REVISTA - Patrimonio Cultural Da Cidade RJ
REVISTA - Patrimonio Cultural Da Cidade RJ
REVISTA - Patrimonio Cultural Da Cidade RJ
9 771984 277009
ISSN 1984-2775
DEZEMBRO 2012
REVISTA DO PATRIMÔNIO CULTURAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
Vazios Urbanos
Conceitos e propostas para um Centro ainda mais vivo
Devido a sua história e capitalidade, aqui estão os mais importantes monumentos do país. Foi aqui também que surgiram os órgão de
patrimônio. Aqui surgiram conceitos e práticas.
Aqui concentra-se expressivo conjunto das manifestações registradas como patrimônio imaterial.
O patrimônio cultural é parte do desenvolvimento urbano da cidade, seja pelas Áreas de Proteção do Ambiente Cultural, as APACs, seja
pela relevância deste campo na recuperação da Região Portuária.
O Porto Maravilha é a primeira operação urbana do país que destina recursos, por definição legal, de 3% da venda das CEPACs, para
recuperação, promoção e apoio ao conjunto expressivo de patrimônio material e imaterial que esta região concentra. Este mecanismo,
onde mais de 26 mil pessoas moram em áreas preservadas pelo patrimônio cultural municipal, é decisivo como política pública urbana e
social, e como entendimento de que o patrimônio reabilitado não é nostalgia, mas qualidade para nosso presente e futuro.
Centro Cultural José Bonifácio, Galpões da Gamboa, Jardins do Valongo, Cais do Valongo e Imperatriz, entidades e manifestações cultu-
rais locais, ou já se beneficiaram ou se beneficiarão deste mecanismo inédito na esfera nacional.
Mas não é somente no Porto, no Centro Histórico também realizamos ações exemplares: a requalificação urbana da Praça Tiradentes e
Lapa está promovendo o interesse por estas áreas e já observamos a recuperação de imóveis antes degradados por iniciativas privadas.
Também inovamos no patrimônio imaterial, reconhecendo pela Prefeitura o que todo carioca ama e reverencia: a bossa nova, vendedores
ambulantes de mate e biscoito de polvilho, os bate-bola de carnaval, o chorinho, e impossível esquecer, os nossos amados botequins.
Além das grandes transformações que se operam no Rio, que não tem nas Olimpíadas de 2016 um fim, e sim um meio, pelo qual estamos
acelerando mudanças planejadas, desejadas, mas que estavam paradas ou emperradas.
Em 2015, portanto um ano antes, celebraremos 450 anos de Fundação da Cidade e promoveremos até lá o patrimônio cultural vivo e
pulsante.
Por isso é um prazer abrir mais uma edição da Revista do Patrimônio Cultural.
Eduardo Paes
Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro
Entretanto, historicamente, este esforço manteve-se prioritariamente nas mãos e mentes, como prerrogativa, dos órgãos de patrimônio
cultural do Estado brasileiro.
Foram eles, por meio de seu corpo técnico e seus líderes notáveis, que selecionaram o acervo de bens materiais que constituem hoje o
corpo construído da identidade cultural nacional.
Talvez fizesse sentido em uma democracia jovem, para quando não dizer claudicante, que coubesse exclusivamente aos órgãos públicos
de patrimônio cultural este modus operandi.
Refletia uma sociedade desigual e assimétrica, na qual educação e conhecimento pertenciam a poucos e, por consequência, melhor seria
que este foro privilegiado e erudito ditasse o que as gerações futuras deveriam conhecer.
Fruto do período de redemocratização do país e dos últimos suspiros do “crescimento brasileiro” da década de 70: grandes obras iriam
mudar a feição do Centro Histórico da cidade, e o corpo técnico da Prefeitura do Rio, conjuntamente com a sociedade civil, resolveu
cooperar e proteger seu patrimônio comum.
Em 1984, é criado o Corredor Cultural, protegendo extensivamente a área central urbana, criando um acervo de caráter único no país até
então: mais de 3 mil exemplares de arquitetura eclética, de meados do século XIX; uma arquitetura mestiça, impura, comum, vernacular,
era agora patrimônio cultural municipal. Era patrimônio cultural carioca.
Definiam e marcavam o ambiente cultural que dava suporte à identidade carioca, à seus tipos e seus modos, aos seus saberes e seus
modos de viver.
Esta abordagem trouxe aspectos do campo da cultura para o ordenamento territorial e o planejamento urbano, fazendo com que este
revisse os modelos rodoviariasta e racionalista que definiam o espaço público e a paisagem construída.
A esta primeira iniciativa veio somar-se a criação de outras áreas de proteção como SAGAS (Saúde, Gamboa e Santo Cristo) e todo o
bairro de Santa Teresa.
Em 1992, com o Plano Diretor, consolidou-se este conceito e foram criadas as Áreas de Proteção do Ambiente Cultural (APACs). E temos
hoje um conceito disseminado e compreensível por grande parte da população, que nele se apoia para fazer valer a manutenção e
requalificação do seu ambiente construído de moradia.
O crescimento exponencial deste acervo – hoje, mais de 30 mil imóveis protegidos, quase 40% do território urbanizado da Área de
Planejamento 1 e 2 (Centro e Zona Sul) –, nos fez concentrar energias na reconstrução de uma linha de atuação do patrimônio cultu-
ral municipal mais próxima das questões do ambiente urbano, da promoção e da animação cultural de áreas históricas, destacando a
dimensão popular e entendida por todos, ou pelo menos das comunidades que mantêm com os bens culturais relação e coexistência.
Patrimônio Cultural, Intervenção Urbana, Arquitetura e Design são modos distintos e complementares de fazer uma gestão holística das
áreas de ambiente cultural, requalificando espaço público, como na Lapa e na Praça Tiradentes, ou conectando-se a temas contemporâ-
neos e prementes, como a economia criativa e o design, através do Centro Carioca de Design, ou criando inovações jurídicas e adminis-
trativas, como a aplicação obrigatória em patrimônio cultural para 3% dos recursos de venda das CEPACs da operação urbana do Porto
Maravilha, permitindo restaurações importantes como do Centro Cultural José Bonifácio e dos Galpões da Gamboa.
Para disseminar este conhecimento e estas práticas, realimentando a necessidade de maior dimensão popular na proteção do patrimônio
cultural carioca, apresentamos, então, mais um número dessa nossa Revista.
Washington Fajardo
A Cidade e a Paisagem 26
O IRPH e a proteção da paisagem cultural carioca | 26
Encanamento do Maracanã | 30
Vazios Urbanos 34
Arqueologia 42
Estudos de Caso 58
Patrimônio Imaterial 70
Noel Rosa, transformando a vida em samba | 70
Os vendedores ambulantes das praias cariocas | 72
Mercadão de Madureira | 75
Paixão Centenária - 100 Anos de FLA X FLU | 77
Procedimentos e Materiais 78
Calçada em pedras portuguesas / A arte musiva sob nossos pés | 78
Passatempo 95
Palavras Cruzadas | 95
Você conhece esse patrimônio cultural | 96
O que sobrevive mostra que o passado tem força Dando sequência à linha editorial do Patrimônio
e está vivo. Carioca, está prevista a publicação de novo livro
do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro.
No entanto, é preciso, às vezes, ter energia, lim-
par a poeira para entender que os homens e
suas obras viveram todo esse tempo e que não Em 1980, o Conselho é criado pela Lei 161 e dá
podemos deixar o passado escapulir... O passa- início a sua atividade; pretendemos, trinta e alguns
do é para ser revelado, pois quando o passado anos depois, contar um pouco do que foi (e tem
nos ocupa, é para nos fazer pensar, hoje, em algo sido) o fruto do seu trabalho, resultante desta inte-
que transformará o presente naquilo que será o ligência coletiva.
futuro.
Nos primeiros dez anos do Conselho, havia uma
Por isso tudo, o Livro.
ideia central de não se tombar de forma isolada, e
O Livro tentará contar um pouco do que foram sim de criar áreas de proteção da ambiência tanto
essas três décadas do trabalho do Conselho Mu- do ponto de vista histórico quanto arquitetônico,
nicipal de Proteção do Patrimônio Cultural, o cultural, paisagístico e natural.
resgate da existência das coisas pelas palavras.
O tempo passou! E agora?
Mas o mundo!... ah, este é tão maior que não
deve ter sido um acaso o fato de o primeiro bem
Instrumentos de conservação? Gestão destas am-
tombado pelo Conselho Municipal de Proteção
biências? Resgate, registro e proteção da história?
do Patrimônio Cultural da Prefeitura do Rio de
Janeiro, ter sido uma árvore. A figueira da Rua
Faro, tombada em 1980. Cuidar do patrimônio é também olhar para o futu-
ro; assim, passado, futuro e presente confundidos,
E ela ainda viceja. vamos contar estas histórias....
Aline Xavier
Paris ao anoitecer
A qualificação do espaço urbano das áreas históri- sibilitando intensificar as emoções, influenciando a
cas se consolida como importante instrumento na interpretação do lugar. Além disso, a sensação de
busca de sua efetiva proteção. A iluminação pública segurança e conforto em decorrência de uma boa
adequada desempenha papel singular para a con- iluminação aumenta a permanência dos usuários
dução à melhor vivência das pessoas nos espaços desse local, tendo em vista uma tendência à re-
públicos e à maior percepção dos valores do lugar. dução dos índices de criminalidade e vandalismo,
bem como uma redução de acidentes.
A iluminação pública eficiente proporciona a valo-
rização da cidade, destacando e contribuindo para O modo como visualizamos os edifícios e monu-
a preservação do seu patrimônio urbano, histórico mentos à noite depende dos critérios de ilumina-
e cultural. Enquanto a iluminação permanente pos- ção utilizados, ou seja, a intensidade luminosa, a
sibilita destacar a história e as características espe- sua distribuição espacial e o tipo de fonte lumino-
cíficas do lugar, contribuindo de forma relevante sa. A escolha destes critérios influencia diretamente
com as condições de segurança e conforto visual na percepção do patrimônio edificado e, por isso,
dos ambientes da cidade, a iluminação temporá- devem ser cuidadosamente estudados. Por esse
ria, utilizada de forma lúdica e interativa, permite motivo, a iluminação deve ser precedida de uma
a criação de cenários, reinterpretações do espaço, criteriosa avaliação das características físicas das
novas poéticas, experiências e emoções, intensifi- edificações ou dos monumentos, levando-se em
cando, assim, a compreensão do patrimônio e a consideração, também, a distância do observador
apropriação do ambiente histórico. à edificação para uma ideal apreciação dos deta-
lhes e ornatos, inclusive nas diferentes perspecti-
A iluminação arquitetônica e a iluminação urba- vas nas quais o monumento será observado. Além
na atuam diretamente no modo como as pessoas da luz, também as sombras projetadas devem ser
sentem o ambiente construído em que vivem, pos- avaliadas. Mesmo com toda esta interpretação da
Marisa Moreira
Várias iniciativas em termos de iluminação pública
já foram feitas como forma de promover o desen-
volvimento de sistemas eficientes de iluminação ur-
bana, com redução do consumo de energia elétri-
ca. Entre elas, podemos citar: o Programa Nacional
de Iluminação Pública Eficiente (ReLuz) – lançado
em junho de 2000, instituído pela Eletrobrás, com
o apoio do Ministério das Minas e Energia. O pro-
grama tem como meta a valorização dos espaços
públicos urbanos, contribuindo para melhorar as
Marisa Moreira
Zeca Linhares
qualificar o ambiente histórico, redefinindo o im-
portante papel da luz na requalificação do espaço
urbano. O plano prevê três níveis de iluminação
para o Centro Histórico, considerando a eficiência
energética e sustentável. São eles:
Marisa Moreira
1. Da Redação. Novos prefeitos, novas políticas... ...e critérios
que não deveriam mudar. In: Revista LUME ARQUITETURA,
São Paulo: De Maio comunicação e editora, dezembro/2004-
-janeiro/2005, p. 66-69.
