Análise de Resultados Da Tipagem Sanguínea Antes E Após A Implantação Da Técnica de Semiautomação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

INSTITUTO DE CIÊNCIAS BÁSICAS DA SAÚDE


CURSO DE BIOMEDICINA

ANÁLISE DE RESULTADOS DA TIPAGEM SANGUÍNEA


ANTES E APÓS A IMPLANTAÇÃO DA TÉCNICA DE
SEMIAUTOMAÇÃO

Isabella Parussini Liu

Porto Alegre – Brasil


2012
Isabella Parussini Liu

ANÁLISE DE RESULTADOS DA TIPAGEM SANGUÍNEA


ANTES E APÓS A IMPLANTAÇÃO DA TÉCNICA DE
SEMIAUTOMAÇÃO

Trabalho de conclusão de curso de Biomedicina realizado no setor de


imunohematologia do Banco de Sangue do Hospital de Clínicas de Porto
Alegre, sob orientação do professor doutor:

Tor Gunnar Hugo Onsten

Universidade Federal do Rio Grande do Sul


Porto Alegre
2012
DEDICATÓRIA

Aos meus pais, que sempre me apoiaram, me


incentivaram, se preocuparam com o meu
sucesso e me proporcionaram mais que o
necessário para chegar até aqui, muitas vezes
abdicando de outras coisas para si próprios.
AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, professor Tor Gunnar Hugo Onsten, que acreditou


em mim e me abriu as portas do Banco de sangue, investindo nessa nova
experiência. Obrigada pela paciência e pela confiança.

À minha família, principalmente a meus pais e minha avó, pela ajuda,


paciência, compreensão, confiança e dedicação. Certamente, sem o apoio
de vocês nada disso seria possível.

Ao meu namorado, Antônio, que sempre, desde o início me ajudou e se


preocupou com o meu sucesso. Obrigada por estar sempre presente, tanto
nos momentos bons quanto nos ruins.

À equipe do banco de sangue, com quem eu tive a oportunidade de


trabalhar e aprender durante esse semestre, principalmente Isabel, Tauana,
Michelle, Fê, Bruna e Jandira. Obrigada pela paciência, pelos ensinamentos
e pelo ótimo período de convivência. Também agradeço à Ana Paula, que
sempre se mostrou pronta para me ajudar no que eu precisei.

Aos meus amigos, Arthur, Enzo, Rafaela, Elisa e Miriana, pelos


momentos alegres e de descontração que vocês me proporcionam há tanto
tempo e que também foi muito importante durante esse período.
ÍNDICE GERAL

I – INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................8

TIPAGEM SANGUÍNEA .....................................................................................................................8


SISTEMA ABO .............................................................................................................................10
Subgrupos de A ....................................................................................................................12
SISTEMA RH ................................................................................................................................14
Fenótipo D-fraco ...................................................................................................................17
SEMI-AUTOMAÇÃO DO PROCESSO.................................................................................................19
APLICAÇÕES CLÍNICAS .................................................................................................................21

II – ARTIGO CIENTÍFICO .............................................................................................................23

RESUMO .....................................................................................................................................23
ABSTRACT...................................................................................................................................24
INTRODUÇÃO ...............................................................................................................................25
MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................................................26
População de estudo ............................................................................................................26
Tipagem sanguínea semiautomatizada para os sistemas ABO e RhD................................27
Resolvendo discrepâncias ABO ...........................................................................................29
Confirmação ou exclusão do fenótipo D-fraco ......................................................................29
Análise Estatística .................................................................................................................31
RESULTADOS ..............................................................................................................................31
Discrepâncias ABO ...............................................................................................................31
Fenótipo D-fraco e discrepâncias Rh....................................................................................32
Reações que motivaram dúvida conforme a técnica ............................................................33
DISCUSSÃO .................................................................................................................................34
REFERÊNCIAS .............................................................................................................................37

III – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS .....................................................................................38

IV – BIBLIOGRAFIA ADICIONAL ................................................................................................38


Liu, IP; Onsten, TGH. Análise de resultados da tipagem sanguínea antes e
após a implantação da técnica de semiautomação.

A tipagem sanguínea consiste na determinação dos grupos sanguíneos,


que se caracterizam pela presença ou ausência de determinados antígenos na
membrana eritrocitária. As técnicas mais conhecidas de tipagem sanguínea
utilizam lâmina, tubo ou, mais recentemente, microplacas comerciais. Na prática
transfusional, é necessário que haja compatibilidade principalmente no que diz
respeito aos sistemas ABO e RhD, a fim de evitar reações que podem culminar
com a morte do receptor. Sabe-se que resultados duvidosos e inconclusivos
encontrados na determinação de grupos sanguíneos podem estar relacionados
a diferentes fatores, tais como subgrupos de A (principalmente o fenótipo A2) e
o fenótipo D-fraco, ambos causados por alterações nos genes que codificam
esses antígenos, levando a alterações na expressão dos mesmos. A técnica de
semiautomação implantada no Banco de Sangue do Hospital de Clínicas de
Porto Alegre (HCPA) utiliza microplacas e equipamentos semiautomáticos
interligados, capazes de conferir maior segurança e padronização ao processo
de tipagem. Nesse contexto, os principais objetivos do trabalho foram analisar
a técnica de semiautomação do Banco de Sangue do HCPA em relação à
ocorrência de resultados duvidosos ou inconclusivos associados aos sistemas
ABO e Rh, e à ocorrência de fenótipos variantes, como D-fraco e A2,
associados a esses resultados. Ainda, faremos uma análise comparativa dos
mesmos aspectos com a técnica manual anterior. Para tanto, todas as amostras
provenientes dos doadores de sangue e plaquetas do Banco de Sangue do
HCPA, durante um período de seis meses, foram submetidas ao processo de
tipagem sanguínea semiautomatizada em microplacas para os sistemas ABO e
RhD. Foram analisadas todas as amostras que apresentaram resultado
discrepante associado a um ou ambos sistemas sanguíneos. O mesmo foi
realizado para as amostras tipadas durante os seis meses imediatamente
anteriores à implantação da semiautomação. Para resolver os casos de
discrepância no sistema ABO (ocorrido na microplaca ou na lâmina), nos quais
as provas direta e reversa eram discordantes, foi utilizada a técnica em tubo.
Em todas as amostras RhD negativas eram realizadas a pesquisa do fenótipo
D-fraco em cartões gel-teste, para esclarecer se essa amostra era de fato
negativa ou apenas fracamente positiva. Para resolver as amostras
discrepantes, nas quais a tipagem RhD resulta negativa (em microplaca ou em
tubo), mas no gel-teste resulta fracamente positiva, foi utilizada outra técnica
em cartão gel-teste para confirmação. No total, encontrou-se uma taxa de
discrepância ABO de 0,25%. Observou-se um aumento na ocorrência de
discrepância ABO na técnica de semiautomação (TSA) em comparação à
técnica manual (TM) (p<0.0005). Desses casos, 15% apresentaram fenótipo
A2. A principal reação que motivou dúvida na microplaca foi a reversa de A. As
situações discrepantes relacionadas ao sistema Rh, totalizaram 0,18%. Não
houve diferença significativa na ocorrência desses casos entre TM e TSA
(p=1.0). Observou-se um aumento na ocorrência do fenótipo D-fraco pela TSA
em comparação à TM (p<0.0005). Concluímos que a semiautomação, apesar
de apresentar maior número de discrepâncias, apresenta consideráveis
vantagens, como a possibilidade do interfaceamento. O aumento nas
discrepâncias ABO encontradas pela TSA, provavelmente, não levaria ao
aumento de tipagens errôneas, não tendo grande impacto no resultado final.
Ainda, observamos que, pela TSA, um maior número de doadores foi
classificado como D-fraco, comparado à TM.
8

