vosso(a). Exemplos:
Nunca vosso avô, meu senhor e marido, achou que me não fosse
possível compreender o ânimo dum grande português.
(J. Régio, ERS, 69.)
Levareis, Senhores Delegados, aos vossos Governos, à vossa Pátria,
estas declarações que são a expressão sincera dos sentimentos do
Governo e do Povo Brasileiro.
(Barão do Rio Branco, D, 98.)
PRONOMES
Observação:
Quanto ao emprego das formas de tratamento cerimonioso em que se fixaram
os p o s s e s s i v o s Sua e Vossa (tipo: Sua Excelência, Vossa Excelência), veja-se o que
dissemos ao estudarmos os p r o n o m e s p e s s o a i s (Pronomes de tratamento).
Substantivação dos possessivos
Os possessivos, quando substantivados, designam:
a) no singular, o que pertence a uma pessoa:
— Eu não tenho mais ambições que fazer fanga e ganhar o que puder,
até ter um bocado de meu.
(Alves Redol, F, 281.)
A rapariga não tinha um minuto de seu.
(A. Rangel, IV , 61.)
Eu não tenho de meu um momento.
(Almeida Garrett, 0 ,1 ,1415.)
b) no plural, os parentes de alguém, seus companheiros, compatriotas ou cor
religionários:
Peço-te que transmitas, em nome de todos os meus, sinceros agrade
cimentos a D. Maria Júlia e a todos os teus.
(E. da Cunha, OC, II, 705.)
Saudades a todos os teus.
(R. Correia, PCP, 623.)
Não me podia a Sorte dar guarida
Por não ser eu dos seus.
(F. Pessoa, OP, 12.)
Impugnaram-na apaixonadamente Dâmaso e os seus; defenderam-na
com brio e vivacidade Moura Seco, Teodoro e os inimigos do arcipreste.
(A. Ribeiro, AFPB, 264.)
Emprego do possessivo pelo pronome oblíquo tônico
Em certas locuções prepositivas, o pronome oblíquo tônico, que deve se
guir a preposição e com ela formar um complemento nominal do substantivo
341
342
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
anterior,
Assim:
é
normalmeiite substituído pelo
prono m e possessivo
em frente de ti
ao lado de mim
em favor de nós
por causa de você
correspondente.
em tua frente
ao meu lado
em nosso favor
por sua causa
Veja-se, por exemplo, este passo, no qual a expressão em teu louvor equivale
a em louvor de ti:
Negrinho do Pastoreio,
Venho acender a velinha
Que palpita em teu louvor.
(A. Meyer, P, 125.)
PRONOMES DEMONSTRATIVOS
1. Os pro n o m es demonstrativos situam a pessoa ou a coisa designada rela
tivamente às pessoas gramaticais. Podem situá-la no espaço ou no tempo:
Lia coisas incríveis para aquele lugar e aquele tempo.
(C dos Anjos, DP, 105.)
A
c a p a c id a d e d e m o s t r a r u m o b j e t o s e m n o m e á - lo , a c h a m a d a
deíctica
( d o g re g o
deiktikós =
fu n ç à o
p r ó p r i o p a r a d e m o n s t r a r , d e m o n s t r a tiv o ) ,
é
a q u e c a r a c te r iz a f u n d a m e n t a l m e n t e e s ta c la sse d e p r o n o m e s .
2. Mas os demonstrativos empregam-se também para lembrar ao ouvinte
ou ao leitor o que já foi mencionado ou o que se vai mencionar:
A ternura não embarga a discrição nem esta diminui aquela.
(Machado de Assis, OC, 1,1124.)
O mal foi este: criar os filhos como dois príncipes.
(M. Torga, V, 309.)
É a sua
funçào anafôrica
à m e m ó r ia ) .
( d o g re g o
anaphorikós = q u e
faz le m b r a r , q u e tr a z
PRONOMES
FORMAS DOS PRONOMES DEMONSTRATIVOS
1.
Os pronom es demonstrativos apresentam formas variáveis e formas
invariáveis, ou neutras:
V
a r i Av e i s
I n v a r i Av e i s
M
F em
a s c u l in o
este
esse
estes
esses
aquele
aqueles
esta
essa
aquela
in in o
estas
essas
aquelas
I
isto
isso
aquilo
1
2. As formas variáveis {este, esse, aquele , etc.) podem funcionar como pronomes
adjetivos e como pronomes substantivos:
Este livro é meu.
Meu livro é este.
3. As formas invariáveis ( isto, isso, aquilo) são sempre pronomes substantivos.
4. Estes demonstrativos combinam-se com as preposições de e em, tomando
as formas: deste, desta, disto; neste, nesta, nisto; desse, dessa, disso; nesse, nessa,
nisso; daquele, daquela, daquilo; naquele, naquela, naquilo.
Aquele, aquela e aquilo contraem-se ainda com a preposição a, dando: àquele,
àquela e àquilo.
5. Podem também ser demonstrativos o {a, os, as), m esm o ,p ró p rio , sem elhante
e tal, como veremos adiante.
VALORES GERAIS
Considerando-os em suas relações com as pessoas do discurso, podemos esta
belecer as seguintes características gerais para os pronomes demonstrativos:
L°) Este, esta e isto indicam:
a) o que está perto da pessoa que fala:
Esta casa estará cheia de flores!
Cá te espero amanhã! Não te demores!
(E. de Castro, UV, 59.)
As mãos que trago, as mãos são estas.
(C. Meireles, OP, 216.)
343
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b) o tempo presente em relação à pessoa que fala:
Esta tarde para mim tem uma doçura nova.
(Ribeiro Couto, PR, 83.)
Neste momento há um rapaz que gosta de mim, um inglês.
(U. Tavares Rodrigues, NR, 13.)
2. °) Esse, essa e isso designam:
a) o que está perto da pessoa a quem se fala:
— Que susto você me pregou, entrando aqui com essa cara de alma
do outro do mundo!
(C. dos Anjos, DR, 32.)
— Ficas aí um pedaço a descansar e a remoer essas fúrias. Isso, agora,
ainda incha um bocado.
(F. Namora, NM, 122.)
Essas tuas fúrias avulso, esse teu calor, esse riso, essa amizade mesmo
nos ódios que tinhas, procuro-lhes em vão só, que os teus olhos estão
fechados para sempre.
(Luandino Vieira, NM, 30.)
b) o tempo passado ou futuro com relação à época em que se coloca a pessoa
que fala:
Bons tempos, Manuel, esses que já lá vão!
(A. Nobre, S, 51.)
Desses longes imaginados, dessas expectativas de sonho, passava
ele ao exame da situação da Europa em geral e da Alemanha em
particular.
(G. Amado, DP, 92.)
3. °) Aquele, aquela e aquilo denotam:
a) o que está afastado tanto da pessoa que fala como da pessoa a quem se fala:
— Olhem aquele monte ali em frente. É longe, não é?
(G. Ramos, AOH, 107.)
PRONOMES
— Qualquer dia dizem assim: ali naquela casa viveu o Paulino.
(Castro Soromenho, C, 116.)
b) um afastamento no tempo de modo vago, ou uma época remota:
Naquele tempo a fogueira crepitava até horas mortas.
(C. dos Anjos, DR, 46.)
— Naquele tempo era uma boa casa de banho.
— Naquele tempo, filho... Ora, naquele tempo!
(M. J. de Carvalho, TM, 41.)
— Naquele tempo as pernas não me pesavam.
(Castro Soromenho, C, 118.)
Resumindo, podemos apresentar no seguinte quadro os valores básicos dessas
formas pronominais para a pessoa que fala ou escreve:
D
e m o n s t r a t iv o
P
esso a
E spaço
T
em po
e s te
1 .3
s it u a ç ã o p ró x im a
p re s e n te
e s se
2 .a
s it u a ç ã o in t e r m e d iá r ia
p a s s a d o o u fu t u ro
o u d is t a n t e
p o u c o d is t a n t e
s it u a ç ã o lo n g ín q u a
p a s s a d o v a g o o u re m o to
a q u e le
3 .a
DIVERSIDADE DE EMPREGO
Estas distinções que nos oferece o sistema ternário dos demonstrativos em
português não são, porém, rigorosamente obedecidas na prática.
Com frequência, na linguagem animada, nos transportamos pelo pensamento
a regiões ou a épocas distantes, a fim de nos referirmos a pessoas ou a objetos
que nos interessam particularmente como se estivéssemos em sua presença.
Linguisticamente, esta aproximação mental traduz-se pelo emprego do pronome
este (esta, isto) onde seria de esperar esse ou aquele.
Sirva de exemplo esta frase de um personagem do romance Fogo morto, de
José Lins do Rego, em que o advérbio lá se aplica a sua casa, da qual no momento
estava ausente:
— Eu só queria estar lá para receber estes cachorros a chicote.
(FM, 296.)
346
NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Ao contrário, uma atitude de desinteresse ou de desagrado para com algo que
esteja perto de nós pode levar-nos a expressar tal sentimento pelo uso do demons
trativo esse em lugar de este. Assim, no seguinte passo de Ferreira de Castro:
O guarda-livros, num repelão, ordenou:
— Tire esse bandido da minha frente, João! Tome conta dele!
(O C,1,300.)
EMPREGOS PARTICULARES
1. Este {esta, isto) é a forma de que nos servimos para chamar a atenção sobre
aquilo que dissemos ou que vamos dizer:
— Justamente, traz uma comunicação reservada, reservadíssima;
negócios pessoais. Dá licença?
Dizendo isto, Rubião meteu a carta no bolso; o médico saiu; ele
respirou.
(Machado de Assis, OC, 1,564.)
Minha tristeza é esta —
A das coisas reais.
(F. Pessoa, OP, 100.)
2. Para aludirmos ao que por nós foi antes mencionado, costumamos usar
também o demonstrativo esse (essa, isso):
Não havia que pedir de fiado nas lojas; a lareira teria sempre lume.
Nisso, ao menos, o Agostinho Serra abria bem as mãos.
(Alves Redol, G, 94.)
— A isso eu chamaria complexo de Carlitos.
(C. dos Anjos, MS, 383.)
3. Esse (essa, isso) é a forma que empregamos quando nos referimos ao que foi
dito por nosso interlocutor:
— As minhas meditações foram sempre pessoais e intransmissíveis.
— Sempre. É nisso que és extraordinária.
(M. J. de Carvalho, PSB, 56.)
— Você, perdendo a noite, é capaz de não dormir de dia?
— Já tenho feito isso.
(Machado de Assis, OC, II, 586.)
PRONOMES
4. Tradicionalmente, usa-se nisto no sentindo de “então”, “nesse momento”:
Nisto, ouvimos vozes e passos.
(A.Abelaira, TM, 112.)
Entardeceu.
Nisto correu voz que a noiva estava chorando.
(Simões Lopes Neto, CGLS, 210.)
Escritores modernos, entretanto, empregam também nisso:
Nisso a orquestra, a boa orquestra romântica dos restaurantes da
velha guarda, atacou “Parabéns para você”...
(C. Drummond de Andrade, CB, 20.)
Nisso bateram à porta.
(Ribeiro Couto, NC, 261.)
5. Em certas expressões o uso fixou determinada forma do demonstrativo, nem
sempre de acordo com o seu sentido básico. É o caso das locuções: além disso,
isto é, isto de, por isso (raramente por isto), nem por isso.
POSIÇÃO DO PRONOME ADJETIVO DEMONSTRATIVO
1. O d e m o n s t r a t iv o , quando
substantivo que determina:
pro n o m e
AD iETivo,
precede norm alm ente o
Meu pobre coração, nessa eterna ansiedade,
Nesse eterno sofrer, eterno arrastaria
Esta triste, esta longa, esta eterna saudade.
(M. Pederneiras, LSMV, 53.)
Estes homens e estas mulheres nasceram para trabalhar.
(J. Saramago, LC, 327.)
2. Pode, no entanto, vir posposto ao substantivo para melhor especificar o que
se disse anterior mente:
Por outro lado, Siá Bina era ainda comadre de Nhô Felício, pois batiza
ra um filho dele, há poucos anos, filho esse do segundo casamento.
(Ribeiro Couto, C, 145.)
PRONOMES
A ternura não embarga a discrição nem esta diminui aquela.
(Machado de Assis, OC, 1,1124.)
Porém de que serve a piedade sem a caridade?
ou antes, pode aquela existir sem esta?
(Almeida Garrett, 0 ,1 ,721.)
2. Por vezes, os d e m o n s t r a t i v o s alternados têm valor indefinido:
E vimos isto: homens de todas as idades, tamanhos e cores, uns em
mangas de camisa, outros de jaqueta, outros metidos em sobrecasacas
esfrangalhadas; atitudes diversas, uns de cócoras, outros com as mãos
apoiadas nos joelhos, estes sentados em pedras, aqueles encostados
ao muro, e todos com os olhos fixos no centro, e as almas debruçadas
das pupilas.
(Machado de Assis, OC, 1,525.)
Outras mulheres, assentadas sobre as esteiras, ladeavam a cama onde
momentos antes repousou o corpo. Esta soluçava a um canto; aquela
lacrimejava em silêncio junto a um móvel...
(A. de Assis lúnior, SM, 56.)
Depois vieram outros e outros, estes fincados de leve, aqueles até à
cabeça.
(Monteiro Lobato, U, 110.)
3. Observe-se também a ocorrência de dois d e m o n s t r a t i v o s em construções
nas quais o predicativo introduzido por aquele melhor esclarece o sujeito,
expresso por um substantivo determinado por este ou esse:
Este homem foi aquele que me dizia “que não me afligisse que eu
ainda estava muito novo para curar-me”
(A. Nobre, CL, 144.)
Mas esses atos são justamente aqueles que os psiquiatras designam
como características de qualquer perturbação mental.
(T. Barreto, QV, 39.)
Por vezes omite-se o substantivo:
Essa é aquela Lélia.
(G. Cruls, QR, 498.)
349
348
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
A recepção esteve muito cacete e o Dr. Martiniano Lopes me pegou
no terraço para ler um longo discurso que vai pronunciar na Ordem
dos Economistas; martírio esse que durou uma hora de relógio.
(C. Drummond de Andrade, CA, 128.)
3. Usa-se para determinar o aposto, geralmente quando este salienta uma
característica marcante da pessoa ou do objeto;
Amanhã, seriam os comentários na rodinha do sura antipático, sem
rabo ainda, sem voz ainda, pescoço pelado, e já metido a galo. Na do
sura e na do garnisé branco — esse, então, um afeminado de marca,
com aquela vozinha esganiçada e o passinho miúdo.
(M. Palmério, VC, 99.)
Arlequim é o D. Quixote, esse livro admirável onde se experimentam
ao ar livre, de dia e de noite, e através de todas as eventualidades os
preceitos da Honra e das outras teorias.
(Almada Negreiros, OC, III, 90.)
Chamava-se “Terminus”, porque o proprietário fizera em tempos a sua
viagem à Europa, “Terminus” em luzinhas bem nítidas, bem fortes,
com um halo, esse muito límpido, a uni-las.
(M. J. de Carvalho, TM, 10.)
4. Esse (e mais raramente este) emprega-se também para pôr em relevo um
substantivo que lhe venha anteposto:
O padre, esse andava de coração em aleluia.
(M. Torga, CM, 47.)
O sacrificador, esse, ficara rodando por aí, e seu desejo seria não voltar
para casa nem para dentro de si mesmo.
(C. Drummond de Andrade, CB, 30.)
Maria José, essa, se comportava no polo oposto, calada e carrancuda.
(A. Ribeiro, M, 289.)
ALUSÃO A TERMOS PRECEDENTES
1. Quando queremos aludir, discriminadamente, a termos já mencionados,
servimo-nos do d e m o n s t r a t i v o aquele para o referido em primeiro lugar, e
do d e m o n s t r a t i v o este para o que foi nomeado por último:
350
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
REFORÇO DOS DEMONSTRATIVOS
Quando, por motivo de clareza ou de ênfase, queremos precisar a situação das
pessoas ou das coisas a que nos referimos, usamos acompanhar o d e m o n s t r a t i v o
de algum gesto indicador, ou reforçá-lo:
a) com os advérbios aqui, aí, ali, cá, lá, acolá:
— Espera aí. Este aqui já pagou. Agora vocês é que vão engolir tudo,
se maltratarem este rapaz.
(C. Drummond de Andrade, CB, 33.)
— E esse pacotinho aí, Seu Xixi?
— Encomenda: é o relógio do Seu Gustavinho Solé.
(M. Palmério, VC, 17.)
Esse aí sabia mesmo para ensinar aos outros?
(Pepetela, AN, 23.)
— Isto aqui não pode dar saúde a ninguém; basta olhar-se para aquele
embondeiro...
(A. de Assis Júnior, SM, 199.)
b) com as palavras mesmo e próprio:
—
—
—
—
O Relógio da Sé em casa de Serralheiro?
Esse mesmo.
O da Matriz?
Esse próprio.
(D. F. M. de Melo, AD, 16.)
— Recusei. Não sei se fiz bem.
— É por causa da mulher.
— Isso mesmo.
(O. Lins,fP, 72.)
c) com o pronome outro, possibilitando as aglutinações estoutro, essoutro,
aqueloutro, evitadas, em geral, no português contemporâneo.
VALORES AFETIVOS
1.
Os d e m o n s t r a t i v o s reúnem o sentido de atualização ao de determinação. São
verdadeiros “gestos verbais”, acompanhados em geral de entoação particular
e, não raro, de gestos físicos.
PRONOMES
A capacidade de fazerem aproximar ou distanciar no espaço e no tempo as
pessoas e as coisas a que se referem permite a estes pronomes expressarem
variados matizes afetivos, em especial os irônicos.
2. Nos exemplos a seguir, servem para intensificar, de acordo com a entoação
e o contexto, os sentimentos de:
a) surpresa, espanto:
Passam vinte anos: chega Ele;
Veem-se (Pasmo) Ele e Ela:
— Santo Deus! este é aquele?!...
— Mas, meu Deus! esta é aquela?!...
(Fontoura Xavier, 0 , 172.)
— Essa agora!
(J. de Sena, SF, 518.)
Ainda mais esta! Onde estaria o padre?
(A. Santos, P, 74.)
b) admiração, apreço:
— Que gente tinha o Pestana, dizia um. Nunca pensei que houvesse
homens com aquela coragem.
(J. Lins do Rego, MR , 97.)
Aquilo é que são homens fortes.
(Ferreira de Castro, OC, 1 ,154.)
Aquilo são pés de veludo!
(M. Torga, NCM, 27.)
c) indignação:
— É tudo claro como água: este cão roubou-me. Acabo ainda hoje
com este malandro! Isto não fica assim.
(F. Namora, NM, 193.)
Oiço a voz tosca do pai, a insultar:
— Esta parva!... Esta burra!...
(Luandino Vieira, NM, 119.)
351
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— Aquilo é uma terra de línguas peçonhentas. Deus os confunda a
todos.
(A. Ribeiro, M, 346.)
d) pena, comiseração:
Quem mora ali? Mora ela,
Aquela!, —
Que nessa triste viela
Foi a flor da Mouraria!
(A. Botto, QA, 225.)
Aquela mulher, flor de poesia, era agora aquilo.
(A. M. Machado, HR, 67.)
— Há aqui falta de cuidado e asseio — disse consigo —; esta pobre
mulher vive aqui quase abandonada...
(A. de Assis Júnior, SM, 192.)
e) ironia, malícia:
Tem um decote pequeno,
Um ar modesto e tranquilo;
Mas vá-se lá descobrir
Coisa pior do que aquilo!
(F. Pessoa, QGP, n.° 251.)
— É um malandro, esse Barbaças!
(F. Namora, TJ, 193.)
— Este Brás! Este Brás! Não lhes digo nada!
(A. de Alcântara Machado, NP, 57.)
f ) sarcasmo, desprezo:
Isso era até uma vergonha!
(M. Torga, NCM, 91.)
Aquela desavergonhada da Helena não anda a dizer que é a ela que o
tio quer e é a ela que leva para o Rio?!
