Corredorcultural Macedo 2019 Volume Escrito

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CORREDOR CULTURAL

Mulher potiguar
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE TECNOLOGIA
CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

CARLIANDRA DE ARAÚJO DANTAS DE MACÊDO

CORREDOR CULTURAL MULHER POTIGUAR:


Anteprojeto de um Centro de Cultura, Memória e Estudos da Mulher em
área de valor histórico-patrimonial em Natal/RN

Natal/RN
2019
CARLIANDRA DE ARAÚJO DANTAS DE MACÊDO

CORREDOR CULTURAL MULHER POTIGUAR:


Anteprojeto de um Centro de Cultura, Memória e Estudos da Mulher em
área de valor histórico-patrimonial em Natal/RN

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso


de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos
para obtenção do grau de Arquiteto e Urbanista.

Orientador: Prof. Dr. Hélio Takashi Maciel de Farias.

Natal/RN
2019
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo
Tinôco - DARQ - -CT

Macedo, Carliandra de Araujo Dantas de.


Corredor cultural mulher potiguar: anteprojeto de um centro de
cultura, memória e estudos da mulher em área de valor histórico-
patrimonial em Natal/RN / Carliandra de Araujo Dantas de Macedo. -
Natal, RN, 2019.
125f.: il.

Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte.


Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura e Urbanismo.
Orientador: Hélio Takashi Maciel de Farias.

1. Centro cultural - Monografia. 2. Arquitetura de gênero -


Monografia. 3. Ribeira - Monografia. I. Farias, Hélio Takashi Maciel de.
II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BSE15 CDU 725.8

Elaborado por Ericka Luana Gomes da Costa Cortez - CRB-15/344


CARLIANDRA DE ARAÚJO DANTAS DE MACÊDO

CORREDOR CULTURAL MULHER POTIGUAR:


Anteprojeto de um Centro de Cultura, Memória e Estudos da Mulher em área
de valor histórico-patrimonial em Natal/RN

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso


de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos
para obtenção do grau de Arquiteto e Urbanista.

Orientador: Prof. Dr. Hélio Takashi Maciel de Farias.

Aprovação em 29 de novembro de 2019

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________
Hélio Takashi Maciel de Farias
Orientador

_____________________________________________________
Eunádia Silva Cavalcante
Convidado Interno

_____________________________________________________
Ana Gabrielle Carvalho
Convidado Externo

Natal/RN
2019
À minha mãe, minha primeira referência feminista,
ao meu pai e meu irmão. Obrigada pelo amor
incondicional, apoio e por sempre respeitar as minhas
escolhas.

À minha bisavó, Maria Emília, a sua história muito


me ensina sobre a importância da construção de nossa
autonomia.

À minha família, ao meu namorado, aos meus


amigos, em especial as amizades formadas no curso -
Gabriele, Daniel, Nayara, Luiza, Letícia, Camila, Isabel,
Beatriz, Louise e Talitha.

Aos meus professores, particularmente ao meu


professor orientador, Hélio, muito obrigada por tudo.

E um agradecimento especial à Gabriele, Daniel,


Nayara e Luiza – minhas companheiras de projeto -,
vocês tornaram a graduação muito mais leve.
LISTA DE FIGURAS

Figura 01: Esquema evidenciando a diferença dos padrões de viagem entre


homens e mulheres. ................................................................................................. 25
Figura 02: Quadras curtas como condição para diversidade urbana. .............. 29
Figura 03: Exemplo de rua com o conceito CPTED............................................... 32
Figura 04: (E) Centro Cultural São Paulo; (D) Centro Cultural do Jabaquara. ... 40
Figura 05: Situação da Biblioteca das Mulheres de Glasgow. ............................. 50
Figura 06: Fachada reformada da Biblioteca das Mulheres de Glasgow .......... 50
Figura 07: Setorização da Biblioteca das Mulheres de Glasgow. ........................ 52
Figura 08: Setorização da área reformada da GWL. ............................................ 52
Figura 09: (E) Ambiente de leitura em grupo; (D) Ambiente de leitura individual.
................................................................................................................................... 53
Figura 10: (E) aberturas das salas de administração; (D) Balcão de informação.
................................................................................................................................... 53
Figura 11: (E) Coreto do bairro de Bridgeton; (D) Carpete da Biblioteca. ......... 54
Figura 12: Situação do Edificio Comercial da Thomas Street e implantação do
CFCCA. ..................................................................................................................... 56
Figura 13: Edificio Comercial visto da esquina da Salmon St. com a Thomas St.
................................................................................................................................... 57
Figura 14: Entrada do CFCCA com o anteparo aberto. ...................................... 57
Figura 15: Setorização da planta baixa do pavimento térreo. ............................ 58
Figura 16: (E) Circulação para a Galeria 02; (D) Galeria 02................................. 59
Figura 17: Setorização da planta baixa do subsolo. ............................................. 60
Figura 18: Situação do Paseo de La Brecha. ......................................................... 61
Figura 19: (E) Fachada da Rua Virrey Ceballos; (D) Fachada da Rua Rivadavia.
................................................................................................................................... 62
Figura 20: Setorização da planta baixa do pavimento térreo............................. 63
Figura 21: (E) Vista do Café com fechamento inclinado; (D) Passagem
semipública e recorte na cobertura. ..................................................................... 63
Figura 22: Situação da Plaza del Torico. ................................................................ 64
Figura 23: Vista da Plaza del Torico à noite. .......................................................... 65
Figura 24: Vista da iluminação da praça na cor vermelha. ................................ 66
Figura 25: Localização dos lotes de intervenção. ................................................. 69
Figura 26: Mapa de atividades culturais na Ribeira. ............................................. 71
Figura 27: Fachada Rua Frei Miguelinho. ............................................................... 73
Figura 28: Fachada da Rua Chile. .......................................................................... 74
Figura 29: Mapa de uso do solo do entorno imediato ao terreno. ..................... 75
Figura 30: Mapa de gabarito do entorno imediato ao terreno........................... 76
Figura 31: Mapa de gabarito do entorno imediato ao terreno........................... 77
Figura 32: Indicação dos limites da SZ-3 e SZ-4 da ZEPH (1990)............................ 79
Figura 33: Delimitação do tombamento do Conjunto Arquitetônico, Urbanístico
e Paisagístico do Município de Natal/RN. ............................................................. 80
Figura 34: Zona Climática 8. ................................................................................... 84
Figura 35: (D) Carta solar sobre o lote de intervenção; (E) Rosa dos ventos sobre
o terreno de intervenção. ....................................................................................... 85
Figura 36: Tempestade de ideias que resultaram no conceito. .......................... 89
Figura 37: Fluxograma .............................................................................................. 89
Figura 38: Esquema da circulação que cruza os lotes de intervenção. ............. 90
Figura 39: Esquema das remoções das coberturas existentes. ............................ 90
Figura 40: Primeiro estudo de planta baixa. .......................................................... 91
Figura 41: Segundo estudo de planta baixa. ........................................................ 92
Figura 42: Proposta após as considerações da pré-banca. ................................ 93
Figura 43: Proposta Final .......................................................................................... 94
Figura 44: Esquema da evolução volumétrica da proposta. .............................. 95
Figura 45: Zoneamento da proposta final.............................................................. 95
Figura 46: Planta baixa esquemática do Térreo e 1° Pavimento com os principais
fluxos. ......................................................................................................................... 96
Figura 47: Perspectiva e Planta baixa esquemática dos blocos adicionados nos
lotes de intervenção. ............................................................................................... 97
Figura 48: Planta baixa esquemática do Térreo e 1° Pavimento......................... 99
Figura 49: Setor de galeria. ...................................................................................... 99
Figura 50: Setor de administração e apoio.......................................................... 100
Figura 51: Mirante e espaço de convivência ...................................................... 101
Figura 52: Setor de biblioteca ............................................................................... 102
Figura 53: Perspectiva do interior da biblioteca .................................................. 102
Figura 54: Instalação de piso tátil em escadas e plataformas e elevadores. .. 103
Figura 55: Comparativo entre o cenário ideal almejado e a proposta............ 105
Figura 56: Mapa esquemático da Intervenção urbana proposta. ................... 106
Figura 57: Exemplo da pavimentação adotada na zona de pedestre. .......... 107
Figura 58: Conexão entre a paginação da zona e a circulação da proposta
arquitetônica. ......................................................................................................... 107
Figura 59: (E) Pré-dimensionamento da viga metálica da galeria 02; (D) Pré-
dimensionamento do pilar metálico da galeria 02; ........................................... 108
Figura 60: (E)Sistema de laje empregado; (D)Cobertura empregada. ............ 109
Figura 61: Planta de cobertura, cortes e perspectiva esquemática. ............... 109
Figura 62: Brise na fachada oeste voltada para a circulação. ......................... 110
Figura 63: Vista da fachada da Rua Frei Miguelinho. ......................................... 112
Figura 64: Vista da circulação ao adentrar o Centro. ........................................ 113
Figura 65: Vista da biblioteca com o mobiliário projetado para este ambiente.
................................................................................................................................. 114
Figura 66: Vista da circulação entre o bloco de apoio e o administrativo. ..... 115
Figura 67: Vista da fachada da Rua Chile com o ritmo das esquadrias
recuperado............................................................................................................. 116
LISTA DE QUADROS

Quadro 01: Princípios para espaços seguros, segundo Jacobs (2000). .............. 28
Quadro 02: Recomendações contidas no Manual Espaços Urbanos Seguros. . 31
Quadro 03: Quadro resumo dos princípios para uma arquitetura de gênero. .. 35
Quadro 04: Quadro resumo dos princípios e diretrizes para centros culturais. .. 42
Quadro 05: Quadro resumo das referências arquitetônicas. .............................. 67
Quadro 06: Prescrições urbanísticas adotadas ..................................................... 81
Quadro 07: Programa de necessidade e pré-dimensionamento ....................... 86
Quadro 08: Prescrições urbanísticas da proposta ................................................ 98
Quadro 09: Decisões projetuais voltadas para a criação de espaços à luz de
gênero. .................................................................................................................... 104
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

CAERN Companhia de Águas e Esgoto do Rio Grande do Norte


CBTU Companhia Brasileira de Transportes Urbanos
CFCCA Centre for Chinese Contemporary Art
CPTED Crime Prevention Through Enviromental Design
DEAM Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher
DGOTDU Direção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento
Urbano
GWL Glasgow Women’s Library
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBRAM Instituto Brasileiro de Museus
IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
IT Instrução Técnica
NBR Normas Brasileiras
OUC Operação Urbana Consorciada Centro Histórico de Natal
OUR Operação Urbana Ribeira
PDN Plano Diretor de Natal
PRAC Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais
PRONASCI Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania
SEMOV Secretaria Municipal de Obras Públicas e Infraestrutura
SEMURB Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal
SNBP Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura
VLT Veículo Leve sobre Trilhos
ZEP Zona Especial Portuária
ZEPH Zona Especial de Preservação Histórica
RESUMO

As mulheres representam a maior parcela da sociedade brasileira, porém,


devido aos diferentes papéis sociais adotados por homens e mulheres, elas são
invisibilizadas no espaço público, tenha ele sentido político ou urbano. A
ausência de espaços que materializem e divulguem as lutas, contribuições e
avanços das mulheres acaba por reforçar o seu anonimato, enquanto
categoria social, na história. Nos projetos contemporâneos de espaços públicos
urbanos há uma tentativa de se reverter este quadro e, apesar de ainda não
suficiente, a variável "sexo" vem sendo introduzida no campo da arquitetura e
urbanismo, possibilitando a criação de ambientes que considerem as
particularidades da vivência feminina. Percebendo a carência de espaços
dedicados às lutas e conquistas das mulheres, assim como de ambientes
projetados levando em consideração as suas necessidades, este trabalho
consiste na elaboração do anteprojeto arquitetônico de um equipamento
cultural para abrigar o patrimônio sociocultural e histórico das mulheres sob o
olhar de gênero. Considerando que o uso cultural geralmente é instalado nos
centros das cidades, numa atitude de conservação do patrimônio histórico, e
que os centros históricos contam com estrutura urbana relativamente
consolidada, optou-se por sua instalação no bairro da Ribeira, Natal/RN. Sendo
assim, este trabalho tem como objetivo desenvolver uma proposta de
anteprojeto de um Centro de Cultura, Memória e Estudos da Mulher em área
de valor histórico-patrimonial à luz da perspectiva de gênero. Para tanto,
buscou-se compreender a interferência das relações de gênero no uso do
espaço pelas mulheres; reunir os atributos legais e físicos funcionais da Ribeira
indutores de vitalidade e diversidade no bairro; e identificar as particularidades
do programa de necessidade e condicionantes espaciais de um equipamento
cultural.

Palavras chaves: Arquitetura de gênero. Centro cultural. Ribeira.


ABSTRACT

Women represents the largest portion of Brazilian society. However due to the
different social roles adopted by men and women they are invisible in the public
space, whether it has a political or urban meaning. The absence of spaces that
materialize and publicize women's struggles, contributions and advances
ultimately reinforces their anonymity as a social category in history. In
contemporary projects of urban public spaces, there is an attempt to reverse this
situation and, although not yet sufficient, the variable "sex" has been introduced
in the field of architecture and urbanism, enabling the creation of environments
that consider the particularities of the female experience. Realizing the lack of
spaces dedicated to women’s struggles and achievements, as well as a design
taking into account their needs, this work consists of creating the developed
design of a cultural project to house the socio-cultural and historical heritage of
women under a gender perspective. Considering that this type of cultural use is
usually installed in the city centers, in a belief in conservation of historical
heritage, and the fact that the historical centers have a relatively consolidated
urban structure, it was decided to install it in the Ribeira neighborhood, Natal, RN.
Thus, this work aims to develop a draft proposal for a Center for Culture, Memory
and Women's Studies in an area of historical-heritage value in light of the gender
perspective. To this end, we sought to understand the impact of gender relations
on the use of space by women; gather the legal and physical functional
attributes of Ribeira bringing vitality and diversity to the neighborhood; and
identify the particulars of the necessary program and spatial constraints of
cultural equipment.

Keywords: Gender architecture. Cultural Center. Ribeira.


SUMÁRIO

Introdução ............................................................................................................ 16

1.Referencial teórico-conceitual...................................................................... 20

1.1 A PERSPECTIVA DE GÊNERO............................................................................... 21

1.1.1 Características ambientais do espaço público ........................................... 27

1.1.2 Arquitetura pensada para mulher ................................................................. 32

1.2 LUGARES DE MEMÓRIA....................................................................................... 36

1.2.1 Centros de cultura: princípios e diretrizes ...................................................... 39

1.2.2 Centros Históricos............................................................................................. 43

1.2.3 A Ribeira ........................................................................................................... 44

1.3. SÍNTESE DA BASE TEÓRICA ................................................................................. 46

2. Estudos de referências projetuais ................................................................ 47

2.1. BIBLIOTECA DAS MULHERES DE GLASGOW ...................................................... 48

2.2 CENTRO PARA ARTE CONTEMPORÂNEA CHINESA – CFCCA .......................... 55

2.3 PASEO DE LA BRECHA – COLONIA DEL SACRAMENTO, URUGUAI .................. 61

2.4 PLAZA DEL TORICO – TERUEL, ESPANHA ............................................................ 64

2.3. QUADRO SÍNTESE DAS REFERÊNCIAS ................................................................ 67

3. CONDICIONANTES projetuais ............................................................................ 68

3.1 UNIVERSO DE ESTUDO ......................................................................................... 69

3.2. LOTES DE INTERVENÇÃO .................................................................................... 73

3.3 CONDICIONANTES LEGAIS ................................................................................. 78

3.3.1 Legislação e Tombamento............................................................................. 78

3.3.2 Plano Diretor..................................................................................................... 80

3.3.3 Código de Obras............................................................................................. 81

3.3.4 NBR 9050/2015 e Código de segurança e prevenção contra incêndio e


pânico do estado do Rio Grande do Norte .......................................................... 82

3.4. CONDICIONANTES BIOCLIMÁTICAS ................................................................. 83

3.5. PROGRAMA DE NECESSIDADES E PRÉ-DIMENSIONAMENTO .......................... 85


4. proposta projetual ......................................................................................... 87

4.1 CONCEITO E PARTIDO ........................................................................................ 88

4.2 ESTUDOS PRELIMINARES ...................................................................................... 89

4.2.1 Evolução do projeto ....................................................................................... 89

4.2. MEMORIAL DESCRITIVO ..................................................................................... 95

4.2.1 Implantação e Prescrições Urbanísticas ....................................................... 96

4.2.2 Soluções Funcionais e Justificativas ............................................................... 98

4.2.3 Acessibilidade ................................................................................................ 103

4.2.4 Soluções quanto à Perspectiva de Gênero ............................................... 104

4.2.5 Soluções Estruturais e Cobertura .................................................................. 108

4.2.6 Estratégias de conforto ................................................................................. 110

Considerações finais .......................................................................................... 117

Referências ............................................................................................................ 119


Introdução
Aqui não é lugar de mulher! É uma frase comum de ser ouvida na
tentativa de justificar a ausência feminina em determinados espaços. Embora
as mulheres representem a maior parcela da sociedade brasileira, devido aos
diferentes papéis sociais adotados por homens e mulheres, elas são
invisibilizadas e por vezes não são bem-vindas no espaço público, tenha ele
sentido político ou urbano.

Durante muito tempo, por conta da divisão sexual do trabalho resultado


da combinação entre o sistema capitalista e o patriarcado, as mulheres foram
limitadas à sua capacidade reprodutiva e ao papel de cuidadora,
naturalizando o ambiente doméstico como o da mulher. Enquanto ao homem
coube as atividades profissionais e de estar em contato com a sociedade,
sustentando a ideia de homem/espaço público x mulher/espaço privado.

A naturalização da domesticidade feminina contribuiu para o


silenciamento de sua história enquanto categoria social e para o
desconhecimento da verdadeira face da sua vivência em sociedade, uma vez
que sua existência real, específica e singular não era reconhecida como
interesse público. Como consequência disso, na dimensão física do espaço, os
interesses/necessidades particulares da existência feminina foram ignorados,
pois ao se planejar os espaços públicos miravam-se em usuários assexuados e
universais, criando uma falsa impressão de igualdade de acesso à cidade por
elas; enquanto na dimensão sociocultural do espaço público, houve a omissão
das suas lutas, contribuições e avanços, tornando-as anônimas.

