Academia.eduAcademia.edu

Pentateuco e os "Pentateucos" na Bíblica

2022, ReBiblica

The Biblical literature is strongly marked by the set of books of the Pentateuch/Torah, from themes, theology and its quinquennial structure. It is a set of "five books" and "instruction" that entered the heart and mind of the Jewish people and the Christian tradition. His books are cited by both OT and NT biblical authors. From his five books, throughout the Holy Scriptures, there are quotations, allusions and echoes of his characters, facts, themes and theology. There are also sets of books that are arranged in the form of a "pentateuch", such as the Megillot and the "sapiential pentateuch"; or books with a quinquennial structure, such as the Psalms (five books) and the Gospel of Matthew (five discourses). It is the only biblical corpus accepted by Jews and Christians in its structure and arrangement, in an unalterable way. Looking at the Samaritan Pentateuch, the smallest biblical canon, one understands its value and scope in religious life, as the revealed and inspired Word of God. This article aims to look at this reality and call attention to its value, indicating several well-known "pentateuchs"and others less known, but which certainly must have suffered some degree of influence from the literature and theology of the Pentateuch/Torah.

ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 O Pentateuco e os “pentateucos” na Bíblia: uma abordagem canônica The Pentateuch and the “pentateuchs” in the Bible: a canonical approach Waldecir Gonzaga Doaldo Ferreira Belém Resumo A literatura bíblica está fortemente marcada pelo conjunto dos livros do Pentateuco/Torá, a partir dos temas, da teologia e de sua estrutura quinquenária. Constitui-se em um conjunto de “cinco livros” e “instrução” que entrou no coração e na mente do povo judeu e da tradição cristã. Seus livros são citados pelos autores bíblicos tanto do AT como do NT. De seus cinco livros, ao longo das Escrituras Sagradas, encontram-se citações, alusões e ecos de seus personagens, fatos, temas e teologia. Também há conjuntos de livros que têm arranjo em forma de “pentateuco”, como os Megillot e o “pentateuco sapiencial”; ou de livros com estrutura quinquenária, como os Salmos (cinco livros) e o Evangelho de Mateus (cinco discursos). É o único corpus bíblico aceito por judeus e cristãos em sua estrutura e arranjo, de forma inalterável. Olhando para o Pentateuco Samaritano, menor cânon bíblico, entende-se seu valor e alcance na vida religiosa, como Palavra de Deus revelada e inspirada. Este artigo tem como escopo olhar para esta realidade e chamar a atenção para seu valor, indicando vários “pentateucos” bastante conhecidos – e outros menos conhecidos, mas que certamente devem ter sofrido algum grau de influência da literatura e da teologia do Pentateuco/Torá. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 247 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 Palavras-chave: Bíblia. Pentateuco. Torá. “Pentateucos”. Antigo e Novo Testamento. Abstract The Biblical literature is strongly marked by the set of books of the Pentateuch/Torah, from themes, theology and its quinquennial structure. It is a set of “five books” and “instruction” that entered the heart and mind of the Jewish people and the Christian tradition. His books are cited by both OT and NT biblical authors. From his five books, throughout the Holy Scriptures, there are quotations, allusions and echoes of his characters, facts, themes and theology. There are also sets of books that are arranged in the form of a “pentateuch”, such as the Megillot and the “sapiential pentateuch”; or books with a quinquennial structure, such as the Psalms (five books) and the Gospel of Matthew (five discourses). It is the only biblical corpus accepted by Jews and Christians in its structure and arrangement, in an unalterable way. Looking at the Samaritan Pentateuch, the smallest biblical canon, one understands its value and scope in religious life, as the revealed and inspired Word of God. This article aims to look at this reality and call attention to its value, indicating several well-known “pentateuchs” – and others less known, but which certainly must have suffered some degree of influence from the literature and theology of the Pentateuch/Torah. Keywords: Bible. Pentateuch. Torah. “Pentateuchs”. Old and New Testament. Introdução O corpus do Pentateuco, terminus technicus, ou Torá (instrução = indicação e noção do conteúdo), é o conjunto de livros do Antigo Testamento mais comum a todas as tradições judaico-cristãs, seja em número seja na ordem em que os livros são dispostos nas Bíblias hoje. Os cinco livros são muito reverenciados dentro do Antigo Testamento e do Novo Testamento, tanto a partir de citações explícitas, como de alusões ou ecos de temas próprios do corpus, o primeiro nas Bíblias, em todas as tradições. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 248 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 Olhando nos livros das Sagradas Escrituras, percebe-se uma presença muito forte da teologia,1 do “Deus de Israel”2 e da estrutura3 do “pentateuco”. Bastaria correr os olhos para se perceber temas como: criação do mundo e do ser humano, mundo, humanidade, amor, fé, lei, justiça, pecado, salvação, aliança, promessa etc., que se encontram dentro dos livros do Pentateuco. Outro dado interessante é a estrutura do Pentateuco, como arranjo de um conjunto de livros, o qual abre as bíblias modernas, como primeiro bloco dos livros do Antigo Testamento, sendo opinio communis entre todas as tradições judaicocristãs.4 Alguns “pentateucos” são muito conhecidos, como o Pentateuco Mosaico, do Cânon Hebraico, recebido da corrente farisaica, pelo Texto Massorético, do Códice Leningradenese (Gênesis, Êxodo, Levítico, Número e Deuteronômio) e o Pentateuco Samaritano, que é o mesmo Mosaico (Gênesis, Êxodo, Levítico, Número e Deuteronômio). Este é o conjunto dos cinco livros contidos nas Bíblias modernas, chamado igualmente de Pentateuco, tomando o nome da língua grega. Aliás, este é igualmente o Pentateuco presente na versão grega da LXX (250 a 150 a.C.) e na versão latina da Vulgata (final do séc. IV d.C.). Há ainda “outros pentateucos” que são menos conhecidos, mas que é importante saber da existência dos mesmos. Por exemplo, o Pentateuco dos Megillot (Rute, Cântico dos Cânticos, Eclesiastes, Lamentações e Ester); tendo presente o cânon protestante, pode-se falar em Pentateuco dos Profetas Maiores em relação aos livros protocanônicos, uma vez que Baruc é um livro deuterocanônico, comum aos católicos e ortodoxos, mas que não entra no cânon protestante; em relação aos Profetas Menores, é possível falar de um Duplo Hexateuco, tendo em vista que este corpus é formado por doze livros. Quando se toma a versão da LXX, então se depara com outros “pentateucos”: o Pentateuco Histórico (1Esdras, Esdras, Neemias, 1Crônicas e 2Crônicas); o Pentateuco Feminino (Rute, Ester, Judit, Sabedoria e Suzana);5 o Pentateuco Sapiencial 1 OSWALT, J. N., Pentateuco, Teología del, p. 657-668. 2 MACKENZIE, J. L., Aspectos do Pensamento do Antigo Testamento, p. 1388-1408. 3 STEINER, V. J., Pentateuco, Estrutura Leteraria del, p. 632-642. 4 ZENGER, E., A Sagrada Escritura de Judeus e Cristãos, p. 28-34. p.15-43 5 Sugerimos conferir o artigo SASSI, K. R., O Pentateuco feminino na liturgia judaica e cristã, p. 1029-1041, que desenvolve um estudo sobre um outro “pentateuco feminino” nas Escrituras Judaicas, computando os textos de Rute, Ester, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos e Lamentações, como cinco livros que fazem parte de um ciclo de leitura sinagogal nas festas litúrgicas do povo de Israel. