Sinésio
Sinésio | |
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Nascimento | 370 Cirene |
Morte | 413 (42–43 anos) Cirene |
Cidadania | Império Bizantino |
Ocupação | filósofo, escritor, sacerdote |
Sinésio (em grego medieval: Συνέσιος; romaniz.: Synésios; em latim: Synesius; 373 — 414), foi um bispo grego de Ptolemaida[1] na Pentápole líbia; nasceu em uma família rica, que se dizia descendente de um dos companheiros de Héracles.[2][3]
Vida
[editar | editar código-fonte]Educado inicialmente na eloquência, bebeu da tradição clássica através de Aristóteles, Homero e Platão, sentindo-se herdeiro de Dião Crisóstomo. Iniciado em ciências, sendo Cirene a terra de Teodoro e Eratóstenes, foi um apaixonado por caça, armas e exércitos equestres, entretenimentos próprios da aristocracia romana tardia.[carece de fontes]
Antes de 395, Sinésio residiu durante três ou quatro anos em Alexandria. Ali conheceu Hipátia, filósofa neoplatônica, filha do matemático Teão de Alexandria, convertendo-se em seu aluno e discípulo [a] Formou-se em astronomia, matemática, neoplatonismo, abarcando o amplo espectro que separa os extremos da ciências aplicadas e a metafísica.[carece de fontes]
Concluídos seus estudos, Sinésio viajou para Atenas, porém tanto a própria cidade como sua ativa escola neoplatônica o decepcionaram profundamente.[b] De regresso a Cirene, no ano 399 seus concidadãos o encarregaram de chefiar uma comitiva para solicitar ao imperador que reduzisse os impostos exigidos a Pentápole. Para cumprir sua tarefa, Sinésio mudou-se para Constantinopla, onde permaneceu por três anos. Em seu discurso Acerca da realeza (latim: De regno), pronunciado diante o imperador Arcádio, criticou o abuso de poder e a corrupção, assim como o fato de as defesas das fronteiras terem sido confiadas a germânicos, que Sinésio considerava bárbaros.[4]
Sua estadia de três anos em Constantinopla, foi cansativa e desagradável; seu lazer foi devotado, em parte, à composição literária. O Aegyptus sive de providentia é uma alegoria em que o bom Osíris e o mau Tifão, que representam Aureliano e o godo Gainas (magister sob Arcádio), lutam pelo domínio; a questão da permissão divina do mal é tratada.[carece de fontes]
No ano 402, voltou com êxito: havia conseguido uma redução significativa nos impostos. Mudou-se para Alexandria, onde se casou com uma cristã, pertencente a nobreza da cidade.[5] O patriarca Teófilo de Alexandria casou pessoalmente o casal.[6]
De volta a Cirene, empenhou-se pessoalmente na defesa das fronteiras, construindo um novo modelo de catapulta e reforçando as fortificações. No final de 409, ou em 410, em agradecimento por seus serviços prestados, o clero e o povo de Ptolemais o elegeram como seu bispo. Sinésio resistiu em aceitar o cargo, porém acabou assumindo-o em 411 com muita relutância[7], mas não antes de explicar ao patriarca Teófilo suas condições: não renunciaria ao seu matrimonio nem a suas convicções filosóficas, que o impediam de aceitar algumas crenças populares.[c] A juízo de Quasten, até o final de seus dias, Sinésio seguiu sendo "mais platónico que cristão, como revela em seus escritos".[6] Contudo, a partir de sua nomeação como bispo não voltou a fazer referencia a sua mulher em suas cartas, como alguns investigadores suspeitam que o patriarca o obrigou a renunciar a sua vida conjugal.[8]
Já bispo, Sinésio utilizou sua autoridade para defender seus compatriotas dos ataques das tribos do deserto e dos abusos de Andrônico, um alto funcionário do governo que por vários anos vinha cometendo graves abusos contra a população. Sinésio pronunciou contra ele a primeira excomunhão solene de que se tem notícia.[d]