Como reflexo dessa realidade e trazendo a discussão a nível regional,


percebe-se, por exemplo, o desconhecimento da maior parte da população
quanto ao pioneirismo das mulheres potiguares na luta por igualdade de
gênero no Brasil. Mulheres como Nísia Floresta, hoje considerada a primeira
feminista brasileira (SOIHET, 2005), entre outras Norte-Rio-Grandenses se
colocaram a frente do seu tempo e ocuparam espaços que cabiam somente
aos homens em sua época, destacando-se em diferentes áreas como na
política, literatura, música e educação. Porém, pouco se encontra espaços que
materializem e celebrem estes feitos.

17
Diante deste incômodo e percebendo a carência de espaços
dedicados às lutas e conquistas das mulheres, este trabalho consiste na
elaboração do anteprojeto arquitetônico de um equipamento cultural para
abrigar o patrimônio sociocultural e histórico feminino potiguar projetado sob a
perspectiva de gênero.

Vale salientar que o olhar de gênero a ser tratado parte do princípio que
homens e mulheres vivem os espaços de maneiras diferentes em decorrência
do papel social a eles atribuídos, e por isso deve haver uma preocupação em
incorporar as necessidades de todos no projeto. Logo, a perspectiva de gênero
assume uma responsabilidade para com o usuário, não que arquitetos homens
e mulheres tenham, necessariamente, diferenças formais na maneira como
criam espaços. Sendo assim, a perspectiva gênero neste trabalho é resultado
de uma reflexão crítica sobre como as mulheres ocupam o espaço e a
consideração de suas necessidades sociais, políticas e ambientais.

Isto posto e considerando, ainda, que edificações com fins culturais


geralmente são instaladas nos centros históricos, numa atitude de conservação
do patrimônio histórico, além do fato dos centros das cidades contarem com
estrutura urbana relativamente consolidada, este trabalho teve por objetivo
elaborar o anteprojeto de um centro cultural, instalado em dois lotes
conectados fundo-fundo entre si, com uma entrada situada na Rua Frei
Miguelinho n° 98 e outra na Rua Chile n° 95, no bairro da Ribeira, em Natal/RN.
A fim de concretizar esta proposta tem-se como objetivos específicos:
compreender a interferência das relações de gênero no uso do espaço urbano
pelas mulheres; reunir os atributos legais e físicos funcionais da Ribeira indutores
de vitalidade e diversidade no bairro; e identificar as particularidades do
programa de necessidade e condicionantes espaciais de um equipamento
cultural.

Assim, o desenvolvimento do trabalho foi estruturado em quatro


capítulos: o primeiro capítulo trata do corpo teórico da pesquisa, nele é
apresentado o entendimento sobre a perspectiva de gênero, lugares de
memória e centros culturais; teorias sobre desenho urbano e a vivência da
mulher no espaço; e a discussão sobre centros de cultura e patrimônio histórico.
Já o segundo capítulo expõe estudos de referências projetuais relacionadas aos

18
conceitos estudados – a Biblioteca das Mulheres de Glasgow, Centro para Arte
Contemporânea Chinesa, Paseo de La Brecha e a Plaza del Torico.O terceiro
capítulo apresenta as condicionantes físicas, ambientais, legais e técnicas do
projeto, assim como o programa de necessidades e o seu pré-
dimensionamento. Já o último capítulo se inicia a discussão do conceito que
norteou o processo projetual e sua espacialização no projeto, o partido; em
seguida apresenta a proposta final, junto com a evolução formal e o memorial
descritivo do projeto.

19
1. Referencial teórico-conceitual
A relação entre patrimônio histórico edificado e memória coletiva, assim
como o papel dos centros de cultura na preservação desses bens materiais e
imateriais, são temas amplamente discutidos na literatura orientada à
intervenção patrimonial. Porém, o recorte de gênero no estudo dessas relações
é relativamente novo e, por isso, só recentemente a invisibilidade das mulheres
na história e nos espaços públicos começou a ser questionada. Logo, as
reflexões acerca desse tema têm muito a serem exploradas.

Com o propósito de realizar uma proposta de anteprojeto arquitetônico


de um centro de cultura em área de interesse histórico patrimonial à luz da
perspectiva de gênero que busca abrigar o patrimônio sociocultural e histórico
das mulheres, em especial da mulher potiguar, foi necessário construir um
entendimento sobre a mulher no espaço público e sobre os centros de cultura
e sua importância para a preservação do patrimônio histórico material e
imaterial. Esta compreensão se dá em dois momentos: no primeiro apresentam-
se conceitos sobre gênero e espaço público, a fim de entender o que seria a
perspectiva de gênero; no segundo momento, explora-se o patrimônio cultural,
os centros culturais e centros históricos; e por fim, relacionam-se estes dois
entendimentos culminando no arcabouço teórico sobre intervenções físico-
territoriais sob perspectiva de gênero, a base teórica deste trabalho.

1.1 A PERSPECTIVA DE GÊNERO

O sujeito mulher retratado ao longo deste trabalho se reporta ao gênero


feminino fruto de uma construção social, não se remetendo somente ao ser
biológico1.

O gênero, de acordo com Gayle Rubin (2017, p.11) pode ser entendido
como “os arranjos por meio dos quais uma sociedade transforma a sexualidade
biológica em produto da atividade humana”, ou seja, o conjunto de regras
conforme as quais as sociedades convertem as diferenças biológica dos sexos
em normas sociais; esta definição está contida no livro “O tráfico de mulheres,
notas sobre a economia política do sexo”2, um dos estudos pioneiros sobre

1 Vale salientar que as mulheres transsexuais podem não estar contempladas neste estudo devido
às particularidades de sua vivência e preconceitos enfrentados que não são compartilhados com
outros grupos de mulheres, como as mulheres cisgênero.
2 The Traffic in Women: Notes on the "Political Economy" of Sex.

21
gênero e sexualidade que trouxe notoriedade para o conceito. Ainda segundo
Rubin (2017) o sistema de sexo/gênero é neutro, podendo ser atribuído tanto ao
feminino quanto ao masculino, não presumindo relação hierárquica entre eles.

Este conceito com caráter neutro, que não imprime hierarquia ou aponta
a direção do vetor da desigualdade, não foi apropriado, no entanto, sendo
“gênero” utilizado frequentemente como substituto da palavra mulher. Porém,
é importante destacar, que segundo Heleieth Saffioti (2011), Rubin permitiu,
ainda que teoricamente, uma alternativa ao patriarcado, regime da
dominação-exploração das mulheres pelos homens, ao admitir que a
desigualdade de gênero na relação homem-mulher não é dada, mas pode ser
construída, e o é, com frequência.

Somando as colocações de Rubin (2017) às de Adriana Piscitelli (2002),


nas quais o ser mulher não tem sentido definido, pois ele se transforma a
depender do contexto espacial e temporal, entende-se por gênero a
construção social do feminino, podendo o papel social atribuído a elas ser
modificado de acordo com o tempo e os costumes de cada sociedade,
ampliando o conceito de uma categoria de análise, para também categoria
histórica e social, sendo necessário um olhar contextualizado.

Esta construção social do feminino prega a superioridade masculina e


ultrapassa as relações da vida cotidiana fazendo-se presente em todas
instituições sociais, ou seja: o regime da dominação-exploração das mulheres
não abrange apenas a família, mas atravessa a sociedade como um todo,
incidindo diretamente sobre a presença das mulheres nos espaços públicos.

Sendo o espaço público supracitado entendido em duas dimensões: a


comunicativa ou política, que se refere aos espaços de interação
comunicativa, como a comunicação social, a ação política e as expressões
culturais, articulados ou não com a segunda dimensão, a física ou territorial, a
qual se reporta aos espaços urbanos, abertos e acessíveis a todos, conforme
Luise Martins da Silva (2009).

Dado a natureza do estudo, sentiu-se a necessidade de incorporar à


dimensão física citada acima a conotação jurídica de espaço público, que

22
para este campo de conhecimento nasce da oposição entre o público e o
privado e está sob regulamentação estatal, segundo Jordi Borja (1998).

Desde una aproximación jurídica, podemos definirlo como un


espacio sometido a una regulación específica por parte de la
administración pública, propietaria o que posee la facultad de
dominio del suelo, que garantiza su accesibilidad a todos y fija
las condiciones de su utilización y de instalación de actividades.
El espacio público moderno proviene de la separación formal
(legal) entre la propiedad privada urbana y la propiedad
pública. Tal separación normalmente supone reservar este suelo
libre de construcciones (excepto equipamientos colectivos y
servicios públicos) y para usos sociales característicos de la vida
urbana (esparcimiento, actos colectivos, transporte, actividades
culturales y a veces comerciales, etc.)(BORJA, 1998, p. 2).

Ainda conforme Borja (1998), atribuir a definição do espaço público


apenas ao seu status jurídico, seria reducionista e não contemplaria toda sua
complexidade, por isso, se faz necessário introduzir também o aspecto
sociocultural, o uso.

El espacio público también tiene una dimensión socio-cultural. Es


un lugar de relación y de identificación, de contacto entre las
gentes, de animación urbana, a veces de expresión
comunitaria. La dinámica propia de la ciudad y los
comportamientos de sus gentes pueden crear espacios públicos
que jurídicamente no lo son, o que no estaban previstos como
tales, abiertos o cerrados, de paso o a los que hay que ir. (…) En
todos estos casos lo que defina la naturaleza del espacio público
es el uso y no el estatuto jurídico (BORJA,1998, p. 3).

Embora o espaço público seja conceitualmente o lugar de todos,


espaço de natureza plural, de troca e socialização, haja vista o que foi exposto,
ele não é neutro, e por isso, exprime as relações sociais e reproduz,
espacialmente, as divisões da sociedade na forma de segregação,
organizando o espaço e o tempo dos indivíduos; fenômeno agravado pelo
capitalismo e que afeta também a cidade sua totalidade.

O capitalismo, sistema de dominação econômica, e o patriarcado,


sistema de dominação político-ideológica, não são sistemas autônomos entre
si, eles se combinam com base em uma divisão sexual do trabalho. Esta divisão
se vale de dois princípios: o de divisão e o de hierarquia; o primeiro trata da
divisão das atividades masculinas que geralmente são profissionais e
públicas, das femininas, atividades domésticas e de cuidado; no segundo
momento, atribui-se maior valor às atividades tidas como masculinas,

23
produzindo uma distribuição desigual de poder, autoridade e prestígio (HIRATA;
KERGOAT, 2007). Por isso, as mulheres estão condenadas a uma posição inferior
na sociedade, sendo limitadas, sob esta perspectiva, à sua capacidade
reprodutiva e ao papel de cuidadora, reduzindo suas atividades à esfera
privada, sustentando a ideia de homem/espaço público x mulher/espaço
privado.

Isto posto e considerando que por anos as análises sociais e urbanas


tiveram como prioridade questões econômicas, culturais e políticas, negando a
esfera do privado e das atividades domésticas - por não as reconhecerem
como interesse público -, e sendo estas predominantemente femininas, acabou
por resultar numa “invisibilidade” das mulheres no espaço público, seja ele
político ou urbano; logo, a negação da divisão sexual do trabalho impossibilita
aos estudiosos reconhecer a reprodução da desigualdade entre gêneros. Na
espacialização dessa desigualdade, Sonia Alves Calió (1997), acrescenta:

A distinção das esferas públicas e privadas, alterando relações


sociais entre homens e mulheres, priorizando o mundo público -
político e econômico - aos homens e o mundo privado -
doméstico e íntimo - às mulheres, sexuou a cidade. E os
estudiosos urbanos tiveram dificuldade em fazer essa nova
leitura. Isso implicou na negação da esfera do privado, das
atividades domésticas, e mesmo das atividades das mulheres. É
o que chamamos de "invisibilização" das mulheres na multidão
urbana. Elas estão lá, importantes para o cenário, mas
insignificantes para a cena (CALIÓ, 1997, p. 04)

Estudos como o de Christian Dymén e Vânia Ceccato (2012) relatam que


a divisão sexual do trabalho influencia diretamente os deslocamentos feitos
pelas mulheres na cidade. Os autores afirmam que as mulheres, com mais
frequência que os homens, escolhem as oportunidades de trabalho perto da
residência e são propensas à viagem em cadeia, ou seja, quando elas viajam,
elas tendem a ter vários propósitos e vários destinos dentro de uma viagem
(figura 01).

24
Figura 01: Esquema evidenciando a diferença dos padrões de viagem entre homens e
mulheres.3

Fonte: ITDP Brasil, 2018.

É importante destacar que ao negar a combinação


patriarcado/capitalismo, nega-se também a verdadeira face da vivência das
mulheres em sociedade, uma vez que ela é, enquanto grupo social, uma
desconhecida - nos dados estatísticos, na história, nos fatos, nas tomadas de
decisões - e acaba misturada na multidão, vivendo uma falsa impressão de
igualdade, não tendo sua existência real, específica e singular reconhecida.

Salientando que a luta das mulheres ao acesso democrático à cidade


está profundamente ligada e parcialmente mesclada a luta pelo direito à
cidadania; trata-se de esferas distintas, contudo inseparáveis para a
compreensão do todo social feminino no espaço urbano. Uma das pautas
dessa luta é a segurança, pois entende-se que a falta dela é um obstáculo ao
acesso e à livre circulação na cidade, logo, age inibitivamente no direito de ir
e vir das mulheres.

O medo das mulheres no espaço público não se restringe à violência


urbana4, conforme Gill Valentine (1989) em “A geografia do medo das

3 Esta imagem faz parte relatório intitulado “O acesso de mulheres e crianças à cidade” publicado
em janeiro de 2018, desenvolvido pelo Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento - ITDP
em Recife/PE.
4 Assassinatos e assaltos são algumas das principais formas de violência urbana.

25
mulheres”5, ele está relacionado, na maior parte dos casos, à sensação de
vulnerabilidade física em comparação ao homem, temendo, principalmente, a
violência de gênero que se apresenta geralmente em forma de violência
sexual, como o assédio sexual e estupro. Ainda segundo a autora, ao passo que
durante o dia as mulheres identificam lugares isolados específicos como
assustadores, elas expressam o medo de todos os espaços durante a noite. Isto
não se deve somente ao fato de à noite a visibilidade ser reduzida e,
consequentemente, aumentar a possibilidade de ataque, mas devido às
mudanças que o espaço público sofre, uma vez que à noite o ambiente passa
a ser dominado por homens, não só numericamente, mas através de um
comportamento agressivo que intimida as mulheres.

Destaca-se ainda que áreas tidas como perigosas nem sempre


correspondem às áreas onde ocorrem mais crimes; na verdade, estudos
mostram que as mulheres são mais propensas a sofrerem violência no espaço
privado e por pessoas conhecidas do que no espaço público com
desconhecidos. Este conflito dual foi denominado como a geografia do medo
e a geografia do crime (VALENTINE, 1989).

No entanto, se por um lado a presença masculina coíbe e se configura


como uma ameaça, por outro, ela oferece proteção; por isso, em busca de se
manter segura, muitas mulheres, adotando o papel tradicional de gênero,
procuram proteção na figura masculina (o pai, irmão, namorado e marido).
contribuindo para um subsistema onde a dominação masculina é mantida e
perpetuada e validando o entendimento do uso inibido do espaço público pela
mulher como uma expressão do patriarcado. De acordo com a pesquisa
desenvolvida pelo ITDP Brasil (2018), para além do uso e da presença masculina,
aspectos físicos contribuem para a construção do medo pelas mulheres.

Isto posto e, considerando o que foi discutido acima, percebe-se que o


medo do crime tem impacto não apenas sobre as liberdades individuais e as
atividades, mas também, por ser predominante em determinados grupos sociais
e em certos lugares, reafirma, frequentemente, a exclusão social desses grupos.
Levando isto em conta, nos próximos itens do estudo busca-se explorar quais

5 The geography of women’s fear.

26
características espaço-ambientais influenciam no distanciamento feminino do
espaço público, para em seguida abordar aquelas que contribuem para a
apropriação desses lugares.

1.1.1 Características ambientais do espaço público

Ao comentar sobre a análise de eventos criminais, Thyana Barros (2012),


informa que a partir da década de 1960:

A localização do crime surge como um elemento de primária


importância na avaliação da criminalidade, como também na
busca de formas de prevenção do crime, que tem no
planejamento urbano, na arquitetura e análise dos espaços,
outra maneira de trabalhar (BARROS, 2012, p. 84).

Neste sentido, as teorias sobre a manipulação do espaço como forma


de prevenir e/ou reduzir a criminalidade e a sensação de insegurança
originaram diversos estudos como os que serão discutidos a seguir: os olhos da
rua de Jane Jacobs (2000); o espaço defensável, do Oscar Newman (1975); e
prevenção do crime através do desenho ambiental, de Ray Jeffery
(FERNANDES, 2007). É importante destacar que nos três estudos citados o recorte
de gênero não está presente.

a) Os olhos da rua, Jane Jacobs

O livro “Morte e Vida de Grandes Cidades” de Jane Jacobs publicado


na década de 1960, é um marco que influencia diversos estudiosos do tema até
os dias atuais. Jacobs (2000) associa a segurança nos espaços públicos à
presença de pessoas, independente de horário, e sugere que, por isso, o espaço
deve comportar usos variados que favoreçam a utilização da rua em horários
distintos do dia, garantindo o tráfego permanente de pessoas. Assim, a autora
elenca três princípios para uma rua segura: a existência do que ela denomina
de “olhos da rua”, a presença de elementos atrativos e a garantia de
diversidade de usos. O quadro 01, elaborado por Barros (2012) em sua tese,
sintetiza essas propriedades.

27
Quadro 01: Princípios para espaços seguros, segundo Jacobs (2000).

Fonte: Barros (2012, p. 85 e 86).

É importante ressaltar que para a autora, a segurança urbana não deve


ser determinada pela presença de policiamento, mas sim pela presença dos
elementos citados acima junto com a iluminação e a existência de quadras
curtas. Segundo Jacobs (2000) a iluminação é importante enquanto elemento
proporcionador da “multiplicação dos olhos”, porém as luzes não têm efeito
algum caso não exista pessoas trafegando nestes espaços. Já sobre as quadras
curtas (figura 02), a autora coloca que o encurtamento das ruas oportunizam a
virada frequente de esquinas, o que propicia uma rica articulação entre os usos
e usuários do bairro; porém se por um lado, as esquinas possibilitam desviar
caminhos, ou até mesmo encurta-los, por outro, é tido como elemento
causador do medo, já que cria a possibilidade de haver alguém escondido e
atrelado a isso a violência sexual.

28
Figura 02: Quadras curtas como condição para diversidade urbana.

Fonte: Jacobs (2000, p. 201).

b) O espaço defensável, Oscar Newman


O conceito de espaço defensável nasceu do questionamento em
relação à sensação de insegurança entre dois conjuntos residenciais na cidade
norte-americana de Saint Louis - Missouri, o Pruitt-Igoe (considerado inseguro) e
o Carr Square Village (considerado seguro).

