Processo de Inventario

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organização

CONSELHO REGIONAL DE LISBOA CONSELHO REGIONAL DOS AÇORES CONSELHO REGIONAL DE COIMBRA

CONSELHO REGIONAL DE ÉVORA CONSELHO REGIONAL DE FARO

Q&A
processo de
INVENTÁRIO
oradoras
Carla Câmara
Juiza Desembargadora no
Tribunal da Relação de Lisboa

Helena Ferreira
Advogada e Formadora

Rita Lobo Xavier


Professora Catedrática na
Faculdade de Direito do Porto
da Universidade Católica Portuguesa

[email protected] conselho-regional-de-lisboa-da-ordem-dos-advogados facebook.com/cdloa crlisboa.org . www.oa.pt/crl


organização
CONSELHO REGIONAL DE LISBOA CONSELHO REGIONAL DOS AÇORES CONSELHO REGIONAL DE COIMBRA

CONSELHO REGIONAL DE ÉVORA CONSELHO REGIONAL DE FARO

CONFERÊNCIA
GRATUITA
oradoras destinatários
Carla Câmara Advogados
Juiza Desembargadora no Tribunal da Relação
de Lisboa Advogados Estagiários
(a nível nacional)
Helena Ferreira
Advogada e Formadora

Rita Lobo Xavier inscrições


Professora Catedrática na Faculdade de
Direito do Porto da Universidade Católica crlisboa.org
Portuguesa

workshop on-line

processo de
INVENTÁRIO
29.OUT | 15h00
[email protected] conselho-regional-de-lisboa-da-ordem-dos-advogados facebook.com/cdloa crlisboa.org . www.oa.pt/crl
workshop on-line
PROCESSO DE
INVENTÁRIO

Veja no Youtube
https://www.youtube.com/watch?v=Pagfy7ioH7M
3
Q&A | Processo de Inventário

diplomas*
DECRETO-LEI N.º 47344
Diário do Governo n.º 274/1966, Série I de 1966-11-25

Código Civil
https://dre.pt/legislacao-consolidada/-/lc/34509075/view

LEI N.º 23/2013 (Revogada)


Diário da República n.º 45/2013, Série I de 2013-03-05

Aprova o regime jurídico do processo de inventário, altera o Código Civil, o


Código do Registo Predial, o Código do Registo Civil e o Código de Processo
Civil
https://dre.pt/web/guest/legislacao-consolidada/-/lc/55032410/view?p_p_
state=maximized

LEI N.º 41/2013


Diário da República n.º 121/2013, Série I de 2013-06-26

Código de Processo Civil


https://dre.pt/legislacao-consolidada/-/lc/34580575/view

PORTARIA N.º 278/2013


Diário da República n.º 163/2013, Série I de 2013-08-26

Regulamenta o processamento dos atos e os termos do processo de inventário


no âmbito do Regime Jurídico do Processo de Inventário aprovado pela Lei n.º
23/2013, de 5 de março
https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/499512/details/normal?p_p_
auth=Qi2QrxSM

PORTARIA N.º 46/2015


Diário da República n.º 37/2015, Série I de 2015-02-23

Altera a Portaria n.º 278/2013, de 26 de agosto, que regulamenta o processamento


dos atos e os termos do processo de inventário nos cartórios notariais
https://dre.pt/web/guest/legislacao-consolidada/-/lc/106638105/view?p_p_
state=maximized

* A presente compilação não pretende ser exaustiva e não prescinde a consulta destes e de outros textos
legais publicados em Diário da República, disponíveis em https://dre.pt.
4
LEI N.º 117/2019
Diário da República n.º 176/2019, Série I de 2019-09-13

Altera o Código de Processo Civil, em matéria de processo executivo, recurso de


revisão e processo de inventário, revogando o regime jurídico do processo de
inventário, aprovado pela Lei n.º 23/2013, de 5 de março, e aprovando o regime
do inventário notarial, e altera o regime dos procedimentos para cumprimento
de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à
alçada do tribunal de 1.ª instância, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de
setembro
https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/124680589/details/normal?p_p_
auth=Z8DINrnP

5
Aspetos inovatórios e pontos sensíveis
do processo de inventário - no
primeiro ano da sua vigência
Rita Lobo Xavier ©

OA , LISBOA 29 NOV 2020

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Sumário

1. Aspetos inovatórios e pontos sensíveis no


processo de inventário notarial (RIN)

2. Aspetos inovatórios e pontos sensíveis no


processo de inventário judicial (CPC
Rita Lobo Xavier ©

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Processo de inventário notarial (RIN)

1. Pontos sensíveis

▪ Remessa dos processos para os tribunais


▪ Oficiosamente
▪ A requerimento
▪ N.º de novos processos
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▪ Por óbito
▪ Por divórcio

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Acórdão do TRG de 01-10-2020
(processo n.º 608/20.8T8VNF.G1; Relatora: ALEXANDRA ROLIM
MENDES
I- Tendo a alteração de regime de inventário, com a publicação
da Lei nº 117/19, de 13 de setembro, como objetivo principal
evitar a morosidade dos processos, querendo que os
interessados nos inventários obtenham o desfecho do processo
em tempo útil, para que esses interessados possam pedir a
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remessa do processo a tribunal nas condições previstas na al. b)


do nº 2 do art. 12º, não é necessário que o prazo de pendência
do processo sem andamento útil e efetivo tenha de decorrer
inteiramente a partir da entrada em vigor dessa Lei.

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Processo de inventário notarial (RIN)

2. O interesse do inventário notarial

3. Aspetos inovatórios

▪ remissão geral para o regime CPC (art.


2º)

▪ confirmação ou designação do cabeça de


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casal

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Processo de inventário judicial

1. Aspetos inovatórios

▪ O paradigma da ação declarativa e do


processo de partes

▪A matriz essencial do inventário


divisório para fazer cessar a comunhão
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hereditária

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Processo de inventário divisório («comum»)

Duas Fases
→ dos articulados (eventual audiência prévia) aos
despachos {de saneamento, de determinação dos bens a
partilhar, de forma à partilha*} [=preparação da conferência
de interessados]
➢ Audiência prévia, diligências instrutórias relativas aos incidentes declarativos (art.
1109.º)
➢ Despacho de saneamento, despacho de determinação dos bens a partilhar e
despacho que define a forma da partilha e despacho que marca a conferência de
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interessados (art. 1110.º, n.ºs 1 e 2)

➢ Notificação dos cônjuges dos interessados diretos (art. 1110.º, n.º 3)

→ *art. 1123.º, n.º 2, b) – destas decisões cabe recurso apelação


autónoma, se este recurso for admissível nos termos gerais (arts. 1123.º,
n.º 1, 629.º, n.ºs 1 e 2, 644.º, n.º 2

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Processo de inventário divisório («comum»)
→da conferência de interessados ao despacho
determinativo do mapa da partilha e à sentença
homologatória da partilha
➢ Autocomposição dos interesses, composição igualitária
dos quinhões, unanimidade (art. 1117.º)
➢ «Partilha parcial como exclusão de interessados» (art.
1112.º)
➢ Oposição ao excesso de licitação (1116.º) (incidente)
Rita Lobo Xavier ©

➢ Redução por inoficiosidade e consequências (arts.


118.º e 1119.º) (incidente)
➢ Despacho que determina a elaboração do mapa da partilha (art. 1120.º,
n.º2)

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Processo de inventário divisório («comum»)

2. Pontos sensíveis
• A finalidade do inventário divisório: o património
coletivo e a sua natureza jurídica; a contitularidade de
direitos; o direito dos contitulares a que a sua quota
seja preenchida com bens
• A questão do acordo quanto à composição dos
quinhões e a intervenção do juiz; a articulação com o
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regime da sucessão legitimária e da imputação das


liberalidades; a articulação com o regime da
inoficiosidade;
• O incidente da oposição ao excesso de licitação
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A composição igualitária dos quinhões
• Resulta da contitularidade de direitos
• Distinção entre: direito ao preenchimento com bens, direito à
composição igualitária do quinhão, deliberações por
unanimidade ou por maioria
• O ac. do TC 680/19 incidiu sobre questão da deliberação por maioria:
decidiu não julgar inconstitucional o art. 48.º do RJPI, considerando a
opção legislativa de substituir a regra da unanimidade dos
interessados para designar as verbas que compõem cada quinhão,
pela regra de 2/3 se enquadrava na margem de discricionariedade
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reconhecida.
• No atual regime, volta a exigir-se a unanimidade
• Não estava em causa nem o direito ao preenchimento da quota com
bens, nem à composição igualitária do quinhão
➢ Cfr. arts. 1117.º, n.º2, b); 1116.º, n.º1-3; 1121.º;

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«Partilha parcial como exclusão de
interessados» (art. 1112.º)
• contradictio in terminis
• a partilha realiza a extinção da situação de indivisão
• prática notarial e o negócio subjacente (não se extingue a
situação de indivisão)
• Pressupostos: acordo de todos os interessados; por unanimidade;
o preenchimento integral do quinhão de algum deles; «se
considerar que não existem ou estão devidamente
salvaguardados os eventuais direitos de terceiros afetados por
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essa ‘partilha’» (o que significa?...)


• Sentença homologatória do acordo e seus efeitos
• O acordo sob condição e a termo suspensivo e o seu impacto na
sentença homologatória

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Conclusões

• Virtualidades e complementaridade do IN
• Desafios da remissão geral para o regime do processo
de IJ
• Coerência e simplificação do PJ
• Desafios da concentração/ preclusão
• Desafios da autocomposição/quinhões
igualitários/unanimidade
• A «partilha» parcial
Rita Lobo Xavier ©

Rita Lobo Xavier © 29/10/2020


Q&A | Processo de Inventário

questões**
https://www.youtube.com/watch?v=Pagfy7ioH7M

Questão 1
“O art.º 45.º do RJPI aprovado pela Lei n.º 23/2013, de 5 de março, impõe ao
cabeça de casal a prestação de contas do cabeçalato até ao 15.º dia que
antecede a data da conferência preparatória. Quid juris se o cabeça de
casal não apresentar essas contas? Poderá o Notário, oficiosamente ou a
requerimento de um interessado, notificá-lo para as apresentar? E se ele não
o fizer?”

Resposta
02:05:55 a 02:09:58
https://www.youtube.com/watch?v=Pagfy7ioH7M&t=7s#t=02h05m
55s

** Na presente compilação transcrevem-se, sem revisão, as questões colocadas pelos advogados aos
oradores relativamente a cada temática.
18
ANEXOS
ACÓRDÃOS

19
28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de


Évora
Processo: 52-A/94.E1
Relator: BERNARDO DOMINGOS
Descritores: INVENTÁRIO PARA SEPARAÇÃO DE MEAÇÕES
REMESSA PARA OS MEIOS COMUNS
Data do Acordão: 09-06-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I - Não é lícito ao juiz remeter as partes para os meios comuns, depois de ter admitido a produção de
prova para a decisão do incidente e sem que a mesma tivesse sido produzida.
II - Tendo o processo por objecto a partilha de um único prédio, discutindo-se se o mesmo é comum
do casal, se próprio do recorrido e se há créditos a favor de algum, consoante for a decisão sobre a
titularidade do bem. A decisão destas questões não envolve grande complexidade e se não for possível
dirimi-las só com a prova testemunhal, sempre o tribunal, oficiosamente pode ordenar a realização das
perícias que se revelem necessárias, tanto mais que não está em causa a partilha de outros bens
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

Proc.º N.º 52-A/94.E1


Apelação
2ª Secção
Tribunal de família e menores de Faro - 2º Juízo Cível

Recorrente:
Adília ..........
Recorrido:
José ..........

Vem o presente recurso de apelação, interposto do despacho proferido nos autos de inventário para
separação de meações e que remeteu as partes para os meios comuns, para se determinar o valor das
benfeitorias relativas à construção pelo casal, de um prédio urbano, no terreno pertencente apenas a
um dos ex-conjuges.
*
Apresentou alegações que rematou com as seguintes
Conclusões:

1- Em processo de Inventário se uma das partes discordar da relação de bens, e apresentar prova
testemunhal, não pode o Juiz, sem produção de tal prova, remeter, de imediato, os interessados para os
meios comuns, a fim de aí discutirem a titularidade dos bens, não só porque antes da produção de
prova ser temerário considerar que a questão não pode ser decidida no inventário, mas também porque
a regra é que tal questão deve ser conhecida em tal processo, exprimindo, o remeter as partes para os
meios comuns, excepção a tal regra.
2- Ora bem, a complexidade da matéria de facto a que se reportam os artigos 1335.°, n.º 1 e 1336.°, n.º
2, ambos do CPC, só obriga à remessa dos interessados para os meios comuns processuais quando
haja necessidade de ter lugar a produção de provas que o processo de inventário não comporte.
3- Devem resolver-se no processo de inventário todas as questões de facto que dependam de prova
documental e aquelas cuja indagação se possa fazer com provas que, embora de outra espécie, se
coadunem com a índole sumária da prova a produzir no processo de inventário, não sendo licito

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28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora
remeter os interessados para os meios comuns senão nas questões cuja complexidade é evidente e que
só através desses meios possam ser decididas.
4- Sendo os cônjuges casados em regime de comunhão de adquiridos e tendo o casal construído uma
casa em terreno que pertencia ao marido, depois do casamento, tendo a edificação um valor superior
ao terreno, a casa constitui um bem comum.
5- Deve, todavia, o proprietário do terreno (marido) ser compensado pelo valor actual do terreno.
6- Consignou-se nas Actas de Tentativa de Conciliação relativas às 1.a e 2.a Conferências de divórcio
em ponto 2.° que: «Relativamente a bens comuns existe uma construção cuja propriedade é
controversa, sendo objecto de uma acção que corre termos no Tribunal Judicial de Vila Real de Santo
António justamente para se definir se se trata de um bem comum do casal ou de um bem pessoal.»
7- Essa acção, que demorou cerca de 13 anos, foi decidida favoravelmente a favor da apelante, como
consta das certidões da sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Vila Real de Santo António e
confirmada pelos Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora e do Supremo Tribunal de Justiça juntas
ao requerimento inicial.
8- Assim sendo, essa questão estará ultrapassada, tanto mais, que o prédio se encontra registado em
nome do cabeça de casal, José .......... casado com a aqui apelante, Adília .......... Pereira no regime da
comunhão de adquiridos (vide descrição e inscrição predial n.o 282/19861117 que o cabeça de casal
juntou aos autos conjuntamente com a sua relação de bens).
9- Mesmo recorrendo à posição clássica seguida pelo direito comum baseada primodialmente - no que
concerne à caracterização da construção feita em terreno que não pertence ou não pertence
exclusivamente a quem nele constrói - na distinção entre os institutos de acessão imobiliária e das
benfeitorias, só poderia, face à prova documental junta aos autos, considerar-se a referida construção
do prédio como benfeitoria útil, chegando à mesma conclusão de que o referido prédio deverá ser
sempre considerado bem comum, por força da aplicação do disposto no art. 1773. 0, n.O 2, ex vi art.
1699.°, n.o 1, a!. d) do CPC.
10- Foi violado por erro de interpretação, o disposto no artigo 1336.°, n. 2 do CPC.
Nestes termos e nos melhores de Direito aplicável, a suprir doutamente por V. Exas., deve o presente
recurso merecer provimento e por via dele ser revogada a douta decisão que deverá ser substituída por
outra em que ordene o prosseguimento dos autos com produção de prova»
*
Contra-alegou o recorrido pedindo a confirmação de despacho e a improcedência da apelação.
*
[1]
Na perspectiva da delimitação pelo recorrente , os recursos têm como âmbito as questões suscitadas
pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 685-A e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil)[2], salvo
as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Das conclusões acabadas de transcrever, decorre que a questão a decidir é meramente jurídica e
consiste em saber se era lícito à sr.ª juíza remeter as partes para os meios comuns, depois de ter
admitido a produção de prova para a decisão do incidente e sem que a mesma tivesse sido produzida.
O fundamento invocado pelo tribunal para não decidir o incidente é uma alegada complexidade da
matéria de facto. Sinceramente não se vislumbra onde possa estar essa complexidade e o tribunal
também não a especifica. Ao invés a questão de facto e a questão jurídica não é especialmente
complexa e já tem sido discutida e decidida nos tribunais superiores designadamente por este tribunal
e este colectivo, como pode ver-se no Ac. de 25/03/10, proferido no proc. nº 454/05.9TBFAR.E1 e
disponível in http://www.dgsi.pt/jtre... E menos compreensível é a decisão recorrida, quando se
verifica que ela foi tomada sem ter sido produzida a prova testemunhal apresentada, admitida e
agendada.
O processo tem por objecto a partilha de um único prédio, discutindo-se se o mesmo é comum do
casal, se próprio do recorrido e se há créditos a favor de algum, consoante for a decisão sobre a
titularidade do bem. A decisão destas questões não envolve grande complexidade e se não for possível
dirimi-las só com a prova testemunhal, sempre o tribunal, oficiosamente pode ordenar a realização das
perícias que se revelem necessárias, tanto mais que não está em causa a partilha de outros bens.
Concluindo

Deste modo e sem necessidade de mais considerações, acorda-se na procedência da apelação, revoga-
se o despacho recorrido e ordena-se o prosseguimento dos autos, para produção da prova e
julgamento, conforme for de direito.
Custas pelo recorrido.
Registe e notifique.
Évora, em 9 de Junho de 2011.

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/975298b339a84eed80257de10056f6a8?OpenDocument 2/3
28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora
--------------------------------------------------
(Bernardo Domingos – Relator)

---------------------------------------------------
(Silva Rato – 1º Adjunto)

---------------------------------------------------
(Sérgio Abrantes Mendes – 2º Adjunto

__________________________________________________
[1] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos
eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente
pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód.
Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do
Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta
matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa –1997, págs.
460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv.
Almedina, Coimbra – 2000, págs. 103 e segs.
[2] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56.

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/975298b339a84eed80257de10056f6a8?OpenDocument 3/3
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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


Processo: 359-09.4TBSRQ.L1-2
Relator: MARIA JOSÉ MOURO
Descritores: INVENTÁRIO
REMESSA PARA OS MEIOS COMUNS
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 28-04-2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I–A decisão sobre a remessa dos interessados para os meios comuns
tanto pode ter lugar antes como depois da produção da prova;
existem certas questões relativamente às quais se pode desde logo e
sem qualquer risco concluir que a índole sumária da prova a
produzir no processo de inventário não permitirá aí decidir.
II–No âmbito do incidente de reclamação contra a relação de bens a
decisão de remeter os interessados para os meios comuns, por si só,
não acarreta a suspensão da instância no processo de inventário até
que a questão remetida seja decidida.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório:
*

I–Em 20-12-2009 BRR requereu a abertura de inventário por óbito de


ISA, referindo desde logo ser a ela própria que cabiam as funções de
cabeça de casal.

Nas declarações de cabeça de casal fez saber a requerente que a


inventariada havia falecido a 14 de Abril de 1993 no estado de viúva,
deixando os seguintes herdeiros: os filhos BRR, MSR, OS, VS – este
falecido em 24-6-2003, no estado de divorciado, deixando como
herdeiros, seus filhos MM, CA e SC - MSR, MPS e IS.
Juntou a cabeça de casal a relação de bens composta por três verbas
– a primeira correspondente a um prédio urbano e as segunda e
terceira verbas correspondentes a dois prédios rústicos de
semeadura, ambos sitos nas Canadas, Freguesia da Calheta de
Nesquim, concelho de Lajes do Pico.

Procedeu-se à citação dos interessados, vindo o interessado MM


deduzir “oposição”. Sustentou que o herdeiro mais velho é MSR e
não a requerente do inventário, sendo àquele que devem ser deferidas
as funções de cabeça de casal; que as verbas 2 e 3 estão

www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/A76082074E17E8F580257FEA0030346A 1/12
28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

indevidamente relacionadas pois representam um único prédio e que


esse prédio foi doado verbalmente pela inventariada ao oponente, em
1987, sendo ele quem desde então e até agora explora toda a área de
forma exclusiva pelo que sempre teria adquirido a propriedade do
prédio por usucapião; que, aliás, em 6-3-2009 foi celebrada escritura
pública de justificação daquela aquisição por usucapião, após o que o
oponente converteu o prédio de rústico em urbano; que procedeu à
construção de uma adega que tem 61 m2 de área de construção final,
limpou e alindou o prédio, recuperou os muros envolventes, tudo isto
tendo um valor total não inferior a 50.000,00 €.

Concluiu que a ora cabeça de casal não é quem deve exercer o cargo,
deverão ser excluídas as verbas 2 e 3 da relação de bens e,
subsidiariamente, deve ser relacionado o valor de 50.000,00 € como
encargo da herança a título de benfeitorias e deve a cabeça de casal
ser condenada como litigante de má fé.
A requerente do inventário e OS responderam à oposição.
Mantiveram que, sendo a interessada BR a mais velha deve ser ela a
cabeça de casal; referiram que a mulher do interessado OS havia,
entretanto, falecido e identificaram os seus herdeiros; reafirmaram
que os prédios relacionados integravam a herança da inventariada e
declararam que não ocorrera a pretendida doação (além de que se
ocorresse corresponderia a uma ofensa da legítima dos restantes
herdeiros legitimários); mencionaram desconhecer a realidade das
obras efectuadas e que não se trata de dívidas da herança, pelo que
não devem ser relacionadas.

Foi proferido despacho que face às certidões de nascimento juntas


aos autos confirmou que cabia à requerente do inventário o cargo de
cabeça de casal.

Posteriormente foi proferido outro despacho que decidiu:


«Remete-se a discussão da propriedade sobre as verbas n.º 2 e 3 da
relação para os meios comuns.
Determina-se a suspensão da instância até decisão transitada sobre a
sobredita questão».

Apelaram MSR, MSS, IS, MPS e OS, concluindo nos seguintes


termos a respectiva alegação de recurso:
1º-Veio a cabeça de casal relacionar três bens imóveis, que fazem
parte do acervo hereditário, o primeiro composto por prédio urbano
com o artigo urbano 75º, o segundo por prédio rústico com o artigo
2197 e o terceiro composto por prédio rústico omisso na matriz, os
quais prédios localizam-se todos na freguesia de Calheta de Nesquim,
concelho de Lajes do Pico e encontram-se todos não descritos na
Conservatória do mesmo concelho.
www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/A76082074E17E8F580257FEA0030346A 2/12
28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

2º-Veio o interessado MM Simas, reclamar da relação de bens,


alegando em síntese a falta de relacionação do montante de €
50,000,00 como encargo da herança a título de benfeitorias e que,
apenas a verba número um deverá fazer parte do acervo hereditário
e as verbas número dois e três correspondem na prática a um único
prédio (artigo 2197).
3º-Prédio esse que deverá ser excluído da relação de bens, uma vez
que o interessado reclamante goza da presunção de registo a seu
favor, em virtude da doação feita pela inventariada formalizada por
escritura de usucapião em 2009 (que apenas teve por objeto o prédio
constante na relação de bens sob a verba II).
4º-Vieram a c.c. de casal e OS responder à reclamação apresentada
alegando em síntese, que existem dois prédios; sendo um com o artigo
2197 e o outro prédio melhor indicado na relação de bens sob o
número três, uma vez que fisicamente são dois prédios distintos e com
inscrições matriciais autónomas, configurando a sua junção num
único artigo uma duplicação de matrizes de prédios.
5º-Indicaram prova e impugnaram do mesmo modo aquela aquisição
e as alegadas benfeitorias.
6º-Mantêm, os ora recorrentes, o entendimento que a eliminação das
verbas número 2 e 3 da relação de bens apresentada pela c.c., em
virtude da doação feita pela inventariada cuja doação foi
formalizada, após a sua morte, por usucapião em 2009 (apenas da
verba nº 2), para além de corresponder a uma tentativa de sonegação
de bens da herança, tal pretensão corresponde a uma verdadeira
ofensa da legítima, cuja redução por inoficiosidade foi arguida.
7º-E isto porque, ainda que por mera hipótese académica, sejam
eliminadas aquelas verbas em virtude da alegada doação ao seu neto
(e junção ao prédio 2197 o prédio descrito sob a verba 3) resta apenas
um prédio correspondente a verba nº 1, cujo valor de mercado é
pequeno e a doação assim realizada, e o averbamento na matriz da
verba nº 3 em nome do interessado MS, ofende a legítima dos
restantes herdeiros legitimários.
8º-A cabeça de casal do mesmo transe veio impugnar as alegadas
benfeitorias que o interessado reclama, porquanto sendo neto da
inventariada nunca assumiu o cabeçalato na administração da
herança, pois não se integra em nenhuma das alíneas do art.º 2080,
n.º 1 do Código Civil e, por isso nenhuns poderes de administração
dos bens da herança da falecida tinha, não lhe aproveitando o
disposto no art.º 2087º do mesmo diploma.
9º-Nos termos do art.º 1350º, n.º 1, do Código Civil “Quando a
complexidade da matéria de facto subjacente às questões suscitadas
tornar inconveniente, nos termos do n.º 2 do artigo 1336º, a decisão
incidental das reclamações (…) o juiz abstém-se de decidir e remete
os interessados para os meios comuns.”
10º-E, de acordo com aquele último normativo, “Só é admissível (…)
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a remessa dos interessados para os meios comuns, quando a


complexidade da matéria de facto subjacente à questão a dirimir
torne inconveniente a decisão incidental no inventário, por implicar
redução das garantias das partes.”.
11º-A remessa dos interessados para os meios comuns só é de ordenar
se não se conseguir no inventário prova suficiente para se decidir as
questões suscitadas.
12º-Conforme os sinais dos autos a prova existente, não foi valorada
nem foi ordenada a produção de prova indicada, pelo que a remessa
da questão da titularidade dos bens relacionados sob as verbas
numero dois e três da relação de bens para os meios comuns, colide
com as normas ínsitas nos artigos 1335º, 1336º e 1350º todos do CPC.
13º-O Mmo juiz a quo para além de não ter valorado a prova
existente não foi ordenada a realização de mais prova, indicada no
articulado dos interessados, que lhe permitiria deferir
provisoriamente as reclamações que se refere o nº 3 do art. 1350º do
CPC.
A jurisprudência e doutrina mais avalizada acompanham esse
entendimento.
14º-Em processo de inventário se uma das partes discordar da
relação de bens e apresentar prova documental e testemunhal, - “não
pode o juiz, sem produção de tal prova, remeter, de imediato, os
interessados para os meios comuns, a fim de discutirem a titularidade
dos bens (…) não só porque antes da produção de prova ser
temerário considerar que a questão não pode ser decidida no
inventário, mas também porque a regra é que tal questão deve ser
conhecida em tal processo, exprimindo, o remeter as partes para os
meios comuns, excepção a tal regra.”
(AC. RP, de 7.11.2005:JTRP00038476.dgsi.Net).
15º-Conforme os sinais dos autos veio o interessado reclamar a
exclusão dos bens relacionados sob as verbas número dois e três, mas
não comprovou (nem nenhum outro interessado), a pendência de
processo comum em que tenha peticionado o reconhecimento da
propriedade sobre tais bens, (Ac. RG, de 12.4.2007: Proc.
340/07.2.dgsi.Net).
16º-(…) IV – A suspensão do inventário só deve ser ordenada quando
os herdeiros demonstrarem haver já recorrido aos meios comuns, por
só, então existir fundamento sério para tal (AC. RC, de 11.09.2007:
Proc. 48/03.3TBFIG.C1.dgsi.Net).
17º Incumbia ao Exc.mo Juiz ordenar, mesmo oficiosamente, todas as
diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa
composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer
(artigo 1344º, n.º 2 e 265º, n.º 3 CPC).
18º-Não se tendo o Exc. Mº Juiz pronunciado expressamente sobre a
necessidade ou não das diligências para o apuramento da verdade
dos factos, estava-lhe vedado concluir pela suspensão dos presentes
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autos, sem que tivesse valorado a pretensão probatória formulada


pelo reclamante, pela cabeça de casal e pelo interessado ora
recorrentes.
19º-No limite, deveria o Mmo Juiz ter convidado o requerente a
explicitar se pretendia accionar os meios comuns vindo aos autos
demonstrar ter dado entrada à acção correspondente em 30 dias para
efeitos do art. 1335º/1 CPC, a fim de ser declarada a suspensão nos
presentes autos, até que fosse proferida decisão definitiva nessa
acção.
Ao ter remetido a discussão da propriedade das verbas nº 2 e 3 da
relação de bens para os meios comuns e nessa medida, determinado a
suspensão da instância até decisão transitada sobre a sobredita
questão, o Mmo. Juiz a quo, fez uma incorreta interpretação, dos
artigo 1335º, 1336º e 1350º todos do CPC (na versão anterior a 2013).
Devendo em consequência ser proferido Douto Acórdão que revogue
a decisão proferida que ordene a produção de prova e apreciação
sumária da prova existente nos autos, e defira provisoriamente as
reclamações e determine nos termos do nº 1 do art. 1327º, o
prosseguimento do inventário com vista à realização de partilha
provisória.

