MarizaRios Ebook
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E EDUCAÇÃO ECOLÓGICA
MARIZA RIOS
(ORGANIZADORA)
DIREITOS DA NATUREZA
E EDUCAÇÃO ECOLÓGICA
CASA LEIRIA
SÃO LEOPOLDO/RS
2024
DIREITOS DA NATUREZA E EDUCAÇÃO ECOLÓGICA
DOI: https://doi.org/10.29327/5392371
Organizadora: Mariza Rios
Revisão: Maria Elizabete de Sousa
Os textos são de responsabilidade de seus autores.
Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.
Arte da capa: Crásio Sérgio Vieira. Habilitado em Desenho pela Escola de Arte
Guignard da Universidade Estadual de Minas Gerais, atua principalmente nas
áreas de pintura e desenho, tendo uma criação voltada para a utilização de obje-
tos comuns como instrumentos de trabalho. Para conhecer mais obras, acesse o
Instagram @crasioart.
ISBN 978-85-9509-113-9
CDU 349.6(81)
Catalogação na Publicação
Bibliotecária: Carla Inês Costa dos Santos – CRB 10/973
DIREITOS DA NATUREZA
E EDUCAÇÃO ECOLÓGICA
SUMÁRIO
Prefácio ............................................................................................ 9
João Batista Moreira Pinto
Prólogo .......................................................................................... 13
Fernando González Botija
Introdução ..................................................................................... 19
Mariza Rios
Capítulo 1 – Educação ecozóica e racionalidade ambiental: da
cosmologia ao paradigma ecológico, uma jornada ecopedagógica
necessária ....................................................................................... 25
Adelaide Pereira Reis
Clarissa Carneiro Desmots
Edmilson de Jesus Ferreira
Juliana de Andrade
Marcos Alberto Ferreira
Paulo Vitor Mendes de Oliveira
1. Considerações iniciais ................................................................................ 25
2. Conhecer o cosmos para compreender-se como cosmos: vislumbres de uma
cosmologia da solidariedade cósmica .......................................................... 26
3. Ecopedagogia: ensinando a aprender o cosmos ........................................... 34
4. Racionalidade ambiental: o primeiro passo para a substituição da visão
antropocêntrica .......................................................................................... 39
5. Considerações finais ................................................................................... 44
PREFÁCIO
João Batista Moreira Pinto
O convite para prefaciar este livro foi motivo de alegria; pri-
meiro, pela proximidade temática entre o projeto dos Direitos Huma-
nos, meu tema fundamental de pesquisa, e a afirmação dos direitos
da natureza, perspectiva assumida e abordada pelo grupo de pesquisa
da professora Mariza Rios. Em 2022 trabalhamos essas duas temáticas
fundamentais no grupo de pesquisa originalmente denominado Direi-
tos Humanos como projeto de sociedade, e que, com a integração da Profa.
Mariza ao grupo, recebeu o adendo: ... e direitos da Natureza; grupo este
vinculado à pós-graduação da Dom Helder Escola Superior.
A maioria de nós – influenciada por uma formação moderna,
esta vinculada a uma racionalidade mais restrita e privilegiando um de-
terminado modelo de desenvolvimento – viveu até aqui sob um modus
de vida que negligenciou a correlação fundamental entre a vida humana
e a vida do planeta. Esse modelo civilizatório desconsiderou, buscou
ocultar ou aniquilar povos e culturas tradicionais como os indígenas
e os quilombolas, que vivem e buscam viver em proximidade com a
natureza, vinculando a esta suas tradições.
A cultura ocidental, por outro lado, ao adotar a crença no domí-
nio sobre a natureza, considerando-a simplesmente como matéria-prima
a ser explorada, visando o aumento do poder, econômico ou outro, só re-
centemente, nos últimos cinquenta anos, tem se deparado com uma na-
tureza que evidencia os limites dessa concepção, desse antropocentrismo.
A tentativa de subjugar a natureza nos conduziu a uma encru-
zilhada, a um “beco sem saída”, e a única alternativa plausível parece
ser retroceder, dar “marcha a ré” e buscar construir novos caminhos,
alternativas que sempre considerem o ambiente, a natureza. Onde se
reconheçam os limites do planeta diante dos modelos econômicos pre-
datórios, e, diante disso, sejam estabelecidos a partir de horizontes mais
amplos, baseados em maior participação social e coletiva, valorizando as
diversas culturas e saberes, mais próximos e integrados com a natureza.
9
10 Prefácio
* Pós-Doutor e Doutor em Direito pela Université de Paris X – Nanterre, França. Mestre em Filosofia
pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), Paris, França. Mestre em Direito pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis/SC, Brasil. Professor do Programa
de Pós-Graduação em Direito da Dom Helder Escola Superior (DHES), Belo Horizonte/MG, Bra-
sil. Líder do Grupo de Pesquisa “Direitos Humanos como projeto político de sociedade”.
DOI: https://doi.org/10.29327/5392371.1-2
PRÓLOGO
tivos que las razones por los que se aprobó esta ley fueron dos: Por un
lado, la grave crisis que en materia socio-ambiental, ecológica y huma-
nitaria viven el mar Menor y los habitantes de sus municipios ribereños;
por otro lado, la insuficiencia del actual sistema jurídico de protección,
a pesar de las importantes figuras e instrumentos de carácter regulador
que se habían ido sucediendo a lo largo de los últimos veinticinco años.
