Conceito de América Latina

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O CONCEITO DE “AMÉRICA

LATINA”
SOBRE O MÉTODO DA HISTÓRIA INTELECTUAL DO POLÍTICO

* O porquê de trazer a discussão: Héctor H. Bruit (2000) e João Féres (2004)


produzem análises linguísticas do desenvolvimento semântico do conceito
América Latina ao longo do período histórico compreendido entre os séculos
XIX e XX.

* História Intelectual do Político/ História dos Conceitos. Trata-se de um campo


de investigação dentro da disciplina História cuja formação remonta ao século
XVIII alemão. Trata-se de uma alternativa à tradicional Historia Intelectual ou
das Ideias.

* Princípios centrais: distinção polissêmica Conceito/Palavra; “Diacronia”;


“Sincronia”; “Semasiologia”.
* Influenciada pela linguística do filósofo suíço Ferdinand Saussure no século
XX. Esta por sua vez:

I – ofereceu sólida contribuição ao desenvolvimento teoria literária.

II – elaborou a Teoria dos Signos na comunicação: unidade portadora de


sentido; formativo da relação entre significante (som acústico/palavra) e
significado (ideia/abstração/conceito). Trata-se de elementos de comunicação e
de representação da realidade que permitem as pessoas interagirem por meio da
transmissão de pensamentos.

III - Seus conceitos atenderam diretamente ao Estruturalismo.

IV – Importante para História dos Conceitos devido ao interesse do campo por


estudos filológicos.
* Duas Vertentes: alemã e a inglesa.

* KOSELLECK, Reinhart. Futuro Pasado: para una semántica de los tiempos


históricos. Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica, 2006:

O aporte mais significativo da História dos Conceitos, na perspectiva de Reinhart


Koselleck, consiste na compreensão do crescimento da relevância histórica e social dos
resultados, quando focalizamos a duração ou a transformação dos conceitos ao longo das
épocas. Tal procedimento permite avaliar o impacto de um conceito social ou político. A
análise diacrônica possibilita acesso a camadas de significado, dado que os conceitos
podem reunir em si diversas experiências e características teóricas de uma única
circunstância.

* Reinhart Koselleck (1923-2006): historiador alemão do pós II Guerra;


* Áreas de interesse: Historia Intelectual do Político; Teoria da História. Período:
história do século XVIII até os dias atuais. Particularidades: Historia político-
administrativa da Prússia no século XVIII; Investigação sobre a formação dos
tempos modernos.

* Um dos principais fundadores da História dos Conceitos ao lado de Otto


Brunner e Werner Conze. Coeditor do Conceitos Históricos Básicos.

* Tese de Doutoramento: Crítica e crise. Um estudo acerca da patogênese do


mundo burguês, defendida em 1954.

* Principais influências: Martin Heidegger; Karl Schimitt; Ganz-Georg Gadamer.


ENQUADRAMENTO ESPAÇO-TEMPORAL DO SURGIMENTO DO
CONCEITO “AMÉRICA LATINA”

* Consenso historiográfico: França do Imperador Napoleão III (1851-1870).

* Referência para estudo do período:

I – O 18 do Brumário de Luís Bonaparte (1852), de Karl Marx:

“Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande
importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de
acrescentar: a primeira como tragédia, a segunda como farsa”.

II – O Crepúsculo das Revoluções 1848-1871, de Quentin Deluermoz.


* No contexto do Segundo Império francês, a formulação e emprego do
conceito América Latina e/ou Amérique Latine possui dupla origem do
ponto de vista espacial e linguístico

I – o círculo de letrados da Corte Luís Napoleão, com destaque para os


escritos do engenheiro, economista e senador Michel Chevalier (1806-
1879), entusiasta da ideologia romântica do panlatinismo em O México
Antigo e Moderno (1863). Expressão utilizada com frequência pela Revue
des Races Latines nos anos de 1860.

II – nas publicações de letrados hispano-americanos frequentadores dos


espaços de sociabilidade da capital francesa, com destaque para: o
argentino Carlos Calvo Recueil complet dês traités, conventions,
capitulations,armistices et outres actes diplomatiques de tous lês Etats de
l’Amérique latine compris entre lê golfe du Mexique et lê Cap Horn
depuis l’année 1493 jusqu’à nos jours (1864); e o colombiano Torre
Caicedo, idealizador da Liga latino-americana por meio da publicação
Unión Latinoamericana (1865).

* Nas Américas, se pudéssemos fazer um balanço de todos os escritores


americanos que se interessaram por traçar o perfil do continente, sua identidade,
observaríamos que a maior parte se mostrou preocupado com as questões de
origem, pelas raízes históricas definidas da cultura nacional ou continental.
Exemplos: Domingos Sarmiento, José de San Martí.

* Os letrados peruanos são os que mais se preocuparam com a latinidade do


continente. A razão disto talvez seja o fato de que a sociedade peruana, e em
geral, toda a sociedade andina, é de forte tradição indígena e mestiça,
populações estas que têm conservado, de todas as formas imaginadas, as
seculares tradições e práticas pré-hispânicas.
SIGNIFICADO (-S) DE PANLATINISMO E DE CONCEITOS
CORRELATOS NO LÉXICO NORMATIVO DA ÉPOCA

VIEIRA, Fr. Domingos.