Dos autos não constam contra alegações.


*

II-São as conclusões da alegação de recurso que delimitam o âmbito


da apelação. Deste modo, face às conclusões apresentadas, as questões
que se nos colocam são as seguintes: se não deveria ter sido
determinada a remessa dos interessados para os meios comuns a fim
de ali ser decidida a questão da titularidade dos bens relacionados
sob as verbas 2) e 3); se, de qualquer modo, não deveria ter sido
determinada a suspensão da instância.
*

III-Dos autos decorre o seguinte:

1–A inventariada I S A faleceu em 14 de Abril de 1993.


2–A cabeça de casal apresentou relação de bens constituída por três
verbas, todas elas bens imóveis, situados na freguesia de Calheta de
Nesquim, concelho de Lajes do Pico.
3–O primeiro daqueles imóveis é um prédio urbano, sito no Terreiro,
composto por casa de alto e baixo e área total de 142 m2 inscrita na
matriz predial sob o artº 75, não descrito nem inscrito na
Conservatória de Registo Predial.
4–As outras duas verbas relacionadas pela cabeça de casal
correspondem a prédios rústicos de semeadura sitos nas Canadas, o
primeiro inscrito na matriz predial sob o art. 2197 e o segundo omisso
na matriz predial, ambos não descritos nem inscritos na

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Conservatória de Registo Predial.


5–Em 6 de Março de 2009 MM celebrou escritura de justificação
notarial em que declarou ser dono e legítimo possuidor de um prédio
rústico de terra de semeadura, vinha e adega, com a área oito ares e
um centiare, sito na freguesia de Calheta de Nesquim, concelho de
Lajes do Pico, inscrito na matriz no art. 2197 e que o adquiriu por
doação feita pela sua avó paterna – a ora inventariada - há mais de 20
anos, sem que fosse outorgada escritura de doação, desde então
estando na posse do dito prédio que adquiriu por usucapião.
6–Na matriz e relativamente ao prédio mencionado em 4) foi
identificado como seu titular MM.
7–Na Conservatória de Registo Predial de Lajes do Pico, encontra-se
descrito sob o nº 1577/20090416 um prédio urbano sito em Canadas,
freguesia de Calheta de Nesquim, com a área de 801 m2, com
aquisição inscrita a favor de Mário M.A.S..., sendo a causa de
aquisição usucapião.
*

IV–1-O interessado MM veio deduzir reclamação contra a relação de


bens requerendo a exclusão de bens que considera indevidamente
relacionados, as verbas 2) e 3), uma vez que as mesmas configuravam
um só prédio por ele adquirido por doação verbal da inventariada,
vindo posteriormente a ser outorgada escritura de justificação
notarial e havendo procedido ao respectivo registo.

Nos termos do art. 1348 do CPC os interessados poderão reclamar


contra a relação de bens, designadamente requerendo a exclusão de
bens indevidamente relacionados.
O referido art. 1348, no seu nº 1, trata esta eventualidade na unidade
do sistema das reclamações, como uma das hipóteses que podem
surgir.
Consoante resulta do nº 3 do art. 1349 do mesmo Código, na
sequência do atinente processado caberia ao juiz decidir sobre a
pertinência da relacionação dos dois imóveis relacionados como
verbas 2) e 3).
Todavia, como decorre do art. 1350 quando a complexidade da
matéria de facto subjacente às questões suscitadas tornar
inconveniente a decisão incidental das reclamações – o que sucede
quando a complexidade da matéria de facto subjacente à questão a
dirimir torne inconveniente a decisão incidental no inventário por
implicar redução das garantias das partes - «o juiz abstém-se de
decidir e remete os interessados para os meios comuns».

Ora, pode suceder que o juiz, mesmo sem a produção de quaisquer


provas, conclua que a questão suscitada tem uma complexidade que
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não é compatível com a índole sumária da prova a produzir no


inventário, não a podendo aí decidir segura e conscientemente.

Dizia João António Lopes Cardoso, a propósito de tal matéria no


âmbito das antecedentes disposições do CPC ([1]): «Pode suceder que
o cabeça-de-casal tenha relacionado como pertencendo à herança
bens que, efectivamente dela não fazem parte ou a respeito dos quais
algum estranho se arrogue a respectiva propriedade (…) Também
aqui poderão remeter-se os interessados para os meios comuns, na
hipótese da prova a produzir se não compadecer com a natureza do
processo de inventário». Referindo também ([2]) «que tudo deve ser
examinado e decidido à luz de um são critério, já para não consentir
que no inventário se resolvam questões de alta indagação, já para não
excluir as que, aí, podem e devem obter solução adequada». Bem
como que há certas questões em relação às quais «pode afoitamente
concluir-se que a índole sumária da prova a produzir no processo de
inventário não consentirá fazer decidir aqui», forçando a ter «como
facilmente previsível a impossibilidade de as ver decididas no
processo de inventário».
Face à nova redacção das disposições do CPC decorrentes da
reformulação do processo de inventário, aplicáveis ao caso dos autos,
continua a não dever excluir-se um juízo a priori antes de produzidas
as provas. Mantendo João António Lopes Cardoso e Augusto Lopes
Cardoso ([3]) o que foi transcrito e mencionando que o juiz deve
formar juízo prévio sobre a possibilidade da questão se dirimir no
processo de inventário e que quando concluir que o desfecho natural
do incidente será o da remessa das partes para os meios ordinários o
proclamará antes de convidar as partes a produzir provas - «única
forma de não causar despesas às partes, de abreviar o andamento do
processo de inventário e não praticar actos inúteis que a lei
processual proíbe».
Como resulta do supra referido, nos casos em que se conclui que para
a questão ser decidida com segurança e consciência exige uma
aturada e complexa indagação, não compatível com a estrutura de
um incidente, devem as partes ser remetidas para os meios comuns.
Existem certas questões relativamente às quais se pode desde logo e
sem qualquer risco concluir que a índole sumária da prova a
produzir no processo de inventário não permitirá aí decidir.

Deste modo, a decisão sobre a remessa dos interessados para os meios


comuns tanto pode ter lugar antes como depois da produção da prova.
As diligências de prova resultariam em acto inútil se, perspectivando-
se desde logo que face à complexidade da questão seria incompatível
a decisão da mesma no âmbito do processo de inventário, mesmo
assim se produzisse a prova para depois determinar aquela remessa.
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Ora, as questões relacionadas com a aquisição por usucapião por


outrem do direito de propriedade sobre imóveis relacionados
envolvem a alegação de factos complexos, com a correspondente
produção de prova, não compaginável com a prova incidental a
produzir no âmbito do processo de inventário.
*
IV–2–Saliente-se que aquilo que o reclamante alega é que em 1987 a
inventariada lhe doou verbalmente o prédio e que até à data da sua
morte – que ocorreu em 1993 - sempre disse que o prédio era dele,
seu neto, explorando o reclamante toda a área do terreno, pelo que
adquiriu o prédio por usucapião, vindo, aliás, a celebrar escritura
pública de justificação daquela aquisição por usucapião em Março de
2009 (cerca de nove meses antes de se iniciar este processo de
inventário).
A relação de bens a apresentar no inventário deve conter, no que
concerne ao activo, os direitos patrimoniais do autor da herança e, no
que concerne ao passivo, as obrigações do mesmo que não meramente
pessoais, ou exceptuadas por lei, sendo que a titularidade de tais
direitos e obrigações tem de ser determinada com referência à data da
abertura da sucessão – data da morte do seu autor (art. 2031 do CC).
A herança da inventariada I corresponderia ao conjunto das relações
jurídicas patrimoniais de que ela era titular ao tempo da sua morte,
sendo objecto da sucessão e transmitindo-se aos seus sucessores.

Assim, a relação de bens a que se reportam os autos deverá integrar


os bens de que a inventariada era titular à data da abertura da
sucessão, ou seja, em 14 de Abril de 1993.
Não oferecerá dúvida que a doação verbal de um imóvel, porque não
respeitada a forma legal é nula, nulidade essa que é de conhecimento
oficioso do tribunal – arts. 947, 220 e 286 do CC. Por isso, na
escritura de justificação o próprio reclamante refere que adquiriu o
prédio por usucapião.
Tendo a inventariada falecido em 1993 e tratando-se de bem imóvel, à
data da abertura da sucessão não decorrera o tempo suficiente –
atentos os factos alegados – para o reclamante MM poder adquirir o
direito de propriedade do imóvel que diz explorar desde 1987, por
usucapião (arts. 1294 a 1296 do CC).

Na herança compreender-se-ia, então, o direito de propriedade sobre


o imóvel a que o reclamante se reporta – imóvel que, segundo ele
mesmo, na sua materialidade corresponde aos imóveis relacionados
pela cabeça de casal como verbas 2) e 3)?

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A situação não se apresenta tão linear como pareceria poder decorrer


das considerações aduzidas. Nos termos do art. 1288 do CC invocada
a usucapião os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse
(em nome próprio), reafirmando o art. 1317 –f) do CC que o
momento da aquisição do direito de propriedade é, no caso de
usucapião, o do início da posse. Ora, o interessado MM afirma que
desde 1987 – muito antes da data da abertura da sucessão - tem a posse
dos imóveis e na escritura pública de justificação outorgada em
Março de 2009 refere a aludida doação e que há mais de 20 anos está
na posse do dito prédio.
A questão a que nos reportamos tem subjacente uma factualidade
complexa que torna inconveniente a sua decisão incidental no
inventário, com susceptibilidade de implicar a redução de garantias
para as partes.

Trata-se, pois, de um caso em que se justifica a remessa dos


interessados para os meios comuns na precisa ocasião em que teve
lugar e sem que anteriormente se procedesse à produção de outros
meios de prova.
*
IV–3-Referiu-se na decisão recorrida:

«…deve ser decretada a suspensão da instância, já que a decisão de


serem eventualmente retirados bens à relação apresentada está
dependente do julgamento da questão que atrás se focou. É que não
fará qualquer sentido prosseguir para uma eventual partilha de bens
que, eventualmente, se podem vir a provar não fazem parte da
herança».

Entende Lopes do Rego ([4]) que «ao contrário do que ocorre com as
questões prévias “essenciais”, a que alude o art. 1335º, a insuficiência
de elementos para dirimir incidentalmente as reclamações deduzidas
em sede de relacionamento dos bens nunca conduz à suspensão do
processo», aplicando-se no caso de remessa para os meios comuns o
disposto no nº 2 do art. 1350. Este diz expressamente que quando o
juiz, dada a complexidade da matéria de facto se abstém de decidir e
remete os interessados para os meios comuns «não são incluídos no
inventário os bens cuja falta se acusou e permanecem relacionados
aqueles cuja exclusão se requereu».

Dispõe o nº 1 do art. 1335 que se «na pendência do inventário, se


suscitarem questões prejudiciais de que dependa a admissibilidade do
processo ou a definição dos direitos dos interessados directos na
partilha que, atenta a sua natureza ou a complexidade da matéria de
facto que lhes está subjacente, não devam ser incidentalmente
decididas, o juiz determina a suspensão da instância, até que ocorra
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decisão definitiva, remetendo as partes para os meios comuns, logo


que os bens se mostrem relacionados». Determinando o nº 2 do
mesmo artigo poder «ainda ordenar-se a suspensão da instância, nos
termos previstos nos artigos 276.º, n.º 1, alínea c), e 279.º,
designadamente quando estiver pendente causa prejudicial em que se
debata algumas das questões a que se refere o número anterior».

Sustenta, em consonância o mesmo autor ([5]) que neste preceito


«apenas se regula o regime das questões ou causas prejudiciais
“essenciais” de que dependa a admissibilidade do processo ou a
definição dos direitos dos interessados directos na partilha, dispondo
o art. 1350º sobre a decisão das questões que apenas condicionam a
exacta definição do acervo dos bens a partilhar no inventário».

Opinião diferente parece ser a de João António Lopes Cardoso e


Augusto Lopes Cardoso ([6]) ponderando que «o facto de se manter a
relação tal como está não significa, nem isso é dito, que o inventário
deva prosseguir logo». Acrescentando, contudo, que em
conformidade com o nº 1 do art. 1335, forçoso será que o juiz
fundamente a decisão em especial quanto ao segmento respeitante a
tratar-se de questão de que dependa a definição dos direitos dos
interessados directos na partilha.
No caso dos autos não está em causa uma questão que interfira com a
admissibilidade do inventário ou com a definição dos direitos dos
interessados e que, portanto, se inclua na previsão do nº 1 do art.
1335.

O que está aqui em causa é a definição dos bens que fazem parte da
herança a partilhar o que tem natureza diversa daquelas outras, nada
tendo a ver com a admissibilidade do inventário e não tangendo com
a definição dos direitos dos interessados no inventário, quer no que
respeita à titularidade dos seus direitos quer no que respeita à
definição da sua quota.

A situação a que nos reportamos não se enquadra na previsão do nº 1


do art. 1335, mas sim, como já vimos, na do art. 1350 - nas palavras
acima transcritas de Lopes do Rego, trata-se de questões que apenas
«condicionam a exacta definição do acervo dos bens a partilhar no
inventário». E, efectivamente, neste âmbito não se prevê a suspensão
do inventário até à decisão a proferir nos meios comuns, como sucede
naqueloutra situação do nº 1 do art. 1335. O disposto no nº 2 do art.
1350 inculca, aliás, o entendimento contrário (ao dizer que não são
incluídos no inventário os bens cuja falta se acusou e permanecem
relacionados aqueles cuja exclusão se requereu). Se não tivesse em
vista o prosseguimento do inventário esta disposição não teria
utilidade prática.
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Afigura-se, pois, que no âmbito do incidente de reclamação contra a


relação de bens em que nos situamos a decisão de remeter os
interessados para os meios comuns, por si só, não acarreta a suspensão
da instância no processo de inventário até que a questão remetida seja
decidida.

Nada impediria, todavia, que a suspensão fosse determinada de


acordo com os termos gerais.

O que, por ora, não se configura, tendo em conta, designadamente,


que não resulta dos autos que haja sido intentada qualquer acção
respeitante aos bens em litígio ([7]).
Daí se concluir não haver lugar à suspensão da instância.

*
V–Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar
parcialmente procedente a apelação, alterando a decisão recorrida:
sendo, embora, os interessados remetidos para os meios comuns no
que concerne às verbas n.º 2 e 3 da relação de bens, não é
determinada a suspensão da instância.
Custas da apelação pelos apelantes na proporção de metade.
*

Lisboa, 28 de Abril de 2016

Maria José Mouro


Teresa Albuquerque
Sousa Pinto

[1]«Partilhas Judiciais», Almedina, 3ª edição, vol. I, pags. 539-541.


[2]Pags. 523-525.
[3]Em «Partilhas Judiciais», Almedina, 5ª edição, vol. I, pags. 592 e
596-599.
[4]Em «Comentários ao Código de Processo Civil», Almedina, 1999,
pag. 715, comentário ao art. 1350.
[5]Obra citada, pag. 702, anotação ao art. 1335.
[6]Obra citada, pags. 595-596.
[7]Havendo já sido decidido, em casos em que a acção fora proposta,
ser justificado que «se decrete a suspensão da instância, para evitar a
possibilidade de virem a ser partilhados bens que, afinal, não
pertencem à herança» - acórdão do STJ de 9-10-97, Colectânea de
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Jurisprudência, Acórdãos do STJ, ano V, tomo 3, pag. 54.


Entendendo a Relação de Coimbra no seu acórdão de 11-9-2007 - ao
qual se pode aceder em http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/, processo
48/03.3TBFIG.C1: «A suspensão da instância ocorre, para além dos
casos em que a lei, especialmente, o determinar, quando o Tribunal o
ordenar, isto é, quando a decisão da causa esteja dependente do
julgamento de outra já proposta e quando entender que ocorre outro
motivo justificado, nos termos das disposições conjugadas dos artigos
276º, nº 1 e 279º, nº 1, ambos do CPC.
Poder-se-ia entender que existe um motivo justificado para viabilizar
a suspensão da instância, com vista a evitar a partilha dos bens que,
eventualmente, se venha a provar que não fazem parte da herança.
De todo o modo, a suspensão do inventário não tem de ser,
imediatamente, ordenada, devendo antes acontecer quando os
herdeiros demonstrarem haver já recorrido aos meios comuns…»
Mas, também ocorrendo decisões em sentido oposto, sustentando-se
que vindo-se a definir na acção que o prédio não pertence à herança,
será caso de com suporte no decidido nessa acção, proceder à emenda
da partilha, consoante arts. 1386 e 1387 do CPC – assim, o acórdão
da Relação de Coimbra de 13-05-2014, ao qual se pode aceder em
http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/, processo 1318/11.2TBPBL.C1.

www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/A76082074E17E8F580257FEA0030346A 12/12
15/12/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


Processo: 782/16.8T8PBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JAIME CARLOS FERREIRA
Descritores: PROCESSO DE INVENTÁRIO
REMESSA PARA OS MEIOS COMUNS
INDEFERIMENTO
PEDIDO
PARTES
RECURSO
Data do Acordão: 09-01-2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – POMBAL – INST. CENTRAL – 2ª SEC. F.E MENORES – J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 16º, NºS 4 E 5, 66º, Nº 1, 76º, NºS 1 E 2, E 79º DO REGIME JURÍDICO DO PROCESSO
DE INVENTÁRIO, APROVADO PELA LEI Nº 23/2013, DE 05/03; 644º, Nº 3 DO NCPC.
Sumário: I – Nos termos do artº 16º, nº 4 do RJPI ‘da decisão do notário que
indeferir o pedido de remessa das partes para os meios judiciais
comuns cabe recurso para o tribunal competente, no prazo de 15 dias
a partir da notificação de decisão...’. Esse recurso sobe
imediatamente... – nº 5 do artº 16º.

II - Apenas cabe recurso, nesta matéria, da decisão do sr. notário que


indeferir o pedido de remessa das partes para os meios judiciais
comuns, mas para o tribunal de 1ª instância competente – nºs 4 e 5 do
artº 16º do RJPI.
III - Da decisão a proferir no tribunal, sobre essa matéria, já não cabe
recurso para o Tribunal da Relação, a não ser com o recurso que
venha a ser interposto da decisão homologatória da partilha – artºs
66º, nº 1, e 76º, nºs 1 e 2 do RJPI, e 644º, nºs 1, 2 e 3 do nCPC – ‘as
decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos processos de
inventário devem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto
da decisão de partilha’.
IV - Com efeito, o artº 644º do nCPC não prevê como apelação
autónoma o recurso da decisão em questão, dispondo o seu nº 3 que
‘as restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1ª instância podem
ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões
prevista no nº 1’.
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de


Coimbra:

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15/12/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

Na Comarca de Leiria - Pombal - Inst. Central - 2ª Sec. F. Men. - J3, corre


termos o presente processo de inventário (para separação de meações) por
divórcio de J... e A..., processo este que teve lugar no seguimento de
despacho proferido pela Ex.ma Notária Dr.ª ... a indeferir a reclamação
contra a reclamação de bens apresentada pela interessada A..., na parte em
que esta interessada pugnava pela caracterização como bem próprio da
verba n.º 53 da relação de bens.
A dita interessada A..., discordando de tal despacho, requereu a remessa
dos ditos autos para o Tribunal Judicial para a apreciação de tal questão
(para os meios comuns).
Pronunciando-se sobre tal requerimento, a Ex.ma Notária Dr.ª ... indeferiu
tal remessa, com o que não se conformou a dita interessada A... que, em
síntese, recorreu de tal decisão com os seguintes fundamentos:
“A verba n.º 53, consistente em prédio urbano inscrito na matriz sob o
artigo... e descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha
Grande com o n.º ..., composto por moradia unifamiliar de r/chão e 1.º
andar com 5 assoalhadas, cozinha, 3 casas de banho, vestíbulos,
despensa, garagem e logradouro, localizada na Rua ..., constitui bem
próprio da interessada, uma vez que proveio de doação realizada pela sua
avó enquanto a interessada era solteira, inexistindo qualquer cláusula de
comunicabilidade na escritura que formalizou a doação, estribando-se
ainda no disposto no artigo 1791.º do Código Civil.
Ao decidir pela comunicabilidade da dita verba nº 53, a Exma. Notária Dr.ª
... violou o artigo 1791.º do Código Civil, bem como os artigos 16.º, 17.º e
36.º, todos do Regime Jurídico do Processo de Inventário, razão pela qual,
no entender da ora recorrente, deve a dita decisão notarial ser revogada e,
em consequência, a decisão da referida questão ser remetida para os meios
comuns, como foi requerido.”.

***

Não houve resposta do interessado.


Nessa sequência e tendo o processo sido remetido para a 2ª Sec. F.
Menores do Tribunal Judicial de Pombal, Comarca de Leiria, foi aí
proferida a seguinte sentença:
“...
II. Saneamento
O recurso foi regularmente admitido.
O tribunal é o competente.
O processo não enferma de nulidades principais.

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15/12/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, estão devidamente


patrocinadas e são legítimas.
Não existem exceções dilatórias ou questões prévias que obstem ao
conhecimento do mérito da causa.
III. Questão a apreciar
A questão prende-se apenas em apreciar a decisão da Exma. Notária Dr.ª
... na parte que indeferiu a remessa para os meios comuns da reclamação à
relação de bens relativamente à verba n.º 53.
IV. Factos a considerar
a) Por escritura pública denominada de “Doação”, datada de 13.03.1996,
M..., viúva, residente na Rua ..., declarou doar à sua neta A..., que declarou
aceitar, um prédio rústico, composto de terra de semeadura, com a área de
429 m2, sito na ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na
Conservatória do Registo Predial da Marinha Grande com o n.º ...
b) Por escritura pública denominada de “Mútuo com Hipoteca e Fiança”,
datada de 14.05.1997, entre A... e J..., ambos solteiros, e o Banco I..., SA,
ficou contratado o seguinte:
“O Banco concede aos primeiros outorgantes, para efeitos de construção
no imóvel abaixo hipotecado, um empréstimo no montante de ONZE MIL
E QUINHENTOS CONTOS
(…)
Os primeiros outorgantes, aceitam o empréstimo e confessam-se desde já,
devedores de todas as quantias que do Banco receberam e ainda venham a
receber a título deste empréstimo e até ao montante do mesmo e obrigam-
se a aplica-las na construção, nos termos da sua proposta (…)
Que, para garantia do pagamento e liquidação da quantia mutuada (…)
A... constitui a favor daquele Banco, hipoteca sobre o prédio rústico
situado em ..., inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória
do Registo Predial da Marinha Grande sob o número …”.
c) J... e A... casaram um com o outro no dia 15.08.2000, celebrando
convenção antenupcial no regime da comunhão geral de bens, lavrada por
auto na Conservatóriado Registo Civil da Marinha Grande no dia
22.05.2000.
d) Por sentença datada de 04.07.2013, transitada a 04.07.2013, o
casamento celebrado entre J... e A... foi dissolvido por divórcio.
e) Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha
Grande a favor de A..., pela Ap. 6 de 1996/..., sob o n.º ..., o prédio urbano
sito na Rua ..., com a área de 429 m2, composto por moradia unifamiliar
de r/chãoe 1.º andar garagem e logradouro.
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V. Fundamentação da matéria de facto


Os factos considerados foram retirados dos documentos constantes dos
autos, em especial as escrituras públicas e a certidão de assento de
casamento dos interessados.
VI. O Direito
A reclamação contra a relação de bens, prevista no artigo 32.º da Lei n.º
23/2013, de 05.03, pode ter por objecto a acusação da falta de bens que
devam ser relacionados, a exclusão de bens indevidamente relacionados,
por não integrarem o património a dividir, ou a arguição de qualquer
inexatidão na descrição dos bens que releve para a partilha.
Quando o cabeça-de-casal não confessa a existência dos bens objecto de
reclamação, nos termos do disposto no artigo 35.º n.º 3 da Lei n.º 23/2013,
de 05.03, decide o notário da existência dos bens e da pertinência da sua
relacionação.
Contudo, de harmonia com o prescrito no artigo 36.º da Lei n.º 23/2013,
de 05.03, quando a complexidade da matéria de facto ou de direito tornar
inconveniente a decisão incidental das reclamações, o notário abstém-se de
decidir e remete os interessados para os meios comuns.
Como refere João António Lopes Cardoso, in Partilhas Judiciais, vol. I, p.
539, “A lei limitou-se a formular uma regra, um critério de orientação, e
cabe ao poder judicial fixar-lhe os limites, definir-lhe os contornos e dar
consistência ao seu conteúdo maleável. Há certas questões em relação às
quais pode afoitamente concluir-se que a índole sumária da prova a
produzir no processo de inventário não consentirá fazer decidir aqui (...) a
inexistência de documentos que de per si levem a conclusão segura, força
a ter como facilmente inventário”.
Continua o mesmo Autor, citando Simões Pereira in obra cit., p. 540, nota
1569, “Qual, porém, o traço de separação entre o possível e o impossível?
Qual o critério com que se há-de arrumar cada caso em cada uma das
categorias? Responde-se: — muito simples — o de poder a questão ser
resolvida sumariamente. Se pode, comporta-a o incidente; se não pode,
resolve-se apenas a questão de se fazer ou não a descrição e deixa-se o
resto para os meios comuns”.
Concluindo assim que “Nesta emergência, para quê convidar as partes a
produzirem quaisquer provas que não sejam as que promanem de
documento de relevância manifesta, se o desfecho natural do incidente
será a remessa delas para os meios ordinários? Temos por idóneo que,
nestes casos, o julgador deve abster-se de procedimento nesta
conformidade, única forma de não causar despesas às partes, de abreviar o
andamento do processo de inventário e de não praticar actos inúteis que a
lei processual proíbe”.