Para situar al lector hay que explicar que el ecosistema marino lagunar
del Mar Menor cuenta una superficie de 135 km2, la mayor laguna
costera del Mediterráneo español y una de las más grandes del Medite-
rráneo occidental. Aunque pueda parecer pequeña desde la perspectiva
latinoamericana en general, y brasileña en especial, dada la extensión
de las tierras del nuevo continente, se comprende mejor la importancia
del tema pese a su diminuta extensión desde esta óptica americana si
tenemos en cuenta la riqueza de sus valores ecológicos. Así, hay que
destacar el conjunto de todos sus componentes –la biodiversidad carac-
terística (hábitats, flora y fauna), el sistema hidrogeológico con el que
conecta y que conforma su cuenca vertiente, el fondo lagunar, el agua y
su salinidad, los humedales litorales. Todo ello ha venido sufriendo una
serie de presiones derivadas de la intensificación de usos desde la década
de los años 60 del siglo XX. Por otro lado se explica por el legislador
que junto a sus valores ambientales, el mar Menor es uno de los prin-
cipales elementos de identificación cultural de la Región de Murcia, y
despierta en todos los murcianos un fuerte apego emocional. Prueba de
ello es la creación de diversas plataformas ciudadanas que reúnen a aso-
ciaciones vecinales, organizaciones ecologistas, colectivos profesionales,
fundaciones culturales, etc., que reivindican medidas para recuperar y
proteger este ecosistema. Todos ellos el 30 de octubre de 2019 celebra-
ron en la ciudad de Cartagena una multitudinaria manifestación con
más de 55.000 personas, solicitando medidas para salvar el mar Menor.
Esto último motivó que, como confiesa el legislador, se diera un salto
cualitativo para adoptar un nuevo modelo jurídico-político, en línea
con la vanguardia jurídica internacional y el movimiento global de re-
conocimiento de los derechos de la Naturaleza. La norma efectivamente
quiere potenciar la democracia directa, en línea con la Declaración de
Rio de Janeiro sobre el Medio Ambiente y el Desarrollo, que ya avisaba
sobre el hecho de cómo los mecanismos democráticos, especialmente
de tipo directo, podían convertirse en un poderoso aliado para proteger
el medio ambiente de manera eficaz. Así, su principio número 10 esta-
16 Prólogo
son los que permiten gozar de una economía real frente a la falacia de la
economía financiera. La tercera parte aborda una temática igualmente
novedosa en el mundo ambiental como es la tocante al género y la raza.
Se trata de un capítulo muy recomendable por su originalidad y que
puede abrir en verdad muchos caminos de reflexión sobre esta materia.
Los capítulos cuarto y quinto tocan temas geográficamente sectoriales
mostrando una perspectiva más ligada al caso concreto. Así, el capítulo
cuarto se centra en el panorama de las políticas públicas en el municipio
de Santa Barbara frente a los derechos de la Naturaleza y el quinto el
caso de los derechos de la Naturaleza y sus defensores de los derechos
humanos amenazados por defender los pueblos y sus territorios en la
Amazonía. Finalmente, la obra se cierra con un capítulo dedicado a
la perspectiva de los saberes tradicionales, la salud y la sostenibilidad,
elementos todos ellos ligados a la calidad de vida ambiental que su pers-
pectiva como sujeto garantiza de la mejor manera posible.
En suma, se trata de un trabajo colectivo de investigación que,
una vez más, sirve de botón de muestra del alto nivel que alcanzan los
estudios de Derecho administrativo ambiental en Brasil, país puntero
en esta disciplina que nos vuelve a aportar un estudio de la máxima re-
levancia y actualidad. Por eso quiere llamar la atención de nuevo sobre
la importancia de trabajos de esta altísima calidad que nos permiten
concienciarnos sobre la suma violencia que se ejerce en ocasiones contra
la herencia medioambiental que nos dejaron las generaciones pasadas y
que nosotros tenemos el deber de legar a las generaciones futuras como
responsables ante Dios y ante la Historia.
INTRODUÇÃO
Mariza Rios
Mariza Rios*
1. Considerações iniciais
Partindo da constatação de nossa “insignificância” diante do
processo evolutivo do Universo e da vastidão cósmica, convidamos o
leitor à compreensão acerca da relação do ser humano com o Universo
e como essa relação é essencial para o futuro da própria espécie humana.
O problema aqui enfrentado se traduz no questionamento a respeito
do nosso lugar no universo e à necessidade de reavaliar a nossa relação
com a natureza, reconhecendo a interdependência, a interconexão entre
todos os seres, bem como a necessidade urgente de uma mudança de
paradigma da visão antropocêntrica para ecocêntrica. A questão-pro-
blema foi formulada da seguinte forma: como desenvolver processos de
7 A cosmologia é uma área da astronomia dedicada ao estudo da origem, estrutura, organização e evo-
lução do universo em seu todo. Está intimamente ligada à Física (do grego antigo: φύσις (physis)
“natureza”), ciência que investiga as leis do universo, a natureza e seus fenômenos em seus aspectos ge-
rais, com base no estudo da matéria e da energia em suas interações (relações e propriedades), as quais
possibilitam a existência do universo em sua forma dinâmica de ser. Assim, a Física busca a compreen-
são científica dos comportamentos naturais e gerais do mundo em nosso entorno, desde as partículas
elementares (microcosmo) até o universo como um todo (macrocosmo). Cf. ABBAGNANO, Nicola.
Dicionário de Filosofia. 6. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.
Capítulo 1 – Educação ecozóica e racionalidade ambiental: da cosmologia ao paradigma ecológico, uma
28 jornada ecopedagógica necessária
8 Cf. NOVELLO, Mario. Do big bang ao universo eterno. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2010, p. 68-93.