Grande Dicionário
Português ou Tesouro da
Língua Portuguesa.
Editado por Ernesto
Chardron e Bartholomeu H.
De Moraes. Porto: Imprensa
Literário Comercial
Editores, 1871- 1873. V.
MORAES SILVA, Antônio de. Dicionário da Língua Portuguesa. 8 ed.
Rio Janeiro: Lisboa: Editora Empresa Literária Fluminense: Tipografia de
Joaquim Germano de Sousa Neves- Editor, 1890, v. I p. 178. Observação
na edição de 1879 do mesmo dicionário não há verbetes para “Saxão” e
“Panlatinismo”.
* Destaque para o nome escritor, político Emílio Castelar y Ripoll (1832-1899)
no universo espanhol do século XIX. Penúltimo Presidente da Primeira
República Espanhola (1873-1874).

* Em Emilio Castelar y el Hispanoamericanismo del siglo XIX, Víctor Peralta


sustenta que a visão política do pensamento castelariano respondeu a um
postulado liberal-católico. Tal postulado dominou a fórmula do progresso
criada por E. Castelar cuja síntese era o desenvolvimento da democracia, sob a
forma republicana no século XIX.
* O paradigma foi orientado de modo a propor projeto cujo propósito foi o de
criar uma confederação transcontinental hispano-latina, envolvendo as
Repúblicas hispano-americanas, Portugal, Espanha, França e Itália. Tal
propósito procurava fazer frente à expansão da raça anglo-saxônica,
representada pelos avanços da República federativa nos Estados Unidos, e às
pretensões imperiais da Monarquia dos Braganças no Brasil.
* Destaca o desprezo cultivado por E. Castelar em relação ao governo
monárquico do Brasil e também o ódio à dinastia dos Braganças.
Historicamente acusou a dinastia portuguesa de haver contribuído para o fim
da unidade ibérica ao indepedentizar-se - se do Reino da Espanha, em 1640. A
raiva à dinastia teria aumentado quando comprovou que, no Brasil, ela agia
tendo por objetivo se opor a projetos republicanos na Europa. E. Castelar
sempre recordaria que o Imperador do Brasil, D. Pedro II, não apenas
perseguiu os simpatizantes da Primeira República Espanhola, com o também
promoveu campanha contra o referido projeto político através da imprensa
monárquica.

* Referência para discussão dos motivos pelos quais o Brasil não se vê inserido
no universo dos países “latino-americanos: PIMENTA, João Paulo. A
Independência do Brasil e a experiência hispano-americana (1808-1822).
São Paulo: Hucitec, 2015.
CONTEXTO DE MUDANÇA SEMÂNTICA RADICAL DO CONCEITO
AMÉRICA LATINA
* Momento do Lance: segundo Jonh Pocock, em Linguagens do Ideário Político,
trata-se do movimento empreendido pelo autor (jogador) do ato de fala, na
qualidade de ator histórico, que pode resultar ou não em inovações no contexto
linguístico.

* O nome “América Latina” é definitivamente consagrado em 1948, quando é


fundada a CEPAL – sigla referente à Comissão Econômica Para América
Latina, um organismo das Nações Unidas com objetivo de incentivar a
cooperação econômica entre países-membros. Destaque para análise baseada
nos pressupostos convencionais da teoria marxista. Explica o desenvolvimento
socioeconômico dos países por etapas.

* A expressão se difunde intimamente associada ao conceito de


“subdesenvolvimento”, formulado na década de 1950.
* América Latina passa a ser sinônimo de:

I – instabilidade política crônica;

II – estrutura produtiva atrasada e em certos casos arcaica;

III – dependência total ao capital norte-americano; estrutura fundiária


reorganizada pelo capital monopólico; acentuado crescimento demográfico.

* São estes processos concretos, próprios do século XX, que deram conteúdo
histórico à ideia de América Latina.
* Os debates acadêmicos na Cepal foram responsáveis por gerar a chamada
Teoria da Dependência que postula a caracterização de países como “atrasados”
baseada na relação de subordinação estabelecida entre “países centrais” e
“países periféricos” no âmbito mundial do sistema capitalista.

* João Fères destaca que tal pensamento não surge em solo estadunidense, mas
foi formulado por pensadores na “América Latina” nas décadas de 1960-1970
e, posteriormente, foi recepcionado pela academia nos EUA. Principais nomes:
Fernando Henrique Cardoso, Enzo Falleto, Theotônio dos Santos, André
Gunder Frank.

* O fenômeno de mudança semântica do conceito “América Latina” também


inserido no contexto de emergência da Teoria da Modernização, no segundo
pós- guerra, nos EUA. Época de disputa político-ideológico e militar com
bloco socialista liderado pela URRS.
* Aplicação do Plano Marshall na EUR e Japão e do projeto de desenvolvimento
e segurança para a “América Latina”. Momento em que Washington e a
iniciativa privada passaram a estreitar laços com os espaços acadêmicos no país
na perspectiva governamental-administrativa e empresarial de torná-los
mecanismos de projeção de poder em escala global, particularmente nas terras
ao sul da fronteira do Rio Grande.

* Crescente preocupação com a segurança interna diante da potencial ameaça


representada por países em estado agudo de pobreza social e econômica.

* Década de 1950: Momento de construção do conceito “América Latina” através


do discurso sociocientifico formulado nas academias a partir da instituição dos
cursos universitários denominados Latin American Studies, sob imperativo da
Teoria da Modernização. Era Kennedy: criação do Projeto Aliança para o
Progresso.

* Revolução Cubana (1953-1959): divisor de água no processo de


institucionalização e profissionalização dos Latin American Studies.

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