Conhecimento de Idosos Sobre o Uso de Psicotrópicos

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Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste

ISSN: 1517-3852
[email protected]
Universidade Federal do Ceará
Brasil

Araújo Prudêncio, Fabrícia; Tolstenko Nogueira, Lidya


CONHECIMENTO DE IDOSAS SOBRE O USO DE PSICOTRÓPICOS
Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, vol. 14, núm. 1, 2013, pp. 130-138
Universidade Federal do Ceará
Fortaleza, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=324027985015

Como citar este artigo


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Prudêncio FA, Nogueira LT

Artigo Original
CONHECIMENTO DE IDOSAS SOBRE O USO DE PSICOTRÓPICOS*

KNOWLEDGE OF ELDERLY WOMEN ABOUT THE USE OF PSYCHOTROPICS

CONOCIMIENTO DE ANCIANOS ACERCA DEL USO DE PSICOTRÓPICOS

Fabrícia Araújo Prudêncio1, Lidya Tolstenko Nogueira2

Decorrentes do processo de envelhecimento podem surgir doenças e a necessidade do uso de medicações psicotrópicas. Esta pesquisa
exploratória, descritiva, com abordagem qualitativa, objetivou descrever o conhecimento de idosas sobre o uso desses medicamentos.
No período de julho a agosto de 2009 foram entrevistadas 18 idosas cadastradas na Estratégia Saúde da Família, que utilizavam
benzodiazepínicos e/ou antidepressivos. Os dados foram organizados com base na técnica de análise de conteúdo de Bardin.
Evidenciou-se que as idosas conhecem a indicação terapêutica dos medicamentos psicotrópicos, sabem distinguir as reações adversas
e relatam a dependência química, notadamente de benzodiazepínicos. Concluiu-se que as idosas acompanhadas pela Estratégia Saúde
da Família adquiriram o conhecimento sobre os medicamentos psicotrópicos na experiência cotidiana e que é necessário ampliar a
discussão sobre o tema e estimular a formulação de diretrizes voltadas para o uso desses medicamentos pelos idosos.
Descritores: Enfermagem; Idoso; Medicamento.

The process of aging can result in diseases and the need for psychotropic medication. This exploratory and descriptive research with
qualitative approach aimed to describe the knowledge of the elderly women about the use of such medication. We interviewed 18
elderly subjects, from July to August 2009, registered in the Family Health Strategy that had been using benzodiazepine and / or
antidepressants. The data were organized through Bardin’s technique of content analysis. This research showed that the elderly knew
the therapeutic indication of the psychotropic medication, how to distinguish the adverse reactions and reported addiction, mainly to
benzodiazepine. We concluded that elderly people assisted by the Family Health Strategy acquired knowledge about psychotropic
drugs in their everyday experience and that it is necessary to extend discussions on the topic, as well as the formulation of guidelines
aimed at the use of psychotropic drugs by the elderly.
Descriptors: Nursing; Elderly; Medication.

Del proceso de envejecimiento pueden emergí enfermedades y necesidad de medicamentos psicotrópicos. Esta investigación
exploratoria y descriptiva, con enfoque cualitativo, tuvo como objetivo describir el conocimiento de ancianos acerca del uso de
medicamentos psicotrópicos. Se entrevistaron a 18 pacientes durante de julio a agosto de 2009, registrados en la Estrategia de Salud
Familiar que utilizaban benzodiazepina y/o antidepresivos. Los datos fueron organizados basados en la técnica de análisis de contenido
de Bardin. Los ancianos conocían la indicación terapéutica de los medicamentos psicotrópicos, distinguían las reacciones adversas y
relataron la dependencia química, notablemente de benzodiazepina. Los ancianos asistidos por la Estrategia de Salud Familiar
adquirieron conocimiento acerca de medicamentos psicotrópicos en su experiencia cotidiana y de que es necesario ampliar las
discusiones sobre el tema y la formulación de directrices para el uso de drogas psicotrópicas por ancianos.
Descriptores: Enfermería; Anciano; Medicamento.

