Comentário Bíblico de Marcos - Itamir Neves

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COMENTÁRIO BÍBLICO DE
MARCOS
ATRAVÉS DA BÍBLIA

ITAMIR NEVES

rádio trans mundial

Ficha catalográfica elaborada por Clarabeti S. N. de Souza, CRB8 6895


Souza, Itamir Neves de
Marcos: comentário bíblico / Itamir Neves de Souza. — São Paulo, Rádio Trans Mundial,
2008. (Série Através da Bíblia)
240 páginas
ISBN – 978-85-89558-65-5

1. Bíblia N. T. – Marcos 2. Marcos – Comentário I. Título.

CDD (21 ed.) 226.3

Índices para catálogo sistemático


1. Bíblia N. T. – Marcos – Comentário 226.4
2. Marcos – Comentário 226.4

Copyright © 2012 Rádio Trans Mundial do Brasil


Todas as citações bíblicas foram extraídas da 2a. edição Revista e Atualizada da tradução de João Ferreira
de Almeida (Sociedade Bíblica do Brasil)
Direção executiva – José Carlos dos Santos
Direção de publicações – Claudinei Franzini
Coordenação editorial – Israel Mazzacorati
Revisão – Clarabeti Stolochi / Israel Mazzacorati
Capa – Wesley Mendonça
Revisão de projeto gráfico – Guilherme Saved
Diagramação – Sonia Peticov

Primeira edição – Julho de 2009


Primeira reimpressão – Junho de 2013

Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, arquivada ou transmitida por qualquer meio – eletrônico,
mecânico, fotocópias, etc. – sem a devida permissão dos editores, podendo ser usada apenas para citações
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Sumário
Contracapa
Prefácio
Introdução geral à série de comentários através da Bíblia
O evangelho de Marcos e sua importância
A história dos primeiros escritos
A primazia do Evangelho de Marcos
Questões introdutórias relativas ao evangelho de Marcos
O problema sinótico
Comparação entre os objetivos dos quatro evangelhos
Autoria
O homem Marcos
Propósitos
Data
Local de origem
Destinatários
Verso-chave
Peculiaridades do Evangelho de Marcos
ESBOÇO DE MARCOS
II – O SACRIFÍCIO DO SERVO. A SALVAÇÃO DO SERVO
O desafio do Evangelho de Marcos para nós
Marcos 1 - O servo e o início do ministério
Anunciado, batizado, provado, demonstrado e autenticado
Onde tudo começou
Mc 1.1
João Batista, o precursor do prometido
Mc 1.2–3
João Batista testemunha sobre Jesus
Mc 1.4–8
João Batista batiza Jesus
Mc 1.9–11
Jesus é testado
Mc 1.12–13
Jesus anuncia o reino de Deus
Mc 1.14–15
Jesus chama os primeiros discípulos
Mc 1.16–20
Jesus expulsa o demônio num sábado
Mc 1.21–28
Jesus cura a sogra de Pedro
Mc 1.29–31
Jesus realiza muitas curas e libertações e pede segredo
Mc 1.32–34
Jesus se retira para orar e prossegue em pregar e curar
Mc 1.35–39
Jesus cura um leproso e insiste no segredo messiânico
Mc 1.40–45
Marcos 2 - O servo quebra as tradições
Come com os pecadores e cura num sábado
Jesus cura um homem amado por seus amigos
Mc 2.1–12
Jesus continua chamando discípulos
Mc 2.13–14
Jesus rompe com os padrões sociais discriminatórios
Mc 2.15–17
Jesus ensina sobre os verdadeiros espirituais
Mc 2.8–22
Jesus quebra o tradicionalismo vazio
Mc 2.23–28
Marcos 3 - O servo convoca homens para uma tarefa divina
Designação dos apóstolos, oposição das autoridades e incompreensão da família
Jesus cura novamente num sábado
Mc 3.1–6
Jesus cura muitos à beira-mar
Mc 3.7–12
Jesus escolhe seus doze apóstolos
Mc 3.13–19
Jesus ensina sobre o pecado imperdoável
Mc 3.20–30
Jesus e sua família
Mc 3.31–35
Marcos 4 - O servo ensina as verdades relativas ao reino de Deus
Objetivos das parábolas e o poder sobre a natureza
Jesus conta a parábola do semeador
Mc 4.1–9
Jesus explica a parábola do semeador
Mc 4.10–20
Jesus conta a parábola da candeia
Mc 4.21–25
Jesus conta a parábola da semente
Mc 4.26–29
Jesus conta a parábola do grão de mostarda
Mc 4.30–32
Jesus tinha razões para ensinar por meio de parábolas
Mc 4.33–34
Jesus ensina através do milagre de acalmar o mar
Mc 4.35–41
Marcos 5 - O servo demonstra seu divino e incomparável poder
Ele é maior que Satanás, a doença e a morte
Jesus expulsa uma legião de demônios
Mc 5.1–14
Jesus é rejeitado pelos gerasenos
Mc 5.14–20
Jesus ouve o pedido de Jairo
Mc 5.21–24
Jesus cura uma mulher com hemorragia
Mc 5.25–34
Jesus ressuscita a filha de Jairo
Mc 5.35–43
Marcos 6 - O servo é rejeitado pelos conhecidos e recebido pelos distantes
Rejeição em Nazaré, morte de João Batista, a primeira alimentação e a recepção em Genesaré
Jesus prega em Nazaré e é rejeitado pelos conhecidos
Mc 6.1–6
Jesus instrui e envia os doze discípulos
Mc 6.7–13
Jesus foi confundido com João Batista, morto por Herodes (6.14–29)
Jesus realiza o milagre da multiplicação de pães e peixes
Mc 6.30–44
Jesus anda sobre o mar e vai de novo a Genesaré
Mc 6.45–56
Marcos 7 - O servo repudiado pelos líderes judeus estende suas bênçãos aos gentios
O que contamina o homem, a libertação de uma menina e a cura de um surdo-gago
Jesus mostra o que contamina o homem
Mc 7.1–23
Jesus expulsa do demônio de uma menina
Mc 7.24–30
Jesus cura um surdo-gago
Mc 7.31–37
Marcos 8 - O servo e a sua identificação
A segunda alimentação, o pedido de um sinal e a confissão de Pedro
Jesus realiza pela segunda vez o milagre da multiplicação de pães e peixes
Mc 8.1–10
Jesus sofre com a incredulidade dos líderes judaicos
Mc 8.11–13
Jesus previne os discípulos sobre o fermento dos fariseus
Mc 8.14–21
Jesus cura um cego em Betsaida
Mc 8.22–26
Jesus é identificado como Cristo, o Messias de Israel
Mc 8.27–30
Jesus prediz pela primeira vez a sua morte e ressurreição
Mc 8.31–33
Jesus apresenta os requisitos do discipulado
Mc 8.34–38
Marcos 9 - O servo confirmado em divindade instrui os discípulos
A transfiguração e as exigências do discipulado
Jesus é transfigurado diante dos discípulos
Mc 9.1–13
Jesus liberta um menino possuído por um espírito mudo e surdo
Mc 9.14–29
Jesus prediz pela segunda vez a sua morte e ressurreição
Mc 9.30–32
Jesus ensina seus discípulos sobre a humildade
Mc 9.33–37
Jesus ensina seus discípulos sobre a tolerância
Mc 9.38–41
Jesus ensina seus discípulos sobre os tropeços
Mc 9.42–48
Jesus ensina seus discípulos sobre o papel deles como o sal da terra
Mc 9.49–50
Marcos 10 - O servo dá ensinamentos a diversos interlocutores
Ensinos sobre divórcio, crianças, riquezas e humildade
Jesus ensina sobre o divórcio, em resposta aos fariseus
Mc 10.1–12
Jesus ensina sobre o reino de Deus, abençoando as crianças
Mc 10.13–16
Jesus ensina sobre as prioridades, em resposta ao jovem rico
Mc 10.17–22
Jesus ensina sobre o perigo das riquezas aos discípulos
Mc 10.23–31
Jesus ensina sobre o seu sacrifício pela terceira vez aos discípulos
Mc 10.32–34
Jesus ensina sobre a atitude de servir, em resposta a Tiago e João
Mc 10.35–45
Jesus ensina sobre a objetividade usando o exemplo de Bartimeu
Mc 10.46–52
Marcos 11 - O servo é recebido em triunfo pelos desamparados
A entrada triunfal, a figueira, a purificação do templo e a sua autoridade
Jesus chega e entra triunfalmente em Jerusalém
Mc 11.1–11
Jesus amaldiçoa uma figueira
Mc 11.12–14
Jesus purifica o templo
Mc 11.15–19
Jesus ensina sobre o poder da fé
Mc 11.20–26
Jesus é questionado, mas confronta os líderes judaicos
Mc 11.27–33
Marcos 12 - O servo é desafiado em seu ensino
Uma parábola, o ensino sobre o tributo, a ressurreição e o grande mandamento
Jesus ensina através da parábola dos lavradores maus
Mc 12.1–12
Jesus ensina sobre o pagamento do tributo
Mc 12.13–17
Jesus ensina sobre a ressurreição
Mc 12.18–27
Jesus ensina sobre o grande mandamento
Mc 12.28–34
Jesus ensina sobre o Cristo
Mc 12.35–37
Jesus ensina sobre a hipocrisia
Mc 12.38–40
Jesus ensina sobre a verdadeira adoração
Mc 12.41–44
Marcos 13 - O servo proclama seu sermão profético
O princípio das dores, a grande tribulação e a vinda do Filho do Homem
Jesus é interrogado pelos discípulos
Mc 13.1–4
Jesus ensina sobre os eventos antecedentes à sua segunda vinda
Mc 13.5–23
Jesus ensina sobre a vinda do Filho do Homem
Mc 13.24–27
Jesus ensina sobre o reconhecimento do tempo
Mc 13.28–31
Jesus ensina sobre a necessidade da vigilância
Mc 13.32–37
Marcos 14 - O servo se prepara para o seu sacrifício vicário
A sua unção, a Páscoa, a traição, a Ceia, a prisão, o julgamento e a negação
Jesus é o alvo de um plano sinistro
Mc 14.1–2
Jesus é ungido em Betânia
Mc 14.3–9
Jesus é alvo da traição de Judas Iscariotes
Mc 14.10–11
Jesus orienta os preparativos da Páscoa e a celebra com os doze
Mc 14.12–21
Jesus institui a Ceia Memorial
Mc 14.22–26
Jesus avisa que Pedro o negará
Mc 14.27–31
Jesus passa momentos de aflição no Getsêmani
Mc 14.32–42
Jesus é preso
Mc 14.43–52
Jesus enfrenta o julgamento do Sinédrio
Mc 14.53–65
Jesus é negado por Pedro
Mc 14.66–72
Marcos 15 - O servo é crucificado e morre em nosso lugar
O julgamento, a crucificação, a morte e o sepultamento
Jesus é levado diante de Pilatos
Mc 15.1–5
Jesus é rejeitado pela multidão
Mc 15.6–15
Jesus é entregue aos soldados romanos para ser crucificado
Mc 15.16–20
Jesus é ajudado por Simão a carregar a cruz
Mc 15.21
Jesus é crucificado
Mc 15.22–32
Jesus morre diante do Pai, da multidão, das autoridades e dos seus
Mc 15.33–41
Jesus é sepultado
Mc 15.42–47
Marcos 16 - O servo ressuscita e ordena a proclamação do evangelho
A ressurreição, os aparecimentos, a ordem para evangelização e a ascensão
Jesus é alvo de uma demonstração de profundo amor
Mc 16.1–2
Jesus surpreende seus seguidores em todos os detalhes
Mc 16.3–5
Jesus é anunciado ressurreto por um anjo
Mc 16.6–8
Jesus aparece a Maria Madalena
Mc 16.9–11
Jesus aparece a dois de seus discípulos
Mc 16.12–13
Jesus aparece aos onze discípulos e lhes ordena a evangelização
Mc 16.14–18
Jesus é recebido em glória e coopera com os discípulos na evangelização
Mc 16.19–20
Referências bibliográficas

Prefácio

O Evangelho de Marcos é o segundo volume do Novo Testamento da Série de


Comentários Bíblicos Através da Bíblia, que se originou do programa
radiofônico veiculado através da Rádio Trans Mundial do Brasil.
Agradecemos a Deus pela oportunidade de entregar ao público de língua
portuguesa mais uma obra que poderá ser consultada, estudada e aplicada na
vida daqueles que almejam parecer-se cada vez mais com o nosso Senhor Jesus
Cristo.
Originalmente o “Através da Bíblia” foi um programa de rádio idealizado e
produzido pelo Dr. J. Vernon McGee. Depois de muitos anos de grande sucesso
nos Estados Unidos, ele foi traduzido em várias línguas e em muitos países tem
sido transmitido há mais de quarenta anos. E, assim, também foi traduzido e
veiculado a partir do Brasil para os povos de língua portuguesa.
Tivemos durante muitas décadas a voz inconfundível do Pr. Davi Nunes
transmitindo mensagens baseadas exclusivamentena Palavra de Deus. E, mais
recentemente, o programa está sob a responsabilidade do pastor e professor
Itamir Neves, que coordena a produção e atualização do programa de rádio.
A partir dessa mudança, e pela insistência dos nossos ouvintes, entendemos
que seria esse o tempo oportuno de ampliarmos o alcance do ministério “Através
da Bíblia” em português. Então, além dos programas veiculados por nossa
própria emissora, que têm alcançado os mais longínquos rincões do nosso país, e
dos programas na internet, que são ouvidos na América do Sul e do Norte, na
Europa e na África, decidimos transformar esse material em literatura cristã.
Através da produção dos diversos comentários dos livros bíblicos estudados, o
desejo da Rádio Trans Mundial do Brasil é servir a igreja de língua portuguesa.
O pastor e professor Itamir Neves, estudioso da Palavra de Deus, tem tido a
oportunidade e o desafio de, juntamente com o programa radiofônico, produzir
em formato de livros esse material de estudos bíblicos. Eles têm sido elaborados
em linguagem acessível e de fácil compreensão, com o objetivo de alcançar não
só o acadêmico mais exigente como o cristão que, desejoso de estudar e
conhecer mais a Palavra de Deus, poderá encontrar uma fonte ampla e sugestiva
de consulta para o desenvolvimento da vida cristã.
Como diretor executivo da Rádio Trans Mundial do Brasil, tenho tido a
oportunidade de acompanhar semanalmente a gravação dos programas e o
trabalho de queridos irmãos na produção do material escrito. Com alegria
também acompanho as correspondências que chegam até nós em razão da
existência do programa e dos materiais que temos disponibilizado. É gratificante
perceber como muitos irmãos têm sido edificados e encorajados na sua
caminhada cristã. Cristãos das mais diferentes faixas etárias, responsabilidades
eclesiásticas e denominações, tanto em nosso país como além fronteiras, têm
testemunhado do valor dos estudos do “Através da Bíblia” e, por isso, louvamos
a Deus.
Ao publicarmos mais esse volume da série, a nossa oração é que Deus o use
para a sua glória e para a edificação do corpo de Cristo. O Comentário Bíblico
Através da Bíblia do Evangelho de Marcos proporcionará ao estudante da
Palavra de Deus uma visão mais aprofundada, atualizada e contextualizada da
mensagem proclamada pelo Rei Servo. Ele deverá ser manuseado portodo
aquele que anseia crescer na graça e no conhecimento do Senhor Jesus Cristo!
Boa leitura!
Pr. José Carlos dos Santos
Diretor executivo da Rádio Trans Mundial do Brasil

Introdução geral à série de comentários


através da Bíblia

A série de Comentários Através da Bíblia tem por objetivo apresentar aos


leitores da língua portuguesa o trabalho realizado por intermédio da
radiodifusão, num prazo de cinco anos, dos comentários que abrangeram toda a
Bíblia, elaborados para o programa Através da Bíblia, da Rádio Trans Mundial
do Brasil.
Este programa radiofônico teve início em 1967, em Pasadena, nos Estados
Unidos, com o seu idealizador, Dr. John Vernon McGee. De lá, rapidamente se
expandiu, e hoje é veiculado em mais de 400 estações de rádio pelo mundo todo
e ouvido em mais de 100 idiomas diferentes, inclusive pela internet. Os novos
comentários, feitos pelo professor Itamir Neves de Souza, têm por base uma
adaptação, revisão e ampliação do material produzido originalmente pelo Dr.
McGee.
Quem ama estudar a Palavra Eterna encontrará nessa obra uma fonte de
recursos bíblicos devocionais aplicáveis à vida diária de cristãos que desejam
andar de acordo com a vontade de Deus. Apesar do novo formato, a série
mantém estreita vinculação com o programa radiofônico, e é destinada a cristãos
de modo geral, professores da escola bíblica dominical, líderes de pequenos
grupos, de departamentos etários, seminaristas, evangelistas, diáconos e pastores
que ministram em tantas e longínquas comunidades de língua portuguesa
espalhadas pelos mais diversos países.
Não foi o objetivo dos produtores e dos editores que esses comentários
bíblicos fossem elaborados com características acadêmicas, baseadas em
tecnicismos adequados para os exegetas, profundos conhecedores das línguas
originais da Escritura: o hebraico, o aramaico e o grego. Entretanto, como é
possível notar pelas indicações bibliográficas, obras de valor teológico e
conteúdo doutrinário saudável serviram de base de consulta.
Dentro dos limites de tempo e espaço, cada livro foi produzido tendo em vista
o entendimento claro e simples das Escrituras Sagradas e a sua aplicação prática
para o desenvolvimento da vida cristã. Com perguntas, desafios, palavras de
conscientização, expressões de louvor e gratidão a Deus diante de trechos das
Escrituras que demonstram a sua graça, misericórdia e amor, estes estudos
pretendem levar os leitores à reflexão, ao questionamento pessoal e a avaliação
interior de suas próprias vidas.
Para os editores desta obra, a Bíblia Sagrada deve ser entendida com
facilidade, proporcionando aos seus estudantes prazer e entusiasmo através do
seu estudo sistemático. Por isso, a série de Comentários Através da Bíblia se
destina ao crescimento pessoal e individual de cada cristão. Nossa oração é que
Deus, através do seu Santo Espírito, fale a cada coração e utilize essa obra para a
glória do seu nome em nossas vidas.
Os Editores

O evangelho de Marcos e sua


importância

Certamente muitos de nós que amamos o Senhor Jesus Cristo e conhecemos o


seu amor gostaríamos de ouvi-lo e tam bém ouvir os relatos daqueles que
conviveram diretamente com Ele. Seria interessante, por exemplo, escutarmos os
relatos de Pedro? Com certeza! E essa experiência pode ser vivenciada
exatamente ao estudarmos o evangelho produzido por Marcos.
A maioria dos pais da igreja considerava Marcos como aquele que preservou
o testemunho de Pedro. E, conforme nos informou Papias, um cristão destacado
que viveu no segundo século, de fato podemos considerar Marcos o intérprete de
Pedro. De acordo com Pohl (1998, p. 19), Eusébio de Cesareia, em sua História
da Igreja, uma obra do quarto século escrita a partir de 337, menciona essa
citação de Papias:
Marcos, na qualidade de hermeneuta de Pedro, anotou com cuidado, mesmo que não em forma,
tudo o que lembrava do que o Senhor tinha dito e feito. Ele não conheceu o Senhor nem foi
discípulo dele, mas de Pedro… Marcos não cometeu nenhum erro quando anotou algumas coisas…
Com uma coisa ele tomava muito cuidado, ou seja, que não esquecesse nada do que tinha ouvido e
dissesse alguma coisa que não fosse verdade.
Diante dessa constatação, percebemos uma das razões pelas quais devemos
dar toda importância ao relato de Marcos. Ele preservou para todas as gerações o
relato do discípulo mais ousado e vigoroso do Senhor Jesus.
Outra razão para reconhecermos a importância desse livro é que,
provavelmente, o Evangelho de Marcos foi o primeiro dos quatro evangelhos a
ser escrito e, consequentemente, um dos primeiros livros do Novo Testamento. E
por que essa importância? Porque o seu conteúdo foi básico na preparação dos
Evangelhos de Mateus e Lucas. E exatamente por terem essa origem comum,
esses três evangelhos (Marcos, Lucas e Mateus), são chamados de “Evangelhos
Sinóticos”, isso é, escritos sob o mesmo ponto de vista, diferenciando-se do
relato de João, escrito mais no final do século. Ora, considerando-se Marcos
como o primeiro, como o mais antigo relato sobre a vida de Jesus, o estudo desse
evangelho se reveste de total importância.
A história dos primeiros escritos
Ao considerarmos a maneira pela qual os primeiros escritos cristãos vieram à
existência, a maioria dos estudiosos aceita que, antes de surgirem os evangelhos,
as cartas paulinas aos Gálatas e aos Tessalonicenses já haviam sido escritas e,
muito provavelmente, na mesma época, já tinha sido escrita a carta de Tiago aos
judeus cristãos que estavam dispersos.
Como dissemos, é aceito que entre os quatro evangelhos existe essa clara
divisão. Mateus, Marcos e Lucas são chamados de “Sinóticos”, por observarem a
vida de Jesus sob o mesmo ponto de vista. O Evangelho de João, escrito quase
no final do século primeiro, é um relato complementar e distinto da vida de
Jesus, bem diferente da abordagem feita pelos três Sinóticos. Mas, ao
estudarmos as origens do Novo Testamento, constatamos que existiram forças
inibidoras e forças geratrizes para a composição dos evangelhos. As forças
inibidoras foram:
1. A igreja primitiva, como uma comunidade escatológica esperava a volta de
Jesus para muito breve.
2. A igreja primitiva era composta de pessoas incultas e, portanto, não havia
muito interesse em registrar uma história que seria lida por poucos.
3. A igreja primitiva que se desenvolveu primeiramente nas classes mais
pobres não tinha recursos para as despesas de produção.
4. Tendo sido perseguidos desde o início, os cristãos que constituíam a igreja
preocuparam-se primeiramente em proclamar com urgência as boas novas de
salvação, enquanto tomavam cuidado para se deslocarem para outras regiões
menos adversas.
Diante dessas circunstâncias, o registro dos fatos relativos a Jesus não foi
visto como uma necessidade urgente. Mas logo depois surgiram as forças
geratrizes que impulsionaram a igreja primitiva a produzir os seus primeiros
escritos. Foram elas:
1. A perda do ardor apocalíptico, por perceberem que a volta de Jesus não
aconteceria tão rapidamente como se esperava.
2. A morte dos principais líderes cristãos, dentre eles os apóstolos,
testemunhas diretas dos feitos e dos ensinos de Jesus, trouxe a convicção da
necessidade de se preservar esses testemunhos.
3. A necessidade de catequização dos novos convertidos. Como a igreja foi
crescendo e expandindo-se por várias regiões, as diversas comunidades
tinham que ser atendidas com os relatos dos feitos e dos ensinos de Jesus.
4. O surgimento de cristãos mais cultos, com interesses históricos e
biográficos, também impulsionou a composição dos evangelhos.
Assim, começaram a surgir os primeiros documentos que continham os
registros daquilo que Jesus Cristo tinha feito e ensinado. Nesse clima, e com a
necessidade de atender as novas gerações de cristãos, surgiu o evangelho de
Marcos. No caso desse evangelho, que era um registro das memórias de Pedro,
ele foi produzido, provavelmente num rascunho primário (proto-marcos), para
depois ser elaborado em definitivo. Como diz Jensen (1987, p. 9), “é possível
que Pedro estivesse referindo-se a este manuscrito que haveria de surgir pela
mão de Marcos, ao escrever 2 Pedro 1.15, que deve ser lido no contexto dos dois
versículos precedentes”.
A primazia do Evangelho de Marcos
Constata-se também a importância de Marcos quando se observa a opinião de
William Barclay (1974, p. 11), sobre os evangelhos:
“Poderia afirmar-se que entre os três, Marcos é o mais importante. Poderia continuar-se a
argumentação, e afirmar que o Evangelho de São Marcos é o livro mais importante do mundo,
porque quase todos estão de acordo em que Marcos é o mais antigo dos Evangelhos, e, portanto, é a
primeira vida de Jesus que chega até nós. Marcos pode não ter sido o primeiro homem que escreveu
uma vida de Jesus. Não há dúvida que houve tentativas mais simples de se colocar por escrito a
história da vida de Jesus, porém o seu Evangelho é certamente a ‘biografia’ de Jesus mais antiga
que tem chegado até nós.”

Ao consideramos essas palavras, vem à tona a questão da primazia do


Evangelho de Marcos em relação aos Evangelhos de Lucas e de Mateus. Ainda
conforme Barclay (1974, p. 12), é possível dividir o relato de Marcos em 105
seções. Dessas, 93 aparecem no Evangelho de Mateus, 85 no Evangelho de
Lucas e somente 4 não são mencionadas em Mateus ou Lucas. Mas outra
maneira de percebermos a primazia de Marcos é constatarmos como nos
apresenta Lopes (2008, p. 16), ao afirmar que dos 661 versos de Marcos, Mateus
reproduz 606 e Lucas reproduz 320. Portanto, Mateus deixa de mencionar 55
versos que estão em Marcos, mas desses 55 Lucas utiliza 31 e, assim, verifica-se
que apenas 24 versos de Marcos não se encontram nos outros dois Sinóticos.
Ora, com esses números, é convincente a possibilidade de considerarmos Marcos
o primeiro evangelho e os dois outros dependentes dele ao escreverem os seus
livros.
Por isso, o estudo desse evangelho é importantíssimo. Quando o estudarmos,
estejamos certos de que estudamos o primeiro relato da vida do nosso Senhor
Jesus Cristo.
Assim, depois de todos esses argumentos apresentados, conhecer o evangelho
escrito por Marcos é importante, pois é um relato claro das ações salvíficas
desenvolvidas pelo Senhor Jesus Cristo, que teve o propósito de vir até nós, não
para ser servido, mas para nos servir, dando a sua própria vida em nosso favor,
em favor do perdão dos nossos pecados.
Conhecer o relato de Marcos, o primeiro a registrar os atos e os ensinos de
Jesus, é importante, pois através desse conhecimento os que ainda não foram
perdoados dos seus pecados poderão encontrar o caminho da verdadeira
comunhão com Deus. Aqueles que já são parte da família de Deus poderão
relembrar detalhes da vida do nosso Senhor Jesus Cristo mas, sobretudo,
relembrarão e confirmarão que o verdadeiro seguidor de Cristo deve ter
disposição de servir. O Evangelho de Marcos, pois, nos desafia a servir, mesmo
que para isso tenhamos que sofrer. Quando estivermos firmados nessa
convicção, então seremos úteis nas mãos de Deus e faremos diferença no meio
em que estamos inseridos.
Oro para que, através do estudo desse livro e percebendo a importância desse
evangelho, você possa, capacitado pelo Espírito Santo, colocar em prática os
princípios que aprenderemos desse rico registro. Oro para que o registro desse
homem, usado por Deus, que nos preservou tão rica e tão marcante história,
possa fazer diferença em sua vida.
Que Deus nos abençoe,
Itamir Neves de Souza
Produtor e apresentador atual do programa
Através da Bíblia, da Rádio Trans Mundial do Brasil

Questões introdutórias relativas ao


evangelho de Marcos

Ao iniciarmos esse capítulo que trata das questões introdutórias do Evangelho


de Marcos, podemos primeiramente supor que esse relato de alguém que não foi
discípulo direto do Senhor Jesus é apenas uma narrativa de segunda mão, sem
tanta importância. Porém, quando estudamos todos os detalhes que envolveram a
composição deste evangelho percebemos, como diz Mulholland (206, p. 15),
que:
O autor nos apresenta um Jesus realmente humano que é ao mesmo tempo Deus entre os homens.
Pela seleção criteriosa e colocação estratégica desse material, ele integra teologia e a realidade da
vida. O retrato vívido de seus personagens leva os leitores a experimentar tais eventos em primeira
mão, pois os conflitos experimentados pelos contemporâneos de Jesus são compartilhados pelas
pessoas de todos os lugares. Ao descrever como o governo de Deus se tornou realidade com a vinda
de Jesus, ele desafia a humanidade a um discipulado radical.

Por isso, conhecer os detalhes introdutórios desse evangelho se reveste de


grande importância. O conhecimento deles nos ajudará com toda a certeza a ter
uma melhor compreensão do propósito do autor. O conhecimento do contexto de
um livro que separamos para estudar é importante porque ao entendermos o
contexto sobre o autor e os destinatários, ao conhecermos os fatos que cercaram
a sua composição e outros detalhes que motivaram a sua escrita, certamente
teremos melhores condições de entender e apreender o texto bíblico com maior
facilidade. Vamos, então, às questões contextuais introdutórias relativas ao
evangelho escrito por Marcos.
O problema sinótico
O problema sinótico, já mencionado de passagem anteriormente, refere-se ao
questionamento levantado sobre como é possível explicar as notáveis
concordâncias, isto é, as semelhanças, e as notáveis discordâncias, isto é, as
diferenças, entre os Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas. Quando
constatamos as semelhanças e diferenças entre esses escritos, a questão sinótica
pode ser resumida com a seguinte questão: Quem copiou de quem? Ou, qual foi
a fonte que todos tiveram em comum?
Para explicar a concordância entre os três, a antiga teoria de que só um
evangelho aramaico estaria na origem dos três evangelhos canônicos é
geralmente rejeitada porque é insuficiente para explicar as diferenças.
Por isso, os estudiosos durante quase 100 anos admitiam como a hipótese
mais segura para explicar as semelhanças a “teoria dos dois documentos”. Em
resumo, ela é explicada e entendida como sendo Marcos um dos documentos
usados por Mateus e Lucas; o outro documento seria “Q”, ao qual somente os
dois, e não Marcos, tiveram acesso. Relembrando os números mostrados
anteriormente e a dependência que Mateus e Lucas tiveram de tão grande
porcentagem de Marcos, uma parte da possível solução é aceitarmos Marcos
como o primeiro dos evangelhos. Quando aceitamos que Mateus e Lucas usaram
Marcos para as suas composições, observamos também que as semelhanças são
vistas na narrativa dos conteúdos mais importantes. Apenas uma pequeníssima
parte de Marcos não foi usada pelos outros dois evangelistas.
E, por outro lado, parte da possível solução em relação às diferenças é
explicada da seguinte forma:
1. Mateus e Lucas tiveram acesso a essa outra fonte comum, chamada “Q”
(do alemão Quelle, fonte), teoria sugerida pela primeira vez por
Schleiermacher em 1832.
2. Mateus e Lucas, além de terem como fonte Marcos e “Q”, tiverem também
fontes particulares, isto é, material exclusivo de cada evangelista. Mas
Marcos também ficou com um material “exclusivo”, isto é, apenas cinco
passagens (3.7–12; 4.26–29; 7.31–37; 8.22–26; 14.51–52), e alguns
versículos isolados que não foram registrados nos outros dois evangelhos
(BÍBLIA DE ESTUDO ALMEIDA, p. 59).
3. Em Mateus e Lucas a cronologia de certas “logias”, isto é, discursos de
Jesus, foi apresentada em ordem diferente.
4. Marcos, Mateus e Lucas tiveram propósitos particulares e específicos para
os seus livros.
5. Em Mateus, Lucas e Marcos o vocabulário de cada evangelista é
claramente divergente.
Mas mesmo diante dessas explicações ainda podemos levantar a seguinte
questão: por que quatro evangelhos, e especificamente, por que três evangelhos
escritos sob o mesmo ponto de vista? Temos quatro evangelhos e
especificamente três Sinóticos, porque cada autor escreveu seu evangelho tendo
um público alvo diferente que queria alcançar.
Comparação entre os objetivos dos quatro evangelhos
Cada um dos quatro evangelistas contou a história de Jesus de um ponto de vista
diferente.
Mateus escreveu para os judeus, conforme Souza (2008, p. 13), com a
finalidade de “apresentar Jesus Cristo como o Messias prometido do Antigo
Testamento, o rei dos judeus, aquele que nos salva dos nossos pecados”. Mateus
enfatizou a concretização das promessas do Antigo Testamento.
Lucas escreveu para os leitores gregos, ou gentios, de um modo geral tendo
por propósito, conforme Souza (2008, p. 24), “apresentar Jesus, o Filho do
Homem, como o ser humano ideal, o homem perfeito, o ápice da história da
salvação”. Lucas escreveu destacando o caráter universal da salvação planejada
e preparada por Deus.
João escreveu um evangelho universal, conforme Lopes (2008, p. 16), e
“apresentou Jesus como Deus, o verbo encarnado”. João escreveu depois de
todos os outros, numa época em que se discutia a existência divina e eterna de
Jesus. João enfatizou como Jesus, o próprio Deus encarnado, concede a vida
eterna a todo o que nele crê.
Mas Marcos escreveu para os gentios e especificamente para os romanos,
apresentando Jesus como o Rei que veio para servir, na verdade um “servo em
ação”. Marcos destacou que Jesus, como Filho de Deus, veio para servir e dar a
sua vida em resgate por muitos.
Assim, temos quatro evangelhos diferentes e, especificamente, os três
Sinóticos também são diferentes certamente porque Deus, através do Espírito
Santo, moveu cada um dos autores a produzirem retratos diferentes do Senhor
Jesus para que pudéssemos contemplá-lo de modo completo como Ele merece
ser conhecido e adorado.
Autoria
Cientes de que toda a Bíblia foi inspirada por Deus, e que através do Espírito
Santo Ele soprou a sua revelação a homens santos, escolhidos para essa missão,
é bom também conhecer mos alguns detalhes referentes aos comentários
relativos à autoria deste evangelho.
Depois dos evangelhos serem esmiuçados pelos críticos da forma e da
redação em relação aos processos pelos quais, especificamente, o texto do
Evangelho de Marcos foi produzido, sem que obtivessem resultados
satisfatórios, conforme Mulholland (2006, p. 20), embora tenham dado alguma
contribuição para o estudo do Novo Testamento, “a tentativa de se descobrir e
analisar porções pré-literárias têm resultado na diluição do todo”. Por isso, ele
afirmou ainda que:
“Quando, porém, Marcos é lido segundo os seus próprios méritos, os leitores reconhecem que ele
não é nenhum escritor ingênuo ou simplório, mas habilidoso. O grego, evidentemente, não era a sua
língua materna, mas sua simplicidade linguística ‘não deve levar o intérprete a deduzir simplicidade
nos padrões de pensamentos’.”

Portanto, diante disso, é importante conhecermos também mais alguns


detalhes sobre esse autor. Vamos a esses detalhes.
O homem Marcos
Ao mesmo tempo em que é importante conhecermos os debates sobre a autoria
dos evangelhos e dos demais livros bíblicos, é importante também conhecermos
quem foram os homens e quais foram as características e as circunstâncias que
proporcionaram a escrita de suas obras. Vamos conhecer Marcos fazendo dez
destaques.
1. Marcos era filho de Maria, uma das mulheres que apoiavam o ministério de
Jesus (Lc 8.1–3). Essa família, provavelmente abastada por possuir uma boa
casa em Jerusalém, hospedou Jesus e seus discípulos na quinta-feira anterior
ao seu sacrifício. A descrição detalhada do cenáculo da casa onde Jesus e seus
discípulos tomaram a última Páscoa (primeira Ceia cristã), de acordo com
Marcos 14.12–26 (principalmente o v. 15), indica que, provavelmente, essa
era a casa da família de Marcos.
2. Marcos, sendo filho de Maria, também hospedou a igreja que se iniciava
enquanto aguardava a promessa da vinda do Espírito Santo (At 1.12–14). A
casa dessa família tornou-se um dos locais de reunião da igreja primitiva. Ali,
tempos depois, o apóstolo Pedro, após ter sido solto milagrosamente da
prisão, compartilhou com os irmãos a sua libertação (At 12.12–17). Esses
fatos fazem-nos perceber, então, que todo o convívio, toda a aproximação e
intimidade com os discípulos ofereceram a Marcos a possibilidade de ouvir
muitas das histórias de Jesus contadas em primeira mão.
3. O seu nome completo era João Marcos (hebraico e latim).
4. Muito provavelmente ele foi o jovem que fugiu desnudo do jardim do
Getsêmani, quando ocorreu a prisão de Jesus (Mc 14.51–52).
5. Marcos era primo de Barnabé (Cl 4.10), e esse fato confirma a boa situação
financeira da família, pois em Atos nos é relatado que Barnabé, sendo um
homem de posses, fez uma generosa doação, depositando o valor aos pés dos
apóstolos (At 4.37).
6. Ele acompanhou Paulo e Barnabé na primeira viagem missionária (At
13.5–13), mas depois desistiu e abandonou-os em Chipre, onde
provavelmente tinha parentes (At 13.13). Conforme Lopes (2008, p. 17), três
são as sugestões para essa desistência: Paulo decidiu largar a região costeira e
ir para o interior, onde os perigos eram maiores; Paulo passou a ocupar a
liderança da equipe que era ocupada por Barnabé, seu primo; Marcos desistiu
por ser ainda muito jovem, inexperiente e inseguro.
7. Marcos tornou-se o motivo da separação de Paulo e Barnabé nos
preparativos da segunda viagem missionária (At 15.36–41). Depois da
separação de Paulo e Barnabé, Marcos viajou com Barnabé (At 15.39), foi
por ele discipulado, tornou-se maduro e ministerialmente útil e esteve com
Pedro em Roma (1Pe 5.13).
8. Marcos esteve com Paulo em Roma, na sua prisão domiciliar (Cl 4.10; Fm
24). Entre cinco a sete anos depois foi chamado para estar com Paulo no seu
último período no cárcere, também em Roma, na prisão Marmetine, quando
foi reconhecido como útil para o ministério (2Tm 4.11).
9. Conforme Justino, o mártir, Clemente de Alexandria, Irineu e Papias, “pais
da igreja”, Marcos escreveu como intérprete de Pedro (conforme Eusébio de
Cesareia), sendo o autor desse primeiro evangelho.
10. A tradição diz que Marcos foi um fiel pregador do evangelho, fundou uma
igreja em Alexandria e tornou-se bispo no Egito, onde foi martirizado.
Propósitos
Marcos escreveu seu evangelho porque, acima de tudo, ou antes de qualquer
outra razão, foi inspirado pelo Espírito Santo. Certamente o Espírito Santo, no
momento adequado a Deus, inspirou Marcos a produzir esse relato autêntico e
fidedigno sobre a vida e a obra de Jesus Cristo.
Ele percebeu a necessidade de um relato por escrito, pois a igreja ainda
dependia da tradição oral, embora houvesse muitos pequenos fragmentos
escritos circulando pelas diversas regiões. E, com a morte dos apóstolos e dos
que viram Jesus vivo, era necessário registrar para a posteridade os fatos como
eles ocorreram.
Marcos percebeu também a necessidade de que as maravilhosas histórias
sobre Jesus, sua vida, seus ensinamentos e seu sacrifício pela humanidade
fossem preservados sem distorções. Tendo acesso direto aos fatos, alguns dos
quais participou (Ceia, a fuga do Getsêmani), outros que certamente presenciou
(a prisão de Jesus), e ainda outros que conheceu através dos relatos das primeiras
testemunhas, fez seu registro de primeira mão.
Marcos escreveu seu evangelho para o fortalecimento e consolo dos cristãos
perseguidos. Logo nas primeiras décadas da igreja cristã muitos foram
perseguidos e sofreram crueldades. Percebendo essa situação, relatou em
detalhes o exemplo de Jesus, que veio para servir e não para ser servido. Veio
sofrer no lugar de todo ser humano, como incentivo para os cristãos que
passavam por duras experiências.
Como última razão, podemos afirmar ainda que Marcos escreveu seu
evangelho para apresentar as poderosas obras do Senhor Jesus Cristo. Ele
apresenta Jesus como o poderoso Filho de Deus que atuou de tal forma que não
havia poder maior que o dele. O exemplo típico é a libertação do homem
endemoninhado relatada no capítulo 5. Mas em tantas outras situações em que
Jesus se opôs aos demônios, Ele os venceu, demonstrando seu poder contra o
inimigo, demonstrando o seu poder insuperável.
Data
Não é possível determinar com exatidão a data em que foram escritos os livros
do Novo Testamento. Mas podemos, através de diversas provas e argumentos,
datá-los com grande dose de acerto. Isso ocorre em relação aos quatro
evangelhos e, especificamente, a Marcos.
Uma evidência para chegarmos à data de Marcos passa pela argumentação de
que ele foi o primeiro evangelho a ser escrito. Em parte, essa prova se dá pelo
fato de que todos os seus versículos, com exceção de pouquíssimos, foram
incluídos em Mateus e Lucas, demonstrando que foram escritos depois de
Marcos e que seus autores usaram esse evangelho na composição das suas obras.
Como sabemos pelo próprio conteúdo, João escreveu seu evangelho quase no
final do século I, tendo em vista a provável data das obras de Lucas (Evangelho
e Atos – 58–62 d.C.) e de Mateus (50–70 d.C., antes da queda do templo e de
Jerusalém), e considerando-se que não é possível deixar de relacionar o texto de
Marcos, como afirmam Soares e Correia Junior (2002, p. 14), com a revolta
judaica e as hostilidades Palestina – Roma. De qualquer forma, Marcos é um
texto que surge de contexto histórico marcado por intenso conflito externo
(judaísmo – Roma), e por profunda crise interna (judeus – gentios). Diversos
estudiosos têm afirmado que o Evangelho de Marcos foi escrito, previamente
(talvez num rascunho), entre 55–60 d.C., e a sua redação final foi feita por volta
de 65 a 68 d.C.
Local de origem
Em relação ao local de origem, embora alguns apontem Antioquia da Síria como
o possível lugar onde esse evangelho foi produzido, a grande maioria dos
estudiosos aceita que Marcos escreveu para os romanos da própria cidade de
Roma, dirigindo suas palavras de estímulo e encorajamento a uma igreja
gentílica que enfrentava dificuldades em relação ao império romano e
certamente a oposição clara do judaísmo.
Destinatários
Em relação aos destinatários do evangelho, fica claro que o público-alvo de
Marcos foi os gentios, provavelmente romanos, porque:
1. Marcos estava em Roma com Pedro (1Pe 5.13).
2. Há certa influência do latim no texto grego do evangelho.
3. Referências são feitas a membros da igreja de Roma (compare Mc 15.21
com Rm 16.13).
4. Existem expressões semíticas na tradução (3.17; 5.41; 15.22).
5. Há uma cuidadosa explicação dos costumes judaicos (7.2–4; 15.42).
Verso-chave
Embora tenha escrito o seu evangelho para os gentios, o ponto de referência de
Marcos no Antigo Testamento é o Livro de Êxodo, afinal ele era também um
judeu filho de uma família judaica. Êxodo é um documento pactual cujo
destaque é a aliança iniciada sob a liderança de Moisés. Em Marcos encontramos
essa mesma ênfase a partir do sacrifício de Jesus, no qual Ele baseou a nova
aliança no seu sangue. Por isso, o verso-chave do Evangelho é Marcos 10.45:
Pois o próprio Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e
dar a sua vida em resgate por muitos.
Devemos dar graças a Deus por não necessitarmos mais cumprir os preceitos da
lei. Recebendo a graça de Deus, podemos entrar livremente na sua santa
presença pelo precioso sangue de Jesus derramado em favor de muitos!
Peculiaridades do Evangelho de Marcos
De acordo com alguns comentaristas, o Evangelho de Marcos se distingue por
algumas peculiaridades.
Conforme Cardoso Pinto (2008, p. 81–82), Marcos é um evangelho de ação
concentrada, onde as multidões estavam continuamente cercando Jesus e
exigindo suas ações. As ações de Jesus na maioria das vezes foram registradas
precedidas da palavra “imediatamente”, usada 41 vezes nesse evangelho,
demonstrando sua disposição de servir sempre.
Marcos é também o evangelho que enfatiza o “segredo messiânico”,
principalmente na primeira parte do livro, quando Jesus recomendava que os
seus interlocutores, inclusive os espíritos malignos expulsos, não anunciassem
antes do tempo que Ele era o Cristo. Marcos também enfatiza bastante a última
semana de Jesus, através de uma peculiaridade que se encaixa bem no contexto
de perseguição dos seus primeiros leitores.
Marcos nos mostra como Jesus estava disposto a dar a sua vida, sofrendo em
nosso lugar. Nesse mesmo sentido de encorajar os seus leitores que viviam dias
difíceis, destaca-se também em Marcos um retrato bem realista dos apóstolos
como homens chamados para o discipulado, mas homens como todos, bem
normais, com seus deslizes, mentalidades fechadas e falta de fé e de
perseverança.
Mas, sobretudo, Marcos é peculiar ao apresentar uma cristologia que enaltece
o Senhor Jesus:
1. Jesus é o Filho de Deus; aquele que batiza com o Espírito Santo.
2. É o servo de Yahweh.
3. É o santo mencionado por Isaías.
4. Tem poder para perdoar os pecados.
5. Tem autoridade sobre a lei e as tradições judaicas.
6. Éo Messias, filho do Altíssimo, ao mesmo tempo em que é totalmente
humano com todas as nossas emoções.
7. Tem também um conhecimento sobrenatural.
Baseando-nos em Lopes (2008, p. 24–29), destacamos outras peculiaridades
neste evangelho. Marcos é um evangelho evangelístico, pois enfatiza com
intensidade a proclamação de Jesus como Filho do Deus vivo. Jesus é o Filho de
Deus. Marcos destaca o ministério, e principalmente as ações de Jesus,
demonstrando a sua popularidade. Marcos demonstra também a identidade de
Jesus ao registrar as palavras do Pai: Tu és meu filho amado… (1.11). Marcos é
o evangelho que apresenta Jesus como servo. A sua mensagem é impactante: o
Filho de Deus veio a este mundo para ser servo!
ESBOÇO DE MARCOS

I – O SERVIÇO DO SERVO. O SEGREDO DO SERVO

1 – O Servo e o início do ministério (capítulo 1)

2 – O Servo quebra as tradições (capítulo 2)

3 – O Servo convoca homens para uma tarefa divina (capítulo 3)

4 – O Servo ensina as verdades relativas ao reino de Deus (capítulo 4)

5 – O Servo demonstra o seu divino e incomparável poder (capítulo 5)

6 – O Servo incompreendido pelos conhecidos é recebido pelos distantes (capítulo 6)

7 – O Servo rejeitado pelos líderes judeus estende suas bênçãos aos gentios (capítulo 7)

8 – O Servo e a sua identificação (capítulo 8)

9 – O Servo confirmado em divindade apresenta seus requisitos aos discípulos (capítulo 9)

10 – O Servo dá ensinamento a diversos interlocutores (capítulo 10)


II – O SACRIFÍCIO DO SERVO. A SALVAÇÃO DO SERVO

1 – O Servo é recebido em triunfo pelos desamparados (capítulo 11)

2 – O Servo é desafiado em seu ensino (capítulo 12)

3 – O Servo proclama seu sermão profético (capítulo 13)

4 – O Servo é ungido, celebra a Páscoa e é traído (capítulo 14)

5 – O Servo institui a Ceia, é provado e negado (capítulo 14)

6 – O Servo é preso, julgado, condenado e ajudado com a cruz (capítulo 15)

7 – O Servo é crucificado em favor da humanidade (capítulo 15)

8 – O Servo morre e é sepultado (capítulo 16)

9 – O Servo ressuscita (capítulo 16)

10 – O Servo ordena a evangelização (capítulo 16)

O desafio do Evangelho de Marcos para nós


O idealizador do nosso programa “Através da Bíblia”, Dr. Vernon McGee (1991,
p. 13), citado por Lopes (2008, p. 27), disse que na Bíblia temos três começos:
1. O princípio na eternidade, isto é, antes do tempo, conforme as palavras de
João: No princípio era o verbo (Jo 1.1).
2. O princípio da criação, isto é, quando Deus iniciou as obras que deram
origem a toda criação, conforme as palavras de Moisés: No princípio criou
Deus os céus e a terra (Gn 1.1).
3. O princípio do ministério de Jesus, quando Ele, Deus encarnado, veio
resgatar o ser humano do seu pecado, conforme as palavras de Marcos:
Princípio do evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus (Mc 1.1).
O desafio do Evangelho de Marcos é apresentado de modo muito objetivo:
ele não apresenta o que devemos fazer, mas o que Deus fez por nós, através de
Jesus Cristo. E, diante disso, qual é a nossa reação?
Este é um evangelho simples, compacto e objetivo. E, conforme Lopes (2008,
p. 28), já desde o seu primeiro verso resume e declara quem é Jesus. Ele é
plenamente homem (Jesus), ungido de Deus (Cristo), e plenamente divino (Filho
de Deus).
Ao estudarmos este evangelho talvez consigamos ouvir a voz de Marcos a
nos encorajar, pois:
Ele quer que vejamos Jesus trabalhando. É como se dissesse: Olhe! O que Jesus fez prova quem ele
era. O que ele operou autentica o que ele ensinou. As obras poderosas confirmam as palavras
surpreendentes. Observem-no trabalhando e maravilhem-se com este operador de prodígios
sobrenatural. Isso irá convencê-lo (BAXTER, 1985, p. 202).

Ao seguirmos para o início do estudo do conteúdo deste evangelho em que


conheceremos mais a Jesus Cristo, a postura de todo aquele que deseja tornar
prático esse conhecimento é ter o seu coração aberto para as verdades
fundamentais que vamos contemplar. Vamos ao texto de Marcos!

Marcos 1 - O servo e o início do ministério


Anunciado, batizado, provado, demonstrado e autenticado
O desejo de vencer é comum a todos os seres humanos. Todos querem vencer.
Quem chega depois do primeiro lugar é considerado perdedor. Vencedores são
aqueles que chegam em primeiro lugar. Eles merecem destaque e são
considerados mais importantes.
Mas, em contraste direto com essa ideia, Jesus disse: e quem quiser ser o
primeiro entre vós será servo de todos. Pois o próprio Filho do Homem não
veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por
muitos (Mc 10.44–45). Essas palavras são impressionantes e transmitem um
conceito desafiador. Jesus é o primeiro. É Deus encarnado. Mas Ele entrou na
história humana como servo, não como o mais importante!
Esta é a mensagem do Evangelho de Marcos. E a partir de agora, iniciamos o
estudo desse livro que traz esse desafio do Senhor Jesus. Neste evangelho
encontraremos uma rápida sucessão de quadros vívidos de Jesus, o servo em
ação.
E já no inicio do primeiro capítulo, Marcos nos mostra a verdadeira
identidade de Jesus, pelo que Ele faz e não tanto pelo que diz. Nesse evangelho,
enquanto somente quatro parábolas são contadas, 18 milagres são narrados. É
Jesus, o servo em ação!
Vamos iniciar o estudo deste texto dividindo-o em 12 partes:
Parte 1 – Onde tudo começou (v. 1)
Parte 2 – João Batista, o precursor do prometido (v. 2–3)
Parte 3 – João Batista testemunha sobre Jesus (v. 4–8)
Parte 4 – João Batista batiza Jesus (v. 9–11)
Parte 5 – Jesus é testado (v. 12–13)
Parte 6 – Jesus anuncia o reino de Deus (v. 14–15)
Parte 7 – Jesus chama os primeiros discípulos (v. 16–20)
Parte 8 – Jesus expulsa o demônio num sábado (v. 21–28)
Parte 9 – Jesus cura a sogra de Pedro (v. 29–31)
Parte 10 – Jesus realiza muitas curas e libertações e pede segredo (v. 32–34)
Parte 11 – Jesus se retira para orar e prossegue em pregar e curar (v. 35–39)
Parte 12 – Jesus cura um leproso e insiste no segredo messiânico (v. 40–45)
Onde tudo começou
Mc 1.1
Essas são as palavras do verso 1: Princípio do evangelho de Jesus Cristo, o
Filho de Deus. Para entendermos corretamente as palavras introdutórias desse
evangelho são necessárias algumas observações.
1. Como já mencionamos, a expressão “princípio” nos relembra as palavras
iniciais de Gênesis 1.1, ligando-nos também a João 1.1. Diferentemente de
Mateus e Lucas em seus escritos, Marcos não apresenta nenhum detalhe da
geração, do nascimento ou da genealogia de Jesus. E como se vê nos versos
posteriores, esse princípio tem ligação direta com o precursor que veio
preparar o ministério de Jesus e foi prometido desde o Antigo Testamento.
2. A palavra “Evangelho” é uma transliteração do grego, cujo significado é
“boas novas”, ou “boa história”. O seu conteúdo principal é a pessoa de Jesus
Cristo, isto é, essas palavras poderiam ser traduzidas como “começo da boa
história de Jesus Cristo”.
3. Jesus Cristo não é só o conteúdo das boas novas, mas elas também contam
a respeito dele e, sobretudo, vêm da parte do próprio Jesus Cristo, isto é, têm
origem divina, se originam do próprio Jesus.
4. A palavra Cristo, outra transliteração do grego, é um adjetivo que significa
“ungido de Deus” e vem do hebraico “messias”. Demonstra esse termo que
Jesus, o Deus encarnado, foi enviado por Deus, o Pai, para resgatar o ser
humano.
5. A expressão Filho de Deus enfatiza a deidade, a divindade e a eternidade
de Jesus. Isso quer dizer:
A. Que o Jesus profetizado no Antigo Testamento foi concretizado no
Novo Testamento.
B. Que Jesus existia desde a eternidade, como vemos em suas
manifestações pré-encarnadas, descritas no Antigo Testamento.
C. Que Jesus tinha uma relação filial especial com Deus, sem ter sido por
Ele gerado como nós geramos os nossos filhos, pois Ele é Deus também.
Essas palavras introdutórias, de fato, são boas notícias! Como Marcos
mostrou Jesus como servo, logo no início enfatizou a divindade de Jesus como a
capacitação que lhe concedeu condições para ser um servo perfeito, para ser o
divino ajudador dos pobres e necessitados, para ser o vencedor do diabo,
expulsando-o de tantas vidas possessas, e para ser o Salvador que
espontaneamente entregou a sua vida por nós. Jesus só pôde agir assim porque é
o próprio Deus, o Filho de Deus, o Messias, o Cristo aguardado. Não há maior
notícia do que esta: Deus nos ama de tal maneira que deu seu filho em nosso
lugar. Esse é o evangelho! É por isso que somos salvos e a Ele devemos
anunciar!
João Batista, o precursor do prometido
Mc 1.2–3
Na sequência da apresentação do Servo, Marcos menciona algo que talvez fuja à
nossa lógica. Se ele escreveu aos romanos, por que citou logo no início do
evangelho dois textos do Antigo Testamento? Vamos entender a sua lógica. Para
isso, destacamos nesses versos a participação de João Batista, prometido desde o
Antigo Testamento. Precisamos fazer sete constatações para entendermos a
preparação do ministério de Jesus.
1. A primeira observação ainda se refere a uma questão: Por que Marcos
começa a história de Jesus sem mencionar a sua origem humana, e fala logo
no início de João Batista? Porque era costume entre os romanos que os seus
oficiais mais importantes que os seus generais, ao chegarem a Roma, fossem
anunciados ou precedidos pelo arauto ou mensageiro. Quando o arauto
entrava na cidade e fazia o anúncio, o povo todo sabia que alguém importante
estava chegando. Assim, ao mencionar a pessoa e o ministério do Batista,
Marcos quis destacar que todos deviam dar grande atenção para aquele que
viria, para aquele que estava sendo introduzido.
2. Ao citar a expressão “está escrito”, Marcos direcionou seus leitores ao
Antigo Testamento. Embora tenha escrito para um público gentio de romanos
convertidos e não convertidos, e seus leitores não fossem conhecedores em
profundidade das Escrituras judaicas, Marcos fez uma ligação com o passado,
pois todo o evangelho está firmemente enraizado em fatos históricos
incontestáveis. Sendo que o evangelho que revela Jesus Cristo é a
confirmação da realidade das antigas profecias, o Antigo Testamento deve ser
considerado o começo e a origem das boas novas de salvação.
3. A citação que Marcos faz de Isaías deve ser compreendida corretamente.
Ele começa citando Malaquias 3.1 e conclui citando Isaías 40.3, nomeando,
entretanto, apenas Isaías, provavelmente por ser o profeta mais conhecido de
seus leitores.
4. Marcos, assim, vinculou e demonstrou também a importância do Antigo
Testamento para entendermos o ministério de Jesus e suas ações divinas como
concretização dos símbolos e significados que vemos nos 39 livros que
compunham as Escrituras Sagradas daqueles dias.
5. A citação refere-se ao ministério preparatório de João Batista que veio
como precursor de Jesus. A citação de Isaías 40 vem do início dos capítulos
que são denominados o Livro da Consolação de Isaías, e tanto João Batista
como Jesus Cristo estariam cumprindo as profecias ditas mais de 700 anos
antes daqueles acontecimentos.
6. João Batista foi prometido desde o Antigo Testamento como precursor do
Messias, como o preparador do povo, pois, após 400 anos de silêncio, sem
nenhuma palavra vinda diretamente de Deus, certamente a vida e as
condições espirituais do povo não estavam adequadas para receber tão
grandiosa notícia.
7. João Batista desenvolveria um ministério diferente e certamente não
popular, pois ministraria no deserto, chamando o povo ao arrependimento,
chamando a atenção somente daqueles que estavam ansiosos por ouvir uma
palavra de esperança.
Como constatamos, diferentemente de Mateus e Lucas, Marcos não se
preocupou em relatar os acontecimentos dos 30 primeiros anos da vida de Jesus,
anteriores ao início do seu ministério. Ele começou sua narrativa mostrando que
o ministério de Jesus tinha por base as profecias há muito tempo feitas e
aguardadas. Ao mencionar as profecias de Malaquias e Isaías, quis vincular o
ministério de Jesus com o plano eterno de Deus que se desenvolvia desde os dias
dos patriarcas até o tempo exato da sua revelação, como disse Paulo: vindo,
porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho… (Gl 4.4).
Diante dessas boas novas, você tem louvado a Deus por ter planejado e
escrito a história da nossa salvação desde o passado, desde a eternidade? Louve a
Deus e inclua-se nesse maravilhoso plano!
João Batista testemunha sobre Jesus
Mc 1.4–8
Marcos destaca, na sequência, o ministério de João Batista. Este ministério deve
ser analisado sob sete aspectos.
1. A pessoa e o caráter de João Batista eram distintos. Quando lemos Lucas
1.5–25,57–80, vemos que João Batista poderia ter exercido seu sacerdócio no
templo, em Jerusalém, pois era filho do sacerdote Zacarias. Mas percebeu,
certamente pela confirmação do Espírito Santo que já o enchera desde o
ventre materno, que o seu chamado era para exercer um ministério não
popular e até excêntrico. O seu ministério seria profético, chamando o povo
ao arrependimento e introduzindo no cenário religioso de Israel a figura do
Messias, do Cristo tão ansiosamente aguardado. O caráter humilde e
abnegado de João Batista fica claro no verso 6, que descreve o seu vestuário,
comparado ao modo de vida simples dos recabitas (Jr 35). O seu
comportamento foi, na prática, uma denúncia ao estilo de vida opulento e
corrupto da liderança judaica.
2. O local e a missão de João Batista estavam muito claros para ele. Ao
escolher desenvolver o seu ministério no deserto, provavelmente João Batista
teve as seguintes motivações:
A. Ele mesmo viu a necessidade de se afastar das distrações dos grandes
centros para ouvir com mais clareza a voz de Deus.
B. Ele queria atrair completamente a atenção dos ouvintes para as suas
palavras, pois eram Palavra de Deus.
C. Além de cumprir a profecia de Isaías 40.3, no deserto, convocando o
povo para estar ali, ele apontava para um rompimento completo com os
religiosos e tudo que envolvia a fútil adoração na suntuosidade do templo.
Em relação à sua missão, ele era o precursor do Messias e assim deveria
promover um reavivamento espiritual, preparando a nação para a vinda
daquele a quem tanto aguardavam. A frase eis aí envio diante da tua face
o meu mensageiro, o qual preparará o teu caminho (v. 2), tinha um
significado muito prático. Antes de um rei ou de uma grande autoridade
visitar uma cidade, engenheiros e trabalhadores iam adiante dele para
aplainar as estradas e preparar-lhe o caminho. Ao exercer esse ministério,
assim como os engenheiros aplainavam as estradas, João Batista pregava,
preparando os homens diante da perspectiva da vinda do Messias. Era essa
a sua missão, e ele a desenvolveu muito bem no poder do Espírito Santo.
3. A pregação de João Batista, o seu anúncio do Messias, encorajava os
desanimados, repreendia os maus e os orgulhosos e trazia esperança a todos.
Quando lemos em Lucas 1.16 que ele converteria o coração dos israelitas ao
Senhor Deus, isso de fato ocorreu. João Batista de fato preparou um grupo de
seguidores que estava pronto para seguir a Jesus. Dos próprios seguidores de
João Batista, Jesus teve os seus primeiros discípulos.
4. O chamado ao arrependimento feito por João Batista foi muito objetivo.
Entre os judeus, o anúncio de que o reino dos céus estava próximo significava
que um novo tempo estava prestes a começar. Mas para usufruir desse novo
tempo era necessário arrependimento dos pecados. O problema é que os
judeus, intérpretes da lei, criam que eles já pertenciam ao reino e por isso não
precisavam arrepender-se. Eles consideravam-se filhos de Abraão, filhos da
aliança. Mas João Batista se opôs a essa interpretação denunciando os
pecados deles e a necessidade do arrependimento.
5. Um outro aspecto a ser considerado é o batismo de João Batista, como
vemos no verso 5. A parte prática, a demonstração de ter um coração aberto
para a vinda do Messias, deveria ser demonstrada através do batismo. Você
deve se lembrar que ao estudarmos os livros da Lei aprendemos que Israel era
uma nação sacerdotal e, portanto, os israelitas entendiam bem que qualquer
impureza os excluía do culto ao Senhor. Para que um israelita pudesse
novamente cultuar a Deus, deveria oferecer um sacrifício e passar pela
lavagem em água, como se fosse um impuro que tinha que cumprir o ritual
para voltar ao seio da comunidade adoradora (Lv 14.7–32; Nm 19.1–22).
Quando João Batista exigiu a demonstração de um coração pronto para o
Messias, através do batismo, colocou os judeus no mesmo nível dos impuros.
Isso provocou uma grande recusa por parte dos religiosos, mas uma aceitação
sem medida pelos demais judeus que reconheciam os seus pecados e a
necessidade do perdão divino sobre suas vidas. Batizar um judeu como sinal
de arrependimento significava um rompimento completo com aquele estilo de
vida hipócrita de uma religião apenas formal. A recusa por parte das
autoridades religiosas se explica por isso: eles estariam confessando a
religiosidade vazia e insuficiente. Mas a boa aceitação por parte do povo mais
simples e sincero era constatada pelas seguintes palavras: Saíam a ter com
ele toda a província da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém… (v. 5).
Era uma demonstração da ansiedade de algo novo por uma grande parte da
população.
6. Na verdade, exigindo arrependimento e batismo, João Batista proclamou a
necessidade de uma renovação espiritual como outros profetas também
tinham proclamado (Ez 36.24–27; Zc 13.1; 2Cr 7.14).
7. E, finalmente, um outro aspecto que deve ser destacado no ministério de
João Batista: é a apresentação que ele fez do seu sucessor, do Messias
prometido. Com o seu desprendimento, coragem e sua mensagem contra a
liderança religiosa de Israel, João Batista conquistou muita atração para si,
mas jamais se esqueceu de que era apenas um precursor ou um arauto. Ele
anunciou: Eu, na verdade, vos batizo com água; mas vem o que é mais
poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar-lhe as correias das
sandálias; ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo (Lc 3.16).
João Batista apontou, conforme João 1.29: Eis o cordeiro de Deus, que tira
o pecado de mundo. Ele reconhecia as limitações do seu ministério, pois não
podia mudar os corações e nem conceder o Espírito Santo que deveria ser
derramado em resposta à petição de Cristo (Jl 2.28).
É possível aplicar em sua vida alguns princípios que nortearam a vida deste
profeta divino, como ousadia, desapego aos bens materiais e, principalmente,
humildade? É possível aceitarmos o batismo daquele que batiza com o Espírito
Santo? Certamente! Ele nos dá de graça. Arrependa-se e busque em Jesus o
perdão dos seus pecados e a vida cheia do Espírito Santo!
João Batista batiza Jesus
Mc 1.9–11
Nesses versos encontramos o relato sobre o batismo de Jesus, um episódio que
necessitamos entender corretamente e sobre o qual devemos fazer cinco
destaques.
1. Em naqueles dias (v. 9), temos a indicação da data inicial do ministério de
Jesus. Provavelmente Ele começou seu ministério em 27 a.C., com
aproximadamente 30 anos de idade (Lc 3.23), tendo ficado até então com sua
família em Nazaré.
2. Jesus foi batizado por algumas razões:
A. Para endossar a autoridade de João Batista.
B. Para se identificar com os pecadores que buscavam o perdão de Deus.
C. Para publicamente confirmar e anunciar seu ministério.
D. Para ser apontado por João como o Messias.
E. Para demonstrar o envolvimento da Trindade nesse ato salvífico. O Pai
falou do alto, o Filho foi batizado e o Espírito Santo desceu, ungindo o
Filho.
3. A vinda do Espírito Santo na forma de uma pomba simbolizava e indicava
a santidade, a pureza, o encorajamento, a mansidão e a impecabilidade do
Espírito Santo, a terceira pessoa da Trindade.
4. A voz do Pai declarando ser Jesus o seu filho amado em quem se agradava
foi significativa, pois além do testemunho das pessoas e do próprio autor da
filiação divina de Jesus, o próprio Deus Pai confirmou essa filiação ao dizer:
Tu és o meu Filho amado (v. 11).
5. A insistência de Jesus ser batizado por João (Mt 3.13–15), tinha razão de
ser, pois Ele tinha nascido sob a lei (Gl 4.4), e por isso deveria cumprir todas
as suas exigências que apontavam para a necessidade da purificação através
da lavagem (Lv 16–17; 22). Mas Jesus também anunciava no seu batismo que
viera para tomar o lugar do pecador, o nosso lugar diante do juízo de Deus.
Essa é outra bênção maravilhosa que temos em Jesus, pois antes de iniciar o
seu ministério Ele se preocupou em identificarse conosco, substituindo-nos
diante de Deus! Que lição preciosa! Você tem usufruído dessa bênção?
Jesus é testado
Mc 1.12–13
Nos versos 12 e 13 destacamos o teste a que Jesus foi submetido. Esse relato
conciso de Marcos ajusta-se à mentalidade romana, pois é:
A visão de um homem impelido por convicções interiores levado a um ambiente desfavorável para
combater contra um inimigo poderoso. O longo período, a presença de feras, tudo aponta para
coragem e resistência, virtudes que os romanos consideravam extremamente valiosas. Seu triunfo
sobre o tentador fica implícito no serviço que os anjos prestaram a Jesus depois dos quarenta dias de
tentação (CARDOSO PINTO, p. 86).