I – INTRODUÇÃO

Tipagem sanguínea

Os grupos sanguíneos são caracterizados pela presença ou ausência de


antígenos na membrana eritrocitária os quais possuem características
polimórficas bem definidas por componentes da membrana. Os antígenos
eritrocitários são herdados geneticamente e são definidos por proteínas com
sequências de aminoácidos específicas ou por carboidratos ligados a essas
proteínas ou lipídios. Pacientes que recebem transfusão de sangue e
componentes sanguíneos podem desenvolver anticorpos dirigidos contra
inúmeros antígenos eritrocitários e o desenvolvimento desses anticorpos
eritrocitários está relacionado com a imunogenicidade antigênica, situações
clínicas especiais e com a incidência dos antígenos na membrana da hemácia.
Na prática transfusional, a compatibilidade para o sistema ABO e para o
antígeno D do sistema Rh é fundamental na prevenção de reações hemolíticas,
embora a compatibilização de outros antígenos, especialmente C, c, E, e do
sistema Rh, assim como os principais antígenos dos sistemas Kell, Kidd, Duffy
e MNS também seja desejável(1). Atualmente, já foram descritos 30 desses
sistemas(2).

O sistema ABO, foi o primeiro a ser descoberto, em 1900, e continua


sendo o mais importante de todos os grupos sanguíneos na prática
transfusional, pois uma transfusão de sangue realizada com incompatibilidade
maior ABO pode resultar na morte do paciente(3). A tipagem Rh D é igualmente
obrigatória. O antígeno RhD é considerado o mais imunogênico do sistema
seguido dos antígenos c, E, C, e. A probabilidade de imunização por RhD é
muito mais alta quando comparada com outros antígenos de grupos
sanguíneos humanos que ocasionalmente produzem anticorpos irregulares,
tornando esse sistema de grande importância clínica(4).
9

A tipagem sanguínea é realizada como procedimento de rotina em


serviços de hemoterapia, bem como outros exames imunohematológicos para a
qualificação do sangue do doador, a fim de garantir a eficácia terapêutica e a
segurança de uma futura doação. A determinação do grupo sanguíneo ABO era
originalmente realizada em lâminas limpas de microscopia. Atualmente, as
provas de aglutinação são realizadas através da utilização de métodos mais
precisos, podendo ser utilizados os métodos em microplacas escavadas, tubos
de ensaio, ou gel-centrifugação, mais recentes. O mesmo se aplica ao fator Rh,
cuja determinação é realizada em microplacas escavadas ou centrifugação em
tubos de ensaio(5).

Cada técnica apresenta suas vantagens e desvantagens, sendo,


portanto, mais indicadas em diferentes situações. A técnica de tipagem
sanguínea em lâmina de microscopia, por exemplo, é a menos vantajosa,
sendo menos sensível que aquela realizada em tubo de ensaio, apresentando
maior quantidade de resultados falso positivos em virtude da rapidez com que a
mistura de reação seca favorecendo a agregação das células. Além disso, as
reações são mais fracas e apresentam maior dificuldade na interpretação. Essa
técnica não é recomendada para utilização rotineira, mas pode ser utilizada em
tipagens ABO de emergência, sempre devendo ser suplementada por alguma
das outras técnicas citadas. A técnica em tubo apresenta mais vantagens e é
mais sensível que a técnica em lâmina para tipagem do sistema ABO. Alguma
de suas vantagens incluem a possibilidade de incubação por tempo
relativamente longo, sem secagem do conteúdo dos tubos, simplicidade de
leitura e classificação dos resultados, além de ser mais limpa e higiênica(6).

A interpretação da hemaglutinação incompleta, que ocasionalmente pode


vir a acontecer, pode variar entre laboratórios e mesmo entre indivíduos no
mesmo laboratório. Existem muitos reagentes para tipagem sanguínea, e a
disponibilidade está mudando continuamente, com tendência a substituição dos
tradicionais reagentes policlonais pelos mono ou oligoclonais(7).
10

Sistema ABO

Descoberto pelo cientista austríaco Karl Landsteiner no ano de 1900, o


sistema ABO foi o primeiro sistema sanguíneo a ser descrito, rendendo, ao seu
descobridor, o prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1930. Em 1909,
Landsteiner classificou amostras de sangue de seres humanos nos conhecidos
grupos A, B, AB e O e demonstrou que transfusões entre indivíduos dos grupos
A ou B não resultariam em destruição de células sanguíneas novas, e que esta
fatalidade ocorre apenas quando um indivíduo é transfundido com sangue
pertencente a um grupo diferente(8).

O sistema ABO é o mais importante grupo sanguíneo na medicina


transfusional. O gene ABO codifica as glicosiltransferases responsáveis pela
transferência de resíduos específicos de açúcar ao substrato H e os convertem
ao antígeno A ou B respectivamente(9). O também chamado “antígeno H” é a
base para a manifestação de todos os antígenos do sistema ABO. Estudos
anteriores demonstraram que a inabilidade do gene O em codificar as
transferases A ou B é devido a uma diferença estrutural em relação aos
nucleotídeos e não à falha da expressão das transferases A ou B. Nos testes
sorológicos de rotina, o grupo sanguíneo O é caracterizado por não apresentar
os antígenos A e B na membrana das hemácias; assim, os seus eritrócitos não
aglutinam na presença dos soros anti-A, anti-B e anti-AB.(9)

Para que um indivíduo seja classificado em grupo sanguíneo A ou B


normal, é necessário que praticamente todos os seus eritrócitos sofram
aglutinação quando misturados, sob condições adequadas, com anticorpos anti-
A ou anti-B. Para tanto, é necessário ao menos um alelo ABO funcional, ou
seja, o processo de formação dos antígenos A ou B deve ocorrer corretamente
desde o processo de transcrição e tradução até sua localização intracelular e
atividade enzimática adequadas. Depois de prontos, os antígenos A ou B
devem ser incorporados na membrana das células precursoras de eritrócitos. A
11

distribuição dos antígenos sobre a superfície celular deve estar de acordo, para
permitir a hemaglutinação. Qualquer defeito neste complexo processo pode
levar a fenômenos sorológicos anormais, dando origem aos subgrupos de A e
B(7).

Sabe-se que os indivíduos possuem anticorpos de ocorrência natural


contra o antígeno ABO que encontra-se ausente na superfície de suas
hemácias, apesar da existência de evidências sugerindo que a produção de
anti-A e anti-B seja estimulada por substâncias presentes na natureza. Algumas
bactérias mostram-se quimicamente similares aos antígenos ABO e podem
atuar como fonte de estímulo para formação de anticorpos, a qual inicia ao
nascimento(3).

Os antígenos ABO não estão restritos à membrana dos eritrócitos.


Também podem ser encontrados em diversas outras células como linfócitos,
plaquetas, endotélio capilar, células sinusoidais do baço, medula óssea,
mucosa gástrica, além de secreções e outros fluidos corporais como saliva,
urina e leite (9).

A determinação do grupo sanguíneo ABO é realizada de maneira direta e


reversa. A tipagem ABO direta é realizada em amostras de sangue, testando-se
as hemácias com anticorpos anti-A, anti-B e anti-AB (exceto quando são
utilizados anticorpos monoclonais, situação em que a aplicação de anti-AB
deixa de ser obrigatória). A tipagem reversa sempre deve ser obrigatoriamente
realizada, testando-se o soro ou plasma da amostra com suspensões de
hemácias conhecidas A1 e B e, opcionalmente, A2 e O. É necessário ficar
atento a qualquer discrepância observada entre as tipagens direta e reversa,
não rotulando ou liberando o hemocomponente até que a discrepância tenha
sido resolvida. Vários estados patológicos podem causar discrepâncias entre a
classificação direta e reversa. Recomenda-se que seja realizada a investigação
de subgrupos de A quando houver resultados discrepantes entre as provas
12

ABO direta e reversa ou na busca de concentrado de hemácias de subgrupo A2


para pacientes que apresentam anticorpo anti-A1 clinicamente significante(10).