* Extraído da dissertação Conhecimento e prática de idosos sobre o uso de medicamentos psicotrópicos, apresentada à Universidade Federal do Piauí, em 2010.
2
Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal do Piauí. Professora Assistente pela Universidade Estadual do Piauí. Teresina, PI. Brasil. E-mail:
[email protected]
2
Enfermeira. Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Docente do Departamento de Enfermagem da Unive rsidade Federal do Piauí. Teresina,
PI. Brasil. E-mail: [email protected]

Autor correspondente: Fabrícia Araújo Prudêncio


Rua Bolívia, 1862. Bairro: Cristo Rei. CEP: 64016-370.Teresina, PI. Brasil. E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO
hipnóticos e os antidepressivos, drogas utilizadas, por
De acordo com o Estatuto do Idoso, são vezes, de maneira inapropriada e errônea. Partindo
consideradas idosas todas as pessoas com idade igual
ou superior a 60 anos(1). No Brasil, a cada ano são desse pressuposto, apresenta-se como problema de
incorporados 650 mil novos idosos: de 3 milhões em pesquisa: qual é o conhecimento que os idosos têm
1960 esse número atingiu 20 milhões em 2008, sobre os psicotrópicos que utilizam? Com base nesse
representando um aumento de quase 700% em menos questionamento, constituiu objetivo deste estudo
(2)
de 50 anos . No Piauí, há 331.877 mil idosos, ou descrever o conhecimento de idosos sobre o uso de
10,64% da população do Estado, sendo a maioria do medicamentos psicotrópicos.
(3)
sexo feminino, com 178.484 mil mulheres . A necessidade de se desenvolver pesquisas sobre
O aumento da expectativa de vida evidenciado esse tema é caracterizada, sobretudo, pela constatação
nos últimos 60 anos é atribuído à queda da fecundidade de lacunas e incipiências na produção científica na área
e aos avanços tecnológicos como: o uso de vacinas, de Enfermagem. Além disso, constitui-se estudo inédito
antibióticos, quimioterápicos, propiciando a prevenção e no Piauí, o que não significa que seja relevante apenas
a cura de muitas doenças. Assim, o perfil de morbidade para o cenário estadual, mas importa a toda a sociedade
e mortalidade, antes caracterizado por doenças brasileira, na medida em que traz reflexões, discussões
infectocontagiosas, foi substituído por doenças crônicas e conhecimentos sobre um problema que incide em todo
(4)
não transmissíveis . o país.
Nesse aspecto, a prática medicamentosa dos Estudo realizado, em 2007, sobre a análise de
idosos inclui fármacos variados, que vão de anti- teses e dissertações de enfermagem envolvendo o idoso
hipertensivos, diuréticos, hipoglicemiantes e insulina até no Brasil, revelou que as pesquisas abordam mais
os que atuam no sistema nervoso central. Atualmente o assuntos relacionados a doenças e cuidados com o
estresse e a ansiedade se apresentam como situações idoso, não existindo nenhuma produção voltada ao uso
que além de envolverem mudanças na rotina dos de medicamentos por esse grupo populacional(7).
pacientes requerem o uso de medicamentos Assim, o presente estudo aborda aspectos
(5)
psicotrópicos com controle mais rigoroso . De acordo relevantes que possibilitam ampliar e aprofundar a
com o primeiro levantamento domiciliar sobre o reflexão acerca da assistência aos idosos que usam
consumo de psicotrópicos nas 107 maiores cidades medicamentos psicotrópicos. Também servirá no
brasileiras, comprovou-se o hábito de consumo contexto da educação, como fonte bibliográfica,
frequente e crescente na população, bem como se oferecendo subsídios a pesquisas congêneres, por se
revelaram os efeitos negativos e os impactos causados, tratar de temática pouco pesquisada.
sobretudo, à saúde desses indivíduos(6).
MÉTODO
Com o olhar voltado para esse levantamento, e a
partir da inserção profissional de uma das autoras como Estudo exploratório-descritivo com abordagem
enfermeira na Estratégia Saúde da Família, pôde-se qualitativa, realizado no período de julho a agosto de
observar que é comum a utilização de medicamentos 2009, em unidade de saúde localizada na zona sudeste
psicotrópicos por idosos, principalmente os sedativo- de Teresina-PI, Brasil. De acordo com o levantamento
realizado nas fichas dos Agentes Comunitários de Saúde,

