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INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
As interações farmacológicas são modificações na intensidade e na duração da resposta de
um fármaco, devido à ingestão simultânea de outro fármaco, álcool etílico ou determinados alimentos. Isso pode potencializar ou reduzir os efeitos dos fármacos, com prejuízos ao tratamento. Nem sempre as interações medicamentosas são maléficas, visto o exemplo dos anestésicos locais com vasoconstritores (diminuem a absorção sistêmica do anestésico, deixando este agir por mais tempo no tecido e impedindo doses sistêmicas tóxicas). Porém algumas interações são maléficas, e os fármacos prescritos por dentistas podem levar a problemas principalmente em indivíduos que já fazem uso de outros fármacos para problemas sistêmicos, como os idosos, que na grande maioria das vezes já apresentam algum tipo de alteração metabólica, cardiovascular ou neurológica. Na clínica odontológica é incomum a polimedicação, que consiste naquelas pessoas que tomam 5 ou mais medicamentos (OMS=4 ou mais medicamentos com ou sem prescrição), mas o problema é que este paciente já pode estar usando outros fármacos. As interações farmacológicas são classificadas como farmacocinéticas, quando ocorrem durante a absorção, distribuição, metabolização ou excreção dos fármacos, ou farmacodinâmicas, quando se dão nos locais de ação dos fármacos envolvidos (receptores), por meio de mecanismos pelos quais os efeitos se manifestam. Porém, existe outra classificação, que nomeia 5 categorias de interações: - Adição (1+1=2): interação de fármacos com mesmo mecanismo de ação e mesmo efeito, que quando usados juntos tem efeito terapêutico aumentado. Ex: AINE+AINE - Somação (1+1=2): interação de fármacos com diferentes mecanismos de ação, porém com mesmo efeito, que quando usados juntos tem efeito terapêutico aumentado. Ex: AINE + Opioide. - Sinergismo (1+0=3): quando a interação produz uma resposta exagerada, maior que a conseguida com ambos os fármacos administrados individualmente. Ex: Amoxicilina + Clavulanato. - Potenciação (1+1=4): quando um fármaco além de ter sua ação, ainda potencializa a ação do outro fármaco. Ex: Adrenalina + Atropina / Álcool + Benzodiazepínicos - Antagonismo (1+1=0): interação que diminui a resposta clínica de um fármaco quando um segundo fármaco é administrado. Ex: Cocaína + Benzodiazepínicos / Fenoterol (agonista B) + Propanolol (Antagonista B).
1. INTERAÇÕES COM VASOCONSTRITORES
Os anestésicos locais usados na clínica odontológica são munidos de vasoconstritores agonistas adrenérgicos (epinefrina, norepinefrina, fenilefrina). Medicações de uso esporádico ou contínuo dos pacientes podem interagir com estes e causar efeitos adversos, principalmente quando estes anestésicos com vasoconstritores são empregados em grandes quantidades (muitos tubetes), empregados com uma grande concentração do vasoconstritor ou aplicados acidentalmente na corrente sanguínea. ANEXO: os receptores adrenérgicos são os seguintes: Alfa1: é um receptor metabotrópico ligado a proteína Gq que promove vasoconstrição, broncoconstrição, constrição uterina e da bexiga. Leva a aumento da pressão arterial. Alfa2: é um receptor metabotrópico autoinibitório associado a proteína Gi, que inibe a liberação de noradrenalina. Beta 1: é um receptor metabotrópico ligado a proteína Gs, presente no coração, aumentando força de contração (inotropismo), frequência cardíaca (cronotropismo) e aumenta a condução de estímulos (dromotropismo). Leva a aumento da pressão arterial. Beta2: é um receptor metabotrópico ligado a proteína Gs, que promove vasodilatação, broncodilatação, relaxamento do útero e da bexiga, relaxamento do TGI. Os fármacos que podem interagir com os vasoconstritores dos anestésicos são: Betabloqueadores: tem efeito anti-hipertensivo, antiarrítmico e antianginoso (regula o O2 que chega ao coração) devido ao bloqueio dos receptores beta, alfa ou ambos. - Não seletivos: bloqueiam B1 e B2. Ex: Propanolol - Cardiosseletivos: bloqueiam