Teatro Municipal: bem tombado iluminado no 4. Miguez, José Canosa. A Luz dos Monumentos Urba-
Centro do Rio de Janeiro nos – A Visão Francesa. In: Revista LAPRO – FACHADAS &
MONUMENTOS, São Paulo: De Maio comunicação e editora,
Marisa Moreira maio/2005, p. 12-17.
A regulamentação das Áreas de Proteção do Patri- Essa nova postura de proteção do valor de conjun-
mônio Cultural (APACs)1 deu prosseguimento, na to visa impulsionar a efetiva restauração do supor-
cidade do Rio de Janeiro, a um processo de deli- te físico (elementos arquitetônicos e urbanos) no
mitação e proteção de relevantes conjuntos urba- processo de conservação destas áreas, e, ao mes-
nos, estendendo a preservação/conservação do mo tempo, mantê-las vivas, disponíveis à popula-
patrimônio edificado aos espaços livres, públicos ção e inseridas no processo de desenvolvimento
ou privados, destas áreas, isto é, aos logradouros, da cidade pelo uso. Assim, os novos elementos,
jardins, pátios etc. introduzidos para maior conforto dos usuários,
podem ser conciliados com a necessidade de pre-
Com as APACs, servação dos valo-
Acervo IRPH
Bens tombados municipalidade é co-responsável pela preservação
Bens preservados e conservação deste patrimônio cultural, o progra-
ma visa aplicar recursos públicos para promover
a conservação e valorização destes ambientes, in-
centivando os usos e a dinamização dos fluxos.
Os critérios de intervenção
Considerando que o acesso ao Patrimônio Cultural Planta cadastral de 1935 com localização da intervenção
é um direito da população garantido pela Consti- na APAC Laranjeiras
Os trechos estão sendo selecionados após a iden- to, como Gloria, Catete, Cosme Velho, Alto da Bo-
avista, Usina e Santa Teresa.
Metodologia adotada
Vanessa Ameixoeira
Baleia. Angelo Venosa
A busca pela história da introdução de monumen- Na cidade do Rio de Janeiro, a história não foi di-
tos em áreas urbanas permite evidenciar os aspec- ferente. Além de sua reconhecida beleza natural,
tos das cidades, sua passagem no tempo e sua a cidade abriga uma enorme coleção de obras de
inclusão no mundo moderno, contemporâneo. A arte instaladas em áreas públicas ou integradas à
inserção destes objetos normalmente acompanha arquitetura. Sua história como capital da Colônia,
uma reformulação, uma releitura do cenário da ci- do Império e da República permitiu o acúmulo de
dade, vista com um caráter documental de forma- um importante acervo artístico entre os séculos
ção social e política do espaço urbano. XVIII e XXI.
Segundo o historiador Paulo Knauss, a cidade se Considerado como um marco, o primeiro monu-
define como um território simbólico. Com o passar mento da cidade do Rio de Janeiro, o Aqueduto
dos anos, grupos sociais e políticos distintos, em da Carioca, construído no século XVIII no Largo
ocasiões diversas, tiveram a oportunidade de in- da Carioca com a função primeira de abastecer a
tervir no espaço urbano mediante a instalação ou cidade, foi visto por viajantes como o mais belo e
atribuição de valor histórico e artístico uma peça mais útil monumento de arquitetura existente na
urbana. Essas intervenções permitem aos cidadãos cidade.
resignificar seu território e sua vida cotidiana, cons-
truindo uma identidade com a cidade. Erguem-se Após ser estabelecida como capital da Colônia,
diferentes emblemas atribuindo sentidos a cidade. em 1763, o Rio de Janeiro passou por diversas re-
Assim, do mesmo modo que as obras de arte di- formas urbanas, dando início a um processo de
videm, organizam e caracterizam as áreas públi- monumentalização, iniciado por mestre Valentim,
cas da cidade, esta é demarcada simbolicamente com a construção de diversos chafarizes e do pri-
(KNAUSS, 1999, p. 7). meiro espaço público do Brasil, o Passeio Público.
Vanessa Ameixoeira
Rio Imperial. E é nesse contexto de transformação
da antiga capital da colônia em capital do governo
imperial português que são instaladas diversas es-
tátuas e monumentos, afirmando a transformação
política, econômica, social e cultural que ocorria
na cidade.
Vanessa Ameixoeira
Grande Quadrado Vermelho - Franz Weissmann
Diversas ações continuaram a transformar o Rio Em 2010, a Prefeitura da Cidade do Rio de Janei-
em um verdadeiro parque de exposições de dife- ro, através da Subsecretaria de Patrimônio Cultu-
rentes manifestações artísticas. Não somente in- ral, Intervenção Urbana, Arquitetura e Design, da
serções de monumentos de cunho político, mas Secretaria Municipal de Cultura, firmou Termo de
de obras de artes de diferentes artistas, diferentes Cooperação Técnica com a instituição Museu A
estilos, atribuindo-lhe símbolos de uma cidade Céu Aberto – Cultura, Ecologia e Desenvolvimento
contemporânea. (MCA), para a realização do projeto de Restauração
do Acervo Artístico da Cidade do Rio de Janeiro.
Na década de 90, o Projeto Esculturas Urbanas, da
Secretaria Municipal de Cultura, enfatizou, sobre- O projeto propõe inicialmente a recuperação de
tudo, essa linguagem mais contemporânea, reu- 445 monumentos, em diferentes localidades da ci-
nindo artistas de diversas gerações. Waltercio Cal- dade do Rio de Janeiro, protegidos pela legislação
das, Frazns Weissmann, Sergio Camargo e Amílcar de proteção do patrimônio cultural municipal, ou
de Castro, dentre outros, foram selecionados para considerados de importância histórica e artística
dar vida ao projeto. para a cidade, dando início a um extenso e con-
tínuo processo de levantamento, análise e desen-
Criar uma política de conservação e valorização volvimento de projeto, culminando com a execu-
destes monumentos, herdados pela cidade com ção de obra de restauração destes monumentos.
o passar dos séculos, e ainda permitir a inserção
de novos monumentos e obras de arte é o gran- São coretos, quiosques, equipamentos e mobiliá-
de desafio do poder público em suas diferentes rio urbano, marcos da Estrada Real de Santa Cruz,
esferas. O caráter documental destas obras as tor- fontes, chafarizes, logradouros públicos, monu-
na dignas de serem consideradas um patrimônio mentos, esculturas, pinturas murais e obras de
cultural a ser transmitido para as gerações futuras. artes de diversos artistas representativos para a
A recuperação destes elementos, de diferentes Monumentos do Rio. Obras de arte existentes nos logradou-
ros municipais. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro; Secreta-
épocas, diferentes artistas, diferentes materiais e ria Municipal de Obras e Serviços Públicos; Divisão de Parques
diferentes usos, que muitas vezes passam desa- e Jardins – Rio de Janeiro: Imprensa Oficial da Cidade, 1983.
percebidos aos cidadãos, moradores e usuários da JUSTICIA, Maria José Martínez. Historia y Teoria de la Conser-
cidade, representa o cuidado com a preservação vación Artística. Madri: Editora Tecnos, 1995.
Ísis Claro
Acervo IRPH
No último dia 30 de março uma bela homenagem A ideia de se elevar uma homenagem em bronze
cívica aconteceu na Praça Tiradentes, Centro do a Dom Pedro I surgiu ainda nos primeiros anos
Rio de Janeiro. O evento lembrou os 150 anos de após a independência. Segundo Moreira de Aze-
inauguração da estátua equestre de Dom Pedro I, vedo1, em edição de 6 de outubro de 1824, o re-
elevada para homenagear a memória do procla- dator do jornal Despertador Constitucional apre-
mador da Independência. sentou um plano de um monumento consagrado
ao fundador do império. Em sessão extraordinária
A cerimônia realizada pela Secretaria de Con- do dia 11 de maio de 1825 o presidente do Sena-
servação e Serviços Públicos, em parceria com a do da Câmara propôs a elevação de uma estátua
Subsecretaria de Patrimônio Cultural, hoje, Institu- ao imperador, aceito por D. Pedro I no dia 13 do
to Rio Patrimônio da Humanidade, contou com a mesmo mês.
presença de autoridades civis, militares e membros
da Família Imperial brasileira, como Dom Antônio Os acontecimentos políticos dos anos subsequen-
de Orleans e Bragança, segundo na linha de su- tes, que culminaram na abdicação de D. Pedro I
cessão e tetraneto de Dom Pedro I, seu irmão Dom em 1831, adiaram os planos de edificação do mo-
Eudes e sua filha Dona Maria Gabriela. numento. Ao longo de 30 anos, e após algumas
tentativas sem efeito para elevar a homenagem,
Foi executado toque de silêncio em memória ao foram abertas três subscrições públicas para arre-
monarca e honras militares, além de ser depositada cadar os recursos necessários.
uma coroa de flores nas cores verde e amarelo. O
evento contou também com a participação da ban- Finalmente, em sessão extraordinária da Câmara
da de música do 1ª Batalhão de Guardas do Exér- Municipal de 7 de setembro de 1854, foi aprovado
cito acompanhada pelo coral do Colégio Pedro II. por unanimidade um projeto definitivo para a exe-
cução do monumento, apresentado e aceito por
D. Pedro II em 4 de outubro do mesmo ano.
Helder Viana
O monumento
Helder Viana
proposta para modificação do desenho inicial,
consistindo em: executar o pedestal em bronze
com detalhes em dourado, ou em mármore, ao
contrário do previsto em granito; duplicar as es-
tátuas dos índios que ornam as faces maiores do
monumento; suprimir os quatro candelabros em
forma de coqueiros existentes no desenho apre-
sentado por Mafra por outros oito candelabros,
para melhor rodear o pedestal.
Helder Viana
nifesto às Nações, detalhe que diferenciava essen-
cialmente, segundo Azevedo, o modelo da está-
tua equestre de Rochet do desenho escolhido.
Helder Viana
Descrição
Manuel Duarte Moreira de Azevedo (1832-1903) Para quem encara o monumento de frente, o pri-
descreve com detalhes o monumento, explican- meiro dos quatro rios é o São Francisco, o que
do os significados dos elementos da estátua e lhe corresponde na face posterior o Madeira; o do
expressando as opiniões e críticas de quem viveu lado esquerdo o Amazonas e o do direito o Para-
os sentimentos do período da inauguração. ná. Os dois primeiros são representados cada um
por uma só figura.
