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Percepção de profissionais da saúde sobre

abortamento legal
Wesley Braga da Rocha 1 , Anadely Castro da Silva 2, Solange Maria de Lacerda Leite 3, Thiago Cunha 4

Resumo
Este estudo analisou o conhecimento e a percepção dos aspectos éticos envolvidos no Programa de Inter­
rupção Gestacional Prevista em Lei, por parte de profissionais de saúde do Hospital Materno Infantil de
Brasília que não lidam diretamente com os serviços de abortamento legal dessa instituição. Utilizou-se méto-
do quantiqualitativo, cujos resultados indicaram desconhecimento por parte desses profissionais quanto ao
funcionamento e aos procedimentos necessários ao serviço. Observou-se que as questões de cunho ético,
moral, cultural e religioso exercem forte influência sobre a percepção do tema pelos profissionais da saúde
que lidam indiretamente com ele. O estudo aponta como principal causa desse quadro a falta de divulgação
do Programa associada ao estigma e ao preconceito presentes nessa temática, indicando a necessidade de
capacitação ética contínua dos profissionais, como forma de qualificar o atendimento às mulheres que reco-
rrem ao serviço de referência para interrupção de gravidez nos casos previstos em lei.
Palavras-chave: Aborto. Aborto legal. Violência sexual. Ética profissional. Bioética.

Resumen
Percepción de profesionales de la salud sobre el aborto legal
El presente estudio analizó el conocimiento y la percepción de los profesionales de la salud del Hospital Ma-
terno Infantil de Brasilia que no lidian directamente con los servicios de aborto legal en relación a los aspectos
éticos involucrados en el Programa de Interrupción de la Gestación Prevista en la Ley. Se utilizó una metodolo-
gía cuali-cuantitativa, cuyos resultados indicaron un desconocimiento por parte de estos profesionales acerca
del funcionamiento y de los procedimientos necesarios para el servicio. Se observó también que ciertas cues-
tiones de cuño ético, moral, cultural y religioso ejercen una fuerte influencia en la percepción del tema por
parte de los profesionales de la salud que lidian directamente con el tema. El estudio señala como principal
causa de este cuadro la falta de divulgación del Programa asociada al estigma y el prejuicio implicados en la
temática, indicando la necesidad permanente de capacitación ética de los profesionales como forma de brin-
dar calidad a la atención de mujeres que utilizan el Servicio de Referencia para la Interrupción del Embarazo
en los Casos Previstos en la Ley.
Palabras-clave: Aborto. Aborto legal. Violencia sexual. Ética profesional. Bioética.

Abstract
The perception of health professionals regarding legal abortion
The present study examined the knowledge and the perception of health professionals of the “Hospital Ma-
terno Infantil de Brasília” (Mother and Child Hospital of Brasilia) that do not deal directly with legal abortion
services as the ethical aspects involved in the Programa de Interrupção da Gestação Prevista em Lei [Legal
preganancy interruption Program]. The study used a qualitative-quantitative method for which the results

Artigos de pesquisa
showed ignorance about the service and the procedures necessary for the service on the part of these. It
was observed that moral, cultural and religious issues exert strong influence on the perception of the theme
by health professionals who deal indirectly with the issue. The study points to the lack Program diffusion
associated to the stigma and prejudice involved in the theme as the main causes of this situation, indicating
the continuing need for ethical training of professionals in order to qualify the care of women who use the
Reference Service for Pregnancy Interruption Where Applicable by Law.
Keywords: Abortion. Abortion, legal. Sexual violence. Ethics, professional. Bioethics.

Aprovação CEP Fapecs/SES/DF CAEE 34524414.0.0000.5553

1. Especialista [email protected] 2. Especialista [email protected] 3. Especialista [email protected]


Universidade de Brasília, Brasília/DF, Brasil. 4. Doutor [email protected] – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba/
PR, Brasil; Universidade de Brasília, Brasília/DF, Brasil.

Correspondência
Anadely Castro da Silva – Quadra 31, lote 34, Setor Leste CEP 72460-310. Gama/DF, Brasil.

Declaram não haver conflito de interesse.

