ASTRONOMIAECOSMOLOGIAcompleto Converted Merged
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All content following this page was uploaded by Marcos Cesar Danhoni Neves on 26 June 2020.
1
MARCOS CESAR
DANHONI NEVES
(Org.)
2
INTRODUÇÃO
A ideia desta obra é a de apresentar textos rápidos e que independam entre si
sobre astronomia e cosmologia, desde uma perspectiva não-usual. Fatos, conjecturas e
refutações se irmanam numa história não-linear, cheia de percalços e que construiu
uma visão de mundo que perdura desde a revolução copernicana de 1543.
O livro reúne trabalhos que foram apresentados em inúmeros eventos
nacionais e internacionais e/ou publicados em revistas científicas e derivados sempre
de atividades que envolviam práticas observacionais e reconstrução de instrumentos
de medida históricos. Há também artigos de epistemologia que envolvem a natureza
da ciência (os três últimos especialmente; incluindo um necessário trabalho sobre a
monumental síntese aristotélica), que foram apresentados em eventos na Itália
(Nápoles e Roma) e que recuperam o subtítulo ‘Conjecturas e refutações’, palavras-
chave para a compreensão da natureza e do progresso da ciência.
Quero agradecer aos coautores de muitos dos capítulos reproduzidos aqui.
Agradeço especialmente ao Warburg Institute da University of London, pelo acesso à
sua fantástica biblioteca; ao Observatório Capodimonte (Nápoles, Itália), por ter
publicado um dos capítulos durante um de seus eventos anuais; à Minnesota
University, pela cessão do trabalho sobre o ‘método da reprodução dos triângulos na
elipse’, apresentado por um dos autores durante o International Congress on History
and Teaching of Science; ao Dipartimento di Fisica da Università La Sapienza di
Roma; ao Istituto e Museo di Storia della Scienza, de Florença (Itália) e à
Pedagogical University of St. Petersburg (Russia) pelos vários textos editados.
Agradeço especialmente aos editores e revisores das revistas Caderno
Brasileiro de Ensino de Física, Revista Brasileira de Ensino de Física, Revista
Latino-Americana de Ensino de Astronomia, Revista Electrónica de Enseñanza de las
Ciencias, Apeiron Journal, Rivista Italiana di Didattica delle Scienze, Revista
Unifamma, Cadernos da Apadec, por terem publicado os trabalhos aqui reunidos.
3
Agradeço também aos editores: Roy Keys, do Canadá; Marco Mamone
Capria, da Itália e Cibelle Nascimento, do Brasil, por terem publicado três dos
capítulos aqui reunidos como trabalhos em anais de eventos internacionais.
Agradecimentos também devem necessariamente ser feitos às seguintes casas
editoriais por publicarem trabalhos anteriores que serviram de base para a presente
obra: Mercado-de-Letras, Editus, Papirus, Eduem e Livraria da Física.
Agradeço, enfim, aos amigos e familiares por terem compreendido tantas
horas preciosas ausentes e tantos poucos momentos profundamente compartilhados.
4
ASTRONOMIA DO FAZER: ALGUNS INSTRUMENTOS
ÚTEIS PARA A COMPREENSÃO DOS FENÔMENOS DO
CÉU E DA HISTÓRIA DA ASTRONOMIA
Marcos Cesar Danhoni Neves
INTRODUÇÃO
5
Toda ciência é compreendida e construída pelo aluno quando ela encerra dentro
de si um caráter prático. Mesmo os mais áridos campos do saber nasceram graças a
um caráter prático motivador. Não existe ciência fora de contexto ou ‘ciência etérea’.
Sendo, assim, este não é, ou não deveria ser, o caso da Astronomia, mas é exatamente
assim que ela é apresentada e ‘ensinada’ nas escolas (o verbo ‘ensinar’ encontra-se
aqui entre aspas porque ele, no atual contexto pedagógico, não indexa possibilidades
de compreensão, alijando o sujeito conhecedor de sua potencialidade em construir a
ciência).
Trataremos aqui de alguns aspectos da fenomenologia cotidiana do movimento
de certos astros, especialmente o Sol, a Lua e as estrelas. Discorreremos sobre a
regularidade de seus movimentos e de como essa regularidade pode nos conduzir à
elaboração e confecção de instrumentos de marcação de tempo (relógios
astronômicos). Para tanto, o trabalho discorrerá sobre a construção de relógios (ou
marcadores) solar, lunar e estelar, fornecendo, assim, instrumental para ser utilizado
tanto de dia quanto de noite, e de potencial pedagógico poderoso na Escola. Este
último comentário [a de que os marcadores poderão ser utilizados tanto de dia quanto
de noite] se dá porque, no senso comum, parece haver consenso de que o único astro
que pode nos indicar as horas é o Sol. Nada mais equivocado! Mas sobre isso,
veremos a seguir.
CONSTRUÇÃO DE INSTRUMENTOS
O RELÓGIO SOLAR
6
quais são impossíveis não somente a construção do dito instrumento como também
sua utilização prática.
O Sol nasce e se põe em diferentes posições do horizonte, nascente e poente,
respectivamente, ao longo do ano, caracterizando aquilo que definimos como estações
do ano: outono, inverno, primavera e verão.
As estações, hoje sabemos, devem-se à inclinação do eixo terrestre com respeito
ao seu plano orbital (ao redor do Sol). Isso pode ser facilmente demonstrado,
tomando-se uma bola de isopor (ou qualquer material) e fazendo-a girar ao redor de
uma lâmpada acesa. Perfurando a bola com um palito (atravessando-a), vemos que se
aquela não estiver inclinada, a incidência da luz será igual e uniforme ao longo de
todo o ano (giro - translação). No entanto, quando inclinamos ligeiramente (ou cerca
de 23°) a bola, vemos que a situação muda drasticamente, com diferentes incidências
de luz ao longo do giro. Podemos notar, inclusive, que, em certa posição, um ou outro
polo da bola não recebe nenhuma incidência de luz, configurando nos invernos
polares, como conhecemos por relatos.
Porém, a discussão acima se trata de uma abstração, pois não temos acesso a
uma observação que se realize acima do plano do sistema solar para se divisar essa
situação dinâmica. O que temos a fazer, pois, é descrever a fenomenologia do
‘movimento’ anual do Sol, especialmente sua posição nos horizontes leste e oeste (ao
falar em ‘horizontes leste e oeste’ não estamos querendo dizer ‘pontos cardeais leste e
oeste’ - é importante citar este fato, pois um dos erros frequentes no ensino de
Astronomia é a afirmação de que ‘o Sol nasce sempre a leste e se põe sempre a
oeste’). A figura 1 mostra como um observador veria as diferentes trajetórias do Sol
ao redor da Terra (adotando-se um referencial geocêntrico - Terra fixa no espaço) nas
diferentes estações do ano. Essas trajetórias são aquelas para um observador
localizado próximo ao Trópico de Capricórnio (para situações ‘extremas’, observador
ou no equador – figura 2 - ou nos polos – figura 3 -, a situação seria completamente
diferente).
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Assim, vê-se que no inverno (início ≈ 21/06), com uma trajetória bastante
inclinada, a duração do dia claro (ver o arco da trajetória do Sol acima do horizonte) é
inferior àquela da noite (arco noturno - abaixo do horizonte). Nos dias de outono e
primavera (respectivamente, 21/03 e 23/09), os arcos diurnos e noturnos são idênticos
(nos dias de início dessas duas estações) e, portanto, dia e noite são iguais, ou seja, o
Sol passa 12 h acima do horizonte e 12 h abaixo dele. No verão (≈ 21/12), temos uma
situação oposta àquela do inverno, com o arco diurno maior que o noturno, ou, o que
é a mesma coisa, com o dia claro maior que a noite.
Pela Figura 1, percebe-se que, quando o Sol se desloca do outono para o
inverno, há, após o início do inverno, uma ‘retomada’ do movimento para leste.
Assim, o Sol, que vinha se distanciando do ponto cardeal leste (no início do outono),
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pareceu, num dia (21/06), ‘estacionar’ e inverter sua posição novamente. Esse
‘estacionar’ remete à palavra latina sol statio, que originará a palavra ‘solstício’.
Portanto, as datas de início de inverno e de seu oposto, o verão, são denominadas de
datas de ‘solstício de inverno e solstício de verão’, respectivamente. As datas de
início de outono e primavera são conhecidas como datas de ‘equinócios’, pois dia e
noite têm duração idêntica e o Sol, nesses dias, percorre o equador celeste, que divide
a abóbada celeste em dois Hemisférios, Sul e Norte.
Um marcador solar pode se constituir numa simples vareta fincada no chão,
como já faziam os índios de Bornéu (ver figura 4). Esse marcador, conhecido pelo
estranho nome de gnomon (palavra que se origina da matemática e que tem a ver com
o cateto de um triângulo) não diz nada a respeito das horas do dia, mas é um
‘instrumento’ valioso para se determinar, com precisão, as coordenadas geográficas
locais. A Figura 5 mostra os padrões de sombras (uma vez que façamos unir todos as
pontas de sombra de um obelisco, por exemplo) para as quatro estações. Vê-se, pela
figura citada, que a linha das sombras nos equinócios (G-H, pela Figura 5) é uma
linha reta, enquanto as linhas de solstícios (E-F – solstício de inverno - e C-D –
solstício de verão) se dispõem simetricamente ao redor daquela última, formando
duas linhas hiperbólicas. Assim, temos um marcador sazonal (de estações) válido para
qualquer época do ano. Se tomássemos medidas dos comprimentos das sombras ao
longo do dia em intervalos pré-estabelecidos, de, por exemplo, meia em meia hora,
poderíamos encontrar a diferença que existe entre o meio-dia local (quando o Sol
cruza o meridiano central, ou, o que é o mesmo, a parte onde a abóbada celeste acima
de nós se divide em duas – nesse momento, a sombra do obelisco apresenta seu
tamanho mais curto) e o meio-dia do relógio (que estamos utilizando para registrar as
medidas do tamanho, ou, melhor dizendo, da ponta das sombras).
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Em uma cidade do sul do país, a diferença entre o meio dia solar (local) e
aquele do relógio (hora oficial do país) é da ordem de 28 min ou, o que é o mesmo, 7º
(já que 24 h correspondem a 360º - assim, 1 h ou 60 min equivale a 15o). Como
sabemos que a hora oficial (de Brasília) começa na longitude 45º (ver Figura 6 –
mapa-mundi com os diversos fusos horários), então, este valor, somado àqueles 7º,
fornecerão como longitude local (da cidade em questão), 52º.
Além de funcionar como ‘relógio’ sazonal e marcador da longitude local, o
gnomon pode fornecer ainda a ‘declinação magnética local’. Quando lemos a direção
Norte-Sul de uma bússola, devemos estar atentos ao fato de que esta direção não
coincide com as do Norte-Sul geográficos. Existe um pequeno ângulo entre as
direções Norte-Sul magnética e Norte-Sul geográfica. Esse ângulo é aquilo que se
convencionou chamar de declinação magnética local. Esse é um assunto complicado
no sentido de que a declinação sofre uma variação temporal e ninguém ainda sabe ao
certo o porquê desse fenômeno (ver linhas magnéticas na figura 7). Os polos Norte ou
Sul geográficos distam daquele magnético em cerca de 1.900 quilômetros (RONAN,
1982).
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Conhecendo agora os conceitos de hora local, hora oficial, longitude, estações
do ano, movimento anual do Sol, falta-nos aquele da ‘latitude’. Esta é a mais simples
das definições: trata-se do ângulo com que um observador na Terra vê o centro de
rotação das ‘estrelas fixas’. Hoje sabemos que nem as estrelas são fixas e nem estas
giram ao redor da Terra. No entanto, devemos lembrar que estamos adotando o
referencial geocêntrico: Terra imóvel no centro do Universo, com todos os demais
corpos girando ao redor dela.
Para nós, habitantes do Hemisfério Sul, esse é um procedimento bastante
simples, pois o centro de rotação (ou polo elevado Sul) está próximo a uma
constelação bastante conhecida: a do Cruzeiro do Sul. Para encontrarmos o polo
elevado, basta que projetemos quatro vezes e meia o ‘braço maior’ ou ‘poste’ da Cruz
(Figura 8). A projeção terminará num ponto onde se localiza o eixo imaginário que
corta a Terra de um polo a outro (ver Figura 9). Para encontrarmos, pois, o ângulo da
latitude local, basta tomarmos um transferidor e adicionar a ele um fio de prumo (ou
um pedra amarrada a um barbante – Figura 10). Ao inclinar o transferidor para
encontrar o polo elevado Sul, teremos o ângulo da latitude local. Para Maringá e
região, este ângulo é de cerca de 23,5º Sul.
