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A ALEGRIA DO AMOR.
A ALEGRIA DO AMOR que se vive nas
famílias é também o júbilo da Igreja. Apesar dos numerosos sinais de crise no matrimónio – como foi observado pelos Padres sinodais – «o desejo de família permanece vivo, especialmente entre os jovens, e isto incentiva a Igreja».[1] Como resposta a este anseio, «o anúncio cristão sobre a família é verdadeiramente uma boa notícia».[2] TEMPO E ESPAÇO Recordando que o tempo é superior ao espaço, quero reiterar que nem todas as discussões doutrinais, morais ou pastorais devem ser resolvidas através de intervenções magisteriais. Naturalmente, na Igreja, é necessária uma unidade de doutrina e práxis, mas isto não impede que existam maneiras diferentes de interpretar alguns aspectos da doutrina ou algumas consequências que decorrem dela. I CAPITULO. A LUZ DA PALAVRA. A Bíblia aparece cheia de famílias, gerações, histórias de amor e de crises familiares, desde as primeiras páginas onde entra em cena a família de Adão e Eva, como seu peso de violência mas também com a força da vida que continua (cf. Gn 4), até às últimas páginas onde aparecem as núpcias da Esposa e do Cordeiro (cf. Ap21, 2.9).As duas casas de que fala Jesus, construídas ora sobre a rocha ora sobre a areia (cf. Mt 7, 24-27), representam muitas situações familiares, criadas pela liberdade de quantos habitam nelas, porque – como escreve o poeta – «toda a casa é um candelabro» FAMÍLIA E SOFRIMENTO. O idílio, que o Salmo128 apresenta, não nega uma amarga realidade que marca toda a Sagrada Escritura: é a presença do sofrimento, do mal, da violência, que dilaceram a vida da família e a sua comunhão íntima de vida e de amor. Não é de estranhar que o discurso de Cristo sobre o matrimónio (cf.Mt 19, 3-9) apareça inserido numa disputa a respeito do divórcio. A Palavra de Deus é testemunha constante desta dimensão obscura que assoma já nos primórdios, quando, com o pecado, a relação de amor e pureza entre o homem e a mulher se transforma num domínio: «Procurarás apaixonadamente o teu marido, mas ele te dominará» (Gn 3, 16). A TERNURA DO ABRAÇO. Como distintivo dos seus discípulos, Cristo pôs sobretudo a lei do amor e do dom de si mesmo aos outros (cf. Mt 22, 39; Jo 13, 34), e fê-lo através dum princípio que um pai ou uma mãe costumam testemunhar na sua própria vida: «Ninguém tem maior amor do que quem dá a vida pelos seus amigos» (Jo 15, 13). Frutos do amor são também a misericórdia e o perdão. Nesta linha, é emblemática a cena que nos apresenta uma adúltera na explanada do templo de Jerusalém, primeiro, rodeada pelos seus acusadores e, depois, sozinha com Jesus, que não a condena mas convida-a a uma vida mais digna (cf. Jo 8, 1- 11). FAMÍLIA ÍCONE. Cada família tem diante de si o ícone da família de Nazaré, com o seu dia-a-dia feito de fadigas e até de pesadelos, como quando teve que sofrer a violência incompreensível de Herodes, experiência que ainda hoje se repete tragicamente em muitas famílias de refugiados descartados e inermes. Como os Magos, as famílias são convidadas a contemplar o Menino com sua Mãe, a prostrar-se e adorá-Lo (cf. Mt 2, 11). Como Maria, são exortadas a viver, com coragem e serenidade, os desafios familiares tristes e entusiasmantes, e a guardar e meditar no coração as maravilhas de Deus (cf. Lc 2, 19.51) CAPÍTULO II. CRISE FAMILIAR. Por outro lado, «há que considerar o crescente perigo representado por um individualismo exagerado que desvirtua os laços familiares e acaba por considerar cada componente da família como uma ilha, fazendo prevalecer, em certos casos, a ideia dum sujeito que se constrói segundo os seus próprios desejos assumidos com carácter absoluto».[12] «As tensões causadas por uma cultura individualista exagerada da posse e fruição geram no seio das famílias dinâmicas de impaciência e agressividade».