Dependendo da tipagem sanguínea de um indivíduo, a IgM anti-A e/ou


anti-B presentes no soro podem constituir uma barreira para as transfusões
sanguíneas e para o transplante de órgãos ABO incompatíveis (9). A freqüência
dos antígenos ABO varia em diferentes populações.

Subgrupos de A

Como dito anteriormente, polimorfismos nos genes que codificam o


sistema sanguíneo ABO podem levar a quantidades diminutas de antígenos A
ou B em células sanguíneas vermelhas, dando origem aos subgrupos no
sistema. A ocorrência de variantes devido à heterogeneidade dos alelos A e B
representa um desafio para a prática imunohematológica. A1 e A2 são os
principais subgrupos do grupo sanguíneo A e eles diferem um do outro, tanto
qualitativa como quantitativamente. Subgrupos de A podem resultar em
discrepâncias na tipagem sanguínea ABO(11).

Diferentes níveis de expressão de antígenos A ou B nos eritrócitos


podem ser encontrados, sendo chamados de subgrupos de A ou B, conforme a
intensidade de aglutinação dos eritrócitos com os reagentes anti-A, anti-B, anti-
AB, anti-A1 e anti-H. A reatividade do reagente anti-H com as hemácias dos
diferentes grupos sanguíneos ABO tende a ser: O>A2>B>A2B>A1>A1B(9).

O fenótipo A2, comum em caucasianos, é detectado, sorologicamente,


por meio da capacidade desses eritrócitos aglutinarem na presença de soro
anti-A e de não aglutinarem com o soro lectina anti-A1, diferentemente do
fenótipo A1 cujas hemácias são aglutinadas na presença desse reagente. O
alelo A2 (A201) é caracterizado pela substituição de uma única base e uma
deleção(9). Hoje em dia, se reconhece que o fenótipo A1 tem uma base
13

genética com o fenótipo A2 sendo definida por uma transferase de A2 que é


relativamente ineficiente em relação à transferase de A1(12). Estudos
anteriores demonstram que os fenótipos A2 e A1 apresentam diferenças
sorológicas (reação com lectinas anti-A1 e anti-H), químicas (um glicolípido A
ativo em células A1 está ausente em células A2) e enzimáticas (diferentes pH
ótimos e Km)(7).

Os dois principais alelos de A, A1 e A2 são diferenciados


sorologicamente de acordo com a reatividade das células com a lectina de
sementes de Dolichos biflorus. A lectina de D. biflorus reage especificamente
com células do subgrupo A1; logo, aglutina hemácias A1, mas não A2(11). O
termo lectina se refere a uma classe de proteínas de origem não-imunológica,
que podem aglutinar hemácias graças à sua propriedade de se ligar
reversivelmente a carboidratos. O anticorpo anti-A1 aparece como uma
aglutinina fria atípica no soro de indivíduos A2 ou A2B, que não têm o antígeno
correspondente.

Subgrupos fracos de A podem ser definidos como eritrócitos do grupo A


que reagem mais fracamente ou não reagem sorologicamente com anti-A
comparados aos indivíduos com hemácias A2. Na maioria dos casos, os
subgrupos de A resultam da expressão de um alelo alternativo fraco nos loci
ABO(11).

A prevalência de subgrupos de A varia de acordo com o lugar e com a


raça. As freqüências observadas de A1 e A2 são geralmente compatíveis com o
equilíbrio de Hardy-Weinberg para a herança mendeliana dos genes alélicos A1
e A2. No entanto, em algumas populações, tais como negros e japoneses, a
frequência do fenótipo A2B é significativamente mais elevada do que a
frequência esperada com base na frequência do fenótipo A2(11).
14

Apesar de os fenótipos A1 e A2 serem os mais conhecidos, existem


outros fenótipos de A que não são tão conhecidos, tais como o alelo A3 (A301),
que apresenta alto grau de heterogeneidade e ao qual diversas mutações já
foram associadas, ou o alelo Ax (A108), que possui uma única mutação
resultando na substituição de um aminoácido. Vários estudos sobre outros
subgrupos de A têm sido realizados, entretanto, devido às suas diferenças
morfológicas, a base genética destes permanece desconhecida(9)(9)(8).

Apesar da existência de subgrupos de B, estes configuram casos muito


mais raros, de maneira que, no presente trabalho, serão abordados apenas os
subgrupos de A. Os subgrupos de B são caracterizados por fraca aglutinação
dos eritrócitos com o soro anti-B e/ou anti-AB. Diferentemente dos subgrupos
de A, a classificação dos subgrupos de B é ainda controversa.

Apesar de os anticorpos monoclonais anti-A e/ou anti-B reconhecerem e


aglutinarem a maioria dos subgrupos ABO, a determinação daqueles que
apresentam baixíssima expressão de antígenos é laboratorialmente trabalhosa.
Nesses casos, a genotipagem ABO pode ser um complemento valioso à
determinação correta do tipo sanguíneo do doador e do receptor (9).

Sistema Rh

O sistema sangüíneo Rh foi inicialmente descoberto ao estimular uma


reação transfusional, que foi investigada por Levine e Stetson, em 1939, um
ano antes de Landsteiner e Wiener descreverem um anticorpo obtido por meio
da imunização de cobaias com hemácias de macacos rhesus. Este soro, recém
descoberto, aglutinava cerca de 85% das hemácias humanas testadas e o
determinante correspondente foi denominado fator Rh. As reações observadas
por Levine eram semelhantes ao soro de animal anti-Rhesus, estimuladas em
animais, relatadas por Landsteiner em 1940. Alguns anos mais tarde, concluiu-
se que o anti-Rh do ser humano e do animal não reagiam com o mesmo
15

antígeno e, portanto, não se tratavam do mesmo anticorpo, porém a


nomenclatura Rh foi mantida(13, 14).

O Sistema Rh é altamente polimórfico e, atualmente, sabe-se que é


constituído por mais de 49 antígenos, sendo o antígeno RhD, juntamente com
outros quatro antígenos principais desse sistema, os responsáveis por 99% dos
problemas clínicos associados ao sistema Rh(13). Estes outros antígenos
principais compreendem dois pares de antígenos antitéticos: C/c e E/e(15)
(Figura 1). O antígeno RhD, por ser o antígeno eritrocitário não-ABO mais
significativo clinicamente, vem sendo implicado amplamente na etiologia de
reações transfusionais hemolíticas, e, portanto, é considerado altamente
imunogênico. Os antígenos C e e são menos imunogênico que E e c.

Figura 1: Proteína Rh. Composta por 417 aminoácidos, apresenta 12 segmentos


transmembrana, 6 alças extracelulares e 5 alças intracelulares. Ambos segmentos carboxil e
amino-terminal estão localizados intracelularmente. Os círculos pretos indicam as posições de
aminoácidos que diferem entre RhD e RhCE, enquanto os círculos brancos representam os
aminoácidos críticos para a expressão de antígenos C/c ou E/e. Adaptada de: The Blood Group
Antigen Factsbook. 2 ed: Academic Press; 2004

O antígeno RhD é composto por 37 epítopos, formando um mosaico.