especificamente B1. Ex: Atenolol, Metoprolol. - De ação vasodilatadora: bloqueiam especificamente A1. Ex: Carvedilol. Os betabloqueadores não seletivos bloqueiam os receptores beta, deixando a livre ação dos alfas, com isso se injetado um vasoconstritor adrenérgico este pode ativar ainda mais o alfa 1 e promover a vasoconstrição que não poderá ser compensada pelo beta 2, levando a um aumento da pressão arterial. Antidepressivos tricíclicos: estes são responsáveis por inibir a recaptação de serotonina, dopamina e noradrenalina na fenda sináptica. Com isso, os níveis de noradrenalina de pacientes que fazem uso destes já estão altos. Por isso, a associação de um anestésico com adrenérgicos (em grande quantidade ou intravenoso) vai aumentar ainda mais a concentração de noradrenalina. Para antidepressivos inibidores da recaptação de serotonina isto não acontece. Exemplos destes tricíclicos são: Amitriptilina, Imipramina. Anfetaminas: as anfetaminas vão causar uma maior liberação de catecolaminas (noradrenalina) nas terminações sinápticas, além de bloquear o TNE (transportador de noradrenalina) impedindo a recaptura desta na sinapse, aumentando os níveis destas. Dentre estas se tem a cocaína e seu subproduto o crack. Estes devido ao aumento dos níveis de NE, vão promover a taquicardia e o débito cardíaca, diminuindo a perfusão coronariana (sangue presente nas veias do coração) levando a isquemia deste e consequentemente a arritmia, angina (dor no peito) e infarto. Os efeitos dos vasoconstritores em pacientes que fazem uso das anfetaminas podem aumentar ainda mais a concentração de noradrenalina. Além disso, a cocaína provoca constrição do baço e um aumento de 4-6% do número de glóbulos vermelhos, que, uma vez na circulação, aumentam a viscosidade do sangue e o risco de trombose. Outra coisa, é que a cocaína parece induzir uma produção maior de um importante fator da coagulação sanguínea, o fator de von Willebrand, que aumenta em até 40%, contribuindo ainda mais para a formação de coágulos intravasculares. Por isso, é fundamental perguntar na anamnese se o paciente faz uso destas e explicar os efeitos que o uso destas com o anestésico pode causar. Fenotiazínicos: são um grupo de psicotrópicos utilizados para o tratamento de doenças psicóticas, promovendo tranquilização leve. Como exemplos se tem: Clorpromazina. A associação de vasoconstritores com este pode levar a uma hipotensão ainda maior do que a causada por estes, devido a epinefrina atuar no receptor B2 que promove vasodilatação periférica e consequente redução da pressão arterial. 1.1. PROTOCOLO DE ATENDIMENTO Devido a estes vasoconstritores terem muitas ações de interação negativas com outros fármacos, é sugerido o seguinte protocolo para os possíveis pacientes que fazem uso destes fármacos: 1) Identificar na anamnese as drogas e medicamentos que o paciente faz uso constante; 2) Documentar no prontuário clínico que o paciente foi esclarecido sobre os riscos da interação, com a assinatura dele (especialmente no caso da cocaína); 3) Na técnica infiltrativa (técnica onde se anestesia diretamente as terminações da região onde o procedimento ocorrerá), aplicar pequenos volumes das soluções anestésicas contendo epinefrina 1:100.000 ou 1:200.000, respeitando o limite de 2-4 tubetes, respectivamente. 4) Nos bloqueios regionais (técnica anestésica onde se anestesia o tronco do nervo de interesse acometendo toda a região), empregar solução com felipressina (atua somente em vênulas e não promove ações semelhantes às da epinefrina) associada à prilocaína 3%. Nos procedimentos de curta duração, pode-se aplicar a solução de mepivacaína 3% sem vasoconstritor. 5) Seja lá qual a técnica, a injeção deve ser lenta e fazendo aspiração negativa, para impedir que este anestésico seja injetado em via intravenosa. 6) Nas urgências odontológicas em que o paciente está sob efeito de cocaína ou crack, avaliar a necessidade de atender este em ambiente ambulatorial ou clínico. Mas em ambos os casos evitar anestésicos com epinefrina, norepinefrina ou fenilefrina.