Com base nas suas observações, Newman (1975) concluiu que o motivo
para a sensação de insegurança em Pruitt-Igoe devia-se não somente à
ausência do controle dos espaços coletivos pelos moradores, mas somado a
isto, ao fato dos residentes só preservarem os espaços que eram percebidos
como seus. Aqueles compartilhados com diversas famílias não eram
apropriados e, portanto, acabavam sendo depredados. O autor argumenta,
também, que ruas abertas, de livre trânsito, eram mais propensas à ocorrência
de criminalidade de que as ruas fechadas onde o acesso era mais restrito, isto
se devia ao sentimento de vigilância, pois estranhos ao adentrar nessas ruas
sentiam que suas ações estavam sendo vigiadas e isso inibia o ato criminoso.

Embora o conceito de espaço defensável tenha contribuído para o que


hoje é entendido como apropriação do espaço e tenha sido aplicado nos
Estados Unidos e nos países da Europa, ele recebeu várias críticas por defender
o controle por parte dos moradores o que poderia resultar na segregação e

29
isolamento, além de colocar os estranhos como inimigos em potencial,
entendimento que vai contra as ideias da Jane Jacobs exploradas
anteriormente.

c) A prevenção do crime através do desenho ambiental, Ray Jeffery

Em 1971, Ray Jeffery, concebeu a expressão “Prevenção do Crime


Através do Desenho Ambiental”6, e esta teoria foi um marco na forma de
relacionar o comportamento antissocial e criminoso com o desenho ambiental,
embora tenha sido ofuscada por uma década pelo Espaço Defensável de
Newman (1975) (FERNANDES, 2007).

O CPTED é um conjunto de estratégias de aplicação prática de


prevenção contra o crime que busca reduzir as possibilidades do delito de
oportunidade, bem como a redução do medo coletivo. O CPTED infere que a
ocorrência do ato delitivo está relacionada a análise de custo-benefício feita
pelo infrator. Este leva em consideração três variáveis ambientais: a situação
favorável, uma vítima vulnerável e sua motivação. Assim como Newman, a
teoria de Jeffery também recebeu inúmeras críticas de outros teóricos, o que
resultou na sua evolução já na década de 1980 (FERNANDES, 2007).
Adicionando as ideias de controle natural dos acessos, vigilância natural,
manutenção e reforço territorial, esta segunda geração incorporou os aspectos
físicos e sociais do ambiente, possibilitando um diálogo com o legado da Jane
Jacobs. Apesar das críticas, o conceito de “Prevenção do crime através do
desenho ambiental” vem sendo adotado em planos, projetos e iniciativas
governamentais no mundo todo, inclusive no Brasil, com o Programa Nacional
de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI) criado pelo governo federal
Lei nº 11.530 de 24 de outubro de 2007, além de outras iniciativas a nível
estadual.

Com recomendações de projetos baseados no CPTED, o Governo do


Chile, em 2004, desenvolveu o “Manual Espacios Urbanos Seguros”. O capítulo
sobre recomendações de projetos neste documento abrange quatro itens: a
edificação (mais precisamente a relação da edificação com o espaço

6Crime Prevention Through Enviromental Design, o termo se tornou mais conhecido por sua sigla
CPTED.

30
público), o espaço de transição (jardins), os limites (referente aos muros dos
lotes) e espaços públicos e elementos urbanos. O quadro a seguir, foi também
desenvolvido em 2004, mas por autoras brasileiras para um documento de
nome homônimo baseado no chileno que apresenta alguns dos problemas
encontrados no espaço público que podem vir a tornar um espaço inseguro; já
a figura 03, ilustra uma rua dotada de elementos que favorecem a vigilância
natural com áreas de permanência, diversidade de uso e atividades e
manutenção adequada, conforme princípios do CPTED.
Quadro 02: Recomendações contidas no Manual Espaços Urbanos Seguros.

31
Figura 03: Exemplo de rua com o conceito CPTED.

Fonte: Santos et al., 2004.

1.1.2 Arquitetura pensada para mulher

Não existe nada neutro em sociedade, por conseguinte, a arquitetura


não o é; sua forma e decisões projetuais exprime os anseios e experiência dos
seus autores, e por isso, há urgência de maior diversidade entre aqueles que a
produzem. Entende-se, pois, que o principal objetivo da arquitetura é conceber
ambientes capazes de responder às necessidades daqueles que os habitam.
Logo, o fato de a maior parte dos espaços públicos terem sido construídos por
um grupo restrito de pessoas, notadamente homem branco de classe média,
acabou por gerar uma lacuna quanto aos interesses dos outros grupos sociais.
Não que homens e mulheres projetem necessariamente de forma diferente, ou
que a classe social e raça do arquiteto (a) repercuta diretamente e sem falta
na arquitetura, mas a experiência vivida dos planejadores do espaço
certamente reflete no ato de projetar.

Porém, deve-se salientar que somente a inclusão de mulheres na


arquitetura - como profissionais arquitetas -, embora seja de fundamental
importância, não significa a criação de espaços mais igualitários sob o ponto
de vista de gênero, deve-se analisar também quais interesses estas mulheres
buscam atender; uma vez que a maior parte das arquitetas desejam
permanecer neutras sobre a questão de gêneros e aquelas que visam explicitar

32
suas intenções feministas, geralmente abraçam o campo da teoria e história da
arquitetura (RENDELL, 2002).

Tendo isto em conta, somente as práticas de projeto e planejamento,


seja arquitetônico ou urbano, que visam a criação de ambientes considerando
as particularidades das mulheres são adjetivados como intervenções com/pela
“perspectiva de gênero”, independente do gênero de quem a produziu.

É importante relatar ainda a dificuldade de encontrar materiais e estudos


que abordam a arquitetura com o olhar de gênero, uma vez que a maior parte
das reflexões que relacionam arquitetura e gênero centram no esquecimento
das arquitetas como protagonistas da profissão e nos espaços do lar e
arquitetura de interiores (ambos espaços privados), fazendo com que muitas
das informações sobre as particularidades femininas sejam captadas através de
jornais que denunciam situações que atingem em especial a mulher, como
grupo social, no espaço arquitetônico. Visto a quantidade limitada de
produções acadêmicas sobre a prática da arquitetura de gênero, fica a dúvida
se a arquitetura de gênero somente nasce após críticas e queixas da situação
atual.

Devido à sensação de insegurança e o medo agirem como os maiores


limitantes do uso do espaço público pelas mulheres - o que prejudica sua
capacidade de trabalhar, estudar, afetando seu empoderamento e direitos -
quando se diz arquitetura ou urbanismo de gênero, lê-se, primeiramente,
aquelas cuja decisões projetuais promovem mais segurança para as mulheres.
Todavia, como o projeto a qual este trabalho se propôs busca atender as
necessidades femininas para além da segurança, procurou-se explorar táticas
e estratégias arquitetônicas que também caracterizam intervenções sob a
perspectiva de gênero.

No tocante à plasticidade da arquitetura, encontrou-se no livro


“Arquitetura do Espaço de Gênero: Uma introdução interdisciplinar”7 (2002), a
seguinte colocação:

7Gender Space Architecture: An interdisciplinary introduction, organizado por Jane Rendell,


Barbara Pener e Iain Borden.

33
Diversos (as) desenhistas feministas extraíram inspiração
arquitetônica do corpo feminino, projetando formas
semelhantes a ventre e curvilíneas em vez de torres fálicas,
espaços que focalizam aspectos do cercado (abrigos e prisões),
explorando a relação entre interior e exterior (aberturas,
cavidades e lacunas) (RENDELL, 2002, p. 229).8

No entanto, acredita-se que para um edifício ser visto como masculino,


não é preciso ter representações fálicas, geralmente este caráter está
associado aos edifícios pesados, robustos e rígidos. O que também se repete
em termos de materialidade, uma vez que o concreto, madeira e aço são
associados ao masculino, enquanto elementos vazados e vidro são femininos,
pois remetem a abertura e fluidez.

Quanto às instalações reclamadas pelas mulheres para os espaços


coletivos, a maioria diz respeito à acessibilidade universal, tais como rampas e
plataforma elevatória, pois devido ao papel de cuidadora que lhe é atribuído,
às mulheres geralmente são quem acompanha os idosos e/ou pessoas com
deficiência da família, vale salientar que entre as mulheres com maior poder
aquisitivo, essa reclamação também está atrelada ao uso do carrinho de bebê;
ampliação dos fraldários para os banheiros masculinos ou a criação de espaços
família, uma vez que a exclusividade dos fraldários nos banheiros femininos
reforçam o papel de cuidadora citado ao inferir que somente as mulheres são
responsáveis pelos cuidados dos bebês e crianças.

Um outro ponto interessante a ser considerado, que recentemente foi


pauta de discussões na Inglaterra, é o desenho das escadas e a
permeabilidade visual de seus guarda-corpos em locais de uso coletivo (BBC,
2019), uma vez que, a depender também de sua materialidade, as escadas
oportunizam o assédio sexual em forma de upskirting, fenômeno que consiste
em violar a intimidade de uma mulher com fotos ou vídeos não autorizados de
suas partes íntimas, feitos por debaixo da saia ou outra peça de roupa.

Por fim, tendo em vista o que foi discutido, percebe-se que há uma
lacuna quanto à caracterização das práticas arquitetônicas, ao nível da

8 Texto original: “A number of feminist designers have drawn architectural inspiration from the
female body, designing womb-like and curvaceous forms rather than phallic towers, spaces which
focus on aspects of enclosure (shelters and prisons), exploring the relationship between inside and
outside (openings, hollows and gaps)”.

34
edificação principalmente, que relacionem gênero e espaço. É necessário que
o desejo das mulheres de se instituírem como sujeitos no sistema arquitetônico
transborde do âmbito privado e que mais estudos, interpretações e produções
do espaço público sejam feitos através da sua própria perspectiva. Pois,
segundo Lia Antunes (2016), a partir da história do “pessoal” e do “íntimo”, as
mulheres podem estabelecer as estruturas da sua resistência e de permanência
na construção do espaço de tal forma que acabem por traçar uma outra face
da história “oficial” (dos homens).

O quadro 03 reúne as diretrizes que serão empregadas no projeto


arquitetônico para atender as necessidades de gênero, além das
recomendações presentes no quadro 02.

Quadro 03: Quadro resumo dos princípios para uma arquitetura de gênero.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Considerando o que foi exposto acima, nos próximos itens busca-se


explorar a ideia de patrimônio cultural e centros históricos tendo em vista que o
projeto a qual este trabalho se propôs busca dedicar-se à memória coletiva das
mulheres, em especial potiguar, e está localizado em área de valor histórico
patrimonial da cidade de Natal, o bairro da Ribeira.

35
1.2 LUGARES DE MEMÓRIA

A ideia de patrimônio contida neste estudo remete-se à noção de


patrimônio cultural descrita por Carlos Lemos (1981), que se desdobra em três
grandes grupos: o primeiro compreende os elementos naturais e do meio
ambiente; o segundo engloba os elementos imateriais do patrimônio – o
conhecimento, as técnicas e o “saber fazer”; já o terceiro compõe os bens
culturais, como objetos, artefatos e edificações (LEMOS, 1981).

Somando este conceito às colocações de José Luiz dos Santos (1983),


que afirma a cultura como expressão em toda a sua riqueza e multiplicidade
de formas de existência de agrupamentos humanos e das características que
os unem e diferenciam, entende-se por cultura toda e qualquer manifestação
capaz de caracterizar um povo ou um período histórico, contribuindo para a
construção de uma identidade.

Identidade esta relacionada à necessidade de pertencimento a um


determinado centro de referência por um indivíduo, que o permita construir
traços comuns com o meio em que vive, estabelecendo uma ligação com sua
própria história e preservando a memória do grupo social (CAFÉ, 2007). Ou seja,
falar de identidade cultural e/ou coletiva é falar de todo o tipo de patrimônio
com que a comunidade se relaciona e pela qual é determinada, sendo
estreitamente ligado à noção de memória coletiva, ponto importante neste
trabalho e que será explorada a seguir.

A memória pode ser entendida como a capacidade humana de reter


fatos e experiências do passado e retransmiti-los às novas gerações. De acordo
com Olga Simson (2003), a memória pode ser dividida em três categorias: a
memória individual, coletiva e subterrânea ou marginal.

A memória individual, segundo a autora, é aquela guardada por um


indivíduo e se refere às suas próprias vivências e experiências, mas que contém
também aspectos da memória do grupo onde ele foi socializado. Já a memória
coletiva é formada pelos fatos e aspectos julgados relevantes que são
guardados como memória oficial da sociedade mais ampla (SIMSON, 2003);
sobre esse conceito, Maurice Halbwachs (2006) acrescenta:

36
[...] a memória coletiva tira sua força e sua duração por ter
como base um conjunto de pessoas, são os indivíduos que se
lembram, enquanto integrantes de um grupo. Desta massa de
lembranças comuns, umas apoiadas nas outras, não são as
mesmas que aparecerão com maior intensidade a cada um
deles. De bom grado, diríamos que cada memória individual é
um ponto de vista sobre a memória coletiva, que este ponto de
vista muda segundo o lugar que ali ocupo e que esse mesmo
lugar muda segundo as relações que mantenho com os outros
ambientes (HALBWACHS, 2006, p.69).

Por outro lado, as memórias subterrâneas ou marginais correspondem a


versões sobre o passado dos grupos dominados de uma dada sociedade
(SIMSON, 2003). Os grupos dominantes, à medida que foram se desenvolvendo
e se organizando, materializaram suas memórias nos museus, arquivos, cemitério
e coleções, festas, aniversários, tratados, processos verbais, monumentos,
santuários, associações, marcos testemunhas de outra era (NORA, 1993).

A materialização dessas memórias permitiu aos grupos dominantes


determinar aos demais grupos quais acontecimentos são importantes e
merecem ser celebrados, tornando-se detentores da memória e adequando a
história a ela (NORA, 1993). A prática de controle da memória e da história deixa
clara a tentativa de exclusão e silenciamento dos grupos minoritários, incluindo
as mulheres, que geralmente passam suas memórias de geração em geração
cuidadosamente por meio da história oral.

Trazendo a discussão sobre o silenciamento das mulheres na história a


nível regional, percebe-se, por exemplo, que a maior parte da população local
desconhece o pioneirismo e importância das mulheres potiguares na luta por
igualdade de gênero no Brasil.

No campo político, as mulheres norte rio grandenses foram protagonistas


no movimento sufragista brasileiro, sendo a Professora Celina Guimarães Viana
(1890 – 1972), em 1927, a primeira mulher a votar e Alzira Soriano (1897 – 1963),
em 1928, a primeira prefeita do país, fatos que repercutiram mundialmente, por
se tratarem não somente da primeira eleitora e primeira prefeita do Brasil, mas
também da América Latina - vale salientar que ambos acontecimentos
ocorreram antes do voto feminino ser incluído pela primeira vez no código
eleitoral brasileiro em 1932. O estado também elegeu a primeira vereadora do
país em 1927, Joana Cacilda Bessa (1898 – 1998) e a primeira deputada estadual

37
mulher no Brasil em 1934, Maria do Céu Pereira Fernandes (1910 – 2001). Os
mandatos de Alzira e Maria do Céu foram cassados depois de assumirem, e o
voto de Celina, assim como de outras eleitoras pioneiras daquele momento,
anulados pelo Senado por entender que o termo “cidadãos” compreendia
somente os homens (LIMA, 2018).

Embora muito se discuta sobre a tradição das mulheres potiguares na


política, uma vez formada majoritariamente por mulheres brancas, vindas da
elite do estado que ascenderam aos seus cargos através de herança política
de seus maridos, pais, irmãos e tios; o protagonismo feminino potiguar não
pereceu em décadas passadas, mantêm-se até os dias atuais, tendo como por
exemplo as eleições de 2018, nas quais o Rio Grande do Norte foi o único dos
27 estados brasileiros a eleger uma governadora, primeira de origem popular,
tornando-se a unidade federativa brasileira que elegeu o maior número de
governadoras na história.

Saindo do campo da política, o Rio Grande do Norte conta com nomes


como Clara Camarão, índia potiguar nascida na metade do século XVII, que
lutou contra os holandeses junto ao seu esposo Felipe Camarão em Recife e
Olinda - Pernambuco e em Porto Calvo (1634) - Alagoas; a poetisa Auta de
Souza (1876 – 1901)(“Conheça 10 mulheres Potiguares que fizeram história”,
2015); a escritora e educadora Nísia Floresta (1810 – 1885), hoje considerada a
primeira feminista do Brasil, responsável por publicar textos em jornais na
imprensa, rompendo os limites entre os espaços público e privado e se
posicionado contra a escravidão e pela igualdade de gêneros (SOIHET, 2005);
entre outros ícones da história nacional.

Visto o que foi exposto, torna-se evidente a necessidade da


materialização das memórias das mulheres, como categoria social, através da
criação de espaços de proteção e difusão de suas lutas, contribuições e
avanços, que tanto são silenciados. Salienta-se ainda que esses equipamentos
voltados para fins de preservação e exposição da história exercem um papel
fundamental no empoderamento feminino e na promoção da igualdade
cidadã e equidade de gênero.

38
Dessa forma, propôs-se o anteprojeto de um Centro de Cultura, Memória
e Estudos da Mulher, espaço que tem não apenas a função de expor e
preservar, mas de promover o aprendizado e educação, objetivando o
fortalecimento dos laços de pertencimento e noções de identidade da própria
população - valorizando o patrimônio potiguar e conservando-o para futuras
gerações - tema que será melhor explorado no item a seguir.

1.2.1 Centros de cultura: princípios e diretrizes

Centros culturais são espaços que conservam, difundem as artes e


expõem testemunhos materiais produzidos pelos seres humanos. No Brasil, há
2.500 centros culturais, entre museus, teatros, galerias, casas de culturas e
bibliotecas, que mantêm acervos e exposições; com eles, o cidadão entra em
contato com diversas manifestações artísticas e pode desenvolver um olhar
mais crítico sobre a cultura e outros aspectos de seu cotidiano (“Centros
culturais”, 2009).

Os centros de cultura costumam ser e/ou tornam-se um ponto de


encontro nas comunidades, lugares onde as pessoas se reúnem para conservar
tradições e desenvolver atividades coletivas. De modo geral, as atividades lá
desenvolvidas são gratuitas ou são cobrados valores simbólicos, de forma que
todos possam usufruir do espaço; por isso os centros culturais frequentemente
são propriedades de uma estatal ou cooperativa, já que comumente não se
trata de instituições com fins lucrativos (“Conceito de centro cultural”, 2013).