Adelaide Pereira Reis, Clarissa Carneiro Desmots, Edmilson de Jesus Ferreira, Juliana de Andrade,
29
Marcos Alberto Ferreira e Paulo Vitor Mendes de Oliveira
16 BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano, compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes, 1999;
BOFF, Leonardo. Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres. Rio de Janeiro: Sextante, 2004.
17 KAHN, Richard. Critical pedagogy, ecoliteracy and planetary crisis: the ecopedagogy movement. New
York: Peter Lang, 2010.
18 MISIASZEK, Greg William. Ecopedagogy: critical environmental teaching for planetary justice and
global sustainable development. New York: Bloomsbury, 2020.
19 PAYNE, Phillip. Ecopedagogy and radical pedagogy: post-critical transgressions in environmental
and geography education. The Journal of Environmental Education, 2017.
Adelaide Pereira Reis, Clarissa Carneiro Desmots, Edmilson de Jesus Ferreira, Juliana de Andrade,
37
Marcos Alberto Ferreira e Paulo Vitor Mendes de Oliveira
e vai além, no sentido mais profundo do que nós fazemos com a nossa
existência e qual lugar nos corresponde dentro do conjunto harmonioso
do cosmos.
Gutiérrez e Prado (2013) afirmam que educamos na medida em
que abrimos espaços de confiança como a atitude básica de relação, de
aceitação mútua, de harmonia comigo mesmo, de autorrealização pela
própria aceitação e pela aceitação do outro, de construção criativa pela
ruptura de aparências, pelo preenchimento dos vazios existenciais que
permita encontrar sentido a cada instante da nossa existência.
Sublinha-se que o outro não se refere apenas ao humano, mas
à natureza como um todo. A ideia da natureza como “outro” é um
conceito crucial na visão contemporânea que pretende redefinir nos-
sa relação com o ambiente natural. Tradicionalmente, a natureza tem
sido tratada como recurso, meio, ou objeto passivo a ser explorado e
utilizado para satisfazer as necessidades humanas. No entanto, deve-se
reconhecê-la como um sujeito em si mesma, dotada de valor intrínseco
e merecedora de respeito e consideração.
Essa mudança de perspectiva abre caminho para uma coexistên-
cia mais harmoniosa e equitativa com todas as formas de vida, reconhe-
cendo a interconexão e interdependência de todos os seres vivos e dos
ecossistemas que habitam. Logo, considerar a natureza como “outro”
implica uma mudança de paradigma, passando de uma visão antropo-
cêntrica dominante para uma perspectiva holística e ecológica em que o
meio ambiente é valorizado por si mesmo, e não apenas pelos benefícios
que podem proporcionar às sociedades.
Os espaços de construção de saberes promovidos pela Ecopeda-
gogia buscam desenvolver temáticas ao desenvolvimento sustentável,
relacionados às capacidades de promover a vida a partir da cotidianida-
de, com profundo respeito pela sabedoria da natureza, sincronizando
o nosso agir com as exigências de viver dos outros, respeitando a vida
em todas as suas formas, de agir eticamente, pois ao agirmos teremos a
preocupação das consequências de nossas ações sobre os outros.
A Ecopedagogia, conforme nos ensina Gadotti (2001), implica
em uma reorientação dos currículos no intuito de influenciar a estrutu-
ra e o funcionamento dos sistemas de ensino. Ela não é uma pedagogia
escolar, porque não se dirige apenas aos educadores, mas a todos os
habitantes da terra. A Ecopedagogia não está preocupada apenas com
a preservação da natureza, ela propõe um novo modelo de civilização
Adelaide Pereira Reis, Clarissa Carneiro Desmots, Edmilson de Jesus Ferreira, Juliana de Andrade,
39
Marcos Alberto Ferreira e Paulo Vitor Mendes de Oliveira
5. Considerações finais
Fomos conduzidos por uma jornada intrigante por meio da cos-
mologia, constatando-se nossa insignificância diante do vasto cosmo
e, simultaneamente, instigando a reflexão sobre nossa relação com a
natureza, nosso lugar e nossa função nela. Pudemos perceber o quão
importante é a cosmologia na compreensão da existência e evolução do
universo, considerando os vários modelos cosmológicos que têm mol-
dado nossa visão do mundo.
Exploramos a Ecopedagogia como um caminho para transfor-
mar a relação entre o ser humano e a natureza, baseado em um novo
paradigma cosmológico, no qual o ser humano não está separado do
meio ambiente, mas é parte intrínseca dele. Portanto, na busca de so-
luções para os desafios que a natureza enfrenta, é imperativo buscar
uma relação de respeito com a natureza, particularmente por meio da
ecologia profunda, integral.
A racionalidade ambiental oferece uma alternativa que pode ree-
quilibrar a relação entre os seres humanos e a natureza, servindo como
um paradigma para uma sociedade mais sustentável, embora não seja
uma tarefa fácil implementar essa transição. É essencial que a educação
ecológica, a participação popular e organizada sejam as bases para to-
madas de decisões nesse processo, considerando-se os diversos saberes
tradicionais em diálogo como as ciências. Assim, mecanismos como
debates, interdisciplinaridade do conhecimento, promoção da susten-
tabilidade, reconstrução das sociedades e o reconhecimento do valor
intrínseco de todas as formas de seres existentes são vitais para efetivar
o projeto de racionalidade ambiental.