A descrição a seguir foi publicada pela primeira
Helder Viana
vez em 1877 e preserva, na íntegra, o texto do
autor, revelando detalhes já não mais observa-
dos atualmente.
Feliz o estatuário na maneira porque retratou a um monumento, onde a crítica severa pouco
fisionomia dos povos indígenas das nossas ma- acharia de censurar, pois quando mais se admi
tas; além do que é perfeito o trabalho artístico. ra esse trabalho artístico mais belezas e primores
descobre observador.
O índio que personifica o Rio São Francisco tem
nobreza e majestade; está sentado, tendo junto
de si um tamanduá bandeira e uma capivara. Ornam o friso do pedestal escudos torreados,
representando as vinte províncias do Brasil, bri-
O indígena que simboliza o Madeira está arma- lhando sobre cada escudo uma estrela dourada.
do de arco e em atitude de disparar uma flecha;
completa esse uma tartaruga, uma ave e alguns Se nas faces do pedestal, os quatro grupos per-
peixes. sonificam o País, os escudos, representando as
O Amazonas e o Paraná são representados cada províncias, personificam a Nação; quis o artis-
um por duas figuras, uma do sexo masculino, ou- ta lembrar que além da Independência deve o
tra do feminino. A índia do Rio Amazonas tem Brasil ao herói do Ipiranga a organização polí-
sobre as costas uma criança dormindo, cuja bele- tica. Foi esta uma ideia feliz e grandiosa devida
za e naturalidade são admiráveis; o jacaré sobre a inspiração artística de João Maximiano Mafra,
o qual o indígena descansa o pé é tao perfeito cujo desenho foi executado com alterações pelo
que parece vivo; há mais uma jiboia, um tigre, estatuário francês.
um ouriço-cacheiro e uma ave.
Na parte superior da face principal do pedestal
É perfeito e majestoso o grupo que personifica o
estão as armas brasileiras e a seguinte inscrição:
Paraná; veem-se junto aos índios um tapirete ou
anta, um tatu e duas grandes aves. A
Constituem estes grupos a maior beleza da D. PEDRO PRIMEIRO
obra pela perfeição e superioridade da exe- GRATIDÃO
cução; cada um deles por si só podia formar DOS BRAZILEIROS
vigiadas por dragões dourados. AZEVEDO, Moreida de. O Rio de Janeiro: sua história, monumentos,
homens notáveis, usos. Rio de Janeiro: Brasiliana, segundo volume, p.
9-46 e 221-228, 1969.
Helder Viana
FRIDMAN, Sergio A. Posteridade em pedra e bronze: história dos mo-
numentos e estátuas da Cidade do Rio de Janeiro, volume I, 1996.
GALVÃO, Alfredo. Manuel de Araújo Porto-Alegre - sua influência na
Academia Imperial das Belas Artes e no meio artístico do Rio de Janeiro.
Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Nº 14, p. 93-94,
1959.
RIBEIRO, Marcus Tadeu Daniel. O romantismo na pintura brasileira do
século 19. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Nº
29, p. 198-229, 2001.
VIANNA, Marfa Barbosa. A estátua mais bonita da Guanabara nas co-
leções do Museu Histórico. Anais do Museu Histórico Nacional. Vol.
Armas bragantinas ladeadas por XIII, p. 229-236, 1952.
dragões dourados
W. A estátua equestre do Senhor D. Pedro I - II. Diário do Rio de Ja-
neiro, Rio de Janeiro, 19 de julho de 1855, Publicações a Pedido, p. 2.
Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 15 de julho de 1855, Páginas Me-
Ergue-se sobre o pedestal o herói em grande uni- nores, p. 1.
forme de general, montado em soberbo ginete, COLI, Jorge. Indianismo – idealização do índio moldou a cultura na-
tendo o braço direito alçado, apresentando ao cional. Folhaonline, disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fol/
brasil500/imagens5.htm. Acesso em 15/08/2012.
mundo o auto da independência do Brasil.
Notas
1
Manuel Duarte Moreira de Azevedo (1832-1903) – pesquisador, escri-
O cavalo, a exceção feita de alguns pequenos tor, médico e professor de História do Colégio Pedro II
reparos, é superiormente executado; mas não 2
Manuel de Araújo Porto Alegre, Barão de Santo Ângelo (1806-1879),
podemos dizer o mesmo do cavaleiro; achamos foi diretor da Academia Imperial das Belas Artes entre 1854 e 1857,
escritor, jornalista, pintor, caricaturista, arquiteto, professor, político e di-
pouco heroica e nobre a atitude do Imperador; plomata brasileiro.
parece haver afetação no gesto e pouca origina- 3
Publicado na página 2 do jornal “Diário do Rio de Janeiro” de 19 de ju-
lidade na fisionomia de Pedro I e julgamos que lho de 1855, em “publicações a pedido” – A Estátua Equestre do Senhor
D. Pedro I – acervo Biblioteca Nacional.
contribui um pouco para esse mau efeito o cha- 4
Revista do IPHAN nº 14, p. 94, Manuel de Araújo Porto-Alegre – sua
péu armado da época contemporânea, com que influência na Academia Imperial das Belas Artes e no meio artístico do
o artista ornou a cabeça do herói do Ipiranga. Se Rio de Janeiro, 1959.
o tivesse posto na mão, como estava no desenho Jornal “Correio Mercantil”, 15 de julho de 1855, em “Páginas Menores”
5
momento solene em que soltou nos campos do Peça musical, de caráter sacro, criada para acompanhar uma missa
7
solene de ação de graças que se inicia com a frase “Te Deum laudamus”
Ipiranga o brado – Independência ou Morte. fonte: http://pt.wiktionary.org/wiki/Te_Deum
8
Primeira estrofe do poema “A inauguração da Estátua Equestre do Se-
nhor D. Pedro I, Imperador e Fundador do Império do Brasil; erigida no
A altura do monumento é de 3,30 m até o alto dia 30 de março de 1862, na Praça da Constituição, na Côrte e Cidade
da cantaria; 6,40m até o alto da cornija e 6 m do Rio de Janeiro” – acervo Biblioteca Nacional. O gradil, de autoria do
a estátua equestre e seu plinto. O peso total do artista Miguel Couto dos Santos, executado posteriormente e exposto
ao público em 9 de novembro de 1865, sendo elogiado por D. Pedro
bronze é de 55 mil quilos, sendo 28 mil quilos II e premiado com a medalha de ouro da Academia das Belas Artes.
todo o pedestal, 12 mil quilos a estátua equestre, 9
O gradil, de autoria do artista Miguel Couto dos Santos, executado
10.000 os dois grupos grandes e 5.000 os dois posteriormente e exposto ao público em 9 de novembro de 1865, sen-
do elogiado por D. Pedro II e premiado com a medalha de ouro da
pequenos.” Academia das Belas Artes.
Fernando Mello
va seu patrimônio cultural e histórico. Percorrer
suas cidades é entrar em contato com a história
da cultura ocidental, cristalizada na ocupação de
seu território, nos campos, nos portos e comércio,
na implantação dos burgos e das cidades, em sua
trajetória de guerras e conquistas.
Fernando Mello
efetiva participação da população, e na valoriza-
ção dos espaços privados e coletivos, históricos ou
contemporâneos.
Fernando Mello
O lugar
Aline Xavier
Podemos entender o conceito de Paisagem Cul-
tural como o resultado das obras conjugadas do “Crianças nas praças
homem e da natureza, em virtude de sua unidade Praças no morro
ou integração na paisagem. Em julho deste ano, a Morro de amores, Rio
cidade do Rio de Janeiro foi declarada Patrimônio Rio da leveza desse povo
da Humanidade, tornando-se a primeira na cate- Carregado de calor e de luta
Povo bamba
goria de Paisagem Cultural Urbana, a partir des-
Cai no samba, dança o funk
te título e do crescente reconhecimento da rele- Tem suingue até no jeito de olhar
vância do patrimônio para o desenvolvimento da Tem balanço no trejeito, no andar
cidade do Rio de Janeiro, a Prefeitura Municipal Andar de cima tem uma música tocando
criou o Instituto Rio Patrimônio da Humanidade Andar de trem tem gente em cima equilibrando
(IRPH). Este novo órgão veio para acrescentar à Andar no asfalto quente os carros vão passando
Andar de baixo
antiga Subsecretaria de Patrimônio Cultural, Inter-
Tem uma moça no quintal cantarolando
venção Urbana, Arquitetura e Design as atribui- Rio de baixadas com seus vales
ções ligadas à gestão do sítio reconhecido pela Vale a pena
Unesco, e novas ações de expansão, potenciali- Sua pobreza é quase mito
zação e consolidação do patrimônio nas diversas Quando fito seus contornos
áreas da cidade. Lá do alto de algum de seus mirantes
Que são tantos
Então
Desta forma, foi criado o Escritório Técnico da
Paisagem Cultural, com a atribuição principal de Tudo vale a pena
implantar a Gestão Municipal Integrada, manten- Sua alma não é pequena
do interface com os órgãos municipais e demais
agentes atuantes em sua área de tutela legal, que Seus santos são fortes
Adoro seu sorriso
consiste no sítio reconhecido como Patrimônio
Zona Sul ou Zona Norte
Mundial. A Gestão Municipal Integrada visa garan- Seu ritmo é preciso”
tir as ações necessárias para o planejamento, con-
servação, preservação e monitoramento das áreas Tudo vale a pena
que configuram o sítio da Unesco, incluindo tam- (Pedro Luís e Fernanda Abreu)
bém a sua Zona de Amortecimento e áreas afins.
André Csaky
A área de tutela legal do Escritório Técnico da Pai-
sagem Cultural é composta pelo sítio reconheci-
do como Patrimônio Mundial pela Unesco como
Paisagem Cultural e engloba a Orla de Copaca-
bana, o Parque do Flamengo, o Parque Nacional
da Tijuca, o Jardim Botânico, os fortes situados na
entrada da Baía de Guanabara e as bordas d’água.
Aline Xavier
mônio Mundial pela Unesco.
Aline Xavier
Zeca Linhares
Engenho de Dentro
Encanamento do Maracanã
Juliana Oakim
Zeca Linhares
Praça Tiradentes - exemplo de qualificação urbana como estímulo à ocupação de vazios
Introdução
O Centro Histórico do Rio de Janeiro é dotado de às áreas planas situadas a oeste, sobre os terrenos
um rico patrimônio edificado, resultado do espíri- encharcados então existentes.
to empreendedor de seus habitantes ao longo de
mais de quinhentos anos de ocupação. Com os ciclos do açúcar, do ouro, e posteriormen-
te do café, a cidade acentua seu papel como prin-
Composto por quantidade expressiva de edifica- cipal porto exportador da colônia e importador de
ções de arquitetura de implantação tipicamente gêneros da metrópole portuguesa, atraindo novos
colonial, principalmente por sobrados, mas con- habitantes, de origens as mais diversas, e conse-
tando com exemplares de todos os estilos e épo- qüentemente, ampliando sua infraestrutura física,
cas, o Centro da cidade é praticamente todo pro- tanto no tamanho do espaço urbano quanto na
tegido como patrimônio histórico e cultural nas 3 qualidade das suas construções.
esferas do poder público, já que apresenta carac-
terísticas marcantes de todos os períodos históri- A cidade assume sua vocação política a partir de
cos por que passou a cidade, o estado e o país. 1763, inaugurando um período de quase duzentos
anos como capital, inicialmente da colônia portu-
Contextualização histórica guesa e, após a chegada da Côrte Portuguesa em
1808, do Reino Português. Essa vocação é reafirma-
A cidade, após a expulsão dos franceses, em 1567, da posteriormente como principal cidade do Império
se fixou no Morro do Castelo, mas rapidamente Brasileiro, no período que se seguiu à independência,
desceu para a várzea, se expandindo em direção e também após a instauração da República, em 1889.