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 249 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 (Provérbios, Jó, Eclesiastes [Qohelet], Eclesiástico [Siracida] e Sabedoria); o Pentateuco Salomônico, (Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Sabedoria e Eclesiástico). Mas também é possível vislumbrar um Pentateuco Salmódico (V livros dos Salmos) e um Pentateuco Enóquico (V livros de Henoc). Pode-se falar igualmente da presença da estrutura de “pentateucos” no corpus do Novo Testamento. Por exemplo, o “pentateuco” formado pelos quatro Evangelhos e o livro dos Atos dos Apóstolos (Mateus, Marcos, Lucas, João e Atos); o Pentateuco Mateano, formado pela estrutura dos cinco discursos de Cristo ao longo do evangelho de Mateus; o Pentateuco Joanino, formado pelo Evangelho, mais as 3 cartas e o livro do Apocalipse (Evangelho de João, 1João, 2João, 3João e Apocalipse de João). Isso demonstra que a teologia, os temas e a estrutura do Pentateuco entraram no coração e na mente do povo e da tradição judaico-cristã, visto que “a Torá contém os eventos e a teologia fundamentais do povo de Deus”.6 Neste artigo, pretende-se analisar a temática, ver e indicar algumas das possibilidades, bem como o valor do corpus e da literatura da Torá, que é o conjunto do Pentateuco. Não tem como preocupação a análise da autoria, se mosaica ou não, sequer suas formas literárias, hipótese documentária e ou história de sua formação.7 Alguns, com certeza, evidenciarão curiosidade e aguçarão novas e futuras pesquisas neste campo das Escrituras Sagradas, que conta com a aceitação comum entre judeus e cristãos de todas as correntes. 1. Origem da palavra “pentateuco” A palavra “pentateuco” tem sua origem no grego “πεντάτευχος/pentateuco”. Etimologicamente é derivada de duas palavras: “πεντά/cinco” e “τευχος/rolo”,8de papiro, e, por extensão, “volume”, “livro”, usado para falar dos “cinco recipientes”, “indicando os rolos escritos de 6 MURPHY, R. E., Introdução ao Pentateuco, p. 56. 7 Para tanto indicamos a leitura do texto MURPHY, R. E., Introdução ao Pentateuco, p. 49-57; BLENKINSOPP, J., El Pentateuco, p. 11-48; SKA, J.-L., Introdução à leitura do Pentateuco, p. 111-140; PURY, A.; RÖMER, T., O Pentateuco em Questão, p. 15-99; ZENGER, E., Os livros da Torá/do Pentateuco, p. 45-157; GALVAGNO, G.; GIUNTOLI, F., Pentateuco, p. 129-152, que apresentam uma ideia da problemática e o atual status quaestionis. 8 BAILLY, A., Dictionnaire Grec Français, p. 1513. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 250 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 pergaminho ou de papiro que eram guardados em receptáculos”.9 Neste sentido, o termo é usado para designar “os cinco livros” que são atribuídos a Moisés ou “ἡ πεντάτευχος βίβλος/o livro em cinco partes”10 (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio);11 porém, esta autoria foi seriamente questionada nos últimos séculos, visto que foram escritos após sua morte e época,12 “mas devemos considerar a formação destes livros ainda como mistério”.13 Há duas formas para se designar os cinco primeiros livros da Bíblica, pois além de Pentateuco, eles também são chamados de Torá, que constitui o “fundamento da vida e do pensamento da comunidade judaica”,14 que significa “instrução”, sendo como que o “centro da Escritura”. Na Bíblia Hebraica – idioma original de sua escrita –,15 a Torá também pode significar “coleções de leis” ou um conjunto de livros. Neste sentido, para referir-se aos cinco primeiros livros da Bíblia, alguns preferem dizer “os cinco livros da Torá”.16 Como se lê em Js 1,7: “sê forte e corajoso para cumprir toda a Torá que Moisés, meu servo, prescreveu-te”, todos os livros da Torá são atribuídos a Moisés.17 O termo grego πεντάτευχος é atestado pela primeira vez no séc. II de nossa era, numa carta do gnóstico Ptolomeu18 (um contemporâneo de Justino, que teria vivido entre os anos 136 e 180 d.C.) para sua irmã Flora, numa discussão acerca da autoria da lei atribuída a Moisés, quando se refere ao “Pentateuco de Moisés”. Seu uso, então, propagou-se no Cristianismo, como pode ser visto nos Padres da Igreja Tertualiano, Orígenes e Epifânio para designar os cinco primeiros livros da Bíblia, atribuídos a Moisés e conhecidos no Judaísmo como Torá.19 Tertuliano, por exemplo, utiliza a palavra “pentateuco” no primeiro de seus cinco livros contra Marcião, no capítulo 10, ao declarar que muito embora Moisés 9 MURPHY, R. E., Introdução ao Pentateuco, p. 49. 10 ZENGER, E., Os livros da Torá/do Pentateuco, p. 46. 11 ZENGER, E., Os livros da Torá/do Pentateuco, p. 46; BLENKINSOPP, J., El Pentateuco, p. 11; BAILLY, A., Dictionnaire Grec Français, p. 1513. 12 BLENKINSOPP, J., El Pentateuco, p. 13. 13 MURPHY, R. E., Introdução ao Pentateuco, p. 50. 14 GARCIA LÓPEZ, F., O Pentateuco, p. 1294. 15 HESS, R. S., Pentateuco, Idioma del, p. 651-656. 16 GARCIA LÓPEZ, F., O Pentateuco, p. 15. 17 ALEXANDER, T. D., Pentateuco, Autoría del, p. 622-632. 18 GARCIA LÓPEZ, F., O Pentateuco, p. 16. 19 LIM, T. H., The Formation of the Jewish Canon, p. 88. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 251 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 “parece ter sido o primeiro a introduzir o conhecimento do Deus”, o “aniversário desse conhecimento não deve (...) ser contado a partir do Pentateuco”.20 Jerônimo, um dos mais entusiasmados defensores da veritas hebraica, utilizou essa expressão em sua introdução ao livro de Gênesis, e a reproduziu no terceiro livro de sua Apologia contra os livros de Rufino: Do meu caro Desidério recebi as tão desejadas cartas, ele que obteve por sorte, como por certo presságio de coisas futuras, o mesmo nome que Daniel, ele me solicita que eu dê aos ouvidos dos nossos compatriotas o Pentateuco traduzido para a língua latina a partir do idioma hebraico.21 Se o uso da palavra “pentateuco” parece ser exclusivo do Cristianismo, por outro lado está autenticamente enraizada no Judaísmo. O vocábulo τευχος já aparece na carta de Aristeias, um escrito provavelmente da era pré-cristã, nos parágrafos 179 e 310 na sua forma pluralizada “τὰ τεύχη/os rolos”.22 No contexto, é uma referência clara aos livros da Lei atribuídos a Moisés, sem necessitar explicitar o número de cinco.23 Por isso, o Judaísmo compreende “πεντάτευχος/pentateuco” como adaptação para o grego da expressão hebraica “ḥamishshah ḥumshe ha-Torah/cinco quintos da Torah”.24 É possível, embora não se possa ter certeza, de que a expressão hebraica seja a mais antiga, visto que “ḥamishshah ḥumshe ha-Torah/cinco quintos da Torah” é atestada na Mishnah, compilação da lei oral judaica, a qual foi posta por escrito por volta do ano 200 de nossa era – posterior, portanto, à obra de Ptolomeu – mas que remete a tradições mais antigas. Essa expressão, na sua forma aramaica, também é encontrada no Talmud.25 A própria história da crítica do Pentateuco indica que o mesmo é citado por várias fontes do mundo judaico, 20 TERTULLIAN, The Five Books Against Marcion, p. 278. 21 JERÔNIMO, Apologia contra os livros de Rufino 2,25. 22 BLENKINSOPP, J., El Pentateuco, p. 66. 23 LIM, T. H., The Formation of the Jewish Canon, p. 88. 24 HIRSCH, E. M., Pentateuch, p. 589-592. 25 Por exemplo B. Sotah 36B; b. Baba Metsia 6,8; b Hagigah 14a; j. Megilah 74A; b. Kiddushin 33a (conferir texto em NEUSNER, J., The Babylonian Talmud). Conferir ainda JASTROW, M. A., ‫חֹומֶ ׁש‬, Dictionary of the Targumim, the Talmud Babli and Yerushalmi, and the Midrashic Literature, p. 436. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 252 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 como o Talmud, a Mishiná, Flávio Josefo e Filon de Alexandria, bem como pela tradição cristã, desde seus primórdios.26 Pode-se dizer que, ainda que suas origens não sejam cristãs e sim judaicas, a palavra “pentateuco” foi “capturada” pelo Cristianismo, amplamente aceita nos seus diversos ramos, sendo comumente usada no dia a dia, seja na vida acadêmica seja pela comunidade eclesial que lê e medita a Palavra de Deus contida na Torá. Na LXX, o tradutor do livro do Eclesiástico, provavelmente do séc. II a.C.,27 em seu prólogo ao livro, distingue as Escrituras Sagradas entre a “νόμος/lei”, os “προφῆται/profetas” e os “βιβλίοις/escritos” (vv.1.8-10.24), indicando que já era uma nomenclatura e divisão conhecidas entre os judeus. Acrescente-se a isso, o fato de que os judeus samaritanos aceitavam apenas os livros da Torá (Pentateuco Samaritano), como sendo genuínos, revelados e canônicos.28 No que tange ao Novo Testamento, a ideia foi perpassada para seus livros, seja na Teologia, seja pela questão do número cinco, como os cindo sermões de Cristo no Evangelho de Mateus ou mesmo na estrutura e arranjo do cânon, como na construção dos Evangelhos e Atos, por exemplo. Aliás, os grandes temas que permeiam todo o Pentateuco, de uma forma ou de outra, estão contemplados e marcam presença ao longo dos livros do Novo Testamento, como: criação, libertação, salvação, aliança, lei, justiça, promessa, amor a Deus e ao próximo, etc.29 2. Os “pentateucos” no cânon hebraico Ainda que a palavra “pentateuco” seja uma apropriação cristã, do ponto de vista canônico a referência é ao conjunto de cinco livros considerados basilares para a fé judaica, comum a todas as tradições do Judaísmo e do Cristianismo, sendo, inclusive, aquele que sobrevive ao “arranjo” bíblico quase sempre intacto em sua ordem, inclusive pelos judeus samaritanos.30 São os 26 ARNOLD, B. T., Pentateuco, Historia de la crítica del, p. 642-656; SKA, J.