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É cediço que o abortamento, grave problema No Brasil, o Código Penal 6 enquadra o estupro
de saúde pública, está presente no cenário brasi- como crime contra a liberdade sexual (artigo 213),
leiro, e é tema gerador de várias discussões, tanto com a finalidade de proteger a dignidade sexual
pela defesa de sua legalização quanto pela manu- da vítima. Nos últimos anos, o atendimento às víti-
tenção, parcial ou irrestrita, de sua proibição 1. Em mas de violência sexual tem merecido atenção dos
que pese o fato de a formação acadêmica dos setores político, social e judicial. Tais mobilizações
profissionais da área da saúde incluir diversas abor- resultaram na criação de serviços de assistência a
dagens sobre o assunto, as influências de questões mulheres vítimas de violência sexual e doméstica,
éticas, morais, socioeconômicas, políticas, culturais assim como de instrumentos legais, como a recente
e religiosas acabam por trazer dificuldades ao seu Lei Maria da Penha 7, que possibilita o atendimento
enfrentamento. Como tema discutido no campo da mais humanizado a essas mulheres.
chamada “bioética das situações persistentes” 2, o Na tentativa de garantir os direitos reproduti-
abortamento proporciona reflexões acerca da au- vos e sexuais das mulheres, definidos em acordos
tonomia da mulher sobre seu corpo, da visão do internacionais e firmados na legislação nacional
profissional de saúde diante de tais decisões, além vigente, o Brasil, por intermédio do Ministério da
das implicações ético-políticas para o campo da saú- Saúde, editou em 1999 a norma técnica “Prevenção
de pública. e tratamento dos agravos resultantes da violência
Embora a palavra “aborto” seja comumen- sexual contra mulheres e adolescentes” 4, a fim de
te utilizada para indicar interrupção da gravidez, assegurar o direito à interrupção da gestação legal
do ponto de vista técnico, há que diferenciá-la de por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Impen-
“abortamento”: enquanto esse é o ato de abortar, de frisar que o escopo dessa norma é cumprir os fins
aquele é o produto do abortamento. Assim, se- específicos da Política Nacional de Atenção Integral
gundo critério da Organização Mundial da Saúde à Saúde da Mulher e seus planos de ação.
adotado pelo Brasil 3, o abortamento caracteriza-se Essa norma tem sido instrumento impres-
pela interrupção da gravidez até a 22ª semana, des- cindível para que o tema da violência sexual seja
de que o produto da concepção – o próprio aborto definitivamente incorporado ao setor da saúde e
– tenha peso inferior a 500 gramas. São variadas as para que a sociedade comece a discutir a questão
causas que desencadeiam o abortamento “natu- do abortamento de forma mais ampla, uma vez que
ral”, as quais, na maioria das vezes, permanecem representa marco fundamental à garantia dos direi-
indeterminadas. No entanto, inúmeras gestações tos adquiridos pelas mulheres, ao permitir o resgate
são interrompidas por decisão pessoal da mu­ de sua dignidade em face de uma gravidez decor­
lher, incluindo casos em que a gravidez decorre de rente de estupro.
violência sexual. No Brasil, embora o abortamento seja confi-
Tal como o abortamento, a violência contra a gurado crime, há dois casos previstos pelo próprio
mulher é problema que integra o rol das situações Código Penal como exceções não puníveis (art. 128,
persistentes da bioética, das quais a agressão sexual incisos I e II), quais sejam: 1) quando a gravidez
é uma das manifestações da violência de gênero trouxer risco à vida da gestante; 2) quando a ges-
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mais cruéis e persistentes, visto que atravessou in- tação resultar de estupro e o aborto for precedido
cólume toda a história humana. Por um lado, em sua de consentimento da gestante, ou, se incapaz, por
dimensão pandêmica, atinge indiscriminadamente seu representante legal 6. Há, ainda, o caso de feto
mulheres, adolescentes e crianças; por outro, sob a com diagnóstico de anencefalia, que se tornou não
forma de violência simbólica e moral, aterroriza, em punível por decisão recente do Supremo Tribunal
particular, o imaginário das mulheres, produzindo Federal 8.
vulnerabilidades e constante sensação de insegu- Diante desse contexto, foi criado em 1996
rança 4. Os resultados dessa violência vêm na forma o Programa SOS Mulher-Aborto Previsto em Lei,
de impactos à saúde reprodutiva, física e mental do Hospital Regional da Asa Sul 9,10, atual Hospital
das vítimas. Cerca de 30% dessas adolescentes e Materno Infantil de Brasília (HMIB), vinculado à
mulheres desenvolvem doenças sexualmente trans- Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal
missíveis, e o risco de gravidez indesejada atinge (SES/DF) e considerado referência nacional nesse
até 5% delas, agravando o quadro já traumático. tipo de atendimento. Em decorrência do precon-
Tais consequências permitem qualificar a violência ceito e estigma ainda hoje persistentes quando se
sexual como questão de saúde pública e grave vio- alude à palavra “aborto”, a partir de julho de 2013,
lação dos direitos humanos e reprodutivos 5. a denominação inicial do serviço foi alterada para

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Programa de Interrupção Gestacional Prevista em tegorias previstas no art. 7º da Portaria 485/2014


Lei (PIGL) 11. do Ministério da Saúde, que dispõe sobre o serviço
Até 2012 existiam no Brasil 65 serviços habi- de atenção às pessoas em situação de violência se-
litados a atender casos de abortamento previstos xual no âmbito do SUS 15. Como critério de exclusão,
em lei, distribuídos em 26 estados 12. Segundo do- definiu-se por não incluir nem os profissionais de
cumento do Ministério da Saúde 4, a Portaria MS/ saúde atuantes no âmbito do PIGL nem aqueles não
GM 1.508/2005 determinou que o boletim de ocor­ enquadrados nas categorias previstas pelo art. 7º
rência (BO) deixasse de ser exigido para o acesso da portaria ministerial. Para identificar esses pro-
aos serviços oferecidos pelo programa. Um efeito fissionais, foi realizado levantamento no setor de
prático desejado por essa norma foi minimizar o recursos humanos do HMIB.
constrangimento e a dificuldade que muitas mulhe- A amostra da pesquisa totalizou 177 profissio-
res enfrentavam para realizar o procedimento. nais de saúde, entre médicos, assistentes sociais,
O HMIB também foi o primeiro hospital do psicólogos, farmacêuticos, bioquímicos, enfermei-
Distrito Federal a introduzir o Programa de Pes- ros e técnicos de enfermagem, todos eles atuando
quisa, Assistência e Vigilância à Violência (PAV) no HMIB e sem vínculos diretos com PIGL.
– conhecido como Programa Violeta –, que ofere- A abordagem dos participantes ocorreu, in-
ce atendimento humanizado a mulheres vítimas de dividualmente, na própria instituição de saúde,
toda forma de violência, seja física, psicológica ou durante o horário de trabalho, mantendo-se o
sexual. O programa cumpre a Lei 12.845/2011 13, cuidado de que nenhum serviço ou atendimento
que dispõe sobre a assistência obrigatória e integral hospitalar fosse interrompido ou postergado. Na
a pessoas em situação de violência sexual. Essa lei oportunidade, foi apresentado aos profissionais o
prevê, em seu artigo 1º, que a rede hospitalar do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE)
SUS deve atender às vítimas de violência sexual de e, posteriormente, um questionário de autopreen-
forma absoluta, emergencial e com equipe multidis- chimento contendo perguntas estruturadas em dois
ciplinar, a fim de controlar e tratar as consequências blocos. Com o primeiro bloco, pretendeu-se coletar
físicas e psíquicas decorrentes da violência sofrida, dados, a fim de caracterizar o perfil sociodemo-
abrangendo, entre diversos serviços, a prática de gráfico dos participantes. O segundo consistiu em
profilaxia da gravidez e, se for o caso, o abortamen- perguntas fechadas e de múltipla escolha, que per-
to, que é realizado após encaminhamento do PIGL. mitiram identificar o conhecimento e a percepção
Em que pesem as críticas por parte de certos grupos dos profissionais de saúde acerca dos aspectos
da sociedade 14 quanto à regulamentação desse ato éticos envolvidos nos serviços de referência para in-
normativo 15, o programa representa um avanço do terrupção da gravidez nos casos previstos em lei. O
cuidado humanizado e dos direitos das mulheres ví- tempo de preenchimento foi de aproximadamente
timas de violência sexual. 20 minutos.
O presente estudo teve como objetivo iden- Os dados obtidos com as perguntas fechadas
tificar o conhecimento e a percepção dos aspectos do questionário foram tratados estatisticamente,
éticos envolvidos no Programa de Interrupção Ges- e as opções das respostas abertas, classificadas e