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Estes são os ‘ingredientes’ para a construção de qualquer marcador de tempo
baseado seja no movimento do Sol, da Lua ou das estrelas. Para a construção de um
relógio de Sol, poderíamos discutir aqui inúmeras formas e escalas para as horas. A
Figura 11(a,b,c,d,e,f) mostra diversos tipos de relógios possíveis e que foram
utilizados durante a longa história da ciência e da técnica: (a) o de anel (com a escala
das horas na parte interna - a hora é marcada pelo raio de Sol que penetra por um
orifício, ao alto, disposto na parte oposta da escala); (b) o horizontal (ou relógio de
praça); (c) o vertical (ou relógio de parede); (d) o inclinante ou equatorial; (e) o
cilíndrico (ou relógio dos pastores); (f) o egípcio (que pertenceu ao faraó Tutmós), em
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forma de uma espécie de ‘T’; (g) o inclinante esférico auto-orientado (é um relógio
cujo eixo consiste de uma agulha magnetizada que se orienta com o campo magnético
terrestre; a auto-orientação se dá porque a esfera, em cujo interior está a escala das
horas, repousa sobre uma espécie de pote d’água). Os exemplos poderiam continuar
ao ‘infinito’, mas pararemos por aqui, pois o relógio, cujo princípio explicaremos, o
‘equatorial’ ou ‘inclinante’, é o mais simples de se construir, envolvendo, além de
uma geometria bastante simples, grande parte dos conceitos discutidos aqui.
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O relógio equatorial é um marcador solar que reproduz elementos da esfera
celeste. Ele possui um eixo orientado no sentido Sul-Norte (a parte superior indica o
polo sul elevado), inclinado no ângulo da latitude local (numa determinada cidade da
região Sul, cerca de 23,5oS). Perpendicularmente a esse eixo (que representa o próprio
eixo terrestre) está disposto o marcador com semicírculos desenhados na sua frente e
às suas costas. Esses semicírculos estão divididos de 15 em 15 graus, já que 1 h
15
corresponde a 15o. O mostrador da frente, ou mostrador austral, indicará as horas
(pela sombra do eixo) durante as estações da primavera e do verão (quando o Sol se
encontra posicionado na parte do Hemisfério Sul celeste). O mostrador traseiro, ou
‘mostrador boreal’, será usado para se ler as horas durante as estações de
outono/inverno. O relógio deve ser posicionado exatamente na direção Sul-Norte e
com o ângulo correto de latitude local. A Figura 12 apresenta os mostradores e a
forma de como orientar o relógio.
16
relógio (pela sombra do eixo no mostrador), adiantando ou atrasando de acordo com
os meses do ano.
17
da hora. Entre o ‘12’ (que indica a posição do Sol) e a hora existirá um ângulo.
Aponte os dois braços para essas duas direções diferentes. O arco metade, ou seja, a
mediatriz desse ângulo, fornecerá o Norte geográfico. Se sabemos onde está o Norte,
sabemos onde estão, por consequência, o Sul, Leste e Oeste. Esse método vale para
qualquer hora do dia e só falha em dia de chuva!
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O RELÓGIO NOTURNO ou ESTELAR
19
Quando batemos uma fotografia de longa exposição do céu noturno estrelado
(deixando o diafragma da câmara fotográfica aberto por um certo tempo – como as
fotografias de cartões postais noturnos, onde se veem, sobre uma avenida
movimentada, fachos contínuos de luzes vermelhas e amarelas, respectivamente, os
faróis traseiros de dianteiros dos carros que se deslocam em ambos os sentidos da
referida avenida), apontando a câmara fotográfica para a direção do polo sul elevado
(onde se encontra ‘cravado’ o eixo polar de ‘rotação’ do céu), o resultado que
obtemos é aquele mostrado na Figura 16. É como se pintássemos, no interior de um
guarda-chuva (Figura 17), pontinhos brancos, representando estrelas, e fizéssemos
girar o conjunto. O efeito é aquele da rotação no sentido Leste-Oeste das estrelas. Na
fotografia da Figura 16 vemos que há um ponto central, o próprio polo elevado sul,
que, como centro da rotação, permanece fixo. Nesse ponto, no Hemisfério Norte está
posicionada a estrela Polaris, ou Polar. Infelizmente, para nós, do Hemisfério Sul,
não temos uma estrela Polar Sul visível. Assim, para encontrar esse ponto, basta
repetirmos o procedimento já descrito de se prolongar quatro vezes e meia o braço
maior (ou poste) da constelação do Cruzeiro do Sul (ver Figura 8).
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Como as estrelas giram regularmente ao redor de uma Terra aparentemente fixa,
podemos usá-las como referenciais para a construção de um marcador de tempo. Os
egípcios já sabiam, desde a mais remota Antiguidade, que as estrelas giravam de Leste
a Oeste no período de 23h56m (período sideral). Eles marcavam certos eventos
observando o ‘nascer helíaco’ da estrela Sotis (Sírius – a estrela mais brilhante do céu
– aquela em que as ‘Três Marias’ sempre apontam). Esse fenômeno pode ser descrito
da seguinte maneira: sabemos que todo mês se muda a configuração do céu, ou seja,
existem constelações características que marcam os meses do ano (os signos do
Zodíaco se constituem no aspecto mais visível desse ‘fenômeno’). Isso se dá porque o
Sol se ‘desloca’ entre as estrelas, ‘atrasando-se’ em relação a elas cerca de 4 min (ou,
o que é equivalente, cerca de um grau) por dia. Portanto, o nascer helíaco da estrela
Sírius era quando, num amanhecer, segundos antes de o Sol nascer, aquela estrela não
era observada, mas, no dia seguinte sim, pois o Sol (hoje sabemos, pelo movimento
de translação terrestre – cerca de um grau por dia, ou 4 min - associado àquele de
rotação, de 23h56m) atrasara-se, em relação a ela, cerca de 4 min (dia solar de 24 h).
De posse dessas informações, podemos passar então à construção do marcador
de horas a partir do ‘movimento’ das estrelas. A Figura 18 mostra o relógio e a Figura
19 mostra suas partes constituintes. Trata-se de um círculo onde, concentricamente,
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estão localizados (de fora para dentro) os círculos: das horas do dia (de 1 a 24 h –
dispostos no sentido horário); dos dias dos meses (dispostos em intervalos de sete
dias e no sentido anti-horário); e, finalmente, o dos meses (de janeiro a dezembro,
dispostos também em sentido anti-horário).
22
Como no relógio de Sol, o mostrador e o ponteiro do relógio estelar podem ser
fotocopiados e ampliados. A montagem pode ser feita sobre uma haste de madeira,
com o conjunto (mostrador circular + ponteiro) fixados por um alfinete de cabeça. Em
determinadas épocas do ano, o Cruzeiro da Sul aparece no céu em tarda madrugada, o
que nos faz perder o referencial de leitura. No entanto, isso pode ser remediado
porque, quase diametralmente oposta à constelação do Cruzeiro, existe uma estrela de
brilho intenso, Achenar, que pode ser utilizada como marcadora (aqui, devemos
lembrar que o ponteiro não deve estar apontado para esta estrela – devemos imaginar
o braço do ponteiro como se projetando, ao longo de seu comprimento, até atingir a
referida estrela). Esse método garante o uso, durante todo o ano, desse útil marcador
das horas noturnas.
O ‘relógio’ lunar, talvez o mais impreciso dos relógios que descrevemos aqui, é
construído baseado sobre a observação de uma lunação completa, ou seja, de um ciclo
que vai de uma Lua Nova a uma Lua Nova.
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Sabe-se que a lunação dura 27,33 dias com respeito às estrelas ‘fixas’, porém,
durante aquele tempo, o sistema Terra-Lua moveu-se de 1/12 pelo movimento anual
ao redor do Sol. Portanto, o período total da lunação é de cerca de um mês, ou, mais
precisamente, 29,5 dias (período sinódico – intervalo entre duas conjunções
sucessivas, ou seja, de uma Lua Nova a uma Lua Nova).
A Figura 20 (a,b,c,d) mostra o ciclo completo da lunação. A Figura (a) mostra
as posições do Sol e da Lua na, assim chamada, fase de ‘Lua Nova’. O desenho
menor, no canto superior direito, mostra como a Lua seria observada no céu nas
primeiras horas da manhã, no horizonte leste. Assim, para efeito de construção de um
‘relógio’ baseado no movimento lunar, admitiremos, usando uma aproximação
relativamente grosseira, que, na Lua Nova, Sol e Lua nascem juntos (não com a Lua
diante do Sol; senão, teríamos um eclipse a cada manhã de Lua Nova!) às 06h00m
(esta é uma aproximação, pois sabemos que, nas diferentes estações, o Sol nasce mais
cedo – verão – ou mais tarde – inverno – que o ‘horário cheio’ de 06h00m).
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Depois de cerca de sete ou oito dias da Lua Nova, Figura (b), temos a
ocorrência da Lua Crescente (ou Quarto Crescente). O Sol está bem alto no céu (não a
‘pino’, pois este fenômeno só ocorre uma vez ao ano para quem se encontra sob os
Trópicos – como Maringá e vizinhanças), às 12h00m. Isso quer dizer que quando é
meio-dia, a Lua Crescente nasce no horizonte leste (e não exatamente no ponto
cardeal leste!), com a forma de um grande ‘C’ (para quem está no Hemisfério Norte, a
Lua Crescente tem a forma de um ‘D’).
Após 15 dias da Lua Nova, temos a ocorrência da ‘Lua Cheia’, quando o Sol se
põe no horizonte oeste, cerca de 18h00m. Nesse momento, a Lua aparece numa
posição diametralmente oposta, no horizonte leste, nascendo com seu disco
completamente iluminado, como mostra a Figura (c).
Passados cerca de 23 dias da Lua Nova, temos sua fase decrescente ou ‘Quarto
Minguante’, quando a Lua nasce no horizonte leste com a forma de um grande ‘D’
(no Hemisfério Norte, com a forma de um grande ‘C’). Nessa fase, a Lua nasce às
24h00m.
Portanto, conhecendo esses dados, em primeira aproximação, dispomos dos
elementos para, nessa regularidade de movimento, construir um marcador de tempo
baseado na rotação da Lua. Vamos chamar os quase 30 dias (e aqui iremos utilizar 30
dias exatos, como valor inteiro aproximado) de lunação, quando a Lua apresenta 30
fases (e não só as quatro mais conhecidas – Nova, Crescente, Cheia e Minguante), de
‘Idades’. Isso quer dizer que atribuiremos à Lua Nova a idade ‘zero’. A primeira Lua
após a ocorrência da Lua Nova terá idade igual a um, e assim por diante. Para as fases
de Crescente, Cheia e Minguante, teremos as idades de oito, 15 e 23, respectivamente.
O mostrador que construímos, baseado nos eventos descritos acima, encontra-se
ilustrado na Figura 21 e sua montagem, na Figura 22. Desenhamos sobre um grande
círculo (Figura 21c), 30 círculos menores, cada um representando as diferentes e
sucessivas fases da Lua. Para critério de divisão e de aproximação ao fenômeno,
desenhamos partes claras (iluminadas) e escuras (não-iluminadas) para distinguir uma
25
fase da outra. Assim, como exemplo, a Lua Nova é um círculo totalmente escuro,
enquanto o seu oposto, o círculo da Lua Cheia, é totalmente claro. Abaixo de cada
Lua, na Figura 21c estão escritos números, cada um correspondendo a uma idade da
Lua, contada sempre a partir da Lua Nova (Idade = 0). Essas Luas estão dispostas em
uma divisão angular de 12o em relação à Lua precedente. Isso porque, se a lunação
dura cerca de 30 dias, então 360o de um círculo completo dividido por 30 fornecem
como resultado o valor de 12o/dia. Esse é um fenômeno bastante interessante de ser
observado: ver o ‘atraso’ de 12o diário da Lua em relação às estrelas. Basta, para
tanto, observarmos a Lua e uma estrela próxima num determinado momento da noite.
Na noite seguinte, basta efetuarmos nova observação para verificarmos que a Lua,
com o auxílio de um transferidor ligado a um fio de prumo, atrasou-se em cerca de
12o, ou, o que é equivalente, em de cerca de 48-50 min.
Na parte externa do círculo que contém as diversas fases da Lua, estão dispostos
outros números, que correspondem às horas do dia (24 h). Esses intervalos estão
separados angularmente de 15o, uma vez que este é o resultado de 360o divididos
pelas 24 h do dia. À Lua Nova é indexada a hora 12, e à sua oposta, a Lua Cheia, a
hora 24.
Depois de construído esse mostrador, podemos recortar um círculo menor
(Figura 21b), para servir de ‘máscara’, ou seja, para mostrar somente uma Lua por
vez. O círculo foi decorado com um dragão de várias cabeças, retirado de um antigo
instrumento astronômico árabe.
Por fim, construímos um novo disco, que aqui batizaremos de ‘disco do
horizonte’ (Figura 21a), o mais externo, e que corresponde ao horizonte como o
vemos. Ele está decorado com um motivo que foi retirado de uma tapeçaria muito
antiga (que descrevia a chegada de um cometa). O horizonte deve ser recortado na
parte tracejada para que possamos ver a Lua que desejamos, localizada pela máscara
do disco intermediário.