-L., Introdução à leitura do Pentateuco, p. 15-17; GALVAGNO, G.; GIUNTOLI, F., Pentateuco, p. 129. 27 BLENKINSOPP, J., El Pentateuco, p. 11. 28 WILLIANS, P. J., Critica Textual, p. 196-202. 29 GARCIA LÓPEZ, F., O Pentateuco, p. 296-302. 30 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 278-280. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 253 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 únicos livros que não possuem uma explicação “específica” para sua canonicidade – e os demais livros, segundo o Judaísmo, terão sua canonicidade comprovada pela conformação com os livros que preferencialmente são designados pelos judeus como a Torá de Moisés.31 Mais ainda, segundo Zenger. A Torá/o Pentateuco é o bloco mais volumoso da Bíblia, quase tão volumoso quanto o Novo Testamento. Constitui o documento-base tanto do Tanak quando do Primeiro Testamento. Também a posição do Evangelho de Mateus, como primeiro livro do Novo Testamento, deve ter relação com sua estrutura de Torá (cf. o Sermão da Montanha, Mt 5–7). Na verdade, o Pentateuco é, por um lado, uma constelação extraordinariamente complexa e por vezes perturbadora, o que tem relação com seu processo de surgimento em múltiplas camadas. Por outro lado, no entanto, não é mero resultado de um processo de coleta acidental, mas permite constatar, em sua forma final, uma composição planejada, cujo objetivo é ser lida como um programa teológico.32 No que diz respeito à terminologia, no cânon hebraico, os textos do Pentateuco identificados e “denominados pela primeira palavra importante de cada livro”: 33 1) Berē’šît (no princípio); 2) Šemôt (nomes); 3) Wayyikrā’ (e chamou); 4) Bemidbar (no deserto); 5) Devarîm (palavras). Na LXX, os livros do Pentateuco são identificados pelo conteúdo: 1) Γένεσις/Gênesis (origem); 2) Ἔξοδος/Êxodo (saída); 3) Λευϊτικὸν/Levítico (levítico); 4) Ἀριθμοὶ/Números (números); 5) Δευτερονόμιον/Deuteronômio (segunda lei). Nas versões latinas eles assumiram a nomenclatura da LXX: Genesis, Exodus, Leviticus, Numeri et Deuteronomium, e daqui os nomes passaram para as línguas modernas, como se encontram nas Bíblias hoje.34 A importância da menção da cifra de cinco livros da Torá pode ser identificada no Talmud: “os Profetas e os Escritos estão destinados para serem anulados, mas os cinco livros da Torá não são destinados para serem anulados” (j. Megillah 70D); e, à pergunta de quantos pregos deve haver numa sandália a ser utilizada no sábado, Rabbi Yohanan responde “cinco, pelos cinco livros da Torah” 31 SANDERS, J. A., Canon, p. 837-852. 32 ZENGER, E., Os livros da Torá/do Pentateuco, p. 46. 33 GARCIA LÓPEZ, F., O Pentateuco, p. 16. 34 GARCIA LÓPEZ, F., O Pentateuco, p. 16. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 254 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 (j. Shabbat 8A). O caráter especial do número cinco proporcionou que cada livro do Pentateuco também pudesse ser dividido em cinco partes.35 Interessante observar que os cinco livros estão em arranjo quiástico, proporcionando uma leitura concêntrica dos preceitos judaicos, que vai conduzindo os ouvintes/leitores a que entrem na vontade de IHWH, onde quer que estejam, perto ou distante do Templo: A A’ Gênesis B Êxodo X Levítico B’ Números Deuteronômio Mantendo a posição central de Levítico, o qual é o livro primordial para a guarda dos preceitos judaicos como o kashrut, Êxodo e Números compartilham em comum o início e o final da caminhada no deserto; Gênesis representa o início de tudo, principalmente das origens do povo de Israel, e Deuteronômio representa um “recomeço” com a nova geração entrando na Terra Prometida e indicando que YHWH cumpre o que prometeu e que o povo deve instalar-se na terra e fazê-la frutificar. As pesquisas recentes revelam que provavelmente o conjunto não foi pensado como um Pentateuco: desde as pesquisas de Martin Noth sobre o deuteronomista, pensa-se no Deuteronômio originalmente iniciando um conjunto de livros históricos que abarcam ainda Josué, Juízes, Samuel e Reis, e que por isso ganharam o nome de “História Deuteronomista”. Consequentemente, haveria originalmente um “Tetrateuco”, o qual evoluiu posteriormente para um “Pentateuco”.36 Independente se a ideia de Pentateuco é ou não original, o mais importante é a descoberta no cânon hebraico de outro “pentateuco”: o deuteronomista, em disposição concêntrica: 35 APPLESON, R. R., Is There a Pattern to The Five Books of Moses?, p. 39-48. Para o texto de j. Megillah 70D e j. Shabbat 8A, ver NEUSNER, J., The Jerusalem Talmud. 36 Para maiores detalhes, ver RÖMER, T.; NIHAN, C., O debate atual sobre a formação do Pentateuco, p. 85-143. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 255 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 A A’ Deuteronômio B Josué X Samuel B’ Reis Juízes A disposição central de Juízes pode ser explicada pelo momento crucial de luta pela ocupação efetiva da terra; se em Josué há a conquista da terra, em Reis há a perda da terra; se em Deuteronômio há a Aliança para a posse da terra, em Samuel há a Aliança com Davi. O livro dos Salmos também foi dividido em cinco livros,37 correspondendo pela ordem aos cinco livros da Torá (Torah), como declara o Midrash: “Assim como Moisés deu cinco livros da lei para Israel, também Davi deu cinco livros de salmos para Israel”. Assim, em sua forma canônica, os cinco livros dos Salmos são fundamentalmente “Torá” (“instrução”) para nossa meditação,38 formando e contendo, em seu interior e estrutura, um “pentateuco salmódico”, contendo, cada livro, inclusive, uma doxologia final e, no final do livro, uma grande doxologia, com os últimos cinco salmos).39 A Livro I (Salmos 1-41) B Livro II (Salmos 42-72) X B’ A’ Livro III (Salmos 73-89) Livro IV (Salmos 90-106) Livro V (Salmos 107-150) Outro “pentateuco” tradicional encontrado no cânon hebraico é o grupo conhecido como Megillot (do singular Megillah), “rolos”. São cinco livros especialmente relacionados às grandes festas judaicas. Por isso, a ordem canônica judaica vigente hoje segue o calendário judaico para esses livros, e 37 GONZAGA, W., O Salmo 150 à luz da Análise Retórica Bíblica Semítica, p. 155-170. 38 Apud FUTATO, M. D., Interpretação dos Salmos, p. 49-50. 39 GONZAGA, W., O Salmo 150 à luz da Análise Retórica Bíblica Semítica, p. 155-170. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 256 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 apresenta uma disposição concêntrica – a exemplo do “pentateuco deuteronomista”:40 A A’ Cântico dos Cânticos B Rute X Lamentações Eclesiastes B’ Ester O livro das Lamentações ocupa a porção central, um dia de lamento e jejum;41 Rute e Ester são os únicos livros do cânon hebraico a ter nomes femininos; enquanto Cântico dos Cânticos celebra a união de Israel com YHWH, Eclesiastes mostra o momento de tensão dessa união. Entretanto, o Códice Leningradense B19A apresenta uma ordem diferente, tornando-se quiástica, e, consequentemente, mais de acordo com a disposição da Torá, e cuja centralidade passa a ser ocupada por Eclesiastes: A A’ Rute B B’ Ester Cântico dos Cânticos X Eclesiastes Lamentações 3. Os “pentateucos” no cânon alexandrino O códice Alexandrino,42 no arranjo do cânon, tem um fator curioso em sua distribuição. Ele traz cinco blocos de livros na divisão do Antigo Testamento, como que “um pentateuco” de corpora e com cinco livros cada, com exceção dos Sapienciais, que forma um bloco com sete livros. Outro dado curioso é que o códice Alexandrino tem duas divisões entre os “livros históricos”, e o centro é ocupado pelo corpus profético, próprio da tradição cristã: 1) os cinco livros clássicos do Pentateuco (Gênesis, Êxodo, Levítico, Número e Deuteronômio); 2) um primeiro bloco de cinco livros dos 40 FRANCISCO, E. F., Manual da Bíblia Hebraica, p. 183-184. 