Apesar da prudência e bom critério que demonstrou como bispo, os últimos anos de Sinésio foram muito amargos. Seu irmão se viu forçado a fugir para evitar ser nomeado decurião, cargo que supunha a ruína econômica do interessado, obrigado a responder como garantidor da arrecadação de impostos. No ano 413, após perder três filhos, escreveu a sua mestra Hipátia, que havia sofrido "tantos infortúnios como é capaz de sofrer um homem" e repreendeu que nem ela nem seus amigos de Alexandria tivessem respondido suas cartas.[9] Nesse mesmo ano, faleceu, consumido pelas recordações de seus filhos mortos.[10]
Segundo uma lenda, seria santo[11], mas os estudiosos não admitem sequer atribuir-lhe o título de Pai da Igreja.[12]
As obras de Sinésio, “bispo filósofo”, testemunham seu esforço para conciliar os dogmas cristãos e a filosofia neoplatônica. Observam-se também, em seus tratados, ideias gnósticas e herméticas. Sinésio enfatiza o caráter transcendente de Deus e sua unidade absoluta, que não resulta em incompatibilidade com a Trindade, por ser esta “interna à unidade”. Dentro da unidade divina, o Pai engendra o Espírito Santo e ambos engendram o Filho. Somente através do mito pode o homem divisar a Deus e compreender a natureza da alma, que se encontra presa na matéria (oposta a Deus) e anseia retornar à patria celeste, de onde procede.[13]
Obras
[editar | editar código-fonte]Suas obras que chegaram aos nossos dias são:
- Um discurso perante o imperador Arcádio: De regno;
- Dio, sive de suo ipsius instituto, em que ele significa o seu propósito de dedicar-se à verdadeira filosofia;
- Elogio à Calvície (Encomium calvitii), uma literatura jeu d'esprit, em resposta a uma obra de Dião Crisóstomo, o Elogio à Cabeleira
- Aegyptus sive de providentia, em duas partes, sobre a guerra contra o godo Gainas e o conflito entre os dois irmãos Aureliano e Cesário;
- De insomniis, um tratado sobre os sonhos;
- Constitutio;
- Catastasis, uma descrição do fim da Cirenaica romana;
- 159 Epistolae (cartas, incluindo um texto – Carta 57 – que é na verdade um discurso);
- 10 Hymni, de caráter contemplativo, característica neoplatônica;
- 2 homilies;
- Um ensaio sobre como fazer um astrolábio;
Trabalhos perdidos:
- Um livro sobre canicultura;
- Poemas, mencionados nas cartas de Sinésio.
Edições modernas de suas obras
[editar | editar código-fonte]- Editio princeps, Turnebus (Paris, 1553);
- Garzya, Terzaghi, e Lacombrade (eds.), Opere di Sinesio di Cirene, Classici greci, Turin: Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1989 (com tradução em italiano);
- Lacombrade, Garzya, and Lamoureux (eds.), Synésios de Cyrène, Coleção Budé, 6 vols., 1978-2008 (com tradução em francês por Lacombrade, Roques, e Aujoulat).
Notas
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- [a] ^ As cartas de Sinésio são uma das poucas fontes disponíveis para acesso à figura de Hipátia, a quem Sinésio se dirige com afeto como sua «mãe, irmã e mestra, minha benfeitora em tudo, e tudo o que para mim é valioso em palavras e ações» [14]
- [b] ^ Segundo a interpretação de Von Campenhausen [15], Sinésio defendeu a preexistência da alma, a eternidade do universo e uma interpretação alegórica da ressurreição. Escreveu em sua carta 105, dirigida a seu irmão: «asseguro que eu nunca discutirei a crença de que a origem da alma é posterior a do corpo. Não admitirei que o cosmos e a suas partes estão destinados a uma destruição conjunta. A tão alardeada ressurreição considero algo sagrado e inefável e bem distante estou de coincidir com as opiniões das massas. (...) Se isto me consentem as leis do ministério sagrado que vou desempenhar, poderia exercê-lo da seguinte maneira: em privado, dedicar-me-ia à filosofia, porém, em público, contaria fábulas (μῦθοι) em meus ensinamentos (δυναίμην ἂν ἱερᾶσθαι τὰ μὲν οἴκοι φιλοσοφῶν τὰ δ’ ἔξω φιλομυθῶν)» [16].