26
A montagem do conjunto pode ser vista na Figura 22. Para ser usado, devemos
entrar com certos dados, especialmente a idade da Lua (não o dia do mês, como
muitos confundem!) e sua posição no horizonte. Assim, se entrarmos com uma idade
de, p.ex., 12 (no furo que deve ser recortado na cabeça do dragão do disco
intermediário), posicionando a Lua respectiva no círculo recortado (em tracejado na
Figura 21), leremos, no furo superior do disco mais externo, as horas respectivas que
a Lua estará no céu em diferentes momentos de seu movimento acima do horizonte.
Se posicionarmos a Lua de idade 12 no horizonte leste (notar no círculo mais externo
que, direcionando o centro do mostrador para o Norte geográfico, encontramos à
direita o ponto Leste (L), e, à esquerda, o ponto Oeste (O)), encontraremos como hora
do nascer da Lua o valor compreendido entre 15h30m e 16h00. Se deslocarmos a Lua
em 90o, ou seja, levando a Lua para a parte mais alta do céu (meridiano central),
veremos que isso ocorre por volta das 21h00 e 21h30m. Deslocando mais 90o, ou
seja, levando a Lua para o seu ocaso, leremos no orifício das horas os valores:
03h00m a 03h30m.
27
A TÍTULO DE CONCLUSÃO
28
Currículos idealizados e realidades sombrias povoam o cotidiano escolar. A
Astronomia é tida hoje como uma ciência da contemplação, do devaneio, quase do
descartável. No entanto, a título de exemplo trágico, devemos lembrar que, há cerca
de dez anos, um grave acidente aéreo matou mais de uma dezena de pessoas na selva
amazônica. Se o piloto do avião da VARIG, o Comandante Garcez, que havia
digitado um código errado no computador de bordo (o que acabou orientando o avião
para uma rota distante – em plena selva amazônica – daquela pretendida), soubesse
um mínimo de orientação astronômica (usando o Sol, as estrelas e mesmo os planetas,
como referenciais), a tragédia jamais teria ocorrido.
Falta educação integradora, multidisciplinar nas escolas! Porém, sobram
currículos desconectados da realidade. Nossas Universidades, como já dissemos na
‘Introdução’, que ‘formam’ biólogos, físicos, geógrafos, matemáticos e professores de
ciências, desconhecem a Astronomia em suas grades curriculares. As Secretarias de
Educação e Núcleos Regionais de Educação desconhecem programas de
recapacitação e, todos, professores e alunos, acabam compartilhando da mesma
cegueira coletiva: a do exílio da compreensão. Isso ocorre para a Astronomia, para as
ciências em geral e para o conhecimento como um todo. Falamos tanto em
‘construtivismo’, mas acabamos encarando-o, infelizmente, como mais um
‘modismo’ de época, esquecendo seu real e poderoso valor pedagógico na elaboração
criativa do pensamento científico.
Nas escolas, a Astronomia de posição e sua rica história, portanto, são
irremediavelmente ‘esquecidas’ ou evitadas. Passa-se de uma ilustração pobre do
geocentrismo ptolomaico para uma Astronomia heliocêntrica e física mal ensinada.
Há somente informação – vazia ou repleta de teores paupérrimos.
O que o presente artigo procurou ilustrar foi uma Astronomia instrumental, que
possui sua validade no cotidiano e que urge ser resgatada na Escola Fundamental. A
densidade dos temas aqui tratados poderá, num momento futuro, ser explorada com
temas correlatos. Por ora, para a compreensão efetiva do que aqui foi abordado,
29
devemos observar o céu, reconhecer seus referenciais e, especialmente, suas
regularidades. Assim, estaremos aptos a entrar no reino do espaço e do tempo e da
contemplação-compreensiva dos fenômenos e das maravilhas do céu diurno e
noturno.
REFERÊNCIAS
BRUTON, E. The history of clocks abd watches. New York: Crescent Books, 1989.
MELLA, F. A. La misura del tempo nel tempo. Milano: Ulrico Hoepli, 1990.
30
ROMANO, G. Introduzione all’astronomia. Padova: Franco Muzzio Editore, 1993.
RONAN, C. Los amantes de la astronomia. Barcelona: Blume, 1982.
31
A LONGITUDE REVISITADA
Introdução histórica
1
(a) (b)
2
embarcações, calmarias e, principalmente, tempestades levaram hordas e hordas de
navegadores para o fim trágico no mar imenso.
Para dar um exemplo, Colombo navegou, em sua célebre viagem de 1492,
seguindo uma linha reta ao longo do mesmo paralelo. Não quis se arriscar navegando
por entre os paralelos, pois as distâncias entre os meridianos, ou seja, nos intervalos
em longitude, variam e em muito, indo de aproximadamente 126 Km para cada grau
no equador terrestre e literalmente nada nos polos.
O problema da longitude foi resolvido após longa e árdua jornada científica e
técnica pela invenção de um método ou mecanismo que permitisse ao navegador
reajustar o tempo a bordo ao meio-dia local, consultando-o e comparando-o com o
tempo no porto de partida.
Christiaan Huygens inventou um relógio a pêndulo, bastante preciso, que
poderia ser levado a bordo para a comparação da hora local com a hora do porto de
partida. No entanto, o balanço do mar inviabilizava o isocronismo do pêndulo do
relógio, ‘destruindo-o’ como instrumento de medida.
Galileo Galilei idealizou um método a partir da observação (com o telescópio
que ele havia há pouco aperfeiçoado) dos períodos das órbitas dos quatro maiores
satélites de Júpiter e de seus respectivos eclipses, quando desapareciam atrás da
sombra do gigante do sistema solar.
O método de Galileo baseava-se na tradição de se procurar na precisão dos
movimentos celestes um ‘relógio’ seguro para ‘portar o tempo’. Antes do método do
sábio italiano, outros métodos astronômicos foram idealizados: observações mistas
das posições do Sol e de certas constelações do Hemisfério Norte e a observação do
movimento de nosso satélite natural: a Lua.
No entanto, mesmo que tais métodos funcionassem, seria impossível para um
marinheiro ajustar uma luneta astronômica a partir de uma posição (em geral, o
mastro) localizada sobre uma ‘plataforma’ instável (o próprio navio) e permanecer ali
por vários minutos (ou mesmo horas) para observar, por exemplo, os eclipses das luas
3
de Júpiter. Além do mais, o céu deveria apresentar longos períodos sem nuvens ou
tempestades, o que, no mar, seria obra de um acaso extraordinário.
O problema só foi resolvido quando John Harrison, em 1773, vence o prêmio
estabelecido pelo Parlamento Inglês no famoso Longitude Act (Lei da Longitude –
instituída em 1714!). Ele inventa relógios que podiam registrar, com precisão quase
absoluta, a hora verdadeira desde o porto de partida até qualquer ponto perdido do
planeta.
Os relógios de Harrison (ver Figura 2) eliminaram o problema da fricção, não
requerendo lubrificação e eliminando o problema da corrosão a partir da combinação
de metais (que compunham seus relógios) que se expandiam ou retraíam-se com as
variações de temperatura, mantendo o andamento do relógio sem atrasá-lo ou retardá-
lo.
(b)
(a)
4
Harrison, após longa e duríssima batalha contra os astrônomos reais, conseguiu
levar o tão merecido e sonhado prêmio, embolsando uma quantia de vinte mil libras
esterlinas, ou, modernamente, doze milhões de dólares!
5
Livro VII – Índia, Sinai, Ceilão e áreas adjacentes. Sumário do mapa do mundo.
Descrição da esfera armilar, incluindo o mapa da Terra habitada. Sumário das divisões
regionais;
Livro VIII – Breve observação dos 26 mapas regionais.
6
Figura 4
Com exceção de três paralelos, todos os outros paralelos ao Norte do equador eram
localizados teoricamente. As três exceções eram:
Méroe – localizava-se a mil milhas abaixo da cidade de Alexandria e a trezentas
milhas da zona tórrida;
Siene (atual cidade de Assuan) – localizava-se sobre a linha do Trópico de Verão
(Trópico de Câncer);
Rhodes – a cidade de uma das sete maravilhas do Mundo Antigo, o ‘Colosso de
Rhodes’, localizava-se a 36° Norte (ver Figura 5).
No mapa de Ptolomeo, o Oceano Índico é representado como um mar fechado. Esse
fato determinou a profunda hesitação dos marinheiros sobre uma hipotética ideia de
contornar o continente africano. Assim, a rota asiática, a oeste, era uma meta mais factível,
segundo a visão antiga.
A Figura 6 mostra que Ptolomeo, querendo evitar a deformação da projeção planar,
modifica sua projeção inicial e idealiza uma ‘Segunda projeção’, em que os meridianos são
curvos e convergentes. Para Ptolomeo, tal representação conferia aos meridianos a
aparência que tinham sobre a esfera terrestre.
7
Figura 5
Figura 6
8
Para resolver o problema da longitude, basta realizarmos um experimento bastante
simples: o gnômon solar (ver Figura 7) ou a observação da sombra produzida por uma
estaca fincada verticalmente no chão.
O experimento consiste em se marcar a ‘cabeça’ da sombra da estaca a cada
intervalo de tempo constante (p.ex., a cada meia hora), usando a hora legal fornecida pelo
relógio de pulso.
Figura 7
A Figura 8 mostra as sombras produzidas por uma estaca ao longo de uma manhã e
tarde (das 10h00min às 14h00min) de um dia de inverno. Mentalmente, poderíamos traçar
uma linha que passasse por todos os pontos que representam a ‘cabeça’ das sombras: a
figura obtida seria aquela de uma hipérbole.
Se tomássemos um compasso, com uma abertura qualquer, e centrássemos sua
agulha na posição da base da estaca, riscaríamos a curva hiperbólica em dois pontos (A e B
da Figura 9). Reposicionando a agulha do compasso sobre essa duas posições (A e B,
respectivamente), obteríamos a mediatriz dessa curva (ponto C da Figura 9). Unindo o
ponto da base da estaca ao novo ponto encontrado (C), teríamos uma linha reta que corta a
hipérbole. Essa linha é aquela correspondente ao meridiano local, ou seja, à linha Norte-
Sul. Sobre essa linha se encontra a menor sombra do dia, pois é quando o Sol cruza do
meridiano central do lugar.
9
Figura 8 Figura 9
Sabemos que uma hora (=60min) equivale a 15°, como vimos anteriormente.
Assim, através de uma regra de três simples, chegamos à conclusão que a cidade está na
longitude 52°, já que,
15° → 60 min
x → 28min
x = 7°
10
Longitude de cidade = 45° + 7° = 52°
O experimento do gnômon é bastante simples, mas muito rico nas informações que
pode proporcionar (linha Norte-Sul, declinação magnética local, marcador horário sazonal,
longitude local). Além de tudo, esse experimento nos conduz a um debate que hoje está
ausente em salas de aula e em nosso cotidiano: a da obtenção de um sistema de orientação
que determinou a aventura humana rumo ao desconhecido e ao sublime universo das
descobertas geográficas e de suas engenhosas e poderosas representações cartográficas.
Referências
11
DETERMINAÇÃO DIDÁTICA DA
DURAÇÃO DO DIA SIDERAL
Introdução
O objetivo aqui é demonstrar um método didático para a determinação do
dia sideral. Porém, antes de tratar do método propriamente dito, é necessário
termos em mente algumas definições para a clara interpretação dos dados obtidos
pelo conjunto de observações.
Algumas definições
1
Figura 1: Estrelas girando ao redor do polo elevado Sul
2
Figura 3: As setas indicam o sentido de rotação aparente das estrelas ao redor do polo
celeste Sul
Dia solar
Já o dia solar, que é o tempo gasto pelo Sol entre duas passagens
meridianas sucessivas, é um pouco mais longo. Isso é pelo movimento de ‘recuo’
aparente do Sol em relação às estrelas. Porém, o Sol não tem velocidade constante
na eclíptica (inclinada de 23,5o em relação ao equador e que contém a ‘órbita
solar’), fato caracterizado pela desigualdade da duração das estações do ano; se a
velocidade não é constante, o Sol verdadeiro não é, pois, um bom relógio. Para
‘remediar’ esse inconveniente, criou-se, então, um ‘Sol médio’, ou seja, um Sol
imaginário que percorre o equador celeste com movimento uniforme, no sentido
para Leste, com a média da velocidade do Sol verdadeiro na eclíptica. A duração
desse percurso num dia é, por definição, de 24 h. Nossos relógios estão regulados
com este tempo.
3
O propósito é determinar, ao longo de observações diárias, o momento
preciso em que as duas estrelas, α1 e β da constelação do Centauro, encontram-se
simultaneamente sobre uma perpendicular ao horizonte local, fazendo uso de
recursos facilmente disponíveis, simplificando ao máximo a tomada de medidas
para as observações sucessivas. Essa simplificação é essencial ao objetivo
inicialmente proposto: tornar o método que desenvolvemos o mais didático
possível.
