Migração Internacional Pela Renda
Migração Internacional Pela Renda
Migração Internacional Pela Renda
Weber Soares
UFMG/Cedeplar
1. INTRODUÇÃO
*
Trabalho apresentado no XIII Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, realizado
em Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil de 4 a 8 de novembro de 2002.
1
O discurso que confere, neste trabalho, conteúdo à análise de redes sociais muito se beneficiou do que
foi ministrado pelo prof. Eduardo Luiz Gonçalves Rios Neto, na disciplina, do curso de doutorado do
Cedeplar/UFMG, Novos Fluxos Migratórios Internacionais, bem como da generosidade e dos intensos
debates mantidos com o doutorando em Demografia, Dimitri Fazito.
predeterminada de preferências e faz a melhor escolha possível, com os meios de que
dispõe.
2. PUSH-PULL THEORY
2
A taxionomia das principais correntes teóricas que se debruçam sobre as causas da migração
internacional foi, em parte, retirada de MASSEY et al (1993).
2
lidar com a emergência dos fluxos migratórios. Essa perspectiva teórica afirma que a
migração internacional, bem como sua contraparte interna, é causada pelas
desigualdades geográficas na oferta e na demanda de trabalho; desigualdades que se
manifestam pelas diferenças nas taxas salariais: países com excesso de força de
trabalho, em relação ao capital, têm baixos salários; e países com limitada força de
trabalho, em relação ao capital, abrigam altos salários. A resultante do deslocamento
populacional torna-se, então, evidente: de países com baixos salários ou com excesso de
mão-de-obra para países com altos salários ou com escassez de força de trabalho. À
medida que se intensificam os fluxos migratórios, a oferta de trabalho diminui e os
salários sobem em países carentes de capital; ao tempo que a oferta de trabalho aumenta
e os salários caem em países fartos de capital; desse modo, o diferencial internacional
de salário passaria a refletir apenas os custos monetários e psíquicos do deslocamento.
Os mercados de trabalho constituem o mecanismo primário pelo qual os fluxos
internacionais são induzidos. Não obstante, implícita está a proposição de que se fossem
eliminadas as diferenças salariais entre os países, os fluxos migratórios deixariam de
existir.
3
taxas salariais entre os países e propõem que mercados de trabalho em desequilíbrio
podem ter na migração um fator equilibrante.
4
migração é considerada uma decisão socialmente “contextualizada” (se a renda é
avaliada de acordo com valores absolutos ou relativos, por algum grupo de referência).
4. TEORIA HISTÓRICO-ESTRUTURAL
Para esse tronco teórico, a migração é vista como fenômeno (relação, processo)
social, no qual a unidade de análise é o fluxo composto por indivíduos de determinado
grupo socioeconômico, que emana de estruturas societárias geograficamente
delimitadas e não como ato soberano ou soma das escolhas individuais. A migração
resulta das desigualdades regionais advindas do espaço transformado, do rearranjo
espacial das atividades produtivas; daí que os determinantes e conseqüências da
migração devem ser remetidos a outros fenômenos sociais, historicamente
condicionados, que se relacionam com o processo de mudança estrutural em
determinada formação social (SINGER, 1973).
5
trabalho é uma das condições de existência do sistema capitalista e expressa a tendência
de submissão, cada vez maior, do trabalhador às exigências do mercado: mercê do
capital e das suas crises periódicas, a força de trabalho desloca-se de uma atividade para
a outra, de um espaço para outro, para satisfazer às necessidades da acumulação
(GAUDEMAR, 1977).
6
operam para tornar a sociedade resistente à eliminação das atividades pertencentes a
esse setor e para fazer com que os nativos relutem em desempenhar tais atividades.
A migração não é, por conseguinte, causada por fatores de expulsão nos países
de origem (baixos salários ou alto desemprego), mas por fatores de atração nos países
de destino. A explicação para o início do fluxo migratório encontra-se na maneira pela
qual a demanda de trabalhadores imigrantes é satisfeita: práticas de recrutamento são
utilizadas por empregadores das sociedades desenvolvidas ou por governos, para
atender aos interesses desses mesmos empregadores. Fica patente que as diferenças
internacionais de salário não constituem condição suficiente para que a migração ocorra,
o que aponta a mudança de percepção na causalidade do fenômeno: a causa dos fluxos
migratórios internacionais não está na esfera da racionalidade/esforço puramente
individual, mas, sim, no predomínio da crônica e inevitável demanda de trabalhadores
estrangeiros (força de atração) e na primazia de fatores econômicos de natureza
estrutural.