- [c] ^ A Atenas de hoje não tem de venerável nada mais que os nomes famosos de seus lugares. E como uma vítima sacrificada da qual só a pele nos diz que uma vez foi uma criatura viva, também a filosofia que saiu desta cidade não deixou nada para seus admiradores além da visão da Academia e do Liceu, e em verdade também a pintada stoa, da qual recebeu seu nome a filosofia de Crisipo (...) Em nossos dias, os egípcios se enriquecem com a colheita que os fez colher Hipátia; a cidade de Atenas, outrora sede da sabedoria, é famosa hoje em dia somente por seu mel. O mesmo serve para a parelha de sábios Plutarcos, que não reúnem a juventude em suas aulas por sua sabedoria, mas pelo mel do Himneto [17].
Referências
- ↑ Cfr. M. Barbanti. Sinesio di Cirene, in Enciclopedia filosofica, vol.11. Milano, Bompiani, 2006, pag. 10671 e segg. anche Henry Chadwick Sinesio di Cirene in Dizionario di Antichità classiche, Milano, Paoline, 1995, pag.1949.
- ↑ Hans von Campenhausen (1974). Los padres de la Iglesia. T. 1: padres griegos. [S.l.]: Ediciones Cristiandad. ISBN 978-84-7057-155-8 pág. 158.
- ↑ Nell Epistola 113 Sinésio reivindica orgulhosamente sua descendência mística
- ↑ (Campenhausen 1974: 162).
- ↑ (Campenhausen 1974: 160).
- ↑ a b Johannes Quasten (1962). Patrología II. La edad de oro de la literatura patrística griega. [S.l.]: BAC. ISBN 978-84-7057-155-8
- ↑ Cfr. Epistola 105
- ↑ (Campenhausen 1974: 169).
- ↑ Cartas, carta 10, p. 46.
- ↑ Carta 16.
- ↑ H. I. Marrou, Synesius of Cyrene and the Alexandrian Neoplatonism, in «The conflict between Paganism and Christianity in the fourth century», Oxford, Clarendon 1963, pp. 126-150
- ↑ H. v. Campenhausen, Griechischen Kirchenväter, Stuttgart, Kohlhammer 1967, p. 125
- ↑ Ferrater Mora, Diccionario de filosofía, s.v. Sinesio.
- ↑ (Carta 16).
- ↑ Von Campenhausen, 1974: 168
- ↑ Cartas, tr. Francisco Antonio García Romero, Madrid: Gredos, pp. 208-9)
- ↑ carta 136, a seu irmão
- ↑ (Campenhausen 1974: 170)
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- T.D. Barnes, "Synesius in Constantinople," Greek, Roman, and Byzantine Studies 27 (1986): 93-112.
- A.J. Bregman, Synesius of Cyrene, Philosopher-Bishop (Berkeley, 1982).
- A. Cameron and J. Long, Barbarians and Politics at the Court of Arcadius (Berkeley, 1993).
- Chr. Lacombrade, Synesios de Cyrène. Hellène et Chrétien (1951)
- J. H. W. G. Liebeschuetz, Barbarians and Bishops: Army, Church and State in the Age of Arcadius and Chrysostom (Oxford 1990).
- ib., 'Why Did Synesius Become Bishop of Ptolemais?', Byzantion 56 (1986): 180-195.
- D. Roques, Etudes sur la correspondance de Synesios de Cyrene (Brussels, 1989).
- T. Schmitt, Die Bekehrung des Synesios von Kyrene (2001)
- Este artigo incorpora texto (em inglês) da Encyclopædia Britannica (11.ª edição), publicação em domínio público.
- Synesius is portrayed in Ki Longfellow's Flow Down Like Silver, Hypatia of Alexandria[1] in a highly imaginative way.
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- «Synesius of Cyrene». www.livius.org at livius.org (Introdução de Jona Lendering e traduções de todas as epístolas, discursos, hinos, homilias e os tratados);
- «D. Roques, Études sur la correspondance de Synésios de Cyrène reviewed by John Vanderspoel, University of Calgary, in Bryn Mawr Classical Review 02.01.16». ccat.sas.upenn.edu
- «Cameron and Long reviewed by R.W. Burgess in BMCR». bmcr.brynmawr.edu
- «Catholic Encyclopedia». www.newadvent.org