Adelaide Pereira Reis, Clarissa Carneiro Desmots, Edmilson de Jesus Ferreira, Juliana de Andrade,
45
Marcos Alberto Ferreira e Paulo Vitor Mendes de Oliveira
Referências
1. Considerações iniciais
A contemporaneidade atravessa um período de crises ambien-
tais intensas com repercussões globais. Esse cenário é ilustrado pelo
crescente nível de degradação ambiental, que resulta em alterações pro-
fundas nos ciclos ecológicos, além de causar impactos diversos em toda
a biosfera.
Nesse contexto, torna-se crucial não apenas reconhecer a exis-
tência dessas crises que assolam a modernidade, mas também apresentar
alternativas. É imperativo que, dentro das ciências sociais, em especial
a Economia e o Direito, sejam explorados novos paradigmas capazes
de elucidar tais fenômenos, ao mesmo tempo em que se propõe solu-
ções viáveis. Deste modo, o presente estudo, parte de uma compreensão
acerca dos Direitos da Natureza para, através de uma intersecção com
a Economia, explorar novas alternativas para contornar as várias crises
da modernidade.
O estudo, de natureza descritivo-exploratória, almeja, simulta-
neamente, investigar a problemática apresentada e compreender como
determinado fenômeno social, econômico e jurídico se apresenta, por
meio da coleta de dados pautados no exame de arcabouço bibliográfico
e documental, com a adoção de importantes pesquisadores, em espe-
1 Lattes: http://lattes.cnpq.br/6245312154640357.
2 Lattes: http://lattes.cnpq.br/9559932633344098.
3 Lattes: http://lattes.cnpq.br/8688030165174788.
4 Lattes: http://lattes.cnpq.br/7677611470871462.
49
50 Capítulo 2 – Economia circular: um modelo econômico para a proteção dos direitos da natureza
cial Acosta (2022), Leff (2006), Boff (2012), Melo (2020), Hans Jonas
(2006), Coase (1988), Weetman (2019). Quanto à análise de dados,
utilizou-se a técnica qualitativa.
O artigo se estrutura abordando inicialmente, de forma abran-
gente, os Direitos da Natureza e a sua intersecção com a Economia. Em
seguida, o texto investiga a viabilidade do reconhecimento da natureza
como sujeito de Direito no ordenamento jurídico brasileiro. Por fim, o
texto investiga a importância da Economia Circular na busca pela pro-
moção dos Direitos da Natureza e de uma Nova Economia.
5. Considerações finais
Referências
1. Considerações iniciais
A destruição da natureza na sociedade capitalista e a invisibili-
zação e subordinação de pessoas racializadas e mulheres nas sociedades
racistas e patriarcais encontram raízes comuns, provém de uma cultura
que coloca uma parede entre os seres humanos e o resto dos seres vivos.
Esses grupos, assim como natureza e os animais, são objetificados, e es-
tão sujeitos ao controle de sua reprodução. Os seres não humanos, que
não se encaixam no estereótipo eurocêntrico de humanidade, e o meio
ambiente são tratados como objetos à disposição do ser humano e do
seu sistema para gerar lucro e benefícios próprios.
Há um vínculo entre a introdução da instrumentalização da na-
tureza e a introdução do conceito moderno de gênero e raça, que tem
como resultado a desumanização constitutiva da colonialidade do ser
(LUGONES, 2014). A partir de uma perspectiva interseccional, pode-
mos compreender esses diversos sistemas de opressão. Os não humanos
e a natureza estão sob o mesmo guarda-chuva da opressão do sistema
racista e patriarcal. É necessário protegê-los e dar-lhes voz como forma
de proteger as mulheres, assim como pessoas racializadas e outros gru-
pos subalternizados, das consequências dos danos ambientais.
O fenômeno da colonialidade atravessa e controla todas as es-
feras da vida e, de forma abertamente violenta, nega a humanidade
1 Lattes: http://lattes.cnpq.br/3644406714639533.
2 Lattes: http://lattes.cnpq.br/2539322540829653.
67
Capítulo 3 – A questão ambiental sob a perspectiva decolonial: questões de gênero e raça e contribuições do
68 antirracismo e do ecofeminismo
não é possível fazê-lo sem uma resposta sistêmica que desafie o patriar-
cado e busque superar as limitações coloniais.
Portanto, neste primeiro momento, objetiva-se proceder a essa
análise à luz da crítica feminista decolonial e do ecofeminismo, cujas
reflexões sobre o passado e o presente servem como um instrumen-
to crucial para traçar novos paradigmas de futuro. Contudo, não há a
pretensão de trazer essa visão como a única interpretação possível para
um problema que é complexo e sistêmico, mas, sim, pontuar mais uma
abordagem, que se unirá a tantas outras descritas neste livro, cada uma
com suas fortalezas e limitações, que se complementam para desenvol-
ver soluções sistêmicas.
O ecofeminismo parte do reconhecimento das conexões in-
trínsecas entre os seres humanos e a natureza (BELTRÁN, 2017). O
autor enfatiza a ideia de que somos seres interdependentes e ecode-
pendentes, destacando a necessidade de cuidado mútuo para garantir
a sobrevivência de todos (BELTRÁN, 2017). Essa abordagem visa
promover transformações sociais que abranjam a integralidade das
relações humanas e com a natureza (BELTRÁN, 2017) e mais, há a
convicção de que a natureza não humana é, também, um problema
feminista (WARREN, 1997).