7
Conforme SASSEN (1988), a reorganização da economia mundial, ao longo das
décadas de 70 e 80, contribuiu para a constituição de um espaço transnacional, no qual
circulam, não apenas trabalhadores, mas, sobretudo, capital, mercadorias, serviços e
informação. A mobilidade do capital, mais precisamente a internacionalização da
produção, tem gerado condições para a mobilidade do trabalho. Formas pronunciadas
dessa internacionalização manifestam-se nos seguintes processos: i) desenvolvimento da
produção para exportação, em diversos países do Terceiro Mundo, por meio de maciços
investimentos estrangeiros diretos; ii) a transformação de grandes cidades em centros de
controle e gerenciamento do sistema econômico global (Nova Iorque e Los Angeles, por
exemplo); e iii) a emergência dos Estados Unidos como principal destinatário dos
investimentos internacionais diretos.
8
movimentos um caráter mais amplo e estrutural, pois prevalece aí o argumento de que a
mobilidade da força de trabalho é regulada pela lógica de acumulação do capital, que
cria, destrói e recria oportunidades de trabalho em diferentes partes do planeta. Há,
nessa visão, um deslocamento da ênfase sobre a racionalidade individual para as
maneiras como os meios sociais afetam e modificam os comportamentos econômicos e
essa mesma racionalidade.
“... na proximidade das relações sociais do que na proximidade física [...], segue
as rotas que foram traçadas por parentes e amigos antes dele. Vai com conhecidos, ou à
procura de conhecidos, que sabe estar em tal ou qual lugar. Os lugares que ele conhece
são os que fazem parte da experiência passada da sua comunidade e são relações
pessoais que servem de ponto de apoio à movimentação espacial. A não ser
excepcionalmente, o emigrante não se aventura no desconhecido, mas se orienta por
notícias, por informações, por relações" (DURHAM, 1984:138);
torna-se oportuno lançar mão de outra linha de investigação que não exclui,
necessariamente, as demais: a análise de redes sociais.
De acordo com TILLY (1990), as unidades efetivas da migração não são nem
indivíduos nem famílias, mas, sim, conjuntos de pessoas ligadas por relações de
amizade, de conhecimento, de parentesco e de trabalho. Não redutível às características
9
(atributos) e intenções individuais, a migração deveria ser pensada como estrutura
comunitária que se traslada. Os movimentos migratórios transplantam os principais
segmentos das redes sociais existentes: as “redes migram”.
TILLY (1990) lembra ainda que os migrantes internacionais não carregam sua
identidade coletiva como se fossem peças de bagagem; acentua a natureza relacional
delas, por meio das seguintes afirmações: i) categorias permanecem – a sobrevivência, à
viagem, de certas categorias depende da mescla populacional, das categorias
previamente estabelecidas em torno das quais as pessoas organizaram suas próprias
vidas no destino; ii) as redes criam novas categorias – migrantes que não têm identidade
comum no lugar de origem, com freqüência, adquirem, no destino, durante a interação
com outros, nova identidade; e iii) as redes transformam categorias existentes – os
membros de determinada rede cuja identidade e estrutura interna estejam mudando
negociam novas relações com outras redes, incluindo as do país de origem. A análise da
dinâmica migratória, consoante com a perspectiva fornecida pelas redes sociais, põe à
mostra que, em vez de uma série de transformações individuais na direção de uma
cultura dominante no destino, os migrantes negociam novas relações/categorias dentro e
por meio das redes: as trajetórias de mudança variam muito, de corrente para corrente
migratória, porque a mudança se traduz numa dimensão coletiva e não apenas
individual.
Para MASSEY et al (1987), as condições que dão origem à migração podem ser
totalmente diferentes das condições que a perpetuam no tempo. Ao passo que
transformações estruturais nas sociedades de origem e de destino respondem pelo início
dos fluxos migratórios internacionais, as redes sociais conferem a tais fluxos
estabilidade, transformando-os em movimento de massa.
10
A teia de relações sociais interligadas, mantida por um conjunto de expectativas
mútuas e de comportamentos determinados, que apóia o movimento de pessoas, bens e
informações, que une migrantes e não-migrantes, que liga comunidades de origem a
lugares específicos das sociedades de destino, constitui a rede migratória. Essa rede
tende a se tornar auto-suficiente com o tempo, por causa do capital social, que faculta,
aos migrantes em potencial, contatos pessoais com parentes, amigos e conterrâneos;
oferecem aos migrantes oportunidades de emprego, hospedagem e assistência financeira
no destino. À medida que as conexões interpessoais são estendidas e elaboradas, esse
capital social mostra-se cada vez mais disponível ao migrante-potencial nas
comunidades de origem, o que intensifica a expectativa dos retornos líquidos e reduz
progressivamente os custos financeiros e físicos da migração (MASSEY, 1987).