Dessa maneira, qualquer alteração de aminoácidos dessa proteína pode afetar
a expressão dos epítopos originais ou resultar na expressão de novos epítopos,
16

levando a variações na expressão dos antígenos RhD na membrana


eritrocitária. As hemácias com fenótipo RhD fraco apresentam uma diferença
quantitativa em relação às células RhD positivas normais, uma vez que
apresentam todos os epítopos RhD, porém com uma redução dos níveis de
antígeno na membrana da hemácia. Estima-se que a freqüência de RhD fraco
na população seja inferior a 1%(15, 16). As hemácias RhD parcial apresentam
uma diferença qualitativa frente às células RhD positivas normais, pois carecem
de um ou mais epítopos que formam o antígeno RhD. Portanto, indivíduos
portadores do fenótipo RhD-positivo podem ser classificados, do ponto de vista
molecular, em três grupos: RhD-positivo, RhD fraco e RhD parcial. Geralmente,
os fenótipos RhD parcial são expressos devido à presença de genes híbridos,
os quais predominam em indivíduos de origem africana(4).

A distinção entre os fenótipos D-fraco e D-parcial é de importância


clínica, pois o último é capaz de produzir anti-D(17). Desde então, diferenças
entre a reatividade de vários reagentes, especialmente na detecção de RhD
fraco e RhD parcial, têm criado uma discussão sobre o teste adequado para
doadores de sangue, pacientes e receptores. A ocorrência de RhD parcial é
rara na população em geral, e sua identificação é possível através do uso de
soros monoclonais específicos ou técnicas de biologia molecular(4).
Sorologicamente, o fenótipo RhD parcial pode comportar-se tanto como RhD
fraco quanto como RhD-positivo, o que implica, preferencialmente, o uso de
métodos moleculares para seu diagnóstico definitivo(18).

Tempos atrás, os reagentes utilizados na detecção do antígeno RhD


eram elaborados a partir de anticorpos produzidos por mulheres sensibilizadas
por RhD ou voluntários hiperimunizados. Esses anticorpos, denominados
policlonais, eram efetivos, pois reconheciam inúmeros epítopos RhD, uma vez
que eram produzidos através de um pool de soros humanos(4).
17

Atualmente, antissoros monoclonais anti-D IgG e IgM têm sido


amplamente produzidos para substituir os policlonais na determinação do
antígeno RhD. Vários indivíduos classificados como RhD fraco têm sido
reclassificados, por apresentarem forte aglutinação com os atuais reagentes
anti-D monoclonais(19). Estudos têm demonstrado que a reatividade dos
reagentes anti-D monoclonais dependem da concentração e da avidez do
anticorpo.

O antígeno RhD é determinado através da adição do antissoro anti-RhD


às hemácias. Em paralelo, realiza-se um controle negativo, através da utilização
de um soro controle compatível com o antissoro utilizado. Nos casos em que,
eventualmente, a reação for negativa para a presença do antígeno RhD, deve
ser efetuada a pesquisa do antígeno D–fraco(10). Os anticorpos dirigidos contra
os antígenos do sistema Rh geralmente são da classe IgG, raramente fixam o
complemento, e reagem otimamente a 37ºC(15).

Fenótipo D-fraco

As hemácias com fenótipo RhD fraco, descritas por Stratton (1946),


diferem quantitativamente das células RhD positivas normais, por serem
definidas historicamente como tendo todos os epítopos RhD presentes, mas
com uma redução dos níveis de antígeno RhD, portanto são detectados apenas
por alguns anticorpos anti-D mais potentes(4).

A nível molecular, as variantes do fenótipo RhD fraco são resultado de


substituições de aminoácidos localizados nos segmentos transmembrana e
intracelulares da proteína RhD (19) (Figura 2). Como essas alterações ocorrem
nas regiões intracelular ou transmembrana, e não na superfície externa da
hemácia, todos os epítopos RhD extracelulares estão presentes. O que
acontece, é que a eficiência de inserção é afetada primariamente e,
18

consequentemente, a quantidade do antígeno RhD na membrana, refletindo a


redução do número de sítios antigênicos nessas hemácias. Os RhD fraco mais
comuns são: tipo 1, associado com o haplótipo cDfracoe; tipo 2, associado com
o haplótipo cDfracoE; tipo 3, também associado com o haplótipo cDfracoE.
Indivíduos pertencentes aos fenótipos RhD fraco não produzem aloanticorpo
anti-D, mas podem possuir auto-anticorpo anti-D(4).

Figura 2: Os aminoácidos representados pelos círculos pretos indicam as


substituições na proteína RhD, que ocorrem nas regiões transmembrana e
intracelulares, originando os diferentes tipo de fenótipo RhD fraco. Modificada de:
The Blood Group Antigen Factsbook. 2 ed: Academic Press; 2004

No Brasil, de acordo com a RDC nº 57, de 16 de dezembro de 2010, é


necessário se testar as amostras até a fase de AGH, classificando os pacientes
como RhD positivo de baixa expressão, caso a mesma seja positiva, a fim de se
manter as reservas de sangue RhD negativo. Porém, tem sido constantemente
observado que, no teste da AGH, vários reagentes anti-D não detectam todos
os tipos de RhD fraco, o que tem colaborado para um aumento no número de
casos de discrepâncias(19).
19

O significado clínico do antígeno RhD fraco é que, caso essas hemácias


sejam transfundidas em indivíduos RhD negativo, poderão induzir a uma
aloimunização, ou seja, formação de anticorpos frente a exposição do indivíduo
a antígenos não próprios. Alguns autores defendem que indivíduos RhD fraco,
especialmente mulheres em idade gestacional poderiam ser tratadas como RhD
positivo quando forem doadoras e RhD negativo quando forem receptoras(20).

Semiautomação do processo

Introduzida há mais de 50 anos, a técnica de automação mais


aperfeiçoada assume importante papel no diagnóstico de fenótipos
variantes(18). É o caso da tecnologia da microplaca, que vem ganhando
popularidade devido ao crescente volume de trabalho nos bancos de sangue e
disponibilidade recente de sistema automatizado. Nessa técnica são utilizados
pequenos volumes e baixa concentração de soro e hemácias, ao mesmo tempo
em que há aumento da quantidade de amostras testadas, garantindo maior
custo-benefício.

Há possibilidade de associar a técnica a hardwares de microplacas


podendo reduzir ainda mais o tempo de operação. A técnica pode, ainda, ser
automatizada através da captura online de dados, que podem promover
redução dos erros de leitura e transcrição, economia de tempo, utilização de
códigos de barras para amostras e identificação de microplacas e integração
em sistema de computador para armazenamento de dados(6). Tanto a
microplaca quanto o gel-teste apresentam a vantagem da automação,
proporcionando otimização da rotina e maior segurança no processo.

O uso de sistemas totalmente automatizados é bastante eficiente na


tentativa de atingir dois objetivos principais no campo da imunohematologia.
São eles: 1) a redução dos riscos transfusionais relacionados a erros humanos
20

por proporcionar a automação das etapas-chave da rotina (identificação de


amostras e reagentes, realizar e interpretar resultados) e 2) garantir a
rastreabilidade de todos os elementos envolvidos no processo analítico, que é
arquivado e permanece acessível após a realização do teste(21).

Os sistemas mais utilizados são baseados na utilização de:


- Microcolunas, que permitem que os resultados sejam vistos após a passagem
das hemácias por uma matriz contendo os reagentes.
- Microplacas de poliestireno cujos poços são pré-revestidos com hemácias ou
plaquetas liofilizadas, ou anticorpos anti-eritrócitos/anti-plaquetas(21).