A proposta transformadora do ecofeminismo tem suas raízes na
ênfase dada às bases materiais do cuidado e da sustentabilidade da vida
e na denúncia do sistema de dominação capitalista e patriarcal (BEL-
TRÁN, 2017). Nos países fora do eixo de desenvolvimento do Norte
Global, em famílias chefiadas por mulheres, elas são as principais res-
ponsáveis por gerir o capital ambiental que as rodeia e são as mais afe-
tadas pelo esgotamento de recursos naturais (ONU, 2021; WARREN,
1997). Desse modo, é necessário que a teoria ecofeminista enfrente se-
riamente os problemas da colonização na análise da opressão, porque
“com a colonização começa a dominação das mulheres e a dominação
da natureza” (SMITH, 1997, p. 22).
O fenômeno da colonialidade, por sua vez, permeia e controla
todos os aspectos da existência humana e, de maneira explicitamente
violenta, nega a humanidade de indivíduos ao estabelecer distinções
raciais, uma concepção introduzida pela modernidade/colonialidade, e
ao impor padrões dicotômicos de gênero. Até então o relacionamento
entre as sociedades pré-intrusão e a natureza era de convivência har-
Larissa Lauane Rodrigues Vieira e Luiza Aarestrup Rocha Ferreira Pinto 73
eles os negros, que tiveram que ocupar locais precários dentro da es-
trutura urbana.
Como visto anteriormente, o racismo se manifesta de diferentes
formas, sendo que a continuação de uma sistemática organizacional em
que o negro é excluído e criminalizado não diz respeito somente aos
corpos negros, mas também aos locais que estes corpos ocupam. Al-
berto Acosta afirma que a hierarquização de raças e a segregação “é um
problema de caráter ambiental, pois não se respeitam os ecossistemas e
territórios onde habitam povos e nacionalidades indígenas ou comuni-
dades negras” (ACOSTA, 2016, p. 146).
Nesse sentido, pode ser observado que a exploração ambiental e
a opressão do negro caminham juntas desde o período colonial, apenas
mudando de forma ao longo dos anos e tomando diferentes proporções
e consequências.
Como proposta de intervenção em relação a um sistema que,
em si mesmo, se retroalimenta no que se refere à hierarquização de
seres, Acosta sugere “a plurinacionalidade como exercício de democra-
cia inclusiva” (ACOSTA, 2016, p. 147). Isto é, a possibilidade de que
sejam levados em consideração diferentes saberes e diferentes olhares,
principalmente da perspectiva ambiental, podem tornar possíveis diálo-
gos que vão ampliar a proteção não somente de grupos marginalizados,
mas do próprio meio ambiente.
O conhecimento a que se refere não é somente os contidos em
quilombos, favelas e em outros grupos de predominância negra, mas
também aqueles pertencentes a outros grupos originários, tradicionais
e marginalizados. A plurinacionalidade se sustenta no diálogo entre di-
ferentes grupos e na possibilidade de que os mais diversos olhares sejam
considerados em prol do debate ambiental.
Como mencionado no decorrer do tópico, há uma relação entre
a inferiorização do negro e a precarização do próprio meio ambiente,
sendo perdida, no percurso colonial e pós-colonial, uma série de conhe-
cimentos ligados à natureza. No entanto, ainda há a possibilidade de
colaborações entre diferentes grupos e experiências, a fim de garantir
uma melhor coabitação entre humanos e natureza.
A decolonialidade, conjuntamente com o projeto plurinacional
e multicultural, atua nessa frente de romper com pensamentos eurocen-
trados e considerar produções e saberes contidos em países ex-colônias e
por povos que nestes lugares viviam ou ainda vivem. A ideia não é des-
Larissa Lauane Rodrigues Vieira e Luiza Aarestrup Rocha Ferreira Pinto 81
truir tudo o que foi construído durante toda a modernidade, mas, sim,
utilizar aquilo que for positivo para a proteção ambiental, observando
as contribuições de outros grupos sociais acerca da temática.
Ao considerar, portanto, as perspectivas de raça e gênero e os
impactos gerados em relação a mulheres e pessoas pretas, prioriza-se
uma maior participação dessas pessoas em decisões envolvendo questões
ambientais, já que são as mais prejudicadas por catástrofes e consequên-
cias da exploração desmedida proporcionada pelo colonialismo. Nessa
toada, o antirracismo ambiental e o ecofeminismo devem ser abordados
de maneira conjunta, representando diferentes olhares que atualmente
não são considerados na tomada de decisões.
4. Considerações finais
Ao longo deste capítulo, explorou-se o ecofeminismo decolonial
e o antirracismo ambiental como perspectivas cruciais para a compreen-
são e enfrentamento da crise ambiental que se inter-relaciona com as
crises econômica, institucional, geopolítica e civilizatória de uma pers-
pectiva sistêmica. Demonstrou-se como esses recortes são essenciais
para a formação de novos paradigmas que abordem não apenas os de-
safios ambientais, mas também questões de justiça social, igualdade de
gênero, antirracismo e decolonialidade.
Como apontado, existem dados que demonstram a vulnerabili-
dade de mulheres e pessoas pretas no que diz respeito a crises climáticas
e catástrofes ambientais, evidenciando que o feminismo e a luta racial
devem englobar, inclusive, pessoas interseccionalmente mais suscetíveis
a sofrerem os impactos referentes à questão ambiental. O ecofeminis-
mo possui relevância exatamente por possuir um olhar voltado para a
questão de gênero que não é amplamente considerado da perspectiva
ambiental.