41 ASHERI, M., O Judaísmo Vivo, p. 238. 42 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 293-298. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 257 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 históricos, contando os duplos como sendo um livro apenas (Josué, Juízes, Rute, Reis e Crônicas); 3) os cinco livros proféticos, tendo presente que os profetas menores contam como sendo um livro apenas (Doze menores, Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel); 4) um segundo bloco de cinco livros históricos, sendo que um é duplo [Esdras] e outro é quádruplo [Macabeus] (Ester, Tobias, Judite, Esdras e Macabeus); 5) e, por fim, um último conjunto contém os sete livros sapienciais (Saltério, Jó, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Sabedoria e Eclesiástico), podendo ser estruturado da seguinte forma concêntrica: A Pentateuco (Gênesis, Êxodo, Levítico, Número e Deuteronômio) B Históricos (Josué, Juízes, Rute, Reis e Crônicas) X Proféticos (Doze menores, Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel) B’ Históricos (Ester, Tobias, Judite, Esdras e Macabeus) A’ Sapienciais (Saltério, Jó, Provérbios, Eclesiastes, Cântico, Sabedoria e Eclesiástico) Entre os livros da LXX, Mazzinghi43 chama a atenção para o Pentateuco Sapiencial. Embora não exista na LXX a nomenclatura corpus sapiencial, como existe um corpus do Pentateuco, é possível falar de gênero literário sapiencial ou de “literatura sapiencial”,44 que diz respeito a alguns livros que se encontram no interior da duas Bíblias: Hebraica e Grega. A literatura sapiencial não se encontra entre as mais estudadas do Antigo Testamento, como Pentateuco, Profetas e Salmos (literatura lírica ou poética). No entanto, ela é muito importante, inclusive para entender “a relação que esses textos têm com a sabedoria dos povos vizinhos (...) e sua relação com a história de Israel”.45 Este “quinteto” de livros sapienciais foi atribuído a Salomão. A literatura sapiencial se diferencia da literatura da Torá, que tem textos de caráter legal, como temos nos livros do Pentateuco, pois o “sábio não prescreve, não tem mandamento para dar, mas sim sugestões e conselhos”.46 43 MAZZINGHI, L., Il Pentateuco sapienziale. 44 MAZZINGHI, L., Il Pentateuco sapienziale, p. 11. 45 MAZZINGHI, L., Il Pentateuco sapienziale, p. 9. 46 MAZZINGHI, L., Il Pentateuco sapienziale, p. 10. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 258 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 A A’ Provérbios B Eclesiastes [Qohelet] X Jó B’ Eclesiástico [Siracida] Sabedoria 4. O Pentateuco Samaritano (séc. IV a.C.) A Bíblia Samaritana47 contém apenas os cinco livros do Pentateuco. Forma o menor cânon bíblico que conhecemos na tradição judaico-cristã. Ela é chamada de Pentateuco Samaritano, Torá Samaritana ou Pentateuco Samaritano de Nablus. “Embora constituam uma comunidade religiosa bastante pequena, os samaritanos sobrevivem até hoje na região de Siquém, em Israel”.48 Eles não aceitaram e nem aceitam o restante dos livros do TANAK, mas apenas e tão somente os cinco livros da Torá como sendo os únicos livros que contém a revelação de Deus. Para eles, os demais livros da Bíblia Hebraica (Profetas e Escritos) não foram dados por Deus, não passando de criações humanas posteriores. Portanto, eles rejeitam até hoje todos os demais livros da Bíblia Hebraica. Com apenas os cinco livros da Torá, o Pentateuco Samaritano conta com: A A’ Gênesis B Êxodo X Levítico B’ Números Deuteronômio Escrito no alfabeto samaritano e assim conservado em seus caracteres arcaicos, o Pentateuco Samaritano não tem apenas a diferença linguística com o texto do Pentateuco Hebraico, da edição do Texto Massorético,49 mas conta com outras diferenças de conteúdo, como, por ex.: na versão samaritana dos Dez Mandamentos, logo após o texto de Ex 20,17, há um 11º Mandamento, onde Deus ordena ao povo que construa um templo no Monte Garizim, diferentemente do 47 BORGONOVO, G., La Tôrâ, ovvero il Pentateco, p. 89. 48 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 278-280. 49 PISANO, S., O Texto do Antigo Testamento, p. 42. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 259 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 Texto Massorético, que não ordena isso. Suas diferenças se concentram especialmente em três campos: 1) harmonização, buscando eliminar possíveis tensões e contradições no texto; 2) simplificação, procurando realizar correções gráficas em questões gramaticais, como os sufixos, muito comuns nas línguas semíticas; 3) e alterações de conteúdo, que são alterações de cunho dogmático, com interesses religiosos e cultuais próprios dos samaritanos,50 que são alterações voluntárias ao longo do texto, com intenções “ideológicas”.51 Basicamente desconhecido no mundo, o Pentateuco Samaritano foi redescoberto por Pietro Della Valle, que, em 1616, revelou ao Ocidente uma cópia do mesmo, trazida de Damasco,52 embora hoje já se conheça outros Manuscritos, como o Codex Zubil e duas traduções para o aramaico, transmitidas em Targumim.53 Entre o Pentateuco Hebraico e o Pentateuco Samaritano há diversas diferenças, a exemplo do que afirma Simian-Yofre: Confrontando o Pentateuco Samaritano com o TM, encontram-se mais ou menos 6.000 variantes, das quais cerca de 1.600 concordam com a LXX. Em geral as variantes são de tipo ortográfico (por exemplo, matres lectiones) ou morfológico. Há, todavia, algumas que indicam os interesses teológicos dos samaritanos (por exemplo, em Ex 20,17 e Dt 5,21 encontramos uma longa interpolação de Dt 11,29s; 27,2-7, que traz as palavras do povo depois da entrega dos dez mandamentos). A construção de um altar sobre o monte Garizim tornase uma parte do decálogo. Às vezes a forma do texto é diversa em comparação com a do TM e da LXX (por exemplo, as cronologias e Gn 5 e 11 existem em três formas: TM, LXX, Pentateuco Samaritano).54 50 FISCHER, A. A., O Texto do Antigo Testamento, p. 80. 51 BORGONOVO, G., La Tôrâ, ovvero il Pentateco, p. 90. 52 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 278-283. 53 FISCHER, A. A., O Texto do Antigo Testamento, p. 82. 54 PISANO, S., O Texto do Antigo Testamento, p. 49; confira igualmente o texto FISCHER, A. A., O Texto do Antigo Testamento, p. 80-82. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 260 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 5. Os “pentateucos” no cânon neotestamentário 5.1. O “pentateuco mateano” Como se percebe em suas narrativas, o Evangelho de Mateus provavelmente foi dirigido a uma comunidade de ambiente judaico. Como para Mateus, Cristo é o novo Moisés, é provável que ele tenha redigido seu Evangelho como um “novo pentateuco”.55 Entre as várias coincidências, assim como Moisés, Cristo também é salvo das mãos de um atroz imperial; ambos residem no Egito, passam pelas águas e pelo deserto, etc.56 Mateus inicia seu Evangelho com as mesmas palavras que se encontram no segundo relato da criação da versão grega da LXX:57 Gn 2,4a: “αὕτη ἡ βίβλος γενέσεως οὐρανοῦ καὶ γῆς Este é o livro da origem do céu e da terra”; Mt 1,1:.“Βίβλος γενέσεως Ἰησοῦ Χριστοῦ υἱοῦ Δαυὶδ υἱοῦ Ἀβραάμ Livro da origem de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão”. Segundo Mateus, a lei continua viva (Mt 5,18) e Cristo a leva à plenitude (Mt 5,17). As palavras de Cristo, a partir de seus ensinamentos, são entendidas e praticadas como a nova lei, daquele que segue e respeita a tradição dos pais, por isso mesmo ele está ligado aos Patriarcas e a Davi, como seu descendente. Aliás, as boas obras do judaísmo continuam a ter valor, a exemplo do jejum, da esmola e da oração (Mt 6,1-15). Mateus tem abundantes citações do Antigo Testamento e muitas delas são dos livros do Pentateuco, inclusive com citações explícitas, além das alusões e ecos. Seu Evangelho é estruturado sobre cinco discursos principais, sendo que cada um tem uma fórmula conclusiva semelhante: Mt 7,28; 11.1; 13,53, 19,1 e 26,1. Em seus discursos, Cristo “esboça um quadro de ações ideadas para os discípulos”.58 55 CARTER, W., O Evangelho de São Mateus, p. 16. 56 CARTER, W., O Evangelho de São Mateus, p. 29. 57 CARTER, W., O Evangelho de São Mateus, p. 16. 58 CARTER, W., O Evangelho de São Mateus, p. 31. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 261 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 A A’ I Discurso (Evangélico): Mt 5–7 B II Discurso (Apostólico; da Missão): Mt 10 X III Discurso (em Sete Parábolas): Mt 13,1-52 B’ IV Discurso (sobre a Igreja, a vida em comunidade): Mt 18 V Discurso (Escatológico, sobre o Reino em Jesus): Mt 24–25 5.2. O “pentateuco joanino” O corpus joanino é formado por cinco textos que foram atribuídos a um mesmo autor, João, o apóstolo e evangelista. Conta com dois textos protocanônicos (Evangelho e 1Joao) e três deuterocanônicos (2-3João e Apocalipse).59 Ele é um corpus que conta com gêneros diversos de literatura: o evangélico, o epistolar e o apocalíptico.60 Estes cinco livros não foram e nem estão dispostos segundo a autoria, como as cartas paulinas, mas sim segundo o gênero literário: entre os evangelhos, as cartas católicas – e o Apocalipse está sozinho, como o último livro no corpus do Novo Testamento.61 Para tanto, colaborou ainda o fato de que os cinco textos joaninos, embora atribuídos ao mesmo autor, sempre foram levantadas dúvidas acerca da autoria dos textos deuterocanônicos, sobretudo por causa de sua grande diferença de estilo e vocabulário, entre outros, como dados e teologia.62 Ainda, ao longo da literatura joanina é possível ver a presença de termos oriundos do Pentateuco, como as palavras iniciais de Gênesis e do Evangelho de João, tomada da versão grega da LXX e presente na própria introdução do livro, do Prólogo Joanino: “ἐν ἀρχῇ/no princípio” (Gn 1,1 e Jo 1,1).63 Gn 1,1: ἐν ἀρχῇ ἐποίησεν ὁ θεὸς τὸν οὐρανὸν καὶ τὴν γῆν no princípio fez Deus o céu e a terra. 59 GONZAGA. W., As Cartas Católicas no Cânon do Novo Testamento, p. 424 e 440. 60 GONZAGA, W., A acolhida e o lugar do Corpus Joanino no Cânon do Novo Testamento, p. 682-683. 61 GONZAGA, W., A acolhida e o lugar do Corpus Joanino no Cânon do Novo Testamento, p. 691. 62 GONZAGA, W., A acolhida e o lugar do Corpus Joanino no Cânon do Novo Testamento, p. 684. 63 SKA, J.-L., Introdução à leitura do Pentateuco, p. 16. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 262 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 Jo 1,1: ἐν ἀρχῇ ἦν ὁ λόγος, καὶ ὁ λόγος ἦν πρὸς τὸν θεόν, καὶ θεὸς ἦν ὁ λόγος no princípio era a palavra, e a palavra era junto de Deus, e a palavra era Deus. Porém, mesmo que os cinco textos joaninos, em seu arranjo no cânon bíblico, estejam espalhados pelos vários corpora do Novo Testamento, e não todos juntos, em um único bloco, é possível ver a presença de um “pentateuco joanino”: A A’ Evangelho de João B 2João X 1João B’ 3João Apocalipse de João 6. A presença de “pentateucos” em outros cânones 6.1. O “pentateuco enóquico” O Primeiro Livro de Henoc gozou de prestígio tanto no Judaísmo quanto no Cristianismo dos primeiros séculos da era cristã, como atestam os manuscritos encontrados em Qumran e a citação em Jd 9.14.15. Mas não logrou êxito em entrar nos cânones, sejam judaicos ou cristãos, fazendo parte unicamente do cânon cristão etíope. Justamente por isso, seu texto foi conservado na íntegra unicamente em manuscritos etíopes, pelo que é conhecido como “Henoc Etíope”.64 Este livro, na verdade, abarca uma série de escritos relacionados a temas enóquicos originalmente separados e redigidos entre os séculos II a.C. e II d.C. – um período de cerca de quatrocentos anos –, e que foram paulatinamente agregados até formar um único livro como o texto hoje conhecido na versão etíope. Manuscritos em aramaico e grego foram encontrados, mas não há consenso se o hebraico teria sido a língua original de compilação.65 64 ROST, L., Introdução aos livros apócrifos e pseudepígrafos do Antigo Testamento e aos manuscritos de Qumran, p. 137-139; 142-143. 65 FITZMYER, J. A., Implications of the New Enoch Literature from Qumran, p. 332-345. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 263 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 A origem desta literatura estaria relacionada a grupos com estreitos pontos de contato com Qumran, sem necessariamente pertencerem à comunidade ali localizada. São identificados cinco materiais, que formam um “pentateuco”: 1) capítulos 1-36 (incluindo o “Livro de Noé”); 2) 37-71 (“Similitudes”); 3) capítulos 72-82 (“Livro Astronômico”); 4) capítulos 83-90 (“Apocalipse dos Símbolos dos Animais”; 5) capítulos 91-104 (incluindo o “Apocalipse das Semanas’), com acréscimo dos capítulos 105-108.66 Da mesma forma que a Torá, é provável que este arranjo como um “pentateuco” não seja original, tendo evoluído para uma construção como um “pentateuco” em algum momento entre as primeiras cópias até a “fixação” do inteiro conjunto como livro único no cânon etíope.67 Entretanto, a disposição foi posta de tal forma a coincidir com aquela da Torá: dentro dos capítulos 136 encontra-se temas relacionados aos relatos de Gênesis; nos capítulos 72-82, o “Livro Astronômico” remete ao calendário das festas, especialmente designados no Levítico; e os discursos nos capítulos 94-105 lembram discursos de despedida, como o de Moisés no Deuteronômio. Portanto, o “pentateuco enóquico” segue bem de perto a disposição quiástica da Torá, com igual centralidade ao material correspondente a Levítico: A A’ Capítulos 1- 36 B Capítulos 37-71 X Capítulos 72-82 B’ Capítulos 83-90 Capítulos 91-108 6.2. O cânon siríaco e um “pentateuco a menos” No início do século V o Cristianismo enfrentou seu primeiro “grande” cisma. Nestório, patriarca de Constantinopla, influenciado por Teodoro de Mopsuéstia, posicionou-se contrário ao ensinamento de que Maria fosse mãe de Deus, e advogava ser esta apenas mãe do Cristo. Para sustentar sua tese, defendeu 66 ROST, L., Introdução aos livros apócrifos e pseudepígrafos do Antigo Testamento e aos manuscritos de Qumran, p. 140-142. 67 GREENFIELD, J. C; STONE, M. E., Enochic Pentateuch and the Date of the Similitudes, p. 51-65. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 264 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 existir em Cristo duas pessoas, o que provocou a convocação do Concílio Ecumênico de Éfeso, em 431. Embora suas ideias tenham sido condenadas, o Nestorianismo espalhou-se especialmente pelo Oriente. Assim, o segmento sírio oriental separou-se, embora posteriormente nem todos aderissem às ideias nestorianas. No Concílio Ecumênico seguinte, o de Calcedônia (451), a solução proposta de Cristo como única pessoa, mas duas naturezas, não agradou uma parcela que adotou o monofisismo, provocando um novo cisma – desta vez, dos coptas, sírios (ocidentais) e armênios, com cânones bíblicos próprios e diversos dos ocidentais.68 Ironicamente, acusaram as decisões de Calcedônia de “nestorianas”.69 As diferenças entre sírios “orientais” e “ocidentais” não se restringiram à doutrina, mas incluíram o cânon: com relação ao Novo Testamento, enquanto o segmento sírio ocidental tenha mantido na íntegra os 27 livros da prática ocidental, o segmento oriental usa até hoje um cânon menor de 22 livros.70 Pensa-se que este cânon “menor” seja o mais antigo, e o “ocidental” seja posterior, sendo este atestado nas versões Filoxena e Heracleana.71 Portanto, são 5 livros a menos, a saber 2Pedro, 2 e 3João, Judas e Apocalipse. Todos esses são deuterocanônicos neotestamentários,72 pelo que o segmento sírio oriental manteve apenas dois dos deuterocanônicos – Hebreus e Tiago. Isto exposto, verifica-se, portanto, a ausência de um “pentateuco” neste cânon sírio. Levando em consideração a ordem adotada no Ocidente, esses livros formam uma disposição concêntrica: A A’ 2 Pedro B 2 João X 3 João Judas B’ Apocalipse 68 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 303-306. 69 Para maiores detalhes, consultar PERRONE, L., De Éfeso (431) a Calcedônia (451), p. 72122. 70 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 299. 71 LUCIUS, F., Manual da Peshitta, p. 55. 72GONZAGA. W., As Cartas Católicas no Cânon do Novo Testamento, p. 424 e 440. