Seja Feliz, Meu Filho - Içami Tiba
Seja Feliz, Meu Filho - Içami Tiba
Seja Feliz, Meu Filho - Içami Tiba
Tiba, Içami
Seja feliz, meu filho / Içami Tiba ; ampliação, atualização e revisão Natércia Tiba. — São Paulo : Integrare
Editora, 2006.
ISBN 85-99362-09-07
1. Crianças — Criação 2. Pais e filhos 3. Psicologia infantil I. Tiba, Natércia. II. Título.
06-7970 CDD-155.4
olivro original Seja feliz, meu filho foi escrito em 1995. Eu estava ainda na
faculdade de psicologia e me lembro, como se fosse ontem, de ter ficado
encantada com ele. Para mim, o título já era uma declaração de amor.
Lembro-me do abraço apertado e das minhas lágrimas de emoção ao ver o
livro pela primeira vez.
Naquela época, vivi a emoção de filha do autor, um misto de amor,
admiração e gratidão. Passada uma década, agora casada com uma pessoa
incrível e com dois filhos maravilhosos, vivo a emoção de mãe que quer,
acima de tudo, que eles sejam também muito felizes. Já consigo ver no
sorriso dos meus filhos a declaração de amor feita pelo avô. Ocupo um lugar
privilegiado – uma mensageira entre a primeira e a terceira geração. Uma
mensagem escrita pelo meu pai a partir de sua história de vida, sua história
profissional, com a participação e contribuição incontestável da sua
companheira de vida, minha mãe.
Como filha, colega de consultório e profissão, tive o enorme prazer e a
honra de fazer a revisão e atualização deste livro – o meu preferido. Foi um
trabalho gostoso e emocionante.
Desde a primeira edição de Seja feliz, meu filho, muita coisa mudou. O
mundo está diferente, mais competitivo, mais perigoso, a vida e a
privacidade das pessoas, mais expostas, ocorreram muitas mudanças nas
formas de relacionamento afetivo e na constituição familiar. Mais liberdade
e também mais liberalismo. Parece que precisamos estar muito melhor
preparados do que antigamente para conseguir sobreviver nos dias de hoje.
Diante de tanta mudança, algo permaneceu imutável: o desejo dos pais
de que seus filhos sejam felizes.
O desejo é o mesmo, mas o que nos faz felizes, não. A felicidade, que
antes estava relacionada à estabilidade, a um casamento duradouro e a
filhos saudáveis, hoje parece algo muito mais complexo e difícil de atingir.
Para alguns, a felicidade está em ser bem-sucedido profissionalmente; para
outros, está em ver os filhos preparados para o futuro, livres das drogas;
alguns a encontram na fama e no sucesso, outros precisam de tudo isso e
muito mais.
Talvez o que seja felicidade para nós, pais, não seja felicidade para os
filhos. Talvez o que sonhamos para eles não seja aquilo que eles queiram
realizar. O importante é darmos a eles os instrumentos e uma estrutura
emocional que os ajude a alcançar seus próprios objetivos.
Por amor aos filhos, sonhamos e criamos expectativas, e também por
amor a eles, temos que deixá-los sonhar e ajudá-los a ser o melhor que
podem ser. Para isso, não basta apenas amor e boas intenções. São
necessárias informações, esclarecimentos, atenção, observação, dedicação e
reflexão.
Este é o objetivo deste livro. Ele é um convite aos pais apaixonados e
bem-intencionados para também se instruírem, para se tornarem os
melhores pais possíveis. Ele nos ajuda a refletir sobre as expectativas que
temos em relação aos filhos, e como estas podem favorecê-los ou prejudicá-
los na construção de sua própria história. Este livro acolhe a angústia de
pais que se sentem desorientados e preocupados com a educação e a
felicidade dos filhos.
Tenho certeza de que Seja feliz, meu filho trará à tona uma série de
sentimentos. Lembranças e vivências que temos enquanto filhos. Amor,
esperança e amparo enquanto pais.
Mas esta obra traz, acima de tudo, uma reflexão guiada por um excelente
profissional, uma pessoa extraordinária, que tem orientado jovens e famílias,
pais e educadores na busca não só da própria felicidade, mas também de
uma sociedade melhor.
Que a leitura deste livro os beneficie enquanto pais e possa torná-los
também mensageiros desta declaração de amor, para que ela possa ser
passada ainda para muitas gerações.
NATÉRCIA TIBA
Psicóloga de crianças e adolescentes.
Responsável pela ampliação,
atualização e revisão desta obra.
Primavera de 2006
introdução
diz um ditado que durante a vida o homem deve plantar uma árvore, ter
um filho e escrever um livro. Mas um desses objetivos jamais pode ser
alcançado sozinho: o filho. Ele nunca é um objeto pessoal. Vai ser sempre
uma produção do casal. A natureza fez a vida de uma maneira muito sábia,
porque são necessárias sempre duas pessoas para formar uma criança.
Um detalhe interessante:
O filho, por sua vez, pode corresponder ou não às expectativas dos pais.
Aliás, elas muitas vezes até se tornam o objetivo da criança, num gesto de
reciprocidade do amor.
Passam a ser reciprocidade quando esses desejos dos pais são expressos
de um jeito gostoso, afetivo, muito mais do que por meio de orientações
verbais ou de um discurso pronto, do tipo “Se não arrumar o quarto vai ser
um bagunceiro”, “Se não estudar vai se transformar num vagabundo”, “Se é
bom em aritmética, será engenheiro”. Aliás, quando os pais educam para não
ser desse ou daquele jeito, dão a dica do modelo rejeitado por eles. E,
assim, oferecem uma arma preciosa para que os filhos os agridam e os
contrariem nas mais diversas ocasiões.
Quando as expectativas dos pais são expressas de um jeito prazeroso, elas
podem se tornar para o filho um objeto gostoso. A criança aprende muito
mais com o clima afetivo agradável do que numa atmosfera ameaçadora, em
que reina a agressividade. É verdade que os pais às vezes cometem erros,
inclusive sem má intenção.