Acervo IRPH
Cristina Coelho
venção urbana, com profundas transformações na
malha tradicional, vai sendo transfigurado paulati-
namente a partir da década de 60, com o retorno
da ocupação das antigas estruturas urbanas por
moradias e novas atividades. Os velhos centros
históricos voltam a ser habitados.
Zeca Linhares
que tivessem um caráter mais abrangente e não
erudito (Veneza, 1964; Nairóbi, 1976; Burra, 1980).
Mas no Brasil, se tais manifestações se faziam no
plano dos técnicos especialistas em proteção ao
patrimônio cultural, nas camadas mais populares
ainda persistiam as idéias de renovação do anti-
go pelo novo. Em ambientes mais “cultos”, eram
percebidas demonstrações de perplexidade ante
a demolição de alguns bens excepcionais, mar-
cantes na paisagem carioca - Palácio Monroe, Mi-
nistério da Agricultura e Mansão Martinelli -, mas
nada era feito em relação à substituição da cidade
tradicional, com sua malha urbana, de seu parce-
lamento do solo, do gabarito das edificações, por
uma cidade dita moderna e progressista.
IRPH/Incubo
Zeca Linhares
Centro Carioca de Design antes da recuperação (2007) ... e depois, esperando melhorias no entorno
Acervo IRPH
1- Núcleo Colonial: a atual Praça XV de Novembro,
antigo Terreiro do Carmo, Largo do Carmo, Terreiro
da Polé, Praça dos Governadores, Largo do Paço;
A cidade é capaz de exprimir a tensão entre a vez que expressa relações sócio-espaciais. Portanto,
racionalidade geométrica e o emaranhado da o centro é principalmente um lugar dotado de senti-
existência humana. (Italo Calvino) dos e, em cada cidade, ele distribui e diferencia equi-
pamentos sociais, culturais e prestígio social.
O espaço é uma das presenças fundantes na or-
ganização e produção sobre o pensamento do Centro é uma parte da cidade delimitada espa-
homem em sociedade. O espaço e o tempo estru- cialmente, que desempenha uma função simul-
turam as narrativas e as representações humanas. taneamente integradora e simbólica. O centro é
um espaço que, devido às características de sua
Centro não é apenas um ponto no espaço, um ocupação, permite uma coordenação das ativi-
ponto que estabelece equidistância, é uma orien- dades urbanas, uma identificação simbólica e
tação e um símbolo que se materializa e possui ordenada destas atividades e, por conseguinte, a
diferentes influências na organização social. O criação das condições necessárias à comunica-
centro é também uma opção ou invenção. A cen- ção entre os atores. (CASTELLS, 1975, p.185)
tralidade é uma definição resultante da organiza-
ção do espaço pelo homem. A centralidade, assim compreendida, é cambiante.
Possui articulações definidas por fluxos e é dinâmica.
Ir ao centro expressa um sentido e um lugar que
concentra condições materiais. É através do patrimônio cultural que a carga sim-
bólica do espaço é evidenciada, elemento simbóli-
A questão da centralidade é questão intrínseca ao co do poder, nele cristalizado. É para o centro que
tratarmos do espaço urbano. Para Lefebvre: a dinâmica da cidade converge e podemos ob-
servar como a noção de cultura (e, por extensão,
... a questão da centralidade em geral, da centra- a de patrimônio cultural ) é representada nesses
lidade urbana em particular, não é das mais fá- centros, revelando a própria ideia de nação. Imer-
ceis, ela atravessa toda a problemática do espa- sa na ideia de centralidade, é que foi produzida,
ço[...]Cada época, cada modo de produção, cada por exemplo, na Praça Tiradentes uma relação que
sociedade particular engendrou sua centralida- identificava a nação moderna, os valores culturais
de: centro religioso, político, comercial, cultural, e, mais recentemente, as variadas formas de inser-
industrial etc. Em cada caso, a relação entre a ção nas novas tecnologias e formas de produção
centralidade mental e a centralidade social está e veiculação de linguagens estéticas. Identificamos
para ser definida. (LEFEBVRE, 1974, p.383) aqui um centro capaz de (re)apresentar sentidos
simbólicos cambiantes no tempo, através da ideia
O centro é, digamos assim, uma porção localizável de patrimônio cultural que ali é fomentado.
e localizada na cidade, distinguindo-se entre si pela
complexidade, abrangência e com a possibilidade de Ainda segundo Castells (1975), é evidente a ideia
alguma hierarquia em relação aos demais espaços de um núcleo lúdico existente no centro, onde se
da cidade. Centros são espaços de convergência; ao concentram lugares de diversão e ócio. No centro
passo que a centralidade não se define pela localiza- é possível as mais diversas experimentações com
ção, mas pelas articulações entre localizações, uma e no espaço urbano.
Fontes de consulta
Ainda segundo Lefebvre, a centralidade “é esse
processo duplo que se expressa também pela or-
CALVINO, Ítalo. As Cidades Invisíveis. São Paulo: Companhia
ganização de vazios, de concentração e dispersão” das Letras, 1990.
(LEFEBVRE, 1983, p.46).
CASTELLS, Manuel. Estudo de elementos da estrutura urba-
na. In Problemas de investigação em sociologia urbana. Lisboa:
Editorial Presença; São Paulo: Editora Martins Fontes, 1975. p.
Em cada centro, podemos verificar indicadores di-
141-208.
ferenciados para a identificação desses usos e flu-
xos, delineando assim a potencialidade que deter- HOLANDA, Frederico de. O Espaço de Exceção. Brasília: Edito-
ra Universidade de Brasília, 2002.
minado centro (com)porta. Indicadores de ordem
econômica, social, política, em especial, indicado- LEFEBVRE, Henri. L’ Espace contraditoire. In: ______. La pro-
duction de l’espace. Paris: Éditions Anthropos, 1974.
res da política patrimonial, traduzem esses usos e
fluxos. O uso do solo nos parece ser um indicador ______________________________________________. Espacio y po-
lítica. Barcelona: Ediciones Península - Historia, Ciencia, So-
que nos permite avaliar como as políticas patrimo- ciedad, 1976.
niais agem e reagem nestes centros, delineando
LEITE, Rogério Proença. Contra-Usos da Cidade. Campinas,
formas urbanas. A presença de vazios urbanos e as São Paulo: Ed. UNICAMP; Aracaju, SE: Editora UFS, 2004.
formas de (re)adequação com novos usos e fluxos
ORLANDI, Eni. P. A Cidade como Espaço Político-Simbólico:
são, de certa forma, a narrativa desta política que Textualização e Sentido Público in Discurso e Texto: formu-
se apresenta na cidade que vem se construindo. lação e circulação dos sentidos. Campinas, S.P.: Pontes, 2005.
Henrique Fonseca
Audiência Pública realizada no Galpão da Ação da Cidadania, Porto
Nas últimas décadas, em particular após o início gião do Porto do Rio de Janeiro); e do GP/CEPPIR
das obras do Porto Maravilha, estudos e escava- (Coordenadoria Especial de Políticas de Promo-
ções arqueológicas vêm revelando a importância ção da Igualdade Racial), além de nove membros
histórica e cultural da região portuária do Rio de convidados. Ao final de todas as reuniões, haviam
Janeiro para a compreensão do processo da Diás- participado do Grupo de Trabalho pelo menos 50
pora Africana e da formação da sociedade brasi- pessoas das mais variadas procedências, incluindo
leira. Motivado por estes achados arqueológicos, sociedade civil e política. Tais reuniões se estende-
foi criado pelo Decreto Municipal 34.803 de 29 de ram de dezembro de 2011 a junho de 2012, cul-
novembro de 2011 o Grupo de Trabalho Curatorial minando com uma audiência pública que contou
do Circuito Histórico e Arqueológico da Herança com quase 150 participantes, realizada no dia 26
Africana, com o objetivo de criar um fórum onde de junho de 2012.
fossem construídas coletivamente diretrizes para
implementação de políticas de valorização da me- Como frutos dessas reuniões, surgiram o primeiro
mória e proteção deste patrimônio cultural. desenho do Circuito Histórico e Arqueológico de
Celebração da Herança Africana e um texto cole-
Inicialmente, o Grupo de Trabalho foi formado por tivo, nomeado Recomendações do Valongo. Para
integrantes da então Subsecretaria de Patrimônio o Grupo de Trabalho, o papel das recentes desco-
Cultural, hoje Instituto Rio Patrimônio da Humani- bertas arqueológicas transcende o debate acadê-
dade (IRPH); do Comdedine-Rio (Conselho Muni- mico e institucional, estendendo-se a um debate
cipal de Defesa dos Direitos do Negro); da CDURP político, econômico e social. Contida nestas des-
(Companhia de Desenvolvimento Urbano da Re- cobertas, há a oportunidade de se estabelecer um
O Decreto Municipal 34.803/2011 apresentou Quanto aos sítios que compõem esse Circuito, é
uma delimitação preliminar do Circuito Histórico possível distinguir três grandes categorias que se
e Arqueológico de Celebração da Herança Afri- interrelacionam:
cana com os seguintes locais: (a) Centro Cultural
José Bonifácio; (b) Cemitério dos Pretos Novos; (c) • sítios arqueológicos: constituídos pelo patrimô-
Cais do Valongo; (d) Jardins do Valongo; (e) Largo nio material de natureza arqueológica, históri-
do Depósito; e (f ) Pedra do Sal. Foi entendimento ca e simbólica. Integram este conceito os sítios
do Grupo de Trabalho que, inicialmente, o Circuito arqueológicos Cais do Valongo e Cemitério dos
será inaugurado com essa delimitação. Contudo, é Pretos Novos;
premissa de constituição do Circuito sua constru-
ção permanente, de modo que, à medida que no-
• sítios históricos: constituídos pelo patrimônio
vas descobertas relevantes forem realizadas, serão
material, com valor histórico e simbólico. Inte-
adicionadas à delimitação original.
gram este conceito os sítios Jardim do Valongo,
Largo do Depósito, Pedra do Sal, Centro Cultural
Cada um dos pontos indicados neste Circuito re-
José Bonifácio e Docas D. Pedro II e
mete a uma dimensão da vida dos africanos e de
seus descendentes na região portuária. O Cais
do Valongo está ligado à chegada e ao comér- • sítios vivos: manifestações, organizadas institu-
cio dos africanos. O Cemitério dos Pretos Novos cionalmente ou não, que preservam tecnologias,
relaciona-se à deposição dos restos mortais dos conhecimentos e celebrações, predominante-
povos trazidos do continente africano. O Largo do mente imateriais, também com valores históri-
Depósito era o local da venda, local de comércio. co e simbólico. Integram este conceito os sítios
O Jardim do Valongo simboliza a história oficial Centro Cultural Pequena África, a Pedra do Sal e
que buscou apagar os traços do tráfico negreiro. o Afoxé Filhos de Gandhi.