Para entendermos completamente o significado desse teste, é necessário que


sobre esses versos façamos algumas considerações.
1. A expressão e logo (v. 12), ou “logo após” ou “imediatamente”, é uma
característica estilística de Marcos. Ela é usada aproximadamente 45 vezes no
evangelho, indicando a prontidão de Jesus agir. Como servo em ação, Jesus é
mostrado sempre agindo, sempre atuando de forma rápida e objetiva.
2. A expressão o Espírito o impeliu para o deserto (v. 12), indicava a
necessidade de Jesus passar por essa experiência, a mesma que Israel teve no
deserto, quando também foi chamado de “meu filho”, tendo sido
anteriormente batizado em Moisés no mar (1Co 10.2; Êx 14.13–31). Mas o
verbo “impelir” pode significar também para o novo convertido que, após o
batismo, ou após a declaração pública de sua fé, começa um difícil período de
provações.
3. O período de 40 dias e noites em que Jesus jejuou (Mt 4.2), é um símbolo
dos 40 anos de Israel no deserto. Mas também está relacionado ao seu
ministério messiânico, em que Ele veio cumprir as profecias do Antigo
Testamento e também inaugurar um novo tempo, o Novo Testamento.
4. A tentação de Jesus refere-se à pergunta que normalmente se faz: Jesus,
como Filho de Deus, podia pecar? Essa questão é estudada em Teologia
Sistemática nos seminários e merece um aprofundamento específico, mas ao
mesmo tempo pode ser respondida de modo simples: o teste, a tentação a que
Jesus foi submetido, foi uma prova da sua verdadeira humanidade, pois de
fato sentiu e lutou contra ela. Em decorrência da sua perfeita união com o
Espírito Santo que o enchia plenamente, era moralmente impossível que Jesus
pecasse. E assim, ao mesmo tempo em que foi provado, o teste, a tentação
que Jesus venceu, a inigualável vitória que obteve contra Satanás, comprovou
e demonstrou a sua completa divindade.
5. A tentativa de Satanás contra Jesus refere-se à natureza dela. Nas três vezes
em que Satanás o atacou, disse: “Abandone essa maneira de salvar o mundo”
(o caminho do sofrimento, do sacrifício e da morte), “Experimente a minha
maneira, que será mais fácil e trará grande notoriedade para você”. E nas três
vezes em que Jesus recusou a proposta do tentador, apoiou-se na Palavra de
Deus (Dt 6; 8). Jesus expulsou o diabo ao usar com sabedoria as Escrituras
Sagradas. Lá no deserto, em meio às feras, Jesus começou a amarrar o
valente, conforme veremos em 3.23–27, derrotando o inimigo. Vitória
completada ao final do seu ministério, na cruz do Calvário, que nos dá a
salvação.
Sem dúvida alguma temos grande salvador! Alguém que sofreu e sentiu
nossas dores e as nossas dificuldades. Saiba que quando você está em meio as
mais duras provas, Jesus está ao seu lado. Jesus é o nosso sumo sacerdote e pode
interceder por nós diante do Pai! É só confiar. Glória a Deus por tão grande
salvação!
Jesus anuncia o reino de Deus
Mc 1.14–15
Concluindo a primeira parte desse capítulo inicial, nos versos 14 e15 destacamos
o início do ministério de Jesus, depois de João Batista ter sido preso. Essa prisão
certamente era uma indicação de como Jesus e seus discípulos seriam tratados ao
anunciarem as mudanças exigidas para quem quisesse entrar no reino de Deus.
João foi preso por Herodes, pois denunciava não apenas os pecados do povo,
mas principalmente os pecados das autoridades e do próprio Herodes, que tinha
um relacionamento irregular com sua cunhada. Confirmando essa posição, essas
palavras nos chamam a atenção:
Este parágrafo pode ser considerado como a conclusão do prólogo (1.2–13), uma vez que reforça o
relacionamento temporal entre esses dois pregadores do arrependimento, Jesus e João. Mais do que
isso, porém, esse parágrafo prefacia o ministério de Jesus centrado na Galileia. João sai de cena. Ele
não aparecerá novamente neste Evangelho, embora seu ministério continue a influenciar as atitudes
em relação a Jesus (MULHOLLAND, 2006, p. 39).
Assim, com o propósito de introduzir o Messias que pregava a necessidade de
uma completa mudança de vida, Marcos, de forma resumida, apresentou o
ministério de proclamação, de advertência de Jesus, em três tópicos.
1. O anúncio da chegada do reino de Deus, significando a invasão da
divindade na história da humanidade para trazer salvação aos homens que
estavam perdidos.
2. A necessidade do arrependimento, significando que esse é um dos
requisitos que Deus espera que seja cumprido por todos os que desejam
pertencer ao reino.
3. A necessidade da crença no evangelho, nas boas notícias de Deus para a
humanidade, significando que deve haver confiança nas promessas divinas.
Crer no evangelho é ter fé de que as boas novas são verdadeiras e, de fato,
nos conduzem à presença de Deus.
Esse é o conteúdo da mensagem da salvação. Essa é a mensagem proclamada
pelo Senhor Jesus. Essa é a mensagem que nós anunciamos. Essa é a mensagem
que todos devem aceitar. Você já aceitou essas boas notícias para você?
Jesus chama os primeiros discípulos
Mc 1.16–20
Uma das primeiras ações práticas do ministério de Jesus apresentadas por
Marcos, nos versos 16 a 20, é a convocação dos primeiros discípulos. Uma vez
que tinha vindo como servo e sabendo que um dia não estaria mais entre nós,
uma das primeiras providências de Jesus foi convocar aqueles que dariam
continuidade à proclamação do reino de Deus quando não estivesse mais aqui.
Temos de lembrar que essa chamada ocorreu em três etapas. O quadro a seguir
nos ajuda a constatar essas etapas de convocação.
QUADRO DAS CHAMADAS DOS APÓSTOLOS DE CRISTO
Chamadas Designação Ano Local

Primeira Discípulos De Preparação Rio Jordão (Jo 1.35–


Principiantes 51)

Segunda Discípulos Integrais De Popularidade Mar da Galileia (Mt


(início) 4.18–22; Mc 1.16–20;
Lc 5.1–11)

Terceira Apóstolos (enviados) De Popularidade (final) Monte (Mt 10.1–4; Mc


3.13–19; Lc 6.12–16)
Jesus chamou aqui duas duplas de irmãos. Desses quatro, três deles, Pedro,
Tiago e João, se tornaram os discípulos mais íntimos de Jesus. A disponibilidade
que tinham de seguir a Jesus serve de exemplo e desafio para nós. O discipulado
com Jesus requer cinco atitudes, como podemos ver no verso 17:
A. Seguir a Jesus, aceitando o vinde após mim.
B. Ser treinado por Jesus, aceitando o eu vos farei.
C. Disposição para ganhar homens, aceitando o chamado para ser
pescadores de homens.
D. Disponibilidade de trabalhar com pessoas, aceitando tratar “de
homens”.
E. Deixar os interesses particulares em segundo plano: eles deixaram as
redes, o pai e os empregados para imediatamente seguirem a Jesus.
Será que esta é a sua disposição? O objetivo dessa narrativa é mostrar que
estamos incluídos nessa tarefa. Nós, cristãos, devemos atender essa convocação,
atentando para as suas responsabilidades e para os seus privilégios. Você já é um
discípulo, um seguidor de Jesus Cristo?
Depois que uma grande introdução foi feita (v. 2–15), após ter nos mostrado a
preocupação de Jesus com a sequência do seu ministério na convocação dos
discípulos (v. 16–20), Marcos começa a mostrar o ministério, o serviço de Jesus
Cristo, o Deus encarnado que veio para servir. Ainda neste capítulo encontramos
pelo menos dois assuntos dos mais relevantes e aplicáveis aos nossos dias.
Vamos falar sobre curas e oração.
Jesus expulsa o demônio num sábado
Mc 1.21–28
É interessante notar que a primeira narrativa de Marcos sobre o ministério de
Jesus mostra o Mestre derrotando as forças do inimigo. Ora, se os seus leitores
se interessavam por homens vitoriosos, nada melhor que esse relato para chamar
a atenção deles.
Vamos, então, estudar esse parágrafo através de sete observações.
1. Nos versos 21 a 28, depois de o povo de Nazaré não o receber (Lc 4.16–
30), Jesus deixou a cidade em que fora criado, o seu próprio povo, e foi para
Cafarnaum.
2. Cafarnaum era importante para os romanos, pois contava com um
centurião (Mt 8.5), uma alfândega (Mt 9.1–9), e era um centro de comércio e
distribuição de peixes para todas as regiões do país. Cafarnaum foi
transformada em quartel general de Jesus durante todo seu ministério.
3. Marcos nos mostra Jesus com os discípulos em Cafarnaum. Num sábado,
todos foram à sinagoga para Jesus ensinar.
4. A sinagoga era uma instituição judaica importante, pois além de ter surgido
na época do exílio babilônico, em certo sentido estava ocupando o lugar do
templo, principalmente para o ensino. E uma vez que eles estavam distantes
de Jerusalém e aos sábados era hábito cultuarem e se reunirem para ler as
Escrituras, Jesus e seus discípulos foram para a sinagoga da cidade. É
importante recordar também que sinagoga significa casa de reunião, de
instrução e de adoração dos judeus. Eram necessários pelo menos dez homens
judeus, com mais de 30 anos, casados, para se formar uma sinagoga. E era
costume convidar os visitantes e mestres para ler e explicar alguma passagem
das Escrituras.
5. Uma das características principais do ministério de Jesus foi o ensino, que
era diferenciado, pois a autoridade com que ensinava não era como a dos
escribas e fariseus. Isso causava grande admiração nos que o ouviam. Quando
a Palavra de Deus é exposta, é ensinada com autoridade e no poder do
Espírito Santo, como Jesus fazia, o inimigo se incomoda e se manifesta. O
inimigo sabe que há poder em Jesus para derrotá-lo e expulsá-lo de um lugar
que indevidamente tomou conta. O coração humano, nos planos divinos,
nunca foi lugar para o diabo, mas para o Espírito Santo.
6. Diante da leitura e do ensino provenientes da Palavra de Deus, o demônio
se manifestou. Ao ouvir a Palavra de Deus exposta por Jesus com autoridade
divina, e por Jesus estar sempre cheio e conduzido pelo Espírito Santo, o
diabo se manifestou. Embora Marcos mencione que apareceu na sinagoga um
homem possesso (v. 23), Lucas diz que esse endemoninhado estava na
sinagoga (Lc 4.33). Tal afirmação nos mostra que até aquele momento Ele
estava na sinagoga participando da reunião, mas não fora incomodado. Por
quê? Certamente porque os que ensinavam não o faziam no poder do Espírito
Santo e na autoridade de Deus. É evidente a diferença entre ministrarmos a
Palavra de Deus baseando-nos na nossa inteligência, nos nossos métodos e
nas nossas interpretações, ou no poder e na capacitação do Espírito Santo. A
verdadeira mensagem cristã tem o poder de libertar os homens das garras do
inimigo.
7. Diante da manifestação do inimigo, Jesus o repreendeu e o expulsou da
vida daquele homem, libertando-o das garras do diabo. É digno de nota
perceber que os demônios reconheciam Jesus (v. 24), como em outras
ocasiões (1.34; 3.11; 5.7), pois já o conheciam (1.34), por Ele ser o “Santo de
Deus”, “o Filho de Deus”, “o filho do Deus Altíssimo”. Mas apesar dessas
declarações, Jesus rejeitou esse louvor demoníaco e mandou que se calassem.
Ao libertar aquele homem, Jesus demonstrou que esse é o papel da igreja e de
seus discípulos diante das necessidades e do domínio que o inimigo exerce sobre
a humanidade. Nós somos cooperadores de Deus para libertar, para sermos
usados como canais da sua graça em favor dos cansados, oprimidos e
sobrecarregados, conforme o convite do próprio Senhor Jesus (Mt 11.28–30).
Diante daquela libertação proporcionada por Jesus, todos se admiraram sem
saber exatamente o que significava aquela manifestação. Conforme Hurtado
(1995, p. 37), com a narrativa desse episódio, certamente Marcos quis
demonstrar que Jesus era muito mais que um mero mestre. Ele era divino e o seu
poder era superior ao inimigo de nossas almas. E assim, a fama de Jesus correu
célere por toda a Galileia e cidades próximas. Era o começo do Ano de
Popularidade, que vimos quando estudamos Mateus.
Você sabe dizer o que significava aquela manifestação? Qual era a nova
doutrina? Com que autoridade Jesus ordenava e expulsava os demônios,
libertando os homens de suas garras? É fundamental sabermos que Jesus veio
anunciar a vinda e a presença do reino de Deus entre os homens. Essa era e é a
mensagem que devemos proclamar. O reino de Deus está entre nós. É importante
entendermos as cinco implicações decorrentes de pertencermos a esse reino:
A. Temos nova autoridade sobre nossas vidas: o Senhor, o Rei Jesus.
B. Temos nova realidade a ser percebida: manifestações divinas e
miraculosas.
C. Temos nova possibilidade: podemos ser pessoas diferentes.
D. Temos nova responsabilidade: os deveres são diferentes – são
interiores.
E. Temos nova comunidade: não mais Israel, mas todas as nações, o corpo,
a igreja.
Para pertencermos a esse reino eterno é necessário primeiramente o
arrependimento, isto é, admitir que sendo pecadores não merecíamos, não
conhecíamos, e que só agora descobrimos essas implicações. E, em segundo
lugar, é necessário ter fé, isto é, atentar e obedecer essas implicações, colocando-
as em prática no dia a dia.
Você já é um súdito do reino de Deus? Reflita sobre essa questão, porque ela
é básica para todos nós!
Jesus cura a sogra de Pedro
Mc 1.29–31
Nos versos 29 a 31, Marcos continua nos mostrando o poder de Jesus.
Lembrando que esse é o primeiro capítulo e sabendo do interesse romano em
pessoas poderosas e vitoriosas, Marcos demonstra que também sobre as doenças
Jesus tinha (e tem) poder. O relato é sobre a cura da sogra de Pedro. Para
entendermos esse episódio são necessárias também algumas observações.
1. Só Marcos relata que Jesus foi com Tiago e João, os filhos de Zebedeu, à
casa dos outros dois irmãos, André e Pedro. E esse fato, essa menção de
nomes, além de emprestar à cena um singelo realismo, ajuda-nos a confirmar
a autoria deste evangelho. Sabendo que Marcos era primo de Pedro, muito
certamente a relação familiar aqui é visível.
2. Sendo Pedro casado, conforme o testemunho de Paulo (1Co 9.5), é bem
provável que Jesus e os outros discípulos tenham ido almoçar na casa de
Pedro, depois de terem participado do culto na sinagoga.
3. A sogra de Pedro estava enferma, mas não se menciona em nenhum dos
evangelhos qual era a doença. Marcos apenas diz que ela estava febril, mas a
febre é um sintoma e não uma doença.
4. Só Lucas, com o seu olhar de médico, destacou que ela estava com febre
alta (Lc 4.38–39). A febre é um sinal de que o sistema imunológico está
trabalhando para combater uma doença. Embora a febre alta pudesse indicar
uma inflamação ou infecção e a reação do corpo contra algum mal que lhe
atacava, a cura, nessa ocasião, demonstrou a importância que Jesus dava a
todos os necessitados.
5. Os que estavam na casa, talvez parentes e amigos, intercederam por ela
diante de Jesus, demonstrando que era uma senhora querida.
6. Conforme Lucas, Jesus dirigiu-se a febre e esta a deixou. Marcos e Mateus
foram mais específicos. Eles nos mostram que Jesus a tomou pelas mãos e
assim houve a cura, houve o restabelecimento da saúde.
7. E, depois de curada, a sogra de Pedro ficou tão bem que teve disposição
para servi-los. O relato desse detalhe, dessa reação de agradecimento,
certamente refletiu a intenção de Marcos em exemplificar a reação apropriada
de todos que foram “tocados” por Jesus.
Creio que a grande lição que temos que aprender aqui é que Jesus se interessa
por todos os tipos de problemas. Desde os maiores, como a libertação de um
endemoninhado, até os mais simples, como a febre alta de uma senhora. Você
tem se apropriado de todas as bênçãos de Jesus para todas as suas necessidades?
Você tem tido disposição de servir aos outros depois que Jesus transformou a sua
vida?
Jesus realiza muitas curas e libertações e pede segredo
Mc 1.32–34
Nesses versos encontramos Jesus curando outros doentes e libertando muitos
endemoninhados. Vamos fazer sete observações relativas a esses versos.
1. Estes versos (juntamente com 1.39; 3.11–12; 4.33–34; 6.6,56), mostram
resumos da atividade ministerial de Jesus. Esses resumos editoriais
apresentam Jesus pregando, ensinando, curando e expulsando os espíritos
maus. Ao mesmo tempo em que são resumos editoriais, introduzem novos
aspectos do ministério de Jesus. São transições bem marcantes dentro desse
livro, destacando a habilidade do seu autor.
2. A frase À tarde, ao cair do sol (v. 32), deve ser compreendida como o
final do sábado. Provavelmente os populares interessados na cura das doenças
dos seus parentes e amigos, não querendo infringir as leis do sábado,
esperaram pelo horário em que não havia mais a proibição. Portanto, com a
possibilidade de se fazerem esforços ao carregar os necessitados, levaram
muitos até Jesus, aquele que veio para servir.
3. É importante destacarmos que Marcos dedica especial atenção nesses
capítulos iniciais à expulsão dos demônios, mostrando o poder de Jesus
contra Satanás, conforme João disse: Para isto se manifestou o Filho de
Deus: para destruir as obras do diabo (1Jo 3.8).
4. O fato de Marcos citar que toda a cidade estava à porta da casa, significa
que as notícias sobre Jesus, o ensino e a expulsão do demônio na sinagoga e a
cura da sogra de Pedro já tinham se espalhado, fazendo muitos necessitados
procurarem a ajuda que só Jesus poderia dar-lhes.
5. O início do verso 34 demonstra a compaixão e o amor de Jesus diante das
necessidades humanas. Marcos é enfático em dizer que não havia doenças
que Jesus não pudesse curar. Jesus tudo pode. Você crê nisso? Essa é a
verdade ainda hoje!
6. Na parte final do verso 34 Marcos destacou que Jesus expulsou muitos
demônios, libertando os oprimidos. Essa ênfase se vê por todo o evangelho.
7. E ainda no verso 34, a proibição de Jesus para que os demônios não o
revelassem, pois sabiam ser Ele o Cristo, conforme já destacamos, deve ser
bem compreendida. Os estudiosos chamam tal procedimento de “o segredo
messiânico”. Ele é encontrado principalmente em Marcos e significava que
Jesus não queria e não precisava do testemunho dos demônios a seu favor. O
“segredo messiânico” imposto por Jesus aos demônios tinha uma razão de
ser:
Jesus expulsou muitos demônios, mas não permitiu que eles falassem. Anteriormente (v. 25),
ordenara a um demônio que se calasse. Os gritos na sinagoga, sem dúvida, atrapalharam a reunião.
Mas, agora, Marcos afirma especificamente que esta ordem de silêncio tinha a ver com a identidade
de Jesus. Os demônios sabiam quem ele era e tentavam usar essa informação para destruí-lo… Ele
desejava que a sua verdadeira identidade permanecesse oculta, até o momento apropriado
(MULHOLLAND, 2008, p. 50).

Mas para os curados, a proibição tinha o objetivo de não espalharem a notícia


de que Jesus era simplesmente um curandeiro, um fazedor de milagres. Ele tinha
verdades a ensinar e queria que o povo e as autoridades soubessem da presença
do reino de Deus entre eles. Jesus revelou-se em particular apenas aos
discípulos, e declarou-lhes a necessidade de sofrer, morrer, mas também de
ressuscitar. Ao fazer isso, estava mostrando que não se submetia ao conceito
popular que o povo e os religiosos tinham a respeito do Messias: um grande líder
guerreiro, um libertador político que tiraria Israel de sob o domínio romano,
colocando-o livre entre as nações. Não! Jesus era um Messias diferente. Um
Messias que tinha vindo para salvar, mas não politicamente. Jesus veio para
salvar o homem do seu pecado. Jesus veio para servir demonstrando o amor, a
compaixão divina para com a humanidade. Você tem experimentado o amor, a
compaixão e o poder de Jesus em sua vida?
Jesus se retira para orar e prossegue em pregar e curar
Mc 1.35–39
Depois do resumo editorial, nos versos 35 a 39, encontramos Jesus
desenvolvendo uma atividade bem distinta. Aqui encontramos Jesus orando. Não
precisamos estranhar, pois no relato dos evangelhos encontramos Jesus
desenvolvendo essa prática em diversas ocasiões. Vamos analisar esse parágrafo
através de sete observações.
1. Mesmo depois de um dia intenso de trabalho, Jesus levantou-se de
madrugada e foi orar. Aqui temos um dos segredos de Jesus. Mesmo sendo
Deus encarnado, Ele sempre dialogou com o Pai. Oração é exatamente isso:
falar com Deus e ouvir a sua voz.
2. Para estar sempre cheio e dirigido pelo Espírito Santo, Jesus priorizou a
oração em seu ministério, mostrando-nos a importância dessa atividade que,
mais do que uma prática religiosa, demonstra a nossa intimidade com Deus.
3. Agora, atente para uma aplicação. Quanto tempo você dedica a oração
diariamente? Não estou me referindo a sua leitura bíblica, às músicas que
você ouve no carro ou no aparelho de som da sua casa ou trabalho. Estou
perguntando mesmo sobre o seu tempo em oração, conversando com Deus e
muitas vezes ficando em silêncio para ouvir a sua voz.
4. O segredo de grandes homens de Deus é exatamente a oração. Quanto mais
difícil a tarefa, mais tempo deve ser gasto em oração. Jesus priorizava a
oração. Jesus foi exemplo para nós.
5. Um outro detalhe que se destaca nestes versos, a partir do verso 36, é que
Pedro e os outros discípulos, depois de o procurarem bastante, quando o
encontraram relataram que mais pessoas estavam a sua procura e dos
benefícios que poderia lhes dar.
6. Mas Jesus ensinou-lhes que tinha consciência clara do seu ministério, que
não se restringia somente a feitos miraculosos e espetaculares. Jesus mostrou
que a proclamação do reino de Deus era uma tarefa importantíssima e, além
de ser sustentada pela oração, tinha que divulgá-la por toda a Galileia.
7. Assim, ao mesmo tempo, Marcos enfatiza que, com a capacitação obtida
através da oração, Jesus continuou desenvolvendo o seu ministério, pregando
a Palavra e livrando os cativos de Satanás (v. 39). A expulsão dos demônios,
como dissemos anteriormente, era uma prova da divindade e do poder do
Senhor Jesus.
Você reconhece o valor da oração em sua vida? É através da oração, do
diálogo com Deus que podemos abrir o nosso coração, confessar nossos pecados
e ficar preparados para sermos usados por Deus, conforme o seu querer.
Jesus cura um leproso e insiste no segredo messiânico
Mc 1.40–45
Chegamos ao final deste primeiro capítulo. Neste trecho encontramos o relato de
mais uma cura realizada por Jesus, o servo do Senhor. Conforme Marcos, Jesus
curou um leproso e a cura e a recuperação desse doente envolvia diversos
detalhes. Mas devemos observar também que Marcos sempre colocava Jesus em
ação. Ele foi mesclando o ministério de Jesus, mostrando o seu ensino, a sua
pregação e o seu poder atingindo o homem todo. O evangelho é assim. As
manifestações divinas atingem o homem na sua parte espiritual, física,
emocional e racional. Mas para facilitar o nosso aprendizado, vamos dividir
estes versos em sete porções.
1. A Bíblia nos mostra três períodos em que as manifestações do poder de
Deus se tornaram evidentes. O primeiro período foi no tempo de Moisés. O
segundo foi no tempo de Elias. E depois, durante o ministério de Jesus e dos
apóstolos. Em todos esses períodos ficou visível o poder de Deus alterando as
condições humanas para que os sofrimentos humanos fossem aliviados e o
seu nome glorificado.
2. A lepra era uma doença discriminatória. Havia leis severas que deveriam
ser cumpridas. A pessoa com lepra era considerada impura (Lv 13–14) e
afastada do convívio da sociedade.
3. A lepra não era incurável, como podemos ver no livro de Levítico. Mesmo
assim, quase sempre era a doença que mais matava o seu portador.
4. O leproso, vendo a Jesus, aproximou-se, rogando-lhe de joelhos: se
quiseres, podes purificar-me (v. 40), demonstrando objetividade no seu
pedido. E, diferentemente dos dias de hoje em que se reivindica, se determina
e se exige direitos, o leproso, ao mesmo tempo, mesmo diante da sua visível
necessidade, mostrou que se submetia a vontade de Jesus. Em relação aos
nossos pedidos a Deus, vale a pena seguirmos o princípio colocado por João
em sua primeira carta (veja 1Jo 5.14–15).
5. Marcos, demonstrando os sentimentos do Servo Sofredor, relata que Jesus,
profundamente compadecido, estendeu a mão, tocou- o, e disse-lhe: Quero,
fica limpo! (v. 41). Jesus, tocando o leproso, demonstrou que valorizava mais
a integralidade do ser humano do que as minúcias da lei (que proibia qualquer
contato com o impuro para não correr o risco de também se tornar impuro).
Jesus o tocou e assim o curou.
6. Nos versos 43 a 44, Jesus advertiu-o para que não contasse nada a
ninguém, mas que fizesse o que a lei exigia, isto é, apresentar-se ao sacerdote
e oferecer sacrifício em gratidão a Deus para servir de testemunho ao povo.
Novamente vemos a ênfase de Marcos em mostrar Jesus procurando o
“segredo messiânico”. Jesus queria ser revelado completamente no tempo
certo.
7. E o verso final (v. 45), nos mostra que o homem que fora curado não
obedeceu a Jesus e, pelo contrário, divulgou o ocorrido. Assim, a fama de
Jesus cresceu mais ainda, de modo que Ele não podia mais entrar em qualquer
cidade porque grande multidão o seguia. Jesus só podia transitar pelos
caminhos e pelos lugares mais desertos. Mas essa popularidade crescente de
Jesus começaria a despertar ciúme e oposição por parte dos líderes religiosos
de Israel. Diante disso, qual a sua opinião para a atitude do ex-leproso? Você
obedeceria a Jesus ou adoraria ao Senhor, divulgando a bênção que tinha
recebido? É uma resposta difícil, não é mesmo?
Embora a divulgação da cura fizesse aumentar a fama e a popularidade de
Jesus, e criasse ainda mais admiração por parte do povo, o que percebemos é que
esse ex-leproso deu mais atenção ao resultado físico que tinha obtido, em vez de
dar atenção às palavras de Jesus. Ainda hoje muitos procuram mais as bênçãos
que podem obter de Jesus do que as palavras que Ele tem a dizer. O que você
tem procurado em Jesus: bênçãos imediatas para essa vida, ou ensinos e palavras
que o conduzem à vida eterna?
Marcos 2 - O servo quebra as tradições
Come com os pecadores e cura num sábado
O capítulo 2 do Evangelho de Marcos é de fundamental importância no início do
livro, pois nele o evangelista continua demonstrando as atividades básicas de
Jesus em seu ministério. Jesus cura, convoca para o discipulado, se relaciona
com todo tipo de pessoas, interpreta corretamente alguns ritos religiosos e se
coloca totalmente contrário a tradição vazia e fria, que fazia os homens se
sentirem seguros por cumprirem certas práticas. O estudo desse capítulo nos
proporciona essa síntese do ministério de Jesus.
Mas para seguirmos com segurança, é necessário nos sustentarmos naquilo
que já aprendemos no capítulo 1. Se imaginarmos que estamos subindo uma
escada, quais os pontos de apoio que temos para seguir adiante?
No capítulo primeiro encontramos Jesus curando, ensinando e orando.
Dissemos também que Marcos destacou o segredo messiânico, que era o desejo
de Jesus de manter-se anônimo, principalmente por causa do conceito
inadequado que a sociedade israelita tinha sobre a vinda desse prometido divino.
O último episódio que estudamos no capítulo anterior foi a cura de um
leproso para o qual Jesus pediu segredo, mas não foi obedecido. Como
mencionamos anteriormente, Jesus não queria ser conhecido como um
curandeiro ou um fazedor de milagres, porque não queria e não precisava do
testemunho externo a seu favor e, porque o seu tempo não tinha chegado.
Ao desejar manter esse segredo, Jesus estava mostrando que não se submetia
ao conceito popular que o povo e os religiosos tinham a respeito do Messias: um
grande líder guerreiro, um libertador político que tiraria Israel de sob o domínio
romano, colocando-o livre entre as nações. Não! Jesus veio cumprir um papel
diferente. Jesus era o Messias que tinha vindo para salvar, mas não
politicamente. Jesus veio salvar e restaurar o homem de modo completo. Veio
para demonstrar o amor e a compaixão divina para com a humanidade, para
mudar a vida humana nas áreas racional, psicológica, física e espiritual.
Portanto, o ex-leproso, cheio de alegria, não deu atenção à severa repreensão
de Jesus. E apesar de ser boa a sua intenção, a sua atitude, querendo honrar a
Jesus, desejando exaltar o feito, ele o desobedeceu. A sua desobediência trouxe
algumas dificuldades, pois a fama de Jesus cresceu rapidamente e não podia
mais entrar nas cidades sem causar grande alvoroço. É isso que acontece quando
desobedecemos a Deus mesmo sendo boa a nossa intenção. Na verdade, não
basta termos boa intenção. É necessário praticar o que é bom e, ainda mais,
aquilo que é bom deve ser feito de acordo com a vontade de Deus.
Jesus não estava interessado em impressionar o povo com milagres. Ele não
quis que as curas e os milagres fossem as características principais do seu
ministério. Não queria que este ex-leproso e outros que foram igualmente
restaurados milagrosamente saíssem a fazer publicidade e divulgação. Por quê?
Porque Jesus veio para realizar um ministério muito mais abrangente. A
principal razão da vinda de Jesus a este mundo foi morrer numa cruz pelos
pecados do mundo. Os milagres poderiam prejudicar a visão dos homens da
verdadeira razão de sua vinda.
Assim também, hoje em dia, não devemos colocar ênfase nas curas ou nos
milagres, mas na mensagem que transforma o ser humano por completo. Os
milagres podem curar apenas o físico, mas só o Cristo da cruz pode mudar a
maneira de alguém pensar, pode desfazer as amarras psíquicas que prendem a
muitos. Só o sangue derramado na cruz tem capacidade de libertar o ser humano
dos pecados, tornando-o novamente amigo de Deus. A obediência à ordem de
Jesus é mais importante do que as nossas melhores intenções. Ele sabe o que é
melhor. Sendo Ele sábio, devemos simplesmente obedecê-lo.
Tendo essas verdades como base, podemos iniciar o estudo do capítulo 2,
onde veremos mais algumas ações de Jesus que demonstram a sua divindade e o
seu cuidado em servir os necessitados. Podemos dividi-lo em cinco partes:
Parte 1 – Jesus cura um homem amado por seus amigos (v. 1–12)
Parte 2 – Jesus continua chamando discípulos (v. 13–14)
Parte 3 – Jesus rompe com os padrões sociais discriminatórios (v. 15–17)
Parte 4 – Jesus ensina sobre os verdadeiros espirituais (v. 8–22)
Parte 5 – Jesus quebra o tradicionalismo vazio (v. 23–28)
Jesus cura um homem amado por seus amigos
Mc 2.1–12
Nesses versos encontramos o relato de uma cura que foi baseada na amizade de
cinco homens que desenvolviam uma grande comunhão. Vamos estudar a cura
de um paralítico, em que Jesus comprova a sua divindade ao perdoar os seus
pecados. Precisamos fazer dez considerações a respeito desse episódio.
1. Embora o texto anterior nos diga que Jesus não podia entrar nas cidades,
vemos no verso primeiro que Jesus estava novamente em Cafarnaum. Muito
provavelmente esta era a casa de Pedro, pois como dissemos, depois de ser
rejeitado em Nazaré, Ele escolheu Cafarnaum para ser o seu “quartel
general”, o centro de suas atividades.
2. A notícia da sua chegada a Cafarnaum se espalhou e logo havia muita
gente reunida para ouvi-lo, bem como para ser curada. Na verdade, esse é o
grande desafio que se coloca diante de todos nós. Por que queremos Jesus?
Por causa do que Ele pode fazer por nós ou porque queremos ouvir suas
palavras, que são palavras de vida eterna?
3. Marcos destacou novamente essa característica marcante do ministério de
Jesus. Conforme o verso 2, Jesus lhes anunciava a palavra, certamente
proclamando o reino dos céus, isto é, o domínio de Deus no coração do
homem. Afinal foi esse o seu papel como Messias prometido, instaurar o
reino de Deus, que é um reino espiritual que atualmente se expressa na vida
daqueles que aceitam o senhorio de Cristo.
4. Destaca-se nos versos 3 e 4 a ação inusitada, persistente e corajosa de um
grupo de quatro amigos em favor de outro. Demonstrando amor, amizade e
principalmente fé na mudança da situação do amigo, eles chamaram a atenção
de Jesus. Demonstraram uma fé prática, a operosidade da fé! Como disse
Pohl (1998, p. 101): “A fé é uma súplica, que pode ser sem palavras, mas
jamais sem ação, firmada na confiança, na disposição poderosa de Deus de
ajudar”. Sua fé é assim? Ela faz você agir? Como disse Tiago: Assim,
também a fé, se não tiver obras, por si só está morta. Mas alguém dirá: Tu
tens fé, e eu tenho obras; mostra-me essa tua fé sem obras, e eu, com as
obras, te mostrarei a minha fé (Tg 2.17–18). Portanto, como a multidão não
lhes deu espaço e oportunidade para se aproximarem de Jesus, eles foram
pelo caminho mais difícil. Subiram no eirado, isto é, no teto, fizeram uma
abertura bem em cima de onde ele estava e baixaram o amigo paralítico até
junto dele.
5. O verso 5 é muito claro. Jesus viu a fé dos quatro amigos demonstrada na
atitude corajosa que tiveram. Certamente viu também a fé do paralítico que
concordava com aquela performance. É surpreendentemente que a primeira
atitude de Jesus não foi curar o paralítico fisicamente. Na época havia o
conceito de que as doenças eram causadas pelos pecados (Jo 9.2), e Jesus
disse-lhe: Filho, os teus pecados estão perdoados (v. 5).
O fato de Jesus mencionar em primeiro lugar os pecados não deve ter surpreendido os quatro
carregadores nem os professores da lei do v. 6. Para os judeus, o sofrimento e a culpa estavam
estreitamente ligados, e as doenças eram consideradas castigo para os pecados… para eles os
doentes eram pessoas com as quais Deus estava especialmente irado (POHL, 1998, p.101).

6. Jesus queria impactar aquele auditório não “apenas” com mais uma cura
física. Ele quis que percebessem a revelação progressiva da sua divindade. A
frase do verso 5, Filho, os teus pecados estão perdoados, é significativa. A
expressão “filho” indicava a acolhida de Jesus para com aquele que estava
sofrendo. A expressão “os teus pecados” indica que Jesus estava preocupado
com a situação concreta do relacionamento entre aquele homem e Deus. Jesus
não tratou dos traumas, das angústias ou do sentimento de culpa daquele
paralítico. Jesus tratou do maior problema do ser humano, o problema que
nos separa de Deus: o pecado. A expressão “estão perdoados” mostra a
divindade, a compaixão, a misericórdia e o amor de Jesus e,
consequentemente, de Deus! Ao proclamar o perdão para aquele necessitado,
Jesus estava anunciando parabolicamente que um novo tempo tinha chegado.
Era a “invasão” da divindade na história humana, era a intervenção de Deus,
enviando seu Filho para o perdão dos nossos pecados! Jesus, com essas
palavras, declarava a sua divindade!
7. Nos versos 6 e 7, os religiosos criticaram a atitude de Jesus, negando-lhe a
possibilidade de usar tais palavras. Eles sabiam que só Deus tinha o poder de
perdoar os pecados. Para eles, nem o Messias tão ansiosamente aguardado
tinha esse poder, porque o viam apenas como um líder político e bélico.
Diante disso, consideraram as palavras de Jesus uma blasfêmia. Mas por quê?
Porque só Deus podia perdoar os pecados, e nisso estavam certos. Mas
também porque não podiam supor que o Messias era um ser divino e
espiritual e não um homem poderoso e político e, portanto, com total
condição para perdoar os pecados.
8. Ao perceber o comentário dos escribas, Jesus confrontou-os com um
argumento simples e poderoso, conforme o verso 9: Qual é mais fácil?. Era
mais fácil perdoar os pecados ou curar o físico? Na verdade, para os
religiosos, as duas ações seriam difíceis e impossíveis. Mas para o Messias, o
próprio Deus encarnado, seria possível não só curar fisicamente, mas
principalmente salvar e curar espiritualmente.
9. E mais uma vez Marcos destaca que Jesus aproveitou a oportunidade para
ensinar. Conforme o verso 10, Jesus ensinou aos cinco amigos, ao povo que o
escutava e aos líderes judaicos que Ele, o Filho do Homem (pois era assim
que Ele se autodenominava), exerceria o seu messianato de modo espiritual e
não como um líder político.
10. O desfecho dessa narrativa se encontra nos versos 11 e 12, que nos dão
conta que Jesus também curou o homem fisicamente e provou o seu poder,
ordenando que se levantasse e carregasse o seu leito, uma espécie de maca, e
fosse para casa. Ele levantou-se e obedeceu. E o resultado foi a glorificação
de Deus. Jamais vimos coisa assim!
Uma das lições que se destaca nessa passagem é a dureza do coração dos
líderes religiosos. A crítica que fizeram a Jesus é que Ele agia fora do padrão das
estruturas organizadas. Jesus confrontava essas estruturas não porque queria
chamar a atenção para si, mas porque as estruturas, as instituições, em vez de
ajudar, frustram e aprofundam mais o vazio do coração humano. Mas, sobretudo,
Jesus quis demonstrar que Ele ama mais as pessoas do que as estruturas. Outra
lição que devemos aplicar em nossas vidas é sobre a fé. Jesus valorizou a fé dos
amigos do paralítico. Mas a salvação dele só aconteceu porque Jesus também viu
em seu interior a sua fé pessoal. Muitas vezes agimos como aqueles religiosos e
nos esquecemos de que o que Deus quer de nós é que sejamos um povo
confiante, um povo com uma fé prática. O problema é que nos esquecemos de
que só há perdão, só há salvação, quanto pessoalmente cremos que Jesus pode
nos transformar.
O que fazer com essas lições? Elas devem ser aplicadas em nosso dia a dia.
Confiemos em Deus e peçamos a sua capacitação para agirmos com fé.
Jesus continua chamando discípulos
Mc 2.13–14
O segundo episódio relatado por Marcos trata-se da chamada, da convocação de
Levi, ou Mateus, filho de Alfeu, para o discipulado. Vamos considerá-lo fazendo
algumas observações.
1. No verso 13, Marcos de novo destaca que Jesus ensinava o povo,
demonstrando ser esse aspecto parte fundamental do seu ministério. Portanto,
o ensino, a proclamação e a pregação também devem ser parte fundamental
do nosso ministério individual e coletivo como igreja.
2. Outro aspecto fundamental do ministério de Jesus, sem dúvida, era as
convocações, as chamadas, os convites que estendia para que pessoas se
tornassem seguidoras dele. Assim como convidou, ainda continua, através de
nós, seus discípulos, convidando a todos para que aceitem o seu gracioso
convite.
3. Embora tenhamos comentado sobre a sua chamada para o discipulado
quando estudamos o Evangelho de Mateus, é ainda necessário destacar mais
uma vez como Jesus confrontou-se com a tradição que, em vez de valorizar,
expunha e desprezava as pessoas.
4. Mateus era o nome que os romanos, seus senhores, tinham lhe dado para
desempenhar a sua função. Levi era o nome judaico. Portanto,
provavelmente, Mateus era um homem da tribo de Levi que poderia estar
trabalhando no templo. Não nos é possível imaginar as razões dessa condição,
mas pelas circunstâncias da vida ele estava exercendo uma profissão bem
diferente daquela para a qual a sua tribo tinha sido designada.
5. Nesse aspecto, outro detalhe que merece ser destacado é a própria maneira
como Mateus, no seu evangelho, refere-se a si mesmo. Em Mateus 9.9–13 ele
se chama de Mateus. No relato de Marcos e no de Lucas, ele é chamado de
Levi (Lc 5.27,29). Essa auto identificação com seu nome romano talvez possa
demonstrar que desejava se esquecer da possibilidade de estar exercendo uma
função dentro do judaísmo e, por isso, quando Jesus, um mestre judeu, o
chamou, imediatamente deixou tudo e o seguiu.
6. Como era judeu, porém cobrador de impostos trabalhando para os
romanos, Mateus era desprezado e até discriminado.
Ele era judeu, porém sua profissão não era muito judaica, considerando que ele arrecadava impostos
para o tão odiado governo romano! Tais homens nem sempre eram reconhecidos por sua
honestidade; para dizer a verdade, eram tratados com menosprezo, como prostitutas, como a ralé da
sociedade (MACDONALD, 2008, p. 112).

Mas nesse episódio, o que surpreende é que Jesus, já sendo considerado um


mestre, ao chamar um publicano para ser seu seguidor, seu discípulo, afrontou
de modo muito objetivo a liderança religiosa dos judeus.
7. Os publicanos eram considerados pecadores pelos religiosos, isto é, judeus
que não obedeciam as leis e, por isso, juntamente com os gentios, não podiam
frequentar as sinagogas. Jesus, então, rompeu as barreiras da discriminação e
convocou Mateus para o discipulado, convite este que foi aceito
imediatamente!
O mesmo convite Jesus faz ainda hoje para todos nós. Basta crer e recebê-lo
para experimentarmos mudanças em nossas vidas. Quando ouvimos o convite de
Jesus, e o atendemos instantânea e incondicionalmente como Mateus,
experimentamos a alegria de ter Jesus em nossa casa e de compartilhá-lo com
nossos parentes e amigos.
Jesus rompe com os padrões sociais discriminatórios
Mc 2.15–17
No terceiro episódio deste texto encontramos Jesus num jantar com muitos
publicanos e aqueles a quem a sociedade chamava de “pecadores”, isto é,
aqueles que, segundo os líderes religiosos, não cumpriam os detalhes da lei.
Vamos considerar essa narrativa sob alguns pontos de vista.
1. Destaca-se logo de início que este jantar foi uma consequência tanto da
convocação de Jesus como da aceitação de Mateus. Assim, Jesus não só
quebrou paradigmas ao convidar Mateus, mas quebrou barreiras ao aceitar o
convite de Mateus para jantar com ele e com os seus amigos, publicanos e
“pecadores”.
2. Jesus tinha claro na mente e no coração que sua missão era bem diferente
daquela com que sonhava o povo e as autoridades religiosas. Jesus não veio
para levantar um exército político. Veio para constituir um novo povo de
Deus que proclamaria as boas novas do evangelho, a realidade e as bênçãos
do reino dos céus para todas as nações e pessoas.
3. Publicanos, pecadores, prostitutas, pobres, leprosos, crianças e mulheres
eram discriminados naqueles dias e alvo de Jesus. E ainda hoje o convite dele
é exatamente para aqueles que se sentem cansados, sobrecarregados e aflitos
com suas próprias vidas e ainda têm contra si a rejeição, o desprezo e o
desamor da sociedade. E, muitas vezes, essa rejeição passa pela própria igreja
que tem se tornado hipócrita e desumana para com os necessitados, assim
como faziam os religiosos daqueles dias.
4. Jesus, diante do comentário e do questionamento irônico dos fariseus e
escribas feito aos seus discípulos, percebeu que estava sendo motivo de
zombaria e pilheria. Em outras palavras, os líderes religiosos perguntaram:
será que Ele não sabe escolher discípulos e companhias? Nós também
precisamos cuidar para não discriminar e não conceder oportunidade de
mudança de vida para todos os que anseiam por salvação.
5. Jesus, conforme o verso 17, respondeu-lhes objetivamente: Os sãos não
precisam de médico, e sim os doentes; não vim chamar justos, e sim
pecadores. E Lucas acrescenta: ao arrependimento (Lc 5.32).
Aqui Jesus está usando uma metáfora, e lança mão da antiga imagem que ligava a doença ao
pecado. Essa imagem havia sido bem estabelecida pelos profetas (conf. Is 1), pois muitas vezes as
perturbações físicas tomavam o lugar das enfermidades espirituais. Mas a observação de Cristo de
que os sãos não precisam de médicos não implica que os “mestres da Lei que eram fariseus” (2.16)
fossem espiritualmente sadios, mas, significava que haviam deixado de reconhecer sua verdadeira
condição… Os religiosos, que pensam estar muito bem, são os mais difíceis de alcançar com o
Evangelho (RICHARDS, 2007, p. 100).

Sim! Essa é a mensagem do evangelho! As boas novas são para os que se


reconhecem pecadores e necessitados da graça de Deus! Quais são os
discriminados dos nossos dias? É para esses que Jesus veio. É para esses que
a igreja deve pregar. Os fariseus e os escribas se viam como muito corretos,
mas eram pecadores profundamente necessitados. Eles se achavam tão bons
aos seus próprios olhos que não percebiam a necessidade que tinham de
Jesus. Esses religiosos menosprezavam os seguidores de Jesus.
6. Esses líderes religiosos estavam tão seguros de si mesmos que
consideravam pecadores tanto os que cometiam furto, adultério e outras
práticas proibidas pela lei, quanto os que não lavavam as mãos e os utensílios
antes das refeições. Na verdade, para eles, pecadores eram todos os que não
aceitavam a sua doutrina. Por isso não se davam com os saduceus, herodianos
e tantos outros das diversas seitas judaicas. Segundo a perspectiva que
tinham, somente eles eram os corretos seguidores da lei de Moisés.
7. Quando Jesus disse-lhes que não tinha vindo para chamar os justos, isto é,
aqueles que se consideravam corretos e aceitos diante de Deus; quando disse-
lhes que veio chamar os pecadores ao arrependimento (conforme ressaltou
Lucas), estabeleceu também a maneira pela qual a igreja, formada pelos seus
discípulos, pode e deve agir. Devemos aceitar os excluídos e discriminados da
sociedade. A igreja é o abrigo dos desamparados. O corpo de Cristo é o
organismo que aceita os fracos e doentes. Mas isso só deve acontecer com
aqueles que se arrependem dos seus maus caminhos e têm disposição de
mudar de vida. É importante lembrarmos Provérbios 28.13: O que encobre
as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa
alcançará misericórdia. Sim! Essa é a condição para ser discípulo de Jesus.
O arrependimento pressupõe uma mudança radical de vida!
Creio que a sua oração deve ser exatamente essa: que você reconheça sempre
a necessidade da graça de Deus sobre a sua vida. Seja você quem for, exerça a
função que exercer, tenha o que tiver, saiba que o evangelho é também para
você. Ele é para todos os que, arrependidos, mudam de vida e creem em Jesus
Cristo.
Jesus ensina sobre os verdadeiros espirituais
Mc 2.8–22
No quarto episódio desse capítulo encontramos Jesus ensinando sobre o nosso
relacionamento com a lei. Sendo essa uma das prioridades do seu ministério, é
interessante percebermos como Jesus ensinava. Ele não era um mestre do estilo
formal e distante dos aprendizes. Era um professor que aproveitava as diversas
situações do dia a dia para ensinar e, inclusive, aceitava as perguntas dos seus
interlocutores para instruí-los. E foi exatamente numa ocasião dessas que Jesus
mais uma vez ensinou. Vamos considerar esse acontecimento através de sete
observações.
1. A convivência de Jesus com Mateus e com os seus amigos escandalizou
tremendamente os religiosos da época. Eles esperaram uma oportunidade para
atacar Jesus de modo direto, e isso logo aconteceu.
2. Embora a lei mosaica exigisse apenas um jejum anual, o jejum do “dia da
expiação” (Lv 16.29), nos dias de Jesus a obediência à lei era imposta e não
fluía de um desejo de agradar a Deus. A prática do jejum, duas vezes por
semana (às segundas e quintas-feiras), tinha se tornado obrigatória e um sinal
de “espiritualidade” (Lc 18.12).
3. Os discípulos de João e os discípulos dos fariseus jejuavam, obedecendo às
regras. Diante dessa prática e de um comportamento totalmente adverso de
Jesus e seus discípulos, alguns questionaram Jesus por que os seus discípulos
não jejuavam. O desrespeito às tradições era algo impensável!
4. Jesus lhes respondeu com uma pequena parábola, conforme os versos 19 e
20, dizendo que numa festa de casamento, numa festa de celebração, os
convidados do noivo não podiam jejuar enquanto o noivo estivesse presente,
mas na sua ausência teriam oportunidade para jejuar.
5. Em outras palavras, Jesus respondeu de modo direto que não viera para
salientar as formas exteriores da velha religião, ou da antiga dispensação.
Conforme Peterson (1989, p. 53), Ele veio para inaugurar uma nova ordem
que cumpriria o que a antiga ordem só apontava como sombra, como
símbolos. Para Jesus, o jejum não era apenas um rito exigido pela lei. Era um
assunto do coração. O jejum deveria ser o resultado natural da vida de oração
e da comunhão com Deus.
6. Jesus quis mostrar aos seus interlocutores que o jejum não era
simplesmente um ritual exigido pela lei ou pela tradição. Aquela não era a
época adequada para jejuar. Era época de festa e de alegria, porque o noivo
estava presente! Para todos nós, cristãos, o jejum não deve ser tratado
somente como abstinência de alimentos ou qualquer outra coisa. Naqueles
dias, o jejum era assunto do interior, a expressão da intimidade com Deus, e
dessa mesma maneira devemos encarar essa prática nos dias de hoje.
7. E ainda nos versos 21 e 22 Jesus enfatiza essa nova compreensão através
de mais duas figuras: a do remendo novo e a do vinho novo. A vinda da nova
época, a vinda do reino de Deus e seu Rei, o Messias, exigiam uma mudança
de mentalidade. Seria insensatez continuar com os velhos rituais cheios de
religiosidade, sem sentido espiritual, num novo tempo, quando Deus está
procurando verdadeiros adoradores que o adorem em espírito e em verdade
(Jo 4.24). Jesus estava mostrando que era impossível tentar misturar as velhas
práticas tradicionais e obrigatórias com a maneira nova de nos relacionarmos
com Deus, com liberdade, graça e ousadia (Hb 4.16; 10.19–22).
O evangelho exige de quem crê uma nova atitude interior. Em vez de temor,
medo, obrigatoriedade e práticas exteriores, o evangelho nos concede amizade,
paz e liberdade e, pelo Espírito Santo, práticas que brotam de um interior
transformado. Que você possa experimentar a graça, a misericórdia e o amor
infinito de Deus e assim desenvolver a intimidade que Ele quer ter com cada um
de nós.
Jesus quebra o tradicionalismo vazio
Mc 2.23–28
Chegamos a parte final deste segundo capítulo, e aqui encontramos Jesus
demonstrando mais uma vez a nova maneira de nos relacionarmos com a lei.
Depois de ser criticado por permitir que seus discípulos colhessem espigas no
sábado, prática que era proibida pela lei, Jesus respondeu aos fariseus, seus
acusadores, com uma ilustração tirada das próprias Escrituras. Vamos às nossas
considerações.
1. O fato de Jesus chamar a atenção dos fariseus, que se entendiam como fiéis
seguidores da lei, para uma passagem das Escrituras, sem dúvida foi uma
chamada de atenção para o fato de que eles podiam até ter memorizado várias
passagens, mas lhes faltava a devida interpretação.
2. De fato, os líderes judeus estavam certos em estranhar a atitude dos
discípulos de Jesus. A lei de Deus dizia que as colheitas não deviam ser feitas
no sábado (Êx 34.21). O objetivo dessa lei era duplo: reprimir a ganância dos
lavradores que colocavam os bens materiais à frente da adoração do próprio
Deus, que os abençoava com o fruto da terra e, impedir que esses lavradores
gananciosos tratassem com desumanidade os seus trabalhadores, aqueles que
faziam a colheita. A questão era que os fariseus se fixaram na letra da lei.
3. Jesus respondeu aos fariseus citando uma passagem claramente registrada
no primeiro livro de Samuel (1Sm 21.1–6). Naquele contexto, Davi estava
fugindo de Saul e, depois de ter-se despedido de Jônatas, foi até Nobe e
chegou ao sacerdote Aimeleque pedindo-lhe pão para si e para os seus
soldados. Depois de alguma relutância, o sacerdote deu a Davi os pães
consagrados, os pães da proposição. Ora, diante de uma extrema necessidade,
ao agirem assim, um sacerdote e um futuro rei de Israel demonstraram
flexibilidade e maturidade no entendimento das exigências da lei.
4. Ao citar esse acontecimento, Jesus deu a devida interpretação para o texto
de Samuel. Conforme Hendriksen (2003, p. 141), Jesus mostrou que se Davi
e o sacerdote Aimeleque agiram sem considerar as prescrições cerimoniais
quando enfrentaram uma situação de extrema necessidade, Ele e os seus
discípulos podiam agir da mesma forma, dando prioridade a necessidade do
ser humano.
5. O princípio que Jesus apresentou foi muito objetivo. Conforme o verso 27,
Ele disse: O sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem
por causa do sábado. O significado dessa expressão deve ser bem entendido
por todos nós. Jesus mostrou que o sábado, mesmo sendo considerado
sagrado, foi estabelecido para o benefício do ser humano e não como um
algoz que reprimia a liberdade e a responsabilidade. Em Marcos 3.4, que
consideraremos posteriormente, Jesus deixou implícito que o sábado era um
dia para se fazer o bem, portanto, buscar alimentar-se não feria o seu sentido.
Conforme Soares (2002, p. 140), para Jesus não havia sábado como dia de
descanso, dia de não fazer nada. Pelo contrário, conforme João assinalou,
para Jesus, se o seu pai trabalhava até àquela hora, Ele também trabalhava (Jo
5.17).
6. Os lideres religiosos dos judeus estavam tão envolvidos com os detalhes da
lei que perderam de vista os objetivos, o “espírito da lei”. Jesus mostrou que
Deus criara o sábado como um dia de adoração, de gratidão a Ele mesmo e de
descanso. Mas certamente não era intenção de Deus que esse descanso se
tornasse impeditivo para se fazer o bem.
7. E então Jesus completou com o verso 28: de sorte que o Filho do Homem
é senhor também do sábado. Jesus demonstrou que o dia dedicado a Deus
não poderia ser um fardo, mas um dia de descanso, para ser usado e
usufruído, de culto e de adoração sincera, feita em espírito e verdade. E
porque “Filho do Homem” é um título cristológico que demonstra a divindade
de Jesus, nessa frase Jesus se afirmou como divino. Jesus demonstrou que até
mesmo sobre o último dia, o de descanço, no qual nem houve criação (Gn
2.2–3), Ele era superior. Afinal, também foi o seu criador. Jesus é o Senhor
sobre tudo e todos! Um dia o senhorio de Jesus Cristo será reconhecido pela
natureza, seres angelicais e seres humanos. Todos confessarão para a glória de
Deus Pai que Jesus Cristo é Senhor (Fp 2.11)!
Hoje todos os dias devem ser dedicados ao Senhor. Não só o domingo, mas
também a segunda, a terça, a quarta, a quinta, a sexta e o sábado. Todos os dias
são do Senhor e devem ser usados para sua honra e glória! Que você
experimente isso em seu dia a dia. Que você reconheça o senhorio de Jesus em
sua vida e que, assim como Ele, priorize fazer o bem, sem olhar a quem!

Marcos 3 - O servo convoca homens


para uma tarefa divina
Designação dos apóstolos, oposição das autoridades e incompreensão
da família
Ao iniciarmos o estudo do terceiro capítulo de Marcos, devemos perceber que o
primeiro acontecimento que o evangelista registra é uma continuidade do tema
tratado no final do capítulo 2. O último episódio relatado é o incidente em que
Jesus foi criticado porque seus discípulos, famintos, colheram algumas espigas
no sábado.
Conforme o evangelista Mateus (Mt 12.1–8), Jesus ensinou o verdadeiro
significado do sábado através de dois argumentos. Primeiramente Jesus mostrou
no Antigo Testamento um episódio no qual Davi e seus soldados receberam e
comeram os pães da proposição do templo que eram exclusivos dos sacerdotes
(1Sm 21). Mas, mesmo assim, eles não foram condenados. No segundo
argumento Jesus mostrou que os sacerdotes do templo, ao trabalharem no
sábado, quebravam o mandamento de não desenvolver atividades naquele dia.
Eles também ficavam sem culpa, porque o serviço do templo era mais
importante do que a lei do sábado.
E ainda é possível perceber um terceiro argumento ao admitirmos que a
maneira como os fariseus interpretavam a lei era errada. Embora se orgulhassem
de serem conhecedores e cumpridores da lei, eles a interpretavam
incorretamente. Na verdade, o que a lei mosaica não permitia era colher espigas
no sábado para levá-las para casa. Mas a lei oferecia uma alternativa: quando
havia necessidade, quando era para se alimentar, aquela prática era permitida.
O texto de Deuteronômio 23.24–25 deixa essa verdade bem clara. A lei
justificava a atitude dos discípulos de Jesus. Eles não estavam usando foice nem
colhendo espigas para levá-las para casa. Eles colheram apenas para comer, e
isto era permitido pela lei. O problema dos líderes religiosos é que além de não
interpretarem corretamente, percebendo o “espírito da lei”, aparentemente
desconheciam todos os seus detalhes.
Ao final, o Senhor Jesus ensinou a grande verdade de que o sábado foi feito
para o homem, e não o homem para o sábado. Jesus demonstrou, como
mencionamos anteriormente, que o dia dedicado ao Senhor não poderia ser um
fardo a ser carregado, mas um dia de descanso, para ser usado e desfruído, de
culto e adoração sincera, feita em espírito e verdade. Todos os nossos dias devem
ser dedicados ao Senhor! Todos os dias são dias do Senhor e devem ser usados
para sua honra e glória!
Tendo essas verdades estabelecidas, agora vamos observar com atenção o
conteúdo do capítulo 3. Nos seus 35 versos encontramos cinco lições que, se
aplicadas, certamente nos ajudarão a viver de modo mais agradável ao Senhor.
Vamos analisá-las:
Parte 1 – Jesus cura novamente num sábado (v. 1–6)
Parte 2 – Jesus cura muitos à beira-mar (v. 7–12)
Parte 3 – Jesus escolhe seus doze apóstolos (v. 13–19)
Parte 4 – Jesus ensina sobre o pecado imperdoável (v. 20–30)
Parte 5 – Jesus e sua família (v. 31–35)
Jesus cura novamente num sábado
Mc 3.1–6
Na sequência da temática sobre como nos relacionarmos com a lei, e
especificamente como entender a lei do sábado, Marcos coloca mais um episódio
que teve ocasião num sábado. Aqui encontramos a narrativa da cura do homem
da mão ressequida. Vamos fazer sete considerações.
1. Esta é a última das cinco histórias do conflito entre Jesus e a liderança
judaica. Esses choques, que foram registrados no capítulo 2, terminam com a
narrativa desse episódio. Através deles Marcos nos mostra, logo no início do
seu evangelho, a intenção das autoridades religiosas. Havia uma clara
conspiração para matarem a Jesus.
2. Jesus não permitiu, e não permitiria, que as críticas constantes dos fariseus
embaraçassem o seu ministério. Entrando novamente num sábado na
sinagoga, encontrou um homem que tinha uma das mãos ressequida. A
liderança judaica queria acusá-lo. E, muito provavelmente, este homem da
mão ressequida foi posto ali pelos fariseus com a finalidade de acusarem
Jesus, caso Ele curasse o enfermo no dia “sagrado”. Os líderes judaicos
estavam observando para ver se Jesus curaria no sábado.
3. Jesus curava, pois isto também fazia parte do seu ministério. E eles sabiam
que se colocassem esse homem necessitado na sinagoga, no caminho de
Jesus, Ele o curaria. Para os fariseus, que estavam presos à letra da lei, não
era lícito desenvolver qualquer atividade no sábado. Eles exageraram,
tornando-se legalistas. Para eles, nem fazer o bem, ou especificamente curar
no dia de sábado, era lícito.
4. E o que Jesus fez quando viu aquele homem necessitado? Percebendo a
armadilha planejada, aproveitou a atenção de todos: E disse Jesus ao homem
da mão ressequida: Vem para o meio! (v. 3). Jesus percebeu a intenção
deles, chamou a atenção de todos e foi muito direto na sua pergunta: É lícito
nos sábados fazer o bem ou fazer o mal? Salvar a vida ou tirá-la? (v. 4).
Ah! Então eles ficaram em silêncio. Eles permaneceram assim porque não
tinham nada mais a dizer. A pergunta de Jesus foi arrasadora. Jesus lhes
revelou o interior. Com essa pergunta mostrou-lhes a má intenção dos seus
corações.
Não era uma pergunta abstrata. O bem-estar de um homem está em jogo. Certamente, eles que
sabiam o que se podia e não se podia fazer no sábado, poderiam responder essa questão. Como
permaneceram em silêncio, Jesus mostrou o que se devia fazer. Deve-se fazer o bem, deve-se amar
o próximo (MULHOLLAND, 2006, p. 66).

5. No verso 5 lemos: Olhando-os ao redor, indignado e condoído com a


dureza do seu coração, disse ao homem: Estende a tua mão. Estendeu-a,
e a mão lhe foi restaurada. Jesus disse que os fariseus estavam interpretando
mal a lei do sábado. Se o sábado não estava ajudando as pessoas, então tinha
perdido o valor. As regras não foram criadas à imagem e semelhança de Deus.
As pessoas é que foram criadas a imagem e semelhança do Deus criador.
Jesus valorizou as pessoas e, por isso, curou o homem, mesmo sendo sábado.
6. Com este ato de amor, Jesus quebrou todas aquelas tradições injustas dos
fariseus e revelou o espírito, o propósito de Deus quando deu sua lei a Israel.
Jesus mostrou que a lei não estava contra o homem, mas a favor do homem.
7. Era sábado, mas Jesus disse que o sábado foi feito para o homem. E que
Ele mesmo era Senhor do sábado. Ora, diante disso, retirando-se os fariseus,
conspiravam com os herodianos para matá-lo. Marcos nos mostra assim a
atitude dos religiosos, que não permitiam colher espigas para comer nem
curar no sábado, em obediência às suas tradições. No entanto, eles saíram
planejando a morte de Jesus. O que se percebe aqui é que o cenário para a
morte de Jesus estava sendo montado rapidamente.
Sendo que o centro do Evangelho de Marcos é demonstrar como Jesus veio
servir entregando-se em favor de muitos (10.45), é perceptível que desde o início
do evangelho esse final estivesse sendo indiretamente anunciado para os seus
leitores.
É importante percebermos que a religiosidade é vazia de conteúdo. Que você
saiba valorizar as pessoas em vez de ficar preso às regras. O amor ao próximo é
a melhor lei!
Jesus cura muitos à beira-mar
Mc 3.7–12
Este é o primeiro texto da narrativa de Marcos que é exclusivamente seu.
Mateus, Lucas e os outros Sinóticos não relatam esse acontecimento. Aqui
encontramos Jesus curando muitos à beira do mar da Galileia. Vemos que muitos
procuravam Jesus para obter os benefícios que precisavam. Enquanto a ira, o
ciúme e a inveja dos líderes religiosos aumentavam, a fama de Jesus entre o
povo necessitado a cada dia se tornava maior. Esse era o Ano de Popularidade.
Já havia passado o Ano de Preparação e logo chegaria o Ano da Paixão. Mas
naqueles dias a fama de Jesus cresceu. A multidão era enorme. Pessoas vinham
das mais diferentes regiões: Galileia, Judeia, Idumeia, de além do Jordão, de
cidades como Jerusalém e de Tiro e Sidom, que pertenciam a Fenícia. Judeus e
gentios precisavam de Jesus, e muitos o buscavam. Os que se sentiam
necessitados buscavam a Jesus. Muitos, entretanto, não se achavam necessitados
e não procuravam a Jesus, como ainda hoje acontece. Os que são humildes
procuram auxílio. Os que acham que não necessitam da bênção de Jesus o
desprezam. Vamos às nossas reflexões sobre esse parágrafo.
1. É interessante notar a providência prática de Jesus. Ele recomendou aos
discípulos que tivessem um barquinho pronto por causa da multidão que, sem
controle, buscando satisfazer suas necessidades, apertava-o, impedindo seus
movimentos.
2. O verso 9 pode ser entendido de uma maneira normal, mas também
interpretado de modo especial. Quando atentamos para as ações de Jesus, no
seu poder demonstrado de modo irrefutável na cura das mais diversas doenças
e na expulsão dos demônios, perguntamos: Jesus não tinha condições de
evitar esse aperto da multidão? Ele não poderia estabelecer para si “um
círculo de proteção” invisível? Certamente! Mas esse detalhe relatado por
Marcos nos revela a completa humanidade de Jesus. Revela-nos a sua total
identificação conosco. Ele era igual a nós, e isso é maravilhoso!
3. Diz assim o verso 10 em sua primeira parte: Pois curava a muitos, de
modo que… É notável aqui a expressão: “curava a muitos”. Não alguns, não
a uns poucos, porém a muitos. A necessidade humana é muito grande. O
desespero das massas era muito grande. A humanidade é pobre e necessitada.
Todos nós pertencemos a esta família humana, a esta família carente e
necessitada. Mas, infelizmente, nem todos reconhecem a necessidade que têm
de Jesus Cristo. E você, sente necessidade de Jesus ou se acha
suficientemente forte para andar por sua própria capacidade?
4. Na última parte do verso 10, todos os que padeciam de qualquer
enfermidade se arrojavam a ele para o tocar, temos uma descrição do
descontrole da multidão:
Eles não só o apertavam de todos os lados, mas até de cima se arremessavam sobre ele, para tocá-lo
de algum modo e experimentar seus poderes milagrosos… Esse anseio descontrolado por cura,
Jesus corrigiu com sua atitude (1.37; Jo 6.26). Ele não queria ser somente um curandeiro e, por isso,
criou espaço para a proclamação do reinado de Deus que se aproximou (4.1). Ele não era só um
profeta que faz milagres (6.15; 8.28), mas o mensageiro das boas novas de que falou Isaías e é
também – misteriosamente – a própria boa notícia (1.14) (POHL, 1998, p. 131).