A grande maioria dos estudos que se vale do arcabouço conceitual das redes
sociais, para tratar os fluxos migratórios, em especial as análises que lidam com a
migração internacional de brasileiros, tem como fonte inspiradora as interpretações de
Tilly e Massey. Lugar comum nesses estudos é o reconhecimento de que as redes
sociais são de grande importância para entender as migrações; constituem, portanto,
princípio heurístico. Todavia, os discursos não passam dessa representação metafórica
de redes sociais. Há certa sinonímia entre as concepções de rede social e de rede
pessoal: a rede social apresenta-se como manifestação de redes pessoais cotidianas
ancoradas em relações sociais de parentesco e de amizade. Além disso, o trânsito entre
os conceitos de rede pessoal e rede migratória realiza-se, mais uma vez nesses mesmos
discursos, de forma direta. Esta coincidência de significados constrói-se mercê da
recorrência com que as relações de parentesco e de amizade são apontadas como: i)
causas ou intensificadoras dos fluxos migratórios – as pessoas migram por causa do
suporte dado por redes pessoais; e ii) como responsáveis pela manutenção dos vínculos
entre origem e destino, pela orientação que os fluxos assumem, pela circulação de
recursos materiais e simbólicos etc. Enfim, prevalece certa imprecisão quanto aos
limites conceituais de rede social, rede pessoal e rede migratória – existe alguma
“promiscuidade” na utilização desses conceitos.
11
Não cabe dúvida sobre a importância das redes sociais para entender, em
especial, as migrações internacionais. Mas é necessário ir além dessa mera indicação e
estabelecer as bases iniciais da perspectiva teórica que se estrutura em conseqüência das
imprecisões encontradas em parte da literatura sobre a temática redes sociais, redes
pessoais e redes migratórias. Assim, cabe admitir que:
ii. rede pessoal representa, então, um tipo de rede social que se funda em relações
sociais de amizade, parentesco etc.;
iii. rede migratória não se confunde com redes pessoais; estas redes precedem a
migração e são adaptadas a um fim específico: a ação de migrar;
3
É o comportamento avaliativo dos atores, jogando incessantemente com variações sobre os temas
fornecidos pelo estoque cultural corrente, que cria e recria a cultura como um sistema elaborado e
constantemente modificado de símbolos (HAMMEL, 1990).
12
status ontológico à dinâmica migratória; é a nostalgia/saudade da origem que confere a
uma pessoa sua condição de migrante. Conforme SAYAD (2000), o retorno remete
necessariamente às relações do migrante com o tempo, com o espaço físico e com o
grupo. Em relação ao tempo, o migrante concebe algo como um retorno a si mesmo, um
retorno ao tempo anterior à emigração, uma retrospectiva. Nessa relação está o tempo
de ontem e o tempo do futuro; a representação de um e a projeção de outro são
estreitamente dependentes do domínio que se tem do tempo presente, isto é, do tempo
cotidiano da imigração presente. Quanto ao espaço, é preciso lembrar que ele é sempre
um espaço qualificado nostálgico, carregado de afetividade. Em todas as suas formas e
seus valores, em sua dimensão física ou geográfica e em suas outras qualificações
sociais, a terra natal é apenas metáfora espacial do espaço social. Por fim, a relação com
grupo evidencia tanto o da sociedade de origem, que foi deixado fisicamente, mas que
permanece, de uma maneira ou de outra, na memória, quanto o grupo da sociedade de
destino, ao qual é preciso impor-se, aprender a conhecer e dominar. Existir é existir no
tempo, no espaço e no interior de um grupo social;
Precisar os suportes teóricos que distinguem a maneira pela qual o tratamento dado pela
análise de redes aos fenômenos sociais, por conseqüência, à migração, do tratamento
dado pela investigação sociológica convencional é o que agora se impõe.
Uma rede consiste num conjunto de atores ou nós (pessoas, objetos ou eventos)
ligados por um tipo específico de relação. A diferentes tipos de relações, correspondem
redes diferentes, ainda que o conjunto de atores seja o mesmo5. A rede, porém, não é
conseqüência, apenas, das relações que de fato existem entre os atores; ela é também o
4
Para uma visão detalhada do surgimento e evolução da análise de redes sociais confira SCOTT (2000).