Em alguns sistemas semi-automatizados, a leitura dos microtubos se dá


através de câmeras (janelas e divisões), ficando a interpretação dos resultados
de cada microtubo a cargo do gerenciador do sistema a partir da análise da
imagem. Os resultados das reações podem ser positivos (1+, 2+, 3+ ou 4+) ou
negativos. Essa interpretação dos resultados de cada microtubo fornecida pelo
equipamento deve ser validada pelo operador por meio da verificação das
imagens captadas. Se houver necessidade, em casos de discordância, o
resultado pode ser alterado manualmente. Da mesma maneira, a interpretação
global do teste também é definida pelo operador, conforme as especificidades
de cada teste(22).

As vantagens apresentadas por essa técnica são: interface amigável,


rastreabilidade, agilidade, possibilidade de importar e exportar dados de e para
outros sistemas, e conexão em rede(22). A rastreabilidade, a leitura
padronizada e o software para o cadastro e registro de resultados, fornecem
maior segurança à rotina da imunohematologia.
21

Aplicações Clínicas

Casos de incompatibilidade ABO representam cerca de 37% dos


comunicados de mortes associadas a transfusão nos EUA. Desses casos,
cerca de 50% são decorrentes de erros humanos. Os erros podem ocorrer em
qualquer etapa do processo, incluindo a identificação do paciente, a coleta e a
rotulagem da amostra, a prova cruzada ou os testes pré-transfusionais de
cabeceira(23, 24). Um estudo realizado em 2007, em São Paulo, revelou que
ocorrência de incompatibilidade materno-fetal foi de 18,4% para o sistema ABO
e de 7% para o RhD(25).

As complicações mais temidas durante uma transfusão sanguínea são as


reações hemolíticas transfusionais, que podem ser fatais e correspondem à
principal causa de morte imediata relacionada à transfusão de hemoderivados.
As reações mais graves envolvem, obviamente, incompatibilidade ABO, onde a
existência prévia de anticorpos circulantes pode levar à ativação do sistema
complemento e consequente hemólise intravascular das hemácias
transfundidas(24). As reações transfusionais hemolíticas agudas
intravasculares estão sistematicamente entre as principais causas de
morbidade e mortalidade relacionadas a transfusão, prova disso é que, de 97
mortes relacionadas a transfusão notificadas à FDA nos anos de 2005 e 2006, 9
foram devido à incompatibilidade ABO(26).

De acordo com McIvor et al., uma das principais causas de


incompatibilidade ABO em transfusões é o fenômeno "wrong blood in tube"
(WBIT), em que a amostra presente no tubo não é do indivíduo identificado na
etiqueta. As transfusões com incompatibilidade ABO são evitáveis, uma vez que
resultam tipicamente de erros na identificação do paciente no momento de
coleta ou administração de sangue. O New York State Department of Health
atribuiu aproximadamente dois terços desses erros a fatores externos ao banco
22

de sangue, tais como: administração ao paciente errado e erros de flebotomia.


Erros de identificação do paciente, no momento da coleta pode levar a dois
tipos de erros que resultam em "WBIT": erro de identificação do paciente ou
rotulagem errônea da amostra(26).

O sistema Rh também apresenta um grande interesse clínico, uma vez


que seus anticorpos encontram-se envolvidos na destruição eritrocitária
imunomediada. Como a imunização pode ocorrer em receptores RhD
negativos, o antígeno RhD é de importância crítica para a transfusão
sanguínea(20), pois tem um papel importante na destruição imune das
hemácias em transfusões alogênicas, na doença hemolítica perinatal (DHPN),
nas anemias hemolíticas auto-imunes e em transplantes de órgãos(4, 13).

A probabilidade de imunização por RhD é muito mais alta quando


comparada com outros antígenos de grupos sanguíneos humanos que
ocasionalmente produzem anticorpos irregulares, tornando esse sistema de
grande importância clínica, principalmente porque o antígeno D é considerado o
mais imunogênico do sistema Rh(4). Quase todos os anticorpos do sistema Rh
resultam de aloimunização por transfusão ou gestação(15).

Somente durante o século XX a metodologia de hemaglutinação em tubo


possibilitou o desenvolvimento e a prática da medicina transfusional. Entretanto,
em 2007, a incompatibilidade ABO era responsável por mais óbitos que todos
os vírus transmitidos por transfusão sanguínea(27). Para evitar a ocorrência de
fatalidades associadas a transfusões sanguíneas devido à incompatibilidade
ABO, é necessário estar atento aos casos discrepantes durante a tipagem
sanguínea, não liberando resultados duvidosos. Para tanto, é preciso ter acesso
a informações importantes do paciente, como sua história clínica, idade e
diagnóstico, relato de transfusão e/ou gestação anteriores, medicações em uso
através da consulta ao dossiê do paciente/doador(28).
23

II – ARTIGO

Análise de resultados da tipagem sanguínea antes e após a


implantação da técnica de semiautomação.

Analysis of results of blood typing before and after the implantation of the
semiatuomated technique.

Banco de Sangue do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (setor de


imunohematologia) – Serviço de Hemoterapia - Porto Alegre, RS.

1 2 3
Isabella Parussini Liu , Isabel Cristina Freitas , Jandira Alves Mesko , Leda Maria Teixeira de
4 5
Campos , Tor Gunnar Hugo Onsten

1
Aluna graduação Biomedicina, UFRGS. Estágio em pesquisa Banco de Sangue Hospital de
Clínicas de Porto Alegre – Porto Alegre, RS.
2
Bióloga. Setor de Imunohematologia - Banco de Sangue Hospital de Clínicas de Porto Alegre
– Porto Alegre, RS.
3
Técnica de laboratório. Setor de Imunohematologia - Banco de Sangue Hospital de Clínicas de
Porto Alegre – Porto Alegre, RS.
4
Médica hemoterapeuta. Coordenadora do Setor de Imunohematologia Transfusional do
Serviço de Hemoterapia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – Porto Alegre, RS.
5
Médico hematologista. Chefe do serviço de hemoterapia do Hospital de Clínicas de Porto
Alegre – Porto Alegre, RS.

Correspondência: Tor Gunnar Hugo Onsten


Chefia do serviço de hemoterapia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – Porto Alegre, RS.
Rua São Manoel 543, 2º andar - Rio Branco
90620-110 – Porto Alegre-RS - Brasil
Tel.: (55 51) 3359.8322
E-mail: [email protected]
24

Resumo: A tipagem sanguínea consiste na determinação dos grupos


sanguíneos, caracterizados pela presença ou ausência de antígenos na
membrana eritrocitária, sendo o principal, o sistema ABO. Fatores como
subgrupos de A (principalmente A2) e o fenótipo D-fraco podem estar
associados a resultados discrepantes. Os objetivos do trabalho foram analisar a
técnica de semiautomação para a tipagem sanguínea do Banco de Sangue do
HCPA, em relação à ocorrência de resultados duvidosos ou inconclusivos e de
fenótipos variantes como D-fraco e A2, e fazer uma análise comparativa dos
mesmos aspectos com a técnica manual anteriormente usada. Para tanto, as
amostras dos doadores de sangue e plaquetas do Banco de Sangue do HCPA
durante seis meses foram tipadas pela técnica semiautomatizada em
microplacas para os sistemas ABO e RhD, sendo analisadas todas as amostras
que apresentaram discrepância associada a um ou ambos sistemas
sanguíneos. Encontrou-se uma taxa de discrepância ABO de 0,25%. Observou-
se aumento nos casos de discrepâncias ABO na técnica de semiautomação
(TSA) em comparação à técnica manual (TM) (p<0.0005). Desses casos, 15%
apresentaram fenótipo A2. A taxa de discrepância Rh foi de 0,18%. Não houve
diferença significativa na detecção desses casos entre TM e TSA (p=1.0). Mais
indivíduos foram classificados como fenótipo D-fraco pela TSA em comparação
à TM (p<0.0005). Concluímos que a semiautomação apresenta consideráveis
vantagens, como a possibilidade do interfaceamento. Apesar de apresentar
maior número de resultados discrepantes, esses provavelmente não teriam
grande impacto no resultado final.