Temos que aprender a buscá-lo não apenas por aquilo que pode fazer por nós,
em nosso benefício. Temos que buscá-lo por Ele ser quem é, o Deus
encarnado que veio até nós trazer a salvação, e pela possibilidade de
novamente termos comunhão com Ele.
5. No verso 11 lemos: Também os espíritos imundos, quando o viam,
prostravam-se diante dele e exclamavam: Tu és o filho de Deus. Os
espíritos maus conheciam Jesus. Eles são seres inteligentes e poderosos que
se apossam das criaturas humanas, e só o poder de Cristo pode
verdadeiramente libertar o homem do poder satânico. Como Jesus desde a
eternidade já tinha vencido Satanás e seus asseclas, eles sabiam quem Jesus
era. Jesus é, em sua encarnação, o Filho de Deus! Infelizmente, muitos em
nossos dias adoram a Satanás. O culto a Satanás se estende por toda a parte.
Mas quem deve ser adorado é o Criador e não a criatura, principalmente um
ser que se desviou das intenções que Deus tinha para ele.
6. Novamente podemos destacar em Marcos o “segredo messiânico”. As
palavras do verso 12 nos ajudam a entender essa ênfase de Jesus: Mas Jesus
lhes advertia severamente que não o expusessem à publicidade. Os
espíritos imundos reconheciam Jesus e o seu poder, mas Jesus não queria o
testemunho deles. Este verso é notável, porque nos mostra claramente que
Jesus não aceitou o testemunho desses demônios. E certamente tendo ouvido
sobre esse exemplo, assim também procedeu Paulo em Atos 16.16–18,
quando expulsou o demônio de uma jovem que dava testemunho dele e de
Silas, dizendo a todos que eles eram servos do Deus Altíssimo e anunciavam
o caminho da salvação. Temos que entender que Jesus, seus ministros e sua
igreja não precisam do louvor e do testemunho de Satanás.
7. Jesus queria manter o segredo messiânico porque ainda não tinha chegado
a sua hora. Em vez de fama, de aparecer, Jesus procurou ser discreto. A igreja
brasileira precisa aprender esse princípio de humildade.
A experiência eclesiástica brasileira necessita de uma reforma. Precisamos de
uma reforma eclesiástica porque temos cometido dois erros:
A. A igreja, ao colocar seus líderes num pedestal, trata-os como
semideuses. Eles são os maiorais. A igreja se esquece de que colocar
alguém em primeiro lugar é pecado. Devemos honrar aquele que serve ao
Senhor, que é instrumento nas mãos divinas, mas tratá-lo como Anjo do
Senhor, como ungido, o único que possui a revelação divina, é perigoso.
Por isso temos a Bíblia em nossas mãos. É nosso dever estudá-la!
B. O segundo erro é cometido pelos que são ou se fazem líderes, esses
líderes idolatrados. Muitos gostam dessa honraria, desse tratamento quase
divino e de serem chamados de “ungidos do Senhor”. Gostam de ser
bajulados, de ficar no pedestal. Gostam tanto da fama e do poder que se
autodenominam com nomes mais pomposos. Eles se esquecem de que
foram chamados a servir, como o Filho do Homem. Muitos líderes se
esquecem de que receberam dons para servir, para serem instrumentos e
colaboradores nas mãos do Senhor (Mc 10.45; 1Co 3.5–9; 1Pe 4.10).
Se seguíssemos o exemplo de Jesus, seríamos diferentes. Ele saiu da
sinagoga, da fama e admiração que tinha obtido no lugar da religião. Ele foi para
a casa humilde de um pescador. Mas de lá também saiu, pois toda a cidade veio
àquela casa. Foi então para fora da cidade, para beira-mar. Não quis ficar
instalado, “curtindo” a adoração do povo. Não! Ele foi para a rua, para o meio do
povo, onde havia necessidade. Foi enfrentar o inimigo. Foi servir o povo pobre e
necessitado. Jesus veio para servir, e foi isso que fez. Ele rejeitou e proibiu o
testemunho a seu respeito. Não queria que ninguém divulgasse os seus feitos.
Nem os demônios, nem os que foram curados!
Quanta diferença dos nossos dias! Que Deus nos perdoe como igreja por
idolatrarmos os líderes, dando-lhes uma posição que só pertence ao Senhor. Mas
que Deus perdoe também os líderes que apreciam o poder, a fama e o pedestal!
Que o Senhor tenha misericórdia da sua igreja!
Jesus escolhe seus doze apóstolos
Mc 3.13–19
Quando Jesus escolheu os doze, já sabia que deixaria a sua missão em mãos
humanas, em mãos frágeis e pecadoras. Mas mesmo assim separou para estarem
com Ele aqueles a quem iria capacitar. Aqui encontramos o propósito soberano
de Deus para escolher os doze apóstolos. Vamos entender bem essa chamada.
1. Em João 15.16, Jesus disse que seus discípulos haviam sido divinamente
escolhidos. Tinham sido escolhidos por Ele mesmo, pelo próprio Cristo, pelo
Messias: Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos
escolhi a vós outros e vos designei para vades e deis fruto, e o vosso fruto
permaneça… Destaca-se aqui não só a escolha divina, mas a escolha com
um propósito: produzir fruto. Creio que o fruto aqui se refere não apenas ao
testemunho que deram a partir da vinda do Espírito Santo sobre suas vidas.
Certamente, o foco também está no “fruto do Espírito”, isto é, uma mudança
de caráter, fazendo com que o discípulo se torne cada dia mais parecido com
o Mestre.
2. Como no quadro mostrado anteriormente, temos aqui a terceira etapa da
chamada, da convocação de Jesus. Os doze discípulos foram chamados para
serem apóstolos, isto é, enviados. É importante frisar que Jesus não os
chamou por causa da fé que tinham, pois ela era frágil e muito pequena. Ele
não os escolheu porque eram talentosos e habilidosos nas Escrituras, pois
nenhum se destacava nesse quesito. Não os convocou porque já tinham dado
prova de coragem e ousadia, pois quando ela foi necessária todos o
abandonaram. Eles foram escolhidos conforme o critério do próprio Senhor
Jesus, conforme as palavras de Marcos: … e chamou os que ele mesmo
quis… (v. 13).
3. Os doze apóstolos eram distintos em suas origens, características e
ocupações. Mateus era cobrador de impostos e trabalhava para Roma (Mt
9.9). Simão, o Zelote, era um revolucionário extremamente nacionalista que
utilizava as armas contra Roma (Lc 6.15). Simão, depois chamado de Pedro
por Jesus, era o típico pescador que sempre tinha o que falar antes dos outros
(Mt 16.17–18). João era pescador e bem relacionado com alguns da cúpula
religiosa dos judeus, alguém com energia que corria bem (Jo 18.15; 20.4).
Tiago, junto com seu irmão, era tão explosivo que ganhou o apelido de “filho
do trovão” (Lc 9.54). Bartolomeu, ou Natanael, era zeloso cumpridor da lei e,
portanto, preconceituoso (Jo 1.45–47). Tomé, o gêmeo, era ao mesmo tempo
corajoso e impulsivo, mas revelou-se duvidoso (Jo 20.25). Filipe gostava de
contar as novidades e era questionador e cético (Jo 1.45; 6.5,7). Tiago, filho
de Alfeu, também chamado de “o menor”, era provavelmente o mais jovem
do grupo (Mc 15.40). André, irmão de Pedro, tinha um bom coração e levou
seu irmão e alguns gregos até Jesus (Jo 1.40–42; 12.20–22). Judas, filho de
Tiago, também chamado de Judas Tadeu, não entendeu a revelação de Jesus
dada primeiramente a eles e não ao mundo (Jo 14.22). Judas Iscariotes, que
traiu Jesus, não era galileu, mas da província de Queriot, ao sul da Judeia; era
também cobiçoso e traiçoeiro (Lc 22.2–6).
4. Jesus chamou esses doze homens para estarem com ele (v. 14). Marcos
resumiu nessa pequena expressão o grande segredo do discipulado. Discípulo
é quem gasta a sua vida com o mestre! Veja que este foi o critério usado para
a escolha do substituto de Judas (At 1.21–22). Eu e você, se quisermos ser
considerados discípulos de Cristo, temos que gastar tempo com Ele!
5. Jesus os enviou para pregar, isto é, conforme o original grego, para
proclamar, para anunciar como arautos a vinda do reino de Deus. Você tem
testemunhado, tem proclamado a presença do reino de Deus entre nós? Tem
mostrado através da sua vida o que significa pertencer ao reino de Deus?
6. Jesus lhes concedeu autoridade, como lhes declarou também em Mateus
28.18–20. Essa autoridade tinha a finalidade de promover a libertação dos
homens cativos nas garras de Satanás. Por isso, como igreja, temos essa
autoridade e essa tarefa dada por Jesus Cristo. Não podemos nos esquecer
dela, pois, afinal, Jesus veio a esse mundo também para destruir as obras de
Satanás. Nós somos o seu exército e temos essa missão (Ef 6.12; 1Jo 3.8). Às
vezes, o diabo possui fisicamente uma pessoa, mas em outras ocasiões ele a
aprisiona por meio de medo, pavor, doenças, necessidades sociais, enfim, usa
todas as estratégias para manter o homem afastado de Deus. Mas, como
igreja, como discípulos de Cristo, temos autoridade para libertar os que estão
aprisionados.
7. Os doze discípulos eram homens normais e extremamente falhos, porém,
depois de serem revestidos pelo Espírito Santo, tornaram- se ousados no
cumprimento da tarefa que lhes fora designada (At 2.1–4). Falharam e
pecaram ainda, mas certamente foram usados para proclamar as boas novas
que transformam a vida de todo aquele que crê (At 2.43; 3.1–10).
Jesus ensina sobre o pecado imperdoável
Mc 3.20–30
Nestes versos Jesus provavelmente está de novo na casa de Pedro. E aqui temos
o seu ensino sobre o pecado imperdoável. Jesus foi acusado de expulsar
demônios pelo poder do próprio diabo e enfrentou também a incompreensão da
sua família, pois julgaram que estivesse fora de si (v. 20–21). Vamos analisar
essa situação junto com os versos 31 a 35. Consideraremos nesses versos a
acusação dos escribas, professores da lei, através de algumas observações.
1. No verso 22 lemos que os escribas, pela própria profissão que exerciam,
vieram em comitiva de Jerusalém para a região pobre da Galileia. Essa
região, ao norte da Palestina, chamada de Galileia dos Gentios, era
menosprezada pela elite religiosa dos judeus que vivia na Judeia e,
principalmente, em Jerusalém.
2. Os escribas vieram para observar, para se inteirar dos acontecimentos
relativos a esse “novo profeta”. Vieram para “julgar” Jesus, o Filho de Deus,
o Deus encarnado que viera para servir. E, ao verem o alvoroço do povo
querendo os benefícios que só Jesus podia lhes dar, deram a sua sentença. Os
escribas proclamaram o seu veredicto: Ele está possesso de Belzebu. E: É
pelo maioral dos demônios que expele os demônios (v. 22).
3. A palavra “Belzebu” é uma junção de duas palavras, conforme nos explica
a Bíblia de Estudo Almeida (2006, p. 12): Belzebu – nome dado ao diabo
como chefe dos demônios; é derivado do hebraico Baalzebub (2Rs 1.2–3),
nome depreciativo (“senhor das moscas”), com que os antigos hebreus
chamavam o deus cananeu Baal. Ou, como aponta Mulholland (2006, p. 73),
Belzebu poderia significar “deus do estrume”. Portanto, afirmar que Jesus
estava possesso e expelia demônios por essa divindade pagã era, de fato,
monstruoso.
4. As obras que Jesus realizou foi por meio do poder do Espírito Santo. Ele
nasceu por obra e graça do Espírito Santo e foi ungido de poder pelo Espírito
Santo para a realização do seu ministério. Portanto, aqui o vemos sendo
caluniado. Jesus estava sendo acusado de estar fazendo milagres por
instrumentalidade do diabo, quando na verdade estava fazendo milagres por
meio do poder do Espírito Santo.
5. Jesus respondeu essa acusação com as palavras dos versos 23 a 26, onde
argumentou que seria um contrassenso Satanás expelir a Satanás. Era como se
um reino lutasse contra si mesmo. Não poderia subsistir. Assim, Jesus
afirmou: Se, pois, Satanás se levantou contra si mesmo e está dividido,
não pode subsistir, mas perece (v. 26), mostrando que não havia lógica, não
havia sensatez na conclusão dos escribas.
6. Jesus continuou aprofundando seu raciocínio e usou uma ilustração. Para
saquear a casa de um valente é necessário que primeiramente o valente seja
amarrado. E para poder fazê-lo, somente alguém mais valente, alguém mais
poderoso que aquele valente. Jesus mostrou-lhes que somente alguém que
tivesse poder ainda maior do que o diabo conseguiria expulsá-lo da vida de
uma pessoa. Assim, em outras palavras, Ele estava provando que, pelo fato de
conseguir expulsar Satanás das vidas que oprimia, o fazia com o poder
sobrenatural, o poder de Deus para quem não há impossíveis. Jesus expulsava
os demônios pelo poder do Espírito Santo, prenunciando que um dia o
amarraria e o imobilizaria por mil anos. Como disse Barclay (1974, p. 91):
Jesus estava mostrando que havia chegado um homem mais poderoso e que a
conquista ou a derrota de Satanás já havia começado!
7. E finalizando este trecho tão marcante, Jesus fala sobre a blasfêmia contra
o Espírito Santo. Os líderes judaicos rejeitaram o poder de quem podia
transformar as suas vidas. Eles rejeitaram o poder do Espírito Santo. É o
pecado da incredulidade que leva o homem a perdição. É este o pecado
imperdoável. O homem que se recusa a aceitar o testemunho do Espírito de
Deus no seu coração, fechando-o para a operação divina, está
irremediavelmente perdido. Não existe meio de escape, não há perdão.
Porém, quando o homem crê, quando aceita a verdade de Deus, então recebe
o perdão para qualquer um e para todos os seus pecados. Por quê? Porque não
há pecado que Deus não possa perdoar, em Cristo, a não ser o pecado da
incredulidade, o pecado contra a pessoa e o ministério do Espírito Santo, o
Espírito da Verdade tão bem descrito por Jesus e registrado por João (Jo 16.7–
11,13; 15.26).
Cristo morreu na cruz por todos os pecados e não somente por alguns. Não há
pecado que tenhamos cometido que não possa ser perdoado se houver fé e
arrependimento. A morte de Cristo é eficaz para nos resgatar. O seu sangue nos
purifica de todo o pecado, porém, é preciso que haja arrependimento e fé, é
preciso aceitar a ação de Deus no coração por meio do Espírito Santo.
Muitos cristãos ficam abalados e preocupados com a possibilidade de terem
cometido esse tipo de pecado para o qual não há perdão. Mas se esse
pensamento passar por sua mente, não se desespere. Como disse Lopes (2008, p.
205): Ninguém pode sentir tristeza pelo pecado sem a obra do Espírito Santo
(em sua vida). Quem comete esse pecado jamais sente tristeza por ele. O medo
angustiante de pensar ter cometido o pecado imperdoável é por si só evidência
de que tal pessoa não o cometeu!
Que possamos agradecer e valorizar a obra do Espírito Santo em nossas vidas,
fazendo-nos cada vez mais semelhantes ao Senhor Jesus Cristo!
Jesus e sua família
Mc 3.31–35
Nos versos 20 e 21, finalmente chegamos ao assunto que conclui este capítulo.
Vamos fazer as nossas considerações, subdividindo esse parágrafo em algumas
seções.
1. Nos versos 20 e 21, os parentes de Jesus, isto é, sua mãe e seus irmãos
(conforme o verso 31 e as passagens paralelas dos outros Sinóticos), ouvindo
que a multidão se aglomerara em frente à casa de Pedro, foram ver o que
estava acontecendo. Nem mesmo tempo para se alimentar Jesus e os
discípulos tinham!
2. Mesmo sem ser o foco aqui, vale a pena ressaltar que Jesus foi criado numa
família normal, nos padrões judaicos. A família era formada por José, Maria,
os irmãos Tiago, José, Judas, Simão e pelo menos duas irmãs. Nessa época,
José não era mais mencionado. Eles eram unidos e demonstravam
preocupação com o bem-estar do irmão mais velho, mesmo não crendo nele
(Jo 7.5).
3. Sem entenderem a dimensão espiritual da sua presença, sem entenderem a
sua responsabilidade ministerial, quiseram retirá-lo, porque criam que estava
fora de si, confirmando a completa descrença por parte daqueles que tinham
convivido com Ele até pouco tempo antes.
4. Este relato continua nos versos 31 a 35, quando informam a Jesus que sua
mãe e irmãos estavam do lado de fora da casa procurando-o, pedindo que
fosse ter com eles. Por não compreenderem o significado do que estava
acontecendo e quem, de fato, Ele era, a família queria colocá-lo sob sua
proteção.
5. Mas, na verdade, este relato mostra a família de Jesus dificultando e
embaraçando a prática do seu ministério, desviando sua atenção. Pensavam
que Ele estava fora de si, e não conseguia mais controlar a situação.
6. Jesus, então, conforme os versos 33 a 35, olhando ao redor, para aqueles
que ouviam os seus ensinos, disse a famosa frase: qualquer que fizer a
vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe (v. 35). Jesus mostrou-lhes
a sua prioridade ministerial, apontando para aqueles que o ouviam. Mesmo
sem saber das suas origens, das suas histórias, da posição social, financeira ou
educacional, Jesus considerou como família aqueles que lhe davam atenção e
queriam ouvir seus ensinamentos. Você se encaixa nessa definição de
pertencente à familia de Jesus?
7. Jesus mostrou que todo cristão tem com seus irmãos de fé uma relação
muito mais forte do que com sua família carnal, se porventura ela for um
obstáculo ao discipulado cristão. Fazer a vontade de Deus, isto é, cumprir e
obedecer os desígnios divinos, deve ser prioridade para nós!
A obediência a Deus tem até prioridade sobre as responsabilidades familiares,
mas elas não são excludentes! Ame a sua família e seja também membro da
família de Deus!

Marcos 4 - O servo ensina as verdades


relativas ao reino de Deus
Objetivos das parábolas e o poder sobre a natureza
Ao iniciarmos o estudo do capítulo 4, é bom recordarmos que nos três primeiros
capítulos que estudamos, Marcos destaca o poder de Jesus, apresentando-o como
o Filho de Deus que pode mudar a realidade dos seres humanos necessitados.
Jesus curou os mais diversos tipos de doenças e libertou os que estavam
escravizados por Satanás.
Como um dos propósitos de Marcos era encorajar os cristãos perseguidos e
também atingir um determinado público, especialmente romano, que ainda não
conhecia a Jesus como seu Senhor e Salvador, destacou: o poder de Jesus
emanava do ser divino que Ele era e da presença e direção do Espírito Santo que
o enchia e dirigia seus passos.
Neste quarto capítulo, Marcos destaca outro aspecto do ministério de Jesus: o
seu ensino. Jesus foi um professor muito especial. Tinha grande habilidade em
transformar situações corriqueiras e simples para ensinar verdades profundas que
dessa maneira eram captadas com muita facilidade por todos. Mas essas
histórias, esses ensinamentos tirados do dia a dia, criavam obstáculos para os que
se consideravam mais inteligentes, os que se entendiam como professores da lei.
Por orgulho e arrogância, eles depreciavam as palavras de Jesus e assim ficavam
sem as verdades fundamentais que Jesus ensinava. Conforme está destacado em
Mateus 4.23 e 9.35, juntamente com Marcos 1.39, o ministério de Jesus era
formado por esse conjunto de ações: o ensino, a pregação e a libertação. Assim,
veremos neste capítulo sete seções onde o ensino de Jesus se evidencia:
Parte 1 – Jesus conta a parábola do semeador (v. 1–9)
Parte 2 – Jesus explica a parábola do semeador (v. 10–20)
Parte 3 – Jesus conta a parábola da candeia (v. 21–25)
Parte 4 – Jesus conta a parábola da semente (v. 26–29)
Parte 5 – Jesus conta a parábola do grão de mostarda (v. 30–32)
Parte 6 – Jesus tinha razões para ensinar por meio de parábolas (v. 33–34)
Parte 7 – Jesus ensina através do milagre de acalmar o mar (v. 35–41)
No último texto do capítulo 3, vimos que Jesus estava ensinando e
manifestando o reino de Deus na casa de Pedro. Agora o ambiente é outro. Jesus
volta a ensinar à beira-mar, e visto que tanto Mateus como Marcos registram este
fato, certamente ele tem importância. Muitos estudiosos veem um sentido
simbólico aqui. A casa era uma ilustração do povo de Israel e o mar uma
representação das nações, de todos os gentios. Adotando essa interpretação, o
significado é que Jesus deixava o seu povo Israel para dar atenção também ao
mundo dos gentios. Jesus mostrou-lhes a chegada do reino de Deus. E, como
Marcos destaca, essa demonstração se deu através dos seus ensinos. Vamos,
pois, a eles.
Jesus conta a parábola do semeador
Mc 4.1–9
A parábola do semeador talvez seja a mais conhecida e pregada de todas as
parábolas que Jesus contou. Ela é uma ilustração muito clara de como as
sementes, durante o processo de plantação, caem em diversos tipos de solo. A
partir dessa situação corriqueira para muitos dos seus ouvintes, Jesus deixou-nos
lições importantes. Vamos detalhar essa parábola.
1. O verso 1 destaca a grande multidão que acompanhava Jesus para ouvir os
seus ensinos. Jesus ficava num barco ancorado próximo à praia enquanto o
povo se assentava na areia para ouvi-lo. Você pode imaginar esta cena? Que
privilégio poder ouvir a voz de Deus, do Deus encarnado ensinando verdades
profundas através de histórias corriqueiras, trazendo essas verdades eternas
para os humildes de espírito, os simples de coração, para aqueles que não se
envergonhavam de sentar-se para ouvi-lo! Era sem dúvida um privilégio
especial estendido a todos.
2. O verso 2 destaca que Jesus estava doutrinando e ensinando o povo através
de parábolas. As parábolas eram histórias, exemplos ou comparações de fatos
ou situações diárias usadas para ensinar verdades espirituais.
3. A parábola do semeador é registrada pelos três Evangelhos Sinóticos (Mt
13.1–9; Lc 8.4–8). Mas os versos 3 a 9 nos dão os detalhes dessa narrativa. O
semeador, fazendo o seu trabalho, foi semear, mas as sementes caíram em
diferentes tipos de solo.
4. O verso 4 fala que uma parte da semente caiu num pedaço de solo que
estava à beira do caminho. Era um solo duro, pisado pelos caminhantes. As
sementes ali lançadas, por não penetrarem na terra, foram logo comidas pelas
aves.
5. Os versos 5 e 6 dizem que outra parte caiu em solo rochoso e logo
germinou, porque a terra não era profunda. Mas saindo o sol, queimou as
primeiras folhinhas. Por não ter raízes profundas, não subsistiu e morreu.
6. O verso 7 aponta que ainda outra porção caiu numa parte do terreno cheia
de espinhos. Eles cresceram com as sementes e as sufocaram, tornando-as
improdutivas.
7. Conforme o verso 8, outra parte caiu numa terra boa, provavelmente já
trabalhada, e ali germinou, cresceu e frutificou: a trinta, a sessenta e a cem
por um, uma taxa de produtividade excepcional.
E, assim, Jesus terminou essa história convocando seus ouvintes a ouvirem
essas palavras com entendimento (v. 9). Esse ensino deveria ser escutado com o
ouvido espiritual. Era um apelo para que atentassem para o significado espiritual
da história. Essas histórias eram exemplos, analogias, ilustrações ou ditos
proverbiais que, em vez de terem significados diversos para cada detalhe,
continham normalmente uma lição central. Essa era uma história da vida real,
um fato que certamente fazia parte do dia a dia dos ouvintes de Jesus. O desafio
era transformá-la numa verdade espiritual. E é exatamente isso que vamos ver
nos próximos versículos.
Jesus explica a parábola do semeador
Mc 4.10–20
Nesses versos encontramos a explicação da parábola.
1. No verso 10, temos o ambiente e a definição de para quem esta parábola
foi explicada. Provavelmente Jesus estava novamente na casa de Pedro e
explicou essa parábola para seus discípulos, isto é, para os seus seguidores
além dos doze apóstolos.
2. A frase a vós outros vos é dado conhecer o mistério do reino de Deus (v.
11) está na voz passiva, demonstrando a ação divina em favor dos homens.
Quem age para dar entendimento é Deus, pelo Espírito Santo. Cabe a nós
ouvirmos com ouvidos espirituais. A palavra “mistério”, isto é, aquilo que
antes era desconhecido, significa algo revelado por Deus ao seu povo. Essa
proclamação era feita a todos, mas apenas aqueles que se interessavam em
compreender é que recebiam a explicação dessas verdades profundas.
3. Nos versos 11 a 13 as palavras de Jesus parecem um pouco ambíguas.
Jesus contou essas parábolas porque seus opositores estavam realmente
furiosos com Ele e com seu ensino, uma das marcas distintivas do seu
ministério. Os religiosos, seus opositores e inimigos, já haviam rejeitado seus
ensinos e as multidões, mesmo que o acompanhassem, também não se
interessavam devidamente. Elas estavam mais interessadas nos milagres
espetaculares de Jesus. Então, só aqueles que de fato estavam desejosos e
sedentos da verdade receberiam o esclarecimento das lições apresentadas.
4. A partir do verso 13 temos a explicação da parábola. A semente é a Palavra
de Deus. Os solos são os diversos tipos de corações. Vemos, então, que há
três tipos de solos onde as sementes caem e não frutificam. Nos versos 14 e
15, temos a reação do coração duro à recepção da Palavra de Deus, um campo
fértil para o diabo vir e pegar a semente lançada e torná-la sem efeito. Nos
versos 16 e 17, a semente que cai no solo rochoso representa aqueles que,
ouvindo a Palavra, a recebem com alegria, mas não tendo raiz, não tendo
profundidade, ao chegarem as angústias, tribulações ou perseguições, logo
desistem porque refletem um coração instável que espera facilidade na
jornada rumo ao reino de Deus. E nos versos 18 e 19, a semente que cai entre
os espinhos representa aqueles cujos corações egoístas preocupam-se mais em
aproveitar o que há de melhor no mundo e no evangelho, mas diante desse
dilema, são sufocados e se tornam infrutíferos.
5. Esses três solos simbolizam aqueles que, mesmo ouvindo a Palavra de
Deus, não a aceitam adequadamente. Assim ela não frutifica e eles
permanecem presos aos seus delitos e pecados.
6. Mas a parábola não termina no verso 20. Encontramos a semente lançada
na boa terra. Sendo uma terra preparada, uma terra boa, ela recebe a semente
que germina e frutifica a trinta, sessenta e cem por um.
7. A palavra só dará frutos, só alcançará seus propósitos no coração daqueles
que humildemente desejam compreender o mistério do reino. Esses que se
humilham para aprender, que procuram conhecer as verdades espirituais,
simbolizam a terra preparada que frutifica abundantemente.
Há três fatos importantes que destacamos: Em primeiro lugar, um coração frutífero ouve e recebe a
Palavra (4.20)… Em segundo lugar, um coração frutífero produz fruto que vinga e cresce (4.8–9)…
Em terceiro lugar, um coração frutífero produz frutos em diferentes proporções (4.9,20) (LOPES,
2008, p. 216–218).

Ao mesmo tempo em que a ênfase da parábola recai sobre a reação das


pessoas frente à proclamação da Palavra de Deus, não podemos deixar de dar
atenção a outra verdade que subjaz ao texto. É importante destacarmos que Jesus
disse que o semeador semeia a Palavra de Deus. Mas infelizmente, e é fato,
existem muitíssimos semeadores que semeiam outro tipo de semente: palavras
de homens, conceitos humanos e tradições humanas. Eles semeiam também
aquilo que os homens querem ouvir, aquilo que lhes dá coceira nos ouvidos
(2Tm 4.3–4). Conforme Lopes (2008, p. 218), “essa semente pode parecer muito
fértil, mas não produz fruto que permanece para a vida eterna”. Por isso, todos
nós temos a responsabilidade de verificar aquilo que ouvimos. São palavras
humanas ou a genuína Palavra de Deus?
Se você tem ouvido a pura Palavra de Deus, a verdadeira semente divina, se
você for esse coração bem preparado, onde a Palavra de Deus causa efeito,
também deve frutificar. E a partir de você outros conhecerão essa mensagem que
transforma a vida de qualquer pessoa!
Jesus conta a parábola da candeia
Mc 4.21–25
Na sequência do texto, encontramos mais um ensinamento do Senhor Jesus. Ele
nos ensina através da parábola da candeia, uma lâmpada que tinha como
combustível o azeite de oliva.
1. Os que ouviram Jesus contando a parábola do semeador, provavelmente em
seus corações estavam considerando: se muitos dos que ouvirão a Palavra são
descritos como solos impróprios, nos quais a semente do evangelho não
frutificará, então por que devemos testemunhar-lhes as verdades eternas? E
não é da mesma maneira que procedemos? Queremos justificar nossa
inatividade com o desinteresse dos outros.
2. Jesus, conhecendo o coração humano, propôs a parábola da candeia,
afirmando de modo objetivo: não há alternativa. Todo aquele que pertence ao
reino deve testemunhar. Aquele que foi atingido pela luz do Senhor deve ser
luz para outras pessoas.
3. É interessante perceber que Jesus mostrou a responsabilidade do cidadão
do reino, dizendo que o segredo messiânico não deveria ser mantido para
sempre. Na verdade, logo seria proclamado.
4. Após a morte, ressurreição e ascensão de Jesus e a vinda do Espírito Santo,
que capacitaria para a proclamação do evangelho, a luz de Cristo deveria
refletir daquele que foi iluminado. É nosso dever, mas, ao mesmo tempo, um
privilégio deixarmos que a luz da graça e da presença de Deus brilhe de tal
maneira que aqueles que vivem nas trevas venham a conhecer e abraçar a luz
verdadeira.
5. O início do verso 24 é significativo: Atentai no que ouvis. Aqui Jesus está
novamente chamando a atenção para a necessidade de ouvir com os ouvidos
espirituais (v. 9). Só quando damos a devida atenção para o significado dessas
histórias simples é que conseguimos perceber a sua profundidade.
… estas afirmações curtas, diretas e memoráveis começam com um apelo para “considerar
cuidadosamente o que se ouve”. Os três provérbios que se seguem estão cheios de semitismos (a
maneira hebraica de expressar-se). Em termos de forma, refletem o estilo hebraico de escrever… e,
longe de ser uma mistura incompreensível de ditados que não têm relação uns com os outros, este
parágrafo está construído ao redor da promessa “o oculto será revelado” e da exortação “ouça”…
(MULHOLLAND, 2006, p. 85).

6. Ainda no verso 24, Jesus mostrou que a proclamação do evangelho será


recompensada na medida direta do esforço, da diligência com que esta tarefa
sagrada é desenvolvida. Mas aquele que não demonstra envolvimento na
tarefa missionária perderá o privilégio até daquilo que recebeu para realizar.
7. A frase do verso 25, Pois ao que tem se lhe dará; e, ao que não tem, até
o que tem lhe será tirado, é muito objetiva em seu significado. Jesus nos
mostra que somos responsáveis por usarmos bem o que recebemos. Não
importa quanto temos, mas o que fazemos com o que temos recebido. Quando
o crente deixa de brilhar e de testemunhar, deixa também de cumprir a sua
missão. Ele perde a razão de ser num mundo em trevas. Portanto, lhe é tirado
o privilégio de ser um agente de Deus na transformação de vidas necessitadas.
Jesus conta a parábola da semente
Mc 4.26–29
No quarto parágrafo desse capítulo, nos versos 26 a 29, encontramos a parábola
da semente. Ela é registrada apenas por Marcos, sendo mais um dos poucos
trechos exclusivos desse evangelho. Vamos considerá-la através de sete
observações.
1. O objetivo da parábola é mostrar o crescimento misterioso da semente, a
maneira misteriosa como o reino de Deus cresce no mundo. Nessa parábola
vemos a ação da graça divina na alma daquele que busca a Deus.
2. A semente foi plantada. O agricultor, depois de um dia de extenuante
trabalho, foi descansar, foi dormir. E essa é a verdadeira rotina daquele que
trabalha na agricultura. Na época da semeadura ele faz exatamente isso.
Planta, semeia, rega a terra com o seu suor até que todo o terreno tenha sido
semeado. É um trabalho concentrado.
3. Depois dessa rotina de dia e de noite, depois que diariamente aproveitou a
época da semeadura, certa manhã, ao se levantar, ele se deparou com uma
realidade que, embora esperada, não tinha ideia como aconteceu.
4. A semente germinou e cresceu. Mas é interessante repararmos que a terra
por si só não produz o bom fruto, não produz o trigo. Por si só ela produz
ervas daninhas e espinhos. Para haver um bom fruto tem que haver um
agricultor. E assim como a mão humana espalha a semente para que haja
colheita, o coração humano só produzirá bons frutos se for tocado pela graça
divina.
5. O agricultor constatou que depois da época da semeadura a terra frutificou
(v. 28). Primeiro brotou a erva, depois veio a espiga e, por fim, o grão cheio
na espiga. Sem entender como aconteceu esse processo, ele constatou que a
semente lançada se transformou em fruto bom e saudável. Assim também a
graça divina no coração humano é incompreensível.
A graça divina no coração humano é algo incomum. Trata-se de um novo princípio, proveniente de
fora, enviado do céu e implantado na alma do homem. Entregue a si mesmo, nenhum ser humano
vivo jamais buscaria ao Senhor. (RYLE, 2007, p. 47).

6. Mas mesmo sem entender como se dá o processo de transformação, depois,


no tempo certo, quando o grão estava maduro, o agricultor o cortou porque
era chegada a ceifa (v. 29). Enquanto a parábola do semeador destaca os tipos
de solos que recebem a semente, nesta parábola o destaque é para a
capacidade de a semente crescer e frutificar. Somente com o passar do tempo
esse resultado acontece. Jesus destacou através dessa parábola a capacidade, o
poder que a mensagem do evangelho tem de crescer e produzir resultados
sem que se perceba como isso acontece.
7. Jesus possivelmente estava se referindo ao seu ministério terreno. Foi um
começo relativamente insignificante e apagado, mas viria um tempo, o tempo
de Deus, em que suas palavras seriam valorizadas e amadas. O seu nome seria
reverenciado e Ele mesmo seria adorado. Isso tem ocorrido agora em todas as
nações, através do avanço missionário. E a grande pergunta é: Essa
frutificação já ocorreu em sua vida?
Jesus conta a parábola do grão de mostarda
Mc 4.30–32
Nesses versos temos mais uma parábola que usa como ilustração a dimensão
agrícola, tão bem conhecida pelos ouvintes de Jesus. Essa parábola refere-se ao
grão de mostarda que, quando semeado, é o menor de todos sobre a terra. Porém,
depois de sofrer transformações, nasce, cresce e se torna a maior das hortaliças,
deitando grandes ramos a ponto de as aves do céu poderem aninhar-se à sua
sombra. Vamos às nossas considerações.
1. Jesus utilizou o grão de mostarda, porque ele, embora muito pequeno, se
transformava numa árvore maior que as hortaliças. Uma árvore de mostarda
pode passar de quatro metros de altura, tamanho suficiente para que os
pássaros façam nela pousada, conforme as palavras do profeta (Ez 17.22–24).
2. Jesus novamente lembrou o crescimento do reino de Deus aqui na terra que
começou com um grupo pequeno e modesto de discípulos, mas depois
alcançou a terra toda.
3. Essa parábola é de esperança e encorajamento.
Esta parábola nos diz que nunca devemos desencorajar-nos pelos começos humildes. Pode nos
parecer que, nesse momento, somente possamos produzir efeitos insignificantes; porém se esse
efeito insignificante se repetir, e voltar a se repetir, certamente chegará a ter um significado… Nada
surge em sua plenitude e desenvolvimento completo. Nosso dever é fazer o que é possível; e o
efeito acumulado de todos os esforços pequenos pode chegar a produzir resultados surpreendentes.
(BARCLAY, 1974, p. 124).

Em vez de ficarmos desanimados com o crescimento aparentemente lento,


devemos observar que o crescimento é contínuo.
4. Mas o ponto central da parábola não é só a lição de que o reino crescerá no
mundo e que não devemos ficar escravos dos números. O que Jesus está
enfatizando nessa pequena parábola é o fato de que existe uma conexão entre
o menor grão e uma grande árvore. Jesus está destacando o pequeno começo
do reino de Deus sob o seu ministério que não era entendido, mas rejeitado, e
a sua consumação gloriosa no futuro.
5. Jesus estava reforçando o conceito de que os pequenos começos não devem
ser desprezados, pois o reino estava sendo implantado pouco a pouco no
coração dos homens que recebem Jesus.
6. O reino de Deus não viria, e de fato não veio, em todo o seu esplendor na
primeira vinda do Messias. Mas no final, na ocasião da segunda vinda do
Messias, o reino virá em grande glória e atrairá a atenção de todos. Na
segunda vinda de Jesus o reino de Deus poderá ser comparado a uma grande
árvore onde todos buscarão proteção e abrigo.
7. Por isso, a sua e a minha tarefa é proclamar a possibilidade de entrada no
reino, sabendo e descansando no fato de que o Senhor é quem dá o
crescimento numérico. Espero que diante dessas palavras de Jesus você
verifique como está o seu testemunho do evangelho. Essa é a sua e a minha
responsabilidade.
Jesus tinha razões para ensinar por meio de parábolas
Mc 4.33–34
Nesses versos encontramos uma explicação de por que Jesus usava as parábolas
como forma de ensino. Algumas observações devem ser feitas.
1. Embora o evangelho mencione que Jesus ensinava o povo com muitas
parábolas (v. 33), Marcos nos apresentou poucas, principalmente porque
queria destacar Jesus como servo em ação.
2. Ainda no verso 33, a frase conforme permitia a capacidade dos ouvintes,
significa que em muitas ocasiões Jesus reconhecia que o povo não estava
pronto para receber a verdade de modo pleno e completo. Temos de
reconhecer que…
Uma palavra totalmente direta teria significado a obrigatoriedade de uma decisão imediata. Para isto
o povo não estava preparado. O resultado teria sido uma descrença coletiva. Também neste contexto
pode-se tocar no caso de Jo 16.2: “Vós não o podeis suportar agora” (POHL, 1998, p. 172).

Temos de reconhecer também a incapacidade do homem de entender ou


discernir as “coisas espirituais” se não houver a iluminação do Espírito Santo!
3. Jesus só usava parábolas para ensinar, conforme o verso 34, pois para
aquele público essa era a maneira mais atraente de chamar e prender a
atenção. Jesus sempre foi um exemplo de Mestre, pois as multidões, quando o
comparavam com os escribas e fariseus, percebiam a diferença de estilo como
bem registrou Mateus (Mt 7.28–29).
4. Jesus era um Mestre por excelência, e é importante reconhecermos que Ele
não falou por parábolas para confundir seus ouvintes. Não! Ele usou esse
método para desafiar os interessados sinceros a descobrirem o verdadeiro
significado das suas palavras.
5. Em grande parte dos seus ensinamentos Jesus combateu os motivos
hipócritas e impuros da liderança religiosa dos judeus. Se tivesse falado
diretamente contra ela, acusando-a, além de provocar uma rebelião contra a
liderança estabelecida, certamente o seu ministério não alcançaria tudo o que
tinha vindo fazer e, provavelmente, seria abreviado.
6. Aos que verdadeiramente ouviam e se interessavam em pedir-lhe
explicações, Jesus, particularmente, explicava o significado espiritual das
parábolas, inclusive aos seus próprios discípulos, mesmo que na maioria das
vezes eles necessitassem de maiores e mais detalhadas explicações.
7. Jesus usava parábolas e as explicava de modo pleno e completo aos
discípulos para despertar-lhes a fé. Mas, por outro lado, elas serviram também
para revelar a resistência, a soberba e a dureza de coração dos líderes
judaicos, pois mesmo diante das diversas oportunidades dadas a Israel durante
toda a sua história, a liderança religiosa dos judeus manteve dura a sua cerviz
(At 7.51).
Esses versos são desafiadores, pois devem nos fazer refletir sobre as nossas
próprias vidas. Como estamos nos relacionando com as palavras de Jesus?
Lembre-se: Só Jesus tem as palavras da vida eterna (Jo 6.68)!
Jesus ensina através do milagre de acalmar o mar
Mc 4.35–41
Nesses versos vemos Jesus acalmando uma tempestade, demonstrando o seu
poder sobre as diversas circunstâncias que nos ocorrem diariamente. Mas será
que houve algum ensino nesse episódio? Vamos analisá-lo através de sete
observações.
1. Este texto mostra mais um milagre realizado por Jesus. Embora o mundo
de hoje seja cético e não creia no sobrenatural, nós, que cremos, acreditamos
também em milagres. Cremos que Jesus tem pleno domínio sobre a natureza,
pois ao mesmo tempo em que a criou, ainda a sustenta.
2. Conforme o verso 36, muitas pessoas seguiram Jesus, mesmo atravessando
o mar, mas a pergunta é: com que motivação elas o seguiram? E você, por que
o segue? Por Ele mesmo ou por aquilo que pode fazer por você? Infelizmente,
muitos seguem a Jesus apenas pelas vantagens que podem obter desse
relacionamento.
3. O mar da Galileia fica 207 metros abaixo do nível do mar, sendo cercado
por uma cadeia de montanhas. Os ventos que sopram dos montes
intensificam-se junto ao mar, causando tempestades violentas e inesperadas.
Assim também as circunstâncias difíceis da vida atingem a todos, mesmo os
seguidores de Jesus.
4. Conforme os versos 37 e 38, é possível imaginarmos a cena. Era uma
tempestade fora do normal, pois os discípulos que eram pescadores e
conheciam bem aquelas águas estavam agitados e preocupados. Porém, Jesus
dormia, provando que era perfeitamente humano como nós, e sentiu
exatamente a necessidade de descansar.
5. Os discípulos sabiam que podiam contar com Jesus nas dificuldades, mas
mesmo assim estavam agitados. A tormenta que enfrentavam era física.
Tormentas de outras ordens podem nos acontecer, como as psicológicas, de
relacionamentos, financeiras, familiares, etc. Mas podemos estar certos!
Assim como os discípulos, sabemos que é possível contar com Jesus nas mais
diferentes dificuldades. Essa é também a sua crença? Por isso podemos nos
unir aos discípulos e clamar: Mestre, não te importa que pereçamos? (v.
38).
6. Nos versos finais, 39 a 41, Jesus acordou e repreendeu o vento e o mar. O
vento aquietou-se. No mar se fez bonança e Jesus repreendeu também os
discípulos: Por que sois assim tão tímidos?! Como é que não tendes fé? (v.
40). Jesus pode mudar as nossas circunstâncias, mas pede que tenhamos fé!
Uma fé sólida, firmada nele mesmo (Hb 12.2). A admiração e a pergunta dos
discípulos foi respondida não só com a ação poderosa, mas sobretudo com a
presença de Jesus junto a eles.
Você tem experimentado a presença e o poder de Deus em sua vida?
7. E qual a grande lição, o grande ensinamento desse relato? Vejamos:
Marcos, com esse evento dá início a uma série de “grandes milagres” estruturados para mostrar ao
leitor que Jesus realmente tem todo o poder. Acalmar a tempestade revela o seu controle sobre a
natureza; curar o homem endemoninhado revela sua autoridade sobre todo o reino espiritual e, curar
a mulher doente… demonstra a sua capacidade de vencer todos os poderes que mantêm o homem
prisioneiro… (RICHARDS, 2007, p. 104).

E o complemento dessa lição é que, ao falar da ressurreição da filha de Jairo


(5.21–24,35–43), Marcos nos mostra o poder de Jesus sobre a morte, a nossa
maior inimiga. Nas piores circunstâncias da vida, nos maremotos ou nas
tormentas espirituais que se abatem sobre nós, podemos contar com Jesus, para
quem não há impossíveis. Que ao contrário dos discípulos (v. 40), sejamos
pessoas de fé. E que em vez de timidez, nossa reação seja de confiança, pois
estamos com Jesus!

Marcos 5 - O servo demonstra seu divino


e incomparável poder
Ele é maior que Satanás, a doença e a morte
Ao iniciarmos o estudo do capítulo 5, dois desafios vistos no capítulo 4 nos dão
base para o que vamos encontrar nesses 43 versos.
Em primeiro lugar, na parábola da candeia, Jesus disse que se a lâmpada não
for colocada num local bem alto para iluminar o ambiente e se não ajudar
ninguém a enxergar, será inútil. Assim também ocorre na esfera espiritual. A sua
vida mostra aos outros como encontrar Deus e como viver para Ele? A sua vida
tem iluminado os passos daqueles que ainda estão em trevas? Se a sua resposta
for negativa, pergunte-se o que apagou a sua luz. Avalie-se: ressentimento,
mágoa, desobediência, inveja e outros sentimentos podem impedir a luz de Jesus
brilhar através da sua vida. Se a sua resposta for positiva, deixe que a luz de
Jesus brilhe mais ainda para que outros conheçam o caminho da salvação.
Em segundo lugar, Marcos nos contou que Jesus acalmou a tempestade. Os
discípulos entraram em pânico, porque a tempestade iria destruí-los fisicamente.
Mas as tempestades também surgem de outras formas. Pense nas tempestades
que lhe causam dificuldades. Como os discípulos, você tem duas opções: pode
preocupar-se e pensar que Jesus não se importa mais ou resistir ao medo e
colocar em Jesus a sua confiança, sabendo que Ele é poderoso para solucionar o
que para nós é impossível.
Por isso, com base nesses dois desafios de sermos testemunhas de Jesus e de
confiarmos completamente nele, vamos considerar os relatos de Marcos que nos
mostram o divino e incomparável poder de Jesus. Vamos estudar o capítulo 5
dividindo-o em cinco parágrafos:
Parte 1 – Jesus expulsa uma legião de demônios (v. 1–14)
Parte 2 – Jesus é rejeitado pelos gerasenos (v. 14–20)
Parte 3 – Jesus ouve o pedido de Jairo (v. 21–24)
Parte 4 – Jesus cura uma mulher com hemorragia (v. 25–34)
Parte 5 – Jesus ressuscita a filha de Jairo (v. 35–43)
Jesus expulsa uma legião de demônios
Mc 5.1–14
Nesses versos temos a narrativa da cura, ou libertação, do endemoninhado
geraseno. Este é um dos textos mais significativos de Marcos, pois mostra o
efeito dessa mensagem salvadora na totalidade do ser humano. Analisaremos
este texto subdividindo-o em sete porções.
1. Deixando Cafarnaum, Jesus e os discípulos atravessaram o mar da Galileia.
A tempestade que os surpreendeu foi acalmada por Jesus e o mar logo
sossegou. Chegando do lado oposto do lago, isto é, em Gerasa ou Gadara (v.
1), Jesus e seus discípulos se depararam com um quadro triste e doloroso.
2. Eles encontraram um homem dominado pelo diabo (v. 2). As algemas não
podiam detê-lo e ninguém podia subjugá-lo. Andava dia e noite entre os
sepulcros gritando e ferindo-se com pedras (v. 3–5). Vivia afastado da sua
família e do convívio social, atividades normais para o ser humano. Mas isso
não era de se admirar, pois o diabo veio para matar, roubar e destruir.
3. Embora não possamos ter certeza do motivo porque a possessão demoníaca
acontece, sabemos que o diabo usa o corpo da pessoa de maneira destrutiva a
fim de deturpar e destruir o relacionamento do homem com Deus e a sua
semelhança com o Criador. Ainda hoje os demônios continuam sendo
perigosos, poderosos e destrutivos. Embora seja importante reconhecermos a
atividade maligna em nossos dias, com o objetivo de estarmos vigilantes,
quem tem a Jesus Cristo como seu Senhor e Salvador não precisa temer o
inimigo. A Bíblia nos orienta a resistir, que ele fugirá de nós (Tg 4.7).
4. O espírito maligno que possuía aquele homem, tendo recebido a ordem de
Jesus para sair dali (v. 8, conforme Lc 8.29), correu até Jesus e, prostrando-se,
adorou-o e exclamou em alta voz: Que tenho eu contigo, Jesus, filho do
Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus que não me atormentes (v. 7).
Diante de Jesus, os demônios se prostram, se acovardam e fogem temerosos.
5. Lembrando que ao possuir um ser humano o diabo toma lugar da
personalidade do possuído Jesus perguntou-lhe o nome e ele identificou-se
como “Legião”, porque eram muitos (v. 9). Jesus, ao pedir-lhe o nome, foi
rapidamente obedecido em demonstração do seu poder e autoridade sobre as
hostes malignas. Uma legião era a maior unidade do exército romano,
consistindo de 3.000 a 6.000 soldados. Evidentemente esse homem estava
possuído por muitos demônios. É importante notarmos ainda que os demônios
pediram a Jesus que não os expulsasse daquela região, mas que os lançasse na
manada de porcos que por ali pastava (v. 10–12).
6. Conforme o verso 13, Jesus atendeu aquele pedido, permitindo que os
demônios fossem para os porcos. Era uma manada de aproximadamente
2.000 porcos que se precipitou e afogou-se no mar. Muitos perguntam a razão
de Jesus ter atendido aquele pedido e alguns estudiosos dessa passagem
chegam até a criticá-lo. Uma das explicações da permissão é considerarmos o
interesse de Jesus por aquele homem, pois além da libertação espiritual, ele
não enfrentou o sentimento de insegurança que poderia lhe ocorrer depois de
liberto. Para Jesus, aquela vida valia mais que todos os porcos do mundo.
Houve libertação, mas é inegável que houve prejuízo para os porqueiros.
Ora, temos que lembrar que a carne de porco era proibida em Israel. Então,
podemos perguntar: por que razão os porcos eram criados e tratados, se eram
animais proibidos? Por desprezo à lei. Os gerasenos ou gadarenos pertenciam
à tribo de Gade, que tinha escolhido ficar no lado oriental, no lado errado do
Jordão, demonstrando tendência a um tipo de vida afastada, isolada da
maioria, do restante do povo de Israel. Durante o decorrer da história eles
foram se misturando, como todo o reino do Norte, com povos de outras
regiões, descaracterizando-se como judeus. E assim, nessa ocasião específica,
tiveram como consequência um abalo profundo no seu negócio de porcos.
7. O relato termina com o verso 14, onde Marcos descreve que diante desses
acontecimentos os porqueiros fugiram e os fatos foram divulgados pela
cidade e pelos campos.
Depois desse relato, podemos fazer pelo menos cinco constatações:
A. A realidade da existência dos demônios é clara.
B. Os demônios podem possuir um ser humano que por motivos diversos
permite que isso aconteça; eles também podem possuir animais.
C. Os demônios nunca habitam a vida de um verdadeiro cristão.
D. Existem muitos demônios ou espíritos malignos, mas só um diabo, que
é Satanás, o pai da mentira, o anjo Lúcifer que se rebelou contra Deus e foi
expulso do céu e derrotado pelo sangue de Jesus.
E. O único que pode se opor e vencer o poder de Satanás é o Senhor Jesus.
O nome de Jesus e o seu sangue sobre nossas vidas são garantia da nossa
vitória. Você tem experimentado essa segurança?
Jesus é rejeitado pelos gerasenos
Mc 5.14–20
No segundo parágrafo, Marcos, na sequência do texto, nos mostra a reação que
os gerasenos tiveram diante da manifestação de Jesus derrotando Satanás.
1. Foi uma reação estranha. Quando chegaram onde Jesus estava e viram o
ex-endemoninhado assentado, vestido e em perfeito juízo, completamente
liberto dos pecados e das garras de Satanás, transformado pelo poder de
Jesus, em vez de se alegrarem e louvarem a Deus por aquela transformação,
ficaram temerosos (v. 14–15).
2. Conforme o verso 16, os que viram os acontecimentos relataram detalhes
da expulsão dos demônios, de como foram para os porcos, precipitados no
abismo e afogados.
3. Esse relato sobre o poder divino entre eles e a perda da manada dos porcos
representava uma escolha que deveriam fazer: Queriam Jesus e suas
manifestações ou os porcos e o dinheiro que o comércio lhes proporcionava?
As pessoas temeram… Temeram quando ele acalmou a tempestade no mar, e agora em uma alma
humana… Era demais para o populacho; imploraram a Jesus que se retirasse da terra deles. Esse
pedido, e não a destruição dos porcos, é a parte lamentável do episódio. Para eles, Cristo era um
convidado que dava muita despesa (MACDONALD, 2008, p. 120).

4. Depois de um milagre tão espetacular que salvou a vida de um homem,


afinal, por que eles pediram que Jesus fosse embora? Uma das possibilidades
é que o poder de Jesus era incontrolável para eles. A tendência humana é
querer ter o controle sobre tudo, inclusive sobre os seus deuses. Como o
poder divino não se submete ao nosso controle egocêntrico e egoísta,
preferiram que Jesus deixasse a região. Qual seria a sua escolha? A minha
seria, mesmo com perda financeira, pela presença divina e suas
manifestações!
5. A escolha dos gerasenos foi racional, prática e material. Pediram que Jesus
se afastasse deles, certamente porque temiam que houvesse mais perdas
financeiras. Preferiram desistir de Jesus a desistir da sua fonte de renda e
segurança. O melhor era não têlo mais em meio a sua comunidade.
6. Nesse pedido para que Jesus se retirasse, o povo preferiu mais o homem
endemoninhado do que restaurado e liberto. A transformação tinha sido
completa, pois viram o homem assentado aos pés de Jesus, vestido e em
perfeito juízo (v. 15). Sabe por que temeram? Porque o evangelho é poderoso
para alterar, para transformar a realidade de vida do ser humano nas áreas
física, psíquica e espiritual. Muitas vezes estamos tão acostumados com a
vida medíocre que uma alteração em nossa rotina não é agradável.
7. Enquanto o povo rejeitava Jesus, o homem liberto queria segui-lo. Mas
Jesus não permitiu e ordenou que fosse para sua casa e contasse como Deus
tinha sido bondoso para com ele. E conforme o final desse parágrafo, no
verso 20, o homem obedeceu e começou a divulgar a fama de Jesus por toda
aquela região.
Aproveitando esse tema, é importante fazer algumas colocações sobre a
realidade do diabo:
A realidade e a personalidade dos demônios são atestadas em todas as eras da história desde a
Queda… passando pela necromancia, até o moderno espiritismo. Os demônios podem degenerar a
mente e o corpo (Mt 12.22; 17.15–18; Lc 13.16). Conhecem a divindade e a soberania de Cristo no
mundo espiritual (Mt 8.31–32; Mc 1.24; At 19.15; Tg 2.19) e têm consciência de sua predestinada
sina (Mt 8.31–32; Lc 8.31). Têm um papel importante no governo do sistema satânico mundial (Dn
10.13; Ef 6.12), na promoção das seitas e das falsas doutrinas (1Tm 4.1–3) e na oposição ao plano
de Deus e ao povo de Deus (Ef 6.12; 1Jo 4.1–6). A oração é o recurso do crente contra Satanás e os
demônios (Ef 6.10–20) (UNGER, 2006, p. 401).

De fato, esse é um texto riquíssimo. Além dessas verdades, Marcos estava


mostrando que Jesus procurou dar a correta visão ao povo de Israel. O inimigo
maior de Israel não era Roma e seu poderio militar, mas o diabo, o mais feroz e
astuto inimigo, que os levava a desobedecer a lei de Deus. Aquele mesmo
inimigo espiritual que estava na sinagoga (1.21–28), aquele mesmo espírito
maligno do qual diziam estar possuindo Jesus, agora estava nesse homem e
possuía muitos outros.
Mas Jesus sempre foi vitorioso contra as artimanhas de Satanás. Usando as
palavras de Paulo, temos que lembrar que a nossa luta não é contra outros seres
humanos, mas contra os poderes espirituais do mal (Ef 6.12). Você tem usufruído
desse poder e amor inigualáveis? Você tem testemunhado do poder e do amor de
Jesus? Não se acovarde diante de Satanás, mas resista no poder de Jesus! Não
escolha o lucro indevido e não rejeite a Jesus!
Jesus ouve o pedido de Jairo
Mc 5.21–24
O texto prossegue e no terceiro parágrafo, nos versos 21 a 24, encontramos Jesus
e os discípulos voltando para o lado ocidental do mar da Galileia, provavelmente
para Cafarnaum. E como era de se esperar, depois das grandes manifestações de
poder e de compaixão, conforme o verso 21, uma grande multidão estava junto
ao mar para recebê-lo. Jesus certamente estava ministrando, ensinando, curando,
pregando o reino de Deus e demonstrando esse reino através de atos poderosos e
amorosos.
Em meio a toda aquela agitação, conforme os versos 22 a 24, nos deparamos
com o relato do pedido de um pai carinhoso preocupado com sua filha:
22. Eis que se chegou a ele um dos principais da sinagoga, chamado
Jairo, e, vendo-o, prostrou-se a seus pés;
23. e insistentemente lhe suplicou: Minha filhinha está à morte; vem,
impõe as mãos sobre ela, para que seja salva, e viverá.
24. Jesus foi com ele. Grande multidão o seguia, comprimindo-o.
Esse é um relato interessante, pois um dos chefes da religião reconheceu em
Jesus um poder especial para ajudar sua filha gravemente enferma. Vamos
destacar nessa parte sete atitudes em Jairo que devem se tornar exemplos para
todos nós.
1. Jairo demonstrou extremo cuidado, atenção e amor por sua filha ao buscar
ajuda para ela.
2. Ao mencionar que sua filhinha estava doente, demonstrou a maneira
carinhosa como a tratava.
3. Mesmo sendo um dos principais da sinagoga, ligado aos fariseus que eram
contrários a Jesus, ele não teve preconceito de buscar Jesus para solucionar
seu problema.
4. Deixando seu orgulho e vaidade, mesmo em meio à multidão, procurou
Jesus, quebrando o preconceito entre os religiosos e um “profeta popular”.
5. Jairo, de modo contrário aos líderes religiosos que acusavam Jesus de estar
sob o comando de Belzebu, procurou essa solução e demonstrou fé em Jesus
quando disse que cria que apenas através da imposição de mãos sua filha seria
curada.
6. Com um objetivo maior, demonstrou humildade, prostrandose aos pés de
Jesus em meio à multidão.
7. Jairo reconheceu Jesus como a única esperança e obteve uma resposta
positiva ao seu pedido. O verso 24 atesta isso: Jesus foi com ele.
Em resumo, Jairo demonstrou cuidado, carinho, falta de preconceito,
humildade, fé, reverência e objetividade em procurar o único que podia resolver
seu problema. É assim que você age diante das tribulações que lhe afetam? Você
quer também ter seus pedidos respondidos? Então, lembre-se que Deus está
pronto a nos atender, como nos disse Isaías em 59.1: Eis que a mão do
SENHOR não está encolhida, para que não possa salvar; nem surdo o seu
ouvido, para não poder ouvir. Mantenhamos a nossa fé olhando sempre para
Jesus!
Jesus cura uma mulher com hemorragia
Mc 5.25–34
O próximo parágrafo é como que um parêntese em meio à narrativa da situação
de Jairo. Depois de ouvir o pedido de Jairo, certamente vendo sinceridade em
seu coração, Jesus atendeu ao pedido e acompanhou-o até sua casa. Você pode
imaginar a cena. Um grande burburinho, uma multidão ávida por ser
beneficiada, enfim… Em meio à grande multidão que acompanhava Jesus,
apertando-o e comprimindo-o, aconteceu algo inusitado. Vamos analisar essa
ocorrência, subdividindo-a em sete partes.
1. Marcos, nos versos 25 a 29, nos conta o que aconteceu com as seguintes
palavras:
25. Aconteceu que certa mulher, que, havia doze anos, vinha sofrendo
de uma hemorragia,
26. e muito padecera à mão de vários médicos, tendo despendido tudo
quanto possuía, sem, contudo, nada aproveitar, antes, pelo contrário,
indo a pior,
27. tendo ouvido a fama de Jesus, vindo por trás dele, por entre a
multidão, tocou-lhe a veste.
28. Porque, dizia: se eu apenas lhe tocar as vestes, ficarei curada.
29. E logo se lhe estancou a hemorragia, e sentiu no corpo estar
curada do seu flagelo.
2. Esta mulher tinha uma doença incurável que lhe causava uma hemorragia
constante. Sua doença provavelmente era uma irregularidade menstrual ou
uterina que a tornava ritualmente impura (Lv 15.25–27), e a mantinha
excluída da maioria das atividades sociais da comunidade judaica. Ela queria
desesperadamente resolver o problema, pois além de ser explorada pelos
médicos, já tinha gasto tudo quanto possuía.
3. Essa mulher ouviu sobre Jesus. Ouviu sobre o seu poder sobre todos os
tipos de doenças e até sobre os espíritos malignos, mas estava num impasse.
Ela sabia que se o tocasse, ou se Ele a tocasse, Ele ficaria impuro diante da
lei. O seu dilema era: Queria ser curada, cria nessa possibilidade e ao mesmo
tempo não queria prejudicar Jesus, tornando-o impuro. O que fazer então?
Corajosamente, transgride as leis do sistema vigente e se aproxima de Jesus. Nem mesmo a
multidão que se apinha em torno dele é obstáculo para ela. Podemos imaginá-la acotovelando a
massa para abrir caminho e passar. Mova-a a fé, essa interpretação correta do significado do enigma
de Jesus para sua vida e essa coragem de romper todos os obstáculos para achegar-se a ele. Ela
crê… (SOARES & CORREIA JR., 2002, p. 233).
4. No Antigo Testamento era possível tocar na orla das vestes de um rei e,
certamente, com esse relato do toque em Jesus, Marcos quis simbolicamente
mostrar que Jesus era reconhecido por alguns como o Rei prometido, o
Messias prometido. Mesmo diante da questão da lei cerimonial essa mulher
agiu com grande determinação, com o desejo e a necessidade de resolver seu
problema. E cheia de fé, rompeu com as tradições e foi curada, atingindo o
seu objetivo. Algumas vezes sentimos que os nossos problemas nos afastam
de Deus. Você já teve essa sensação? Mas Jesus está sempre disposto a nos
atender e não devemos permitir que o medo, as tradições e a letra da lei
impeçam a nossa aproximação de Jesus, que quer nos abençoar.
5. Mas o episódio não terminou aqui. Marcos continuou a narrativa
mostrando que Jesus, percebendo que dele tinha saído poder, virou-se para a
multidão e perguntou: Quem me tocou? (v. 31). Essa pergunta causou
admiração nos discípulos, pois em meio a todas aquelas pessoas apertando
umas as outras, como Jesus queria saber quem o tocara?
6. Jesus insistiu olhando ao redor (v. 32). E a mulher, conforme o verso 33
relata, atemorizada e tremendo, sabendo que tinha sido curada, prostrou-se
diante de Jesus e lhe contou como tudo se passara. O episódio termina com as
seguintes palavras do verso 34: E ele lhe disse: Filha, a tua fé te salvou;
vai-te em paz e fica livre do teu mal.
Como entender esse desfecho? Ora, Jesus não se zangou com a mulher que
tinha lhe tocado. Jesus sabia o que ela fizera e o resultado que obtivera, mas quis
ensiná-la, e aos que estavam por perto, que a verdadeira fé não é só o toque (o
pedido). A verdadeira fé envolve a ação, a confissão e o testemunho do que
aconteceu. Foi nisso que Jesus insistiu. Ele queria que a mulher contasse o que
tinha acontecido, que confessasse o que tinha feito e então testemunhasse da
bênção recebida. Você tem testemunhado do que Deus lhe concede, ou tem
ficado calado sem compartilhar as bênçãos recebidas?
Jesus ressuscita a filha de Jairo
Mc 5.35–43
O capítulo 5 encerra, então, essa série de milagres e feitos de Jesus, mostrando o
seu divino e incomparável poder.
De novo em território judeus, Jesus revela ao mesmo tempo sua compaixão e seu poder (5.21–41).
Em dois episódios entrelaçados a vida ia se esvaindo. No caso da mulher hemorrágica, lentamente;
no caso da filha de Jairo, muito depressa. Em ambos os casos, a fé encontrou uma resposta de
empatia e compaixão da parte de Jesus, e uma completa reversão – da perda de vida para a
plenitude de vida. Em ambos os casos, a fé foi fundamental, mas… era necessário que o povo
aceitasse sua mensagem, não apenas admirasse seus atos de poder (CARDOSO PINTO, 2008, p.
91).

Vamos considerar esse relato fazendo seis observações.


1. A menina tinha 12 anos. Jesus estava a caminho da casa de Jairo para curá-
la. Mas veio alguém ao seu encontro e disse: Tua filha já morreu; por que
ainda incomodas o Mestre? Mas Jesus, sem acudir a tais palavras, disse
ao chefe da sinagoga: Não temas, crê somente (v. 35–36). E chegando lá,
vendo toda a confusão e estando acompanhado somente de Pedro, Tiago e
João, entrou na casa.
2. Quem fazia alvoroço eram as pessoas que tinham vindo consolar a família.
Em muitos velórios eram contratadas as “carpideiras”, isto é, mulheres que
eram pagas para cantar canções tristes e chorar a morte do falecido.
3. Jesus, que veio trazer vida, não se curvou àquela situação. Questionou a
lamúria e disse que era tudo em vão, pois a menina não estava morta, mas
apenas dormindo (v. 39).
4. Como era natural para aqueles que não conheciam Jesus e nunca
experimentaram da sua divina presença, diante daquelas palavras todos riram,
não acreditando e zombando da sua maneira de encarar a situação (v. 40).
Mas exatamente nesse ponto é que está a questão: Como encaramos a vida?
Como encaramos a morte? Como Jesus a encara? Em vários trechos do Novo
Testamento a morte é encarada como um sono (1Ts 4.13–18).
5. Depois de mandar sair todos os incrédulos, ficando apenas com Jairo, a
mãe da menina e os três discípulos, Jesus foi até onde jazia inerte o corpo.
Jesus tomou-a pela mão e disse: Talitá cumi!, que quer dizer: Menina, eu te
mando, levanta-te! (v. 41).
6. Imediatamente a menina se levantou e pôs-se a andar. Diante disso, todos
ficaram sobremaneira admirados. Jesus mandou que dessem de comer à
menina. E mais uma vez pediu que guardassem segredo, ordenando-lhes
expressamente que não contassem a ninguém essa maravilhosa obra divina.
Mas afinal, porque Jesus pedia silêncio dos que eram beneficiados?
Essa ênfase, às vezes chamada de “segredo messiânico”, fascinou e confundiu intérpretes modernos
de Marcos… Uma leitura cuidadosa de Marcos revela que em três tipos de circunstâncias Jesus
ordenou que ficassem em silêncio. Em cada caso, isto ocorreu por uma razão diferente.
Primeiramente, em exorcismos, Jesus ordenou que os demônios ficassem quietos porque não queria
ter associação com eles de maneira alguma (1.32–34; 3.11–12)… Em segundo lugar, em alguns
casos, ordenava às pessoas que eram curadas de doenças que ficassem em silêncio para aliviar a
pressão das multidões sobre a totalidade do seu ministério… E, em terceiro lugar, Jesus disse aos
seus discípulos que ficassem quietos sobre o seu messianismo porque eles simplesmente não
entendiam aquilo que ocorria e só o entenderiam depois da ressurreição (8.29–30; 9.9–10,31–32) e
depois da vinda do Espírito Santo. (ELWELL & YARBROUGH, 2002, p. 94–96).
A filha de Jairo foi ressuscitada e devolvida ao pai aflito! Jesus atendeu a
súplica, mas queria ser atendido no seu pedido. Não queria que a notícia se
espalhasse. Ainda não era o seu tempo!
Que lições podemos aprender desse relato? Jesus ressuscitou a menina porque
Jairo teve atitudes corretas? Ou ela foi ressuscitada somente pela misericórdia e
graça do Senhor?
Em primeiro lugar, esse milagre maravilhoso ocorreu porque Jesus é bondoso
e cheio de graça. Em segundo lugar, Jesus, vendo a aflição e a sinceridade de
Jairo, honrou sua atitude. Mas, sobretudo, a graça de Jesus é maravilhosa. Não
há situação ou problema que não possa resolver. Que nos acheguemos a Ele
cheios de fé e certeza!