Conjuntamente a isso, uma construção e enfrentamento do cha-
mado racismo ambiental evidencia um processo de invisibilização desde
o início da escravidão do negro e que ainda gera consequências para a
população preta em detrimento da realidade que ainda enfrentam por
estarem instalados em locais precários. Em ambos os casos, um olhar
decolonial é necessário para que diversos olhares sejam considerados
em relação ao aspecto ambiental, incluindo os daqueles que são mais
Capítulo 3 – A questão ambiental sob a perspectiva decolonial: questões de gênero e raça e contribuições do
82 antirracismo e do ecofeminismo
Referências
1. Considerações iniciais
Ante o atual contexto de crise ambiental e desastres decorren-
tes da atividade de mineração, o presente artigo se propôs a analisar
como a cidade de Santa Bárbara, integrante do quadrilátero ferrífero
no estado de Minas Gerais, vem lidando com a questão da preservação
da natureza, em especial do rio que leva o seu nome. A cidade de San-
ta Bárbara possui estreita relação com a atividade mineradora e, assim
como diversas cidades do Brasil, vive a “minério dependência” e o medo
da “lama-invisível”, expressão cunhada, principalmente, pela possibili-
dade do rompimento da barragem de Córrego do Sítio, pertencente à
mineradora AngloGold Ashanti e da barragem Sul Superior, situada na
cidade de Barão de Cocais, pertencente à mineradora Vale S.A.
É inescapável o fato de que a ameaça de um rompimento causa
danos psicológicos e sociais, bem como gera impactos negativos no sen-
timento de pertencimento e vivências nas comunidades próximas. No
que se refere à cidade de Santa Bárbara, a expectativa de rompimento
faz com que as experiências da população junto ao rio Santa Bárbara, já
afetado pelas ações humanas e, em especial, pela atividade mineradora,
1 E-mail: [email protected].
2 Lattes: http://lattes.cnpq.br/4299068320679771.
3 Lattes: http://lattes.cnpq.br/0768932367847653.
85
Capítulo 4 – No romper da mineração, panorama das políticas públicas do município de Santa Bárbara
86 frente aos direitos da natureza
I
O Rio? É doce
A vale? Amarga
Ai, antes fosse
Mais leve a carga
II
Entre estatais
E multinacionais
Quantos ais!
III
A dívida interna
A dívida externa
A dívida eterna
IV
Quantas toneladas exportamos
De ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos
Sem berro? (VILA DE UTOPIA, 2020)
Nesse diapasão, falar em mineração é, portanto, um vivenciar
de apagamentos de espaços de pertencimento, histórias, relações e o
reviver da promessa de uma nova era de desenvolvimento econômico
e, mais recente, de um desenvolvimento sustentável. “Uma sociedade é
um espaço e uma arquitetura de conceitos, formas e de leis, cuja verda-
de abstrata se impõe à realidade dos sentidos, dos corpos, dos quereres
e desejos” (LEFEBVRE, 2006, p. 198). O que o poeta já retratava no
final do século passado persiste nos tempos atuais e se reinventa com os
desastres ambientais. Para Aráoz (2020, p. 23) “a história econômica da
região parece representar tragicamente o mito de Sísifo, ‘condenada’ a
Meirilane Gonçalves Coelho, Renata Cristina Araújo e Rafaela Carvalho Coutinho de Oliveira 95
5. Considerações finais
Por meio da análise que este trabalho se propôs a debruçar,
constatou-se que a mineração tem grande ligação com o sentimento de
pertencimento da cidade de Santa Bárbara, estando intrinsecamente re-
lacionada à sua criação. Esse fato, por vezes, esconde outros aspectos de
suma importância para a população, como é o caso da proteção do rio
Santa Bárbara. Esse apagamento dos aspectos culturais, sociais, históri-
cos e do meio ambiente refletem na compreensão do Poder Público mu-
nicipal no momento da construção legislativa. Isso porque a mineração
Meirilane Gonçalves Coelho, Renata Cristina Araújo e Rafaela Carvalho Coutinho de Oliveira 101
Referências
José Boeing1
Jane Portella Salgado2
1. Considerações iniciais
O presente trabalho inicialmente visa relacionar os direitos hu-
manos e a dignidade da pessoa humana. A dignidade está positivada na
Constituição Federal (CF/88), porém o intuito é ir além e dizer que os
direitos humanos e os direitos da natureza encontram-se intimamente
interligados. Isso significa que o ser humano não pode estar separado da
natureza, assim como ambos – direitos humanos e da natureza – devem
ser respeitados e garantidos no mesmo patamar.
A inclusão dos direitos da natureza aos direitos humanos seria
uma forma de redirecionar o crescimento econômico e o progresso de
forma positiva. A degradação ambiental é um problema grave que colo-
ca em risco a vida do planeta e assim toda a vida humana. Dessa forma,
uma conexão maior entre os direitos da natureza e humanos é apontar
para o crescimento e desenvolvimento socioambiental.
Além disso, a presente pesquisa aprofunda a questão ambiental
quando trata da interdependência e da interligação entre os direitos
humanos, mas também na questão da solidariedade entre os povos e
em defesa do seu território, do seu habitat na casa comum para o Bem
Viver. Por meio dessa associação, o trabalho aponta para um caminho
de rompimento da visão antropocêntrica na perspectiva do reconheci-
mento da natureza como sujeito de direitos.
1 Lattes: http://lattes.cnpq.br/0021940658373367.
2 Lattes: http://lattes.cnpq.br/3732277480681354.
107
Capítulo 5 – Direitos da natureza e seus defensores e defensoras dos direitos humanos ameaçados por
108 defenderem os povos e seus territórios na Amazônia
4 Ver sobre o tema da soja na Amazônia, documento na FASE e CPT, a Palestra proferida por Sérgio
Scillesinger: O Grão que cresceu demais. Seminário com entidades do Baixo Amazonas. Santarém
2005. Ver também DVD do Greenpeace: o grão que cresceu demais. Disponível em: www.youtube.
com. Acesso em: 14 nov. 2014.