Palavras-chave: Tipagem sanguínea, métodos, tubo, semiautomação.

Abstract Blood typing consists on the determination of blood groups, which are
characterized by the presence or absence of antigens in the plasma membrane.
Factors such as A subgroups (especially A2) and weak-D phenotype may be
associated with discrepant results. The objectives of this study were to analyze
the semiautomated technique (SAT) of blood typing on the Hospital de Clínicas
25

de Porto Alegre's Blood Bank for the occurrence of equivocal or incloncusive


results and variant phenotypes such as weak-D and A2 and to make a
comparactive analysis of these aspects with the previous technique. For this
purpose, samples of blood and platetet donors of the HCPA's blood bank over a
six-month period were typed by the SAT in microplates for ABO and RhD
systems and all samples that had a discrepancy associated with one or both
blood systems were analyzed. It was found a discrepancy rate on the ABO
system of 0.25%. It was observed an increase in cases of ABO discrepancies
using SAT compared to the manual technique (MT) (p<0.0005). A total of 15%
of these cases were A2 phenotype. The Rh discrepancy rate was 0.18%. There
was no significant difference on the detection of these cases between MT and
SAT. There was more individuals who were classified as weak-D phenotype by
the SAT compared to MT (p<0.0005).We conclude that SAT has considerable
advantages, such as the possibility of interfacing. Although a higher number of
discrepant results, these probably wouldn't have a great impact on the final
result.

Key words: Blood grouping, methods, tube, semiautomation.

Introdução

A tipagem sanguínea é realizada como procedimento de rotina em


serviços de hemoterapia para a qualificação do sangue do doador, a fim de
garantir a eficácia terapêutica e a segurança de uma futura doação(1). O
sistema ABO, foi o primeiro a ser descoberto, em meados de 1900, e continua
sendo o mais importante de todos os grupos sanguíneos na prática
transfusional (2), pois uma transfusão de sangue realizada com
incompatibilidade maior ABO pode resultar na morte do paciente (3). O sistema
Rh é altamente polimórfico e sabe-se que é constituído por mais de 49
antígenos(4), sendo o antígeno RhD, juntamente com outros quatro antígenos
26

principais desse sistema, os responsáveis por 99% dos problemas clínicos


associados ao sistema Rh(5).

Introduzida há mais de 50 anos, a técnica de automação mais


aperfeiçoada assume importante papel no diagnóstico de fenótipos variantes(6).
É o caso da tecnologia da microplaca, que vem ganhando popularidade devido
ao crescente volume de trabalho nos bancos de sangue. Nessa técnica são
utilizados pequenos volumes e baixa concentração de soro e hemácias, ao
mesmo tempo em que há aumento da quantidade de amostras testadas,
garantindo maior custo-benefício. Fenótipos variantes relacionados ao sistema
Rh, como D-fraco, e ao sistema ABO, como subgrupo A2, por exemplo, podem
estar envolvidos nos casos discrepantes e duvidosos resultantes da tipagem
sanguínea, sendo necessários ensaios confirmatórios a fim de esclarecer o
grupo sanguíneo ao qual o doador pertence. Esse procedimento visa reduzir a
chance de complicações posteriores para o futuro receptor de sangue.

Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivos analisar a


técnica de semiautomação que está sendo implantada no Banco de Sangue do
Hospital de Clínicas de Porto Alegre em relação à detecção de resultados
duvidosos e inconclusivos associados aos sistemas ABO e Rh, e à detecção de
fenótipos variantes, principalmente D-fraco. Ainda, faremos uma análise
comparativa dos mesmos aspectos com a técnica manual anteriormente
utilizada.

Casuística e métodos/Material e Métodos:

População de estudo

Todas as amostras provenientes dos doadores de sangue e plaquetas do


Banco de Sangue do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (n = 7363) no período
de seis meses (Novembro de 2011 a Abril de 2012) foram submetidas ao
27

processo de tipagem sanguínea semiautomatizada em microplacas para os


sistemas ABO e RhD. Também foram coletados os resultados das amostras
submetidas ao processo de tipagem sanguínea manual em lâmina (n=7677)
para os sistemas ABO e RhD durante os seis meses (Maio a Outubro de 2011)
imediatamente anteriores à implantação da técnica semiautomatizada. Foram
analisadas todas as amostras, de ambos períodos, que apresentaram resultado
discrepante associado a um ou ambos sistemas sanguíneos. Os doadores do
Banco de Sangue do HCPA geralmente compreendem indivíduos saudáveis
com idade entre 18 e 65 anos, de ambos sexos. Entretanto, amostras de
sangue de pacientes do HCPA que receberam autodoação (stem cell)
eventualmente também são encaminhadas ao laboratório para serem tipadas
utilizando a mesma técnica, e, portanto, existem indivíduos fora da faixa etária
estabelecida para os doadores em geral na população em estudo.

Tipagem sanguínea semiautomatizada para os sistemas ABO e RhD

A técnica é realizada no módulo Swing Twin Sampler (DiaMed Micro


Typing System), o qual é responsável pela pipetagem das amostras na
microplaca, identificação automática através da leitura dos códigos de barras
dos tubos de amostras, dos frascos de reagentes de hemácias-teste e diluentes
e da microplaca. As microplacas (DiaMed-MP Teste) com anticorpos
monoclonais dessecados e um controle negativo (RhD) vêm prontas para uso e
são utilizadas para a determinação dos grupos sanguíneos ABO e RhD (Figura
1). Para maior segurança, cada microplaca também é identificada com um
código de barras. A configuração das microplacas permite 12 determinações de
grupos sanguíneos, por placa, incluindo prova direta e reversa. São necessários
outros reativos adicionais, como as hemácias-teste para prova reversa (DiaCell-
MP ABO) e solução de bromelina (ID-Diluent 1), cujos frascos são dispostos
nos locais apropriados do equipamento. Após a pipetagem automática e um
período de incubação de 10 minutos, a microplaca passa para o módulo Lyra
28

MP-reader (DiaMed Micro Typing System), responsável pela centrifugação,


agitação, leitura e interpretação das reações de aglutinação da microplaca.

Figura 1: Microplaca utilizada para determinação dos


sistemas sanguíneos ABO e Rh. Capacidade para 12
amostras (colunas). As amostras (fração de hemácias)
são aplicadas nos poços contendo anti-A (A), anti-B (B),
anti-AB (C), anti-D IgM (D), anti-D IgM/IgG (E), controle
negativo (F). Nos dois últimos poços é realizada a prova
reversa; na reversa de A (G) adiciona-se amostra de
plasma e hemácias-teste A1, enquanto na reversa de B
(H) adiciona-se hemácias-teste B à amostra de plasma
do doador.

A leitura da placa é realizada através da utilização de câmeras digitais, e


a interpretação dos resultados de cada poço é feita pelo gerenciador do sistema
a partir da análise das imagens. Os resultados das reações podem ser positivos
(1+, 2+, 3+ ou 4+) ou negativos. Essa interpretação dos resultados fornecida
pelo equipamento deve ser validada pelo operador, que verifica as imagens
captadas e, se necessário, as compara com a visualização da própria placa
com auxílio de um suporte específico que possui um espelho de aumento. Se
necessário, em casos de discordância, o resultado pode ser alterado
manualmente pelo operador.