Essas medidas foram realizadas com o auxílio de um barbante (fio de
prumo) e o horário do acontecimento foi medido mediante um relógio digital de
pulso.
O relógio teve sua hora comparada com a hora oficial, que era aferida
através da estação Rádio Relógio Federal ZYZ 20, ondas curtas (4905 Kc –
retransmissão direta dos sinais do Observatório Nacional do Rio de Janeiro).
Nessa aferição utilizamos um rádio relógio comum (de cabeceira) com faixa de
ondas curtas.
A simplicidade do instrumental confronta-se com a riqueza de resultados
que podemos obter das diversas observações. Porém, antes de passarmos aos
resultados propriamente ditos, devemos discutir um fenômeno que contribui para
melhorar a precisão das medidas. É o problema da ‘sensitividade direcional da
retina ou efeito Stiles-Crawford’.
1
A α do Centauro é a estrela mais próxima da Terra depois de nosso Sol. Sua distância é de cerca
de 4,5 anos-luz, ou seja, cerca de 43 trilhões de quilômetros do sistema solar.
4
deslocamentos das observações efetuadas podem causar drásticas mudanças na
configuração dos raios marginais emergentes, como pode ser visualizado pelo
esquema da Figura 4b.
5
Figura 5: Eficiência luminosa na retina
Resultados obtidos
2
A utilização de um barbante com um diâmetro um pouco menor que o diâmetro da pupila durante
a observação noturna é aconselhável a fim de se utilizar prioritariamente os raios marginais.
6
A tabela 1 apresenta o dia e o horário em que as estrelas α e β do
Centauro se encontraram simultaneamente sobre uma perpendicular ao horizonte
local.
7
Figura 7: Direção dos raios incidentes conforme Figura 4b. No desenho menor, região do
gráfico da Figura 5 para a eficiência luminosa no caso ilustrado acima
Gráfico 1: Obtido para o cálculo da diferença entre o dia solar médio e o dia sideral
8
Uma consulta à bibliografia especializada fornece como correto o valor
de 3min56,55seg (236,55 seg).
Se levarmos em consideração a imprecisão do instrumento de medidas (o
relógio digital) e o efeito Stiles-Crawford, o cálculo do erro indica que a medida
foi afetada em cerca de 0,5%, fornecendo como resultado (237,0 ± 1,0) segundos.
Tal resultado encontra-se dentro de um rigor científico bastante razoável.
Conclusão
Do que foi exposto, podemos perceber que uma experiência desse gênero
possui grande valor didático, haja vista a diversidade de temas ligados a conceitos
astronômicos que podem ser explorados.
A observação do movimento estelar nos leva inevitavelmente ao conceito
de ‘tempo’: ano, dia solar, dia solar médio, dia sideral, etc. Assim, num ‘correr de
olhos’ pela História da Ciência, poderíamos fabricar um instrumento de medida de
tempo baseado no movimento das estrelas. Este instrumento, um relógio noturno,
encontra-se descrito com riquezas de detalhes em Felli (1982). Trata-se da
construção de uma réplica de um relógio de 1568. Porém, ele foi construído para
ser utilizado no hemisfério Norte (tendo como referências a estrela polar e as
estrelas α e β da Ursa Maior). Como mostramos no Capítulo 1 (Astronomia do
fazer), a construção de um relógio desse gênero é muito fácil para o hemisfério
Sul, desde que se usem as estrelas α e β do Centauro.
A importância didática deste capítulo deve-se, também, ao planejamento
de uma experiência quantitativa simples que pode ser desenvolvida no Ensino
Médio (e até no Ensino Fundamental) e que, apesar de sua simplicidade, com a
utilização de equipamentos baratos ou facilmente encontráveis no mercado, não
perde o rigor da precisão científica, como observado na seção anterior.
Referências
9
ENOCH, J. M. Optical properties of the retinal receptors. Journal of the
Optical Society of America 53, 71, 1963.
FELLI, M. L’Orologio notturno. Firenze: Edizioni Arnaud e IMSS, 1982. Formatado: Português (Brasil)
10
1
Introdução
1
Este sistema ainda é muito utilizado, especialmente em situações práticas de navegação marítima
astronômica, agrimensura, etc., apesar dos modernos, mais rápidos e mais precisos métodos de
orientação, como o GPS.
3
(a) (b)
Figura 2: (a) modelo elíptico heliostático; (b) modelo elíptico geostático
A segunda lei de Kepler (ou ‘Lei das Áreas’) foi prenunciada, por assim
dizer, por Ptolomeo ao estudar o movimento do Sol a partir do ponto equante
(punctum aequans).
O ponto equante é o ponto conjugado ao longo da linha afélio-perihélio
(figura 4), na circunferência descentrada em R . ε, mas do lado oposto ao local
ocupado pela Terra, afastado também da distância R . ε, em torno do qual a
‘velocidade angular do Sol é constante’ e igual a 2π/T, sendo T o período de um
ano orbital terrestre = 365,25 dias ou um ano.
Por essa descrição temos duas leis aproximadas, muito simples de serem
tratadas geometricamente: a da circunferência descentrada, que descreve a ‘forma’
da órbita aparente do Sol, e a do ponto equante, que descreve a velocidade do Sol
numa órbita. Essas duas ‘leis’ substituem as duas primeiras leis de Kepler.
Redução ao Centro
Figura 8: Amplitudes
2
No caso geocêntrico é mais apropriado se ‘rebatizarem’ estes dois pontos de, respectivamente,
apogeu e perigeu.
12
sobre a eclíptica ec, têm o mesmo período, 365 dias, para realizar uma volta
completa ao redor da Terra. Não levaremos em conta nessa correção as variações
do Sol verdadeiro ao longo de seu percurso sobre a eclíptica, porque já foram
consideradas na correção C1. Consideraremos então o Sol médio na eclíptica,
ec, e que terá o mesmo período que o , mas animado com velocidade
uniforme.
tg α ( eq ) = cos i . tg L ( )
I = 23°27’ ; cos i = ,091706
α( eq ) = tg-1 [cos i . tg L ( )]
C2 = α ( eq ) -α( )
L( eq ) = (2 π ND / 365) = K x ND (L em radianos)
ou,
ou .
Lembremos que
α( ) = (2 π ND) / 365
Analisando a função
C2 = tg-1 (cos i . tg L) – L (ver figura 12),
3
A trigonometria esférica foi desenvolvida antes da plana.
16
vemos que esta equação é para valores de i < 25°; o que se assemelha muito
com a função harmônica proposta, com amplitude de 9,9 min. Portanto,
Conclusão
ET = C1 + C2
4
Vemos que C1 é zero – dia 03 de janeiro e C2 é zero no dia 22 de dezembro – solstício de verão –
ambos crescendo positivamente para dias seguintes. Então C1 e C2 deverão ser somados, levando-
se em conta esta defasagem,
C1 ⇒ n – 3 = s , em que n é o número de dias transcorridos,
C2 ⇒ n + 9 = w, desde o começo do ano.
C1 = + 7,7 . sen [(2 π s) / 365]
C2 = + 9,9 sen [(4 π w) / 365]
ou
C2 = tg-1 [cos (π i )/180 . tg L] – L
(i = 23°27’) e L = (n . 360) / 365
17
APÊNDICE
PROGRAMA EM Q BASIC
CLS
Calcula as duas componentes da equação do tempo e a sua soma, ET, com
aproximação menor que 1 min.
INPUT “Entre com o número de dias do mês ”, dm
INPUT “Entre com o número do mês ”, m
F m = 1 THEN D = 0
F m = 2 THEN D = 31
F m = 3 THEN D = 59
F m = 4 THEN D = 90
F m = 5 THEN D = 120
F m = 6 THEN D = 151
F m = 7 THEN D = 181
F m = 8 THEN D = 212
F m = 9 THEN D = 243
F m = 10 THEN D = 273
F m = 11 THEN D = 304
F m = 12 THEN D = 334
Ri = D + dm
Pi = 3.1416
LINE (0, 224)-(640, 224), 15
FOR n = 0 TO 33
LINE (0, n * 14)-(640, n * 14), 3
NEXT
FOR q = 0 TO 33 STEP 5
LINE (0, q * 14 + 14)-(640, q * 14 + 14), 14
NEXT
LOCATE 1
PRINT “+15”
LOCATE 6
PRINT “+10”
LOCATE 10
PRINT “+5”
LOCATE 14
PRINT “0”
LOCATE 19
PRINT “-5”
LOCATE 23
PRINT “-10”
LOCATE 28
PRINT “15”
N=1
18
4
w=n+9
s=n–3
a = -7.7 * 14 * SIN (2 * pi * s / 365 ) + 224
PSET (n * 1.5 + 40, a), 3
b = - 9.9 * 14 * SIN (4 * pi * w / 365) + 224
PSET (n * 1.5 + 40, b), 2
PSET (n * 1.5 + 40, (a + b) - 224), 14
N=n + 1
F n = R THEN GOTO 10
GOTO 4
10 PRINT “ dia”; dm; “ mês”; m
END
L = Pi * s / 180
B = ATN (COS (Pi * 23.5 / 180) * TAN (L)) - L
B = B * 57.2 * 4
D = - 9.9 * SIN (2 * L)
PRINT s, B, D, B - D
NEXT
19
20
APÊNDICE MATEMÁTICO
y – y* = y – ky = (1 – k) y
M = tg-1 (k tg L)
M – L = tg-1 (k tg L) - L
M = tg-1 (k tgL)
(y – y*)/ (M – L) = dy/dL
(1 – k)y / (M – L) = dy/dL
(1 – k) = (M – L) dy/dL, para ∆L , M-L é pequeno.
M – L = (1 – k) y / (dy/dL)
21
M = L + [(1 – k) y / (dy/dL)]
Então,
M = L + 0,042 sen2L
K = 0,917
1 – k = 0,083
(1 – k)/2 = 0,042
( 1 – k ) / 2 = ( 1 – cos i) / 2
(1 – cos i ) / 2 = sen2 (i / 2) 5
da fórmula,
5
Coleção Schaun– 5.53, em que sen2A = (1/2) (1 – cos2A) ; A = ½ ; sen2 (i/2) = (1/2) (1 – cos i)
22
Para I = 23,5
M – L = 0,041469 sen 2 L6
Apresentação da ET
ou
ou
Tempo ET
01/1 + ----
02/1 + ----
03/1 + ----
04/1 + ----
Mais uma correção deve ser feita para a obtenção da hora média legal, hora
oficial que corresponde à hora no meridiano central do fuso horário.
Essa correção de ± 4 min de tempo para cada grau de longitude, Oeste ou
Leste de afastamento do local do relógio de sol, com o meridiano central do fuso
horário que determina a hora oficial.
O meridiano central de uma zona é múltiplo de 15° a partir do meridiano de
Greenwich, tomado como origem das longitudes.
26
Referências
1. Introdução
o céu (astrofotografia) de forma simples e que pode servir como suporte razoável para
o ensino de Astronomia no nível Fundamental (5ª a 8ª séries) e no Ensino Médio.
Para tal fim, podemos utilizar uma analogia com um caso conhecido de ensino
de Física. Um professor dessa disciplina, quando pretende ensinar aos seus alunos
sobre lançamento de projéteis, normalmente desenha a trajetória no quadro e se
apropria das imagens do livro didático. O problema é que, nesse caso, os alunos não
têm contato nenhum com a tridimensionalidade da situação. Há praticamente um
‘exílio’ da situação real. Quando um professor realiza, com seus alunos, experiências
práticas com lançamento de projéteis, esses alunos passam a ter contato direto com a
situação, tornando a atividade um fato ‘palpável’, concreto.
Como o ensino de Física envolve muita subjetividade, seu aprendizado, na
escola atual, é sempre realizado de forma teórica, desmotivante. Quando utilizamos
experimentos, simulações, softwares e outros recursos do gênero no ensino de Física,
transformamos essa subjetividade em um tipo de objetividade que pode colaborar, de
forma mais eficaz, na aprendizagem dos alunos. Com a Astronomia não é diferente.
Os astrônomos estudam objetos que estão a milhões ou bilhões de quilômetros de
distância (sistema solar) e objetos que estão a milhares, milhões e bilhões de anos-luz
de distância (galáxia e aglomerados de galáxias). Motivar as pessoas a estudar ou
analisar objetos que estão a distâncias inimagináveis para os padrões humanos é
tarefa muito árdua. Como, então, estudar esses objetos tão distantes sem o uso de
fotografias, que tanto encantam e motivam o interesse pela Astronomia?
Trabalhar com a Astrofotografia pode aproximar o interesse das pessoas num
céu já tão empobrecido pelo sistema de ensino e pelas luzes e poluição das cidades.
Investir, pois, numa astrofotografia simples significa tocar a imaginação das pessoas,
trazendo para um ‘pedaço de papel’ um pedaço do céu como nunca antes observado.