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 265 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 As relações temáticas entre 2Pedro e Judas há muito são reconhecidas, o que leva inclusive a conjecturar a dependência redacional mútua.73 A relação entre 2João e Apocalipse pode ser encontrada na designação na primeira da “senhora eleita”, possível simbolismo para a Igreja, alvo das atenções no último para encorajá-la e confortá-la. A centralidade de 3João poderia ser explicada pelo desejo de prosperidade e saúde a Gaio, representativo de todos os cristãos fiéis.74 6.3. A presença de “pentateucos” no cânon protestante A Reforma Protestante apresentou um novo cisma na cristandade, o qual não acontecia desde o “grande cisma” com a Igreja Ortodoxa Oriental, cujos começos podem ser detectados nas controvérsias em torno da processão do Espírito Santo, na época carolíngia, “oficializado” em 1054 e tornado “irreversível” na Quarta Cruzada de 1204.75 A Reforma Protestante trouxe novas reflexões acerca da teologia, abrangendo questões como Eclesiologia e Soteriologia. E reviveu antigas polêmicas sobre o cânon, pelo qual “retornou” à compreensão judaica clássica de uma lista canônica veterotestamentária exclusivamente hebraica – a “veritas hebraica” advogada nos primórdios do Cristianismo por Jerônimo, por exemplo,76 enquanto que a Igreja Católica Romana seguia a Septuaginta Auctoritas, defendida e apoiada por Agostinho de Hipona, em sua disputa com Jerônimo, entre Hebraica veritas versus Septuaginta auctoritatem, no que diz respeito ao Cânon Bíblico do Antigo Testamento,77 na tensão entre os textos nas línguas originais. Para os textos do Novo Testamento ambos aceitaram a Graeca veritas,78 pois já começam a surgir textos em latim. Agostinho defendia que a Igreja “devia abraçar em seu cânon os livros que a tradição apostólica, e a tradição posterior, haviam recebido no que chamamos de 73 SPROUL, R. C., 1 e 2 Pedro, p. 268. 74 SMALLEY, S. S., 1, 2, 3 John, p. 344. 75 Para maiores detalhes, WARE, T., The Orthodox Church, p. 1-100. 76 TRUEMAN, C.; KIM, E., Os Reformadores e suas Reformas, l. 2615-3229. 77 CARBOJA, I., Hebraica veritas versus Septuaginta auctoritatem, p. 14-21. 78 CARBOJA, I., Hebraica veritas versus Septuaginta auctoritatem, p. 14. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 266 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 versão grega da LXX”,79 sendo esta a versão usada, de longe, como fonte para as citações nos textos do Novo Testamento e na Patrística.80 Num primeiro momento, os reformadores usaram os deuterocanônicos – os livros que constavam na Septuaginta e na Vulgata, mas não no cânon hebraico; mas, para sua lista canônica, preferiram deixá-los em separado, ao final. Depois, no decorrer dos anos, “abandonaram” de vez os livros deuterocanônicos;81 e assim, a partir da ordem canônica já estabelecida desde a Vulgata, houve uma reorganização que permitiu o surgimento de novos “pentateucos”. A esse respeito, a “Introdução aos livros deuterocanônicos” da nova Bíblia TEB esclarece que: Entretanto, a estes 39 livros algumas Igrejas acrescentam vários escritos que não figuram na Bíblia hebraica, mas que foram transmitidos em sua tradução grega, a Septuaginta. Estes livros se encontram em todas as traduções cristãs antigas da Bíblia. Estão presentes nas bíblias modernas (com algumas exceções) até o início de séc. XIX, embora seu número, sua nomeação e autoridade sejam diferentes de uma confissão a outra. A partir do séc. XIX, apenas as bíblias católicas e ortodoxas mantiveram no AT livros suplementares vindos da Septuaginta.82 Sem a presença dos livros deuterocanônicos poéticos da Sabedoria de Salomão e Eclesiástico, o cânon protestante ficou com um “pentateuco poético”: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cantares. Nessa lista encontrase uma interessante disposição concêntrica, tendo como centro o livro dos Provérbios, que indica a forma de se viver com sabedoria na vida cotidiana: A A’ Jó (por que o justo sofre?) B Salmos (louvores à união com Deus) X Provérbios (como proceder na vida diária) Eclesiastes (qual é o sentido da vida?) B’ Cantares (louvor à união conjugal) 79 CARBOJA, I., Hebraica veritas versus Septuaginta auctoritatem, p. 142. 80 CARBOJA, I., Hebraica veritas versus Septuaginta auctoritatem, p. 143-147. 81 Para maiores detalhes sobre esse desenvolvimento no cânon protestante, consultar GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 337-384; conferir igualmente a “Introdução aos livros deuterocanônicos” da nova BÍBLIA TEB, p. 1425-1437. 82 BÍBLIA TEB, Introdução aos livros deuterocanônicos, p. 1425. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 267 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 Nesta disposição Provérbios ocupa a centralidade como grande manual para a conduta diária piedosa. Os dois livros que envolvem grandes perguntas existenciais – Jó e Eclesiastes – formam um paralelo, bem como dois livros relacionados à ideia de união – Salmos e Cantares. Neste último caso, se, a princípio, um fala de união com o divino e outro com o sexo oposto, não se deve perder de vista como tanto a piedade judaica quanto a cristã elaboraram uma interpretação simbólica em Cantares de uma união do povo de Deus com o divino.83 Sem a presença do livro deuterocanônico profético de Baruc, a lista dos profetas maiores, no cânon protestante, também formou um “pentateuco”: Isaías, Jeremias, Lamentações de Jeremias, Ezequiel, Daniel. Desta feita, com Lamentações ocupando a centralidade, detecta-se uma disposição quiástica: A A’ Isaías B B’ Daniel Jeremias X Lamentações de Jeremias Ezequiel Aqui, a disposição quiástica materializa-se da seguinte forma: tanto Isaías quanto Daniel são reputados como grandes profetas messiânicos, os quais anunciaram, de antemão, fatos relacionados à vida de Cristo; Jeremias e Ezequiel são ambos profetas com origens relacionadas ao ambiente sacerdotal, e os dois possuem ligações com a ideia do cativeiro. Ao ocupar a centralidade, Lamentações deixa de ser exclusivamente uma queixa acerca do cativeiro judeu para simbolizar o sentimento de cativeiro de todos os cristãos.84 6.4. O arranjo do Pentateuco nos Padres da Igreja, Sínodos e Concílios Como é do conhecimento geral, o arranjo ou sequência dos livros no cânon bíblico do Antigo Testamento, que temos nas Bíblias hoje, é resultado de um longo 83 Para maiores detalhes, ver POPE, M. H., Song of Songs, p. 17-21. 84 Uma pergunta pode ser feita: haveria intencionalidade nessa disposição de Lamentações, ao pensar nas grandes perseguições empreendidas contra o movimento protestante, e incluir ainda a história das grandes perseguições da era pré-constantiniana? ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 268 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 processo de caminhada na vida do povo judeu, dentro (TANAK) e fora da Palestina (LXX), passando pela Monarquia, pelo Exílio Babilônico, pelo período dos Impérios Grego e Persa, entrando no período do Império Romano, indo até à discutida Assembleia de Jamnia,85 que teria acontecido entre o final do séc. I d.C. e o início do séc. II d.C., provavelmente entre os anos 90-110 d.C., quando fora fechado o cânon bíblico em seu arranjo, na forma tríplice da TANAK,86 termo artificial, um acróstico formado a partir das iniciais dos três conjuntos da Bíblia Hebraica (Torá, Profetas e Escritos),87 declarando os inspirados e canônicos e os que ficaram de fora.88 A tradução do texto hebraico para o grego deu-se no período do Império Grego, entre os anos 250-150 a.C., e tem o nome de Septuaginta89 (LXX, 4 blocos: Pentateuco, Históricos, Poéticos e Proféticos), quando também tivemos a escrita de outros livros em língua grega, chamados de deuterocanônicos do Antigo Testamento e ou de apócrifos, a depender de qual tradição eclesial. A tradução para o latim, versão chamada Vulgata,90 tanto do Antigo Testamento como do Novo Testamento, deu-se no final do séc. IV, por Jerônimo. No que tange ao arranjo geral dos corpora do Antigo Testamento, o que se percebe é que realmente o conjunto dos livros do Pentateuco é o mais comum e igual em todos os padres da Igreja, Sínodos e Concílios. A mesma coisa se dá na divisão interna dos livros do corpus do Pentateuco, como se vê a seguir, segundo Gonzaga.91 1) Arranjo Geral dos Corpora do AT - Septuaginta, Melitão de Sardes, Orígenes, Vulgata, Códice Vaticano, Cirilo de Jerusalém, Cânon de Cheltenham/Mommsen, Concílio de Laodicea, Cânon Apostólico, Célio Sedúlio – Anonymus, Jerusalemitano, Gregório de Nazianzo, Anfilóquio de Icônio, Hilário de Poitiers, Códice Claromontano, Atanásio, Agostinho, Concílio Plenário de Hipona, III Concílio de Cartago, IV Concílio de Cartago, Epifânio, Anônimo in notis, Sessenta Livros, Isidoro, João 85 BROWN, R. E.; COLLINS, E. F., Canonicidade, p. 919. 