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existiam 239 idosos cadastrados e, segundo registros Posteriormente as entrevistas foram ouvidas e
contidos nos prontuários, 55 utilizavam drogas transcritas cabalmente, de maneira a permitir uma
psicotrópicas. Destes, 51 usavam ansiolíticos, melhor compreensão dos sentidos buscados e com
antipsicóticos e/ou antidepressivos há pelo menos um vistas a alcançar o objetivo proposto. Vale lembrar que
ano. na apresentação das falas, optou-se por mencionar a
Os sujeitos do estudo foram idosos cadastrados substância química do medicamento.
na equipe 80 da Estratégia Saúde da Família, em uso de Os dados coletados foram organizados com base
sedativo-hipnóticos e/ou antidepressivos por no mínimo na técnica de Análise de Conteúdo de Bardin e
um ano e que tinham condições de participar da discutidos à luz do referencial teórico. Nessa
entrevista. Diante dos critérios de inserção dos sujeitos, perspectiva, privilegiou-se a Análise de Conteúdo
não puderam participar idosos com demência e com Categorial Temática, através do desmembramento do
problemas de dicção e fala. conteúdo das falas dos sujeitos. A citada técnica
Participaram da pesquisa 18 idosas. Cabe envolveu três etapas: a pré-análise, a exploração do
destacar que o estudo abrangeu somente mulheres material, e o tratamento dos resultados e
idosas, pois os homens que utilizavam medicação interpretação(8).
psicotrópica encontravam-se hospitalizados; os demais A pré-análise abrangeu a organização do material
idosos cadastrados apresentavam sequelas de doenças coletado e a segunda etapa envolveu a exploração do
que comprometiam a fala. material obtido, mediante o exame detalhado e posterior
Para a coleta dos dados, utilizou-se a entrevista codificação em unidades temáticas. A última etapa
semiestruturada, cujo roteiro continha duas partes: a consistiu no tratamento e interpretação dos resultados,
primeira que abordava dados sociodemográficos (idade, à luz do referencial temático. A definição das categorias
estado civil, escolaridade e renda familiar), com quem temáticas considerou como princípios os conteúdos e as
residiam, medicamento psicotrópico que utilizavam, unidades semânticas, as semelhanças e as diferenças de
tempo de uso, prescritor atual, acompanhamento de sentidos, agrupando os dados em função de
psiquiatra e local de armazenamento. A segunda parte características comuns para serem analisados
(8)
constou de perguntas direcionadas para os posteriormente .
conhecimentos sobre o uso dos medicamentos Em todas as etapas da pesquisa observou-se a
psicotrópicos, como: o que você conhece sobre essa(s) Resolução n° 196/96. O projeto foi aprovado pelo
medicação(ções)? Para que foi indicada? Sente alguma CEP/UFPI conforme protocolo no 0043.0.045.000-09C e
reação com o uso do psicotrópico? Conseguiria ficar sem os sujeitos foram consultados sobre a decisão individual
utilizar o psicotrópico? de participar ou não do estudo.
As entrevistas foram realizadas nos domicílios das
RESULTADOS
idosas, por proporcionar um ambiente seguro, tranquilo,
familiar e livre de interrupções; as falas foram gravadas Inicialmente buscou-se abordar sobre o perfil
em MP10 player, com duração média de 25 minutos, socioeconômico das idosas e sobre o consumo
incluindo a apresentação do tema, leitura e assinatura medicamentoso, para que fosse possível, então,
do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e descrever o seu conhecimento acerca do uso de
gravação dos depoimentos, até se alcançar a saturação. medicamentos psicotrópicos.