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tacional Prevista em Lei, por parte de profissionais analisadas qualitativamente, de acordo com meto-
de saúde do Hospital Materno Infantil de Brasí- dologia descrita por A. C. Gil 16. A análise global dos
lia que não lidam diretamente com os serviços de resultados quantiqualitativos fundamentou-se na
abortamento legal dessa instituição. Buscou-se abordagem teórica das situações persistentes em
apresentar um olhar de observadores próximos da bioética 2, enfocando especificamente suas impli-
realidade concreta dos casos de gravidez resultante cações para a saúde pública. A pergunta norteadora
de estupro, cerne deste estudo. para a discussão desse artigo foi: Você atuaria no
Programa de Interrupção Gestacional Prevista em
Lei ou em outro serviço de referência que envolve
Método o abortamento? A problemática concentrou-se na
discussão dos motivos pelos quais os inquiridos não
Trata-se de estudo quantiqualitativo, do tipo aceitariam participar.
exploratório-descritivo, com amostragem proba- O projeto foi aprovado pelos comitês de ética
bilística estratificada, envolvendo profissionais de em pesquisa da Secretaria de Estado de Saúde do DF
saúde do HMIB. Como critério de inclusão, foram (CEP/Fepecs) e da Faculdade de Ciências da Saúde
considerados os profissionais pertencentes às ca- da Universidade de Brasília (CEP/FS/UnB). A pes-

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quisa foi desenvolvida entre setembro e novembro inquiridos informaram conhecer o programa; 43
de 2014. O instrumento de coleta de dados encon- (24,3%) disseram conhecê-lo parcialmente; 46
tra-se disponível no Anexo deste artigo. (26%) declararam desconhecê-lo, e 3 (1,7%) pre-
feriram não responder à questão. Porém, dos 128
profissionais que afirmaram conhecer total ou par-
Resultados e discussão cialmente o programa, apenas 21 (16,5%) disseram
ter encaminhado (ou que encaminhariam) ao PIGL
Perfil sociodemográfico a paciente que solicitou (ou solicitasse) informação
Esta pesquisa foi realizada com 177 pro- sobre a disponibilidade de serviços de abortamento
fissionais de saúde do HMBI: 32 ginecologistas/ na instituição. Embora o questionário aplicado não
obstetras (18,1%), 3 clínicos (1,7%), 5 assistentes permita avaliar que esses dados resultam de algu-
sociais (2,8%), 9 psicólogos (5,1%), 8 farmacêuticos/ ma restrição moral por parte dos profissionais, suas
bioquímicos (4,5%), 68 enfermeiros (38,4%) e 52 respostas evidenciam claramente um nível maior de
técnicos de enfermagem (29,4%). Dos inquiridos, desconhecimento do programa do que aquele apre-
115 (65%) informaram que nunca atuaram em ser- sentado na autoavaliação (perfil sociodemográfico).
viço de interrupção da gestação em casos previstos Tal desconhecimento fica mais explícito quan-
em lei; 10 (6%) atuaram anteriormente; 50 (28%) do se considera o resultado discrepante encontrado
disseram que no momento trabalham no serviço na caracterização da amostra, na qual 28% dos par-
de referência para interrupção da gestação prevista ticipantes informaram, de maneira equivocada,
em lei, e 2 deles (1%) preferiram não responder à que participam atualmente do PIGL, lembrando
questão. que os únicos 6 profissionais do HMIB que atuam
Em relação a esses dados, cabe destacar que o no programa haviam sido previamente excluídos do
PIGL instalado no HMIB conta com uma equipe fixa estudo. Esses dados corroboram a hipótese de que,
de 6 profissionais, que foram previamente excluídos mesmo entre aqueles que informaram conhecer o
da amostra do estudo. A discrepância entre esse cri- PIGL, parte importante desconhece sua função e es-
tério de exclusão e o alto número de profissionais pecificidades.
que disseram atuar no serviço de referência para in- Por outro lado, essa discrepância talvez se deva
terrupção da gestação prevista em lei será objeto de ao fato de que esses profissionais possivelmente se
análise pormenorizada em tópicos subsequentes. identifiquem como atuantes no programa, já que o
Quanto ao gênero, verificou-se que 159 par- HMIB é considerado referência nacional tanto no
ticipantes pertencem ao sexo feminino (89,8%); atendimento a mulheres vítimas de violência sexual
14, ao sexo masculino (7,9%), e 4 deles (2,3%) não quanto nos procedimentos de abortamento legal.
quiseram responder à questão. Em relação à idade, Prova disso é que deparamos com número significa-
10 tinham entre 18 e 24 anos (5,6%); 69, entre 25 e tivo de profissionais que geralmente chamam o PIGL
35 anos (38,9%); 75, entre 36 e 50 anos (42,4%); 22 de Programa Violeta ou, ainda, Programa de Pesquisa,
contavam 51 anos ou mais (12,5%), e 1 deles não Assistência e Vigilância à Violência (PAV), integran-
quis responder (0,6%). tes do Núcleo de Estudos e Programas na Atenção
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e Vigilância em Violência (Nepav), da SES/DF 17,