O importante é que os pais não façam dos
seus sonhos uma camisa-de-força para
os filhos, permitindo que experimentem
os próprios caminhos.
E um dia, quando menos esperam, os pais vão perceber que seus filhos
atingiram o objetivo pretendido por eles. O fundamental não era a sua
felicidade?!
Os pais
➊
sempre esperam
algo dos filhos
teresa era a única menina da família de quatro filhos homens em que reinava
a visão de que mulher deveria nascer morta. Teve uma irmã antes dela, que
morreu no primeiro aniversário de vida. Ela cresceu ouvindo a mãe dizer que
os homens não prestam e que sua missão na vida era protegê-la contra o sexo
masculino. O pai, um machão típico, acreditava que a mulher tem cabelos
compridos porque suas idéias são curtas. Se tivesse cabelo curto, não valeria
nada. Por isso, Teresa só pôde cortar os cabelos pela primeira vez aos 17 anos.
Dez anos antes, quando estava com 7, num raro gesto de carinho, o pai tentou
pentear-lhe os cabelos. A mãe desaprovou a iniciativa. E, assim que o penteado
ficou pronto, comentou: “Seu pai estragou seu cabelo”, como se dissesse: “Seu
pai a violentou, tirou o que você tinha de mais precioso. Agora, você não vale
mais nada”.
Até os 10 anos de idade, Teresa dormiu no quarto dos pais e cansou de ouvir
a mãe reclamando de maus-tratos, dizendo que só não se separava do marido
porque tinha que cuidar da filha. Portanto, era dela a culpa pela infelicidade
da mãe, que dizia mais: só iria se livrar do marido quando Teresa se casasse.
“Afinal, homem nenhum presta, a começar pelo pai e terminar nos netos.”
Assim, os pobres filhos que Teresa nem chegara a conceber já estavam sendo
desprezados pela avó.
Rejeitada por ser mulher e ao mesmo tempo superprotegida, Teresa só podia
sair na rua na companhia dos irmãos mais velhos, que se encarregavam de fazer
a assepsia dos homens. Ai dela se olhasse para dentro dos bares e barbeiros,
onde se encontravam os perigosos espécimes masculinos. A frase “homem não
presta” foi de tal maneira repetida e incutida na cabeça de Teresa que ela
acabou ficando com uma idéia distorcida do sexo oposto. Para escapar da prisão
onde cresceu, refugiava-se nos livros, que lhe apresentavam outro tipo de vida,
diferente da que ela vivia. Teresa ansiava esse futuro para as filhas, já que
achava que ela mesma estava condenada. Sentia-se frágil e impotente pelo fato
de ser tão desvalida na família.
Um dia, começou a namorar um rapaz que os irmãos viviam
ridicularizando. Diziam que ele não valia nada, o que era extensivo, portanto,
às escolhas afetivas da jovem. Anos depois, ficou provado que este homem, o
único que se interessou por ela, era um fraco. Apesar das críticas, casou-se com
esse sujeito que escolheu e arrumou a casa de forma que a mãe pudesse vir
morar com ela (afinal, a mãe não vivia dizendo que ia se separar depois que ela
se casasse?). Para surpresa de Teresa, a mãe recusou, com a seguinte desculpa:
“O que vão dizer meus netos de terem uma avó separada?” Na verdade, ela
jamais iria se separar daquele marido que a maltratava.
Teresa levou para casa o berço onde dormira e foi lá que acomodou seus
filhos. Por uma dessas fatalidades da vida, teve três meninas: a primeira foi
aceita pela sua família, a segunda recebeu o nome da mãe e a terceira foi
tremendamente rejeitada. Era só a avó pegá-la no colo que ela já começava a
chorar. Ah! Se esse berço pudesse falar, quanta história ele teria para contar
sobre o que ouviu, presenciou...
Mas a maternidade apenas não bastava. Teresa quis estudar para ser livre e
sentir-se valorizada como mulher. Hoje, aos 75 anos, é escritora e tem vários
livros publicados. Criou as filhas para serem independentes, auto-suficientes,
capazes de lutar e trabalhar para se manterem. Elas ditariam os próprios passos,
sem ter de prestar contas a ninguém – o que Teresa nunca pôde fazer. Deu-lhes
tamanha liberdade que hoje está só. Sem o carinho das filhas, dos genros e dos
netos.
Teresa se culpa pela indiferença das filhas ao seu sofrimento. Onde foi que
ela errou?
Na sua psicoterapia, descobriu que sempre só deu, sem nada pedir ou exigir
em troca, como se de nada precisasse, mas intimamente esperando que as filhas
aprendessem a devolver espontaneamente essa doação, sem que ela tivesse que
pedir. Vivia espartanamente, para que suas filhas não sentissem falta de nada.
Elas se acostumaram com a idéia de que a mãe de nada precisava. Hoje, esta
supermãe já está idosa e precisa de ajuda. Teresa tem esperança de que um dia
suas filhas percebam quanto precisa delas.
Um gesto de amor
Todo pai que é pai de verdade e toda mãe que é mãe mesmo não
conseguem ficar indiferentes ao nascimento de um filho. É um desejo
atávico do ser humano desejar coisas boas para um descendente: querer que
ele nasça perfeito, bonito, saudável. E, de preferência, com o passar dos
anos, torne-se bem-sucedido, se possível rico e, melhor ainda, um
profissional reconhecido. O sonho dos pais é que seus filhos sejam pessoas
felizes e realizadas. Para que alcancem esse objetivo, oferecem a eles o que
conseguiram de melhor em suas vidas e procuram evitar toda dor e todo
sofrimento. No entanto, como pais, a gente transmite aos nossos filhos não
só facilidades, como no exemplo de Freud, mas também sobrecargas, como
no caso de Teresa.
Vale a pena acrescentar que as expectativas não são só dos pais. O social
também cobra por meio das grandes famílias. Um exemplo clássico: se você
namora, todo mundo fica xeretando: “E aí, quando vocês vão ficar noivos?”