(A. Ribeiro, M, 349-350.)
PRONOMES
— Depois transformaram a senhora nisso, D. Adélia. Um trapo, uma
velha sem-vergonha.
(G. Ramos, A, 136.)
3. Digno de nota é o acentuado valor irônico, por vezes fortemente deprecia
tivo, dos neutros isto, isso e aquilo, quando aplicados a pessoas, como nestes
passos:
Ninguém sabe onde ele anda, Seu Coronel! Aquilo é um desgraçado.
(J. Lins do Rego, ME, 80.)
Aquilo, aquele pobre homenzinho amarelento, dessorado, chocho...
(U. Tavares Rodrigues, JE, 158.)
Como estivesse a contemplá-lo, à porta, parou um homem, entrou, e
olhou com interesse para o retrato. O lojista reparou na expressão; po
dia ser algum miguelista, mas também podia ser um colecionador...
— Quanto pede o senhor por isto?
— Isto? Há de perdoar; quer saber quanto peço pelo meu rico senhor
D. Miguel?
(Machado de Assis, OC, 1,908.)
Mas, pelos contrastes que não raro se observam nos empregos afetivos, po
dem esses d e m o n s t r a t i v o s expressar também alto apreço por determinada
pessoa.
Assim:
Aquilo é que dava um deputado às direitas!
(C. Castelo Branco, QA, 19.)
— Bonita mulher. Como aquilo vê-se pouco. Ele teve sorte.
(Castro Soromenho, C, 160.)
— Como cozinheira não há outra e aquilo... é o apuro de asseio.
(Alves Redol, G, 95.)
4. Entre os valores afetivos cabe ressaltar o sentido intensivo, superlativante,
que o demonstrativo adquire em frases do tipo8:
s Sobre estas construções, leia-se Maria Manuela Moreno de Oliveira. Processos de intensifica
ção no português contemporâneo. Lisboa, Centro de Estudos Filológicos, 1962, p. 35-38.
353
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Qual o quê! Queriam monte. Monte num dia daqueles!
(M. Torga, CM, 72.)
Ninguém é operado assim com essa pressa.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 365.)
Outro homem não podia existir com aquela força nos braços, aquele
riso na boca e aquele calor no peito.
(Adonias Filho, LBB, 8 6 .)
5. As formas femininas esta e essa fixaram-se em construções elípticas do tipo:
Ora essa!
Essa, não!
Mais esta!...
6.
Essa é boa!
Essa cá me fica!
Esta é fina!
Fixa também aparece a forma neutra na locução isto (ou isso) de, que equivale
a “com referência a”, “no tocante a”, “a respeito de”:
— Ah! meu caro Rubião, isto de política pode ser compar ado à paixão
de Nosso Senhor Jesus Cristo; não falta nada, nem o discípulo que
nega, nem o discípulo que vende.
(Machado de Assis, OC, 1,642.)
— Isso de letras é na escola...
(M. Torga, V", 174.)
— Isto de filhos é um aborrecimento!
(Ó. Ribas, EMT, 165.)
0(S), A(S) COMO DEMONSTRATIVOS
O demonstrativo o (a, os, as) é sempre pronome substantivo e emprega-se
nos seguintes casos:
a) quando vem determinado por uma oração ou, mais raramente, por uma
expressão adjetiva, e tem o significado de aquele(s), aquela(s), aquilo:
O homem que ri, liberta-se. O que faz rir, esconde-se.
(A. M. Machado, CJ, 228.)
— Não vejo a que esperei!
— Virá ainda.
(E. Castro, UV, 76.)
PRONOMES
Ingrata para os da terra,
boa para os que não são.
(C. Pena Filho, LG, 120.)
Era terrível o que se passava.
(M. Torga, NCM, 20.)
b) quando, no singular masculino, equivale a isto, isso, aquilo, e exerce as fun
ções de objeto direto ou de predicativo, referindo-se a um substantivo, a um
adjetivo, ao sentido geral de uma frase ou de um termo dela:
O valor de uma desilusão, sabia-o ela.
(M. Torga, NCM, 153.)
Não cuides que não era sincero, era-o.
(Machado de Assis, OC, 1,893.)
Seguia-o com o olhar sem me atrever a evitá-lo.
(A. Santos, P, 125.)
Ser feliz é o que importa,
Não importa como o ser!
(F. Pessoa, QGP, n.° 82.)
SUBSTITUTOS DOS PRONOMES DEMONSTRATIVOS
Podem também funcionar como demonstrativos as palavras tal, mesmo,
próprio e semelhante.
1. Talé demonstrativo q u a n d o sin ô n im o :
a)
d e “este”, “esta”, “isto ”, “esse”, “essa”, “isso”, “a q u e le ”, “a q u e la ”, “a q u ilo ”:
Tal foi a primeira conclusão do Palha; mas vieram outras hipóteses.
(Machado de Assis, OC, 1,602.)
— Quando tal ouvi, respirei...
(A. de Assis Júnior, SM, 176.)
Como era possível que nunca tivesse dado por tal?
(M. J. de Carvalho, TM, 57.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b) de “semelhante”:
Houve tudo quanto se faz em tais ocasiões.
(Machado de Assis, OC, II, 197.)
A causa verdadeira de tal medo, não a sabia dizer.
(M. Torga, CM, 151.)
Tal situação contundia-a fortemente, e fazia diminuir aquele vigor e
energia com que a conhecemos.
(A. Assis Júnior, SM, 198.)
2. Mesmo e próprio sã o
demonstrativos
q u a n d o tê m o s e n tid o d e “e x a to ”,
“id ê n tic o ”, “e m p esso a” :
Eu não posso viver muito tempo na mesma casa, na mesma rua, no
mesmo sítio.
(Luandino Vieira, JV, 62.)
— Foi a própria Carmélia quem me fez o convite.
(C. dos Anjos, DR, 161.)
3. Semelhante serve de
demonstrativo
d e id e n tid a d e :
O Lucas reparou nisso e doeu-se intimamente de semelhante des
cuido.
(M. Torga, CM, 84.)
Tudo o que disse foi, sem dúvida, convencional, e nem a jovem Aurora
podia deixar de recorrer às fórmulas que se usam em semelhantes
conjunturas.
(C. dos Anjos, DR, 284.)
PRONOMES RELATIVOS
São assim chamados porque se referem, de regra geral, a um termo anterior
--- O ANTECEDENTE.
FORMAS DOS PRONOMES RELATIVOS
Os
pronomes relativos
apresentam:
PRONOMES
a) fo rm a s variáveis e fo rm a s invariáveis:
V
a r iá v e is
I n v a r iá v e is
M
IF e m
a $c u u n o
o qual
os quais
in in o
a qual
as quais
que
cujo
cujos
cuja
cujas
quem
quanto
quantos
—
quantas
onde
b ) fo rm a s sim ples:
que, quem, cujo, quanto e onde; e
fo rm a c o m p o sta :
o qual
O bservação:
Antecedido das preposições a e de, o pronome onde com elas se aglutina, pro
duzindo as formas aonde e donde.
NATUREZA DO ANTECEDENTE
O ANTECEDENTE d o PRONOME RELATIVO p o d e Ser:
a) u m substantivo:
Deem-me as cigarras que eu ouvi menino.
(M. Bandeira, PP, 1,387.)
b ) u m pronome :
Não serás tu que o vês assim?
(A. Sérgio, D, 31.)
c) u m
adjetivo :
As opiniões têm como as frutas o seu tempo de madureza em que se
tornam doces de azedas ou adstringentes que dantes eram.
(Marquês de Maricá, M, 166.)
d ) u m advérbio:
Lá, por onde se perde a fantasia
No sonho da beleza; lá, aonde
A noite tem mais luz que o nosso dia...
(A. de Quental, SC, 61.)
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NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
e) u m a oração (d e reg ra re su m id a p e lo d e m o n stra tiv o
o):
Só a feb re a u m e n ta u m p o u c o , o que n ã o a d m ira rá n in g u é m .
(A. Nobre, Cl, 145-6.)
“Acomodar-se-iam num sítio pequeno,
o que parecia difícil a Fabiano,
criado solto no mato.”
(G. Ramos, V 5,172.)
FUNÇÃO SINTÁTICA DOS PRONOMES RELATIVOS
Os pronomes relativos assumem um duplo papel no período com represen
tarem um determinado antecedente e servirem de elo subordinante da oração
que iniciam. Por isso, ao contrário das conjunções, que são meros conectivos,
e não exercem nenhuma função interna nas orações por elas introduzidas,
estes pronomes desempenham sempre uma função sintática nas orações a que
pertencem. Podem ser:
1. Suieito :
Quero ver do alto o horizonte,
Que foge se m p re d e m im .
(O. Mariano, TVP, II, 434.)
[que = sujeito de foge].
2.
O b je t o d ir e t o :
— Já não se lembra da picardia que me fez?
(A. Ribeiro, M, 67.)
[que = objeto direto de fez].
3.
O b je t o in d ir e t o :
Eu aguardava com uma ansiedade medonha esta cheia de que tanto
se falava.
(J. Lins do Rego, ME, 58.)
[de que = objeto indireto de se falava].
PRONOMES
4. P redicativo:
Não conheço quem fui no que hoje sou.
(F. Pessoa, OP, 91.)
[quem e que = predicativos do sujeito eu, oculto].
5. A djunto adnominal :
Há pessoas cuja aversão e desprezo honram mais que os seus louvores
e amizade.
(Marquês de Maricá, M, 223.)
[cuja = adjunto adnominal de aversão e desprezo, mas em concordância
apenas com o primeiro substantivo, o mais próximo].
6. C omplemento nominal :
Lembrava-me de que deixara toda a minha vida ao acaso e que não
pusera ao estudo e ao trabalho com a força de que era capaz.
(Lima Barreto, REIC, 287.)
\de que = complemento nominal de capaz].
7. A diunto
adverbial:
Entrava-se de barco pelo corredor da velha casa de cômodos onde
eu morava.
(M. Quintana, P, 92.)
[onde = adjunto adverbial de morava].
8. A gente da passiva:
— Sim, sua adorável pupila, a quem amo, a quem idolatro e por quem
sou correspondido com igual ardor!
(A. Azevedo)
[por quem = agente da passiva do verbo conesponder].
Observação:
Note-se que o relativo cujo funciona sempre como adjunto adnominal; e o
relativo onde, apenas como adjunto adverbial.
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PRONOMES RELATIVOS SEM ANTECEDENTE
1.
Os p r o n o m e s r e l a t i v o s quem e onde podem ser empregados sem antecedente
em frases como as seguintes:
Quem tem amor, e tem calma,
tem calma... Não tem amor...
(A. Tavares, PC, 81.)
Passeias onde não ando,
Andas sem eu te encontrar.
(F. Pessoa, QGP, n.° 47.)
Denominam-se, então, r e l a t i v o s
in d e f in id o s .
2. Nestes casos de emprego absoluto dos r e l a t i v o s , muitos gramáticos admitem
a existência de um antecedente interno, desenvolvendo, para efeito de análise,
quem em aquele que, e onde em no lugar em que. Assim, os exemplos citados
se interpretariam:
Aquele que tem amor...
Passeias no lugar em que não ando...
3. O antecedente do
r e l a t iv o
quanto{s) costuma ser omitido:
Hoje penso quanto faço.
(F. Pessoa, OP, 92.)
Saibam quantos este meu verso virem
Que te amo...
(O. de Andrade, PR, 167.)
VALORES E EMPREGOS DOS RELATIVOS
Que
1.
Que é o r e l a t i v o básico. Usa-se com referência a pessoa ou coisa, no singular
ou no plural, e pode iniciar orações
a d ie t iv a s r e s t r it iv a s
— Não diz nada que se aproveite, esse rapaz!
(A. Bessa Luís, QR, 134.)
e e x p l ic a t iv a s :
PRONOMES
O ministro, que acabava de jantar, fumava calado e pacífico.
(Machado de Assis, OC, 1,638.)
2. O a n te c e d e n te d o
relativo
p o d e s e r o s e n tid o d e u m a e x p re s s ã o o u o r a ç ã o
a n te r io r :
E seu cabelo em cachos, cachos d’uvas,
E negro como a capa das viúvas...
(À maneira o trará das virgens de Belém
Que a Nossa Senhora ficava tão bem!)
(A. Nobre, S, 39.)
Neste caso, o que vem geralmente antecedido do demonstrativo o ou da
palavra coisa ou equivalente, que resumem a expressão ou oração a que o
relativo se refere:
Vendia cautelas, o que requer muito cálculo, muito olho e muita porfia.
(J. de Araújo Correia, FX, 54.)
Achou-se mais prudente que eu me safasse pelos fundos do prédio, o
que fiz tão depressa quanto pude.
(C. dos Anjos, MS, 328.)
Ela então consentiu que eu erguesse seu rosto, gesto que não me
haviam autorizado.
(N. Pinon, CP, 65.)
3. Por vezes, o antecedente do que não vem expresso:
Esta palavra doeu-me muito, e não achei logo que lhe replicasse.
(Machado de Assis, OC, 1,826.)
A uma pergunta assim, a rapariga nem sabia que responder.
(M.Torga, NCM, 184.)
Q u a l, o q u a l
1. Nas orações adjetivas explicativas, o pronome que, com antecedente subs
tantivo, pode ser substituído por o qual (a qual, os quais, as quais):
Sei que estou plagiando nosso famoso cronista, o qual, certa vez, deulhe na telha fazer essa comunicação ao jornal e aos leitores.
(C. Drummond de Andrade, CB, 57.)
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Durante o seu domínio, todavia, acentua-se a evolução do latim vul
gar, falado na península, o qual vinha de há muito diversificando-se
em dialetos vários.
(J. Cortesão, FDFP, 42.)
Clareava: uma luz baça, em neblina, através da qual apareciam serra
nias distantes e o mar liso, esbranquiçado, luzindo a trechos.
(Coelho Netto, OS, 1 ,173.)
2. Esta substituição pode ser um recurso de estilo, isto é, pode ser aconselhada
pela clareza, pela eufonia, pelo ritmo do enunciado. Mas há casos em que a
língua exige o emprego da forma o qual.
Precisando melhor:
que e m p re g a - s e , p r e f e r e n te m e n te ,
n o s s ilá b ic a s a, com, de, em e por:
a) o
relativo
d e p o is d a s p r e p o s iç õ e s m o
A verdade é um postigo
A que ninguém vem falar.
(E Pessoa, QGP, n.° 21.)
As artes com que o bacharel flautista vingou insinuar-se na estima de
D. Maria I e Pedro III, não as sei eu.
(C. Castelo Branco, OS, 1,322.)
Indicou-lhe um hotel, de que a viúva tomou nota num caderninho.
(C. Drummond de Andrade, CA, 137.)
Havia ocasiões em que me revoltava.
(L. Jardim, MPM, 96.)
A maneira por que ele falava é que era apaixonada, dolorosa, como
vente.
(Machado de Assis, OC, II, 112.)
b) as demais preposições simples, essenciais ou acidentais, bem como as locu
ções prepositivas, constroem-se obrigatória ou predominantemente com o
pronome o qual:
Tinha vindo para se libertar do abismo sobre o qual sua negra alma
vivia debruçada.
(M. Torga, NCM, 49.)
PRONOMES
Uma visita de dez minutos apenas, durante os quais D. Benedita disse
quatro palavras no princípio:
— Vamos para o Norte.
(Machado de Assis, OC, II, 316.)
“O livro tinha numa página a figura de um bicho corcunda ao lado do
qual, em letras graúdas, destacava-se esta palavra: ESTÔMAGO.”
(G. Amado, HMI, 42.)
Timbrava em manter em casa uma autoridade áspera, perante a qual
todos os seus tinham de se curvar passivamente.
(R. M. E de Andrade, V, 9.)
c) o qual é também a forma usada como partitivo após certos indefinidos,
numerais e superlativos:
O Luís, que cuidava da horta de cima, era pai de uns sete ou oito,
alguns dos quais já principiavam a ajudá-lo.
(R. M. F. de Andrade, V, 135.)
Cinco cadeiras das quais uma de braços no centro do semicírculo.
(Costa Andrade, NVNT, 13.)
Os filhos, quatro crianças, a mais velha das quais teria oito anos,
rodeavam-no aos gritos.
(Artur Azevedo, CFM, 5.)
3. Qual,
q u a n d o r e p e t i d o s im e tr ic a m e n te , é
in d e f in id o ,
e e q u iv a le a
um...
outro:
— Imagine uma cachoeira de ideias e imagens, qual mais original,
qual mais bela, às vezes extravagante, às vezes sublime.
(Machado de Assis, OC, II, 326.)
Um carrega quatro grandes tábuas ao ombro; outro grimpa, com risco
de vida, a precária torre do enguiçado elevador; qual bate o martelo;
qual despeja nas formas o cimento, qual mira a planta, qual usa a pá,
qual serra (o bárbaro) os galhos de uma jovem mangueira, qual ajusta,
neste momento, um pedaço de madeira na serra circular.
(R. Braga, CCE, 249.)
363
364
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Q uem
1. Na língua contemporânea, quem só se emprega com referência a pessoa ou
a alguma coisa personificada:
Feliz é quem tiver netos
De quem tu sejas avó!
(F. Pessoa, QGP, n.° 118.)
A mim quem converteu foi o sofrimento.
(Coelho Neto, OS, 1, 105.)
2. Como simples relativo , isto é, com referência a um antecedente explícito,
quem equivale a “o qual” e vem sempre antecedido de preposição:
A senhora a quem cumprimentara era a esposa do tenente-coronel
Veiga.
(Machado de Assis, OC, II, 172.)
Nada como o mexe-mexe caseiro da mulher de quem se gosta — José
de Arimateia imaginava.
(M. Palmério, CB, 25.)
Advirta-se, porém, que a língua moderna substitui por sem o (a) qual a dis
sonante combinação sem quem, de emprego corrente no português antigo e
médio.
3. Repetido, em fórmulas alternadas, quem corresponde ao in d efin id o um...
outro. Esta construção, que não era rara no português médio (cf. Camões.
Lusíadas, I, 92; IV, 5), só aparece, modernamente, em autores de expressão
artificial:
Quem no Rostro pasmando se extasia;
Quem pelo cúneo aos redobrados vivas
Da plebe e dos patrícios embasbaca;
Outro em sangue de irmãos folga ensopar-se...
(Odorico Mendes, VB, 125.)
C u jo
Cujo é, a um tempo, relativo e possessivo , equivalente pelo sentido a do qual,
de quem, de que. Emprega-se apenas como pronome adjetivo e concorda com a
coisa possuída em gênero e número:
PRONOMES
Convento cTáguas do Mar, ó verde Convento,
Cuja Abadessa secular é a Lua
E cujo Padre-capelão é o Vento
(A. Nobre, S, 28.)
Herculano é para mim, nas letras, depois de Camões, a figura em
cujo espírito e em cuja obra sinto com plenitude o gênio heroico de
Portugal.
(G. Amado, TL, 36.)
Q u a n to
Quanto, como simples relativo, tem por antecedente os pronomes indefini
dos tudo, todos (ou todas), que podem ser omitidos. Daí o seu valor também
indefinido:
Em tudo quanto olhei fiquei em parte.
(F. Pessoa, OP, 231.)
Soprava dum lado, do outro, e tudo quanto foi de garrancho e folha
seca se juntou num canto só.
(L. Jardim, BA, 115.)
Entre quantos te rodeiam,
Tu não enxergas teus pais.
(Gonçalves Dias, PCP, 385.)
O nde
1.
Como desempenha normalmente a íunção de adjunto adverbial (= o lugar
em que, no qual), onde costuma ser considerado por alguns gramáticos
ADVÉRBIO RELATIVO:
Sob o mar sem borrasca, onde enfim se descansa.
(A. Nobre, S, 90.)
Ainda não sei mesmo onde vou buscar as flores.
(Luandino Vieira, NM, 29.)