Marcos 6 - O servo é rejeitado pelos


conhecidos e recebido pelos distantes
Rejeição em Nazaré, morte de João Batista, a primeira alimentação e a
recepção em Genesaré
Depois de termos refletido mais profundamente sobre o capítulo 5 de Marcos,
basta fazermos uma primeira abordagem ao longo conteúdo do capítulo 6 para
percebermos o contraste entre os dois capítulos. No capítulo 5 vimos a
importância da fé na demonstração do divino e incomparável poder de Jesus. E
agora, no capítulo 6, seremos confrontados com a incredulidade dos nazarenos,
de Herodes e dos próprios discípulos. Anteriormente vimos a autoridade de Jesus
sobre os demônios, a doença e a morte. Veremos nesse capítulo a autoridade de
Jesus sendo contestada, compartilhada e confundida, mas, finalmente,
consagrada e consolidada. Vamos dividir este texto em cinco partes para melhor
estudá-lo:
Parte 1 – Jesus prega em Nazaré e é rejeitado pelos conhecidos (v. 1–6)
Parte 2 – Jesus instrui e envia os doze discípulos (v. 7–13)
Parte 3 – Jesus foi confundido com João Batista, morto por Herodes (v. 14–
29)
Parte 4 – Jesus realiza o milagre da multiplicação de pães e peixes (v. 30–44)
Parte 5 – Jesus anda sobre o mar e vai de novo a Genesaré (v. 45–56)
Jesus prega em Nazaré e é rejeitado pelos conhecidos
Mc 6.1–6
Nesses versos está descrita a rejeição que Jesus teve em sua própria cidade, e
podemos ver como sua autoridade foi contestada. Vamos analisar esse parágrafo
detalhadamente.
1. O verso 1 nos mostra Jesus retornando para a sua cidade, para a sua terra,
muito provavelmente Nazaré. Se estes versos são paralelos à Lucas 4.16–30,
confirmamos que a frase foi para a sua terra (v. 1) refere-se a Nazaré.
Mesmo sendo sua cidade, a cidade onde fora criado, Jesus foi rejeitado.
Marcos destaca um detalhe importante que Mateus e Lucas não
mencionaram: a presença dos discípulos com Jesus. Esse detalhe é
importante, pois fazia parte do discipulado acompanhar o mestre ouvindo
seus ensinamentos e vendo seu comportamento e suas ações (conforme 3.14).
2. Embora Jesus tenha se declarado como Senhor do sábado, respeitava o
princípio divino para esse dia e normalmente ia ao culto na sinagoga. O verso
2 nos relata que num sábado, como de costume, Jesus estava em Nazaré, foi à
sinagoga e ensinou, pois como dissemos anteriormente, era costume nas
sinagogas um visitante ser convidado para ler e expor as Escrituras. Pelo
relato de Lucas, o trecho que Jesus escolheu para ler e ensinar naquela manhã
foi o que está em nossas Bíblias em Isaías 61. Ainda conforme o verso 2,
Jesus causou grande admiração pelo conteúdo do seu ensino e pelas
maravilhas que fazia, pois aqueles frequentadores conheciam sua origem.
3. Marcos, no verso 3, mostra que a origem de Jesus conhecida por todos era
a humana. Para seus conterrâneos Ele era carpinteiro, filho do carpinteiro
José, que provavelmente já tinha falecido naquela época. Sua mãe se chamava
Maria.
Como Maria e José tiveram mais filhos, Jesus era irmão de Tiago, José,
Judas, Simão e pelo menos duas irmãs. A frase escandalizavam-se nele (v. 3)
significa que estavam desprezando sua ministração pois, afinal, o que o
credenciava religiosa e academicamente? Eles estavam céticos em relação a
Jesus: “Nós o conhecemos. Por que dar atenção a alguém que é um
trabalhador braçal como nós mesmos?”. Não podiam crer nem admitir que
aquele que crescera no meio deles pudesse ter tanta sabedoria e autoridade
para ensinar e curar.
4. Jesus, sabendo o que se passava no coração de seus vizinhos, citou um
provérbio popular e lhes disse, conforme o verso 4: Não há profeta sem
honra, senão na sua terra, entre os seus parentes e na sua casa. E com
essas palavras Jesus transmitiulhes algumas verdades:
A. Ele era profeta, isto é, um porta-voz de Deus.
B. O profeta normalmente era honrado pelos que não o conheciam.
C. O profeta não era respeitado pelos que o conheciam.
D. O profeta quase sempre era desacreditado pela própria família.
E. Jesus, o profeta enviado de Deus, não pôde realizar milagres em Nazaré
por causa da incredulidade deles.
5. No verso 5 Marcos nos relata que Jesus operou apenas algumas curas de
enfermos, impondo-lhes as mãos. Enquanto em Cafarnaum, na casa de Pedro,
Jesus curou o paralítico que foi descido pelo teto, pois seus amigos creram,
em Nazaré, por causa da incredulidade, pouquíssimos milagres foram feitos.
6. Marcos termina a narrativa desse episódio no verso 6, dizendo que Jesus
admirou-se da incredulidade dos seus conterrâneos. É digno de nota que da
mesma forma que eles ficaram admirados com o poder e a autoridade de
Jesus, Ele se admirou da incredulidade deles. Apenas duas vezes Jesus se
admirou: da fé do centurião, relatada em Mateus 8.10 e, da falta de fé dos
nazarenos, relatada nesses versos.
7. Mesmo diante da incredulidade, da impossibilidade de realizar sua missão
em Nazaré, Jesus manteve-se na região visitando aldeias, pequenos vilarejos,
cumprindo uma das partes importantes do seu ministério. Jesus ensinou sobre
a realidade da presença do reino de Deus entre nós. Jesus aqui nos deu este
exemplo e nos ensinou esta importante lição: O Senhor da glória, o Filho de
Deus, foi pregar em lugares pequenos.
Quantos de nós têm essa disposição? E que lições aprendemos de toda essa
narrativa?
Este texto é uma melancólica ilustração da iniquidade do coração humano. Vemos em primeiro
lugar, quão inclinados são os homens a subestimar as coisas com as quais estão familiarizados, por
isso é que ficaram “escandalizados”. Em segundo lugar, aprendemos quão humilde foi a posição
que nosso Senhor condescendeu em ocupar em sua vida, antes de iniciar o seu ministério público,
pois ele era apenas um simples “carpinteiro”. Em último lugar percebemos quão excessivamente
pecaminoso é o pecado da incredulidade, que causou “admiração” em Jesus a ponto dele não poder
fazer ali nenhum milagre “senão apenas algumas curas” (RYLE, 2007, p. 66–68).

O preconceito, o orgulho e a inveja impediram os nazarenos de aceitarem os


ensinos de Jesus. E a incredulidade deles impediu Jesus de realizar milagres que
por certo ajudariam a muitos. Não permita que nada se coloque entre você e
Jesus!
Temos que reconhecer que a fé é indispensável para as ações de Deus, para a
nossa salvação. Em Isaías 53.1 o profeta diz: Quem creu em nossa pregação?
E a quem foi revelado o braço do SENHOR? A fé, a crença, vem pelo ouvir e
ouvir a Palavra de Deus. Onde não há fé não há salvação. O poder de Deus deixa
de manifestar-se onde não há fé e, assim, deixamos de receber os seus
benefícios. A fé é o meio de alcançarmos tudo aquilo que Deus tem para nos
oferecer.
Jesus instrui e envia os doze discípulos
Mc 6.7–13
O segundo episódio, relatado por Marcos nos versos 7 a 13, nos mostra Jesus
enviando os doze apóstolos para proclamarem a presença do reino de Deus.
Além da proclamação e do ensino, eles teriam autoridade sobre os espíritos
imundos, isto é, sobre os demônios, e também poderiam curar os enfermos. Aqui
encontramos a autoridade de Jesus compartilhada. A expulsão de demônios e as
curas seriam as credenciais dos apóstolos.
Quando um embaixador é enviado a um país estrangeiro, recebe credenciais que lhe autenticam a
missão. Como poderiam os apóstolos evangelizar sem experiência, sendo desconhecidos ante a
comunidade de Israel e convencer o povo de que, de fato, eram embaixadores do Reino? Para que
não houvesse tal inconveniente, o Mestre deu-lhes cartas de crédito sobrenaturais a fim de
convencerem os seus ouvintes. Durante a sua missão haveriam de curar enfermos e expelir
demônios (PEARLMAN, 2002, p. 43).

Vamos estudar essa missão compartilhada em profundidade.


1. No verso 7, Marcos relata que Jesus chamou os doze e enviouos em duplas,
para alcançarem as mais remotas aldeias da Galileia com a mensagem das
boas novas do reino de Deus. É importante entender que aqui se deu a
concretização da chamada para o apostolado, que vimos em 3.13–19. A
palavra “apóstolo” quer dizer enviado, delegado, e aqui se dá a concretização
do apostolado. Jesus envia, delega e compartilha com os doze a missão de
proclamar o reino de Deus.
2. Conforme os versos 8 a 11, os apóstolos não deveriam levar nada para o
caminho, exceto um bordão. Jesus menciona cinco itens:
A. Não deveriam levar pão.
B. Não deveriam levar alforje, isto é, saco de dormir.
C. Não deveriam levar dinheiro.
D. Não deveriam levar par extra de sandálias, mas iriam só com a dos pés.
E. Não deveriam levar túnica ou veste de reserva, que poderia servir de
cobertor para se aquecerem à noite.
3. O que Jesus queria com essas proibições? Será que é esse o padrão para
todos aqueles que ministram de modo itinerante? Não! Jesus apenas queria
despertar nos discípulos, e quer despertar em nós também, uma completa
confiança em Deus. Deveriam crer que Deus forneceria alimento e
alojamento para todos os dias e todas as noites.
4. No verso 10, Jesus recomendou também aos doze que se satisfizessem com
as condições que seus hospedeiros oferecessem, permanecendo naquela casa
até saírem da cidade. As regras da hospitalidade, tão respeitadas no judaísmo,
davam instruções específicas e advertiam os hóspedes a não trocar uma casa
por outra que oferecesse melhores condições. Essa procura pelo bem estar
não poderia causar dificuldades ao anúncio do reino de Deus.
5. No verso 11 vemos, por outro lado, que eles deveriam sacudir o pó dos pés
em testemunho contra aqueles que porventura não os recebessem nem os
ouvissem. Não ouvir e rejeitar a mensagem do reino colocava qualquer judeu
na mesma situação que um gentio, isto é, na condição de alguém repulsivo,
como os judeus consideravam os gentios. Por isso, a única atitude a tomar
contra os que não queriam dar atenção à mensagem do reino era cumprir as
normas da época: sacudir o pó dos pés.
6. No verso 12, Marcos mostra claramente que houve obediência por parte
dos discípulos. Eles não questionaram, não disseram que não sabiam, não
criaram obstáculos. Eles já tinham visto como fazer e o que falar ao estarem
com Jesus (3.14). E, além disso, tinham recebido a autoridade de Jesus, a
autoridade divina. Estavam plenamente capacitados.
7. O relato desse episódio termina numa narrativa vitoriosa. No verso 13, os
doze, ou as seis duplas, pregaram o arrependimento ao povo, libertaram
muitos expulsando os demônios e curaram muitíssimos enfermos, ungindo-os
com óleo. Embora naqueles dias o azeite de oliva fosse muito usado como
medicamento, certamente o poder de Deus estava presente na ministração dos
apóstolos de Jesus.
Conforme esses versos, a nossa responsabilidade é pregar, ajudar os
necessitados e clamar por libertação para os oprimidos. Aceitar ou recusar a
mensagem da salvação é responsabilidade daquele que nos ouve. O papel de
convencê-los não nos pertence, mas ao Espírito Santo (Jo 16.8–11). Você tem
sido fiel em transmitir a mensagem do reino de Deus?
Jesus foi confundido com João Batista, morto por Herodes (6.14–29)
No terceiro episódio deste capítulo encontramos, nos versos 14 a 29, o relato da
morte de João Batista. Aqui vemos a autoridade de Jesus sendo confundida.
Depois da excursão evangelística dos doze, Jesus começou a retirar-se da
Galileia por algumas razões:
A. Pela oposição da liderança religiosa judaica.
B. Porque a multidão queria que Ele assumisse o papel do messias
libertador.
C. Porque desejava instruir os doze e o tempo do seu ministério não era
longo.
D. Porque Jesus ouviu o relato sobre a morte de João Batista.
E. Porque ouviu sobre o interesse e curiosidade de Herodes nas suas
próprias atividades e não queria dar-lhe atenção antes do tempo devido (Lc
13.32).
Mas vamos conhecer em detalhes o que Marcos nos relata sobre a morte de
João Batista, conforme os versos 17 a 29.
1. Herodes Antipas, filho mais novo de Herodes, o Grande (Mt 2.1), era o
tetrarca tanto da Pereia como da Galileia. Em certa ocasião, visitando Roma,
encantou-se e seduziu Herodias, sua cunhada, convencendo-a a abandonar seu
irmão Filipe e a ficar com ele. Para isso, o próprio Antipas tinha que
divorciar-se de sua esposa. E ele tomou essa atitude sem qualquer
preocupação.
2. O menosprezo pela lei dos judeus e pelo padrão moral divino foi
denunciado por João Batista com veemência. Assim, João foi detido e levado
à prisão de Maquerus, assinando a sua própria sentença de morte. Herodes
Antipas tratava João Batista com respeito e temor, e desejava mantê-lo preso,
inclusive por temer o povo que o tinha como profeta.
3. Herodias, porém, odiava João Batista, porque ele denunciava a sua relação
com Herodes, seu cunhado, e aguardava uma oportunidade boa para destruir o
profeta precursor do Messias. Essa oportunidade surgiu quando Herodes, ao
festejar seu aniversário, convidou os nobres da corte para uma grande noite de
festa e celebração.
4. Provavelmente depois de muita bebida, Herodes fez uma promessa
inusitada à sua enteada, Salomé, que lhe tinha agradado ao dançar em sua
homenagem. Herodes prometeu que lhe daria tudo quanto pedisse. Mas
quando ouviu o pedido de Salomé, instruída por sua mãe, ele estremeceu.
Salomé pediu num prato a cabeça de João Batista. E o rei, para não perder sua
palavra diante dos convidados, e também por achar que uma palavra real não
podia voltar atrás, ordenou que João Batista fosse imediatamente executado.
5. Mas como vimos no início desse parágrafo, nos versos 14 a 16, Marcos nos
relata que a fama de Jesus, seus feitos, seus ensinos, seus milagres e,
especialmente, a ressurreição da filha de Jairo, tinham chegado ao
conhecimento de Herodes. Como era maldoso, supersticioso e também
culpado pela morte de João, pensou que Jesus era João Batista, ressuscitado
com poderes sobrenaturais. É interessante perceber que mesmo o poder, a
riqueza e o status não concedem paz àquele que está longe de Deus, em
pecado. De nada adiantava o poder de Herodes. Ele era um homem
atormentado.
6. É interessante percebermos que havia outras posições relativas a Jesus.
Nesta passagem vemos três afirmações sobre Jesus. Em primeiro lugar vemos a afirmação
produzida por uma consciência culpada: Herodes dizia que Jesus era João Batista ressuscitado dos
mortos. Em segundo lugar vemos a afirmação produzida pelos nacionalistas: Alguns judeus que
aguardavam o Messias como um rei conquistador criam que Elias havia voltado. Em terceiro lugar
vemos a afirmação daqueles que aguardavam a voz de Deus: Para este Jesus era um profeta como
os profetas do Antigo Testamento (BARCLAY, 1974, p. 161–162).

Herodes pensava que Jesus era João Batista. Alguns achavam que Jesus
era Elias, pois havia uma profecia de que o Messias viria no espírito de Elias
(Ml 4.5). E outros criam que Jesus era mais um profeta, como os outros
profetas do Antigo Testamento. Havia muita divergência de opinião a respeito
de Jesus. E ainda hoje existe esta divergência. O povo olha para Jesus de
diferentes maneiras. Dizem que Ele é um filósofo, mestre, ético, ou religioso.
Enfim, temos as mais diversas opiniões sobre Jesus. Espero, entretanto, que
você tenha Jesus como seu Senhor e Salvador, o verdadeiro Deus encarnado
que morreu na cruz para nos salvar dos pecados!
7. Os versos finais, 27 a 29, nos dão conta que depois de ter sido executada a
trama maldosa de Herodias, João Batista foi decapitado. Seus discípulos logo
que souberam do triste fim prepararam o sepultamento, certamente com
respeito, dor e muita tristeza.
Como disse MacDonald (2008, p. 123), Herodes foi pego numa armadilha.
Teve que agir contra a sua vontade para atender ao pedido da sua amante. O
pecado tinha feito uma teia ao seu redor e ele foi derrotado por uma mulher
madura, com um desígnio mau, e por uma mulher jovem, com uma dança
sensual.
Como você tem se comportado diante de tentações semelhantes a essas?
Jesus realiza o milagre da multiplicação de pães e peixes
Mc 6.30–44
Nesses versos encontramos a narrativa de Marcos sobre a primeira multiplicação
de pães e peixes. Aqui, Marcos destaca a autoridade de Jesus sendo consagrada.
O evento foi tão marcante que se tornou o único milagre que os quatro
evangelhos registraram. Além dos três Sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas),
João, mesmo depois de 65–68 anos, também o registrou em detalhes. E para isso
“gastou” todo o capítulo 6 do seu evangelho. Vamos considerar essa consagração
da autoridade de Jesus.
1. Nos versos 30 e 31, Marcos descreve de modo vívido o estado físico e
emocional dos doze depois da viagem missionária (6.12–13). Eles prestaram
um relatório detalhado a Jesus, mas estavam cansados, estafados, e nem
tinham tempo para se alimentar diante da grande necessidade de tantas
pessoas que iam e vinham.
2. Conforme o verso 32, Jesus mostrou cuidado e sensibilidade para com os
discípulos, levando-os de barco a Betsaida (conforme Lc 9.10), um lugar
sossegado, para se refazerem.
3. Porém, a multidão necessitada antecipou-se a eles (v. 34). Quando
desembarcaram, aproximadamente quinze mil pessoas esperavam por Jesus e
pelos discípulos.
4. O verso 34 é significativo pelas palavras de Jesus: a multidão, aos olhos de
Jesus, era como ovelhas que não tinham pastor. Mas por que Jesus fez essa
comparação? Porque as pessoas não tinham alimento, água da vida, um
aprisco e alguém que as protegesse e indicasse o caminho para se livrarem
dos perigos.
5. Jesus, como o bom pastor, conforme Ele mesmo se nomeou em João 10.14,
não teria outra atitude senão atender as necessidades fundamentais de todo ser
humano. Jesus queria ensiná-las, trazendo suprimento para a vida espiritual e
para a vida física.
6. Então, diante do avançado da hora, os discípulos apresentaram a Jesus uma
solução (v. 35–36). Mas o Mestre, mostrando mais uma vez cuidado pela
multidão, e querendo também ensinar aos discípulos compaixão e fé,
desafiou-os a que alimentassem a multidão (v. 37). Eram cinco mil homens,
mas se contarmos o mesmo número de mulheres e crianças chegaremos ao
total de quinze mil pessoas.
Os discípulos queriam resolver logo o problema despedindo a multidão. Mas Jesus não concordou
com isso. O Evangelho de João nos diz que foi Filipe quem calculou serem necessários mais de
duzentos denários de pão para dar de comer a todos (Jo 6.7). O denário era o que se pagava ao
trabalhador por um dia de serviço. Os recursos dos discípulos por certo eram poucos e não
chegavam a tantos (PETERSON, 1989, p. 70).

Os discípulos tentaram argumentar em termos racionais, fazendo cálculos


e mostrando os números para Jesus, mas Ele tinha outros cálculos, outra
matemática (v. 38).
7. Conforme o verso 39, Jesus ordenou que a multidão se assentasse numa
grande área verde, formando grupos de 100 ou de 50. Ele tomou os cinco
pães e os dois peixes que os discípulos tinham conseguido e, orando, os
abençoou e começou a repartilos. O milagre da multiplicação se deu. A
multidão se fartou e foram colhidos 12 cestos com as sobras.
Foi um milagre impressionante! Além de Jesus saciar a fome daquela
multidão, demonstrou aos discípulos e a todos nós que não há limites para o
poder de Deus. Parece-nos que Marcos está mostrando realmente quem era
Jesus. Os vizinhos o viram apenas como carpinteiro; a sua família achou que
estava fora de si; Herodes pensou que era João Batista; alguns pensaram que era
Elias ou um profeta; e os próprios discípulos, nesse episódio, não tinham uma
ideia clara sobre quem era Jesus. Eles não sabiam que em certas ocasiões temos
que depender completamente de Jesus. Quando dependemos dele, os milagres
acontecem. Quando você enfrentar uma tarefa aparentemente impossível, faça o
que estiver ao seu alcance, mas ore e peça a Deus que realize o impossível. Dê a
Deus aquilo que lhe pedir, mesmo que seja bem pouco, porque Ele pode querer
fazer o impossível acontecer!
Jesus anda sobre o mar e vai de novo a Genesaré
Mc 6.45–56
No quinto e último episódio deste capítulo, nos versos 45 a 56, encontramos
Jesus andando sobre as águas e indo até Genesaré. Aqui a autoridade de Jesus é
consolidada. Embora o milagre da multiplicação tenha sido narrado nos quatro
evangelhos, esse milagre que aconteceu na sequência só não é relatado por
Lucas. Nós já o estudamos em Mateus 14.22–33, e o estudaremos um pouco
mais em João 6.15–21, mas vale a pena refletir sobre ele sob a perspectiva de
Marcos. Vamos fazer dez considerações a partir desse acontecimento.
1. Conforme o verso 45, Jesus continuava preocupado com os discípulos.
Quando atravessaram o lago indo para Betsaida (v. 31), seu propósito era que
tivessem um tempo em particular e pudessem descansar um pouco. Mas eles
foram surpreendidos com a multidão de aproximadamente quinze mil
pessoas. Depois de dar-lhes o que comer, Marcos nos informa que os
discípulos foram convencidos por Jesus a atravessarem de novo o mar da
Galileia, provavelmente retornando a Genesaré, enquanto Ele mesmo
despedia a multidão (v. 53).
2. Depois dessa grande manifestação, desse milagre incomparável, Jesus foi
refazer suas forças numa conversa, certamente entusiasmada, com o Pai.
Embora sendo Deus, Jesus tinha o hábito de orar, passar tempos preciosos na
presença de Deus Pai (v. 46). Enquanto Jesus estava orando, os discípulos,
alguns deles experientes pescadores, atravessavam o lago e enfrentavam
alguma dificuldade (v. 47–48).
3. Ainda no verso 48, Marcos descreve de maneira específica o que os
discípulos enfrentavam, certamente reproduzindo o que Pedro, um dos
experientes pescadores, posteriormente lhe contou. Por volta da quarta vigília
da noite, isto é, entre 3 e 6 horas da madrugada, sendo-lhes o vento contrário,
eles remavam e não progrediam na viagem.
4. A frase: e, vendo-os em dificuldade (v. 48) é reconfortante. Como é bom
saber que Jesus está sempre olhando por nós e percebendo as nossas
dificuldades! E a providência que Jesus tomou foi aquela que nos dá cada vez
mais confiança. Jesus foi para onde eles estavam e queria tomar-lhes a
dianteira (v. 48). Jesus vem para onde estamos. Ele toma a iniciativa. Ele
quer chegar primeiro, porque as nossas dificuldades são as suas dificuldades.
As nossas lutas são as suas lutas! Que bênção de Salvador nós temos!
Agradeça a Deus por isso!
5. Mas conforme o verso 49, os discípulos ficaram temerosos ao verem Jesus
andando sobre as águas, indo ao encontro deles. Eles pensaram que era um
fantasma. Jesus queria que soubessem que poderiam contar sempre com sua
ajuda. Embora os discípulos não o vissem na hora do aperto, Jesus os via e
sabia o que lhes acontecia e como os socorreria. O interesse de Jesus superou
a falta de fé deles. Da próxima vez que você estiver no meio do mar, numa
tempestade, lembre-se de que Jesus conhece sua situação e está pronto a
ajudá-lo. Ele se importa com cada um de nós!
6. Conforme o verso 50, os discípulos ficaram apavorados, aterrorizados, mas
a presença e as palavras de Jesus os acalmaram. Todos nós sentimos medo.
Você tem tentado se livrar dele sozinho? Ou tem deixado que as palavras de
Jesus lhe tragam segurança e paz? Em épocas de temor e incerteza, é possível
ter tranquilidade e paz ao lembrarmos que Jesus está sempre conosco.
Reconhecer a presença e o poder de Jesus é o antídoto certo contra o medo e
o temor!
Tende bom ânimo! Sou eu. Não temais! (v. 50) são palavras que nos
tiram o temor e nos fazem ser mais confiantes. Mas o verso 51 completa a
tranquilidade que Jesus lhes deu. Ele entrou no barco para estar com eles (v.
51). Perceba a riqueza desse detalhe. Em 3.14, quando Jesus chamou para o
discipulado, chamou-os para estarem com ele, mas agora, quando estavam
em dificuldades, ele foi para estar com eles! É assim que age o nosso Senhor
e Salvador!
7. O verso 52 diz que os discípulos, mesmo depois de terem visto o grande
milagre da multiplicação, continuaram sem fé. Não criam ainda que Jesus
fosse o poderoso Filho de Deus, o próprio Deus encarnado. Eles não
conseguiram transferir a realidade do que viram, isto é, a alimentação de
quinze mil pessoas com apenas cinco pães e dois peixes para as
circunstâncias de suas vidas. O texto fala de forma dura e objetiva que os seus
corações estavam endurecidos.
E nós? Não podemos criticar os doze, porque mesmo quando lemos sobre
esses maravilhosos atos poderosos e bondosos de Jesus, em muitas ocasiões
também não transferimos essas verdades para o nosso dia a dia. Não temos
procedido da mesma forma? Devemos apenas crer! Devemos nos apropriar
desses maravilhosos feitos para as nossas vidas!
8. Mais uma vez Marcos nos conta que Jesus e seus discípulos não tinham
folga. Nos versos 53 e 54, chegando a Genesaré, eles foram logo
reconhecidos e, certamente, o povo estava sempre ao redor deles.
9. Nos versos 55 e 56, o relato chega ao final nos mostrando que Jesus foi e
ainda é um Salvador que não faz acepção de pessoas. Genesaré era uma
cidade situada na planície fértil a oeste do mar da Galileia. Ficava próxima a
Cafarnaum, e por estar na região da Galileia, seu povo era mais pobre e
discriminado pela aristocracia judaica, a tal ponto de ser chamada de Galileia
dos gentios.
10. O texto, porém, nos relata que Jesus percorreu toda aquela região
anunciando as boas novas e curando a muitos. Mas o que se destaca nesse
final de relato é a incapacidade dos próprios discípulos de compreenderem
quem era Jesus. Um ser divino que podia alimentar quinze mil pessoas, mas,
ao mesmo tempo, que atendia alguns excluídos.
Toda a história, a partir do verso 45 teria sido desnecessária se não tivesse faltado aos discípulos a
compreensão cristológica e, com isso, a dissociação definitiva da esperança messiânico-política dos
judeus. Os judeus não tinham uma expectativa grande demais, mas pequena demais… eles não
deixaram Deus ser Deus e, sempre de novo se incomodavam com Jesus… Também a aparição
grandiosa sobre a água tinha seus limites (para a compreensão dos discípulos)… Estes só foram
entendidos pela cruz de Jesus. O Gólgota foi o ponto culminante da sua revelação… (POHL, 1998,
p. 220).

Sim! Jesus revelou de forma clara e objetiva a sua autoridade, mas mostrou
nesses episódios o seu grande amor e compaixão. Jesus mostrou que o seu
propósito e o do evangelho é resgatar o ser humano na sua integralidade. Não
apenas espiritualmente, mas fisicamente também. Assim, o convite é para que
você entregue seus problemas a Jesus. Ele é um Salvador poderoso! Se Jesus é
seu Senhor e Salvador, entregue-lhe todos os seus problemas. Mas se ainda não
é, entregue-lhe a sua vida! Vale a pena!

Marcos 7 - O servo repudiado pelos


líderes judeus estende suas bênçãos aos
gentios
O que contamina o homem, a libertação de uma menina e a cura de um
surdo-gago
Em termos cronológicos, o capítulo 7 relata três episódios relativos ao último
ano do ministério de Jesus Cristo. Conforme Souza (2008, p. 197), comumente
esse ano é chamado de “Ano da Paixão”. Sem se preocupar com qualquer
aspecto cronológico ou geográfico, Marcos continua mostrando Jesus, o servo
em ação. Porém, essas ações de Jesus ao noroeste da Palestina, chegando à
região de Tiro e Sidom, são fruto da rejeição, do repúdio e da oposição que se
levantava contra Jesus e o desenvolvimento do seu ministério. Logo depois da
maravilhosa multiplicação dos pães e peixes, conforme o relato de João, as
reações ao milagre foram as mais diversas possíveis.
O evangelho de João relata mais que o de Marcos a respeito do colapso da campanha de Jesus na
Galileia. Lendo Jo 6.22–71, observa-se porque os judeus rejeitaram a Jesus como seu Messias,
nessa ocasião. Observa-se, também, que alguns de seus discípulos o abandonaram nesta mesma
época (Jo 6.60–67) (JENSEN, 1987, p. 62).

Ao milagre da multiplicação, tivemos pelo menos quatro reações distintas:


A. A população recusou o messianato de Jesus, pois queria fazê-lo rei, mas
Ele não aceitou (Jo 6.15).
B. Os líderes judaicos cada vez mais o rejeitavam por causa da inveja e do
ciúme.
C. Muitos seguidores de Jesus o abandonaram diante do duro discurso que
fez depois da multiplicação (Jo 6.60–66).
D. Os doze, através de Pedro, se comprometeram a ficar com Jesus, pois
reconheceram: Tu tens as palavras da vida eterna; e nós temos crido e
conhecido que tu és o Santo de Deus (Jo 6.68–69).
O desejo de Marcos era mostrar que Jesus veio para morrer na cruz em nosso
lugar e fazer a vontade do Pai, concretizando o eterno plano salvador na cruz.
Isso ficará mais evidente a partir do capítulo 11, quando ele nos relatará a última
semana de Jesus antes da sua crucificação. Porém, tendo o seu objetivo bem
delineado, sabendo o perfil do seu público alvo e sem se ocupar detalhadamente
com a geografia ou com a cronologia, Marcos, neste capítulo, continuou
enfatizando três aspectos prioritários do ministério de Jesus: o ensino, o poder
contra Satanás e a compaixão em atender os necessitados. Vamos estudar estes
37 versos dividindo-os em três eventos:
Parte 1 – Jesus mostra o que contamina o homem (v. 1–23)
Parte 2 – Jesus expulsa o demônio de uma menina (v. 24–30)
Parte 3 – Jesus cura um surdo-gago (v. 31–37)
Jesus mostra o que contamina o homem
Mc 7.1–23
O primeiro acontecimento narrado por Marcos, nos versos 1 a 23, nos mostra
Jesus defrontando-se com a tradição judaica. Alguns fariseus e escribas, vindos
de Jerusalém para observar tudo o que diziam a seu respeito, do seu ensino e dos
milagres que fazia, vendo o procedimento dos discípulos, quiseram confrontá-lo,
pois os doze não respeitavam a tradição religiosa.
Você deve se lembrar que ao estudarmos o evangelho de Mateus
mencionamos que durante os 400 anos de silêncio entre o Antigo Testamento e o
Novo Testamento, muitos acontecimentos ocorreram na história e na vida
religiosa de Israel. Desde o período do exílio da Babilônia até os dias de Jesus
surgiram movimentos entre os judeus, que no início tinham boas intenções.
Além de outros, surgiram os fariseus e os saduceus, seitas dentro do judaísmo,
todas com uma expectativa muito específica: a vinda de um messias libertador.
Era a “esperança messiânica” a motivação de todos esses movimentos.
Porém, com o tempo, muitas tradições e interpretações da lei foram se
cristalizando, tornando-se mais rígidas que a própria lei. Não havia a
preocupação de entender o espírito ou a razão de ser da lei. As interpretações se
tornaram lei e essas tradições exigiam determinados procedimentos. Assim,
quem não obedecesse integralmente de forma cuidadosa cada detalhe da tradição
dos anciãos era considerado pecador, isto é, desqualificado como judeu. Por isso
a menção, em várias ocasiões, da expressão “publicanos e pecadores”.
Publicanos eram os judeus que trabalhavam como funcionários públicos para o
governo romano. Pecadores eram os judeus que não cumpriam as exigências da
tradição. Enquanto isso, os religiosos, quer fariseus, saduceus ou escribas, se
consideravam puros, respeitadores da lei e verdadeiros filhos de Abraão.
Foi com esses que cumpriam a letra da lei sem se preocuparem com a
motivação da obediência que Jesus sempre teve atrito. Por quê? Porque Jesus
enfatizava o interior, a motivação, o espírito com que se desenvolviam as
práticas religiosas. Jesus os acusava de serem hipócritas, isto é, falsos. Jesus os
chamou de sepulcros caiados, onde por fora está tudo bonito, tudo pintado, mas
no interior há podridão, imundície e morte. Então, no primeiro evento do
capítulo 7, Jesus confronta mais uma vez essa maneira inadequada e superficial
de nos relacionarmos com a lei.
O confronto é com os fariseus e os escribas. Eles eram inimigos de Jesus e
queriam destruí-lo. Jesus era amado pelos apóstolos e discípulos, mas odiado e
perseguido pelos religiosos. Mas não devemos nos admirar. O mundo continua
exatamente assim. Uns se colocam a favor de Jesus e outros contra. E você, qual
é a sua posição em relação a Jesus? É… Você pode dizer que faz parte de uma
denominação cristã, de uma igreja ou de uma comunidade que tem normas claras
e seguras. Mas a pergunta objetiva é: Qual é a sua posição em relação a Jesus?
Você o ama, só quer os seus milagres ou o rejeita? Essa é uma resposta que só
você pode dar!
A questão levantada era sobre a tradição de lavarem as mãos antes das
refeições. Era uma questão cerimonial, de etiqueta social, quer dizer, não era
realmente importante. E Marcos explica tudo detalhadamente, pois seus leitores
eram romanos e não conheciam essas tradições. Aquelas normas eram costumes
cerimoniais de limpeza, de purificação, peculiares ao povo de Israel. Deus havia
dado a Israel, no passado, ordens e ritos que enfatizavam a limpeza. Quando
estudamos o livro de Levítico, vemos as várias determinações que enfatizavam a
pureza cerimonial e a santidade que o povo devia ter para se relacionar com
Deus. Deus tinha formulado ordens claras, mas os judeus haviam criado
tradições e interpretações bem pessoais a esse respeito. Baseados nessas
tradições humanas é que os fariseus e escribas vieram a Jesus para discutir.
Jesus não reconhecia essas tradições humanas. Os líderes religiosos estavam
condenando os discípulos de Jesus porque eles comiam sem lavar as mãos.
Estavam com muito ciúme da popularidade de Jesus diante das multidões e,
ainda com temor de afrontá-lo diretamente, procuravam combatê-lo acusando os
discípulos, como já tinham feito em 2.24. Para esses religiosos, a pureza exterior
era importante demais. Não cumprir essas determinações representava um
grande pecado, mas para Jesus o conceito dos fariseus era baseado numa
premissa falsa. Havia um grande afastamento da intenção da lei, do espírito da
lei. Era uma religião que valorizava o ritualismo, mas não se importava com o
amor, a misericórdia e a fé. Na prática, os fariseus estavam mais preocupados em
obter a aprovação dos homens do que a de Deus.
Jesus respondeu-lhes citando as Escrituras tão veneradas por eles. Mas não
citou as leis, citou o profeta Isaías, conforme os versos 6 a 9:
6. Bem profetizou Isaías a respeito de vós, hipócritas, como está
escrito: Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está
longe de mim.
7. E em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de
homens.
8. Negligenciando o mandamento de Deus, guardais a tradição dos
homens.
9. E disse-lhes ainda: Jeitosamente rejeitais o preceito de Deus para
guardardes a vossa própria tradição.
Jesus tratou seus oponentes chamando-os de hipócritas. Hipócrita hoje
significa um religioso fingido, uma pessoa que simula ser boa, piedosa, mas não
é. Foi com este sentido que Jesus também usou a palavra, endereçando-a aos
fariseus e escribas. Esta palavra era usada para designar um ator. Estes inimigos
de Jesus eram como atores que fingiam viver uma realidade que não era a deles.
Eles passavam por algum ritual religioso, mas não tinham vida, não havia
autenticidade. “Em vez de reconhecerem a palavra de Deus como autoridade
exclusiva em todos os assuntos de fé e moral, eles se esquivavam ou explicavam
as claras exigências das Escrituras por meio de sua tradição” (MACDONALD
2008, p. 125).
Na verdade, seus lábios podiam até dizer uma coisa, mas o coração não estava
sentindo nada. Eles eram como bonecos sobre os joelhos de um ventríloquo. Mas
este mal não estava presente somente naquela época, não era apenas uma
peculiaridade dos fariseus e escribas. Infelizmente, há muita gente hoje que se
diz cristã e recebe os sacramentos da igreja e os demais ritos sem ter passado por
nenhuma experiência de transformação espiritual. Não houve conversão. Não há
coração, não há autenticidade em sua vida. Muitas denominações ficam com as
tradições cristãs e perdem Cristo. O cristianismo é Cristo, o cristão verdadeiro
vai a Cristo diretamente pela fé, porque cristianismo é Cristo. Esta é a razão
porque muitas religiões ou ramos do cristianismo, que antes serviam a Deus,
hoje estão longe de Deus, servindo as tradições humanas.
Nos versos 10 a 13, Jesus, ainda usando as Escrituras do Antigo Testamento,
exemplificou seu ensino, citando:
10. Pois Moisés disse: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser
a seu pai ou a sua mãe, seja punido de morte.
11. Vós, porém, dizeis: Se um homem disser a seu pai ou a sua mãe:
Aquilo que poderias aproveitar de mim é Corbã, isto é, oferta para o
Senhor,
12. então, o dispensais de fazer qualquer coisa em favor de seu pai ou
de sua mãe,
13. invalidando a palavra de Deus pela vossa própria tradição, que vós
mesmos transmitistes; e fazeis muitas outras coisas semelhantes.
O que Jesus disse condenando os fariseus deve ser bem entendido. Eles
estavam descuidando de cumprir seus deveres ao se desculparem dizendo que
estavam dando ofertas para o templo e, por isso, não podiam e nem se sentiam
na obrigação, no dever, de ajudar a seus pais idosos. Jesus, usando essa prática
hipócrita, os condenou severamente.
Quando entendemos o significado dessa ação dos fariseus podemos entender
a dura reação de Jesus. É que, de acordo com esta tradição dos fariseus, aqueles
que não quisessem ajudar o pai ou a mãe, quando eles se tornassem velhos e
necessitados, dedicavam suas possessões ao sacerdócio no templo. Isso era
chamado Corbã, que quer dizer oferta ou dedicação. Com esta contribuição para
o serviço religioso, eles se achavam completamente desobrigados em relação aos
seus pais idosos, passando essa responsabilidade para o templo ou para o estado.
Esta era uma tradição perniciosa, que desconsiderava os pais que tinham criado
aqueles filhos e, sobretudo, contradizia o ensino da lei de Deus, que mandava
honrar pai e mãe.
Muitos hoje também correm o risco de cometer a mesma falha, quando
deixam de assistir aos pais idosos para darem o seu dinheiro a determinadas
organizações. Uma coisa não substitui a outra. Muitos cristãos não estão
querendo fazer mais nada pessoalmente. Entregam seu dinheiro a alguma
organização, e então ela que se responsabilize. Isto é perigoso. Há
responsabilidades pessoais que devem ser cumpridas e que não podemos
transferir para os outros.
Depois de mostrar como os religiosos burlavam o significado da lei, Jesus
convocou a multidão, os fariseus e escribas e lhes disse o que de fato contamina
o homem. Jesus fez então uma afirmação revolucionária: Não é a falta de lavar
as mãos que contamina o homem. O que verdadeiramente o contamina é o que
está em seu coração, é o que sai do seu coração, isto é, o desejo de burlar a lei. E
depois, em separado, em casa, explicou aos discípulos o significado de suas
palavras.
Jesus quer que compreendamos que aquilo que vem de fora, que entra no
homem, não pode contaminá-lo, porque não entra no coração. O alimento que
entra na boca e vai para o sistema digestivo não contamina o homem e, assim,
também considerou puros todos os alimentos. Mas Jesus ensinou que o que sai
do homem, aquilo que vem do seu interior, isso sim contamina o homem. Por
quê? Porque de dentro, do coração, é que procedem as más intenções que
contaminam.
Esses mesmos pecados encontram-se nos jornais de hoje como uma prova de
que o que Jesus disse naquele tempo continua sendo uma triste realidade hoje.
Vemos as ações dos homens maus por toda parte, o mau desígnio, a prostituição,
o furto, o homicídio, o adultério, a avareza, a malícia, o dolo, a lascívia, a inveja,
a blasfêmia, a loucura, o orgulho, a vaidade, a maldade, o crime, enfim todos os
vícios de uma sociedade que vive longe de Deus. Todas essas ações brotam do
interior, da mente do homem. Por isso, Jesus disse que era necessário que o
homem nascesse de novo para ver o reino de Deus. Você já nasceu de novo? O
seu interior já foi transformado por Jesus Cristo?
Jesus expulsa do demônio de uma menina
Mc 7.24–30
Os versos 24 a 30 nos relatam o caso da mulher siro-fenícia, uma gentia. Ela
veio a Jesus pela fé e pediu que curasse a sua filha que estava possessa de um
demônio. Jesus, testando-lhe a fé e persistência até de forma pejorativa, disse-lhe
que não era bom dar a comida dos filhos aos cachorrinhos. Com essas palavras
Ele mostrou também que o plano divino era que a salvação fosse apresentada
primeiramente aos judeus.
A figura de linguagem que Jesus usou para afirmar esse fato foi aquela em que os judeus eram
representados como filhos, os gentios como cachorrinhos… Isto é, animais de estimação, e não os
cachorros do pátio e das ruas, e os benefícios do ministério de Jesus como o pão dos filhos
(BRUCE, 2009, p. 1615).

Porém, conforme o verso 28, a mulher concordou com Jesus, chamando-o


reverentemente de Senhor. Inclusive, esta é a única vez em que Jesus é chamado
de Senhor neste evangelho! Mas ao concordar com Jesus, a mulher levou o
argumento dele mais adiante e disse que os cachorrinhos também se
alimentavam das migalhas que caíam da mesa dos filhos, das crianças. Esta
humildade da mulher, acompanhada de uma grande fé, certamente mexeu com
Jesus e o levou a dizer-lhe simplesmente: Por causa desta palavra, podes ir; o
demônio já saiu de tua filha (v. 29). E conforme o verso 30: Voltando ela para
casa, achou a menina sobre a cama, pois o demônio a deixara.
É interessante observarmos esse detalhe que Marcos destaca aqui. Jesus
expulsou o demônio que dominava aquela menina à distância. Para Jesus, a
distância não representava nenhum obstáculo. O poder de Jesus supera qualquer
distância, qualquer dificuldade. Quando a mãe chegou em casa encontrou a
menina completamente curada, pois o espírito mal já a havia deixado diante do
poder de Jesus. Este milagre mostra que Jesus é tão poderoso que não precisa
estar presente em pessoa para libertar alguém. Jesus é tão poderoso que supera
os nossos impossíveis. Você tem experimentado isso em sua vida diária?
Humilhe-se diante dele, reconhecendo-o como Senhor. Tenha fé e persista. Jesus
é poderoso e pode abençoá-lo!
Jesus cura um surdo-gago
Mc 7.31–37
Este é o último evento do capítulo 7. E é mais um trecho exclusivo. Mateus,
Lucas e João não citam esse milagre. Aqui temos o relato da cura do surdo e
gago realizada por Jesus. O texto diz:
31. De novo, se retirou das terras de Tiro e foi por Sidom até ao mar
da Galileia, através do território de Decápolis.
32. Então, lhe trouxeram um surdo e gago e lhe suplicaram que
impusesse as mãos sobre ele.
33. Jesus, tirando-o da multidão, à parte, pôs-lhe os dedos nos ouvidos
e lhe tocou a língua com saliva;
34. depois erguendo os olhos ao céu, suspirou e disse: Efatá!, que quer
dizer: Abre-te!
35. Abriram-se-lhe os ouvidos, e logo se lhe soltou o empecilho da
língua, e falava desembaraçadamente.
36. Mas lhes ordenou que a ninguém o dissessem; contudo, quanto
mais recomendava, tanto mais eles o divulgavam.
37. Maravilhavam-se sobremaneira, dizendo: Tudo ele tem feito
esplendidamente bem; não somente faz ouvir os surdos, como falar os
mudos.
Constatamos mais uma vez que para Jesus não há doenças ou enfermidades
que não possam ser curadas. Os métodos que usava e usa para curar são
diferentes. Jesus não seguia um padrão nas suas ações e isso nos mostra que o
apego a certas metodologias, em vez de ser positivo, impede a manifestação livre
do Senhor e do Espírito Santo. Muitas vezes transformamos algo que deu certo
em tradição, mas esse tipo de atitude impede a livre ação do Senhor.
Ao mesmo tempo temos que aprender que não houve um só caso que Jesus
não pudesse resolver. E Jesus tudo pode, porque é Deus. Este homem que estava
impedido de ouvir e falar recebeu completa restauração. O povo então ficou
maravilhado com Jesus, e disse: Tudo ele tem feito esplendidamente bem (v.
37). E, de fato, Jesus é assim. Tudo o que faz, faz muito bem. Devemos nos
achegar a Ele com confiança e fé.
Mas será que a lição principal desse texto é apontar mais uma vez que Jesus é
poderoso sobre as nossas necessidades físicas? Além dessa lição, podemos
aprender outras, quando focalizamos esse texto dando-lhe um significado mais
profundo. Certamente a cura do surdo e gago pode nos mostrar outros detalhes
importantes. Com essa mesma visão, Ryle (2007, p. 92) comenta:
Um dos intuitos desse incidente é percebermos o poder de nosso Senhor para curar os
espiritualmente surdos. Cristo pode conferir ao principal dos pecadores um ouvido que ouve… e,
uma outra finalidade desse registro sagrado é vermos o poder que o nosso Senhor tem de curar os
espiritualmente mudos. Cristo é poderoso para ensinar ao mais duro dos transgressores a invocar a
Deus…

Você crê que Jesus pode transformar assim a vida de uma pessoa? Você tem
experimentado Jesus dessa maneira? Entregue a sua vida e experimente as
transformações que só Ele pode fazer. Confie e descanse em Jesus!

Marcos 8 - O servo e a sua identificação


A segunda alimentação, o pedido de um sinal e a confissão de Pedro
Ao iniciarmos o estudo do capítulo 8 é possível refletir sobre as nossas
motivações. Muitos cristãos agem procurando a aprovação e o reconhecimento
das pessoas que se encontram ao seu lado. Outros agem por dever da
consciência. Ajudam, auxiliam e prestam socorro porque sabem que isso é certo.
E já que é certo, para aliviarem a consciência, assim agem. Ainda outros agem
para mostrar que, como cristãos, são prestativos e diferentes, são mais
espirituais. Infelizmente, o que vemos em muitos casos, se não na maioria deles,
é exatamente isso: a motivação que impulsiona a ação de muitos não é genuína,
a que deveria brotar de um coração sincero, puro e honesto.
No primeiro episódio desse capítulo percebemos que o sentimento que
constantemente levava Jesus a agir era a compaixão que sentia pelas pessoas,
pelas multidões que vagavam como ovelhas sem pastor (v. 2; 6.34). O problema
é que o nosso contato diário com o mundo, com a dureza da vida, com a
desvalorização da vida humana e com o recebimento constante das mais diversas
informações, umas boas, outras tristes, umas esperançosas, outras inquietantes,
nos deixam insensíveis e endurecidos. Assentados, estamos habituados a ver,
ouvir ou ler diferentes notícias que não nos abalam mais.
Mas, o coração do Senhor Jesus permanecia divinamente sensível. O estado do surdo e gago, no
capítulo 7.34, o fez suspirar, erguendo os olhos ao céu. Aqui no versículo 12, é a incredulidade dos
fariseus que o faz suspirar profundamente. E, finalmente, a dureza do coração dos seus discípulos
também o aflige (conforme 6.52 e 7.18)… (KOECHLIN, 2001, p. 85).

Será que continuaremos com nossa insensibilidade, ou através do exemplo de


Jesus pediremos que Ele mesmo nos conceda a sua compaixão? Neste capítulo
temos sete episódios nos quais Jesus se revelou ainda mais claramente aos
líderes judaicos, às multidões e especialmente aos discípulos, mostrando-se não
apenas alguém cheio de poder e virtudes, mas sensível e comprometido em
trazer salvação para toda a raça humana, mesmo que isso lhe exigisse a vida. Por
compaixão, graça e amor, Jesus se deu por nós. Que ao nos espelharmos no
exemplo e nas atitudes de Jesus, possamos nos doar pelos nossos semelhantes!
Vamos estudar esses sete episódios identificadores de Jesus:
Parte 1 – Jesus realiza pela segunda vez o milagre da multiplicação de pães e
peixes (v. 1–10)
Parte 2 – Jesus sofre com a incredulidade dos líderes judaicos (v. 11–13)
Parte 3 – Jesus previne os discípulos sobre o fermento dos fariseus (v. 14–21)
Parte 4 – Jesus cura um cego em Betsaida (v. 22–26)
Parte 5 – Jesus é identificado como Cristo, o Messias de Israel (v. 27–30)
Parte 6 – Jesus prediz pela primeira vez a sua morte e ressurreição (v. 31–33)
Parte 7 – Jesus apresenta os requisitos do discipulado (v. 34–38)
No capítulo 8, chegamos a um ponto muito importante desse evangelho. Aqui
encontramos pela segunda vez a menção do título “Cristo” (a primeira vez foi
em 1.1). E é somente depois dessa identificação, professada por Pedro, que esse
título é usado por Marcos mais cinco vezes (9.41; 12.35; 13.21; 14.61; 15.32),
demonstrando que, a partir daqui, Jesus não teve mais a preocupação de manter
o “segredo messiânico”. Vamos ao estudo de cada um desses parágrafos.
Jesus realiza pela segunda vez o milagre da multiplicação de pães e
peixes
Mc 8.1–10
Nesses versos encontramos o relato da segunda multiplicação de pães e peixes,
que não deve ser confundida com a primeira, embora Lucas e João não a
mencionem. Novamente uma grande multidão foi alimentada de modo
milagroso, de modo sobrenatural. Era uma multidão de quatro mil homens. Se
contarmos as mulheres e crianças, possivelmente chegaremos a um grupo de dez
a doze mil pessoas, vindas de diversos e alguns longínquos lugares.
Esse milagre aconteceu em Decápolis, ou região das Dez Cidades, onde Jesus
estava, conforme vimos em 7.31. Isso nos mostra que Jesus estava ministrando e
se revelando também aos gentios. A ministração aos gentios demonstra que a
mensagem do evangelho não era e nunca foi destinada somente aos judeus. A
salvação que Deus nos oferece, embora tenha sido anunciada primeiramente aos
judeus, são boas notícias para todos os povos.
Diversos estudiosos têm afirmado que este relato é uma duplicação da
primeira multiplicação que estudamos em 6.30–44. Mas não podemos aceitar
essa colocação, porque temos pelo menos cinco detalhes diferentes nos dois
relatos:
A. Nesta segunda multiplicação o local é diferente (Decápolis). Em 6.32,
um lugar a nordeste do mar da Galileia.
B. O tempo que a multidão estava com Jesus é diferente (aqui, três dias).
Em 6.35, apenas um dia.
C. Quem tomou a iniciativa de resolver o problema da fome da multidão
foram sujeitos diferentes (aqui, Jesus se sentiu sensibilizado com a
multidão). Em 6.35–36, foram os discípulos.
D. O termo grego usado para a palavra cesto e a quantidade deles são
diferentes (aqui, Marcos menciona sete sturídas [cesto de corda
suficientemente grande para carregar um homem – At 9.25]). Em 6.43,
foram doze kofinon (cesto de vime para carregar manualmente os
alimentos).
E. O número de pessoas é diferente (aqui, quatro mil homens). Em 6.44,
cinco mil homens. Portanto, podemos afirmar que são dois eventos em que
Jesus demonstrou o seu amor e poder, socorrendo o povo necessitado.
Depois desses esclarecimentos temos que considerar algumas lições, a partir
de atitudes da multidão, dos discípulos e de Jesus.
Em primeiro lugar, a multidão teve as seguintes atitudes:
A. Seguia a Jesus para ouvi-lo ensinar.
B. Seguia a Jesus para ser curada e liberta.
C. Seguia a Jesus para comer, pois já tinha a experiência da primeira
multiplicação.
D. Queria fazê-lo rei (Jo 6.15), pois esse era o conceito que tinha de
messias.
E. Procurava mais a satisfação física do que a espiritual.
Em segundo lugar, os discípulos tiveram as seguintes atitudes:
A. Estavam em processo de treinamento e, por isso, foram desafiados
novamente a crer no poder de Jesus.
B. Ficaram perplexos diante do problema, por não se lembrarem do
milagre anterior, da primeira multiplicação.
C. Procuraram a solução humana – temos sete pães e alguns peixinhos.
D. Tiveram oportunidade de pegar com as mãos o milagre de Jesus,
distribuindo pães e peixes para a multidão.
E. Comprovaram mais uma vez, ao recolherem sete cestos do que sobrou,
que o poder de Jesus é superabundante.
Em terceiro lugar, Jesus teve as seguintes atitudes:
A. Teve compaixão do povo.
B. Treinando os discípulos, compartilhou com eles o problema.
C. Pediu a participação dos discípulos na solução do problema.
D. Orou ao Pai, demonstrando submissão e dependência, ensinando-nos a
levar todas as dificuldades a Deus, e assim os pães e peixes foram
multiplicados.
E. Incentivando-os à fé, fez com que os discípulos tivessem em suas mãos
o milagre concreto, amoroso e poderoso de Deus.
Quando destacamos a motivação da multidão em seguir a Jesus, devemos
refletir sobre nós mesmos: seguimos a Jesus por amá-lo de todo coração,
entendimento e forças, ou o seguimos por aquilo que podemos obter dele? Em
relação aos discípulos, podemos destacar que, assim como eles, muitas vezes
esquecemos do que Deus já fez para nós e ficamos procurando soluções
humanas para os nossos problemas. Falta-nos a fé, a visão de que temos um
Senhor amoroso e poderoso. E em relação a Jesus, devemos aprender, através de
seu exemplo, sobre o amor, a compaixão, o tratamento igualitário que dispensava
a todos os necessitados e a paciência que tinha ao tratar os discípulos aprendizes.
Assim como mencionamos anteriormente, ao aplicarmos essas lições às
nossas vidas, devemos atentar para a natureza da necessidade e a resposta que o
Senhor Jesus ofereceu à situação:
A necessidade do alimento é uma das mais básicas da natureza humana. Jesus não estava
preocupado somente com a condição espiritual do povo. Ele também foi movido pela compaixão
diante da fome física. Não poderemos representar adequadamente a Jesus se formos levados apenas
pela necessidade de resgatar almas perdidas. Para representar Jesus devemos nos preocupar com os
famintos, com aqueles que não têm onde morar, e com os oprimidos, da mesma maneira que Jesus
preocupou-se com as multidões famintas (RICHARDS, 2007, p. 112).

Que o Senhor nos conceda condições de sairmos da nossa “zona de conforto”


para aplicarmos essas verdades! Só assim Jesus será visto em nossas vidas.
Jesus sofre com a incredulidade dos líderes judaicos
Mc 8.11–13
Nos versos 11 a 13, encontramos o relato de mais uma controvérsia entre Jesus e
os fariseus:
Ao voltar do território gentio, Jesus enfrentou mais uma vez a incredulidade dos fariseus. Seu
pedido de um sinal vindo do céu foi uma obra-prima da hipocrisia, uma vez que haviam
deliberadamente atribuído a evidência disponível ao poder à atividade do príncipe dos demônios (cf.
3.22) (CARDOSO PINTO, 2008, p. 93).

Os fariseus que acusavam Jesus de realizar os milagres pelo poder do


Maligno exigiram um sinal divino como credencial. Pediram que Jesus lhes
desse um sinal divino da sua autoridade, de sua messianidade. Mas Ele não os
atendeu. Mesmo que fizesse algum sinal, não os convenceria, pois a motivação
deles ao fazer esse pedido, além da descrença, era desafiá-lo.
Diante desse pedido que revelava incredulidade, Jesus arrancou do íntimo do
seu espírito um gemido, e disse: Por que pede esta geração um sinal? Em
verdade vos digo que a esta geração não se lhe dará sinal algum (v. 12).
Jesus não estava disposto a discutir com os fariseus, nem interessado em
satisfazer a curiosidade deles, fazendo milagres para lhes agradar. Jesus não
realizava sinais por encomenda, principalmente para aqueles que, incrédulos,
queriam testá-lo. Quando Jesus exercia seu poder sobrenatural era para ajudar
alguém, nunca para promover espetáculo.
Jesus procede de igual modo ainda hoje. Os corações humanos podem estar
endurecidos de tal forma que o interesse pelos sinais é motivado apenas pelo
espetáculo e pelo desafio da incredulidade. Muitas vezes nem sequer os fatos e
as demonstrações sobrenaturais convencem os corações empedernidos. Portanto,
ao orar pedindo que Jesus atenda seu pedido de modo sobrenatural, lembre-se de
que, antes de tudo, Jesus só trará solução para o seu caso se for algo que esteja
de acordo com a vontade dele e se trouxer glória ao nome de Deus. Testar ou
tentar Jesus não dá certo, não é correto. Por isso, Jesus embarcou e foi para o
outro lado do mar da Galileia. Será que Jesus atenderá outros lugares e outras
pessoas por causa da nossa incredulidade?
Jesus previne os discípulos sobre o fermento dos fariseus
Mc 8.14–21
Nos versos 14 a 21, encontramos o terceiro episódio narrado por Marcos neste
capítulo. Aqui, Jesus estava ensinando os discípulos sobre o perigo das
interpretações dos fariseus, dos legalistas. A advertência é contra os falsos
ensinamentos que valorizavam a letra e não o espírito, o significado dos
mandamentos. Os discípulos não entenderam quando Jesus falou do fermento.
Pensaram que Ele se referia ao pão que não tinham levado consigo para mais
uma viagem. A mente dos discípulos ainda estava fechada para as realidades
espirituais.
Mais uma anotação negativa a respeito dos discípulos. Com tantos cestos de pão que haviam
sobrado, esqueceram-se de levar pão consigo. É como se estivessem bem distantes da dinâmica que
Jesus imprimia ao novo povo de Deus. Suas disposições, ao contrário, eram bem parecidas com as
dos adversários, dos fariseus. Estavam bloqueados pela dureza do coração (3.5–6; 8.12 e v. 17).
Nem chegaram a perceber que havia um pão no barco (v.14). E é muito provável que esse único pão
existente no barco seja o símbolo da presença de Jesus. Marcos é o único a falar disso, justamente
num contexto todo ele evocativo da eucaristia… (SOARES, 2002, p. 293).

Quando Jesus falou sobre o fermento dos fariseus e de Herodes neste texto, o
fermento simbolizava o mal. Da mesma maneira que para a massa do pão crescer
basta uma pequena quantidade de fermento, a dureza do coração dos líderes
judeus podia penetrar e contaminar toda a sociedade judaica e fazer com que as
pessoas não cressem em Jesus, o que infelizmente, posteriormente, de fato ficou
constatado.
Jesus chamou a atenção dos discípulos para a interpretação errada que deram
à sua palavra. Ele não estava preocupado com o pão físico. Afinal, já tinha
multiplicado pães e peixes em duas ocasiões. E se lhes faltasse alimento,
certamente teria condições de providenciá-lo.
Jesus advertiu os discípulos, e nos adverte, para não sermos vagarosos no
entendimento das coisas espirituais. Embora Cristo nos tenha feito superar
provações e tentações no passado, em muitas ocasiões temos dificuldade em crer
que Ele também o fará no presente.
Será que o seu coração está tão fechado que você não consegue compreender
tudo o que Deus pode fazer em seu favor?
Não seja como os discípulos, demorando para entender os ensinos de Jesus.
Ouça Jesus e não as falsas interpretações dos líderes que se acham acima dos
princípios da lei divina. Infelizmente temos hoje no cenário evangélico, no
cenário denominado “gospel”, muitos líderes declarando-se “ungidos do Senhor”
e proclamando verdades bíblicas misturadas com interpretações humanas. É o
próprio fermento que dentro da massa a contamina e a faz crescer. Jesus chama
nossa atenção para essa situação: devemos estar prevenidos (v. 15), nos guardar
(v. 15), considerar (v. 17), ver (v. 18), ouvir (v. 18), nos lembrar (v. 18) e
compreender (17,21) para não sermos enganados pelos outros e por nós mesmos!
Jesus cura um cego em Betsaida
Mc 8.22–26
Nesses versos encontramos mais um relato exclusivo de Marcos. O evangelista
nos fala sobre a cura de um cego. Os ensinamentos do parágrafo anterior
aconteceram no barco, enquanto estavam indo para Betsaida. Os ensinamentos
aqui descritos acontecem em terra firme, em Betsaida. Ao chegarem naquela
cidade trouxeram a Jesus um cego, pedindo que o Mestre o tocasse. Ele se
retirou com o cego para um local mais reservado, fora da aldeia, e ali realizou
um dos milagres mais peculiares, narrado somente neste evangelho. Foi um
milagre realizado em duas etapas.
Jesus usou um método bem peculiar para dar vista ao cego. Ele usou sua
própria saliva para restabelecer-lhe a visão, certamente para desafiar, comprovar
e aumentar a fé dele. Depois de aplicar saliva nos olhos do cego, perguntou-lhe
se estava vendo. O homem olhou ao redor e disse que estava vendo pessoas
como árvores, andando. Certamente aquele cego já tinha se chocado com alguma
árvore nas suas andanças, por isso podia reconhecer uma árvore, com seu tronco
e galhos. Porém, ele via as pessoas que, como árvores, se movimentavam. Daí a
razão da sua resposta.
Alguns têm tentado explicar porque Jesus fez esse milagre em duas etapas, e
uma possível explicação é que na primeira, no primeiro toque de Jesus, os olhos
foram atingidos e assim ele recobrou a capacidade de ver, de enxergar (v. 24). Na
segunda etapa, Jesus colocou novamente a mão sobre os olhos do cego,
provavelmente atingindo e capacitando o cérebro a dar-lhe a percepção mental
das imagens captadas pelos olhos, e assim, conforme o verso 25, o cego ficou
completamente restabelecido, distinguindo todas as coisas perfeitamente.
Que lição podemos tirar desse milagre especial? Certamente Jesus quis nos
mostrar que algumas curas são feitas gradualmente e não instantaneamente.
Jesus quis mostrar que as verdades espirituais são compreendidas
progressivamente. Mas este milagre pode ser usado como um exemplo da
condição do crente hoje. Nós não vemos as coisas espirituais completamente
nítidas, pois como diz o apóstolo Paulo, vemos parcialmente, como que por meio
de espelho (1Co 13.12).
Há muitos que dizem que entendem todas as coisas espirituais de modo
completo, de modo perfeito, porque têm o dom do discernimento espiritual.
Entretanto, creio que essa afirmação é muitas vezes usada incorretamente, com
orgulho e arrogância. Ninguém hoje pode dizer que tem conhecimento perfeito
de todas as coisas espirituais. Há certas coisas que ainda não entendemos
perfeitamente, por isso o Espírito Santo nos foi dado, para nos guiar a toda a
verdade.
Um dia nós conheceremos a Cristo perfeitamente, pois o veremos face a face
(1Jo 3.2). Porém, por enquanto, vemos como que por espelho. Por isso é que nos
reunimos para estudar a Palavra de Deus. Por isso é que temos programas em
que se estuda a Bíblia com profundidade para entendermos, para percebermos
suas lições e aplicá-las em nossas vidas. É com a iluminação do Espírito Santo
que vamos entendendo e vendo mais nitidamente.
O que aprendemos através dessa cura especial é que Jesus usa métodos
diversos para atender as pessoas. Vemos aqui Jesus tocando nos olhos deste
homem. Em algumas ocasiões Ele disse apenas uma palavra. E em outras,
mesmo à distância, a cura foi realizada. Foi diferente também com o cego do
tanque de Siloé. Jesus mandou-o lavar-se no tanque e assim que o cego
obedeceu, voltou enxergando. Temos que entender definitivamente que o Senhor
divino não se prende a apenas um método. Ele usa vários métodos e maneiras
diferentes para beneficiar o seu povo, para honrar a fé daquele que nele crê. Não
tente vivenciar em sua experiência a experiência de outros. Jesus nos trata com
singularidade!
Jesus é identificado como Cristo, o Messias de Israel
Mc 8.27–30
No quinto parágrafo deste capítulo, nos versos 27 a 30, encontramos a
declaração de Pedro a respeito de Jesus, enquanto caminhavam em direção a
Cesareia de Filipe, bem ao norte da Palestina, uma cidade eminentemente gentia.
Ela era conhecida por sua adoração aos deuses gregos e seus templos dedicados
a Baal, deus conhecido desde os tempos do Antigo Testamento. Conforme vimos
no capítulo 6, Herodes Filipe foi traído por sua esposa Herodias e por seu irmão
Herodes Antipas. Esse Filipe, desejando que essa cidade não fosse confundida
com a cidade costeira de Cesareia, capital da província governada por Antipas,
acrescentou seu nome ao nome original. Nesta cidade extremamente pagã e
idólatra, Jesus, de modo bem significativo, perguntou aos discípulos o que
achavam da sua identidade.
Os discípulos relataram o que ouviram pelas ruas: alguns acham que o Senhor
é João Batista, outros dizem que é Elias e ainda outros que é um dos profetas.
Assim como a cidade tinha várias divindades adoradas, também eram muitas as
opiniões a respeito de Jesus. Mas Jesus perguntou a opinião dos próprios
discípulos. Então Pedro, tomando à frente, respondeu afirmativamente: Tu és o
Cristo (v. 29). E Jesus ainda pediu-lhes para não ser revelado!
Na verdade, mesmo depois de Jesus ter estado conosco, realizado seu
ministério, morrido, ressuscitado e ter sido exaltado, as dúvidas a respeito da sua
pessoa continuaram e continuam até hoje. No início do cristianismo surgiram
muitas teorias a respeito de Jesus. Conforme House (1999, p. 63), tivemos
diversas concepções falsas a respeito da pessoa de Cristo, dentre as quais é
possível destacar os ebionistas e os arianistas, que negavam a natureza divina de
Jesus. Por outro lado, os docetistas negavam a natureza humana do Senhor; os
nestorianos, a união de suas naturezas divina e humana; os eutiquianos, a
distinção dessas mesmas naturezas. Enfim, como naqueles dias, ainda hoje a
pessoa de Jesus, o Cristo, é motivo de muita disputa, e as opiniões sobre Ele são
as mais diversas, como bem lembrou Lopes (2006, p. 383):
Ao longo da História, houve vários debates acerca de quem é Jesus. Os ebionistas acreditavam que
Jesus era apenas uma emanação de Deus, os gnósticos não acreditavam na sua divindade. Os
arianos não acreditavam na sua eternidade. E, hoje, há aqueles que creem que Jesus é um mediador,
mas não o mediador entre Deus e os homens. Há aqueles que dizem que Jesus é apenas um espírito
iluminado, um mestre, mas não o Senhor e Mestre. Há aqueles que ainda escarnecem de Jesus e
colocam-no apenas como um homem mortal que se casou com Maria Madalena e teve filhos, como
ensina o livro Código da Vince.