No que tange à orientação religiosa, 54,2% e destinados ao atendimento de usuárias vítimas
disseram-se católicos (96); 27,1%, protestantes/ de violência, as quais posteriormente podem vir a
evangélicos (48); 10,2%, espíritas (18); 1,7% decla- ser encaminhadas ao PIGL. Outra possibilidade re-
raram-se simultaneamente católicos e espíritas (3); laciona-se ao fato de que alguns profissionais, na
4,5%, agnósticos/ateus (8), e 2,3%, de outras reli- atividade cotidiana, participam de rotinas que in-
giões (4). No que diz respeito ao grau de formação cluem o atendimento a abortamentos incompletos
acadêmica, identificou-se que 67 profissionais ou espontâneos.
não possuem pós-graduação lato ou stricto sensu
(37,9%); 96 têm especialização (54,2%); 11 cursa- Convém esclarecer que, segundo informações
ram mestrado (6,2%), e 2 fizeram doutorado (1,1%). da SES/DF prestadas à Comissão Parlamentar Mista
Um participante não respondeu à questão (0,6%). de Inquérito do Senado que investigou a situação da
violência contra a mulher no Brasil 18, o fluxo de aten-
dimento em saúde a mulheres e adolescentes em
Conhecimento quanto ao PIGL situação de violência no HMIB inicia-se com o acolhi-
A investigação sobre o conhecimento da exis- mento humanizado, escuta qualificada, ana­mnese e
tência do PIGL na instituição revelou que 85 (48%) avaliação de risco; após o que a mulher, adolescente

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ou criança é encaminhada aos diversos setores do (especialmente a orientação protestante/evangé-


hospital, entre eles o serviço de inter­rupção da gra- lica) é significativo nas correlações com a opinião
videz em decorrência da violência sexual. contrária ao direito de aborto em qualquer caso e
Desse modo, considera-se que o encaminha- favorável a convencer uma mulher grávida por estu-
mento aos programas do hospital, como o Programa pro a levar adiante a gestação.
Violeta, por exemplo, não desvirtua o PIGL. O que é A respeito das justificativas, cabe destacar que
preciso, de fato, é torná-lo visível no hospital, o que um dos participantes sopesou que não atuaria no
demanda, por parte do gestor público, providências programa por motivo relacionado à veracidade das
destinadas a sua melhor divulgação em todo o cor- informações prestadas pela vítima: “Porque em al-
po hospitalar. guns casos de violência sexual acredito que algumas
pacientes dão informações falsas, portanto não sei
se gostaria de participar e de julgar esses casos”.
Atuação no PIGL e justificativas de recusa Esse discurso confirma o peso da desconfiança e da
Ao se posicionarem com relação à possibi- suspeição 20 como marcador da moralidade do pro-
lidade de atuar em um serviço de referência para fissional diante da mulher que procura atendimento
interrupção da gravidez em casos previstos em lei ou para abortamento nos casos previstos em lei.
em qualquer outro que envolvesse o abortamento,
Os serviços de referência existentes nos hos-
a maioria – 113 (63,8%) – respondeu que não atua-
pitais devem oferecer à mulher grávida pós-estupro
ria, enquanto 60 (33,9%) informaram que atuariam,
todo o aporte para que decida ou não pela inter­
e 4 (2,3%) preferiram não responder à questão.
rupção da gravidez. Por meio de entrevistas com a
À questão sobre se o profissional atuaria ou paciente, assistentes sociais, psicólogos e médicos
não em um serviço de referência que envolvesse podem aferir a idade gestacional com a data do
abortamento, foi foi acrescentada a pergunta de evento do crime sexual. Por outro lado, a mulher
cunho subjetivo informando ao participante que que procura o serviço de referência afiançando
justificasse seu posicionamento, caso respondesse ter sofrido violação sexual detém credibilidade; de
negativamente ao item anterior. Com essa ques- modo que, ao recebê-la, a equipe deve presumir sua
tão aberta – e norteadora do presente artigo –, veracidade.
pretendeu-se que os participantes lançassem suas A finalidade da assistência à saúde prestada
opiniões, ainda que elas tenham consistido em frag- pelo Estado é afiançar o exercício desse direito à ví-
mentos complexos acerca de sua postura de não tima, não sendo da competência do profissional o
atuar no programa da instituição ou em qualquer julgamento prematuro da informação por ela pres-
outro serviço de mesma finalidade, em razão da tada, sob pena de agravar as implicações sofridas
influência das questões morais, religiosas, éticas, em razão do ato criminoso. Em estudo realizado
emocionais, culturais que afligem nossa sociedade. com 82 profissionais de saúde de cinco serviços de
Foi considerável o número de justificativas a referência para aborto legal, sendo um de cada re-
esse item. Dada sua diversidade e complexidade, gião do país, Diniz e colaboradores 20 verificaram,
as respostas foram codificadas em palavras-chaves nas entrevistas, que a palavra da mulher não era