O mundo ia pouco além do quarteirão de poucas casas e largos
terrenos devolutos, onde o lixo subia, onde o capim crescia, onde
366
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
catávamos melões de São Caetano, onde os pirilampos surgiam aos
milhares ao cair da tarde, onde o orvalho brilhava como pedras pre
ciosas nas belas manhãs de inverno.
(Marques Rebelo, SMAP, 33.)
2. Embora a ponderável razão de maior clareza idiomática justifique o contraste
que a disciplina gramatical procura estabelecer, na língua culta contemporâ
nea, entre onde(= o lugar em que) e aonde (= o lugar a que), cumpre ressaltar
que esta distinção, praticamente anulada na linguagem coloquial, já não era
rigorosa nos clássicos.9
Não é, pois, de estranhar o emprego de uma forma por outra em passos
como os seguintes:
Vela ao entrares no porto
Aonde o gigante está!
(Fagundes Varela, VA, 76.)
Não perceberam ainda onde quero chegar.
(Alves Redol, BC, 47.)
Nem mesmo a concorrência de ambas as formas num só enunciado:
Mas aonde te vais agora,
Onde vais, esposo meu ? 10
(Machado de Assis, OC, III, 109.)
Ela quem é, meu coração? Responde!
Nada me dizes. Onde mora? Aonde?
(Teixeira de Pascoaes, OC, III, 14.)
PRONOMES INTERROGATIVOS
1. Chamam-se interrogativos os pronomes que, quem, qual e quanto, empre
gados para formular uma pergunta direta ou indireta:
‘J Sobre o emprego indiscriminado de onde e aonde, consulte-se a abundante exemplificação
coligida pelo professor Aurélio Buarque de Holanda, inserta em sua edição dos Contos
gauchescos e lendas do sul, de Simões Lopes Neto, 5.“ ed., Porto Alegre, Globo, 1957,
p. 79-82.
1,1 Na edição de 1902 das Poesias completas (Rio de Janeiro - Paris, Garnier, p. 207) lê-se vás
em ambos os versos.
PRONOMES
Que trabalho estão fazendo?
Diga-me que trabalho estão fazendo.
Quem disse tal coisa?
Ignoramos quem disse tal coisa.
Qual dos livros preferes?
Não sei qual dos livros preferes.
Quantos passageiros desembarcaram?
Pergunte quantos passageiros desembarcaram.
2.
Os pronomes interrogativos estão estreitamente ligados aos pronomes inde
finidos. Em uns e outros a significação é indeterminada, embora, no caso dos
interrogativos, a resposta, em geral, venha esclarecer o que foi perguntado.
FLEXÃO DOS INTERROGATIVOS
que e quem são invariáveis. Qual flexiona-se em número
{qual, quais); quanto, em gênero e em número (quanto, quanta, quantos, quantas).
Os
interrogativos
VALOR E EMPREGO DOS INTERROGATIVOS
Que
O interrogativo que pode ser:
a) pronome substantivo, quando significa “que coisa”:
1.
Que tenciona fazer quando sair daqui?
(A. Abelaira, TM, 8 6 .)
Mas não sei que disse a estrela...
(A. Tavares, PC, 9.)
b) pronome adjetivo, quando significa “que espécie de”, e neste caso refere-se a
pessoas ou a coisas:
Que mal me havia de fazer?
(M. Torga, NCM, 47.)
Não sei que vento mau turvou de todo o lago.
(A. de Guimaraens, OC> 56.)
368
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2. Para dar maior ênfase à pergunta, em lugar de que pronome substantivo,
usa-se o que:
O mundo? O que é o mundo, ó meu amor?
(E Espanca, S, 90.)
Não sei o que o trouxe aqui.
(C. de Oliveira, AC, 17.)
3. Tanto uma como outra forma pode ser reforçada por é que:
— Que é que o senhor está fazendo? gritou-lhe.
(C. Lispector, ME, 313.)
O que é que eu vejo, nestas tardes tristes?
(Teixeira de Pascoaes, OC, III, 24.)
Observação:
Nenhuma razão assiste aos que condenam a anteposição do o ao que interroga
tivo, como exaustivamente mostraram Heráclito Graça, em Factos da linguagem. Rio
de Janeiro. Livraria de Viúva Azevedo, 1904, p. 367-383; e Said Ali, em Dificuldades
da língua portuguesa. 5.“ ed. Rio de Janeiro, Acadêmica, 1957, p. 12-20; e Gramática
histórica da língua portuguesa. 3.11ed. São Paulo, Melhoramentos, 1964, p. 112-114.
Quem
1. O
interrogativo
quem é
p r o n o m e s u b s ta n tiv o e re fe re -s e a p e n a s a p e s s o a s
o u a a lg o p e r s o n if ic a d o :
Quem
Quem? Quem n ã o a
(J. de Lima, OC, 1,212.)
n ã o a c a n ta ?
c a n ta e sen te?
Perguntei ao doutor quem era a velha.
(J. de Araújo Correia, FX, 56.)
Mas a Ideia quem é? Quem foi que a viu,
Jamais, a essa encoberta peregrina?
(A. de Quental, SC, 59.)
2. Em orações com o verbo ser, pode servir de predicativo a um sujeito no
plural:
PRONOMES
Quem sois vós, meus irmãos e meus algozes?
(A. de Quental, SC, 92.)
Sabem, acaso, os vultos, quem vão sendo?
(C. Meireles, OP, 320.)
Q ual
1.
O interrogativo qual tem valor seletivo e pode referir-se tanto a pessoas
como a coisas. Usa-se geralmente como pronome adjetivo, mas nem sempre
com o substantivo contíguo. Nas perguntas feitas com o verbo ser, costuma-se empregar o verbo depois de qual:
— Qual é o hotel, em que rua fica?
(U. Tavares Rodrigues, NR, 76.)
Padre Manuel perguntou ao escudeiro do comendador qual era a
situação de D. Ana Vaz.
(C. Castelo Branco, OS, II, 247.)
2. A ideia seletiva pode ser reforçada pelo emprego da expressão qual dos (das
ou de), anteposta a substantivo ou a pronome no plural, bem como a nu
meral:
Qual dos senhores é pai dum menino que está de cócoras no jardim
há mais de meia hora?
(A. M. Machado, JT, 51.)
Qual deles tinha coragem para começar?
(F. Namora, TJ, 293.)
— Então, moça? qual foi dos nove?
(C. Castelo Branco, BP, 25.)
Q u a n to
O interrogativo quanto é um quantitativo indefinido. Refere-se a pessoas e a
coisas e usa-se quer como pronome substantivo, quer como pronome adjetivo:
— Quanto devo?
(G. Ramos, A, 167.)
370
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Quantas sementes lhe dás tu?
(R Namora, TJ, 158.)
EMPREGO EXCLAMATIVO DOS INTERROGATIVOS
Estes pronomes são também frequentemente usados nas exclamações, que
não passam muitas vezes de interrogações impregnadas de admiração. Confor
me a curva tonal e o contexto, podem assumir então os mais variados matizes
afetivos.
Comparem-se as frases seguintes:
Que inocência! Que aurora! Que alegria!
(Teixeira de Pascoaes, OC, III, 140.)
— Que vovozinha que nada! explodiu amarga a aniversariante.
(C. Lispector, LF, 58.)
— Coitada!... quem diria... quem imaginaria que acabaria assim!?...
(A. de Assis Júnior, SM, 52.)
Quem me dera ser homem!
(B. Santareno, TPM, 101.)
Quais feitios, qual vida!
(M. Torga, CM, 50.)
— E Sigefredo tem esperneado muito?
— Qual nada! Anda no mundo da lua.
(C. dos Anjos M, 295.)
Quanto sonho a nascer já desfeito!
(F. Espanca, S, 81.)
Ai, quanto veludo e seda,
e quantos finos brocados!
(C. Meireles, OP, 669.)
PRONOMES INDEFINIDOS
Chamam-se in d efin id o s o s pronomes que se aplicam à 3.a pessoa gramatical,
quando considerada de um modo vago e indeterminado.
PRONOMES
FORMAS DOS PRONOMES INDEFINIDOS
Os
pronom es ind efinidos
a p r e s e n ta m f o r m a s v a riá v e is e in v a riá v e is:
V ariáveis
I nvariáveis
M asculino
algum
nenhum
todo
outro
muito
pouco
certo
vário
tanto
quanto
qualquer
alguns
nenhuns
todos
outros
muitos
poucos
certos
vários
tantos
quantos
quaisquer
F eminino
alguma
nenhuma
toda
outra
muita
pouca
certa
vária
tanta
quanta
qualquer
algumas
nenhumas
todas
outras
muitas
poucas
certas
várias
tantas
quantas
quaisquer
alguém
ninguém
tudo
outrem
nada
cada
algo
LOCUÇÕES PRONOMINAIS INDEFINIDAS
Dá-se o nome de locuções pr o n o m in a is indefinidas aos grupos de pala
vras que equivalem a prono m es in d efin id o s : cada um, cada qual, quem quer
que, todo aquele que, seja quem for, seja qual for, etc.
PRONOMES INDEFINIDOS SUBSTANTIVOS E ADJETIVOS
1.
Os in d efin id o s alguém, ninguém, outrem, algo e nada só se usam como
pronomes substantivos:
E se alguém fosse avisar a Guarda?
(M. Torga, NCM, 52.)
Ninguém ainda inventou fósforos contra o vento?
(A. Abelaira, QPN, 25.)
Outrem a repetiu [a frase do discurso], até que muita gente a fez sua.
(Machado de Assis, OC, 1,921.)
Minha Teresa tem algo a me dizer, não é?
(J. Amado, TBCG, 289.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Não devo nada a ninguém.
(Alves Redol, SC, 43.)
2. Tudo é normalmente pronome substantivo, mas tem valor de adjetivo nas com
binações tudo isto, tudo isso, tudo aquilo, tudo o que, tudo o mais e semelhantes:
Subia as escadas que levavam à torre do palácio, meditando em tudo
isto.
(Alves Redol, BC, 58.)
Hoje, tudo isso, pássaros e estrelas caídas do céu, são memórias.
(J. C. de Carvalho, NMAI, 51.)
Pensando bem, tudo aquilo, era muito estranho.
(A. Meyer, SI, 25.)
3. Algum, nenhum, todo, outro, muito, pouco, vário, tanto e quanto são pronomes
adjetivos que, em certos casos, se empregam como pronomes substantivos.
Assim nestes períodos:
Todos estavam admirados.
(Castro Soromenho, TM, 186.)
Quando nos tornamos a ver, nenhum teve para o outro a mínima
palavra, ficamos a um banco, lado a lado, em expansivo silêncio.
(R. Pompeia, A, 205.)
4. Certo só se usa como pronome adjetivo:
Certos homens ergueram-se acima do seu tempo, acima da civilização.
(A. Abelaira, TM, 79.)
Em certo ponto a água cobria um homem.
(R. Pompeia, A, 47.)
5. Também os in d efinidos cada e qualquer, de acordo com a boa tradição da
língua, devem sempre vir acompanhados de substantivo, pronome ou nu
meral cardinal:
Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.
(F. Pessoa, OP, 206.)
PRONOMES
Está certo, cada qual como Deus o fez.
(G. Ramos, AOH, 111.)
Amava a Deus em cada uma das suas criaturas.
(B. Santareno, TPM, 47.)
Certas palavras não podem ser ditas em qualquer lugar e hora qual
quer.
(C. Drummond de Andrade, MA, 143.)
Qualquer caminho
Em qualquer ponto seu em dois se parte.
(F. Pessoa, OP, 476.)
OPOSIÇÕES SISTEMÁTICAS ENTRE OS INDEFINIDOS
Observam-se algumas oposições sistemáticas na classe dos
fin id o s . São bastante nítidas, por exemplo, as que se verificam:
a) entre o caráter afirmativo da série:
algum
alguém
algo
ninguém
nada
e o negativo da série:
nenhum
b) entre o caráter de totalidade inclusiva de:
tudo
todo
e o de totalidade exclusiva de:
nada
nenhum
c) entre a presença de ideia de pessoa em:
alguém
ninguém
e a ausência dessa ideia em:
a lg o
nada
pronomes in d e
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
d ) entre o valor particularizante de:
certo
e a total ausência de particularização de:
qualquer
Outras oposições privativas podem ser ainda assinaladas nesta classe tão
heterogênea de pronomes (as de certo / qualquer, muito / pouco, outro / outrem,
etc.), com vista a apresentá-la, de maneira mais coerente e, assim, justificar-lhe,
em parte pelo menos, a tradicional e unitária conceituação.
VALORES DE ALGUNS INDEFINIDOS
A lg u m e n e n h u m
1. Anteposto a um substantivo, algum tem valor positivo. É, como dissemos, o
contrário de nenhum:
— Com ele podes arranjar alguma coisa.
(Castro Soromenho, TM, 248.)
Não havia nele senão aspiração à grandeza verdadeira; nenhum cabotinismo, nenhuma vaidade, e sim um compreensível orgulho.
(A. F. Schmidt, F, 237.)
2. Posposto a um substantivo, algum assumiu, na língua moderna, significação
negativa, mais forte do que a expressa por nenhum. Em geral, o in d efin id o
adquire este valor em frases onde já existem formas negativas, como não,
nem, sem:
Já não morria naquele dia e não tinha pressa alguma em chegar a casa.
(Ferreira de Castro, OC, II, 694.)
Não escreveu, que eu saiba, livro algum.
(A. F. Schmidt, GB, 71-72.)
No português antigo e médio, podia dar-se a posposição de algum com
sentido positivo. Veja-se, por exemplo, este passo de Os lusíadas, em que a
expressão refresco algum deve ser entendida como “algum refresco”:
PRONOMES
Desta gente refresco algum tomamos
E do rio fresca água; mas com tudo
Nenhum sinal aqui da índia achamos
No povo, com nós outros quase mudo.
(Camões, Lus., V, 69.)
3. No feminino, aparece em construções de acentuado valor afetivo:
O lavrador ainda levantou a cabeça para fazer alguma das dele.
(Alves Redol, BC, 354.)
Alguma ele andou fazendo.
(F. Sabino, ME, 31.)
— Você quer sair da casa? Por alguma é?
(Eça de Queirós, 0 ,1 ,89.)
4. Reforçado por negativa, nenhum pode equivaler ao
in d efin id o
um:
Esse capitão não foi nenhum oficial de patente, mas um autêntico
capitão de terra e mar de Quatrocentos, ao mesmo tempo piloto dos
mares de Noroeste e regedor de capitania.
(V. Nemésio, Cl, 205.)
Eu, Marília, não fui nenhum vaqueiro
Fui honrado pastor da tua aldeia.
(T. A. Gonzaga, OC, 1,137.)
C ada
1. Como dissemos, deve-se empregar o in d efin id o cada apenas como pronom e
adietivo . Quando falta o substantivo, usa-se cada um (uma), cada qual:
Lá no fundo cada um espera o milagre.
(C. de Oliveira, PB, 156.)
Cada qual sabe de sua vida.
(J. Amado, MM, 95.)
2. Cada pode preceder um numeral cardinal para indicar discriminação entre
unidades, ou entre grupos ou séries de unidades:
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
De cada dúzia de ovos que vendia, a metade era lucro.
Vinha ver-me cada três dias.
3. Tem acentuado valor intensivo em frases do tipo:
A ti era o Chiado que te fazia mal! Apanhavas ali cada constipação...
(V. Vitorino, F, 160.)
— Você tem cada uma!
(G. Ramos, AOH, 75.)
O bservação:
Na linguagem informal é cada dia mais frequente o emprego substantivo
deste pronome em construções como a seguinte:
Estas águas-fortes custam dez mil cruzeiros cada.
C e rto
1.
Certo é pronom e indefinido quando anteposto a um substantivo. Caracteriza-o
a capacidade de particularizar o ser expresso pelo substantivo, distinguindo-o
dos outros da espécie, mas sem identificá-lo.
Dispensa, em geral, o artigo indefinido. A presença deste torna a expressão
menos vaga e dá-lhe um matiz afetivo.
Assim:
Sílvio não pede um amor qualquer, adventício ou anônimo; pede um
certo amor, nomeado e predestinado.
(Machado de Assis, OC, II, 552.)
No fim de contas, tinha uma certa mágoa da forma como a tratara.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 765.)
No rostinho enrugado e emurchecido, havia ainda uma certa graça
e vivacidade de menina.
(É. Veríssimo, A, II, 306.)
2.
É adjetivo, com o significado de “seguro”, “verdadeiro”, “exato”, “fiel”, “cons
tante”:
a) quando posposto ao substantivo:
— Idade certa não sei.
(G. França de Lima, JV, 35.)
PRONOMES
Homens de piso certo, seus passos derivam de suas lagoas interiores
de resignação.
(A. Santos, P. 177.)
— Não há carreira mais certa.
(Alves Redol, F, 279.)
b) em comparações intensivas, geralmente antecedido de tão:
Acredita que é tão certo como Deus estar no céu!
(M. Torga)
Estou tão certo do que digo como da luz que nos alumia.
(A. Ribeiro)
Neste caso pode ser seguido de substantivo:
Mais certo amigo é João do que Pedro, tão certo amigo é João como
Paulo.
(Sousa da Silveira, LP, 244.)
N ada
1. Nada significa “nenhuma coisa”, mas equivale a “alguma coisa” em frases
interrogativas negativas do tipo:
— O capitão não come nada?
— Eu agradeço, minha senhora.
(J. Lins do Rego, FM, 317.)
De tempos em tempos aparecia, perguntava se eu não queria nada.
(M. de Andrade, CMB, 285. )
2. Junto a um adjetivo ou a um verbo intransitivo pode ter força adverbial:
— Não foi nada caro, tive um grande desconto.
(A. Abelaira, QPN, 14.)
Não tinha um ar nada inocente. Mesmo nada.
(J. Cardoso Pires, D, 298.)
O cavalo não correu nada.
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O u tro
1.
Cumpre distinguir as expressões:
a) outro dia, ou o outro dia = um dia passado mas próximo:
— Outro dia fui à casa do Sebastião e lá aceitei um café.
(C. Drummond de Andrade, FA, 209.)
Contou-me a Ana, o outro dia,
Que Deus, somente o veria
Quem fosse Anjo, ninguém mais.
(A. Corrêa d’Oliveira, M, 92.)
b) no outro dia, ou ao outro dia = no dia seguinte:
No outro dia, de volta do campo, encontrei no alpendre João Nogueira,
Padilha e Azevedo Gondim.
(G. Ramos, SB, 52.)
No outro dia, o terceiro, Elmira não pôde sair mais cedo.
(A. de Assis Júnior, SM, 204.)
Ao outro dia, ao almoço, Amélia estava pálida, com as olheiras até
ao meio da face.
(Eça de Queirós, 0 ,1 ,69.)
Partiu o navio, ao outro dia de manhã.
(M. Ferreira, HB, 135.)
2. Em expressões denotadoras de reciprocidade, como um ao outro, um do
outro, um para o outro, conserva-se em geral a forma masculina, ainda que
aplicada a indivíduos de sexos diferentes:
Compreendi que um vínculo de simpatia moral nos ligava um ao
outro; com a diferença que o que era em mim paixão específica, era
nela uma simples eleição de caráter.
(Machado de Assis, OC, II, 496.)
A Judite dava toda a atenção ao seu par, a uma distância perigosa um
do outro.
(Almada Negreiros, NG, 93.)
PRONOMES
Sentou-se no canapé e ficamos a olhar um para o outro, ela desfeita
em graça, eu desmentindo Shelley com todas as forças sexagenárias
restantes.
(Machado de Assis, OC, 1 ,1129.)
3. Outro pode empregar-se como adjetivo na acepção de “diferente”, “mudado”,
“novo”:
Não sabia que assim tão outra voltarias:
Eras de negro olhar, de olhar azul tu voltas.
(A. de Guimaraens, OC, 105.)
Era outro homem, fora fundido noutro cadinho.
(Ferreira de Castro, OC, II, 93.)
Entrei em casa outro homem: calmo e bem humorado.
(R. M. F. de Andrade, V, 127.)
Q u a lq u e r
Tem por vezes sentido pejorativo, particularmente quando precedido de
artigo indefinido:
Não é uma qualquer coisa, não!