[13] MUITO MAIS… Durante muito tempo pensámos que, com a simples insistência em questões doutrinais, bioéticas e morais, sem motivar a abertura à graça, já apoiávamos suficientemente as famílias, consolidávamos o vínculo dos esposos e enchíamos de sentido as suas vidas compartilhadas. Temos dificuldade em apresentar o matrimónio mais como um caminho dinâmico de crescimento e realização do que como um fardo a carregar a vida inteira. O NARCISISMO IMPEDE O COMPROMISSO. O narcisismo torna as pessoas incapazes de olhar para além de si mesmas, dos seus desejos e necessidades. Mas quem usa os outros, mais cedo ou mais tarde acaba por ser usado, manipulado e abandonado com a mesma lógica. Faz impressão ver que as rupturas ocorrem, frequentemente, entre adultos já de meia-idade que buscam uma espécie de «autonomia» e rejeitam o ideal de envelhecer juntos cuidando-se e apoiando-se. CRISE ÉTICA CONJUGAL. Ninguém pode pensar que o enfraquecimento da família como sociedade natural fundada no matrimónio seja algo que beneficia a sociedade. Antes pelo contrário, prejudica o amadurecimento das pessoas, o cultivo dos valores comunitários e o desenvolvimento ético das cidades e das aldeias. Já não se adverte claramente que só a união exclusiva e indissolúvel entre um homem e uma mulher realiza uma função social plena, por ser um compromisso estável e tornar possível a fecundidade. Nenhuma união precária ou fechada à transmissão da vida garante o futuro da sociedade. CRISE DO MASCULINO. O homem «desempenha um papel igualmente decisivo na vida da família, especialmente na proteção e sustento da esposa e dos filhos. (...) Muitos homens estão conscientes da importância do seu papel na família e vivem-no com as qualidades peculiares da índole masculina. A ausência do pai penaliza gravemente a vida familiar, a educação dos filhos e a sua integração na sociedade. Tal ausência pode ser física, afetiva, cognitiva e espiritual. Esta carência priva os filhos dum modelo adequado do comportamento paterno».[44] A ESPERANÇA DA FAMÍLIA. Dou graças a Deus porque muitas famílias, que estão bem longe de se considerarem perfeitas, vivem no amor, realizam a sua vocação e continuam para diante embora caiam muitas vezes ao longo do caminho. Partindo das reflexões sinodais, não se chega a um estereótipo da família ideal, mas um interpelante mosaico formado por muitas realidades diferentes, cheias de alegrias, dramas e sonhos. As realidades que nos preocupam, são desafios. Não caiamos na armadilha de nos consumirmos em lamentações autodefensivas, em vez de suscitar uma criatividade missionária. Em todas as situações, «a Igreja sente a necessidade de dizer uma palavra de verdade e de esperança. (...) OLHAR FIXO EM JESUS. O nosso ensinamento sobre o matrimónio e a família não pode deixar de se inspirar e transfigurar à luz deste anúncio de amor e ternura, se não quiser tornar-se mera defesa duma doutrina fria e sem vida. Com efeito, o próprio mistério da família cristãs ó se pode compreender plenamente à luz do amor infinito do Pai, que se manifestou em Cristo entregue até ao fim e vivo entre nós. Por isso, quero contemplar Cristo vivo que está presente em tantas histórias de amor e invocar o fogo do Espírito sobre todas as famílias do mundo. CAPÍTULO III.OLHAR FIXO EM JESUS. A encarnação do Verbo numa família humana, em Nazaré, comove com a sua novidade a história do mundo. Precisamos de mergulhar no mistério do nascimento de Jesus, no sim de Maria ao anúncio do anjo, quando foi concebida a Palavra no seu seio; e ainda no sim de José, que deu o nome a Jesus e cuidou de Maria; na festa dos pastores no presépio; na adoração dos Magos; na fuga para o Egito, em que Jesus participou no sofrimento do seu povo exilado, perseguido e humilhado; na devota espera de Zacarias e na alegria que acompanhou o nascimento de João Batista; na promessa que Simeão e Ana viram cumprida no templo; na admiração dos doutores da lei ao escutarem a sabedoria de Jesus adolescente. O MATRIMONIO. O sacramento do matrimónio não é uma convenção social, um rito vazio ou o mero sinal externo dum compromisso. O sacramento é um dom para a santificação e a salvação dos esposos, porque «a sua pertença recíproca é a representação real, através do sinal sacramental, da mesma relação de Cristo com a Igreja. Os esposos são, portanto, para a Igreja a lembrança permanente daquilo que aconteceu na cruz; são um para o outro, e para os filhos, testemunhas da salvação, da qual o sacramento os faz participar». SEMENTES DO VERBO. «O Evangelho da família nutre também as sementes ainda à espera de desenvolver-se e deve cuidar das árvores que perderam vitalidade e necessitam que não as transcurem»,[73] de modo que, partindo do dom de Cristo no sacramento, «sejam conduzidas pacientemente mais além, chegando a um conhecimento mais rico e uma integração mais plena deste mistério na sua vida».