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que classificam os motivos da rejeição, aglutinando suficiente para configurar a veracidade da violência
a subjetividade de cada colaborador: “Estigma”, 1 sofrida. Os autores anotam, também, que a maioria
(0,9%); “Sem opinião formada”, 3 (2,7%); “Morali- dos serviços de abortamento legal estrutura-se de
dade”, 5 (4,4%); “Inviolabilidade da vida”, 10 (8,8%); modo a reproduzir a postura de desconfiança dos
“Religioso”, 19 (16,8%); “Emocional”, 20 (17,7%); profissionais de saúde quanto à narrativa da vítima.
“Profissional”, 20 (17,7%); “Objeção de consciência”, A reflexão sobre o discurso transcrito a se-
22 (19,5%), e 13 (11,5%) não responderam. Em que guir permite vasculhar, também, a disposição do
pese a religião ser fator sobremaneira significativo profissional que não cogita a hipótese de ser estig-
nas tomadas de decisão das pessoas, por fazer par- matizado em seu ambiente de trabalho: “Gosto de
te de nossa cultura, conforme observam Faúndes e atuar na parte de cesarianas e cirurgias eletivas,
Barzlatto 19, nessa análise qualitativa o argumento e o colega que atua nessa área [no abortamento
religioso foi encontrado explicitamente em apenas legal] não é bem visto pelos outros colegas”. Essa
19 dos 113 profissionais que afirmaram que não declaração indica que a dimensão negativa do abor-
atuariam em serviços de interrupção voluntária tamento reproduz uma perspectiva estigmatizante
da gestação. De qualquer modo, conforme será tanto em relação à mulher que o vivencia quanto ao
apresentada em tópicos seguintes, o fator religião profissional que o executa.

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É oportuno mencionar que, segundo afirmam acreditava ser indispensável a apresentação de BO


Godoi e Garrafa 21, o artigo 11 da Declaração Univer- pela vítima.
sal sobre Bioética e Direitos Humanos (DUBDH) 22, É sobremodo importante assinalar que, para
atrela o princípio da não discriminação e não es- realização na rede hospitalar do abortamento em
tigmatização ao princípio da dignidade da pessoa caso de gravidez por violência sexual, não se exige
humana, aos direitos fundamentais e às liberdades nenhum documento comprobatório do crime, haja
individuais, motivo pelo qual ninguém deverá so- vista a inexistência de respaldo legal nesse sentido,
frer qualquer constrangimento ou ser diminuído em vez que a norma técnica “Prevenção e tratamento
razão do que quer que faça ou escolha, sob pena dos agravos resultantes da violência sexual contra
de ter retirada sua dignidade. Embora aqui não se mulheres e adolescentes”, editada pelo Ministério
esteja a equiparar, ou mesmo comparar, o suposto da Saúde, eliminou a exigência do BO nesses casos 4.
sofrimento da mulher que aborta e do profissional
Cumpre notar, também, que a dispensa do boletim
que o executa, cabe destacar que todos aqueles
de ocorrência não implica que a vítima não deva
envolvidos no abortamento, mesmo legal, parecem
ser orientada pelo profissional de saúde a tomar
estar vulneráveis a diferentes processos de estigma-
as providências legais cabíveis, a fim de punir seu
tização e discriminação.
agressor; mas, caso não o faça, não pode ter seu di-
De fato, Soares 23 verificou, em seu estudo, que reito cerceado.
a dificuldade de identificar profissionais de saúde
Assim, pode-se vislumbrar que o objetivo
dispostos a atuar em serviços de abortamento legal
dessa norma técnica é a preservação do interesse
é um dos principais obstáculos para a instauração
individual dessas mulheres de não desejar expor
desse tipo de assistência na rede hospitalar. Segundo
seu sofrimento diante das autoridades policiais.
a autora, tais dificuldades devem-se a diversos fato-
Ademais, caso o médico seja induzido a erro pela
res, entre eles: o desconhecimento, por parte dos
paciente e efetivar o procedimento do aborto legal,
profissionais de saúde, da legislação vigente sobre
ele estará imune de pena, já que aí se configura a
aborto legal; a forte influência dos valores ético-reli-
descriminante putativa prevista no artigo 20, § 1º,
giosos sobre esses profissionais, que na maioria das
do Código Penal 6.
vezes não conseguem desvincular a prática profissio-
nal de suas concepções e valores pessoais; o repúdio
de serem tachados de “aborteiros”. Orientação religiosa e discordância quanto ao
Em reforço, pode-se mencionar a melhoria direito de interrupção voluntária da gestação
das políticas públicas destinadas à promoção, no Verificou-se que 27,1% (48) de todos os in-
âmbito da rede hospitalar, de discussões sobre o quiridos concordam com o direito de interrupção
difícil e delicado problema do abortamento. Tais voluntária da gestação; 37,9% (67) concordam
debates poderão favorecer a mudança de atitude parcialmente; 23,7% (42) discordam; 4,6% (8) dis-
por parte do corpo hospitalar, levando-o a desvin- cordam parcialmente; 5,6% (10) não têm opinião
cular preceitos morais da prática profissional e a formada, e 1,1% (2) não responderam se concordam
reconhecer que os direitos humanos e a dignidade ou discordam desse direito.
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das mulheres devem ser respeitados em qualquer No que se refere à correlação entre orien-
ocasião, de modo que, ao lidar com as situações de tação religiosa e concordância total ou parcial com
mulheres grávidas vítimas de violência sexual, esses o direito à interrupção voluntária da gestação,
profissionais poderão enfrentar menor desconforto observou-se que 45,8% dos católicos, 41,7% dos
e constrangimento em realizar o abortamento. protestantes e 38,9% dos espíritas são favoráveis à
interrupção apenas nos casos de estupro, risco de
Capacitação ético-jurídica e conhecimento sobre vida à gestante e incompatibilidade do feto com a
dispensa de boletim de ocorrência vida. Entre os 25 profissionais que se manifesta-
O questionário permitiu identificar que 56 pro- ram contrários ao direito de aborto em qualquer
fissionais de saúde do HMIB já haviam participado ocasião, 14 (56%) declaram-se católicos; 10 (40%),
de cursos, palestras ou oficinas em que foram discu- protestantes/evangélicos, e 1 (4%), espírita. Es-
tidos aspectos éticos ou jurídicos do abortamento. ses dados corroboram, mais uma vez, a análise de
Entre esses colaboradores, averiguou-se, porém, Soares 23, que indicou a influência da religiosidade
que apenas 5 (8,1%) conheciam a documentação na prática profissional.
exigida da mulher no atendimento dos serviços de Em relação à atitude do profissional de con-
abortamento legal, e que grande parte deles ainda vencer uma mulher grávida pós-estupro a levar