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As idosas encontravam-se na faixa etária de 70 a muitas situações podem ser reversíveis com a redução
80 anos, eram aposentadas, viúvas, com ensino da dose; ou quando da ingestão da medicação em doses
fundamental incompleto, renda familiar de dois salários excessivas, sendo denominada de reação adversa não
mínimos (equivalente a R$ 465,00 no período da coleta relacionada à ação principal do fármaco(9). Nesse
de dados), residiam com filhos e netos, faziam uso de sentido, são elucidativas as falas a seguir: Amitriptilina me
diazepam e amitriptilina, cujo consumo variava de 1 a dá secura na boca, na garganta, fico sem saliva. O diazepam, não
sinto nada (Entrevistada 5). O que sinto devido eu tomar esse remédio
25 anos, prescrito na maioria das vezes pelo médico da
[diazepam], é só sono, é muito sono, eu durmo muito, eu acho até
Estratégia Saúde da Família, sem acompanhamento de
bom... (Entrevistada 7). Com a amitriptilina eu sinto a boca amarga e
psiquiatra. No decorrer da entrevista as idosas, seca é só isso que eu sinto e mais nada (Entrevistada 10). Efeito ruim
espontaneamente, empenharam em mostrar os eu não sinto, não. Quando eu usava a amitriptilina aí eu amanhecia
com uma dor fina na cabeça que o tempo ia passando e passava sem
medicamentos psicotrópicos de que faziam uso, os quais
precisar tomar remédio, aí foi por isso que o médico mudou para o
se encontravam no prazo de validade e guardados em
clonazepam e com ele eu me dou bem (Entrevistada 13).
locais longe do sol e sem umidade. Ainda voltado para o conhecimento sobre os
De acordo com a Análise de Conteúdo foi medicamentos psicotrópicos, evidenciou-se nas falas a
possível agrupar as falas em três categorias: relação de dependência das idosas à medicação. Assim,
conhecimento das idosas sobre as indicações o termo dependência é entendido como um fenômeno
terapêuticas; conhecimento das idosas sobre as reações biológico decorrente da administração repetida do
adversas e conhecimento das idosas sobre a medicamento, podendo ocorrer com a utilização de
dependência dos psicotrópicos. drogas psicotrópicas através de diferentes
Ao serem questionadas sobre o que conheciam mecanismos (10)
.
sobre o uso dos medicamentos psicotrópicos, as idosas As idosas ao serem questionadas sobre a
mencionaram o fármaco, as indicações terapêuticas, as possibilidade de deixar o uso do psicotrópico
reações adversas e a dependência química advinda, expressaram-se conforme as falas a seguir: Parece que não
conforme mostram as falas a seguir: A amitriptilina sei que é consigo não! Ah! Porque se eu não tomar, eu não durmo e fico mais
antidepressivo, o diazepam é para gente que fica com insônia, sem doente, eu fico em pé e fico querendo cair, com um negócio na
sono, não consegue dormir, aí toma diazepam (Entrevistada 5). O cabeça. Tem vez que eu fico até tremendo, se um dia eu tiver saúde e
diazepam é para juízo, não é?! Para a memória, não é?! A amitriptilina dormir bem aí eu vou conseguir. Já foi muita gente que falou para eu
serve para minha cabeça, para eu pensar normal, para largar de ficar deixar esse comprimido, o que eu faço? Será que esse comprimido
encabulada, chorando, que às vezes eu choro muito. Eu imagino, está fazendo mal para mim? (Entrevistada 3). Se eu ficar sem tomar,
assim, foi o doutor que passou, foi ele que me viu, me olhou, sabe o eu tenho para mim que eu pioro. Será que eu posso deixar? Não
que eu tenho aí eu confio nele (Entrevistada 6). O diazepam diz que é queria deixar não, porque eu me sinto bem, passo o dia bem
bom para os nervos, para acalmar, para dormir, porque eu não durmo (Entrevistada 6).
e é justamente por isso que ele [o médico] passa (Entrevistada 9). A Outras idosas também se expressaram da
amitriptilina serve para acalmar, ficar tranquila... Ah! Para depressão,
seguinte forma: Eu acho que não, assim se for o jeito tem que
assim foi passado para mim e para minha vizinha (Entrevistada 10).
ficar, mas se tiver um jeitinho sem usar é melhor. Eu já passei de
Sei não, não sei para que serve, só sei que o médico passa, mas ele
semana para não ficar muito viciada, eu passei semana sem tomar,
mesmo nem explica para que é ( Entrevistada 15).
mais aí tem dia que não durmo de jeito nenhum (Entrevistada 13). Eu
As idosas também relataram seus conhecimentos
não sei nem informar o que acontece se eu deixar, eu acho que não
sobre as reações adversas ao uso de medicamentos durmo, aí fico com aquela impressão naquele remédio, se eu não
psicotrópicos. Uma reação adversa pode ocorrer de duas tomar ele eu não durmo. Já tentei deixar passei 15 dias sem tomar,
mas aí não tinha sono que prestasse, não dormia nem um cochilo.
formas: primeiro relacionado à principal ação
Precisava fazer uma garapa de açúcar para eu dormir aí eu durmo,
farmacológica do medicamento, o que é previsível e em