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Como já acima se disse, a questão prende-se apenas em apreciar a decisão


da Exma. Notária Dr.ª ... na parte que indeferiu a remessa para os meios
comuns da reclamação à relação de bens relativamente à verba n.º 53.
Salvo o devido respeito, quando a interessada e recorrente refere que ao
decidir pela comunicabilidade da verba n.º 53, a Exma. Notária Dr.ª ...
violou o artigo 1791.º do Código Civil, bem como os artigos 16.º, 17.º e
36.º, todos do Regime Jurídico do Processo de Inventário, devendo por
isso “a presente decisão ser revogada e, em consequência, a decisão ser
remetida para os meios comuns”, crê-se que a interessada confunde a
decisão da reclamação contra a reclamação de bens com a oportunidade da
decisão da Exma. Notária Dr.ª ... quando entende não remeter as partes
para os meios comuns.
Efetivamente, uma coisa é a decisão da reclamação contra a reclamação de
bens que entendeu que a verba n.º 53 constitui bem comum, contra a qual
a interessada e recorrente se insurge, entendendo ser bem próprio, e outra
bem diferente constitui a decisão da Exma. Notária Dr.ª ... relativamente à
oportunidade da decisão da Exma. Notária Dr.ª ... quando entende não
remeter as partes para os meios comuns.
O recurso admitido tem em vista recorrer da decisão que indeferiu a
remessa das partes para os meios comuns e não a obtenção de outra
decisão que decida de forma diversa o carácter da verba n.º 53, julgando-a
bem próprio da recorrente.
No que toca à decisão que indeferiu a remessa das partes para os meios
comuns, como já acima ficou exposto, verifica-se que tal remessa apenas
deve suceder quando o notário, no caso concreto, em virtude da
complexidade da matéria de facto ou de direito, não possa concluir com
segurança pela natureza comum ou própria da verba em causa, sob pena de
prejudicar uma justa partilha, tornando-se inconveniente a decisão
incidental da reclamação por implicar redução das garantias das partes.
Ora, analisando a alegação da interessada e recorrente e os factos
considerados, não se vislumbra que factos mais devam ser considerados ou
que factualidade deva ainda ser apurada, inexistindo assim qualquer
complexidade da matéria de facto, sendo bastante a prova documental
recolhida que dá conta dos termos em que foi celebrada a escritura de
doação, o casamento e o divórcio.
Por outro lado, a matéria em questão não se revela de especial
complexidade, sendo fácil a sua subsunção jurídica.
J... e A... celebraram convenção antenupcial em que estipularam o regime
da comunhão geral de bens, lavrado por auto na Conservatória do Registo
Civil da Marinha Grande a 22.05.2000.
O regime da comunhão geral previsto nos artigos 1732.° a 1734.° do
Código Civil define como património comum todos os bens presentes e
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futuros dos cônjuges que não sejam excetuados por lei, sendo que, atento o
caso concreto, apenas se excetuam bens doados, ainda que por conta da
legítima, no caso de conterem cláusula de incomunicabilidade (artigo
1733°, n.º 1, al. a) do Código Civil), o que não se verifica no caso em
apreço, uma vez que a escritura de doação datada de 13.03.1996 não faz a
tanto qualquer referência.
Afirma o artigo 1790.º do Código Civil, na redacção introduzida pela Lei
n.º 61/2008, de 31.10, que em caso de divórcio, nenhum dos cônjuges pode
na partilha receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido
celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos.
A este propósito, refere o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado
de 06.02.2014, disponível in www.dgsi.pt que “O artigo 1790.º do Código
Civil, na redacção da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, não altera o
regime de bens a que se encontra sujeito o casamento celebrado, pelo que
a partilha continua a fazer-se tratando como bens comuns aqueles que de
acordo com esse regime o são.
Para efectuar a partilha aplicando essa disposição, uma vez apurado o
valor que corresponde ao quinhão (meação) de cada um dos cônjuges nos
bens comuns a partilhar, tem de se comparar esse valor com aquele que
resultaria da sua partilha como se o regime de bens fosse a comunhão de
adquiridos; para o efeito simula-se a partilha de acordo com este regime de
bens, separando os bens que de acordo com esse regime seriam próprios e
encontrando a hipotética quota (meação) de cada um dos cônjuges nos
bens que mesmo nesse regime seriam comuns; finalmente, comparando os
valores apurados na partilha segundo o regime efectivo e na partilha
segundo o regime hipotético, caso aquele valor exceda este, deverá ser
reduzido a este valor, aumentando correspondentemente a quota do outro
cônjuge, procedendo-se então ao preenchimento dos quinhões.”
Segundo o Projecto de Lei n.º 509/X - Alterações ao Regime Jurídico do
Divórcio - Exposição de Motivos, 10 de Abril de 2008, p. 14, mencionado
no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 26.05.2015,
disponível in www.dgsi.pt, “o legislador justificou esta alteração tendo em
vista obstar “que o divórcio se torne num meio para adquirir bens, para
além da justa partilha do que se adquiriu com o esforço comum na
constância do matrimónio, e que resulta da partilha segundo a comunhão
de adquiridos. Afirma-se o princípio de que o cônjuge que contribui
manifestamente mais do que era devido para os encargos da vida familiar
adquire um crédito de compensação que deve ser satisfeito no momento da
partilha”.
Por outras palavras, não obstante a consideração como bem comum da
verba n.º 53, a partilha não deixará de ser ponderada atendendo à diferença
entre o regime da comunhão geral e de adquiridos, pelo que nenhum dos
cônjuges poderá receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido
celebrado na comunhão de adquiridos.
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Finalmente, e pegando no dispositivo legal avançado pela interessada e


recorrente, como escreveu a Exma. Notária Dr.ª ..., o artigo 1791.º do
Código Civil apenas tem aplicação no que se refere a doações feitas em
vista do casamento, o que não se encontra preenchido no caso em apreço,
mormente se se atentar na data em que a doação foi feita, ou seja, no ano
de 1996, e na data em que teve lugar o casamento, ou seja 2000, sendo
que, para mais, nada alega sequer nesse sentido a interessada e recorrente.
Finalmente, como entende o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
datado de 16.05.1995, disponível in www.dgsi.pt, “a situação de doação
em vista do casamento ou em consideração do estado de casado há-de
resultar da própria escritura pública”, e nada resulta nesse sentido da
escritura denominada de “Doação”, naufragando assim a argumentação da
interessada e recorrente.
VII. Decisão:
Termos em que se nega provimento ao recurso interposto por A...
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC, nos termos
do artigo 7.º n.º 4 e da tabela II do Regulamento das Custas Processuais,
atenta a simplicidade e processado a que deu causa, sem prejuízo do apoio
judiciário de que beneficia.
Valor: 113.620,00 (cento e treze mil seiscentos e vinte euros).
Registe e notifique, comunicando igualmente ao Cartório Notarial da
Exma. Dr.ª ... após trânsito em julgado.”.
Desta sentença interpôs recurso a interessada A..., em cuja
alegação concluiu da seguinte forma:
...
11ª - Termos em que deve o presente ser admitido e a decisão recorrida ser
revogada e, em consequência, a verba n.º 53 ser excluída da relação de
bens apresentada pelo cabeça de casal, devendo assim a referida verba ser
considerada um bem próprio da ora recorrente.

***

Esse recurso foi admitido em 1ª instância, como sendo de apelação,


com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, tendo
subido a esta Relação.
Feitos os autos conclusos ao seu relator (também o relator do
presente acórdão), foi proferido o seguinte despacho:
‘O presente processo de inventário, em consequência de divórcio
entre as partes, é regulado pelo chamado Regime Jurídico do Processo de

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15/12/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

Inventário, aprovado pela Lei nº 23/2013, de 05/03, designadamente pelo


seu artº 79º.
Foi essa a tramitação seguida, junto do Cartório Notarial de ...,
sito na Marinha Grande.
Foi nomeado como cabeça de casal o interessado J..., que
prestou compromisso de honra em 27/03/2014 – fls. 70.
Na sequência da apresentação de reclamação quanto à relação de
bens, por parte da interessada A..., foi proferido despacho pela senhora
Notária, conforme fls. 17 e segs., no qual decidiu, além do mais, a
relacionação da verba nº 53 – imóvel, como sendo bem comum.
Nessa sequência veio a interessada A... requerer, no que diz
respeito ao relacionamento da verba nº 53 como bem comum, que essa
questão seja remetida para os meios comuns, nos termos do artº 16º do
RJPI citado – fls. 180.
Esse requerimento foi objecto de despacho notarial, a fls. 192 e
segs., no qual foi indeferida a dita pretensão.
É desse despacho que a fls. 202 a interessada A... interpôs
recurso para o Tribunal Comum, recurso esse admissível, nos termos do
artº 16º, nº 4 do RJPI – ‘da decisão do notário que indeferir o pedido de
remessa das partes para os meios judiciais comuns cabe recurso para o
tribunal competente, no prazo de 15 dias a partir da notificação de
decisão...’.
Esse recurso sobe imediatamente... – nº 5 do artº 16º.
E assim se procedeu, conforme fls. 216 e fls. 231.
No Tribunal da Comarca de Leiria – Pombal – Inst. Central – 2ª
Sec. F. e Menores – J3 foi apreciado o objecto desse recurso, conforme fls.
231 e segs., tendo sido decidido o indeferimento do recurso em causa.
É desta decisão que agora vem novo recurso, também interposto
pela interessada A... – fls. 241 e seg.s.
Ora, com o devido respeito, e conforme já antes referido, apenas
cabe recurso, nesta matéria, da decisão do sr. notário que indeferir o
pedido de remessa das partes para os meios judiciais comuns, mas para o
tribunal de 1ª instância competente – nºs 4 e 5 do artº 16º do RJPI.
Da decisão a proferir no tribunal, sobre essa matéria, já não cabe
recurso para o Tribunal da Relação, a não ser com o recurso que venha a
ser interposto da decisão homologatória da partilha – artºs 66º, nº 1, e 76º,
nºs 1 e 2 do RJPI, e 644º, nºs 1, 2 e 3 do nCPC – ‘as decisões
interlocutórias proferidas no âmbito dos processos de inventário devem ser
impugnadas no recurso que vier a ser interposto da decisão de partilha’.

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Com efeito, o artº 644º não prevê como apelação autónoma o


recurso da decisão em questão, dispondo o seu nº 3 que ‘as restantes
decisões proferidas pelo tribunal de 1ª instância podem ser impugnadas no
recurso que venha a ser interposto das decisões prevista no nº 1’.
Assim sendo, nos termos do artº 652º, al. b) do nCPC não se
conhece do recurso interposto, por ser inadmissível, nos termos supra
citados’.

***

Deste despacho reclamou para a conferência a interessa A..., com


fundamento no disposto no artº 644º, nº 1 do nCPC, que, no seu entender,
contempla o recurso autónomo interposto.
Cumpre apreciar e decidir, nos termos do artº 652º, nº 3 do nCPC
(reclamação para a conferência, para ser proferido acórdão sobre o
despacho do relator).
Apreciando, esta conferência ratifica o despacho proferido pelo
relator, que confirma nos seus precisos termos, pelo que é indeferida a dita
reclamação para a conferência.
Custas pela Reclamante.
Tribunal da Relação de Coimbra, em
09/01/2017
Relator: Des. Jaime Carlos Ferreira
Adjuntos: Des. Jorge Arcanjo
Des. Manuel Capelo

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Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


Processo: 1441/11.3TBFIG-C.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: PARTILHA
EMENDA
REQUISITOS
ERRO DE FACTO
DESCRIÇÃO DE BENS
ERRO DE ESCRITA
CASO JULGADO
EFEITOS
Data do Acordão: 07-03-2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – F. FOZ – JUÍZO FAM. E
MENORES – J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 667º, Nº 1, 1386º E 1387º DO CPC.
Sumário: I – De acordo com o disposto no artº 1386.º, nº 1, do pretérito CPC,
“a partilha ainda depois de passar em julgado a sentença, pode ser
emendada no mesmo inventário por acordo de todos os interessados
ou dos seus representantes, se tiver havido erro de facto na descrição
ou qualificação dos bens ou qualquer outro erro susceptível de viciar
a vontade das partes.”.
II - Prevendo a verificação de algum dos casos previstos no artº
1386.º, nº 1, sem que, contudo, haja o mencionado acordo, dispõe o nº
1 do artº 1387º do CPC que a emenda pode “...ser pedida em acção
proposta dentro de um ano, a contar do conhecimento do erro,
contanto que este conhecimento seja posterior à sentença.”.
III - A emenda da partilha, na falta de acordo dos interessados, tem,
assim, de radicar num erro de facto na descrição ou qualificação dos
bens, ou qualquer outro erro susceptível de viciar a vontade das
partes, sendo que neste último caso haverá que exigir, como se diz no
acórdão da Relação de Lisboa de 03 de Outubro de 2013 (Apelação nº
136-B/1992.L2-2), que o erro que fundamenta o pedido apresente as
«[…] características que o tomariam relevante como erro-vício da
vontade: essencialidade ou causalidade, propriedade e escusabilidade
ou desculpabilidade […]», para o que cumpre ao Autor a alegação da
respectiva matéria de facto.
IV - Na acção de emenda da partilha não está em causa qualquer
reapreciação crítica dos actos praticados no decurso do inventário já
findo, mas apenas apurar se um acto, específico e determinado, do
processo - a partilha - padece ou não de alguma das deficiências ou
irregularidades tipificadas nos artigos 1386º e 1387º do CPC.
V -Como erro de facto na descrição considera-se toda a descrição que
não corresponda a verdade, designadamente a descrição dum prédio
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28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

urbano por um rústico, um móvel por imóvel ou, dentro de cada uma
destas categorias, quando tenha sido descrito como de três andares
um prédio de um andar único, ou uma quinta por um terreno de
centeeiro, ou vícios ocultos da coisa ou falta de conteúdo ou extensão.
VI - Estes erros (na descrição ou na qualificação) operam por si
mesmos, isto é, não/se torna necessário alegar e provar quaisquer
outros requisitos para, com base neles, peticionar a emenda,
porquanto viciam gravemente o objectivo que a partilha se propõe
alcançar (...).
VII - Já não assim nos demais erros de facto (v. g. estar o requerente
na ignorância da extensão, natureza e características e valor (...) dos
bens inventariados), erros que recaem sobre a qualidade dos mesmos
bens (...) e assim sujeitos à regra do art. 1386º-1, in fine. Nesse caso
torna-se mister alegar e provar os requisitos gerais e especiais desse
erro, nos precisos termos dos arts 247º e seguintes do Código Civil.
VIII - A rectificação possível de erro de escrita de que enferme uma
decisão (seja um despacho, uma sentença ou um acórdão), à sombra
do disposto no citado artº 667º, nº 1, depende da circunstância de esse
erro resultar de lapso manifesto, que se evidencie com absoluta
clareza do contexto da declaração ou das circunstâncias em que a
declaração é feita.

IX - Verificada, com o trânsito em julgado, a insusceptibilidade de a


sentença ser objecto de reclamação ou de recurso ordinário (artº 628º
do NCPC), forma-se caso julgado, que tem como efeitos, como se diz
no Acórdão desta Relação de 20/10/2015 (Apelação nº
231514/11.3YIPRT.C1), “...a impossibilidade de qualquer tribunal,
incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a
questão decidida - efeito negativo - e a vinculação do mesmo tribunal
e eventualmente de outros, estando em causa o caso julgado material,
à decisão proferida - efeito positivo do caso julgado.”.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra[1]


I - 1) - Na Instância Central - 2.ª Secção de Família e Menores - da
Comarca de Coimbra (Figueira da Foz), por apenso aos autos de
inventário n.º ..., subsequentes a divórcio sem consentimento do outro
cônjuge, veio A..., em 24/11/2015, intentar contra a sua ex-cônjuge, M...,
acção que, invocando o disposto no artº 1387º do CPC, disse destinar-se
à emenda da partilha efectuada nesse inventário e homologada por
sentença de 06/01/2014.

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Alegou, para o efeito e em síntese, que:


- Nos referidos autos de inventário, em que a ora Ré desempenhou as
funções de cabeça de casal, tendo ele reclamado da inclusão, no acervo
de bens a partilhar, do prédio urbano que identificou, aí relacionado,
originariamente, sob a verba nº 30 (e, mais tarde, sob a verba nº 31), pois
que era um bem próprio seu, esse prédio veio aí a ser partilhado, tendo
cabido à ora Ré, por fazer parte do lote que lhe calhou em sorteio, tudo
isto indevidamente, já que por anterior “sentença” (SIC), de 21/1/2013
(fls. 85 a 98), havia sido decidido remeter os interessados para os meios
comuns quanto à propriedade do bem relacionado sob a verba n.º 30,
embora mantendo-se o mencionado bem “...na relação de bens, ao
abrigo do disposto no art. 1350º n.º 2 do CPC”;
- Efectivamente, a partilha desse prédio só ocorreu devido a lapso no
despacho de 17/6/2013 (fls. 129), que, sem determinar a exclusão desse
bem, estabeleceu o modo de se proceder à partilha e à concretização da
composição dos lotes, lapso esse que inquinou todo o processado
posterior, designadamente, o mapa da patilha e a consequente sentença
homologatória;
- Só em 11/2/2015, quanto foi citado para acção de reivindicação nº ...,
que a ora Ré intentou contra ele, aqui Autor, respeitante ao dito prédio,
que ele ocupou e ocupa, pois que é a sua habitação, é que se deu conta
do referido lapso, sucedendo, assim, que, não só foi partilhado esse seu
bem próprio, como também foi prejudicado em virtude de esse bem ter
sido partilhado por cerca de 1/6 do seu valor real;
- Deduzindo reconvenção naquela acção nº ..., aproveitou para requerer,
para ele, o reconhecimento da propriedade do dito imóvel, mas, tendo-se
tentado resolver a questão prévia que ali se coloca, mediante emenda da
partilha, por acordo das partes, esse acordo não foi possível, o que o
obrigou a intentar a presente acção;
Defendendo ter havido, no referido inventário, violação, por parte do
despacho de fls. 129, do caso julgado formado pela decisão de 21/1/2013,
“...na parte que não exclui dos bens a partilhar a verba n.º 31 da relação
de bens de fls. 103 e seguintes”, sustentou ser ineficaz todo o processado
posteriormente àquele despacho de fls. 129, “...mormente o mapa de
partilha, as operações de sorteio e a sentença homologatória por
indevida inclusão de um bem anteriormente excluído por sentença
transitada em julgado.”.
Terminou peticionando conforme se transcreve:
«[…] requer:
a) Seja declarado ineficaz o despacho de fls 129 e todo o processado
posterior no processo ... por ofensa da sentença de 21/1/2013, transitada
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em julgado; e, consequentemente,
b) Seja ordenado o cancelamento da alteração da inscrição matricial de
26/5/2014 na Autoridade Tributária e Aduaneira e do registo de
aquisição efetuado sob a apresentação ... de 1/8/2014 na Conservatória
do Registo Predial de ..., ambos relativos ao prédio inscrito na matriz
predial urbana da freguesia de ..., sob o artigo n.º ... e descrito sob o n.º
...; e,
c) Seja excluído dos bens a partilhar o prédio relacionado sob a verba n.º
31 da relação de bens de fls. 103 e seguintes, emendada a partilha
refazendo-se o respetivo mapa, elaborando-se novo sorteio e proferindo-
se nova sentença homologatória; ou, caso assim se não entenda,
d) Seja alterado o valor de tal verba n.º 31 para 42.480,00€,
correspondente ao seu valor patrimonial tributário, alterando-se em
conformidade o mapa de partilha, elaborando-se novo sorteio e
proferindo-se nova sentença homologatória.».
2) - A Ré, contestando, para além de se ter defendido por impugnação,
veio invocar:
- A excepção de caso julgado, porquanto a pretensão ora deduzida pelo
Autor ofende o caso julgado da sentença homologatória da partilha,
proferida em 06/01/2014 e transitada em julgado em 10/02/2014;
- A caducidade da propositura da presente acção, por há muito ter
decorrido o ano previsto na norma do art. 1387º, n.º 1, do CPC, na
versão aplicável, já que, defende, tendo o ora Autor tido conhecimento e
consequentemente notificado da partilha constante do mapa, das
operações de sorteio e do trânsito em julgado da sentença homologatória
da mesma, que ocorreu em 10/02/2014, teria até 10/02/2015 para
intentar a presente acção, só o tendo feito em 24/11/2015.
Concluiu pugnando pela procedência das excepções e pela sua
absolvição do pedido.
3) - Em 15/02/2016 foi proferido saneador-sentença, em cuja parte
dispositiva se consignou:
«[…] Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se procedente a
presente ação e, em consequência:
a) Declara-se a ineficácia do despacho de fls 129 e todo o processado
posterior no processo ... por ofensa da sentença de 21/1/2013, transitada
em julgado; e, consequentemente,
b) Determina-se se remeta certidão desta sentença à Autoridade
Tributária e Aduaneira e à Conservatória do Registo Predial de ..., para
efeitos de aí ser ordenado o cancelamento da alteração da inscrição

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matricial de 26/5/2014 e do registo de aquisição efetuado sob a


apresentação ... de 1/8/2014, respetivamente, ambos relativos ao prédio
inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., sob o artigo n.º ... e
descrito sob o n.º ...; e,
c) Determina-se a exclusão do prédio relacionado sob a verba n.º 31 da
relação de bens de fls. 103 e seguintes, do apenso B), de entre os bens a
aí partilhar. […]».
4) - Essa sentença, no que respeita à decisão da matéria de facto, veio a
ser objecto da rectificação oficiosa, determinada pelo despacho de
27/04/2016, nos termos que se transcrevem:
«[…] tal como alegado pelo A./recorrido, o tribunal cometeu lapso na
indicação, como não provado, do consignado em A) (factos não
provados), considerando o reconhecimento expresso da correspondente
alegação no art. 6º, da petição inicial, conforme art. 23º da contestação.
Por se nos afigurar ter-se tratado de lapso manifesto na conferência
factual dos articulados, deixa-se aqui a retificação da factualidade não
provada, mediante a transferência do consignado em A) para os factos
provados, com a numeração sequencial.[…]».
II - A) - A Ré, inconformada com a sentença, dela interpôs recurso -
recebido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e
efeito meramente devolutivo -, oferecendo, a findar a respectiva
alegação, as seguintes conclusões:
«a) - A acção de emenda à partilha intentada pelo A. ora recorrido,
deverá ser considerada extemporânea, por apresentada fora de prazo.
b) - Com efeito, a lei, desde que não haja acordo entre as partes quanto à
emenda da partilha, que não houve, estatui que a mesma deve ser
proposta dentro de um ano a contar do conhecimento do erro.
c) - Assim, teria o recorrido de ter intentado tal acção até 10 de
Fevereiro de 2015 e não o tendo feito precludiu o direito de a propor fora
desse prazo.
d) - Ao reclamar da relação de bens quanto à propriedade da verba nº 30
à altura, bem imóvel sito na Rua ... e tendo sido tal reclamação objecto
de decisão com trânsito em julgado que remetia as partes para os meio
comuns quanto ao apuramento da propriedade do mesmo bem, tal verba,
como não podia deixar de ser, ao abrigo do art. 1350º nº 2 do CPC, foi
mantida na relação de bens.
e) - E ao ser mantida na relação de bens, ao abrigo da supracitada
disposição legal, foi objecto da constituição de um lote, mais
concretamente o lote A, que por sorteio foi adjudicado à recorrente M...

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f) - O bem passou a integrar a esfera patrimonial da ora recorrente,


nunca tendo o recorrido apresentado qualquer reclamação, recurso ou
outro que impedisse aquele bem de integrar o património da mesma
recorrente M...
g) - A tudo isto acresce que a partilha onde tal foi decidido, foi
homologada por douta sentença com trânsito em julgado, o qual não foi
respeitado pela douta sentença recorrida.
h) - Aliás, as excepções peremptórias de caso julgado, não foram
contempladas nem tão pouco abordadas na mesma sentença recorrida.
i) - Mesmo dando de barato tudo o que acaba de ser dito, igualmente
acresce que o mencionado imóvel- casa de habitação sita na Rua de ... -
foi edificado de raiz na constância do matrimónio da recorrente com o
recorrido, bastando para o efeito analisar o documento superveniente,
bem como os documentos já juntos aos autos pela recorrente com a
resposta à reclamação da relação de bens.
j) - Destarte, deve ser mantida a partilha nos autos pela forma que a
mesma foi efectuada, sob pena de subverter todas as disposições legais
acima invocadas. […]».
Terminou pedindo que a sentença recorrida fosse substituída por Acórdão
que a declarasse nula, mantendo-se a partilha já efectuada nos autos, nos
moldes que acima referira, decidindo-se pela sua absolvição do pedido
formulado na P.I.
B) - O Autor, respondendo à alegação de recurso, defendeu que não se
admitisse o documento junto com a alegação da Recorrente e que,
negando-se procedência ao recurso, se confirmasse a sentença recorrida.
C) - A Recorrente, com a sua alegação de recurso, juntou um documento
- certidão de uma escritura de doação outorgada em 21 de Junho de 1979
- que, por despacho do relator (fls. 135 e 136), se decidiu que não seria
atendido no julgamento do recurso.
D) - Por despacho do relator, de fls. 157 e na sequência de despacho
rectificativo do Tribunal “a quo”, foi alterado para “meramente
devolutivo” o efeito atribuído ao recurso.
III - Em face do disposto nos art.ºs 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do
novo Código de Processo Civil[2] (doravante, NCPC, para o distinguir
do Código que o precedeu, que se passará a identificar como CPC), o
objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos
recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra
apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, “ex vi” do
art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.