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adiante a gestação, 116 (65,5%) disseram não con- complicações decorrentes de abortamento insegu-
siderar correta tal postura, enquanto 48 (27,1%) ro 4. Nesse sentido, Diniz destaca:
afirmaram ser correta, e 13 (7,4%) preferiram não
responder à questão. Em matéria de políticas públicas de saúde, minha
Entre os 48 profissionais que concordam provocação é entender a objeção de consciência
com essa atitude de convencimento, 24 (50%) como um dispositivo de proteção a sentimentos,
declaram-se católicos; 17 (35%), protestantes/evan- podendo ser garantido por medidas administrativas
gélicos, e 7 (15%), espíritas. Embora nesse caso o de acomodação interina aos serviços de saúde. Sim,
número absoluto de católicos tenha sido maior, o arrisco redescrever o dispositivo da objeção de cons-
número de profissionais evangélicos/protestantes ciência como um ajuste de proteção, mas não como
favorável ao convencimento foi, relativamente, mais um direito absoluto quando ameaça necessidades
expressivo, vez que, do total de 96 católicos, ape- de saúde 24.
nas 24 (25%) deles se posicionaram desse modo, ao Os dados revelados em nossa pesquisa
passo que, entre os 48 evangélicos, 17 (35%) con- também corroboram o estudo de Camargo e colabo-
cordaram com essa postura. radores 25, no qual se observou que os profissionais
de saúde têm pouco conhecimento sobre a utili-
Área profissional e conhecimento sobre a objeção zação da objeção de consciência no contexto do
de consciência aborto legal no Brasil. Verificou-se, também, que o
O questionário também possibilitou observar a vínculo entre objeção de consciência e aborto legal é
relação entre conhecimento do direito à objeção de escassamente abordado pelos autores acadêmicos,
consciência e área profissional. Da compilação dos e que esses, quando o fazem, estabelecem sua co-
dados, averiguou-se que apenas 4 (2%) participantes nexão apenas com os códigos de ética profissionais,
revelaram conhecimento sobre o direito à objeção em particular das áreas de enfermagem e medicina.
de consciência, ao assinalar simultaneamente as Ademais, os autores do estudo sugerem a inserção
afirmações: “O direito à objeção de consciência não do termo “objeção de consciência” como descritor
cabe nos casos de necessidade de abortamento por controlado, a fim de ampliar as investigações sobre
risco de vida para a mulher” e “O direito à objeção o tema.
de consciência não cabe em situação de abortamen-
to juridicamente permitido, na ausência de outro(a) Área profissional e qualificação profissional
médico(a) que o faça”. No tocante à averiguação da qualificação es-
Notou-se que 12 (6,8%) profissionais optaram pecífica do profissional que trabalha diretamente
por responder somente à primeira afirmativa, e 10 no PIGL, 79,1% (140) disseram-se favoráveis à qua-
(5,6%), apenas à segunda. Percebeu-se, também, lificação, 18,1% (32) foram contrários a ela e 2,8%
que 38 (21,5%) deles assinalaram unicamente a (5) não responderam. Das sugestões apresentadas
afirmação “Objeção de consciência é um direito do pelos participantes favoráveis à qualificação, desta-
profissional e pode ser alegado em qualquer oca- caram-se as oficinas de capacitação, treinamento,

Artigos de pesquisa
sião”, enquanto 59 (33,3%) não souberam informar cursos, formação ou conhecimento em psicologia,
quando questionados sobre esse direito. ética, bioética, legislação, serviço social, enfer-
Sabe-se que a objeção de consciência tem magem, medicina, obstetrícia, direitos humanos,
previsão em vários atos normativos ou códigos entre outras.
profissionais consubstanciados pela Constituição Também é oportuno registrar a opinião de
Federal, com o escopo de resguardar o indivíduo em dois dos profissionais, que mencionaram, respecti-
situações contrárias a seus princípios morais. No en- vamente, “Adequado conhecimento da legislação,
tanto, tal direito não é absoluto quando há prejuízo treinamento em como atender a essa paciente sem
à saúde de outras pessoas. Desse modo, o direito julgamentos ou preconceitos, bem como em apoio
à objeção de consciência encontra limites, não sen- psicológico” e “Qualificação para atendimento hu-
do possível aos profissionais invocá-lo nas situações manizado que leve em consideração o desejo da
consideradas de urgência, quais sejam: risco de mulher”. Cabe ressaltar, nesse sentido, que um dos
morte da gestante; abortamento juridicamente per- escopos do Ministério da Saúde é justamente bus-
mitido; ausência de outro(a) profissional que o faça; car promover a atenção qualificada e humanizada
possibilidade da mulher de sofrer danos ou agravos às mulheres em situação de abortamento, e, entre
à saúde em razão da omissão do(a) profissional, e os princípios basilares para a concretização desse

