Decisão Favorável - TJMG

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Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais

PJe - Processo Judicial Eletrônico

26/08/2024

Número: 5012204-84.2020.8.13.0702
Classe: [CÍVEL] PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
Órgão julgador: 1ª Vara Cível da Comarca de Uberlândia
Última distribuição : 05/05/2020
Valor da causa: R$ 15.289,00
Assuntos: Alienação Fiduciária
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Partes Advogados
ANTONIO EUSTAQUIO DE LIMA (AUTOR)
CRISTIANO MENDONCA RIBEIRO (ADVOGADO)
BANCO PAN S.A. (RÉU/RÉ)
CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES (ADVOGADO)

Documentos
Id. Data da Assinatura Documento Tipo
9584794931 23/08/2022 02:16 Acórdão - Apelação Cível Documentos 2ª instância
Apelação Cível Nº 1.0000.22.125661-3/001

<CABBCAADDAABCCBBCAADBCBACADDAADBAACAADDADAAAD>
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS
CONTRATUAIS. FINANCIAMENTO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO
FIDUCIÁRIA. EVENTUAL REPERCUSSÃO SOBRE A GARANTIA. CÓDIGO
DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INCIDÊNCIA. REVELIA. PRESUNÇÃO DE
VERACIDADE DOS FATOS. TARIFA DE CADASTRO. ONEROSIDADE
EXCESSIVA. ILEGALIDADE. TARIFAS DE AVALIAÇÃO DE BEM E
REGISTRO DO CONTRATO. QUESTIONAMENTO EM CONCRETO.
ABUSIVIDADE. SEGURO. VENDA CASADA. IMPOSSIBILIDADE. PARCIAL
PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS. REFORMA DA SENTENÇA.
– “Os efeitos da revelia não abrangem as questões de direito, tampouco
implicam renúncia a direito ou a automática procedência do pedido da
parte adversa. Acarretam simplesmente a presunção relativa de
veracidade dos fatos alegados pelo autor (CPC, art. 319)”. (AgRg no
AREsp 204.908/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. 04/11/2014,
DJe 03/12/2014).
– Na hipótese de revelia, a ação revisional deve ser julgada procedente,
na parte que envolver discussão fática sobre a incidência das cláusulas
contratuais previstas na avença das partes.
– O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos
bancários.
– É ilegal a cobrança de tarifa de cadastro na hipótese de onerosidade
excessiva arguida pelo Autor e não rebatida pelo Réu, ante a declaração
de revelia.
– Nos termos de precedente vinculante do STJ, é válida a cobrança de
registro de contrato e de avaliação do bem (Recurso Especial Repetitivo
1.578.553), salvo se não houver prova da efetiva prestação do serviço
controvertida na inicial.
– Nos termos do Recurso Especial Repetitivo 1.639.259, é ilegal a
cobrança de seguro, na hipótese de venda casada.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.22.125661-3/001 - COMARCA DE UBERLÂNDIA - APELANTE(S): ANTONIO EUSTAQUIO
DE LIMA - APELADO(A)(S): BANCO PAN S/A

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª Câmara Cível


Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na
conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PROVIMENTO AO
RECURSO.

DES. JOSÉ MARCOS RODRIGUES VIEIRA


RELATOR

Fl. 1/7

Número do documento: 22082302161300000009580888700


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Apelação Cível Nº 1.0000.22.125661-3/001

DES. JOSÉ MARCOS RODRIGUES VIEIRA (RELATOR)

VOTO

Trata-se de Apelação Cível interposta por Antonio Eustáquio de


Lima da sentença (DE-31) que, nos autos da Ação Revisional ajuizada
contra Banco Pan S.A., julgou improcedentes os pedidos formulados
na inicial, a despeito da revelia do Réu.
Em razões recursais (DE-38), aduz o Autor a abusividade das
seguintes cláusulas contratuais: a) tarifa de cadastro; b) tarifa de
avaliação; c) registro de contrato. Nestes termos, pugna pelo
provimento do recurso.
Sem contrarrazões (DE-40), ante a revelia.
É o Relatório. Passo a decidir.
Conheço do recurso, presentes os pressupostos de
admissibilidade.
Sobre as questões discutidas, cabe ressaltar que o sistema de
precedentes obrigatórios visa a prover o Judiciário de instrumento para
fazer face ao fenômeno da massificação das demandas,
especialmente útil em casos tais, em que a parte não faz distinção do
caso relativamente aos precedentes, tampouco argumenta por sua
superação.
É pacífico o entendimento atual no sentido da aplicação do CDC
às demandas revisionais de contratos bancários, eis que a atividade se
subsume ao conceito de serviço (art. 3º. §2º do CDC), conforme
largamente reconhecido pela jurisprudência nacional (Súmula 297 do
STJ e ADI 2591). Assim, considera-se possível a readequação das
cláusulas abusivas e ilegais, com fundamento nos arts. 6º, V e 51 do
CDC.