Os dados referentes à tipagem sanguínea manual dos doadores no


período entre maio e outubro de 2011, anterior à implantação da
29

semiautomação, foram levantados a partir dos registros do caderno do setor de


imunohematologia, juntamente com os relatórios das totalizações mensais
fornecidos pelo sistema do hospital (AGH). No caderno eram anotadas, à
caneta, a prova reversa do sistema ABO, o RhD e, nos casos RhD negativo, o
resultado da pesquisa do fenótipo D-fraco. Tanto a prova direta ABO quanto a
tipagem do RhD eram realizadas em lâmina, no setor de processamento do
Banco de Sangue do HCPA, e as amostras eram posteriormente enviadas ao
setor de imunohematologia, responsável pela prova reversa e pesquisa do
fenótipo D-fraco das amostras RhD negativas. Esses resultados eram anotados
no caderno e passados para o sistema, caso nenhuma discrepância fosse
detectada.

Para o sistema ABO, foram consideradas discrepantes as amostras que


apresentaram discordância entre as tipagens direta e reversa em microplaca ou
em lâmina (manual). Para o sistema Rh foram consideradas discrepantes as
amostras que inicialmente se mostraram RhD negativas (Figura 2), seja pela
tipagem em microplaca ou em lâmina, mas que no teste confirmatório em cartão
de gel-teste resultaram fracamente positivas.

Resolvendo discrepâncias ABO

As amostras que apresentaram discrepância entre as tipagens ABO


direta e reversa em microplaca foram submetidas à técnica de tipagem em tubo
de vidro para confirmação. Ambos métodos, tanto em microplaca quanto em
tubo, são baseados na prova de aglutinação. No segundo caso, são utilizados
os regentes Anti-A Monoclonal e Anti-B Monoclonal (Lorne Reagents) para
verificação do grupo ABO, Anti-D Duoclone Monoclonal e Controle Anti-D
Monoclonal (Lorne Reagents) para sistema RhD, e Revercel A1 e B para prova
reversa (Fresenius Kabi).

Confirmação ou exclusão do fenótipo D-fraco


30

Todas as amostras que resultaram negativas na análise de antígeno RhD


em microplaca foram submetidas à técnica em gel-teste (ID-Coombs Anti-IgG,
DiaMed e reagente ID-Diaclon Anti-D, DiaMed) para a pesquisa do fenótipo D-
fraco (Figura 2). Nos casos em que a pesquisa de D-fraco resulta positiva, é
realizado novo teste de confirmação utilizando um gel-teste DiaClon ABD-
Confirmação (DiaMed) para confirmação dos grupos ABO e RhD e um gel-teste
ID-Coombs anti-IgG (DiaMed), no qual é realizado o teste Coombs direto.

Tipagem RhD
Técnica manual Técnica semiautomatizada

Lâmina

Microplaca

Positivo Negativo Positivo Negativo

Provável DF

Cartão-gel

Cartão-gel

Positivo Negativo

Positivo Negativo

Discrepância

Discrepância

Figura 2: Esquema ilustrativo da fenotipagem RhD. Comparação entre as técnicas manual e


semiautomatizada. Na técnica manual realiza-se apenas uma tipagem por lâmina, enquanto a
microplaca tem capacidade para 12 determinações simultâneas.
31

Os cartões de gel-teste ID-Coombs Anti-IgG utilizados para pesquisa de


D-fraco, passam por incubação a 37ºC durante 13 minutos e centrifugação a
910 rpm durante 10 minutos. Os cartões DiaClon ABD-Confirmação não
passam por incubação e são diretamente centrifugados. Após, a leitura dos
cartões é realizada no módulo Banjo ID-reader (DiaMed Micro Typing System),
responsável pela leitura e interpretação de ID-cartões.

Não foi realizada pesquisa para detecção do fenótipo D-parcial, uma vez
que sua identificação não é possível através das técnicas convencionais, sendo
necessária a realização de técnicas mais sofisticadas.

Análise Estatística

A análise dos dados obtidos e discrepâncias observadas foi baseada na


estatística descritiva. Ainda, foi realizada uma análise comparativa entre os
dados obtidos através da técnica de semiautomação durante o período entre
Novembro/11 e Abril/12 (seis meses) e o histórico dos dados da técnica manual
dos seis meses imediatamente anteriores (Maio/11 a Outubro/11) à implantação
da técnica semiautomatizada, com relação à detecção de possíveis casos de
discrepância nos sistemas ABO e Rh. Para isso, foi utilizado o Teste exato de
Fisher, utilizado na comparação dados categóricos, e o teste de Pearson, com
significância de p<0,05, com objetivo de observar a presença de diferenças
estatisticamente significativas.

Resultados

Discrepâncias ABO

No período de 12 meses, a taxa de discrepância ABO (Tabela 1)


observada foi de 0,22% (33/15040). De um total de 33 casos, 28 ocorreram
32

durante o período da técnica semiautomatizada (TSA) e 5 ocorreram durante o


período da técnica manual (TM).

Tabela 1
Resultados discrepantes associados ao sistema ABO durante a TM e a TSA

Período Discrepante Não Discrepante Total


Mai/11 a Out/11 (TM) 5 7672 7677
Nov/11 a Abr/12 (TSA) 28 7335 7363
33 15007 15040
p < 0.0005 (Odds ratio: 4,633; I.C 95%: 2.039 – 10.527)

Dentre os casos de discrepância ABO no período da TSA, dois


apresentaram fenótipo A2, enquanto no período da TM três doadores
apresentaram esse subgrupo de A. Portanto, cinco doadores foram
classificados como fenótipo A2, representando 15% (5/33) dos casos de
discrepância ABO. Um doador no período da TSA apresentou alto título do
anticorpo irregular anti-M e outros três eram autodoadores de stem cell.

Fenótipo D-fraco e discrepâncias Rh

Com relação às discrepâncias relacionadas ao sistema Rh (Tabela 2),


observamos que as situações discrepantes totalizaram 0,18% (27/15040) de
todas as amostras analisadas durante o período de 12 meses. Também
podemos observar que não houve diferença na ocorrência desses casos entre
as técnicas manual e semiautomatizada (p=1.0).

Tabela 2
Resultados discrepantes associados ao sistema Rh durante a TM e a TSA

Período Discrepante Não Discrepante Total


Mai/11 a Out/11 (TM) 14 7663 7677
Nov/11 a Abr/12 (TSA) 13 7350 7363
27 15013 15040
p = 1.0 (Odds ratio: 0,968; I.C 95%: 0.455 – 2.061)
33

Vinte doadores apresentaram o fenótipo D-fraco no período da TM


(Tabela 3), contra cinquenta e quatro doadores no período da TSA. Ainda,
observamos que a prevalência do fenótipo D-fraco, no período de 12 meses e
na população estudada, foi de 0,49% (74/15040).

Tabela 3
Resultados da tipagem Rh e pesquisa do fenótipo D-fraco durante a TM e a TSA

Período Rh + Rh - DF Total
Mai/11 a Out/11 (TM) 6704 953 20 7677
Nov/11 a Abr/12 (TSA) 6424 885 54 7363
13128 1838 74 15040
p < 0.0005

Reações que motivaram dúvida conforme a técnica

Ao analisar a origem dos casos duvidosos relacionados às discrepâncias


ABO na microplaca (Tabela 4), observamos a ocorrência de algumas reações
que motivaram dúvida envolvendo os reagentes já presentes na microplaca. A
maior frequência de reações duvidosas foi na tipagem reversa de A (R.A), que
respondeu por quase metade dos casos (46,4%). Das treze reações duvidosas
na R.A., onze ocorreram devido à detecção de micro-pó ou reação de uma cruz
(1+) no poço da R.A., de maneira que não concordavam com a prova direta.
Vinte e seis dos vinte e oito casos de discrepância ABO foram solucionados
após técnica em tubo.

