Casos Clínicos Vínculos Transmissão Psíquica

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Abaixo apresentamos uma vinheta clínica, um pequeno trecho de um relato de um caso

clínico de atendimento em psicoterapia familiar. Partindo dos conteúdos apresentados


no trecho abaixo, construa uma reflexão sobre a transmissão psíquica familiar
O caso de Alice e sua família
“ Alice foi hospitalizada aos 17 anos, e sua internação foi um “ choque” para toda a sua família.
Hoje ela tem 22 anos, é a última filha e segundo seu pai a mais mimada e protegida de uma
família de três, ela tem mais uma irmã e um irmão. No caso de Alice, ela foi progressivamente se
fechando em casa, parece triste e exprime ideias pessimista e apresenta-se muito violenta quando
contrariada. Em alguns momentos sua angústia é insuportável e ela comunica isso aos outros,
que se desesperam com seu estado. Ela acaba por explicar que aos quinze anos sofreu um
estupro coletivo depois que lhe deram LSD e outras drogas que não conhece. A partir deste
momento, queixa-se dos maus odores exalados do seu corpo. Ela sente a podridão. Antes do
nascimento de Alice, a família vivia no Orienta médio e o pai relata com nostalgia os momentos
vividos nesses tempos, momentos de prazeres materiais, do corpo e da mesa. Porém, quando a
mãe de Alice ficou grávida eles decidiram retornar à França para que ela pudesse parir a menina
em um bom hospital. Desta forma, o pai permaneceu por alguns anos no Oriente e a mãe na
França e esse fazia visitas esporádicas à família. O pai vem de uma família numerosa, onde uma
mãe abandonada pelo marido ainda quando adolescente, vive uma relação com um amante. È
uma mulher magoada pelo abandono que sofrera e o pai de Alice não perdoa seu pai por tê-la
abandonado e cuida de sua mãe com bastante zelo e afeição, visita-a todos os dias depois do
trabalho e sua esposa entende isso muito bem pois também é uma filha devotada à sua própria
família. Porém, no contexto da casa o pai é bastante ausente e sua ausência só aumentou no
período que ficou fora, no Oriente. A infância da mãe, por sua vez, foi marcada por um ambiente
triste de uma casa consagrada de corpo e alma a seu irmão mais velho que tinha uma deficiência
motora. Tudo girava em torno desse irmão, não se podia cantar, gritar, nem rir, não se podia fazer
nada que atrapalhasse seu irmão. Aos 18 anos, seu casamento a libertou dessa esfera opressiva e
viu nele sua única escapatória. Entretanto, sua alegria não durou muito tempo: grávida, dois anos
mais tarde, suas angústias e seus tormentos voltaram sob uma forma um tanto mais penosa, que
ela jamais contou a ninguém, até hoje: ela temia dar nascimento a uma criança disforme, como
seu irmão. Ela imagina, em silêncio, mil monstruosidades: se ela adotasse uma posição
desconfortável durante o sono, se ela agitasse, se suas roupas fossem muito apertadas, a criança,
no seu ventre, poderia sufocar. Em cada uma de suas três gestações, foi parecido; e aliás, foi o
que a fez retornar para dar a luz à Alice. Esse segredo revelado depois de tanto tempo, foi
associado a morte de seu próprio pai, da qual tomou conhecimento quando retornou do Oriente,
sua família não havia lhe dito nada porque consideravam que sua partida havia enchido o velho
de desgosto e isto iria “mata-la”. Seu pai era um homem distante e autoritário, “ como meu
marido, veja você”, e ela acabou se agarrando muito aos filhos. Mais tarde eles acrescentam que
o que os motivou a pedir a terapia familiar foi a homossexualidade do filho, que magoa
profundamente o pai, pois seu filho que poderia carregar o nome da família, não lhe dará netos e
começa a se questionar se isso era fruto da sua ausência no grupo familiar. A família se mostra
dividida em dois blocos, os filhos em uma unidade com a mãe contra o pai. Após alguns meses
de terapia, chegamos a relacionar todas as vivências de pais ausentes na descendência, que
deixaram as mães despojadas e ofendidas. A homossexualidade do irmão de Alice, aparece
assim, no imaginário familiar, como conectada à partida do avô paterno: era preciso que ele
vivesse como mulher para atrair o homem ausente para casa, mas tudo isto uma geração mais
tarde. O comportamento provocador de Alice não deixará de inquietar os pais no período que se
segue, ela começa a sair de casa e voltar após horas ou dias, depois telefonava para que o pai
viesse buscá-la pois estava sendo perseguida por jovens suspeitos. O medo do estupro tornou-se
uma obsessão. Esse movimento foi mostrando a necessidade também apresentada de Alice de
chamar o pai para casa. O movimento de Alice, como o do irmão, relacionavam-se a uma
tentativa de fazer um apelo ao lado paterno, de que este retornasse como aqueles que partiram e