E não adianta sabermos quais foram ou quais são as opiniões a respeito de


Jesus; não significa muito saber as diversas teorias sobre Jesus. Cada um de nós
tem a responsabilidade de ter a sua própria opinião sobre Ele. Você precisa saber,
compreender, conhecer e experimentar Jesus como seu Salvador e Senhor, o
ungido de Deus, o Cristo prometido! É esse o significado de Jesus para você?
E Marcos encerra o parágrafo mostrando Jesus ainda pedindo para não ser
revelado. Mas você sabe por quê? Porque além das razões que já apresentamos
nos estudos passados, Jesus queria que os apóstolos aprendessem ainda mais
sobre o seu ministério, sobre a obra que viera realizar. Jesus queria que
soubessem que, em vez de enfatizar a política, o nacionalismo e a libertação do
jugo romano, a sua missão envolveria sofrimento, rejeição e morte, mas, por fim,
ressurreição. Os discípulos precisavam conhecer todo o conteúdo do evangelho.
E é isso o que vemos a seguir…
Jesus prediz pela primeira vez a sua morte e ressurreição
Mc 8.31–33
Na sequência dessa especial confissão de Pedro, nos versos 31 a 33 encontramos
o primeiro anúncio da morte e ressurreição de Jesus, pois Ele queria que os
discípulos entendessem claramente o significado dele ser o Cristo, o Ungido
divino, o enviado de Deus (Jesus anunciaria ainda o seu sacrifício vicário em
9.30–32 e em 10.32–34). Através de cinco observações é possível
compreendermos o que Jesus revelou aos seus discípulos. Ele ensinou que:
A. Era necessário o seu sofrimento, isto é, fazia parte dos planos eternos,
profetizados desde o Antigo Testamento. O sacrifício de Jesus não foi
circunstancial.
B. Seria conhecido como Filho do Homem. Ele mesmo se identificaria
como Filho do Homem, expressão derivada de Daniel 7.13–14 e usada 81
vezes nos evangelhos como um título messiânico.
C. Ele sofreria rejeição por parte da liderança judaica – anciãos, sacerdotes
e escribas que formavam o Sinédrio – em cumprimento à profecia de Isaías
53.
D. Seria morto, em cumprimento às profecias de Zacarias 12.10 e 13.7.
E. Ressuscitaria ao terceiro dia, em cumprimento às profecias do Salmo
110, de Daniel 7.13–14 e outros textos do Antigo Testamento.
E Marcos termina esse parágrafo com os versos 32 a 33, mostrando que
mesmo tendo a revelação de Deus (Mt 16.13–23), Pedro via Jesus como o
Cristo, mas ainda não conseguia perceber qual o significado correto, qual a
profundidade da messianidade de Jesus. Ele estava infectado pelo fermento dos
fariseus, isto é, pela falsa interpretação dos líderes religiosos. Por isso Pedro
chamou Jesus de lado para reprová-lo e sugerir-lhe que não fosse para a cruz.
A reação de Jesus foi muito objetiva. Ele repreendeu a Pedro, mas,
certamente, também ao diabo, que colocou sobre o apóstolo um véu para que
não entendesse o que via.
Pedro falou nas duas ocasiões como representante dos outros discípulos.
Numa palavra demonstrou que sabia quem era Jesus (v. 29), mas nessa outra
palavra demonstrou que não sabia quem Ele era (v. 32). Diante dessa falta de
sintonia de procedimentos e declarações, é necessário entendermos bem esse
acontecimento. Pelo lado humano, pelos sentimentos dos discípulos, de amor e
consideração pelo Mestre, Pedro quis dissuadir Jesus, quis protegê-lo de um
triste final. Mas enquanto os motivos dos discípulos eram bondosos, a motivação
de Satanás, presente na situação, era perversa e odiosa. Ele tentava mais uma vez
impedir que Jesus fosse para a cruz cumprir a missão de nos dar a salvação e
destruir as obras do diabo (1Jo 3.8).
Por isso Jesus, fitando todos os discípulos, dirigiu-se a Pedro e lhe disse:
Arreda, Satanás! Porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das dos
homens (v. 33).
Encontramos aqui uma humilhante prova do fato que o melhor dos santos é apenas uma pobre
criatura falível. Vemos que havia ignorância em Simão Pedro… Vemos que havia presunção em
Simão Pedro… E, finalmente, mas não menos importante, vemos que Simão Pedro fez tudo isso
com a melhor das intenções… Entretanto, o zelo e a sinceridade não servem de justificação para o
erro. Vemos que é bem pequena a distância entre fazer uma boa confissão e ser um “Satanás”
obstruindo o caminho de Cristo… (RYLE, 2007, p. 104).

Que possamos estar com nossos olhos espirituais abertos para vermos as
realidades a respeito de Jesus. Que possamos ter discernimento para não sermos
iludidos por Satanás. Que a nossa oração seja um pedido a Deus para nos
proteger dos erros e dos enganos.
Jesus apresenta os requisitos do discipulado
Mc 8.34–38
Finalmente, nesse último parágrafo, nos versos 34 a 38 encontramos Jesus dando
uma clara explicação sobre o discipulado, tendo em vista a sua própria missão de
morrer por nós.
Jesus disse claramente: Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue,
tome a sua cruz e siga-me (v. 34).
A cruz era um instrumento violento e doloroso de execução. “Tomar a cruz” era levar o braço
horizontal da cruz para o local da execução, geralmente através de uma multidão apupando. Em
termos fortes, retoricamente, Jesus descreve aquilo que todo verdadeiro discípulo tem que estar
pronto para fazer. Se querem seguir a Jesus têm que estar prontos para literalmente enfrentar
escárnio e morte, pois têm que seguir para a cruz (KEENER, 2004, p. 164).

Jesus apresentou os requisitos do discipulado: negar a si mesmo, tomar a cruz


e segui-lo, mas completou ainda de forma mais enfática, dizendo, Que
aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Que
daria um homem em troca de sua alma? (v. 36–37). E aqui vemos que Ele
ensinou também sobre o valor da alma. Muitos, desconhecendo o valor de sua
alma, estão trocando-a por qualquer coisa. Jesus disse aqui que a alma vale mais
do que o mundo inteiro. Muitos passam a vida toda buscando felicidade e prazer,
mas naquilo que não lhes dá a verdadeira felicidade. Jesus declarou que o mundo
de prazeres concentrado nos bens, na posição ou no poder é algo que não
satisfaz. Tudo o que podemos obter na terra é apenas temporário. Só quando
seguirmos a Jesus, mesmo com os sofrimentos que esse seguir exige,
confirmaremos o que realmente significa viver aqui e também ter certeza da vida
eterna.
E no verso 38, logo em seguida, Jesus advertiu que se as pessoas se
envergonhassem dele e de suas palavras, também Ele, o Filho do Homem, se
envergonharia delas quando viesse na glória de seu Pai com os santos anjos. As
palavras de Jesus foram diretas: Porque qualquer que, nesta geração adúltera
e pecadora, se envergonhar de mim e das minhas palavras, também o Filho
do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória de seu Pai com os
santos anjos.
Jesus constantemente invertia a perspectiva do mundo, falando em salvar e
perder, em jogar fora e encontrar. E aqui Ele nos apresenta uma escolha. Existem
as pessoas que ficam envergonhadas e rejeitam seguir a Jesus nessa vida. Um
dia, elas estarão diante dele, mas será tarde demais. Porém, existem as que não
se envergonham dele e o aceitam. E embora enfrentem zombaria e sofrimento, se
mantêm firmes no discipulado. Um dia elas estarão diante dele e escaparão de
serem rejeitadas no juízo final.
E você, se envergonha de Cristo ou tem tido prazer em testemunhar que é um
discípulo, um cristão autêntico?
Nesta parte do evangelho, a partir de 8.31, Marcos mostrou Jesus ministrando
especificamente aos discípulos, porque o tempo de entregar-se na cruz chegava
rapidamente. Para reter esses ensinos precisamos lembrar que as palavras de
Jesus nesses versos são fundamentais para o discipulado. Por isso, avalie-se
profundamente e responda: como está a sua vida? Você é alguém comprometido
com Jesus? Essa é uma posição que afetará o seu futuro. Oro para que você não
se envergonhe de Jesus!

Marcos 9 - O servo confirmado em


divindade instrui os discípulos
A transfiguração e as exigências do discipulado
O capítulo 9 antecede o último relato do ministério de Jesus, antes de Ele entrar
em Jerusalém, no domingo, seis dias antes da sua morte na cruz do Calvário.
Essas informações nos fazem perceber que a narrativa desses 50 versos é muito
valiosa, pois nos traz instruções específicas, algumas das últimas instruções que
Jesus deu aos seus discípulos.
O capítulo inicia com uma manifestação poderosa do Senhor Jesus,
antecipando para alguns um pequeno vislumbre da sua esplêndida glória, que Ele
como Rei dos reis e Senhor dos senhores teria e teve depois da sua glorificação e
ascensão. Mas nesses versos temos o relato da sua ação libertadora enquanto
aqui estava. Libertando um menino das garras de Satanás, Jesus ensinou aos
discípulos a necessidade da oração. Ao libertá-lo de Satanás, novamente ensinou
sobre a necessidade do seu sacrifício e outros temas importantes. Para
estudarmos e refletirmos sobre todo esse rico conteúdo, podemos dividir o
capítulo em sete partes:
Parte 1 – Jesus é transfigurado diante dos discípulos (v. 1–13)
Parte 2 – Jesus liberta um menino possuído por um espírito mudo e surdo (v.
14–29)
Parte 3 – Jesus prediz pela segunda vez a sua morte e ressurreição (v. 30–32)
Parte 4 – Jesus ensina seus discípulos sobre a humildade (v. 33–37)
Parte 5 – Jesus ensina seus discípulos sobre a tolerância (v. 38–41)
Parte 6 – Jesus ensina seus discípulos sobre os tropeços (9.42–48)
Parte 7 – Jesus ensina seus discípulos sobre o papel deles como sal da terra
(v. 49–50)
Nesses versículos, Jesus vai se revelando cada vez mais aos discípulos,
porque sabia que o tempo de se dirigir para Jerusalém estava chegando
rapidamente. Eles ainda tinham dificuldade para entender todas as coisas, mas
Jesus sabia que depois da vinda do Espírito Santo, o Espírito da Verdade (Jo
16.11), compreenderiam mais claramente todos aqueles acontecimentos e
ensinamentos. Nós que já possuímos o Espírito Santo, peçamos sua iluminação
para também entendermos os detalhes dessa narrativa.
Jesus é transfigurado diante dos discípulos
Mc 9.1–13
A transfiguração é um relato notável. Ela teve como objetivo enfatizar a
humanidade e não a divindade de Cristo. Nota-se que esta manifestação foi
registrada apenas nos três Sinóticos, Mateus, Marcos e Lucas. O acontecimento
ficou de fora do evangelho de João. Ora, sabendo que a ênfase de João no seu
evange lho era demonstrar a divindade de Jesus, o fato de não apresentar a
transfiguração confirma e nos faz admitir que a transfiguração, em vez de
destacar a divindade, destaca, sim, a humanidade de Jesus.
Dando sequência aos versos 34 a 38 do capítulo 8, onde Jesus apresentou
como requisitos para o discipulado a dor, o sofrimento e a humilhação, Marcos
registrou, logo em seguida, aqui no verso 1, essas palavras de Jesus: Em
verdade vos afirmo que, dos que aqui se encontram, alguns há que, de
maneira nenhuma, passarão pela morte até que vejam ter chegado com
poder o reino de Deus. Qual é então o significado dessa expressão? Como
podemos interpretá-la dentro do contexto?
Os estudiosos têm diversos entendimentos sobre essas palavras. Conforme a
opinião de alguns, Jesus poderia estar prevendo sua ressurreição e exaltação,
profetizando a vinda do Espírito Santo em manifestação poderosa ou se
referindo à sua volta a terra, em poder e glória, no final dos tempos. Mas para
muitos estudiosos, provavelmente Jesus estava se referindo a sua transfiguração,
algo que aconteceria logo em seguida. De certa maneira, depois de mostrar as
dificuldades e a autonegação que se requeria do discípulo, Jesus quis mostrar o
outro lado da vida do discípulo:
Tendo colocado diante dos discípulos o caminho do opróbrio, sofrimento e morte, que ele estava
para tomar, e tendo-os convidado a segui-lo em vidas de sacrifício e abnegação, o Senhor agora
apresenta o outro lado da moeda. Embora o discipulado lhes custasse elevado preço nessa vida,
seria recompensado com glória no porvir (MACDONALD, 2008, p. 129).

Essa interpretação faz sentido especialmente porque Pedro, que estava lá,
anos depois fez referência a esse fato, na sua segunda carta, em 1.16–18. Entre
outras coisas ele disse que relembrava da transfiguração ocorrida quando
estavam no monte santo:
16. Porque não vos demos a conhecer o poder e a vinda de nosso
Senhor Jesus Cristo seguindo fábulas engenhosamente inventadas,
mas nós mesmos fomos testemunhas oculares da sua majestade,
17. pois ele recebeu, da parte de Deus Pai, honra e glória, quando pela
Glória Excelsa lhe foi enviada a seguinte voz: Este é o meu Filho
amado, em quem me comprazo.
18. Ora, esta voz, vinda do céu, nós a ouvimos quando estávamos com
ele no monte santo.
O apóstolo Pedro referiu-se à glória que João, Tiago e ele viram na pessoa de
Jesus no monte da transfiguração. Por isso é possível entender o verso 1 como
referência à transfiguração que está relatada nos versos 2 a 13.
Alguns destaques devem ser feitos em relação à transfiguração.
1. O verso 3 nos dá a dimensão da glória, majestade e santidade de Jesus
glorificado, a tal ponto que Pedro, interpretado por Marcos, não tinha com
que comparar o que vira. Nada humano, nenhum homem ou produto de
limpeza humana poderia produzir aquela glória, aquela brancura, aquele
brilho visto nas vestes de Jesus.
2. Conforme o verso 4, o fato de aparecerem Moisés e Elias junto com Jesus é
significativo, pois demonstra o cumprimento do propósito divino na lei,
através de Moisés, nos profetas, através de Elias, que agora se cumpria
integral e perfeitamente no evangelho, através de Jesus.
3. O fato de Pedro expressar o desejo de fazer cabanas para todos ficarem ali,
mostra que a transfiguração foi tão grandiosa e poderosa e causou tamanho
impacto nos discípulos que Pedro nem sabia o que falar, conforme os versos 5
e 6.
4. No verso 7, a voz vinda do céu, vinda do Pai em relação ao Filho, era uma
complementação do testemunho que o próprio Pai dera do seu Filho
unigênito, quando também manifestou-se do céu na ocasião do batismo.
5. Conforme o verso 8, assim como repentinamente houve a manifestação de
glória e majestade, assim também tudo acabou. Depois da nuvem os
discípulos só viram a Jesus. Por isso, podemos considerar simbolicamente
este verso, mostrando que a normalidade da vida cristã não é feita de
manifestações espetaculares e sobrenaturais. Elas são exceções, e por isso
mesmo são sobrenaturais. O natural, o normal da vida cristã, é caminhar com
fé na companhia de Jesus!
6. No verso 9 ainda temos o segredo messiânico, pois Jesus pediu para não
revelarem esses acontecimentos senão após a sua ressurreição. Também nesse
verso é possível percebermos a falta de visão espiritual por parte dos
discípulos (v. 10), pois ainda não entendiam o que Jesus queria dizer sobre
ressuscitar dos mortos.
7. O parágrafo termina com mais um ensino de Jesus. Em resposta ao
questionamento dos discípulos, disse-lhes que Elias já tinha vindo. Isto é,
João Batista, simbolizando Elias, realizara o ministério de preparação para a
vinda do Messias, do próprio Jesus (Ml 4.1–2). Os dois ministérios, de João
Batista e de Jesus Cristo, envolveriam sofrimento e morte. Como bem disse
MacDonald (2008, p. 129): “A morte de João Batista foi um sinal adiantado
do que eles fariam com o filho do Homem. Rejeitaram o precursor e,
certamente, rejeitariam o Rei”. Portanto, essa é a realidade em relação a Jesus
e os discípulos. Teremos momentos de êxtase, de bênçãos, de manifestações,
e também de tristeza, de dor, de sofrimento e de morte. Você está disposto a
isso? Você está disposto a se comprometer com um Messias desse tipo?
Como os discípulos, que não conseguiam entender que os valores do reino de
Deus eram diferentes dos valores deste mundo, muitas pessoas não querem se
comprometer com Jesus. A visão que têm ainda está limitada às próprias
circunstâncias e ao próprio bem-estar. E você? Qual tem sido a sua opção?
Mas, o episódio ainda continua…
Jesus liberta um menino possuído por um espírito mudo e surdo
Mc 9.14–29
Na sequência, nos versos 14 a 29, temos mais uma manifestação poderosa do
Senhor Jesus. Enquanto Jesus, Pedro, João e Tiago estavam no monte, um pai
necessitado veio até os outros nove discípulos e lhes pediu que libertassem o
filho que estava possesso por um demônio, que o atirava no chão, fazendo-o
espumar, ranger os dentes e definhar. Mas eles não conseguiram libertá-lo.
Quando Jesus ouviu o relato frustrado daquele pai, quando Jesus viu toda
aquela manifestação e até alguns escribas discutindo, exclamou com profundo
pesar: Ó geração incrédula, até quando estarei convosco? Até quando vos
sofrerei? Trazei-mo (v. 19). Então, diante dessa situação, podemos perguntar:
Por que os discípulos não puderam expulsar o demônio? Ora, se em Marcos 6.12
lemos que eles expulsaram demônios em sua missão às aldeias vizinhas, por que
não conseguiam agora? Talvez porque tenham recebido autoridade especial
apenas para aquela viagem, porque a fé e o entusiasmo dos discípulos tinham
diminuído, ou porque não criam plenamente, conforme indica a expressão de
Jesus condenando a incredulidade.
O menino foi levado à presença de Jesus, e quando o demônio viu quem
estava à sua frente, manifestou-se novamente. Jesus procurou descobrir detalhes
sobre o endemoninhado e, ao relatar todos os acontecimentos, o pai do menino,
clamando, pediu a Jesus que, se fosse possível, tivesse compaixão e fizesse
alguma coisa por eles (v. 22).
Nesse ponto do relato, creio que já temos lições importantes, pois é
contrastada a fé dos discípulos e a fé desse pai. Jesus respondeu-lhe que tudo é
possível ao que crê (v. 23). E numa das mais surpreendentes confissões dos
evangelhos, o pai, chorando, respondeu: Eu creio! Ajuda-me na minha falta de
fé! (v. 24), que quer dizer: eu creio, mas a minha fé é pequena. Eu creio, mas
preciso crer mais. Fortaleça a minha fé. Veja que o problema não estava em
Jesus, mas no pai do menino. Se o homem cresse, se tivesse fé, Jesus podia
ajudá-lo, Jesus poderia libertar o endemoninhado.
Com lágrimas, esse homem se entregou ao Senhor. Ele compreendeu que não se alcança a fé com
um esforço de vontade própria. Ele se reconheceu incapaz. Ele reconheceu a necessidade da
intervenção divina. Nós precisamos da ajuda divina não somente para a libertação propriamente
dita, mas até mesmo para pedir por ela (KOECHLIN, 2001, p. 88).

Na verdade, Jesus pode todas as coisas, pode realizar até o que é impensável
para nós. Por quê? Porque é totalmente onipotente! E o restante do parágrafo
mostra que Jesus libertou aquele menino e devolveu-o são e salvo ao seu pai.
Mas é preciso fazer algumas considerações sobre esse episódio. Em primeiro
lugar, temos que admitir que a fé não é algo palpável, que pode ser tomado como
se fosse um remédio. A fé é uma atitude interior de confiança e crença, conforme
lemos em Hebreus 11.6. Mas veja bem, até a nossa capacidade de crer é um dom
de Deus (Ef 2.8–9). E não importa quanta fé tenhamos, jamais chegaremos ao
ponto de sermos autossuficientes. A fé não pode ser acumulada como fazemos
com o dinheiro no banco. Por isso, o desafio é crescer na fé. Porém, é bom saber
que crescer na fé é um processo constante de renovação diária da nossa
confiança em Jesus Cristo.
Em segundo lugar, além dessa lição desafiadora para todos nós, vale ressaltar
que Jesus estava dizendo aos discípulos que eles enfrentariam situações difíceis
que só poderiam ser resolvidas com muita oração e jejum sincero que
demonstrasse a completa e total dependência de Deus.
E, em terceiro lugar, precisamos aprender que, enquanto a oração demonstra
nossa confiança em Deus, o jejum demonstra humildade, dependência de Deus,
que não há nada mais importante do que Ele para nós e nossa crença nas ações
divinas em nosso favor.
Você tem experimentado vitórias em situações impossíveis, usando esse
método que Jesus apresentou? Lembre-se de que a oração e o jejum são práticas
espirituais muito boas se forem desenvolvidas com sinceridade e desejo de
agradar a Deus.
Jesus prediz pela segunda vez a sua morte e ressurreição
Mc 9.30–32
Nesse parágrafo vemos que Jesus tinha um plano bem estabelecido na etapa final
do seu ministério. Jesus não queria que as multidões soubessem que Ele e seus
discípulos passariam pela Galileia, rumando em direção a Jerusalém. Ele sabia
que era necessário ministrar particularmente aos discípulos.
Jesus precisava ensiná-los sobre todos os detalhes do plano eterno de Deus.
Ele, o Messias, o Filho do Homem, mesmo que ressurgisse ao terceiro dia, teria
que ser entregue nas mãos dos homens e morto. Jesus tinha que mostrar-lhes a
necessidade dessa morte vicária, substitutiva, pois afinal era o cordeiro de Deus
que tira o pecado do mundo. E isso só aconteceria através do seu sacrifício na
cruz.
Mas em meio a tantos milagres e evidências de poder, os discípulos ainda
estavam cegos e pensavam apenas no reino físico, material. Por não
compreenderem a profundidade das palavras de Jesus, ficaram envergonhados e
temerosos de pedir maiores explicações.
A lentidão dos discípulos, no tocante às realidades espirituais, apareceu novamente, no momento em
que esse ensino foi dado. Nessas palavras, houve tanto o que parecia ser mal como o era bom; tanto
o que seria amargo, como o que seria doce ao extremo; nesse ensino Jesus falou-lhes da morte, mas
falou-lhes da vida; falou da cruz, mas falou também da ressurreição… Mas, as suas mentes
continuavam repletas de ideias equivocadas a respeito do reinado de seu Senhor sobre a terra. Eles
pensavam que o reino terrestre de seu Senhor haveria de manifestar-se imediatamente. Quando os
preconceitos e as opiniões obscurecem os nossos olhos, somos lentos em entender (RYLE, 2007, p.
114).

Essa dificuldade para entender certas verdades não acontece com você
também? Ficamos sem entender certos acontecimentos, mas em vez de nos
abrirmos diante de Deus, conversando e compartilhando nossas dúvidas, ficamos
quietos e temerosos. Sabe por quê? Porque muitas vezes o inimigo nos coloca
nessa situação de vergonha diante do Pai, tentando impedir-nos de crescer no
conhecimento e na graça de Jesus Cristo.
Apropriemo-nos da verdade de Hebreus 10.19: que tenhamos ousadia e
liberdade para entrar no Santo dos Santos pelo novo e vivo caminho que o
Senhor Jesus nos deu ao entregar sua vida por nós na cruz do Calvário; que
possamos entrar na sua presença para desfrutar da comunhão e do ensino do
nosso Senhor.
Jesus ensina seus discípulos sobre a humildade
Mc 9.33–37
Nos versos 33 a 37 temos o ensino sobre a humildade. Inicia-se aqui a seção
nova no Evangelho de Marcos, denominada “O caminho para Jerusalém”, que
vai de 9.33 a 10.52. Mesmo depois de terem ouvido as declarações de Jesus, pela
segunda vez, sobre a necessidade do seu sofrimento e morte (v. 30–32), não
compreenderam o significado completo desse ensino, estando em Cafarnaum,
preparando-se para ir para a capital do país.
Enquanto se preparavam, provavelmente na casa de Pedro, para ir à cidade
que era o centro das grandes manifestações nacionais, os discípulos discutiram
entre si sobre quem seria o maior no reino de Deus. Certamente ainda
influenciados pelos conceitos populares sobre o Messias e seu reino, disputavam
um lugar de destaque. Jesus perguntou-lhes sobre o que falavam no caminho e,
diante do silêncio deles, mas conhecendo os seus corações, chamou-os e,
assentado, ensinou-lhes o princípio da humildade.
É interessante que Marcos nos tenha dado esses pequenos detalhes. Não mais
no caminho, mas em casa; não mais em pé, mas assentado; não mais no meio de
muitas pessoas, mas na intimidade dos doze, Jesus ensinou-lhes sobre a
humildade, característica fundamental para quem quer fazer parte do reino de
Deus.
Trazendo uma criança para estar entre eles, pegando-a no colo, usou-a como
exemplo. Quem seria essa criança? Se fosse a casa de Pedro, quem era essa
criança? Talvez o seu filho mais novo? Ou será que seria um neto do apóstolo?
Fosse essa criança quem fosse, ela serviu para Jesus ensinar sobre uma atitude
que se requer do discípulo de Cristo e daquele que é súdito do seu reino.
Qualquer que receber uma criança, tal como esta, em meu nome, a mim me
recebe; e qualquer que a mim me receber, não recebe a mim, mas ao que me
enviou (v. 37).
Com essas palavras Jesus ensinou que toda e qualquer arrogância, orgulho ou
ambição pessoal é condenável. O serviço, mesmo o de cuidar de um pequenino,
feito em nome de Jesus, tem valor. O cuidado dispensado aos outros é a medida
da nossa grandeza. Por outro lado, qualquer que prejudicar ou deixar de cuidar
de alguém está pecando. Quando Jesus colocou essa criança no meio deles,
estava quebrando mais um paradigma, pois elas, até aquele tempo, como tantas
outras minorias, eram desprezadas e não eram contadas pela sociedade.
Mesmo não sendo esse o ensino principal, é possível inferir dessa atitude de
Jesus a importância que, como igreja e pais, devemos dar aos nossos filhos,
àqueles que dependem de nós. Tão sério como o estudo e ensino para os adultos,
assim também deve ser a nossa ministração aos pequeninos. Você tem praticado
isso com os que estão ao seu redor?
Mas a grande lição que Jesus quis ensinar a todos que em todas as épocas são
seus discípulos é a lição da humildade.
No mundo, quem está em posição superior é servido pelos demais. Mas não é assim no reino de
Deus. O primeiro lugar estabelece uma posição da qual se serve os outros. Os doze, porém não
estavam praticando o ensino de Jesus. A autonegação sucumbe ao desejo de prestígio e poder…
Jesus, que foi servo de todos até a cruz (Fp 2.5–8), conclama seus discípulos a serem servos
também (MULHOLLAND, 2006, p. 150).

Assim como muitos de nós ainda hoje, os discípulos não compreenderam as


palavras de Jesus. Enquanto falava de seus sofrimentos e morte, a única coisa
pela qual se interessavam era saber qual era o maior entre eles. Não entendendo
nada sobre o reino de Deus e seus princípios, provavelmente pensando que em
Jerusalém Jesus se declararia Rei e Messias, estavam preocupados com a posição
que ocupariam nesse reino futuro. Jesus ensinou que o espírito que deve nos
caracterizar é a humildade, o serviço e a doação aos outros.
Você tem vivido esse princípio? Tem desenvolvido essa característica em seu
viver?
Jesus ensina seus discípulos sobre a tolerância
Mc 9.38–41
É interessante notarmos que Marcos coloca na sequência do ensino sobre a
humildade um fato que exemplifica o princípio. Jesus recriminou a acepção de
pessoas, o exclusivismo e o orgulho.
Os discípulos tinham pensado que deviam impedir alguém de realizar milagres no nome do Senhor
Jesus. “Ele não nos segue” foi o pretexto que João apresentou. Mas o Senhor lhes mostrou que
também nessa questão eles estavam mesmo ocupados consigo mesmos e não com ele. Vigiemos
para não termos um espírito sectário. Muitos cristãos, embora não andem conosco, seguem
fielmente e bem de perto ao Senhor no caminho da abnegação e da cruz (8.34) (KOECHLIN, 2001,
p. 89).

A tolerância deve padronizar o relacionamento entre todos os discípulos de


Cristo. Jesus desenvolveu um argumento interessante, pois ensinou que em vez
da intolerância, todos os atos de misericórdia, de cuidado e de manifestação da
graça divina realizados em seu nome, com a intenção de servi-lo e glorificá-lo,
serão reconhecidos como evidência de um discipulado verdadeiro. Lembre-se
dessas palavras: Em verdade vos afirmo que, sempre que o fizestes a um
destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes (Mt 25.40).
Jesus, então, mostrando sua tolerância para com os que não pertenciam ao seu
grupo apostólico, mas que ajudavam os necessitados em seu nome, disse aos
discípulos: Pois quem não é contra nós, é por nós (v. 40).
Qual tem sido sua prática nesse caso específico? Como tem sido sua vida
nesse aspecto? Você se reconhece com certo sentimento de exclusividade? Só
aceita aqueles que pensam e agem como você, os que fazem parte do seu grupo?
Ou é aberto e aceita todos os que de maneiras diferentes querem ajudar e
amparar os necessitados? Lembre-se de que embora Jesus tenha escolhido doze
pessoas para serem apóstolos, tinha muitos outros seguidores.
Jesus ensina seus discípulos sobre os tropeços
Mc 9.42–48
Na sequência dessas palavras sobre tolerância, Jesus destacou outro ponto que
estava completamente ligado ao ensino anterior.
Deixar de agir em mútua aceitação seria colocar tropeços diante de outros, com consequências
temporais devastadoras (9.42). A necessidade de autoexame e de remoção de pensamentos e ações
malignas (mão, pé e olho são metonímias) era imperativa porque a pessoa que deixa de fazê-lo
indica sua falta de compromisso com Cristo… (CARDOSO PINTO, 2008, p. 95).

Neste trecho Ele chamou a atenção para a possibilidade de fazer cair um dos
pequeninos. Nesse caso, o pequenino a que Jesus se referia era o homem que
expulsara demônio em seu nome, mas que tinha sido rejeitado pelos discípulos.
Mas por que os discípulos rejeitaram e proibiram aquele homem? Porque
queriam manter tudo sobre controle. Jesus os repreendeu e ensinou que seria
preferível amarrar uma pedra de moinho e se jogar no mar do que deixar de fora
alguém que queria ministrar.
Certamente Jesus não estava estimulando a mutilação física como caminho
para o reino de Deus. Ele não poderia se contradizer, pois tinha dito que o mal
que pode deixar alguém de fora do reino está dentro do ser humano (7.21–23).
Mas certamente estava mostrando que devemos ser muito objetivos, retirando
qualquer empecilho que possa nos deixar fora do reino de Deus.
Ao apresentar essa figura de linguagem exagerada, dizendo que deveríamos
cortar a mão, o pé, e arrancar o olho para poder entrar no reino, Jesus estava
mexendo com a tradição dos religiosos. A tradição dizia que as pessoas
deficientes, não podiam entrar no templo e, assim, não podiam entrar no reino de
Deus quando o messias chegasse. Jesus ensinou o contrário e apelou para que
aceitemos os pequeninos, deixando de lado essas tradições legalistas. O desafio
de Jesus para todos nós é que não ofendamos os pequeninos, porque também
foram feitos à imagem de Deus.
Se o homem não agir com objetividade, tirando tudo o que o impede de entrar
no reino de Deus, pode ser lançado no inferno, no fogo inextinguível, onde não
lhes morre o verme, nem o fogo se apaga (v. 44,46,48). E embora os versos 44
e 46 não estejam nos melhores manuscritos, a verdade do verso 48 é muito
objetiva:
O inferno não é uma figura mitológica, mas uma realidade solene. Há céu e inferno; há luz e trevas;
há salvação e perdição; há bem-aventurança e condenação eterna. Jesus foi quem mais falou sobre o
inferno. Ele o descreveu como um lugar de tormento eterno, onde o fogo jamais se apaga e o bicho
jamais deixa de roer (LOPES, 2006, p. 428).

Aos olhos do Senhor Jesus, servir a esses que o mundo rejeita, servir a esses
que o mundo hostiliza, tem muito mais valor do que manter as aparências e a
maneira do mundo pensar. Agindo dessa maneira nos afastamos do inferno e nos
aproximamos do reino de Deus.
Mesmo que para isso tenhamos que perder mão, pé e olho (certamente uma
hipérbole, isto é, um exagero de linguagem), o verdadeiro discípulo de Cristo
não pode prejudicar ou deixar de fazer o bem aos pequeninos. Mesmo que o
mundo não valorize o nosso agir, a grandeza que permanece é medida apenas
pelos padrões divinos.
A grande pergunta é: qual a medida que usamos para medir os nossos feitos: o
nosso sucesso pessoal ou o serviço altruísta?
Jesus ensina seus discípulos sobre o papel deles como o sal da terra
Mc 9.49–50
E finalmente, concluindo o seu ministério na Galileia, Jesus apresentou aos
discípulos o papel que pretendia que executassem depois da sua partida. Nos
versos 49 e 50 temos o ensino sobre os discípulos como sal da terra.
O verso 49 traz essas palavras: Porque cada um será salgado com fogo. A
interpretação dessas palavras não tem sido totalmente satisfatória, porém, é
possível concordar com essa colocação:
No Antigo Testamento, os sacrifícios estavam associados ao fogo (v. 48) e ao sal (Lv 2.13; Ez
43.24). Essas palavras-chave levam a uma metáfora do discipulado: “cada um será salgado com
fogo”. Assim como o sal é necessário para preservar a vida e preservar da deterioração, a
autodisciplina dos discípulos dá vida e preserva aquilo que é bom. Pelo fogo das provas e da
perseguição (1Pe 1.7; 4.12; Is 48.10) Deus nos purifica de tudo o que é contrário à sua vontade
(MULHOLLAND, 2006, p.153).

Com as palavras do verso 50 Jesus ainda usou o sal para ilustrar as qualidades
que devem ser encontradas na vida de cada cristão.
1. Devemos ter uma vida cristã eficaz como o sal é eficaz para dar sabor aos
alimentos. Se perdermos a função de salgar o mundo com a mensagem do
evangelho nos tornaremos inúteis. Mas, para isso, a purificação pelo fogo das
provas é necessária.
2. Devemos ter um padrão moral puro, como o sal é puro, para determos a
corrupção que existe no mundo. Mas para isso a autodisciplina de “cada um”
(v. 49) é necessária.
3. Devemos viver de um modo agradável, em paz. Assim como o sal, na
medida certa, torna o alimento agradável, se vivermos em paz e harmonia em
nossos relacionamentos, promoveremos um ambiente agradável onde
estivermos inseridos. Mas para isso é necessário a renúncia pessoal. Jesus
disse que o mundo saberia que tinha sido enviado pelo Pai se fôssemos um,
como Ele era um com o Pai (Jo 17.21). Assim como Jesus agiu, se entregando
por nós, se nos dermos uns pelos outros estaremos “salgando” o ambiente
onde fomos colocados.
Você tem feito diferença no meio em que está inserido? Avalie-se diante desse
ensino de Jesus!

Marcos 10 - O servo dá ensinamentos a


diversos interlocutores
Ensinos sobre divórcio, crianças, riquezas e humildade
Os acontecimentos deste capítulo nos mostram que o momento da cruz estava
ficando cada vez mais nítido para Jesus. Depois da confissão de Pedro e da
transfiguração, Jesus teve cada vez mais a preocupação de preparar os discípulos
para o ministério que deveriam exercer após sua partida. Então, como
mencionamos, de 9.33 até o final deste capítulo, Marcos enfatiza mais o
ministério de ensino do que as curas que Ele realizava.
Nesse “Caminho para Jerusalém” são relatados os acontecimentos que
precedem imediatamente a chamada Semana Santa. Jesus, durante o percurso
para Jerusalém, se encontrou, dialogou e ensinou sete diferentes grupos ou
pessoas com suas pendências: os fariseus, as crianças, o jovem rico, os
discípulos, em duas ocasiões, os irmãos Tiago e João e o cego Bartimeu. Nesses
encontros, enquanto a maioria pediu a intervenção de Jesus e não recebeu nada,
só dois fizeram de forma correta seus pedidos e foram atendidos.
O estudo atento deste capítulo certamente irá nos ensinar muito sobre nós
mesmos. Então, vamos aos sete acontecimentos que ele nos mostra:
Parte 1 – Jesus ensina sobre o divórcio, em resposta aos fariseus (v. 1–12)
Parte 2 – Jesus ensina sobre o reino de Deus, abençoando as crianças (v. 13–
16)
Parte 3 – Jesus ensina sobre as prioridades, em resposta ao jovem rico (v. 17–
22)
Parte 4 – Jesus ensina sobre o perigo das riquezas aos discípulos (v. 23–31)
Parte 5 – Jesus ensina sobre o seu sacrifício pela terceira vez aos discípulos
(v. 32–34)
Parte 6 – Jesus ensina sobre a atitude de servir, em resposta a Tiago e João (v.
35–45)
Parte 7 – Jesus ensina sobre a objetividade, usando o exemplo de Bartimeu (v.
46–52)
Conforme o verso 1, Jesus saiu de onde estava e foi para o território da Judeia
que ficava além do Jordão. Mas como identificar essas referências geográficas e
cronológicas que Marcos nos fornece?
Temos aqui uma clara divisão geográfica dentro deste evangelho. Nos
primeiros nove capítulos, Marcos mostra o ministério de Jesus centralizado na
Galileia, e a partir do capítulo 10, Jesus ministrando mais na Judeia,
encaminhando-se para Jerusalém, onde morreu por nós. Jesus vai em direção a
Jerusalém através de Decápolis (Pereia), além do Jordão.
Devemos ter em mente que Jesus deixou Cesareia de Filipe com o objetivo de
ir a Jerusalém. A caminho da cidade santa, Ele se preocupou em preparar os
discípulos para os acontecimentosque, para eles, até aquele momento, eram
inimagináveis (8.27–31). Esse é o período que em Mateus (14.1–18.35)
identificamos como “Semestre de Retirada” (Souza, 2008, p. 197). O local da
transfiguração, nesse “alto monte”, provavelmente era o monte Hermom (com
3.000 metros de altura), que ficava aproximadamentea 18 quilômetros de
Cesareia de Filipe.
Tendo passado pela Galileia e estado em Cafarnaum (Mc 9.33), partiram
silenciosamente em direção às fronteiras da Judeia com a Pereia, território do
lado direito do rio Jordão. Ali Jesus ensinou todo o conteúdo desse capítulo,
enquanto prosseguiam caminhando para Jerusalém (Mc 10.32), até que
chegaram a Jericó, onde se deu o ensino sobre a objetividade, com base na cura
de Bartimeu (Mc 10.46–52).
Depois, chegaram bem próximo de Jerusalém, às cidades de Betfagé e
Betânia (Mc 11.1). Durante todo o percurso Jesus desenvolveu por completo um
dos aspectos importantes do seu ministério. Como Mestre, ensinou e preocupou-
se em preparar os discípulos para os grandes acontecimentos que logo se dariam.
Vamos, pois, ao estudo desses ensinamentos.
Jesus ensina sobre o divórcio, em resposta aos fariseus
Mc 10.1–12
No primeiro relato desse capítulo, nos versos 1 a 12, Jesus ensinou sobre o
divórcio. No verso 1 encontramos as multidões fazendo o que costumavam
fazer: continuavam seguindo Jesus. Compassivamente Ele ensinava a todos,
conforme o seu costume. O povo humilde e simples gostava de ouvir os ensinos
de Jesus, mas seus inimigos religiosos estavam enciumados e planejavam tirar-
lhe a vida. No verso 2 encontramos os fariseus com má intenção, com o desejo
de pegá-lo numa armadilha. Eles vieram com uma pergunta capciosa: E,
aproximando-se alguns fariseus, o experimentaram, perguntando-lhe: É
lícito ao marido repudiar sua mulher?
É preciso lembrar que esta pergunta foi feita não porque quisessem aprender
ou receber orientação sobre o assunto. Eles estavam querendo testá-lo. Aqueles
fariseus já tinham a opinião formada a respeito do casamento e do divórcio. A
pergunta estava cheia de maldade, era ardilosa e bem elaborada. Se Jesus
dissesse que não era lícito, poderiam dizer que estava contrariando Moisés. Se
dissesse que era lícito, então o acusariam de estar ensinando algo moralmente
frouxo.
Mas outro detalhe que devemos lembrar é que essa pergunta foi feita,
também, porque naquele tempo o rei Herodes havia abandonado sua verdadeira
mulher e se casado com Herodias, a mulher do seu irmão Filipe. Você deve se
lembrar que João Batista tinha condenado frontalmente este pecado de Herodes,
e essa atitude do profeta foi uma das razões que resultou na sua morte.
Então, os fariseus maldosamente queriam que Jesus se pronunciasse também
sobre a situação de Herodes. Era, portanto, uma pergunta capciosa. Se Jesus
apoiasse o divórcio, estaria atestando que a atitude de Herodes estava correta. Se
dissesse que o divórcio não era lícito, se posicionaria contra Moisés e contra
Herodes, certamente atrairia o ódio de Herodes e Herodias e talvez tivesse o
mesmo fim de João Batista.
Como os fariseus queriam vê-lo morto, ardilosamente prepararam essa
pergunta. Porém Jesus, sabendo que não era o tempo de sua morte e que ela
deveria acontecer da maneira como Deus a planejara, surpreendeu-os com uma
argumentação que só poderia vir de alguém que possuía a sabedoria divina, de
alguém plenamente divino!
Conforme os versos 3 e 4, Jesus surpreendeu-os, dizendo: Que vos ordenou
Moisés? Eles responderam: Moisés permitiu lavrar carta de divórcio e
repudiar. Jesus sabia o que os fariseus iriam responder. A lei de Moisés,
conforme Deuteronômio 24.1–4, dizia que se um homem casado se desagradasse
de sua mulher por achar alguma coisa indecente nela, e dela se divorciasse,
deveria dar-lhe uma carta de divórcio. O que se discutia era o significado da
frase de Moisés: “coisa indecente”.
Para a expressão havia duas interpretações: os intérpretes da escola do rabino
Shammai entendiam que “coisa indecente” significava infidelidade conjugal;
porém, os intérpretes da escola do rabino Hilel entendiam que “coisa indecente”
significava todo e qualquer motivo desagradável. Infelizmente, nos dias de
Jesus, os casais se divorciavam como em nossos dias se divorciam, por qualquer
razão, por qualquer pretexto.
Jesus, então, conforme os versos 5 a 9, argumentou sobre o assunto, levando-
o para a origem do relacionamento homem-mulher. Os fariseus consideravam o
divórcio uma questão legal e não espiritual, mas Jesus passou do assunto do
divórcio para o casamento. E certamente o propósito divino para o casamento é
espiritual e, por isso, devemos refletir muito mais sobre ele do que sobre o
divórcio.
Jesus disse que por causa da dureza do coração humano é que a lei previa o
divórcio. Disse que por causa do pecado do homem é que o divórcio foi
permitido. Mas ressaltou que no início não era assim. Ele relembrou a intenção
de Deus ao criar o homem e a mulher, e acrescentou que por isso deixaria o
homem seu pai e sua mãe e se tornaria uma só carne com sua mulher. E ainda
concluiu enfatizando: o que Deus ajuntou não separe o homem (v. 9).
Jesus continuou dizendo que o homem deve viver a vida do lar de acordo com
padrão original de Deus. O divórcio não estava no plano original, não fazia parte
do programa. Deus tinha algo melhor para o homem: uma vida de harmonia e
cumplicidade, de amor e de doação. É esse o tipo de relacionamento que Deus
espera ver num casal.
Agora temos que entender que os outros pecados e males não estavam nos
seus planos, e para todos os pecados havia perdão. Então, quem se divorcia
também pode obter perdão. Como qualquer outro pecado, o divórcio pode e deve
ser perdoado. Mas para muitas pessoas ele é um pecado imperdoável. Elas se
esqueceram de que todos nós somos pecadores e, quando nos convertemos, Deus
nos salva e nos perdoa de todos os pecados.
Mas, no texto de Marcos, Jesus enfatiza mais o casamento do que o divórcio.
O casamento é uma instituição divina, é algo que Deus criou, uma união que não
deve ser desfeita. Afinal, esta foi a sua proposta original. Por isso os que querem
se casar precisam saber o que é o casamento, para que tragédias sejam evitadas.
Não podemos fazer pouco caso da vida matrimonial.
Encontramos aqui nesse texto cinco verdades sobre o casamento que todos os
que se preparam para essa etapa da vida devem conhecer. Em primeiro lugar, o
casamento é uma instituição divina (10.6). E como alistou Lopes (2006, p. 438–
441): o casamento é heterossexual (10.6), monogâmico (10.7), monossomático
(10.8) e indissolúvel (10.9).
Mas o texto continua, e nos versos 10 a 12, respondendo às questões dos
discípulos, Jesus disse: Quem repudiar sua mulher e casar com outra comete
adultério contra aquela. E, se ela repudiar seu marido e casar com outro,
comete adultério (v. 11–12). Ora, fica claro que o Senhor, através dessas
palavras, era abertamente contra o divórcio, pois esse não era o plano inicial de
Deus.
Mas, em Mateus 19, Jesus mencionou o único caso em que o divórcio poderia
ser aplicado: somente no caso de adultério, mas mesmo assim essa não era a
vontade divina. Esta é a única base bíblica que temos para defender o divórcio.
Portanto, o ensino de Jesus aqui está de acordo com o ensino mosaico, e a defesa
do divórcio é somente para o caso de infidelidade conjugal.
Mas surge uma pergunta importante nesse contexto: por que Marcos e Lucas
(Lc 16.18) omitiram essa cláusula mencionada por Mateus?
Algumas possibilidades são apontadas: McGee (1991, p. 121), o idealizador
do programa que deu origem a essa série, sugeriu que Marcos não mencionou o
que Mateus registra porque seus leitores romanos não conheciam a legislação
mosaica (e talvez não se importassem com ela), pois viviam sob o “direito
romano”. Hendriksen (2003, p. 483), entende que Mateus destacou essa exceção
que validava o divórcio exatamente porque seus leitores eram judeus e
conheciam os detalhes daquilo que Moisés tinha escrito. E Mulholland (2006, p.
158), considerou que cada autor (Mateus, Marcos e Lucas), relatou o que era
mais relevante aos seus leitores originais e, por conseguinte, Marcos, escrevendo
para os romanos, deu destaque ao fato de que a mulher poderia iniciar o processo
de divórcio, pois o “direito romano” assim lhe facultava a ação.
Ao deixar em segundo plano a discussão sobre o divórcio, e ao destacar os
ideais divinos sobre o casamento, mais uma vez Jesus calou seus adversários e se
desfez com sabedoria do laço que os fariseus prepararam para que caísse.
Mas, falando em família…
Jesus ensina sobre o reino de Deus, abençoando as crianças
Mc 10.13–16
Logo depois da questão do divórcio, nos versos 13 a 16, Marcos nos mostra
Jesus abençoando algumas crianças. Certamente o registro foi feito dessa
maneira para nos lembrar de uma verdade muito importante: a maior vítima do
divórcio são as crianças, são os filhos. Nos países onde o divórcio é aceito
legalmente, podemos comprovar que os jovens desajustados e revoltados, na
maioria das vezes, são vítimas de lares desfeitos.
O texto mostra que as pessoas trouxeram a Jesus algumas crianças para que as
tocasse, mas os discípulos as repreendiam. Jesus, porém, indignou-se e,
conforme os versos 14 a 16, enquanto as pegava nos braços e as abençoava,
ensinou aos discípulos que quem não recebesse o reino de Deus como uma
criança de maneira nenhuma entraria nele. Aqui temos uma lição importante.
Normalmente esperamos que nossos filhos se tornem adultos para se decidirem
por Cristo. Mas Jesus ensina que os adultos é que têm de se tornar como crianças
para entrar no reino de Deus.
Além de Jesus ensinar sobre a atenção e o cuidado que devemos dispensar às
crianças, aos nossos filhos, educando-os e conduzindo-os a Jesus para que dele
recebam a bênção, ensinou para os adultos que o caminho para o reino de Deus
deve ser trilhado com a atitude que vemos nas crianças.
Precisamos abandonar aquilo que chamamos de cultura, de sabedoria, de
conhecimento, de grandeza, porque na realidade tudo isso não passa de
aparência, de sofisticação. Temos que ser gratos a Deus porque nos oferece
gratuitamente o seu reino. Tudo que produz em nosso coração vaidade, orgulho e
presunção nos afasta de Jesus.
Jesus está dizendo que o reino de Deus não pertence aos que dele se acham “dignos”… Ao
contrário, como é um presente, é dos que são “tais” como crianças, i.e., insignificantes e
dependentes. Não porque merecem recebê-lo, mas porque Deus deseja conceder-lhes (cf. Lc 12.32).
Os que reivindicam ter méritos não entrarão nele, pois Deus dá o seu reino àqueles que dele nada
podem reivindicar (MULHOLLAND, 2006, p. 159).

Jesus quer que nos voltemos para a simplicidade de uma criança, para a
simplicidade da fé em Cristo. Algumas questões merecem ser levantadas para
aplicarmos esse ensino às nossas vidas. Como você tem tratado seus filhos
pequenos? Como igreja, temos tratado corretamente as nossas crianças? Temos
embaraçado o caminho delas ou deixado que encontrem em Jesus o amigo
maravilhoso que traz diferença às suas vidas? Como você tem procurado entrar
no reino de Deus? Tem apresentado seus atos de justiça e religiosidade como
chave para entrar no reino? Ou tem dependido continuamente da graça de Deus,
manifestada em Jesus Cristo?
Jesus ensina sobre as prioridades, em resposta ao jovem rico
Mc 10.17–22
O terceiro encontro, narrado nos versos 17 a 22, nos mostra uma das cenas mais
impactantes dos evangelhos. Jesus é surpreendido por um homem que ajoelhou-
se diante dele e perguntou: Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna?
(v 17). Esse relato, mencionado pelos três Sinóticos, merece algumas
considerações.
1. No tempo de materialismo em que vivemos, este incidente e o ensino de
Jesus sobre as prioridades são muito importantes.
2. Mateus nos diz que o jovem perguntou o que poderia fazer de bom para
alcançar a vida eterna (Mt 19.16–22).
3. Marcos nos diz que o moço chamou Jesus de bom Mestre, mas Jesus
replicou que só Deus é bom. A maneira como o jovem dirigiu-se a Ele
poderia implicar que reconhecia essa capacidade de Jesus. Mas, além disso,
ao responder que só Deus é bom, Jesus queria que o moço percebesse que não
herdamos a vida eterna, que não alcançamos o reino de Deus por mérito, por
fazermos coisas boas.
4. Esse moço vivia sob o sistema mosaico, e então Jesus mencionou diversos
mandamentos que deveriam ser obedecidos.
5. É interessante notar que Jesus mencionou somente os deveres que ele tinha
para com as pessoas, sem mencionar os deveres que, conforme a lei, ele tinha
para com Deus.
6. O moço respondeu que obedecia a todos desde a sua juventude.
7. Então, Jesus passou a mostrar-lhe o seu dever para com Deus. A resposta
de Jesus surpreendeu aquele moço: E Jesus, fitando-o, o amou e disse: Só
uma coisa te falta: Vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um
tesouro no céu; então, vem e segue-me (v. 21). Sabemos que Jesus é Deus.
Provavelmente aquele jovem também reconhecia a divindade dele. Então,
Jesus claramente expôs o dever do jovem rico para com Deus: Dar-lhe o
primeiro lugar em sua vida!
Bem, o moço agora estava ciente da sua responsabilidade diante de Deus.
Jesus mandou que vendesse as suas propriedades, desse o dinheiro aos pobres e
o seguisse. E Jesus prometeu-lhe um tesouro no céu. A prioridade daquele moço
que queria herdar a vida eterna (v. 17) era dar o primeiro lugar em sua vida a
Deus, o dono do reino eterno!
O texto termina dizendo que o jovem foi embora entristecido, porque era
muito rico. Sabe por que Jesus pediu que ele vendesse suas propriedades e desse
o dinheiro aos pobres? Porque sabia que o amor ao dinheiro é a raiz de todos os
males. Ele sabia que o primeiro lugar de nossas vidas deve ser dado a Deus!
Jesus mostrou que o dinheiro pode comprar tudo, menos a vida eterna. A vida
eterna é dom, é presente, é dádiva divina.
Avalie-se agora. Você crê que tem a vida eterna porque leva uma vida correta
diante de Deus, porque tem cumprido os mandamentos desde há muito tempo?
Ou crê que tem a vida eterna porque já a recebeu pela graça de Deus? Responda
diante de Deus. Essa é uma questão fundamental!
Jesus ensina sobre o perigo das riquezas aos discípulos
Mc 10.23–31
Nos versos 23 a 31, dando sequência ao assunto, Marcos mostra que Jesus
ensinou aos discípulos sobre o perigo das riquezas. Diante das afirmações
objetivas de Jesus, falando sobre a impossibilidade dos que confiam nas riquezas
serem salvos, os discípulos perguntaram: Então, quem pode ser salvo? (v. 26).
Os discípulos ficaram maravilhados mas, certamente, ao mesmo tempo, ficaram
preocupados.
Como judeus vivendo sob a lei, eles corretamente consideravam as riquezas como indicação das
bênçãos de Deus. Sob o código mosaico, Deus prometera prosperidade aos que lhe obedecessem.
Os discípulos concluíram que se uma pessoa rica não pode entrar no reino, então ninguém mais
poderia (MACDONALD, 2008, p. 133).

E no verso 27 Jesus apresentou o seguinte princípio: Para os homens é


impossível; contudo, não para Deus, porque para Deus tudo é possível. Jesus
mostrou aos discípulos que as riquezas poderiam ser consideradas como um deus
para os ricos e impedi-los de entrar no reino de Deus. Trocar a segurança das
riquezas pela simplicidade do reino de Deus é uma troca impossível para
qualquer ser humano. Somente Deus tem condições de operar tal transformação.
Na verdade, para Deus não há transformações que não possam ser feitas!
Somente Cristo pode salvar o homem. Muitos pensam que se têm dinheiro,
têm tudo. Puro engano. O dinheiro pode comprar a cama, mas não compra o
sonho. O dinheiro pode comprar o alimento, mas não compra o apetite. O
dinheiro pode comprar o remédio, mas não compra a saúde. O dinheiro pode
comprar a casa, mas não compra o lar. O dinheiro pode comprar joias, mas não
compra o amor. O dinheiro não compra a salvação. O dinheiro não compra a
vida eterna!
Nos versos 28 a 31 encontramos a argumentação dos discípulos diante das
afirmações diretas de Jesus sobre as prioridades. Pedro era o porta-voz dos
discípulos, e disse: Eis que nós tudo deixamos e te seguimos (v. 28).
Provavelmente querendo demonstrar que tinham priorizado o mais importante,
querendo demonstrar que deixaram os ganhos que suas profissões poderiam lhes
dar, Pedro talvez esperasse um elogio do Mestre.
Mas o que Jesus fez foi assegurar aos discípulos que todos que renunciarem
algo valioso por sua causa serão recompensados cem vezes mais nessa vida,
porém, não necessariamente da mesma forma. Ele ilustrou que alguém que for
rejeitado por sua família, por aceitar seu senhorio, e o seguir ainda nesta vida,
ganhará uma família maior, a família dos filhos de Deus. Com certeza essa
resposta agradou aos discípulos, pois tinham deixado tudo para segui-lo. Mas ao
mesmo tempo, Jesus surpreendeu novamente os discípulos acrescentando um
detalhe muito significativo no final da sua colocação. Ele disse: com
perseguições (v. 30). Jesus alertou-os, e nos alerta também, sobre a realidade das
perseguições, para que não o sigamos com um espírito egoísta, apenas para
recebermos os prêmios, as recompensas prometidas.
E Jesus acrescentou: e, no mundo por vir, a vida eterna. Porém muitos
primeiros serão últimos; e os últimos, primeiros (v. 30–31). Ele explicou
também que no mundo vindouro os valores mundanos serão invertidos. Os que
se desembaraçarem dos empecilhos dessa vida, os que permanecerem humildes,
serão grandes no mundo por vir. Infelizmente temos sido bombardeados com
mensagens que nos dizem que devemos reivindicar o melhor dessa vida para
usufruirmos tudo o que ela pode nos oferecer, pois “também somos filhos do
rei”. Temos ouvido mensagens que nos estimulam a buscar a felicidade e a
prosperidade que o mundo nos oferece. Esses ensinos criam um espírito
mercantilista, criam um espírito comercial da vida cristã.
Esse tipo de mensagem pregada é completamente oposta ao ensino de Jesus.
Jesus quer que deixemos esses valores e tudo o que o mundo nos oferece por
amor: por amor de mim e por amor do evangelho (v. 29). Jesus é muito
objetivo nos seus requisitos: Somente quem o ama e ao evangelho pode esperar a
recompensa divina, tanto nessa vida como na vindoura!
Você está disposto a trocar esses valores? Enquanto o mundo coloca em
primeiro lugar os que têm sucesso nessa vida e em último os que tudo deixam
por amor a Cristo e ao evangelho, Deus tem outra visão. Os primeiros deste
mundo serão os últimos. Os considerados últimos na visão desse mundo serão os
primeiros na visão celeste. Devemos perguntar novamente: Você está disposto a
trocar esses valores?
Jesus ensina sobre o seu sacrifício pela terceira vez aos discípulos
Mc 10.32–34
Embora somente Mateus mencione em cinco ocasiões o aviso de Jesus sobre o
seu sacrifício (Mt 12.40; 16.21; 17.22–23; 20.17–19; 26.1–2), Marcos, aqui, pela
terceira vez, registra o aviso que Ele fez do seu futuro sacrifício. Jesus explicou
claramente aos discípulos o que lhe aconteceria, mas eles ainda estavam cegos
para essa revelação.
Os discípulos ainda pensavam no Messias como um rei vencedor que
libertaria Israel do jugo romano e não podiam imaginar como alguém poderia
ressuscitar depois de ter morrido. Pelo fato de Jesus falar sempre por meio de
parábolas, provavelmente eles pensaram que essas palavras faziam parte de mais
uma parábola.
Mas graças a Deus não era uma parábola! Esses avisos em antecipação aos
fatos que ocorreriam dentro em breve demonstravam que o sacrifício de Jesus
fazia parte do plano eterno de Deus para a salvação da humanidade. E não era
uma eventualidade, um acidente de percurso.
Calma e deliberadamente, Jesus falou aos discípulos acerca da sua paixão vindoura, em Jerusalém.
Uma após outra, Jesus descreveu todas as principais circunstâncias que envolveriam a sua morte.
Coisa alguma lhes foi ocultada. Coisa alguma foi deixada para trás. Notemos bem que nada houve
de involuntário ou de imprevisto na morte do nosso Senhor (RYLE, 2007, p. 129).

Jesus sabia da sua missão; sabia o que tinha vindo fazer entre nós. Estava
mostrando que caminhava com segurança para o cumprimento da missão que
nos trouxe a salvação! Você tem agradecido a Deus por esse plano tão detalhado
que revelou sua graça e seu amor por nós?
Jesus ensina sobre a atitude de servir, em resposta a Tiago e João
Mc 10.35–45
Nos versos 35 a 45, Jesus tem um encontro específico com dois discípulos, dos
três com quem tinha mais intimidade. Na verdade, esse foi um encontro que os
dois primos de Jesus quiseram ter com Ele, pois imaginavam que, sendo
parentes, poderiam gozar de certos privilégios (os dois discípulos eram primos
em primeiro grau de Jesus, já que eram filhos de Salomé, irmã de Maria, mãe de
Jesus – Mt 27.56; Mc 15.40; Jo 19.25).
Mas, além disso, com esse relato Marcos nos mostra exatamente como
pensavam os discípulos em meio aos acontecimentos. No verso 37, o pedido de
Tiago e João para que ocupassem postos no reino, um ao lado direito de Jesus e
outro ao esquerdo, demonstra a falta de visão espiritual dos discípulos. No verso
38 a resposta de Jesus foi clara: Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o
cálice que eu bebo ou receber o batismo com que sou batizado?
Diante da resposta que impensadamente deram, no verso 39 Jesus acrescentou
que eles beberiam o cálice que beberia e receberiam o batismo a que se
submeteria. E nós sabemos que Tiago foi o primeiro mártir dentre os doze (At
12.1–2), e João o último a morrer, possivelmente também como mártir, exilado
na ilha de Patmos (Ap 1.9).
Ainda pensando em termos do reino político de Israel, Tiago e João queriam
as posições mais elevadas no reino que Jesus viera implantar. Para eles que agora
caminhavam para Jerusalém, a capital política e religiosa do país, era a hora de
reivindicar uma posição de destaque nesse novo reino. Os discípulos ainda
estavam espiritualmente cegos. Jesus quis abrir-lhes os olhos e lhes disse que a
verdadeira grandeza é servir aos outros.
Jesus contrastou a maneira do mundo com a maneira de agir no reino de
Deus: Mas entre vós não é assim; pelo contrário, quem quiser tornar-se
grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro
entre vós será servo de todos (v. 43–44). No reino de Deus, o serviço
dispensado aos outros é a maneira de nos tornarmos grandes. O desejo de ocupar
as mais destacadas posições é um impedimento e não uma ajuda para o
verdadeiro cristão. E Marcos, em resumo, sintetiza o ensino de Jesus anotando as
palavras que formam o versículo-chave do seu evangelho: Pois o próprio Filho
do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em
resgate por muitos (v. 45). Jesus nos desafia a imitarmos o seu exemplo.
Como exemplo dessa atitude, ele citou a sua própria atitude, pois veio para servir (v. 45). É bem
provável que, por dedução, ele fez a reivindicação aqui de cumprir o papel do “Servo” de Deus,
predito em Is 52.13–53.12, de quem o profeta declarou: “ele derramou sua vida na morte” e: “levou
o pecado de muitos” (Is 53.12); pois ele retratou o seu ato supremo de serviço a favor dos homens
como dando a sua vida em resgate por muitos… (BRUCE, 2009, p. 1623).

Jesus mostrou aos discípulos, e especificamente a Tiago e João, que no reino


de Deus o engrandecimento provém do serviço prestado aos outros. Jesus, o
nosso exemplo, nos serviu pagando um resgate por nós, porque não podíamos
pagá-lo. A morte de Jesus nos libertou da escravidão do pecado. Essa foi a razão
da morte de Cristo.
Os discípulos pensavam que a vida e o grande poder de Jesus os libertariam
do domínio de Roma, mas Jesus lhes afirmou que a sua morte e a sua grande
humilhação os libertaria do domínio do pecado. Jesus lançou e ainda hoje lança
esse desafio aos seus discípulos: queremos as posições mais elevadas no reino
desse mundo ou preferimos o reino de Deus com seus valores totalmente
inversos? Você está disposto a viver essa inversão de valores?
Jesus ensina sobre a objetividade usando o exemplo de Bartimeu
Mc 10.46–52
O sétimo acontecimento, nos versos 46 a 51, é o último desse capítulo. Marcos
nos mostra Jesus curando um cego em Jericó. E usando essa cura, o Mestre
completou seus ensinos antes de chegar a Jerusalém e tratou sobre a
objetividade. Devemos notar que Mateus menciona a cura de dois cegos quando
Jesus estava saindo de Jericó. Lucas e Marcos mencionam apenas um cego e
narram o milagre quando Jesus entrava em Jericó. Essas diferenças podem ser
assim explicadas:
A. Provavelmente existiam dois cegos, e Bartimeu, por ser mais enérgico,
recebeu destaque.
B. Os cegos pediram a cura quando Jesus entrava na cidade, mas só foram
atendidos quando Ele deixava a cidade.
C. É possível ainda que a cura tenha acontecido quando Jesus saía da velha
Jericó e entrava na nova Jericó, construída por Herodes (Lc 18.35).
Sobre Jericó, é importante lembrarmos ainda que:
Jericó, nos tempos de Jesus, era o local onde ficava o palácio de inverno de Herodes. Ele e seu filho
Arquelau a embelezaram caprichosamente com magníficos edifícios helenísticos – palácio, teatro,
fortaleza e hipódromo… Jericó herodiana era uma esplêndida cidade a vinte e sete quilômetros de
Jerusalém, trezentos metros abaixo do nível do mar, no vale do rio Jordão… (UNGER, 2006, p.
406).

É muito significativo o fato de Jericó estar num vale, abaixo do nível do mar,
e Jesus ter trazido vista para que pudessem contemplá-lo morto na cruz, no
monte do Calvário. Assim, Ele mesmo disse: E eu, quando for levantado da
terra, atrairei todos a mim mesmo (Jo 12.32). Jesus sabia que só com os olhos
desvendados Bartimeu e todos nós poderíamos reconhecê-lo como Senhor e
Cristo. Só com os nossos olhos espirituais o enxergamos como o Senhor
vitorioso. Esse milagre significativamente ocorreu em Jericó, antes da entrada
em Jerusalém, pois na cidade santa Jesus seria sacrificado como o “Cordeiro de
Deus” que tira o pecado do mundo. Todos nós temos que ver isso!
Mas, além disso, na cura de Bartimeu Marcos enfatiza o princípio da
objetividade. Que queres que eu te faça? (v. 51), perguntou Jesus. E Bartimeu
respondeu: Mestre que eu torne a ver (v. 51). Então Jesus lhe disse: Vai, a tua
fé te salvou. E imediatamente tornou a ver e seguia a Jesus estrada fora (v.
52).
Jesus também está perguntando o que você quer que Ele lhe faça. Ele é
objetivo conosco. Ele também deseja que você seja objetivo no seu pedido. Ele
quer que você tenha visão espiritual perfeita para ver as maravilhas do amor de
Deus!
E sendo objetivo ao aplicar esse texto às nossas vidas, vamos estruturá-lo de
tal maneira para que você possa compartilhá-lo com objetividade com outras
pessoas que também necessitam contemplar as maravilhas do amor de Deus.
Bartimeu era cego e estava assentado à beira do caminho. Ele gritou, clamou
e pediu misericórdia. Quando pedimos misericórdia a Deus, muitas vezes as
pessoas nos mandam ficar quietos. Mas Jesus, mesmo em meio à multidão,
ouviu o seu clamor e ele não perdeu a oportunidade. Bartimeu foi claro e
objetivo e Jesus o atendeu. É interessante ver que Tiago e João também fizeram
um pedido (10.37), e Jesus não os atendeu. Mas por quê? Porque pediram mal,
para o seu próprio prazer, conforme o outro Tiago escreveu anos mais tarde:
pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres
(Tg 4.3). Jesus atendeu a Bartimeu porque seu pedido era justo, visava à
reparação de uma necessidade básica fundamental, a possibilidade de enxergar.
Neste texto encontramos sete ações que devemos praticar ao nos
relacionarmos com Jesus. Assim como Bartimeu, precisamos:
A. Ouvir a Jesus (v. 47), já que o vemos como por espelho (1Co 13.12).
B. Expressar nossa fé (v. 47), clamando pela compaixão divina (Hb 4.15).
C. Não permitir que outros nos impeçam de ter contato com Jesus (v. 48),
clamando, crendo e confessando-o como Messias e Salvador (Rm 10.9).
D. Confessar a nossa própria mendicância (v. 48), apelando para a
misericórdia de Cristo (Hb 4.16).
E. Livrar-nos de tudo que dificulte nosso caminhar até Jesus (v. 50),
desembaraçando-nos de todo o peso e de todo o pecado (Hb 12.1).
F. Atender o chamado de Jesus (v. 50–51), falando-lhe objetivamente (Gl
1.15–17).
G. Seguir a Jesus (v. 52), usufruindo da salvação e sendo iluminados por
Ele (Jo 8.12).
Jesus foi objetivo e desafiou a fé de Bartimeu. Bartimeu foi objetivo e
recebeu a bênção que procurava! Meu desejo é que você seja objetivo e
compartilhe essas verdades com aqueles que estão ao seu lado e ainda não
enxergaram o grande amor de Deus, expresso a cada um de nós através de Jesus
Cristo!