Para um casal de noivos, a pergunta mais ouvida é: “Quando é que sai esse
casamento?” Então você se casa e todo mundo quer logo saber: “Quando é
que vêm os filhos?” Mal nasce o primeiro filho, já indagam sobre o segundo.
Nossos pais, muitas vezes, podem esperar de nossos filhos, seus netos,
que preencham as expectativas deles. Com o filho, o avô talvez não tenha se
sentido tão realizado, porque este deu muito trabalho na infância. Agora,
eles afrouxam, deixando o lado pesado da educação para os pais. Querem
apenas curtir o neto. Podem vir a ser excelentes avós sem terem sido
excelentes pais. A maioria, aliás, foi muito rígida no passado. Por isso se diz
que os avós estragam os netos porque são muito permissivos.
Paralelamente, um homem que não resolveu sua independência pessoal
e que ainda traz dentro de si, muito fortes, as expectativas dos próprios pais,
pode transmiti-las ao filho e esperar que ele corresponda aos anseios dos
avós, coisa que ele mesmo não foi capaz de fazer. Dizem, aliás, que só sendo
pai para entender o próprio pai.
O nascimento de uma criança e a responsabilidade que esse evento
acarreta sobre os novos pais possibilitam uma aproximação dos pais e avós
na figura do neto. Num primeiro momento, isso acontece sobretudo com a
mãe, que corre para a própria mãe, buscando ajuda sobretudo nos cuidados
com o bebê. Quanto ao pai, essa aproximação da geração anterior ocorre em
geral na adolescência, quando ele começa a perceber que o filho não
corresponde às suas expectativas e pode chegar à velha conclusão: “Meu pai
tinha razão”.
Reprodução assistida
Cada vez que o filho se afasta do caminho traçado por eles, entram num
estado de ansiedade.
Cabe a nós, pais, saber distinguir aquilo que é melhor de fato para o filho
e o que é melhor para nós, pais. Identificando as nossas exigências, fica mais
fácil libertar o filho para o sucesso. Afinal, alguém que esteja o tempo todo
preocupado em corresponder às expectativas alheias estará dividido e talvez
nunca chegue a produzir livremente e a mostrar ao mundo o que pode fazer
de melhor.
Um exemplo típico
Bebês difíceis
Errar é humano.
Persistir no erro é... estar envolvido.
Só as pessoas envolvidas continuam errando, porque têm sempre as
mesmas percepções, esperam que o outro reaja como gostariam e vivem na
expectativa de que na próxima vez será melhor.
Nenhum futuro pai ou mãe, olhando a barriga da gestante, espera que ali
esteja um bebê que venha a dar muito trabalho ou tenha algum tipo de
problema. Especialmente aqueles pares que só se casaram para o “tudo
bem” são pegos de surpresa, quando seus filhos apresentam esse tipo de
comportamento. As desavenças conjugais podem aparecer, muitas vezes,
em virtude das dificuldades surgidas nos papéis de pai e mãe. O marido, por
exemplo, pode ficar enciumado vendo a esposa cobrir a criança de
cuidados. E, a partir daí, agredir o filho, achando que ele é o culpado pelo
fato de sua mulher não lhe dar mais atenção e estar sendo muito mais mãe
que esposa. A mulher também pode ficar enciumada ao observar o marido
no papel de pai.
De modo geral, a mãe está mais envolvida com os filhos do que o pai,
que fica menos tempo dentro de casa. A convivência faz com que a mãe, e
não o pai, se volte mais para o problema das crianças. Resultado: a visão da
mãe torna-se mais conivente; a do pai, mais crítica. Quando os filhos se
desenvolvem bem, e existem essas diferenças entre os pais, ou elas não
aparecem ou é possível conviver com elas sem maiores dramas. Na
ocorrência de problemas, elas ficam evidentes e irritantes.
Menino ou menina?
O problema maior ocorre quando os filhos, mesmo normais e
saudáveis, nascem com o sexo diferente do esperado ou justamente aquele
rejeitado pelos pais. Aliás, desde o momento em que nascemos, em função
do sexo que apresentamos, já recebemos um tratamento específico que
funciona como adequação social ao gênero masculino e feminino, mas ao
mesmo tempo pode ser uma camisa-de-força, uma prisão ao machismo e ao
feminismo.
Isso me faz lembrar a história de um casal sem filhos que queria muito
ter uma menina e acabou por “adotar” um sobrinho, filho de parentes
próximos. Na verdade, o mais exato seria dizer “tomou emprestado para
educar”. Com o tempo, a tia apossou-se do garoto e começou a tentar
realizar, por meio dele, o sonho de ter uma filha. Só lhe dava bonecas de
presente e não permitia, de jeito nenhum, que cortasse o cabelo. Era a tia
que mandava naquela casa; o tio não se manifestava: era totalmente omisso.
Esses fatos trouxeram sérias complicações para o estabelecimento da
identidade sexual da criança. Ele era um garoto normal, mas não podia se
desenvolver como homem para não desagradar à tia. Com isso, foi castrando
suas características masculinas. Assim, forçou-se a barra do que era normal
em vista do que os pais/tios sonhavam.
Aparentemente, esse é um caso extremo. Mas é bom saber que nós
fazemos isso no nosso cotidiano, sem perceber, embora em menor escala.
Ensinando limites
Se fez de propósito, é bem provável que entenda também que aquilo não
foi bom e não deve ser repetido. Isso deve ser dito num tom mais sério,
porém de forma nenhuma agressivo. Havendo agressão, o que a criança
registra é só a agressão, muito raramente a causa dela, o motivo pelo qual
está sendo agredida. A noção de tempo para a criança não inclui o passado
antigo nem o futuro remoto. Engloba o presente e o passado recente, que
logo ela esquece. A emoção mais forte ocupa o lugar da lembrança. A
criança deixa na sua memória marcas muito mais nítidas da dor do que do
aprendizado.