5 Sobre o assunto ver: Revista das Humanidades Ambiental. Disponível em: https://www.amazonia
latitude.com/2019/03/12/projeto-de-porto-da-embraps-ameaca-meio-ambiente-e-povos-tradicio
nais-do-lago-do-maica/. Acesso em: 21 out. 2023.
6 Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo 1°. Santarém: Diocese de Santarém, 2003, p. 2.
Capítulo 5 – Direitos da natureza e seus defensores e defensoras dos direitos humanos ameaçados por
114 defenderem os povos e seus territórios na Amazônia
que aprendeu com o pai. Mas como o pai não sabia ler nem escrever,
foi na escola que ele descobriu que o pai era explorado na venda da
seringa no comércio. A partir dessa constatação, Chico Mendes co-
meçou a defender a luta coletiva dos trabalhadores dos seringais. Em
1987 obteve a criação da primeira Unidade de Conservação, também
chamada de Reservas Extrativistas9.
A proposta de criação das Reservas Extrativistas e o desenvolvi-
mento sustentável na Amazônia nasceu como forma de resistência dos
seringueiros do Acre ao processo de expansão capitalista naquele estado,
tendo como pano de fundo a intrínseca e injusta estrutura fundiária ali
predominante. Do confronto entre a chegada da colonização capitalista
e o modo tradicional dos povos viverem na floresta, surgiu o movi-
mento do “empate”, que significa impedir, empatar uma atividade, no
caso, o desmatamento. Mas nesta luta em defesa dos direitos humanos e
direitos da natureza muitos foram assassinados como é o caso de Chico
Mendes no dia 22 de dezembro de 1988 em Xapuri, no Acre depois que
tinha feito a denúncia na ONU sobre as violações dos direitos humanos
e direito da natureza10.
Outra grande líder e ambientalista foi a Irmã Dorothy Stang
em Anapu, no Pará. Irmã Dorothy por mais de 30 anos viveu na região
da Transamazônica e dedicou quase metade de sua vida para dar voz
às comunidades rurais, defendendo o direito à terra e lutando por um
modelo de desenvolvimento sem destruição da floresta. Ela foi brutal-
mente assassinada no dia 12 de fevereiro de 2005. Sua luta foi em defesa
dos pobres migrantes nordestinos que ocuparam as terras públicas na
Transamazônica no município de Anapu. Ela replicava em suas pales-
tras uma frase que carregava consigo: “o fim da floresta é o fim de nossa
vida”. Também pode-se registrar atitudes da Irmã Dorothy quando já
estava ameaçada pelos fazendeiros. Muitos sugeriram que ela fosse em-
bora de Anapu. Mas ela dizia que não ia fugir, pois os pobres agriculto-
res tinham o direito sagrado de viver na terra e eles não tinham quem
os defendesse caso ela fosse embora. Essa é a consciência e coragem de
todos os defensores ameaçados diante das injustiças e impunidades na
Amazônia.
9 Ver sobre as Reservas Extrativistas e o desenvolvimento sustentável na Amazônia o livro de AN-
DERSON, Anthony et al. O destino da floresta: reservas extrativistas e o desenvolvimento sustentável
na Amazônia. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994.
10 Ver sobre os mártires e suas histórias em: THOMAS, Jennifer Ann. Inspiração: conheça ambienta-
listas que fizeram história. Guia do Estudante, 20/10/2021. Disponível em: https://guiadoestudante.
abril.com.br/dossie-verde/inspiracao-conheca-ambientalistas-que-fizeram-historia/.
José Boeing e Jane Portella Salgado 123
11 Ver documento que Adilson Vieira enviou ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Disponível em:
www.portalverdeonline.com.br/oalrinasloDiniao/irmadorotv.htm Documento ao Presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. FBOMS.
12 Relatório do Greenpeace. “Pará: Estado de Conflito”, lançado em outubro de 2003, disponível em:
chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://greenpeace.org.br/amazonia/pdf/
para_estadodeconflito.pdf. Ver também. Sérgio Sauer. Violação dos Direitos Humanos na Amazô-
nia: conflito e violência na fronteira paraense. Goiânia: CPT – Comissão Pastoral da Terra: Confli-
tos no Campo. Brasil. Goiânia: CPT, 2005
Capítulo 5 – Direitos da natureza e seus defensores e defensoras dos direitos humanos ameaçados por
124 defenderem os povos e seus territórios na Amazônia
todos os seres que com ele interagem ou dele dependem. Segundo a decisão,
o rio tem o direito de ‘manter seu fluxo natural’, ‘nutrir’ e ‘ser nutrido’, ‘exis-
tir com suas condições físico-químicas adequadas ao seu equilíbrio ecológi-
co’ e se relacionar com seres humanos em ‘suas práticas espirituais’, de lazer,
da pesca artesanal, agroecológica e cultural. (OLIVEIRA, 2023, [s.p.])
8. Considerações finais
Este estudo apontou para o conceito de meio ambiente que vai
além de conceitos ecológicos. O meio ambiente é onde o indivíduo está
José Boeing e Jane Portella Salgado 129
inserido, é um direito humano. Direito este que deve estar ao lado dos
direitos da natureza. Ponto de vista este defendido pelos povos originá-
rios e seus defensores. Os direitos da natureza, como demonstrou o tra-
balho, já estão positivados na Constituição do Equador e deve também
ser garantido na Constituição brasileira (CF/88). Outra questão levan-
tada pelo trabalho é que os defensores dos direitos da natureza precisam
e devem ter suas vidas protegidas por meio de políticas públicas. So-
mente com políticas públicas que lhes garanta proteção o seu trabalho
poderá deixar de ser criminalizado como muitas vezes também ocorre.