Marcos 11 - O servo é recebido em


triunfo pelos desamparados
A entrada triunfal, a figueira, a purificação do templo e a sua autoridade
A partir desse ponto, estamos entrando na segunda parte do esboço de Marcos
que se concentra nos fatos ocorridos na semana final do ministério de Jesus. Ao
iniciarmos o estudo do capítulo 11, comentaremos sobre os últimos dias da vida
de Jesus, antes do seu sacrifício, e é importante termos clareza sobre alguns
fatos.
Ao deixar Jericó, Jesus seguiu em direção a Jerusalém para ser aclamado e
depois crucificado. Durante a última semana Ele ficou em Betânia, uma vila nas
proximidades do monte das Oliveiras, perto da cidade. Jesus fez o trajeto
Betânia-Jerusalém-Betânia algumas vezes durante esses dias. Ele foi para
Jerusalém com os discípulos para ensinar no templo. Celebrou a Páscoa em
Jerusalém, numa casa previamente designada para esse fim e, finalmente, na
sexta-feira, foi crucificado, dando a sua vida em nosso lugar. Os fatos que
aconteceram nessa semana mudaram a história da humanidade.
Ao considerarmos o texto do capítulo 11, constatamos cinco divisões:
No domingo
Parte 1 – Jesus chega e entra triunfalmente em Jerusalém (v. 1–11)
Na segunda-feira
Parte 2 – Jesus amaldiçoa uma figueira (v. 12–14)
Parte 3 – Jesus purifica o templo (v. 15–19)
Na terça-feira
Parte 4 – Jesus ensina sobre o poder da fé (v. 20–26)
Parte 5 – Jesus é questionado, mas confronta os líderes judaicos (v. 27–33)
Jesus chegou e entrou em Jerusalém num domingo, no início da semana da
celebração da Páscoa. O ambiente da cidade era festivo. Havia muita gente vinda
dos mais diferentes lugares do país e do império. A grande maioria era de judeus,
mas certamente havia também algumas centenas de gentios convertidos ao
judaísmo que chegavam nessa ocasião para a celebração tão significativa. A
Páscoa lembrava a libertação de Israel dos 430 anos de escravidão no Egito. Era
uma das festas mais importantes, respeitada e celebrada pelos judeus.
E nessa ocasião, além de toda a euforia motivada pela Páscoa, havia na cidade
um grande número de judeus que para lá se dirigiu porque tinha ouvido falar que
Jesus também estaria em Jerusalém. Depois da ressurreição de Lázaro (Jo 11.1–
46), a fama de Jesus chegou ao ápice.
Mas é interessante destacar que essa agitação toda em torno de Jesus tinha
duas motivações distintas: o povo queria usufruir da presença de Jesus
certamente para ver e ser beneficiado com os poderosos atos miraculosos que
sempre fazia; as autoridades, enciumadas, estavam à sua procura para prendê-lo
e matá-lo (Jo 11.47–48,53,55–57). Foi nesse clima que Jesus chegou e entrou em
Jerusalém.
Vamos às considerações sobre cada um desses episódios narrados no capítulo
11.
Jesus chega e entra triunfalmente em Jerusalém
Mc 11.1–11
A partir deste texto, os acontecimentos que estudaremos ocorreram na última
semana de Jesus, antes do seu sacrifício. Nesse capítulo encontraremos as
últimas visitas de Jesus a Jerusalém e ao templo.
Em relação à entrada triunfal, devemos considerar os preparativos para a
entrada em Jerusalém. Conforme o verso 2, Jesus ordenou que dois dos
discípulos fossem à aldeia pegar um jumentinho para servir-lhe de montaria. Ele
orientou sobre o que responderiam se alguém lhes perguntasse o que estavam
fazendo (v. 3). Provavelmente Jesus tratou do caso com antecedência e já havia
falado com seus amigos a respeito da sua posterior visita a Jerusalém para
participar da Páscoa. Naturalmente falou sobre sua intenção de usar o
jumentinho como montaria. Tudo foi combinado com o dono daqueles animais
antes. E mesmo com esses acertos houve perguntas, mas diante da resposta
segura dos discípulos nenhum impedimento foi levantado (v. 4–6).
É importante considerarmos que através desse fato se cumpriu a profecia de
Zacarias 9.9 que previa que o Messias, rei, justo e salvador, viria montado num
animal de carga. Devemos lembrar que Marcos está escrevendo para os romanos
que tinham se acostumado com as entradas triunfais dos seus generais em Roma.
A escolha de um jumentinho, comparada aos cavalos que simbolizavam a guerra,
as conquistas e o poder, foi muito significativa, pois a intenção de Jesus usar esse
animal de carga, que nunca havia sido montado e era modesto, simbolizava os
tempos de paz.
O contraste era nítido: um general vitorioso entrou em Roma, a cidade
dominadora, montado em um cavalo fogoso e devidamente ornamentado para
essas ocasiões. O servo que daria a sua vida em nosso favor entrou em
Jerusalém, a cidade da paz, montado em um jumentinho preparado
adequadamente para essa ocasião especial. Destaca-se também, conforme o
verso 7, o fato dos discípulos terem colocado seus mantos sobre o jumentinho
para que Jesus montasse, demonstrando obediência, carinho e humildade da
parte deles.
Outra questão que devemos considerar é que a partir do verso 8 Jesus foi
recepcionado pela multidão de modo especial. Essa era uma época especial. Em
Jerusalém o clima era de expectação. Ouvia-se por todo o país as boas novas de
um grande libertador. Enquanto isso acontecia, os inimigos de Jesus cada vez
mais o odiavam. Conforme mencionamos, em João 11 lemos que depois da
ressurreição de Lázaro as notícias se espalharam e o povo ficou em grande
expectativa. Ouvindo que Jesus vinha para Jerusalém, para a Páscoa, formou-se
uma multidão querendo vê-lo e ouvi-lo.
Jesus foi aclamado por milhares de pessoas quando se aproximou de
Jerusalém. A estrada militar que vinha de Jericó para Jerusalém passava perto da
vila de Betfagé, cujo significado é “casa de figos verdes”, e por Betânia, cujo
significado é “casa de tâmaras”. As pessoas que chegavam a Jerusalém para
celebrar o festival religioso da Páscoa formavam uma grande multidão, e a
presença de Jesus trouxe ainda mais exaltação. A multidão, homenageando o
cortejo, formou um tipo de tapete com suas vestes e ramos para que Ele pudesse
entrar.
Marcos, que foi o evangelho que mais destacou o “segredo messiânico”, ao
descrever esse momento singular nos mostra uma atitude totalmente diferente de
Jesus. Jesus deixou que a multidão o reconhecesse, o reverenciasse e o
aclamasse como cumprimento das profecias do Antigo Testamento:
Os acontecimentos descritos nestes versículos formam uma singular exceção na narrativa do
ministério que nosso Senhor efetuou na terra. Em geral, vemos o Senhor Jesus retirando-se para
evitar o reconhecimento público, frequentemente passando os seus dias nas remotas partes da
Galileia e, com frequência, permanecendo em lugares ermos. Dessa forma ele cumpria a profecia
que dizia: “Não clamará, nem gritará, nem fará ouvir a sua voz na praça” (Is 42.2). Aqui, e somente
aqui, nosso Senhor parece deixar de lado essa sua característica particular e, por sua própria
escolha, atrai a atenção do público para si mesmo… Assim, Jesus dirigiu-se voluntariamente à
cidade santa, sob o clamor “Hosana!” (RYLE, 2007, p. 135).

Ao chamar: Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o


reino que vem, o reino de Davi, nosso pai! Hosana, nas maiores alturas! (v.
9–10), a multidão expressava o desejo que Jesus fosse o messias prometido e
aguardado. Como vimos no estudo dessa passagem paralela no evangelho de
Mateus, ao clamarem “Hosana”, demonstravam o significado profundo, o desejo
profundo dessa palavra: “Salve-nos, agora”, “socorra-nos, ó rei” (2Samuel 14.4).
Mesmo sem saber do significado espiritual, a multidão expressava o desejo de
libertação. Estas expressões populares eram o cumprimento do Salmo 118.25–
27, mas a aclamação era por libertação do domínio romano e não pela salvação,
a libertação espiritual.
Este primeiro parágrafo termina com o verso 11 dizendo que Jesus, tendo
entrado em Jerusalém, foi direto ao templo. Certamente foi visitar cada uma das
dependências observando e sentindo o “pulsar” daquele local. Afinal, aquela era
a sua casa. A sua enérgica ação para os que estavam desvirtuando os objetivos
daquela casa de oração seria realizada no próximo dia. Mas Jesus, vendo que já
era tarde, junto com os discípulos foi para Betânia para ali passar a noite,
possivelmente na casa de Lázaro, Marta e Maria, local onde provavelmente
passou as noites daquela última semana.
Jesus amaldiçoa uma figueira
Mc 11.12–14
Nesta narrativa, Marcos nos mostra a reação de Jesus diante de uma figueira sem
frutos. O verso 12 nos diz que no dia seguinte, isto é, na segunda-feira, quando
saíram de Betânia, Jesus teve fome. E os versos13 e 14 completam o relato:
13. E, vendo de longe uma figueira com folhas, foi ver se nela,
porventura, acharia alguma coisa. Aproximando-se dela, nada achou,
senão folhas; porque não era tempo de figos.
14. Então, lhe disse Jesus: nunca jamais coma alguém fruto de ti! E os
seus discípulos ouviram isto.
Este pequeno incidente merece explicações, porque Jesus amaldiçoou a
figueira por não ter fruto numa época em que, conforme o próprio relato de
Marcos, não era tempo de figos (v. 13). Será que a atitude de Jesus foi correta?
Há uma explicação para esse fato:
Figueiras em regiões bíblicas produziam um fruto precoce comestível antes das folhas aparecerem.
Era um arauto da colheita normal mais adiante. Quando Jesus veio à nação de Israel havia folhas,
que indicavam confissão de fé, mas não havia fruto para Deus. Houve promessa sem cumprimento,
crença sem concretização. Visto que não houve fruto prematuro, ele sabia que não haveria colheita
mais adiante do povo incrédulo e, portanto, ele amaldiçoou a figueira. Isso prefigurou o julgamento
que cairia sobre Israel em 70 d.C. (MACDONALD, 2008, p. 136).

Esta figueira, então, é um símbolo da nação de Israel que estava rejeitando a


Cristo e, por isso, foi amaldiçoada. Havia na figueira muitas folhas, mas não
fruto. Temos aqui uma lição espiritual importante para nós. Havia em Israel
muito ritualismo, muita liturgia, muita tradição, mas não havia vida espiritual,
não havia verdadeira comunhão com Deus.
Jesus condenou isso em Israel e condena hoje na igreja, porque ainda existe o
mesmo problema. Há muita folha e pouco fruto. Acontece com a igreja de hoje o
mesmo que aconteceu com a igreja de Laodiceia (Ap 3.14–22). Ela era uma
igreja que não tinha nada autêntico. Uma igreja pobre, cega, que precisava de
colírio para os olhos, que pensava que era rica. Era uma igreja que não era
quente nem fria e, por isso, estava a ponto de ser vomitada da boca de Jesus. O
problema da igreja de Laodiceia é que o Senhor Jesus não estava mais lá. Jesus
foi colocado do lado de fora da porta. Por isso Ele estava à porta e batia,
desejando entrar.
Jesus quer ter comunhão conosco, mas espera o nosso convite. Ele não é um
arrombador, um assaltante que pula pela janela em vez de entrar pela porta.
Israel, os laodicenses, muitas igrejas de hoje e muitos cristãos individualmente
não têm mais condições de funcionar como povo de Deus. Foi a respeito de um
estado espiritual deste que o profeta Isaías, divinamente inspirado, disse em
Isaías 29.13–14:
13. O Senhor disse: Visto que este povo se aproxima de mim e com a
sua boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe
de mim, e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de
homens, que maquinalmente aprendeu,
14. continuarei a fazer obra maravilhosa no meio deste povo; sim,
obra maravilhosa e um portento; de maneira que a sabedoria dos seus
sábios perecerá, e a prudência dos seus prudentes se esconderá.
Mas que obras são essas que o profeta mencionou? O portanto que o Senhor
fará, as obras que disse que continuaria fazendo, são as obras maravilhosas de
salvação, de recebimento daqueles que depositam sua confiança nele, que
desfrutam da sua intimidade. Essa é a grande diferença. Não adianta mostrarmos
algo que não somos. Folhagem bonita pressupõe frutos, senão é só aparência.
Conforme Richards (2007, p. 70), “nas variedades antigas, os frutos
frequentemente apareciam antes das folhas, e em todas as variedades os frutos
aparecem dentro das folhas”. Temos muitos cristãos, e consequentemente muitas
igrejas, que fazem “propaganda enganosa”. Mostram ser uma coisa, mas quando
chegamos mais perto, quando examinamos melhor, percebemos falsidade,
hipocrisia e vida vazia.
Conforme o que Marcos relata a seguir (a purificação do templo), esse
episódio da figueira foi apenas uma introdução ao tema central de toda a
passagem. A figueira sem fruto e o templo sem culto verdadeiro demonstravam a
vida de religiosidade em vez de uma vida de intimidade com Deus:
… especialmente aqui, a partir do v. 11, o movimento do templo com seus responsáveis está no
centro das atenções. Havia por um lado a “folhagem”, ou seja, sua grandiosidade arquitetônica
(13.1–2) e sua organização econômica (11.15–16). Infelizmente, porém, quem olhava de perto não
encontrava ‘frutos’, antes endurecimento (11.33), planos secretos de assassinato (12.12), fingimento
e falsidade (12.13–15), cegueira instruída (12.24–27) e infâmia sob o manto da dignidade (12.38–
40)… (POHL, 1998, p. 327).

O templo refletia o estado espiritual do povo judeu, e essa figueira que foi
condenada por Cristo mostra exatamente o desagrado de Cristo com todas as
igrejas e cristãos que em suas vidas só têm folhas. É realmente desagradável aos
olhos do Senhor este tipo de religião. Como você se posiciona em relação a essa
situação? Você reconhece em sua vida muitas folhas, muita aparência? Ou numa
análise sincera percebe frutos da ação do Espírito Santo em sua vida?
Jesus purifica o templo
Mc 11.15–19
O terceiro episódio deste capítulo, nos versos 15 a 19, mostra a purificação do
templo. O verso 15 relata: E foram para Jerusalém. Entrando ele no templo,
passou a expulsar os que ali vendiam e compravam; derribou as mesas dos
cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas. Jesus fez uma verdadeira
limpeza no templo. João nos diz que Jesus havia feito outra limpeza assim bem
no começo do seu ministério (Jo 2.13–22). E agora Ele repete essa ação no fim
do seu ministério, fazendo-nos concluir que foram duas as purificações no
templo.
Os cambistas tinham um lugar reservado e próprio para o negócio. Os
estrangeiros que vinham de países distantes precisavam ter a moeda legal aceita
no templo. Esses cambistas executavam um trabalho necessário. Os que
compravam as moedas faziam com o melhor propósito. Mas Jesus combateu os
cambistas severamente, dizendo que eram ladrões que tinham transformado o
templo numa casa de negócios, na qual exploravam os que queriam trocar o
dinheiro, e cometiam injustiça.
Esta é a razão porque os religiosos que fazem negócios devem ser sempre
examinados. Jesus não quer que a sua obra seja transformada numa casa de
negócio, onde se ganha dinheiro e se obtém lucro. Quando uma igreja se
transforma em fonte de renda, ela perde o seu propósito, o seu poder espiritual.
Deixa de ser casa de Deus e se torna casa de negócio.
Como Jesus purificou o templo de Jerusalém, pode fazer a mesma coisa nas
igrejas que têm imitado aquele mau exemplo. Por quê? Porque Ele mesmo,
citando Isaías 56.7, disse: Não está escrito: A minha casa será chamada casa
de oração para todas as nações? Vós, porém, a tendes transformado em
covil de salteadores (v. 17).
O ataque de Jesus não foi contra a função dos cambistas e dos vendedores de
animais. O ataque foi ao mau uso que faziam das suas atribuições, do lucro
exagerado, da ganância e da impiedade de seus corações. Jesus os condenou
porque estavam usando o pátio dos gentios para o comércio defraudador,
impedindo que os próprios gentios pudessem estar ali e adorar.
Uma vez que aquela casa era para todos os povos, para todas as nações, os
judeus deveriam dar espaço aos gentios para adorarem, mas o preconceito e o
desprezo desferido contra eles fizeram com que a elite sacerdotal estivesse mais
interessada nos ganhos do que em promover o nome de Deus entre todos. Mas
Jesus atacou também aqueles que transitavam pelo templo, usando-o apenas
como um caminho mais curto para os seus afazeres diários:
Uma lei rabínica posterior também instruía contra o perigo de tornar os pátios do templo impuros
pelo fato de se carregar através deles itens desnecessários, mas ninguém protestou tão fortemente
quanto Jesus o fez, e ninguém parece haver questionado a necessidade da atividade comercial no
pátio externo durante a festa (KEENER, 2004, p. 173).

Certamente, conforme o verso 18, as autoridades religiosas dos judeus


sentiram e entenderam esse ataque de Jesus como desferido ao sistema que
tinham estabelecido. Portanto, era uma clara denúncia contra os seus interesses
econômicos, sociais e de autoridade. Diante disso, procuravam um modo de
lhe tirar a vida; pois o temiam, porque toda a multidão se maravilhava de
sua doutrina (v. 18). O parágrafo termina, então, mostrando o ódio crescente
dos inimigos de Jesus, a grande admiração da multidão e que Jesus e os
discípulos, lá pelo final da tarde, saíram do templo e voltaram para Betânia, para
mais uma noite de repouso. Era o final da segunda-feira.
Que lições podemos tirar desse relato, dessa situação contextual tão
específica? Todos nós podemos entender que:
A. O culto que elevamos a Deus deve nos livrar dos desejos de vingança e
ódio que por vezes nutrimos contra os nossos semelhantes.
B. O culto que fazemos a Deus deve ser sincero e puro, vindo de um
coração quebrantado e agradecido; os rituais e as práticas rotineiras não
sensibilizam o coração de Deus.
C. O culto que prestamos a Deus não deve criar obstáculos, não deve ter
preconceitos a qualquer tipo de pessoa que sinceramente, em espírito e
verdade, quer cultuar a Deus.
Jesus ensina sobre o poder da fé
Mc 11.20–26
Os versos 20 a 26 nos mostram Jesus e os discípulos na manhã de terça-feira.
Esses versos que apresentam Jesus ensinando sobre o poder da fé são
importantes, pois nos fornecem mais algumas diretrizes sobre a nossa vida de
oração.
O texto nos diz que no dia seguinte, isto é, na terça-feira, voltando Jesus e
seus discípulos a Jerusalém, Pedro chamou a atenção de todos. A surpresa de
Pedro e dos outros discípulos, conforme o verso 22, se deu porque viram a
figueira completamente seca. Ela se secara rápida e completamente. Esse fato
deixou-os admirados (Mt 21.20).
Mas certamente outro motivo de admiração devia haver nas mentes de alguns
dos discípulos. Era uma questão fundamental: se o templo como local de culto e
adoração estava tão distante do seu objetivo, como então fariam dali em diante
para adorar? Se os responsáveis pela religião, pelo contato com Deus, tinham
desvirtuado o uso do local de adoração, como fariam para adorar? Jesus, que
conhecia bem o que se passava no interior das pessoas, diante das perguntas, da
admiração e das inquietações, encontrou uma oportunidade de lhes ensinar mais
uma lição espiritual, falando sobre fé e oração.
O templo deixou de funcionar como um lugar onde a humanidade se aproxima de Deus. Como,
então, os homens podem vir a Deus para verdadeira prestar adoração? Jesus agora provê a resposta.
Fé, oração e perdão são essenciais para todo aquele que busca um verdadeiro relacionamento com
Deus (MULHOLLAND, 2006, p. 176).

Conforme os versos 22 a 25, Jesus lhes disse:


22. Tende fé em Deus;
23. porque em verdade vos afirmo que, se alguém disser a este monte:
Ergue-te e lança-te no mar, e não duvidar no seu coração, mas crer
que se fará o que diz, assim será com ele.
24. Por isso, vos digo que tudo quanto em oração pedirdes, crede que
recebestes, e será assim convosco.
25. E, quando estiverdes orando, se tendes alguma coisa contra
alguém, perdoai, para que vosso Pai celestial vos perdoe as vossas
ofensas.
O que Jesus disse não deve ser mal compreendido. Não temos de procurar
mover uma montanha de um lugar para outro por meio da oração. Nós
precisamos de poder espiritual para vivermos agora, para remover das nossas
vidas e dos nossos lares as montanhas de problemas que muitas vezes nos
atingem.
Quando Paulo, o apóstolo, orou pelos efésios, pediu para que fossem
fortalecidos no homem interior, quer dizer, na vida espiritual, pelo poder do
Espírito Santo, para poderem enfrentar os problemas que se tornam como
montanhas intransponíveis.
Certamente Jesus não estava se referindo literalmente a orarmos pedindo que
uma montanha se mova de um lugar para o outro. Jesus usou essa ilustração para
ensinar que é possível para Deus fazer o impossível. Se não há mais templo,
como não está limitado a locais humanos, Deus responde à oração independente
do local onde estivermos. Deus procura e recebe adoração daqueles que o
adoram em “espírito e verdade” (Jo 4.24). As montanhas de dificuldades que
temos diante de nós nada são diante do poder de Deus. Para Ele não há
impossíveis! Da oração de poder, entretanto, só desfruta o cristão que tem sua
vida sintonizada com Deus, aquele que desenvolve intimidade com Ele.
A oração eficaz não conhece limites, mas reconhece condições. Essas
condições são alistadas por Jesus:
A. Ter fé em Deus e não em nós mesmos (v. 22).
B. Ter fé para pedir até o impossível (v. 23).
C. Ter fé superior as dúvidas (v. 23).
D. Ter fé para pedir tudo o que for necessário (v. 24).
E. Ter um coração limpo e sem mágoas; ter um espírito perdoador (v. 25).
Embora o verso 26 não esteja nos melhores manuscritos de Marcos,
encontramos essas mesmas palavras em Mateus 6.15: se, porém, não
perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai vos
perdoará as vossas ofensas.
F. Ter consciência de que para obtermos os impossíveis de Deus devemos
estar em ordem com Ele, e isso se dá quando pedimos perdão pelos nossos
próprios pecados (v. 26).
G. Ter consciência de que Deus é justo em seu atendimento; só haverá
perdão para nós se perdoarmos nossos irmãos (v. 26).
O autor aos Hebreus afirma que sem fé é impossível agradar a Deus. Aquele
que vem a Deus deve crer que Ele existe e que é galardoador dos que o buscam
diligentemente (Hb 11.6). Uma pessoa que não crê em Deus é cética e nem deve
orar. A oração para ela não existe. Mas se você crê em Deus, fale com Ele
através da oração. Deus ouve e responde as nossas orações.
Você tem cumprido essas condições alistadas por Jesus? Você tem sido
atendido em suas orações? Aproveite a oportunidade e avalie sua vida de oração!
Jesus é questionado, mas confronta os líderes judaicos
Mc 11.27–33
Os versos 27 a 33 mostram outro confronto entre Jesus e os religiosos, ainda na
terça-feira. Nesse caso, os principais da religião judaica desafiaram Jesus,
questionando-o sobre sua autoridade. Estavam sempre tramando contra Jesus e
cheios de ódio contra Ele.
Então, lhe perguntaram:
28. Com que autoridade fazes estas coisas? Ou quem te deu tal
autoridade para as fazeres?
29. Jesus lhes respondeu: Eu vos farei uma pergunta; respondei-me, e
eu vos direi com que autoridade faço estas coisas.
30. O batismo de João era do céu ou dos homens? Respondei-me!
As autoridades judaicas queriam colocar Jesus contra a parede. Se Ele
dissesse que a sua autoridade vinha de Deus, o acusariam de blasfêmia e
poderiam prendê-lo, pois era esse o propósito deles. Se dissesse que a autoridade
era dele mesmo, o rejeitariam, o expulsariam do templo como um fanático e o
desacreditariam diante da multidão. Poderiam também prendê-lo por ter feito
todo aquele “estrago” no dia anterior.
Mas antes de responder a pergunta, Jesus demonstrou sabedoria e colocou
aqueles religiosos contra a parede! Eles ficaram sem saída.
Jesus trouxe à memória deles o caso de João Batista e lhes perguntou se João tinha exercido o seu
ministério por designação divina ou se, ao contrário, tinha sido comissionado para isso pelas
autoridades judaicas (v. 30). Eles se recusaram a encarar essa pergunta honestamente por conta das
consequências desconcertantes em que se meteriam se resolvessem enfrentar a questão… Espetado
na ponta de um dilema, recusaram-se, covardemente, a responder à pergunta de Jesus, com o que
Jesus se recusou a responder à pergunta deles (v. 33) (BRUCE, 2009, p. 1625).

O texto nos mostra que eles fizeram uma rápida conferência entre si: Se
dissermos: Do céu, dirá: Então, porque não acreditastes nele? Se, porém,
dissermos: dos homens, é de temer o povo. Porque todos consideravam a
João como profeta (v. 31–32). Jesus, percebendo a intenção do coração deles e
querendo mostrar ao povo quem eram esses líderes religiosos, fez a pergunta que
os calou. Poderiam responder, mas qualquer resposta que dessem os denunciaria
diante do povo.
O silêncio desses religiosos provou que não estavam interessados na resposta.
Provou que era uma armadilha, mas diante de Jesus ela não funcionou. O
silêncio e a negativa em responder a pergunta de Jesus provaram que queriam
apenas apanhar Jesus numa armadilha, porque Ele era uma constante ameaça ao
sistema que impuseram de uma religião vazia e hipócrita.
O verso 33 conclui esse relato com as seguintes palavras: Então,
responderam a Jesus: Não sabemos. E Jesus, por sua vez, lhes disse: Nem eu
tampouco vos digo com que autoridade faço estas coisas.
Jesus se recusou a atender seus oponentes, se recusou a responder a pergunta
dos inimigos porque não criam (8.11–13). Cristo sempre respondeu a todos os
que lhe perguntavam interessados em aprender. Porém, sempre confrontou os
que perguntavam com más intenções, com artimanhas, querendo derrotá-lo por
não crerem nele.
A maneira como Jesus os tratou foi a melhor possível. Eles tentaram
confundi-lo com perguntas, mas saíram confundidos diante de Jesus. Esses
religiosos não imaginavam que Jesus tinha percebido suas intenções. Mas o
Senhor Jesus revelou o seu discernimento. Ele conhece perfeitamente o interior e
a motivação do homem. Ele conhece o nosso interior. Jesus não lhes respondeu
por que percebeu más intenções e incredulidade em seus corações.
E você? Quando questiona Jesus, o faz com fé, humildemente? Ou questiona
o seu Senhor exigindo satisfação sobre a maneira como age com você e com o
mundo ao seu redor? Lembre-se: nós somos servos. Jesus é o Senhor!

Marcos 12 - O servo é desafiado em seu


ensino
Uma parábola, o ensino sobre o tributo, a ressurreição e o grande
mandamento
Anteriormente dissemos que Marcos era o evangelho dos milagres e da ação.
Mas Marcos não quis deixar de enfatizar outra particularidade do ministério de
Jesus. Conforme Mateus, Jesus percorria cidades e povoados … ensinando nas
sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e
enfermidades… (Mt 4.23; 9.35). Dissemos também, e constatamos agora, que
nesta etapa do ministério Jesus se concentrou mais em ensinar e claramente
caminhou para a cruz, porque os seus inimigos aumentavam a maldade contra
Ele. O conteúdo destes sete ensinos aconteceu na terça-feira daquela última
semana. Vamos analisá-los individualmente:
Na terça-feira
Parte 1 – Jesus ensina através da parábola dos lavradores maus (v. 1–12)
Parte 2 – Jesus ensina sobre o pagamento do tributo (v. 13–17)
Parte 3 – Jesus ensina sobre a ressurreição (v. 18–27)
Parte 4 – Jesus ensina sobre o grande mandamento (v. 28–34)
Parte 5 – Jesus ensina sobre o Cristo (v. 35–37)
Parte 6 – Jesus ensina sobre a hipocrisia (v. 38–40)
Parte 7 – Jesus ensina sobre a verdadeira adoração (v. 41–44)
Destaca-se neste capítulo uma mudança de estratégia da parte de Jesus.
Sabendo que “o seu tempo” chegava rapidamente, em alguns desses ensinos Ele
mesmo tomou a iniciativa, desafiando os líderes judaicos.
A iniciativa passa para o servo, que por meio de parábolas revela que a
rejeição sistemática dos mensageiros de Deus por parte de Israel, que
culminaria com a rejeição do Filho, acabaria por trazer o juízo divino
(CARDOSO PINTO, 2008, p. 97).
Jesus ensina através da parábola dos lavradores maus
Mc 12.1–12
Os versos deste parágrafo registram a parábola dos lavradores maus. Depois de
muitas provocações dos religiosos judeus, Jesus tomou a iniciativa e contou uma
parábola que ilustrava a relação Deus-Israel. Jesus disse que o dono de uma
vinha, tendo-a preparado com uma cerca e um tanque para prensar as uvas,
arrendou-a para lavradores e viajou, saindo do país.
Depois de um tempo de viagem, na hora da colheita, enviou seu servo para
receber a parte dos frutos. O texto mostra que os lavradores maltataram,
apedrejaram e mataram cada um dos que foram enviados. Diante do ocorrido,
conforme o verso 6, esse homem decidiu enviar seu filho, entendendo que
aqueles lavradores o respeitariam.
Observemos como é descrito (somente aqui em Marcos) o último enviado do Dono da vinha:
“Restava-lhe ainda um, seu filho amado” (v. 6). Essa frase nos recorda as palavras que Deus disse a
Abraão: “Toma teu filho, teu único filho… a quem amas” (Gn 22.2). Temos aí uma comovente
indicação das afeições do Pai pelo seu Filho amadado, que ele sacrificou por nós! (KOECHLIN,
2001, p. 95).

A intenção do dono da vinha era boa, mas aconteceu o contrário, e também


mataram o filho dele. Diante da pergunta de Jesus sobre qual deveria ser o
procedimento do proprietário, Que fará, pois, o dono da vinha? (v. 9), os
fariseus, ao perceberem que estavam sendo retratados na parábola, nem
responderam. E Jesus, então, completou: Virá, exterminará aqueles lavradores
e passará a vinha a outros (v. 9). Jesus mostrou-lhes que o proprietário deveria
exterminar os lavradores malvados e oferecer a oportunidade para outros servos.
O proprietário da vinha deveria arrendá-la a outros trabalhadores, dando assim
mais uma oportunidade do trabalho ser realizado.
Mas Jesus foi adiante e disse: Ainda não lestes esta Escritura: A pedra que
os construtores rejeitaram, essa veio a ser a principal pedra, angular (v. 10).
Jesus citou o Salmo 118.22–23, referindo-se também a Isaías 8.14 e Daniel
2.34,44. O ponto central é: se a pedra no Salmo apontava para Davi, que foi
desprezado por Golias, pela própria família e por Samuel, e um dia foi ungido
por Deus como rei de Israel, assim também Jesus, rejeitado por todos, seria
ungido, tornando-se a pedra principal. Jesus citou estas Escrituras referindo-se a
si mesmo.
O significado desta parábola é muito claro. Os servos enviados são os
profetas mandados por Deus. O homem que plantou a vinha é o próprio Deus; e
a vinha é a nação de Israel. Deus escolheu esta nação e a protegeu, porque tinha
plano de usá-la como um instrumento de comunicação do seu amor ao mundo.
Os lavradores são os líderes religiosos, e o filho amado que foi enviado por
último é Jesus Cristo. Jesus é o Filho unigênito de Deus que foi enviado à nação
de Israel primeiramente. Ele foi enviado ao mundo, mas inicialmente às ovelhas
perdidas de Israel. E como João mencionou: Veio para o que era seu, e os seus
não o receberam (Jo 1.11). Com essas palavras, notamos que Jesus fez um
ataque direto aos guias religiosos do seu tempo.
Quando Jesus disse que a pedra que os construtores rejeitaram veio a ser a
principal, pedra angular, revelou todo o seu ensino. O próprio Jesus foi a pedra
de escândalo, uma pedra de ofensa para os líderes religiosos. Muitos que se
achegaram a Cristo pela fé tornaram-se depois pedras para o alicerce da igreja,
como os apóstolos (Ef 2.20). Mas Cristo é a pedra angular, a pedra de esquina, o
verdadeiro fundamento da igreja (1Co 3.11; 1Pe 2.4–8).
Jesus, que foi desprezado pela liderança religiosa de Israel, foi a principal
manifestação de Deus para o seu povo. Mas essa mesma liderança o matou, e
assim a oportunidade de salvação e de proclamação foi entregue aos gentios.
Jesus, mesmo sabendo que estavam planejando contra Ele, mostrou-lhes que
tinha consciência e conhecia tudo. Assim, conforme o verso 12, quando os
líderes religiosos perceberam que Jesus se referia a eles e a si mesmo, em vez de
aproveitarem a oportunidade, e arrependidos se firmarem nele, que é a rocha, se
calaram, desistiram de se contrapor à sua sabedoria e se foram.
Qual tem sido a sua reação quando Jesus lhe declara certas verdades, falando
ao seu interior, falando através da sua Palavra ou da palavra de um outro cristão?
Você dá ouvidos ou desiste e vai embora?
Jesus ensina sobre o pagamento do tributo
Mc 12.13–17
Nesse episódio, as autoridades religiosas tomaram a iniciativa. Eles desafiaram
Jesus com uma pergunta perspicaz, e esses versos registram o ensino sobre a
questão do tributo. Os fariseus, agora associados aos herodianos, com quem
concordavam politicamente pelas vantagens que recebiam (veja 3.6; 8.15; Mt
22.16), tentaram novamente apanhar Jesus em algum deslize.
Começaram com elogios a Jesus. Iniciaram o diálogo com lisonjas para tentar
encobrir o propósito maldoso da pergunta. A pergunta feita foi direta: é lícito
pagar tributo a César ou não? Devemos ou não pagar? (v. 14). A pergunta
aqui, que parece tão inteligente, era maldosa, pois estavam com hipocrisia, com
a intenção de fazer Jesus cair em alguma contradição. Mas Jesus descobriu logo
a falta de sinceridade dos seus interlocutores, pois queriam com essa pergunta
colocá-lo num beco sem saída.
Se Jesus tivesse dito: sim, vocês devem pagar o tributo a César, então eles o
denunciariam ao povo. Os líderes religiosos interpretariam essa resposta
afirmativa mostrando que, para Jesus, César deveria estar acima de Moisés e do
próprio Messias. Assim, eles colocariam Jesus contra a maioria do povo judeu,
que sofria pelas pesadas taxas que todos tinham que pagar como tributo a Roma,
o país dominador. Se, entretanto, Jesus dissesse: não, não devem pagar o
imposto, não devem entregar o tributo a Cesar, então Jesus seria acusado de
promover uma rebelião política, de incitar um levante contra Roma. Eles
traçaram bem a trama, traçaram bem o ardil contra Jesus e, no entendimento
deles, Jesus não tinha como escapar.
Jesus, porém, conhecia a maldade do coração humano e questionou-os: Por
que me experimentais? (v. 15). A questão para os fariseus e herodianos é que
tinham se esquecido, ou não criam, que Jesus pudesse conhecer o interior do ser
humano.
Jesus começou sua resposta pedindo-lhes uma moeda para ver a efígie. Com a
moeda em mãos, Jesus foi muito direto e perguntou-lhes: De quem é esta efígie e
inscrição? Responderam: De César. Disse-lhes, então, Jesus: Dai a César o
que é de César e a Deus o que é de Deus (v. 16–17).
Essa resposta de Jesus merece cinco considerações.
1. Os impostos devem ser pagos às autoridades governamentais.
2. O pagamento dos impostos indica que o cidadão de determinada localidade
não pode receber por toda a vida os benefícios do governo sem participar das
responsabilidades.
3. Falsos religiosos estavam usando as belas estradas pavimentadas que foram
abertas por César; estavam gozando da paz implantada no mundo por ele;
estavam desfrutando da liberdade que lhes dava de continuarem cultuando no
templo; usufruíam de todos os benefícios públicos que havia propiciado para
o mundo de então e, mesmo assim, não queriam pagar o imposto que lhe era
devido.
4. Jesus também pagou os seus tributos (Mt 17.24–27).
5. Temos também a nossa responsabilidade para com Deus. Jesus não disse
somente: dai a César o que é de César. Ele logo acrescentou: E a Deus o
que é de Deus. O homem também tem responsabilidade para com Deus e é
isso que muitos não sabem, ou se esquecem. Estamos vivendo num mundo
tão cético e materialista que poucos são os que sabem que também têm
responsabilidade para com Deus e sua obra.
Os fariseus e os herodianos pensaram que tinham a pergunta certa para
colocar Jesus numa situação caótica. Mas se enganaram. Jesus respondeu com
extrema sabedoria e expôs a má intenção dos seus corações. Ele ensinou a todos
os que o ouviam que a moeda que levava a efígie do imperador devia ser dada ao
imperador, indicando a responsabilidade de cada cidadão para com o Estado.
Mas Jesus foi além. Ele mostrou que aquilo que tem a imagem de Deus, isto é, a
nossa própria vida, deve ser entregue a Deus, pois pertence a Ele!
Diante dessa lição, diante este aspecto que ninguém até então tinha pensado,
muitos se admiraram da sua resposta (v. 17).
Querido amigo, você é um bom cidadão? Lembre-se: se você já tem a Jesus,
então é cidadão de dois reinos: do Reino de Deus e do reino humano, da nação
onde você mora. Então, mais uma vez eu lhe pergunto: você tem cumprido com
suas responsabilidades para com os dois reinos a que pertence? Você tem pagado
os impostos, as taxas, os tributos e todos os encargos que a legislação exige?
Mas, por outro lado, você tem contribuído com alegria, generosidade e gratidão,
ofertando a Deus como reconhecimento de que Ele é o seu dono, o seu Senhor, e
quem lhe dá tudo? Diante desse ensino de Jesus, use essa oportunidade e avalie-
se!
Jesus ensina sobre a ressurreição
Mc 12.18–27
Mais uma vez a liderança dos judeus tomou a iniciativa do diálogo. Uma vez que
os fariseus e os herodianos não tiveram como superar Jesus com a pergunta de
caráter político, vieram os saduceus para questionar Jesus sobre um tema
teológico, um tema sobre o qual eles mesmos não criam. Ao perguntarem sobre a
ressurreição, estavam tentando ridicularizar não só a Jesus, mas também à
própria doutrina da ressurreição. Assim, nesse terceiro episódio, Marcos narra a
controvérsia sobre a ressurreição.
A intenção era a mesma e a pior possível. Então, depois dos fariseus e
herodianos serem calados por Jesus, vieram os saduceus para interrogá-lo, para
tentarem apanhá-lo em alguma contradição com a finalidade de acusá-lo,
prendê-lo e matá-lo. Na verdade, percebemos que diante de Jesus, e com o
objetivo de se livrarem dele e de suas acusações diretas, todas as facções do
judaísmo que se opunham umas às outras, tendo Jesus como inimigo comum, se
uniam para tentar conquistar seus objetivos:
A. Queriam desacreditar Jesus e seus ensinos diante do povo.
B. Queriam acusá-lo por uma palavra ou uma ação passível de má
interpretação.
C. Queriam prendê-lo, julgá-lo e matá-lo. O objetivo final de todos os
grupos, fariseus, saduceus, herodianos, escribas e os membros do Sinédrio
(corte suprema de Israel), era se livrar de Jesus o quanto antes.
Em relação aos saduceus, é importante lembrarmos algumas de suas
características distintas. Eles eram mais um grupo religioso dentro do cenário
religioso de Israel. Eram liberais e não criam na ressurreição, na existência dos
anjos, em milagres e nos atos sobrenaturais de Deus. É difícil determinar sua
origem, mas sabemos que já existiam nos últimos dois séculos do segundo
templo, em completa discórdia com os fariseus. O nome deles, provavelmente,
vem do sumo sacerdote Zadoque, que foi escolhido para dar continuidade à linha
sacerdotal dos tempos de Davi (1Cr 15.11–15; 27.17; 29.22).
E segundo o programa ideal da constituição de Ezequiel, devia ser a única
família a exercer o sacerdócio na nova Judeia, de modo que dizer saduceus era
como dizer “pertencentes ao partido da estirpe sacerdotal dominante”. Eles
diferenciavam-se por não aceitarem a tradição oral, a interpretação literal e
legalista da lei feita pelos fariseus. Tendo muitos contatos com ambientes
helenizados, estavam inclinados a algumas modificações ou helenizações. O
conflito entre os diversos partidos foi o desastre dos últimos anos antes da queda
de Jerusalém.
Os saduceus apresentaram um caso hipotético bem interessante a Jesus a
respeito da lei do levirato (Dt 25.2–10), também chamada de “lei do parente
resgatador”. Ela dizia que se um homem casado morresse sem deixar um filho, a
sua esposa, viúva, deveria se casar com o irmão do falecido para dele suscitar
descendência ao irmão (v. 18–19). Quando estudamos Gênesis, vimos um caso
semelhante a esse em relação aos filhos de Judá (Gn 38).
O caso apresentado pelos saduceus foi o de uma mulher que casou-se com o
primeiro de sete irmãos. Este veio a falecer e não teve filhos. Assim, ela
desposou o segundo irmão que também faleceu sem que tivesse um filho. Esse
mesmo fato aconteceu com o terceiro irmão e ela foi casando com todos os sete,
que também faleceram e não tiveram filhos. A mulher, posteriormente, também
faleceu. Então, eles perguntaram a Jesus: Na ressurreição, de qual deles ela será
esposa, já que os sete a desposaram (v. 20–23)?
É importante vermos a má intenção da pergunta. Se os próprios saduceus não
criam na ressurreição, por que perguntarama Jesus a respeito de algo que
envolvia essa doutrina? Ora, a intenção deles era ridicularizar Jesus e ver se a
sua resposta serviria para acusá-lo.
Mas Jesus lhes respondeu:
24. Não provém o vosso erro de não conhecerdes as Escrituras, nem o
poder de Deus?
25. Pois, quando ressuscitarem de entre os mortos, nem casarão, nem
se darão em casamento; porém, são como os anjos nos céus.
26. Quanto à ressurreição dos mortos, não tendes lido no livro de
Moisés, no trecho referente a sarça, como Deus lhe falou: Eu sou o
Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó?
27. Ora, ele não é Deus de mortos, e, sim, de vivos. Laborais em
grande erro.
Jesus disse que o problema dos seus inimigos era o desconhecimento da
Palavra de Deus e do seu poder. O problema dos saduceus é o mesmo problema
dos céticos e incrédulos de hoje. O problema deles era desconhecerem a Palavra
e o poder de Deus. Depois de explicar que no céu não haverá casamento, pois a
realidade aqui da terra já passou e os salvos serão como os anjos, Jesus ensinou
sobre a ressurreição, dizendo-lhes que o Deus que pelo seu poder deixou a sarça
ardendo para chamar a atenção de Moisés não é Deus de mortos, mas de vivos.
Jesus citou Êxodo 3.6, um texto do Pentateuco que era aceito pelos saduceus.
Através dele mostrou que, para Deus, Abraão, Isaque, e Jacó não estavam
mortos. Deus é Deus de vivos e não de mortos. Conforme Bruce (2009, p. 1627),
“A falha dos saduceus, portanto, era que eles não conheciam as Escrituras que
ensinavam a ressurreição, nem o poder de Deus que poderia efetuar a
ressurreição (v. 24)”. Portanto, esse Deus de vivos é suficientemente poderoso
para garantir a ressurreição de todos os que creem nele. Ele também garante que
todos os crentes que morreram em Cristo não estão mortos.
Mas, que lições podemos extrair desse texto? É possível percebermos a sua
relevância?
Desta passagem, aprendemos quanta injustiça podemos detectar, com frequência, nos argumentos
dos infiéis… aprendemos ainda que um grande número de erros religiosos pode ser resultado da
ignorância acerca das Sagradas Escrituras… Por outro lado, as igrejas locais que mais florescem,
em nossos dias, são aquelas que honram a Bíblia… os homens e mulheres mais santificados são os
que leem regularmente a Bíblia… aprendamos quão diferente serão as circunstâncias após a
ressurreição, em relação às que atualmente vivemos… há conforto para o verdadeiro cristão. No
corpo que agora possui, com frequência ele geme angustiado. No mundo por vir, entretanto, todas
essas coisas serão mudadas. Coisa alguma faltará para torná-lo completamente feliz (RYLE, 2007,
p. 153–155).

A resposta que Jesus deu aos saduceus do seu tempo foi surpreendente. A
pergunta que se faz necessária hoje é: você crê na ressurreição? E ainda mais:
você tem certeza de que, ressuscitado, estará para sempre com o Deus dos vivos
eternamente?
Jesus ensina sobre o grande mandamento
Mc 12.28–34
Motivado pela resposta que Jesus tinha dado aos saduceus, e percebendo que a
base da sua argumentação tinha sido a lei claramente citada, um escriba, que
aparentemente era sincero e também conhecia a lei, perguntou a Jesus sobre o
grande mandamento. O ensino aconteceu quando o escriba lhe perguntou qual
era o principal dos mandamentos. A resposta de Jesus foi clara: Ouve, ó Israel,
o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor! Amarás, pois, o Senhor, teu Deus,
de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de
toda a tua força (v. 29–30). Nessa resposta Jesus citou a passagem de
Deuteronômio 6.4–5.
Mas Jesus foi além, e acrescentou: O segundo é: Amarás o teu próximo
como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes (v. 31). Ele
citou outro texto da lei (Lv 19.18) como complemento à sua resposta. O escriba,
por sua parte, demonstrando seu conhecimento da lei, concordou com Jesus e
ainda acrescentou que esse mandamento excedia a todos os holocaustos e
sacrifícios (v. 33). Quando o escriba concordou e até elogiou a resposta de Jesus,
acrescentou essa frase sobre os holocaustos e sacrifícios, pois, na verdade:
Ele percebeu os erros da ênfase dos escribas no ritualismo e sacrifícios. Tendo avaliado aquele que
o veio avaliar, Jesus diz: “Não estás longe do reino de Deus” (34). Em contrastes com os saduceus
que estavam se afastando das Escrituras e do poder de Deus (12.24), esse escriba está se
aproximando do reino de Deus (MOLHOLLAND, 2006, p. 188).

Quando Jesus ouviu a resposta do escriba, certamente se comoveu. Percebeu


certo discernimento espiritual nele e, por isso, disse que o escriba não estava
longe do reino de Deus. Mas como disse Pohl (1998, p. 353), “os que estão perto
ficam do lado de fora junto com os que estão longe, até reconhecerem o
‘mistério do reinado de Deus’ (4.11), até que Jesus lhes seja manifesto como
Messias rejeitado”. E, assim, ninguém mais ousou interrogar Jesus (v. 34).
Você é capaz de obedecer a estes mandamentos: amar a Deus de todo o
coração, alma, entendimento e de toda a sua força, e amar o seu próximo como a
si mesmo? Honestamente, é difícil e até impossível obedecer. Por isso
precisamos do Espírito Santo como nosso capacitador. As leis de Deus não são
pesadas, elas são reduzidas a essas duas regras fundamentais de vida: amar a
Deus e amar ao próximo. Quando amarmos sinceramente a Deus, amaremos
consequentemente ao próximo. Mas isso só é possível pela presença de Jesus
através do Espírito Santo em nossa vida.
Jesus percebeu na conversa com o escriba que ele estava bem encaminhado e
perto do reino de Deus. E você, onde está? Está perto? Está longe? Ou já está
dentro do reino? Estar longe significa estar perdido. Estar perto significa estar
perdido. O importante é ser um cidadão do reino!
Jesus ensina sobre o Cristo
Mc 12.35–37
No quinto episódio deste capítulo, nos versos 35 a 37, Jesus confrontou os
fariseus. Depois de afirmar que ninguém tinha mais coragem de enfrentar Jesus,
Marcos nos mostra que os debates pessoais ou em grupo não aconteceriam mais.
E, assim, novamente, Jesus tomou a iniciativa e questionou os escribas. Jesus
lançou uma pergunta interessante: como explicar que o Messias é filho de Davi,
se o próprio Davi, pelo Espírito Santo, ao compor o Salmo 110.1, chamou o
Messias de seu Senhor? Ora, se o Messias é seu Senhor, como é filho de Davi?
Se Davi, pois, chama o Messias de Senhor, como é que o Messias é seu filho?
Afinal de contas, que pai se dirige ao filho chamando-o de “meu Senhor”?
Jesus estava tentando fazer com que os fariseus entendessem e aceitassem que
o Filho de Davi também era o Senhor de Davi, isto é, o Messias era ao mesmo
tempo descendente humano de Davi e também o seu divino Senhor.
Para nós que cremos, a resposta à pergunta de Jesus é clara e pode ser
explicada. Como disse MacDonald (2008, p. 139), “O Messias seria tanto
Homem como Deus. Como Filho de Davi, ele seria humano. Como Senhor de
Davi, ele seria divino”. Jesus tentou revelar-se a eles como Messias, mas
infelizmente não o compreenderam. Diante dessas perguntas, diante dessas
colocações que deveriam ser respondidas espiritualmente, os escribas ficaram
calados, sem saber o que responder, enquanto a multidão ouvia Jesus com prazer.
Qual tem sido a sua reação diante dos ensinos e dos esclarecimentos de Jesus?
Você tem prazer, sente alegria em perceber como Jesus agiu, ensinou e
proclamou o evangelho do reino, trazendo-nos salvação? O prazer e a alegria
pelos ensinamentos do Senhor devem nos levar a adorá-lo e a agradecer ao Pai
que o enviou a nós.
Jesus ensina sobre a hipocrisia
Mc 12.38–40
Ainda na terça-feira, quase no final do dia, nos versos 38 a 40, Jesus tomou a
iniciativa e censurou os escribas. Na sequência do texto, os religiosos não
conseguiram interpretar corretamente a questão do messianato. Nesses três
versos, Jesus, dirigindo-se à multidão, advertiu-a contra a prática dos escribas.
Por constatar e demonstrar que os líderes religiosos não conheciam e nem
conseguiam interpretar os temas mais importantes das Escrituras, Jesus chamou
a atenção do povo.
A fim de colocar o povo em guarda contra esses líderes indignos, o Senhor
então faz um triste relato dos escribas vaidosos, avarentos e hipócritas.
Infelizmente, esses traços têm, às vezes, caracterizado também outros “líderes
espirituais” afora os de Israel (1Tm 6.5) (KOECHLIN, 2001, p. 97).
Jesus advertiu contra o perigo da vaidade espiritual. Os escribas andavam
com roupas especiais e gostavam das saudações nas praças, dos primeiros
lugares nos auditórios e das primeiras cadeiras nas sinagogas. Como não tinham
salário fixo e dependiam de patrocinadores, as viúvas eram os alvos preferidos
desses mestres insensíveis. Muitos deles se aproveitavam do costume de serem
sustentados por outros patrícios e os exploravam, tirando dos pobres tudo o que
possuíam e aproveitando-se dos ricos de todas as maneiras possíveis. Jesus disse
que eles devoravam as casas das viúvas.
E o pior é que, para justificar o mau procedimento, para atenuar o erro
cometido, fingindo-se de piedosos, eles faziam longas orações em público
aparentando uma profunda espiritualidade. Assim conquistavam posição,
reconhecimento e respeito.
Jesus estava advertindo contra esses professores que gostavam de parecer
santos e receber honras, quando na verdade não passavam de hipócritas. E essa
advertência serve para nós hoje. De nada adianta lermos a Bíblia, orarmos ou
seguirmos os rituais da igreja se o nosso comportamento não estiver de acordo
com a nossa crença. Como disse Tiago: Meus irmãos, não vos torneis, muitos de
vós, mestres, sabendo que havemos de receber maior juízo (Tg 3.1). O castigo
dos líderes será maior, pois eles são os professores e os guias do povo.
Jesus ensina sobre a verdadeira adoração
Mc 12.41–44
Finalizando esse capítulo, usando o exemplo de uma viúva pobre, Jesus ensinou
sobre a verdadeira adoração. Exatamente depois de falar sobre as pobres e
inocentes viúvas que eram exploradas por alguns mestres da lei, Jesus se
defrontou com uma cena especial. Assentado nas dependências do templo, bem
próximo ao gazofilácio, observando como o povo contribuía, Jesus constatou
que os ricos colocavam nessa caixa grandes quantias de dinheiro. Porém, a
atenção de Jesus foi atraída para uma pobre viúva que ofertou tudo o que tinha:
duas moedas, que correspondiam aos nossos centavos, o menor valor em
circulação. Aproveitando a oportunidade, Ele chamou os discípulos e lhes
ensinou um dos princípios mais importantes na área da contribuição financeira.
Jesus mostrou-lhes que Deus não olha para a quantidade que damos, mas para o
espírito ou o sentimento com que ofertamos.
Para Jesus, aquela viúva contribuiu muito mais do que todos os ricos que
depositavam grandes quantias, porque davam do muito que lhes sobejava. Muita
gente pensa que Deus está interessado na quantidade da oferta. Mas Ele mostrou
exatamente o contrário. Deus olha para o coração. Ele vê que lugar lhe damos.
Deus quer ver a motivação do nosso coração.
Nos dias de hoje, infelizmente, muitas pessoas, estimuladas por líderes
cobiçosos, avarentos e mal intencionados, contribuem com suas finanças com
propósitos e motivações totalmente contrários ao espírito de adoração. Em vez
de contribuírem com alegria, com gratidão por tudo o que o Senhor lhes tem
dado, contribuem esperando receber em troca muito mais do que ofertaram.
Muitos tentam negociar e barganhar com Deus, entendendo que, tendo
contribuído com alguma quantia, Ele está obrigado a lhes retribuir com muito
mais.
Infelizmente estas pessoas estão erradas. A atitude daquela viúva pobre é a
atitude que Deus espera de cada um de nós. Dar tudo, entregar a própria vida, em
demonstração da nossa disposição de servi-lo e adorá-lo.
Que a sua oferta seja o reflexo de que você tem dado a Deus o primeiro lugar
em sua vida!
Mas ainda em relação a essa ocasião, Robertson comenta:
Esta é a última vez que Jesus aparece no templo. Encerra-se o ministério público de ensino, exceto
pelas suas palavras de defesa, em seu julgamento, e as sete palavras da cruz. Fariseus e saduceus se
retiraram, furiosos, diante da explícita condenação de Jesus e até mesmo seus discípulos ficaram a
alguma distância, enquanto Jesus sentava-se a sós diante do gazofilácio (ROBERTSON, 1922, p.
172).

Provavelmente, depois desse episódio, ainda na terça-feira, ao saírem do


templo para retornarem a Betânia, Jesus proferiu o “sermão escatológico”.
Porém, esse não foi mais um ensino público, mas particular para os seus
discípulos.

Marcos 13 - O servo proclama seu


sermão profético
O princípio das dores, a grande tribulação e a vinda do Filho do Homem
Estamos nos aproximando do final do Evangelho de Marcos e, através do seu
relato, constatamos que o ministério de Jesus estava chegando ao final. Muito
breve Ele estaria na cruz do Calvário derramando seu sangue para nos perdoar os
pecados e nos dar a salvação.
O capítulo que vamos estudar agora trata de um dos temas mais delicados da
Palavra de Deus. Neste capítulo, que é chamado de “Pequeno Apocalipse” ou
“Sermão do monte das Oliveiras”, vamos estudar sobre escatologia, isto é, a
parte da teologia que trata das coisas do final dos tempos.
Este capítulo tem trazido grandes dificuldades de interpretação aos estudiosos
e comentaristas por algumas razões.
1. Esse discurso foi feito em linguagem apocalíptica, e isso significa que
muitas palavras e símbolos têm um significado oculto. Foi necessário que
Marcos registrasse assim as palavras de Jesus para que os inimigos da igreja,
quando apanhassem esses escritos, não tivessem condições de entendê-los
claramente, trazendo mais complicações para os cristãos primitivos. Embora
essa palavras talvez fossem mais bem entendidas pelos primeiros cristãos,
para nós trazem dificuldades de interpretação.
2. Nesse discurso, Jesus intencionalmente entrelaçou referências à destruição
do templo e de Jerusalém, que ocorreu no ano 70 d.C., com referências à sua
segunda vinda, no final dos tempos.
3. Esse discurso deve ser interpretado sob a visão das circunstâncias literárias
daqueles dias em que se manifestava de modo claro a “esperança
messiânica”, isto é, o desejo de um messias que pudesse libertar Israel do
domínio romano, no grande e terrível dia do Senhor.
4. Desse discurso não podemos esperar uma cronologia dos tempos do fim. É
muito provável que as palavras de Jesus aqui registradas não tenham sido
ditas apenas nessa ocasião. Um dito, uma palavra referente ao tema,
pronunciada em outra ocasião, por certo foi colocada aqui, pois fazia parte do
mesmo tema, como vemos no capítulo 13 de Mateus, quando o autor
registrou diversas comparações sobre o reino de Deus como se fossem ditas
numa só ocasião.
5. Nesse registro feito por Marcos, temos que notar a presença e a ação do
Espírito Santo orientando e inspirando o autor sagrado a escrever e registrar
dessa maneira, com essa linguagem, pois o seu objetivo era alcançar os
romanos com a mensagem do evangelho.
Diante dessas considerações, vamos estudar detalhadamente cada uma das
cinco partes que compõem este capítulo.
Na terça-feira
Parte 1 – Jesus é interrogado pelos discípulos (v. 1–4)
Parte 2 – Jesus ensina sobre os eventos antecedentes à sua segunda vinda (v.
5–23)
Parte 3 – Jesus ensina sobre a vinda do Filho do Homem (v. 24–27)
Parte 4 – Jesus ensina sobre o reconhecimento do tempo (v. 28–31)
Parte 5 – Jesus ensina sobre a necessidade da vigilância (v. 32–37)
Ao tratarmos sobre escatologia, devemos ter consciência de certas verdades,
como bem apontou Lopes (2008, p. 527):
A segunda vinda de Cristo é o assunto mais enfatizado em toda a Bíblia. Há cerca de trezentas
referências sobre a primeira vinda de Cristo na Escritura e, oito vezes mais sobre a segunda vinda,
ou seja, há mais de 2.400 referências sobre a segunda vinda em toda a Bíblia. A segunda vinda de
Cristo é o assunto mais distorcido e o mais desacreditado. Muitos falsos mestres negam que Jesus
voltará. Outros tentam enganar as pessoas marcando datas. Contudo, outros, dizem crer na segunda
vinda de Cristo, mas vivem como se ele jamais fosse voltar.

E você, qual tem sido a sua posição em relação a essa promessa que, no
tempo certo, no tempo divino, será cumprida? Se você tem algumas dúvidas,
creio que este estudo pode ajudá-lo. Vamos refletir sobre cada uma dessas cinco
partes.
Jesus é interrogado pelos discípulos
Mc 13.1–4
Em primeiro lugar, nos versos 1 a 4, Jesus ensina sobre a destruição do templo.
Para entendermos bem essas palavras de Jesus precisamos entender o contexto
em que elas foram ditas. No Evangelho de Mateus, na terça-feira da última
semana, ainda no templo, Jesus advertiu severamente os religiosos judeus (Mt
23.13–36). Saindo do templo e olhando para a cidade, fez um lamento sobre ela,
declarando que um dia ficaria deserta até que dissesse novamente: Bendito o que
vem em nome do Senhor, como tinha ocorrido no domingo, quando entrou em
Jerusalém montado num jumentinho (Mt 23.37–39).
Os apóstolos não entenderam como aquilo poderia acontecer com Jerusalém,
o centro religioso da nação, e chamaram a atenção de Jesus para o templo,
porque aquela construção era tão sólida, tão perfeita, com pedras tão grandes e
tão firmes que achavam que seria impossível se concretizar o que Ele havia dito.
Eles mostraram a Jesus as pedras, as construções, como que duvidando do
cumprimento da profecia feita por Jesus (v. 1).
De fato, aquela era uma construção que impressionava. Por volta de 19 a.C.,
cerca de 15 anos antes de Jesus nascer, Herodes começou a reconstruir o templo
que fora reconstruído por Esdras depois da volta do exílio da Babilônia, em 516
a.C. Herodes fez do templo uma das mais belas construções de Jerusalém. Seu
objetivo não era agradar a Deus, mas agradar e apaziguar os judeus, a quem
governava. Essa construção só foi terminada por volta de 64 d.C., mas logo
depois, em 70 d.C., quando os romanos invadiram Jerusalém sob o comando de
Tito, o templo foi completa e definitivamente destruído, e ainda permanece em
ruínas 21 séculos depois.
Diante da observação dos discípulos, salientando a construção do templo,
Jesus foi mais enfático e disse que não ficaria pedra sobre pedra que não fosse
removida (v. 2). Diante das palavras de Jesus, Pedro, Tiago, João e André,
perguntaram em particular a Jesus: Quando essas palavras serão cumpridas? E
que sinal haverá desses acontecimentos (v. 3)?
Essas perguntas que deram origem ao pronunciamento de Jesus têm sido
repetidas durante toda a história da Igreja. Muitas tentativas de interpretação da
resposta de Jesus têm sido dadas. Vamos analisar as palavras de Jesus para
entender a sua resposta.
Entretanto, é notório que muitos de nós nos orgulhamos das cidades em que
moramos, admiramos as grandes construções que temos em nossa vizinhança e
ficamos tão envolvidos com as visões desta vida que nem nos lembramos da
realidade da volta de Jesus. Porém, é bom lembrarmos que um dia tudo
desaparecerá, tudo será destruído. Todas as coisas serão arruinadas e removidas.
Nada aqui é eterno, senão as nossas vidas. Diante desse tema, você tem
construído sua vida alicerçada em valores humanos e passageiros ou está
firmado na rocha que é Jesus Cristo, sabendo que um dia Ele voltará?
Jesus ensina sobre os eventos antecedentes à sua segunda vinda
Mc 13.5–23
A partir do verso 5, Jesus começou a responder às perguntas dos discípulos
relativas à destruição do templo, advertindo-os contra os falsos mestres e contra
os falsos ensinos, pois como dissemos anteriormente, esse é uma tema em que as
opiniões e as afirmações são as mais diferentes possíveis. Temos que estar muito
atentos, porque por todo este capítulo vamos perceber que estão ligados ao
anúncio da destruição do templo que ocorreu em 70 d.C. e às profecias acerca
dos acontecimentos relacionados ao fim do mundo. Na verdade, conforme
Hendriksen (2003, p. 651), temos que entender que os acontecimentos
profetizados sobre a destruição do templo de certa maneira antecipavam e
serviam como tipo, como prefiguração dos acontecimentos do final dos tempos.
Nos versos 5 a 23 encontramos dez colocações feitas por Jesus sobre esse
tempo situado entre as duas vindas. Esse período é o tempo conhecido, referido e
descrito desde o Antigo Testamento e por todo o Novo Testamento. Além de
outras designações, esse tempo foi chamado de: “O ano aceitável da salvação”
(Lc 4.19); “o tempo dos gentios” (Lc 21.24); “Dia do justo juízo de Deus” (Rm
2.5); “Dispensação da graça” (Ef 3.2); “Dia de Cristo Jesus” (Fp 1.6, 2.16); “Dia
do Senhor” (1Ts 5.2, 2Pe 3.10); “Dia de Hoje” (Hb 3.13); “Dia que se aproxima”
(Hb 10.25); e “Dia de Deus” (2Pe 3.12). É o tempo que ultrapassa à queda do
templo e chega à segunda vinda de Jesus, quando Ele vier em poder e glória.
1. Jesus advertiu e pediu ações concretas de extrema cautela: ninguém vos
engane; não se assustem; não é o fim; ficai de sobreaviso; ai das que tiveram
grávidas; orai; não acrediteis; e, novamente, ficai de sobreaviso. Jesus, em
resumo, pediu vigilância.
2. Jesus mostrou alguns sinais desse tempo: muitos virão em meu nome;
muitos dirão “sou eu”; muitos serão enganados; ouvireis de guerras e rumores
de guerra; se levantará nação contra nação; reino contra reino; haverá
terremotos; haverá fomes; sereis presos; sereis açoitados; sereis colocados
diante de governadores e reis; haverá traição entre irmãos; entre pais e filhos;
sereis odiados de todos por causa do meu nome. Jesus, em resumo, mostrou
as dificuldades que todo cristão enfrentaria.
3. Jesus especificou a necessidade de alguns processos, pois tanto a
destruição do templo de Jerusalém como a segunda vinda não aconteceriam
sem antes acontecer aquilo que Ele mesmo chamou de “o princípio das dores”
(Mt 24.8). Essa expressão literalmente significa: “dores de parto”, isto é, o
nascimento de uma nova época (Jo 16.16–22).
4. Jesus disse que o evangelho deveria ser pregado à governadores, reis e a
todas as nações (v. 9–10). E isso de fato aconteceu, pois antes de 70 d.C., data
da queda do templo, o evangelho já tinha chegado ao conhecimento de reis e
governadores (At 25–26), a Roma, a capital, e às mais diversas localidades do
império (At 28.30–31; Rm 15.18–29).
5. Jesus especificou também que o Espírito Santo daria as palavras certas para
que os cristãos testemunhassem quando estivessem diante dos seus
acusadores (v. 11). Tal orientação não deve ser mal-entendida, pois em épocas
normais, para que possamos pregar a genuína Palavra, mantendo a fidelidade
da sã doutrina, necessitamos estudá-la e interpretá-la corretamente. E isso de
fato aconteceu, como por exemplo, com Estevão, que conhecia bem a Palavra
e a quem os seus opositores não puderam resistir (At 6.8–10).
6. Jesus especificou a necessidade da perseverança (v. 13). Embora a salvação
não tenha como pré-requisito a perseverança, mas a fé, a perseverança é
prova da verdadeira salvação (Ef 2.8–9; Hb 10.36).
7. Jesus especificou a necessidade do discernimento quando o templo fosse
profanado, quando fosse visto o abominável da desolação, o sacrilégio
terrível situado onde não deveria estar (v. 14). Sobre essa profecia temos três
indicações:
A. Antes da queda de Jerusalém, em 70 d.C., por volta de 66 d.C., quando
os zelotes tomaram o poder, eles mataram muitos sacerdotes no próprio
templo, profanando o local.
B. Em 70 d.C. o marechal Tito colocou um ídolo no local onde ficava o
templo, queimado e destruído junto com a cidade de Jerusalém. Ele
profanou o templo.
C. Referindo-se ao futuro, essa abominação pode ser uma referência a
profanação da Igreja, o templo de Deus, através da entrada de heresias,
falsas doutrinas ensinadas por falsos mestres, como infelizmente vemos
em nossos dias (1Tm 4.1; 2Tm 3.1).
8. Jesus especificou que haveria grande destruição, grande tribulação, como
nunca tinha acontecido e nunca mais aconteceria, conforme o verso 19 e
conforme Hendriksem (2003, p. 648). Isso de fato ocorreu, pois como nos
dizem os historiadores Josefo e Tácito, naqueles dias do cerco a Jerusalém,
por volta de 66–70 d.C., aqueles que estavam na cidade experimentaram uma
catástrofe de dimensões sobrenaturais, com a direta participação divina no
julgamento da cidade que crucificou o Salvador (Lc 19.43–44). Entretanto,
mesclando as duas épocas (ano 70 d.C. com a segunda vinda de Jesus), e
interpretando essa “grande tribulação” como os dias finais, esse período
causará grande perturbação, angústia e sofrimento, mas não acontecerá sem
que primeiro venha a apostasia e seja revelado o homem da iniquidade, o
filho da perdição (2Ts 2.3).
9. Jesus especificou também que, por causa dos eleitos, cristãos da primeira e
da última geração, esse tempo aterrorizante seria abreviado (v. 20). Alguns
cristãos judeus do primeiro século, atendendo essas palavras de Jesus,
fugiram de Jerusalém e se refugiaram em Pela, cidade próxima ao mar Morto.
E em relação aos cristãos em geral, antes da volta gloriosa de Jesus esse
tempo também seria abreviado, pois muitos dos eleitos poderiam ser
enganados pela artimanha do inimigo (v. 22; 1Jo 2.18).
10. Mas Jesus especificou também, conforme dissemos, que todos esses
sinais não seriam o fim (v. 7). Eles seriam apenas o princípio das dores (v. 8).
Na verdade, seriam os eventos cotidianos durante o tempo entre as duas
vindas de Jesus Cristo. Mas, sobretudo, Jesus revelou em termos gerais que
essas palavras não serviam para encorajar a especulação, mas para prevenir os
discípulos contra o engano. E como Ele mesmo tinha sofrido durante o tempo
do seu ministério, os seus discípulos deveriam estar preparados para o
sofrimento durante a jornada cristã (Ap 6.1–17).
Jesus ensina sobre a vinda do Filho do Homem
Mc 13.24–27
Os versos 24 a 27 referem-se à vinda do Filho do Homem. O texto diz assim:
24. Mas, naqueles dias, após a referida tribulação, o sol escurecerá, a
lua não dará a sua claridade,
25. as estrelas cairão do firmamento, e os poderes dos céus serão
abalados.
26. Então, verão o Filho do homem vir nas nuvens, com grande poder
e glória.
27. E ele enviará os anjos e reunirá os seus escolhidos dos quatro
ventos, da extremidade da terra até à extremidade do céu.
Estes versos apontam para a volta gloriosa de Jesus. Haverá um cataclismo
celeste, como profetizou Joel em 2.30–31, quando os astros serão abalados,
demonstrando que a vinda do Messias afetará tanto a humanidade como a
natureza. Quando o Filho do Homem vier sobre as nuvens do céu, virá com
grande poder e glória, glória que simboliza a presença de Deus, a glória
“schekiná”. O ponto máximo da história será a volta de Jesus Cristo. Na primeira
vinda, Jesus veio como servo, conforme vimos em 10.45. Mas na segunda vinda
Ele virá publicamente como Senhor do universo e da história, Rei dos reis,
Senhor dos senhores (Ap 19.16).
Mas um detalhe deve ser destacado. Como o plano salfívico de Deus, como a
salvação é universal, como a graça divina não faz acepção de pessoas, raças ou
qualquer outra divisão humana, Ele enviará os seus anjos, que reunirão os seus
escolhidos dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus, isto é, de
todos os lugares, de todos os cantos do mundo. Os eleitos, os escolhidos, serão
reunidos e certamente se alegrarão, ficarão agradecidos e encantados.
Nesse ponto, vale à pena interrompermos o detalhamento do texto para mais
uma vez perguntar: você se atemorizará diante da vinda do Messias, do Senhor
Jesus Cristo, não mais como Salvador, mas como Juiz? Ou se alegrará, pois
sendo um dos escolhidos será reunido pelos anjos divinos para estar para sempre
com o Senhor?
Jesus ensina sobre o reconhecimento do tempo
Mc 13.28–31
No quarto parágrafo, nos versos 28 a 31, encontramos a parábola da figueira.
Nessa parábola temos a exortação sobre a percepção dos sinais dos tempos. A
figueira pode referir-se a Israel, como já comentamos anteriormente. Mas, como
no texto paralelo de Lucas 21.29, Jesus fala sobre “a figueira e todas as árvores”,
não devemos fixar a interpretação pensando somente na nação judaica. O texto
diz assim:
28. Aprendei, pois, a parábola da figueira: quando já os seus ramos se
renovam, e as folhas brotam, sabeis que está próximo o verão.
29. Assim, também vós: quando virdes acontecer estas coisas, sabei
que está próximo, às portas.
30. Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que tudo
isto aconteça.
31. Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão.
Este é mais um dos ensinos em que vemos intercaladas palavras relativas
àqueles dias, àquela geração, com palavras relativas ao final dos tempos, à
segunda vinda de Cristo. No capítulo 13, esse sermão profético, além de nos
mostrar o cumprimento do que aconteceu à primeira geração, nos revela os
acontecimentos e nos mostra os sinais da segunda vinda de Cristo. Portanto,
esses sinais devem chamar a nossa atenção, devem nos fazer ficar atentos.
Como dissemos anteriormente, embora nem todos os cristãos tenham a
mesma posição escatológica, muitos entendem que a figueira seja símbolo de
Israel. Então, a figueira já está brotando, porque depois de séculos espalhados
por todas as partes do mundo, agora Israel já se acha em forma de país, em
forma de Estado. O povo judeu que se achava até quase meados do século
passado sem terra, sem pátria, já tem a sua terra. Nesse simbolismo, a figueira
que está brotando, Israel, é um país que causa admiração ao mundo.
Jesus ensinou aqui que, antes da sua segunda vinda, a figueira produziria folha. Em 1948, a nação
independente de Israel foi formada. Hoje essa nação exerce uma influência nos negócios mundiais
que está fora de toda proporção com seu tamanho. Pode-se dizer de Israel que “está brotando
folhas”. Mas ainda não há fruto até que o Messias volte a um povo que está disposto a recebê-lo
(MACDONALD, 2008, p. 141).