Quando a criança entende que errou, é interessante falar de modo curto
e claro, nunca curto e grosso. Porque, ainda que a criança entenda, a
grossura pode deseducar muito mais do que a clareza educa. Caso a criança
não entenda, a agressão dos pais acaba tendo um resultado ainda mais
desastroso. Eles estão provocando uma reação contrária às suas
expectativas, porque quem bate esquece que bateu, enquanto quem apanha
registra dentro de si que apanhou.
Se a proibição dos pais não atinge mais a criança, é importante verificar
por que ela aprendeu a desrespeitar as ordens. Quase sempre, os
professores dessa desobediência às ordens dos pais são os próprios pais,
quando eles mesmos desrespeitam as regras que instituíram para os filhos.
As crianças, então, aprendem que as ordens dos pais não serão cumpridas
por eles, o que as autoriza a não segui-las também.
A mãe que diz não e, diante da insistência do filho, acaba cedendo,
ensina para a criança que o “não” pode virar “sim”, desde que ela insista.
Essa insistência pode durar 1 segundo ou 3 horas. A criança vai continuar
tentando, enquanto acreditar que pode transformar o “não” em “sim”. Neste
cenário, surge o pai, que, sem estar envolvido com a história, pode
concordar com a criança, numa franca contraposição às ordens da mãe. A
tradução disso para a criança é: se mamãe não deixa, papai permite. E vice-
versa.
Quando querem algo que lhes é negado, os filhos sabem exatamente como
quebrar a proibição. Às vezes, eles têm que ouvir vários “nãos” antes do
“sim”, outras têm que pedir na frente das visitas ou contando com a
intercessão delas. Às vezes, têm que pedir quando os pais estão bem
ocupados numa tarefa qualquer, falando ao telefone ou cuidando do irmão
menor. As crianças encontram uma hora em que os pais estão fragilizados.
Se a mãe não agüenta mais a ladainha e joga a decisão para o pai que vai
chegar, ela está se desautorizando. E, pior, colocando o pai numa posição
difícil.
Algumas vezes, as situações de confronto vão se desenrolando de tal
maneira que, de repente, os adultos acabam praticando o que sempre
abominaram nas suas expectativas de serem bons pais: o tapa.
O tapa, os cascudos e os puxões de orelhas (nem falo das chineladas e
cintadas) são formas de agressão, e na agressão subentende-se que há uma
descarga de raiva. Com raiva, não se educa!
A difícil
➌
(e sublime)
missão dos pais
Pais que tomam para si tarefas do filho, sem verificar quais são suas reais
necessidades ou desejos, podem estar partindo de um pressuposto básico: o
de que conhecem mais o desejo da criança do que a própria criança. A
seqüência pode ser trágica. Às vezes, por saber levantar-se, a criança se
ergue sozinha e experimenta prazer ao fazer isso. Se os pais forem
hipersolícitos, estendendo a mão em caráter de ajuda toda vez que a criança
cai, talvez ela reaja com um golpe instintivo de sobrevivência dos seus
desejos e acabe por atingi-los.
Os pais podem então desconfiar de que fizeram algo que não deveriam e
aprendem a mudar seu comportamento. Ou ferir-se na sua auto-estima,
achando, sim, que foi o filho que errou. E, por fim, devolver-lhe um tapinha
na mão, dizendo: “Não bata na mamãe”. Volto a insistir, muitas vezes me
refiro apenas à mãe porque normalmente é a figura mais constante na vida
da criança.
O tapinha na mão funciona, nesse caso, como uma faca de dois gumes:
ensina a criança a reagir quando a mãe a agride ou simplesmente coloca na
sua cabeça que ela não pode reagir. Desse modo, seu gesto natural de
defesa é castrado. Para ela, isso significa “não posso fazer coisas de que sou
capaz senão mamãe fica, no mínimo, chateada e, no máximo, bate em
mim”.
A reação dessa mãe do exemplo não levou em conta o que se passava
com a criança porque ela estava ocupada demais com o que se passava com
ela própria. “Verdades” do tipo “em mãe não se bate” (entre aspas porque
tem mãe que precisa ser contida na sua superproteção e, quando pequena,
a criança não sabe fazê-lo de outra forma). Nessa situação, a mãe
desobedeceu à criança. Portanto, a semente da desobediência está plantada.
Uma das lições que a criança pode tirar desse episódio é que,
mesmo tendo capacidade de se levantar, precisa esperar que a mãe a
levante. Assim, só na presença da mãe ela depende de auxílio para se
erguer. Cai inúmeras vezes em outros lugares, mas se levanta sozinha.
Aprende também a manipular a mãe. Sabe fazer, mas por que se esforçar,
se a mãe larga tudo o que estiver fazendo para levantá-la?
O papel da mãe, como educadora, já está começando com sobrecarga e
sufoco para o adulto e folga para a criança.
No caso de hipersolicitude dos pais,
o filho não precisa se esforçar em nada
porque os pais se esforçam por ele.
A copa e a cozinha
Quartos bagunçados
Uma simples visita não é estímulo bastante para que coloquem seu canto
em ordem. Nessa ocasião, com freqüência os pais, que já nem conseguem
mais entrar no quarto do filho, brigam com o adolescente, uma vez que
pretendem estender a sala de visitas ao quarto dele. A preocupação dos pais
é: o que as visitas vão achar de nós com esse quarto tão bagunçado?
Forçar o adolescente a arrumar o quarto por causa das visitas é quase
uma batalha perdida. Justamente por causa delas, ele não vai arrumar. É
interessante notar que, quanto mais organizada a sala, mais bagunçado pode
ser o quarto do adolescente. Quanto mais os pais se empenham na busca da
ordem e do perfeccionismo, qualquer objeto que saia da organização
desperta neles uma vontade incontrolável de arrumar. Da mesma maneira, a
bagunça desperta no jovem o desejo de conviver com ela. Internamente, ele
acaba se organizando para viver na bagunça. Quando os pais se põem a
arrumar o quarto do filho adolescente, geralmente a mãe, ela diz “pela
milésima vez que é a última vez que ela arruma o quarto dele” . O filho nem
esquenta. Já ouviu esse discurso incontáveis vezes. Sabe que uma a mais
não vai fazer diferença e que essa última vez só dura até a próxima visita.