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objetivo encontram-se a igualdade, a liberdade e darem em convencer uma mulher vítima de estupro
a dignidade da pessoa humana, sendo assegurado a prosseguir com a gestação, contribui negativa-
à vítima o acesso à assistência em saúde 3. Para o mente para essa questão o fato de que também os
profissional, a atenção humanizada implica uma próprios profissionais de saúde envolvidos nesses
conduta na qual deve abstrair suas convicções mo- serviços parecem sofrer as consequências do estig-
rais, culturais, religiosas, bem como outros aspectos ma e do preconceito associados ao aborto.
que possam influir no atendimento à paciente; ou A esse quadro soma-se o desconhecimento
seja, sua atitude deve ser norteada, acima de tudo, dos demais profissionais de saúde sobre a estrutu-
pela imparcialidade (justiça). ra e o funcionamento do PIGL no HMIB, observável
As falas desses participantes coadunam-se no fato de que a maioria dos participantes deste
com a bioética principialista, segundo a qual é pre- estudo confundiu esse serviço com outros oferta-
ciso respeitar a autonomia da mulher no que se dos pelo hospital, notadamente aqueles destinados
refere à sua vida e ao seu corpo; almejar seu bem a atenção à violência, como o Programa Violeta e
integralmente, maximizando-o e minorando o dano o Programa de Pesquisa, Assistência e Vigilância à
(beneficência), e evitar qualquer prejuízo que lhe Violência, os quais se voltam-se a atendimentos em
cause sofrimento (não maleficência). Para Faúndes casos de violência e apenas quando necessário en-
e Barzelatto 19, os princípios da não maleficência e caminham ao PIGL as mulheres grávidas vítimas de
da beneficência implicam vários desencadeamen- estupro. Importa ressaltar que o PIGL não presta as-
tos, entre os quais o repúdio a qualquer restrição de sistência apenas a gestantes vítimas de estupro, mas
acesso aos serviços de abortamento e a atos buro- a todos os casos em que o abortamento é permitido
cráticos que o tornem inacessível à paciente. por lei, a saber, gestações de alto risco à mulher e
casos comprovados de anencefalia fetal.
Diante desse resultado, indicamos não apenas
Considerações finais
a necessidade de maior divulgação institucional e
técnica dos serviços de interrupção de gestação nos
A análise dos resultados da pesquisa deixou casos previstos em lei, mas também a criação e a
evidente que, apesar de ter-se originado em 1996, consolidação de espaços de diálogos e debates que
o serviço de referência para abortamento em casos favoreçam à reflexão adequada sobre a moralidade
previstos em lei do HMIB permanece pouco conhe- do aborto entre os diversos grupos da sociedade.
cido e pouco divulgado, tanto entre os usuários da Embora não tenha sido objetivo deste trabalho pro-
saúde e a população em geral como entre os próprios por tais soluções, pode-se sustentar que a bioética
profissionais de saúde, em consequência da ultra- se constitui em espaço potencialmente propiciador
passada visão acerca do abortamento, que acaba do diálogo entre gestores, profissionais de saúde,
por discriminar e vulnerabilizar as mulheres. Embora usuários dos hospitais, movimentos sociais, educa-
neste estudo a crença religiosa dos profissionais te­ dores, mídia – enfim, entre todos os diversos grupos
nha sido correlacionada às posturas estigmatizantes que compõem o tecido social e que, dialeticamente,
em relação ao serviço de abortamento legal, nomea- fomentam e são vítimas dos processos de estigma-
Artigos de pesquisa

damente, a tendência de profissionais de orientação tização, vulneração e reprodução das violações dos
cristã afirmarem que não atuariam no PIGL e concor- direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.

Trabalho produzido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Bioética e Cátedra Unesco de Bioética da Universidade
de Brasília, Brasília/DF, Brasil.

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Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal

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Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana
para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e
a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. [Internet]. 2006 [acesso 5 dez 2014]. Disponível:
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Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal

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Recebido: 13.2.2015
revista/article/view/4231/pdf_5358
Revisado: 7.6.2015
Participação dos autores
Wesley Braga da Rocha, Anadely Castro da Silva e Solange Maria de Lacerda Leite participaram do Aprovado: 12.6.2015
delineamento do estudo, aplicação do questionário, análise dos dados e produção do artigo. Thiago
Cunha participou de todas as etapas, na qualidade de orientador do trabalho de conclusão de curso.
Artigos de pesquisa

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Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal

Anexo

Questionário semiestruturado

Parte 1. Perfil sociodemográfico Possui pós-graduação?


Prezado(a) colaborador(a), fique à vontade para ( ) Não
não responder a qualquer informação abaixo soli- ( ) Especialização
citada. Nenhuma informação que o(a) identifique ( ) Mestrado
será divulgada. ( ) Doutorado
Área: _____________________________________
Área profissional: __________________________________________
( ) Assistente social __________________________________________
( ) Clínico
( ) Enfermeiro(a) Parte 2. Conhecimento e percepção sobre os servi-
( ) Farmacêutico(a) ços de referência do Programa de Interrupção Ges-
( ) Ginecologista/obstetra tacional Prevista em Lei
( ) Psicólogo(a)
( ) Técnico(a) de enfermagem 1) Você concorda ou discorda com o chamado “di-
( ) Outro. Qual: ___________________________ reito ao aborto”, isto é, com o direito à interrupção
voluntária da gestação?
Experiência profissional em serviços de interrupção ( ) Concordo
da gestação prevista em lei: ( ) Concordo parcialmente
( ) Nunca atuei em serviço de interrupção de gesta- ( ) Discordo
ção em casos previstos em lei ( ) Discordo parcialmente
( ) Atuei anteriormente em serviço de referência ( ) Não tenho opinião formada
para interrupção de gestação em casos previstos ( ) Outro (descrever) : _______________________
em lei
( ) Atuo no momento em serviço de referência 2) Assinale abaixo apenas a afirmação que melhor
para interrupção de gestação em casos previs- corresponda ao seu posicionamento sobre o direi-
tos em lei to ao aborto:

Gênero: ( ) Feminino ( ) Masculino ( ) Contrário em qualquer caso


( ) Favorável apenas no caso de gestação resultante
Naturalidade: ______________________________ de estupro
( ) Favorável apenas no caso de risco de vida à ges-
Faixa etária: tante
( ) De 18 a 24 anos ( ) De 36 a 50 anos ( ) Favorável apenas no caso de incompatibilidade
do feto com a vida