De acordo com Renata Neves (2013), as atividades promovidas em um


centro cultural podem ser resumidas em três verbos gerais que buscam se
espacializar em ambientes, sendo eles: informar, discutir e criar. O verbo
informar está relacionado ao acesso à informação pelo público,
materializando-se em espaços de biblioteca, centro de multimídias, salas de
exposições entre outros; já o verbo discutir busca transbordar a organização
passiva das informações, relacionando-se à espaços de discussões, reflexões e
críticas, tais como átrios, anfiteatros e auditórios; o terceiro e último verbo, criar,
surge da interação entre a informação e a discussão e se espacializam em
laboratórios, salas de oficinas, entre outros.

39
Isto posto, entende-se centro cultural como um local onde há a
concentração de atividades diversas em prol da cultura e que atuam de formas
interdependentes, simultâneas e multidisciplinares.

No Brasil, embora já houvessem espaços destinados à cultura ainda que


sob denominações separadas - como museus, bibliotecas, teatro, entre outros -
, foi a construção do Centro George Pompidou na França que impulsionou a
construção de edifícios que agora seriam denominados centro culturais, na
década de 1980 (MILANESI, 1997). Sendo marcos brasileiros a construção do
Centro Cultural do Jabaquara e do Centro Cultural São Paulo, ambos em São
Paulo (figura 04).

Figura 04: (E) Centro Cultural São Paulo; (D) Centro Cultural do Jabaquara.

Fonte: (E) Studio Plano Verde, 2014; (D)Yau; Rocha Filho, 2017.

Vale destacar que houve um grande estímulo para a criação e


manutenção de centros culturais nos últimos anos, alimentado por leis e
investimentos de incentivo à cultura, tal como a criação do Instituto Brasileiro de
Museus (IBRAM), em 2009, entidade responsável por desenvolver ações
educativas e de inclusão social nos centros culturais, utilizando o patrimônio
cultural como ferramenta de interação.

Quanto às características físicas e programação dos centros culturais,


essas definições devem ser feitas através da análise do público alvo e das
particularidades de onde ele será construído. Além disto, para Neves (2013), os
centros devem integrar três campos comuns ao trabalho cultural: a criação,
circulação e preservação. O campo de criação atua como o “verbo criar”,

40
anteriormente explicado no texto; já o segundo campo prevê a circulação de
bens culturais, evitando a conversão desses espaços em locais de somente
lazer, sem a atuação dos três verbos mencionados; já a preservação atua no
resguardo do bem cultural e a manutenção da memória da coletividade
explicada no item anterior. Ainda segundo a autora, a relação desses campos
(criação, circulação e preservação) com os verbos (informar, discutir e criar)
citados, contribuem na compreensão da finalidade e funcionamento dos
centros de cultura.

No que concerne a arquitetura desses espaços, a autora destaca:

Para proporcionar um bom funcionamento, um centro cultural


deve exercer funções necessárias como espaços de apoio,
contendo dependências administrativas, almoxarifado, reservas
técnicas, sanitários, espaços que proporcione suporte para a
realização dos objetivos principais. Sendo acrescentadas aos
espaços “complementares”, estendendo o programa de
necessidades, visando atender a demanda relacionada aos
interesses econômicos, tais como: as cantinas, restaurantes,
lanchonetes, livrarias, lojinhas de artesanatos, dentre outros. Ao
propor o programa de necessidades de um centro cultural, o
profissional deve ter consciência que enfrentará várias
diversidades programáticas existentes, decorrentes das
necessidades culturais que são bastante variadas no contexto
social e saber ao certo o conceito de cultura (NEVES, 2013, p.
06).

Outros atributos físicos também mencionados são: possibilidade de vários


acessos, tornando o espaço mais receptivo e diminuindo a inibição do público;
acessos em continuidade com espaços públicos, como por exemplo, praças;
democratização dos espaços, traduzido na organização dos ambientes em
volta de um espaço central de convívio, como pátio.

Somado a estes, tem-se ainda: integração das diversas atividades


através de visuais livres, objetivando atrair o público e permitir que ele conheça
as atividades que lá são desenvolvidas; adequação ambiental, as salas devem
apresentar boas dimensões e adaptabilidade aos diferentes tamanhos de
público; e integração do público através de áreas de convivência
(restaurantes, cafés, entre outros), para a reunião de usuários.

Incorporam-se a estas orientações, diretrizes e princípios para bibliotecas


públicas desenvolvidos pelo Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas/SNBP e

41
publicado em 2010. Como princípios gerais para o projeto arquitetônico, neste
manual tem-se que: a solução arquitetônica deve sempre priorizar a
funcionalidade dos espaços; as janelas devem ser posicionadas de modo a
evitar o possível extravio de obras e a sua deterioração pela ação do sol, vento
e umidade; o piso deve ser de material resistente e de fácil conservação; e os
ambientes devem ser sempre que possível amplos e flexíveis.

Quanto às recomendações técnicas, tem-se que embora devam ser


considerados aspectos de iluminação e ventilação natural é indispensável o uso
de iluminação artificial e instalação de aparelhos de ar condicionado; deve-se
evitar a instalação de jardins suspensos, especialmente acima do acervo, visto
o risco de infiltração de água; o exterior da edificação deve ser destacado e
contar com placa indicando o nome da instituição e os horários de
funcionamento; a biblioteca deve ter somente uma entrada para público e
pessoal para facilitar o controle da circulação e deve contar com guarda-
volumes; e que próximo a esta entrada deve estar o balcão de empréstimo e
devolução e as salas de exposição.

O quadro 04 reúne as diretrizes que serão empregadas na proposta


arquitetônica.

Quadro 04: Quadro resumo dos princípios e diretrizes para centros culturais.

Fonte: Elaborada pela autora, 2019.

42
1.2.2 Centros Históricos

Equipamentos com uso cultural geralmente são instalados nos centros


das cidades, numa atitude de conservação do patrimônio histórico por meio de
novos usos que viabilizem a conservação e sustentabilidade dos antigos
edifícios; além dos centros históricos contarem com estrutura urbana
relativamente consolidada. Os centros culturais e museus vieram, sob inúmeros
pontos de vista, transformar, de novo, o centro da cidade em praça de
comércio, sobre isto, acrescenta-se:

Nesta praça, o mercado de arte e cultura resgata uma


dimensão apenas aparentemente perdida: aquela que, ao
estabelecer o constante uso do "espírito", garante a
sobrevivência dos artistas ao mesmo tempo em que assegura a
ordem futura. De outro lado, é inegável que as mudanças
sociais, políticas e econômicas induzindo a dinâmica da cultura
e de seus suportes físico-espaciais, encontraram, nas áreas
centrais em arruinamento, os lugares ideais para o exercício da
construção de novas expressões do dito "quanto mais se muda
mais se permanece (GUIMARAENS; IWATA, 2001).

Os centros históricos são, via de regra, a área mais antiga das cidades e,
segundo a Direção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento
Urbano – DGOTDU de Portugal, geralmente coincidem:

Com o polo de origem do aglomerado, de onde irradiaram


outras áreas urbanas sedimentadas pelo tempo, conferindo
assim a esta zona uma característica própria cuja delimitação
deve implicar todo um conjunto de regras tendentes à sua
conservação e valorização (DGOTDU, 2005, p.63).

Estas áreas iniciaram um processo de decadência e esvaziamento na


segunda metade do século XX, com a expansão dos processos de
suburbanização e deslocamento do emprego para áreas novas da cidade,
ação geradora de novas centralidades periféricas e maior diversidade de
morfologias urbanas, conforme Ana Sofia Sebastião(2010). Contudo, a partir da
década 1970, quando as questões econômicas se agravaram com o fim do
boom econômico pós-guerra, ficou evidente a urgência de inverter a
tendência de abandono dos núcleos históricos e das áreas centrais da cidade,
pois reabilitar um parque habitacional preexistente, à escala de um centro
histórico, acarretaria menos gastos do que construir de novo, como explica
Eduardo Henriques (2003).

43
À escala de um núcleo histórico o processo de reabilitação é
facilitado por já existir todo um conjunto de infraestruturas que
não necessitam de ser novamente introduzidas de raiz, tais como
canalizações, ligações eléctricas, condutas de gás, entre outras,
justificando por vezes apenas alguns melhoramentos. Por outro
lado, a própria conservação e reabilitação dos centros históricos
das cidades para “as modernas procuras de habitação, ou para
funções económicas e sociais”, permite por sua vez “conter o
alargamento dos perímetros urbanos e, por esta via, controlar a
escalada da procura de transportes” e todos os gastos
energéticos a ela associados (HENRIQUES, 2003, p.227).

Esta necessidade crescente de reanimar os núcleos históricos traduziu-se


na elaboração de documentos, que apresentavam princípios relacionados à
preservação, salvaguarda e à intervenção nos núcleos históricos das cidades.

Por fim, para além da importância patrimonial mais física - edificada,


ainda que tenha perdido parte da sua relevância e acessibilidade, os centros
históricos mantiveram sua imagem simbólica como elemento marcante. De
fato, centro histórico, para além de ser a área “em que as funções se
sobrepõem e sobretudo o lugar em que se desenrolam as atividades vistas
como sendo particularmente importantes, aquelas que se situam ao nível
hierárquico mais elevado”, também são “o lugar simbólico por excelência, o da
história e da memória coletiva”, segundo Jean Rémy e Liliane Voyé (1997, p. 92).

O fenômeno descrito acima também pode ser observado no centro


histórico da cidade de Natal – RN, especificamente no bairro da Ribeira, local
da intervenção arquitetônica a qual este trabalho se propôs; por isso, será
descrito no próximo item um breve histórico do bairro e como esse processo se
deu.

1.2.3 A Ribeira

Em Natal, assim como, a maior parte das cidades brasileiras do período


colonial, o centro foi instalado fazendo uso da configuração acidentada do
solo, no local de topografia mais elevada – bairro da Cidade Alta -, sendo
demarcado pela construção de edifícios representativos de poder da época,
como as igrejas e casas de câmara e cadeia. Imediatamente após o
surgimento da Cidade Alta, ocorreu a ocupação da região de topografia mais
baixa - bairro da Ribeira -, que possuía um outro aspecto comum à estrutura
colonial de ocupação do território: a conexão com o oceano e as vias

44
marítimas de transporte (FIGUEIRA et al., 2018). Com o estabelecimento dessa
zona portuária, a Ribeira que até então era tida como “zona de sítios para
plantação e armazéns” (MIRANDA apud FERRAZ, 2008) se apropriou do título de
“centro da cidade” devido a intensidade e a diversidade de atividades que
passou a concentrar na época (FERRAZ, 2008).

É importante destacar que as construções deste período - século XVII à


meados do século XIX – eram em sua maioria em taipa, seguindo conformações
“coloniais”. Porém, nas últimas décadas do século XIX as influências estilísticas
trazida pela Corte Portuguesa presente nos grandes centros urbanos chegou na
região, “modernizando” a cidade através de reformas urbanas que tiveram
como objetivo adequar-se aos padrões higienistas da época. Sendo alocado
grandes investimentos, entre 1908 e 1913, pelo poder público para “transformar
a cidade” introduzindo no cenário urbano um sistema de abastecimento de
água, transportes, comunicação e construindo novos edifícios (FIGUEIRA et al.,
2018).

Estes investimentos atraíram a transferência de várias instituições para o


bairro, contribuindo para a multiplicidade de atividades lá instaladas, para além
das atividades comerciais e residenciais. Na década de 1940, período em que
Natal sediou uma base militar de grande importância para os Aliados no
contexto da II Guerra Mundial, a Ribeira se desenvolveu enquanto polo cultural
e de espaços de boemia, sendo abertos então grandes bares e hotéis (SEMURB,
2017).

No entanto, como o fim da II Guerra Mundial teve-se início o processo


gradual de transferência do centro comercial em direção às novas
centralidades ocasionando uma perda de status e vitalidade do bairro -
processo presente também em outras capitais brasileiras, como discutido no
item anterior. Durante este processo de decadência, em 1980 iniciaram-se as
discussões sobre o reconhecimento do valor patrimonial da Ribeira e de
tombamento do traçado urbano do centro histórico de Natal, buscando
reestabelecer as atividades culturais numa tentativa de evitar o esvaziamento
noturno, já que há uma alta concentração de atividades predominantemente
diurnas na área (comercio e serviço)(SEMURB, 2017).

45
Da década de 1990 a atualidade, os esforços do poder público não mais
se concentraram em evitar o esvaziamento urbano, passando a agir na
tentativa de reabilitar a área, sendo desenvolvidos diversos programas, ações e
trabalhos na região. Salienta-se que os instrumentos legais e urbanísticos
desenvolvidos neste período serão discutidos no item de condicionantes legais
contido no capítulo 03 deste trabalho.

1.3. SÍNTESE DA BASE TEÓRICA

A literatura estudada apresenta dois focos de abordagem, questões


ligadas as mulheres no espaço, tanto de ordem social quanto física; e questões
relacionadas à memória e espaços históricos. Este trabalho se detém ao
aspecto físico do espaço, já que busca a intervenção arquitetônica, porém a
compreensão da influência dos elementos sociais na experimentação do
construído, arquitetônico e urbano, pelas mulheres se faz fundamental para a
construção do programa e dos parâmetros de projeto.

Em virtude do que foi discutido, compreende-se que a sensação de


insegurança é o maior limitador do uso do espaço público pelas mulheres,
tornando-se evidente a necessidade de uma intervenção urbana juntamente
com a arquitetônica, que nesta proposta se caracteriza por uma intervenção
na escala da rua. Verificou-se ainda uma escassez de diretrizes na escala da
edificação, por isso, a proposta arquitetônica buscará rebater as
recomendações para os espaços urbanos no edifício, fazendo com que o
espaço privado seja uma extensão do espaço público a luz do gênero.

No que concerne aos centros históricos, percebe-se a importância da


inserção de novos usos na conservação desses sítios, que se dá através da
promoção de vitalidade. Estes novos usos, especialmente os culturais, tornam
o lugar mais atrativo aos olhos do público, local e turistas, por atrair a instalação
de usos secundários diversos que geram copresença de usuários em diferentes
horários, causando nos transeuntes e moradores, especialmente do sexo
feminino, sensação de mais segurança.

46
2. Estudos de referências projetuais
No processo de concepção arquitetônica, o estudo de referências
projetuais cumpre o importante papel de guiar os arquitetos na tomada de
decisões, por meio da análise crítica de projetos existentes que solucionaram de
forma satisfatória e/ou inovadora as necessidades e elementos projetuais que
se assemelham aos da proposta a ser desenvolvida.

A fim de explorar soluções relacionadas à escala, forma, função,


programa de necessidades, entre outros aspectos, foram estudados quatro
referências, das quais duas foram de forma direta, através de visita ao local e
duas de forma indireta, analisadas por meio de fontes como livros, sites de
internet e outros.

A primeira referência é a Biblioteca das mulheres de Glasgow9, Escócia;


a seguinte é o Centro para Arte Contemporânea Chinesa10 em Manchester,
Inglaterra11; em seguida, como referência indireta, o Paseo de La Brecha no
Uruguai e a Plaza del Torico na Espanha.

2.1. BIBLIOTECA DAS MULHERES DE GLASGOW

O projeto para a Biblioteca das Mulheres de Glasgow foi desenvolvido


pela firma local Collective Architecture através de um concurso, esteve entre os
nomeados para o Prêmio RIAS12 em 2016 e foi vencedor de quatro prêmios,
dentre eles o Prêmio GIA13 de melhor Design na categoria Lazer e Artes em 2016.

A escolha desta referência se deu principalmente pelo fato de ser uma


biblioteca/museu dedicado à vida, histórias e conquistas das mulheres, além de
ser um projeto de reuso para uma edificação de valor patrimonial e contar com
um programa de necessidades semelhante ao objetivado neste trabalho. Em
entrevista à revista digital Dezeen (2016), Cathy Houston e Steven Byrne,
arquitetos responsáveis pelo projeto, explicaram que a reforma se concentrou
em atender às exigências espaciais da GWL de transformar parte da área de

9 Glasgow Women’s Library (GWL).


10 Centre for Chinese Contemporary Art (CFCCA).
11As visitas foram realizadas durante uma viagem ao Reino Unido e ocorreram respectivamente

nos dias 01(segunda-feira) e 19 de julho de 2019 (sexta-feira


12 Royal Incorporation of Architects in Scotland Award celebra anualmente a melhor arquitetura

da Escócia.
13 Glasgow Institute of Architects Award.

48
biblioteca em museu/galeria, criando novos espaços para sediar grandes
eventos, exibições, palestras e exposições

A biblioteca nasceu em 1991 após uma temporada de eventos,


workshops, exposições, entre outras atividades coletivas sobre e para mulheres,
promovida pela organização artística Women in Profile. Depois desse período,
a organização reuniu os escritos e materiais que documentavam as suas
atividades e após consulta à comunidade local, criou-se a Biblioteca das
Mulheres de Glasgow na área de Garnethill para abrigar este acervo. A partir
de então, milhares de pessoas doaram livros, revistas, periódicos e objetos
pequenos, contribuindo para o rápido crescimento da GWL, tanto em termos
de tamanho de coleção quanto de número de usuários; o que culminou na
mudança da organização para as instalações de propriedade do Conselho
Municipal de Glasgow na 109 Trongate, onde continuou a se expandir e se
desenvolver.

Em 2007, a Biblioteca mudou-se temporariamente para 81 Parnie Street


enquanto negociava instalações independentes permanentes na Biblioteca
Mitchell, para a qual a organização planejou uma reforma no valor de 1,5
milhões de libras – a edificação 109 Trongate foi reclamada para organizações
de artes visuais –. Entretanto em 2010, assim como a 109 Trongate, as instalações
temporárias da Parnie Street foram designadas como necessárias para
organizações de artes visuais, resultando na ocupação do espaço da Biblioteca
Mitchell antes do término das obras de reforma. Esta mudança revelou que a
Biblioteca cresceu significativamente entre a oferta do local e mudança para
ele, pois o espaço não mais atendia aos requisitos operacionais e estratégicos
da GWL em termos de tamanho, funcionalidade, visão e ambição.

A partir desse momento a GWL junto a Glasgow Life14 iniciou a busca por
novas instalações adequadas, identificando o prédio da antiga biblioteca
pública na Landressy Street em Bridgeton a melhor opção. A Biblioteca das
Mulheres de Glasgow mudou-se permanentemente suas instalações em 2013
para 23 Landressy Street (Figura 05), após um grande projeto de reforma no valor
de 1,4 milhão de libras que foi concluído em novembro de 2015.