Tabela 4
Reações que motivaram dúvida na técnica em microplaca e na técnica em tubo

Anti-A Anti-B Anti-AB Anti-D Anti-D Controle R.A. R.B.


Microplaca 4 3 1 0 0 1 13 8
Tubo* 0 0 0 0 0 0 2
* Reação em tubo realizada a temperatura ambiente

As duas reações duvidosas em tubo, na R.B., representadas na Tabela 4


correspondem a amostras cuja tipagem em tubo não foi capaz de solucionar a
34

discrepância observada na microplaca. Não foi possível definir a causa dos


resultados discrepantes, mas sabe-se que um dos casos era de um autodoador
de stem cell.

Discussão

A automação da técnica de tipagem sanguínea vem ganhando espaço no


cenário atual, em que surgem novas tecnologias capazes de assegurar maior
segurança aos procedimentos transfusionais, acompanhando a enorme
demanda nos bancos de sangue. As vantagens oferecidas pelos equipamentos
semiautomatizados são inúmeras, uma vez que proporcionam uma maior
padronização das técnicas convencionais e uma menor subjetividade na sua
interpretação, além da possibilidade de interfaceamento. Como podemos
observar, mesmo com o advento dessas novas tecnologias, as técnicas
manuais anteriores ainda não podem ser de todo abolidas, tendo grande
importância na confirmação de resultados por vezes duvidosos.

A partir dos resultados que obtivemos, podemos observar que há um


aumento nos casos de discrepâncias ABO após a implantação da técnica
semiautomatizada (Tabela 1). Entretanto, desses vinte e oito casos ocorridos na
microplaca, vinte e seis foram resolvidos no teste em tubo. Dentre esses casos
discrepantes (Tabela 4), observamos que uma importante parcela ocorreu nos
poços da linha G da microplaca (Figura 1) em que é realizada a prova reversa
do grupo A. Os resultados duvidosos, de acordo com as informações contidas
na bula do kit (DiaMed-MP Teste), podem ser atribuídos a possíveis fatores,
tanto internos quanto externos ao doador, dentre eles poderíamos citar
variações na velocidade ou no tempo de agitação da microplaca, atraso na
leitura e interpretação das reações (sedimentação), presença de anticorpos
irregulares, contaminação bacteriana (ou de outros tipos) dos materiais. Todos
esses elementos podem levar a reações equivocadas ou erros na leitura dessas
reações. Entretanto, alguns desses fatores podem ser descartados
35

especificamente no nosso estudo, uma vez que a agitação da microplaca e a


interpretação dos resultados é realizada em equipamento semiautomático (MP-
Reader) em tempo hábil e na velocidade e no tempo de agitação padrões.

No caso do sistema Rh não foi observado aumento semelhante na


detecção de casos discrepantes (Tabela 2), mas observou-se uma considerável
elevação na classificação de indivíduos como fenótipo D-fraco após a
implantação da semiautomação. O aumento na frequência do fenótipo D-fraco
sem consequente aumento na frequência de casos de discrepância Rh, uma
vez que esse é um dos principais fatores que leva a esse tipo de discrepância,
pode ser explicado pelo fato do leitor de microplacas (MP-reader) ser capaz, na
maioria das vezes, de discernir e detectar reações fracamente positivas,
diferentemente da tipagem em lâmina, na qual essas reações poderiam ser
interpretadas e classificadas equivocadamente. Dessa maneira, o novo sistema
estaria colaborando, teoricamente, para a redução dos casos de discrepância
Rh, pois seria capaz de evitar interpretações incorretas na tipagem RhD. O
aumento do número de casos de D-fraco pode ser atribuído, como dito
anteriormente, à capacidade do leitor de microplacas detectar as reações
fracamente positivas para anti-D, as quais, anteriormente, seriam apenas
detectadas no teste confirmatório em cartão-gel após tipagem previamente
negativa em lâmina. Nesse período, como as reações eram apenas
interpretadas a olho nu, muitas tipagens RhD fracamente positivas podem ter
sido classificadas como positivas, gerando uma consequente queda na
classificação dos casos de fenótipo D-fraco.

A automação apresenta diversas vantagens na sua implantação, uma


vez que proporciona um aumento na quantidade de amostras testadas a cada
vez, utiliza pequenos volumes de amostra, possibilita o interfaceamento
(promovendo redução nos erros de leitura e transcrição e economia de tempo),
permite a rastreabilidade dos resultados e uma maior padronização na leitura
das reações (7). A rastreabilidade dos resultados proporcionada pela
36

automação foi de grande importância para a realização deste estudo, auxiliando


na coleta dos dados. Isso se deve ao armazenamento dos resultados no
computador sob a forma de registro escrito e foto digitalizada da reação
observada, tanto na microplaca quanto nos cartões-gel. Esses resultados
podem ser resgatados e visualizados no monitor a qualquer momento, apenas
informando o número da amostra, a data da leitura ou o tipo de teste realizado.
A mesma facilidade certamente não foi observada na coleta dos dados de
tipagens referentes ao período anterior à implantação da semiautomação, uma
vez que eram anotados manualmente em um caderno à caneta, sem registro de
imagem. Entretanto, a automação também apresenta algumas desvantagens no
que diz respeito ao tempo de processo do pipetador automático, podendo levar
o dobro do tempo necessário para realização da mesma técnica manualmente.
A principal desvantagem relacionada ao tempo está associada à lavagem da
ponteira utilizada pelo equipamento, a qual deve ser lavada três vezes a cada
amostra ou reagente pipetado em vez de utilizar ponteiras descartáveis.

As principais conclusões que podemos tirar do presente estudo são de


que a implantação da semiautomação da técnica de tipagem sanguínea é
acompanhada de importantes vantagens, principalmente a possibilidade de
interfaceamento, a rastreabilidade dos resultados, favorecida pela geração de
registros com imagem, e a padronização na interpretação das reações. A
técnica, entretanto, também traz consigo algumas desvantagens, relacionadas
principalmente ao tempo do processo. Ainda, observamos que algumas vezes a
técnica semiautomatizada em microplacas gera resultados diferentes da técnica
em tubo, com consequente aumento na classificação de indivíduos no fenótipo
D-fraco e aumento nos casos duvidosos ou discrepantes na tipagem do sistema
ABO. Entretanto, esses casos foram potencialmente solucionados na técnica
em tubo, que permanece sendo padrão-ouro na tipagem sanguínea, e não gera
grandes impactos no resultado final. Dessa maneira, o aumento nos casos de
discrepância ABO observados na semiautomação não colabora para um
aumento no risco de tipagens errôneas.
37

Referências

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7. Chaves G. Maestro MasterSoftware - DiaMed. 2007.


38

III – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS

Após seis meses de utilização da técnica semiautomatizada, podemos


fazer algumas considerações sobre a semiautomação. De maneira geral, os
equipamentos utilizados na técnica semiautomatizada (Maestro Master
Software – Diamed) mostraram-se bastante adequados para a execução da
rotina do laboratório de imunohematologia, na execução das tipagens
sanguíneas dos doadores. Não há dúvidas de que a nova técnica apresenta
diversas vantagens e uma grande relação custo-benefício. Apesar disso, a
técnica manual em tubo continua sendo padrão-ouro na tipagem sanguínea, por
ser uma técnica bastante sensível, prática e mais acessível. Entretanto,
pensando na segurança dos doadores e, principalmente, dos futuros receptores
de transfusões sanguíneas, acreditamos que as perspectivas futuras apontam
para o uso em uma escala cada vez maior das técnicas automatizadas, uma
vez que elas oferecem proteção contra a identificação incorreta de amostras e
erros de transcrição, que configuram os principais erros responsáveis por
transfusões incompatíveis.

IV – BIBLIOGRAFIA

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