Artigos de pesquisa
( ) De 25 a 35 anos ( ) A partir de 51 anos
Estado civil: ( ) Não possuo companheiro(a)/côn- ( ) Favorável nos três casos anteriores (estupro, risco
juge ( ) Possuo companheiro(a)/cônjuge de vida da gestante e incompatibilidade do feto
com a vida)
Orientação religiosa: ( ) Favorável até a 12ª semana de gestação
( ) Católica ( ) Umbanda/candomblé ( ) Favorável até a 22ª semana de gestação
( ) Protestante/evangélica ( ) Agnóstico/ ( ) Outro posicionamento (descrever): _________
ateu
( ) Espírita Outra( ) : __________________ 3) Você conhece o serviço de referência para inter-
rupção de gravidez nos casos previstos em lei?
Tempo de atuação na unidade de saúde: _________
( ) Sim
( ) Não
Local de formação acadêmica: __________________
( ) Parcialmente
_________________________________________
( ) Outro (descrever): ______________________

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Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal

4) Independentemente da resposta à pergunta an- 7) Você já atendeu alguma mulher grávida pós-
terior, assinale aquele(s) serviço(s) que acredita ser -estupro?
realizado(s) no âmbito dos serviços de referência ( ) Sim
para interrupção de gravidez nos casos previstos ( ) Não
em lei:
8) Caso a resposta anterior seja positiva, sabe in-
( ) Atendimento médico (ginecologista e obstetra) formar se a mulher foi encaminhada ao Programa
( ) Exames laboratoriais para diagnósticos e eco­ de Interrupção Gestacional Prevista em Lei?
grafia ( ) Sim
( ) Atendimento psicossocial a todas as pacientes ( ) Não
submetidas a abortamento ( ) Não sabe informar
( ) Atendimento psicossocial apenas às mulheres ví-
timas de violência sexual 9) O que deve ser exigido à vítima de violência se-
( ) Profilaxia para DST xual que solicita a realização do abortamento?
( ) Anticoncepção de emergência ( ) Boletim de ocorrência com registro da violência
( ) Abortamento em casos de estupro e risco de sexual sofrida
morte da mulher ( ) Boletim de ocorrência seguido de ordem judicial
( ) Abortamento em caso de incompatibilidade do ( ) Apenas o consentimento da mulher ou de seu re-
feto com a vida presentante legal
( ) Abortamento apenas em casos de estupro ( ) Consentimento da mulher ou de seu represen-
( ) Abortamento para gestantes que não atendam tante legal, desde que definido o nexo por perícia
aos critérios previstos por lei, desde que expres- médica
sem voluntariamente a decisão em termo de con- ( ) Consentimento da mulher ou de seu represen-
sentimento livre e esclarecido tante legal, desde que apresentado laudo psicos-
( ) Coleta e guarda de material genético de mulher social emitido por equipe de referência
vítima de violência sexual ( ) Não sei informar
( ) Acompanhamento psicossocial e médico por 15
dias após o aborto 10) Qual a sua posição diante da realização de
( ) Acompanhamento psicossocial por tempo inde- abortamentos realizados no Programa de Interrup-
terminado ção Gestacional Prevista em Lei?
( ) Não sei informar ( ) Discordo com os procedimentos que resultem em
aborto
5) Alguma paciente do HMIB já solicitou informa- ( ) Concordo com os procedimentos de interrupção
ções sobre a disponibilidade de serviços para reali- da gestação nos casos previstos em lei
zação de abortamento na instituição? ( ) Não tenho opinião formada sobre o assunto
( ) Sim ( ) Outro (descrever): _______________________
( ) Não __________________________________________
( ) Não recordo __________________________________________
Artigos de pesquisa

__________________________________________
6) Caso a resposta anterior seja positiva, qual foi
sua orientação? Ou, caso esse assunto nunca tenha 11) Você considera correto convencer uma mulher
sido abordado, em uma situação hipotética, qual grávida pós-estupro a levar adiante a gestação?
seria sua orientação? ( ) Sim
( ) Encaminhamento ao Programa Violeta ( ) Não
( ) Encaminhamento ao Programa de Interrupção
Gestacional Previsto em Lei 12) Você atuaria no Programa de Interrupção Ges-
( ) Informação à paciente de que o hospital não ofe- tacional Prevista em Lei ou em outro serviço de re-
rece esse tipo de atendimento ferência que envolve o abortamento?
( ) Encaminhamento a outro setor/serviço do hospi- ( ) Sim
tal (informar): _________________________ ( ) Não

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Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal

13) Caso a resposta anterior seja negativa, informe, ( ) O direito à objeção de consciência pode ser alega-
por favor, o motivo pelo qual você não atuaria no do por motivação religiosa e/ou de fórum íntimo,
programa: desde que devidamente justificada
__________________________________________ ( ) Não sei informar
__________________________________________
15) Você já participou de algum curso, oficina ou
14) Em relação à objeção de consciência em servi- palestra em que foram discutidos aspectos éticos
ços de abortamento regulamentados pelo Ministé- ou jurídicos do abortamento?
rio da Saúde, assinale o(s) item(ns) que considera ( ) Não
verdadeiro(s): ( ) Sim
( ) O direito à objeção de consciência não cabe nos Qual? ____________________________________
casos de necessidade de abortamento por risco
de vida para a mulher 16) Você considera que o profissional que trabalha
( ) O direito à objeção de consciência não cabe em diretamente com o Programa de Interrupção Ges-
situação de abortamento juridicamente permiti- tacional Prevista em Lei deva possuir alguma quali-
do, na ausência de outro(a) médico(a) que o faça ficação específica?
( ) Objeção de consciência é um direito do profis- ( ) Não
sional de saúde e pode ser alegado em qualquer ( ) Sim
ocasião Qual? ____________________________________

Agradecemos sua inestimável contribuição à realização da pesquisa.

Artigos de pesquisa

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