Além disso, a fotografia astronômica pode se constituir num recurso didático
enriquecedor para o aprendizado de conceitos de Astronomia e do aprendizado de
Física, envolvendo especialmente a interdisciplinaridade entre aquela ciência e os
conceitos de ótica.
4
Essas são recomendações para aqueles que buscam informações sobre como
se iniciar na Astrofotografia. Hoje, as máquinas fotográficas estão mais sofisticadas e
uma imensidão de câmeras digitais inundam o mercado, com preços cada vez mais
acessíveis. Ainda assim, uma câmera do tipo reflex (Figura 2 - com lentes
intercambiáveis, velocidade B) continua com preço proibitivo quando comparamos
com uma câmera comum, dessas que podem ser facilmente encontradas em qualquer
bazar ou até em lojas de produtos importados com preços acessíveis, comumente
chamadas de ‘1,99’.
6
Pelo trecho acima, poderíamos concluir que a Astrofotografia não é tarefa tão
simples como parece. As máquinas reflex possuem muitas configurações e o
fotógrafo necessita ter bom domínio sobre seus recursos. Por esse motivo,
desenvolver um método de baixo custo para se fotografar o céu pode se constituir
num poderoso agente motivador para o ensino de Astronomia para todos aqueles que
nunca teriam acesso ao equipamento necessário para fotografar o céu.
7
ISO
Filme/Marca Poses Condições de Uso
(ASA)
Uso geral externo, grandes ampliações;
Kodak Gold 100 100 12, 24 e 36
Passeios, viagens, retratos, praia, neve.
Fuji Super HG V Uso geral externo, grandes ampliações;
100 12, 24 e 36
100 Passeios, viagens, retratos, praia, neve.
Agfa HDC 100 100 36 Uso geral externo, grandes ampliações;
8
Figura 3: Dispositivo que contém a lente de uma máquina reflex e as ilustrações das diferentes
‘aberturas’ de um diafragma
Fonte: astrosurf (2006).
Figura 6: Foto tirada da máquina pronta para fotografar o céu. Vemos que abaixo da palavra
lente existe um ponto branco, ali fica a lente da câmera
Fonte: os autores.
Como a máquina não possui o obturador para obstruir a luz que passa pela
lente, deve-se tomar cuidado extra para se colocar o filme. Esse cuidado se deve
porque é preciso disparar a máquina para rodar o filme, mas para realizar essa ação, a
máquina deve estar num local muito escuro ou, simplesmente, colocada contra o
corpo do fotógrafo, com a lente apontada contra o peito. Imediatamente após esse
processo, com a máquina ainda pressionada ao peito, deve-se fechar a parte que
impede a entrada de luz na máquina. Todas as máquinas possuem esse dispositivo.
Com esse dispositivo fechado, a máquina não ‘dispara’, ou seja, é impossível tirar
14
Olhando para o céu em uma noite estrelada, parece que estamos no centro de
uma grande esfera oca. As estrelas parecem estar ‘coladas’ nessa esfera. Com o
passar do tempo, as estrelas mudam de posição, porque, para um observador na
superfície da Terra, toda a abóbada celeste parece se mover carregando todas as
estrelas ‘fixas’, os planetas e a Lua (astros ‘móveis’). Se observarmos o céu em dias
seguidos e na mesma hora, perceberemos que as estrelas aparentam voltar sempre ao
mesmo lugar. Porém, se observarmos o céu por períodos longos, meses, por exemplo,
perceberemos que as estrelas, apesar de manterem as mesmas distâncias relativas
entre si, mudam de posição no céu quando vistas sempre à mesma hora.
A Figura 10 ilustra o movimento aparente do Sol em diferentes latitudes.
17
Figura 10: Movimento aparente do Sol no céu em diferentes localidades no globo terrestre
objetos. Numa noite escura, pode-se ver entre 1000 e 1500 estrelas,
sendo que cada estrela pertence a alguma constelação (FILHO;
SARAIVA, 2004, p.23).
4. Resultados
Figura 12: Fotografia de longa exposição da constelação do Cão maior – 4 min de exposição
– Filme: ISO 400 - com nomes das principais estrelas
Fonte: os autores (com tratamento de imagem para ter maior contraste. Cortesia: Wilson
Guerra).
5. Conclusão
7. Referências
Disponível em:
<http://gedal.astrodatabase.net/artigos_e_textos_ensinoedivulgacaodaastronomia.htm
l>. Acesso em: 07 jun. 2006.
I. Introdução
científicos prévios levados pelos alunos do Ensino Médio para a Universidade. Mais
tarde, em 1998, Zelik, Schau e Mattern (1998) fizeram uma investigação com o
mesmo público com o intuito de determinar o que é ciência e que é ‘não-ciência’ em
conceitos físicos e astronômicos.
Podemos observar em muitas pesquisas que os conceitos prévios que os
alunos trazem consigo, as chamadas ‘concepções alternativas’, podem ter grande
influência na aprendizagem, podendo provocar algum tipo de resistência à ‘troca’
desses conceitos por aqueles ensinados em sala de aula (DRIVER, 1989). Outro
grande problema que se apresenta é a absorção de conceitos considerados ‘errôneos’
[passaremos a tratar desses conceitos no presente trabalho como conceitos que se
enquadram em esquemas ‘pré-copernicanos’ ou, quando não se enquadram em
nenhum esquema definido, como ‘conceitos ambíguos’], o que pode ser causado pela
má preparação do professor ou pela desatenção ou mesmo distorção (graças a um
sistema educacional deficiente) desses conceitos pelos alunos.
II. Metodologia
- Astronomia geocêntrica;
- observação noturna à vista desarmada;
- construção de instrumentos de medida (relógios lunares, estelares, solares
e carta do céu);
- sistemas referenciais;
- Astronomia pós-copernicana (heliocêntrica, heliostática);
- princípios gerais de Cosmologia Moderna;
- cosmologias alternativas (não-evolucionistas – sem Big Bang).
No primeiro dia de aula foi feito um questionário aos alunos (21 no total)
envolvendo diversos tipos de questões. Para o estabelecimento de um critério de
avaliação qualitativo e de interesse de pesquisa para as questões, estas foram
classificadas em quatro grupos (seguindo a metodologia encontrada em ALBANESE;
DANHONI NEVES; VICENTINI, 1997):
Tabela 1: Questionário I
Questões Classificação
1) O que são: a) solstícios?; b) equinócios? QE
2) Qual o princípio de funcionamento de um relógio de sol? QE ou QO
3) O que é um meridiano? QE
4) O que é a eclíptica? QE
5) Por que existem os fusos horários? QE
6) O que são: a) latitude? ;b) longitude? QE
7) Por que ocorrem as estações do ano? QE ou QO
8) Como encontrar as coordenadas geográficas de um lugar? QD ou QE
9) É possível medir a hora pelo movimento aparente das estrelas? QO
10) Aponte argumentos que ‘provem’ a rotação e a translação da Terra. QE ou QO
No decorrer do curso, uma das atividades pedidas aos alunos foi a observação
do céu noturno durante um mês. Nesses dias eles deveriam acompanhar, a olho nu, o
movimento da Lua (ou a lunação completa) e fazer medições dos ângulos de
inclinação, com relação ao horizonte, às estrelas e aos planetas, além de verificar
quais os principais astros visíveis no céu. Em se tratando do início do ano (2003), os
5
astros mais importantes observados foram, portanto, a Lua, Júpiter, Saturno, Sírius e
as Três Marias. Após o período de observação, os alunos entregaram um trabalho,
relatando o que foi visto e posteriormente responderam a um outro questionário, em
que a única pergunta presente era:
Questionário II
1) Explique o porquê da lunação. QO ou QE
Grupo 1: Respostas Observativas (RO) - são aquelas em que o aluno faz menção a
um fenômeno por ele observado, não importando se o argumento apresentado está
correto ou não;
Grupo 2: Respostas Memorizativas (RM) - são aquelas em que o aluno apela para a
memória de fatos que ele não vivenciou;
Grupo 3: Respostas Alternativas (RA) - quando as respostas são sabidamente
errôneas, mas apresentam um modelo subjacente (em geral, do tipo ‘pré-
copernicano’);
Grupo 4: Respostas Ambíguas (RAm) - são respostas que não fornecem elementos
suficientes para uma classificação mais precisa nas categorias acima.
60 RM
50
40
percentuais 30 RA RAm
20 RO Seqüência1
10
0
1 2 3 4
categorias
IV. Conclusão
V. Referências
COMETOGRAFIA I: OBSERVANDO,
FOTOGRAFANDO E CONSTRUINDO
EFEMÉRIDAS APROXIMADAS DO
COMETA MCNAUGHT
Marcos Cesar Danhoni Neves
Introdução
(a)
3
(b) (c)
Figura 2: Cometa Halley fotografado em 1910 (a) e em 1986 (b, c) [fonte das fotos b e c:
o autor]
(a)
(b)
5
Figura 4: Filmagem realizada pelo satélite SOHO, mostrando a colisão de três cometas
[em (a) e (b), dois momentos da trajetória de colisão; em (c), dois cometas em rota de
colisão [no disco solar nos dias 22/12/1996 e 01/06/1998]
Figura 5: Fotos do cometa Hale-Bopp em sua passagem pelo hemisfério Sul (latitude
23,5º S) [fonte: o autor]
(a)
8
(b)
Figura 7. Duas imagens obtidas pelo satélite SOHO nos dias 14 de Janeiro de 2007 e 15
de Janeiro de 2007 (as fotos em (a) estão em cores falsas para realçar certos detalhes). As
fotos do ponto luminoso diante do cometa na foto à esquerda é o planeta Mercúrio. A
linha que perpassa o núcleo do cometa na foto à esquerda é o ‘estouro de luz’ no CCD
pelo grande brilho do objeto
Fonte: [Solar and Heliospheric Observatory (SOHO)]
Figura 10: Foto obtida no dia 13 de Janeiro de 2007 no Monte Chaussitre, França,
mostrando que o cometa era visível inclusive de dia.
Fonte: [cometography]
Fonte: assa.org
Figura 20: Cometa Mcnaught fotogrado numa cidade da região Sul do Brasil (latitude
23,5°S – Maringá - PR)
[Fonte: o autor]
18
Referências
BERTON, M. J. When life nearly died: the greatest mass extinction of all time.
New York: Thames and Hudson, 2003.
.
1
COMETOGRAFIA 2: RECONSTRUINDO
DIGITALMENTE O COMETA MCNAUGHT
A PARTIR DE UMA CÂMARA
FOTOGRÁFICA DIGITAL DE BAIXO
CUSTO
Introdução
Figura 2: Fotografia do cometa McNaught, utilizando uma câmara digital de baixo custo
(latitude 23,5º S – Maringá-PR). Fotografia obtida no dia 23 de janeiro de 2007 às 20h30m
3
Figura 6: Filtragem espacial de uma foto da Lua do projeto Apollo para retirar as linhas
horizontais da montagem inicial da figura (filtro consistiu da pintura das componentes
verticais da figura da difração)
Fi
gura 9: Área da foto em que aparece o cometa (à esq.) e a transformada de Fourier da mesma
região do céu
8
(a) (b)
(c) (d)
(e) (f)
Figura 12: Imagem da mesma região do espaço obtida pelo telescópio espacial Hubble antes
(esquerda) e depois da correção (direita)
Fonte: www.lbl.gov/LBL-Programs/TEAM/files/how.html
Figura 13: Imagem de galáxia espiral obtida pelo Hubble telescope antes da correção
(esquerda) e depois da correção da imagem (direita)
Fonte: http://www.lightandmatter.com/html_books/5op/ch03/figs/hubble-aberration.jpg
11
Outra possibilidade foi quando foram feitas três imagens da galáxia espiral NGC4319
(de baixo redshift) e do objeto Markarian 205 (de alto redshift) [Figura 14]. A primeira
fotografia, do telescópio Hubble, de pouca exposição, não mostra a então improvável ponte
luminosa que une os dois objetos. As duas fotos sucessivas, empregando técnicas diferentes,
e com exposição longa, feitas pelo eminente astrônomo Halton Arp, demonstram a existência
de uma ligação física entre as duas estruturas, colocando em xeque a interpretação de que
Markarian205 pudesse ser um quasar.
Figura 16a: A imagem ampliada para melhorar a visualização (nos quadros menores,
diferentes tonalidades – claras e escuras – para melhorar a definição da imagem)
14
Figura 17b: Escolhendo uma tonalidade mais escura para os pixels que compõem a imagem
do cometa
17
Figura 18a: Cometa com ‘cores’ (pixels) mais diferenciadas (melhoria do contraste)
Figura 18c: Comparando melhorias com a imagem inicial (cores verdadeiras – imagem
ampliada)
21
Figura 19b: Imagens mostrando duas fotografias (com máquina digital de baixa e alta
resolução – duas iniciais) e a reconstrução digital (foto inferior)
23
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
25
www.lbl.gov/LBL-Programs/TEAM/files/how.html
http://www.lightandmatter.com/html_books/5op/ch03/figs/hubble-aberration.jpg
DO MUNDO FECHADO DA
ASTRONOMIA NA ANTIGUIDADE À
COSMOLOGIA DO UNIVERSO FECHADO
DO BIG BANG: Revisitando velhos e novos
dogmas da ciência astronômica
Pequeno Prólogo
Introdução
1
“Um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham” (KUHN, 1987, p. 219).