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mas aí eu tenho medo de tomar e apresentar diabete porque dizem podem ser colocados em dúvida, especialmente os
que a gente idoso não pode viver tomando garapa doce (Entrevistada
relacionados a conhecimentos, habilidades e atitudes
14). Acho que não. Porque eu já estou viciada, tudo que é bom a
adquiridos na academia.
gente se vicia e o diazepam quando eu não tenho, fico sofrendo: como
é que vai ser à noite sem o diazepam (Entrevistada 16). Observou-se a valorização atribuída pelas idosas
aos medicamentos psicotrópicos, entre os quais os
DISCUSSÃO
antidepressivos e os ansiolíticos, esses últimos indicados
As idosas, por meio de linguagem simples e clara, nos casos de distúrbios de ansiedade e do sono, visto
revelaram seus conhecimentos sobre as indicações que induzem sonolência e simulam um estado de sono
terapêuticas dos medicamentos psicotrópicos, com a natural(10). Tais indicações terapêuticas reforçam a
apropriação advinda do uso rotineiro, embora sem o preferência dos idosos e o hábito do uso prolongado.
domínio científico de tais indicações. Para minimizar esta situação geradora de
Nesse sentido, observou-se discrepância no dependência, ressalta-se a importância das relações de
conhecimento das idosas acerca da indicação redes sociais, construídas com as pessoas que
terapêutica dos medicamentos psicotrópicos. Enquanto circundam o ambiente dos idosos e que, por meio de
as entrevistadas cinco, nove e 10 demonstraram clareza uma interação de comunicação, ajudam a conhecer o
no entendimento sobre as indicações terapêuticas da porquê do consumo e qual medicamento o outro
amitriptilina e do diazepam, a entrevistada seis revelou consome(12-13). O conhecimento que os idosos adquirem
conhecer em parte tais indicações e a entrevistada 15 sobre o uso dos medicamentos psicotrópicos provém
relatou desconhecimento sobre o assunto. tanto da interação médico-paciente quanto do contato
Essa desigualdade no conhecimento da indicação com o meio social em que vivem. Ressalta-se, também,
terapêutica dos medicamentos psicotrópicos tem que a trajetória de convivência com médicos de variadas
semelhança com estudo realizado em Fortaleza-Ceará, especialidades e a diversidade de medicamentos
com idosos hipertensos para avaliar o nível de consumidos permite aos idosos estabelecer distinções
conhecimento sobre a enfermidade e adesão ao entre o que consideram os melhores e piores
tratamento medicamentoso, cujos resultados revelaram medicamentos(14).
que 69,1% não souberam definir a hipertensão arterial O conhecimento de reações adversas,
enquanto que os demais se expressaram de forma principalmente entre as idosas usuárias de amitriptilina,
simples, clara e não científica. Mesmo com a baixa apontou para a sensação de boca seca. A entrevistada
escolaridade desses idosos, a adesão ao tratamento foi 13 mencionou cefaleia ao amanhecer, com o uso dessa
atribuída ao comparecimento da maioria à unidade de medicação, o que se contrapõe às pesquisas que
(11)
saúde e ao recebimento gratuito da medicação . mostram a indicação desse fármaco na profilaxia das
Ainda nas falas das entrevistadas seis e 15, enxaquecas. Ademais, os antidepressivos possuem
revelou-se a relação de confiança estabelecida entre os benefícios no tratamento de distúrbios obsessivos
médicos que prescreveram os medicamentos compulsivos, distúrbio do pânico, ansiedade
psicotrópicos e as idosas, pois essas não se permitiam generalizada, distúrbios disfórico pré-menstrual, bulimia
indagar sobre a indicação do medicamento. As idosas nervosa, depressões e dores crônicas (15).
manifestaram ainda a visão ideologizada do profissional As drogas antidepressivas costumam causar
de saúde como detentor do saber científico e que, por respostas anticolinérgicas, principalmente entre os
esta razão, personifica a autoridade cujos atos não idosos, que são os mais sensíveis. Os efeitos comuns