Quando a figueira está com os seus ramos se renovando e as suas folhas


brotando é sinal de que o verão está próximo. Portanto, conforme esta
interpretação, o fato de Israel já estar constituído novamente como nação é um
sinal para o qual devemos atentar.
Mas nessa parábola, o verso 30 merece comentários específicos: Em verdade
vos digo que não passará esta geração sem que tudo isto aconteça. Conforme
Keener (2004, p. 181), esse verso certamente se refere à profecia sobre a
destruição de Jerusalém e, de fato, aquela geração não passou sem que tudo o
que fora dito acontecesse. Calculando-se uma geração em 40 anos, e tendo Jesus
feito suas profecias entre os anos 29–30 d.C., esses acontecimentos referem-se à
destruição ocorrida no ano 70, sob o marechal Tito.
Em relação a geração mencionada, temos ainda outras colocações que
devemos destacar. Uma delas entende que a referência é à geração anterior à
tribulação, e que os acontecimentos ocorrerão num curto período de tempo:
A referência muito debatida à geração que irá testemunhar o cumprimento da profecia é melhor
entendida como uma indicação de que os eventos aqui preditos terão um rápido desenvolvimento
(se esta interpretação do Sermão Profético estiver correta, tudo irá durar apenas sete anos),
permitindo aos sobreviventes da tribulação testemunhar todos os eventos assustadores do tempo do
fim (CARDOSO PINTO, 2008, p. 99).

Ainda outros entendem que “esta geração” pode ser uma referência específica
aos judeus e aos descrentes que estarão presentes por todas as gerações:
… a palavra geração, genea, pode estar sendo usada em um de seus outros possíveis sentidos, que
incluem “família”, “raça”, e até mesmo “época”. Se genea está sendo usada com algum destes
sentidos, Jesus pode estar se referindo ao povo judeu, e pode querer dizer que eles serão
preservados como uma raça distinta até o final que foi previsto pelos profetas do Antigo
Testamento. Ou ele pode referir-se a “esta geração” como caracterizando aquela classe de pessoas
que não creem e são perversas, uma classe que irá persistir ao longo da história até que Jesus volte,
apesar do poder sobrenatural da mensagem do evangelho (RICHARDS, 2007, p. 79).
Contudo, podemos entender “esta geração” como “esta raça”, isto é, esta raça
de judeus incrédulos, de acordo com MacDonald (2008, p. 1410), pois “o
testemunho da história é que ‘esta geração’ não passou”. Porém, o fato é que
esses acontecimentos devem nos fazer ficar atentos e vigilantes para que
percebamos os sinais desse grande acontecimento.
E finalizando este parágrafo, no verso 31 Marcos registra as seguintes
palavras: Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão.
Aqui está o poder das Palavras de Jesus. Elas se cumprirão literalmente. Esse é o
aviso de Jesus, pois Ele mesmo disse: E eis que venho sem demora (Ap 22.12).
Você tem estado atento aos sinais que estão surgindo pouco a pouco, nos
avisando da seriedade desses eventos? Não fica impressionado com a exatidão
do cumprimento das profecias bíblicas? Devemos ter consciência clara de que
tudo pode passar, mas as palavras de Jesus são infalíveis.
E o que fazer enquanto esses eventos não acontecem? Lembremos e sigamos
o conselho do apóstolo João: E a si mesmo se purifica todo o que nele tem
esta esperança, assim como ele é puro (1Jo 3.3).
Jesus ensina sobre a necessidade da vigilância
Mc 13.32–37
Nos versos finais, de 32 a 37, temos uma advertência para que sejamos
vigilantes. Quando Cristo vem? Qual é o dia? Qual é a hora? De acordo com as
palavras de Jesus, ninguém sabe, senão o Pai. Por estas palavras vemos que
falham todos aqueles que têm anunciado o dia e a hora da volta de Jesus. Muitos
têm feito previsões até detalhadas, mas todos têm errado. As palavras de Jesus
foram muito claras: Estai de sobreaviso, vigiai e orai porque não sabeis
quando será o tempo (v. 33). Jesus, ainda com o objetivo de que todos
entendessem claramente a urgência da vigilância, contou mais uma pequena
parábola:
34. É como se um homem que, ausentando-se do país, deixa a sua casa,
dá autoridade aos seus servos, a cada um a sua obrigação, e ao
porteiro ordena que vigie.
35. Vigiai, pois, porque não sabeis quando virá o dono da casa: se à
tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se pela manhã;
36. para que, vindo ele inesperadamente, não vos ache dormindo.
Como podemos notar nestas palavras finais do sermão escatológico, há uma
grande necessidade de estarmos preparados e vigilantes, aguardando a volta de
Cristo. Quando o dono retornar e encontrar o porteiro dormindo, certamente o
destituirá, pois seria uma comprovação da sua negligência, do seu desprezo e do
seu desrespeito às ordens do seu senhor.
Quanta necessidade há na igreja de vigilância! O que temos visto em nossos
dias é triste e preocupante. Os cristãos vivem como se essa fosse a vida
definitiva. Estão vivendo conforme os valores do mundo, lutando com as armas
do mundo e tentando conquistar posições e bens desse mundo. Muitos estão
totalmente desatentos.
Por outro lado, enquanto vigiamos, o nosso trabalho deve continuar, pois
quando feito no Senhor, ele não é vão (1Co 15.58). Trabalhemos para edificação
da igreja, para que muitos ainda possam receber Jesus como seu Salvador.
Trabalhemos de tal forma que glorifiquemos a Deus. Mas, sobretudo, lembremos
dessas palavras finais, objetivas e diretas: O que, porém, vos digo, digo a
todos: Vigiai! (v. 37). Vigiemos pois e oremos para não sermos surpreendidos
com a volta gloriosa de Jesus. Você está preparado para esse encontro?

Marcos 14 - O servo se prepara para o


seu sacrifício vicário
A sua unção, a Páscoa, a traição, a Ceia, a prisão, o julgamento e a
negação
No estudo do capítulo 14 de Marcos veremos os acontecimentos da quarta-feira
e parte dos fatos da quinta-feira da última semana de Jesus, quando Ele se deu
como sacrifício em nosso favor.
Depois de passar um dia intenso como o de terça-feira, que terminou bem
tarde, com as palavras proféticas do sermão escatológico, certamente Jesus e
seus discípulos voltaram para Betânia para descansar. A sexta-feira que mudaria
o curso da história se aproximava rapidamente. Chegava o dia em que o justo se
tornaria maldito para que os malditos se tornassem justificados. Ao estudarmos e
fazermos uma harmonia dos evangelhos dos eventos desses últimos dias,
conforme Richards (2007, p. 126–128), não há nada registrado, em nenhum dos
evangelhos, sobre os acontecimentos ocorridos na quarta-feira.
Aparentemente foi um dia calmo para Jesus e seus discípulos, que o passaram descansando e
conversando. Sem dúvida alguma foi um dia agitado para os inimigos de Jesus, em que tramaram a
maneira de livrar-se daquele Nazareno que pretendia ser o Messias (JENSEN, p. 97).

Nos 72 versos do capítulo 14 encontramos dez acontecimentos que


certamente terão lições importantes para as nossas vidas:
Na quarta-feira:
Parte 1 – Jesus é alvo de um plano sinistro (v. 1–2)
Parte 2 – Jesus é ungido em Betânia (v. 3–9)
Na quinta feira:
Parte 3 – Jesus é alvo da traição de Judas Iscariotes (v. 10–11)
Parte 4 – Jesus orienta os preparativos da Páscoa e a celebra com os doze (v.
12–21)
Parte 5 – Jesus institui a Ceia Memorial (v. 22–26)
Parte 6 – Jesus avisa que Pedro o negará (v. 27–31)
Parte 7 – Jesus passa momentos de aflição no Getsêmani (v. 32–42)
Parte 8 – Jesus é preso (v. 43–52)
Parte 9 – Jesus enfrenta o julgamento do Sinédrio (v. 53–65)
Parte 10 – Jesus é negado por Pedro (v. 66–72)
À medida que a morte de Jesus ia se aproximando, tornavam- se cada vez
mais manifestos os sentimentos de todos os envolvidos naqueles acontecimentos.
As multidões que tinham vindo de todas as partes acompanhavam os ensinos e
as ações de Jesus entusiasmadas, reconhecendo nele um profeta, alguém especial
com poderes divinos. As autoridades religiosas tinham um crescente ódio em
seus corações e, cautelosamente, por causa da multidão, tentavam de alguma
maneira identificar a melhor oportunidade para prendê-lo, julgá-lo e matá-lo. Os
discípulos continuavam admirados pelos ensinos, pela maneira como o Mestre
saía vitorioso dos debates com os mais diversos religiosos que tentavam de todas
as maneiras desacreditá-lo.
Um dos discípulos, Judas Iscariotes, descontente com o desenrolar dos
acontecimentos, naturalmente cobiçoso, e certamente tentado por Satanás, estava
imaginando como poderia sair daquela situação com algum lucro pessoal. E
Jesus, por sua vez, consciente da sua missão, vivia a cada instante o drama de se
entregar por nós e levar sobre si os nossos pecados. Mas resoluto, ia em frente,
no cumprimento do maravilhoso e gracioso plano eterno de salvação. Entre os
outros personagens, não diretamente ligados aos acontecimentos, havia uma
multiplicidade de sentimentos. Certamente houve afeto por Jesus na casa de
Simão, o leproso, e um desejo de adoração no coração da mulher que ungiu
Jesus. Enfim, aqueles eram dias e horas de grande expectativa, pois algo nunca
visto e experimentado logo aconteceria.
Vamos, então, às dez partes deste capítulo para estudá-lo detalhadamente.
Jesus é o alvo de um plano sinistro
Mc 14.1–2
Nos versos 1 e 2 temos o relato da elaboração do plano para matar Jesus. Seu
ministério terreno chegava ao fim, em cumprimento às profecias do Antigo
Testamento. Como disse o profeta: Ele foi oprimido e humilhado, mas não
abriu a boca; como cordeiro foi levado ao matadouro; e, como ovelha muda
perante os seus tosquiadores, ele não abriu a boca (Is 53.7). Jesus estava
sendo levado para o matadouro como uma ovelha muda, entretanto, é importante
destacar que se entregaria voluntariamente nas mãos dos homens (Jo 10.17–18).
Ele sabia que a sua hora havia chegado (Jo 13.1).
O texto desse primeiro parágrafo diz assim: Dali a dois dias, era a Páscoa e
a Festa dos Pães Asmos; e os principais sacerdotes e os escribas procuravam
como o prenderiam, à traição, e o matariam. Pois diziam: não durante a
festa, para que não haja tumulto entre o povo (v. 1–2).
Como dissemos, esse episódio ocorreu na quarta-feira. Nesse dia Jesus ficou
em Betânia junto com seus discípulos e amigos. Enquanto isso, em Jerusalém, os
principais líderes religiosos estavam trabalhando, estavam tramando contra a sua
vida. É difícil entender, mas os homens da religião estavam planejando como
prenderiam e matariam o autor da vida. Veja que a religião não nos impede de
praticarmos a maldade dos nossos corações. Só religião não basta. O que
transforma a nossa vida e nos faz viver de modo diferente é ter Jesus como
Salvador e Senhor.
Em Levítico 23.5–6 lemos: No mês primeiro, aos catorze do mês, no
crepúsculo da tarde, é a Páscoa do SENHOR. E aos quinze dias deste mês é
a Festa dos Pães Asmos do SENHOR; sete dias comereis pães asmos. A
Páscoa celebrava a noite em que os israelitas foram libertados do Egito (Êx 12),
quando Deus, através do seu anjo, passou por sobre as casas marcadas com
sangue de um cordeiro.
O dia da Páscoa era seguido por uma festa de sete dias, chamada Festa dos
Pães Asmos. Esta festa lembrava a saída rápida dos israelitas do Egito, quando
não tiveram tempo de esperar que os pães crescessem, preparando-os e assando-
os sem fermento. Este feriado festivo reunia todo o povo para uma refeição
especial que incluía carne de cordeiro, vinho, ervas amargas e pão sem fermento.
Com o correr do tempo, a semana inteira veio a ser chamada de Páscoa, pois
ocorria imediatamente após aquele dia especial. E esse primeiro mês, o mês de
Nisã, corresponde em nosso calendário ao final de março, começo de abril.
A cidade estava lotada para aquelas cerimônias e, por isso, a preocupação da
liderança religiosa de efetivarem o plano somente após as duas festas, após os
oito dias de festas. Como disse Cardoso Pinto (2008, p. 100), as tentativas dos
religiosos de quererem controlar a cronologia do evento, e com isso obter
vantagens sem causar revolta popular de consequências trágicas, iriam fracassar
sob a intervenção providencial de Deus. Os religiosos, com temor das pessoas
que admiravam Jesus, planejavam para depois das festas a prisão, a condenação
e a morte de Jesus; mas Deus tem sempre o tempo certo, como disse Paulo aos
Gálatas: vindo, porém, a plenitude do tempo… (Gl 4.4).
Todavia, é interessante observar que os religiosos, numa semana de
celebração e gratidão pelas obras grandiosas e bondosas feitas por Deus, estavam
preparando a morte do Filho de Deus! Como dissemos: uma vida de
religiosidade e de aparência não tem efeito nenhum em nossa relação com Deus.
Então, vale à pena perguntarmos: Como tem sido a sua vida? De religiosidade ou
de intimidade e verdadeira comunhão com Deus? Lembrese: Deus procura
verdadeiros adoradores que o adorem em espírito e em verdade. Não seja apenas
um religioso. Seja um verdadeiro adorador!
Jesus é ungido em Betânia
Mc 14.3–9
Nos versos 3 a 9 temos o relato que nos mostra de relance o que aconteceu na
quarta-feira. Marcos nos mostra Jesus sendo ungido em Betânia. Enquanto nos
versos 1 e 2 temos o relato do que acontecia em Jerusalém, nesse parágrafo
temos o relato do que acontecia em Betânia. Depois de passar o dia conversando,
ensinando os discípulos e desfrutando da amizade dos amigos Lázaro, Marta e
Maria, talvez após o pôr do sol, na hora da ceia, na casa de Simão,
provavelmente por parte de um ex-leproso curado pelo próprio Jesus, ele foi alvo
de uma atitude de profundo carinho e afeto. Jesus foi alvo de uma homenagem.
Foi-lhe oferecido um jantar de gratidão.
E nessa ocasião aconteceu algo ainda mais surpreendente. Estando Jesus
reclinado à mesa para jantar, aproximou-se uma mulher trazendo um vaso feito
de alabastro com precioso perfume de nardo puro. Ela quebrou o vaso e
derramou bálsamo sobre a cabeça de Jesus, isto é, ungiu Jesus com aquele
perfume que vinha de uma rara planta aromática importada das regiões da Índia.
Essa é uma das ações mais lindas feitas em homenagem a Jesus. João, em seu
evangelho, nos revela que essa mulher era Maria, irmã de Lázaro, e coloca esse
acontecimento pelo menos uma semana antes (Jo 12.3). Porém, como não temos
condição de precisar corretamente o dia, vamos nos concentrar no significado da
ação.
Marcos, registrando aqui esse acontecimento, procura apresentar um contraste
marcante entre a ação amorosa de Maria e a ação criminosa de Judas, que
veremos a seguir. Marcos quis que percebêssemos o contraste vivo entre a luz e
as trevas. A luz está no ato de Maria de Betânia e as trevas estão no ato de Judas.
O texto nos fala ainda sobre a reação dos presentes diante dessa atitude de
Maria. Houve questionamento e crítica. Eram de opinião que todo aquele valor
poderia ser revertido e dado aos pobres. E, conforme João, Judas Iscariotes,
aquele que trairia Jesus, sendo ladrão, foi um dos que argumentou dessa maneira
(Jo 12.4–6). Na verdade o valor era alto mesmo. Segundo alguns estudiosos,
aquele vaso e o seu perfume custavam o equivalente a muitos meses de salário
de um trabalhador diarista. Era de fato um valor alto. Estavam certas as críticas?
Aquilo seria coisa pouco comum e mesmo inusitada em nossos dias, mas na época em que Jesus
viveu era costume aspergir algumas gotas de óleo perfumado sobre os convidados. O que chamava
a atenção era, sim, a exuberância e prodigalidade daquele ato gracioso de amor e amizade. O vaso
de alabastro que Maria esvaziou sobre os pés e a cabeça de Jesus, o seu Mestre e Senhor, foi
avaliado em trezentos denários… Precisava um homem trabalhar um ano todo para poder comprar
um unguento tão caro como aquele. Por isso não é de se admirar que os circunstantes exclamassem:
“Para que este desperdício de bálsamo?” (4) (PETERSON, 1989, p.134).

Conforme o verso 6, Jesus não aceitou as críticas feitas à Maria e disse a


todos: Deixai-a; por que a molestais? Ela praticou boa ação para comigo. Os
discípulos e outros participantes do jantar não entenderam a atitude de Maria e
certamente ficaram surpresos com as palavras de Jesus, que sempre demonstrou
cuidado e atenção para com os desfavorecidos.
Como entender as palavras de Jesus no verso 7? Porque os pobres, sempre
os tendes convosco e, quando quiserdes, podeis fazer-lhes bem, mas a mim
nem sempre me tendes. Qual a interpretação correta para essas palavras? Pohl
(1998, p. 390) nos ajuda a entender as palavras de Jesus:
… o cuidado dos pobres podia ser sempre repetido (Dt 15.11)… Os que reclamaram de Maria se
comportavam como guardiães e incentivadores de outros. Mas será que eles teriam mesmo dado
este dinheiro aos pobres, se o tivessem à sua disposição? Judas, pelo menos, não. No v. 11 ele não
gastou, mas embolsou.

Jesus certamente não estava ensinando que devemos nos esquecer dos pobres,
nem queria justificar a indiferença para com eles. Mas pelo contrário, através da
sua vida ministerial, demonstrou cuidado e atenção para com todos os excluídos
da sociedade. No entanto, Jesus quis destacar a atitude generosa de adoração de
Maria.
Conforme o verso 8, Jesus deu o verdadeiro significado daquele ato de amor:
Ela fez o que pôde: antecipou-se a ungir-me para a sepultura. E ainda
afirmou que em todos os locais por onde o evangelho fosse pregado, essa
história seria repetida (v. 9), como estamos fazendo hoje, demonstrando a
sensibilidade e o amor de Maria pelo Senhor.
Nessa ação vemos uma antecipação da unção que se fazia para os mortos.
Maria, certamente dirigida pelo Espírito Santo, percebeu que Jesus caminhava
deliberadamente para a cruz, para morrer em nosso lugar! Somente uma mulher
que escolheu a melhor parte e se assentou aos pés de Jesus para ouvir seus
ensinamentos (Lc 10.38–42); somente uma mulher com liberdade para
questionar o amigo Jesus em razão da morte do seu irmão (Jo 11.32); somente
uma mulher com sensibilidade, com discernimento espiritual, dirigida e
orientada pelo Espírito Santo, poderia, através de uma ação como essa,
homenagear e ungir o Filho de Deus, o Rei de Israel, profetizando que sua morte
aconteceria dentro em breve.
Como você tem tratado Jesus em seu viver? Como tem tratado os pobres?
Sem deixar de atender os necessitados, você tem deixado que outras coisas
importantes ocupem o lugar que só Jesus deve ter em sua vida? Você tem feito
tudo o que é possível para homenageá-lo? Não ame a Jesus apenas pelo que Ele
pode fazer por você. Ame-o e adore-o por Ele ser quem é!
Jesus é alvo da traição de Judas Iscariotes
Mc 14.10–11
Nos versos 10 e 11, de modo lacônico, encontramos o pacto da traição. O texto
diz: E Judas Iscariotes, um dos doze, foi ter com os principais sacerdotes,
para lhes entregar Jesus. Eles, ouvindo-o, alegraram-se e lhe prometeram
dinheiro; nesse meio tempo buscava ele uma boa ocasião para o entregar.
Que relato triste! Aqui temos a ação de Judas, um dos doze. Este texto vem
logo depois do registro da ação de amor de Maria. Judas traiu Jesus, e Maria,
movida pelo amor, homenageou Jesus. Que contraste!
Mas por que Judas queria traí-lo? Embora o texto não diga, podemos com
segurança afirmar que, como os outros discípulos e boa parte dos judeus daquela
geração, Judas esperava que, como o Messias prometido, Jesus desse início a
uma rebelião política para libertar Israel do poder de Roma. Também, como
tesoureiro, Judas esperava receber uma posição de destaque, assim como Tiago e
João desejavam ocupar lugares importantes no reino que eles imaginavam que
Jesus implantaria. Mas quando Judas viu a reação de Jesus louvando Maria, que
gastou uma grande quantia para homenageá-lo, percebeu que o reino de Jesus
não era o reino que ele e os demais esperavam.
Judas percebeu que ele mesmo não usufruiria de qualquer vantagem material.
O reino de Jesus não era deste mundo, como logo anunciaria a Pilatos: O meu
reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus
ministros se empenhariam por mim, para que não fosse eu entregue aos
judeus; mas agora o meu reino não é daqui (Jo 18.36). O reino de Jesus era
espiritual. Jesus viera inaugurar o reino de Deus, implantando-o pela fé no
coração das pessoas! Por isso, com o coração cheio de cobiça e dominado pela
avareza, Judas procurou os líderes religiosos judeus, vendendo Jesus para poder
usufruir algum lucro financeiro. Mas como bem sinalizou Bruce (2009, p. 1630),
no final das contas, o ato foi inspirado pelo próprio Satanás (Lc 22.3; Jo 13.2,
27).
O desejo de Judas, movido pela avareza, proporcionou aos líderes religiosos
judaicos a oportunidade que tinham planejado somente para depois das festas.
Judas, então, se associava aos inimigos de Jesus para matá-lo. O plano era trair
Jesus, e Judas aguardava a ocasião oportuna.
Judas e os principais sacerdotes exercitam sua livre vontade; e são responsáveis por suas ações
deliberadas. Ao mesmo tempo, Deus previu isso (Zc 11.12), controlando o momento e coordenando
tudo de acordo com seus propósitos. A forma passiva de paradidomi (ser entregue) (cf. 1.14; 9.31;
10.33), no verso 10, sugere que é Deus, em última instância, que entrega Jesus à morte
(MULHOLLAND, 2006, p. 208).

Conforme o plano salvífico traçado na eternidade, Jesus sabia tudo quanto


Judas tramava. Jesus sabia, por isso disse na quinta-feira, durante a refeição: O
que pretendes fazer, faze-o depressa (Jo 13.27). Jesus nunca foi surpreendido
pelos acontecimentos. Como dissemos, Ele entregou sua vida por nós
voluntariamente, por amor. Estava cumprindo em detalhes o plano divino para
nossa salvação! Glória a Deus!
Como você encara essa traição de Judas? Foi um episódio decepcionante,
concorda? Será que você também não tem traído Jesus, deixando que outras
ambições ocupem o primeiro lugar em sua vida? Será que muitas vezes não
agimos como Judas? É hora de nos avaliarmos!
Jesus orienta os preparativos da Páscoa e a celebra com os doze
Mc 14.12–21
Agora estamos na quinta-feira da última semana do ministério público de Jesus,
um dia antes do seu sacrifício. Nos versos 12 a 21 temos o relato da preparação
da Páscoa pelos discípulos. A hora da sua morte ia se aproximando rapidamente.
Chegando o dia da Páscoa, Jesus queria aproveitar a ocasião para um
momento de comunhão e intimidade com os discípulos. Conforme o evangelho
de Lucas, Jesus tomou a iniciativa, enviando Pedro e João para tomar as
providências necessárias (Lc 22.8). Marcos complementa relatando a pergunta
feita sobre onde Jesus queria que fizessem os preparativos para a comemoração
da Páscoa (v. 12).
Podemos pressupor que anteriormente Jesus já tivesse acertado com o dono
da casa a possibilidade de usarem o cenáculo para esta comemoração, mas Ele
instruiu sobre os passos que deveriam ser dados:
A. Deveriam ir à cidade, isto é, a Jerusalém.
B. Lá encontrariam um homem carregando um cântaro de água.
C. Seguindo-o, chegariam à casa designada.
D. Deveriam perguntar sobre a localização do aposento para prepararem a
Páscoa.
E. No local indicado, um cenáculo espaçoso e mobiliado, deveriam fazer
os preparativos daquela refeição tão especial (v. 13–15).
Em relação à maneira dos discípulos identificarem o local da celebração da
Páscoa, há dois detalhes que merecem nossa atenção. Conforme Keener (2004,
p. 182), algo fora do comum aconteceu:
Muitos comentaristas salientam que os jarros de água (diferentemente dos odres de vinho) eram
quase sempre carregados por mulheres. Um homem carregando um vaso de água seria, portanto,
algo logo percebido. As casas que podiam ter escravos sempre os faziam carregar água.

É importante destacarmos que os discípulos, conforme orientação de Jesus,


facilmente reconheceriam um homem carregando um jarro de água, pois essa era
uma tarefa normalmente destinada às servas. E, além disso, o fato de ter um
servo carregando água para o suprimento dos seus senhores indica que a família
que hospedaria Jesus e seus discípulos era uma família abastada.
O cenáculo espaçoso, mobiliado e pronto para receber os hóspedes (v. 15),
conforme estudos históricos relativos àquela época, mostra que algumas famílias
possuíam casas diferenciadas. As mais abastadas tinham cômodos no primeiro
andar (cenáculo), e provavelmente nesse local foram feitos os preparativos para
a última Páscoa de Jesus, que a transformaria na primeira comemoração da Ceia
cristã.
Esses fatos merecem destaque, pois com muita probabilidade Maria, mãe de
João Marcos, era uma das mulheres que assistiam Jesus com seus bens (Lc 8.1–
3). Ela era dona dessa casa onde foi comemorada a primeira Ceia cristã. Essa,
então, era a casa da família do próprio autor deste evangelho. Nela os discípulos,
juntamente com Maria, mãe de Jesus, e seus outros filhos, ficaram esperando em
oração, junto com outras pessoas, o cumprimento da promessa da vinda do
Espírito Santo (At 1.12–14). E com certeza foi nessa casa que a igreja estava
reunida, orando pela libertação de Pedro, que corria o risco de morrer (At 12.12).
O parágrafo termina no verso 16, relatando que tudo aconteceu exatamente
como Jesus previra, demonstrando através de todos esses detalhes a divindade, o
poder de Jesus e a sua onisciência.
Conforme Barclay (1974, p. 343), os preparativos para a refeição da Páscoa
consistiam em algumas providências:
1) O cordeiro pascal lembrava o sangue passado nas ombreiras das portas protegendo os israelitas
do Anjo da Morte quando da saída do Egito. 2) Os pães asmos, isto é, os pães sem fermento,
lembravam a urgência da saída do Egito. 3) Uma taça de água salgada simbolizava as lágrimas
derramadas durante a escravidão no Egito e a passagem miraculosa pelo Mar Vermelho. 4) Um
molho de ervas amargas (rabanetes, chicória, escarola, alface e outras ervas) que lembrava o
sofrimento da escravidão durante os quatro séculos no Egito. 5) Uma mistura de frutas, que
lembrava a obrigação de fazer tijolos de argila e palha. 6) Quatro copos de vinho que lembravam as
promessas divinas registradas em Êx 6.6–7.

E certamente podemos acrescentar que a sétima providência era a bacia para a


lavagem dos pés, um costume comum naqueles dias em que as estradas e ruas
eram bem empoeiradas (Jo 13.5). Aquela seria uma cerimônia muito marcante,
uma despedida triste mas ao mesmo tempo vitoriosa, pois a ressurreição era
certa, estava segura.
Quando estudamos o Evangelho de João, vemos no capítulo 13 uma descrição
do ambiente daquela celebração. João nos diz assim: Ora, antes da festa da
Páscoa, sabendo Jesus que era chegada a sua hora de passar deste mundo
para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim
(Jo 13.1). A melhor maneira de descrevermos Jesus e seu sacrifício é dizermos
que todos esses acontecimentos foram atos do amor de Deus por nós. Você tem
experimentado esse amor?
Mas o texto continua, e nos versos 17 a 21 temos o relato da indicação do
traidor. Naquele ambiente de profundo amor, precisamos entender esses versos
mais com o coração do que com a razão. Era quinta-feira e devia ser tarde
quando Jesus subiu para a Páscoa. As trevas da noite cobriam o cenário por toda
a parte. Ele foi de noite porque não queria que seus inimigos o vissem. Jesus não
se expunha facilmente, pois a hora certa do seu sacrifício seria na sexta-feira.
Sua hora ainda não havia chegado. Quando chegou o tempo exato, ainda na
madrugada de quinta para sexta-feira, vemos que corajosamente Ele se entregou
voluntariamente para ser morto, para ser crucificado pelos nossos pecados.
Durante a refeição Jesus indicou que haveria um traidor. Todos ficaram tristes
e cada um ficou preocupado, perguntando se seria ele. Jesus indicou com clareza
quem seria o traidor: O que come comigo, me trairá… O que mete comigo a
mão no prato (v. 18, 20). Aquele que comia no mesmo prato com Jesus seria o
traidor. Judas foi indicado. Depois de passar três anos com Jesus, resolveu trair o
seu Mestre e Salvador.
É interessante refletirmos sobre esse ato. O que Judas fez, qualquer um deles
poderia ter feito, porque cada um perguntou: Porventura, sou eu? (v. 19). Mas é
bom pensarmos em nós também. Temos de reconhecer que se estivéssemos
naquela situação talvez traíssemos a Jesus. Por quê? Porque normalmente
buscamos em primeiro lugar os nossos próprios interesses.
Naquele ambiente, com os sentimentos mais diversos, Jesus esclareceu o
assunto dizendo que aqueles acontecimentos faziam parte de tudo o que fora
escrito a respeito do Filho do Homem (v. 21). Sua morte não obedeceria ao
programa dos homens, a agenda humana, mas a sua própria agenda, ao seu
próprio programa, aos planos estabelecidos desde a eternidade. Isto é
maravilhoso. O amor de Jesus por nós é eterno!
E Jesus finalizou o assunto dizendo: Ai daquele por intermédio de quem o
Filho do Homem está sendo traído! Melhor lhe fora não haver nascido! (v.
21). Aquela foi uma notícia estarrecedora. Desse episódio podemos tirar três
lições:
A. Quando os nossos planos e motivações são maldosos, abrem portas
para sermos usado por Satanás para males ainda maiores.
B. Os resultados dos maus desejos são tão imprevisíveis que até mesmo
pequenas ações não prejudiciais podem trazer consequências
tremendamente sérias.
C. Os planos de Deus e os seus propósitos são realizados mesmo através
dos piores acontecimentos provocados por nós, por nossos pecados.
Além dessas lições, avalie-se e veja se você não tem traído Jesus, colocando
seus interesses, desejos e cobiças à frente do compromisso de ser um discípulo,
um seguidor de Jesus. Portanto, qualquer que for a sua situação, agora, diante do
grande amor de Deus, através de Jesus, renove o seu compromisso com Ele.
Jesus institui a Ceia Memorial
Mc 14.22–26
Nesses versos temos o estabelecimento da Ceia cristã, da Ceia Memorial. Esse é
um dos momentos mais sublimes do evangelho. Ele tomou dois elementos da
refeição da Páscoa, o pão e o vinho, e estabeleceu a nova aliança, mostrando que
a redenção do homem pecador se daria através do seu sacrifício.
Na páscoa judaica, o sangue do cordeiro protegeu os israelitas da morte. Na
Ceia cristã, na Ceia Memorial, o sangue de Jesus nos limpa do pecado e nos
protege do severo juízo de Deus. Na páscoa judaica, o pão era sem fermento,
pois era um alimento preparado com rapidez para poderem partir. Na Ceia cristã,
o pão simboliza Jesus como o alimento que nos fortalece para a nossa jornada.
Devemos notar que Jesus por duas vezes orou agradecendo. Agradeceu pelo
pão, o símbolo do alimento mais básico do ser humano.
Esse verbo, abençoando-o, é tradução do verbo grego que significa “ele abençoou (Deus)”,
referindo-se à prática judaica de dar graças pelo pão numa refeição, dizendo-se: “Bem-aventurado
és tu, Senhor, nosso Deus, que da terra tiras o pão”. Segundo costume judaico de tempos antigos,
quanto a refeições, considerava-se irreverente cortar o pão com uma faca, visto ser o pão dádiva de
Deus, pelo que o pão deve ser “partido” ou quebrado com as mãos (HURTADO, 1995, p. 254).

Depois de agradecer pelo pão, ainda com os elementos da Páscoa judaica, o


vinho foi usado com um novo significado.
Na Páscoa, refeição demorada, prescreviam-se quatro cálices de vinho rubro. O cálice aqui
mencionado pode ter sido o cálice final que encerrava a ceia. Marcos preservou-nos as palavras de
Jesus ao partir o pão no início da refeição, e as que ele pronunciou sobre o cálice no
encerramento… O que sobreviveu, pois, nas celebrações posteriores da igreja cristã da santa ceia do
Senhor, foi a parte inicial e a final de uma refeição completa (HURTADO, 1995, p. 254–255).

E embora fosse um momento de despedida, havia certa alegria permeando o


ambiente, uma alegria só explicada pelo Espírito Santo de Deus. Veja que por
duas vezes Jesus orou agradecendo. Certamente agradecia por estar cumprindo
os eternos planos divinos.
Jesus ainda disse que não tomaria mais aquela refeição com eles, mas que o
faria quando viesse em definitivo para estabelecer o reino de Deus na sua volta.
O significado daquela ocasião foi completamente transformador: “No
ambiente de consternação geral depois da partida de Judas, Jesus investiu a
Páscoa de um significado mais profundo, anunciando a Si mesmo como o
sacrifício da Nova Aliança (v. 22–25). Marcos 14.24 ecoa Êxodo 24.8, o sangue
da aliança que o Senhor faz com vocês” (CARDOSO PINTO, 2008, p. 100).
O significado da própria Ceia instituída por Cristo é maravilhoso e
confortador para o verdadeiro cristão:
A Ceia do Senhor é alimento para a alma; portanto, é suficiente que seja celebrada com bem menos
do que a quantidade de alimento que empregamos para o sustento de nosso corpo… Foi instituída
pelo exemplo e prática de nosso Mestre… Ela é a primícia e um sabor antecipado da felicidade que
haverá no céu, e, por isto, retira de nós o gosto pelos prazeres e deleites dos sentidos. Todo aquele
que já saboreou as delícias espirituais deseja claramente as eternas (HENRY, 2002, p. 810).

E o texto termina mostrando que após esse jantar tão especial Jesus e os
discípulos foram cantando um hino, caminhando para o monte das Oliveiras.
Normalmente a cerimônia da Páscoa começava com o canto dos Salmos 113 e
114 e, conforme Mulholland (2006, p. 212), a comunhão à mesa terminava com
o entoar responsivo da segunda metade dos Salmos de Hallel (115–118). Jesus
fez das palavras destes salmos sua própria oração de ação de graças e louvor.
Você tem agradecido a Deus por tanto amor mostrado simbolicamente nessa
cerimônia tão rica? Ao participar da próxima Ceia Memorial, agradeça a Deus
por sua salvação!
Jesus avisa que Pedro o negará
Mc 14.27–31
No sexto parágrafo deste capítulo, nos versos 27 a 31, Jesus avisa que Pedro irá
traí-lo. Como vimos anteriormente, depois que terminaram o jantar da Páscoa,
onde Judas foi apontado como traidor e já não estava mais com eles, Jesus e os
discípulos saíram do cenáculo e foram para o monte das Oliveiras, cantando e
louvando a Deus. Nesses momentos finais, antes da sua prisão, Jesus ainda teve
o cuidado de preparar os discípulos para os fatos que ocorreriam dali a algumas
horas.
Jesus, então, disse as seguintes palavras: Todos vós vos escandalizareis,
porque está escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas ficarão dispersas. Mas,
depois da minha ressurreição, irei adiante de vós para a Galileia (v. 27–28).
Ele estava antecipando o sentimento dos discípulos que horas mais tarde
veriam o seu Mestre ser preso, sofrer nas mãos dos principais líderes religiosos e
não reagir. Jesus não usaria o poder que tantas vezes usara para salvar as
pessoas. Preocupado com a fé dos discípulos, antecipou-se no seu cuidado. É
possível percebemos o cuidado de Jesus? Ele sabia que dali a algumas horas
todos estariam perplexos e principalmente decepcionados com a sua falta de
reação. Eles seriam como ovelhas dispersas, por lhes faltar o pastor. Quanto
amor podemos ver nessas palavras de Jesus! E como afirmou Ryle, é possível
percebermos nesses versos as dimensões desse amor divino:
Cristo concedeu-lhes o grande privilégio de estarem continuamente em sua companhia e ouvirem a
sua voz, apesar de estar plenamente consciente da melancólica debilidade e da pequenez da fé que
eles mostrariam no final do seu ministério terreno. Esse é um detalhe notável, que merece estar
continuamente em nossa memória (RYLE, 2007, p. 186).

Na sequência do texto, Marcos nos mostra Pedro cheio de confiança em si


mesmo. Aliás, essa autoconfiança, na verdade, traz muitos riscos às nossas vidas
cristãs.
Não sabemos até onde poderemos cair, se colocados sob tentação. Não existe grau de pecado ao
qual não possa descer o maior dos santos, se não for sustentado pela graça de Deus e se ele mesmo
não vigiar e orar (RYLE, 2007, p. 187).

O texto nos mostra a reação de Pedro afirmando, com sua costumeira


autossuficiência e espontaneidade, que mesmo que todos se escandalizassem,
não se escandalizaria em Jesus. Essa foi a sua reação humana, e talvez até o
desejo do seu coração, mas Jesus foi muito claro, mostrando a Pedro que
qualquer uma de nossas reações não pode ter por base a nossa força. Sempre
temos que depender de Deus. Jesus mostrou-lhe que o orgulho precede a ruína.
Esse é um provérbio que precisamos memorizar. O orgulho sempre vem antes da
queda (Pv 16.18)!
Jesus falou a Pedro: não confie em você mesmo, em suas palavras e em seus
desejos. Dependa sempre de Deus. E solenemente advertiu-o: Em verdade te
digo que hoje, nesta noite, antes que duas vezes cante o galo, tu me negarás
três vezes (v. 30). Jesus disse a Pedro que, mesmo que ele não quisesse, ainda
naquela noite, antes do galo cantar, isto é, antes de amanhecer o dia, negaria
Jesus por três vezes. Foi uma notícia traumatizante para Pedro. Ele não podia e
nem queria acreditar naquilo que estava ouvindo.
Mas Pedro e os demais discípulos ainda não compreendiam a necessidade
extrema que temos de depender de Deus. Elas ainda não compreendiam a
necessidade do sacrifício de Cristo. E, por isso mesmo, e com os corações
prontos para “defender” Jesus, todos disseram com suas forças que não se
escandalizariam em Jesus (v. 31). Horas mais tarde, esse orgulho e essa
convicção de estar sempre ao lado de Jesus foram colocados de lado e cada um
fugiu, abandonando o seu Senhor.
E você, tem se mantido fiel e unido a Jesus por suas próprias forças, ou tem
dependido do Senhor para manter o compromisso com a verdade do evangelho?
Jesus passa momentos de aflição no Getsêmani
Mc 14.32–42
Depois de caminharem entoando um hino de louvor a Deus, depois de ter
chamado a atenção de Pedro e dos demais, encontramos Jesus orando no
Getsâmani. Jesus e os onze discípulos chegaram a um lugar chamado Getsêmani,
que quer dizer “lugar das oliveiras”. E, ali, Jesus reservou um tempo para se
preparar para se entregar voluntariamente. E como diz o texto:
32. … ali chegados, disse Jesus a seus discípulos: Assentaivos aqui,
enquanto eu vou orar.
33. E, levando consigo a Pedro, Tiago e João, começou a sentir-se
tomado de pavor e de angústia.
34. E lhes disse: A minha alma está profundamente triste até à morte;
ficai aqui e vigiai.
35. E, adiantando-se um pouco, prostrou-se em terra; e orava para
que, se possível, lhe fosse poupada aquela hora.
36. E dizia: Aba, Pai, tudo te é possível; passa de mim este cálice;
contudo, não seja o que eu quero, e sim o que tu queres.
Aquele que assumiu a forma de servo vai agora mostrar até onde irá a sua obediência. E esta será
até a morte… e morte de cruz! Satanás tenta tudo para fazer com que o Senhor Jesus se desvie do
caminho de sua perfeição. Nesta luta decisiva, a arma de Satanás é oprimir o coração do Senhor,
que está ciente da dimensão do horror do cálice da ira de Deus contra o pecado. A arma do Senhor
Jesus é a sua dependência. Um termo que é usado uma única vez pelo Senhor e que se encontra aqui
em Marcos expressa a mais profunda intimidade de um momento como esse: “Aba, Pai”, disse ele,
na consciência de que a perfeita comunhão com Deus terá de ser interrompida no momento em que
estiver levando o pecado sobre si, isto é, quando estiver bebendo o cálice da ira de Deus. Mas é
precisamente esse seu amor sem reservas pelo Pai que o motivou a uma obediência sem reservas:
“Não seja o que eu quero, e, sim, o que tu queres” (v. 36) (KOECHLIN, 2001, p. 102).
No jardim do Getsêmani Jesus sofreu terríveis agonias. Deixando oito dos
discípulos à entrada do jardim, levou consigo, para um lugar mais adiante,
Pedro, Tiago e João, como fizera no monte da Transfiguração, onde foram
testemunhas de Jesus glorificado. E agora eles estavam presenciando Jesus
agonizando, sofrendo por ter que enfrentar o inferno em nosso lugar. Era um
tempo de oração. Era um tempo de intimidade com o Pai. Jesus estava
perfeitamente consciente do que brevemente aconteceria com Ele na cruz. Ele
tomaria sobre si os pecados do mundo inteiro. Não era medo da cruz, mas a
certeza de tomar sobre si o pecado do mundo todo e, com isso, ficar longe do
Pai. Satanás, que tentou a Jesus no deserto no início do seu ministério,
certamente estava tentando-o aqui, ao ver que se aproximava o final do seu
ministério.
Sozinho, em oração, e com profunda emoção, Jesus ousou expressar ao Pai o
desejo de ser poupado dos sofrimentos que o aguardavam. Ele sabia que isso
seria impossível, pois fora exatamente para essa hora que tinha vindo. Mas ao
mesmo tempo em que pedia para não tomar o cálice, rapidamente se submeteu à
vontade de Deus.
Jesus pede para que o cálice de sofrimento e julgamento que está vindo seja afastado dele. Contudo,
o que Jesus realmente deseja é fazer a vontade de Deus, e em contraste com o fato de que os
discípulos ignoram suas próprias necessidades de evitar a tentação, vem a lição exemplo da
passagem. Jesus se submete à vontade do Pai mesmo que isso signifique intenso sofrimento para ele
(BOCK, 2006, p. 340).

A partir desta oração, Marcos relata nos versos 37 a 42:


37. Voltando, achou-os dormindo; e disse a Pedro: Simão, tu dormes?
Não pudeste vigiar nem uma hora?
38. Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na
verdade, está pronto, mas a carne é fraca.
39. Retirando-se de novo, orou repetindo as mesmas palavras.
40. Voltando, achou-os outra vez dormindo, porque os seus olhos
estavam pesados; e não sabiam o que lhe responder.
41. E veio pela terceira vez e disse-lhes: Ainda dormis e repousais!
Basta! Chegou a hora; o Filho do Homem está sendo entregue nas
mãos dos pecadores.
42. Levantai-vos, vamos! Eis que o traidor se aproxima.
Os discípulos foram surpreendidos quando Jesus os encontrou dormindo
numa hora como aquela. Nem eles mesmos entendiam porque agiam daquela
maneira. Na verdade, eles não reconheciam a sua própria fragilidade, como disse
Henry:
Observemos como a pecaminosa fragilidade retorna aos discípulos de Cristo e os vence. Que fardos
tão pesados os nossos corpos são para as nossas almas! Devemos vigiar, pois, quando virmos os
problemas às portas, devemos nos preparar para enfrentá-los. Mas eles não agiram assim. Ao invés
de “estarem prontos” para morrer com Cristo, não estavam preparados para velar, para vigiar com
ele nem sequer por uma hora (HENRY, 2002, p. 811).

Enquanto Jesus sofria angústias indescritíveis, os apóstolos dormiam. Jesus


havia dito que orassem e vigiassem, entretanto, os encontrou dormindo. Ele
chamou a atenção principalmente de Pedro. E, de fato, Pedro precisava orar e
estar alerta. Talvez se Pedro tivesse orado e vigiado mais, não teria logo depois
negado a Jesus três vezes. A carne é fraca. Havia tentação. Não era o momento
para dormir. A oração é o poder que vence o diabo. A tentação só pode ser
vencida por meio de oração. E quanto a nós? Será que estamos orando e
vigiando para não entrarmos em tentação, para não cairmos em tentação? Jesus
voltou a orar pedindo a mesma coisa e, quando retornou, os discípulos
novamente estavam dormindo.
Não podemos ser duros e simplesmente acusar os discípulos de falta de
compromisso. Temos de entender que, quando o desânimo, o cansaço, a tristeza
e o medo dominam a pessoa, facilmente ela perde a postura cristã de um soldado
de Cristo. Estes homens eram muito fracos como nós o somos. Portanto, antes de
acusá-los, olhemos primeiramente para nós. Mas a bênção que nos leva a louvar
a Deus é que eles, posteriormente, foram transformados pela presença do
Espírito Santo em suas vidas (At 2.1–4).
Pela terceira vez tudo aconteceu como antes. Mas Jesus lhes disse: Basta! (v.
41). Jesus reconheceu que tinha chegado a sua hora. E, naturalmente, também
estava preocupado com o estado físico dos seus discípulos. Ele estava sofrendo
muito, porém isso não o levou a ignorar o cansaço que se abatia sobre aqueles
homens. Jesus percebeu que Judas se aproximava. Ele sabia de tudo o que estava
acontecendo! Estava a par de tudo. Ele tudo sabia. Era e é Deus onisciente!
Você tem experimentado o cuidado, o amor e a preocupação de Jesus? Saiba
que Ele, agora glorificado, está sempre atento às nossas necessidades (Rm 8.34)!
Jesus é preso
Mc 14.43–52
Vemos aqui o tipo de expediente que Judas estava usando! Como se estivesse
liderando os inimigos do Mestre para prendê-lo, veio até Jesus e o beijou. O
beijo que representava amor e afeto, aqui representou traição e crime.
Judas, que tinha deixado o cenáculo onde Jesus e os discípulos tinham se
reunido para a celebração da Páscoa, depois de manter contato com as
autoridades religiosas, combinou qual seria o sinal identificador, para que não
prendessem a pessoa errada.
Para prevenir que prendessem o homem errado na escuridão, disse-lhes que o homem a ser preso
era aquele a quem ele saudasse com um beijo (v. 44). Era prática comum um discípulo saudar o seu
mestre como “Rabbi” (v. 45) e beijá-lo; mas Judas, de forma desprezível, usou esses símbolos de
amor como uma ferramenta de traição (BRUCE, 2009, p. 1631).

É interessante destacarmos como Judas saudou a Jesus. Ele disse: Mestre! (v.
45), e não Senhor. Isso aconteceu para que aprendamos de vez que só o Espírito
Santo inspira o homem a chamar Jesus de Senhor. Judas o chamou
hipocritamente de mestre, isto é, professor, porque não o via mais como o
Messias libertador de Israel, o Senhor da história. Para ele, Jesus não supria o
anseio, não supria a expectativa do Messias. Então, diante do beijo, o sinal
previamente acertado por Judas, os soldados identificaram e prenderam a Jesus
(v. 46).
Mas, conforme o verso 47, essa prisão arbitrária não ficou sem reação: Nisto,
um dos circunstantes, sacando da espada, feriu o servo do sumo sacerdote e
cortou-lhe a orelha. É interessante destacarmos que não houve reação divina,
mas humana. Reação da carne, da força própria, e não reação dependente do
Senhor. Pedro era o circunstante, e certamente tinha a intenção de cortar a cabeça
do servo do sumo sacerdote. Mas errou. Ele era pescador e sabia usar muito bem
a rede de pescar, mas não tinha habilidade para usar a espada.
Marcos não relata, mas conforme Lucas 22.51 e João 18.10–11, Jesus
repreendeu Pedro e, tocando a orelha de Malco, curou-o completamente. Mas
Jesus também questionou seus inimigos: Saístes com espadas e porretes para
prender-me, como a um salteador? Todos os dias eu estava convosco no
templo, ensinando, e não me prendestes (v. 48). Em certo sentido Jesus
perguntou-lhes: o que significa isso? Mas ao mesmo tempo em que demonstrava
a incoerência daquela atitude, Jesus aceitou a situação, pois tudo o que acontecia
era para que se cumprissem as Escrituras. Como assinalou bem Pohl (1998, p.
415):
Jesus percebeu totalmente a atitude baixa, covarde e maligna dos seus captores. Mais
incompreensível ainda a frase seguinte deve ter sido para os discípulos: “Contudo, é para que se
cumpram as Escrituras” (49). Em vez de exterminar o mal com poder divino, Jesus aceita o papel de
criminoso com vontade de Deus. Mas, que Deus é este? Aqui, na fé depositada em Deus, tem início
a desagregação dos doze. Eles não entendem mais nada.

Diante da ação de Jesus, diante da falta de discernimento para entenderem


como o seu Mestre e Senhor estava tão passivo e não reagia contra aquele ato de
injustiça, os discípulos talvez tenham olhado uns para os outros sem vislumbrar
outra reação senão a de fugir daquele momento delicado. Como Marcos registra:
Então, deixando-o, todos fugiram (v. 50).
Jesus se entregou voluntariamente aos inimigos quando chegou a hora. Não
eram os homens que tinham o controle da situação. Ninguém podia tirar-lhe a
vida se Ele mesmo não a desse, para depois voltar a tomar, na ressurreição. Mas
sem entender o que de fato acontecia, todos os discípulos, fugindo, deixaram o
Senhor nas mãos dos inimigos.
É assim que procedemos muitas vezes diante das dificuldades. Abandonamos
Jesus pensando que temos um refúgio seguro, quando na verdade o único refúgio
seguro é Jesus!
E, em mais uma passagem exclusiva deste evangelho, nos versos 51 e 52
temos uma narrativa muito específica. O texto diz assim: Seguia-o um jovem,
coberto unicamente com um lençol, e lançaram-lhe a mão. Mas ele,
largando o lençol, fugiu desnudo. Quase todos os comentaristas são unânimes
em afirmar que este jovem era João Marcos, o autor deste evangelho. A maioria
dos estudiosos é de opinião que este relato é uma autorreferência do autor, sobre
quem já comentamos no início dos estudos desse evangelho. A referência ao
lençol, no original pano de linho, indicava que esse jovem era de família
abastada.
Mas como destacamos anteriormente, foi exatamente na casa de João Marcos,
na casa dessa família abastada, que Jesus comemorou a Páscoa e a transformou
em Ceia (v. 22–26); foi nessa mesma casa que os discípulos depois da ascensão
de Jesus aguardaram o cumprimento da promessa da vinda do Espírito Santo (At
1.14); provavelmente foi nessa casa que os 120 que estavam reunidos receberam
a promessa da vinda do Espírito Santo (At 2.1–4); e foi nessa casa que a primeira
igreja se reuniu em Jerusalém e, em certa ocasião, orou pela libertação de Pedro
(At 12.12).
Embora tenha sido um relato bem simples e mostre o temor do jovem Marcos
fugindo, como fugiram os discípulos daqueles que vieram prender Jesus, essas
atitudes nos fazem refletir sobre uma possível aplicação. Como percebeu Pohl,
porque na mesma hora em que Deus decidiu entregar Jesus para ser sacrificado,
para perdoar os pecados do mundo, os discípulos, e também João Marcos,
decidiram deixar Jesus nas mãos das autoridades. Através da atitude de Pedro (v.
47), eles tentaram ajudar Jesus, mas não conseguiram. E não conseguiram
porque era plano de Deus. Pohl (1998, p. 415) ainda diz que a salvação do
mundo é obra só de Deus e não dos discípulos, dos cristãos ou das igrejas! A
obra da salvação tem apenas e tão somente uma origem: o amor de Deus!
Jesus enfrenta o julgamento do Sinédrio
Mc 14.53–65
Nos versos 53 a 65, Jesus enfrenta o julgamento do Sinédrio. Este texto faz parte
da seção que vai de 14.53 a 15.15, que contempla os julgamentos aos quais Jesus
foi submetido diante dos judeus e romanos.
Tecnicamente, a cena não é de um julgamento. É mais uma fase de reunião de acusações, bem
parecida com nossos processos de júri de instrução. A liderança judaica não possuía autoridade
legal para executar Jesus. Eles podiam somente recomendar um curso de ação. Essa restrição foi o
motivo de eles, por fim, terem levado Jesus a Pilatos. Essa também foi uma boa jogada de ponto de
vista político. Uma execução romana tornaria os executores estrangeiros responsáveis pela morte de
Jesus… A ausência de um julgamento oficial é importante… o objetivo não era apresentar uma
acusação religiosa, porque esta seria de pouco interesse judicial para os romanos (por exemplo, At
25.18–20). O objetivo era apresentar uma alegação política que levaria os romanos a agir em seu
próprio interesse… Ações contra o templo tinham sobretons políticos e religiosos… esse local
sagrado era uma fonte potencial de problemas. Se pudesse ser mostrado que Jesus tinha planos de
prejudicar esse local, ele seria uma ameaça para a lei e a ordem, algo que Pilatos estava encarregado
de manter a pleno controle. Isso também explica o interesse em uma afirmação messiânica. Se Jesus
afirmava ser um rei rival, César não ficaria contente com isso (BOCK, 2006, p. 345).

Sem a intenção de justiça, e com toda essa motivação impura, Jesus, preso,
foi se deixando conduzir para que o plano eterno se concretizasse. No trajeto até
a cruz Ele esteve por sete vezes diante de pessoas ou tribunais, sendo julgado de
modo errado, injusto e ilegal.
Jesus esteve diante:
A. De Anás, o sumo sacerdote (Jo 18.12–14).
B. Do Sinédrio, na casa de Caifás (Mc 14.53–65).
C. Do Sinédrio, no próprio Sinédrio (Mc 15.1; Lc 22.66–71).
D. De Pilatos (Mc 15.1b–5; Lc 23.1–6).
E. De Herodes Antipas (Lc 23.7–12).
F. De Pilatos, pela segunda vez (Mc 15.6–11; Lc 23.13–18).
G. Da multidão, que preferiu soltar Barrabás (Mc 15.12–15; Lc 23.19–25)
e matar a Jesus Cristo.
Mas quando esteve diante das autoridades, conforme os versos 53 a 65, sete
fatos sobre o julgamento de Jesus se destacam:
A. Ele foi irregular quanto ao horário, isto é, de madrugada (v. 54).
B. Ele foi irregular quanto ao local, isto é, na casa do sumo sacerdote (v.
54).
C. Ele foi irregular quanto a pressa incomum, isto é, sem possibilidade de
testemunhas favoráveis a Jesus (v. 55).
D. Ele foi irregular quanto às testemunhas que depuseram contra Jesus,
pois eram falsas (v. 56–57).
E. Ele foi irregular quanto ao entendimento falho das palavras de Jesus
sobre o templo, pois Ele nunca disse que destruiria o templo de Herodes,
mas que o seu corpo, se fosse destruído, estaria novamente em pé após três
dias, sinalizando a sua ressurreição (v. 58).
F. Ele foi irregular pela falta de coerência na acusação, pois acusaram-no
de falar contra o templo e condenaram-no por confirmar ser o Cristo (v.
56,59).
G. Ele foi irregular pelas ações violentas contra o prisioneiro – cuspes,
socos, murros e bofetadas (v. 65).
Em acréscimo a essas colocações, em relação à falta de coerência e o motivo
final da condenação de Jesus (o ponto F), vale à pena citar:
Os líderes entrevistaram pessoas dispostas a dar falso testemunho contra o Senhor, mas seus
testemunhos não eram coerentes. Finalmente, o sumo sacerdote perguntou a Jesus abertamente:
“Você é o Cristo, o Filho do Deus Bendito?”. Jesus respondeu: “Sou”, Para os líderes, a declaração
era uma blasfêmia. Jesus afirmara ser o próprio Deus! E a punição para a blasfêmia era a morte
(RICHARDS, 2004, p. 731).

Por isso, ainda é importante fazer mais três destaques:


A. A firmeza de Jesus sobre si mesmo, testemunhando-lhes mais uma vez
que era o Cristo, deu-lhes o motivo desejado de acusação (v. 62).
B. A profecia de Jesus de que o veriam assentado à direita do Pai, vindo
com as nuvens do céu, certamente foi recebida como mais uma provocação
(v. 62).
C. A atitude de Pedro, seguindo a Jesus de longe, à certa distância, e
assentando-se junto daqueles que eram contrários a Jesus (v. 54), foi uma
demonstração de que tinha se esquecido da advertência de Jesus para que
vigiasse e orasse (v. 38).
Pedro estava seguindo a Jesus de um modo errado, e assentou-se no lugar
errado. Estava na roda dos escarnecedores. Este é um lugar perigoso para a fé e
para a vida espiritual. Eram passos perigosos que Pedro estava dando e que
infelizmente terminaram na tríplice negação a Jesus. Como você tem seguido a
Jesus?
Jesus é negado por Pedro
Mc 14.66–72
Em décimo e último lugar, nos versos 66 a 72 deste capítulo, Pedro nega Jesus.
O capítulo termina com esse triste relato. Um relato confrontador, pois mostra
como podemos falhar quando não seguimos as orientações de Jesus. O texto tem
exatamente essas palavras:
66. Estando Pedro embaixo no pátio, veio uma das criadas do sumo
sacerdote
67. e, vendo a Pedro, que se aquentava, fixou-o e disse: Tu também
estavas com Jesus, o Nazareno.
68. Mas ele o negou, dizendo: Não o conheço, nem compreendo o que
dizes. E saiu para o alpendre. (E o galo cantou.)
69. E a criada, vendo-o, tornou a dizer aos circunstantes: Este é um
deles.
70. Mas ele outra vez o negou. E, pouco depois, os que ali estavam
disseram a Pedro: Verdadeiramente, és um deles, porque também tu
és galileu.
71. Ele, porém, começou a praguejar e a jurar: Não conheço esse
homem de quem falais!
72. E logo cantou o galo pela segunda vez. Então, Pedro se lembrou da
palavra que Jesus lhe dissera: Antes que duas vezes cante o galo, tu
me negarás três vezes. E, caindo em si, desatou a chorar.
Na tríplice negação de Pedro:
A. Ele disse que não compreendia do que a criada do sumo sacerdote o
acusava.
B. Ele negou a Jesus, dizendo que não o conhecia.
C. Ele praguejou e jurou, dizendo que não o conhecia. Três vezes Pedro
negou a Jesus e o galo cantou por duas vezes.
Diante disso, certamente Pedro lembrou-se de suas palavras, quando disse
que mesmo se todos se escandalizassem, ele não se escandalizaria (v. 29–31).
Mas com certeza Pedro lembrou-se das palavras de Jesus e, não suportando a sua
própria maneira de agir, se arrependeu e saiu chorando amargamente.
A negação de Cristo por parte de Pedro teve início quando este se manteve afastado dele. Aqueles
que se envergonham da santificação estão bem avançado no caminho de negar a Cristo. Aqueles
que pensam ser perigoso andar em companhia dos discípulos de Cristo, porque daí podem ser
levados a sofrer por ele, verão ser muito mais perigoso estar na companhia dos seus inimigos,
porque aí serão levados a pecar contra ele (HENRY, 2002, p. 811).

O nosso dever é orar e vigiar, para não cairmos na mesma tentação em que
Pedro caiu.
Talvez você condene Judas, o traidor, o Sinédrio injusto e Pedro, o
autoconfiante que negou. Mas não se esqueça de que quando não dependemos de
Jesus podemos fazer o mesmo. Que Deus nos livre de tais atitudes.

Marcos 15 - O servo é crucificado e


morre em nosso lugar
O julgamento, a crucificação, a morte e o sepultamento
O capítulo 14 de Marcos é rico em ternura e terror, pleno de comunhão íntima e
total solidão e repleto de palavras ousadas e ações fracas. Quando atentamos
para os seus detalhes não podemos deixar de perceber a emoção reinante
naquelas últimas horas, quando espontaneamente Jesus se entregou por nós.
Muitas ações ocorreram na madrugada de quinta para sexta-feira, e o capítulo
15 nos mostra todos os eventos ocorridos na sexta-feira.
Jesus avisara os discípulos que um dia seria entregue para morrer, como
cumprimento do eterno plano divino. Nesses avisos, também mencionou que o
propósito da sua morte objetivava a nossa salvação. Ele mencionou que a sua
morte seria em resgate de muitos (10.45) e que o seu sangue seria derramado
para inaugurar uma nova aliança (14.24). Nesse capítulo 15 Marcos nos mostra
que as palavras de Jesus se cumpriram detalhadamente.
Como foi marcante na narrativa deste evangelho, até mesmo a morte de Jesus,
o seu sacrifico redentor, tinha que acontecer “logo” (v. 1). E assim tem início a
narrativa dos eventos transformadores da história da humanidade.
Agitados pela aproximação da Páscoa, e com pressa para acabar com este
prisioneiro que lhes enchia de temor, as autoridades do povo não perderam
tempo. Conduziram o Senhor Jesus perante Pilatos para mais um julgamento.
Diante do governador, o Salvador novamente guardou silêncio, do qual os Salmos 38.1–15; 39.9 e
Lamentações de Jeremias 3.28 revelam os maravilhosos motivos. A sua oração neste momento é:
“Pois em ti, Senhor, espero, tu me atenderás, Senhor Deus meu; porque tu fizeste isto”… Por fim,
ironicamente, o homem coroa o seu Criador com espinhos que a terra passou a produzir em
consequência do pecado do próprio homem (Gn 3.18) (KOECHLIN, 2001, p. 104).