14Glasgow Life é uma instituição de caridade que oferece atividades culturais, esportivas e de
aprendizado em nome do Conselho Municipal de Glasgow.

49
Figura 05: Situação da Biblioteca das Mulheres de Glasgow.

Fonte: Girlhood Gang, 2018, modificado pela autora, 2019.

A edificação 23 Landressy Street (Figura 06) foi construída em 1903 com


dinheiro doado pelo empresário e filantropo escocês-americano Andrew
Carnegie, juntamente com outras seis bibliotecas da cidade e trata-se de um
edifício tombado categoria B15.
Figura 06: Fachada reformada da Biblioteca das Mulheres de Glasgow

Fonte: GRIFFITHS, 2016.

15De acordo com a lei de tombamento da Escócia (Listed Buildings and Conservation Areas -
(Scotland) Act 1997) a categoria B significa que o edifício possui uma importância regional ou
local, um exemplo importante de um estilo ou período particular, que pode ter sido alterado.

50
No exterior da edificação foram realizados, para além da adição de um
novo elevador na porção sul do edifício, somente trabalhos de restauro das
inscrições gravadas, dos detalhes do parapeito e das esculturas em pedra dos
frontões. A instalação do elevador surgiu da união entre a necessidade de uma
circulação vertical acessível para o primeiro andar e a falta de espaço interno
adequado, logo, resolveu-se instalar este novo elemento arquitetônico fora da
caixa volumétrica do edifício, enfatizando-o através do revestimento em aço,
contrapondo o novo com o existente. O revestimento em aço foi cortado de
forma a representar obras literárias existentes no acervo da Biblioteca que foram
carinhosamente escolhidas por seus membros e voluntários.

Internamente, a reforma se concentrou na ala esquerda da biblioteca,


que foi escolhida para ser área de museu/galeria e abrigar grandes eventos
(figura 07), para isto buscou-se restaurar o pé-direito duplo original,
possibilitando maior quantidade de luz natural no ambiente após desobstrução
das janelas; além da instalação de um mezanino para maximizar o uso do
espaço. No térreo, próximo a circulação vertical se encontra o bloco de
banheiros - que não possui distinção de gênero -, uma pequena galeria abaixo
do mezanino, aproveitando a atmosfera mais intimista criada, uma cozinha,
parte do arquivo e espaço para eventos (Figura 08). Já no mezanino se
encontra outra parte do arquivo, a estação de trabalho do funcionário
arquivista e o acervo não disponível para empréstimo com mesas para leitura;
durante a visita à Biblioteca, observou-se que nas mesas de leitura do mezanino
estava havendo uma reunião de mulheres para confeccionar cartazes, uma
demonstração do uso do espaço como ponto de encontro por estes grupos.

Sobre a distribuição dos ambientes, a assistente administrativa Mattie


Roberts informou que o arquivo dividido em dois ambientes era uma exigência
projetual, pois um seria de livre acesso pelo público (térreo), enquanto o outro
seria somente acessado com um funcionário (mezanino).

51
Figura 07: Setorização da Biblioteca das Mulheres de Glasgow.

Fonte: GRIFFITHS, 2016, modificado pela autora, 2019.

Figura 08: Setorização da área reformada da GWL.

Fonte: Dezeen, 2016, modificado pela autora, 2019.

Já a ala direita do edifício consiste no hall de entrada, loja, biblioteca


com o acervo disponível para empréstimo, duas salas administrativas, banheiro
e sala de oração/estudo em grupo. Ao longo da conversa com Mattie Robert
foi relatado que, pelo fato da edificação ter sido projetada como uma
biblioteca genérica, sentiu-se a necessidade de criar uma ambiência mais
acolhedora, para tanto houveram algumas pequenas mudanças, dentre elas:
a criação de ambientes de leitura menores e mais intimista distribuído entre as

52
prateleiras com o acervo (figura 09); na administração foram criadas grandes
aberturas de vidro voltadas para o interior da biblioteca, possibilitando uma
aproximação dos usuários com os funcionários, além de ampliar o campo de
visão (figura 10 (E)); e no tocante ao mobiliário, o desenho do balcão da
recepção foi alterado para um design circular e mais aberto - antes o móvel
era ortogonal e robusto, além de desloca-lo para outra parede (figura 10 (D)).
Figura 09: (E) Ambiente de leitura em grupo; (D) Ambiente de leitura individual.

Fonte: (E) Acervo da autora, 2019; (D) Acervo da autora, 2019.

Figura 10: (E) aberturas das salas de administração; (D) Balcão de informação.

Fonte: (E) Acervo da autora, 2019; (D) Acervo da autora, 2019.

53
No primeiro pavimento, encontra-se a sala de reunião/conferência,
cozinha, banheiros e um pequeno espaço de galeria com mesas. Vale salientar
que embora o acesso seja livre, estes ambientes geralmente são frequentados
pelo público durante eventos; e o elevador instalado, citado anteriormente no
texto, buscou garantir acessibilidade a este espaço.

Sobre o funcionamento da Biblioteca, Mattie Roberts afirmou a


importância da sua localização próxima à estação de trem, uma vez que a
maior parte dos usuários utiliza do transporte público para chegar lá; e o uso da
identidade local para a sensação de pertencimento, presente na adoção do
coreto existente no bairro, Bridgeton, como motivo do carpete (figura 11).
Quanto aos seus usuários, passam pela biblioteca em média 150 pessoas
diariamente, aumentando este número para 500 pessoas quando há
exposições ou evento no local; destaca-se que o público é
predominantemente feminino e o seu quadro de funcionários e voluntários é
composto integralmente por mulheres.

Figura 11: (E) Coreto do bairro de Bridgeton; (D) Carpete da Biblioteca.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

De acordo com a funcionária, para a criação de ambientes com a


perspectiva de gênero, deve-se prezar por espaços acessíveis e que permitam
a autonomia das mulheres. Como visitante, a atmosfera feminista foi percebida
pela presença de outras mulheres desenvolvendo atividades diversas, tais
como: lendo livros, estudando, utilizando computador e confeccionando
cartazes.

54
2.2 CENTRO PARA ARTE CONTEMPORÂNEA CHINESA – CFCCA

O projeto do Centro para Arte Contemporânea Chinesa, desenvolvido


pelo escritório OMI Architects, recebeu Prêmio RIBA de Excelência em Design16
no ano de 2004, e tinha como princípio norteador a incorporação de elementos
arquitetônicos chineses a fim de relacionar a edificação com o seu uso, além
de respeitar as características originais históricas do edifício.

A escolha desta referência se deu pelo fato de ser um projeto de reuso


para uma edificação de valor patrimonial com o programa de necessidades
semelhante ao do projeto em desenvolvimento neste trabalho. Salienta-se que
o objetivo deste projeto também coincidiu, que é dar voz a um grupo de
expressão política minoritária no contexto no qual está inserido; assim como, no
âmbito mais formal, o programa arquitetônico do projeto que é caracterizado
pelo uso da planta flexível dentro dos limites volumétricos originais da
edificação.

O CFCCA é uma galeria de arte contemporânea e cultura visual chinesa


para audiência britânica em funcionamento há mais de 30 anos, que busca
explorar e questionar a noção de “chinesidade17”. Anteriormente chamada de
Centro de Artes Chinesas18, abriu as portas na Charlotte Street, Chinatown de
Manchester em 1989, com o intuito de fornecer uma plataforma para a
comunidade artística chinesa na cidade, dando continuidade ao festival
Chinese View’86 que acontecera três anos antes.

Em 1996, com a necessidade de ampliar-se e com o intuito de evitar


representações caricatas da cultura e do folclore chinês, a galeria saiu da
Chinatown, buscando uma maior audiência convencional na Edge Street,
bairro de Northern Quarter, escolhido por ser uma vizinhança amplamente
consolidada do ponto de vista turístico e cultural. A galeria permaneceu neste
endereço até 2003 quando recebeu financiamento do Conselho de Artes da
Inglaterra19 para sua expansão, do qual 825 mil libras eram destinadas à
mudança para instalações permanentes (EVANS, 2004).

16 RIBA Award for Design Excellence.


17 Em inglês “chineseness”.
18 Chinese Arts Centre.
19 Em inglês: Arts Council England.

55
As novas instalações do Centro para Arte Contemporânea Chinesa
foram estabelecidas no Edifício Comercial da Thomas Street (Market Buildings)
do antigo Mercado de Peixes no Atacado (Wholesale Fish Market), conjunto de
arquitetura vitoriana tombado grau II20, datados respectivamente de 1877 e
1872, no mesmo bairro de Northern Quarter.

O Edifício Comercial da Thomas Street é uma edificação de uso misto,


sendo o primeiro e o segundo pavimento ocupado por apartamentos – a
conversão dos escritórios em residências ocorreu em 2002 com a construção de
um anexo na fachada posterior -, e nível térreo voltado para estabelecimentos
de serviço. Embora o conjunto arquitetônico (Edifício Comercial e Mercado de
Peixes no Atacado) ocupe uma quadra inteira, o Edifício Comercial em si mede
em média 45x10m - não contabilizando o anexo -; a sede do CFCCA ocupa
metade do nível térreo e parte do subsolo da edificação (figura10). Sua
fachada principal se estende por toda face do lote voltada para Thomas Street
e é simétrica com entrada central marcada por um frontão e tem suas
extremidades chanfradas em 45°, tendo dois andares em tijolos vermelhos
assentados em padrão “Flemish Bond” e térreo revestido em arenito (figura 13).

Figura 12: Situação do Edificio Comercial da Thomas Street e implantação do CFCCA.

Fonte: EVANS, 2004, modificado pela autora, 2019.

20De acordo com a lei de tombamento da Inglaterra e País de Gales (Planning - Listed Buildings
and Conservation Areas - Act 1990) o grau II significa que há um interesse especial arquitetônico
e/ou histórico pelo edifício que lhe garante a preservação.

56
Figura 13: Edificio Comercial visto da esquina da Salmon St. com a Thomas St.

Fonte: Julie Twist Properties, [S.d].

Devido a fachada estar incorporada em um edifício cuja fachada é


tombada, a entrada principal da Galeria foi enfatizada por meio de um recuo
e lhe foi adicionada um painel/portão em aço com o nome da galeria em
caracteres chineses, tirando a fachada da galeria do anonimato e ainda assim
preservando o seu ritmo (figura 14). Esta estratégia permitiu que a rampa de
entrada estivesse dentro da caixa volumétrica do edifício, porém fora da
galeria, além de possibilitar que o subsolo tivesse um acesso independente; vale
salientar que a entrada da esquina foi fechada para melhor controlar o fluxo e
para diminuir os custos com funcionários.
Figura 14: Entrada do CFCCA com o anteparo aberto.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

57
Uma vez dentro da galeria, a presença abundante de luz natural
proveniente da fachada, o pé direito entre 4-5m e o uso de cores claras são
responsáveis por criar uma ambiência moderna no espaço. Em entrevista à
revista The Architect’s Journal (2004), o escritório OMI Architects relatou que os
revestimentos foram escolhidos de modo a evitar o minimalismo encontrado em
muitas galerias de arte contemporânea, fazendo uso de cores, revestimentos e
texturas naturais para avivar as paredes brancas.

No primeiro ambiente, a recepção, o balcão minimalista integrado ao


pilar cumpre o papel de ponto de segurança da administração e da galeria,
contudo, sem inibir a circulação de pessoas. Atrás deste balcão se encontra o
acesso para o mezanino da área adminstrativa, cuja janelas se voltam para a
loja, permitindo uma surpervisão adicional e discreta dos clientes. Para além
das questões de segurança e supervisão, a loja se posiciona próximo da
recepção para também reduzir os custos com funcionários e se utilizar das
aberturas como vitrine visando atrair um público independente.

Figura 15: Setorização da planta baixa do pavimento térreo.

Fonte: EVANS, 2004, modificado pela autora, 2019.

58
Na porção frontal da edificação também se encontra a galeria 02,
posicionada no ambiente chanfrado mais próximo da esquina que possui três
faces envidraçadas – durante a visita, a galeria estava com uma exibição de
audiovisual que se mantinha “ligada” durante a noite, despertando a
curiosidade e atraindo o público mesmo nos horários em que a galeria estava
fechada.

Já a galeria 01, maior e principal salão de exposição do Centro, se


encontra nos fundos do edificio, sendo seu acesso feito por uma circulação
estreita e extensa ao lado da recepção(figura 16). Este espaço de exposição é
por excelência o cubo branco21 do CFCCA e para manter a sua versatilidade e
não poluir visualmente, as instalações de lógica e elétrica foram embutidas no
rodapé. Já a iluminação do espaço foi feita principalmente por paineis de LED
controlados para criar a ambiência de acordo com a exposição, embora
também haja trilhos para a iluminação focal.

Figura 16: (E) Circulação para a Galeria 02; (D) Galeria 02.

Fonte: (E) Acervo da autora, 2019; (D) CFCCA, 2003.

Na circulação que leva a galeria também se encontra o acesso para


o arquivo e para o estúdio de residência artística. O estúdio artístico foi pensado
para estadias curtas e é descrito como uma residência de “bolso”, devido ao
seu tamanho. Assim como o subsolo, este ambiente também conta com um
acesso independente para a rua e, para melhor aproveitar o seu espaço, foi

21O conceito do “Cubo Branco” surgiu para descrever o espaço da galeria moderna, que
geralmente é um cubo de janelas lacradas, pintado de branco, limpo, livre de toda e qualquer
experiência que não a estética.

59
criado um mezanino acima da área molhada (cozinha e banheiro) para o
dormitório.

De volta ao ambiente da recepção e loja se encontra a plataforma


elevatória e a escada que dá acesso ao subsolo. Neste piso se encontra o
centro de educação/conferências da galeria, os banheiros e as áreas técnicas
de armazenamento e manutenção (figura 17). No salão educacional do
subsolo, por abrigar em si diferentes tipos de atividades, a flexibilidade passa a
ser um fator particularmente importante. ara isto, foi adicionado uma partição
acústica sanfonável, permitindo a criação de dois ambientes quando
necessário.
Figura 17: Setorização da planta baixa do subsolo.

Fonte: EVANS, 2004, modificado pela autora, 2019.

Após a análise do projeto percebe-se que o escritório OMI Architects


obtiveram sucesso no diálogo entre a arquitetura contemporânea voltada pra
espaços de exposição e a obra arquitetônica original, distribuindo de maneira
funcional todos os ambientes em 570m², sem descaracterizar o edifício.

60
2.3 PASEO DE LA BRECHA – COLONIA DEL SACRAMENTO, URUGUAI

O projeto do Paseo de La Brecha, desenvolvido pelo escritório argentino


Frazzi Arquitectos, recebeu 10º Prêmio Internacional Dedalo Minosse e o Prêmio
Gubbio America Latina e Caribe de 2017. O projeto propõe a diversificação de
atividades no intuito de valorizar e qualificar o espaço respeitando sua
significância histórica e cultural, e teve como princípio articular o conjunto
arquitetônico e o espaço público através da criação de uma passagem
conectando duas ruas.

A escolha desta referência se deu pelo fato de ser um projeto de reuso


para uma edificação de valor patrimonial e, principalmente, possuir
características de galeria que permite que os usuários atravessem de uma rua
para outra, além de sua solução formal. Salienta-se que, assim como a proposta
desenvolvida, o projeto conta com uma fachada contemporânea e uma
fachada em consonância com o entorno – predominantemente de edificações
históricas.

O Paseo de La Brecha é uma edificação de uso misto, abrigando um


café e oito unidades habitacionais, localizado no Bairro Histórico da cidade de
Colonia del Sacramento no Uruguai, território tombado como Patrimônio da
Humanidade pela UNESCO. O projeto está locado em dois lotes conectados
entre si no formato de “L” com saída para as Rua Virrey Ceballos s/n e Rua
Rivadavia Nº 208. É importante pontuar que embora o projeto esteja locado
em lotes, o estudo de referência centrou-se nas soluções formais desenvolvidas
no lote com fachada para a Rua Virrey Ceballos.
Figura 18: Situação do Paseo de La Brecha.

Fonte: “Paseo de La Brecha”, [S.d.], modificado pela autora, 2019.

61
Devido ao tombamento do traçado urbano do Bairro Histórico, após
diversas reuniões com membros da UNESCO, a proposta recebeu a permissão
de remembramento dos lotes para criar uma unidade no projeto - porém
legalmente se mantém duas unidades. Após esse remembramento, nasceu a
proposta criar um caminho visitável, abrindo um espaço semipúblico dentro do
conjunto privado, com entrada e saída por duas ruas objetivando a criação de
um circuito histórico-museológico (RIOS; TEIXEIRA, 2018).

Por conta das normativas de tombamento da área, nas fachadas devem


priorizado o uso dos cheios aos vazios. Tendo isso em vista,, nas fachadas da
edificação o uso da transparência se limitou aos portões de segurança,
permitindo, mesmo quando fechados, a relação do exterior com o interior.

Figura 19: (E) Fachada da Rua Virrey Ceballos; (D) Fachada da Rua Rivadavia.

Fonte:“Paseo de La Brecha Museum / Frazzi Arquitectos”, 2017.

Buscando convidar o pedestre a adentrar o espaço, junto a fachada da


Rua Virrey Ceballos a circulação foi deslocada para uma das laterais e foi
locado o “Café”, que possui fechamento inclinado. Nesse lote, que abrigava
um galpão com aproximadamente 130 anos, foi restaurada toda a estrutura da
cobertura, com exceção as telhas – que não eram originais do conjunto.
Salienta-se que a abertura presente na cobertura - resultada da falta de
manutenção das telhas, tornou-se um recorte na cobertura proposta, pois os
arquitetos responsáveis pelo projeto entenderam que esta abertura, juntamente
com o pé direito alto do galpão proporcionavam leveza ao espaço.

Numa atitude de conservar a amplitude gerada pela cobertura, foram


utilizados aço (nas estruturas) e vidro (vedação) nos ambientes propostos para
este espaço.

62
Figura 20: Setorização da planta baixa do pavimento térreo.

Fonte:“Paseo de La Brecha Museum / Frazzi Arquitectos”, 2017, modificado pela autora, 2019.

Figura 21: (E) Vista do Café com fechamento inclinado; (D) Passagem semipública e recorte na
cobertura.

Fonte:“Paseo de La Brecha Museum / Frazzi Arquitectos”, 2017.

Por fim, após análise do projeto percebe-se que o escritório Frazzi


Architectos obteve sucesso na continuidade do espaço público no espaço
intra-lote, bem como na criação de um térreo público e ativo com a atividade
do Café e do circuito histórico-museológico.