A Pedra do Sal era local de resistência, celebração
e de encontro. E, finalmente, a antiga escola da Conforme recomendações do Grupo de Trabalho,
Freguesia de Santa Rita, Centro Cultural José Bo- inicialmente serão instalados mobiliários urbanos
nifácio, que remete à educação e à cultura como de sinalização, de comunicação e direcional em
instrumentos de libertação em nossos dias. cada um dos locais. Parte deste mobiliário conte-
rá texto histórico (construído com colaboração do
Além desses, o Grupo de Trabalho determinou Grupo de Trabalho), mapa indicativo do Circuito e
que deverão ser incluídos ainda, em curto prazo, marca própria.
os seguintes locais: (a) o Centro Cultural Pequena
África, cujo trabalho pretende resgatar e preser- Esse trabalho, sintetizado no texto Recomenda-
var valores históricos e culturais, além de celebrar ções do Valongo, é concluído com um parágrafo
personalidades centrais da ancestralidade da re- que, pelo seu importante teor, merece destaque:
gião outrora conhecida como Pequena África; (b) Todos os brasileiros participam da história da es-
as Docas D. Pedro II, obra erguida pelo engenheiro cravidão: história da qual não se pode esquivar,
negro André Rebouças, que não permitiu o uso de nem se deve esquecer. É nosso entendimento que
trabalho escravo em sua construção; atualmente o resgate dessa memória e a quebra do ciclo de
cedidas como sede da organização não governa- amnésia social contribuem para o enfrentamen-
mental Ação da Cidadania; e (c) o Afoxé Filhos de to e a redução das desigualdades herdadas do
Gandhi, um dos primeiros blocos afro do Rio de sistema escravista.
Grifo Consultoria
nado, Rio de Janeiro, RJ foi desenvolvido em cum-
primento as políticas e legislações federal, estadual
e municipal, que conjuntamente ratificam a neces-
sidades de conhecer a história e preservar a memó-
ria da cidade do Rio de Janeiro. Nos últimos anos
o fortalecimento de várias ações políticas, inquestio-
navelmente confirmadas pelo apoio da sociedade à
sua herança cultural, permitiu o que grande parte da
população que não registrou sua própria história pu-
desse ser revelada para seus descendentes. A revela-
ção dessa história a toda a sociedade permite a ela se
identificar, se reconhecer e, assim, tornar cada um de
nós mais cidadão, mais completo, consciente de sua
contribuição na formação cultural do povo brasileiro.
Grifo Consultoria
tardo, reservatório (piscinão) destinado à retenção
das águas pluviais que alagam a região; 2 - Garagem
Poula e 3 – Igreja de Santo Antonio dos Pobres.
Grifo Consultoria
essas ideias.
Grifo Consultoria
Vasilhames em grés cerâmico (stoneware)
específicos para tintas para sapatos
(blaking and polish bottle), fabricados pela
Doulton & Lambeth, London.
Grifo Consultoria
Área destinada à construção da caixa de retardo
– “piscinão”- na quadra da Rua dos Inválidos com
Rua do Senado. Procedimentos iniciais de prote-
ção do poço de alvenaria, evidenciado durante a
realização das pesquisas, antes de sua transposi-
ção, ou seja, retirada do remanescente arqueoló-
gico do terreno original para local de exposição
permanente nas proximidades
Fontes de consulta
ABREU, Maurício. Geografia Histórica do Rio de Janeiro (1502- LIMA, Evelyn et alii. Cruz Vemelha e adjacencias: uma plano para
1700). Ardrea Jakobsson Estúdio. Rio de Janeiro, 2011. a revitalização da área. In: Cadernos do Patrimônio Cultural. SMC/
DGPC, Rio de Janeiro, 1992 [2, Caderno Especial].
AS NOÇÕES SOBRE A CULTURA, E FÁBRICA DO ANIL. In: O Pa-
triota: Jornal Litterário, político e mercantil, &C. n. 2- Fevereiro LLOYD´s. Impressões do Brazil no século XX: Sua História, seo
de 1813. Impressão Régia. Rio de Janeiro povo, commercio, indústrias e recursos. Lloyd´s Greater Britain
Publishing Company. Ltda. Rio de Janeiro. 1913.
BARREIROS, Eduardo Canabrava. Atlas da evolução urbana da
cidade do Rio de Janeiro- Ensaio - 1565-1965. Rio de Janeiro: MAURICIO, Augusto. Templos históricos do Rio de Janeiro. 2. ed.
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BERGER, Paulo. Dicionário histórico das ruas do Rio de Janeiro. NAJJAR, Rosana Pinhel Mendes. Manual de Arqueologia Histó-
Rio de Janeiro: Gráfica Olímpica, 1974. rica. Brasília: IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, 2005.
CARVALHO, Eliana Teixeira de. Escopo geral para serviços de ar-
queologia. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro: PASSOS, Alexandre. O Rio no Tempo do Onça. 4. ed. Rio de Janei-
SEDREPAHC/Gerência de Arqueologia, 2008. ro: Livraria São José, 1965.
CAVALCANTI, Nireu Oliveira. Rio de Janeiro: centro histórico RIO DE JANEIRO. Decreto Municipal nº 22872 de 7 de maio de
1808-1998 - Marcos da Colônia. Rio de Janeiro: GMT, 1998 2003. Cria a Obrigatoriedade da Pesquisa Arqueológica nas
Obras de Intervenção Urbana.
COARACY, Vivaldo. Memórias da cidade do Rio de Janeiro. 3. ed.
Belo Horizonte: Itatiaia, 1988. RIO DE JANEIRO. Decreto Municipal nº 22873 de 7 de maio de
2003. Cria a Carta Arqueológica do Município do Rio de Janeiro.
FRANÇA, Jean Marcel Carvalho (Org.). Visões do Rio de Janeiro
Colonial: antologia de textos (1531 – 1800). 3. ed. Rio de Janeiro: BRASIL. lei N. 3924, de 26 de julho de 1961. Dispõe sobre os mo-
José Olympio, 2008. numentos arqueológicos e pré-históricos. Diário Oficial da União,
Brasília, DF, 27 de julho de 1961, Seção 1, p. 6793. 1961.
GERSON, Brasil. História das ruas do Rio. Rio de Janeiro: Brasi-
liana, 1965
Carlos Azevedo
Vista panorâmica da área escavada
Nunca se falou tanto em Arqueologia como juventude de suas implantações, situadas nas pri-
nos dias de hoje, basta abrir um jornal, uma re- meiras décadas do século XX, ou, ainda, em virtude
vista ou ainda assistir a um noticiário local para da falta de áreas não edificadas que viabilizem uma
nos deparamos com relatos sobre descobertas empreitada desta natureza. No entanto, de feverei-
arqueológicas, áreas sendo escavadas, estrutu- ro a maio de 2012, no Leblon, que é uma das áreas
ras arqueológicas e o que poderia a alguns anos com o metro quadrado mais valorizado de nossa ci-
atrás nos parecer uma cena de filme: arqueólo- dade, foi escavado um terreno de aproximadamente
gos em ação. O potencial arqueológico da cidade 190 m², com o objetivo de realizar um diagnóstico
do Rio de Janeiro é inquestionável, inúmeros são do potencial arqueológico daquela área. O Projeto
os sítios arqueológicos cadastrados e, quase que de Diagnóstico Arqueológico da Rua General Urqui-
diariamente, somos notificados sobre novas des- za (Leblon) foi executado pelas arqueólogas Jacke-
cobertas arqueológicas. Sejam estas de estruturas line de Macedo1 e Ana Cristina Sampaio2 a partir de
ou artefatos recuperados através de pesquisas ou exigências feitas pela Gerência de Arqueologia do
achados fortuitos. Contudo, muito do nosso pas- IRPH ao empreendedor e proprietário do terreno.
sado ainda permanece desconhecido, pois, ape-
sar de haver uma demanda de pesquisas sendo Um dos aspectos que influenciou a solicitação por
desenvolvidas, estas ainda se concentram, em sua parte dos técnicos da prefeitura a exigirem o diag-
maioria, nas áreas centrais e portuárias da cidade. nóstico arqueológico foi a proximidade da área
alvo da pesquisa com a antiga Rua do Pau, via que
A Zona Sul da cidade, os bairros do Leblon e de fazia o acesso ao conhecido quilombo que se lo-
Ipanema não aparecem como alvo de pesquisas ar- calizava no sopé do Morro Dois Irmãos. O Leblon
queológicas. Isto se deve ao fato do frescor e da do século XIX era constituído por chácaras, dentre
Leyla Mariath
O século já raiava e o Leblon continuava sendo Essa área fez parte, em certa época, da Fazenda
um apêndice da Gávea. Nacional da Lagoa e resultou de uma desapropria-
ção, pela Fazenda Real, de grande gleba em volta
Assim começa o capítulo sobre o Leblon do livro
da Lagoa, que, segundo planta de 1844, alterada
de Brasil Gerson, A História das Ruas do Rio de
em 1868, foi desmembrada em 150 chácaras, das
Janeiro.
quais, 100 no Leblon, vendidas a particulares.
Em seu livro, O Antigo Leblon, o escritor Rogé-
Toda a área compreendida entre a Praia da Restin-
rio Barbosa recorda: “Nos anos 40 e 50, o Leblon
ga, destino frequente dos habitantes, vindos das
era um subúrbio à beira-mar, um bairro de gente
áreas interiores da gleba e da própria Gávea, os
simples, onde só circulavam os moradores”, os na-
Dois Irmãos e a Rua Boa Vista, atual Marquês de
tivos do bairro, gente singela que compartilhava a
São Vicente, constava como o Campo do Leblon,
aventura de habitar uma área isolada, um extenso
estendendo-se daí o nome a todo o futuro bairro.
areal, área semeada de alagadiços e brejos, co-
berta de pitangueiras, espinheiros, palmeiras anãs, A Rua do Sapé, uma das primeiras ruas do Leblon
cactos e araçás ocupada por cabanas onde mora- para o mar, com origem no Largo das Três Vendas,
vam uns poucos pescadores. atual Praça Santos Dumont, era, e o foi durante mui-
to tempo, a única via de penetração para o Leblon, a
Urbanizadas a parte final de Copacabana e de
partir da Gávea.