3
Figura 1: Elementos da esfera celeste para um observador: equador, polos Norte e Sul,
horizonte, zênite (posição mais elevada do céu = 90º), nadir (oposto do zênite), latitude
Pitágoras de Samos (580-500 a.C.), que fundou uma escola baseada na primazia
do número, acreditava que a Terra e o universo fossem esféricos. No que concerne à
Terra, parece que as evidências que embasavam suas afirmações eram sólidas
observações dos fenômenos celestes: um eclipse lunar (a forma arredondada da
sombra terrestre sobre o disco lunar) e o desaparecimento de um navio sobre o
extenso e distante horizonte marítimo: a última coisa a desaparecer do navio era a
ponta de seu mastro, e isso de uma forma lenta e progressiva, o que evidenciava a
esfericidade das águas.
Hiceta de Siracusa (entre o VI e V séc. a.C.), Heráclides do Ponto (388-315 a.C.)
e Ecfanto de Siracusa, o Pitagórico (V séc. a.C.), também imaginavam que a Terra
6
fosse esférica e cujo movimento se dava como aquele de uma roda montada sobre
um eixo, girando de Oeste a Leste ao redor de seu próprio centro.
Platão (428-347 a.C.), por motivos geométricos, de simetria e de harmonia,
acreditava que a Terra só poderia tomar a forma esférica, por ser essa a forma
geométrica mais perfeita.
Para Aristóteles, de Estágira (384-322 a.C.), a Terra era esférica. O famoso
pensador grego invocava argumentos físicos, pois os ‘graves’ (corpos com peso –
terra e água -, em oposição aos corpos ‘leves’, imponderáveis – ar e fogo) sempre
caíam em direção a um centro, formando uma superfície equidistante desse centro.
Inferia, ainda, a esfericidade, invocando dados observacionais: eclipse lunar e o
relato de viajantes acerca de constelações não vistas na Grécia.
Os argumentos de Aristóteles eram tão sólidos, lógicos e previsores que seu
sistema de mundo influenciou, decisivamente, quase cinco séculos depois, o
astrônomo de Alexandria, Ptolomeo (85-165 d.C.), em sua obra máxima, o
Almagesto.
Aristarco de Samos (310-220 a.C.) acreditava também na esfericidade da Terra,
atribuindo a ela um movimento diurno (ao redor do próprio eixo) e um movimento
anual ao redor do Sol.
Posidônio (140?-50? a.C.) de Apamea (Síria) demonstra a falibilidade dos
argumentos sobre a forma da Terra, que não aquela da esfericidade, recordando a
“progressiva variação do céu estrelado visível sobre o horizonte à medida que se
viaja em direção ao norte ou sul” (DREYER, 1970, p. 156). Relata, ainda, que os
persas veem o Sol surgir quatro horas antes dos ‘Ibéricos’. Utiliza também o mesmo
argumento aristotélico, dizendo que a superfície do oceano deve ser equidistante do
centro da Terra.
Enquanto se pensava sobre a forma da Terra, pensava-se também no quão grande
seria sua esfericidade. Para se realizar essa medida, seria necessário, a partir da
observação do céu noturno e/ou diurno, encontrar um método geométrico que
7
2
Sabemos desse resultado por uma passagem do livro De Caelo (Sobre o Céu), de Aristóteles, o
Estagirita: “298a Eu quero dizer que mudam as estrelas que estão acima da cabeça, e as estrelas
visíveis são diferentes, quando nos movemos para o norte e para o sul. Realmente, há estrelas que são
vistas no Egito e nas proximidades de Cyprus e que não são vistas nas regiões do norte; e estrelas que
no norte são sempre visíveis e que nessas regiões (do sul) aparecem e desaparecem [...]. Portanto, não
se deve estar seguro de ser inacreditável a doutrina naqueles que concebem uma continuidade entre as
regiões além dos pilares de Hércules e as regiões da Índia, e que desta maneira o Oceano seja um só.
Como a evidência adicional a favor disto eles indicam o caso dos elefantes, uma espécie que ocorre
em cada uma dessas regiões extremas, sugerindo que a característica comum desses extremos é
explicada por sua continuidade. Além disso, os matemáticos que tentaram calcular o tamanho da
circunferência da Terra chegaram ao valor de 400.000 estádios” (ARISTÓTELES apud DANHONI
NEVES, 2005, p. 35).
8
Muitos séculos depois dos primeiros pensadores gregos e mesmos árabes, Johann
de Sacrobosco (aprox. 1236 d.C.), o Holywood, e Pierre D'Ailly, de Compiègne
(1350-1420 d.C.) estimaram a circunferência terrestre em cerca de 50.000 km
(GRANT, 1971). O método empregado por ambos não era o de Eratóstenes e
baseava-se, provavelmente, no método descrito por Posidônio. Segundo Pierre
D'Ailly, o valor determinado por Alfraganus (XI séc d.C.) e outros árabes para a
circunferência da Terra era de cerca de 33.000 km.
Segundo o egípcio Ibn Yunus (950?-1009 d.C.), o comprimento de um grau foi
medido, por ordem do califa al-Mamun, na planície de Palmira (DREYER, 1970),
por dois observatórios entre Wamia e Tadmor e de outras duas localidades, das quais
não há registro histórico. Uma das medidas forneceu o valor médio de 56,66 milhas
para cada grau, resultando numa circunferência terrestre de 20.400 milhas. Uma
segunda medida deu como resultado 56,25 milhas para cada grau, perfazendo 20.250
milhas para a circunferência terrestre. A milha árabe tinha 2.100 metros, o que dá,
para a medida, o valor de 42.840 km para a circunferência da Terra.
É interessante citar aqui uma passagem de Copérnico (1473-1543 d.C.), em sua
obra máxima, De revolutionibus, na qual fica flagrante como ele estava seguindo
profundamente a tradição de seus antepassados. Diz ele (COPÉRNICO, 1984, p. 49):
10
3
A palavra ‘equinócio’ significa ‘noites iguais’, ou seja, o Sol, em seu movimento ao redor da Terra
(numa perspectiva geocêntrica), nos dias 21 de março e 23 de setembro, nasce exatamente a Leste e
se põe exatamente a Oeste, ficando, nesses dias (e somente neles), 12 h acima do horizonte e 12 h
abaixo dele. Já a palavra ‘solstício’ vem da comunhão das palavras (em latim) sol statio, ou seja, ‘sol
parado’. Isso significa que o Sol, após os equinócios, distancia-se ao máximo dos pontos Leste
(nascer) e Oeste (ocaso). O afastamento máximo se dá nos dias 21 de junho e 22 de dezembro,
12
Acreditava que a última esfera, a das estrelas fixas, fosse constituída por partículas
destacadas da Terra, em rápida revolução pelo éter ígneo. Já para Demócrito de
Abdera (460-360? a.C.), a faixa esbranquiçada da Via Láctea nada mais era (hoje,
sabemos, acertadamente) que a cansada luz de uma multidão de estrelas de brilho
muito débil.
Pitágoras de Samos e sua escola conceberam um universo baseado no
geocentrismo. Theon de Smirna (70-135 d.C.) afirma que ele próprio foi o primeiro
a observar que os planetas se movem em órbitas distintas, inclinadas com respeito ao
equador celeste. Aézio (início IV séc.-367 d.C.) (DREYER, 1970), apesar de
Enópide de Chio (V séc a.C.) reivindicar essa descoberta, diz que Pitágoras (571?-
496? a.C.) foi o primeiro a dar-se conta da inclinação do círculo zodiacal com
respeito ao equador (inclinação da eclíptica). No entanto, registros históricos dão
conta de que a eclíptica e sua inclinação já eram conhecidas pelos chineses desde
1.100 a.C.
Filolao de Cróton (aprox. 480 a.C.), um pitagórico, ao final do século V a.C.,
concebia um universo particular. Diógenes Laércio (metade do III séc d.C.) chegou a
dizer que Filolao foi o primeiro a afirmar que a Terra se movia num círculo (apesar
de desconsiderar o movimento de rotação ao redor do próprio eixo). Seu sistema
consistia no seguinte modelo (Figura 4): considerava 10 o número perfeito4. Assim,
ele acreditava que o universo era constituído por nove corpos: a Terra, a Lua, o Sol,
os cinco planetas e a esfera das estrelas fixas. Para completar o décimo corpo,
Filolao criou outro (e invisível) planeta: a Antiterra (Antichton). Este último era
invisível porque se encontrava entre nós e um misterioso fogo central (a Torre de
respectivamente, o solstício de inverno (para o hemisfério Sul) e solstício de verão (para o hemisfério
Sul).
4
“Segundo o pitagorismo, a essência, o princípio essencial de que são compostas todas as coisas, é o
número, ou seja, as relações matemáticas. Os pitagóricos, não distinguindo ainda bem forma, lei e
matéria, substância das coisas, consideraram o número como sendo a união de um e outro elemento.
Da racional concepção de que tudo é regulado segundo relações numéricas, passa-se à visão fantástica
de que o número seja a essência das coisas” (Fonte:mundodosfilosofos).
13
Figura 4: O sistema de Filolao: A-esfera das estrelas fixas, B-órbitas planetárias, C-núcleo
ígneo, D-Antiterra, E-Terra, F-Lua, G-Sol
coincidia com o centro da Terra) era, pois, o lugar natural de todos os corpos
pesados (GRANT, 1971).
Sobre a presença de cometas nos céus de sua época (que poderiam indicar
corruptibilidade no reino da perfeição), Aristóteles aludiu esses fenômenos a
ocorrências atmosféricas. Essa ideia prevaleceu até o século XVI. Galileo, tido como
um dos mais convictos pensadores antiaristotélicos, apesar de seu tratado sobre o
movimento dos corpos, De Motu, dedicou uma de suas obras, Il Saggiatore, à defesa
da opinião de que os cometas eram fenômenos de nossa atmosfera e não fenômenos
de origem astronômica.
Por Arquimedes (287-212 a.C.), sabemos que um grego, de nome Aristarco de
Samos (que já mencionamos), aluno de Estratão, o Físico, concebia um modelo em
que supunha que a Terra, os planetas e a esfera das estrelas fixas se moviam em
círculos ao redor de um Sol estático. Ele considerava tanto o movimento de rotação
quanto o de translação. O modelo desenvolvido por Aristarco era superior ao de
Eudoxo e Aristóteles porque explicava a variação da luminosidade dos planetas, pela
respectiva variação de suas distâncias relativas com a Terra. As esferas
homocêntricas de Eudoxo (408-355 a.C.) e seu discípulo Callipo, além de
Aristóteles, mantinham sempre as mesmas distâncias com respeito à Terra, ou seja,
não havia variação do brilho.
Apolônio de Pérgamo (262 - 190 a.C.), que foi citado no XII livro do Composito
de Ptolomeo (85-165 d.C.), para dar conta das retrogradações planetárias (Figura 5) e
do movimento de Oeste para Leste do Sol, introduziu, ao redor de uma Terra imóvel,
um círculo, chamado deferente (movimento em longitude) e, sobre este, onde se
encontrava o astro errante (planeta), deslizava um epiciclo (pequeno círculo -
movimento em anomalia) (Figura 6).
16
Como esse sistema não dava conta de todas as irregularidades dos planetas,
Apolônio aplicou para os planetas externos (Marte, Júpiter e Saturno) círculos
excêntricos móveis (Figura 7). Nesse modelo, o centro do excêntrico revoluciona
com velocidade igual à velocidade aparente do Sol em sua revolução em torno ao
centro do zodíaco (de Oeste para Leste), ao passo que o astro se move sobre o
excêntrico na direção oposta (DREYER, 1970).
17
Utilizando esse sistema, desde as observações dos caldeus, e pela posição de dois
eclipses lunares (que ocorrem na proximidade do apogeu do epiciclo), Ptolomeo
calculou o diâmetro da Lua no apogeu: 31’20”' (GRANT, 1971). Seu erro não
excedia a dois minutos de arco! Porém, para os planetas esse erro superava quatro
vezes esse valor!
O modelo desenvolvido por Ptolomeo era o coroamento da Geometria e da
Astronomia (teórica e observacional) grega. No entanto, esse sistema se afastava dos
ideais platônicos e aristotélicos, das esferas cristalinas girando ao redor de uma Terra
posicionada no centro do universo. A posição excêntrica da Terra, desprovida de
movimento circular uniforme ao seu redor (qualidade agora destinada ao ponto
equante), valeu a Ptolomeo severas críticas. Os astrônomos árabes não o perdoaram,
preferindo as esferas cristalinas de Eudoxo, Callipo e Aristóteles. Apesar disso, o
grau de precisão obtido por Ptolomeo salvava os fenômenos observados no céu.