63
2.4 PLAZA DEL TORICO – TERUEL, ESPANHA

O projeto para a Praça Carlos Castel, popularmente conhecida por Plaza


del Torico (Praça do Torico) foi desenvolvido pelo escritório b720 Fermín Vázquez
Arquitectos, no ano de 2007, e consistiu na renovação da aparência da praça,
seu pavimento, suas sacadas e fachadas através da iluminação do conjunto.
Além disso, projetou-se a recuperação e conversão dos tanques de água
subterrâneos em espaços de exposição.

A escolha desta referência se deu pelo fato de ser uma intervenção no


espaço público urbano de pequena escala em área de valor histórico-
patrimonial com o objetivo de gerar um ponto de encontro para os habitantes
e turistas e melhorar a atratividade; vale lembrar que o projeto proposto neste
trabalho se presta a transbordar o limite da edificação, estendendo-se à rua. É
importante pontuar também que embora o projeto conte com intervenção
arquitetônica, o estudo de referência centrou-se na intervenção urbana.

A Plaza del Torico é uma praça em formato triangular na cidade de Teruel


na Espanha, totaliza uma área de 3.730m² e seu traçado é resultado dos
declives por onde a água da chuva escorria (figura 22). Seu nome popular se
deu pela presença da estátua de um pequeno touro (torico) na fonte existente
no centro da praça.
Figura 22: Situação da Plaza del Torico.

Fonte: BORDAS, 2018, modificado pela autora, 2019.

64
Tendo em vista o entorno com edificações históricas e a função de ponto
de encontro e de conector de espaços que a praça cumpre, o projeto consistiu
em tornar a área em zona exclusiva para pedestre, mudança de pavimentação
(figura 23) e iluminação pontual de algumas edificações, de modo a projetar o
espaço para o futuro e respeitar as particularidades patrimoniais e espaciais da
área.
Figura 23: Vista da Plaza del Torico à noite.

Fonte: b720 Fermín Vázquez Arquitectos, [S.d].

No tratamento do piso, foi adotada a estratégia de incorporar na


pavimentação um sistema de iluminação em tecnologia LED. Os elementos de
iluminação utilizados foram desenhados exclusivamente para o projeto de
modo a suportarem o alto tráfego de pessoas e a corrida de touros – tradicional
na cidade. Quanto às dimensões das peças, estas tem entre 46 ou 77cm de
comprimento por 3,5cm de largura.

No que concerne a diagramação destas peças, na descrição do projeto


contido no livro Espacios Urbanos: Innovacíon y diseño22 (2009), é relatado que
a inspiração deriva do escorrimento natural da água da chuva que se traduz
em vetores de forças, que bifurcam e inflexionam frente a obstáculos. Outro

22 Tradução livre pela autora: Espaços Urbanos: inovação e desenho.

65
ponto a se destacar é que a tecnologia LED permite a mudança de cores da
luz (figura 24), gerando diferentes texturas e composições a depender da
ocasião, sendo o branco adotado em dias usuais.

Figura 24: Vista da iluminação da praça na cor vermelha.

Fonte: GINÉS, [S.d].

Nas edificações do entorno, para não desviar o protagonismo da praça,


foi adicionado uma iluminação horizontal embutida no forro das sacadas,
produzindo uma iluminação difusa. Porém nos edifícios emblemáticos foram
adicionados pontos de iluminação focal de modo a enfatizar suas
características arquitetônicas.

Por fim, após análise do projeto percebe-se que o escritório b720 Fermín
Vázquez Arquitectos obteve sucesso na criação de um espaço público atrativo
em área patrimonial sem redirecionar a atenção das edificações, tampouco
descaracterizar as relações de traçado.

66
2.3. QUADRO SÍNTESE DAS REFERÊNCIAS

Após a análise das quatro referências: Biblioteca das Mulheres de


Glasgow; Centro para Arte Contemporânea Chinesa; Paseo de la Brecha e
Plaza del Torico, foram listados alguns aspectos projetuais que foram
incorporados à intervenção proposta, sendo elas de natureza formal, estética e
funcional, como se observa no quadro 05.

Quadro 05: Quadro resumo das referências arquitetônicas.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

67
3. CONDICIONANTES projetuais
Neste capítulo, será detalhado o processo de análise dos fatores que
junto ao referencial teórico e projetual anteriormente abordado direcionaram
o desenvolvimento da proposta arquitetônica do Centro de Cultura, Memória e
Estudos da Mulher Potiguar e as diretrizes projetuais adotadas. A princípio, se fez
necessário compreender a edificação/terreno e o seu entorno, bem como a
legislação vigente, além das recomendações e restrições normativas
particulares da área devido ao seu caráter histórico patrimonial; em seguida, as
condicionantes físicas e ambientais do terreno; e por fim, o programa de
necessidades e o pré-dimensionamento dos ambientes necessários.

No que se refere ao universo de estudo foi feita uma caracterização da


infraestrutura do bairro, considerando informações gerais do bairro
disponibilizadas pela SEMURB e IBGE. Já para a caracterização do terreno foram
feitas análises morfológicas do espaço considerando um raio de 200 metros
com informações acerca do uso do solo, gabarito e hierarquia viária, as quais
influenciam de modo direto a proposta.

3.1 UNIVERSO DE ESTUDO

A área de intervenção do presente trabalho está localizada no Bairro da


Ribeira, Região Administrativa Leste de Natal, composta também pelos bairros:
Cidade Alta, Petrópolis, Tirol, Lagoa Seca, Alecrim, Rocas, Barro Vermelho,
Santos Reis, Areia Preta, Mãe Luíza e Praia do Meio. A Ribeira foi oficializada
como bairro pela Lei n.º 251 de 30 de setembro de 1947, na administração do
Prefeito Sylvio Piza Pedroza e teve seus limites redefinidos pela Lei n.º 4.330, de
05 de abril de 1993, publicada no Diário Oficial do Estado em 07 de setembro
de 1994 (SEMURB, 2017).
Figura 25: Localização dos lotes de intervenção.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

69
É importante destacar que a Ribeira, embora esteja inserida na Zona
Adensável estabelecida Plano Diretor de Natal (PDN/2007), apresenta uma taxa
de densidade demográfica estimada de 24,04 (habitantes por hectares) e
crescimento estimado de 0,52% no período 2000 - 2016, ambas inferiores aos
mesmos parâmetros estimados para o município (densidade demográfica 52,08
habitantes por hectare e taxa de crescimento municipal: 1,31%) (SEMURB, 2017).

Ainda de acordo com a SEMURB (2017), a Ribeira apresenta uma


população estimada em 2.269 habitantes, sendo em sua maioria mulheres,
proporção verificada também no Nordeste e no Brasil. Vale salientar que a
Ribeira é o segundo bairro menos adensado da Zona Leste, atrás de Santos Reis
(21,73), ainda que seja vizinho do bairro com maior densidade demográfica do
município, as Rocas (156,55).

No que concerne as atividades econômicas presentes no bairro, há


predominância de serviços (57,83%) e comércio (24,78%), o que se deve ao
cenário econômico do período pós-guerra explicado anteriormente neste
trabalho e a atividade do Porto de Natal. Este elevado número de espaços
destinado ao uso de serviços geram um alto fluxo de pessoas para a região no
período diurno, e são eles, em sua maioria, repartições públicas e oficinas de
reparos de automóveis.

No que diz respeito às atividades culturais, a Ribeira é palco de


importantes eventos, como por exemplo “Ribeira Boemia”, “Virada Cultural de
Natal” e “Circuito Cultural Ribeira”, e lar de espaços como o Teatro Alberto
Maranhão, Museu de Cultura Popular Djalma Maranhão, Centro Cultural do Sol,
Casa da Ribeira, entre outros (Figura 26). Vale salientar que a Rua Frei
Miguelinho e a Rua Chile se destacam como ponto de entretenimento e de
espaços destinados a atividade cultural, com a Rua Chile concentrando o
maior número de bares e casas noturnas, atraindo um fluxo elevado de pessoas
para a região.

70
Figura 26: Mapa de atividades culturais na Ribeira.

Fonte: Produzido por Camila Duarte, 2018, modificado pela autora 2019.

Quanto à infraestrutura de saneamento ambiental, o bairro é


considerado uma localidade bem abastecida de serviços e ações. De acordo
com dados divulgados pela Companhia de Águas e Esgoto do Rio Grande do
Norte - CAERN, em 2015 100% dos domicílios da Ribeira apresentava
abastecimento de água pela rede geral do município e esgotamento sanitário;
além de apresentar 100% de drenagem de águas pluviais e área pavimentada,
podendo ser do tipo asfáltico, com cimento, paralelepípedos e pedras,
segundo a Secretaria Municipal de Obras Públicas e Infraestrutura – SEMOV
(SEMURB, 2017).

71
Com relação à infraestrutura de transporte público, o bairro é avaliado
como bem servido, pois muitas linhas de ônibus passam pela Ribeira, que
também dispõe de um terminal rodoviário localizado na Praça Augusto Severo.
Porém, o mesmo não pode ser dito sobre o horário de funcionamento deste
serviço, pois com exceção da linha “33” (Planalto/Ribeira)- conhecida como
“Corujão”, não há oferta de ônibus após as 23:40h; o que acaba por restringir a
vocação cultural e de entretenimento noturno do bairro, uma vez que os
usuários do local somente dispõe de opções de transporte privado após este
horário. O bairro também dispõe de uma estação ferroviária com trens e Veículo
Leve sobre Trilhos – VLT, administrada pela Companhia Brasileira de Transportes
Urbanos – CBTU, que conectam atualmente os municípios de Natal, Ceará
Mirim, Parnamirim e Extremoz. Vale destacar também que no Plano Cicloviário
do Município, no qual são apresentados estudos para a implantação de
ciclovias, ciclofaixas e ciclorotas, a avenida Duque de Caxias, situada na
Ribeira, figura como objeto de intervenção com inclusão de ciclofaixa.

Diante dos dados expostos acima infere-se que o bairro da Ribeira


apresenta uma infraestrutura consolidada, porém ao visitar o bairro é possível
constatar insuficiência da manutenção da mesma e dos serviços básicos, tais
como segurança, iluminação e limpeza pública, comprometendo a qualidade
de vida dos habitantes, usuários, comerciantes e proprietários do local. Nota-se
também uma deficiência quanto ao mobiliário urbano, paradas de ônibus
depredadas ou inexistentes, falta de manutenção das praças e seus
equipamentos; deficiência na pavimentação das ruas e pouca ou nenhuma
acessibilidade nas calçadas.

Por fim, com base nas informações apresentadas, percebe-se que ao


passo que a Ribeira se apresenta como uma região ideal para instalação de
equipamentos culturais, o atual estado de conservação dos seus edifícios e a
manutenção do seu espaço público, segundo os conceitos de “Espaço
defensável” e “CPTED” explicados no capítulo 01 contribuem para a sensação
de insegurança na região; que somado ao esvaziamento do bairro nos horários
não comerciais, caracterizam um obstáculo à presença feminina.

72
3.2. LOTES DE INTERVENÇÃO

Como já mencionado, para o desenvolvimento do projeto foram


escolhidas duas edificações/lotes conectados fundo-fundo entre si, resultando
numa área aproximada de 841,24 m². Uma entrada situada na Rua Frei
Miguelinho n° 98 e outra na Rua Chile n° 95, como pode ser observado na Figura
27 e 28.

A partir deste momento do texto, será adotado o termo lote para as


edificações escolhidas, tendo em vista que ambas tiveram o seu interior
demolido, restando somente as fachadas e fragmentos de edificação no fundo
do lote da Rua Chile e na porção frontal do lote da Rua Frei Miguelinho. Sobre
o lote com acesso para a Rua Frei Miguelinho não foi encontrada nenhuma
informação histórica sobre a edificação, porém sabe-se que por muitos anos
funcionou como estacionamento privado, sucata – ambos usos comuns nessa
região do bairro-, posteriormente foi alugado pelo grupo de Quadrilha Junina
Coração Matuto do bairro de Mãe Luiza para a realização de ensaios e
atualmente encontra-se desocupado e sob a responsabilidade de uma
imobiliária. Por conta disto, não foi possível adentrar o lote, mas por imagens de
satélite é possível identificar que junto a fachada há uma cobertura com
aproximadamente 5 metros de extensão. A sua fachada, embora ainda
preserve os frisos provavelmente originais, encontra-se descaracterizada por
portões metálicos de rolo e não possui características arquitetônicas históricas
e/ou estilísticas a serem preservadas (figura 27).

Figura 27: Fachada Rua Frei Miguelinho.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

73
Assim como o lote da Rua Frei Miguelinho, não foram encontradas
informações históricas sobre a edificação n° 95 da Rua Chile tampouco histórico
de usos do espaço. Por imagens de satélite, no entanto, é possível identificar a
existência da cobertura no fundo do lote com aproximadamente 9 metros de
extensão, porém, como novamente não foi possível adentrar o lote e averiguar
o estado de conservação desta estrutura, ela não será mantida na proposta. A
sua fachada (figura 28), ainda que modificada pela adição de um portão de
rolo, preserva característica estilísticas da arquitetura neocolonial, por isso, será
preservada.

Figura 28: Fachada da Rua Chile.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

A escolha destes lotes se deu pelo desejo de projetar uma edificação


com característica de galeria que permitisse que os usuários atravessassem da
Rua Frei Miguelinho para a Rua Chile, articulando os usos e os públicos dos
espaços culturais existentes nestas ruas. Vale destacar que estas duas ruas
concentram o maior número de espaços de cultura do bairro (Figura 26). A
atitude de encurtar a quadra, segundo Jacobs (2000) propicia uma maior
sensação de segurança, como explicado no primeiro capítulo, ponto positivo
na criação de espaços sob a perspectiva de gênero.

74
Outro aspecto considerado na seleção foi a localização próxima a
estação ferroviária e de ônibus, a exemplo da Biblioteca das mulheres de
Glasgow, e da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher – DEAM na
Rua Frei Miguelinho, como destacado na Figura 26. Pretendeu-se com esta
decisão criar uma rede de referência de serviços de apoio ofertados às
mulheres, presumindo uma atuação integrada, embora independente entre a
DEAM e o Centro de Cultura, Memória e Estudos da Mulher Potiguar.

Quanto à observação da área de influência direta, delimitada por um


raio de 200 metros como dito anteriormente, nota-se a predominância de
imóveis desocupados e estabelecimentos de serviço (figura 29), o que contribui
para o esvaziamento das ruas, principalmente fora do horário comercial.
Lembrando que esta característica junto à iluminação precária, são os agentes
limitadores do espaço urbanos pelas mulheres citados com maior frequência.
Figura 29: Mapa de uso do solo do entorno imediato ao terreno.

Fonte: SEMURB, 2007, modificado pela autora, 2019.

75
Observando a Figura 30, constata-se ainda que a maioria desses edifícios
possuem gabarito entre quatro e oito metros, o que se deve na maior parte dos
casos pela altura da platibanda; seguido de edificações com altura entre 8 a
12 metros. Ressalta que próximo aos lotes de intervenção na porção voltada
para Rua Chile há uma concentração do gabarito 8-12m.

Figura 30: Mapa de gabarito do entorno imediato ao terreno.

Fonte: SEMURB, 2007, modificado pela autora, 2019

Por fim, um outro aspecto importante observado foi a estrutura viária.


Quanto a hierarquia viária, as ruas de acesso aos lotes, Rua Frei Miguelinho e
Rua Chile são classificadas como vias locais (Figura 31), havendo nesta última
presença elevada de automóveis de médio/grande porte durante o horário

76
comercial devido à atividade pesqueira. Nas proximidades, contudo, observa-
se a existência de via arterial (Av. Duque de Caxias) que conta com largura
maior, incluindo canteiro central, e é responsável por conectar o bairro no eixo
norte-sul; e uma via coletora (Av.Tavares de Lira ) com duas faixas de rolamento
e calçadas largas, que proporcionam a mobilidade para outras áreas da
cidade no eixo leste-oeste.

Figura 31: Mapa de gabarito do entorno imediato ao terreno

Fonte: SEMURB, 2007, modificado pela autora, 2019.

77
3.3 CONDICIONANTES LEGAIS

No que diz respeito aos aspectos legais, utilizaram-se das várias


legislações que se sobrepõem no local e os instrumentos de ordenamento
urbano para compreender as recomendações e restrições particulares da área.
Para além disso, utilizou-se o Plano Diretor de Natal (Lei complementar n° 082,
de 21 de junho de 2007) e o Código de Obras de Natal (Lei complementar no
055, de 27 de janeiro de 2004); e considerando o caráter público da edificação,
consultaram-se às normas de acessibilidade (NBR 9050-2015) e o Código de
Segurança e Preservação Contra Incêndio e Pânico do Estado do Rio Grande
do Norte de 2017.

3.3.1 Legislação e Tombamento

A legislação incidente e os debates legais do bairro da Ribeira são


fundamentais para a compreensão da dinâmica e da estrutura urbana da
região, sendo peça chave no desenvolvimento da proposta sob a perspectiva
de gênero, já que esta pressupõe uma relação do edifício com o entorno.

A revisão do Plano Diretor de 1984 do município de Natal (Lei N°


3.175/1984), institui o macrozoneamento da cidade, e com ele as zonas de
proteção da área portuária e do sítio histórico. Posteriormente na década de
1990, derivaram-se dessas iniciativas as leis específicas para a Zona Especial de
Preservação Histórica - ZEPH (Lei N° 3.942/1990) e a Zona Especial Portuária – ZEP
(Lei N° 4.069/1992). Essas medidas visavam a proteção da ambiência e
permanência do conjunto urbano histórico e sua área de entorno, por meio de
prescrições urbanísticas específicas, uma vez que o bairro da Ribeira havia sido
instituído pelo Plano Diretor como Zona Adensável, o que possibilitava maiores
Coeficientes de Aproveitamento, incentivando a verticalização.

Para tanto através da ZEPH, foram definidas duas subzonas conformes ao


uso comercial e de serviço, Figura 32, sendo a SZ-4, onde está localizada a
proposta desenvolvida neste trabalho, com restrição de gabarito de 7,50m e a
SZ-3 com 12m; e buscando estimular a ocupação dessa zona, foram dispostos
maiores índices de utilização do solo e taxa de ocupação para o uso comercial,
de serviço e pesca. Estas prescrições foram continuadas pela ZEP, que também
conta com restrição de gabarito de até 7,50m.

78
Figura 32: Indicação dos limites da SZ-3 e SZ-4 da ZEPH (1990).

Fonte: NATAL, 1990, modificado pela autora, 2019.