Nesse esquema, a mãe continua como cozinheira, o pai como provedor, e o
filho como comensal.
Há pais que arrumam o quarto pelos filhos na esperança de que eles
aprendam com os exemplos. E, de uma hora para a outra, comecem a segui-
los. Na prática, o que vemos é que só o exemplo não é suficiente.
A aprendizagem do custo/benefício
escola é quase
uma exigência
todos os pais, sem exceção, são favoráveis a que seu filho estude. O grau do
estudo é que pode variar, da alfabetização à pós-graduação no exterior.
Quando os filhos concordam em estudar, a tarefa dos pais é fácil. As
dificuldades surgem quando eles rejeitam a idéia.
A reviravolta da 5ª série
Na puberdade, os meninos
(com aproximadamente 11 anos)
podem apresentar problemas na área
de desenvolvimento, como falta
de atenção, memória e concentração
e conseqüente desorganização
das matérias e falta de método
para estudar.
Essa etapa de suas vidas consome tanta energia que eventualmente elas
poderiam até apresentar uma queda no rendimento escolar. Mas, em geral,
não é o que acontece. Se as meninas tiverem problemas na 7ª série, será por
outras questões, bem diferentes daquelas que causam turbulências na vida
dos rapazes.
Na fase de oposição, é uma boa arma para os filhos não irem bem
naquilo que os pais tanto desejam. Portanto, o jovem pode tomar como
opção de vida parar de estudar para trabalhar, já que não está rendendo
bem nos estudos. A ameaça voltou-se contra eles, pais, pois quando os
filhos começam a trabalhar, o pouco que ganham, para eles, é muito.
Confere autonomia psicológica e dá margem a um erro de avaliação de que
agora são auto-suficientes, logo “ninguém manda em mim”. A conta que
esses filhos não fazem é quanto eles custam para a casa, que estão usando
como pensão, na qualidade de moradia, restaurante e mordomia. Os pais
que diziam não sustentar vagabundo agora têm que engolir um filho que
não estuda, mas trabalha fazendo “bicos” por aí.
A liberdade do colegial
No JARDIM-DA-INFÂNCIA, tanto o
pai quanto a mãe participam
das reuniões escolares.
No PRIMÁRIO, alguns pais já
deixam de marcar presença.
No GINÁSIO, o pai só vai até a
escola em situações graves.
No COLEGIAL, ainda mais raramente.
Entretanto, as mães continuam
participando de todas as reuniões.
O curioso é que só volta a haver
o fluxo de ambos os pais por
ocasião do vestibular.
Têm razão os pais que querem e até forçam seus filhos a estudarem o
máximo que puderem, avançando na escolaridade. Uma pesquisa feita pelo
IBGE, o PNDA 2002 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios),
publicada na revista Veja de 6 de setembro de 2006, concluiu que:
Atualmente, o adolescente
tende a continuar no campo
que os pais abriram.
Opções extravagantes
Esse uniforme novo pode funcionar tal qual a birra dos 2 anos de idade:
é como se, de outra maneira, ele não pudesse se posicionar no mundo. O
que muda é apenas a linguagem utilizada. A criança birrenta que
permaneceu assim pode superpor a essa nova identidade uma boa dose de
birra. Ou seja, perpetuar um comportamento só porque os pais não o
aceitam. Isso não deixa de ser uma forma de agressão. É uma força mal
canalizada, porque em vez de aplicá-la no seu equilíbrio, passa para o
exagero de sua defesa.
Pais que foram intolerantes com a birra freqüentemente também o são
com essa “extravagância”. Na luta das duas gerações, os pais acabam
levando desvantagem, porque nesse ponto os filhos estão mobilizando todas
as suas energias para se auto-afirmarem. Quem e o que for contra essa auto-
afirmação são considerados seus inimigos, portanto, alvo de suas negações e
agressões.
Os pais querem que o filho não seja extravagante também para o bem
dele e, implicitamente, para o seu. Portanto, ficam divididos na sua posição.
Uma parte dessa divisão se soma à força de auto-afirmação dos
adolescentes. Assim, eles contam com sua força e mais um tanto da
proteção dos pais. E os pais, com metade de suas forças, lutam pela
adequação (obediência) do jovem, tentando, no fundo, justificar que é para
o bem dele. São comuns observações do tipo: “Quem vai gostar de você
assim? Desse jeito, você não vai conseguir nada. Vão dizer que é malandro,
traficante, drogado”.
Se antes os pais conseguiam reprimir uma birra, é bem provável que
agora não consigam fazer o mesmo com o filho escandaloso. Diante dessas
tentativas, os adolescentes demonstram uma necessidade maior da muleta e
permanecem mais tempo com ela.
As interferências dos pais no jeito
de ser do adolescente são sentidas
como uma diminuição de
sua individualidade,
uma redução à infância.
Nessa idade, os filhos muitas vezes retrucam com uma resposta cruel:
“Não pedi para nascer”. É uma crueldade porque os adolescentes estão
jogando todas as fichas num único comportamento, enquanto seus pais
jogam várias fichas em várias frentes. Desse modo, as gerações assumem
posições bem distintas e radicais perante o conflito.
Mas os pais podem estar certos dos sentimentos de pais. Se estiverem
tranqüilos com esse sentimento, essa certeza irá resistir a qualquer conflito.
Em outras palavras, isso significa: “Eu gosto de você, mas não aceito que
você faça determinadas coisas”. O filho que se sente amado não necessita
de uma muleta tão forte.
Nada mais natural do que desejar que os filhos vençam na vida. Bons
pais oferecem o melhor que está a seu alcance: boa escola, alimentos,
cuidados médicos.