86 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 276-278; BROWN, R. E.; COLLINS, E. F., Canonicidade, p. 915-917; GALVAGNO, G.; GIUNTOLI, F., Pentateuco, p. 17-18. 87 BORGONOVO, G., La Tôrâ, ovvero il Pentateco, p. 83. 88 ZENGER, E., A Sagrada Escritura de Judeus e Cristãos, p. 28-34. 89 PISANO, S., O Texto do Antigo Testamento, p. 53-63; GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 280-283. 90 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 300-303. 91 GONZAGA, W., Compêndio do Cânon Bíblico, p. 394-396. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 269 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 Damasceno, João Crisóstomo, Synopsis Scripturae Sacrae, 4 blocos: Pentateuco, Históricos, Sapienciais (Poéticos) e Proféticos. - Samaritanos: aceitaram apenas o Pentateuco e recusaram todo o resto do AT. - Marcião: recusou todo o AT. - Fragmento Muratoriano: traz o catálogo a partir de Lucas, tendo perdido o restante. - Massorético, Jerônimo [herbraica veritas], João de Salisbury, 3 blocos: Pentateuco, Proféticos e Escritos. - Liber Sacramentorum, Códice Sinaítico, Esticometria Armeniana, Rufino, Leôncio de Bizâncio, Hugo de São Vitor, Junílio, 4 blocos: Pentateuco, Históricos, Proféticos e Sapienciais. - Ebed Jesu, Concílio de Antioquia, Concílio Romano e Decreto Gelasiano, 4 blocos: Pentateuco, Históricos, Sapienciais, Proféticos e o restante dos Históricos. - Códice Alexandrino, 4 blocos: Pentateuco, Históricos, Proféticos, e o restante dos Históricos, Sapienciais. - Inocente I, 4 blocos: Pentateuco, Históricos, Proféticos, Sapienciais e o restante dos Históricos. - Filastro: traz um comentário geral dos corpora do AT, sem especificar os livros. - Cassiodoro: não tem uma lista própria. Ele traz uma recensão das litas de Jerônimo, Agostinho e da Septuaginta [com o NT]. - Eusébio de Cesareia: o texto que temos dele traz apenas a lista do NT, dividindo os livros entre recebidos, contestados, espúrios e hereges. 2) Arranjo do Corpus Pentateucum - Pentateuco Samaritano, Massorético, Septuaginta, Vulgata, Peshita Syriaca, Armena, Copta, Etiópica, Georgiana, Códice Vaticano, Códice Alexandrino, Códice Sinaítico, Esticometria Armeniana, Fragmento Muratoriano, Orígenes, Concílio de Antioquia, Cirilo de Jerusalém, Hilário de Poitiers, Cânon de Cheltenham/Mommsen, Concílio de Laodicea, Atanásio, Cânon Apostólico, Anfilóquio de Icônio, Concílio Romano e Decreto Gelasiano, Gregório de Nazianzo, Epifânio, Filastro, Códice Claromontano, Jerônimo, Concílio Plenário de Hipona, Agostinho, III Concílio de Cartago (Norte da África), IV Concílio de Cartago (Norte da África), Rufino, João Crisóstomo, Inocente I, Célio Sedúlio - Anonymus, Synopsis Scripturae Sacrae, Junílio, Leôncio, Isidoro, Liber Sacramentorum, Sessenta Livros, Anônimo in notis, João Damasceno, Jerusalemitano, Hugo de São Vitor, João de Salisbury, Ebed Jesu, Irineu, Clemente de Alexandria, Tertuliano, Cipriano, Dídimo (o Cego): Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. - Melitão de Sardes, Leôncio de Bizâncio: Gênesis, Êxodo, Números, Levítico, Deuteronômio, Josué, ... - Jerusalemitano: Gênesis, Êxodo, Levítico, Josué, Deuteronômio, Números, ... ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 270 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 - Cassiodoro: não tem uma lista própria. Ele traz uma recensão das litas de Jerônimo, Agostinho e da Septuaginta [com o NT]. - Eusébio de Cesareia: o texto que temos dele traz apenas a lista do NT, dividindo os livros entre recebidos, contestados, espúrios e hereges. Conclusão Se o Pentateuco constitui a base da fé e da religião judaica, sua singularidade, conforme pode se constatar por esse artigo, não se restringe à teologia, nem tampouco às inúmeras citações, alusões e ecos encontrados no Novo Testamento: o Pentateuco exerceu uma forte influência na própria história da formação dos diversos cânones. Mais do que influência, o papel do Pentateuco seria decisivo. Se o Judaísmo apresentou diversas vertentes, com diferentes teologias, o Pentateuco tornou-se um fator aglutinador, um ponto de união. Os samaritanos, até hoje existentes, o aceitam como “cânon mínimo”. O cânon palestinense não se restringiu ao Pentateuco: os diversos arranjos da “ordem canônica”, seja no texto massorético, seja nos diversos códices medievais (como o códice Leningradense B19A), sempre se basearam no Pentateuco, seja explicitamente (como é o caso dos Salmos), seja implicitamente (História Deuteronomista, Megillot). Isto fica ainda mais evidente com a Septuaginta, com seu “cânon alexandrino”. Ainda que inclua outros livros não aceitos na Bíblia Hebraica, que tornou-se normativa entre os judeus, justamente com estes livros procurou reorganizar a ordem dos livros, de tal forma a obter outros “pentateucos”, como no “Pentateuco Sapíencial”. Talvez o Pentateuco pudesse ser encarado como um elemento a mais para explicar a razão das diferenças entre o cânon palestinense e o cânon alexandrino: mesmo o livro de Henoc, o qual participa tão somente do cânon cristão etíope, reuniu todo o material das tradições relativas a Henoc em forma quíntupla, o “Pentateuco enóquico”. Com o Cristianismo, a influência do Pentateuco na elaboração do cânon aprofundou-se: o conjunto dos Evangelhos-Atos, o “pentateuco joanino”, e o próprio Evangelho segundo Mateus organizado como se fosse um “novo pentateuco” – o que talvez explique a escolha de sua proeminência, encabeçando a lista dos evangelhos. Tão importante é o Pentateuco para a formação do cânon cristão, que talvez tenha determinado a escolha por um “pentateuco a menos” no cânon siríaco, e ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 271 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 novos arranjos do “cânon protestante”. Pode-se argumentar que estes “pentateucos” sejam “fortuitos”, não intencionais. Não obstante, provavelmente indicariam que de tal forma o Pentateuco estaria enraizado no pensamento cristão, que pode se ver indubitavelmente a constituição de “pentateucos” alternativos. Mas a detecção desses diferentes “pentateucos” não constitui uma mera “homenagem numérica”: pode-se sempre encontrar uma disposição concêntrica, com um elemento central. E esse elemento central representaria o pensamento mais caro para as diferentes comunidades, sejam judaicas ou cristãs. Ou seja, a ordem canônica não representa uma disposição aleatória, mas antes uma afirmação dos pontos doutrinários mais importantes conforme compreendidos. No cânon protestante, a centralidade do livro das Lamentações poderia ser mais do que uma “coincidência”: representaria o sentimento de todos aqueles que compartilhavam uma fé perseguida, e que muitas vezes levava à ruína e deportação – numa identificação como a sorte do povo judeu. Mas, infelizmente, não há dados seguros para tal assertiva. Os limites da identificação ampliam-se, como quando K. R. Sassi identifica, levando em consideração o ciclo litúrgico sinagogal, a presença de um “pentateuco feminino” – com as menções explícitas de Ester e Rute, implícita no Cântico dos Cânticos, e “simbólicas” em Eclesiastes e Lamentações. Ou seja: um “pentateuco feminino” enfatizaria o quanto a literatura bíblica valorizaria o papel da mulher, tão proeminente na liturgia judaica, e presente igualmente no relato evangélico. Tudo isso posto, conclui-se finalmente que há ainda um grande campo a ser explorado acerca dos “pentateucos” da Bíblia, e como poderiam ser incluídos na história da formação do cânon. Referências bibliográficas ALEXANDER, T. D. Pentateuco, Autoría del. In: ALEXANDER, T. D.; BAKER, D. W. (Eds.). Diccionario del Antiguo Testamento. Pentateuco. Barcelona: CLIE, 2012. p. 622-632. APPLESON, R. R. Is There a Pattern to The Five Books of Moses? Jewish Bible Quarterly, v. 36, n.1, p. 39-48, 2008. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 272 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 ARNOLD, B. T. Pentateuco, Historia de la crítica del. In: ALEXANDER, T. D.; BAKER, D. W. (Eds.). Diccionario del Antiguo Testamento. Pentateuco. Barcelona: CLIE, 2012. p. 642-656. ASHERI, M. O Judaísmo Vivo. As Tradições e as Leis dos Judeus Praticantes. Rio de Janeiro: Imago, 1987. BAILLY, A. Dictionnaire Grec Français. Le Grand Bailly. Paris: Hachette, 2000. BÍBLIA TEB. Introdução aos livros deuterocanônicos. In.: BÍBLIA TEB. São Paulo: Loyola, 2020. p. 1425-1437. BLENKINSOPP, J. El Pentateuco. Estella: Verbo Divino, 1999. BORGONOVO, G. La Tôrâ, ovvero il Pentateco. In: BORGONOVO, G. e collaboratori. Torah e Storiografie dell’Antico Testamento. Torino: ELLEDICI, 2012. p. 79-99. BROWN, R. E.; COLLINS, E. F. Canonicidade. In: BROWN, R. E.; FITZMYER, J. A.; MURPHY, R. E. (Eds.). Novo Comentário Bíblico São Jerônimo: Novo Testamento e Artigos Sistemáticos. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2011. p. 907-946. CARBOJA, I. Hebraica veritas versus Septuaginta auctoritatem. Existe um texto canónico del Antiguo Testamento. Navarra: Verbo Divino, 2021. CARTER, W. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. Grande Comentário Bíblico. São Paulo: Paulus, 2002. ELLIGER, K.; RUDOLPH, W. (Eds.). Biblia Hebraica Stuttgartensia. 5.ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. FISCHER, A. A. O Texto do Antigo Testamento. Edição reformulada da Introdução à Bíblia Hebraica de Ernst Würthwein. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2013. FITZMYER, J. A. Implications of the New Enoch Literature from Qumran. Theological Studies, v. 38, n. 2, p. 332-345, 1977. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 273 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 FRANCISCO, E. F. Manual da Bíblia Hebraica. Introdução ao texto massorético. 3.ed. revisada e ampliada. São Paulo: Vida Nova, 2008. FUTATO, M. D. Interpretação dos Salmos. São Paulo: Cultura Cristã, 2011. GALVAGNO, G.; GIUNTOLI, F. Pentateuco. Petrópolis: Vozes, 2014. GARCIA LÓPEZ, F. O Pentateuco. São Paulo: Ave Maria, 2006. GONZAGA, W. Compêndio do Cânon Bíblico. Listas dos Catálogos Bíblicos: Antigo Testamento, Novo Testamento e Apócrifos. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: Editora PUC Rio, 2019. GONZAGA. W. As Cartas Católicas no Cânon do Novo Testamento. Perspectiva Teológica, v. 49, n. 2, p. 421-444, mai./ago. 2017. GONZAGA, W. A acolhida e o lugar do Corpus Joanino no Cânon do Novo Testamento. Perspectiva Teológica, v. 52, n. 3, p. 681-704, set./dez. 2020. GONZAGA, W. O Salmo 150 à luz da Análise Retórica Bíblica Semítica. ReBiblica, v. 1, n. 2, p. 155-170, jan./jun. 2019. DOI: https://doi.org/10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2021v2n3p9 GREENFIELD, J. C; STONE, M. l E. Enochic Pentateuch and the Date of the Similitudes. Harvard Theological Review, v. 70, n. 1-2, p. 51-65, 1977. HESS, R. S. Pentateuco, Idioma del. In: ALEXANDER, T. D.; BAKER, D. W. (Eds.). Diccionario del Antiguo Testamento. Pentateuco. Barcelona: CLIE, 2012. p. 651-656. HIRSCH, E. M. Pentateuch: The five books of Moses. In: SINGER, I. (Org.). The Jewish Encyclopedia. New York; London: Funk & Wagnalls, 1901–1906. p. 589-592. v. 9. JASTROW, M. A Dictionary of the Targumim, the Talmud Babli and Yerushalmi, and the Midrashic Literature: Volume I and II. London; New York: Luzac & Co.; G. P. Putnam’s Sons, 1903. JERÔNIMO, S. Apologia contra os livros de Rufino. São Paulo: Paulus, 2014. (Coleção Patrística, 31). ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 274 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 LIM, T. H. The Formation of the Jewish Canon. New Haven; London: Yale University Press, 2013. LUCIUS, F. Manual da Peshitta. Rio de Janeiro: BV Books, 2019. MACKENZIE, J. L. Aspectos do Pensamento do Antigo Testamento. In: BROWN, R. E.; FITZMYER, J. A.; MURPHY, R. E.; ROLAND, E. M. (Eds.). Novo Comentário Bíblico São Jerônimo: Antigo Testamento. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2007. p. 1387-1448. MAZZINGHI, L. Il Pentateuco sapienziale. Proverbi, Giobbe, Qohelet, Siracide, Sapienza. Caratteristiche letterarie e temi teologici. Bologna: EDB, 2019. MURPHY, R. E. Introdução ao Pentateuco. In: BROWN, R. E.; FITZMYER, J. A.; MURPHY, R. E.; ROLAND, E. M. (Eds.). Novo Comentário Bíblico São Jerônimo: Antigo Testamento. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2007. p. 49-57. NESTLE-ALAND (eds.), Novum Testamentum Graece. Ed. XXVIII. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 2012. NEUSNER, J. The Babylonian Talmud: A Translation and Commentary. Peabody, MA: Hendrickson Publishers, 2011. Logos edition. NEUSNER, J. The Jerusalem Talmud: A Translation and Commentary. Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 2008. Logos edition. OSWALT, J. N. Pentateuco, Teología del. In: ALEXANDER, T. D.; BAKER, D. W. (Eds.). Diccionario del Antiguo Testamento. Pentateuco. Barcelona: CLIE, 2012. p. 657-668. PERRONE, L. De Éfeso (431) a Calcedônia (451): a questão cristológica e a ruptura da ecumene. In: ALBERIGO, G. (Org.). História dos Concílios Ecumênicos. São Paulo: Paulus, 1995. p. 72-122. PISANO, S. O Texto do Antigo Testamento. In: SIMIAN-YOFRE, H. (Coord.). Metodologia do Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 2000. p. 39-71. ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 275 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 POPE, M. H. Song of Songs: A New Translation with Introduction and Commentary. New Haven; London: Yale University Press, 2008. PURY, A.; RÖMER, T. O Pentateuco em Questão: Posição dos problemas e breve história da pesquisa. In: PURY, A. (Org.). O Pentateuco em questão. Petrópolis: Vozes, 2002. RAHLFS, A.; HANHART, R. (Eds.). Septuaginta. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft. 2006. RÖMER, T.; NIHAN, C. O debate atual sobre a formação do Pentateuco. In: RÖMER, T.; MACCHI, J.-D.; NIHAN, C. (Orgs.). Antigo testamento: história, escritura e teologia. São Paulo: Loyola, 2010. p. 85-143. ROST, L. Introdução aos livros apócrifos e pseudepígrafos do Antigo Testamento e aos manuscritos de Qumran. 3.ed. São Paulo: Paulus, 2004. TERTULLIAN. The Five Books Against Marcion. In: ROBERTS, A.; DONALDSON, J.; COXE, A. C. (Orgs.). Latin Christianity: Its Founder, Tertullian. Buffalo, NY: Christian Literature Company, 1885. v.3. SANDERS, J. A. Canon: Hebrew Bible. In: FREEDMAN, D. N. (Org.). The Anchor Yale Bible Dictionary. New York: Doubleday, 1992. p. 837-852. v.1. SASSI, K. R. O Pentateuco feminino na liturgia judaica e cristã. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DA FACULDADES EST, v. 1, 2012, São Leopoldo. Anais... São Leopoldo: Faculdade EST, 2012. p. 1029-1041. SMALLEY, S. S. 1, 2, 3 John. Dallas: Word Incorporated, 1989. STEINER, V. J. Pentateuco, Estrutura leteraria del. In: ALEXANDER, T. D.; BAKER, D. W. (Eds.). Diccionario del Antiguo Testamento. Pentateuco. Barcelona: CLIE, 2012. p. 632-642. SKA, J.-L. Introdução à leitura do Pentateuco. Chave para a interpretação dos cinco primeiros livros da Bíblia. São Paulo: Loyola, 2000. SPROUL, R. C. 1 e 2 Pedro. São Paulo: Cultura Cristã, 2016. TRUEMAN, C.; KIM, E. Os Reformadores e suas Reformas. In: BARRETT, M. (Org.). Teologia da Reforma. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017. l. 2615-3229. (Edição Kindle) ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 276 ISSN 2596-2922 DOI: 10.46859/PUCRio.Acad.ReBiblica.2596-2922.2022v3n6p247 WARE, T. The Orthodox Church: An Introduction to Eastern Christianity. 3rd Edition Revised. Westminster: Penguin Books, 2015. WEBER, R.; GRYSON, R. (Eds.). Biblia Sacra Vulgata. Iuxta Vulgatam Versionem. Editio Quinta. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 2007. WILLIANS, P. J. Critica Textual. In: ALEXANDER, T. D.; BAKER, D. W. (Eds.). Diccionario del Antiguo Testamento. Pentateuco. Barcelona: CLIE, 2012. p. 196-202. ZENGER, E. A Sagrada Escritura de Judeus e Cristãos. In: ZENGER, E. et al. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 1995. p. 15-43. ZENGER, E. Os livros da Torá/do Pentateuco. In: ZENGER, E. et al. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 1995. p. 44-157. Waldecir Gonzaga Doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Roma, Itália) Diretor do Departamento de Teologia da Pontifícia Universidade Católica Rio de Janeiro Rio de Janeiro/RJ – Brasil. E-mail: [email protected] Doaldo Belem Doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Rio de Janeiro/RJ, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 25/01/2022 Aprovado em: 02/04/2022 ReBiblica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 6, p. 247-277, jul./dez. 2022 277