(Luandino Vieira, NM, 116.)
Ele não era um qualquer.
(M. Ferreira, HB, 47.)
— Júlio, se eu te falo assim é porque não te vejo como um qualquer.
(J. Lins do Rego, E, 253.)
A tonalidade depreciativa torna-se mais forte se o indefinido vem posposto
a um nome de pessoa:
Já não era uma Judite qualquer, era a Judite do Antunes.
(Almada Negreiros, NG, 8 6 .)
Hoje é isto que o senhor vê: um Pestana qualquer acha-se com o
direito de ser deputado.
(J. Lins do Rego, MR, 239.)
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Todo
No capítulo 9, estudamos o emprego do artigo com este
acrescentaremos o seguinte:
in d efin id o .
Aqui
1. No singular e posposto ao substantivo, todo indica a totalidade das partes:
Toda a obra é vã, e vã a obra toda.
(F. Pessoa, OP, 486.)
O conflito acordou o colégio todo.
(G. Amado, HM/, 163.)
2. Também indica a totalidade das partes, quando, no singular, antecede um
pronome pessoal:
Todo ele evidenciava um cansaço íntimo.
(M. Torga, V, 105.)
A casa, toda ela, gelava.
(C. de Oliveira, AC, 81.)
3. No plural, anteposto ou não, designa a totalidade numérica:
Todos os homens caminhavam em silêncio.
(Ferreira de Castro, OC, 1,446.)
As culpas todas eram deles; aguentassem com elas!
(A. Peixoto, PC, 449.)
4. Anteposto a um elemento nominal, aposto ou predicativo, emprega-se com
o sentido de “inteiramente”, “em todas as suas partes”, “muito”:
Silva estendeu a guia de trânsito a Vasconcelos, levantando-se da
secretária com um sorriso, todo amável.
(Castro Soromenho, TM, 132.)
Paisagem desconhecida, Manuel da Bouça era todo olhos para a
várzea que atravessavam.
(Ferreira de Castro, OC, 390.)
PRONOMES
Eras toda graça e incompreensão.
(Ribeiro Couto, PR, 226.)
Tudo
Refere-se normalmente a coisas, mas pode aplicar-se também a pessoas:
Não se fala noutra coisa, e está tudo furioso.
(A. de Quental, C, 358.)
Fidélia chegou, Tristão e a madrinha chegaram, tudo chegou.
(Machado de Assis, OC, 1 ,1069.)
Aqui na pensão e na casa da lagoa tudo dorme.
(J. Cardoso Pires, D, 339.)
Enfim, tudo aquilo era a mesma gente, exceto o Antunes.
(Almada Negreiros, NG, 92.)
Capítulo 12
Numerais
ESPÉCIES DE NUMERAIS
1. Para indicarmos uma quantidade exata de pessoas ou coisas, ou para assina
larmos o lugar que elas ocupam numa série, empregamos uma classe especial
de palavras — os num erais .
Os n u m e r a is podem ser c a r d in a is , o r d in a is , m u l t ip l ic a t iv o s e f r a
c io n á r io s .
2. Os numerais cardinais são os números básicos. Servem para designar:
a) a quantidade em si mesma, caso em que valem por verdadeiros substantivos:
Dois e dois são quatro.
b) uma quantidade certa de pessoas ou coisas, caso em que acompanham um
substantivo à semelhança dos adjetivos:
Geraldo Alonso levantou-se, deu três passos para a frente.
(O. Lins, FP, 158.)
Botou a cinco cântaros o mel... e a dois lagares o azeite.
(A. Ribeiro, M, 44.)
3. Os numerais ordinais indicam a ordem de sucessão dos seres ou objetos numa
dada série. Equivalem a adjetivos, que, no entanto, se substantivam facilmente:
A senhora Basília de Cedofeita, uma alfarrabista, era viúva e entendida
em primeiras edições.
(A. Bessa Luís, OM, 126.)
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Foi aí que se tornou a primeira de sua classe.
(A. de Alcântara Machado, NP, 125.)
4. Os numerais multiplicativos indicam o aumento proporcional da quantidade,
a sua multiplicação. Podem equivaler a adjetivos e, com mais frequência, a
substantivos, por virem geralmente antecedidos de artigo:
É um duplo receber, que é um duplo dar.
(J. M. de Macedo, RQ, 2.)
Tinha o dobro da minha grossura e era vermelho como malagueta.
(Ferreira de Castro, OC, 1 ,154.)
5. Os numerais fracionários exprimem a diminuição proporcional da quanti
dade, a sua divisão:
Já pagamos a metade da dívida.
Só recebeu dois terços do ordenado.
NUMERAIS COLETIVOS
Assim se denominam certos numerais que, como os substantivos coletivos,
designam um conjunto de pessoas ou coisas. Caracterizam-se, no entanto, por
denotarem o número de seres rigorosamente exato. É o caso de novena, dezena,
década, dúzia, centena, cento, lustro, milhar, milheiro,par.
FLEXÃO DOS NUMERAIS
CARDINAIS
1. Os n u m e r a i s
ca r d in a is
um, dois, e as centenas a partir de duzentos variam em
gênero:
um
dois
uma
duas
duzentos
trezentos
duzentas
trezentas
2. Milhão, bilhão (ou bilião), trilhão, etc. comportam-se como substantivos e
variam em número:
dois milhões
vinte trilhões
NUMERAIS
3. Ambos, que substitui o cardinal
os
dois, varia em gênero:
ambos os pés
4. Os outros
cardinais
ambas as mãos
são invariáveis.
ORDINAIS
Os numerais
ordinais
primeiro
vigésimo
v a r ia m e m g ê n e r o e n ú m e r o :
primeira
vigésima
primeiros
vigésimos
primeiras
vigésimas
MULTIPLICATIVOS
1. Os numerais multiplicativos são invariáveis quando equivalem a substantivos:
Podia ser meu avô, tem o triplo da minha idade.
Empregados com o valor de adjetivos flexionam-se em gênero e em número:
Costuma tomar o remédio em doses duplas.
2. As formas multiplicativas dúplice, tríplice, etc. variam apenas em número:
Deram-se alguns saltos tríplices.
FRACIONÁRIOS
1. Os numerais fracionários concordam com os cardinais que indicam o número
das partes:
Subscrevi um terço e Carlos dois terços do capital.
2. Meio concorda em gênero com o designativo da quantidade de que é fração:
Comprou três quilos e meio de carne.
Andou duas léguas e meia a pé.
Observação:
No Brasil, em lugar de meio-dia e meia (hora), diz-se normalmente meio-dia e
meio:
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386
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Meio-dia e meio... nada de Luzardo.
(Gilberto Amado, DP, 147.)
NUMERAIS COLETIVOS
Todos os num erais coletivos flexionam-se em número:
três décadas
dois milheiros
cinco dúzias
quatro lustros
VALORES E EMPREGOS DOS CARDINAIS
1. Na lista dos cardinais costuma-se incluir zero (0), que equivale a um subs
tantivo, geralmente usado em aposição:
grau zero
desinência zero
2. Cem, forma reduzida de cento, usa-se como um adjetivo invariável:
cem rapazes
cem meninas
Cento é também invariável. Emprega-se hoje apenas:
a) na designação dos números entre cem e duzentos:
cento e dois homens
cento e duas mulheres
b) precedido do artigo, com valor de substantivo:
Comprou um cento de bananas.
Pagou caro pelo cento de peras.
c) na expressão cem por cento.
3. Usa-se ainda conto (antigamente = um milhão de réis) no sentido de “mil
escudos” (em Portugal) e “mil reais” (no Brasil):
A gravura custou dois contos.
4. Bilhão (que também se escreve bilião) significava outrora “um milhão de
milhões”, valor que ainda conserva em Portugal, Grã-Bretanha, Alemanha e
no mundo de língua espanhola. No Brasil, na França, nos Estados Unidos
e em outros países representa hoje “mil milhões”.
NUMERAIS
Observação:
No Brasil quatorze alterna com catorze, que é a forma normal portuguesa. Em
Portugal empregam-se normalmente dezasseis, dezassete e dezanove, variantes de
susadas no Brasil.
CARDINAL COMO INDEFINIDO
O emprego do número determinado pelo indeterminado é um dos processos
de superlativação preferidos pelas línguas românicas.
Sirva de exemplo o cardinal mil, desde os começos da língua largamente
usado para expressar a indeterminação exagerada:
Em abril, chuvas mil.
EMPREGO DA CONJUNÇÃO E COM OS CARDINAIS
1. A conjunção e é sempre intercalada entre as centenas, as dezenas e as unidades:
trinta e cinco
trezentos e quarenta e nove
2. Não se emprega a conjunção entre os milhares e as centenas, salvo quando
o número terminar numa centena com dois zeros:
1892 = mil oitocentos e noventa e dois
1800 = mil e oitocentos
3. Em números muito grandes, a conjunção e emprega-se entre os membros da
mesma ordem de unidades, e omite-se quando se passa de uma ordem a outra:
293.572 = duzentos e noventa e três mil quinhentos e setenta e dois
332.415.741.211 = trezentos e trinta e dois bilhões, quatrocentos e
quinze milhões, setecentos e quarenta e um mil duzentos e onze
VALORES E EMPREGOS DOS ORDINAIS
1. Ao lado de primeiro, que é forma própria do ordinal, a língua portuguesa
conserva o latinismo primo (-a), empregado:
a) seja como substantivo, para designar parentesco (osprimos) e, na forma fe
minina (aprima), “a primeira das horas canônicas” e “a mais elevada corda”
de alguns instrumentos;
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b) seja como adjetivo, fixado em compostos como obra-prima e matéria-prima,
ou em expressões como números primos.
2, Certos ordinais, empregados com frequência para exprimir uma qualidade,
tornam-se verdadeiros adjetivos. Comparem-se:
Um material de primeira categoria [= superior].
Um artigo de segunda qualidade [= inferior].
3. Como em certos jogos as cartas, pedras ou pontos são designados pelas pa
lavras ás, duque, temo, quadra, a forma ás, equivalente a primeiro, passou a
designar os campeões, especialmente dos esportes:
Os ases do automobilismo.
EMPREGO DOS CARDINAIS PELOS ORDINAIS
Em alg u n s caso s, o
numeral ordinal
é s u b s titu íd o p elo cardinal c o rre s
p o n d e n te .
Assim:
l.°) Na designação de papas e soberanos, bem como na de séculos e de partes
em que se divide uma obra, usam-se os ordinais até décimo, e daí por diante o
cardinal, sempre que o numeral vier depois do substantivo:
GregórioVII (sétimo)
Pedro II (segundo)
Século X (décimo)
Ato III (terceiro)
Canto VI (sexto)
João XXIII (vinte e três)
Luís XIV (quatorze)
Século XX (vinte)
Capítulo XI (onze)
Tomo XV (quinze)
Quando o numeral antecede o substantivo, emprega-se, porém, o ordinal:
Décimo século
Terceiro ato
Sexto Canto
Vigésimo século
Décimo primeiro capítulo
Décimo quinto tomo
2.°) Na numeração de artigos de leis, decretos e portarias, usa-se o
até nono, e o cardinal de dez em diante:
Artigo l.° (primeiro)
Artigo 9.° (nono)
Artigo 10 (dez)
Artigo 41 (quarenta e um)
ordinal
NUMERAIS
3.
°) Nas referências aos dias do mês, usam-se os cardinais, salvo na desig
nação do primeiro dia, em que é de regra o ordinal. Também na indicação dos
anos e das horas empregam-se os cardinais:
Chegaremos às seis horas do dia primeiro de maio.
São duas horas da tarde do dia vinte e oito de julho de mil novecentos
e oitenta e três.
4.
°) Na enumeração de páginas e de folhas de um livro, assim como na
de casas, apartamentos, quartos de hotel, cabines de navio, poltronas de casas de
diversões e equivalentes empregam-se os cardinais. Nestes casos sente-se a
omissão da palavra número:
Página 3 (três)
Folha 8 (oito)
Cabine 2 (dois)
Casa 31 (trinta e um)
Apartamento 1 0 2 (cento e dois)
Quarto 18 (dezoito)
Se o numeral vier anteposto, usa-se o ordinal:
Terceira página
Oitava folha
Segunda cabine
Trigésima primeira casa
EMPREGO DOS MULTIPLICATIVOS
Dos multiplicativos apenas dobro, duplo e triplo são de uso corrente. Os
demais pertencem à linguagem erudita. Em seu lugar, emprega-se o numeral
cardinal seguido da palavra vezes: quatro vezes, oito vezes, doze vezes, etc.
EMPREGO DOS FRACIONÁRIOS
1.
Os números fracionários apresentam as formas próprias meio (ou metade)
e terço. Os demais são expressos:
a) p e lo ordinal c o rre s p o n d e n te , q u a n d o este se c o m p õ e d e u m só radical:
quarto, quinto, décimo, vigésimo, milésimo, etc.;
b ) p e lo cardinal c o rre s p o n d e n te , se g u id o d a p alav ra avos, q u a n d o o ordinal é
u m a fo rm a c o m p o sta : treze avos, dezoito avos, vinte e três avos, cento e quinze
avos.
2.
Excetuando-se meio, os numerais fracionários vêm antecedidos de um cardi
nal, que designa o número de partes da unidade: um terço, três quintos, cinco
treze avos.
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Observações:
1.
a) No Brasil, a expressão meia dúzia (não raro reduzida a meia) substitui o
cardinal seis, principalmente quando se enunciam números de telefone.
2.
a) A forma fracionária duodécimo é de uso normal, na linguagem administrativa,
nas áreas em que a distribuição orçamentária se processa por parcelas mensais:
O Departamento já recebeu o segundo duodécimo.
QUADROS DOS NUMERAIS
NUMERAIS CARDINAIS E ORDINAIS
A lgarismos
C
R
om anos
1
A
O
a r d in a is
r d in a is
r á b ic o s
1
um
primeiro
II
2
dois
segundo
III
3
três
terceiro
IV
4
quatro
quarto
V
5
cinco
quinto
VI
6
seis
sexto
VII
7
sete
sétimo
VIII
8
oito
oitavo
IX
9
nove
nono
X
10
dez
décimo
XI
11
onze
undécimo ou décimo primeiro
XII
12
doze
duodécimo ou décimo segundo
XIII
13
treze
décimo terceiro
XIV
14
quatorze
décimo quarto
XV
15
quinze
décimo quinto
XVI
16
dezesseis
décimo sexto
XVII
17
dezessete
décimo sétimo
XVIII
18
dezoito
décimo oitavo
XIX
19
dezenove
décimo nono
XX
20
vinte
vigésimo
XXI
21
vinte e um
vigésimo primeiro
XXX
30
trinta
trigésimo
XL
40
quarenta
quadragésimo
L
50
cinquenta
quinquagésimo
LX
60
sessenta
sexagésimo
LXX
70
setenta
septuagésimo
NUMERAIS
A
l g a r is m o s
C
R
A
om anos
O
a r d in a is
r d in a is
r ã b ic o s
LXXX
80
oitenta
octogésimo
xc
c
cc
ccc
90
noventa
nonagésimo
100
cem
centésimo
200
duzentos
ducentésimo
300
trezentos
trecentésimo
CD
400
quatrocentos
quadringentésimo
D
500
quinhentos
quingentésimo
DC
600
seiscentos
seiscentésimo ou sexcentésimo
DCC
700
setecentos
septingentésimo
DCCC
800
oitocentos
octingentésimo
CM
900
novecentos
nongentésimo
M
1 000
mil
milésimo
X
10 000
dez mil
dez milésimos
C
100 000
cem mil
cem milésimos
M
1 000 000
um milhão
milionésimo
1SÄ
1 000 000 000
um bilhão
bilionésimo
NUMERAIS MULTIPLICATIVOS E FRACIONÁRIOS
M
F r a c io n á r io s
u l t ip l ic a t iv o s
duplo, dobro, dúplice
meio ou metade
triplo, tríplice
terço
quádruplo
quarto
quíntuplo
quinto
sêxtuplo
sexto
séptuplo
sétimo
óctuplo
oitavo
nônuplo
nono
décuplo
décimo
undécuplo
undécimo ou onze avos
duodécuplo
duodécimo ou doze avos
cêntuplo
centésimo
391
Capítulo 13
Verbo
NOÇÕES PRELIMINARES
1. V erbo é u m a p a la v ra d e fo rm a v ariáv el q u e e x p rim e o q u e se passa, isto é,
u m a c o n te c im e n to re p re s e n ta d o n o te m p o :
Um dia, Aparício desapareceu para sempre.
(A. Meyer, SI, 25.)
A mulher foi educada por minha mãe.
(Machado de Assis, OC, 1,343.)
Como estavam velhos!
(A. Bessa Luís, S, 189.)
Anoitecera já de todo.
(C. de Oliveira, AC, 19.)
2.
I
O verbo não tem, sintaticamente, uma função que lhe seja privativa, pois
também o substantivo e o adjetivo podem ser núcleos do predicado. Indi
vidualiza-se, no entanto, pela função obrigatória de predicado, a única que
desempenha na estrutura oracional. 1
Daí a definição de A. Maria Barrenechea: “Os verbos são as palavras que tém a fiinção
obrigatória de predicado e um regime próprio” (Las ciases de palabras en espanol como
clases funcionales. Romance Philology, 17:306-307,1963).
394
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
FLEXÕES DO VERBO
O
apresenta as variações de
e de voz.
verbo
de aspecto
n ú m ero ,
de
pessoa ,
de
modo,
de
tem po ,
NÚMEROS
Como as outras palavras variáveis, o verbo admite dois números: o singular
e o plural . Dizemos que um verbo está no singular quando ele se refere a uma
só pessoa ou coisa e, no plural, quando tem por sujeito mais de uma pessoa ou
coisa. Exemplo:
S in g u l a r
e s tu d o
e stu d a s
e s tu d a
P lu r a l
e s tu d a m o s
e s t u d a is
e stu d a m
PESSOAS
O v e rb o p o ssu i trê s pessoas rela c io n a d a s d ire ta m e n te co m a p e sso a g ra m a
tical q u e lhe serve de sujeito .
1. A primeira é aquela que fala e corresponde aos pronomes pessoais eu (sin
gular) e nós (plural):
e s tu d o
e s tu d a m o s
2. A segunda é aquela a quem se fala e corresponde aos pronomes pessoais tu
(singular) e vós (plural):
e stu d a s
e stu d a is
3. A terceira é a q u e la de q u e m se fala e c o rre s p o n d e aos p ro n o m e s p esso ais ele,
ela (sin g u lar) eles, elas (p lu ra l):
e stu d a
e s tu d a m
MODOS
Chamam-se modos as diferentes formas que toma o verbo para indicar a
atitude (de certeza, de dúvida, de suposição, de mando, etc.) da pessoa que fala
em relação ao fato que enuncia.
Há três modos em português: o indicativo, o subjuntivo e o imperativo. D os
seus valores e empregos tratamos, com o necessário desenvolvimento, adiante,
VERBO
n e ste m e sm o c a p ítu lo , o n d e ta m b é m e s tu d a m o s as formas nominais d o verbo:
O INFINITIVO, O GERÚNDIO e O PARTICÍPIO.
TEMPOS
T empo é a v a ria ç ã o q u e in d ic a o m o m e n to e m q u e se dá o fato ex p resso p e lo
v erb o .
O s trê s te m p o s n a tu ra is são o presente, o pretérito ( ou passado) e o futuro ,
q u e d e sig n a m , re sp e c tiv a m e n te , u m fato o c o rrid o no momento em que se fala,
antes tio momento em que sefala e após o momento em que se fala.