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Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja


prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que
antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, “questões”,
para efeito do disposto no n.º 2 do artº 608º do NCPC, são apenas as que
se reconduzem aos pedidos deduzidos, às causas de pedir, às excepções
invocadas e às excepções de que oficiosamente cumpra conhecer, não
podendo merecer tal classificação o que meramente são invocações,
“considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor
produzidos pelas partes”[3] e que o Tribunal, embora possa abordar
para um maior esclarecimento dos litigantes, não está obrigado a
apreciar.
Deste modo, importa aqui apreciar do acerto da procedência da acção,
considerando, em especial, os termos e os fundamentos de tal decisão,
bem assim como a ponderação da questão da caducidade da acção e do
caso julgado invocado pela Ré/recorrente.
IV - No saneador-sentença consignou-se o seguinte quanto à matéria de
facto (aqui já considerada a rectificação efectuada mediante o despacho
de 27/04/2016, reflectida na consignação, nos factos provados, da
matéria ora constante do item 38)):
«Factos Provados:
1)
Nos autos de Divórcio Sem Consentimento do Outro Cônjuge, com o n.º
..., que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da
Foz, por sentença proferida em 23/1/2012 e transitada em julgado em
22/2/2012, foi decretado o divórcio entre o aqui autor A... e a aqui ré
M,,,, assim ficando dissolvido o respetivo casamento.
2)
Na pendência do casamento, a casa de morada da família do casal
formado pelo A... e pela M... situava-se em Rua ..., e estava inscrita na
respetiva matriz predial sob o n.º ...
3)
Sob o apenso A, a M... intentou contra o A... uma ação de Atribuição de
Casa de Morada da Família, acima referida, pedindo que a mesma lhe
fosse atribuída.
4)
Neste apenso, consta do despacho proferido em 4/1/2012:
“Resulta do assento de casamento das partes, junto a fls. 8, que o mesmo
foi celebrado em 1979, sem precedência de convenção antenupcial, ou

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seja, no regime supletivo da comunhão de adquiridos (cfr. artigo 1717.º


do Código Civil).
Pois, o imóvel em que se fixou a residência do casal (habitação situada
no n.º 17 da Rua ..., a que corresponde o artigo matricial n.º ... da
sobredita freguesia) foi adquirido pelo requerido A... por doação (cfr.
certidão do registo predial de fls. 30), ou seja, trata-se de um bem
próprio do requerido e não chegará por isso a ser partilhado (cfr. artigo
1772.º, n.º 1, al. b) do Código Civil).”
5)
Em 22/6/2012, naquele apenso A, foi proferida sentença, transitada em
julgado em 13/9/2012, que julgou a ação improcedente.
6)
O aqui A... continuou a residir na casa de morada de família, como
sempre residiu, sendo que a M... a tinha já abandonado em julho de 2011,
conforme consta dos factos 3.6. e 3.7. dados como provados naquela
sentença.
7)
Consta dos fundamentos da sentença proferida a 22.06.2012, no apenso
A), o seguinte:
“Também se salientou já que resulta do assento de casamento das partes,
junto a fls. 8, que o mesmo foi celebrado em 1979, sem precedência de
convenção antenupcial, ou seja, no regime supletivo da comunhão de
adquiridos (cfr. artigo 1717.º do Código Civil). Ora, o imóvel em que se
fixou a residência do casal (habitação situada no n.º 17 da Rua ..., a que
corresponde o artigo matricial n.º ... da sobredita freguesia) foi adquirido
pelo requerido A... por doação (cfr. certidão do registo predial de fls. 30),
ou seja, trata-se de um bem próprio do requerido e não chegará por isso
a ser partilhado (cfr. artigo 1722.º, n.º 1, al. b) do Código Civil).”.
8)
Em 13/3/2012 a R. M... propôs contra o A... uma ação de inventário para
partilha de bens em consequência do divórcio de ambos, que correu
termos sob o apenso B.
9)
Em 16/3/2012 a R. M... foi nomeada para o cargo de cabeça de casal,
tendo prestado compromisso de honra e declarações em 12/4/2012, nos
termos do n.º 2 do artigo 1340.º do Código de Processo Civil antigo.
10)

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Por requerimento de 31/5/2012, a Conceição apresentou uma relação de


bens onde, sob a verba n.º 30, relacionou o seguinte bem imóvel:
“Prédio urbano destinado a habitação, sito na Rua ..., composto de r/c
com sala, três quartos, cozinha, dois banhos, vestíbulo, dispensa e
alpendre, com a s.c. de 117 m2, logradouro de 546 m2, a confrontar ...,
descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ... e inscrito na
matriz predial respetiva sob o art.... e com o valor patrimonial de
7.144,06€”.
11)
Em 12/10/2012, o A... reclamou da relação de bens alegando e
peticionando, para o que aqui interessa, o seguinte:
“10. Ainda quanto ao acervo a partilhar, só por mero lapso, deve ter sido
arrolado como bem comum do casal o Imóvel descrito na verba nº 30 do
Inventário.
11. Pois, como consta da respetiva Certidão do Registo Predial e
expressamente da decisão judicial proferida no apenso A destes autos e
relativa à atribuição de casa de morada de família, o referido bem imóvel
é bem próprio do requerido, não podendo fazer parte do acervo a
partilhar.”
“Face ao exposto, requer-se a V. Exa. o seguinte: […]
b) Deverá ser retirado do Inventário a verba n.º 30, correspondente ao
Imóvel aí descrito, por o mesmo ser um bem próprio do requerido”.
12)
Por requerimento de 26/10/2012, a M... pugnou pela manutenção no
inventário do dito bem imóvel relacionado sob a verba n.º 30.
13)
Por despacho de 26/11/2012, quanto a esta específica questão proferiu-se
despacho no seguinte sentido:
“2.2.
Alínea b) e c) da reclamação de fls. 32 a 33 dos autos:
Atenta a posição dos interessados, a questão suscitada depende de prova
a produzir pelo que relega-se a sua apreciação.”
14)
Na decisão de 21/1/2013, consta: “4. DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos expostos, Tribunal decide:

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4.1. Remeter-se os interessados para os meios comuns quanto à


propriedade do bem relacionado sob a verba n.º 30 e, em consequência,
manter o mencionado bem na relação de bens, ao abrigo do disposto no
art. 1350º n.º 2 do CPC”.
15)
Desta decisão não foi apresentada reclamação nem recurso.
16)
Esta decisão de remessa para os meios comuns justificou-se,
resumidamente, assim:
“Ora, não se olvidando que o regime de bens que vigorava na pendência
do casamento era o regime da comunhão de adquiridos e que o
reclamante goza da titularidade do direito prevista no artigo 7.º do
Código de Registo Predial, a verdade é que não podemos olvidar que esta
presunção é ilidível mediante prova em contrário. Assim sendo, entende o
Tribunal não estar em condições de forma conscienciosa, resolver em
sede do presente incidente a questão suscitada acerca da propriedade do
bem em causa, reclamando a matéria factual em causa, que tem por
objeto direitos sobre bens imóveis, uma mais aprofundada produção de
prova, a qual não se compadece com a decisão incidental no âmbito do
presente inventário atentos os limites probatórios que lhe são inerentes.”.
17)
O A. A... não contestou, no inventário, a descrição e o valor atribuídos
pela R. M... ao referido bem.
18)
Na sequência daquela sentença, a ré apresentou, em 7/3/2013, uma nova
relação de bens, onde o imóvel em causa passou a constar como verba n.º
31.
19)
Em sede de conferência de interessados realizada em 20/5/2013, a M... e
o A... não chegaram a acordo relativamente à adjudicação dos bens a
partilhar nem licitaram nenhuma das verbas constantes da relação de
bens.
20)
Por despacho de 17/6/2013 decidiu-se:
“Os bens a partilhar são os constantes da relação de fls. 103 com a
precisão de fls. 127.”
[…]
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De acordo com o exposto, procede-se à partilha dividindo-se em duas


partes iguais o valor dos bens relacionados e atribui-se cada uma delas a
cada um dos interessados que constituía o dissolvido casal.
[…]
A composição dos quinhões será concretizada mediante sorteio de lotes
nos termos e para os efeitos da alínea c) do n.º 1 do artigo 1374.º do
Código de Processo Civil.”
21)
Em 30/10/2013 foi organizado o mapa de partilha, onde figura a verba
n.º 31, referente ao imóvel acima identificado, que passou a integrar o
lote A.
22)
Por despacho de 31/10/2013, foi ordenado:
“Desta forma, e porquanto se encontra organizado o mapa de partilha,
ponha-o a reclamação em conformidade com o disposto no artigo 1379.º
do Código de Processo Civil”.
23)
Em 4/12/2013 foram sorteados os lotes, tendo o A... ficado com o lote B e
a M... com o lote A.
24)
Em 6/1/2014 foi homologada por sentença a partilha constante do mapa
e as operações de sorteio.
25)
Esta última sentença transitou em julgado em 10 Fevereiro do ano de
2014.
26)
Não foi proposta a ação judicial, nos “meios comuns”, para aferir da
propriedade do bem imóvel inicialmente relacionado no apenso B) sob a
verba 30.
27)
Ora, em 6/2/2015 a R. M... propôs contra o A... uma ação judicial de
reivindicação do dito imóvel, sob o n.º ..., descrevendo-o como “casa de
habitação de r/c e logradouro, sita na Rua ..., com a área total de 663m2,
área coberta de 180m2 e área descoberta 483m2 inscrita na matriz
predial urbana sob o art. ... e descrita na competente Conservatória do
Registo Predial, sob o nº ... e com o valor patrimonial de 42.480,00€”.
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28)
Nos termos da descrição da referida verba 30 da inicial relação de bens,
no apenso B), o prédio em questão tinha “ 117 m2 de superfície coberta e
um valor de 7.144,06€”.
29)
Na mencionada ação de reivindicação, o mesmo prédio é descrito como
tendo afinal 180 m2 de área coberta e um valor de 42.480,00€.”
30)
O atual valor patrimonial tributário do prédio que veio a constituir
objeto da verba n.º 31 (após reclamação) - 42.480,00€ - já tinha sido
atribuído pela Autoridade Tributária em 9/1/2013, ou seja, ainda antes
da última relação de bens apresentada pela R. M..., do despacho que não
excluiu o bem imóvel da partilha e de todas as operações de partilha
subsequentes.
31)
R. M... procedeu ao registo do predito imóvel em seu nome, usando como
título os seguintes documentos do dito inventário: auto de compromisso
de honra e declarações de cabeça de casal (fls. 14 e 15), relação de bens
(fls. 103 a 108), mapa de partilha (fls. 132 a 134), auto de sorteio (fls.
142 e 143) e sentença homologatória (fls. 146), omitindo perante a
Conservatória do Registo Predial (e em momento prévio também perante
a Autoridade Tributária) a sentença de remessa para os meios comuns
referida supra.
32)
O aqui A. A... foi citado para esta ação em 11/2/2015.
33)
Na referida ação, este foi o único bem partilhado que a aqui R. M...
reivindicou.
34)
O aqui A. A... contestou, por exceção e impugnação, e reconveio,
aproveitando aquela ação para requerer a apreciação da propriedade do
imóvel, pretendendo, assim, posteriormente, com a respetiva sentença,
proceder a uma nova partilha, em substituição da anteriormente feita.
35)
A M... replicou, escudando-se na exceção de caso julgado.
36)
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Findos os articulados, foi realizada tentativa de conciliação a


10.11.2015, naquele processo n.º ..., com o objetivo de resolver a questão
prévia que ali se coloca, através da emenda da partilha por acordo das
partes, o que não foi obtido.
37)
Após 10.11.2015, no referido processo n.º ..., por despacho de
02.02.2016, foi determinada a suspensão da respetiva instância, em
função da propositura da presente ação de emenda da partilha,
considerada causa prejudicial em relação àquela, dando, ainda assim,
conta de que o sorteio do imóvel objeto da dita verba n.º 31 se tinha
devido a lapso.
38)
O aqui A... continuou a residir na casa de morada de família, como
sempre residiu, sendo que a M... a tinha já abandonado em julho de 2011,
conforme consta dos factos 3.6. e 3.7. dados como provados naquela
sentença.
Factos não provados:
B)
O aqui A. A... só em 11.02.2015 é que tomou conhecimento de que o bem
que constituía a verba n.º 31 (após a decisão de 21.01.2013), do apenso
B) tinha sido partilhado no inventário.
V - De acordo com o disposto no artº 1386.º, nº 1, do pretérito CPC, “a
partilha ainda depois de passar em julgado a sentença pode ser
emendada no mesmo inventário por acordo de todos os interessados ou
dos seus representantes, se tiver havido erro de facto na descrição ou
qualificação dos bens ou qualquer outro erro susceptível de viciar a
vontade das partes.”.
Prevendo a verificação de algum dos casos previstos no artº 1386.º, nº 1,
sem que, contudo, haja o mencionado acordo, dispõe o nº 1 do artº 1387º
do CPC que a emenda pode “...ser pedida em acção proposta dentro de
um ano, a contar do conhecimento do erro, contanto que este
conhecimento seja posterior à sentença.”.
A emenda da partilha, na falta de acordo dos interessados, tem, assim, de
radicar num erro de facto na descrição ou qualificação dos bens, ou
qualquer outro erro susceptível de viciar a vontade das partes, sendo que,
neste último caso haverá que exigir, como se diz no acórdão da Relação
de Lisboa, de 03 de Outubro de 2013 (Apelação nº 136-B/1992.L2-2)[4],
que o erro que fundamenta o pedido apresente as «[…] características
que o tomariam relevante como erro-vício da vontade: essencialidade ou

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causalidade, propriedade e escusabilidade ou desculpabilidade […]»,


para o que cumpre ao Autor a alegação da respectiva matéria de facto.
E mais se diz, com toda a propriedade, nesse Acórdão de 3/10/2013:
«[…] O "erro susceptível de viciar a vontade das partes" será um erro
subjectivo, que, por razões pessoais, que respeitam exclusivamente a
determinado interessado, levam a que este tome determinada decisão que
não tomaria se o erro não existisse. […]».
Importa lembrar, também, que, com a emenda da partilha, não se
confunde a anulação da partilha (artº 1388), nem a “nova partilha”,
prevista no artº 1385 do CPC.
Efectivamente, conforme se salienta no Acórdão do STJ de 3 de Junho de
2003 (Revista nº 03A1607)[5] «[…] ao pretender a anulação da partilha
está-se a pedir que, a proceder, ela não se mantenha, seja invalidada;
porém, quando, de imediato, se pede que ela seja emendada contradiz-se,
pois, a proceder, a partilha mantém-se e apenas é corrigida onde deve ser
corrigida.
Na realidade, pela anulação não se emenda a partilha e, in casu, torna-se
patente, ao acrescentar - «já que houve erro na valoração dos mesmos»,
que a pretensão do autor não é poder vir a tornar-se proprietário
exclusivo de certos bens mas receber um maior quantitativo de tornas e,
caso não sejam prestadas, poder exercer um dos direitos que a lei
concede em tal situação. Não é a invalidade mas a emenda que o autor
persegue com esta acção. […]».
O que se acabou de dizer está em consonância com o entendido no citado
Acórdão da Relação de Lisboa de 3/10/2013, onde se escreveu:
«[…] Na acção de emenda da partilha não está em causa qualquer
reapreciação crítica dos actos praticados no decurso do inventário já
findo,[6] mas apenas apurar se um acto, específico e determinado, do
processo - a partilha - padece ou não de alguma das deficiências ou
irregularidades tipificadas nos artigos 1386º e 1387º do CPC.
Tais irregularidades deverão ser sanadas, tanto quanto possível, sem pôr
em causa a validade e eficácia da partilha globalmente realizada, cujos
efeitos, em princípio, se manterão, já que o acto não é objecto de
anulação. […]».
Neste mesmo sentido foi o Acórdão do STJ de 25/02/2010 (Revista nº
399/1999.C1.S1)[7], onde se pode ler: «[…] objecto e típica
funcionalidade da acção de emenda da partilha não se traduz numa
reapreciação crítica dos actos praticados no decurso do inventário já
findo, mas apenas em apurar se um acto, específico e determinado, do
processo - a partilha - padece ou não de alguma das deficiências ou
irregularidades tipificadas nos arts 1386º e 1387º do CPC: erro na
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descrição ou qualificação dos bens partilhados ou outro erro susceptível


de viciar a vontade das partes - que deverão ser sanadas, tanto quanto
possível, sem pôr em causa a validade e eficácia da partilha globalmente
realizada, cujos efeitos se deverão, em princípio manter, já que o acto
não é objecto de anulação. […]».
Ora, no presente caso, embora pedindo, também (já que, tirando o
formulado sob a alínea d)), não apresenta os restantes pedidos em termos
subsidiários) que a partilha fosse emendada, invocando para o efeito o
disposto no artº 1387º do CPC, o que na realidade pretendeu o Autor, em
via principal, não foi uma verdadeira emenda, tal como esta foi acima
definida, nem o erro que invoca para esse efeito integra qualquer um
daqueles que acima se enunciaram como hábeis a esse escopo.
Na verdade, o que o Autor pretende, efectivamente, apesar da forma
como denomina a acção e dos termos que utiliza na alínea c) do petitório,
não é que a partilha se mantenha, embora que corrigida, mas antes que
seja declarado ineficaz o despacho de fls 129 e todo o processado
posterior no processo de inventário (al. a)), que seja excluído dos bens a
partilhar o prédio relacionado sob a verba n.º 31 da relação de bens de
fls. 103 e seguintes, e que se refaça o mapa da partilha, elaborando-se
novo sorteio e proferindo-se nova sentença homologatória.
Para o efeito o autor invoca, não um erro de facto, um "erro na descrição
e qualificação dos bens", nem um "erro susceptível de viciar a vontade
das partes", mas sim um lapso no despacho de fls. 129, “...na parte que
não exclui dos bens a partilhar a verba n.º 31 da relação de bens de fls.
103 e seguintes”, o que consubstancia, embora o Autor assim o não
crisme, um erro de julgamento, ou, no mínimo, uma nulidade processual,
a que foi dada cobertura pela sentença homologatória da partilha.
É certo que o Autor, em termos subsidiários, pede (alínea d)) que “...seja
alterado o valor de tal verba n.º 31 para 42.480,00€, correspondente ao
seu valor patrimonial tributário...”, mas, depois, pede, também, que se
elabore novo sorteio e se profira nova sentença homologatória.
Ora, pedindo o Autor, ao abrigo desta alínea do pedido, que se elabore
novo sorteio, depois de alterado o valor da verba n.º 31, significa que, na
realidade, não é a atribuição à Ré do bem que integra tal verba que
coloca em causa - pois que essa atribuição pode também vir a ocorrer no
novo sorteio que o Autor pretende que se realize.
Então, a divergência do Autor, à luz do peticionado nesta alínea, em face
do resultado a que se chegou no inventário, reconduz-se, na prática, ao
montante de tornas que lhe coube, por contraposição com aquilo que
poderá vir a ter direito em função da rectificação do valor da referida
verba n.º 31.

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Atente-se, porém, no que se diz no citado Acórdão do STJ de 25/02/2010:


«[…] não pode considerar-se, de forma generalizada, que a mera
circunstância de o valor-base atribuído originariamente a certo bem no
inventário não coincidir com o valor venal ou real desse bem constitui
«erro de facto na descrição ou qualificação dos bens» que - sem mais -
imponha a emenda da partilha efectuada - cumprindo aos interessados o
ónus de corrigir, na pendência do processo, tal valor, quando considerem
que o mesmo não retrata a realidade, através dos instrumentos que a lei
de processo em vigor lhes faculta.
Resta saber se a situação de erro «subjectivo» do interessado acerca do
valor real do bem, viciando a sua vontade em termos de o levar a abster-
se de desencadear os procedimentos adequados à correcção do defeito da
originária avaliação, poderá enquadrar-se na segunda parte do
preceituado no citado art. 1386º, nº 1, do CPC.[…]».
E já João António Lopes Cardoso dizia[8]:«[…] Como erro de facto na
descrição considera-se toda a descrição que não corresponda a verdade,
designadamente a descrição dum prédio urbano por um rústico, um
móvel por imóvel ou, dentro de cada uma destas categorias, quando
tenha sido descrito como de três andares um prédio de um andar único,
ou uma quinta por um terreno de centeeiro, ou vícios ocultos da coisa ou
falta de conteúdo ou extensão.
Estes erros (na descrição ou na qualificação) operam por si mesmos, isto
é, não/se torna necessário alegar e provar quaisquer outros requisitos
para, com base neles, peticionar a emenda, porquanto viciam gravemente
o objectivo que a partilha se propõe alcançar (...).
Já não assim nos demais erros de facto (v. g. estar o requerente na
ignorância da extensão, natureza e características e valor (...) dos bens
inventariados), erros que recaem sobre a qualidade dos mesmos bens (...)
e assim, sujeitos à regra do art. 1386º-1, in fine. Nesse caso torna-se
mister alegar e provar os requisitos gerais e especiais desse erro, nos
precisos termos dos arts 247.º e seguintes do Código Civil […]»[9].
Ora, no caso “sub judice”, relativamente ao prédio urbano relacionado
sob essa verba nº 31, não há, salvo o devido respeito, alegação hábil a
conduzir à conclusão de que o Autor, na altura em que tal bem assim foi
relacionado, desconhecia que o valor que aí foi dado a esse bem não era
o seu valor real, v.g., aquele que ora defende lhe seja atribuído; ou seja,
que o Autor ignorasse, então, que o valor desse prédio fosse mais
elevado, e que não fora esse desconhecimento teria procedido de outra
forma relativamente àquele bem.
O já assente na presente acção transmitirá, aliás, o contrário, mesmo que
se considere que a Ré, quando apresentou a segunda relação de bens, em
que relacionou o dito prédio sob a verba nº 31, pelo valor de 7.144,06€,

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tinha conhecimento de que, a esse prédio, já tinha sido atribuído pela


Autoridade Tributária, em 9/1/2013, o valor patrimonial tributário de
42.480,00€ (esse conhecimento não está, efectivamente, adquirido no
processo, pois o que se deu como assente apenas comprova que a
Autoridade Tributária, em 9/1/2013, atribuiu ao prédio o valor
patrimonial tributário de 42.480,00€ e que na acção de reivindicação que
a Ré intentou em 6/2/2015 descreveu o prédio atribuindo-lhe este valor -
cfr. nºs 27) e 29) dos factos provados).
Desde logo, o conhecimento, por parte do Autor, ainda no decurso do
inventário, de que o prédio em causa teria valor superior àquele pelo
qual foi relacionado, é pressuposto na seguinte afirmação constante da
petição que apresentou nesta acção:
“O A... não contestou naquela ação a descrição e o valor atribuídos pela
M... daquele bem porque o mesmo não ia ser partilhado.”(17).[10]
Saliente-se, também, que o ora Autor não apresentou, na pendência do
inventário, qualquer reclamação, ou assumiu alguma divergência, quanto
ao valor pelo qual o prédio em causa sempre foi relacionado no
inventário (cfr. nº 17 dos factos provados) sendo certo que é o Autor
quem sempre residiu nesse prédio, que a Ré deixou em julho de 2011 (nº
38) dos factos provados).
Assim, não se encontrando, pelo que antes se deixou exposto, verificados
os pressupostos da emenda da partilha, sempre este pedido subsidiário
teria de improceder, o que tornaria despicienda a análise da questão da
caducidade da acção, conclusão que se adianta desde já, embora que o
seu efeito útil só se alcance depois de demostrado, como procurará fazer-
se, que os pedidos formulados pelo Autor em via principal, também não
podem proceder.
Como se viu, os pedidos principais - os formulados sob a alíneas a), b) e
c) - não se enquadravam na emenda da partilha.
No saneador-sentença, referindo-se a questão da caducidade da acção e
imediatamente antes de se afirmar a procedência dos pedidos principais,
escreveu-se[11]: «[…] no caso dos autos, o aqui A. nunca esteve em erro
quanto a entender que o imóvel em causa não deveria ser partilhado,
tendo, pois, reclamado contra a relação de bens inicial e, por despacho
que forma caso julgado formal, para efeitos do então art. 672° do
CPC[12], ficado ciente que a questão não seria resolvida no apenso B).
Eis porque não se nos afigura necessário produzir prova sobre, desde
logo, a condicionante temporal dos presentes autos, a saber o prazo de
caducidade da propositura da presente ação.
Ainda assim, nos termos das normas dos arts. 5°, n.° 3[13], e 547.°[14],
ambos do CPC, porque os pedidos formulados nesta ação se ajustam à
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causa de pedir prevalecente neste imbróglio processual - violação do


caso julgado formal de que gozava a decisão de 21.01.2013, pela decisão
de 17.06.2013 -, decide-se em conformidade com essa sintonia,
abstraindo da qualificação do expediente processual (ação de emenda da
partilha).
E nem se objete com a prolação de decisão surpresa, pois que os pedidos
e causa de pedir ajuizados percorrem a argumentação do aqui A. desde a
ação de reivindicação e repetem-se integralmente nesta ação, sobre os
quais a aqui R. se pronunciou.[…]».
E depois deixou-se um anúncio, em jeito de aviso.
«[…] Mas - caso impressione, pela negativa, a adequação formal que
preconizamos - ainda vislumbramos, pelo menos, mais uma via para
desatar o nó a que o lapso ocorrido no despacho de 17.06.2013 deu
origem, a saber, o conhecimento, aí, desse mesmo lapso, ao abrigo do
disposto no art. 667º, n.º 1, do CPC, na versão aplicável.
Suspendemos, porém, este último recurso, em função da sorte que estes
autos tomarem, após a presente sentença. […]».[15]
Ora, comecemos por esta última parte da transcrição que se acabou de
fazer, para esclarecer o que se segue.
O artº 667º do pretérito CPC (correspondente ao artº 614º do NCPC),
epigrafado “Rectificação de erros materiais”, preceituava no seu nº 1:
“Se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas, ou
contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas
a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples
despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do
juiz.”.
A rectificação possível de erro de escrita de que enferme uma decisão
(seja um despacho, uma sentença ou um acórdão), à sombra do disposto
no citado artº 667º, nº 1, depende da circunstância de esse erro resultar
de lapso manifesto, que se evidencie com absoluta clareza do contexto da
declaração ou das circunstâncias em que a declaração é feita.[16]
E é isso que explica que se nenhuma das partes interpuser recurso da
decisão a rectificação possa “…ter lugar a todo o tempo”, ou seja,
mesmo depois do respectivo trânsito em julgado - nº 3 do referido artº
667º -, não havendo, assim, com a correcção do lapso manifesto, ofensa a
qualquer caso julgado.
E não há uma tal ofensa porque a definição legal do erro material é tal
que não a permite. De modo que, apresentando-se um erro cuja
rectificação implica uma real alteração da decisão, o que há a concluir é
que, sem embargo de se admitir poder ter existido erro, este não reúne as

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condições a poder ser entendido como um erro material rectificável, nos


termos do citado artº 667º.
Pode concluir-se, assim, que se há mero erro material rectificável, não há
erro de julgamento e, consequentemente, se se afirma este último -
alicerçando-o, v.g., na violação de caso julgado - exclui-se,
necessariamente, a verificação do primeiro.
Importa, em seguida, esclarecer uma outra questão.
Está assente que por decisão de 21/1/2013, proferida nos autos de
inventário, o Tribunal determinou a remessa dos interessados para os
meios comuns quanto à propriedade do bem relacionado sob a verba n.º
30 e, em consequência, decidiu manter o mencionado bem na relação de
bens, ao abrigo do disposto no art. 1350º, n.º 2, do CPC [ponto 14), dos
factos provados].[17]
Esclareça-se que as “acções competentes” ou os “meios comuns” a que
se reportam os artºs 1336, nºs 1 e 2, 1350º, nºs 1 e 3 e 1351, nº 2, do
CPC, variam, consoante a questão que esteja em causa e que não se
mostre conveniente decidir no processo de inventário. Daí que esse meio
processual possa ser, por exemplo, uma acção de reivindicação, ou, mais
genericamente, uma acção de reconhecimento do direito propriedade.
Ora, consignou-se na matéria de facto provada:
«[…] 26)
Não foi proposta a ação judicial, nos “meios comuns”, para aferir da
propriedade do bem imóvel inicialmente relacionado no apenso B) sob a
verba 30.
27)
Ora, em 6/2/2015 a R. M... propôs contra o A... uma ação judicial de
reivindicação do dito imóvel, sob o n.º ..., descrevendo-o como “casa de
habitação de r/c e logradouro, sita na Rua ..., com a área total de 663m2,
área coberta de 180m2 e área descoberta 483m2 inscrita na matriz
predial urbana sob o art. ... e descrita na competente Conservatória do
Registo Predial, sob o nº ... e com o valor patrimonial de 42.480,00€”.
(...)
34)
O aqui A. A... contestou, por exceção e impugnação, e reconveio,
aproveitando aquela ação para requerer a apreciação da propriedade do
imóvel, pretendendo, assim, posteriormente, com a respetiva sentença,
proceder a uma nova partilha, em substituição da anteriormente feita.
[…]».