Ipanema, por iniciativa o Barão de Ipanema não
tardou realizar os planos que tinha para o Leblon. Existiam algumas chácaras de Carlos Le blon −
A continuidade da praia não correspondia a uma Emmanuel Hippolyte Charles Toussaint Le Blon de
continuidade da terra habitável, um acidente, a Meyrach, um local tão privilegiado, protegido pela
chamada Barra da Lagoa, por onde o mar pene- montanha, voltado para o nascente e à beira-mar;
trava na Lagoa Rodrigo de Freitas e dela saía. A às quais se chegava por caminhos que saíam da
Barra da Lagoa seccionava a área correspondente estrada propriamente dita, que seria parte da atu-
aos futuros bairros de Ipanema e Leblon. al Avenida Bartolomeu Mitre, antiga Rua do Sapê
Felipe Cohen
meiro pavimento do Antigo Museu Real, atual
Museu e Centro Cultural da Casa da Moeda do
Brasil, dentro do Projeto de Restauro do edifício,
realizado sob coordenação do Instituto Hebert
Levy2. O Projeto obteve o apoio institucional do
Instituto de Arqueologia Brasileira – IAB, além do
acompanhamento de pesquisadores da Gerência
de Arqueologia da Instituto Rio Patrimônio da Hu-
manidade - IRPH e do IPHAN.
Entre os anos de 1905 a 1906, foram realizadas re- Inicialmente, foram evidenciadas 25 bases de con-
formas no edifício para acolherem o Arquivo Na- creto, onde estavam assentadas nos pilares me-
cional. A fachada foi fortemente modificada com tálicos que correspondem ao período do Arquivo
a construção de um pórtico e um terceiro andar. Nacional. Nos níveis posteriores, foram encontradas
A aparência palaciana do edifício foi transformada as estruturas relacionadas ao período da construção
em uma arquitetura neoclássica. Em 1985, o Ar- do Palacete, como os Baldrames de pedras com ar-
quivo Nacional transfere-se para o edifício da an- gamassa de coloração amarelada. Um dos Baldra-
tiga Casa da Moeda, também localizado na Praça mes divide ao meio a Área do Teatro, sendo possível
da República. deduzir a existência de uma antiga parede no local.
Patrícia Pinnock
arqueológica, pode-se compreender e revelar a
história do monumento, as suas alterações e in-
tervenções arquitetônicas. Esse trabalho objetivou
compreender o monumento como um superarte-
fato, que contém significados e valores próprios,
Felipe Cohen
Felipe Cohen
do Exército-AHEx
Acervo IRPH, a partir de fotos do Acervo do Arquivo Histórico
quena colina foi erguido um forte de terra – Forte
de Nossa Senhora da Glória do Campinho, consi-
derado tecnologicamente um dos mais modernos
de sua época. Segundo documentos históricos
fazia parte de um plano de defesa para a cidade
do Rio de Janeiro, que previa a construção de 17
fortes semelhantes, a partir dos quais se pretendia
estabelecer pontos fortes e passíveis de resistir a
qualquer exército europeu interessado em com-
bater a recém adquirida independência do país.
O antigo Forte, construído com tão avançada me-
todologia, possuía “muralhas de terra” (GRAHAM,
1956) e se situava sobre uma pequena elevação
Reconstituição da planta original do Forte
defendendo a cidade de quem para ela demanda- do Campinho de autoria de Rudolph Waehneldt
va pela estrada Real de Santa Cruz, no local deno-
minado Campinho, área de entroncamento viário
de grande importância no período. A viajante inglesa Maria Graham (1956), no dia 26
de agosto em 1821, “uma terça-feira de sol” se
Segundo historiadores, como Aníbal Barreto referiu assim ao Forte do Campinho, desenhando-
(1958) e Tasso Fragoso (1965), o Forte teve suas -o em pontas:
origens na necessidade de defesa do território na-
cional, por ocasião ainda das invasões francesas Deixamos os Afonsos a tempo esta manhã (...)
de 1710 e 1711 e para a proteção da cidade do Paramos, naturalmente, em Campinho (...) tive-
Rio de Janeiro pelo interior. mos ensejo de admirar o campo em torno (...) É
Acervo IRPH
mos visto, distinguindo-se por um novo forte de
barro*, num outeiro isolado (o grifo é nosso), que
domina a estrada para a capital, através de mor-
ros e da planície.
Acervo IAB
exigência do IRPH-Gerência de Arqueologia, face
à relevância cultural da área, previamente diag-
nosticada por meio de estudos históricos.
Acervo IAB
pesquisas arqueológicas no local, as quais foram
organizadas em duas etapas. Com o avanço da
pesquisa, novas áreas foram sendo anexadas ao
Projeto de Arqueologia, que se estendeu ao longo
dos anos de 2007 e 2008. O terreno pesquisado
correspondeu a uma área de 84.519,48 m2.
paradidático de divulgação foram editados e dis- ** “Largo do Madureira”, atual Largo do Campinho. Segundo
tribuídos gratuitamente DVD´s com informações alguns historiadores, neste local teria havido embates contra os
franceses. Por isso o morro defronte ao Forte e ao atual Largo
sobre as pesquisas arqueológicas e as atividades
do Campinho era conhecido, até o século XIX, pelo nome de
de educação patrimonial, baseadas na metodolo- “Marangá” que significa, na língua indígena, “Campo de Bata-
gia própria do Instituto de Arqueologia Brasileira, lha”. Esse morro já se chamou: Morro da Bica, Morro das Pedras
e, atualmente, chama-se Morro ou Favela do Fubá.
o “Psicodrama Pedagógico”.
Fontes de consulta
Como resultado das pesquisas arqueológicas reali- Campinho. Maria Graham (des.). Coleção Museu Britânico. In:
zadas e em decisão conjunta entre a coordenação GRAHAM, Maria, 1956.
A edificação, situada na Rua General Severiano, Esta edificação é considerada como um exemplar
159 nasceu da necessidade de continuar a abrigar da arquitetura Neoclássica, embora, Bethencourt
as órfãs e desvalidas que, desde 1853, ocupavam da Silva já havia projetado dentro das primeiras
uma casa que havia sido doada para sede do Re- manifestações da arquitetura Eclética na cidade do
colhimento de Órfãs e de Desvalidas de Santa Te- Rio de Janeiro, como, por exemplo, o Centro Cul-
reza e que teve de ser demolida. tural José Bonifácio situado na Rua Pedro Ernesto.
Esta casa localizava-se, então, na Rua do Hospício A arquitetura Neoclássica está evidente na fa-
de Pedro II, atual General Severiano. chada principal com o corpo central destacado,
coroado por frontão triangular e tímpano, que,
A nova construção, realizada no mesmo local, já posteriormente, ganhou a decoração da estátua
com a finalidade de formar e educar, foi chama- representando Santa Tereza e, ainda, a sua mar-
da, dentre outros nomes, pelo mais conhecido, o cante horizontalidade.
Educandário Santa Tereza, que teve sua pedra fun-
damental lançada em 15 de outubro de 1873 e foi Os pátios internos são significativos, e a sutileza
inaugurada em 1877; tinha, entre seus benfeitores, e escassez da utilização de ornatos, também, são
Dom Pedro II e a Imperatriz Tereza Cristina. características do Neoclássico, valendo mencionar,
ainda, a série de palmeiras imperiais alinhadas na
O projeto e a construção são atribuídos a Fran- frente da fachada para a Rua General Severiano.
cisco Joaquim Bethencourt da Silva (1831-1911),
que foi um dos últimos discípulos de Grandjean A edificação foi tombada, provisoriamente, através
de Montigny. do Decreto 6.934/1987 e seu tombamento defini-
Heloisa Cerqueira
O casarão em 2007
Heloisa Cerqueira
Antes da obra
Heloisa Cerqueira
No começo da obra
Heloisa Cerqueira
Antes da obra
A situação do casarão era muito precária e a restau- etapas, está prevista para o final deste ano de
ração está sendo minuciosa, como, por exemplo, 2012.
os laboratórios montados no local para restaurar as
milhares de ferragens das mais de 500 esquadrias, A terceira e última etapa ficará para mais adiante.
( janelas e portas) entre dobradiças, cremonas, fe-
chaduras, etc., a oficina de gesso para moldar e É uma vitória para a cidade do Rio de Janeiro ter
copiar os ornatos e sancas do forro, dentre outras. este casarão – museu – educandário, de volta ao
nosso patrimônio e à nossa cena cultural e edu-
O resultado já está aparecendo e a inauguração, cativa, principalmente, neste ano da consagração
mesmo que, apenas, da primeira e da segunda como Patrimônio da Humanidade.
Heloisa Cerqueira
Heloisa Cerqueira
Fabricio de Rezende
Fachada do imóvel após as obras
No decorrer dos seus 100 anos, o imóvel sofreu Cada vez que surge um novo caso em minha vida
com as intempéries e o descaso de seus proprie- profissional, sinto-me como um médico se sente
tários; e sobreviveu a um incêndio que o deixou diante de um novo paciente.
quase em ruínas, além das diversas modificações
que descaracterizaram o imóvel. Esse encontro marca o início de outro desafio pro-
fissional, e sempre enxergo e muitas vezes “con-
O projeto em questão visou restaurar o bem e ade- verso” com uma edificação, para que ela me mos-
quá-lo a um novo uso, exclusivo comercial, desti- tre o que tem de bom, o que não está bom, o que
nado a bar e restaurante – Enchendo Linguiça. gostaria de mudar, o que tem que ser mantido.
Afinal, serão humanos que irão utilizar-se dela, e pre- Toda a estrutura do mezanino é independente,
cisamos respeitar os limites que cada imóvel possui. para que não transmita nenhum esforço ou carre-
gamento as paredes originais do imóvel.
Primeiro contato
A maior interferência projetada foi a mudança da
Meu primeiro contato com esta edificação foi em escada. Originalmente em madeira, ela era contí-
agosto de 2010, do melhor jeito, durante as ne- nua com um patamar e colada na divisa, ligando
gociações para uma locação. Como é comum aos diretamente o térreo ao sobrado. Neste projeto,
proprietários de imóveis, estes avaliam o preço e criamos a escada em concreto, sem a continui-
as condições da locação de seu bem, vinculados dade original, e prestigiamos o primeiro trecho,
ao fator da área construída, e, em especial a este instalando-a entre a área de mesas e a área de
imóvel, que possuía um desordenado e despro- fabricação dos defumados. Poderíamos escondê-
porcional mezanino. -la em algum canto, mas ela serve para que todos
vejam com proximidade estes importantes com-
partimentos do jirau.
Da importância das regras do jogo
Precisava criar uma solução que envolvesse todo Bastaria instalar o fundo das vigas em concreto
esse nobre conjunto de madeiras, mantendo os mes- entre duas vigas em madeira, que, por sua vez, já
mos alinhamentos e posições das vigas em madeira, teriam sua primeira utilidade, a de servir de forma
de todas elas, até das que haviam sido incineradas. da viga em concreto.
Fabricio de Rezende
gas em concreto, transversais à fachada da Rua
dos Inválidos, que seriam para suportar três lajes
continuas, com larguras variáveis, porém com o
mesmo comprimento de 4,70 m. Essas lajes não
seriam apoiadas nas paredes originais da constru-
ção, como é comum de se ver.
por outras novas, mas após orientação dos téc- isenção de IPTU, o que não vai ser difícil. Pois, as
nicos do Patrimônio, foi possível gerar uma forma obras já estão concluídas e todas de acordo com
em fibra de vidro, graças a algumas peças origi- as orientações do Patrimônio Municipal.
nais, necessária à confecção das peças danificadas,
agregando às varandas a mesma uniformidade da
ANTES
Fabricio de Rezende
visão original do imóvel.