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são xerostomia, retenção urinaria, constipação, benzodiazepínicos leva os usuários a se tornarem


hipotensão postural, visão congestionada, sedação, dependentes químicos e, quanto mais tempo de
náuseas e concentração diminuída, insônia, consumo, maior é a necessidade de persistir com a
agravamento da psicose, aumento de massa corporal, medicação.
agravamento de glaucoma e de epilepsia e distúrbios Percebeu-se na fala das entrevistadas a relação
sexuais(10-15). de necessidade e dependência que sentem em usar os
A disponibilidade de antidepressivos para os medicamentos psicotrópicos, quando se referem ao vício
idosos na rede básica de saúde deve ser objeto de e ao sofrimento com a hipótese da ausência do
reflexão, e no cenário do estudo restringe-se à medicamento. Na prática profissional, é comum
amitriptilina, que provoca efeitos anticolinérgicos nem constatar os pedidos frequentes e insistentes de receitas
sempre bem tolerados. Nesse sentido, a padronização de medicamentos controlados e os relatos de idosos que
de medicamentos tem como fundamento o controle dos não conseguem livrar-se desse tipo de fármaco.
custos e por essa razão o sistema de saúde limita a A fala da depoente 14 comprova o emprego de
introdução de outros fármacos psicotrópicos. práticas alternativas para diminuir ou abandonar o
Dentre as idosas que utilizam os sedativo- consumo de psicotrópicos. No consultório, os idosos
hipnóticos, somente a entrevistada sete mencionou a costumam mencionar que utilizam medidas caseiras
sonolência excessiva como reação adversa ao diazepam, como chás, “garapa de rapadura” e leite morno; porém,
que é muito frequente entre os que utilizam esse tipo de tais recursos na maioria das vezes não apresentam
medicamento por período prolongado. respostas satisfatórias, o que faz com que eles retomem
Em se tratando dos sedativo-hipnóticos, o o uso dos medicamentos psicotrópicos.
diazepam pode provocar como reações adversas A dependência química foi apontada pelas idosas
sonolência, hipotonia muscular e incapacidade de que faziam uso de benzodiazepínicos. A dependência é
lembrar eventos que ocorrem durante a ação da droga, caracterizada por sintomas desagradáveis após a
erupção cutânea e síndrome de abstinência. Os suspensão abrupta de qualquer substância, sendo que
benzodiazepínicos possuem a meia-vida de eliminação nos casos de pacientes que usam benzodiazepínicos,
longa e, portanto, o uso de múltiplas doses causa um pode ocorrer mesmo com doses baixas e com pouco
efeito acumulativo e residual, como a sonolência(10). Em tempo de uso(18). Estudos comprovam que os
alguns estudos, comprovou-se que o diazepam mostrou psicotrópicos quando utilizados sem um diagnóstico
vários efeitos adversos em usuários crônicos, como os correto, orientação de um profissional de saúde ou
sintomas de angústias, dores articulares, depressão e ainda de forma inadequada, podem causar
(16) (19)
tontura . A idade também é um fator que contribui dependência .
para maior sensibilização do sistema nervoso central e, O uso de medicamentos psicotrópicos por mais de
desse modo, idosos estão expostos a maiores riscos de seis meses pode ocasionar a dependência, além do
intoxicação e efeitos adversos como ataxia, vertigens e aumento das taxas de quedas e acidentes em idosos. O
(17)
distúrbios comportamentais . efeito da dependência deve ser alertado pelo médico e
Em relação ao uso dos benzodiazepínicos, enfermeiro, pois a falta de esclarecimento facilita a
algumas idosas confirmaram não conseguirem abster-se cronicidade do uso(20). Além disso, os psicotrópicos
dessa medicação, configurando, portanto, a constituem a classe com o maior número de
dependência. O uso por tempo prolongado de medicamentos sem receita médica no domicílio,

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principalmente os benzodiazepínicos pelo fato de a Evidenciou-se desigualdade quanto ao