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Ora, o exarado no ponto 26), só se pode compreender, sob pena de estar


em contradição com o consignado nos pontos nºs 27) e 34), quando
reportada a não propositura da acção judicial a período temporalmente
anterior à instauração da acção n.º ..., pois que esta é, precisamente, a
acção idónea a resolver, nos “meios comuns”, a questão da propriedade
do imóvel em causa, como o atestam os pedidos aí formulados na petição
e na reconvenção.
Lembre-se que, no caso, conforme vem assente, não foi apresentada
reclamação, nem recurso, da decisão de 21/1/2013, proferida nos autos
de inventário, em que o Tribunal determinou a remessa dos interessados
para os meios comuns quanto à propriedade do bem relacionado sob a
verba n.º 30 e em que se decidiu manter o mencionado bem na relação de
bens, ao abrigo do disposto no art. 1350º n.º 2 do CPC, tendo-se que
concluir, pois, que, relativamente a essa decisão se constituiu caso
julgado formal.
Sendo usual apontar como fundamentos do caso julgado material razões
de segurança jurídica e de certeza do direito, bem como o prestígio da
justiça, já quanto ao caso julgado formal, em virtude do seu objecto se
restringir à relação processual, sem efeitos para além dos respectivos
autos, não se vê que se funde naqueles motivos, mas antes na necessidade
de disciplina ou ordem no desenvolvimento do processo.
Mas o escopo de evitar uma contradição prática de decisões, a prolação
de decisões concretamente incompatíveis, vale tanto para o caso julgado
material[18], como para o caso julgado formal.
A Apelante, na respectiva alegação de recurso, sustenta que a partilha
efectuada nos autos de inventário em causa foi homologada por sentença
com trânsito em julgado, o qual não foi respeitado pela sentença
recorrida. De facto, tem inteira razão, como adiante se procurará
demonstrar.
Em primeiro lugar importa esclarecer que, do acima exposto resulta, que
com o trânsito da decisão de 21/1/2013 se constituiu caso julgado formal,
quer quanto à remessa dos interessados para os meios comuns, para aí se
definir a questão da propriedade do bem relacionado sob a verba nº 30
(depois 31), quer quanto a dever este bem permanecer relacionado no
inventário, pelo que duas conclusões se retiram daqui:
A primeira conclusão, que nos parece óbvia, é a de que, sob pena de
violação do referido caso julgado, a questão da definição, em definitivo,
do titular do direito de propriedade do bem relacionado não pode ser
resolvida nos autos de inventário, nem em acção, apensa ou não a estes,
que não tenha com escopo a definição dessa titularidade.
A segunda conclusão é a de que, em princípio, a decisão que determina
que o bem em causa permaneça relacionado implica que, sem violação
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do caso julgado que se constituiu relativamente a ela, não se possa


decidir a exclusão desse bem do inventário, a não ser que essa exclusão
seja motivada pela decisão proferida nos meios comuns para onde
tenham sido remetidos os interessados e que haja reconhecido, em
termos definitivos, que o direito de propriedade desse bem, cuja indevida
relacionação se invocou, pertence em exclusivo a quem isso reclamou,
assim se demonstrando não fazer parte do acervo de bens a partilhar.[19]
Significa isto, “per se”, que na sentença ora recorrida, proferida numa
acção, dita de “emenda da partilha”, mas em que também se pede, com
fundamento no caso julgado formado quanto à decisão de 21/1/2013,
proferida noutros autos (os de inventário), a ineficácia de um outro
despacho - o de 17/6/2013 (fls. 129 desse inventário) -, também
transitado em julgado, proferido nesses outros autos, bem como a
ineficácia de todo o processado desse processo, posterior a esse
despacho de 17/6/2013, não se podia, sob pena de violação do caso
julgado formado por essa própria decisão de 21/1/2013, determinar,
como foi o caso, “a exclusão do prédio relacionado sob a verba n.º 31 da
relação de bens de fls. 103 e seguintes, do apenso B)...”, bem esse, que
aquele despacho havia decidido, precisamente, que permanecesse
relacionado.
Aliás, uma vez que a apensação da presente acção aos autos de
inventário só tem arrimo em função do pedido de emenda (artº 1387º, nº
2, do CPC), o fundamento da decisão recorrida, já que é um outro - a
violação do caso julgado formado por despacho anteriormente proferido
nos autos a que a acção está apensa -, não consubstancia motivo que
legitime o Juiz que julga essa acção, a contrariar, declarando ineficaz,
despacho proferido nesses outros autos e o processado posterior a ele,
ainda não se verificasse nesse processo, a obstá-lo, o caso julgado.
O Autor sustenta que o despacho de 17/6/2013, proferido a fls. 129 dos
autos de inventário, violou, “...na parte que não exclui dos bens a
partilhar a verba n.º 31 da relação de bens de fls. 103 e seguintes”, o
caso julgado formado pela decisão de 21/1/2013, não devendo o prédio
em causa nessa verba ter sido objecto de partilha, entendimento este que
foi acolhido pelo Tribunal “a quo” na sentença recorrida.
Embora não seja essencial à decisão do recurso - como se explicitará
adiante -, a questão de saber se na partilha efectuada nos aludidos autos
de inventário a verba em causa devia ou não ter sido incluída, sempre
diremos, embora que sinteticamente, o que se nos afigura quanto a essa
matéria.
Em primeiro lugar afigura-se que a inclusão, na partilha, de um bem,
relativamente à titularidade do qual as partes foram remetidas para os
meios comuns, tendo o Tribunal, no entanto, determinado,
concomitantemente, nos termos do artº 1350º, nº 1, do CPC, que esse bem
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permanecesse relacionado, estando em consonância com essa decidida


permanência, não contraria o caso julgado dessa decisão, na parte em
que determinou que a apontada titularidade fosse discutida nos meios
comuns, já que não implica o conhecimento dessa titularidade.
Em segundo lugar, embora se reconheça não existir uniformidade de
entendimento quanto à inclusão na partilha de bens cuja discussão sobre
a respectiva titularidade foi relegada para os meios comuns,
permanecendo, no entanto, relacionados, tudo nos termos do citado artº
1350º, nº 1, há uma forte corrente jurisprudencial que, a propósito dessa
questão específica, ou relativamente aqueloutra da suspensão do
inventário com base na prejudicialidade da resolução, nos meios comuns,
da titularidade desses bens, que vai no sentido de que a dita remessa
para os meios comuns não obsta à respectiva partilha[20], considerando,
uns, que esta deve ter-se como provisória - sendo de observar as cautelas
previstas no artigo 1384.º nº 1 al. a), do CPC, no que concerne à entrega
aos interessados dos bens que lhes couberem e que estiverem em
causa[21] -, enquanto que, segundo outros, deve, nessa hipótese,
consignar-se na relação de bens e no mapa de partilha que os bens a que
se reportam as verbas em causa têm carácter litigioso.[22]
Pode suceder, de facto, que só depois de transitada em julgado a sentença
homologatória da partilha se venha a reconhecer, v.g., mediante a
sentença proferida em acção intentada nos meios comuns, para onde
tenham sido remetidos os aí interessados, que foi partilhado um bem que
não fazia parte do acervo a partilhar, incluindo o caso em que se
reconhece tal bem como pertencente a terceiro, situação esta cuja
solução suscita divergências.
Já se tem entendido que, tendo plena aplicação o regime estabelecido no
artº 2123º do Código Civil - incluindo, por analogia, ao inventário para
separação de meações - a partilha é nula, na parte em que incidiu sobre
bem que se veio a apurar não pertencer ao acervo a partilhar[23] (ou
sobre bens inexistentes).[24]
Diferentemente, no Acórdão do STJ de 08 de Julho de 1997 (Revista nº
97A154), relatado pelo Exmo. Cons. Machado Soares, defendeu-se que
após a decisão proferida nos meios comuns se pode lançar mão da
emenda da partilha.
De todo o modo, esta problemática não está agora em causa no presente
recurso, sendo de passar a expor o que, de facto, constitui o obstáculo
intransponível para o entendimento expendido na decisão recorrida e
que veio a conduzir à procedência dos pedidos formulados pelo Autor em
via principal, obstáculo esse que é, afinal, a verdadeira causa da
procedência que se irá conceder à Apelação e, consequentemente, da
revogação da decisão impugnada.

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Como já se lembrou, o Tribunal “a quo”, na sentença ora recorrida,


proferida numa acção, que, com o fundamento na violação de caso
julgado formal, nada tem de “emenda da partilha”, não podia, como fez,
determinar “a exclusão do prédio relacionado sob a verba n.º 31 da
relação de bens de fls. 103 e seguintes, do apenso B)...”.
Mas também não podia o Tribunal “a quo”, nessa acção, ainda que com
o fundamento da violação do caso julgado formal constituído pela
decisão de 21/1/2013, proferida nos autos de inventário, declarar a
ineficácia de um outro despacho proferido nesse processo, também ele
transitado - o despacho fls. 129 - bem como a ineficácia todo o
processado desses autos de inventário, posterior a esse despacho,
incluindo, pois, a sentença homologatória da partilha, também esta
transitada em julgado.
Vejamos.
Verificada, com o trânsito em julgado, a insusceptibilidade de a sentença
ser objecto de reclamação ou de recurso ordinário (artº 628º do NCPC),
forma-se caso julgado, que tem como efeitos, como se diz no Acórdão
desta Relação de 20/10/2015 (Apelação nº 231514/11.3YIPRT.C1)[25]
(Relatora: Des. Maria Domingas Simões) “...a impossibilidade de
qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir
pronúncia sobre a questão decidida - efeito negativo - e a vinculação do
mesmo tribunal e eventualmente de outros, estando em causa o caso
julgado material, à decisão proferida - efeito positivo do caso julgado.”.
O caso julgado impossibilita, pois, não só que se emitam decisões que
contrariem a sentença transitada em julgado, como, também, que
contrariem ou impliquem a alteração dos despachos e demais processado
que culminou com essa sentença (artºs 620º e 625º, do NCPC)[26].
Na verdade, conforme se diz no Acórdão do STJ de 06 de Maio de 2004
(Revista nº 04B1291)[27], citando Miguel Teixeira de Sousa[28] «[…] "o
caso julgado da decisão também possui um valor enunciativo: essa
eficácia de caso julgado exclui toda a situação contraditória ou
incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada. (...).
Além disso, está igualmente afastado todo o efeito incompatível, isto é,
todo aquele que seja excluído pelo que foi definido na decisão transitada"
[…]».
Assim, ainda que desconforme com o direito aplicável, a sentença
transitada em julgado, impera em absoluto, dizendo-se, por isso, que faz
do “branco, preto” e “do quadrado, redondo” - passe esta expressão,
digamos, em tradução livre, do adágio latino “facit de albo nigrum, de
quadrato rotundum”, utilizado para vincar a força da sentença
transitada em julgado.

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28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

Sendo, em regra, a sentença transitada em julgado, apenas passível de


modificação - se reunidos os respectivos pressupostos - mediante o
recurso de revisão, pode, no entanto, a partilha efectuada em inventário e
ainda que homologada por sentença transitada, ser emendada, por
acordo ou sem ele (artigo 1386.º e 1387.º, do CPC), ou ser anulada (artº
1388º do CPC).[29]
Ora, a acção em causa, no que respeita aos pedidos principais
formulados pelo Autor, não pode ser considerada, como vimos, como de
emenda da partilha, nem se enquadra, evidentemente, em qualquer dos
restantes meios processuais acima apontados.
Também já se viu que o despacho de fls. 129 em nada contraria a decisão
de 21/1/2013, pelo que a circunstância de ter sido proferida sentença
homologatória da partilha, que transitou em julgado, houvesse ou não
razão, por parte do Autor, quanto a não dever ser partilhado o prédio em
causa, seria suficiente para obstar à procedência dos pedidos formulados
em via principal.
Significa isto que, contrariando o caso julgado formado pela sentença
homologatória da partilha, os pedidos formulados pelo Autor sob as
alíneas a) e c) - e também o efectuado na alínea b), já que dependente da
procedência do pedido efectuado na alínea a) -, não podiam ser
atendidos, devendo a Ré, quanto a eles, por força dos disposto nos artºs
576º, nº 2, 577º i) e 578º, do NCPC, ser absolvida da instância, pelo que
só com patente desrespeito, por parte do Tribunal “a quo”, do apontado
caso julgado, foi possível a procedência dada na sentença ora impugnada
a esses pedidos, o que implica que essa procedência não possa subsistir.
Decididos, assim, os pedidos principais, resta concluir que o pedido
subsidiário formulado sob a alínea d), embora que por razões diferentes,
que já mais acima ficaram expostas, também improcede, devendo a Ré
ser absolvida desse pedido.
A acção improcede, pois, “in totum”.
VI - Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da
Relação em, na procedência da apelação, revogar o saneador-sentença
recorrido e, julgando a acção improcedente, absolver a Ré da instância
relativamente aos pedidos formulados em via principal, sob as alíneas
a), b) e c), absolvendo-a do pedido efectuado na alínea d) da petição
inicial.
Custas a cargo do Apelado.
Coimbra, 07 de Março de 2017
(Luiz José Falcão de Magalhães)
(António Domingos Pires Robalo)
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(Sílvia Maria Pires)

[1] Segue-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa de 1990, respeitando-se, em caso de transcrição, a grafia do
texto original.
[2] Aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho e entrado em vigor em
01/09/2013.
[3] Acórdão do STJ, de 06 de Julho de 2004, Revista nº 04A2070, embora
versando a norma correspondente da legislação processual civil pretérita,
à semelhança do que se pode constatar, entre outros, no Ac. do STJ de
13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e no Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º
07B3586, todos estes arestos consultáveis em
“http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase”.
[4] Acórdão consultável tal como os demais da Relação de Lisboa que
forem citados sem menção de origem, no endereço
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf?OpenDatabase, relatado pela Srª Des. Ondina
Carmo Alves.
[5] Relator: Cons. Lopes Pinto.
[6] O sublinhado é nosso.
[7] Relator: Cons. Lopes do Rego.
[8] Partilhas Judiciais, vol. II, Coimbra 1980, págs. 524 e 525.
[9] O sublinhado é nosso.
[10] Sublinhado nosso.
[11] A transcrição vai acompanhada das respectivas notas de rodapé,
embora que, por razões óbvias, sem manterem a numeração que têm no
texto original.
[12] Correspondente ao atual art. 620°, do CPC.
[13] Com o seguinte teor: “3 - O juiz não está sujeito às alegações das
partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de
direito”
[14] Com o seguinte teor: “O juiz deve adotar a tramitação processual
adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos
atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo
equitativo”.
[15] Sublinhado agora, no presente Acórdão.
[16] Cfr., v.g., Acórdão do STJ de 26/11/2015, Revista nº
706/05.6TBOER.L1.S1 (Relatora: Cons. Maria dos Prazeres Beleza e o
Acórdão do STJ, de 12 de Fevereiro de 2009, Revista nº 08A2680,
relatado pelo Cons. Sebastião Póvoas.
[17] Tenha-se em consideração que o prédio a que se referia esta verba nº
30, veio, depois, a ser relacionado sob a verba nº 31.
[18] Prof. Manuel de Andrade, in, Noções Elementares de Processo Civil,
Coimbra Editora - 1979 - págs. 317 e 318.
[19] Cfr. Acórdão desta Relação de Coimbra, de 09/11/2007 (Apelação nº
48/03.3TBFIG.C1), relatado pelo ora Cons. Hélder Roque.
[20] Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 28/04/2016, Apelação nº 359-
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09.4TBSRQ.L1-2 (Relatora: Des. Maria José Mouro).


[21] Acórdão desta Relação de Coimbra de 06/12/2012, Apelação nº
59/07.0TBCNT.C1 (Relator: Des. Carlos Moreira).
[22] Citado Acórdão desta Relação de Coimbra, proferido nos autos nºs
48/03.3TBFIG.C1;
[23] Cfr. Rabindranath Capelo de Sousa, in “Lições de Direito das
Sucessões”, II vol., 2.ª edição, Coimbra Editora - 1986 – págs. 369 e 370.
[24] Assim e admitindo uma tal analogia, embora abordando uma
situação, não, propriamente de partilha e bens de terceiro, mas de bens
inexistentes, cfr. o “supra” citado Acórdão do STJ, de 25/02/2010
(Revista nº 399/1999.C1.S1).
[25] Consultável tal como os demais da Relação de Coimbra que forem
citados sem menção de origem, no endereço http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf?
OpenDatabase
[26] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 23/09/2003 (2ª
Subsecção do CA, Processo nº 01344/02), consultável em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf?OpenDatabase.
[27] Relator: Cons. Fernando Araújo de Barros.
[28] In "Estudos Sobre o Novo Código de Processo Civil", Lisboa, 1997,
pág. 579.
[29] Acórdão desta Relação de Coimbra, de 29/01/2013, Apelação nº
804/06.0TMCBR-G.C1 (Relatora: Des. Maria José Guerra).

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Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


Processo: 3457/16.4T8PBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: INVENTÁRIO
RELAÇÃO DE BENS
INCIDENTE DA RECLAMAÇÃO
REMESSA PARA MEIOS COMUNS
SUSPENSÃO DO INVENTÁRIO
Data do Acordão: 27-04-2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - POMBAL - JL CÍVEL - JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS. 16, 32 RJPI ( LEI Nº 23/2013 DE 5/3)
Sumário: I -A reclamação contra a relação de bens é processado de cariz
incidental, e, assim, pretendendo-se célere e tendencialmente
preclusivo, sendo que, após a audiência preparatória, fica, em
princípio, vedado aos interessados colocá-la em crise – artº32º nº5 do
RJPI.
II - O acordado pelos interessados na conferência preparatória,
designadamente quanto à composição dos quinhões e ao
reconhecimento das dívidas, vincula-os definitivamente, salvo a
superveniência de factos novos.
III - A impugnação da validade de uma doação por o doador não ter
a disposição do bem doado e ter incapacidade mental que o impediu
de intuir a natureza e alcance do ato, é matéria que, pela sua
complexidade factual e jurídica, não pode ser dilucidada pelo Sra.
Notária no processado probatório sumário do inventário, mas antes
pelo Juiz nos tribunais comuns.

IV - A decisão nesse sentido pela Notária implica – salvo taxativas e


invocadas exceções - a suspensão dos termos do inventário, os quais
só podem reiniciar-se após aquela decisão do juiz - artº 16º nº1 e nº6
do RJPI.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA.


1.
A (…) instaurou processo de inventário para partilha de herança
deixada por óbito de L (…).
O processo seguiu com realização da conferência preparatória e
da conferência de interessados e com vicissitudes várias, vg.,
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quanto à exclusão/inclusão na relação de bens de dívidas e a


remessa dos interessados para os meios comuns quanto ao
pedido de sub-rogação do interessado requerente, e, mais tarde,
cabeça de casal, na posição de um credor da herança, por a sua
mãe, e viúva do de cujus, ter pago a este credor dívida da
herança, tendo ficado perante ela com um crédito que lhe foi
doado por esta, então, interessada.
A final foi proferida a seguinte decisão:
«Nestes autos de inventário ocorrido por óbito de L (…), falecido
em 4 de Dezembro de 2005, nos quais A (…) desempenha as
funções de cabeça-de-casal, homologo pela presente decisão a
partilha constante do mapa de fls. 480 a 482, adjudicando aos
vários interessados os respectivos quinhões, condenando-os
ainda no pagamento das dívidas por todos aprovadas.
Custas pelos interessados, na proporção do recebido (art.º 67.º,
n.º 1 da Lei n.º 23/2013, de 5 de Março).
Fixo o valor da causa em 304 300 €.»
2.
Inconformado recorreu o requerente cabeça de casal.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
(…)
Contra alegou a interessada C...., aduzindo os seguintes
argumentos finais:
(…)
4.
Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de
que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões
define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas
são as seguintes:
1ª – Alteração da partilha em função:
a)- da relacionação da verba 1 do activo da (última) relação de
bens: direito à posição contratual no contrato-promessa de compra
e venda celebrado com H (…) e mulher M (…) e que tem por
objecto um armazém, sito em (...) com a área de 1588 m2, a
confrontar do Norte com caminho, Sul com (…), Nascente com
estrada e Poente com (…), inscrito na matriz predial urbana da
freguesia de (...) , concelho de (...) sob o artigo 1691, com o valor
patrimonial de €24.649,70."
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b)- da determinação do pagamento da dívida a Herdeiros de G


(…), no valor de €10.000, relacionada sob a verba 2 do passivo,
aprovada por todos os interessados na conferência preparatória;
c)- da admissão da relacionação da dívida a A (…) no valor de
€60.000, sem qualquer condição;
d) da consideração do cabeça-de-casal como sub-rogado nos
direitos da credora Caixa de Crédito Agrícola Mútuo das Serras de
(...) , CRL, relacionada na verba 1 do passivo, nos montantes de
€7.466,77 e €550,80.
e) – da consideração do cabeça-de-casal como sub-rogado nos
direitos da credora Caixa de Crédito Agrícola Mútuo das Serras de
(...) , CRL, relacionada na verba 1 do passivo, no montante de
€15.643,34, paga à custa do património da mãe do cabeça-de-
casal, doado por esta àquele.
f) da aprovação das despesas/impostos suportados pelo cabeça-
de-casal com os bens da herança, no montante de €907,43.
2ª- Remissão, ou não, para os meios comuns.
3ª Em caso afirmativo, suspensão dos termos do inventário.
5.
Apreciando.
5.1.
Primeira questão.
5.1.1.
O processo de inventário destina-se a pôr termo à comunhão
hereditária.
Como processo que é, e como é apanágio de qualquer
normatividade adjetiva, ele destina-se a que tal fito seja
consecutido, não de qualquer forma e atribiliáriamente, mas antes
de uma maneira escorreita, racional, célere e com a maior
economia de meios possível.
Em função do que emergem, determinantemente, os magnos
institutos da lealdade e da boa fé processual, e, ainda, os
princípios do dispositivo, da auto responsabilidade e da preclusão.
Na verdade:
«O processo civil, por mais ou menos apreço que por ele se tenha,
é uma disciplina necessária a observar quer na instauração quer
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no desenvolvimento quer no conhecimento de um pleito.