Em sua obra Hipótese dos planetas, Ptolomeo dizia: “não sustento de ser capaz
de explicar todos os movimentos do mesmo modo; mas mostrarei que cada um deles
pode ser explicado recorrendo à sua hipótese particular”, ou seja, o sistema de
epiciclos, deferentes, excêntricos e equantes, desenvolvido por Ptolomeo (com uma
Terra numa posição geostática, não mais ‘geocêntrica’), explicava, com seus ‘13
20
maiores distâncias para Leste que a Oeste (desde que dados com a mesma impulsão);
iii) os tiros ou voos de flechas se desviariam se fossem feitos para Norte ou Sul; etc.
Na Europa Medieval, Nicolau de Cusa (1401-1464 d.C.), em sua obra La Docta
Ignorantia (A Douta Ignorância), publicada em 1440, recorre a intrincadas noções
filosóficas de ‘absoluto e relativo’. Ele dizia que a Terra se movia, mas que não nos
apercebíamos disso, tal qual ocorre quando estamos no interior de um navio e não
nos damos conta de seu movimento. Nicolau de Cusa é um dos expoentes do
pensamento da Idade Média, o que mostra que caracterizar essa época como ‘idade
das trevas’ não corresponde à realidade.
Girolamo Fracastoro (1483-1553), (que provavelmente conheceu Copérnico na
Universidade de Padova), representou os movimentos planetários retornando às
esferas homocêntricas de Eudoxo, aumentando o número de esferas para 79
(DREYER 1970, p. 274)!
Nicolau Copérnico (1473-1543), que é o divisor de águas entre o sistema baseado
numa Terra estática e seu novo sistema (apesar de Aristarco), de Sol estático,
publicou inicialmente, em 1533, um pequeno Comentário, Commentariolus, no qual
criticou os sistemas de Callipo e Eudoxo, porque estes não salvavam os fenômenos
celestes adotando círculos concêntricos.
Em 1543, com sua obra-mor, De Revolutionibus Orbium Coelestium (Das
Revoluções dos Orbes Celestes), Copérnico muda o referencial dos movimentos
planetários para o Sol, deixando a Terra como mais outro planeta a orbitar o ‘astro-
rei’. Seu livro começa demonstrando que o Mundo e a Terra são esféricos. No quarto
capítulo, afirma que os movimentos dos corpos celestes são uniformes e circulares,
ou compostos de movimentos circulares. Para afirmar que a Terra gira ao redor do
Sol e de seu próprio eixo, reinterpreta os argumentos da física aristotélica, invocando
que a tendência de os corpos irem para seus lugares naturais (movendo-se em linha
reta) também se verifica em outros corpos celestes. Além das órbitas, Copérnico faz
assemelhar ainda mais a Terra com outros planetas. O sistema de Copérnico permitiu
22
a ele, através da determinação precisa dos períodos sinódicos dos planetas (duas
sucessivas oposições de um planeta), chegar a um método correto para o cálculo dos
períodos siderais (orbitais) dos planetas ao redor do Sol, como pode ser visto pela
Tabela 1 (DANHONI NEVES; ARGÜELLO, 2001).
5
os que consideram o sistema de Copérnico ‘superior’ ao de Ptolomeo levam somente em conta o
referencial heliocêntrico. Esquecem-se que o sistema copernicano continuava a se utilizar de
inúmeros círculos e epiciclos (em número ainda maior que o do sistema ptolomaico) e que os dados
observacionais de Copérnico foram obtidos ainda do Almagesto.
24
6
O termo paralaxe significa o deslocamento angular aparente de um referencial, causado pelo
deslocamento do observador.
27
Porém, só foi com as medidas excepcionalmente precisas que Kepler pôde chegar
ao que hoje conhecemos em livros didáticos como as ‘três leis do movimento
planetário’.
Kepler, como seu antecessor Copérnico, recusava-se a introduzir o ponto equante
para ‘salvar’ os fenômenos. No entanto, diferentemente do astrônomo polaco, Kepler
não utilizou os epiciclos. Usou, numa descrição geométrica aproximada, círculos
descentrados. Isso parecia recomendar o uso de um ponto equante, já que o planeta
precisaria apresentar velocidade angular constante com respeito ao Sol descentrado.
Esse modelo parecia reproduzir os resultados obtidos por Tycho. Porém, após oito
7
Um grau tem 60 min de arco e um minuto de arco tem 60 seg de arco.
29
anos de estudos sobre os dados tychonianos da órbita de Marte (num arco de 25 anos
de observação!), o erro sistemático encontrado por Kepler era de oito minutos de
arco (DREYER, 1970).
Apesar desse erro, Kepler chega, conforme consta em sua obra Astronomia nova,
à ‘Lei das Áreas’: “O raio-vetor que une sol-planeta varre áreas iguais em tempos
iguais” (DANHONI NEVES, 2001, p. 47).
Nas escolas essa lei é ensinada como sendo a ‘segunda lei de Kepler’, mas ele a
descobriu primeiro! Partindo dessa premissa, Kepler resolveu abandonar a perfeição
da circularidade (mesmo que usando círculos descentrados) para adotar a elipse
como forma mais adequada não mais para ‘salvar fenômenos’ mas para descrever os
movimentos planetários ao redor do Sol. Essa nova descrição fez Kepler enunciar
aquela que é hoje conhecida como “1ª Lei de Kepler: os planetas descrevem órbitas
elípticas com o sol ocupando um dos focos destas” (DANHONI NEVES, 2001, p.
47).
Sua terceira e última lei saiu quase como de seu último refúgio na perfeição e
harmonia do cosmo. Era uma proporcionalidade que lembrava a música das esferas,
inicialmente pensada por Pitágoras e seus discípulos. A terceira lei pode assim ser
enunciada: ‘o quadrado do período de um planeta é diretamente proporcional ao
cubo de seu semi-eixo maior’.
Para finalizar esta seção, lembremos as palavras de Dreyer (1970, p. 361), acerca
da segunda lei de Kepler:
A descoberta da órbita elíptica de Marte era um ponto de partida
absolutamente novo, uma vez que implicava o abandono do
princípio do movimento circular uniforme, um princípio que, de
tempos em tempos, foi considerado evidente e inviolável, apesar
de que Ptolomeo já houvesse, tacitamente, deixado cair,
introduzindo o equante.
30
(a)
(b)
Figura 13: O argumento do navio para uma pedra deixada cair do alto de um mastro. Em (a)
está o argumento aristotélico de que, com o navio em movimento, a pedra cairia na popa.
Em (b), o argumento que leva em conta o sistema inercial; a pedra está animada da mesma
velocidade do navio e, por essa razão, cai ao pé do mastro
34
Para concluir essa longa exposição histórica do difícil caminho percorrido pela
ciência para o estabelecimento da tão proclamada ‘Revolução Copernicana’,
lembramos que o mundo pós-Copérnico só se firmou graças à melhoria da precisão
35
dos instrumentos de medida, aliada a uma física que encontrou, nos trabalhos de
Galileo e Newton, a força definitiva para nos dar uma posição dentro do sistema
solar.
Essa nova posição da Terra e todo o trabalho da ciência ao redor dessa definição
fizeram o historiador e filósofo da ciência Edwin Arthur Burtt (1892-1989) escrever
algures:
A grande autoridade de Newton se fazia sentir plenamente na
visão do cosmo que fazia do homem um espectador insignificante
e irrelevante [...] do vasto sistema matemático, cujos movimentos
regulares, segundo os princípios mecânicos, constituíam o mundo
da natureza. O universo gloriosamente romântico de Dante e
Milton, que não fixava limites à imaginação do homem para
desenrolar-se no espaço e tempo, foi posto de lado. O espaço foi
identificado com a Geometria, o tempo com a continuidade do
número. O mundo em que julgávamos estar vivendo - um mundo
rico de cores e sons, de fragrância, de alegria, amor e beleza que
demonstravam em tudo uma harmonia e ideais criativos
intencionais - passou a ser amontoado em pequenos cantos nos
cérebros dos seres orgânicos dispersos. O mundo realmente
importante lá fora era um mundo duro, frio, sem cor, silencioso e
morto; um mundo de quantidades, um mundo de movimentos
matematicamente computáveis em regularidade mecânica. O
mundo das qualidades, tal como o imediatamente percebido pelo
homem, tornou-se um efeito curioso e insignificante daquela
máquina infinita que jaz mais além (BURTT, 1979, p. 113).
8
O termo Big Bang foi criado por um dos mais ácidos críticos dessa teoria, o Prof. Fred Hoyle, ao
referir-se jocosamente, durante um programa radiofônico da BBC, à ideia de um universo ‘explosivo’.
9
O fenômeno ou efeito Doppler é um fenômeno físico e, graças a ele, é possível mensurar se uma
fonte sonora ou luminosa se aproxima ou se afasta de um observador. O caso sonoro é bastante
conhecido: quando um carro de bombeiros se aproxima de nós, observadores-ouvintes, com a sirene
ligada, ouvimos um som muito agudo (as frentes de onda se concentram à frente da fonte, diminuindo
o comprimento das ondas e, portanto, aumentando a frequência). No caso oposto, quando o caminhão
se afasta, o som da sirene torna-se mais grave (as ondas sofrem uma espécie de ‘alargamento’- ver
Figuras 14a e 14b – tornando-se maiores, o que, em consequência, diminui a frequência). Para o caso Formatado: Não Realce
luminoso, o efeito é o mesmo: para fontes que se afastam, linhas espectrais tendem a deslocar-se para
a extremidade vermelha do espectro (grande comprimento de onda, baixa frequência) – esse é o que
os astrônomos batizaram de “desvio para o vermelho (redshift); para fontes que se aproximam, as
linhas espectrais tendem a deslocar-se para a extremidade azul do espectro (pequeno comprimento de
onda, alta frequência) – blueshift (deslocamento para o azul).
38
Figura 14b: Efeito Dopper luminoso (notar o deslocamento das raias ou riscas ao longo do
espectro – extremidade esquerda = azul; extremidade direita = vermelho): fonte 1: estrela
próxima; fonte 2: galáxia vizinha; fonte 3: galáxia à grande distância; fonte 4: galáxia muito
distante [os números 400, 500, 600, 700 referem-se ao valor do comprimento de onda, em
Angstroms]
Esta seção procurará dar uma dimensão do trabalho de Hubble e de como ele
serviu para alimentar o paradigma atual de um Universo com criação e possível
extinção; de um Universo efêmero no tempo cosmológico mas eterno na sucessão de
nascimentos e colapsos; de um Universo destinado aos limites da expansão ou de
uma expansão infinita.
Discutiremos, sobretudo, a questão de como o paradigma do Big Bang (Grande
Explosão) se estabeleceu e quais os problemas que ele apresenta para se firmar. Para
tanto, discutiremos, através da história recente da Cosmologia, trabalhos destoantes
da atual teoria, realizados por homens que raramente são citados na bibliografia
científica corrente, nas salas de aula e nos livros-textos, e que foram eclipsados pela
força avassaladora do paradigma atual. Responderemos então, ao final, à seguinte
questão: ‘a que Universo o trabalho de Hubble nos destinou?’.
39
Hubble e além
Figura 18a: galáxia vizinha e sua posição no gráfico velocidade versus distância de Hubble
Figura 18b: galáxia relativamente próxima e sua posição no gráfico velocidade versus
distância de Hubble
Figura 18c: galáxia distante e sua posição no gráfico velocidade versus distância de Hubble
43
Figura 18d: galáxia muito distante e sua posição no gráfico velocidade versus distância de
Hubble
10
Estudos da década de 1980 do século passado estimavam que o aumento da velocidade, v, por
unidade de distância, r, era de 15 km/s para cada milhão (106) de anos-luz (A.L. – 1 ano-luz é a
distância percorrida pela luz em um ano, o que dá um valor aproximado de 9,5.1012 km, ou seja,
quase 9,5 trilhões de quilômetros). Esse valor, 15 km.s-1 / 106 A.L., é conhecido como a ‘constante de
Hubble H’. A relação de Hubble pode ser escrita como: v = H . r . Se o raciocínio inicial de Hubble
estivesse correto, as galáxias deveriam, num passado muitíssimo remoto, ter estado muito mais
próximas umas das outras. Se fizermos esse ‘recuo no passado’, veremos que o inverso da constante
de Hubble fornece o ‘tempo da expansão’ (se realmente tivesse havido uma ‘criação’ e uma ‘inflação’
do Universo): t = 1 / H. O resultado seria 6,3.1017 seg, ou, aproximadamente, 20 bilhões de anos.