não puderam/quiseram, nunca retornar” (Eiguer, 1998,p.64-65)
Abaixo apresentamos uma vinheta clínica, um pequeno trecho de um relato de um caso
clínico de atendimento em psicoterapia familiar. Partindo dos conteúdos apresentados
no trecho abaixo, apresente uma reflexão sobre a transmissão psíquica familiar e os
organizadores do psiquismo familiar.
A família D’Argos
“O pai, senhor D’Argos, homem afável e triste, está acompanhado pela esposa de aparência bem cuidada
e distinta. Vêm com os quatro filhos, com idades entre 12 e 20 anos. Marc, o mais velho, começou a
sofrer de catatonia durante sua estadia em uma cidade estrangeira onde, em um primeiro momento obteve
relativo sucesso nos estudos. Como frequentemente ocorre, a catatonia veio acompanhada de mutismo e
recusa alimentar. Irmãos e irmã parecem indiferentes: a irmã Frederiquè, é relaxada e tem o olhar
desconfiado. Didier, o terceiro, tem um ar efeminado e às vezes vem às sessões maquiado – estuda
maquiagem artística e explica-nos que a dele é feita por um colega. Pierre, o caçula, é também mais solto,
sempre pronto para pregar peças, desempenha admiravelmente o papel de brincalhão da família. Na
primeira entrevista, a família expõe sua história recente, marcada por mudanças por vários países do
Oriente onde o pai ocupa um cargo diplomático. Ao fim de suas andanças a família se instala na capital,
onde sua adaptação profissional parece difícil. Bastante deprimido, mescla nostalgia e amargura: seus
conhecimentos do oriente interessam pouca gente. Recentemente foi obrigado a abandonar um cargo
importante para se dedicar a uma livraria especializada em temas do oriente. Os rapazes viajam
frequentemente para o Oriente a fim de – dizem – reencontrar a atmosfera da infância. Quanto à mãe,
parece ter-se adaptado melhor à França, retomou sua atividade como tradutora de alemão. (...)Ao retomar
a história familiar, o Sr. D’Argos, relata que no início dos anos 40, quando tinha cinco anos, o pai morreu
em um acidente e a mãe ficou com cinco filhos pequenos. Não sabendo como enfrentar as contingências
da vida, ela decidiu coloca-los em um internato. Ao se lembrar daquele penoso tempo, ele acrescenta que
sua mulher, quando pequena, também sofrera a perda do pai, mas tivera a sorte de ficar perto da mãe, que
é a figura que acolhe a família quando eles voltam do Oriente. Os irmãos do Sr. D’Argos também são
viajantes e retoma então a história de seus antepassados, relatando que estes vivam em uma aldeia onde
em cada geração um dos homens era prefeito da aldeia e este era quem dirigia a empresa familiar. O pai
do Sr. D’Argos, quando vivo, exerceu essa função por alguns anos, mas cansado, decidiu ir trabalhar em
uma outra empresa na qual viajava muito e onde graças a seu talento progrediu rapidamente. Viajava com
a jovem esposa e os filhos por todo o Oriente e o sr. D’Argos, conheceu então, desde pequeno o mar e o
barco, instrumentos para suas viagens em família. A morte prematura do pai foi que interrompeu essa
rotina, que posteriormente seria retomada pelo próprio Sr. D’Argos. Na história familiar da Sra D’Argos,
o pai era o segundo marido da mãe, era um homem vinte e cinco anos mais velho que a mãe, militar de
carreira, tinha a seu favor o fato de ter participado de duas guerras mundiais, e a sra. D’Argos parecia
muito orgulhosa disso.Morreu durante as manobras de 1940, não na guerra, o que teria aumentado ainda
mais o seu prestígio, mas de um simples acidente de carro longe da frente de batalha. A mãe da Sra.
D’Argos, “mulher sólida”, foi obrigada a suportar corajosamente tal choque e conseguiu manter a
estabilidade do lar. A família possui uma ´serie de peleterias, que foram construídas há mais de 200 anos
e trabalham todos no comércio. O Sr. D’Argos coloca então que o comércio nada tem a ver com sua
família. A Sra D’Argos coloca que o seu avô, era um personagem mítico para a família, pois era um
empreendedor e aventureiro que foi caçar ursos no extremo norte canadense e graças a seu tino comercial
conseguiu consolidar um grande negócio na Europa e fundou as peleterias. Porém, como na família do Sr.
D’Argos, a morte interrompera esse movimento. Percebemos então que as histórias evocadas pela família
são romanceadas e muitas mortes marcam os relatos. As mortes são conectadas a um movimento no
momento onde a família para em algum país, colocando sempre o fantasma de que a parada levaria a
morte trágica de um membro do grupo. É nesse mesmo movimento que a família vem a terapia, após o
retorno do Oriente e o estabelecimento da família na França, Marc começa a apresentar sintomas de
catatonia”. ( Eiguer, 1995,p. 128-130)

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