Agenda para Acao FINAL PORT
Agenda para Acao FINAL PORT
Agenda para Acao FINAL PORT
EXPEDIENTE
Organização:
Alan Azevedo, Ana Paula Bortoletto,
Janine Giuberti Coutinho e Lorenza
Longhi
Idealização do documento:
Ana Paula Bortoletto, Elisabetta
Recine e Janine Giuberti Coutinho. Apoio:
Pesquisa:
Potira V. Preiss
Produção de texto:
Alan Azevedo, Ana Paula Bortoletto,
Elisabetta Recine, Janine Giuberti
Coutinho, Lorenza Longhi e Patrícia
Gentil.
Caro leitor,
de 811 milhões1 de pessoas passando
Você tem em mãos uma Agenda para fome no mundo.
Ação para a transição dos sistemas
alimentares. São recomendações que Na América Latina, lamentavelmen-
apontam os caminhos das mudanças te, 267 milhões2 de pessoas enfrentam
que devem ser feitas - e como fazê-las - algum tipo de insegurança alimentar.
para transformar a maneira com que os Também é uma das regiões que mais
alimentos são produzidos, distribuídos, sofre com as consequências da obesi-
ofertados e consumidos. A forma he- dade e de outras doenças crônicas não
gemônica como esses processos vêm transmissíveis, em grande parte decor-
sendo conduzidos nas últimas décadas rentes da mesma situação de má-ali-
está levando ao adoecimento da popu- mentação.
lação e do meio ambiente, acelerando O Instituto Brasileiro de Defesa do
os impactos das mudanças climáticas Consumidor (Idec) é uma associação
e colocando em risco o direito funda- de consumidores sem fins lucrativos,
mental a uma alimentação adequada e independente de empresas, partidos
saudável. ou governos, que há mais de 30 anos
Somando os desafios atuais aos contí- trabalha para garantir à população o
nuos desdobramentos da pandemia de acesso a alimentos saudáveis que res-
covid-19, a necessidade de sistemas ali- peitem os limites dos recursos naturais.
mentares que promovam saúde e con- O Idec luta pelo direito dos consumido-
tribuam com a preservação do planeta res-cidadãos. Está na sua missão inci-
tornou-se inadiável. Neste período, as dir, monitorar e defender políticas que
desigualdades e as injustiças sociais em garantam a perspectiva da produção e
todo o planeta se tornaram ainda mais do consumo de alimentos saudáveis a
evidentes. A insegurança alimentar está partir de bases sustentáveis.
em patamares impensáveis, com cerca Boa leitura,
Carlota Aquino
1. The State of Food Security and Nutrition in the World 2021. Em: www.fao.org/3/cb4474en/cb4474en.pdf
3
SUMÁRIO
DIMENSÃO 1: NEGÓCIOS 10
DIMENSÃO 3: ECOLÓGICA 20
DIMENSÃO 4: SAÚDE 26
DIMENSÃO 5: GOVERNANÇA 31
3. Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no contexto da pandemia da covid-19 no Brasil. Disponível em:
https://pesquisassan.net.br/.
4. Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Disponível em: https://
bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf
5
As mudanças climáticas configuram governamental tem justamente apoia-
uma emergência sanitária com conse- do a manutenção e expansão do mo-
quências profundas na saúde das popu- delo hegemônico do sistema alimentar
lações e do planeta. A luta pela preser- no país. A desnutrição, a obesidade e
vação do meio ambiente e pelo direito as mudanças climáticas são fenômenos
à uma alimentação saudável e sustentá- que ocorrem de forma concomitante
vel é indissociável da luta contra a po- e que se retroalimentam, caracterizan-
breza e por um mundo menos desigual do a Sindemia Global. Compreender o
e mais justo.
funcionamento e os interesses corpora-
Todos esses aspectos não são fenôme- tivos desses mecanismos é fundamen-
nos isolados ou paralelos. Pelo contrá- tal para decodificar as engrenagens que
rio, há uma convergência desses fatores, contribuem para a perpetuação do atu-
visto que o redirecionamento da ação al sistema alimentar hegemônico.