Como a gravidade ‘freia’ a inflação, pois a primeira é uma força agregadora enquanto a segunda é
uma ‘força dispersora’, o ‘início’ deveria ter ocorrido num tempo inferior a 15 bilhões de anos! Em
estudos de 1994 (Cosmological conflict - O conflito cosmológico), Craig Hogan, Nature, v. 371, p. Formatado: Não Realce
374-375, e An old galaxy in a young universe (Uma galáxia velha num universo jovem), Robert Formatado: Não Realce
Kennicutt Jr., Nature, v. 381, p. 555-556, ao se estudar galáxias na Constelação de Virgo, a constante
de Hubble foi recalibrada e o tempo de expansão caiu para cerca de nove bilhões de anos, ou seja,
uma valor inferior ao da vida das galáxias (cerca de 13 bilhões de anos)!
44
11
a unidade Kelvin (K) dá para sua escala mínima, ou seja, o ‘zero absoluto’, o valor de cerca de -
273˚C.
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microondas (7,35 cm), equivalendo a uma temperatura de radiação próxima dos 3,5
K.
Com a descoberta da RCF (valor atual = 2,7 K), associada aos estudos de
Hubble dos redshifts galáticos, nascia a teoria do Big Bang, com um Universo entre
dez e 20 bilhões de anos de idade.
Problemas do paradigma
Como alternativa e/ou teoria rival ao Big Bang, existem os modelos de estado
estacionário de Universo. A teoria de estado estacionário12 mais famosa foi aquela
formulada por Fred Hoyle (1915-2001), Jayant Narlikar (1938 - ) e Thomaz Gold
(1920-) (BRUSH, 1992). Porém, a descoberta da CBR coloca em xeque essa teoria,
descartando-a.
No entanto, outras teorias de estado estacionário aparecem paralela ou
anteriormente à teoria do Big Bang. Mas, embasando-nos ainda em Kuhn (1974, p.
52), “ao aceitar um paradigma, a comunidade científica adere toda ela,
12
Segundo a teoria do Estado Estacionário, o Universo existiu e existirá para sempre e o movimento
de afastamento, especialmente das galáxias distantes, seria resultado da criação de novos átomos de
hidrogênio, por efeito da gravidade do próprio Universo.
46
13
As estrelas são catalogadas em razão de suas temperaturas superficiais: O, B, A, F, G, K e M. As
estrelas do tipo O são azuis, com temperatura superficial superior a 25.000 K, 15 vezes o raio solar e
60 vezes a massa do Sol. As estrelas do tipo B são, também, azuis, mas com temperaturas que variam
de 11.000 a 25.000 K. Têm sete vezes o raio do Sol e cerca de 18 vezes a massa solar.
49
Além dos trabalhos citados aqui, que são ‘desconhecidos’ dos livros-textos e
da bibliografia em geral de Cosmologia Moderna (mesmo o clássico Os três
primeiros minutos, de S. Weinberg, em seu capítulo 6, Digressão histórica, não faz
menção a nenhum dos autores citados no presente trabalho, que defendem a ideia de
um Universo estacionário), existem inúmeros outros artigos que apresentam
redshifts ‘anômalos’. Reboul (1981) lista 772 dessas medidas de redshifts, que não
são explicadas pelo efeito Doppler, ou seja, não apresentam correlação distância-
velocidade!
Da natureza da ciência
14
Quasares é a denominação de quase-stellar radio source (fonte de radio quase estelar). Trata-se de
objetos astronômicos das dimensões aparentes de uma estrela mas com um brilho equivalente a de
toda uma galáxia. Apresentam elevados redshifts. O primeiro quasar foi descoberto em 1950. Em
1960 eles foram catalogados pela primeira vez no Third Cambridge Catalog.
51
15
O termo NGC refere-se ao New General Catalog (Novo Catálogo Geral) de galáxias em
substituição ao Catálogo M (Messier).
52
Figura 19b: Galáxia NGC 4319 e o objeto- quasar Markarian 205. Notar que essa é uma
galáxia espiral, mas só apresenta intacto o braço superior. O inferior provavelmente foi
destruído pelo objeto Markarian 205
53
Figura 19c: A ponte luminosa entre NGC 4319 e Markarian 205 – coincidência ótica?!?
Impossível!
Por esses dois autores, podemos intuir o abismo que separa duas concepções
radicalmente diferentes de Universo. De um lado, um Universo que evolui numa
alucinada expansão cósmica; de outro, um Universo eterno e estacionário, sem
limites no espaço e no tempo. Esse abismo de concepções é encontrado mesmo em
Giordano Bruno (1983, p. 17):
FILOTEO - Afinal, para chegar ao âmago da questão parece-me
ridículo afirmar que além do céu não exista nada, e que o céu
exista por si mesmo, localizado por acidente, e seja lugar por
acidente, isto é, com respeito as suas partes. E qualquer que seja a
interpretação dada a seu ‘por acidente’, não se pode evitar de
fazer de um dois, porque sempre é uma coisa o continente e outra
o contido; e assim é de tal forma que, segundo ele próprio, o
56
Em seu livro The realm of nebulae (O reino das nebulosas), Hubble (1936, p.
122-123) escreve:
Esta interpretação [a de que o redshift representa velocidade de
afastamento] explica os redshifts como efeito Doppler, ou seja,
como velocidades de afastamento, indicando um movimento
autêntico de recessão. Podemos estabelecer com alguma confiança
que os redshifts ou são velocidades de afastamento ou
representam algum princípio até agora desconhecido na física.
Em 1937, Hubble (citado por Reber, 1986) afirma: “A luz pode perder energia
durante sua jornada através do espaço, mas se assim o for, nós ainda desconhecemos
como a perda de energia pode ser explicada”.
Seis anos após a publicação do The realm of the nebulae, Hubble ainda
escreve: “Os redshifts representam ou efeitos Doppler, recessão física da nebulosa,
ou a ação de algum princípio ainda não identificado na natureza”.
Diante do exposto, podemos concluir que Hubble jamais descobriu a expansão
do Universo. Podemos afirmar que ele descobriu o redshift cosmológico, associando
ao desvio das raias espectrais um termo de ‘velocidade aparente’.
Em seu artigo The problem of the expanding universe (O problema do
universo em expansão), Hubble (1942, p. 115) conclui: “Parece estarmos como nos
dias de Copérnico, diante de uma escolha: um Universo pequeno e finito, ou um
Universo indefinidamente grande mais um novo princípio da natureza”.
Hubble representa o homem diante das dúvidas fundamentais: ‘o que é o
espaço e o que é o tempo’. Seu trabalho é reinterpretado à luz de um Universo
inflacionário (com início e fim, ou com uma expansão eterna) ou de um Universo
estacionário (sem criação e infinito no espaço e no tempo).
Como Giordano Bruno (1548-1600 - DANHONI NEVES, 2004), perguntamo-
nos constantemente se este espaço que contém o mundo é mais ‘apto a conter um
mundo que outro espaço, existente mais além’.
58
Referências
ARP, H. La contessa sulle distanze cosmiche e le quasar. Milano: Jaca Book, 1989.
BRUNO, G. Sobre o infinito e os mundos. São Paulo: Abril Cultural, 1983. (Os
pensadores).
GALILEO, G. Duas novas ciências. São Paulo: Nova Stella, 1990. Formatado: Português (Brasil)
GAMOW, G. The creation of the Universe. New York: Viking Press, 1961.
GRANT, E. Physical science in the middle ages. New York: John Wiley & Sons,
1971.
HUBBLE, E. The realm of the Nebulae. New Haven: Yale University Press, 1936.
REGENER, E. Der energiestrom der ultrastrahlung. Zeitschrift fur Physik, v. 80, p. Formatado: Inglês (Estados Unidos)
666-669, 1933.
http://www.mundodosfilosofos.com.br/pitagoras.htm
1
F=σ T4,
2
Guillaume e Eddington
Capítulo XIII
Regener
Nernst
Sciama (1971). Devemos lembrar que esse resultado não foi obtido, utilizando-se
a cosmologia do Big Bang.
§ 6. O Redshift Cosmológico
Gamow e Colaboradores
Temperatura = ????
Tpresente = 50 K
Discussão e Conclusão
Essa carta, como podemos ver, não corresponde aos fatos reais. Gamow,
numa edição ‘revisada’ de seu livro de 1952, publicado em 1961, calculou a
temperatura do universo. Nota-se, claramente, que Gamow não estimou um
‘limite superior de 50 K’. Gamow usou um jogo de palavras para convencer a
14
todos que era ele quem havia previsto a temperatura da radiação cósmica de fundo
antes de qualquer outra pessoa, como podemos ver por um outro artigo de Penzias
(1972, p. 35):
Referências
GAMOW, G. The creation of the universe. New York: Viking Press, 1961.
16
REGENER, E. The energy flux of cosmic rays. Zeitschrift für Physik, Berlin, v.
80, p. 666-669, 1933.
Introdução
Problemas
Isso é a confissão de que boa parte das chapas obtidas em Príncipe eram
simplesmente ‘imprestáveis’! Mesmo assim, Eddington não se dá por batido e
6
afirma que: “uma chapa tinha boas imagens de cinco estrelas, o que garantia uma
possibilidade de determinação” (EDDINGTON, 1920, p. 115).
Sua descrição dessa chapa diz: “Os resultados desta chapa dão um
deslocamento definido, de bom acordo com a teoria de Einstein e em desacordo
com a previsão newtoniana. Embora o material fosse pobre em relação àquilo que
esperávamos, foi convincente” (EDDINGTON, 1920, p. 116).
Seguindo a descrição daqueles fatos, Eddington continua: “O tempo nublado
acabou com meus planos e eu tentei medir de diferentes maneiras,
consequentemente eu não tive como anunciar preliminarmente o resultado. Mas
uma das chapas que eu medi dava o valor de acordo com Einstein” (DOUGLAS,
1957, p. 42).
O ‘grande achado’ de Eddington se dará sobre a análise das posições
relativas de apenas cinco estrelas em duas chapas do total de 16 tiradas!
Em Sobral, o fator climático não influiu de forma tão negativa: o céu estava
brilhante, sem nuvens que ameaçassem as observações. Apesar disso, as
fotografias (feitas a partir de dois telescópios idênticos aos de Príncipe, além de
um terceiro com distância focal diferente) acabaram decepcionando pela
qualidade das imagens, que revelaram definição ruim. Diz Eddington (1920, p.
117): “[as] medidas apontavam que estavam de acordo com a ‘meia-deflexão’, ou
seja, com o valor newtoniano, metade daquele requerido pela teoria de Einstein”.
O Enigma de Sobral
Hermann Bondi (1960, p. 61), que jamais poderá ser classificado como um
antirrelativista, diz que:
A predição de Einstein pode ser checada somente em raras
ocasiões quando, no momento de um eclipse, estrelas brilhantes
estiverem próximas na direção do sol. O efeito é difícil de ser
estudado mesmo nas circunstâncias mais favoráveis. As
indicações são mais favoráveis à teoria da relatividade, mas
seria prematura dizer que isso é conclusivo.
Conclusão
poderia estar a uma distância cosmológica, nos confins do Universo. Para ele, o
quasar poderia ser a ejeção de matéria de um núcleo galático, explicando os
elevados redshifts de quasares associados a galáxias (de baixos redshifts).
O uso da história da ciência, na pesquisa às fontes originais do
conhecimento, na exploração das polêmicas e de suas anomalias, assim como o
uso de mapas conceituais demonstraram para nós que o professor, a partir das
leituras críticas, mesmo que especializadas, dispõe de ferramenta fundamental
para compreender o contexto didático e epistemológico da construção da ciência.
Randall Meyers (2004), que trabalhou na edição do consagrado filme de
Hollywood, The english patient (O paciente inglês), editou um DVD duplo
intitulado Universe: the cosmology quest (ver sinopse original no box) e procurou
ir ao encontro de fonte originais e polêmicas da ciência. O resultado poderia servir
para a educação científica e para mostrar que as divergências de concepções de
mundo fazem parte da própria estrutura da ciência e de seu ensino.
This feature length presentation is a unique mixture of ‘human interest’ and science documentary
film. As the first comprehensive documentary to deal with major new approaches in non-big bang
cosmologies, it reveals several deep-rooted theoretical and observational controversies.
This is a fact, well hidden from university students and the general public, which is told with
clarity and conviction; and potentially leading to the down-fall of the presiding Big Bang theory.
The story is told by 16 world renown astronomers and cosmologists; such as the legendary Sir
Fred Hoyle, controversial cosmologists - Geoffrey Burbidge and Halton Arp, philosopher and
telescope designer John Dobson, and Nobel Laureate Kary Mullis.
Nearly 3. 5 hours of film and extra interviews, illustrated with 3D animations and a lush
11
symphonic soundtrack - a scientific and historical ‘must’ for anyone interested in astronomy and
cosmology today!
Director:
Randall Meyers
Referências
FOWLER, A. (Chair of) Meeting of the Royal Astronomical Society, friday, july
11, 1919. The Observatory, London, v. 42, p. 297, 1919.
THOMSON, J. [Chair of] joint eclipse meeting of the Royal Society and the
Royal Astronomical Society. The Observatory, London v. 42, p. 389, 1919.
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