Ainda que sem a rigidez do formalismo e o emperrar burocrático,
infelizmente comum a tantos organismos e instituições, há sempre
um mínimo a respeitar.
Tendo havido uma decisão, e dela não se havendo reagido com
êxito, nem se tendo reagido contra os valores da posterior
relacionação, não há lugar a deliberação da conferência nos
termos e para os efeitos do artº. 1353, n. 4, alíneas a) e c).» - Ac.
do STJ de 05.11.2002, p. 02A3262 in dgsi.pt.
Assim, e desde logo, tal processo encerra uma fase preliminar, de
cariz investigatório, na qual, e para além do mais, se deve fixar o
acervo – passivo e ativo – a partilhar.
Nesta conformidade estatuindo, vg., os artºs 32º, 35º 36º do
REGIME JURÍDICO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO aprovado
pela Lei n.º 23/2013, de 05 de Março:
32º
1 - Apresentada a relação de bens, todos os interessados podem,
no prazo previsto no n.º 1 do artigo 30.º,(20 dias) reclamar contra
ela:
a) Acusando a falta de bens que devam ser relacionados;
b) Requerendo a exclusão de bens indevidamente relacionados,
por não fazerem parte do acervo a dividir; ou
c) Arguindo qualquer inexatidão na descrição dos bens, que releve
para a partilha...
5 - As reclamações contra a relação de bens podem ainda ser
apresentadas até ao início da audiência preparatória, sendo o
reclamante condenado em multa, exceto se demonstrar que a não
pôde oferecer no momento próprio, por facto que não lhe é
imputável.
35.º
1 - Quando seja deduzida reclamação contra a relação de bens, é
o cabeça de casal notificado para, no prazo de 10 dias, relacionar
os bens em falta ou dizer o que lhe oferecer sobre a matéria da
reclamação.
2 - Se confessar a existência dos bens cuja falta foi invocada, o
cabeça de casal procede imediatamente, ou no prazo que lhe for
concedido, ao aditamento da relação de bens inicialmente

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apresentada, notificando-se os restantes interessados da


modificação efetuada.
3 - Não se verificando a situação prevista no número anterior, são
notificados os restantes interessados com legitimidade para se
pronunciarem, no prazo de 15 dias, aplicando-se o disposto no n.º
2 do artigo 31.º e decidindo o notário da existência de bens e da
pertinência da sua relacionação, sem prejuízo do disposto no
artigo seguinte.
36.º
1 - Quando a complexidade da matéria de facto ou de direito
tornar inconveniente, nos termos do n.º 2 do artigo 17.º, a decisão
incidental das reclamações previstas no artigo anterior, o notário
abstém-se de decidir e remete os interessados para os meios
judiciais comuns.
2 - No caso previsto no número anterior, não são incluídos no
inventário os bens cuja falta se acusou e permanecem
relacionados aqueles cuja exclusão se requereu.
3 - Pode ainda o notário, com base numa apreciação sumária das
provas produzidas, deferir provisoriamente as reclamações, com
ressalva do direito às ações competentes, nos termos previstos no
n.º 2 do artigo 17.º
Vemos, assim, que a reclamação da relação de bens assume-se,
ela própria, como um incidente da instância do inventário, no qual
as partes assumem as suas alegações e apresentam as provas,
tendencialmente apenas num articulado e em prazos que se têm
como suficientes para o exercício e defesa dos direitos dos
interessados.
E que existe um terminus ad quem, preclusivo, para as mesmas,
qual seja, o início da audiência preparatória.
Tanto assim que, só após serem «Resolvidas as questões
suscitadas que sejam suscetíveis de influir na partilha e
determinados os bens a partilhar, o notário designa dia para a
realização de conferência preparatória da conferência de
interessados » - Artº 47.º
Ora nos termos do Artigo 48.º
1 - Na conferência podem os interessados deliberar, por maioria
de dois terços dos titulares do direito à herança e
independentemente da proporção de cada quota, que a
composição dos quinhões se realize por algum dos modos
seguintes: …
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3 - Aos interessados compete ainda deliberar sobre a aprovação


do passivo e da forma de cumprimento dos legados e demais
encargos da herança.
4 - Na falta da deliberação prevista no n.º 1, incumbe ainda aos
interessados deliberar sobre quaisquer questões cuja resolução
possa influir na partilha.
5 - A deliberação dos interessados presentes, relativa às matérias
contidas no número anterior, vincula os demais que, devidamente
notificados, não tenham comparecido na conferência.
E nos termos do artº 17º:
1 -…, consideram-se definitivamente resolvidas as questões que,
no inventário, sejam decididas no confronto do cabeça de casal ou
dos demais interessados a que alude o artigo 4.º, desde que
tenham sido regularmente admitidos a intervir no procedimento
que precede a decisão, salvo se for expressamente ressalvado o
direito às ações competentes.
2 - Só é admissível a resolução provisória, ou a remessa dos
interessados para os meios judiciais comuns, quando a
complexidade da matéria de facto subjacente à questão a dirimir
torne inconveniente a decisão incidental no inventário, por implicar
a redução das garantias das partes.
Por conseguinte, tem de concluir-se que se não houver
reclamações quanto aos bens que compunham a universalidade
do património de cujus, tal questão encontra-se definitivamente
decidida entre os interessados.
Tanto assim é que:
«face ao disposto no nº1 deste artigo (1336 do CPC pretérito),
devem os interessados no inventário usar da maior cautela no
acompanhamento do inventário por forma a evitar que sejam
tomadas decisões implícitas…e tornadas definitivas…ou de não
ter sido ressalvado o direito às ações competentes» - Abílio Neto
in Breves Notas ao CPC, 2005, p.317
Por outro lado…
As declarações do cabeça de casal não beneficiam de qualquer
presunção de fidedignidade.
Consequentemente, elas apenas fazem fé em juízo até serem
impugnadas.
Uma vez impugnadas compete ao cabeça de casal fazer a prova
do que afirmou, valendo as regras gerais da distribuição do ónus
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da prova.
Aliás, relativamente a factos sujeitos a prova documental ou
específica, as declarações não têm valor sem a apresentação dos
respetivos documentos ou títulos, vg. testamentos, convenções
antenupciais, escrituras de doação, estados de demência ou
ausência, etc. – cfr. Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, 3ª ed.
vol.1º, p.301 e sgs. e Ac. da Relação de Coimbra de 26.04.89,
BMJ, 386º,523 e Ac. da Relação de Lisboa de 16.01.2007,
dgsi.pt,p.7964/2006-1.
Todavia, se o opoente não se limitar a impugnar tais declarações,
mas invocar matéria nova que possa impedir, modificar ou
extinguir o direito invocado pelo autor/requerente, defendendo-se,
assim, por exceção, impende sobre o mesmo alegar e provar o
que afirma – artº 571º do CPC e 342º nº 2 do CC.
5.1.2.
O caso vertente é paradigmático no sentido da subversão destes
princípios e do iter processual, supra referidos, com postergação
da racionalização que eles pretendem incutir e da tendencial
preclusão deles dimanante.
Na verdade, e em síntese, parece que toda a problemática do
acervo a partilhar – maxime, e no que para o caso interessa, no
atinente aos bens , direitos e dívidas que agora estão em causa
nesta instância recursiva - ao invés de ser dilucidada e fixada no
tempo ante audiência preparatória, foi, na sua essencialidade
relevante, colocada já após tal audiência.
E colocada em requerimentos e contra requerimentos sucessivos,
ao longo dos meses, sem que os interessados tenham,
minimamente, cumprido a limitação de articulados e os prazos da
instância, meramente incidental, repete-se, da reclamação da
relação de bens, e, valha a verdade, sem que a Srª Notária tenha
posto cobro a tal prolixidade.
E com a agravante de os interessados, maxime, na economia do
recurso, o ora recorrente, lavrarem em algumas contradições.
Efetivamente, apresentada pela cabeça de casal inicialmente
nomeada, G (...) , cônjuge do de cujus, a respetiva relação de
bens, na qual não constavam, vg. a dívida ao (…), o ora
recorrente dela não reclamou.
Quem reclamou foi a interessada M (…) a qual, para além do
mais, acusou a falta de relacionação de tal dívida.

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Habilitada que foi a interessada C (…), em substituição da cabeça


de casal, foi nomeado cabeça de casal o ora recorrente.
Ora este apresentou relação de bens – fls. 162 e sgs - a qual, em
muitos deles, não coincidiu com a anterior, não obstante desta ele
não ter reclamado.
Tendo, inclusive, e relativamente à dita dívida ao A (…) defendido,
em resposta à reclamação da interessada M (…), que não a
reconhecia – fls.184.
Após tal reclamação foi proferido despacho no qual se ordenou a
eliminação da verba nº10 do ativo, armazém inscrito na matriz sob
o artº 1691.
E, considerando-se que existia possibilidade de acordo na
conferência preparatória designou-se a data de 01.10.2015 para a
sua realização.
Esta opção é aceitável: ou seja, em vez de proceder à produção
de prova no incidente da reclamação de bens, a Sr. Notária,
imbuída da convicção de que o consenso seria possível,
designadamente quanto à composição da relação de bens,
decidiu-se pela convocação desta conferência.
Ora, como é evidente, tudo o que os interessados nela
consensualizassem quanto a tal composição, ficaria assente e
arrumado, sem necessidade de ulterior apreciação.
E na ata desta conferência consta, no que ora releva:
«Foi deliberado por unanimidade:
-Excluir da relação de bens as verbas nº e nº10…
Foram aprovadas por unanimidade as dívidas passivas
relacionadas sob as verbas nº1 (dívida à Caixa de Crédito
Agrícola Mútuo das Serras de (...) …no montante de 15.164,19) e
nº3 (dívida a Herdeiros de G (…)…no montante de 10.000,00
euros».
O recorrente apresentou nova relação de bens na qual, e para
além do mais, relacionou, sob a verba nº1 a verba 10 da anterior
relação, «por ter sido prometida vender verbalmente aos ora
herdeiros»
5.1.3.
Aqui chegados cumpre apreciar, de per se, a consideração, ou
não, na partilha, dos bens, dívidas e direitos supra referidos nas
als. a) a f).
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5.1.3.1.
Quanto ao bem da al. a) e como emerge do já supra referido, ele
não pode ser atendido.
Ele foi excluído da relação de bens por todos os interessados,
incluindo o recorrente.
Pelo que não poderia ele advogar, logo a seguir e quase em ato
contínuo, e em venire contra factum proprium, a sua inclusão na
relação de bens.
O argumento de que foi excluído como direito de propriedade e
agora é incluído como direito de crédito, por artificioso, não colhe.
O que releva é a essência e consistência económica e jurídico
material.
Ora nesta vertente, o bem imóvel é o mesmo: um armazém, com
certas caraterísticas físico materiais.
Por outro lado, a consequência jurídico-prática do cumprimento do
contrato promessa é a realização do contrato prometido, e, assim,
a entrada na esfera jurídica da herança da propriedade do bem.
Propriedade esta que os interessados já anuíram que não lhe
pertencia.
Seria, passe o plebeísmo, querer fazer entrar pela janela o que
não se conseguiu fazer entrar pela porta.
Ademais, impugnada a existência de tal crédito oriundo do
invocado contrato promessa, cumpria ao cabeça de casal provar a
existência e validade do mesmo.
Ora estando nós perante um contrato promessa de compra e
venda, a sua validade apenas emergiria se fosse celebrado por
escrito – artº 410º nº2 do CC .
Pelo que a invocação de mero contrato verbal queda insuficiente
para provar e validar o direito invocado.
5.1.3.2.
No atinente à dívida a herdeiros de G (…), no valor de 10.000,00€.
Aqui assiste razão ao recorrente.
Na verdade, e como se viu, esta dívida, foi aprovada por todos os
interessados na conferência preparatória.
Assim sendo, tal dívida «considera(m)-se reconhecida(s),
devendo o seu pagamento ser ordenado por decisão do notário.» -
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artº 38º nº1 do RJPI.


E deveria ter ela sido considerada aquando no despacho
determinativo da forma da partilha de fls. 475 a 482.
Mas não o foi, tendo, inclusive, nele sido consignado -fls. 479 –
que «não foi… considerado qualquer passivo…».
Assim, e versus o defendido pelo recorrente, mais do que uma
nulidade por omissão de pronúncia existe uma ilegalidade.
Certo é que tal afirmação, contrária às evidências e vinculações
processuais – decorrentes do anuído na conferencia preparatória
-, devia ter sido impugnada em recurso, anterior e autónomo.
Pois que, nos termos do atº 57º nº4 do RJPI:
« Do despacho determinativo da forma da partilha é admissível
impugnação para o tribunal da 1.ª instância competente, no prazo
de 30 dias, a qual sobe imediatamente, nos próprios autos e com
efeito suspensivo.»
Não tendo o recorrente exercido atempadamente tal direito seria
defensável o entendimento que a questão estava precludida e
arrumada.
Porém, bem vistas as coisas, tal posição da Srª Notária alcança-
se mais como um lapso material, o chamado lapsus calami.
Ademais, parece que os demais interessados- desde logo a
recorrida C (…) - assim o entendem e defendem.
Tal passivo, porque aprovado por todos os interessados, terá de
ser pago por todos e cada um deles proporcionalmente ao seu
quinhão, não acarretando quaisquer outras consequências na
partilha.
Mostrar-se-ía, assim, sensato e razoável o impetrado pela referida
interessada: que o montante deste passivo se dê como existente e
relevante e ele fosse tomado em consideração no mapa da
partilha, retificando-se este em conformidade.
Porém, e em função do infra a decidir, que implicará a elaboração
de uma nova partilha, tal mostra-se prejudicado.
5.1.3.3.
No que tange à admissão da relacionação da dívida a A (…) no
valor de €60.000, sem qualquer condição.
Pelo que já supra se expendeu, esta pretensão é,
meridianamente, de rejeitar.
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Nem a primitiva cabeça de casal, nem o ora recorrente, enquanto


investido, posteriormente, em tal qualidade, relacionaram esta
dívida.
Apenas a interessada M (…) pugnou, inicialmente, pela sua
inclusão, parecendo que, posteriormente, desistiu dessa sua
pretensão.
O recorrente opôs-se à relacionação da dívida dizendo
expressamente que não reconhece a sua existência e que a
pretensão da sua inclusão na relação de bens por banda da
interessada M (…) é extemporânea porque posterior à conferência
preparatória - fls. 287
Mesmo após ter sido decidido, numa primeira fase – fls. 298 – que
tal dívida tinha de ser relacionada, enquanto não ocorra o seu
pagamento, o recorrente apenas se insurgiu contra tal decisão, na
medida em que ela foi relacionada sob condição.
Entendendo que devia ser apurado se a dívida é, ou não, da
herança, relacionando-se naquele caso e não se relacionando
neste – fls. 339.
Formalmente não se apurou a natureza e a quem deve ser
imputada a dívida.
Mesmo que, como alega a recorrida/interessada C (…), a dívida
seja comum do anterior casal formado pelo de cujus e pela G (…),
e ela tenha sido paga por bem próprio desta – sua meação -
certo é que ela não é interessada nestes autos, pois que vendeu a
meação aquela interessada C (…).
Pelo que, se alguém está prejudicado é a G (…) ficando, como o
próprio recorrente admite, os interessados do inventário
beneficiados.
Também por isto nem sequer se alcança o interesse em agir e a
legitimidade do recorrente para poder levantar esta questão.
Mal se compreende, pois, que o recorrente, dando o dito por não
dito e mesmo contra o dito – e, mais uma vez em clara
contradição – tivesse depois, sem justificação bastante, alterado a
sua posição.
Até porque na conferência preparatória foi, como se viu, tomada
posição quanto ao passivo e nela ele não colocou em equação
esta dívida.
5.1.3.4.

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No que tange à sub-rogação pelos valores de 7.466,77 e €550,80


e de €15.643,34.
Foi aprovada pelos interessados na conferência preparatória este
último montante de €15.643,34 como dívida da herança.
Resulta dos autos, e é aceite pelos interessados, que tal montante
respeita a dívida à Caixa de Crédito Agrícola e que se reporta à
ação executiva nº27/14.5TBANS.
Assim, e bem interpretada a vontade dos interessados, tem de
concluir-se que os 15.643,34 euros era o montante que, à data da
conferência, eles consideraram ser devido em tal ação e que eles
consideraram como dívida da herança todos os valores que em
tal ação fossem pagos.
O recorrente alegou e provou que, no âmbito de tal ação, pagou
mais os restantes montantes de 7.466,77 e €550,80.
Tendo o recorrente provado que aquelas quantias foram satisfeitas
quer por conta do remanescente da meação e do quinhão
hereditário da G (…), quer diretamente por si, aos mesmos tem
direito de reembolso por banda da herança, pois que, como alega,
ficou sub rogado nos direitos da G (…) ex vi da doação que ela lhe
fez do remanescente da meação.
No entanto a interessada M (…) invocou a invalidade da doação,
quer porque a G (...) não tinha a disponibilidade da meação pois
que esta estava arrestada, quer porque já não se encontrava em
estado mental bastante que lhe permitisse entender o sentido e
alcance do ato.
O recorrente pugna que enquanto a doação não for declarada
inválida, ela é válida e eficaz, pelo que a sub-rogação, nela
alicerçada, deve desde já operar e os créditos serem
considerados.
Mas não lhe assiste razão.
Na verdade e tal como ele propugna, importa atentar no disposto
no artº 16º do RJPI, a saber:
1 - O notário determina a suspensão da tramitação do processo
sempre que, na pendência do inventário, se suscitem questões
que, atenta a sua natureza ou a complexidade da matéria de facto
e de direito, não devam ser decididas no processo de inventário,
remetendo as partes para os meios judiciais comuns até que
ocorra decisão definitiva, para o que identifica as questões
controvertidas, justificando fundamentadamente a sua
complexidade…
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6 - O notário pode autorizar, a requerimento das partes principais,


o prosseguimento do inventário com vista à partilha, sujeita a
posterior alteração, em conformidade com o que vier a ser
decidido, quando:
a) Ocorra demora injustificada na propositura ou julgamento da
causa prejudicial;
b) A viabilidade da causa prejudicial se afigure reduzida; ou
c) Os inconvenientes no diferimento da partilha superem os que
derivam da sua realização como provisória.
E, ainda, no disposto no artº 36º:
1 - Quando a complexidade da matéria de facto ou de direito
tornar inconveniente, nos termos do n.º 2 do artigo 17.º, a decisão
incidental das reclamações previstas no artigo anterior, o notário
abstém-se de decidir e remete os interessados para os meios
judiciais comuns.
2 - No caso previsto no número anterior, não são incluídos no
inventário os bens cuja falta se acusou e permanecem
relacionados aqueles cuja exclusão se requereu.
Destarte, verifica-se que quando o notário remeter as partes para
os meios comuns, tal, ipso facto implica, imediata e
imperativamente, a suspensão da tramitação dos autos.
A qual apenas pode continuar, a pedido das partes, e nos
taxativos casos das alíneas do nº6 do artº 16º.
O que, no caso sub judice ,não se verificou.
Decorrentemente, e suspenso que seja o processo, obviamente
que neles não se podem praticar atos, salvo os urgentes
destinados a evitar dano irreparável – artº 275º nº1 do CPC.
Ademais, releva, determinantemente, o nº2 do artº 36º.
Ora o caso dos autos subsume-se na sua primeira parte.
Pois que não estando ainda tais créditos considerados no
inventário, rectius na relação de bens, eles não podem ser
atendidos enquanto a questão da (in)validade da doação não for
resolvida nos meios comuns.
Resta é apurar se estamos perante um caso de suficiente
complexidade justificativo de remessa para os meios comuns.
O que se apreciará na seguinte questão.

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5.1.3.5.
Finalmente o valor de 907,43 euros.
A Srº Notária entendeu remeter para os meios comuns quanto a
esta verba.
Mas, em função do que se dirá na questão seguinte, esta matéria
não assume complexidade bastante para tal.
Urge, pois, decidir, perante a prova apresentada e o direito
aplicável.
Assim e no que tange às verbas de 219,02 e 198,10 euros elas
não podem ser consideradas pois que tendo, alegadamente, sido
pagas pelo recorrente em 23.07.2015, ele não as reclamou até à
data da realização da audiência preparatória – 01.10.2015 -, e
esta, como se viu, constitui prazo final preclusivo para a sua
reclamação – artº 32º nº5 do RJPI.
Quanto à despesa de 203,20 euros pela limpeza dos terrenos, ela
também não pode ser considerada pois que do documento junto
pelo interessado não dimana que ela tenha sido feita em terrenos
pertencentes à herança.
Já as restantes quantias impetradas, elas são concedíveis pois
que dos documentos apresentados emerge, com a suficiência
exigível e ainda dentro da margem de álea em direito probatório
permitida, que foram feitas por causa da herança.
O alegado pela interessada M (...) no sentido de que as despesas
não devem ser consideradas pois que foram pagas com dinheiro
da herança não releva: trata-se de argumentação de cariz
excetivo, a qual, assim, tinha de ser provada pela alegante, o que
não fez.
Assiste, pois, ao recorrente, jus ao crédito de 287,11 euros.
5.2.
Segunda questão.
O critério legal vai no sentido de que, por princípio, no processo de
inventário devem ser decididas todas as questões, de facto e de
direito, de que a partilha dependa.
Porém, a natureza e finalidade do inventário não se compadecem
com indagações profundas e morosas, pelo que a decisão das
questões relevantes para a partilha, apenas nele pode/deve ser
prolatada se tais questões não se assumirem, factual e/ou
juridicamente, vastas e/ou complexas.
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Assim:
« O juiz, para remeter os interessados para os meios comuns, no
processo de inventario, não e obrigado a produzir todas as provas
oferecidas, mas tem de ter no processo elementos bastantes para
reconhecer que a questão posta exige mais larga, variada e
cuidada indagação do que a sumaria instrução do inventario.» -
Ac. do STJ de 09.05.1978, p. 067220
«Em processo de inventário o juiz deverá remeter os interessados
para os meios comuns ante a falta de prova, no incidente, dos
factos alegados sobre questão controvertida - doações feitas por
pessoa falecida -, se for de admitir que nos meios comuns tais
factos poderão ser mais largamente investigados. - Ac. do STJ
de 24.10.1996, p. 96B544
«podendo os simuladores arguir a nulidade do negócio simulado e
estando vedada a prova testemunhal quando a simulação seja
invocada pelos simuladores em relação a negócios celebrados
através de documentos autênticos na parte em que este têm força
probatória plena, a prova a efectuar, mesmo só por documentos,
não se compagina com a índole sumária da indagação no
processo sumário.» - Ac. do STJ de 16.12.1999, p. 99B995
«Em processo de inventário, as questões relativas à relação de
bens que demandem outras provas, além da documental, só
devem ser objecto de decisão definitiva quando for possível a
formulação de um juízo, com elevado grau de certeza, sobre a
existência ou inexistência desses bens.
II- Na ausência dessa prova, devem os interessados ser remetidos
para o processo comum ou deve ser ressalvado o direito às
acções competentes.» - Ac. do STJ de 11.01.2000, p. 99A1014,
todos in dgsi.pt.
Ora se este entendimento já se assumia como pacífico na
legislação anterior, perante a atual, ele deve ser perspetivado, por
maioria de razão, mais abrangentemente.
Na verdade, atribuindo a lei aos Srs. Notários o poder/dever de
apreciar e decidir, em primeira instância, nomeadamente quanto à
composição da relação de bens e no mais que pode influir na
partilha, e considerando, sem desprimor, que eles, pelo menos
em tese, não se encontram tão bem apetrechados, como o juiz,
para, juridicamente, escalpelizarem e decidirem certas questões
de direito mais intrincadas, deve a apreciação destas ser
conferida ao juiz do tribunal comum.
No caso vertente assim é.
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Efetivamente, a questão quanto à validade da doação é, pelo


menos juridicamente, complexa.
A interessada M (…) opôs-se à mesma quer defendendo que o
bem doado já não estava na disponibilidade da doadora, quer,
principalmente e no que para o caso releva, argumentado que a
doadora, devido à quebra das suas faculdades mentais, não
atingiu o significado sobre a natureza e alcance do ato jurídico.
Destarte, é medianamente evidente que a questão assume foros
de complexidade factual e jurídica, cuja análise e decisão não se
compadece quer com a estrutura probatória sumária do processo
de inventário, quer com os (não) exigíveis conhecimentos na
matéria por parte da Sra. Notária.
É, pois, o presente caso, como por ela bem decidido, um dos
quais em que é admissível, e até exigível, a remessa para os
meios comuns.
5.3.
Terceira questão.
A esta questão já se deu resposta em 5.1.3.4. no sentido de que a
suspensão dos termos do processo era de decretar.
Acrescenta-se agora que tal opção é percetível: vale mais esperar
– razoavelmente, que não desmesuradamente, caso em que,
regem, a fortiori as previsões do nº6 do artº 16º para se poder
impetrar o reinício da instância – pela decisão da questão nos
meios comuns do que se avançar, temerariamente, para uma
partilha, provisória e com a espada de Dâmocles em cima e que
poderá ser invalidada, com a retirada de eficácia e proficuidade
aos atos praticados e com as inerentes perdas: de tempo e de
meios.
Assim sendo o processo tinha de ser suspenso a partir da decisão
que remeteu as partes para os meios comuns para apreciação da
validade da doação, ou seja, a partir de 11.03.2016 – fls.395.
Não o tendo sido, com o entendimento de que não era caso para
isso porque a partilha podia ser mais tarde emendada, foi, porque
decidido contra legem e os princípios jurídicos convocáveis,
cometida ilegalidade.
Em termos estritos a consequência da constatação de tal
ilegalidade seria a anulação dos atos praticados após a sua
verificação, ou seja, após a data de 11.03.2016, os quais incluíram
a conferência de interessados e atos posteriores.

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No entanto certo é que eles já foram praticados.


E, se a doação for considerada inválida a partilha apenas é
afetada no por ora decidido quanto à dívida de dez mil euros, a
suportar por todos os interessados, e pelo crédito reconhecido ao
recorrente de pouco mais de 287 euros.
Nesta conformidade, e considerando o princípio da concentração
dos atos processuais e razões de celeridade e economia de
meios, não se decreta tal anulação.
E devendo os atos já praticados posteriormente a 11.03.2016
serem aproveitados na medida do possível, em função,
especialmente, do que vier a ser decidido quanto à (in)validade da
doação.
(Im)procede, parcialmente, o recurso.
6.
Sumariando- artº 663º nº7 do CPC.
I -A reclamação contra a relação de bens é processado de
cariz incidental, e, assim, pretendendo-se célere e
tendencialmente preclusivo, sendo que, após a audiência
preparatória, fica, em princípio, vedado aos interessados
colocá-la em crise – artº32º nº5 do RJPI.
II - O acordado pelos interessados na conferência
preparatória, designadamente quanto à composição dos
quinhões e ao reconhecimento das dívidas, vincula-os
definitivamente, salvo a superveniência de factos novos.
III - A impugnação da validade de uma doação por o doador
não ter a disposição do bem doado e ter incapacidade mental
que o impediu de intuir a natureza e alcance do ato, é matéria
que, pela sua complexidade factual e jurídica, não pode ser
dilucidada pelo Sra. Notária no processado probatório
sumário do inventário, mas antes pelo Juiz nos tribunais
comuns.
IV - A decisão nesse sentido pela Notária implica – salvo
taxativas e invocadas exceções - a suspensão dos termos do
inventário, os quais só podem reiniciar-se após aquela
decisão do juiz - artº 16º nº1 e nº6 do RJPI.
7.
Deliberação.

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Termos em que se julga o recurso parcialmente procedente,


determina-se a, oportuna, consideração da dívida aludida de
dez mil euros e do mencionado crédito a favor do recorrente
de 287,11 euro, declarando-se suspensa a instância até
decisão, nos meios comuns, da (in)validade da doação.
No mais se confirmando o decidido.
Custas recursivas a final em função/proporção do aí determinado.
Coimbra, 2017.04.27
Carlos Moreira ( Relator )
Moreira do Carmo

Fonte Ramos

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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


Processo: 848/15.1T8VFX.L1-7
Relator: LUÍS ESPÍRITO SANTO
Descritores: INVENTÁRIO
MEIOS COMUNS
ACÇÃO JUDICIAL AUTÓNOMA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02-05-2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I-A remessa dos interessados para os meios comuns, realizada ao abrigo do disposto nos
artigos 16º, nº 1 (concernente às disposições gerais), 36º, nº 1 (referentes especificamente às
reclamações contra a relação de bens apresentada), do Regime Jurídico do Processo de
Inventário, aprovado pela Lei nº 23/2013, de 5 de Março, pressupõe a subsequente
instauração de uma acção judicial autónoma, a impulsionar pelos respectivos interessados, no
âmbito da qual a matéria controvertida será devidamente discutida, dilucidada e decidida.
II - A remessa para os meios comuns supõe naturalmente uma necessária amplitude de
garantias processuais, traduzidas na livre possibilidade de apresentação dos meios
probatórios e da sua efectiva contradição, bem como na realização, judiciosa e
pormenorizada, de audiência julgamento, tudo nos moldes genericamente previstos para as
acções declarativas comuns, que extravasa totalmente os termos processualmente confinados,
simplificados e relativamente condicionados da resolução das referidas questões de facto e de
direito em sede meramente incidental.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Decisão em texto integral

Assunto: Inventário. Processo tramitado no Cartório Notarial.


Remessa para os meios comuns. Acção judicial autónoma.

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção).