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Apelação Cível Nº 1.0000.22.125661-3/001

No entanto, o fato de se aplicar o Código de Defesa do


Consumidor ao contrato em questão e de ser possível a sua revisão,
não permite concluir-se, automaticamente, pela abusividade das
cláusulas livremente pactuadas, que deve estar evidenciada nos autos.
Sobre as tarifas bancárias, o STJ manifestou-se em diversos
precedentes vinculantes.
Quanto à tarifa de cadastro, a cobrança é válida nos contratos
bancários posteriores ao início de vigência da Resolução-CMN n.
3.518/2007, em 30/4/2008, no início do relacionamento entre o
consumidor e a Instituição financeira (Súmula 566, STJ).
No REsp 1.578.553 , fixou as seguintes teses: a) abusividade
da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços
prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser
efetivamente prestado; b) abusividade da cláusula que prevê o
ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente
bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de
entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no
período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da
onerosidade excessiva; c) validade da tarifa de avaliação do bem
dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o
ressarcimento de despesa com o registro do contrato,
ressalvadas a abusividade da cobrança por serviço não
efetivamente prestado e a possibilidade de controle da
onerosidade excessiva, em cada caso concreto.
Por fim, no REsp 1.639.259, consignou que, nos contratos
bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar
seguro com a Instituição financeira ou com Seguradora por ela
indicada.

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In casu, ganha relevo a revelia do Réu decretada no curso do


processo, em virtude da ausência de contestação apresentada nos
autos.
Sabe-se que o efeito da revelia é a presunção de veracidade, o
que diz respeito, porém, apenas aos “fatos afirmados pelo autor” (art.
344 do CPC). Tal presunção, contudo não é absoluta nem implica
imediato acolhimento da tese autoral. A propósito, a lição de FREDIE
DIDIER JR:

É possível que haja revelia e não se presuma a


ocorrência dos fatos deduzidos contra o revel.
O simples fato da revelia não pode tornar verossímil o
absurdo: se não houver o mínimo de verossimilhança
na postulação do autor, não será a revelia que lhe
conferirá a plausibilidade que não possui. Se a
postulação do autor não vier acompanhada do mínimo
de prova que a lastreie, não se poderá dispensar o
autor de provar o que alega pelo simples fato da
revelia. A revelia não é fato com dons mágicos.
(“Curso de Direito Processual Civil”, Vol. I, 11ª. ed.,
Salvador: JusPodivm, 2009, p. 507)

Dita afirmação encontra amparo, ainda, na distribuição do ônus


probatório, prevista no art. 373 do CPC, que impõe ao Autor a prova do
fato constitutivo do direito postulado:

A necessidade de provar para vencer, diz WILHELM


KISCH tem o nome de ônus da prova. Não se trata de
um direito ou de uma obrigação, e sim de ônus, uma
vez que a parte a quem incumbe fazer a prova do fato
suportará as conseqüências e prejuízos da sua falta e
omissão (JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Manual de
Direito Processual Civil”, São Paulo: Saraiva, 1987, p.
194).

Observo que a ficta confessio tem origem germânica apontada


no clássico estudo de CALMON DE PASSOS (Da Revelia do
Demandado, Salvador: Progresso, 1960, p. 77 e ss), o que me remete

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Apelação Cível Nº 1.0000.22.125661-3/001

às fontes em que acolhida na Alemanha, cuja Ordenação Processual


é, por sua vez, uma das fontes do Anteprojeto Buzaid, como expresso
na Exposição de Motivos do CPC de 1973.
Nesta esteira, também o CPC brasileiro atual não adota a teoria
da individuação da causa de pedir, a dispensar o fato. Ao contrário,
perfilha a teoria da substanciação da causa de pedir, de modo que o
fato, como suporte remoto originário da fundamentação jurídica, é
elemento indispensável à delimitação da lide (art. 319, III do CPC).
Reversamente há o ônus da impugnação específica (art. 341): cabe ao
réu manifestar-se precisamente sobre os fatos afirmados. É dizer: não
sobre fatos não afirmados. Assim, atento às fontes germânicas (e não
latinas), o comentário do mestre de Munique:

Existe uma carga das afirmações unicamente em um


procedimento com princípio dispositivo, no qual é
assunto das partes a apresentação de fatos
necessários à resolução. (...) Por isso, o ônus das
afirmações coincide, em princípio, quanto a seu objeto
e extensão, com o ônus da prova. A independência do
ônus das afirmações se reconhece, todavia, também
aqui quando não se apresenta uma afirmação: os
prejuízos disto os sofre a parte cuja ação não pode ter
êxito sem essa afirmação e que, portanto, suporta o
ônus. Assim ocorre, em particular, para as afirmações
que fundam a demanda, no caso do autor; e no do
demandado, para os fatos de exceção. Por isso, se não
se afirmou completamente o fundamento, se rechaça a
demanda apesar da revelia do demandado (LEO
ROSENBERG, “Tratado de Direito Processual Civil”,
tomo II, trad., Angela Romera Vera, EJEA, Buenos
Aires, 1955, p. 224).

E mais:

Só pode ter lugar o pedido do demandante, de que se


profira sentença por revelia contra o demandado,
quando tenham sido afirmados os fatos que justificam
a demanda (LEO ROSENBERG, O Ônus da Prova,
EJEA, Buenos Aires, 1956, p. 40).

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Apelação Cível Nº 1.0000.22.125661-3/001

O CPC vigente tem ainda a dicção clara de seu Art. 345, IV, que
adotou a tese da ficta litis contestatio, quando, não sendo verossímil o
fato constitutivo narrado na inicial, perdurará o autor com o ônus de
sua prova.
Delineadas as premissas, no caso dos autos, verifica-se que o
Autor não se insurge contra todos os pontos da sentença, pois deixa
de devolver a esta Instância matérias alegadas na inicial que
perpassam exclusivamente o exame de direito (juros remuneratórios e
capitalizados, comissão de permanência). Em grau recursal, o Autor
questiona matérias que demandam exame fático, não apenas de
direito. Daí, por que a revelia do Réu incide sobre as tarifas de
cadastro, registro de contrato, avaliação de bem e seguro.
Com efeito, quanto à tarifa de cadastro, verifica-se que, na
inicial, não há questionamento de tal encargo após o início do
relacionamento. A prestação do serviço pela parte adversa é admitida
pelo próprio Autor, que, na realidade, insurge-se contra a onerosidade
excessiva do valor cobrado sob a rubrica de tarifa de cadastro. Neste
tocante, verifica-se que a onerosidade excessiva é incontroversa nos
autos, em vista da revelia do Réu.
Verifica-se, ainda, que a inicial controverte a efetiva prestação
do serviço referente ao registro de contrato e avaliação do bem. Como
se nota, o fundamento de abusividade não ocorre em abstrato, mas em
concreto, de acordo com as peculiaridades da causa. De modo tal que,
dada a revelia, ausente qualquer documento elucidativo de que o
Banco Réu tivesse prestado qualquer serviço capaz de lastrear a
cobrança, a declaração de abusividade de tais tarifas é de providência
de caráter impositivo.

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Na mesma linha, a cláusula de seguro deve ser declarada


abusiva, pois se presume que o Autor não tivera a faculdade de eleger
a Seguradora.
Quanto à repetição dos encargos declarados indevidos, tenho
entendimento de que eventual ressarcimento deva ser feito de forma
simples, eis que o art. 42, §ún., do CDC exige a prova da má-fé, que é
afastada quando a cobrança possui previsão contratual (Apelação
Cível 1.0024.08.038247-6/003, j. 16/03/2017, publ. 27/03/2017). Prova
da má-fé esta que se imputa ao Autor, a despeito da revelia.
Com tais considerações, dou provimento ao recurso para
reformar a sentença e julgar parcialmente procedentes os pedidos
formulados na inicial, de modo a declarar abusivas as cláusulas
estabelecidas sob a rubrica de tarifa de cadastro, registro de contrato,
avaliação de bem e seguro, cuja restituição deve ocorrer de forma
simples, com acréscimo de correção monetária pela tabela da CGJ
desde a data do desembolso e de juros moratórios de 1% ao mês
desde a data de citação. Fica autorizada compensação do montante
com eventual saldo devedor.
Ante a alteração no resultado do julgamento, inverto os ônus
sucumbenciais, para condenar exclusivamente o Banco Réu ao
pagamento das custas e demais despesas processuais bem como dos
honorários advocatícios, estes que, com fulcro no art. 85, §§2º e 11, do
CPC, arbitro em 15% do valor atualizado da condenação.

DES. RAMOM TÁCIO - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. MARCOS HENRIQUE CALDEIRA BRANT - De acordo com o(a)


Relator(a).

SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO."

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