Os pais que agem desse modo não o fazem por falta de amor, mas sim
por acreditar que a sua experiência de vida ensinou-os a distinguir o que é
melhor. É um erro de amor, mas não deixa de ser um erro.
Pais que venceram na vida são como árvores frondosas. Nesse caso, porém,
elas cresceram tanto que absorveram todo o sol. Portanto, suas sementes
são lançadas embaixo da sua grande copa e nascem protegidas da luz. Esses
pais que venceram na vida à custa de tanto esforço adquirem uma sensação
de poder que os autoriza a arbitrar sobre a vida das pessoas que estão sob
sua dependência. Como se a verdade estivesse sempre com eles: sabem o
que é melhor para o filho, escolhem para ele a profissão mais adequada. Tal
“saber” é antes um produto de desejo e exigência dos pais do que um real
conhecimento. “Sabem” o que é vencer na vida, baseados na própria
experiência. Quanto aos filhos, são obrigados a fazer várias adaptações para
sobreviver sob essa copa. O interessante é que esses pais costumam
esquecer que contrariaram os próprios pais, imigrando um dia. Talvez hoje
os pais idosos tenham orgulho deles, ao constatarem que venceram.
Provavelmente, na época da decisão de mudar de rumo, tenham tachado o
filho de rebelde e insubordinado, por aceitar outro destino que não o que
tencionavam dar a ele, também achando que fosse o melhor.
Assim, esses pais foram os primeiros a romper uma linha de educação na
qual os pais sabem o que é melhor para o filho, procurando fazer valer suas
escolhas e sonhos. E, de repente, os próprios filhos não podem fazer o que
eles fizeram. Feliz ou infelizmente, hoje em dia isso já não acontece tanto.
Árvores frondosas que jogam as sementes embaixo das próprias copas
acabam criando filhos muito frágeis.
Uma vez que os filhos posam como se fossem ricos, tal qual os pais,
ficam muito abusados, sentem-se detentores de grande autoridade e poder,
mas na verdade não passam de posseiros numa área que não lhes pertence.
Os pais fazem questão de que recebam educação e refinamento. Foi o que
lhes faltou quando estavam ocupados demais em trabalhar para constituir
seu patrimônio. Portanto, a nobreza é o complemento da riqueza, ou seja, os
pais se realizam por meio do filho nessa complementação. E o filho, que
não conquistou nada, apenas recebe dos pais a seguinte mensagem: “Para
você, basta ser nobre, ter do bom e do melhor”.
Porém, não adianta o jovem receber um diploma de médico, se não
cursou uma faculdade. Da mesma forma, não adianta receber um título de
nobreza, se não o conquistou, porque os nobres também têm despesas.
Alguém vai ter de sustentar o seu luxo. Se, na educação, os pais
transmitirem ao filho a noção de que lhe cabe usufruir a nobreza, ele não
estará nem um pouco preparado para se sustentar. E, muito provavelmente,
nem chegue a se preocupar com isso. Continuará vivendo na nobreza à
custa do pai vivo, ou, caso este esteja morto, à custa da herança, até liquidar
o último centavo.
Não é obrigatório que o filho de rico seja sempre nobre. Basta que os
pais estabeleçam com a criança uma relação custo/benefício, nos critérios
do próprio filho, quer dizer, o filho vai ter de arcar com as conseqüências de
tudo o que fizer.
Pais nobres não sabem educar. Sabem antes receber e usufruir. Tanto que
vão gastando a riqueza do pai vivo ou já falecido. Quando chega a vez do
próprio filho, já não sobra quase nada. Assim fica a terceira geração: os
netos pobres. O interessante é que geralmente esse filho pobre começa a
lutar tendo o pai como um antimodelo, enquanto se espelha no exemplo do
avô.
Assim como os demais, os pais nobres também querem que o filho vença
na vida, mas não têm força para empurrá-lo nessa direção: não podem
garantir a ele a melhor escola, uma alimentação saudável, ótimos cuidados
médicos. O neto pobre, embora tenha vivido sempre em sala de visitas,
nunca teve nada do pai. Não herdou a mesma condição financeira favorável
que os pais receberam dos avós. Quando atinge a adolescência, é muito
comum os pais estarem vivendo de aparências e os filhos, comendo mal e
enfrentando vários sacrifícios e privações para manter a nobreza paterna.
Os nobres podem destruir duas
gerações, além da própria:
a do seu pai e a do filho.
Conheci um sujeito, criado como nobre, que se casou com uma mulher rica.
Ainda vivendo como nobre na idade adulta, ele não conseguiu assumir a
família e foi abandonado pela esposa. Atualmente esse nobre, na faixa dos 40
anos, mora com o pai viúvo, que arca com todas as suas despesas. Para o social,
ele leva uma vida de nobre: joga golfe, tem carro importado, viaja
freqüentemente ao exterior. Mas não dispõe sequer de um centavo para dar de
mesada aos filhos, que ficaram com a mãe.
Um deles, adolescente, foi trazido à terapia porque não estudava, não fazia
nada. Achava que tinha direito a tudo, sem nenhum tipo de compromisso ou
responsabilidade. Nem o supletivo cursou direito. Os trabalhos ocasionais que
familiares da mãe lhe ofereciam não passavam de estágios de vida. Era um
adolescente nobre e ponto.
Uma vez trabalhada psicologicamente a nobreza desse garoto, ele acordou.
Percebeu que, se não traçasse um caminho para sua vida, acabaria como o pai,
numa vergonhosa situação de extrema dependência dos outros. Quando
começou a readquirir a própria identidade, desvencilhou-se da história da
família paterna e começou a produzir. Fez do pai seu antimodelo de vida.
Arregaçou as mangas e colocou um desafio para si mesmo: atingir a meta de 2
bilhões de dólares. Pode parecer apenas um sonho. Mas, se quiser, ele sabe que
pode conseguir muito mais do que o pai.