I – RELATÓRIO.
No presente processo de inventário para separação de meações do
casal outrora constituído por Maria Inês ……. e José ………., o
Cartório Notarial decidiu enviar as partes interessadas no
inventário para os meios comuns para que nessa sede se conhecesse
da reclamação contra a relação de bens apresentada por um dos
interessados, ao abrigo e nos termos do artigo 16º da Lei nº
23/2013, de 5 de Março.
De seguida, foi proferida pelo juiz a quo decisão conhecendo o
mérito da referida reclamação relativamente às questões que foram
suscitadas pela Notária, tratando tal matéria enquanto incidente do
inventário e julgando-a improcedente.
Consta da decisão em apreço:
“Nos presentes autos de inventário para separação de meações do casal
outrora constituído por Maria Inês ... ... e José ... ... ..., veio a Ex.ª Notária
remeter os presentes autos para os meios comuns, ao abrigo do disposto no
artº 16º da Lei nº 23/2013 de 5 de Março, uma vez que existiam várias
questões controvertidas e importantes para a decisão do processo, a saber:
1- se o bem imóvel , fracção autónoma designada pela letra “R”, quinto
www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/fb751ce28584ee6580258131003ca888?OpenDocument&Highlight=0,848%2F15.1T8VFX.… 1/12
15/12/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

andar, c, sito na Rua Fernando Pessoa, nº 3, 5º C, Vila ... de ..., descrito na


Conservatória do Registo Predial de Vila ... de ..., sob o nº 25706, inscrita
na matriz sob o artº 3060, é bem próprio do CC ou bem comum do ex-
casal;
2- valor das benfeitorias realizadas e como foram pagas;
3- se os bens móveis identificados em 6) e 7) da relação de bens foram
adquiridos pelo filho e se os bens móveis descritos em 13) da reclamação
foram adquiridos na constância do matrimónio;
4- como foi paga a reparação do indicado veículo automóvel – verba 4º do
passivo da relação de bens.
Cumpre apreciar.
Uma vez que o artº 16º e artº 36º da Lei nº 23/2013 de 5 de Março não
estabelecem qualquer tramitação especial para a decisão das reclamações
apresentadas no âmbito de um processo de inventário ter-se-ão que aplicar
as regras previstas nos artigos 292º a 295º do CPC.
Estipula o artº 293º nº 1 do CPC que no “requerimento em que se suscite o
incidente e na oposição que lhe for deduzida, devem as partes oferecer o rol
de testemunhas e requerer os outros meios de prova”.
No incidente deduzido a fls. 14 a 16 a requerente não juntou nem requereu
qualquer prova. Limitou-se a juntar cópia da escritura de compra e venda
da fracção autónoma designada pela letra “R”, quinto andar, c, sito na
Rua Fernando Pessoa, nº 3, 5º C, Vila ... de ..., descrito na Conservatória
do Registo Predial de Vila ... de ..., sob o nº 25706, inscrita na matriz sob o
artº 3060 e certidão de casamento.
Na resposta à reclamação também não foi junta nem requerida qualquer
prova.
Não tendo sido requerida qualquer prova e já não o podendo ser, uma vez
que o artigo artº 293º nº 1 do CPC determina que as partes têm que o fazer
com o requerimento e com a oposição, cumpre apreciar e decidir as
questões suscitadas pela Ex.ª Sr.ª Dr.ª Rute Carla Valente da Encarnação
que remeteu os presentes autos.
Questão 1) Veio a requerente reclamar da relação de bens apresentada pelo
CC alegando que a fracção autónoma designada pela letra “R”, quinto
andar, c, sito na Rua Fernando Pessoa, nº 3, 5º C, Vila ... de ..., descrito na
Conservatória do Registo Predial de Vila ... de ..., sob o nº 25706, inscrita
na matriz sob o artº 3060 é um bem comum uma vez que apesar de ter sido
adquirido pelo CC antes do casamento o mesmo foi pago na pendência do
matrimónio e com bens comuns do casal.
Nos termos do disposto no artº 342º nº 1 do CC aquele que invocar um
direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
Não tendo a requerente apresentado qualquer prova, seja testemunhal, seja
documental, conforme lhe competia, que o imóvel em causa foi pago com
bens comuns do casal, tal reclamação terá de improceder, tendo tal bem ser
considerado como bem próprio do CC nos termos do disposto no artº 1722º

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nº 1 al. a) do Código Civil.


Questão 2) Veio a requerente reclamar da relação de bens apresentada pelo
CC alegando que a verba nº 2 terá de ser eliminada uma vez que as
benfeitorias aí referidas não foram pagas com bens comuns do casal mas
sim com uma indemnização que recebeu a título de indemnização por um
acidente de trabalho.
Nos termos do disposto no artº 342º nº 1 do CC aquele que invocar um
direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
Não tendo a requerente apresentado qualquer prova, seja testemunhal, seja
documental, conforme lhe competia, que recebeu tal indemnização e que a
mesma serviu para pagar tais benfeitorias tal reclamação terá de
igualmente improceder.
Veio, ainda, a requerente reclamar da relação de bens apresentada pelo CC
alegando que o CC não relacionou as benfeitorias realizadas na fracção
autónoma designada pela letra “R”, quinto andar, c, sito na Rua Fernando
Pessoa, nº 3, 5º C, Vila ... de ..., descrito na Conservatória do Registo
Predial de Vila ... de ..., sob o nº 25706, inscrita na matriz sob o artº 3060,
no montante de € 25.000,00, feitas na constância do matrimónio e com
património comum.
Mais uma vez é de referir que nos termos do disposto no artº 342º nº 1 do
CC aquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos
constitutivos do direito alegado.
Não tendo a requerente apresentado qualquer prova, seja testemunhal, seja
documental, conforme lhe competia, que foram efectuadas as benfeitorias
por si descritas e no montante referido e que as mesmas foram pagas com
património comum, terá a reclamação nesta parte também improceder.
Questão 3) Veio a requerente reclamar da relação de bens apresentada pelo
CC alegando que as verbas nº 6) e 7) da relação de bens foram adquiridos
pelo filho e como tal devem ser suprimidas por não serem bens comuns e os
bens móveis descritos em 13) da reclamação foram adquiridos na
constância do matrimónio e como tal devem ser incluídos na relação de
bens.
Nos termos do disposto no artº 342º nº 1 do CC aquele que invocar um
direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
Não tendo a requerente apresentado qualquer prova, seja testemunhal, seja
documental, conforme lhe competia, que os bens descritos nas verbas nº 6)
e 7) da relação de bens tenham sido adquiridos pelo filho e que os bens
descritos no art.º 13 da reclamação tenham sido adquiridos na constância
do matrimónio, tais reclamações terão igualmente de improceder.
Questão 4) Veio, ainda, a requerente reclamar da relação de bens
apresentada pelo CC alegando que o valor da verba referente à reparação do
veículo automóvel foi pago com dinheiro comum e como tal não deve ser
relacionado.
Nos termos do disposto no artº 342º nº 1 do CC aquele que invocar um

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direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.


Não tendo a requerente apresentado qualquer prova, seja testemunhal, seja
documental, conforme lhe competia, que o valor da verba referente à
reparação do veículo automóvel foi pago com dinheiro comum, tal
reclamação terá também de improceder.
Face ao supra exposto, julgo improcedente a reclamação de Maria Inês ... ...
relativamente às questões que foram suscitadas pela Exª Notária para
serem resolvidas por este Tribunal e acima devidamente explicitadas e
fundamentadas.
Custas do incidente a cargo da requerente”
A interessada Maria Inês ... ... apresentou recurso contra tal
decisão, o qual foi admitido no âmbito da apresentação da
reclamação prevista no artigo 643º, nº 1, do Código de Processo
Civil.
Juntas as competentes alegações, formulou a apelante as seguintes
conclusões:
I. O presente recurso versa sobre a sentença proferida pelo Tribunal
da Comarca de Lisboa Norte, Vila ... de ..., Instância Central, 3.ª
Seção de Família e Menores – J2, que julgou improcedente a
Reclamação à Relação de Bens, apresentada pela Apelante.
II. Em que é julgada improcedente a reclamação da ora Apelante
com o fundamento no n.º 1, do artigo 342.º do C.C. conjugado com
os artigos 293.º a 295.º do C.P.C.
III. Ora tal fundamentação não tem cabimento na medida em que a
remessa dos interessados para os meios comuns pressupõe a
existência de uma acção autónoma, independente e não
subordinada ao processo de inventário.
IV. A remessa das partes para os meios comuns não tem por
objecto decidir ou proferir uma sentença quanto à procedência ou
não da reclamação apresentada à relação de bens.
V. Nem pode ser, a remessa para os meios comuns, tramitada,
autuada e processada como se de um incidente da instância se
tratasse.
VI. Tem legitimidade para recorrer aos meios comuns as
partes/interessados no processo.
VII. Cabe a estes e tão só a eles dar início a esse novo processo,
ainda que delimitados pela matéria apresentada como
controvertida pelo notário a quem cabe a direcção do processo de
inventário.
VIII. Sendo, o notário parte ilegítima e não se podendo substituir às
partes ao intentar essa acção.
IX. Muito menos estão as partes vinculadas aos articulados
apresentados no processo de inventário, devendo dar
cumprimentos a todas as formalidades e requisitos necessários à

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entrada de uma nova acção em tribunal.


X. Caberia, ao douto Tribunal a quo, conhecer destas excepções e se
assim o entendesse suprir/sanar as mesmas.
XI. Ainda que, fosse entendimento, dado o decurso de tempo
manter esta acção, deveriam as partes ter sido convidadas a
apresentar novos articulados e a suscitar o que tivessem por
conveniente.
XII. A lei 23/2013 de 5 de Março é muito clara quando refere,
inúmeras vezes, que o que é enviado para os meios comuns são os
interessados e não os autos de inventário, quanto às questões
controvertidas.
XIII. Assim, a correta tramitação deste tipo de ocorrência, tal como
resulta da lei, é o notário, fundamentando a decisão e identificando
as questões controvertidas, notificar as partes da sua decisão
convidando-as a recorrer aos meios comuns para dirimir essas
questões.
XIV. A remessa para os meios judiciais comuns, constitui uma
excepção à regra de que cabe aos Notários praticar os actos e
termos do processo de inventário (artigo 3º, nº 1).
XV. Não cabe ao notário dar início a uma nova acção em nome
dessas mesmas partes/interessados.
XVI. Trata-se de uma acção nova, completamente diferente e
autónoma do processo de inventário.
XVII. Acção, essa que deve ser instruída com novas peças
processuais, meios de prova, etc.
XVIII. Trata-se, assim, de uma acção ab initio, em que não está
delimitada pelos articulados, provas e meios de prova requeridos
ou apresentados no processo de inventário.
XIX. Assim, não consegue compreender a Apelante, como é que foi
possível que o notário em causa não só tenha decidido enviar essas
questões para os meios comuns, como tenha dado início a esse
processo juntando para o efeito os articulados entregues em sede de
inventário e não tendo a Apelante qualquer intervenção na acção.
XX. Mais, o douto Tribunal a quo aceitou como válida esta
“tramitação do processo de inventário”, em que o que serve de
aparente petição inicial é o despacho proferido pelo notário que se
substitui às partes.
XXI. Assim, no caso em epígrafe, não só foi proferido despacho a
remeter as partes para os meios comuns, como os autos foram
enviados para os meios comuns pelo notário, situação com a qual o
Tribunal foi conivente demonstrando desconhecer por completo a
tramitação do processo de inventário e as “consequências” da
remessa das partes para os meios comuns.
XXII. O que é completamente contrário ao espirito da lei.

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XXIII. Deveria ter o douto Tribunal a quo conhecido desta situação


e devolvido os autos ao processo de inventário para que as partes
fossem notificadas que deveriam dar início a um novo processo,
com recurso aos meios comuns.
XXIV. Atendendo às questões suscitadas foram, erradamente, os
autos remetidos para os meios comuns, por iniciativa da Exma. Sra.
Notária, ao abrigo do disposto no artigo 16.º da Lei n.º 23/2013 de 5
de Março – a remessa para os meios comuns diz respeito aos
interessados e não aos autos.
XXV. Os quais viriam a ser autuados em 27/02/2015, com o N.º de
Processo 848/15.1T8VFX.
XXVI. Tendo sido designado para o dia 12 de Janeiro de 2016 as
Declarações de Parte.
XXVII. Em que foi requerida a suspensão da instância com vista à
obtenção de um acordo, o qual não se logrou alcançar.
XXVIII. Foi, então, proferida liminarmente a douta sentença que é
agora objecto de recurso.
XXIX. Em que é julgada improcedente a reclamação da ora
Apelante com o fundamento no n.º 1, do artigo 342.º do C.C.
conjugado com os artigos 293.º a 295.º do C.P.C.
XXX. Não pode a Apelante, também, concordar com a
fundamentação esplanada da douta sentença, em que faz referência
por inúmeras vezes a que: “Não tendo a Apelante apresentado qualquer
prova”.
XXXI. Pois, tal não corresponde à verdade, na medida em que
procedeu à junção aos autos de documentos comprovativos da data
de aquisição da fracção, do contrato de mútuo e da sua duração e
certidão de casamento.
XXXII. Mais, a Apelante invocou no seu processado que quer a
fracção, quer as benfeitorias, quer a reparação do automóvel foram
situações/ocorrências que se verificaram na pendência do
casamento.
XXXIII. Não tendo o Apelado impugnado esse fato.
XXXIV. O próprio Apelado assume, assim, que o bem foi pago na
sua totalidade na pendência do casamento.
XXXV. Ora, não podia o douto Tribunal a quo deixar de analisar e
de ter em atenção ambos os articulados juntos aos autos, baseando
apenas a sua decisão no entendimento que não foi junta aos autos
qualquer prova do alegado pela ora Apelante.
XXXVI. De fato, na resposta à reclamação de bens apresentada, o
Apelado, em momento algum invocou que o dinheiro que serviu de
pagamento ao crédito hipotecário, durante 25 anos, era um bem
próprio.
XXXVII. Como resulta da Lei, quer os salários dos cônjuges, alínea

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a), do artigo 1724.º do C.C., quer os frutos provenientes desse bem


são bens comuns, n.º do artigo 1728.º do C.C., consideram-se
comuns os frutos dos bens próprios, naturais ou civis.
XXXVIII. Existe, assim, uma confissão desses fatos por parte do
Apelado, que aceita e reconhece que o empréstimo foi liquidado na
pendência do casamento.
XXXIX. Ora, como resulta dos autos as obras em causa foram
realizadas há mais de 20 anos, ainda que na data existisse
comprovativo/facturas da sua realização a verdade é que dado o
decurso do tempo nenhuma das partes dispõe de tais documentos.
XL. Sucede que, mais uma vez o douto Tribunal não tem em
atenção o articulado apresentado pelo Apelado que, quanto a este
ponto, apenas vem dizer que essas benfeitorias foram feitas e pagas
pelo próprio.
XLI. Mais, uma vez, o Apelado não impugna/contesta o fato de as
mesmas terem sido realizadas na pendência do casamento.
Apenas diz que foram pagas por ele, mas quando e com que
dinheiro ninguém sabe.
XLII. Assim, o Apelado não impugna, quanto à data da realização
das benfeitorias, os fatos alegados pela Apelante.
XLIII. Logo, reconhece e aceita que foram realizadas na pendência
do casamento
XLIV. No que se refere à reparação do veículo automóvel e que é
um bem comum de ambos os ex-cônjuges, a ora Apelante invocou
que a mesma foi paga com dinheiro comum ainda na pendência do
casamento.
XLV. Sendo certo que a ação de divórcio deu entrada em 13 de
Junho de 2013, também é verdade que o veículo foi a reparar antes
dessa data.
XLVI. Desconhece, assim a Apelante, a data em que a reparação foi
liquidada e muito menos qual o valor, atendendo a que o Apelado
não juntou qualquer comprovativo do pagamento da mesma.
XLVII. Mais, desconhece, a Apelante, se de fato foi liquidado
qualquer montante uma vez que o ex-marido trabalha na oficina
em questão.
XLVIII. Resulta do n.º 3, do artigo 25.º da Lei n.º 23/2013 de 5 de
Março que a menção dos bens é acompanhada dos elementos
necessários à sua identificação e ao apuramento da sua situação
jurídica.
XLIX. Resulta dos autos, que o Apelado, não procedeu à junção de
qualquer documento comprovativo dos direitos a que se arroga.
L. Assim, caberia ao Requerido/Apelado em sede de resposta à
reclamação da relação de bens indicar os meios de prova e as
provas que entendesse pertinentes para demonstrar a sua pretensão

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o que não fez.


LI. O envio, para os meios comuns, teve logo como subjacente a
necessidade de produção de prova e a intervenção de terceiros
alheios ao processo de inventário.
LII. Do mesmo modo, o artigo 36.º, da Lei n.º 23/2013 de 05 de
Março tem como epigrafe – insuficiência das provas para decidir
das reclamações.
LIII. É, assim, de pressupor, que se no âmbito do inventário existe
insuficiência de provas, para decidir destas questões, a simples
remessa para os meios comuns desses articulados sem que seja
possível aperfeiçoar os mesmos ou requerer outros meios de prova,
também irá esbarrar no mesmo problema.
LIV. Afigura-se, assim, que o legislador ao admitir que no âmbito
do processo de inventário não seja possível decidir certas questões
devido à deficiência ou falta de prova e, que por esse motivo as
partes devem ser remetidas para os meios comuns quer com isso
dizer que nesse âmbito, o juiz do processo a quem cabe a direção do
mesmo pode e deve tomar as rédeas do processo, tendo iniciativa,
não estando o juiz adstrito ao material probatório junto pelas
partes, podendo oficiosamente recolher outros meios de prova ou
provocar a produção de outros meios de prova.
LV. No artigo 6.º do CPC, prescreve-se: “1- Cumpre ao juiz, sem
prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às
partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu
andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências
necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for
impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando
mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam
a justa composição do litígio em prazo razoável. 2 - O juiz
providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de
pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a
realização dos actos necessários à regularização da instância ou,
quando estiver em causa alguma modificação subjectiva da
instância, convidando as partes a praticá-los.
LVI. A reforma do CPC visou quebrar com regras e hábitos
processuais há muito enraizados, através da redução das formas de
processo e a simplificação do regime, assegurando eficácia e
celeridade, da oralidade processual e limitação às questões
processuais relevantes, com vista a tornar o processo mais eficaz e
compreensível pelas partes.
LVII. Pretendeu-se, ainda, tornar o processo civil mais célere, mais
simples e mais flexível e, ao mesmo tempo, conferir conteúdo útil
aos princípios da verdade material, da cooperação funcional e ao
primado da substância sobre a forma.

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LVIII. Uma das mais importantes alterações foi o reforço do poder


de direcção pelo juiz e do princípio do inquisitório.
LIX. Temos, também, o princípio da adequação formal que passa a
ter assento no artigo 547º o qual prevê que, no processo declarativo,
o juiz deve adoptar a tramitação processual adequada às
especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos
processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo
equitativo. Sublinhe-se que este princípio já se encontrava
consagrado no Código de Processo Civil português (cfr. art. 265º-A)
– a novidade parece estar na coexistência deste princípio com a
forma única de processo.
LX. Mais, não pode a Apelante concordar que a remessa do
processo para os meios comuns configure um incidente da instância
e seja processado como tal, quando o que resulta da lei é
precisamente o contrário.
LXI. Devendo antes configurar uma nova acção, uma acção ab
initio.
LXII. Não devendo o Tribunal a quo pronunciar-se quanto ao
incidente da Reclamação de Bens, pois a decisão quanto à mesma
cabe ao Notário.
LXIII. Novidade da reforma do Código do Processo Civil é a
adopção do princípio da gestão processual à tramitação comum. O
dever de gestão processual reúne num único normativo o princípio
da direcção do processo e o princípio da adequação formal,
implicando para o juiz a obrigação de fazer uma aplicação das
regras processuais de acordo com determinados critérios, tendo em
conta o fim do processo, a decisão de mérito célere e justa,
assegurando-se sempre a igualdade das partes e o contraditório.
LXIV. NCPC confere, então, ao juiz um poder autónomo de gestão
activa e efectiva do processo. A nova tramitação processual impõe,
pois, ao juiz um novo poder-dever. Este passa a ter o dever de
direcção, de impulso, de simplificação e agilização processual, bem
como o dever de sanação de actos meramente dilatórios e da falta
de pressupostos processuais, devendo determinar a realização de
todos os actos necessários a regularizar a instância.
LXV. Assim, mais uma vez se salienta que, ainda, que a tramitação
da remessa dos interessados para os meios comuns não tenha sido a
adequada, tal poderia ter sido ultrapassado se o Tribunal a quo
tivesse assumido a gestão ativa e efetiva do processo.
LXVI. Ao decidir nos termos em que o fez na douta sentença, o
douto Tribunal a quo violou e fez errada interpretação e aplicação
das normas e princípios legais supra referidos.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. proficientemente
suprirão, requer-se a V. Exas. seja concedido provimento ao recurso

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e anulada a douta decisão recorrida e seja substituída por outra


que:
1. Julgue procedente os fundamentos invocados pela Apelante
quanto ao erro na forma do processo e na tramitação do mesmo,
2. Anulando todo o processado e devolvendo os autos ao processo
de inventário para que sejam as partes notificadas de que devem
recorrer aos meios comuns para dirimir as questões controvertidas,
3. Declare a ilegitimidade do notário em se substituir às
partes/interessados no recurso aos meios comuns,
Em alternativa, não sendo este o douto entendimento de V. Exas. e
visando o aproveitamento dos presentes autos deve:
4. A douta sentença recorrida ser revogada e as partes convidadas a
apresentarem novos articulados e requerem o que tiverem por
conveniente dando assim “início” à correta tramitação do processo
que consistia no envio para os meios comuns, seguindo, então, os
autos a sua normal tramitação.
Ainda, assim, colocando apenas a hipótese por mero dever de
patrocínio e caso não vingue nenhuma das posições acima
defendidas:
5. Deve ser dado provimento ao recurso e a douta sentença
recorrida revogada atendendo à prova apresentada pela Apelante e
que não foi considerada,
6. Atendendo a que o Apelado na resposta à reclamação de bens
não impugna o momento da prática dos fatos, ou seja pendência do
casamento,
7. Não deve a presente acção ser tramitada como um incidente da
instância, mas sim como uma acção declarativa comum com todas
as implicações que recaem sobre as partes e sobre o douto Tribunal.

II – FACTOS PROVADOS.
Os indicados no RELATÓRIO supra.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.


São as seguintes as questões jurídicas que importa dilucidar:
Inventário tramitado no Cartório Notarial. Remessa para os meios
comuns. Instauração de acção judicial autónoma. Conhecimento
indevido da reclamação contra a relação de bens.
Passemos à sua análise:
A remessa dos interessados para os meios comuns, realizada ao
abrigo do disposto nos artigos 16º, nº 1 (concernente às disposições
gerais), 36º, nº 1 (referentes especificamente às reclamações contra a
relação de bens apresentada), do Regime Jurídico do Processo de
Inventário, aprovado pela Lei nº 23/2013, de 5 de Março, pressupõe
a subsequente instauração de uma acção judicial autónoma, a

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impulsionar pelos respectivos interessados, no âmbito da qual a


matéria controvertida será devidamente discutida, dilucidada e
decidida.
Conforme se refere sintomaticamente in “Regime Jurídico do Processo
de Inventário Anotado. Lei nº 23/2013, de 5 de Março”, de Carla
Câmara e outros, em anotação nº 22 ao respectivo artigo 3º, página
43: ”A previsão do n.o 7 não abrange a competência para a tramitação das
questões que sejam apreciadas nos «meios comuns»., aplicando-se, nestas
situações, as regras sobre a competência (artigos 59.o e seguintes)
previstas no Novo Código de Processo Civil (…) ”.
Ou seja, e como bem salienta a recorrente, são os interessados que
são remetidos para os meios comuns e não as questões jurídicas
que são enviadas pelo Cartório Notarial ao conhecimento do
tribunal a quo[1].
Não poderia, portanto, o juiz a quo apreciá-las como fez, tratando-as
enquanto simples incidente do processo inventário que corre os
seus termos no Cartório Notarial respectivo.
A remessa destas matérias para os meios comuns supõe
naturalmente uma necessária amplitude de garantias processuais,
traduzidas na livre possibilidade de apresentação dos meios
probatórios e da sua efectiva contradição, bem como na realização,
judiciosa e pormenorizada, de audiência julgamento, tudo nos
moldes genericamente previstos para as acções declarativas
comuns, que extravasa totalmente os termos processualmente
confinados, simplificados e relativamente condicionados da
resolução das referidas questões de facto e de direito em sede
meramente incidental[2].
Os autos prosseguirão assim os seus termos processuais no
Cartório Notarial onde se encontram pendentes, competindo a
discussão e decisão das questões jurídicas controvertidas em
referência ao julgador da acção judicial autónoma que vier a ser, a
esse propósito, oportunamente instaurada.
Assiste, assim, inteira razão à apelante.
Procede, neste termos a presente apelação.
O que se decide, sem necessidade de outras considerações ou
desenvolvimentos.

IV - DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar
procedente a apelação e, em consequência, revogar a decisão
recorrida, devendo os autos serem remetidos ao Cartório Notarial,
cabendo às partes interessadas tomar a iniciativa de instaurar
acção judicial autónoma onde serão discutidas as questões

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jurídicas em causa.
Custas pela apelada, atenta a oposição que apresentou.

Lisboa, 2 de Maio de 2017.

(Luís Espírito Santo).

(Conceição Saavedra).

(Cristina Coelho).