Do apoio técnico
Fabricio de Rezende
tua confiança profissional entre as partes.
Fabricio de Rezende
Ao projetar-se modificações em um imóvel exis-
tente, temos que observar e, principalmente, res-
peitar suas dimensões e características.
No final de 2011, a Gerência de Cadastro e Pesqui- rente foi orientado a recuperar os vãos conforme
sa e Proteção analisou um processo de aceitação os originais, mas não existiam instrumentos legais
de obras para demolição de marquise em edifica- que o obrigassem a cumprir tal exigência, uma vez
ção de construção anterior a 1938. Ou seja, afeta que o imóvel ainda não havia sido protegido. Ain-
ao Decreto 20.048/2001, referente a um imóvel lo- da assim, mesmo sem o direito a pleitear qualquer
calizado na esquina das ruas do Rosário e da Qui- isenção fiscal, o proprietário optou pela restaura-
tanda, no Centro. Tratava-se de um sobrado de ção dos elementos originais da edificação. Uma
três pavimentos e uso comercial no térreo, rema- vitória para a cidade e para o Patrimônio Cultural.
nescente das primeiras ocupações da área, com
revestimento em azulejos, elementos em cantaria,
Acervo IRPH
beiral em cimalha e gradis em ferro. O sobrado
havia sido indicado para proteção no estudo para
ampliação da área do Corredor Cultural, ainda
não implantada, e está localizado no entorno ime-
diato do Edifício Sulamérica, bem que se encontra
em processo de tombamento, permanecendo, no
entanto, sem nenhum tipo de proteção.
Fabricio de Rezende
timentos em imóveis sob a tutela do Patrimônio
Cultural Carioca, procurando esclarecer e fomen-
tar a recuperação de bens preservados em Áreas
de Proteção do Ambiente Cultural - APACs.
Entrevista
tural, uma vez que a área pertencia ao Corredor
Nome: Antonio dos Santos Paiva Cultural1. Isto foi em 1997.
Nacionalidade: Portuguesa
Data de nascimento: 19/06/1946
Revista: Desde quando o Sr. tem percebido algu-
Profissão: Empresário (comércio de vidros)
ma mudança na área do SAGAS (Saúde, Gamboa
e Santo Cristo)?
Revista: Desde quando o Sr. mora no Brasil?
Sr. Antonio: De três anos para cá, com o início do
Sr. Antonio: Desde 1964, ou seja, 48 anos. Vim projeto do Porto Maravilha.
de Portugal para o Rio de Janeiro e desde então,
estou aqui. Revista: Quais foram os principais motivos para
investir em imóveis Preservados?
Revista: Há quanto tempo o Sr. tem comércio em
áreas históricas do Rio de Janeiro? Sr. Antonio: Isenção de IPTU2 e remissão de dívi-
das de IPTU3. Além de que gosto muito da arqui-
Sr. Antonio: Desde 1968, tendo como primeiro tetura antiga e esses imóveis são lindos.
comércio um bar na Praça Tiradentes e depois ou-
tros negócios nos bairros da Gamboa e Saúde. Revista: Qual a importância do Patrimônio Muni-
cipal neste processo?
Revista: Como e quando ficou sabendo da atua-
ção do Órgão Municipal de Patrimônio Cultural? Sr. Antonio: Orientação e esclarecimentos com
relação aos trâmites e acompanhamento dos
Sr. Antonio: Foi quando fui à Secretaria de Urba- processos para conseguir esses benefícios. Assim
nismo pedir uma licença de obras para um prédio como orientações técnicas para restauração e
na Rua Visconde do Rio Branco. Na ocasião, fui conservação da arquitetura tradicional dos imó-
informado que deveria procurar o Patrimônio Cul- veis do local.
Segue fotos de alguns dos bens recuperados pela a equipe do Sr. Antonio. Assim, podemos constatar o sucesso
desta parceria, e como realmente é um bom negócio preservar a nossa história.
ANTES DEPOIS
Fabricio de Rezende
Fabricio de Rezende
ANTES DEPOIS
Fabricio de Rezende
Fabricio de Rezende
Rua Alexandre Mackenzie, 103, Centro (Subárea A – Barão de São Félix 2)
ANTES DEPOIS
Fabricio de Rezende
Fabricio de Rezende
Acervo IRPH
um dos arquitetos pioneiros do moderno carioca,
trata-se de uma excepcionalidade dentro de sua
produção. Autor de diversos projetos para edifí-
cios de apartamentos de elevada qualidade arqui-
tetônica, voltados para a classe média na Zona Sul
da cidade, como, por exemplo, os edifícios Mis-
souri, Mississipi, Jarau e Ocaporan.
Acervo IRPH
cução da obra, pela ausência de ornamentação e
pela harmoniosa composição das fachadas.
ANTES
Marcelo Laranjeira
DEPOIS
Marcelo Laranjeira
Eduardo de Almeida
culturais do Rio de Janeiro, surge primeiro como
ritmo, dança e folguedo coletivo, com palmas,
batuques e refrões que eram ditos repetidamen-
te. Posteriormente, começa a ganhar os versos e
se transforma em canção, firmando-se definitiva-
mente como o mais carioca dos ritmos.
Por ter nascido e morado a vida inteira em Vila Isabel, bairro projetado em 1872, Noel, assim
como o bairro, representava a modernidade frente à velha cidade colonial. Vila Isabel era um bair-
ro portador de inovações e reflexo de um novo modo de vida da cidade com suas ruas largas, reti-
líneas e arborizadas, em contraposição às ruas estreitas abertas ao longo dos anos na cidade tradi-
cional. O próprio Boulevard 28 de Setembro foi considerado uma réplica do boulevard parisiense.
Como símbolo da modernidade, os bondes da Companhia Ferro Carril de Vila Isabel, fundada pelo
Barão de Drumond para ligar Andaraí e Vila Isabel ao Centro da cidade, organizada em 1873; e a
luz elétrica no bairro, inaugurada em 1909, no boulevard, hoje Avenida 28 de Setembro.
Eduardo de Almeida
cantores e tornou-se conhecido no rádio pelas
vozes de Araci de Almeida, Mario Reis e Francisco
Alves entre outros. Um de seus principais parceiros
na música foi Oswaldo Gagliano, conhecido por
Vadico, que conheceu na fábrica de discos Odeon.
Dessa parceria surgiram: Cem mil Réis, Conversa
de Botequim, Feitiço da Vila e outras.
Fontes de consulta:
que Noel começa a ficar conhecido. O primeiro MAXIMO, João e DIDIER, Carlos. Noel Rosa: uma biografia. Bra-
sília: Editora Universidade de Brasília, Linha Gráfica Editora, 1990.
sucesso é Com que roupa? que teve grande re-
percussão no carnaval. BRANCO, Celso. Noel Rosa e Chico Buarque comparados: a
construção da tradição na canção popular brasileira. Dis-
sertação de Mestrado, UFRJ/ IFCS/PPGHC, Rio de Janeiro, 2008.
Pouco após o casamento com Lindaura, dez anos
Eduardo de Almeida
mais nova que ele, muda-se para Belo Horizonte
por motivos de saúde, em busca de um melhor cli-
ma para o tratamento da tuberculose. Ao retornar
ao Rio, estava com a saúde bastante comprometida.
Zeca Linhares
Praias de Ipanema e Leblon
Para celebrar esse momento, centenas de adesivos Ainda na primeira metade do século XIX, a cidade
divulgando esse registro, com a marca do Patri- ganha uma grande diversificação na sua popula-
mônio Cultural Carioca, foram distribuídos para os ção, não sendo só a de origem africana a etnia a
vendedores nas praias. disputar um lugar nos novos mercados de traba-
O século XX
bairros à beira-mar passam a sofrer uma valoriza- É evidente que o vendedor ambulante é um per-
ção em função dessa relação com a praia. sonagem fundamental neste cenário que repre-
senta o Rio de Janeiro. Seja marcando a memória
A história da ocupação e apropriação das praias do carioca que cresceu nas praias, seja na lem-
da cidade pelos cidadãos cariocas está intima- brança do turista que conheceu a cidade, são ge-
mente ligada à expansão urbana em direção à rações que identificam os vendedores ambulantes
Zona Sul, a partir da segunda metade do sécu- de praia como parte de uma vida, uma cidade e
lo XIX, com os investimentos em novos meios de um momento indissociáveis.
transporte, infra-estrutura e o surgimento de um
novo e poderoso setor imobiliário disposto a in- Se para o freqüentador da praia, esta é uma área
vestir nos novos bairros à beira-mar. de recreação, de descanso, para outros, represen-
ta oportunidade de trabalho e fonte de renda. Os
Podemos considerar que as praias cariocas come- vendedores ambulantes circulam as praias anun-
çam a ter o papel fundamental de área de lazer ciando seus produtos, sejam eles alimentos, bebi-
preferida do carioca e símbolo da cidade a partir das, cangas, bijuterias, chapéus, guarda-sóis, etc.
do início do século XX, principalmente com o cres- Já são inúmeros os produtos vendidos. Parece não
cimento dos bairros junto às praias oceânicas de haver limite na imaginação dos vendedores ambu-
Copacabana, Ipanema e Leblon. lantes para o comércio nas praias.
O ambulante nas praias cariocas ...a praia significa trabalho e renda para uma
parcela importante da população. As atividades
Hoje é impossível frequentar as praias cariocas
existentes neste espaço mobilizam grande nú-
sem perceber os ambulantes. Uniformizados ou
mero de trabalhadores, tanto em seu uso coti-
não, eles vêm trazendo suas mercadorias sob o sol
diano, quanto nas grandes festas públicas, como
quente pisando na areia fofa e chamando atenção
no Ano Novo, ou os grandes eventos esportivos
pelos criativos bordões: “Olha o mate!”, “menina
e culturais, apoiados por sua vez por um marke-
bonita não paga, mas também não bebe.”, “Bis-
ting e financiamento publicitário próprios.
coito Globo!”.
(Coleção Estudos Cariocas, PCRJ – Dezembro 2009)
Fontes de consulta:
Zeca Linhares
Praia de Copacabana
Fernando Mello
O Mercadão é atração mais conhecida e a que mais Na segunda metade de 1960, o Grande Mercado
projeta o nome de Madureira para além de suas de Madureira alcançaria seu apogeu como centro
fronteiras. Conhecido como o maior mercado popu- distribuidor de alimentos, impulsionando o cres-
lar do Rio de Janeiro, sua importância econômica não cimento do comércio local; e na década de 70,
é maior que a afetiva, sendo ele motivo de orgulho alcança a condição de segundo maior centro co-
e uma referência importante para toda a população. mercial do estado da Guanabara.