[74] SEMENTES DO VERBO. «O discernimento da presença das semina Verbi. (cf. Ad gentes, 11) pode-se aplicar também à realidade matrimonial e familiar. Para além do verdadeiro matrimónio natural, há elementos positivos também nas formas matrimoniais doutras tradições religiosas»,[76] embora não faltem também as sombras. Podemos dizer que «toda a pessoa que deseja formar, neste mundo, uma família que ensine os filhos a alegrar-se por cada acção que se proponha vencer o mal – uma família que mostre que o Espírito está vivo e operante – encontrará gratidão e estima, independentemente do povo, região ou religião a que pertença».[77] TRANSMISSÃO DA VIDA. O matrimónio é, em primeiro lugar, uma «íntima comunidade da vida e do amor conjugal»,[80]que constitui um bem para os próprios esposos;[81]e a sexualidade «ordena-se para o amor conjugal do homem e da mulher».[82]Por isso, também «os esposos a quem Deus não concedeu a graça de ter filhos podem ter uma vida conjugal cheia de sentido, humana e cristãmente falando». A IGREJA FAMÍLIA. A Igreja é família de famílias, constantemente enriquecida pela vida de todas as igrejas domésticas. Assim, «em virtude do sacramento do matrimónio, cada família torna-se, para todos os efeitos, um bem para a Igreja. Nesta perspectiva, será certamente um dom precioso, para o momento actual da Igreja, considerar também a reciprocidade entre família e Igreja: a Igreja é um bem para a família, a família é um bem para a Igreja. A salvaguarda deste dom sacramental do Senhor compete não só à família individual, mas a toda a comunidade cristã».[102] O AMOR NO MATRIMONIO. Tudo o que foi dito não é suficiente para exprimir o Evangelho do matrimónio e da família, se não nos detivermos particularmente a falar do amor. Com efeito, não poderemos encorajar um caminho de fidelidade e doação recíproca, se não estimularmos o crescimento, a consolidação e o aprofundamento do amor conjugal e familiar. De facto, a graça do sacramento do matrimónio destina-se, antes de mais nada, «a aperfeiçoar o amor dos cônjuges» O NOSSO AMOR QUAOTIDIANO O AMOR É ….
O AMOR É …
O AMOR É…
O AMOR FONTE INESGOTÁVEL DA VIDA!
SERVIÇO No conjunto do texto, vê-se que Paulo quer insistir que o amor não é apenas um sentimento, mas deve ser entendido no sentido que o verbo «amar»tem em hebraico: «fazer o bem». Como dizia Santo Inácio de Loyola, «o amor deve ser colocado mais nas obras do que nas palavras».[106] Assim poderá mostrar toda a sua fecundidade, permitindo-nos experimentara felicidade de dar, a nobreza e grandeza de doar-se superabundantemente, sem calcular nem reclamar pagamento, mas apenas pelo prazer de dar e servir. SEM INVEJA. O verdadeiro amor aprecia os sucessos alheios, não os sente como uma ameaça, libertando-se do sabor amargo da inveja. Aceita que cada um tenha dons distintos e caminhos diferentes na vida; e, consequentemente, procura descobrir o seu próprio caminho para ser feliz, deixando que os outros encontrem o deles. SEM VAIDADE. Segue-se o termo perpereuetai, que indica vanglória, desejo de se mostrar superior para impressionar os outros com atitude pedante e um pouco agressiva. Quem ama não só evita falar muito de si mesmo, mas, porque está centrado nos outros, sabe manter- se no seu lugar sem pretender estar no centro. A palavra seguinte – physioutai – é muito semelhante, indicando que o amor não é arrogante. DESPRENDIMENTO. Como se diz muitas vezes, para amar os outros, é preciso primeiro amar-se a si mesmo. Todavia este hino à caridade afirma que o amor «não procura o seu próprio interesse», ou «não procura o que é seu». Esta expressão aparece ainda noutro texto: «Não tenha cada um em vista os próprios interesses, mas todos e cada um exactamente os interesses dos outros» (Flp 2, 4).Perante uma afirmação assim clara da Sagrada Escritura, deve-se evitar de dar prioridade ao amor a si mesmo, como se fosse mais nobre do que o dom de si aos outros. PERDÃO. Quando estivermos ofendidos ou desiludidos, é possível e desejável o perdão; mas ninguém diz que seja fácil. A verdade é que «a comunhão familiar só pode ser conservada e aperfeiçoada com grande espírito de sacrifício. Exige, de facto, de todos e de cada um, pronta e generosa