Em 1994, após revisão do Plano Diretor (Lei Complementar 07/1994), veio


a primeira Lei de Operação Urbana Ribeira - OUR (Lei N° 4.932/1997) que visava
a ocupação e recuperação da área através da isenção e redução de tributos
municipais, estimular as atividades artísticas, culturais, turísticas e de lazer. Vale
salientar que esta proposta foi reeditada em 2007 (Lei Complementar
n°79/2007), com alterações que contemplaram mudança nos índices
construtivos e incentivos fiscais oferecidos, estendendo-se à Operação Urbana
Consorciada Centro Histórico de Natal – OUC.

Durante os anos 2000, um novo projeto para a área foi anunciado, o


Projeto Ribeira: Reabilitação Urbana, conjuntamente com a aprovação da Lei
de Tombamento Municipal (Lei N° 5.191/2000). É importante destacar que no
fim da mesma década, numa demonstração de esforço em reabilitar a área e
ausência de integração no planejamento, dois trabalhos foram desenvolvidos
simultaneamente, o Programa ReHabitar em Natal (2007) e o Plano de
Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC-RIBEIRA 2008); ambos os
projetos consistiam em diagnóstico da área e buscavam o incentivo à
realização de múltiplas atividades, sendo a habitação a principal delas.

79
Um outro acontecimento importante no bairro da Ribeira foi o
tombamento do conjunto arquitetônico, urbanístico e paisagístico da cidade
de Natal pelo IPHAN em 2010 (Figura 33), através de normativa específica que
impede a descaracterização dos edifícios por reformas e impõe maior rigor aos
projetos. Porém, percebe-se que a poligonal de tombamento traçada na
Ribeira contempla apenas o traçado urbano, uma vez que não há publicação
de diretrizes que determinem a forma de intervenção no edificado, não
havendo assim, clareza no tipo de postura a ser adotada nesta área especial.

Figura 33: Delimitação do tombamento do Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e


Paisagístico do Município de Natal/RN.

Fonte: IPHAN apud OLIVEIRA, 2016, p.131, modificado pela autora, 2019.

3.3.2 Plano Diretor

O Plano Diretor da Cidade do Natal é o instrumento básico da política de


desenvolvimento urbano sustentável do Município, o qual contém instruções
relacionadas à Política Urbana, Uso e Ocupação do Solo, Sistema de Áreas
Verdes e Arborização Urbana, Política de Mobilidade Urbana, Instrumentos para
a Gestão Urbana, e Sistema de Planejamento e Gestão Urbana do Município.

Como já mencionado, a proposta arquitetônica está localizada no bairro


da Ribeira, classificado como Zona Adensável de Natal, porém , pelo fato de
haver diversas outras normativas se sobrepõem a região, como foi descrito no

80
tópico acima, serão adotadas as prescrições urbanísticas da Operação Urbana
Ribeira (Lei Complementar n°79/2007), por serem as mais recentes – embora
vencidas em 2013, uma vez que a Área de Recuperação Histórica (RH) disposta
neste documento cobre a ZEPH e traz atualizações dos parâmetros
estabelecidos pela Lei N° 3.942/1990 – ZEPH, sendo eles: Coeficiente de
Aproveitamento de 1,2 do terreno, o que dá a possibilidade de construção de
1010,95 m² no terreno de estudo; Gabarito Máximo de 7,5m; Taxa de Ocupação
máxima de 80%; Taxa de Permeabilidade de 20% do lote, além das
especificações de recuo – todas essas prescrições estão resumidas no quadro
06.
Quadro 06: Prescrições urbanísticas adotadas

Fonte: NATAL, 2007, modificado pela autora, 2019.

3.3.3 Código de Obras

O Código de Obras, Lei complementar nº055, de 27 de janeiro de 2004,


dispõe de normas para a execução de projetos, considerando aspectos
técnicos, formais e estruturais, assim como medidas administrativas.

Deste documento, considerou-se principalmente as especificações


referente a calçadas, insolação, iluminação e ventilação, além da
classificação das vias, descrita na análise do terreno, as quais foram
classificadas como vias locais.

Vale salientar que se utilizou ainda da Lei Complementar n°79/2007 –


OUR, para a dispensa do estacionamento e para as disposições quanto a
acessibilidade, utilizou-se da NBR 9050/2015.

81
Sobre as calçadas, no Código de Obras têm-se:

Art. 126 - Toda calçada deve possuir faixa de, no mínimo,


um metro e vinte centímetros (1,20m) de largura, para a
circulação de pedestres - passeio - com piso contínuo sem
ressaltes ou depressões, antiderrapante, tátil, indicando limites e
barreiras físicas. (NATAL, 2004, p. 212)

Quanto aos aspectos de insolação, iluminação e ventilação, têm-se:

Art. 147 - Toda edificação deve ser projetada com a


observância e orientação dos pontos cardeais, atendendo,
sempre que possível, aos critérios mais favoráveis de ventilação,
insolação e iluminação.

Art. 148 - Para efeito de insolação, iluminação e


ventilação, todos os compartimentos da edificação devem
dispor de abertura direta para logradouro, pátio ou recuo.

Art. 150 - A superfície da abertura voltada para o exterior,


destinada à insolação, iluminação e ventilação, não pode ser
inferior a um sexto (1/6) da área do compartimento, quando se
tratar de ambientes de uso prolongado. Parágrafo único. A área
definida no caput é de um oitavo (1/8), quando se tratar de
ambientes de uso transitório.

Art. 151 -. São dispensados de iluminação e ventilação


direta e natural os ambientes que se destinam a: I – corredores e
halls de área inferior a cinco metros quadrados (5,00m2 ); II –
compartimentos que pela sua utilização justifiquem a ausência
dos mesmos, conforme legislação própria, mas que disponham
de iluminação e ventilação artificiais; III – depósitos de utensílios
e despensa.

Art. 154 - Na edificação que tenha no máximo dois (2)


pavimentos, os compartimentos de uso prolongado ou
transitório, que não possam ser insolados, iluminados e ventilados
por aberturas diretas para os logradouros ou imóveis vizinhos,
podem utilizar-se de pátios e reentrâncias, desde que: I – o seu
desenho permita a inscrição de um círculo de diâmetro de dois
metros (2,00m); II – estejam a céu aberto, livre e desembaraçado
de qualquer elemento construtivo. (NATAL, 2004, p. 215)

3.3.4 NBR 9050/2015 e Código de segurança e prevenção contra


incêndio e pânico do estado do Rio Grande do Norte

A Norma Brasileira (NBR) nº 9050 de 2015, trata acerca da acessibilidade


em edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Tendo em vista
que a perspectiva de gênero se rebate arquitetonicamente em ambientes mais
acessíveis e democráticos, a NBR 9050 se fez presente em todas decisões
projetuais. Assim, objetivando garantir a autonomia para os usuários com
diferentes condições de mobilidade, utilizou-se das prescrições da NBR nos
sanitários, circulações horizontais e verticais, acessos e mobiliário.

82
Utilizou-se também da Lei Complementar Nº 601 DE 07/08/2017 a qual
estabelece o Código de Segurança e Preservação Contra Incêndio e Pânico
do RN, cujas exigências buscam garantir os meios necessários para combater
incêndios, evitar ou minimizar a propagação do fogo, facilitar as ações de
socorro e promover a evacuação segura dos ocupantes das edificações.
Juntamente com a Instrução Técnica (IT) nº 11/2018 do Corpo de Bombeiros
Militar do Rio Grande do Norte, que institui o dimensionamento das saídas de
emergência.

Primeiramente, classificou a proposta quanto ao seu uso, enquadrando-


se na classificação de “Reunião Pública”, atendendo as exigências de
dispositivos de proteção contra incêndio, de acordo com a área construída e
altura da edificação.

Desta maneira, devido a proposta se enquadrar na classificação de


estabelecimento com altura entre seis e quinze metros e área construída
superior a 750 m², se fazem necessários os seguintes aspectos: prevenção fixa
(hidrantes); prevenção móvel (extintores de incêndio); chuveiros automáticos
(sprinkler) nas circulações e área comuns; iluminação de emergência;
sinalização; escada convencional; e hidrante público.

3.4. CONDICIONANTES BIOCLIMÁTICAS

Com o propósito de encontrar soluções ambientais adequadas ao


contexto onde se desenvolve a proposta, realizou-se uma análise das
condicionantes de ventilação e insolação do terreno, considerando que Natal
está inserida na Zona Bioclimática 8, marcado pelo clima quente e úmido,
conforme divisão da NBR 15220-3/2003 (Figura 34).

83
Figura 34: Zona Climática 8.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

No tocante a trajetória do sol, ao sobrepor a carta solar de Natal nos lotes


de intervenção, nota-se que as maiores fachadas não têm incidência direta do
sol na maior parte do ano, sendo as porções nordeste e sudoeste as que
necessitam de maior proteção no período da manhã e da tarde
respectivamente. As edificações do entorno do terreno não têm impacto sobre
ele no que concerne a sua isolação.

Em relação à ventilação, ao sobrepor o gráfico rosas dos ventos,


percebe-se que embora haja maior frequência de ventos no sentido leste –
oeste, os ventos com maior intensidade ocorrem no sentido sudeste – noroeste,
orientação que corresponde com as maiores faces do lote.

84
Figura 35: (D) Carta solar sobre o lote de intervenção; (E) Rosa dos ventos sobre o terreno de
intervenção.

Fonte: Google Earth, S.d] e ProjetEEE, [S.d.], modificado pela autora, 2019.

3.5. PROGRAMA DE NECESSIDADES E PRÉ-DIMENSIONAMENTO

A definição do programa de necessidade, para o projeto de Centro de


Cultura, Memória e Pesquisa da Mulher, foi desenvolvido a partir das
considerações conceituais e dos estudos de referência exploradas
respectivamente nos capítulos 01 e 02. Enquanto o pré-dimensionamento foi
formulado pela combinação das edificações estudadas. Contudo, é
importante destacar que o processo de distribuição deste programa foi feito de
modo a se encaixar no terreno, haja vista a sua conformação – lote estreito e
comprido.

Inicialmente foram definidos dois usos âncoras que buscassem suprir os


verbos de informar, discutir e criar, sendo eles os espaços de galeria e biblioteca;
em seguida foram definidos os ambientes secundários a estes espaços e
acrescido o espaço de café e livraria, visando a atender a demanda
relacionada a movimentação econômica. Com base nisso, o programa
elaborado foi subdividido em seis setores: setor rosa (galeria); setor roxo
(biblioteca); setor verde (administração); setor amarelo (apoio/serviço); e setor
laranja (circulações) (Quadro 07).

85
Quadro 07: Programa de necessidade e pré-dimensionamento

Fonte: Acervo da autora, 2019.

86
4. proposta projetual
Neste capítulo serão explicados os caminhos e as decisões projetuais
tomadas no desenvolvimento da proposta arquitetônica, as quais tiveram
como base as discussões e conteúdo explorados ao longo do trabalho.
Inicialmente, serão descritos os primeiros passos do processo de concepção
arquitetônica, sendo eles: definição de conceito e partido, processo evolutivo
formal e zoneamento; em seguida serão descritas as soluções finais do projeto.

4.1 CONCEITO E PARTIDO

Para a definição do conceito, ideia/palavra-chave norteadora do


processo projetual que geralmente é de natureza abstrata, realizou-se uma
tempestade de ideias23. Primeiramente surgiram ideias relacionadas aos anseios
pretendidos para com o edifício, tais como: contar a história vista sob a
perspectiva da mulher – herstory – e resgatar/compartilhar as histórias das
mulheres potiguares protagonistas de seu tempo. Neste momento ainda,
surgiram palavras relacionadas aos aspectos formais, como por exemplo:
permeabilidade, boa iluminação, fluidez, espaço convidativo, entre outros.

Sendo assim, adotou-se o conceito “Luz” com o significado de gerar


conhecimento – luz -, trazer luz às mulheres esquecidas e projetar o espaço sob
à luz de gênero. Esta palavra-chave se rebateu no projeto – partido – no uso do
vidro que permite a entrada de luz natural nos ambientes, na adoção de
cobertura em duas alturas com recortes, aliada com pé direito alto; circulações
amplas e instalação de LEDs no revestimento do piso, como visto na referência
projetual da Plaza del Torico - esta pavimentação transborda da edificação
para a rua, criando um corredor iluminado.

A espacialização do conceito e do partido, assim como a evolução da


proposta serão descritas nos próximos itens.

23Em inglês: Brainstorm. Esta atividade consiste em sugerir qualquer pensamento ou ideia que vier
à mente a respeito do tema tratado.

88
Figura 36: Tempestade de ideias que resultaram no conceito.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

4.2 ESTUDOS PRELIMINARES

4.2.1 Evolução do projeto

A partir do programa de necessidades apresentado anteriormente, fez-


se um fluxograma inicial com base no item 1.2.1 (Centros de cultura: princípios
e diretrizes) e nos estudos de referência projetuais, objetivando criar noções de
hierarquia entre os ambientes, fluxos e conexões (Figura 37).
Figura 37: Fluxograma

Fonte: Acervo da autora, 2019.

No tocante a espacialização desses ambientes, tendo como base as


discussões sobre perspectiva de gênero no espaço, exploradas nos itens 1.1.1 e
1.1.2 (Características ambientais do espaço público e Arquitetura pensada para
mulher), e percebendo que a maior parte da bibliografia e diretrizes de
intervenção encontradas se debruçaram sobre as particularidades da mulher
no espaço público urbano, a intervenção arquitetônica buscou, primeiramente,

89
fazer com que o espaço público adentrasse o privado, criando um espaço
semipúblico ou semiprivado, de modo que permitisse que as recomendações
com base de gênero pudessem ser aplicados na escala do arquitetônico. Isto
se espacializou na proposta por meio da abertura de uma passagem ampla
entre a Rua Frei Miguelinho e a Rua Chile.

Figura 38: Esquema da circulação que cruza os lotes de intervenção.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Para a criação desta circulação foi necessário a demolição do muro


posterior que separa os dois lotes. Somando a isto, por não saber o estado de
conservação, as coberturas presentes no fundo do lote da Rua Chile e na
fachada da Rua Frei Miguelinho também foram demolidas (Figura 39).

Figura 39: Esquema das remoções das coberturas existentes.

Fonte: Google Earth, [S.d.], modificado pela autora, 2019

90
A princípio, imaginou-se a distribuição do programa em três blocos,
sendo eles: setor de galeria e administração no térreo, setor de biblioteca e
pesquisa no 1° pavimento elevado e com mezanino e setor de serviços e apoio
também no térreo. Durante o processo projetual a forma destes blocos foram as
que mais sofreram modificações, se adequando a novas distribuições dos
ambientes com o progresso dos estudos.

A forma destes blocos deriva de um losango com subtrações. No primeiro


estudo volumétrico, as subtrações eram anguladas e com projeções em
balanço no 1° pavimento (Figura 40); com o desenvolvimento do projeto as
paredes foram ficando mais ortogonais para aproveitar melhor o espaço,
considerando que os lotes de intervenção são bastante estreitos em relação ao
seu comprimento (aproximadamente 11x72m) e que a circulação, espaço
chave no projeto, precisava ser ampla.

Figura 40: Primeiro estudo de planta baixa.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

91
Quanto ao zoneamento, agrupou-se os setores de galeria e
administração no mesmo bloco que foi locado próximo à fachada da Rua Frei
Miguelinho. O setor da biblioteca foi locado em cima do bloco da galeria e
administração, porém mais próximo ao centro do terreno, já que contava com
um mezanino e por ter gabarito mais alto que o entorno poderia influenciar na
leitura do edifício; o seu acesso se dava por uma escada locada no hall de
recepção interno no bloco da galeria. Já o bloco de serviços e apoio estava
locado na porção mais próxima a fachada da Rua Chile - fachada voltada
para o sol poente -, porém na outra face do terreno e descolado dos blocos de
galeria e biblioteca, criando um hall central, vale salientar que com o
desenvolver da proposta a laje deste bloco se estendeu até a fachada criando
um mirante para Rua Chile (Figura 41).

Figura 41: Segundo estudo de planta baixa.

Fonte: Acervo da autora, 2019

92
Estas ideias foram levadas para a pré-banca e constatou-se que a
concentração das atividades administrativas na porção frontal do lote próximo
à Rua Frei Miguelinho e a independência desse bloco em relação ao bloco de
serviços e apoio gerava uma falta de atratividade no espaço central do lote e
uma sensação de fundo de lote na porção da Rua Chile. Isto posto, foram
realizados novos arranjos na planta baixa (Figura 42), trabalhado aspectos de
qualidade do espaço, principalmente das circulações, e aperfeiçoamento da
forma para alcançar a perspectiva de gênero pretendida e os aspectos
estéticos funcionais desejados, que será explorada nos próximos itens.

Figura 42: Proposta após as considerações da pré-banca.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Na etapa final do processo projetual, modificou-se ainda a locação da


escada para torná-la mais visível, ajustando também o mobiliário fixo presente
na circulação principal e os jardins; além do mais foi substituído a estrutura da
cobertura de treliças metálicas por pórticos metálicos, criando uma visual
menos poluída. Após estas modificações, chegou-se ao produto final (Figura
43), aonde nota-se que a locação dos blocos permaneceu a mesma desde o
princípio, no entanto, a distribuição dos seus ambientes mudou. A administração

93
e circulações verticais foram locadas para o centro do lote; foi adicionado um
café e uma livraria no bloco de serviços e apoio; abriu-se mão do mezanino na
biblioteca, afim de diminuir o impacto visual no entorno; externalizou dos blocos
a circulações verticais (escada e plataforma elevatória); e criou uma conexão
entre o mirante e a biblioteca através de uma passarela.

Figura 43: Proposta Final

Fonte: Acervo da autora, 2019.

É possível notar que a evolução da proposta se deu mais no campo da


distribuição dos ambientes e nas relações entre eles. Nota-se também que
aspectos formais como locação dos blocos, cobertura em duas águas e
circulações amplas mantiveram-se como o almejado desde o início da
concepção arquitetônica.

94
Figura 44: Esquema da evolução volumétrica da proposta.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Figura 45: Zoneamento da proposta final

Fonte: Acervo da autora, 2019.

4.2. MEMORIAL DESCRITIVO

Visto a discussão da proposta e suas etapas iniciais, nos próximos itens


serão descritas as soluções finais adotadas no centro de cultura, memória e
pesquisa da mulher potiguar (implantação, sistema construtivo, soluções de
conforto etc.), a fim de complementar o material presente nas pranchas anexas
a este trabalho e contribuindo para o entendimento do projeto.