____________________________________________________

[1] Sobre a apreciação das questões jurídicas em acção própria e


autónoma, por via da remessa a que o Cartório Notarial procedeu
no processo de inventário, ao abrigo do artigo 16º, nº 2, do Regime
Jurídico do Processo de Inventário, vide artigo intitulado “O Novo
Processo de Inventário. Traves Mestras da Reforma. Tutela Jurisdicional.
Algumas questões”, de Eduardo de Sousa Paiva, publicado na
Revista “Julgar”, Setembro-Dezembro 2014, 111 a 118. No que tange
à remessa das partes para os meios comuns no âmbito do Novo
Regime do Processo de Inventário, vide artigo subordinado ao
mesmo título (“Contributo para a definição das situações de remessa das
partes para os meios comuns”), da autoria de Maria João Gonçalves,
na Revista “Julgar”, Setembro-Dezembro 2014, 143 a 150.
[2] Como se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 9 de Janeiro de 2017 (relator Jaime Carlos Ferreira), publicado in
www.dgsi.pt: “No que toca à decisão que indeferir a remessa dos autos
para os meios comuns, verifica-se que tal remessa apenas deve suceder
quando o notário, no caso concreto, em virtude da complexidade da
matéria de facto ou de direito, não possa concluir com segurança pela
natureza comum ou própria da verba em causa, sob pena de prejudicar
uma justa partilha, tornando-se inconveniente a decisão incidental da
reclamação por implicar redução de garantias das partes”.

www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/fb751ce28584ee6580258131003ca888?OpenDocument&Highlight=0,848%2F15.1T8VF… 12/12
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Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


Processo: 8991/17.6T8CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDO MONTEIRO
Descritores: PROCESSO DE INVENTÁRIO
REGIME JURÍDICO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO
CONSTITUCIONALIDADE
Data do Acordão: 13-11-2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA - COIMBRA - JC CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: LEI Nº 23/2013 DE 5/3, ART. 20, 202 CRP
Sumário: O conjunto normativo do artigo 16º da Lei nº 23/2013 (Regime
jurídico do processo de inventário) não é inconstitucional, quando
interpretado no sentido de condicionar a apreciação pelos tribunais,
de questões que se suscitem no processo de Inventário, que corre seus
termos em cartório notarial, a prévia decisão notarial.
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:
M (…) intentou ação contra R (…), pedindo a declaração de que não deve
a este € 74.819,68, alegadamente correspondente a metade de verba dele
usada para a construção de certo imóvel.
Para tanto, a Autora alega, em síntese:
Foi casada no regime de comunhão de adquiridos com o Réu, casamento
dissolvido por divórcio, por sentença de 2/7/2009, já transitada em
julgado; na relação de bens do inventário que corre para partilha dos bens
comuns, o Réu incluiu um passivo de € 74.819,68, contra si,
injustificadamente.
Contestou o Réu, em síntese:
O processo de inventário tem decorrido com observância de todos os
direitos processuais, e ali foi dada à Autora oportunidade para se
pronunciar quanto à relação de bens apresentada, tendo ela reclamado da
mesma, e tendo a questão sido ali decidida, pela manutenção do passivo
no inventário.
O Tribunal ouviu as partes sobre o eventual efeito preclusivo da
falta de reação, da Autora, contra o despacho do Notário, pela
manutenção da verba e pela não remessa dos interessados para os meios
comuns.
Apenas a Autora se pronunciou, considerando ter direito à ação comum,
considerando duvidosa a constitucionalidade da norma que defere a
competência aos srs. Notários para dirimir processos de inventário.
No saneador, considerando um efeito preclusivo, decorrente da pendência
do inventário, o Tribunal decidiu absolver o Réu do pedido.
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/9703a18434f1caa18025837c003dd503?OpenDocument 1/6
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Inconformada, a Autora recorreu e apresenta as seguintes conclusões:


1º O direito de acesso à justiça e aos tribunais decorre do artigo 20º da
CRP e dos princípios nela consignados, designadamente,
2º O de que compete aos tribunais, como órgão soberania, dirimir
conflitos públicos e privados.
3º No âmbito do processo de inventário litigioso a correr termos em
Cartório Notarial não existe impedimento legal a que qualquer dos
interessados recorra a tribunal para dirimir o litígio sobre a propriedade
de uma verba relacionada no inventário.
4º O direito de ação decorre do artigo 2º do CPC; do artigo 20º do CRP e
os princípios nela consignados entre os quais o de que compete aos
tribunais, como órgão de soberania, dirimir litígios públicos e privados.
5º A norma do artigo 16º da Lei nº 23/2013 é inconstitucional quando
interpretada no sentido de condicionar a apreciação pelos tribunais de
questões que se suscitem no processo de Inventário que corre seus termos
em cartório notarial a prévia dcecisão notarial.

Contra-alegou o Réu, defendendo a correção do decidido e a


indevida arguição de inconstitucionalidade.

A questão a dirimir é a de saber se a norma do artigo 16º da Lei nº


23/2013 é inconstitucional, quando interpretada no sentido de condicionar
a apreciação pelos tribunais de questões que se suscitem no processo de
Inventário que corre seus termos em cartório notarial a prévia decisão
notarial.

Factos a considerar, para além daqueles que resultam do relatório


antecedente:
A Autora instaurou a ação, alegando que o Réu incluiu um passivo de €
74.819,68 na relação de bens do processo de inventário, que corre termos
para partilha dos bens do casal, não justificando essa verba.
No referido inventário, a Autora reclamou de tal inclusão.
Em 9.11.2016, a srª Notária indeferiu a reclamação e indeferiu a remessa
do processo para os meios comuns.
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/9703a18434f1caa18025837c003dd503?OpenDocument 2/6
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A Autora não impugnou judicialmente o referido despacho.

*
Na análise da questão, são especialmente relevantes os seguintes artigos
da Lei nº 23/2013 (Regime Jurídico do Processo de Inventário):
Artigo 3.º (Competência do cartório notarial e do tribunal), seu nº 7:
Compete ao tribunal da comarca do cartório notarial onde o processo foi
apresentado praticar os atos que, nos termos da presente lei, sejam da
competência do juiz.
Artigo 16.º (Remessa do processo para os meios comuns):
1 - O notário determina a suspensão da tramitação do processo sempre
que, na pendência do inventário, se suscitem questões que, atenta a sua
natureza ou a complexidade da matéria de facto e de direito, não devam
ser decididas no processo de inventário, remetendo as partes para os
meios judiciais comuns até que ocorra decisão definitiva, para o que
identifica as questões controvertidas, justificando fundamentadamente a
sua complexidade.
2 - O notário pode ainda ordenar suspensão do processo de inventário,
designadamente quando estiver pendente causa prejudicial em que se
debata alguma das questões a que se refere o número anterior, aplicando-
se o disposto no n.º 6 do artigo 12.º
3 - A remessa para os meios judiciais comuns prevista no n.º 1 pode ter
lugar a requerimento de qualquer interessado.
4 - Da decisão do notário que indeferir o pedido de remessa das partes
para os meios judiciais comuns cabe recurso para o tribunal competente,
no prazo de 15 dias a partir da notificação da decisão, o qual deve incluir
a alegação do recorrente.
5 - O recurso previsto no número anterior sobe imediatamente e tem
efeito suspensivo, aplicando-se o regime da responsabilidade por
litigância de má-fé previsto no Código de Processo Civil.
6 - O notário pode autorizar, a requerimento das partes principais, o
prosseguimento do inventário com vista à partilha, sujeita a posterior
alteração, em conformidade com o que vier a ser decidido, quando:
a) Ocorra demora injustificada na propositura ou julgamento da causa
prejudicial;
b) A viabilidade da causa prejudicial se afigure reduzida; ou
c) Os inconvenientes no diferimento da partilha superem os que derivam
da sua realização como provisória.

www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/9703a18434f1caa18025837c003dd503?OpenDocument 3/6
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7 - Realizada a partilha nos termos do número anterior, são observados os


atos previstos no artigo 68.º, relativamente à entrega aos interessados dos
bens que lhes couberem. (…)
Artigo 17.º (Questões definitivamente resolvidas no inventário):
1 - Sem prejuízo das competências próprias do Ministério Público,
consideram-se definitivamente resolvidas as questões que, no inventário,
sejam decididas no confronto do cabeça de casal ou dos demais
interessados a que alude o artigo 4.º, desde que tenham sido regularmente
admitidos a intervir no procedimento que precede a decisão, salvo se for
expressamente ressalvado o direito às ações competentes.
2 - Só é admissível a resolução provisória, ou a remessa dos interessados
para os meios judiciais comuns, quando a complexidade da matéria de
facto subjacente à questão a dirimir torne inconveniente a decisão
incidental no inventário, por implicar a redução das garantias das partes.
Artigo 66.º (Decisão homologatória da partilha):
1 - A decisão homologatória da partilha constante do mapa e das
operações de sorteio é proferida pelo juiz cível territorialmente
competente.
2 - Quando a herança seja deferida a incapazes, menores ou a ausentes em
parte incerta e sempre que seja necessário representar e defender os
interesses da Fazenda Pública, o processo é enviado ao Ministério Público
junto do juízo cível territorialmente competente, para que determine, em
10 dias a contar da respetiva receção, o que se lhe afigure necessário para
a defesa dos interesses que legalmente lhe estão confiados.
3 - Da decisão homologatória da partilha cabe recurso de apelação, nos
termos do Código de Processo Civil, para o Tribunal da Relação
territorialmente competente, com efeito meramente devolutivo.
Artigo 76.º (Regime dos recursos):
1 - Da decisão homologatória da partilha cabe recurso, aplicando-se, com
as necessárias adaptações, o regime de recursos previsto no Código de
Processo Civil.
2 - Salvo nos casos em que cabe recurso de apelação nos termos do
Código de Processo Civil, as decisões interlocutórias proferidas no
âmbito dos mesmos processos devem ser impugnadas no recurso que vier
a ser interposto da decisão de partilha.
No caso dos autos, seguindo o processo de inventário a sua tramitação
normal, foi indeferida a remessa dos interessados para os meios comuns,
despacho que não foi colocado em causa, nos termos do art.16º, nº 4, da
lei em análise.

www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/9703a18434f1caa18025837c003dd503?OpenDocument 4/6
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O seu incidente sobre a reclamação de bens culminou na decisão de


9/11/2016, de manter relacionada a verba do passivo, relativamente à qual
a Autora pretende que seja declarado nestes autos que não existe como
dívida dela ao Réu.
Quanto à decisão de não remessa para os meios comuns, como a
interessada não recorreu, a mesma tornou-se definitiva no inventário.
Quanto à decisão sobre a reclamação de bens, mantendo a verba do
passivo, como resulta do referido art.76º, nº 2, a Autora poderá interpor
recurso dela com o recurso que vier a ser interposto da decisão de
partilha.
Aquele conjunto normativo revela que, enquanto dure o inventário, no
qual foi colocada a questão da consideração da verba, a Autora não pode
colocar uma ação deste tipo, antecipando ou modificando as
competências do Tribunal.
A(o) interessada(o) deve defender-se primeiro no inventário, suscitando a
decisão do Notário, impugnando esta ou recorrendo dela para o Tribunal
competente.
Não sendo assim, o normativo relativo a recursos não teria qualquer
função útil, já que, mesmo que não recorresse, sempre o interessado
poderia reagir contra a decisão, através de outro meio processual, noutra
sede processual, quando bem entendesse.
O próprio regime do processo de inventário estaria inutilizado.
Se da decisão do notário, que indeferir o pedido de remessa das partes
para os meios judiciais comuns, cabe recurso para o tribunal competente,
e da sua decisão, que decide manter uma verba relacionada, cabe recurso
com o recurso da sentença de partilha, não vislumbramos no regime uma
violação do direito constitucional de acesso à justiça e aos tribunais.
E a exigida prévia decisão do Notário não configura uma
desjudicialização completa e inadmissível dos litígios em questão.
(Ver acórdão do T. Constitucional nº 843/2017, de 13.12.2017, proc.
265/2017, em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos e ac. da Relação
de Lisboa, de 30.3.2017, proc. 13079/16, em www.dgsi.pt.)
O direito de acesso aos tribunais não é absoluto e pode ser conformado
pelo legislador em limites proporcionados.
E a exigência de prévia decisão notarial não viola a exigência
constitucional de que cabe aos tribunais a administração da justiça
(art.202º da Constituição da República Portuguesa).
Quanto à primeira decisão do Notário em causa (não remessa para os
meios comuns), a Autora teve a faculdade de a impugnar no tribunal
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/9703a18434f1caa18025837c003dd503?OpenDocument 5/6
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competente.
Quanto à segunda decisão do Notário em causa (manter a verba do
passivo), a Autora ainda poderá questioná-la junto dos tribunais.
Estas salvaguardas legais são suficientes e proporcionadas ao invocado
direito de acesso aos tribunais.
Assim, em concreto, em face do pedido no recurso, importa concluir que
o conjunto normativo do artigo 16º da Lei nº 23/2013 não é
inconstitucional, quando interpretada no sentido de condicionar a
apreciação pelos tribunais, de questões que se suscitem no processo de
Inventário, que corre seus termos em cartório notarial, a prévia decisão
notarial.

Decisão.
Julga-se o recurso improcedente e mantém-se a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Coimbra, 2018-11-13
Fernando Monteiro ( Relator )
António Carvalho Martins
Carlos Moreira

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Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de


Évora
Processo: 852/19.0T8TNV.E1
Relator: FRANCISCO MATOS
Descritores: NOTARIADO
INVENTÁRIO
INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA
Data do Acordão: 04-06-2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I - Na pendência do inventário em cartório notarial os interessados podem propor
ações comuns destinadas a resolver questões conexas com o inventário em curso
quando o notário o determinar, por iniciativa própria ou por iniciativa dos
interessados.
II- Por falta de condições de admissibilidade da ação, não é de admitir a ação comum
destinada a solucionar uma questão conexa com o inventário em curso sem que os
interessados hajam sido remetidos para os meios comuns.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Proc. nº 852/19.0T8TNV.E1
Integral:

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora:

I – Relatório
1. (…), viúva, residente na Estrada (…), nº 20, Casal dos (…), (…), instaurou contra
(…), residente na Estrada (…), nº 20, Casal (…), (…), ação declarativa com processo
comum.
Alegou, em síntese, que A. e a R. são filhas de (…) e (…), ambos falecidos e que estes
doaram, a cada uma das filhas, prédios mistos, mas a R foi significativamente
beneficiada em relação à A., uma vez que os donatários constituíram uma reserva de
usufruto do prédio que lhe doaram e oneraram a doação com o encargo de tratar dos
doadores, seus pais, na saúde e na doença e suprir as despesas necessárias com a sua
alimentação e saúde o que esta observou, durante mais de dez anos e até à morte de
ambos.
A R. instaurou processo de inventário para partilha dos bens deixados por morte de
seus pais, o qual corre termos no cartório Notarial de Torres Novas a cargo da Drª
Marta Susana da Silva Cruz, as interessadas partilharam, por acordo, os bens móveis,
já chegaram a acordo quanto à partilha de dois prédios rústicos, mas quanto aos
prédios recebidos por doação a R. pretende receber tornas da A. argumentando que
prédio doado à A. tem um valor superior ao valor do prédio que ela R. recebeu em
doação e a A. considera que, no seu caso, as tornas não são devidas.
Concluiu pedindo, entre outras declarações, a dispensa da redução da liberalidade por
inoficiosidade.
Contestou a R. excecionando a incompetência do tribunal em razão da matéria, por se
encontrar em curso processo de inventário para partilha dos bens dos pais da A. e R.
e, entre eles, dos prédios doados, em que são interessadas a A. e a R., meio processual
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/2a888089216320db80258590002a00bd?OpenDocument 1/6
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adequado para apreciar o pedido da A. que, aliás, não o formulou no inventário e


contradizendo, por falsos, os factos alegados pela A.
Conclui pela improcedência da ação e pediu a condenação da A. em multa e
indemnização não inferior a € 2.000,00, por litigância de má-fé.

2. Seguiu-se despacho saneador que julgou procedente a exceção de incompetência absoluta do


tribunal em razão da matéria e absolveu a R. da instância.

3. A A. recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso:


“1. Sendo o objeto do recurso delimitado ao conhecimento da competência em razão
da material do tribunal a quo para conhecer dos pedidos, a única questão que é a
passível de decisão do tribunal ad quem é exatamente se poderá, ou não, o tribunal a
quo julgar-se absolutamente incompetente em razão da matéria e nessa medida
absolver a R. da instância, s.m.o., entendemos que não, porquanto a competência dos
tribunais em razão da matéria está plasmada nos artº 64º e 65º do CPC, conjugados
com artº 40º, nº 1 e 2, artº 80º, nº 1 e 2, artº 130º todos da Lei da Organização do
Sistema Judiciário, aprovada pela Lei 62/2013, de 26 de Agosto, atualizada pela Lei
19/2019, de 19 de Fevereiro.
Por outro lado, dispõe o artº 16º, nº 1, do Regime Jurídico do Processo de Inventário:
“O notário determina a suspensão da tramitação do processo sempre que, na
pendência do inventário, se suscitem questões que, atenta a sua natureza ou a
complexidade da matéria de facto e de direito, não devam ser decididas no processo
de inventário, remetendo as partes para os meios judiciais comuns até que ocorra
decisão definitiva, para o que identifica as questões controvertidas, justificando
fundamentadamente a sua complexidade;
2. Dispõe ainda o nº 3 da mesma norma:
“A remessa para os meios judiciais comuns prevista no nº 1 pode ter lugar a
requerimento de qualquer interessado”.
3. E, por fim, dispõe o artº 17º, nº 2, do RJCI:
“Só é admissível a resolução provisória, ou a remessa dos interessados para os meios
judiciais comuns, quando a complexidade da matéria de facto subjacente à questão a
dirimir torne inconveniente a decisão incidental no inventário, por implicar a redução
das garantias das partes”.
Ou seja,
Sempre que qualquer interveniente num processo de inventário, devido à
complexidade da causa, tiver justo receio da redução das suas garantias, poderá
requerer a remessa dos autos aos meios judiciais comuns, os quais possuem
competência material para os apreciar, sob pena de serem violados direitos
fundamentais da CRP.

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Atentos os factos supra referidos, deve o Tribunal ad quem, revogar a sentença


recorrida e ordenar a devolução dos autos ao tribunal a quo para conhecimento dos
pedidos COM O QUE SE FARÁ SERENA, SÃ E COSTUMADAJUSTIÇA!”
Respondeu a R. por forma a concluir pela improcedência do recurso.
Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Objeto dos recursos.


O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões
de conhecimento oficioso (arts. 635º, nº 4 e 608º, nº 2 e 663, nº 2, do Código de
Processo Civil), nos recursos apreciam-se questões e não razões ou argumentos e os
recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado
pelo conteúdo do ato recorrido, sem prejuízo da liberdade de indagação, interpretação
e aplicação das regras de direito.
A não sujeição do juiz às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e
aplicação das regras de direito (artº 5º, nº 3, do CPC), a par de outros, é um princípio
do procedimento que não sofre restrições na 2ª instância, isto é, o tribunal de recurso
não está limitado quanto a esta liberdade de motivação.
“No respeitante à matéria de direito (…) são tribunais de recurso inteiramente livres quanto à
determinação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso ajuizado, devendo mesmo, tomar
em consideração as modificações da lei sobrevindas após o julgamento ocorrido na instância inferior,
caso elas abranjam a relação jurídica litigiosa”[1].
Esta precisão torna-se necessária porquanto a Apelante parece querer ignorá-la e, por
efeito, condicionar o conhecimento desta instância à competência do tribunal em
razão da matéria; a única questão que é a passível de decisão do tribunal ad quem é exatamente se
poderá, ou não, o tribunal a quo julgar-se absolutamente incompetente em razão da matéria e nessa
medida absolver a R. da instância, afirma, querendo significar que o tribunal ou é
competente ou não é competente e nenhuma outra solução é possível no tribunal de
recurso.
A solução supõe a questão mas não se confunde com ela e a diferença está em envolver a
solução a qualificação jurídica dos factos, ou seja, a indagação, interpretação e aplicação
das regras de direito que a iniciativa das partes não pode limitar, por isso que as
questões a decidir pelo tribunal ad quem não estão limitadas pela qualificação jurídica
considerada pelas partes, nem pela qualificação jurídica do ato recorrido e, neste
sentido, a qualificação jurídica dos factos não condiciona o objeto do recurso.
As questões a decidir consistem, pois, em verificar (i) se a dispensa de redução de
liberalidades inoficiosas é uma questão conexa com o inventário, (ii) se estando a correr um processo
de inventário, os aí interessados podem propor ações comuns destinadas a resolver questões conexas
com o inventário em curso.

III. Fundamentação.
1. Factos
Relevam os factos constantes no relatório supra, designadamente, que se encontra a
correr processo de inventário, no cartório Notarial de Torres Novas a cargo da Drª
Marta Susana da Silva Cruz, para partilha dos bens deixados por morte de (…) e (…),
em que são interessadas a A. e a R.
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/2a888089216320db80258590002a00bd?OpenDocument 3/6
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2. Direito
2.1. Se a dispensa de redução de liberalidades inoficiosas é uma questão conexa com o inventário
A ação destina-se a declarar que a R. não tem direito a reduzir a doação que os seus
falecidos pais fizeram a favor da A., sua irmã, no pressuposto – não caraterizado –
que tal doação ofende a legítima daquela.
Dizemos não caraterizado, porquanto as liberalidades dizem-se inoficiosas quando
ofendem a legítima dos herdeiros legitimários (artº 2168º do CC), esta é calculada por
referência ao valor dos bens existentes no património do autor da sucessão à data da
sua morte, ao valor dos bens doados, às despesas sujeitas a colação e às dividas da
herança (artº 2162º, nº 1, do CC) e nada disto vem alegado na petição inicial.
Este aspeto é, aliás, essencial para compreender a ligação ou conexão da pretensão da
A. – dispensa de redução de liberalidades inoficiosas – ao processo de inventário, uma vez
que, sem ele, ou seja, declarado, em tese, ou em abstrato, como a A. parece entender, é
suscetível de ocasionar pronúncia inútil e se a lei proíbe a prática de atos inúteis no
processo (artº 137º do CPC), por maioria de razão proíbe a tramitação de processos
inúteis.
A utilidade do processo, ou seja, o direito da autora a que corresponde uma ação adequada a
fazê-lo reconhecer em, juízo (artº 2º, nº 2, do CPC) parte do pressuposto que a liberalidade
que os seus pais lhe fizeram em vida é redutível por inoficiosidade e isto, porque se o
não for, isto é, se a doação que beneficiou a A. não ofender a legítima da R., sua irmã,
a doação não é, à partida, redutível e é tão só isto que se pretende ver declarado; a
inutilidade consistira precisamente em declarar não redutível por inoficiosidade uma
doação que ab initio nunca o foi. Por isto que o direito da A. não surge em abstrato,
surge em concreto depois de verificado que a doação de que é donatária ofende a
legítima da sua irmã.
Considerandos que não têm o propósito de reconhecer ou não razão à A., nem o de
verificar se a petição reúne as condições necessárias a este conhecimento, mas tão só
de evidenciar que o direito a que a A. se arroga não prescinde do cálculo da legítima da
R., sua irmã, o cálculo desta, por sua vez, exige que se conheçam os valores dos bens
existentes no património dos autores da sucessão à data da sua morte, o valor dos
bens doados, as despesas sujeitas a colação e as dividas, ou seja, para se afirmar o
direito que a A. pretende ver declarado é necessário conhecer todos os elementos de
facto próprios do processo de inventário.
“A redução, como a revogação, pressupõem a estimação rigorosa dos bens do autor da herança, a
determinação exata da sua quota disponível, o apuramento da ofensa das legítimas, e todos estes
dados só [são] suscetíveis de serem captados através dos termos que são próprios do inventário em si
mesmo” [Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, vol. 1º, 4ª ed., pág. 142].
Em resposta a esta primeira questão dir-se-á, pois, que a dispensa de redução de
liberalidades inoficiosas é uma questão conexa com o inventário.

2.1. Se estando a correr um processo de inventário, os aí interessados podem propor ações comuns
destinadas a resolver questões conexas com o inventário em curso
Segundo o artº 3º, nºs 1 e 4, do regime jurídico do processo de inventário, aprovado
pela Lei n.º 23/2013, de 5/3, ao caso aplicável[2], “[c]ompete aos cartórios notariais sediados
no município do lugar da abertura da sucessão efetuar o processamento dos atos e termos do processo

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28/10/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

de inventário e da habilitação de uma pessoa como sucessora por morte de outra” e “[a]o notário
compete dirigir todas as diligências do processo de inventário e da habilitação de uma pessoa como
sucessora por morte de outra, sem prejuízo dos casos em que os interessados são remetidos para os
meios judiciais comuns”.
De acordo com os nºs 1 a 4 do artº 16º da mesma lei, os interessados são remetidos
para os meios comuns, a seu requerimento ou por iniciativa do notário (i) sempre que,
na pendência do inventário, se suscitem questões que, atenta a sua natureza ou a complexidade da
matéria de facto e de direito, não devam ser decididas no processo de inventário e no caso de estar
pendente causa prejudicial em que se debata alguma das referida questões e o notário
pode ainda (ii) ordenar suspensão do processo de inventário.
Da decisão do notário que indeferir o pedido de remessa das partes para os meios
judiciais comuns, cabe recurso para o tribunal.
Assim e em resposta a esta segunda questão diremos que estando a correr um
processo de inventário, os aí interessados podem propor ações comuns destinadas a
resolver questões conexas com o inventário em curso quando o notário o determinar, seja
por iniciativa própria, seja por iniciativa dos interessados.

2.2. O caso concreto


A A., na pendência do inventário em que são interessados ela e a R., sua irmã, propôs
a presente ação comum com vista a resolver uma questão conexa com o inventário,
sem que haja colocado a questão no processo de inventário e aí requerido a remessa
dos interessados para os meios comuns e sem que o Notário (a quem a questão não
foi colocada) haja remetido os interessados para os meios comuns, assim se
evidenciando que o A. não tem razão para solicitar e obter a tutela judicial pretendida
antes de a formular processo de inventário.
A nosso ver, não estamos confrontados com uma questão de competência do tribunal
[esta, “em sentido técnico designa a repartição do poder jurisdicional pelos diversos tribunais do
Estado”[3] o que, no caso, não se coloca e, ademais, o tribunal comum é competente
para conhecer da questão nos termos antes preconizados] mas com uma questão de
falta de jurisdição ou de atribuições[4] do tribunal comum que não configurando, no
caso, um qualquer conflito entre autoridades (artigo 109.º do CPC) obsta – por falta
de condições de admissibilidade da ação – a que o tribunal se possa pronunciar sobre
o mérito da pretensão da A., constituindo, como tal, uma exceção dilatória inominada
(artº 576º, nº 3, do CPC) de conhecimento oficioso (artº 578º do CPC).
Assim, o acórdão desta Relação de 8/2/2018, “(…) não poderá o tribunal de 1.ª instância
pronunciar-se sobre a questão em causa, uma vez que compete ao notário dirimir todas as questões
que importem à partilha. Tal impedimento configura uma exceção dilatória inominada, de
conhecimento oficioso, que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição
da instância (artigos 576.º, n.º 2 e 578.º do CPC)”[5].
A decisão recorrida, na parte em que considerou que a pretensão da A. deve ser
suscitada, em primeira linha, no processo de inventário e em que absolveu a R. da
instância, conforma-se a solução apontada e, como tal, com este alcance, deve
manter-se.
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Improcede o recurso.

3. Custas
Vencida no recurso, incumbe ao Apelante pagar as custas (artºs 527º, nºs 1 e 2, do
CPC).
Sumário (da responsabilidade do relator – artº 663º, nº 7, do CPC):

(…)

IV. Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto, na improcedência do recurso, em confirmar a decisão
recorrida na parte em que absolve a R. da instância.
Custas a cargo da Apelante.
Évora, 4/6/2020
Francisco Matos
José Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho

__________________________________________________
[1] Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, pág. 157.
[2] A Lei n.º 23/2013, de 5/3 foi revogada pelo artº 10º da Lei n.º 117/2019, de 13/9,
mas continua a aplicar-se aos processos de inventário pendentes nos cartórios
notariais, em 1/1/2020 que não sejam remetidos ao tribunal nos termos do disposto
nos artigos 11.º a 13.º (artºs 11º e 15º).
[3] Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 1, 2ª ed., pág. 104.
[4] Ob. cit., pág. 366.
[5] Processo 90/17.7T8PTG.E1, disponível em www.dgsi.pt.

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Ficha Técnica

Título
Processo de Inventário

Edição
Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos
Advogados
Rua dos Anjos, 79
1050-035 Lisboa
T. 21 312 98 50
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Sofia Galvão

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