receita ficar retida na farmácia o que leva a muitas conhecimento sobre a indicação terapêutica dos
pessoas ficarem sem orientação formal para o uso medicamentos psicotrópicos: enquanto algumas idosas
(21)
destes medicamentos . Ademais, de acordo com a mencionaram de maneira correta tais indicações, mesmo
avaliação da qualidade das receitas nem todas as que sem a apropriação da terminologia científica, outras
prescrições vem acompanhada das informações mínimas demonstraram conhecimento parcial. Ademais, foi
(22)
recomendadas . possível observar que algumas idosas não tiveram
Faz-se necessário, portanto, um trabalho interesse ou curiosidade em buscar informações sobre o
multiprofissional, sistemático, na monitoração dos idosos fármaco, por acreditar que o saber médico é
que utilizam medicamentos psicotrópicos, especialmente inquestionável e, portanto, não lhes cabe a busca de
na Estratégia Saúde da Família. Supõe-se que essas explicações para o esclarecimento sobre os
ações ainda não se encontram implementadas pelos medicamentos prescritos.
profissionais de saúde, por não terem eles voltado a As idosas pesquisadas têm conhecimento sobre os
atenção para o uso excessivo desse tipo de medicação efeitos colaterais do uso dos medicamentos
pela população assistida, e, também, por ser uma psicotrópicos, e, entre os mais relatados, destacaram a
prática assistencial rotineira, na qual não é avaliado o sensação de “boca seca” e sonolência ocasionadas pelo
custo e o benefício dos medicamentos psicotrópicos em uso de amitriptilina e diazepam, respectivamente.
longo prazo. Percebeu-se também a relação de dependência das
idosas aos benzodiazepínicos, pois elas referiram
CONSIDERAÇÕES FINAIS
sofrimento psíquico na possibilidade de ausência dessa
O presente estudo possibilitou o alcance do medicação, decorrente do consumo por períodos
objetivo proposto quanto a descrever o conhecimento prolongados. Algumas idosas, ainda, reportaram a
de idosas sobre o uso dos medicamentos psicotrópicos, utilização de medidas caseiras na tentativa de suprir o
tendo como ponto favorável a metodologia utilizada, que uso do psicotrópico, mas relataram insucesso nesse tipo
deu voz àquelas que habitualmente utilizam tais de conduta.
fármacos. Porém, como limitações destacaram-se: o Diante do exposto, torna-se necessário repensar o
campo do estudo delimitado à área de abrangência de diálogo entre os profissionais de saúde e os pacientes,
uma única equipe da Estratégia Saúde da Família e o no sentido de adequar a linguagem à compreensão dos
envolvimento exclusivo de idosos do sexo feminino, com idosos e tentar desmistificar a relação de poder e
idade superior a 70 anos. domínio do saber científico.
As idosas expressaram seus conhecimentos sobre Acredita-se que, na abordagem da Estratégia
as indicações terapêuticas, reações adversas e Saúde da Família, faz-se necessário um trabalho
dependência química dos medicamentos psicotrópicos multiprofissional no sentido de referenciar os idosos ao
de forma simples, com linguagem clara e de fácil psiquiatra antes da primeira prescrição do medicamento
compreensão, e que esse conhecimento é oriundo das psicotrópico. Esse acompanhamento especializado deve
experiências relacionadas com o tempo de consumo, ser mantido no decorrer do tratamento.
visto serem usuárias de longo período, bem como da Além disso, os enfermeiros têm importante papel
relação social com outros idosos e profissionais de educativo, no sentido de reforçar as orientações sobre o
saúde. uso dos medicamentos psicotrópicos prescritos, tempo

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estimado de uso, efeitos terapêuticos e reações [periódico na Internet]. 2007 [citado 2012 set 01]; 6(1).
adversas, para que os idosos incorporem novos Disponível em:
conhecimentos e exerçam uma prática segura na http://www.objnursing.uff.br/índex.php/nursing/article/v
utilização desses fármacos. iew/689.
Por outro lado, os resultados mostraram a 8. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Ed 70; 2009.
necessidade de diretrizes na área de saúde do idoso 9. Rang HP, Dale MM, Ritter JM, Flower, RJ.
relacionadas ao uso prolongado de medicamentos Farmacologia. 6ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2007.
psicotrópicos e, no direcionamento efetivo das ações 10. Sappa AMAM, Oliveira IRO. Farmacologia. 7ª ed. Rio
desenvolvidas pelos profissionais da Estratégia Saúde da de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.
Família voltadas para a melhoria da assistência 11.Romero AD, Silva MJ, Silva ARV, Freitas RWJF,
dispensada a essa clientela. Damasceno MMC. Características de uma população de
idosos hipertensos atendida numa Unidade de Saúde da
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Brasília: Ministério da Saúde; 2009. idosos de Porto Alegre: uma abordagem qualitativa. Rev
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Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios [Internet]. 14. Mendonça RT, Carvalho ACD. O papel de mulheres
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Recebido: 02/01/2012
Aceito: 14/11/2012

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