95
4.2.1 Implantação e Prescrições Urbanísticas

Para que os lotes de intervenção se tornassem viáveis para abrigar o uso


projetado, primeiramente, propôs-se a demolição das porções de coberturas
existentes no fundo do lote da Rua Chile e na porção frontal da Rua Frei
Miguelinho, a qual também teve sua fachada demolida por entender que ela
não possui características arquitetônicas históricas e/ou estilísticas a serem
preservadas. Como serviço preliminar, o projeto também requer uma
terraplanagem com rebaixamento do terreno para a cota zero, as mesmas das
ruas.

Como mencionado anteriormente no texto, o projeto foi concebido com


a existência de dois acessos de entrada, abrindo uma circulação (corredor) que
conecta a Rua Frei Miguelinho a Rua Chile. Esta circulação possui em média três
metros de largura, havendo pontos mais largo e outros levemente mais estreitos,
o que se deve ao desejo de criar a sensação de espaço público dentro do lote
para poder aplicar as diretrizes sobre perspectiva de gênero estudadas.

Figura 46: Planta baixa esquemática do Térreo e 1° Pavimento com os principais fluxos.

Fonte: Acervo da autora, 2019

96
Na fachada da Rua Frei Miguelinho o bloco inserido foi locado rente aos
limites atuais do edifício, objetivando preservar o alinhamento da fachada
existente e do conjunto do entorno. Já na fachada da Rua Chile o novo bloco
se insere deslocado 4,15m da fachada preservada.

Figura 47: Perspectiva e Planta baixa esquemática dos blocos adicionados nos lotes de
intervenção.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

97
Quanto ao gabarito da edificação, embora a ZEPH (Lei N° 3.942/1990)
estabeleça um limite máximo de 7,5m, ao se analisar o entorno percebe-se a
predominância de edificações com oito metros ou mais; considerando ainda
que as normativas do IPHAN não determinam diretrizes de intervenção no
edificado, cabendo a análise individual do projeto, decidiu-se adotar na
fachada da Rua Frei Miguelinho o mesmo gabarito da fachada da Rua Chile, e
no centro do lote um gabarito mais alto, mas que ainda assim respeita o entorno
e não interfere na paisagem.

Além do gabarito, quanto às outras prescrições urbanísticas têm-se:

Quadro 08: Prescrições urbanísticas da proposta

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Vale salientar que para a obtenção da taxa de permeabilidade igual ao


exigido pelo Plano Diretor (PDN, 2007), foi utilizado de piso drenante nas
circulações externas aos blocos que não são cobertas.

4.2.2 Soluções Funcionais e Justificativas

O zoneamento do edifício foi feito de modo a convidar o público a


adentrar o espaço.

Na Figura 48, é possível notar que o pavimento térreo é dividido em dois


blocos independentes, como havia sido discutido acima. No bloco próximo a
fachada da Rua Frei Miguelinho, se encontra o primeiro espaço de exposição,
galeria 01, batizada de Galeria Clara Camarão, que possui fechamento em
vidro - permite a iluminação natural - e atua como uma vitrine, divulgando as
atividades que ocorrem no interior do edifício e convidando o público a
conhecê-lo. O acesso a este espaço se dá através da recepção e para chegar
até ele passa-se pela loja de souvenir; a divisão entre a galeria 01 e a loja de
souvenirs é feita pelo layout do mobiliário, tendo em vista a necessidade de
flexibilidade deste espaço.

98
Figura 48: Planta baixa esquemática do Térreo e 1° Pavimento.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Pela recepção que dá acesso a galeria 01 e a loja de souvenir, também


se tem acesso a galeria 02, o cubo branco da galeria por excelência. Este
espaço possui três acessos, sendo dois deles voltados para a circulação externa
ao bloco e seria utilizada em exposições que não precisam de controle de
público, enquanto a outra porta – voltada para a recepção - seria utilizado nas
exposições onde é essencial ter o controle daqueles que entram e saem do
espaço.
Figura 49: Setor de galeria.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

99
Na galeria 02 encontra-se ainda o acesso às salas de restauro e sala de
reserva técnica, lembrando que a proposta no centro cultural não inclui espaço
para reserva de acervo próprio, logo estas salas cumprem a função de abrigar
materiais de apoio e acervo temporariamente.

Os ambientes descritos cumprem a função de espaço de “informar”, de


acordo com a classificação vista no primeiro capítulo deste trabalho.

Na porção mais central do lote se encontra o setor administrativo, que


reúne os ambientes de administração em volta do espaço de convívio dos
funcionários - a copa. Nesta porção também se encontram as circulações
verticais - escada e plataforma elevatória - que dão acesso ao mirante e a
biblioteca.
Figura 50: Setor de administração e apoio

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Oposto ao bloco de administração se encontra o bloco de serviço e


apoio, no qual estão concentrados os espaços de banheiros e fraldário e conta
com espaços que promovem a circulação de capital econômico no centro
cultural – a livraria, denominada Livraria Auta de Souza, com face voltada para
a circulação principal e a cafeteria, Cafeteria Celina Guimarães, voltada para
a Rua Chile. A livraria foi locada de modo a fornecer “olhos” para a circulação,
enquanto a cafeteria para convidar os transeuntes da Rua Chile a adentrar o
centro.

100
O espaço formado pela distância entre estes dois blocos (administração
e apoio) cumpre a função de espaço multiuso de convívio, podendo ser
utilizado para feira de artesanato, exposições temporárias, mostra de filmes,
entre outras atividades. Este ambiente se enquadra como espaço de “discutir”
do centro cultural.

Já no primeiro pavimento elevado, ao subir a escada se depara com o


espaço de convívio e interação em grupo. Esse ambiente foi pensado para o
desenvolvimento de atividades em grupo que por conta do ruído ou o uso de
materiais não podem ser desenvolvidos dentro da biblioteca, assim como para
o lazer; a criação desse ambiente se deu ao presenciar na visita à Biblioteca
das Mulheres de Glasgow uma reunião de coletivo feminista para a confecção
de cartazes. Além do espaço de convívio, há o mirante que aproveita a
abertura existente na fachada para “olhar” para Rua Chile. Esses espaços se
conectam com a biblioteca por meio de uma passarela.

Figura 51: Mirante e espaço de convivência

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Na biblioteca, que recebeu o nome de Nísia Floresta, os ambientes mais


ruidosos, como a sala de reunião e o setor administrativo, foram locados mais
próximos da saída. Um pouco mais à frente se encontra o balcão de devolução

101
e empréstimo e os armários guarda volume, neste ponto, há um estreitamento
da circulação, tendo em vista a instalação do sensor antifurto.

A biblioteca tem seu fechamento em vidro, sendo a parte inferior em


vidro jateado, para evitar eventos de upskirting, mas ainda assim permitir a
criação de olhos para quem transita pelas circulações. Na porção mais próxima
da fachada da Rua Frei Miguelinho, o usuário da biblioteca tem uma visão da
loja de souvenir e da galeria 01, devido ao pé direito duplo destes espaços.

Figura 52: Setor de biblioteca

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Figura 53: Perspectiva do interior da biblioteca

Fonte: Acervo da autora, 2019.

102
4.2.3 Acessibilidade

Com o objetivo de proporcionar a utilização do edifício e seus


equipamentos de maneira autônoma ao maior número de pessoas, afinal a
perspectiva de gênero tem como base a acessibilidade universal, apresenta-se
a seguir alguns elementos complementares, de acordo com a NBR 9050/2015,
que junto ao projeto arquitetônico proporcionam maior acessibilidade do
espaço.

Para além da instalação da plataforma elevatória e dos banheiros


acessíveis, o projeto contou com a sinalização tátil de alerta no piso instalada
perpendicularmente ao sentido de deslocamento nas situações de início e
término de escada, com largura de 0,25m, no máximo do ponto onde ocorre a
mudança do plano. Foi instalado também junto as portas da plataforma com
largura de 0,25 m, seguindo as recomendações ilustradas abaixo.

Figura 54: Instalação de piso tátil em escadas e plataformas e elevadores.

Fonte: Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2015.

Os corrimãos das escadas foram projetados em perfil tubular de Ø1¹/2” e


instalado a 0,92 m do piso, medido da geratriz superior. Instalados em ambos os
lados da escada com um espaço livre de no mínimo 4,0 cm entre a parede e o
corrimão, prolongou-se 30 cm antes do início e após o término da escada, sem
interferir com áreas de circulação ou prejudicar a vazão.

Os guardas- corpos foram projetados em perfis de inox e placas opacas


de acrílico para evitar o fenômeno de upskirting.

103
4.2.4 Soluções quanto à Perspectiva de Gênero

A partir das discussões sobre as particularidades da vivência feminina no


espaço público feitas anteriormente neste trabalho, algumas soluções
projetuais foram adotadas visando incluir a perspectiva de gênero na proposta.
Tais soluções podem ser conferidas no quadro 09.

Quadro 09: Decisões projetuais voltadas para a criação de espaços à luz de gênero.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Entendendo que a sensação de insegurança é o maior limitador do uso


do espaço público pelas mulheres, na circulação principal - espaço
semipúblico criado -, buscou-se reproduzir o cenário ideal contido no livro
“Recomendações de projetos e gestão comunitária para a obtenção de
espaços urbanos seguros” (2004).

104
Figura 55: Comparativo entre o cenário ideal almejado e a proposta.

Fonte: Santos et al., 2004, modificado pela autora, 2019; Acervo da autora, 2019.

105
Na busca de prover elementos que qualifiquem o espaço sob a
perspectiva de gênero a proposta transbordou os limites dos lotes estendendo -
se para a rua na porção da Rua Frei Miguelinho. A intervenção urbana consistiu
na inserção de medidas de Traffic calming (moderação do tráfego) para a
criação de uma zona de pedestre no trecho entre a Delegacia Especializada
em Atendimento à Mulher – DEAM e a Casa Ribeira (Figura 56), sendo alterada
a pavimentação e implantados balizadores retráteis. Essa zona, junto ao Centro
de Cultura, Memória e Pesquisa da Mulher, tem como propósito a criação de
um corredor referência no tocante a inclusão da vivência feminina no ato de
projetar; além de converte-se a zona exclusiva de pedestre no período da noite
e em dias de eventos na Ribeira, gerando copresença – aspecto importante
para a sensação de segurança-, e beneficiando os espaços culturais existentes
nesse perímetro e no entorno imediato.

Somado a isto, foi proposto a iluminação pontual das edificações com


uso cultural dentro deste trecho, sugerindo a ampliação desta iluminação para
edificações com uso cultural em toda Ribeira.

Figura 56: Mapa esquemático da Intervenção urbana proposta.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

106
No tratamento do piso, além da mudança da cor do pavimento e o seu
tratamento, foi adotada a estratégia utilizada na Plaza del Torico, sendo
incorporado um sistema de iluminação embutida em LED. Essa intervenção,
principalmente no período da noite, convidaria os transeuntes a adentrar no
espaço do Centro - visto a continuidade do piso iluminado na circulação
principal do mesmo, reforçando o seu caráter público.

Figura 57: Exemplo da pavimentação adotada na zona de pedestre.

Fonte: BORDAS, 2018, modificado pela autora, 2019.

Figura 58: Conexão entre a paginação da zona e a circulação da proposta arquitetônica.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

107
4.2.5 Soluções Estruturais e Cobertura

Sobre os aspectos estruturais, foi adotado como solução um sistema


composto por vigas e pilares metálicos parafusados. Sendo empregado pilares
e vigas com perfil em “I” para todos os ambientes, com exceção ao espaço da
galeria 02, pois devido a necessidade de vencer um maior vão junto a uma
maior carga na estrutura gerada pela biblioteca acima, adotou-se pilares
metálicos em “H”. O pré-dimensionamento dessas estruturas foram realizadas
de acordo com as tabelas de pré-dimensionamento de Yopanan Rebello
(2000), considerando os valores mais altos, visto o carga na estrutura
ocasionada pelos livros.

Figura 59: (E) Pré-dimensionamento da viga metálica da galeria 02; (D) Pré-dimensionamento do
pilar metálico da galeria 02;

Fonte: (E)REBELLO, 2000, p.102, modificado pela autora, 2019. (D)REBELLO, 2000, p.112,
modificado pela autora, 2019.

Já para a estrutura que suporta a cobertura foi empregado pórticos


metálicos distribuídos em eixos e espaçados em 7,40m, possuindo duas alturas.
A escolha dessa estrutura em pórtico se deu por esta ser capaz de vencer
grandes vãos, além de gerar visuais mais “limpas” quando comparado ao
sistema de treliças.

Para a laje, adotou-se o uso do steel deck devido ao seu caráter mais
resistente frente a incêndios, tendo em vista que a biblioteca possui uma alta
quantidade de objetos inflamáveis. Enquanto para a cobertura, foi empregada
telha metálica trapezoidal termoacústica tipo "telha forro" cor branca sobre
perfis metálicos.

108
Figura 60: (E)Sistema de laje empregado; (D)Cobertura empregada.

Fonte: (E)MELO, 2018; (D)“Telha Forro com PU TP 40 (Poliuretano - PU - PIR - Telha Térmica - Telha
Sanduíche)”, [S.d.].

Figura 61: Planta de cobertura, cortes e perspectiva esquemática.

Fonte: Acervo da autora, 2019.

Para o cálculo da capacidade do reservatório foi utilizado a


metodologia de Creder (1995), na qual se inicia com a estimativa da população
usuária da edificação. Vale salientar que embora o livro possibilite estimar o
público relacionando o uso da edificação com sua área, preferiu-se estimar a
população com base nos estudos de referências, adotando-se 150 pessoas

109
com o consumo de 50l de água por dia – consumo recomendado para edifícios
de prestação de serviços (classificação mais próxima ao uso do projeto). Para
a reserva técnica de combate a incêndio foi adotado 20% do valor total. Deste
modo tem-se:

• 150 (pessoas) x 50 (litros) = 7.500 (litros) x 2 (dias) = 15.000 litros


• Reserva de incêndio de 20% = 18.000 litros

Este valor foi dividido em duas câmaras de capacidade igual a 9.000litros.

4.2.6 Estratégias de conforto

Nos lotes de intervenção onde se projetou a proposta as maiores


fachadas não têm incidência solar direta do sol na maior parte do ano. Ainda
assim, pelo fato de parte dos ambientes possuírem fechamentos em vidro,
projetou-se beirais extensos, que fornecem sombreamento nessas fachadas.

Nas esquadrias foram utilizados montantes em alumínio com fechamento


em vidro para permitir a entrada de iluminação natural. A maior parte delas são
de correr e peitoril alto – fazendo uso do pé direito alto dos ambientes, podendo
ficar aberta – proporcionando ventilação cruzada, sem perder a privacidade,
especialmente nos setores de administração e apoio. Destaca -se que nas
esquadrias voltadas para o oeste, para protegê-las da incidência solar do
poente, foi projetado um brise vertical com acabamento em madeira.

Figura 62: Brise na fachada oeste voltada para a circulação.

Fonte: Acervo da autora.

110
Quanto à ventilação, ainda que se saiba que em alguns ambientes, tais
como a biblioteca, o uso da climatização por ar-condicionado é indispensável,
buscou-se prover estes espaços com a possibilidade de uso de ventilação
natural. Vale salientar, que embora tenha se buscado locar as áreas molhadas
com aberturas voltada para circulações, alguns sanitários ficaram sem conexão
com área externas, para estes ambientes propõem-se a exaustão mecânica.

De modo geral, as circulações amplas e pé direito alto também


contribuem para melhor distribuição dos ventos e da iluminação natural.

111
Figura 63: Vista da fachada da Rua Frei Miguelinho.24

24 A fachada proposta é uma releitura contemporânea da fachada da Rua Chile, se valendo da mesma caixa mural.
Figura 64: Vista da circulação ao adentrar o Centro.
Figura 65: Vista da biblioteca com o mobiliário projetado para este ambiente.
Figura 66: Vista da circulação entre o bloco de apoio e o administrativo.
Figura 67: Vista da fachada da Rua Chile com o ritmo das esquadrias recuperado.

Mulher potiguar
Corredor cultural

cultural
Considerações finais
Misturada na multidão, a mulher vive uma falsa impressão de igualdade
no espaço público, tenha ele sentido político ou físico. Isto posto, viu-se a
proposição de uma edificação dedicada as lutas e conquistas das mulheres
necessária para trazer luz às memórias desse grupo social. Visando mais
igualdade no espaço físico, considerou-se no processo projetual as
particularidades da vivência das mulheres.

No entanto, olhar para o espaço construído, seja ele público ou privado,


sob a perspectiva de gênero foi ao mesmo tempo instigante e desafiador. Haja
visto o pequeno número de estudos produzidos sobre a interferência do entorno
na percepção do espaço pelas mulheres.

Dessa forma, a conceituação teórica sob a perspectiva gênero ancorou-


se no entendimento da sensação de insegurança como o maior limitador do
acesso ao espaço público por elas, sendo adotado bibliografias que tratassem
da relação entre o medo e as características ambientais e uso do espaço, sem
necessariamente possuírem o recorte de gênero. Esse estudo foi de
fundamental importância no processo de tomada de decisões projetuais e na
justificativa das mesmas; juntamente com a conceituação sobre centros de
cultura e a análise do bairro da Ribeira, que contribuíram na definição das
atividades do Centro, visando atrair um público diverso e em diferentes horários,
gerando copresença - essencial para a sensação segurança.

Com base nas referências projetuais e na análise do terreno e entorno,


especializou-se as áreas propostas tomando partido da conformação do lote –
estreito e comprido. Ressalta-se ainda, que a intervenção proposta transbordou
os limites dos lotes, estendendo-se a rua, por entender que projetar sob a
perspectiva de gênero não pode ser uma ação isolada do entorno.

Por fim, acredita-se que é possível introduzir a variável “gênero” no


campo da arquitetura e urbanismo para a obtenção de espaços mais inclusivos
e espera-se que o desenvolvimento deste projeto possa contribuir com reflexões
no que tange à inserção das particularidades das mulheres no ato de projetar.
Acredita-se também, que os objetivos traçados para este trabalho foram
alcançados e afirma-se a relevância e importância da temática através da
indicação da mesma para estudos futuros.

118
Referências
ANTUNES, Lia Pereira Saraiva Gil. A arquitetura nunca mais será a mesma.
considerações sobre género e espaço(s). URBANA: Revista Eletrônica do
Centro Interdisciplinar de Estudos sobre a Cidade, v. 7, n. 2, p. 2, 31 Out 2016.
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Térmico em Edificações Parte 3: Zoneamento bioclimático brasileiro e diretrizes
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BARROS, Thyana Farias Galvão De. (Co)vivendo com fortalezas: o outro lado
de morar bem. 2012. p. 284. Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
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<https://repositorio.ufrn.br/jspui/bitstream/123456789/17397/1/ThyanaFGB_TESE.
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