2. INTERAÇÕES COM ANSIOLÍTICOS
Os benzodiazepínicos (Midazolam, Lorazepam, Diazepam, Alprazolam) podem ser utilizados esporadicamente para a sedação mínima em consultórios odontológicos, porém estes podem interagir com outros fármacos. Depressores do SNC: pacientes que fazem uso de anticonvulsivantes, hipnóticos e outros fármacos depressores do SNC, podem ter uma depressão muito grande deste se usarem os benzodiazepínicos, sendo recomendado que o cirurgião dentista converse com o médico deste. Álcool etílico: toda prescrição de benzodiazepínicos, mesmo quando utilizados em dose única ou por período restrito, deve ser acompanhada de um alerta* quanto aos riscos de interação com o álcool etílico, que deve ser proibido pelo período de 24 h antes e 24 h após o uso da medicação. Tal recomendação se deve ao fato de que essa interação pode provocar uma depressão pronunciada do SNC. 3. INTERAÇÕES COM ANALGÉSICOS Dentre as interações com analgésicos (paracetamol e dipirona) se tem: - Paracetamol: já foi comprovado o grande efeito hepatóxico deste, devendo sua prescrição ser evitada para pacientes que fazem uso de álcool etílico (outra substância hepatotóxica) e com nimesulida (também hepatotóxica). Além disso, este não pode ser prescrito com a Varfarina (anticoagulante oral), pois este vai atuar nas enzimas do complexo P450 aumentando a biodisponibilidade desta última podendo levar a hemorragias. - Dipirona: não se encontraram interações com este analgésico, podendo no máximo intensificar os efeitos do álcool etílico.
4. INTERAÇÕES COM AINES
Os anti-inflamatórios não esteroidais usados comumente na clínica odontológica para controle da dor e do edema, apesar da boa margem de segurança, podem interagir com alguns medicamentos: Anticoagulantes: são medicamentos utilizados para prevenir tromboembolias devido a atuação nos fatores da coagulação, evitando infartos devido a trombos. O principal é a Varfarina. AINEs não devem ser utilizados pois tem alta taxa de ligação as proteínas plasmáticas, competindo com a Varfarina e aumentando sua concentração na forma livre podendo resultar em hemorragias no tratamento odontológico. Antiagregantes plaquetários: AINEs por meio de sua ação nas enzimas COX bloqueiam a síntese de tromboxanas (agregantes plaquetários). Com isso, não deve utilizar este com outros antiagregantes como a Aspirina e o Clopidogrel, devido ao risco de hemorragias. Deve se optar por esteroides ou pela Dipirona. Anti-hipertensivos: tanto os inibidores da Enzima conversora de angiotensina (Captopril, Enalapril), quanto os diuréticos (Furosemida, Hidroclorotiazida) e os betabloqueadores (Propanolol, Metoprolol), que reduzem a pressão arterial tem alguma influência das Prostaciclinas (PGI), que são bloqueadas pelos AINEs podendo levar a complicações na hemostasia renal e aumentar a pressão. Com isso, deve-se optar por conversar com o médico endocrinologista deste paciente ou utilizar corticosteroides tópicos. Hipoglicemiantes orais: devido aos AINEs terem alta taxa de ligação a albumina, podem deslocar estes hipoglicemiantes (Glibenclamida), causando quadros de hipoglicemia exagerados. Deve-se conversar com o endocrinologista ou prescrever corticosteroides.