Pretende aplicar boa parte do seu primeiro salário como vendedor de uma
loja de automóveis. O restante deixará para seus prazeres. No íntimo, ele
entende que se continuar trabalhando só como empregado não vai atingir a
meta. Quer bolar algo novo, um sistema que permita alcançá-la, e já está
trabalhando nesse sentido. Enquanto isso, nem ousa mostrar seu holerite ao
pai, temendo que ele lhe peça algum dinheiro emprestado.
“Filho rico” e “filho de rico”
Há uma diferença básica entre esses dois tipos, que vai ser
determinada pela educação que recebem.
O grande retorno
A vida é um
processo dinâmico.
As oportunidades
servem para quem estiver
preparado a agarrá-las.
Pessoas que não puderam estudar, seja lá por que razão for,
costumam ter origem humilde e até carregar um certo complexo íntimo de
inferioridade por saber que não estudaram, quando, no fundo, saber que
não se sabe é uma grande sabedoria. Essa sensação de inferioridade em
relação a quem estuda acompanha essas pessoas desde a infância. Elas até
já estão acostumadas. Fica uma espécie de humildade que é quase
subserviência, e isso lhes confere uma posição de vida mais fragilizada. É a
cultura influindo na formação da personalidade.
Em geral, quem não estudou vive numa condição socioeconômica
desfavorável e acaba escolhendo uma parceira também desse meio. Pela
seqüência natural da vida, o passo seguinte são os filhos. Se não tiverem
uma crença religiosa, as pessoas ficam sem ponto de apoio para a sua
afirmação, que pode ser representada por um emprego garantido, mesmo
que mal pago. Tendo uma religião, sua posição perante a vida já dá uma boa
melhorada, porque se identificam com a crença. E as que acreditam com
mais facilidade são aquelas que aceitam naturalmente a existência de Deus
e praticam a religião com mais afinco. Essa vivência pode incutir nelas
valores de honestidade e justiça pelos quais regem a sua vida. A pessoa
tende a se tornar ainda mais pobre quando não tem crença.
Que tipo de expectativa esses pais têm em relação aos filhos? Que estes
possam ajudá-los com as despesas no presente e que, no futuro, garantam
sua velhice. Houve épocas em que a preferência por filhos do sexo
masculino era nítida. De dez anos para cá, isso mudou, porque as filhas
também estão ganhando o mercado de trabalho. O sonho de muitas mães é
que fiquem famosas como cantoras ou top models, o que possibilita uma
ascensão glamurosa e a conquista de muito dinheiro.
O que mobiliza esses pais a investir nos filhos é que estes passam a ser
um bem. Sem condição de trabalhar o bastante e crescer para se proteger
na velhice, eles se garantem por meio dos filhos. A grande expectativa,
portanto, com a chegada das crianças é o aumento da mão-de-obra. Talvez
este seja um dos motivos do grande número de filhos nessa camada, mais
até do que o desconhecimento de contraceptivos.
Nas propriedades rurais, há pais que ainda perguntam: “Mas para quê?”
Quando recebem um pouco mais de informação, começam a achar o estudo
importante. Por sinal, atualmente o êxodo rural acontece não só por motivo
de trabalho, mas também para o filho estudar. Aquele hábito de o imigrante
mandar o filho estudar na cidade agora se repete com as populações do
campo. O fato é que ninguém está imune à informação.
O critério “não vencer na vida é de foro íntimo”. Cada pai pode carregá-lo
ou não. Alguns se realizam sentindo-se honestos e cumpridores de suas
tarefas, ainda que tendo ganhos simples e humildes e pouco ou nenhum
acesso a conquistas.
Como a mãe venceu na vida, ela acha que sabe o que é melhor para
filhas e filhos. Não raramente, mães assim abafam todo o resto da família.
Como são muito dinâmicas, não têm muita paciência para esperar que os
filhos realizem algo no ritmo deles e acabam por atropelá-los. Mas lá no
inconsciente elas aguardam que o filho do sexo masculino ocupe a posição
que deveria ser do marido e as livre do desgaste de ter de administrar casa e
trabalho.
redesenhadas
Pais separados
Isso era o que lhes passava pela cabeça na hora da união. Agora, diante
da separação, recorrem aos filhos com a maior naturalidade para pressionar
o ex-cônjuge e conseguir seus objetivos.
Existem situações que aos olhos dos outros parecem bizarras, mas para
os envolvidos tornam-se verdadeiras tragédias. Pais que estabelecem
pensões economicamente ridículas para a ex-mulher e os filhos. Pais que
dão muito dinheiro para os filhos, sem dar um tostão para a antiga esposa. É
horrível para a mãe não ter condição sequer de manter a casa e ver o filho
adolescente despendendo altas somas. Já vi casos de mulheres obrigadas a
andar de ônibus enquanto seus filhos desfilam com o carro do ano. Quando
têm um bom relacionamento com a mãe, os filhos acabam minimizando seu
sofrimento e dando alguma contribuição para o sustento da casa. Mas, se
existem desavenças entre eles, essas diferenças de posição econômica são
usadas para agredir.
Por outro lado, há mães que cortam a convivência dos filhos com o pai,
restringindo suas visitas a algumas horas semanais. Quanto mais magoada
estiver, mais rígida se tornará quanto aos horários de visita. O pai tem de
pegar as crianças às 6h15 da manhã e entregá-las de volta às 19h18. O fim
de semana com as crianças teoricamente é do marido, mas a mãe exige que
elas lhe sejam entregues no sábado à noite. Aliás, essas exigências tendem a
se tornar maiores quando o homem inicia um relacionamento novo, porque
aí entram em cena outros ingredientes emocionais da mãe, que pesam
contra o pai.
Há casais, inclusive, que colocam os filhos numa posição ainda mais
delicada, de juízes de quem está certo ou errado. Desse modo, tanto o pai
quanto a mãe se esforçam para seduzir o juiz, às vezes até subornando,
chantageando ou pressionando diretamente os filhos. Todas essas situações
são uma lástima porque, em geral, os filhos pouco ou nada têm a ver com a
separação dos pais.