5
“... é improvável que, para o conjunto de trabalhadores de determinada empresa, a rede de conselhos, a
rede de amizade e a rede de autoridade sejam a mesma coisa” (KNOKE & KUKLINSKI, 1982: 12).
13
resultado da ausência de relações, da falta de laços diretos entre dois atores, do que
BURT (1992) chama de “buraco estrutural”6.
Vale lembrar que as redes podem ser compostas de atores de natureza diversa.
Num extremo, elas consistem de símbolos constantes em textos ou de símbolos
presentes em verbalizações; noutro extremo, de estados que integram um país ou de
países que compõem o sistema mundial. As redes podem, então, ser tão pequenas
quanto uma sala de aula do ensino fundamental, ou tão grandes, como o conjunto dos
países7 (HANNEMAN, 2001).
6
“Por exemplo, prestar atenção apenas nas conexões que se manifestam pela fofoca, em uma
comunidade, e não considerar os buracos estruturais, que resultam da ausência de ligações, pode levar a
um entendimento impreciso de como se espalham ou se evaporam os rumores” (KNOKE &
KUKLINSKI, 1982: 11).
7
A título de ilustração, poder-se-ia considerar, como exemplo de rede, o fluxo comercial de 50
mercadorias diferentes (café, açúcar, chá etc.) entre 170 países do sistema mundial, em determinado ano.
Nesse caso, os 170 países despontam como atores e a quantidade de cada mercadoria exportada de um
país para os 169 restantes, como a força do laço existente entre eles. (HANNEMAN, 2001).
8
“Se um pesquisador está classificando indivíduos em categorias sociais e descobre que uma de suas
variáveis não tem efeito sobre, por exemplo, a prática religiosa, ele ainda não pode concluir,
definitivamente, que sua variável não afeta a prática religiosa. Afinal, o agrupamento realizado pode
simplesmente não funcionar. Outros agrupamentos poderiam mostrar efeitos significantes” (DEGENNE
& FORSÉ, 1999:2).
14
atores: as relações dependem de contextos sociais específicos e são alteradas ou
desaparecem se um ator é removido da interação com outros atores (a relação
professor/aluno não existe fora do cenário escolar; a relação marital desaparece com a
morte de um dos cônjuges ou com o divórcio); os atributos permanecem em diferentes
contextos sociais (idade, sexo ou renda não mudam se o indivíduo está em casa, no
trabalho ou na igreja) (KNOKE & KUKLINSKI, 1982).
15
(1999:1): “...conjunto de métodos voltado para o estudo sistemático das estruturas
sociais”.
16
coagir suas práticas e representações; e há, também, uma gênese social dos esquemas de
percepção, pensamento e ação, constitutivos do campo de competências, que os
indivíduos utilizam para se movimentar no universo arbitrário de determinada
sociedade.
9
Elias, para dar conta do trânsito entre os constrangimentos estruturais e a prática constituinte dos
agentes, realiza, com o conceito de interdependência, esforço semelhante ao de Bordieu, com a noção de
habitus (ELIAS, 1994).
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O habitus corresponde, portanto, a estruturas mentais, por meio das quais os
agentes apreendem o mundo social; é o jogo social incorporado, transformado em
natureza; é a disposição regrada para gerar condutas regradas e regulares, à margem de
referência às regras. Conjunto de padrões adquiridos de comportamento, pensamento e
gosto, com traduções em diferentes domínios da prática, o habitus faz a ligação entre as
forças do coletivo e as práticas individuais (BORDIEU, 1990). Assim, com o social
inscrito no corpo, estaria o indivíduo habilitado a atuar num registro de semi-
improvisação, tornando coisa sua o que todos sabem pertencer a um fundo comum de
experiências.
18
Tal concepção da estrutura social10 liga-se, muito estreitamente, ao uso que dela
foi feito no campo antropológico pela tradição empirista, representada por
RADCLIFFE-BROWN (1973), ao mesmo tempo em que se afasta da noção mais
“abstrata”, defendida por LÉVI-STRAUSS (1980). Ao passo que Radcliffe-Brown
compreendia a estrutura social como a trama de todas as relações observadas numa
sociedade, em dado momento, que a identificava ao conjunto das próprias relações
sociais; Lévi-Strauss entende que “... as estruturas não são realidades diretamente
visíveis ou observáveis, mas níveis de realidade que existem além das relações visíveis
[...] e cujo funcionamento constitui a lógica mais profunda do sistema social”
(BOTTOMORE, 1988: 141). Neste caso, as relações sociais são a matéria-prima
empregada para a construção de modelos que tornam manifesta a estrutura social
propriamente dita: a noção de estrutura social não diz respeito à realidade empírica, mas
às elaborações teóricas capazes de dar sentido a essa mesma realidade (LÉVI-
STRAUSS, 1980).