5. INTERAÇÕES COM ANTIBACTERIANOS
Os dentistas têm acesso a um curto espectro de antibacterianos, porém estes podem apresentar interações com alguns medicamentos: Álcool etílico: o etanol muitas vezes é indicado como algo que “corta o efeito dos antibacterianos”, isso ocorre porque o álcool estimula diretamente as membranas do aparelho digestório promovendo aumento da produção do HCl e peristaltismo do estômago e intestino provocando vômitos e diarreias, atrapalhando a absorção dos antibacterianos. Efeito dissulfiram: alguns antibióticos como o Metronidazol, a Ampicilina e algumas cefalosporinas tem a capacidade de causar efeito dissulfiram por se ligarem as proteínas plasmáticas liberando o acetaldeído (metabólico do álcool), que em grandes concentrações causará uma sensação iminente de morte com os seguintes sintomas: palpitações, queda da pressão arterial, dor no peito, dificuldade respiratória, vermelhidão da face e pescoço, náuseas, vômitos e transpiração excessiva. Este efeito dissulfiram não é grave, mas pode ser usado para as pessoas pararem de beber. Quando houver necessidade da prescrição de antibióticos que, em conjunto com o álcool, possam promover intoxicação aldeídica ou “efeito dissulfiram”, deve-se acrescentar no corpo da receita: “não ingerir bebidas alcoólicas por até 48 h após o término do tratamento, pelo risco de efeitos tóxicos”. Hepatotoxidade: a Azitromicina e a Eritromicina já são hepatotóxicas, então se consumido o álcool com estas pode se aumentar ainda mais a hepatotoxicidade. Aumento da diurese: o álcool causa o aumento da diurese por meio da inibição da vasopressina (hormônio antidiurético). Com isso, este pode atrapalhar a ação de antibacterianos que precisam de concentrações plasmáticas estáveis para impedirem o crescimento bacteriano e matar estas. Contraceptivos orais: os antibacterianos podem interagir com estes provocando uma diminuição no efeito contraceptivo, sendo aconselhável seguir o seguinte protocolo em caso de pacientes que façam uso destes contraceptivos e precisem iniciar uma terapia com antibióticos: 1) Informar a paciente sobre o risco potencial de redução de efetividade do CO pelo uso concomitante com antibióticos. 2) Sugerir que a paciente procure seu médico para receber orientações sobre outros métodos de contracepção adicionais (não hormonais). 3) Mostrar a importância de a paciente aderir ao tratamento proposto. Também recomendam que as pacientes devam assinar um termo de esclarecimento e responsabilidade, em duas vias, atestando estarem cientes dos riscos da interação quanto a uma possível gravidez não planejada, com uma delas sendo anexada ao prontuário clínico. Carbonato de lítio: o lítio é um cátion monovalente, indicado para transtornos bipolares (doença maníaco-depressiva), cujo tratamento exige a monitorização constante de suas concentrações sanguíneas, pelo seu baixo índice terapêutico (doses um pouco maiores podem levar a efeitos tóxicos). Antibacterianos como o Metronidazol e as Tetraciclinas podem ter relação com o aumento da concentração deste no sangue, não sendo recomendados. Varfarina: é um anticoagulante oral bastante empregado pelos cardiologistas, que age como antagonista da vitamina K, mas que também possui baixo índice terapêutico, exigindo constante monitoramento de suas concentrações sanguíneas. Assim, a administração concomitante de outras substâncias como os antibacterianos Metronidazol, Eritromicina e Claritromicina pode levar a um aumento da atividade anticoagulante, acarretando hemorragia. Digoxina: a digoxina, também conhecida como digitálico, é utilizada no controle de doenças cardíacas, como arritmias e doença cardíaca congestiva. Entretanto, pode apresentar interações medicamentosas com a Claritromicina. O uso concomitante de Eritromicina ou Claritromicina pode promover a diminuição da microbiota intestinal, elevando os níveis sanguíneos da digoxina e causando toxicidade no paciente. Cogita- se também que a claritromicina interfira na excreção renal da digoxina, elevando o seu nível e levando a sintomas como distúrbios de visão e arritmias cardíacas.
6. INTERAÇÃO COM FITOTERÁPICOS
Os medicamentos fitoterápicos por serem considerados naturais, normalmente tem uso indiscriminado pela população, porém por conterem vários princípios ativos podem acontecer interações fitoterápico-medicamento. A erva de são joão, ginseng, podem afetar no efeito anticoagulante da Varfarina, provocando hemorragias em procedimentos cirúrgicos odontológicos.