O presente é indivisível, m a s o pretérito e o futuro s u b d iv id e m -se n o modo
indicativo e n o subjuntivo , c o m o se vê d o se g u in te esq u em a:
Presente:
e stu d o
imperfeito:
Pretérito
e stu d a v a
simples: e s t u d e i
perfeito
composto: t e n h o
e stu d a d o
IN D ICATIVO
■<
simples:
mais-que-perfeito
composto: t in h a ou
simples:
do presente
J Pretérito
composto: t e r i a ou
e stu d a sse
. perfeito: t e n h a ou
h a ja e s t u d a d o
mais-que-perfeito: t iv e s s e ou
Futuro
Presente
h o u v e sse e stu d a d o
” simples: e s t u d a r
composto: t i v e r ou
Im p e r a t i v o
h a v e r ia e s t u d a d o
e stu d e
imperfeito:
u b ju n t iv o
h a v e re i e stu d a d o
simples: e s t u d a r ia
do pretérito2
S
h a v ia e s t u d a d o
e stu d a re i
composto: t e r e i ou
Futuro
Presente:
e stu d a ra
e stu d a
e stu d a i
h o u v e r e stu d a d o
(tu), e s t u d e (você), e s t u d e m o s (nós),
(vós), e s t u d e m (vocês).
• De acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira — e afastando-nos neste ponto
deliberadamente da tradição gramatical portuguesa — adotamos esta designação, em
lugar de m o d o c o n d i c i o n a l , por a julgarmos mais adequada. Veja-se o que dizemos na
página 478 (Observação 3.a), ao tratarmos do emprego deste tempo.
395
396
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
ASPECTOS
1. Diferente das categorias do tempo , do modo e da voz, o aspecto designa “uma
categoria gramatical que manifesta o ponto de vista do qual o locutor consi
dera a ação expressa pelo verbo”. Pode ele considerá-la como concluída, isto
é, observada no seu término, no seu resultado; ou pode considerá-la como
não concluída, ou seja, observada na sua duração, na sua repetição.-1
É a c la ra d is tin ç ã o q u e se v e rific a e m p o r tu g u ê s e n t r e as f o r m a s v e rb a is c la s
s ific a d a s c o m o PERFEITAS OU MAIS-QUE-PERFEITAS, d e U m la d o , e a s IMPERFEITAS,
d e o u tr o .
2. Além dessa distinção básica, que divide o verbo, gramaticalmente, em dois gran
des grupos de formas, costumam alguns estudiosos alargar o conceito de aspecto,
nele incluindo valores semânticos pertinentes ao verbo ou ao contexto.
Assim, nestas frases:
João começou a comer.
João continua a comer.
João acabou de comer.
n ã o h á , a b e m d iz e r, u m a o p o s iç ã o g r a m a tic a l d e a s p e c to . É o p r ó p r i o
s ig n ific a d o d o s a u x ilia re s q u e tr a n s m ite a o c o n te x to o s s e n tid o s
incoativo ,
PERMANSIVO e CONCLUSIVO.
Dentro dessa lata conceituação, poderíamos distinguir, entre outras, as se
guintes oposições aspectuais:
l.a) A specto pontual / aspecto durativo. A oposição aspectual caracteriza-se
neste caso pela menor ou maior extensão de tempo ocupada pela ação verbal.
Assim:
Aspecto pontual
Acabo de ler Os lusíadas.
Aspecto durativo
Continuo a ler Os lusíadas.
2.a) A specto continuo / aspecto descontínuo . Aqui a oposição aspectual incide
sobre o processo de desenvolvimento da ação:
3
Aspecto contínuo
Vou lendo Os lusíadas.
Aspecto descontínuo
Voltei a ler Os lusíadas.
Conrad Bureau. In Dictionnaire de la linguistique: sous la direction de Georges Mounin.
Paris, P.U.F., 1974, p. 41.
VERBO
3.a) A specto incoativo / aspecto conclusivo . O aspecto incoativo exprime um
processo considerado em sua fase inicial; o aspecto conclusivo ou terminativo
expressa um processo observado em sua fase final:
Aspecto incoativo
Comecei a ler Os lusíadas.
Aspecto conclusivo
Acabei de ler Os lusíadas.
3. São também de natureza aspectual as oposições entre:
a) F orm a simples / perífrase durativa :
leio / estou lendo (ou estou a ler)
A perífrase de estar + g er ú n d io ( o u in fin itiv o precedido da preposição
a), que designa o “aspecto do momento rigoroso” (Said Ali), estende-se a
todos os modos e tempos do sistema verbal e pode ser substituída por outras
períffases, formadas com os auxiliares de movimento (andar, ir, vir, viver,
etc.) ou de implicação (continuar, ficar, etc.):
Ando lendo (ou a ler).
Vai lendo.
Continuo lendo (ou a ler).
Ficou lendo (ou a ler).
b) Ser / estar.
Ele foi ferido.
Ele está ferido.
A oposição ser / estar corresponde a dois tipos de passividade. Ser forma a
passiva de ação; estar, a passiva de estado.4
Como vemos, tais oposições se baseiam fundamentalmente na diversidade
de formação das períffases verbais.
De um modo geral, pode-se dizer que as perífrases construídas com o par t ic Ipio exprimem o aspecto acabado, concluído; e as construídas com o in
finitivo ou o gerún dio expressam o aspecto inacabado, não concluído.
Dos seus principais valores aspectuais trataremos adiante ao estudarmos os
verbos auxiliares e a s formas nom inais do verbo.
1 Quanto às construções com ser e estar em espanhol, mas com interesse para o português,
veja-se a monografia de Ricardo Navas Ruiz. Sery estar. Estudio sobre elsistema atributivo
dei espanol. Salamanca, Acta Salmanticensia, 1963.
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Observações:
1. a) Estudiosos há que, seguindo o eslavista Agrei, distinguem aspecto de mo
dalidade de ação, considerando o primeiro a categoria gramatical que opõe a ação
concluída à não concluída, e a segunda toda oposição expressa por meios lexicais, o
que abrange um número ilimitado de possibilidades semânticas. Veja-se a respeito:
Robert Martin. Temps et aspect. Essai sur l’emploi des temps narratifs en moyen fran
çais. Paris, Klincksieck, 1971. p. 56; --------- . Temps et aspect en français moderne.
Quelques remarques inspirées para la lecture de Verbe et adverbe de M. A. Klum.
Travaux de Linguistique et de Littérature,3(1 ): 67-79, especialmente p. 76-79; L. Jenaro
Maclennan. El problema dei aspecto verbal. Estúdio crítico de sus presupuestos. Madrid,
Gredos, 1962, p. 146-150; Arne Klum. Verbe et adverbe. Etude sur le système verbal
indicatif et sur le système de certains adverbes de temps à la lumière des relations verbo-adverbiales dans la prose du français contemporain. Stockholm, Almqvist & Wiksell,
1961, p. 107 passim; Ataliba T. de Castilho. Introdução ao estudo do aspecto verbal na
língua portuguesa. Marília, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, 1968, p. 39-44;
Claudino Cella. Système verbal français et système verbal portugais. Etude comparative.
Metz, Université de Metz, 1978, p. 61-65 (com larga bibliografia sobre o assunto).
2.
a) É hoje vastíssima a bibliografia sobre aspecto verbal. Além da que se contém
nas obras citadas na observação anterior, veja-se a que dá Marc Wilmet em Etudes de
morpho-syntaxe verbale. Paris, Klincksieck, 1976, p. 153; e em: Aspect grammatical,
aspect sémantique, aspect lexical: un problème de limites. In La Notion d'Aspect.
Colloque organisé par le Centre d’Analyse Syntaxique de l’Université de Metz. Actes
publiés par Jean David et Robert Martin. Paris, Klincksiek, 1980, p. 51-52. Estas Atas
reproduzem o texto das comunicações de Eugênio Coseriu, Martin S. Ruipérez, Joe
Larochette, Gérard Moignet, Marc Wilmet, Maurice Gross, Jean-Marie Zemb, Gérold
Stahl, J. Hoepelman - C. Rohrer, Frédéric Nef, Antoine Culioli, J.-P. Desclés, Bernard
Pottier e representam uma súmula conclusiva das principais questões concernentes
ao aspecto em geral.
VOZES
O fato expresso pelo verbo pode ser representado de três formas:
a) como praticado pelo sujeito:
João feriu Pedro.
Não vejo rosas neste jardim.
b) como sofrido pelo sujeito:
Pedro foi ferido por João.
Não se veem [= são vistas] rosas neste jardim.
VERBO
c) como praticado e sofrido pelo sujeito:
João feriu-se.
Dei-me pressa em sair.
No primeiro caso, diz-se que o verbo está na v o z ativa; no segundo, na voz
passiva; no terceiro, na v o z reflexiva.
Como se verifica dos exemplos acima, o objeto direto da voz ativa corres
ponde ao sujeito da voz passiva; e, na voz reflexiva, o objeto direto ou indireto
é a mesma pessoa do sujeito. Logo, para que um verbo admita transformação
de voz, é necessário que ele seja transitivo .
Voz passiva. Exprime-se a v o z passiva:
a) com o verbo auxiliar ser e o particípio do verbo que se quer conjugar:
Pedro foi ferido por João.
b) com o pr o n o m e apassivador se e uma terceira pessoa verbal, singular ou
plural, em concordância com o sujeito:
Não se vê [=é vista] uma rosa neste jardim.
Não se veem [são vistas] rosas neste jardim.
Voz reflexiva. Exprime-se a voz reflexiva juntando-se às formas verbais da
voz ativa os pronomes oblíquos me, te, nos, vos e se (singular e plural):
Eu me feri [=a mim mesmo]
Tu te feriste [= a ti mesmo]
Ele se feriu [= a si mesmo]
Nós nos ferimos [= a nós mesmos]
Vós vos feristes [= a vós mesmos]
Eles se feriram [= a si mesmos]
Observações:
l.a) Além do verbo ser, há outros auxiliares que, combinados com um particípio,
podem formar a voz passiva. Estão nesse caso certos verbos que exprimem estado
(estar, andar, viver, etc.), mudança de estado (ficar) e movimento (ir, vir):
Os homens já estavam tocados pela fé.
Ficou atormentado pelo remorso.
Os pais vinham acompanhados dos filhos.
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400
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2.a) Nas formas da voz
o sujeito:
passiva, o
partidpio concorda em gênero e número com
Ele foi ferido
Ela foi ferida
Eles foram feridos.
Elas foram feridas.
FORMAS RIZOTÔNICAS E ARRIZOTÔNICAS
Em certas formas verbais, o acento tônico recai no radical. Assim:
ando
ande
andas
andes
anda
ande
andam
andem
Em outras, o acento tônico recai na terminação. Assim:
andamos
andemos
andais
andeis
Às primeiras damos o nome de
andou
andava
formas rizotònicas ;
andar
andará
às segundas, de
formas
ARRIZOTÔNICAS.
CLASSIFICAÇÃO DO VERBO
1. Quanto
à
flexào , o
verbo pode ser
regular , irregular , defectivo
e abun
dante .
Os regulares flexionam-se de acordo com o pa r a d ig m a , modelo que
representa o tipo comum da conjugação. Tomando-se, por exemplo, cantar,
vender e partir como paradigmas da 1.a, 2.a e 3.®conjugações, verificamos que
todos os verbos regulares da 1 .a conjugação formam os seus tempos como
cantar, os da 2.a, como vender, os da 3.a como partir.
São irregulares os verbos que se afastam do paradigma de sua conjugação,
como dar, estar, fazer, ser, pedir, ir e vários outros, que no lugar próprio
estudaremos.
V erbos defectivos são aqueles que não têm certas formas, como abolir, falir
e mais alguns de que tratamos adiante. Entre os defectivos costumam os
gramáticos incluir os unipessoais , especialmente os impessoais, usados apenas
na 3.a pessoa do singular: chover, ventar, etc.
A bundantes são os verbos que possuem duas ou mais formas equivalentes.
De regra, essa abundância ocorre no particípio. Assim, o verbo aceitar apre
senta os particípios aceitado, aceito e aceite; o verbo entregar, os particípios
entregado e entregue; o verbo matar, os particípios matado e morto.
VERBO
Observação:
A Nomenclatura Gramatical Brasileira distingue verbos irregulares de verbos
anômalos, aplicando a última denominação a verbos como estar, haver, ser, ter, ir,
vir e pôr, cujas profundas irregularidades não se enquadram em classificação alguma.
Esta distinção não é adotada pela Nomenclatura Gramatical Portuguesa.
2. Quanto à fu n ç ã o , o verbo pode ser principal
o u auxiliar .
P rincipal , é o v e r b o d e s ig n ific a ç ã o p le n a , n u c le a r d e u m a o r a ç ã o .
Assim:
Estudei português.
Haverá uma solução para o caso.
Comprei um livro.
aquele que, desprovido total ou parcialmente da acepção própria,
se junta a formas nominais de um verbo principal, constituindo com elas
locuções que apresentam matizes significativos especiais. Assim:
A uxiliar é
Tenho estudado p o r tu g u ê s .
Há de haver uma solução para o caso.
Um livro foi comprado por mim.
Os auxiliares mais comuns são ter, haver, ser e estar, de que apresentamos,
adiante, a conjugação completa.
CONJUGAÇÕES
um verbo é dizê-lo em todos os modos, tempos, pessoas, números
e vozes. O agrupamento de todas essas flexões, segundo uma ordem determinada,
chama-se c o n iu g a ç à o .
Há três conjugações em português, caracterizadas pela vogal tem ática .
A l.a conjugação compreende os verbos que têm a vogal temática -a-:
C onjugar
estud-a-r
fic-a-r
rem-a-r
A 2.a conjugação abarca os verbos que têm a vogal temática -e-:
receb-e-r
dev-e-r
tem-e-r
À 3.a conjugação pertencem os verbos que têm a vogal temática -i
dorm-i-r
part-i-r
sorr-i-r
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Como as vogais temáticas se apresentam com maior nitidez no infinitivo,
costuma-se indicar pela term inação deste (= vogal tem ãtica + sufixo -r) a con
jugação a que pertence um dado verbo. Assim, os verbos de infinitivo terminado
em -ar são da l.a conjugação; os de infinitivo em -er, da 2 .a; os de infinitivo em
-ir, da 3.a.
TEMPOS SIMPLES
E s t r u t u r a d o v e rb o
1. Examinemos os seguintes tempos do indicativo do verbo cantar:
P r es en t e
P r et ér it o
im p er feito
P r et ér it o
m ais -que -p er feit o
c a n to
c a n ta v a
c a n ta ra
c a n ta s
ca n ta v a s
ca n ta ra s
c a n ta
c a n ta v a
c a n ta ra
ca n ta m o s
ca n tá v a m o s
ca n tá ra m o s
c a n t a is
c a n t á v e is
c a n t á r e is
c a n ta m
ca n ta va m
ca n ta ra m
Verificamos que todas as suas formas se irmanam pelo radical cant-, a parte
invariável que lhes dá a base comum de significação.
Verificamos também que a esse radical verbal se junta, em cada forma, uma
term inação , da qual participa pelo menos um dos seguintes elementos:
a) a
vogal tem ãtica
-a-, c a r a c te r ís tic a
cant-a
b) o
sufixo tem poral
d o s v e r b o s d a l . a c o n ju g a ç ã o :
cant-a-va
(o u
m o d o - tem poral ),
cant-a-ra
q u e in d ic a o te m p o e o m o d o :
cant-a-va
c) a
cant-a-ra
desinência pessoal ( o u n Om e r o - pessoal ),
q u e id e n tif ic a a p e s s o a e o n ú
m e ro :
cant-o
cant-a-va-s
cant-á-ra-mos
2. Todo o mecanismo da formação dos tempos simples repousa na combinação
harmônica desses três elementos flexivos com um determinado radical verbal.
Muitas vezes falta um deles, como:
VERBO
a) a vogal temática, no presente do subjuntivo e, em decorrência, nas formas
do imperativo dele derivadas: cante, cantes, cante, etc.;
b) o sufixo temporal, no presente e no pretérito perfeito do indicativo, bem
como nas formas do imperativo derivadas do presente do indicativo: canto,
cantas, canta, etc.; cantei, cantaste, cantou, etc.; canta (tu), cantai (vós);
c) a desin Encia pessoal, n a 3 .11 p e sso a d o s in g u la r d o p re s e n te d o in d ic a tiv o
(canta); n a l . a e n a 3.a p esso a d o s in g u la r d o im p e rfe ito (cantava), d o m a isq u e -p e rfe ito (cantara) e d o f u tu r o d o p r e té r ito (cantaria) d o in d ic a tiv o ;
e n e s ta s m e sm a s p e sso a s d o p re s e n te (cante), d o im p e rfe ito (cantasse) e
d o f u tu r o (cantar) d o s u b ju n tiv o , assim c o m o n a s d o in fin itiv o p e sso a l
(cantar).
Mas, salvo no caso em que a falta de desinência iguala duas pessoas de um
só tempo, perturbando a clareza, a ausência de qualquer desses elementos
flexivos é sempre um sinal particularizante, pois caracteriza a forma lacunosa
pelo seu contraste com as que não o são.
F o rm a ç ã o d o s te m p o s s im p le s
1. Com exceção do infinitivo pessoal, os tempos simples dos verbos portugueses
correspondem a formações existentes no latim clássico ou no latim vulgar,
que sofreram, com os séculos, naturais alterações fonéticas. O estudo dessa
evolução é matéria que pertence à chamada gramática histórica e excede,
naturalmente, os limites deste livro de natureza sincrônica. Podemos, no
entanto, adotar aqui um vulgarizado artifício didático para melhor apreen
dermos o mecanismo das conjugações.
Consiste tal artifício em admitir que o verbo apresente três tempos primitivos,
sendo os outros deles derivados.
São tempos primitivos: o presente do indicativo, o pretérito perfeito do
INDICATIVO e O INFINITIVO IMPESSOAL.
2. Para mostrar a valia didática deste processo formativo, tomemos como exem
plo os verbos cantar, vender e partir, e separemos nos seus tempos simples o
RADICAL, OU O TEMA (= RADICAL + VOGAL TEMÁTICA), da TERMINAÇÃO, incluindo
nesta o sufixo temporal e a desinência número - pessoal.
D e r iv a d o s d o p r e s e n te d o in d ic a tiv o
Do
presente do indicativo
presente do subjuntivo
eo
form am -se o
im perfeito do in d ica tivo , o
imperativo.
l.° ) I mperfeito do indicativo . É fo rm a d o d o rad ic a l d o p re se n te acrescido:
403
404
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
a) na 1 .®conjugação, das terminações -ava, -avas, -ava, -ávamos, -áveis, -avam
(constituídas da vogal temática -a- + sufixo temporal -va- + desinências
pessoais);
b) na 3.® conjugação, das terminações -ia, -ias, -ia, -íamos, -íeis, -iam (consti
tuídas da vogal temática -i- + sufixo temporal -a- + desinências pessoais);
c) na 2.® conjugação, das mesmas terminações da 3.®, por ter a vogal temática
-e- passado a -i- antes de -a-.
Assim, nos verbos cantar, vender e partir, temos:
R a d ic a l , do
P
Im
presec te
1.aCONJUGAÇÃO
2.aCONJUGAÇÃO
3»aCONJUGAÇÃO
cant*
vend-
part-
cant-ava
vend-ia
part-ia
cant-avas
vend-ias
part-ias
cant-ava
vend-ia
part-ia
cant-ávam os
vend-íam os
part-íam os
cant-áveis
vend-íeis
part-íeis
cant-avam
vend-ia m
part-iam
r e t é r it o
p e r f e it o d o
in d ic a t iv o
Observação:
Fogem
à
tin h a , v in h a
regra acima os verbos ser,
e p u n h a , respectivamente.
ter, v ir
e p ô r , que fazem no
im p e r f e it o
era,
2.°) P resente do subiuntivo . Forma-se do radical da 1.® pessoa do presente
do indicativo, substituindo-se a desinência -o pelas flexões próprias do presente
do subjuntivo: -e, -es, -emos, -eis, -em, nos verbos da 1 .®conjugação; -a, -as, -a,
-amos, -ais, -am, nos verbos da 2.® e da 3.® conjugação.