10
A proximidade entre as noções de estrutura de Radcliffe-Brown e da análise de redes foi defendida,
inicialmente, pelo prof. do departamento de Sociologia e Antropologia da UFMG Leonardo Hipólito
Genaro Fígoli.
19
a análise de redes volta-se para os pressupostos do individualismo estrutural. De acordo
com este paradigma, os atores não são guiados, apenas, pelo auto-interesse objetivo,
mas também pelo auto-interesse subjetivo: a racionalidade absoluta do individualismo
cede lugar à racionalidade relativa. Assim, “... o homo economicus é capaz de
altruísmo; pode imitar seus vizinhos. O conformismo total é racional com a opção de
alguém que não busca se informar. Pode prevalecer, na decisão, o entendimento de que
é melhor errar junto, do que acertar sozinho” (DEGENNE & FORSÉ, 1999: 9).
i. “indivíduos atuam para alcançar seus objetivos, com base nas preferências
pessoais;
20
que consiste de todas as influências que escapam ao modelo” (DEGENNE & FORSÉ,
1999: 10).
Essa visão mais dinâmica do comportamento social não está de acordo com o
que se entende por sistema linear – fundamentado na compreensão de que a
interferência num dos componentes de qualquer sistema provoca alterações sistêmicas
proporcionais à intensidade dessa interferência – e sim, com o que é conhecido por
sistema não-linear – baseado no entendimento de que o conjunto de interações dos
componentes sistêmicos enseja equilíbrios instáveis: pequenas transformações num
desses componentes podem levar a drásticas mudanças de todo o sistema. A perspectiva
dos sistemas não-lineares apreende o mundo social como imensa rede de interações na
qual nada se pode definir de maneira absolutamente independente – as propriedades não
estão nos atores, mas entre os atores; o comportamento de qualquer ator é definido por
suas conexões com o resto do sistema.
Enfim, cabe conceber as redes sociais como sistemas não-lineares, abertos, que,
embora comportem regularidade/estabilidade, são suscetíveis de mudança, apresentam
plasticidade. Na sua instância objetivista, as redes constituem expressão formal da
estrutura social – regularidade nos padrões de relações entre atores concretos –, são
topologias de interação social, porque servem para uma análise de situação, uma análise
das posições relativas dos atores e das relações objetivas entre essas posições.
11
“Quando um sistema é perturbado, tem a tendência para manter sua estabilidade por meio de
mecanismos de realimentação negativa, os quais tendem a reduzir o desvio do estado equilibrado.
Contudo, essa não é a única possibilidade. Os desvios também podem ser internamente reforçados através
da realimentação positiva, em resposta a mudanças ambientais ou espontaneamente, sem nenhuma
influência externa. A estabilidade de um sistema é continuamente testada por suas flutuações, e, em certos
momentos, uma ou várias delas podem tornar-se tão fortes que impelem o sistema a passar por uma
instabilidade rumo a uma estrutura inteiramente nova, a qual será de novo flutuante e relativamente
estável. A estabilidade dos sistemas nunca é absoluta” (CAPRA, 1982: 280).
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8. CONCLUSÃO
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plausível da migração internacional, pois ela ocorre mesmo em regiões que não tenham
sido objeto de tais investimentos – como é, no Brasil, o caso de Valadares.
Cada uma das redes que integra certo ambiente social define-se por um tipo de
relação que a fundamenta; funciona como circuito de tráfego nesse ambiente, como
trajetórias relacionais possíveis que ligam certos atores (uma rede de amizades
comporta, por via de regra, poucos atores), fornece oportunidades e constrangimentos à
ação individual. Esta não é, portanto, uma ação “surrealista”; inscreve-se na pauta de
práticas sociais construída, é claro, socialmente – o ator serve-se de uma lista de
prováveis opções e faz a melhor escolha de acordo com os meios de que dispõe.
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tornam a migração provável: se o migrante potencial não estiver inserido na rede
migratória internacional, se a rede pessoal dele não abrigar os laços/conexões que
permitem acionar essa rede migratória é pouco provável que a migração se dê; é preciso
que o ator tenha os laços “certos” com os atores “certos”. Enfim, a migração
internacional depende do perfil das conexões/laços da rede social da qual toma parte
o ator; depende da posição estrutural que os fluxos “relacionais” conferem a ele
nessa rede social, isto é, a rede social da qual o ator participa deve comportar
vínculos que o inscrevam na rede migratória internacional para a consecução do
migrar.
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