5. As Cinco Dimensões dos Sistemas Alimentares no Brasil: Uma Revisão de Literatura”. Documento que analisa
mais de 100 publicações científicas sobre a interconexão das pandemias de obesidade, desnutrição e mudanças
climáticas, apresentando o sistema alimentar hegemônico como uma causa central - assim como parte da solução
- de tais problemas.
6. A Sindemia Global da Obesidade, Desnutrição e Mudanças Climáticas. Relatório da Comissão The Lance. Dispo-
nível em: https://alimentandopoliticas.org.br/wp-content/uploads/2019/10/Relat%C3%B3rio-Completo-The-Lan-
cet.pdf.
7. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 18 atores-chaves, entre representantes de governo, da Aca-
demia e de Organizações da Sociedade Civil que tenham atuação no campo da alimentação e nutrição. Foi selecio-
nado um representante de cada setor para contemplar as cinco dimensões para a transição sustentável e saudável
de sistemas alimentares. Além disso, foram realizadas quatro entrevistas com atores da academia e da sociedade
civil especializados em temáticas prioritárias em que a revisão da literatura apresentou resultados frágeis ou inci-
pientes. São eles: gênero e segurança alimentar; mudanças climáticas e sistemas alimentares; covid-19 e segurança
alimentar no Brasil.
7
5 DIMENSÕES DOS
SISTEMAS ALIMENTARES
RECOMENDAÇÕES
COM BASE NAS
5 DIMENSÕES
DOS SISTEMAS
ALIMENTARES
Estruturação de
mecanismos de Definir um código
descentralização de de conduta e
Segurança Alimentar processos que
e Nutricional, com previnam conflitos
DIMENSÃO 3: instalação de fóruns de interesses e a
ECOLÓGICA bipartites e tripartites, interferência privada
para auxiliar estados e nas decisões de
municípios a priorizar a interesse público,
Retomada e fortalecimento das transição para sistemas como espaços
políticas públicas de mitigação alimentares saudáveis multi-atores
Valorização
das mudanças climáticas. e sustentáveis. (multistakeholders).
das espécies da
sociobiodiversi-
dade brasileira, Fomento a práticas Defesa do marco legal brasileiro alinhado ao
facilitando o agropecuárias de baixo atendimento multiescalar e multissetorial de Segurança
uso sustentável impacto ambiental, tais como: Alimentar e Nutricional e do Direito Humano à
dos recursos diversificação na produção, Alimentação Adequada, retomando as bases originais
nacionais incentivo à agroecologia, de governança legítima e participativa e princípios
e a preservação medidas de controle e redução que viabilizam o controle social do Estado a partir do
dos biomas. do uso de agrotóxicos. exercício da democracia pelos titulares de direito.
9
DIMENSÃO 1:
NEGÓCIOS
A comoditização dos alimentos
para exportação enfraquece o
abastecimento interno
8. As Cinco Dimensões dos Sistemas Alimentares no Brasil: Uma Revisão de Literatura. Disponível em:
https://alimentandopoliticas.org.br/wp-content/uploads/2021/11/af-IDEC-Revisao-de-Literatura-ptbr-digital.pdf.
9. Companhia Nacional de Abastecimento - CONAB. Acompanhamento da Safra Brasileira. 2021. Disponível em:
https://www.conab.gov.br/info-agro/safras. Acesso em: 17 dez. 2021.
11
se tornam problemáticos. O primeiro é Para os produtores, cria-se um cenário
que a redução da produção impacta a em que as condições de produção e o
disponibilidade do arroz como alimento apoio estatal (crédito, assistência téc-
base da população. O segundo, é que nica, disponibilidade de insumos, etc.)
ao ser considerado uma commodity, o tornam muito atrativa a produção de
preço é determinado pelo mercado in- commodities, ainda que as condições
ternacional, se tornando suscetível a in- de autonomia frente aos mercados e
tensas flutuações no dólar que podem renda seja muito limitada, em especial
aumentar o preço do produto final ao a agricultores de pequena a média es-
consumidor brasileiro, tal como ocorreu cala. Aqueles que optam por produzir
a partir do segundo semestre de 2020. alimentos básicos, em processos diver-
Ao considerar os alimentos como uma sificados e sustentáveis, conectados
mercadoria qualquer, cria-se um pro- aos territórios e culturas regionais, en-
cesso que pouco considera as necessi- contram pouco amparo e muitos de-
dades da população por alimentos de safios, seja para ampliar sua produção,
qualidade a preços acessíveis e se fo- ter acesso aos mercados e ter uma vida
menta um mercado agroalimentar alta- digna com base na agricultura.
mente concentrado.