Assim:
P r e s e n t e d o in d ic a t iv o
1.aCONJUGAÇÃO
2.aCONJUGAÇÃO
3«aCONJUGAÇÃO
1.®pessoa do singular
canto
vend-o
parto
P
r esen te do
s u b ju n t iv o
cant-e
vend-a
p a rta
cant-es
vend-as
p a rta s
cant-e
vend-a
p a rta
cant-em os
vend-am os
p a rta m o s
cant-eis
vend-ais
p a rta is
cant-em
vend-am
p a rta m
VERBO
1.
a) Dentre todos os verbos da língua apenas os seguintes não obedecem à regra
anterior: haver, ser, estar, dar, ir, querer e saber, que fazem no presente do subjuntivo:
haja, seja, esteja, dê, vá, queira e saiba.
2.
a) Os verbos defectivos em que a l.a pessoa do presente do indicativo caiu em
desuso não têm presente do subjuntivo.
3.°) I mperativo. O imperativo afirmativo só possui formas próprias de 2.a
pessoa do singular e 2 .a pessoa do plural, derivadas das correspondentes do
presente do indicativo com a supressão do -s final.
Assim:
ca n ta (s)
ven d e(s)
p arte (s)
ca n ta i(s)
ve n d e i(s)
p a rti(s)
Observações:
1. a) Excetua-se o verbo ser, que faz sê (tu) e sede (vós).
2.
a) Costumam perder o -e na 2.a pessoa do singular do imperativo afirmativo
os verbos dizer, fazer, trazer e os terminados em -uzir: dize (ou diz) tu, faze (ou faz)
tu, traze (ou traz) tu, aduze (ou aduz) tu, traduze (ou traduz) tu.
As outras pessoas do imperativo afirmativo, bem como todas as do impera
tivo negativo, são supridas pelos equivalentes do presente do subjuntivo, com
o pronome posposto, quando usado.
D e r iv a d o s d o p r e t é r it o p e r f e it o d o in d ic a tiv o
Do tema do pretérito perfeito formam-se os seguintes tempos simples:
l.° ) o MAis-QUE-PERFEiTO do indicativo, juntando-se as terminações (= sufixo
temporal -ra- + desinências pessoais) -ra, -ras, -ra, -ramos, -reis, -ram:
1
R a d ic a l d o p e r f e it o
CONJUGAÇÃO
canta*
2.aCONJUGAÇÃO
3-* CONJUGAÇÃO
vende*
parti*
VOCAL TEM ÁTICA
P
r e t é r it o
M AIS-Q UE-PERFEITO
DO INDICATIVO
canta-ra
vende-ra
parti-ra
canta-ras
vende-ras
p arti-ras
canta-ra
vende-ra
parti-ra
cantá-ram os
vendê-ram os
partí-ram os
cantá-reis
vendê-reis
p artí-reis
canta-ram
vende-ram
parti-ram
405
406
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2.°) o imperfeito do suBiuNTivo, juntando-se as terminações (= sufixo
temporal -sse- + desinências pessoais) -sse, -sses, -sse, -ssemos, -sseis, -ssem:
V
R a d ic a l d o p e r f e it o
CONJUGAÇÃO
canta-
2.aCONJUGAÇÃO
3.aCONJUGAÇÃO
vende-
parti-
a
VOCAL TEM ÁTICA
P
r e t é r it o
IM PER FEITO DO
SUBJUNTIVO
c a n ta -s s e
v e n d e -s s e
p a rti-sse
c a n ta -s s e s
v e n d e -s s e s
p a rti-s s e s
c a n ta -s s e
v e n d e -s s e
p a rti-sse
ca n tá -sse m o s
ve n d ê -sse m o s
p a r tí- s s e m o s
c a n t á - s s e is
v e n d ê - s s e is
p a rtf-sse is
c a n ta - s s e m
v e n d e -s s e m
p a rti-s s e m
3.°) o futuro do subjuntivo, juntando-se as terminações ( = sufixo temporal
-r- + desinências pessoais) -r, -res, -r, -rmos, -rdes, -rem:
R a d ic a l d o p e r f e it o
*
1.aCONJUGAÇÃO
2.aCONJUGAÇÃO
3.aCONJUGAÇÃO
canta-
vende-
parti-
VOGAL TEM ÁTICA
P
r e t é r it o
IM PER FEITO DO
SUBJUNTIVO
c a n ta -r
v e n d e -r
p a r ti- r
c a n ta -re s
v e n d e -re s
p a rti-re s
c a n ta -r
v e n d e -r
p a r ti- r
c a n t a - rm o s
ve n d e -rm o s
p a r ti- r m o s
c a n ta -rd e s
v e n d e -rd e s
p a r ti- rd e s
c a n ta -re m
v e n d e -re m
p a rti-re m
Observações:
1.
a) O
tem a
d o p r e t é r it o p e r f e it o p o d e s e r o b t id o s u p r im in d o - s e a d e s in ê n c ia
d a 2 .a p e s s o a d o s in g u la r o u d a l . a p e s s o a d o p lu r a l:
canta(ste)
fize(ste)
vie(ste)
puse(ste)
c a n ta (m o s )
f iz e ( m o s )
v ie (m o s )
p u s e (m o s )
2.
a) Embora as suas formas sejam quase sempre idênticas, o futuro do subjuntivo
e o infinitivo pessoal têm origem diversa, que deve ser conhecida para evitar-se a
frequente confusão que se estabelece nos poucos verbos em que as formas são dis
tintas: fizer — fazer; for — ser, souber — saber, etc.
VERBO
D e r iv a d o s d o in f in it iv o im p e s s o a l
Do infinitivo impessoal formam-se os dois futuros simples do indicativo, o
infinitivo pessoal, o gerúndio e o particípio.
l.°) O futuro d o presente , com o simples acréscimo das terminações -ei, -ás,
-á, -emos, -eis, -ão:
I n f in it iv o im p e s s o a l
F
u tu ro do pr esen te
2 .°)
O
1.aCONJUGAÇÃO
2 .a CONJUGAÇÃO
3-aCONJUGAÇÃO
cantar
vender
partir
cantar-ei
vender-ei
p arti r-ei
cantar-ás
vender-ás
p arti r-ás
cantar-á
vender-á
p arti r-á
cantar-em os
vender-em os
p arti r-emos
cantar-eis
vender-eis
p arti r-eis
cantar-ão
vender-ão
p arti r-ão
futuro do pretérito ,
com o acréscimo das terminações -ia, -ias, -ia,
-íamos, -íeis, -iam:
I n f in it iv o im p e s s o a l
F
u t u r o d o p r e t é r it o
1 .a CONJUGAÇÃO
2 .a CONJUGAÇÃO
B .a CONJUGAÇÃO
cantar
vender
partir
cantar-ia
vender-ia
p artir-ia
cantar-ias
vender-ias
p arti r-i as
cantar-ia
vender-ia
p artir-ia
canta r-íam os
vender-íam os
p arti r-íam os
canta r-íeis
vender-íeis
p arti r-íeis
cantar-iam
vender-iam
p artir-iam
Observações:
1.
a) Não seguem esta regra os verbos dizer, fazer e trazer, cujas formas do fu
turo do presente e do pretérito são, respectivamente: direi, diria, farei, faria,
trarei, traria.
2.
a) O futuro do presente e o futuro do pretérito são formados pela aglutinação
do infinitivo do verbo principal às formas reduzidas do presente e do imperfeito do
indicativo do auxiliar haver, amar + hei, amar + hia (por havia), etc.
3.°) O infinitivo pessoal, com o acréscimo das desinências pessoais: -es (2.®
pessoa do singular), -mos, -des, -em:
407
408
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
1 .“ CO N JU G AÇÃO
2 .a CO N JU G AÇÃO
B .a CO N JU G AÇÃO
cantar
vender
partir
I n f in it iv o im p e s s o a l
F
u tu r o pesso al
4.°) 0
g e r ú n d io
cantar
vender
partir
canta r-es
vender-es
parti r-es
cantar
vender
partir
cantar-mos
vender-mos
partir-mos
cantar-des
vender-des
parti r-des
cantar-em
vender-em
parti r-em
fo rm a -s e s u b s titu in d o -s e o su fix o - r d o in fin itiv o p e lo
sufixo - n d o :
1 .a CO N JU G AÇÃO
2 .a CO NJU G AÇÃO
3 .a CO N JU G AÇÃO
canta-r
vende-r
parti-r
canta-ndo
vende-ndo
parti-ndo
I n f in it iv o im p e s s o a l
G
e r ú n d io
5.°) O PARTicíPio fo rm a -se s u b stitu in d o -s e o sufixo -r d o in fin itiv o pelo sufixo
-d o , se n d o d e n o ta r q u e , p o r in flu ê n c ia d a vogal te m á tic a d a 3.® c o n ju g ação , a
d a 2.® p a sso u a -i-:
I n f in it iv o im p e s s o a l
P
a r t ic íp io
1.aCO N JU G A ÇÃ O
2.aCO N JU G AÇÃO
3.aCO N JU G AÇÃO
canta-r
vende-r
parti-r
canta-do
vendi-do
parti-do
O bservação:
Os verbos dizer, escrever,fazer, ver, pôr, abrir, cobrir, vir e seus derivados formam
o PARTicíPio irregularmente: dito, escrito, feito, visto, posto, aberto, coberto, vindo.
Dos derivados exclui-se prover, cujo particípio é provido.
VERBOS AUXILIARES E O SEU EMPREGO
1. O s c o n ju n to s fo rm a d o s de u m v e rb o a u x iliar co m u m v e rb o p rin c ip a l ch am a m - s e l o c u ç õ e s v e r b a is . N as l o c u ç õ e s verbais c o n ju g a - s e a p e n a s o
auxiliar, p o is o v e rb o p rin c ip a l v em se m p re n u m a das fo rm a s n o m in a is: n o
PARTICÍPIO, n o GERÚNDIO,
OU
nO INFINITIVO IMPESSOAL.
VERBO
2. O s auxiliares d e u so m a is fre q u e n te são ter, haver, ser e estará
Ter e haver em p reg am -se:
a) c o m o PARTicíPio d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra fo rm a r os te m p o s c o m p o sto s da
voz ativa, d e n o ta d o re s d e u m fato aca b a d o , re p e tid o o u c o n tín u o :
Tenho feito exercícios.
Havíamos comprado livros.
b ) c o m o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l a n te c e d id o da p re p o siç ã o de, p a ra ex
p rim ir, respectiv a m e n te , a o b rig a to rie d a d e o u o firm e p ro p ó s ito d e re aliza r
o fato:
Tenho de fazer exercícios.
Havemos de comprar livros.
Ser e m p re g a -se c o m o
particípio
d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra fo rm a r os te m p o s
d a voz passiva d e ação:
E xercícios foram feitos p o r m im .
L ivros serão comprados p o r n ó s.
Estar em p reg a-se:
a) c o m o particípio d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra fo rm a r te m p o s d a voz p assiv a de
estad o :
Estou arrependido d o q u e fiz.
Estamos impressionados c o m o fato.
Como não há uniformidade de critério linguístico para determinação dos limites da
auxiliaridade, costuma variar de gramática para gramática o elenco de verbos auxiliares.
Sobre o assunto, no âmbito da língua portuguesa, o estudo mais desenvolvido é o de Lúcia
Maria Pinheiro Lobato. VAuxiliarité en langueportugaise (tese de doutorado apresentada
à Universidade de Paris-III, Paris, 1970, mimeografado). Menção particular merecem
também os trabalhos de: Eunice Pontes. Verbos auxiliares em português. Petrópolis, 1973,
onde a auxiliaridade, principalmente dos verbos que se constroem com infinitivo, é
estudada à luz da gramática transformacional; e de Eduardo Paiva Raposo. A construção
“união de orações” na gramática do português (dissertação de doutoramento apresentada à
Universidade de Lisboa, Lisboa, 1981, mimeografado), em que se examinam do ponto de
vista da gramática relacional as construções de infinitivo com verbos como fazer, mandar,
deixar, ver, sentir e ouvir.
409
410
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
b ) co m o gerúndio , o u co m o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l a n te c e d id o d a p r e
p o sição a, p a ra in d ic a r u m a ação d u ra tiv a , c o n tin u a d a :
Estava ouvindo música.
Estava a ouvir música.
c) com o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l a n te c e d id o da p re p o siç ã o para, p a ra
e x p rim ir a im in ê n c ia de u m a c o n te c im e n to , o u o in tu ito de re aliza r a ação
expressa p elo v erb o p rin c ip a l:
O avião está para chegar.
Há dias estou para visitá-lo.
d ) com o infinitivo d o verbo p rin c ip a l an teced id o d a p rep o sição por, p a ra in d ic a r
q u e u m a ação q u e já d ev eria te r sid o realiza d a a in d a n ã o o foi:
O trabalho está por terminar.
A carta ficou por escrever.
D is tin ç ã o im p o rta n t e
A construção de estar (ou andar) + gerúndio , preferida no Brasil, é a mais
antiga no idioma e ainda tem vitalidade em dialetos centro-meridionais de
Portugal (principalmente no Alentejo e no Algarve), nos Açores6 e nos países
africanos de língua portuguesa.
No português-padrão e nos dialetos setentrionais de Portugal predomina
hoje a construção, de sentido idêntico, formada de estar (ou andar) + preposi
ção a + infinitivo , que aparece, vez por outra, na pena de escritores brasileiros.
Comparem-se estes exemplos, colhidos na obra de Adonias Filho:
Estava a passar a cera no cordão e a ouvir Gonçalo Cintra quando
se ergueu de um salto.
{LBB, 126.)
Três meses ali estava, João Joanes, a pescar com Pé de Vento, a visitar
os vizinhos, a ajoelhar-se na sepultura da mulher.
(LBB, 133.)
6 Veja-se M. de Paiva Boléo. Estudos de linguística portuguesa e românica, I. Coimbra, Acta
Universitatis Conimbrigensis, 1974, p. 425;----- . Revista Portuguesa de Filologia, p. 17:971,
1975-1978.
VERBO
O filho lá estava, c o rre n d o n a areia, a brincar c o m o u tro s m e n in o s.
{LBB, 15.)
3. A lém d o s q u a tro v e rb o s e stu d a d o s, o u tro s h á q u e p o d e m fu n c io n a r co m o
auxiliares. E stão n e ste caso os v erb o s ir, vir, andar, ficar, acabar e m ais alg u n s
q u e se ligam ao infinitivo d o v e rb o p rin c ip al p a ra ex p ressar m atizes de te m p o
o u p a ra m a rc a r certo s asp e c to s d o d e se n v o lv im e n to d a ação. A ssim :
Ir em p reg a-se:
a) c o m o gerúndio d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra in d ic a r q u e a ação se realiza p r o
g ressiv am en te o u p o r e ta p a s sucessivas:
O n avio ia encostando n o cais (p o u c o a p o u c o ).
O s c o n v id a d o s iam chegando d e a u to m ó v e l (su cessiv am en te).
b ) c o m o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra e x p rim ir o firm e p ro p ó s ito de
ex e c u ta r a ação, o u a certeza d e q u e ela será realizad a e m fu tu ro p ró x im o :
Vou procurar u m m éd ico .
O n avio vai partir.
Vir em p reg a-se:
a) c o m o gerúndio d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra in d ic a r q u e a ação se desenvolve
g ra d u a lm e n te (c o m p a re -se a c o n s tru ç ã o sim ila r c o m ir)\
Vinha rompendo a m a d ru g a d a .
Venho tratando desse a ssu n to .
b ) c o m o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l, p a ra in d ic a r m o v im e n to em d ireção
a d e te rm in a d o fim o u in te n ç ã o d e re aliza r u m ato:
Veio fazer co m p ra s.
Vieste interromper-me o tra b a lh o .
c) c o m o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l a n te c e d id o d a p re p o siç ã o a, p a ra ex
p re ssa r o re su lta d o final d a ação:
Vim a saber dessas coisas m u ito tard e.
Veio a dar c o m o s b u rro s n’água.
d ) c o m o infinitivo d o v e rb o p rin c ip a l a n te c e d id o d a p re p o s iç ã o de, p a ra
in d ic a r o té rm in o recen te d a ação:
411
412
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Vinha de ajustar contas com o imigrante.
(J. Cardoso Pires, D, 290.)
Minha intenção era saudar os jangadeiros que vêm de chegar.
(A. F. Schmidt, GB, 56.)
Esta última construção, que desde o século passado se documenta em bons
escritores do idioma, tem sido condenada por alguns gramáticos como ga
licismo.
Andar, à
nitivo
s e m e lh a n ç a d e e s ta r , e m p re g a - s e c o m o
g e r ú n d io , o u
com o
in fi
d o v e r b o p r in c ip a l a n te c e d id o d a p r e p o s iç ã o a , p a r a i n d i c a r u m a a ç ã o
d u r a tiv a , c o n tin u a d a :
Ando lendo o s c lássico s.
Ando a ler o s c lá ssic o s.
A primeira construção, como dissemos, é a mais usada no Brasil; a segunda,
a preferida em Portugal.
Ficar, a lé m
d e se j u n t a r a o
particípio
p a r a f o r m a r a v o z p a s s iv a d e n o t a d o r a
d e m u d a n ç a d e e s ta d o (f i c o u m o l h a d o ) , e m p re g a -s e :
a ) c o m o g e r ú n d io , o u c o m o in fin itiv o d o v e r b o p r in c i p a l a n te c e d id o d a
p r e p o s iç ã o a , p a r a in d ic a r u m a a ç ã o d u r a tiv a c o s tu m e ir a , o u m a is lo n g a d o
q u e a e x p re s s a p o r esta r; c o m p a r e m - s e :
Ficava cantando
Estava cantando
Ficava a cantar
Estava a cantar
b) com o
in fin itiv o
Ficou esperando
Esteve esperando
Ficou a esperar
Esteve a esperar
d o v e r b o p r in c ip a l a n te c e d id o d a p r e p o s iç ã o p o r , p a r a
in d ic a r q u e u m a a ç ã o q u e d e v e ria te r s id o re a liz a d a n ã o o foi:
O trabalho ficou por terminar.
Compare-se à construção paralela com
e sta r.
O trabalho está por terminar.
Acabar
e m p re g a -se co m o
in fin it iv o
d o v e rb o p rin c ip a l a n te c e d id o d a
p r e p o s iç ã o d e , p a r a in d ic a r u m a a ç ã o r e c é m - c o n c lu íd a :
O avião acabou de aterrissar.
Os convidados acabaram de chegar.