Poupando sofrimento
Produção independente
e mães solteiras
Filhos adotivos
Pais adolescentes
A construção da felicidade
depende da capacidade de absorver
a frustração, usufruir os ganhos
e aprender com tudo isso.
Cada dia é um novo dia, porque mesmo sendo outro dia, mesmo
se fizermos igualzinho ao que foi feito ontem, passa a ser simplesmente um
dia novo. Não modificando nada, não crescemos nada e não damos um
passo nessa longa caminhada.
Avaliando o hoje como o ontem, não existem diferenças entre ontem e
hoje. É vivermos do passado. Isso é muito comum na avaliação dos filhos.
Imagine uma reforma num dos aposentos da casa, mas que não
inclua as outras dependências. Mesmo assim, a casa inteira fica
tumultuada. Embora o resultado atinja diretamente apenas um aposento, o
modus vivendi de todos os habitantes da moradia é alterado. É isso o que
acontece quando um filho entra na adolescência. Ele adquire uma série de
novidades pagas pelos pais, mas escolhidas por ele, e transformações físicas
e psicológicas que não dependem dele, mas de sua genética. Não adianta o
pai insistir para pôr determinado objeto no quarto dele. O adolescente só irá
introduzir ali o que quiser. Portanto, terão de acontecer negociações.
Há momentos em que o filho se confunde quanto à decoração. Não se
adaptou muito bem ao quarto, que está mudando de dimensão e de
funções. Uma falha antiga na parede poderia ser oculta pelos pais
pendurando um quadro sobre ela. Talvez um quadro do anjo da guarda, ou
de super-heróis, como os do Power Rangers. Com a reforma, o adolescente
substitui aquele quadro por novos pôsteres, quadros e/ou fotos, com
conteúdos juvenis, e o buraco fica exposto, revelando provavelmente a
poeira que se acumulou ao longo dos anos e, não raramente, a presença de
alguns insetos.
Esse quarto em reforma nada mais é do que o púbere. Ele joga fora os
objetos infantis e sai em busca de uma nova identidade própria, que é
sustentada pelos pais, concordem eles ou não. A mudança tumultua toda a
família, porque os pais pouco se modificam nesse período, enquanto o filho
atravessa uma etapa de profundas alterações, passando a funcionar de
forma diferente.
Os problemas psicológicos que a família, numa atitude de superproteção,
dava um jeito de esconder, por exemplo, com um quadro do anjo da guarda,
agora ficarão expostos. E justamente num momento em que o filho não
quer mais a proteção do anjo da guarda. Ele passa a ser guiado pelos
próprios modelos e ídolos.
Quando as meninas iniciam sua vida afetiva, são só penas que voam para
todo lado. Não me interpretem mal. Não estou dizendo que as filhas viram
“galinhas” e os rapazes, “galinha”. E que o anjo da guarda, aturdido com
suas atitudes, muitas vezes impulsivas, não pára de bater as asas, dizendo:
“Não. Por aí, não!” Por isso, voam tantas penas.
Nas suas expectativas, os pais sempre imaginaram filhos cordatos,
concordantes com suas fantasias e ideologias, e nada é mais contundente
do que a nova realidade: a mudança da postura do filho na puberdade. Tal
reforma pode ser desde uma transformação total até uma simples adaptação
ao seu crescimento.
A palavra “reforma” é apropriada porque alguns elementos da construção
antiga são preservados, como a base da personalidade e os padrões morais
de honestidade e idoneidade. O que muda radicalmente são as reações às
ordens recebidas. Na busca da nova identidade, aceitar as ordens que
acatava antigamente remete o púbere à infância, e o que ele mais deseja
nesse momento é despedir-se da infância.
Pais desatentos podem interpretar as novas reações como desobediência.
Nada os incomoda mais do que ver o filho escapando por entre os dedos –
filho este que tão bem se aninhou nos seus braços, quando criança. Nesse
momento da vida dos filhos é que surgem os maiores conflitos na cabeça
dos pais.
O filho púbere pode desdizer tudo o que falou hoje como num simples
trocar de roupa. Como se tivesse experimentado posições e, de todas, a que
vai adotar é aquela na qual se sinta melhor.
Os pais que sofrem com essas instabilidades do púbere podem tentar
imprimir suas características aos filhos, tomando a si próprios como
referência: “No meu tempo, o meu pai fazia assim. Eu sempre agi assim. O
mais correto é...”
Deve-se ter cuidado com este erro saudosista. A saudade funciona para
buscar o resultado no passado. Só se sente saudade do que faz falta no
presente. Quando os pais acham falta de disciplina nos filhos, vão lembrar-
se, muitas vezes, da disciplina que seus pais lhes impunham. Erro
saudosista, porque nessa hora não recordamos também de quanto mal o
autoritarismo dos nossos pais nos causou. Apenas comparamos a disciplina
“daquela época” com a disciplina de hoje.
Pais que esperam resultados nos seus filhos pelos erros saudosistas não
conseguirão contatar o presente deles. Vivem dizendo: “No meu tempo, só
de olhar, meu pai já metia medo. Hoje, se olho muito para o meu filho, ele
pergunta: por que tá me olhando? Bebeu hoje?”
Lembrando sempre:
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[1] Para saber mais, leia Adolescentes: Quem Ama, Educa!, Içami Tiba, Integrare Editora, 2005.
[2] Amniocentese: procedimento clínico utilizado no diagnóstico de anormalidades genéticas no
embrião ou no feto, mediante o exame de células de amostra do líquido amniótico, retiradas por
punção no abdome materno.
[3] Para saber mais, leia Anjos Caídos – Como Prevenir e Eliminar as Drogas na Vida do Adolescente,
Içami Tiba, Editora Gente, 1999.
[4] Para mais detalhes, leia Adolescência: O Despertar do Sexo, Içami Tiba, Integrare Editora, 2007.
[5] Para mais detalhes, leia Adolescência: O Despertar do Sexo, Içami Tiba, Integrare Editora, 2007.