13
• Fomento de pesquisas científicas sobre agricultura e mu-
danças climáticas em colaboração com agricultores, de
forma que os saberes científicos e empíricos possam faci-
litar a criação de soluções.
IDEC EM AÇÃO
10. Tributo, consumo e direitos. Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, 2021. Disponível em: https://idec.org.
br/reforma-tributaria.
15
N essa dimensão, chama-se a
atenção para como a indústria
alimentar explora as vulnerabilida-
A extinção do Ministério do Desenvolvi-
mento Agrário (MDA), do Conselho Na-
cional de Segurança Alimentar e Nutri-
des biológicas, psicológicas, sociais e cional (Consea) e do Conselho Nacional
econômicas dos indivíduos, criando de Desenvolvimento Rural Sustentável
ambientes alimentares altamente in- (Condraf), iniciativas de alteração dos
dutores a escolhas não saudáveis e in- marcos legais, a paralisação e o desmon-
sustentáveis. te financeiro e institucional de políticas
públicas centrais para promoverem abas-
Além disso, existe um debate na litera-
tecimento e acesso, como, por exemplo,
tura sobre o crescente encarecimento
no Programa de Aquisição de Alimentos
da alimentação saudável, fazendo com
(PAA) no Programa Nacional de Alimen-
que padrões alimentares saudáveis,
tação Escolar (PNAE), na Companhia
com alimentos in natura, minimamen-
Nacional de Abastecimento (CONAB),
te processados e culturalmente refe-
foram algumas das medidas tomadas
renciados se tornem um privilégio de
desde 2016 até o momento atual.
poucos. Esse direcionamento elitista
da alimentação adequada e saudável é Se o abastecimento enfrentava muitas
justamente o oposto do que devemos assimetrias, em relação à ênfase na pro-
almejar para a sociedade, já que este é dução de commodities, à boa qualidade
um direito humano universal11. do alimento, à regularidade da oferta e
mesmo às quantidades efetivamente
No presente contexto de fragilização
comercializadas no elo final da cadeia,
das instituições comprometidas com
agora essa situação se agrava, tornando
o Direito Humano à Alimentação Ade-
quada (DHAA) no país e uma agenda o país muito mais vulnerável. Se de um
política pautada pelo desmonte das lado temos agricultores familiares, em si-
políticas de segurança alimentar e nu- tuação de insegurança alimentar grave12,
tricional, das políticas sociais e aque- com dificuldades de comercialização de
las voltadas para a agricultura familiar seus produtos, e de outro, populações
e camponesa, as populações em situ- urbanas e rurais com dificuldades de
ação de vulnerabilidade se encontram acesso à alimentação saudável e na imi-
à deriva. Desafios históricos enfrenta- nência da fome, as respostas perpassam
dos pela maioria das famílias brasilei- pelo fortalecimento de políticas públicas
ras para manter condições mínimas de e ações que articulem as duas pontas
vida foram ampliados e aprofundados. nos territórios.
11. As Cinco Dimensões dos Sistemas Alimentares no Brasil: Uma Revisão de Literatura. Disponível em: https://ali-
mentandopoliticas.org.br/wp-content/uploads/2021/11/af-IDEC-Revisao-de-Literatura-ptbr-digital.pdf.
12. Os dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil,
desenvolvido pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN) mostrou
que 12% dos domicílios das populações rurais, sejam elas de agricultores(as) familiares, quilombolas, indígenas e
ribeirinhos(as) enfrentam fome.
PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES
PARA A TRANSIÇÃO
17
CAMINHOS PARA A AÇÃO
IDEC EM AÇÃO
O Mapa localiza:
19
DIMENSÃO 3:
ECOLÓGICA
A produção em larga escala, ligada
ao uso intensivo de agrotóxicos,
monocultura e pecuária extensiva,
colabora diretamente para as
mudanças climáticas
21
CAMINHOS PARA A TRANSIÇÃO PARA
SISTEMAS ALIMENTARES SAUDÁVEIS
E SUSTENTÁVEIS
PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES
PARA A TRANSIÇÃO
13. O Cadastro Nacional de Cultivares Locais, Tradicionais e Crioulas foi criado com objetivo de apoiar o uso,
manejo e conservação de cultivares locais, tradicionais e crioulas, no contexto das políticas de democratização
do acesso a sementes, preservação da agrobiodiversidade e adoção de práticas agroecológicas. O Cadastro foi
instituído na Secretaria de Agricultura Familiar, em 2007, por meio da Portaria MDA 51/2007 e está disponível na
internet no endereço http://cnc.mda.gov.br.
23
• Promoção de uma estratégia de ecologia de saberes que
reúna conhecimento acadêmico, popular e tradicional de
maneira a ampliar as soluções de enfrentamento da crise
climática e produção de alimentos saudáveis e sustentáveis.
14. Anna Lappe. The Foodprint of fake meat. Report 2021. disponível em: https://foodprint.org/reports/the-foo-
dprint-of-fake-meat/?utm_medium=email&_hsmi=186992419&_hsenc=p2ANqtz-8IGQpPkUhZ-RFCfgld_Mrzbtg-
mxc_qth7AiCtmuI9URZjTdGpBAP3iXmYCDobv_2wg4wvzKM1UJqXOJB9nUFWghNcY9Khbnhtn7sPgmv_FNQ09y-
So&utm_content=186992419&utm_source=hs_email#section_9
25
DIMENSÃO 4:
SAÚDE
Os sistemas alimentares
hegemônicos que privilegiam
a monocultura e o consumo de
alimentos ultraprocessados estão
adoecendo a população
15. A Emenda Constitucional nº 64 incluiu a alimentação entre os direitos sociais, fixados no artigo 6º da Constitui-
ção Federal de 1988.
16. Diálogo sobre ultraprocessados: Soluções para sistemas alimentares saudáveis e sustentáveis. Nupens/USP,
2021. Disponível em https://www.fsp.usp.br/nupens/wp-content/uploads/2021/06/Documento-Dia%CC%81logo-
-Ultraprocessados_PT.pdf.
27
CAMINHOS PARA A TRANSIÇÃO PARA
SISTEMAS ALIMENTARES SAUDÁVEIS
E SUSTENTÁVEIS
PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES
PARA A TRANSIÇÃO
29
Por exemplo, ações de sensibilização para o desestímulo
ao consumo de alimentos que utilizam mais recursos na-
turais e poluem o meio ambiente, como a pecuária inten-
siva e produtos ultraprocessados).
IDEC EM AÇÃO
31
A governança refere-se à dinâmi-
ca de como o Estado, as normas
e os atores interagem na criação e na
pelos múltiplos atores da sociedade.
33
PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES
PARA A TRANSIÇÃO
O QUE PRECISA SER FEITO
• Defesa do marco legal brasileiro alinhado ao atendimen-
to multiescalar e multissetorial de Segurança Alimentar e
Nutricional e do Direito Humano à Alimentação Adequa-
da, retomando as bases originais de governança legítima
e participativa e princípios que viabilizam o controle so-
cial do Estado a partir do exercício da democracia pelos
titulares de direito.
17. Preventing and Managing Conflicts of Interest in Country-level Nutrition Programs: A Roadmap for Implemen-
ting the World Health Organization’s Draft Approach in the Americas. Disponível em: https://iris.paho.org/hand-
le/10665.2/55055.
35
IDEC EM AÇÃO
37
Uma Agenda para Ação: Transição para Sistemas
38 Alimentares Saudáveis e Sustentáveis na América Latina