VERBO
CONJUGAÇÃO DOS VERBOS TER , HAVER, SER E ESTAR
M o d o in d ic a t iv o
P r esen te
tenho
hei
sou
estou
tens
hás
és
estás
tem
há
é
está
tem os
havem os
somos
estam os
tendes
haveis
sois
estais
têm
hão
são
estão
P r et ér it o
im p er feit o
tin h a
havia
era
estava
tinhas
havias
eras
estavas
tin h a
havia
era
estava
tínham os
havíam os
éram os
estávam os
tín h eis
havíeis
éreis
estáveis
tinham
haviam
eram
estavam
P r e t é r it o
p er feit o
tive
houve
fui
estive
tiveste
houveste
foste
estiveste
teve
houve
foi
esteve
tivem os
houvem os
fom os
estivem os
tivestes
houvestes
fostes
estivestes
tiveram
houveram
foram
estiveram
P r et ér it o
m ais -q u e -p e r fe it o
tivera
houvera
fora
estivera
tiveras
houveras
foras
estiveras
tivera
houvera
fora
estivera
tivéram os
houvéram os
fôram os
estivéram os
tivéreis
houvéreis
fôreis
estivéreis
tiveram
houveram
foram
estiveram
413
414
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
F u turo
do p r esen te
terei
haverei
serei
estarei
terás
haverás
serás
estarás
terá
haverá
será
estará
terem os
haverem os
serem os
estarem os
te re is
havereis
sereis
estareis
terão
haverão
serão
estarão
F u tu r o do
p r e t é r it o
te ria
haveria
seria
estaria
terias
haverias
serias
estarias
te ria
haveria
seria
estaria
teríam o s
haveríam os
seríam os
estaríam os
te ríe is
haveríeis
seríeis
estaríeis
teriam
haveriam
seriam
estariam
M o d o s u b ju n t iv o
P r esen te
tenha
haja
seja
esteja
tenhas
hajas
sejas
estejas
tenha
haja
seja
esteja
tenham os
hajam os
sejam os
estejam os
tenhais
h ajais
sejais
estejais
tenham
hajam
sejam
estejam
P r et ér it o
im p er feit o
tivesse
houvesse
fosse
estivesse
tivesses
houvesses
fosses
estivesses
tivesse
houvesse
fosse
estivesse
tivéssem os
houvéssem os
fôssem os
estivéssem os
tivésseis
houvésseis
fôsseis
estivésseis
tivessem
houvessem
fossem
estivessem
VERBO
F uturo
tiv e r
houver
for
estiver
tiveres
houveres
fores
estiveres
tiv e r
houver
for
estiver
tiverm os
houverm os
form os
estiverm os
tiverdes
houverdes
fordes
estiverdes
tiverem
houverem
forem
estiverem
M o d o im p e ra tiv o
A firm a tiv o
tem (tu )
(desusado)
sê (tu )
está (tu )
tenha (você)
haja (você)
seja (você)
esteja (você)
tenham os (n ó s)
hajam os (n ó s)
sejam os (n ó s)
estejam os (n ó s)
tende (vós)
havei (vós)
sede (vós)
estai (vós)
tenham (vocês)
hajam (vocês)
sejam vocês)
estejam (vocês)
N eg ativo
nâo tenhas (tu )
não sejas (tu )
nâo tenha (vo cê)
não seja (você)
nâo tenham os (n ó s)
não sejam os (n ó s)
não tenhais (vó s)
não sejais (vós)
não tenham (vocês)
não sejam (vocês)
não hajas (tu )
não estejas (tu )
não haja (você)
não esteja (você)
não hajam os (n ó s)
não estejam os (n ó s)
não h ajais (vós)
não estejais (vós)
não hajam (vocês)
não estejam (vocês)
F o rm a s n o m in a is
I n fin itiv o
ter
haver
im pesso a l
ser
estar
415
416
NOV A G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
I n fin it iv o
pesso a l
te r
haver
ser
estar
teres
haveres
seres
estares
te r
haver
ser
estar
term os
haverm os
serm os
estarm os
terdes
haverdes
serdes
estardes
terem
haverem
serem
estarem
G erú n d io
tendo
havendo
sendo
estando
P a r t ic íp io
tido
havido
sido
estado
FORMAÇÃO DOS TEMPOS COMPOSTOS
E n tr e o s
tem po s co m po sto s
d a v o z a tiv a m e r e c e m re a lc e p a r ti c u la r a q u e le s
q u e s ã o c o n s titu íd o s d e f o r m a s d o v e r b o te r ( o u , m a is r a r a m e n te , h a v e r ) c o m
o
p a r t ic í p io
d o v e r b o q u e se q u e r c o n ju g a r, p o r q u e é c o s tu m e in c lu í- lo s n o s
p r ó p r io s p a r a d ig m a s d e c o n ju g a ç ã o .
E is o s te m p o s e m c a u s a :
M o d o in d ic a tiv o
l.° ) P r e t é r it o
d o v e r b o te r c o m o
p e r f e it o
p a r t ic í p io
co m po sto
. F o r m a d o d o p r e s e n t e d o in d ic a t iv o
d o v e r b o p r in c ip a l:
tenho cantado
tenho vendido
tenho partido
tens cantado
tens vendido
ten s partido
tem cantado
tem vendido
tem partido
tem os cantado
tem os vendido
tem os partido
tendes cantado
tendes vendido
tendes partido
têm cantado
têm vendido
têm partido
VERBO
Form ado do i m p e r f e i t o
do verbo ter (ou haver) com o p a r t ic í p io do verbo principal:
2 .° ) P r e t é r it o
do in d i c a t i v o
3 .° )
s im p l e s
4.°)
s im p l e s
m a is - q u e - p e r f e it o
co m po sto
.
tin h a cantado
tin h a vendido
tin h a partido
tin h a s cantado
tin h as vendido
tin h a s partido
tin h a cantado
tin h a vendido
tin h a partido
tín h am o s cantado
tín h am o s vendido
tínham o s partido
tín h e is cantado
tín h e is vendido
tín h e is partido
tinham cantado
tin h am vendido
tin h a m partido
Formado do f u t u r o d o
do verbo ter (ou haver) com o p a r t ic í p io do verbo principal:
F u tu ro do presen te co m po sto .
terei cantado
terei vendido
terei partido
terás cantado
terás vendido
terás partido
terá cantado
terá vendido
terá partido
terem os cantado
terem os vendido
terem os partido
tereis cantado
tereis vendido
tereis partido
terão cantado
terão vendido
terão partido
Formado do f u t u r o d o
do verbo ter (ou haver) com o p a r t ic í p io do verbo principal:
F u t u r o d o p r e t é r it o c o m p o s t o .
te ria cantado
te ria vendido
teria partido
te ria s cantado
te ria s vendido
te ria s partido
te ria cantado
te ria vendido
teria partido
teríam o s cantado
te ríam o s vendido
teríam o s partido
te ríe is cantado
te ríe is vendido
te ríe is partido
teriam cantado
te ria m vendido
teria m partido
presen te
p r e t é r it o
M o d o s u b ju n tiv o
Formado do p r e s e n t e
do verbo principal:
l . ° ) P r e t é r it o p e r f e it o .
haver) com o p a r t ic í p io
d o s u b iu n t i v o
do verbo ter (ou
tenha cantado
tenha vendido
tenha partido
tenhas cantado
tenhas vendido
tenhas partido
tenha cantado
tenha vendido
tenha partido
tenham os cantado
tenham os vendido
tenham os partido
ten h ais cantado
tenhais vendido
ten h a is partido
tenham cantado
tenham vendido
tenham partido
417
418
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
2.°) P retérito mais- que - rerfeito. Formado do imperfeito do subjuntivo do
verbo ter (ou haver) com o particIpio do verbo principal:
tivesse cantado
tive sse vendido
tivesse partido
tivesses cantado
tivesses vendido
tivesses partido
tivesse cantado
tive sse vendido
tivesse partido
tivéssem os cantado
tivéssem o s vendido
tivéssem os partido
tivésseis cantado
tiv é sse is vendido
tivésseis partido
tivessem cantado
tive sse m vendido
tivessem partido
3.°) F uturo composto . Formado do futuro simples do subjuntivo do verbo
ter (ou haver) com o particIpio do verbo principal:
tiv e r cantado
tiv e r vendido
tiv e r partido
tive res cantado
tiveres vendido
tiveres partido
tiv e r cantado
tiv e r vendido
tiv e r partido
tiverm o s cantado
tiverm o s vendido
tiverm o s partido
tiverd es cantado
tiverdes vendido
tiverdes partido
tiverem cantado
tiverem vendido
tiverem partido
F o rm a s n o m in a is
l.° ) I nfinitivo impessoal com posto ( pretérito impessoal ). Formado do
infinitivo impessoal do verbo ter (ou haver) com o particípio do verbo principal:
te r cantado
te r vendido
te r partido
2 .°) I nfinitivo pessoal com posto ( pretérito pessoal ). Formado do in
finitivo pessoal do verbo ter (ou haver) com o particIpio do verbo principal:
te r cantado
te r vendido
te r partido
teres cantado
teres vendido
teres partido
ter cantado
te r vendido
te r partido
term os cantado
term os vendido
term os partido
terdes cantado
terdes vendido
terdes partido
terem cantado
terem vendido
terem partido
3.°) G erúndio composto ( pretérito ). Formado do gerúndio do verbo ter (ou
haver) com o particIpio do verbo principal:
tendo cantado
tendo vendido
1
tendo partido
VERBO
CONJUGAÇÃO DOS VERBOS REGULARES
Como dissemos, são regulares os verbos que se flexionam de acordo com o
paradigma de sua conjugação. Assim, tomando os verbos cantar, vender e partir
como paradigmas, respectivamente, da l.a, 2.a e 3.a conjugações, verificamos
que todos os verbos regulares da l.a conjugação formam os seus tempos pelo
modelo de cantar; os da 2.a, pelo de vender; os da 3.a, pelo de partir.
CONJUGAÇÃO DA VOZ PASSIVA
(Modelo: ser louvado)
M o d o in d ic a tiv o
P r esen te
P r et ér ito
im p er feito
s o u lo u v a d o (-a)
e ra lo u v a d o (-a)
é s lo u v a d o (-a)
e ra s lo u v a d o (-a)
é lo u v a d o (-a)
e ra lo u v a d o (-a)
s o m o s lo u v a d o s (-a s)
é r a m o s lo u v a d o s (-a s)
s o is lo u v a d o s (-a s)
é r e is lo u v a d o s (-a s)
s ã o lo u v a d o s (-a s)
e ra m lo u v a d o s (-a s)
P r e t é r it o
p e r fe it o
( s im p le s )
P r et ér it o
p e r fe it o
( com posto )
f u i lo u v a d o (-a)
t e n h o s id o lo u v a d o (-a)
fo s te lo u v a d o (-a)
t e n s s id o lo u v a d o (-a)
fo i lo u v a d o (-a)
t e m s id o lo u v a d o (-a)
f o m o s lo u v a d o s (-a s)
t e m o s s id o lo u v a d o s (-a s)
fo s te s lo u v a d o s (-a s)
t e n d e s s id o lo u v a d o s (-a s)
f o r a m lo u v a d o s (-a s)
t ê m s id o lo u v a d o s (-a s)
P r et ér it o
m ais -q u e -p e r fe it o
( s im p le s )
P r e t é r it o
m ais -q ue -p e r fe it o
( com posto )
fo ra lo u v a d o (-a)
t in h a s id o lo u v a d o (-a)
f o r a s lo u v a d o (-a)
t in h a s s id o lo u v a d o (-a)
fo ra lo u v a d o (-a)
t in h a s id o lo u v a d o (-a)
f ô r a m o s lo u v a d o s (-a s)
t ín h a m o s s id o lo u v a d o s (-a s)
f ô r e is lo u v a d o s (-a s)
t ín h e is s id o lo u v a d o s (-a s)
f o r a m lo u v a d o s (-a s)
t in h a m s id o lo u v a d o s (-a s)
419
420
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
F u tu ro
do p r esen t e ( s im p le s )
serei louvado (-a)
serás louvado (-a)
será louvado (-a)
seremos louvados (-as)
sereis louvados (-as)
serão louvados (-as)
F u turo
do p r e t é r it o
( s im p le s )
F u turo
do p r e s en t e ( com posto )
terei sido louvado (a)
terás sido louvado (-a)
terá sido louvado (-a)
teremos sido louvados (-as)
tereis sido louvados (-as)
terão sido louvados (-as)
F u turo
do p r e t é r it o
( com posto )
seria louvado (-a)
serias louvado (-a)
seria louvado (-a)
teria sido louvado (a)
terias sido louvado (-a)
teria sido louvado (-a)
seríamos louvados (-as)
seríeis louvados (-as)
seriam louvados (-as)
teríamos sido louvados (-as)
teríeis sido louvados (-as)
teriam sido louvados (-as)
M o d o s u b ju n t iv o
P r esen te
P r e t é r it o
im p er feit o
seja louvado (-a)
sejas louvado (-a)
fosse louvado (-a)
fosses louvado (-a)
seja louvado (-a)
sejamos louvados (-as)
sejais louvados (-as)
sejam louvados (-as)
fosse louvado (-a)
fôssemos louvados (-as)
fôsseis louvados (-as)
fossem louvados (-as)
P r e t é r it o
p er feit o
P r e t é r it o
m a is -q ue -perfetto
tenha sido louvado (-a)
tivesse sido louvado (-a)
tenhas sido louvado (-a)
tenha sido louvado (-a)
tenhamos sido louvados (-as)
tenhais sido louvados (-as)
tenham sido louvados (-as)
tivesses sido louvado (-a)
tivesse sido louvado (-a)
tivéssemos sido louvados (-as)
tivésseis sido louvados (-as)
tivessem sido louvados (-as)
F u turo ( s im p le s )
for louvado (-a)
fores louvado (-a)
for louvado (-a)
formos louvados (-as)
fordes louvados (-as)
forem louvados (-as)
F uturo ( com posto )
tiver sido louvado (-a)
tiveres sido louvado (-a)
tiver sido louvado (-a)
tivermos sido louvados (-as)
tiverdes sido louvados (-as)
tiverem sido louvados (-as)
VERBO
F o rm a s n o m in a is
I n fin itiv o
I n fin it iv o
im pesso a l p r e s en t e
ser louvado (-a)
I n fin itiv o
ter sido louvado (-a)
I n fin it iv o
pesso al p r e s en t e
ser louvado (-a)
seres louvado (-a)
ser louvado (-a)
sermos louvados (-as)
serdes louvados (-as)
serem louvados (-as)
G erú n d io
im pesso a l p r e t é r it o -
pesso a l p r e t é r it o
ter sido louvado (-a)
teres sido louvado (-a)
ter sido louvado (-a)
termos sido louvados (-as)
terdes sido louvados (-as)
terem sido louvados (-as)
G erú n d io
p r esen te
sendo louvado (-a,-os,-as)
p r e t é r it o
tendo sido louvado (-a,-os,-as)
P a r t ic íp io
louvado (-a, -os, -as)
Observações:
1.
a) Só há uma forma simples na voz passiva, que é o particípio. Colocamos,
no entanto, entre parênteses, as designações simpi.es e composto para lembrar a
correspondência das formas assim nomeadas com as da voz ativa, que apresentam
semelhante oposição.
2. a) Na voz passiva n ão se usa o imperativo.
VOZ REFLEXIVA
Na voz reflexiva o verbo vem acompanhado de um pronome oblíquo que
lhe serve de objeto direto ou, mais raramente, de objeto indireto e representa a
mesma pessoa que o sujeito. Assim:
Eu me lavo (ou lavo-me).
Ele se deu o trabalho de vir a minha casa (ou deu-se).
A próclise é preferida no Brasil, a ênclise em Portugal.
O verbo reflexivo pode indicar também a reciprocidade, isto é, uma ação
mútua de dois ou mais sujeitos:
Pedro, Paulo e eu nos estimamos (estimamo-nos) [= mutuamente].
Os dias se sucedem (sucedem-se) [= um ao outro] calmos.
421
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
V e rb o r e fle x iv o e v e rb o p ro n o m in a l
Muitos verbos são conjugados com pronomes átonos, à semelhança dos
reflexivos, sem que tenham exatamente o seu sentido. São os chamados verbos
pro n o m in a is , de que podemos distinguir dois tipos:
a) os que só se usam na forma pronominal, como:
apiedar-se
condoer-se
queixar-se
suicidar-se
b) os que se usam também na forma simples, mas esta difere ou pelo sentido
ou pela construção da forma pronominal, como, por exemplo:
debater [= discutir]
debater-se [= agitar-se]
enganar alguém
enganar-se com alguém
O bservação:
Distingue-se, na prática, o verbo reflexivo do verbo pronominal porque ao
primeiro se podem acrescentar, conforme a pessoa, as expressões a mim mesmo,
a ti mesmo, a si mesmo, etc. Quando o reflexivo tem valor recíproco, as expressões
reforçativas passam a ser um ao outro, reciprocamente, mutuamente, etc.
Assim:
Feri-me a mim mesmo.
Amavam-se um ao outro.
CONJUGAÇÃO DE UM VERBO REFLEXIVO
(Modelo: lavar-se)
M o d o in d ic a tiv o
C om
C om
o pro n o m e en c lític o ou m eso clítico
o pro n o m e pro clítig õ
Presente
lavo-me
eu me lavo
lavas-te
tu te lavas
lava-se
ele se lava
lavamo-nos
nós nos lavamos
lavais-vos
vós vos lavais
lavam-se
eles se lavam
VERBO
C om
C om
o pro n o m e en c lític o ou m eso clítico
o pro n o m e p ro c ü tic o
Pretérito imperfeito
lavava-me
eu me lavava
lavavas-te
tu te lavavas
lavava-se
ele se lavava
lavávamo-nos
nós nos lavávamos
laváveis-vos
vós vos laváveis
lavavam-se
eles se lavavam
Pretérito perfeito simples
lavei-me
eu me lavei
lavaste-te
tu te lavaste
lavou-se
ele se lavou
lavamo-nos
nós nos lavamos
lavastes-vos
vós vos lavastes
lavaram-se
eles se lavaram
Pretérito perfeito composto
tenho-me lavado
eu me tenho lavado
tens-te lavado
tu te tens lavado
tem-se lavado
ele se tem lavado
temo-nos lavado
nós nos temos lavado
tendes-vos lavado
vós vos tendes lavado
têm-se lavado
eles se têm lavado
Pretérito mais-que-perfeito simples
lavara-me
eu me lavara
lavaras-te
tu te lavaras
lavara-se
ele se lavara
laváramo-nos
nós nos laváramos
laváreis-vos
vós vos laváreis
lavaram-se
eles se lavaram
Pretérito mais-que-perfeito composto
tinha-me lavado
eu me tinha lavado
tinhas-te lavado
tu te tinhas lavado
tinha-se lavado
ele se tinha lavado
tínhamo-nos lavado
nós nos tínhamos lavado
tínheis-vos lavado
vós vos tínheis lavado
tinham-se lavado
eles se tinham lavado
423
424
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
C om
ò pro n o m e en c ü tic o ou m eso cl IYic o
C om
o pro n o m e pro c lític o
Futuro do presente simples
lavar-me-ei
lavar-te-ás
lavar-se-á
lavar-nos-emos
lavar-vos-eis
lavar-se-ão
eu me lavarei
tu te lavarás
ele se lavará
nós nos lavaremos
vós vos lavareis
eles se lavarão
Futuro do presente composto
ter-me-ei lavado
ter-te-ás lavado
ter-se-á lavado
ter-nos-emos lavado
ter-vos-eis lavado
ter-se-ão lavado
eu me terei lavado
tu te terás lavado
ele se terá lavado
nós nos teremos lavado
vós vos tereis lavado
eles se terão lavado
Futuro do pretérito simples
lavar-me-ia
lavar-te-ias
lavar-se-ia
lavar-nos-íamos
lavar-vos-íeis
lavar-se-iam
eu me lavaria
tu te lavarias
ele se lavaria
nós nos lavaríamos
vós vos lavaríeis
eles se lavariam
Futuro do pretérito composto
ter-me-ia lavado
ter-te-ias lavado
ter-se-ia lavado
ter-nos-íamos lavado
ter-vos-íeis lavado
ter-se-iam lavado
eu me teria lavado
tu te terias lavado
ele se teria lavado
nós nos teríamos lavado
vós vos teríeis lavado
eles se teriam lavado
M o d o s u b ju n t iv o
C om
C om
o pro n o m e en c lític o
o pro n o m e pro c lític o
Presente
lave-me
laves-te
lave-se
lavemo-nos
laveis-vos
lavem-se
eu me lave
tu te laves
ele se lave
nós nos lavemos
vós vos laveis
eles se lavem
VERBO
C om
C om
o pro n o m e en c lític o
o pro n o m e p ró c ü tic o
Pretérito imperfeito
lavasse-me
eu me lavasse
lavasses-te
tu te lavasses
lavasse-se
ele se lavasse
lavássemo-nos
nós nos lavássemos
lavásseis-vos
vós vos lavásseis
lavassem-se
eles se lavassem
Pretérito perfeito
(Não se usa com o
eu me tenha lavado
pronome enclítico)
tu te tenhas lavado
ele se tenha lavado
nós nos tenhamos lavado
vós vos tenhais lavado
eles se tenham lavado
Pretérito mais-que-perfeito
tivesse-me lavado
eu me tivesse lavado
tivesses-te lavado
tu te tivesses lavado
tivesse-se lavado
ele se tivesse lavado
tivéssemo-nos lavado
nós nos tivéssemos lavado
tivésseis-vos lavado
vós vos tivésseis lavado
tivessem-se lavado
eles se tivessem lavado
Futuro simples
(Não se usa com o
eu me lavar
pronome enclítico)
tu te lavares
ele se lavar
nós nos lavarmos
vós vos lavardes
eles se lavarem
Futuro composto
(Não se usa com o
eu me tiver lavado
pronome enclítico)
tu te tiveres lavado
ele se tiver lavado
nós nos tivermos lavado
vós vos tiverdes lavado
eles se tiverem lavado
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
M o d o im p e ra tiv o
C om
C om
o pro n o m e en c lític o
o pro n o m e pro c lític o
Afirmativo
lava-te
lave-se
lavemo-nos
lavai-vos
lavem-se
(Não pode vir
proclítico
o pronome)
Negativo
(Não pode vir
enclítico
o pronome)
não te laves
não se lave
não nos lavemos
não vos laveis
não se lavem
F o rm a s n o m in a is
C om
o pro n o m e en c lític o
C om
o pro n o m e pro c lític o
Infinitivo impessoal presente
lavar-se
— se lavar
Infinitivo impessoal pretérito
ter-se lavado
— se ter lavado
Infinitivo pessoal presente
lavar-me
eu me lavar
lavares-te
lavar-se
lavarmo-nos
tu te lavares
ele se lavar
nós nos lavarmos
lavardes-vos
lavarem-se
vós vos lavardes
eles se lavarem
Infinitivo pessoal pretérito
ter-me lavado
teres-te lavado
eu me ter lavado
tu te teres lavado
ter-se lavado
termo-nos lavado
ele se ter lavado
terdes-vos lavado
nós nos termos lavado
vós vos terdes lavado
terem-se lavado
eles se terem lavado
VERBO
C om
C om
o pro n o m e en c lític o
o pro n o m e p r ó c ü tic o
Gerúndio presente
lavando-se
— se lavando
Gerúndio pretérito
tendo-se lavado
— se tendo lavado
Particípio
O pronome oblíquo não pode vir posposto ao particípio
Observações:
1.
a) Note-se que, em todas as l as. pessoas do plural deste paradigma, quando o
pronome é enclítico, o -s final da desinência -mos é omitido (em virtude de uma
antiga assimilação à nasal inicial do pronome seguinte).