disponibilidade à compreensão, à tolerância, ao perdão, à reconciliação. Nenhuma família ignora como o egoísmo, o desacordo, as tensões, os conflitos agridem, de forma violenta e às vezes mortal, a comunhão: daqui as múltiplas e variadas formas de divisão da vida familiar» AS EMOÇÕES Desejos, sentimentos, emoções (os clássicos chamavam-lhes «paixões») ocupam um lugar importante no matrimónio. Geram-se quando «outro» se torna presente e intervém na minha vida. É próprio de todo o ser vivo tender para outra realidade, e esta tendência reveste-se sempre de sinais afectivos basilares: prazer ou sofrimento, alegria ou tristeza, ternura ou receio. São o pressuposto da actividade psicológica mais elementar. O ser humano é um vivente desta terra, e tudo o que faz e busca está carregado de paixões. CAPITULO V. O AMOR QUE SE TORNA FECUNDO. O amor sempre dá vida. Por isso, o amor conjugal «não se esgota no interior do próprio casal (...). Os cônjuges, enquanto se doam entre si, doam para além de si mesmos a realidade do filho, reflexo vivo do seu amor, sinal permanente da unidade conjugal e síntese viva e indissociável do ser pai e mãe».[176] FECUNDAÇÃO ALARGADA Àqueles que não podem ter filhos, lembramos que «o matrimónio não foi instituído só em ordem à procriação (...). E por isso, mesmo que faltem os filhos, tantas vezes ardentemente desejados, o matrimónio conserva o seu valor e indissolubilidade, como comunidade e comunhão de toda a vida».[199] Além disso, «a maternidade não é uma realidade exclusivamente biológica, mas expressa-se de diversas maneiras».[200] A ADOÇÃO «A opção da adopção e do acolhimento exprime uma fecundidade particular da experiência conjugal, mesmo para além dos casos de esposos com problemas de fertilidade (...). Ao contrário das situações em que o filho é desejado a todo o custo, como um direito ao próprio completamento, a adopção e o acolhimento, rectamente compreendidos, mostram um aspecto importante da paternidade e da filiação ajudando a reconhecer que os filhos, quer naturais quer adoptivos ou acolhidos, são em si mesmos outro sujeito e é preciso recebê-los, amá-los, cuidar deles e não apenas trazê-los ao mundo. O CORPO. Nesta linha, convém tomar muito a sério um texto bíblico que habitualmente é interpretado fora do seu contexto ou duma maneira muito geral, pelo que é possível negligenciar o seu sentido mais imediato e directo, que é marcadamente social. Trata-se da primeira Carta aos Coríntios (11, 17-34), onde São Paulo enfrenta uma situação vergonhosa da comunidade. Nela, algumas pessoas facultosas tendiam a discriminar os pobres, e isto verificava-se mesmo na ágape que acompanhava a celebração da Eucaristia. Enquanto os ricos se deleitavam com seus manjares, os pobres olhavam e passavam fome: «Enquanto um passa fome, outro fica embriagado. Porventura não tendes casas para comer e beber? Ou desprezais a Igreja de Deus e quereis envergonhar aqueles que nada têm?» CAPITULO VII. REFORÇAR A EDUCAÇÃO DOS FILHOS. Os pais incidem sempre, para bem ou para mal, no desenvolvimento moral dos seus filhos. Consequentemente, o melhor é aceitarem esta responsabilidade inevitável e realizarem-na de modo consciente, entusiasta, razoável e apropriado. Uma vez que esta função educativa das famílias é tão importante e se tornou muito complexa, quero deter-me de modo especial neste ponto. FILHOS E ÉTICA Os pais necessitam também da escola para assegurar uma instrução de base aos seus filhos, mas a formação moral deles nunca a podem delegar totalmente. O desenvolvimento afectivo e ético duma pessoa requer uma experiência fundamental: crer que os próprios pais são dignos de confiança. Isto constitui uma responsabilidade educativa: com o carinho e o testemunho, gerar confiança nos filhos, inspirar-lhes um respeito amoroso. PACIÊNCIA A educação moral implica pedir a uma criança ou a um jovem apenas aquelas coisas que não representem, para eles, um sacrifício desproporcionado, exigir-lhes apenas aquela dose de esforço que não provoque ressentimento ou acções puramente forçadas. O percurso normal é propor pequenos passos que possam ser compreendidos, aceites e apreciados, e impliquem uma renúncia proporcionada. Caso contrário, pedindo demasiado, nada se obtém. A pessoa, logo que puder livrar-se da autoridade, provavelmente deixará de praticar o bem.