No entanto, essa política pública deve ser feita não como decreto que é
frágil, mas, sim, em forma de lei.
O estudo destacou que políticas públicas que tratem com se-
riedade o trabalho árduo que vem sendo realizado pelos defensores e
povos originários garantirá uma real democracia e vai muito além deste
aspecto porque garantiria a dignidade da pessoa humana. Dignidade
essa refletida no direito dos povos a lutarem pela conservação da natu-
reza e que com isto garantirá a continuidade da vida não só em uma
região, mas de todo o planeta. Falar em continuidade de vida é falar
também nas gerações futuras que estão ameaçadas quando é ameaçada
a natureza.
Desta forma, a pesquisa vai além da garantia de vida do ser hu-
mano, mas de todos os seres na garantia de sobrevivência de rios, ár-
vores, natureza de forma geral. Garantia de vida planetária que será
resguardada se conseguirmos chegar a um desenvolvimento sustentável
equilibrado. Equilíbrio este demonstrado aqui no equilíbrio entre direi-
tos humanos e direitos da natureza.
Na sociedade atual, vista como sociedade de Estado Social e De-
mocrático do Direito, os direitos humanos e sociais são essenciais para
a garantia do bem-estar físico das pessoas. Existe uma discussão inter-
nacional acerca da melhora de condições para a comunidade global que
é fator determinante para se chegar ao patamar dos direitos e garantias
entendidos atualmente como essenciais à humanidade. Logo, porque
não garantir justiça e direito a vida para aqueles que vivem para lutar
pela garantia de direitos da natureza como o fazem os defensores da
natureza?
O presente trabalho demonstrou casos práticos na justiça, po-
rém estes conseguiram resultados que podem ser aumentados se real-
mente o trabalho feito dia a dia pelos defensores da natureza e pelos
Capítulo 5 – Direitos da natureza e seus defensores e defensoras dos direitos humanos ameaçados por
130 defenderem os povos e seus territórios na Amazônia
Referências
1. Considerações iniciais
O Brasil é um país privilegiado em termos de biodiversida-
de, pois conta com uma variedade de biomas, como Amazônia, Mata
Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pampa e Pantanal. Esses biomas consti-
tuem um ambiente riquíssimo em se tratando de recursos naturais. “A
Amazônia, por exemplo, possui a maior diversidade de reserva biológica
do planeta, com indicações de que abriga, ao menos, metade de todas as
espécies vivas do planeta” (IBGE, 2023). Tamanha biodiversidade é um
dos fatores que contribuem para que o Brasil se destaque como um dos
países pioneiros na utilização da medicina tradicional popular.
A utilização da medicina tradicional popular no Brasil já data de
séculos, quando os povos originários se utilizavam das plantas medicinais
para tratar vários tipos de enfermidades. Eles detinham um conhecimen-
to extraordinário sobre a utilização dessas plantas e possuíam um sistema
de saúde próprio, estabelecendo uma relação harmoniosa e de muito res-
peito à natureza, pois sabiam que dependiam dela para sobreviver.
Os povos originários, indígenas ou não, têm uma relação dife-
renciada com a natureza, eles a resguardam e a preservam porque en-
tendem que os recursos naturais não podem ser explorados como se
fossem infinitos, como ocorre na sociedade capitalista moderna. Eles
1 Lattes: http://lattes.cnpq.br/8002686215025348.
2 Lattes: http://lattes.cnpq.br/5738083057094322.
3 E-mail: [email protected].
135
Capítulo 6 – Saberes tradicionais, saúde e sustentabilidade: uma análise das práticas integrativas e
136 complementares
4 Informações sobre a Rename e os fitoterápicos que ela abrange podem ser encontradas no site do Mi-
nistério da Saúde, disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/sectics/daf/pnpmf/
plantas-medicinais-e-fitoterapicos-no-sus#:~:text=O%20SUS%20oferta%20%C3%A0%20popu
la%C3%A7%C3%A3o,do%20uso%20racional%20dos%20medicamentos. Acesso em: 14 out.
2023.
Adriana Silva Lúcio, Alair Silva Nogueira Alves e Juliana Froede Peixoto Meira 145
5. Considerações finais
A partir do exposto neste estudo, observa-se que as plantas me-
dicinais se diferenciam dos remédios fitoterápicos. Entretanto, ambos
possuem uma ligação, são alternativas à alopatia e, além de tal caracte-
rística, possuem o condão de aproximar os usuários do modo de vida
praticado pelos indígenas e pela população tradicional.
O uso das plantas medicinais como forma de tratamento para
algumas doenças é fruto de uma característica secular realizada pelos
indígenas brasileiros e que muito foi apagada pelos colonizadores que
chegaram ao Brasil. Nesse sentido, ainda assim o conhecimento dos
efeitos delas continuou sendo repassado e, ao final do século XX, com a
promulgação da Constituição de 1988 e a criação do Sistema Único de
Saúde, o seu uso começou a ser institucionalizado.
Ante tal contexto, as políticas públicas como a Política Nacional
de Práticas Integrativas e Complementares e a Política Nacional de Plantas
Capítulo 6 – Saberes tradicionais, saúde e sustentabilidade: uma análise das práticas integrativas e
150 complementares
Referências
Mariza Rios
Coordenadora do Grupo de Pesquisa
Direitos da Natureza e Educação Ecológica