Então, veremos nesses 45 versos, em sete episódios, os últimos momentos da


vida de Jesus, até a sua morte e o sepultamento:
Na sexta-feira:
Parte 1 – Jesus é levado diante de Pilatos (v. 1–5)
Parte 2 – Jesus é rejeitado pela multidão (v. 6–15)
Parte 3 – Jesus é entregue aos soldados romanos para ser crucificado (v. 16–
20)
Parte 4 – Jesus é ajudado por Simão a carregar a cruz (v. 21)
Parte 5 – Jesus é crucificado (v. 22–32)
Parte 6 – Jesus morre diante do Pai, da multidão, das autoridades e dos seus
(v. 33–41)
Parte 7 – Jesus é sepultado (v. 42–47)
Veremos também como o nosso pecado levou-nos a realizar o mais infame
dos crimes de todos os tempos. Por nossos pecados, Jesus Cristo, Filho de Deus
(Mc 1.1), foi crucificado e pendurado numa cruz. O bendito foi amaldiçoado (Gl
3.13) para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus (2Co 5.21).
Com gratidão em nossos corações por tão grande salvação (Hb 2.3),
analisemos em detalhes cada um desses episódios.
Jesus é levado diante de Pilatos
Mc 15.1–5
Depois de ser interrogado e acusado por toda a noite pelas autoridades de Israel,
logo cedo Jesus foi levado diante de Pilatos, o governador romano. Como
podemos notar, esse relato merece nossa atenção. Vamos fazer algumas
considerações.
1. No verso 1, a expressão “logo pela manhã”, isto é, logo na sexta-feira cedo,
confirma que Jesus foi julgado durante a madrugada em total irregularidade
diante da lei.
2. E podemos perguntar: Por que a Corte Suprema de Israel, o Sinédrio, levou
Jesus a Pilatos, governador romano da região? Conforme vimos
anteriormente, o Sinédrio condenara Jesus à morte. Mas tinham que levá-lo a
Pilatos, porque os judeus, ou qualquer outro povo sob o domínio de Roma,
não tinham o direito de exercer a pena capital. Assim, não bastava apenas o
tribunal judaico condenar. Para executá-lo, era necessário haver a
concordância romana.
3. Só o governador romano poderia autorizar o tipo de morte que o
condenado teria. E os líderes judaicos, revelando um coração duro e
impiedoso, queriam a crucificação de Jesus, queriam vê-lo pendurado no
madeiro, pois conforme a lei mosaica, o que for pendurado no madeiro é
maldito de Deus… (Dt 21.23). Eles queriam convencer o povo de que Jesus
era amaldiçoado e não abençoado por Deus. Para isso, tinham que acusar
Jesus de maneira tal que o governador não tivesse outra opção senão dar o seu
parecer.
Quando o levaram diante de Pilatos o acusaram de perverter o povo, de proibir o pagamento de
tributo a César e de chamar-se rei (Lc 23.1–2). Tiveram que desenvolver uma acusação de caráter
político ou Pilatos nem lhes teria escutado. Sabiam, e também Pilatos o sabia, que se tratava de uma
mentira. Por isso Pilatos perguntou a Jesus: “És tu o rei dos judeus” (v. 2). A reposta de Jesus foi
estranha: “Tu o dizes” (v. 2). Não disse nem sim nem não (BARCLAY, 1974, p. 363).

4. Quando lemos os versos 2 e 3, vemos uma grande objetividade na pergunta


que Pilatos dirigiu a Jesus e na resposta de Jesus a Pilatos: És tu o rei dos
judeus? Respondeu Jesus: tu o dizes (v. 2). Jesus respondeu, em outras
palavras, que em certo sentido Ele era o Rei dos judeus. Porém, Ele não um
rei revolucionário que ameaçaria o poder de Roma, mas o Rei prometido
pelas Escrituras Sagradas. Certamente Pilatos também entendia assim. Mas os
principais sacerdotes, diante dessa resposta de Jesus, conforme o verso 3,
aproveitaram a oportunidade para acusar Jesus de muitas outras coisas. Eram
mentiras, acusações falsas que forjaram contra Jesus.
5. Pilatos ficou admirado porque Jesus não ficou inquieto, nem nervoso, e lhe
perguntou: Nada respondes? Vê quantas acusações te fazem! (v. 4). Em
outras palavras, Pilatos disse: Você não percebe que quem cala consente? Mas
o Filho de Deus queria que Pilatos tirasse as suas próprias conclusões, que
não apenas o julgasse, mas julgasse também as ações dos seus acusadores.
Certamente a postura serena, a tranquilidade e o silêncio de Jesus provocaram
em Pilatos muitas reflexões. Barclay (1974, p. 363–364) nos aponta cinco
tipos de silêncio que devem nos fazer refletir:
Há momentos em que o silêncio é mais eloquente que as palavras, porque o silêncio pode dizer
coisas que as palavras não podem. Temos o silêncio de admiração, quando não se encontram
palavras para dizer. Temos o silêncio de desprezo, quando ao invés de responder o protesto de
alguém, o ouvinte o deixa desdenhosamente sem resposta. Temos o silêncio do medo, quando o
temor interior, a covardia da alma impede o ouvinte de responder aquilo que ele sabe que deveria
dizer. Temos o silêncio do coração dolorido, quando uma pessoa é duramente ofendida e ferida e
não fica querendo protestar e rejeitar as palavras ditas contra si, mas silenciosamente sente a sua
dor. E, temos o silêncio da tragédia, quando não há nada o que dizer diante das deslavadas
mentiras, das incompreensíveis acusações e da antevisão de um final terrível.

Certamente o silêncio de Jesus foi o silêncio da tragédia. Ele sabia o que


estava por vir à sua frente. Entregaria a sua vida por nós, sofrendo a dura
separação do Pai pelos nossos pecados: … como ovelha muda perante os
seus tosquiadores, ele não abriu a boca… (Is 53.7).
6. Conforme Lucas 23.4,14–15,20,22, Pilatos não via problemas em Jesus e,
além disso, sabia que por inveja aqueles religiosos haviam trazido Jesus ao
seu tribunal para ser condenado (v. 10; Mt 27.18). E, conforme Marcos nos
relata, essa atitude de Jesus ficar calado surpreendeu a todos … a ponto de
Pilatos muito se admirar (v. 5). Pilatos muito se admirou do comportamento
de Jesus, e para ele essa era uma situação muito difícil. Julgar este homem
seria realmente difícil.
7. Mas por que Jesus não respondeu a Pilatos? Jesus não responde por razões
bem específicas: porque seria inútil responder, já que as autoridades tinham
definido o que iria acontecer; porque não queria defender-se ou ficar
argumentando sobre as injustiças que estava sofrendo; porque tinha chegado a
hora de dar a sua vida para salvar o mundo; porque tinha vindo para esse
momento; e porque estava convicto da sua missão e nada o impediria de
completar a sua obra, isto é, dar a sua vida em nosso lugar.
Você tem agradecido por essa grande e maravilhosa determinação do nosso
Salvador?
Jesus é rejeitado pela multidão
Mc 15.6–15
Nesses versos encontramos a escolha que a multidão fez entre Jesus e Barrabás.
Com certeza, este foi mais um momento de dor para o nosso Senhor. Vamos
analisar detalhadamente o texto.
1. Era comum um prisioneiro ser libertado por ocasião da Páscoa (v. 6; Mt
27.15; Lc 23.17).
2. Barrabás, provavelmente um zelote, uma das seitas mais extremas dentro
do judaísmo, tinha sido preso com amotinadores que haviam cometido
homicídio (v. 7).
3. A multidão, instigada pelas autoridades religiosas (Mt 27.20), pediu que
Pilatos soltasse um dos presos, conforme o costume (v. 8).
4. Pilatos lhes perguntou: Quereis que eu vos solte o rei dos judeus? (v. 9).
Pilatos imaginou que a multidão nunca escolheria um criminoso de alta
periculosidade, um amotinador, um assaltante, um homicida conhecido de
todos por sua capacidade de cometer crimes e assaltos.
Quando Pilatos ofereceu soltar Jesus, insultando os principais sacerdotes invejosos, o povo foi
instruído a pedir por Barrabás. Os mesmos que estavam acusando Jesus de traição contra César
estavam pedindo a soltura de um homem que era realmente culpado de tal crime! A posição dos
principais sacerdotes era irracional e absurda – mas o pecado é assim mesmo! (MACDONALD,
2008, p. 146).

Provavelmente, Pilatos pensou que o povo preferiria soltar Jesus em vez de


Barrabás, pois enquanto um era um extremista perigoso, o outro era um
“profeta” bondoso que tanto bem fazia aos mais necessitados. Porém, Pilatos
enganou-se profundamente. Como vimos, ele sabia que era por inveja que os
principais sacerdotes haviam lhe entregado Jesus (v. 10). Pilatos sabia que
não havia nenhuma acusação justa contra Ele, mas certamente não esperava
essa reação da própria multidão.
5. Mas, orientado e estimulado pela liderança judaica, o povo respondeu a
Pilatos que queria que Barrabás fosse solto (v. 11). O povo preferiu Barrabás.
6. Mas Pilatos lhes perguntou: Que farei, então, deste a quem chamais o
rei dos judeus? (v. 12). Pilatos estava perdido, sem saber que decisão tomar.
Como juiz ele tinha de dar a última palavra.
7. E a resposta do povo foi clara, como vemos no verso 13: Crucifica-o! A
multidão, orientada pelo sinédrio, pelos líderes religiosos, pediu a morte de
Cristo de uma forma específica: Crucifica-o!
8. Pilatos lhes disse: Que mal fez ele? (v. 14). Mas o povo gritava cada vez
mais: Crucifica-o! (v. 14). E agora? Qual a decisão do governador romano?
Seguiria a justiça romana, que não condenava um justo em hipótese alguma?
Ele se preocuparia com a justiça ou tomaria o caminho mais fácil, o caminho
dos seus próprios interesses?
9. Conforme o verso 15, Pilatos preferiu o caminho que mais lhe favorecia.
10. E, após mandar açoitar a Jesus, entregou-o para ser crucificado (v.
15).
Torna-se claro que Pilatos estava plenamente convencido da inocência do nosso Senhor… Vemos
Pilatos a debater-se debilmente a fim de obter a absolvição de nosso Senhor, para satisfazer a
própria consciência. Mas, finalmente, cedeu ante a importunação dos judeus incrédulos; e, “Pilatos,
querendo contentar a multidão” (v. 15), entregou Jesus para ser crucificado. E, isto resultou na
eterna desgraça e ruína da sua alma. Um homem investido de grande autoridade sem princípios
espirituais é uma das mais deploráveis cenas do mundo. Assemelha-se a um grande navio sem
bússola e sem leme, que o mar leva de um lado para o outro (RYLE, 2007, p. 200).

Você percebe que rumo infeliz tomou Pilatos diante deste processo? Tinha nas
mãos o poder para decidir a questão, pois era governador e juiz. Mas para
contentar o povo, para agradar a liderança religiosa de Israel, e pensando em si
próprio, condenou Jesus, mandou açoitá-lo e o entregou para ser crucificado.
Pilatos colocou a justiça de lado para agradar a outros, certamente motivado
por seus próprios interesses!
Jesus é entregue aos soldados romanos para ser crucificado
Mc 15.16–20
A terceira cena que Marcos nos apresenta é de muita dor, sofrimento e
humilhação. Aqui, Jesus é entregue aos soldados romanos. Nestes versos,
encontramos Jesus sofrendo sem nenhuma culpa, por causa dos nossos pecados.
Devemos nos lembrar que Pilatos não achou nenhuma culpa, pecado ou qualquer
crime em Jesus. Mas foi bom Ele ter sido julgado por Pilatos, a máxima
autoridade naquela ocasião. Assim ficaria absolutamente claro diante de todos,
em todos os tempos, que Jesus não tinha nenhum pecado. Dessa maneira vemos
o Cordeiro de Deus em condição de ser crucificado, porque nas cerimônias da
Páscoa, o cordeiro sacrificado não deveria ter nenhuma falha, nenhum defeito.
Entretanto, mesmo que não houvesse qualquer falha em nosso Senhor, Ele foi
humilhado e espezinhado como nenhum outro:
O estilo solene mostra que se chegou ao meio da cena: “E o saudavam, dizendo: Salve, rei dos
judeus!” (v. 18) Eles irromperam em aclamações impetuosas como as que conheciam do culto ao
imperador, gritavam entusiasmados bênçãos para Sua Majestade e não paravam de dar-lhe vivas. O
brado de “salve” era um elemento importante dos hinos aos deuses. É claro que tudo isto era feito
entre risos, debaixo das gargalhadas de toda a turba… A profundeza da sua humilhação era seu
maior momento de triunfo… “Davam-lhe na cabeça com um caniço, cuspiam nele” (v. 19). Era um
misto selvagem de maus tratos que se repetiam e submissão fingida. Mas será que no gesto de
cuspir não havia uma alusão ao beijo de reverência? “E, pondo-se de joelhos, o adoravam” (v. 19).
Vejam, seus rostos estavam colados no chão em devoção. Que importa que o gesto foi feito
zombeteiramente?! Era profecia de tirar o fôlego (POHL, 1998, p. 434).

Embora Pilatos não tenha visto nenhum crime em Jesus, ele o entregou nas
mãos dos soldados para ser crucificado. Como o texto diz, o Senhor Jesus, o
autor da Criação, foi insultado, xingado, menosprezado e ridicularizado.
1. Com o sentimento de zombaria vestiram Jesus de púrpura, pois essa era a
cor da realeza.
2. Os espinhos que apareceram na terra como consequência da maldição, por
causa do pecado, agora era usado como coroa para punir Jesus pelos pecados
de toda a humanidade. Como bem salientou Henry:
Será um manto púrpura ou escarlate uma questão de orgulho para um cristão, se foi uma questão de
reprovação e vergonha para Cristo? Ele levou a coroa de espinhos que nós merecíamos, para que
pudéssemos levar a coroa de glória que ele merece (HENRY, 2002, p. 812).

3. A ultrajante saudação “salve, rei dos judeus!” era uma zombaria, por Ele
estar sendo condenado como rei dos judeus.
4. Bater na cabeça, cuspir no rosto e ajoelhar-se diante dele para adorá-lo de
modo desrespeitoso foram outras provocações que Jesus suportou.
5. A troca de roupas, da púrpura real para o traje simples do andarilho das
estradas poeirentas da Palestina, foi a última ação dos soldados contra Jesus
antes de conduzirem-no para ser crucificado.
Apesar do escárnio, os soldados declaram a verdade, pois, de fato, aquela pessoa humilhada é o
verdadeiro “Rei de Israel”. Sem saber cumpriam as profecias do Antigo Testamento (Sl 22.6; Is
50.6–7; 53.3 e 5) (MULHOLLAND, 2006, p. 227).

Mesmo que não saibam, os ímpios são servos de Deus (como, por exemplo,
Isaías 45.1–5). Deus atua até através daqueles que não o obedecem, a fim de que
os seus planos e as divinas profecias sejam cumpridos detalhadamente. Os
soldados, em vez de estarem ultrajando Jesus, estavam cumprindo as profecias
divinas!
Agradeçamos a Deus por esse plano tão amoroso para conosco!
Jesus é ajudado por Simão a carregar a cruz
Mc 15.21
No verso 21, Marcos nos apresenta um personagem totalmente desconhecido até
então. Simão é convocado e obrigado a levar a cruz de Jesus. Como ressaltou
Mulholland (2006, p. 228), “na ausência dos discípulos ou qualquer voluntário,
os soldados obrigam um espectador, Simão de Cirene, a levar a cruz”.
Cirene era uma cidade importante do norte da África, na Líbia atual.
Provavelmente, havia lá uma colônia judaica. E possivelmente alguns deles,
morando em Jerusalém, eram frequentadores da sinagoga dos Libertos a qual
Lucas se referiu (At 6.9).
Estando Simão em Jerusalém por ocasião da Páscoa, teve o privilégio de
ajudar o Senhor a carregar a cruz. Depois dessa inusitada e direta experiência
com a cruz do Salvador, certamente este homem se converteu, assim como sua
família. Posteriormente sua esposa e filhos, Alexandre e Rufo, se tornaram
cristãos conhecidos na comunidade cristã de Roma (Rm 16.13).
É muito provável que alguns cireneus estivessem em Jerusalém 50 dias
depois (At 2.10). E depois da vinda do Espírito Santo, já convertidos, foram para
outras regiões. Alguns estudiosos identificam esse Simão com Simeão, Níger,
que junto com Lúcio de Cirene era um dos líderes da igreja de Antioquia (At
13.1).
A experiência de Simão ser obrigado a carregar a cruz de Jesus serve como
uma antítese simbólica de como o verdadeiro discípulo, tomando
espontaneamente a sua própria cruz, deve seguir o Senhor de sua vida. Espero
que você seja um verdadeiro seguidor de Jesus Cristo!
Jesus é crucificado
Mc 15.22–32
Na sequência do texto, encontramos a narrativa da crucificação. Vamos analisar
este parágrafo fazendo sete considerações:
1. O local era uma pequena colina com formato de caveira, motivo pelo qual
provavelmente recebeu o nome de Gólgota. Era um local fora da cidade (v.
22).
2. A bebida oferecida a Jesus como analgésico foi vinho com mirra. Essas
especiarias tinham um poder analgésico e comumente eram oferecidas aos
crucificados para atenuar suas dores.
Aqui se oferecia vinho narcótico às vítimas para amortecer a sensibilidade dos seus sentidos; isso
era feito pelas mulheres de Jerusalém. Faziam-no de forma rotineira por consideração às palavras de
Pv 31.6. Jesus, no entanto, rejeitou o narcótico (v. 23), tanto em vista da sua declaração de 14.25
quanto também pela sua determinação de não evitar nada do sofrimento designado a ele por seu Pai
(BRUCE, 2009, p. 1633).

Jesus não bebeu esse unguento (v. 23), porque queria sofrer
conscientemente em favor do ser humano. Ele preferiu sofrer todas as nossas
dores para que a salvação que nos oferece seja completamente suficiente. Não
precisamos acrescentar mais nada à obra salvífica de Jesus Cristo!
3. A crucificação era a morte mais desprezível, reservada a assassinos,
escravos e outros criminosos vis que normalmente não eram romanos.
Conforme o verso 24, depois de colocá-lo pendurado na cruz, repartiram suas
vestes, em cumprimento do Salmo 22.18. Como acontecia costumeiramente,
os executores tinham direito às roupas do condenado.
4. Conforme o verso 25, Era a hora terceira quando o crucificaram. O
horário da crucificação foi às 9 horas da manhã.
5. A placa indicando a acusação era levada pelo prisioneiro enquanto
caminhava para a execução. Ela foi ordenada por Pilatos e tinha a seguinte
inscrição: [O REI DOS JUDEUS (v. 26)].
6. Jesus foi crucificado em companhia de dois ladrões (v. 27–28), em
cumprimento da profecia de Isaías 53.12.
7. E a última consideração diz respeito às zombarias que Jesus sofreu.
29. Os que iam passando, blasfemavam dele, meneando a cabeça e
dizendo: Ah! Tu que destróis o santuário e, em três dias, o reedificas!
30. Salva-te a ti mesmo, descendo da cruz!
Conforme os versos 31 e 32, os principais sacerdotes e os escribas
escarneciam, e os dois ladrões que com Jesus foram crucificados o insultavam.
Mas por que tudo isso? A fim de que nós, que somos miseráveis transgressores, tanto por natureza
quanto por prática, fôssemos considerados inocentes… Isto sucedeu a fim de que nós, que não
somos dignos de nada senão de condenação, sejamos contados como dignos… isto aconteceu a fim
de que nós, em nossos últimos momentos de vida, mediante a fé em Cristo, tenhamos forte
consolação. Todas essas coisas aconteceram a Cristo, a fim de que desfrutássemos de uma
inabalável segurança… (RYLE, 2007, p. 204).

Todos estes foram desafiando Jesus com as frases que erroneamente tiraram
dos seus ensinos. E injustamente, por amor a todos nós, Ele foi suportando as
injúrias conscientemente. Jesus sofreu por amor!
O que você tem feito em retribuição a essa tão impressionante demonstração
de amor?
Jesus morre diante do Pai, da multidão, das autoridades e dos seus
Mc 15.33–41
Marcos nos apresenta, nos versos 33 a 41, a sua descrição da morte de Jesus.
Jesus ficou na cruz durante 6 horas, das 9 da manhã até o meio da tarde, isto é,
até às 15 horas. As trevas duraram 3 horas, do meio dia até às 15 horas.
Jesus foi crucificado às 9 horas da manhã (v. 25). Do meio dia até as 15 horas, o céu se escureceu
(v. 33), e esse sinal simbolizava o descontentamento de Deus por aquilo que os homens estavam
fazendo ao seu Filho (BRUCE, 2009, p. 1634).

Certamente, durante essas horas, o Filho amado de Deus sofreu a separação


do Pai.
Como vemos em Isaías 53.4–5, certamente, durante essas horas…
4. ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou
sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido.
5. Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas
nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e
pelas suas pisaduras fomos sarados.
Certamente, durante essas horas, o Filho santo de Deus sofreu o inferno por
nós. Mas podemos pontuar esse momento da morte de Jesus fazendo as
seguintes observações.
1. Jesus clamou Eloí, Eloí, lamá sabactâni?… Deus meu, Deus meu, por
que me desamparaste? (v. 34), citando o Salmo 22.1 em hebraico,
chamando por Deus. Pohl nos faz perceber que
A narrativa praticamente silenciou sobre o período entre 12 e 15 horas. Talvez os sacerdotes, e com
eles os judeus devotos, tenham-se retirado, pois tinham trabalho a fazer no templo… O fato de
escrever em duas línguas deixa entrever que Marcos escrevia para leitores fora da Palestina, pois lá
a tradução seria desnecessária…

Mas sobre esse clamor, sobre essa invocação ao Pai, ainda é preciso
observarmos que
De certo modo ele também sentiu a dor do rompimento, não em sua substância, mas em sua
atuação. A autorrevelação de Deus se dividiu e entrou em tensão consigo mesma. De maneira
incrível Deus estava contra Deus, Deus lutou com Deus, Deus venceu a si mesmo (POHL, 1998, p.
443–445).

Esse clamor pela presença do Pai demonstra o que experimentarão aqueles


que passarem a eternidade longe de Deus.
2. O clima estava tão contrário a Jesus que pensaram que estava chamando
por Elias, pois acreditava-se que Elias, quando invocado, vinha ajudar os
necessitados. “Alguns que estão ao redor (v. 35) ouvem o clamor de Jesus e
pensam que ele chama por Elias… Se Elias não o ajudar, eles têm a prova
adicional de que a reivindicação de Jesus de ser o Messias é falsa”
(MULHOLLAND, 2006, p. 231).
Sem entenderem o clamor, não por Elias, mas pelo Pai, e sem entenderem
a necessidade dele passar por tudo isso, todos ali estavam prontos para julgá-
lo mais uma vez e desacreditá-lo. Quanta ignorância! Quanta falta de
discernimento! Ainda hoje, quanta cegueira espiritual.
3. O verso 36 diz que ofereceram-lhe vinagre, agora não mais com o desejo
de aliviar suas dores, mas desejando mantê-lo vivo e desperto para prolongar
o seu sofrimento. E ainda o perturbavam, dizendo: vejamos se Elias virá ao
ser chamado por Ele.
Estava ali o espectador que quis ver se Elias viria. Tinha uma curiosidade mórbida diante da cruz do
Salvador. A terrível cena não o fazia sentir nem espanto, nem reverência, e muito menos piedade.
Esse espectador com um sentimento totalmente duro, todavia, queria sim, experimentar, queria ver
Jesus morrendo (BARCLAY, 1978, p. 373).

Embora conhecesse o coração dos homens, Jesus não sabia a dimensão do


pecado humano. Como disse Hendriksen (2003, p. 832), o inferno veio até o
Calvário nesse dia, e o Salvador desceu a ele, experimentando os seus
horrores em nosso lugar. Sozinho, ali na cruz, Ele pôde perceber o quanto
estávamos afastados dos propósitos de Deus!
4. No verso 37 vemos que Jesus, dando um grande grito, expirou,
significando que espontaneamente entregava a sua vida por nós. “Jesus
exclamou com força e triunfo, depois expirou. Sua morte foi um ato de sua
vontade, não de um colapso voluntário… Uma nova grandiosa era fora
introduzida Seria uma era de proximidade de Deus, não de distância dele”
(MACDONALD, 2008, p. 147).
Jesus não morreu agonizante, como morriam os outros crucificados.
Conforme Lucas relatou em 23.46, o brado de Jesus, o seu grito, foi dirigido a
Deus: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito! E espontaneamente entregou
seu espírito ao Pai por nós!
5. O verso 38 diz que o véu do templo que separava o Lugar Santo do Santo
dos Santos foi rasgado de alto a baixo, mostrando que com a morte de Jesus o
novo e vivo caminho foi aberto diante do Pai, conforme Hebreus 10.19.
No mesmo instante em que o Senhor Jesus morreu, o véu do templo foi rasgado de alto a baixo.
Este fato foi motivo de terror para os judeus incrédulos, e foi o sinal de destruição tanto da nação
quando da fé deles. Por outro lado, expressava consolo para todos os cristãos crentes, porque
significava abrir um caminho novo e vivo ao Lugar Santíssimo, por meio do sangue de Jesus
(HENRY, 2002, p. 813).

Toda a iniciativa foi de Deus. O véu que separava já não separa mais!
Deus abriu a possibilidade de entrarmos no Santo dos Santos pelo precioso
sangue de Jesus derramado na cruz.
6. Por escrever para um público romano, Marcos destacou o testemunho do
centurião, um soldado romano:
Em Marcos, somente o centurião é focalizado. Para ele, essa afirmação do centurião parece ser uma
reação à escuridão e à forma como Jesus reagiu a tudo. A confissão é: “Realmente este homem era o
Filho de Deus!”. Em Lucas, a reação parece ser uma resposta aos mesmos fatores que Marcos
registrou. A confissão é: “Certamente este homem era díkaios (Lc 23.47)”. O termo grego pode ser
traduzido tanto por “justo” como por “inocente”. Qualquer uma das duas traduções faz sentido aqui,
porque dizer que Jesus era justo é o mesmo que afirmar sua inocência (BOCK, 2006, p. 362).

O centurião romano que comandava e estava presente na crucificação, vendo


a morte de Jesus de modo tão diferente da dos outros crucificados, confirmou:
Verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus! (v. 39) E esse testemunho
era uma apologia, era uma afirmação da inocência de Jesus Cristo!
7. Finalizando o parágrafo, conforme os versos 40 e 41, Marcos registrou a
presença feminina na cena da crucificação:
Pelos padrões severos dos religiosos, teria sido escandaloso para mulheres (especialmente as
casadas) viajarem com um grupo de discípulos do sexo masculino. À parte dos membros da
aristocracia helenizada, as mulheres judias da Palestina deviam limitar a atividade pública, para
manter as cabeças cobertas e cumprir as tarefas domésticas. A ideia de mulheres patronesses
(patrocinadoras) é conhecida em outros lugares, embora realmente seja impressionante que essas
mulheres viajassem com Jesus (KEENER, 2004, p. 190).

Essas foram as mulheres que acompanhavam Jesus e os discípulos desde a


Galileia (Lc 8.1–3), mulheres que certamente tinham sido abençoadas por Ele e
o serviam. Essas mulheres, quebrando os paradigmas culturais, foram fiéis ao
Senhor Jesus, não o abandonando e não se importando com o que, porventura,
pensassem a respeito delas.
Mesmo com a companhia daqueles que lhe foram fiéis até a morte, Jesus se
sentiu sozinho quando os pecados do mundo foram lançados sobre Ele. Mas
conforme 2Coríntios 5.19, tudo era plano divino, pois Deus estava em Cristo
reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas
transgressões.
E Ele nos confiou a palavra da reconciliação. Você está disposto a proclamar
essa reconciliação seguindo Jesus fielmente?
Jesus é sepultado
Mc 15.42–47
Nesses versos, chegamos ao relato final dos acontecimentos da sexta-feira. Aqui
temos o relato do sepultamento de Jesus. No processo que envolvia o sacrifício,
a morte e a ressurreição de Jesus, o seu sepultamento era uma parte fundamental.
Como bem ressaltou Ryle (2007, p. 208):
A morte do nosso Senhor Jesus Cristo é o fato mais importante do cristianismo. Dela dependem as
expectativas de todos os pecadores salvos, quanto ao tempo e à eternidade. Por conseguinte, não
precisamos ficar surpresos diante do fato que a realidade da morte de Cristo precisou ser
confirmada acima de qualquer contestação. Nos versículos que lemos (39–41), existem três tipos de
testemunhas do fato da morte de Cristo: o centurião romano, que estava próximo à cruz; as
mulheres, que tinham seguido o nosso Senhor desde a Galileia até Jerusalém; e os discípulos, que o
sepultaram. Todos esses foram testemunhas do fato que Jesus realmente morreu. A evidência
conjunta dessas testemunhas está acima de qualquer suspeita. Eles não poderiam estar equivocadas.
O que elas viram não foi um desmaio, ou transe, ou insensibilidade temporária. Elas viram aquele
mesmo Jesus, que fora crucificado, dar a sua vida, tornando-se assim obediente até à morte. Que
isso fique bem gravado em nossas mente. O nosso Salvador morreu, real e verdadeiramente!

Vamos analisar essa narrativa do sepultamento fazendo sete observações.


1. Conforme o verso 42, Jesus morreu na tarde da sexta-feira, na véspera do
sábado, o dia de descanso para todos os judeus, onde não podia haver
qualquer atividade.
2. José, da cidade de Arimateia, um ilustre membro do Sinédrio, que
certamente não tinha concordado com aquele julgamento injusto (Lc 23.51),
junto com Nicodemos (Jo 3.1), era um discípulo oculto de Jesus, pois
esperava o reino de Deus. Esse homem teve uma atitude digna e corajosa:
Todos os relatos descrevem o esforço de José de Arimateia para obter o corpo de Jesus para lhe dar
um sepultamento digno. Marcos o descreve como o “dia da preparação”, a sexta-feira antes do dia
do descanso judaico. Mateus diz que José era rico, enquanto Marcos e Lucas informam que ele era
membro do conselho. João o descreve como um discípulo secreto, que manteve a sua crença em
segredo por medo dos judeus. Mateus também o chama de discípulo. Marcos e Lucas dizem que ele
estava esperando pelo reino. E com isso, percebemos que nem todos os líderes rejeitaram a Jesus
(BOCK, 2006, p. 363).

O texto do verso 43 diz que José de Arimateia, com uma atitude objetiva e resoluta, foi até Pilatos e
pediu-lhe o corpo de Jesus para sepultá-lo ainda naquelas últimas horas da sexta-feira, por ser
sábado o dia seguinte.

3. No verso 44, Pilatos se admirou de Jesus ter morrido tão rapidamente, pois
o normal era o crucificado demorar muito tempo, às vezes alguns dias, para
morrer. Mas a morte de Jesus ocorreu mais rapidamente, porque
espontaneamente se entregou por nós.
4. Conforme os versos 44 e 45, Pilatos pediu confirmação para ver se Jesus
de fato tinha morrido. Diante da confirmação do comandante, cedeu o corpo a
José de Arimateia para que o sepultamento se realizasse.
5. No verso 46, José e Nicodemos, o seu parceiro de fé, membro do Sinédrio
(Jo 19.39–40), tiraram o corpo da cruz e o sepultaram. E no dizer de Pohl
(1998, p. 451): “Deus, que abandonara seu Filho na cruz, apesar de tudo se
confessa em favor deste morto. Do madeiro maldito ele foi direto para o
túmulo honroso. Um ponto de exclamação que prenuncia a Páscoa!”.
O sepultamento se deu num sepulcro novo aberto numa rocha, em
cumprimento da profecia de Isaías 53.9. Em todos os detalhes a Palavra de
Deus estava se cumprindo completamente!
6. No verso 46 vemos que o sepulcro foi fechado com uma pedra colocada na
entrada do túmulo. “O túmulo era um pequeno quarto esculpido na rocha. A
porta era selada com uma pedra, com formato de moeda, que era rolada
dentro de um sulco esculpido na rocha” (MACDONALD, 2008, p. 148).
Nas entrelinhas do relato é possível confirmar que Jesus de fato tinha
morrido, porque seu corpo inerte foi envolvido num lençol e recebeu todos os
unguentos costumeiros para a ocasião, pesando cerca de 100 libras (uns 30
quilos), conforme João nos relata em 19.39. Mas, além disso, percebemos
todo o cuidado e honra dedicada àquele que tinha dado a vida pela
humanidade. Essa atitude de reverência e amor para com Jesus é o que Ele
ainda espera de nós!
7. Terminando este capítulo, no verso 47 Marcos registra que algumas
mulheres que estavam na crucificação também presenciaram o sepultamento,
vendo onde colocavam o corpo inerte do Senhor da vida. Como destaca
Cardoso Pinto:
A presença das mulheres na hora final da vida de Jesus (15.40–41,47) acha um equivalente em sua
presença no evento glorioso do primeiro dia da semana. Sua fidelidade diante das provações é
recompensada com a primeira alegria da ressurreição e a primeira responsabilidade da proclamação
(CARDOSO PINTO, 2008, p. 102).

Mas sobre a ressurreição e essa maravilhosa tarefa dada em primeiro lugar às


mulheres trataremos no próximo capítulo.
Ao concluirmos esse relato tão marcante, constatamos que muitos que leem
este texto sobre a crucificação, a morte e o sepultamento sentem simpatia por
Jesus e ódio pelos homens que o mataram. Muitos ficam penalizados e sentem
porque Jesus morreu dessa maneira tão sofrida. Os corações religiosos e
sensíveis ficam cheios de sentimentos e de dor por isso. Outros ficam cheios de
ódio e aversão por aqueles que cometeram tão grande crime de crucificar o
Senhor da vida.
Embora sejam sentimentos que às vezes não conseguimos controlar, não são
sentimentos que Jesus quer que tenhamos. Não é isso que agrada a Deus. O que
Deus quer é que nos aproximemos da cruz com fé na obra que Jesus realizou por
nós. Não a simpatia, a solidariedade humana ou o pesar revelado pelos homens,
porque nada valem. Deus quer que tenhamos fé no sacrifício que Jesus realizou
na cruz. Quer que creiamos que Jesus Cristo morreu e foi ressuscitado dentre os
mortos para nos salvar. Com o coração cremos para a justiça e com a boca
fazemos confissão para a nossa salvação. É isto que Deus quer. Deus quer ver
em nós uma fé viva para assim nos dar a salvação em Jesus Cristo.
E você? Qual é a sua reação diante do sacrifício de Jesus? Simpatia ou
crença? Solidariedade ou fé? Avalie-se e desfrute do grande amor de Deus!
Deus quer ver em nós fé no sacrifício que Jesus realizou na cruz. O ponto
mais importante deste evangelho é a crucificação de Cristo. A morte de Cristo
fazia parte do plano de Deus antes mesmo que houvesse mundo. Desde a
eternidade Ele lançou o plano da redenção do homem. Jesus é o cordeiro de
Deus que foi sacrificado desde a fundação do mundo. O evangelho traduziu o
plano divino, estabelecido desde a eternidade, em realidade. Deus providenciou
tudo que precisávamos para alcançarmos a salvação. Jesus Cristo foi entregue na
cruz pelas nossas ofensas e ressuscitou para a nossa justificação, para a nossa
absolvição, para nos reconciliar com Deus.
A morte de Cristo foi o acontecimento que transformou a história da relação
Deus-homem. Jesus não morreu como as demais pessoas morrem, Ele entregou
seu espírito ao Pai. Jesus não morreu porque teve falência múltipla dos órgãos,
porque seus órgãos não funcionavam mais. Não! Jesus entregou o espírito antes
que o corpo deixasse de funcionar. Você tem experimentado andar pelo novo e
vivo caminho aberto por Jesus? Você tem tido comunhão e intimidade com o
Pai? Esse é um privilégio dos cristãos!

Marcos 16 - O servo ressuscita e ordena


a proclamação do evangelho
A ressurreição, os aparecimentos, a ordem para evangelização e a
ascensão
Antes de iniciarmos as nossas considerações sobre este capítulo tão importante
de Marcos, onde encontramos a narrativa da vitória do Senhor Jesus Cristo, da
sua ressurreição, das suas aparições e da sua glorificação, é necessário fazermos
um registro importante sobre o conteúdo que vamos estudar.
Precisamos mencionar que este capítulo tem sido alvo de muitos debates entre
os estudiosos. Enquanto muitos aceitam que o final original de Marcos se dá no
verso 8, os versos 9 a 20, por não serem encontrados em alguns dos melhores
manuscritos, têm despertado discussões sobre a autenticidade deles. Como bem
assinalou Hendriksen (2003, p. 859–860), não se trata de uma discussão em
torno de posições conservadoras ou liberais, mas de uma dificuldade textual que
merece ser considerada.
Assim, essa questão tem sido analisada sob a possibilidade de termos um
“final curto”, que engloba os versos 8 e 9, e um “final longo”, que engloba os
versos 9 a 20. Alguns estudiosos, então, entendem que esses versos não são
autênticos, isto é, não foram escritos pelo próprio Marcos. Eles creem que o final
original do evangelho foi perdido e que posteriormente os versos 9 a 20 foram
compostos para dar-lhe um final adequado, como vemos nos outros evangelhos.
Constatando essa situação, vale a pena citarmos Mulholland (2006, p. 238),
que além de outros detalhes, diz:
Os manuscritos mais antigos e mais confiáveis, porém, terminam com o que nós conhecemos como
o versículo 8. O “final longo” foi anexado, provavelmente algum tempo antes da metade do
segundo século. A origem do “final curto” (entre os versículos 8 e 9) é desconhecida. Ambos foram
escritos provavelmente numa tentativa de completar a narrativa de Marcos que (muitos alegam)
termina muito abruptamente… O “final longo” parece uma compilação editorial, possivelmente
para uso catequético, com a maior parte do seu conteúdo tirado dos outros Evangelhos. Há consenso
quase universal de que, à luz de evidências internas e externas, esses finais não são parte da
narrativa original.

E esse mesmo autor, concordando com outros estudiosos, aconselha que não é
sábio usarmos esse texto para firmarmos e alicerçarmos posições teológicas
baseando-nos exclusivamente em suas palavras. Em apoio a essa recomendação,
afirmamos que é sensato basearmos as doutrinas e as posições teológicas que
vemos aqui em tantos outros textos, pois eles não levantam qualquer dúvida em
relação à sua autenticidade.
Entretanto, ao mesmo tempo em que essa opinião é firmada, outros homens
de Deus, profundos estudiosos, conhecedores e autoridades no estudo da Palavra
de Deus, entendem e creem firmemente que o capítulo todo é tão autêntico como
qualquer outro texto. Além de outras razões claramente expostas em seus
comentários, mencionados na bibliografia, esses estudiosos têm essa posição
porque o conteúdo dos versos 9 a 20 é citado por vários escritores antigos já no
final do segundo século, e uma grande quantidade de manuscritos de Marcos
contém o capítulo 16 com os seus 20 versos, como temos em nossas Bíblias.
Um dos estudiosos que tem essa posição, ao apresentar as razões do seu
entendimento, faz a seguinte afirmação:
É necessária aqui uma palavra sobre o fim do Evangelho de Marcos, um tópico acaloradamente
debatido ao longo dos últimos quinze séculos. Creio que os doze últimos versículos de Marcos (9–
20) pertencem ao lugar em que se acham e foram escritos pelo próprio Marcos, sob a direção do
Espírito Santo (CARDOSO PINTO, 2008, p. 82).

Também se posicionam dessa mesma maneira Baxter (1992, p. 237), Mac


Donald (2008, p. 148) e o autor desse comentário.
Entretanto, talvez alguns perguntem por que estamos fazendo essas
colocações. Fazemos isso em respeito a você. Sendo honestos, não podemos
omitir esses comentários. Queremos que você conheça as questões importantes
que envolvem o estudo da Palavra de Deus. Entretanto, elas não diminuem em
nada o valor do estudo deste trecho do evangelho.
Portanto, agora estamos prontos para analisar cada parte do último capítulo
deste evangelho tão direto e objetivo. Estamos diante de um relato maravilhoso,
diante da narrativa do milagre único que abalou toda a história da humanidade.
Depois de ter sido hostilizado pelas autoridades religiosas dos judeus durante
todo o seu ministério, depois de enfrentá-las até que a sua hora chegasse, e
depois de se entregar voluntariamente, dando-se em sacrifício por nós, Jesus
experimentou desonra, maus tratos e humilhação até a morte na cruz.
Depois de experimentar o abandono dos seus discípulos, depois de enfrentar
um grande sofrimento físico durante as horas da crucificação, depois de
experimentar o inferno por nós, ao enfrentar a completa solidão pela ausência do
seu Pai Jesus experimentou o amargo sabor da morte. Como um ser humano
completo, passou por todas as aflições que qualquer um de nós pode passar. E,
assim, tornou-se capaz de compadecer-se das nossas fraquezas (Hb 4.15).
Mas a maravilhosa notícia do evangelho é que a morte não o deteve! Jesus
ressuscitou, como Ele mesmo tinha avisado aos discípulos. Graças a Deus, Jesus
ressuscitou! Temos um Salvador e um Senhor vivo! Cremos num Deus vivo!
Cremos num Deus que mesmo experimentando a morte venceu-a completamente
e, ressuscitado, nos deu a esperança segura e firme de que também podemos
vencer esse último e grande inimigo de todo ser humano!
É essa narrativa que vamos estudar. É para esse milagre único que Marcos
chama a nossa atenção. Com os corações gratos e esperançosos, vamos, então,
considerar este capítulo dividindo-o em sete partes:
No domingo:
Parte 1 – Jesus é alvo de uma demonstração de profundo amor (v. 1–2)
Parte 2 – Jesus surpreende seus seguidores em todos os detalhes (v. 3–5)
Parte 3 – Jesus é anunciado ressurreto por um anjo (v. 6–8)
Parte 4 – Jesus aparece a Maria Madalena (v. 9–11)
Parte 5 – Jesus aparece a dois de seus discípulos (v. 12–13)
Parte 6 – Jesus aparece aos onze discípulos e lhes ordena a evangelização (v.
14–18)
Parte 7 – Jesus é recebido em glória e coopera com os discípulos na
evangelização (v. 19–20)
Finda a hora da dor, do desprezo, da humilhação, da entrega e da solidão,
Deus, o Pai, demonstrou seu amor pelo Filho obediente. E mesmo morto e
sepultado, o Filho amado foi tratado com carinho e atenção por alguns dos seus
seguidores. Mesmo morto:
A. Jesus recebeu o cuidado de José de Arimateia, que pediu para Pilatos
liberar rapidamente o corpo do seu Senhor para não deixá-lo exposto no
final da sexta-feira e por todo o sábado.
B. Jesus recebeu o cuidado de Nicodemos, que se envolveu nos
preparativos e, junto com José, respeitosamente sepultaram seu corpo num
túmulo novo.
C. Jesus recebeu a atenção das mulheres que o acompanhavam desde a
Galileia que, com seus olhos totalmente atentos, seguiram cada um desses
procedimentos para saber o local exato do túmulo, para depois o
homenagearem com os aromas e bálsamos preparados.
Sim! Depois do final da sexta-feira e antes madrugada de domingo, o corpo
de Jesus foi alvo da preocupação dos seus seguidores, mas também dos seus
inimigos (Mt 27.62–66). Porém, todos esses cuidados e preocupações seriam
inúteis diante do milagre único da ressurreição. Com o propósito de aproveitar
cada detalhe deste capítulo, vamos estudá-lo cuidadosamente.
Jesus é alvo de uma demonstração de profundo amor
Mc 16.1–2
Durante todo o sábado Jesus esteve sepultado. Quando contamos a tarde-noite de
sexta-feira e a madrugada de sexta-feira para sábado, todo o sábado e ainda a
madrugada de sábado para domingo, de fato Jesus esteve sepultado durante três
dias. E, então, no alvorecer de domingo, Jesus ressuscitou! Graças a Deus!
Glórias a Deus por esse único e maravilhoso milagre.
No verso 1, em meio a narrativa da ressurreição de Jesus, encontramos o
relato da profunda demonstração de amor por parte das mulheres, suas
seguidoras. Tendo presenciado a crucificação, acompanharam também os
detalhes do sepultamento.
Além de outras, algumas delas foram mencionadas por nomes pelos três
evangelistas sinóticos: Maria Madalena; Maria, mãe de Tiago, o menor, e de
José; Salomé, que era mulher de Zebedeu (15.40; Mt 27.56,61; 28.1); e Joana
(Lc 24.10). João, por sua vez, mencionou: Maria, mãe de Jesus; a irmã dela
(Salomé); a mulher de Clopas (mãe de Tiago, o menor, e José); e Maria
Madalena (Jo 19.25). O propósito dessas mulheres era embalsamar o corpo de
Jesus.
Conforme o verso 2, logo cedo, nas primeiras horas do domingo, ao raiar o
sol, essas dedicadas mulheres foram ao túmulo com aromas para Jesus. Elas
foram as últimas a sair do Gólgota. E vale repetir: foram as primeiras a chegar ao
túmulo. Elas tinham pressa porque queriam chegar o mais cedo possível para
embalsamar aquele corpo ferido, como uma demonstração de afeição por Jesus.
Era uma expressão do amor que tinham por Ele.
Nicodemos trouxe uma grande quantidade de especiarias, mas estas bondosas mulheres não creram
que fossem suficientes. O respeito que outros mostram para com Cristo não nos deve impedir de
demonstrar o nosso. Aqueles que são levados pelo santo zelo a buscar a Cristo com diligência,
perceberão que os tropeços do caminho desaparecem com rapidez. Quando nos expomos a
problemas e gastos por amor a Cristo, somos aceitos… (HENRY, 2002, p. 813).

Como nos dias de hoje, quando levamos flores para homenagear nossos
mortos, elas levaram os aromas em homenagem a Jesus. Que dedicação, que
amor essas mulheres tinham por Jesus! Será que temos essa mesma dedicação
por Ele?
Jesus surpreende seus seguidores em todos os detalhes
Mc 16.3–5
Conforme o verso 3, preocupadas em homenagear Jesus, as mulheres iam
antecipando um possível problema a respeito da remoção da pedra que havia
sido colocada na entrada da tumba, do túmulo. Colocar a pedra fechando o
túmulo era fácil, mas depois de encaixada na canaleta aberta na rocha, tirá-la era
difícil demais e quase impossível para um grupo de mulheres. Por meio do verso
4 podemos aprender desse episódio que nunca devemos sofrer antecipando um
problema, porque ele pode não existir. Uma grande parte do sofrimento de muita
gente é devido a problemas que são irreais, que não existem, são apenas “pré-
ocupações”.
Elas sabiam que não seria fácil. Sabiam que uma grande pedra fora rolada na boca do túmulo.
Sabiam acerca do selo romano e da guarda dos soldados. Mas o amor salta por sobre as montanhas
de dificuldades para alcançar o objeto de sua afeição… elas estavam imaginando em voz alta quem
poderia remover a pedra da entrada do túmulo… mas, olharam e viram que já havia sido removida!
Quantas vezes, quando estamos concentrados em honrar o Salvador, acontece de as dificuldades
serem removidas antes de chegarmos lá! (MACDONALD, 2008, p. 148).

Temos de saber que quando caminhamos com Cristo Ele sempre nos
surpreende, pois … é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo
quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós… (Ef
3.20). Assim, como a pedra fora removida, o problema não mais existia. Deus
quer que descansemos nas suas providências.
Mas conforme o verso 5, as mulheres tiveram uma segunda surpresa: Jesus
não estava lá. Ele tinha ressuscitado! E elas tiveram ainda uma terceira surpresa:
entrando no túmulo, viram um jovem assentado do lado direito, vestido de
branco, e ficaram surpreendidas e atemorizadas (v. 5). Ora, não era para
menos: encontrar o sepulcro aberto com a pedra removida; não encontrar o corpo
de Jesus que tinham vindo homenagear; e encontrar um jovem assentado lá
dentro, vestido de branco, foi impactante. Sem dúvida elas ficaram atemorizadas.
De acordo com os outros evangelhos, aquele não era um jovem comum, como
inicialmente pensaram. Era um anjo que lhes anunciaria uma excelente notícia!
Jesus é anunciado ressurreto por um anjo
Mc 16.6–8
Desde o Antigo Testamento, como já temos estudado, os anjos apareciam na
forma humana trazendo mensagens divinas. Afinal, são … espíritos
ministradores, enviados para serviço a favor dos que hão de herdar a
salvação (Hb 1.14). E assim como os anjos serviram a Jesus, depois do seu
período de testes, logo no início do seu ministério (1.13), esse anjo também o
serviu dirigindo às mulheres palavras muito significativas. Aquelas palavras
mudaram a história da humanidade.
Foi a maior mensagem de todos os tempos: Não vos atemorizeis; buscais a
Jesus, o Nazareno, que foi crucificado; ele ressuscitou, não está mais aqui;
vede o lugar onde o tinham posto. Mas ide, dizei a seus discípulos e a Pedro
que ele vai adiante de vós para a Galileia; lá o vereis, como ele vos disse (v.
6–7). O anjo sabia de tudo, ele estava bem informado. Foram feitas cinco
afirmações:
A. Não tenham medo. O anjo queria tranquilizá-las para a importante e
maravilhosa notícia que lhes daria.
B. Vocês estão buscando a Jesus, que foi crucificado. Ele ressuscitou.
C. Vejam o lugar.
D. Digam aos seus discípulos e a Pedro: Ele já está indo para a Galileia.
E. Lá o vereis como Ele disse.
Esse cuidado especial dispensado a Pedro certamente se deve ao fato de,
depois de ter negado a Jesus, ele estar se sentindo culpado e envergonhado. Mas
um destaque que deve ser feito é em relação ao cumprimento das palavras de
Jesus. Tudo aconteceu como tinha previsto.
Conforme o verso 8, diante desse encontro com o anjo e diante dessas
palavras tão inacreditáveis, as mulheres saíram do sepulcro e fugiram espantadas
e temerosas. Elas estavam tão abaladas emocionalmente que nada disseram a
ninguém, mostrando como o ser humano reage e se comporta diante do
sobrenatural.
… esta fuga nada tem em comum com a fuga dos discípulos em 14.50. Lá os discípulos queriam se
esconder, mas essas mulheres atenderam à sua missão. O fato de saírem correndo da câmara
mortuária se explica pela condição em que encontravam: “Porque estavam possuídas de temor e de
assombro” (8). Nossa surpresa diante disto pode estar relacionada com nosso embotamento quanto à
mensagem da Páscoa. Nós festejamos a Páscoa todos os anos… Estas mulheres, porém, não tinham
experiência na área. A Páscoa simplesmente as derrubou… De forma alguma quis Marcos retratar a
desobediência delas aqui, mas sua obediência de fé… as mulheres obedeceram direitinho. Nada lhes
fora ordenado além de notificar os discípulos, e elas não se deixam desviar para o anúncio
generalizado pelas ruas e praças, no templo ou em casa. A pregação a todos será tarefa dos
discípulos (POHL, 1998, p. 457–458).

Jesus tinha ressuscitado, e essa era uma grande notícia! Essa maravilhosa
notícia que deveria ter provocado naquelas mulheres uma grande e profunda
alegria, deixaram-nas espantadas e tomadas de medo. Mas esse é o
comportamento humano diante de feitos e de fatos sobrenaturais. O ser humano
não está acostumado com estes fatos. O medo é uma força que chega a paralisar
as pessoas. As mulheres que foram ao sepulcro e viram a tumba vazia, provando
que Jesus havia ressuscitado, viram o anjo e ouviram suas palavras. Com medo,
mas em obediência, nada disseram a ninguém senão aos discípulos.
Porém, por causa do medo que domina muitos crentes ainda hoje, por causa
da falta de coragem para testemunhar e certamente por causa da vergonha em
proclamar que acreditam no sobrenatural, muitos estão vivendo sem
experimentar a transformação que a mensagem mais poderosa deste mundo, a
mensagem do Jesus Cristo ressuscitado, pode provocar na vida humana. O medo
é uma força paralisante. Que o medo, a falta de coragem e a vergonha não nos
impeçam de experimentar e anunciar Jesus Cristo ressuscitado!
Jesus aparece a Maria Madalena
Mc 16.9–11
Nos versos 9 a 11 Jesus aparece a Maria Madalena. Este relato é muito direto e
objetivo:
9. Havendo ele ressuscitado de manhã cedo no primeiro dia da
semana, apareceu primeiro a Maria Madalena, da qual expelira sete
demônios.
10. E, partindo ela, foi anunciá-lo àqueles que, tendo sido
companheiros de Jesus, se achavam tristes e choravam.
11. Estes, ouvindo que ele vivia e que fora visto por ela, não
acreditaram.
Vamos analisar este parágrafo fazendo sete considerações.
1. Marcos confirma que Jesus ressuscitou no domingo, de manhã cedo.
2. Quando Marcos foi escrito, aproximadamente entre os anos 55–68 d.C., o
domingo já era considerado como o primeiro dia da semana pelos cristãos,
exatamente porque Jesus tinha ressuscitado depois do sábado. Assim, o
primeiro dia depois do sábado foi considerado o dia inicial de uma nova
semana.
3. O nome Madalena derivava de Magdala, uma cidade à margem sudoeste do
mar da Galileia. Jesus apareceu primeiro a Maria Madalena, fato confirmado
pelos outros evangelhos, principalmente por João (20.11–18), que narra esse
encontro.
4. O texto nos diz que dela Jesus expulsou sete demônios, e tal registro
concorda com o ambiente descrito por Marcos, pois por todo o livro ele
mostra a completa autoridade de Jesus sobre Satanás e seus demônios.
A ela, antes que a qualquer outro dos filhos de Adão, foi concedo o privilégio
de ter sido a primeira pessoa a contemplar o Salvador ressurreto. Maria, a mãe
de nosso Senhor, continuava viva. João, o discípulo amado, continuava na terra.
No entanto, ambos foram preteridos, nessa ocasião, em favor de Maria
Madalena. Uma mulher que, antes de sua conversão, provavelmente fora uma
das principais pecadoras, uma mulher que antes estivera possessa por sete
demônios. Essa mulher foi a primeira pessoa a quem Jesus se mostrou vivo,
depois que Ele ressurgiu vitorioso do sepulcro. Esse fato é notório e repleto de
instruções (RYLE, 2007, p. 214).
5. No verso 10, Maria Madalena, depois de ter visto Jesus, foi e anunciou o
milagre da ressurreição aos discípulos. Jesus apareceu primeiramente a ela,
que teve o privilégio de anunciar aos discípulos o maravilhoso milagre da
ressurreição!
6. Os companheiros de Jesus estavam tristes, certamente porque as ambições
políticas e sociais que tinham se desfizeram. Concordando com o conceito
inadequado do povo sobre o Messias, os discípulos estavam tristes e
frustrados com a morte daquele em quem depositavam esperança.
7. Os discípulos choravam desalentados, pois além de não terem mais a
presença de Jesus com eles, também sentiam culpa por terem abandonado o
Mestre, deixando-o sozinho enfrentando as autoridades judaicas e romanas.
No seu nascimento, Jesus esteve sozinho, sem um lugar adequado para vir ao
mundo. Agora, na sua morte, Ele estava sozinho, abandonado pelos seus
companheiros. E você, tem dado o lugar adequado a Jesus? Você tem se
comprometido com Ele ou o tem negado através de suas ações?
O choro deles foi de tristeza, e certamente de culpa e arrependimento. Mas
graças a Deus, Maria Madalena trouxe-lhes a mensagem da ressurreição!
Jesus aparece a dois de seus discípulos
Mc 16.12–13
Prosseguindo na comprovação da sua ressurreição, Jesus apareceu a dois de seus
discípulos, que iam para o campo. O texto diz: Depois disto, manifestou-se em
outra forma a dois deles que estavam de caminho para o campo. E, indo,
eles o anunciaram aos demais, mas também a estes dois eles não deram
crédito (v. 12–13). O relato completo sobre esse episódio está em Lucas 24.13–
35. Faremos agora sete observações.
1. Conforme o verso 12, a palavra “manifestou-se” demonstra, pelo verbo
grego, que Jesus desejava se revelar, se mostrar ressurreto. Mas Ele só se
manifestou aos seus escolhidos, àqueles que o acompanhavam desde o
começo.
2. A frase manifestou-se em outra forma é também significativa. Para
Maria, Jesus apareceu como jardineiro. Para esses dois discípulos, como um
viajante. Por quê? Porque as notícias da sua aparição dadas progressivamente
facilitariam os discípulos lembrarem-se das suas promessas e crerem com
alegria neste fato sobrenatural.
3. Conforme o verso 12, é possível deduzir que os dois iam para o campo, por
causa da morte do seu líder. Não crendo e sem esperanças, eles talvez
estivessem desistindo do discipulado.
4. Porém, o verso 13 diz que tão logo constataram que o Senhor estava vivo,
em vez de guardarem as boas novas para si mesmos, não tiveram medo e,
deixando a incredulidade de lado, foram levar as boas novas da ressurreição
aos demais discípulos.
5. Ainda no verso 13, em relação à frase eles o anunciaram aos demais,
percebemos que a atitude deles, assim como aconteceu com Maria Madalena
(v. 10), foi a de compartilhar com os outros a grande novidade da
ressurreição. Essa atitude chama atenção para a nossa responsabilidade. Todo
cristão que tem visto pelos olhos da fé o Senhor ressurreto não pode e nem
deve se calar, mas anunciar que o nosso Senhor é vivo!
6. Porém, a frase final do verso 13 é sintomática: mas também a estes dois
eles não deram crédito. Os demais discípulos continuaram incrédulos. É
possível explicarmos esse tipo de atitude? Essa atitude só é explicada quando
olhamos para nós mesmos. Em muitas ocasiões, mesmo diante da intervenção
de Deus, não acreditamos no seu poder sobrenatural e na sua capacidade
extrema de nos amar!
7. Por isso, em relação à incredulidade, vale a pena lembrarmos que, como
somos falhos e titubeantes, é possível que a dúvida brote em nossos corações.
Como disse Ryle (2007, p. 216):
Somos pessoas sujeitas às mesmas paixões dos apóstolos. Não podemos considerar coisa estranha
se a nossa experiência, algumas vezes, assemelha-se às experiências deles, ou se a nossa fé, tal
como a deles, algumas vezes desfalece. Resistamos com ousadia à incredulidade.

As palavras do autor do livro aos Hebreus, nesse sentido, devem ser


relembradas: De fato, sem fé é impossível agradar a Deus… (Hb 11.6). Por
isso, devemos manter o nosso olhar fixado no Senhor Jesus Cristo ressurreto, o
autor e consumador da fé (Hb 12.2).
Jesus aparece aos onze discípulos e lhes ordena a evangelização
Mc 16.14–18
Nesses versos encontramos a aparição de Jesus aos onze e a ordem para
anunciarem o evangelho para todo o mundo. Temos sete observações a fazer.
1. Conforme o verso 14 e o relato dos outros evangelhos, depois dessas e
outras aparições, finalmente Jesus apareceu-lhes quando todos os onze
estavam juntos à mesa, provavelmente ainda descrentes das notícias que
tinham ouvido de Maria Madalena e dos dois discípulos que iam ao campo
(Lc 24.36–43; Jo 20.26–29).
2. Jesus censurou-lhes a incredulidade e a dureza dos corações, porque não
tinham crido nem naqueles que já o tinham visto. Como descreveu Lopes
(2006, p. 604)
Os discípulos de Jesus fugiram quando Jesus foi preso no Getsêmani (14.50); estiveram ausentes no
Calvário (exceto João); não compareceram diante de Pilatos para reivindicar o seu corpo para o
sepultamento; estiveram ausentes no sepultamento; e, agora não acreditavam na mensagem da sua
ressurreição… Jesus, então, aparece a eles quando estavam à mesa e censura-lhes a incredulidade e
dureza de coração (16.14).

Será que essa censura foi apenas para os discípulos? Certamente, num
primeiro momento se aplicava a eles, que ainda estavam cegos para
contemplar que para Deus não há impossíveis, conforme o próprio Jesus lhes
tinha ensinado anteriormente: … porque para Deus tudo é possível (10.27).
Mas essa censura é extensiva a nós também, pois mesmo vendo as grandes
transformações que Deus faz em nossas próprias vidas, ainda cheios de
incredulidade não cremos na sobrenaturalidade do nosso Deus trino!
3. Porém, graças a Deus, Jesus não enfatizou somente o negativo, e logo lhes
chamou a atenção para algo positivo. Jesus lhes ordenou explicitamente que
fossem por todo o mundo e pregassem o evangelho a toda a criatura: Ide por
todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura (v. 15). Essa era a
tarefa de Jesus para os discípulos da primeira geração, mas é também a ordem
para todos nós que somos seus discípulos. O evangelho é a comunicação da
graça salvadora e universal de Deus! A nossa tarefa é anunciar essa “tão
grande salvação” em Jesus Cristo!
4. Na sequência, nos é dito que essa proclamação deveria ser recebida pela fé
e confirmada no batismo, como diz o texto: Quem crer e for batizado será
salvo; quem porém, não crer será condenado (v. 16). Entretanto, é
importante entendermos corretamente essas palavras. A ênfase é sobre a
necessidade de crer, sobre a obrigatoriedade de crer. Se qualquer pessoa crer
no sacrifício de Jesus será salvo. O batismo é um simbolismo da nova vida
em Cristo; é uma identificação com Cristo, mas não é determinante para a
salvação. A condenação só é destinada àquele que não crer!
5. Nos versos 17 e 18 Jesus ainda acrescentou que sinais sobrenaturais
acompanhariam os que cressem. Jesus mencionou cinco sinais: expulsar
demônios (At 8.7; 16.18), falar em novas línguas (At 10.46; 19.6), pegar em
serpentes (At 28.3–6), tomar veneno e impor as mãos sobre os doentes e eles
serem curados (At 9.17–18; 28.8).
6. Embora crendo que todos esses sinais seguiriam e ainda seguem os
discípulos de Cristo, é importante mencionar que entre todos, apenas o de
beberem alguma coisa mortífera (v. 18) não foi registrado no livro de Atos
dos Apóstolos. Entretanto, passagens como Romanos 15.19 e Hebreus 2.3–4
referem-se a todos esses sinais.
7. Ao finalizar esse parágrafo, uma pergunta vale a pena ser considerada:
Qual foi o propósito desses milagres prometidos? Certamente a resposta deve
vir de Hebreus 2.3–4. O texto diz:
3. Como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação? A
qual, tendo sido anunciada inicialmente pelo Senhor, foi-nos depois
confirmada pelos que a ouviram;
4. dando Deus testemunho juntamente com eles, por sinais, prodígios e
vários milagres e por distribuições do Espírito Santo, segundo a sua
vontade.
As ações sobrenaturais divinas que seguiram os discípulos de Jesus com
certeza foram permitidas e aconteceram por vontade de Deus. O propósito divino
era testemunhar, era confirmar a mensagem do evangelho, a proclamação das
boas novas. A proclamação da chegada do reino de Deus foi sendo autenticada
por essas maravilhosas ações, nas quais o próprio Senhor usava os discípulos
para que fosse comprovada.
Mas ao respondermos essa questão, certamente surge outra que nos afeta
diretamente: esses sinais e manifestações sobrenaturais ainda seguem os
discípulos de Jesus nos dias de hoje?
Embora alguns estudiosos entendam que esses sinais ficaram restritos a época
em que a Bíblia estava sendo escrita, não encontramos na própria Escritura base
suficientemente clara para afirmarmos que esses sinais, e as manifestações das
distribuições do Espírito Santo, segundo a sua vontade, se encerraram
naqueles primeiros dias do cristianismo.
Temos de perguntar a nós mesmos se estamos disponíveis para sermos usados
por Deus, pelo Senhor Jesus e pelo Espírito Santo como canais das suas
poderosas manifestações que têm a finalidade de mostrar a verdade do
evangelho. Essa é uma questão que só você pode responder diante de Deus!
Jesus é recebido em glória e coopera com os discípulos na
evangelização
Mc 16.19–20
Como último parágrafo, nos versos 19 e 20, temos o relato da ascensão de Jesus.
Sobre esses versos temos também sete constatações.
1. Conforme o verso 19, Jesus continuou por algum tempo falando, ensinando
os discípulos. Jesus ficou com eles durante 40 dias, dando provas da sua
ressurreição e conversando a respeito do reino de Deus (At 1.3).
2. Ainda conforme o verso 19, Jesus foi recebido no céu, completando
totalmente a sua missão salvífica por todos nós. A glorificação de Jesus
significou a aceitação por parte de Deus Pai do seu sacrifício em nosso lugar.
Como justo, Ele pagou pelos injustos e assim a justiça de Deus foi vindicada.
Ter sido recebido no céu significou que a sua atuação no desempenho da sua
missão foi aceita, e assim Ele obteve lugar de honra e poder.
3. Jesus ocupou o lugar de destaque à direita do Pai (v. 19), numa clara
referência a autoridade, ao poder que lhe foi concedido. No primeiro embate
entre os apóstolos e as autoridades, depois da glorificação de Jesus, Pedro
deixou isso bem claro quando disse em Atos 4.10–12:
10. Tomai conhecimento, vós todos e todo povo de Israel, de que, em
nome de Jesus Cristo, o Nazareno, a quem vós crucificastes, e a quem
Deus ressuscitou dentre os mortos, sim, em seu nome é que este está
curado perante vós.
11. Este Jesus é pedra rejeitada por vós, os construtores, a qual se
tornou a pedra angular.
12. E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não
existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa
que sejamos salvos.
4. O verso 20 registra que os discípulos partiram para o cumprimento de sua
missão. Depois da ordem de Jesus (v. 15), os discípulos foram anunciando as
boas novas de salvação em nome de Jesus Cristo. Porém, como é possível
deduzir, a proclamação das boas novas só aconteceu depois de terem ficado
em Jerusalém aguardando, em oração, a promessa da vinda do Espírito Santo
(At 1.4,12–14), a qual se concretizou no dia de Pentecostes (At 2.1–4).
5. O relato é significativo, pois como vemos por todo o livro de Atos, todos
os apóstolos se envolveram na proclamação do reino de Deus (At 2.43),
incluindo o próprio Marcos, o autor desse evangelho (At 13.5; 15.37–39).
Sim! Recebendo a ordem e autoridade de Jesus os discípulos difundiram a
mensagem do evangelho por todo o mundo antigo. Em aproximadamente 30
anos o evangelho saiu de Jerusalém e chegou a Roma, a capital do grande
Império.
6. Ainda conforme o verso 20, o Senhor Jesus cooperava com eles no
ministério de proclamação da Palavra. A promessa que Mateus registrou
estava se cumprindo literalmente: E eis que estou convosco todos os dias até
a consumação do século (Mt 28.20). E a grande bênção para nós é que essa
promessa ainda é válida. Jesus está conosco continuamente e, certamente,
quando nos dispomos a anunciar as boas novas de salvação fazendo e
trazendo novos discípulos para o seguirem.
7. A última frase do livro de Marcos carrega uma palavra de esperança,
segurança e vitória, pois o Senhor Jesus confirmava o ministério dos
discípulos. Jesus confirmava a palavra por meio de sinais, que se seguiam,
conforme Lucas testemunhou no seu livro que registrou o início da igreja
cristã (At 2.43; 5.12; 6.8; 8.6,13; 14.3; 15.12; 19.11). E a boa notícia é que
essa esperança, segurança e vitória estão disponíveis a nós, se crermos (v. 17).
Ao final deste estudo constatamos que ele é básico para nossa fé. Assim como
a morte de Jesus nos proporcionou a possibilidade de entrarmos no Santo dos
Santos, a ressurreição e a ascensão de Jesus nos concedeu autoridade para
proclamar o evangelho.
O evangelho de Marcos salienta o poder de Jesus assim como a sua posição
de servo. A vida e os ensinos de Jesus transformaram o mundo. Jesus tinha toda
a autoridade e poder, mas preferiu servir o ser humano.
Seguir a Jesus significa receber este mesmo poder para servir. Como cristãos,
somos chamados para ser servos. Assim como Cristo serviu, nós devemos servir
também!
Amém!

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