2.
a) Nas formas do modo indicativo, quando o pronome sujeito vem expresso,
a ênclise do pronome oblíquo é a construção preferida em Portugal e a próclise, a
normal no Brasil. Veja-se o que dissemos a propósito da colocação dos pronomes
átonos no capítulo 11.
CONJUGAÇÃO DOS VERBOS IRREGULARES
Ir r e g u la r id a d e v e rb a l
A irregularidade de um verbo pode estar na flexão ou no radical.
Se examinarmos, por exemplo, a l.a pessoa do presente d o indicativo dos
verbos dar e medir, verificamos que:
a) a forma dou não recebe a desinência normal -o da referida pessoa;
b) a forma meço apresenta o radical rneç-, distinto do radical med-, que aparece no
infinitivo e em outras formas do verbo: med-ir, med-es, med-i, med-ira, etc.
Dar e medir sã o , p o is , verbos
irregulares .
Se examinarmos, por outro lado, o pr etér ito im per fe it o d o in d ic a tiv o
dos verbos em causa, observamos que as formas:
a) dava, davas, dava, dávamos, dáveis, davam se enquadram no paradigma dos
verbos regulares da l.a conjugação;
b) media, medias, media, medíamos, medíeis, mediam, por sua vez, incorporamse ao paradigma dos verbos regulares da 3.® conjugação;
Vemos, assim, que num verbo irregular pode haver determinadas formas
perfeitamente regulares.
427
428
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
O bservação:
Para mais fácil conhecimento dos verbos irregulares, convém ter em mente o
que dissemos sobre a formação dos tempos simples. Excetuando-se a anomalia
que apontamos na conjugação dos verbos dar, estar, haver, querer, saber, ser e ir, a
irregularidade dos demais é sempre constante nas formas de cada um dos grupos:
1 .° GRUPO
2 .° GRUPO
3 .° GRUPO
Pres. do indicativo
Pretérito perfeito do indicativo
Futuro do presente
Pres. do subjuntivo
Pret. mais-que-perf. do indicativo
Futuro do pretérito
Imperativo
Pret. imperfeito do subjuntivo
Futuro do subjuntivo
A t e n t a n d o - s e , p o i s , n a s f o r m a s d o presente, d o pretérito pereeito e d o puturo
do presente d o modo indicativo, s a b e - s e s e u m v e r b o é o u n ã o i r r e g u l a r e , t a m b é m ,
c o m o c o n ju g á -lo n o s te m p o s d e c a d a u m d o s trê s g ru p o s .
Ir r e g u la r id a d e v e rb a l e d is c o rd â n c ia g rá fic a
É necessário não confundir irregularidade verbal com certas discordâncias
gráficas que aparecem em formas do mesmo verbo e que visam apenas a indicar-lhes a uniformidade de pronúncia dentro das convenções do nosso sistema
de escrita.
Assim:
a) os verbos da 1 .a conjugação cujos radicais terminem em -c, -ç e -g mudam tais
letras, respectivamente, em -qu, -c e -gu sempre que se lhes segue um -e:
ficar — fiquei
justiçar — justicei
chegar — cheguei
b) os verbos da 2.a e da 3.a conjugação cujos radicais terminem em -c, -g e -gu
mudam tais letras, respectivamente, em -ç, -j e -g sempre que se lhes segue
um -o ou um -a:
vencer — venço — vença
tanger — tanjo — tanja
erguer — ergo — erga
restringir — restrinjo — restrinja
extinguir — extingo — extinga
São, como vemos, simples acomodações gráficas, que não implicam irregu
laridade do verbo.
VERBO
Verbos com alternância vocálica
Muitos verbos da língua portuguesa apresentam diferenças de timbre na
vogal do radical conforme nele recaia ou não o acento tônico. Estas diferenças
não são exatamente as mesmas na variante europeia e na variante brasileira da
língua portuguesa, devido sobretudo ao fenômeno da redução das vogais em
sílaba átona, a que nos referimos no capítulo sobre fonética e fonologia. Assim,
às formas le v a m o s e l e v a i s — com [d ] fechado no português normal de Portugal
e com [e] semifechado no português do Brasil — contrapõem-se levo , leva s, le v a e
l e v a m , com e semiaberto [e]; às formas r o g a m o s e ro g a is — com [u] no portu
guês de Portugal e com [o] semifechado no português do Brasil — opõem-se
ro g o , ro g a s, ro g a e r o g a m , com o semiaberto [a]. Às vezes a alternância vocálica
observa-se nas próprias formas rizotônicas. Por exemplo: s u b o , em contraste
com s o b e s , s o b e e s o b e m ’, f i r o , em oposição a fe r e s , f e r e e f e r e m .
Por sofrerem tais mutações vocálicas no radical, esses verbos, ou melhor, os
pertencentes à 3.a conjugação, vêm de regra incluídos no elenco dos verbos
irregulares . Cumpre ponderar, no entanto, que essas alternâncias são carac
terísticas do idioma; os verbos que as apresentam não formam exceções, mas
a norma dentro da nossa complexa morfologia. Saliente-se, ainda, que não é
lógico que se considerem regulares verbos como b e b e r e m o v e r , que, nas formas
rizotônicas, apresentam, respectivamente, as alternâncias: a ) de [ô] fechado no
português normal de Portugal e de e semifechado [e] no português do Brasil
com e semiaberto [e]; b ) de [u] fechado no português normal de Portugal e
o semifechado [o] no português do Brasil com o semiaberto [o]; e, de outro
lado, se tenham por irregulares verbos como f r i g i r e a c u d i r , que alternam [i]
com e semiaberto [e] e fu] com o semiaberto [o]. Há flagrante semelhança
nos casos citados. Apenas em b e b e r e m o v e r não se distinguem na escrita (fato
meramente gráfico, por conseguinte) aquelas oposições de fonemas vocálicos
a que nos referimos.
Uma palavra deve ainda ser dita com referência aos verbos de qualquer
conjugação que têm no radical a vogal a .
No português do Brasil não se observa nenhuma alternância na referida vogal,
que apresenta o mesmo timbre aberto nas formas rizotônicas e arrizotônicas,
embora nestas últimas, naturalmente, ela se articule com menos intensidade.
Assim: la v o , la v a s, la v a , la v a m o s , la v a is , la v a m ; la v e , la v e s, la v e , la v e m o s , la v e is ,
la v e m (sempre com o a tônico ou pretônico aberto).
No português de Portugal, porém, a vogal radical a , sujeita, nas formas
arrizotônicas, ao fenômeno da redução vocálica, apresenta, regularmente, o
timbre [a]. Temos assim: la v o , la v a s , la v a , la v a m ; la v e , la v e s, la v e , la v e m (com a
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430
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
tônico aberto [a]), mas lavamos, lavais; lavemos, laveis; lavai (com a pretônico
semifechado [a]).
Quando a vogal radical é a nasal [cr], grafada an ou am, não se registra
qualquer alternância nem no português do Brasil nem no de Portugal, pois a
vogal é sempre semifechada, como se disse no capítulo dedicado à Fonética.
Assim: canto, cante, cantamos, cantemos, etc. (sempre com [a ']).
Feitas essas considerações, examinemos os principais tipos de alternância
vocálica dos verbos em que existem formas rizotônicas: o presente do indicativo ,
O PRESENTE DO SUBJUNTIVO, O IMPERATIVO AFIRMATIVO e O IMPERATIVO NEGATIVO.
D e 7." c o n ju g a ç ã o
(Modelos: levar e lograr)
I n d icativo
S u bjun tivo
p r esen te
PRESENTE
I m pera tiv o
A firm a tivo
N eg ativo
le vo
le v e
le v a s
le v e s
leva
n ã o le ve s
leva
le v e
leve
n ã o leve
le v a m o s
le v e m o s
le v e m o s
n ã o le v e m o s
le v a is
le v e is
levai
n ã o le v e is
le v a m
le v e m
le v e m
n ã o le v e m
lo g ro
lo g re
lo g ra s
lo g re s
lo g ra
n ã o lo g re s
lo g ra
lo g re
lo g re
n ã o lo g re
lo g r a m o s
lo g r e m o s
lo g re m o s
n ã o lo g re m o s
lo g r a is
lo g re is
lo g ra i
n ã o lo g re is
lo g ra m
lo g re m
lo g re m
n ã o lo g re m
—
—
—
Verificamos que, no primeiro, à vogal fechada [3] do português normal de
Portugal e à semifechada [e] do português normal do Brasil, que aparecem na
l.a e 2.® pessoas do plural, corresponde a semiaberta [e] na l.a, 2.a e 3.a pessoas
do singular e na 3.a do plural. No segundo, há uma mutação semelhante: à vogal
fechada [u] do português normal de Portugal e à semifechada [o] do português
normal do Brasil, existentes nas formas arrizotônicas, corresponde a semiaberta
[o] nas formas rizotônicas.
VERBO
431
Observações:
no
a)
b)
c)
1.
a) Seguem o modelo de levar os verbos da l.a conjugação que têm e gráfico7
radical, a menos que esta vogal:
faça parte do ditongo escrito ei — e pronunciado [ej] no português do Brasil e
[a j] no português normal de Portugal — , como em cheirar , por exemplo: cheiro,
cheiras, cheira, etc. (sempre com [e] ou [a]);
esteja seguida de consoante nasal articulada ([m], [xx] ou [ j i ] ) : remo, remas,
rema, etc.; ordeno, ordenas, ordena, etc.; em penho, em penhas, em penha, etc. (no
português do Brasil, sempre com [e]; no português de Portugal, com [e] ou (a)
antes de [ji| nas formas rizotônicas, e com [3] nas arrizotônicas);
venha seguida de consoante palatal ([J], [ 3 ] ou [A]: fecho, fechas, fecha, etc.;
desejo, desejas, deseja, etc.; aparelho, aparelhas, aparelha, etc. (no português do
Brasil, sempre com [ej; no português de Portugal, com |e) ou [a] nas formas
rizotônicas, e com [ 3 ] nas arrizotônicas);
Apenas os verbos invejar, embrechar, frechar e vexar, dentre os que ao |e] segue
uma consoante palatal, apresentam a vogal [e] nas formas rizotônicas.
2.
a) Embora não se enquadre em nenhuma das exceções apontadas, o verbo chegar
(e seus derivados, como achegar, aconchegar, etc.) conserva a vogal semifechada [e J
em todas as formas rizotônicas.
3.
a) Seguem o modelo de lograr os verbos da l.a conjugação que têm 0 gráfico7
no radical, salvo nos casos em que esta vogal:
a) faz parte do ditongo oi (seguido de consoante) e do antigo ditongo ou: pernoito,
pernoitas, pernoita, etc.; douro, douras, doura, etc. (sempre com [o]);
b) antecede consoante nasal articulada ( [m | , [ 11 ] , [)i]: tomo, tomas, toma, etc.; leciono,
lecionas, leciona, etc.; sonho, sonhas, sonha, etc. (no português do Brasil, sempre
com [o]; no português de Portugal, com [o] nas formas rizotônicas e com [u]
nas arrizotônicas);
c) pertence a verbos terminados em -oar, como voar. voo, voas, voa, etc. (tanto no
português do Brasil como no de Portugal, com [o] nas formas rizotônicas e com
[u] nas arrizotônicas.
4.
a) Os verbos que apresentam no radical e [ê] ou 0 [õ] nasal conservam estas
vogais em todas as formas: tento, tentas, tenta, etc.; conto, contas, conta, etc.
C o m o d is s e m o s , n o p o rtu g u ê s e u ro p e u n o r m a l, as v o g a is r a d ic a is e s c rita s
0, e, s o a m
[3 ],
[ u ] ,n a s fo rm a s a r r iz o t ô n ic a s . O s in f in it iv o s le v a r e / o g r a r s ã o ,p o is ,p r o n u n c ia d o s [13’v a r]
e [ l u ’g r a r ] .
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NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
D e 2 .a c o n ju g a ç ã o
(Modelos: dever e mover)
I n dicativo
S u bjun tivo
PRESENTE
p r esen te
I m pera tiv o
A firm a tivo
N eg ativo
devo
d e va
deves
devas
deve
não devas
deve
d e va
deva
não deva
devem os
devam os
devam os
não devam os
d e v e is
d e v a is
devei
n ã o d e v a is
devem
devam
devam
não devam
m ovo
m ova
-
m oves
m ovas
m ove
-
m ove
não m ovas
m ova
m ova
não m ova
m ovem os
m ovam os
m ovam os
não m o vam o s
m o v e is
m o v a is
m ovei
n ã o m o v a is
m ovem
m ovam
m ovam
não m ovam
Verificamos que:
a) no p r e s e n t e d o iNDiCATivo, as formas rizotônicas apresentam uma alternância
da vogal semifechada [e] e [o] da l.a pessoa do singular com a vogal semia
berta [e] e [o] da 2.a e 3.a pessoas do singular e da 3.a do plural; nas formas
arrizotônicas observa-se a distinção entre as vogais átonas fechadas [3] e [u]
do português de Portugal e as semifechadas [e] e [o] do português do Brasil.
b ) no p r e s e n t e d o s u b j u n t i v o , o português do Brasil mantém em todas as
formas a vogal [e] ou [o], conservada no português de Portugal somente nas
formas rizotônicas, pois nas arrizotônicas se dá a redução normal a [ô] ou [u].
c) no i m p e r a t i v o a f i r m a t i v o , a 2 .a pessoa do singular, em correspondência
com a do p r e s e n t e d o i n d i c a t i v o , tem a vogal semiaberta [e] ou [o]; no
português do Brasil, a 2.a pessoa do plural, forma arrizotônica, e as formas
derivadas do p r e s e n t e d o s u b j u n t i v o (3.a do singular, l.a e 3.a do plural e
todas as pessoas do i m p e r a t i v o n e g a t i v o ) conservam a vogal semifechada
[e] ou [o] deste tempo; no português de Portugal, as formas rizotônicas
derivadas do p r e s e n t e d o s u b j u n t i v o m antêm a vogal semifechada [e]
ou [n], mas as formas arrizotônicas apresentam a redução a [ô] ou [u].
Observações:
l.a) Seguem o modelo de dever os verbos da 2.a conjugação que têm e gráfico
no radical, com exceção:
VERBO
a) do verbo querer, cujo p r e s e n t e d o s u b iu n t iv o é irregular (queira, queiras, etc.)
e que, no p r e s e n t e d o in d ic a t iv o , apresenta todas as formas rizotônicas com e
semiaberto [ej: quero, queres, quer, querem .
b) no português do Brasil, dos verbos em que o e antecede uma consoante nasal,
como temer, tem o, temes, teme, etc. (sempre com (e ]); no português de Portugal
estes verbos seguem o modelo de dever.
2.
°) Seguem o modelo de m over os verbos da 2.“ conjugação que têm o gráfico
no radical, com exceção:
a) do verbo poder, em que a vogal semiaberta [o] aparece também na l.a pessoa
do singular do p r e s e n t e d o in d ic a t iv o e, consequentemente, em todas as formas
rizotônicas do p r e s e n t e d o s u b i u n t i v o : posso, podes, pode, podem; possa, possas,
possa, possam;
b ) no português do Brasil, dos verbos em que o o antecede consoante nasal, a exem
plo de comer, como, comes, come, etc. (sempre com [o]); no português normal de
Portugal estes verbos seguem o modelo de mover.
Note-se que em algumas regiões do Brasil os verbos em que o o do radical ante
cede consoante nasal seguem também o modelo de mover.
3.
a) Os verbos que apresentam no radical e [ê] ou [õ] nasal conservam estas vogais
em todas as formas: encho, enches, enche, etc.; rompo, rompes, rompe, etc.
D e 3 .a c o n ju g a ç ã o
(Modelos: servir e dormir)
I n d ica tivo
S u bju n tivo
PRESENTE
p r e s en t e
s ir v o
s ir v a
se rv e s
s ir v a s
s e rv e
I m pera tiv o
A
N eg ativo
firm a tivo
s e rv e
n â o s ir v a s
s ir v a
s irv a
n â o s irv a
s e r v im o s
s ir v a m o s
s ir v a m o s
n â o s ir v a m o s
s e r v is
s ir v a is
s e rv i
n â o s ir v a is
se rv e m
s ir v a m
s ir v a m
n ã o s ir v a m
d u rm o
d u rm a
—
—
d o rm e s
d u rm a s
d o rm e
não d u rm a s
d o rm e
d u rm a
d u rm a
não d u rm a
d o r m im o s
d u rm a m o s
d u rm a m o s
não d u rm a m o s
d o r m is
d u r m a is
d o rm i
n ã o d u r m a is
d o rm e m
d u rm a m
d u rm a m
não d u rm a m
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434
NOVA G R A M Á T I C A DO P O R T U G U Ê S C O N T E M P O R Â N E O
Notamos que, nesses verbos, as vogais do radical alternam de modo ainda
mais sensível.
Assim:
a) no presente d o iNDicATivo, as formas rizotônicas apresentam uma alter
nância da vogal fechada [i] ou [n] da l.a pessoa do singular com a vogal
semiaberta [e] ou [o] da 2.® e 3.®pessoas do singular e da 3.® do plural; nas
formas arrizotônicas observa-se a redução vocálica normal a [9] ou [u] no
português europeu e uma oscilação entre [e/i] ou [o/u] no português do
Brasil, com predominância da vogal fechada [i] ou [u] por influência assimilatória da vogal tônica;
b) no
presente do subjuntivo ,
d e r iv a d o d a 1.® p e s s o a d o
presente d o indicativo ,
m a n tê m - s e e m to d a s a s f o r m a s a s v o g a is d a q u e la p e s s o a , [i] o u [ n ] , c o n f o r m e
o caso;
c) no imperativo afirm ativo , a 2 .® pessoa do singular, em correspondência
com a do presente d o indicativo , tem a vogal [e] ou [o]; a 2 .® do plural,
em consonância com a do presente d o ind icativ o , apresenta a vogal [9]
ou [n], no português