No início de 1914, em nova intervenção do gover- Com a inauguração da Ceasa em Irajá, em 1974,
no municipal no sistema de abastecimento da cida- as vendas caíram fortemente, mas isso só ser-
de do Rio de Janeiro, a prefeitura promove a con- viu para atestar a capacidade do Mercadão de
cessão de pequenos mercados varejistas em vários se reinventar. Os produtos foram diversificados:
bairros. Então, sob as pistas de acesso ao viaduto artigos para festas, roupas e artigos religiosos,
Negrão de Lima, cria-se oficialmente o Mercado de sempre vendidos a preços populares, mudaram o
Madureira, para abastecer estes varejos. seu perfil e seu público, mas seu status se manteve.
O mercado possuía no início o perfil de um en- Em 2000, veio o trauma do incêndio que des-
treposto agropecuário e seu crescimento foi ver- truiu todas as suas instalações, e que causou uma
tiginoso. Em 1929, foi realizada uma obra de am- verdadeira comoção pública. Ciente da enorme
pliação, quando o mercado já se tornava o maior importância do Mercadão, a prefeitura deu um
distribuidor de alimentos da Zona Suburbana. suporte imediato aos comerciantes, o que possibi-
litou sua reinauguração em instalações moderni-
Em 1949, são construídos mais boxes para a dis- zadas já em 2001.
tribuição direta de mercadorias dos produtores à
população. Ao longo dos anos, o mercado passa Para administrar o processo de reconstrução, foi
por várias fases de expansão. Em 1959, Juscelino criado um grupo gestor de proprietários de espa-
Kubistchek faz novos investimentos de ampliação, ços internos na área do Mercado, que agregavam
e o antigo mercado ganha o carinhoso apelido de os recursos advindos dos seguros pagos, sendo os
“Mercadão”. únicos responsáveis por sua execução.
Tendo como ideia inicial reconstruí-lo como um Um marco histórico é o momento em que na sua
shopping center, teve grande oposição dos co- primeira luta pela sobrevivência o Mercadão se
merciantes e proprietários, ocasião onde se firma- transformou no Entreposto Mercado do Rio de Ja-
ria o slogan: ”Como shopping center o Mercadão neiro, que recebendo da população o carinhoso
de Madureira seria mais um, mas como mercado apelido e vencidos outros momento de luta é hoje
popular ele é único”. ‘ o Mercadão de Madureira.
Em 5 de outubro de 2001, 87 anos após sua cria- Em 4 de julho de 2012, através do Decreto 35.862,
ção oficial, reabriu suas portas o Mercadão de declara-se então Patrimônio Cultural Carioca de
Madureira, moderno em sua infraestrutura, mas natureza imaterial, oficialmente reconhecido e
tradicional em sua forma. merecidamente valorizado.
Fernando Mello
não apenas como o retorno de uma brilhante
instituição, mas como uma homenagem a todos
que compreenderam sua importância econômica,
social e histórica. O início de 2001 marcava uma
nova era para o entreposto.
Fernando Mello
tante ocupação por movimentos e campanhas de
ação social e de saúde pública. Em razão de sua
frequência média de 80 mil pessoas por dia, alcan-
ça expressivo nível de sucesso.
Daniela Di Blasi
Um século de história e rivalidade marcado por A ansiedade em torno do primeiro confronto foi
disputas de campeonatos inesquecíveis e explo- grande, já que boa parte do time do Flamengo
são de emoções. Rui Barbosa em sua frase célebre era formada por antigos jogadores do Fluminense.
e muito apropriada para estes momentos dizia: “O
pranto é livre”. O fato é que nove titulares do Clube das Laranjei-
ras foram para o departamento de futebol do Fla-
O Fla-Flu nasceu 40 minutos antes do nada, dizia mengo, criado nessa época, que, anteriormente,
Nelson Rodrigues. se dedicava apenas a Regatas. Portanto, o futebol
do Flamengo nasceu do Fluminense Football Club.
Uma pequena multidão de 800 pessoas, às
15h55min. do dia 7 de julho de 1912, nas Laran- O placar do jogo Fla x Flu (abreviatura dada pelo
jeiras, viu o apito inicial da primeira partida entre jornalista Mário Filho em 1933) foi de 3x2. No final
Flamengo e Fluminense, aquele que viria a se tor- do jogo, mesmo derrotados, os atletas do Flamen-
nar o clássico mais charmoso do Brasil, citado no go saudaram o público e confraternizaram com os
próprio hino do Flamengo e até mesmo no hino adversários no bar do clube tricolor. Bons tempos...
do Bangu Atlético Clube.
Ari Barroso e Nelson Rodrigues, notórios radialis-
A torcida era quase toda Fluminense. Homens de tas e jornalistas, torcedores com força extraordi-
terno, gravata e chapéu de palha, com fita das co- nária, influenciaram gerações com suas crônicas,
res do clube. Mulheres com leques e vestidas “como narrações e comentários. Torcedores vibrantes,
se fossem a uma recepção no Itamaraty”, definiu o parciais e de uma capacidade de transformar o
escritor, tricolor fanático, Nelson Rodrigues. jogo num épico do esporte.
Faz frio. Mas, depois duns dias de aguaceiros, rias para calçar 8.712m2 do Largo do Rossio (Praça
Vibra uma imensa claridade crua. Dom Pedro IV). Finalizada em 1849, está é consi-
derada a primeira pavimentação em mosaico por-
De cócaras, em linha os calceteiros,
tuguês de grande destaque. O motivo escolhido,
Com lentidão, terrosos e grosseiros,
ondas formadas por pedras de basalto e calcário,
Calçam de lado a lado a longa rua. ficou conhecido como Mar Largo do Rossio.
Cesário Verde/1878
Este tipo de pavimentação passou a expressar
uma manifestação de busca no passado de signos,
A origem fatos e mitos que remetem à história de Portugal e
fortalecem o sentido de identidade nacional.
Vanessa Ameixoeira
Elaine Goldsmid
Ondas - Praça D. Pedro IV - Lisboa
Elaine Goldsmid
Animais
Elaine Goldsmid
Espinha
Elaine Goldsmid
Flor de Lis
Elaine Goldsmid
Cartelas e logomarcas
Zeca Linhares
as ondas perpendiculares ao mar de Copacabana.
Acervo IRPH
Calcula-se que a cidade do Rio de Janeiro possui (...) Lembrai-vos desta arte,
1,218 milhão de metros quadrados de passeios Penso que tem defesa!
pavimentados com este tipo de calçamento.
Aparece em toda parte,
Pois ela é bem Portuguesa!(...)
Muitas destas calçadas são consideradas patrimô-
nio cultural da cidade, protegidas por legislações Tony Calceteiro
específicas. Os conhecidos calçadões de Copaca-
bana e Ipanema, bem como toda a orla carioca e
A aplicação apropriada da técnica de assentamen-
as calçadas musicais do Boulevard 28 de Setem-
to é condição sine qua nom para garantir a quali-
bro, em Vila Isabel, são alguns exemplos de calça-
dade e durabilidade da pavimentação em pedras
mentos tombados pela municipalidade.
portuguesas. É um trabalho bastante cuidadoso e
artesanal, visto que a má execução da técnica, a
Eduardo de Almeida
Lenora De Vasconcelos
(...) Neste momento descobri,
sob meus pés, as pedras do calçamento,
as mesmas que pisei na infância.
Senti um grande conforto. (...)
Ecléa Bosi, 1994
O Jockey Club foi fundado em 1868 e, em 1932, camos nas três vilas hípicas existentes, bem como
fundiu-se ao Derby Club dando origem ao Jockey no conjunto arquitetônico próximo ao Tattersal,
Club Brasileiro. O terreno para instalação do hi- qualidades paisagísticas e de ambiência urbana
pódromo na Freguesia da Gávea foi obtido atra- suficientes para justificar seu interesse à proteção,
vés de uma permuta com a prefeitura. Sua área principalmente a Vila Hípica, por seu conjunto ar-
foi posteriormente se ampliando por meio de su- quitetônico ainda íntegro; e a Vila Tattersal, pela sua
cessivos aterros que modificaram a forma primitiva relação com o canal e pela qualidade ambiental do
do espelho d’água da Lagoa Rodrigo de Freitas. O seu entorno imediato. Além disso, esses bens pos-
projeto arquitetônico original do empreendimento suem importância histórica e cultural, uma vez que
foi assinado pelos arquitetos Archimedes Memó- guardam o registro da ocupação e das atividades
ria e Francisco Cuchet. Durante dois anos, foram do turfe na cidade do Rio de Janeiro.
construídos os prédios principais do complexo,
cuja inauguração ocorreu em julho de 1926. Dentre as demais edificações citadas acima, me-
recem especial atenção o Tattersal, presente já no
Em 1989, toda a área do Jockey Club Brasileiro foi projeto de 1928, por sua íntima relação com a vila,
protegida pela Lei 1.400, que transformou o lo- apesar de apresentar descaracterizações, ao nosso
cal em Área de Proteção Ambiental. Mais tarde, ver, facilmente recuperáveis. O castelo d’água, sua
várias leis, decretos, portarias e resoluções foram base e as baias do entorno também merecem ter
promulgados, com o objetivo de salvaguardar o sua volumetria e revestimentos externos mantidos.
conjunto de suas edificações. Além disso, entendemos que a vegetação existen-
te, especialmente no entorno do canal e nas ruas
Com a transferência das atividades de treinamen- das vilas, bem como junto às tribunas, merecem
to de cavalos e a permanência dos mesmos fora um estudo mais aprofundado a fim de que sejam
da cidade, diversos equipamentos do hipódromo identificadas as espécies arbóreas significantes de
ficaram obsoletos, tornando-se necessária a re- modo a torná-las imunes ao corte.
novação das áreas desativadas ou subutilizadas,
até mesmo como uma forma de gerar recursos
para a manutenção dos bens já protegidos pelo
Acervo IRPH
Formadas basicamente pelas cocheiras, estas com- os cavalos, com tipologia estilística de elementos
postas pelos boxes para cavalos, pátio e casas de Normandos e Ecléticos de gosto Classicizante.
treinadores, as três vilas existentes apresentam ca-
racterísticas tipológicas e arquitetônicas próprias,
Acervo IRPH
tendo sido construídas em diferentes momentos da
ocupação do terreno onde hoje está localizado o
complexo do hipódromo. Não foi possível determi-
nar com precisão a data de construção de cada uma
delas. No entanto, a partir das informações obtidas
na aerofoto de 1928 e em plantas e fotografias do
acervo do Jockey Club, conseguimos alguns dados
sobre a origem e evolução dessas edificações.
Acervo IRPH
não tivemos acesso a nenhum projeto ou fotografia
da época, só foi viabilizada após a construção do
aterro executado no período entre 1935 e 1965.
Acervo IRPH
Acervo IRPH
Tattersal). É composta por quatro ruas, duas delas
paralelas à orla da lagoa e duas perpendiculares,
formando três quadras e uma rua de cocheiras,
com acesso pela Avenida Borges de Medeiros.
Acervo IRPH
Vista geral da Vila Tattersal
Acervo IRPH
Vila Lagoa
Acervo IRPH
Vila Tattersal - vista da edificação
com as baias para cavalos
Acervo IRPH
Foi encontrado, ainda, um pequeno grupo de edi-
ficações junto ao acesso à Vila Tattersal, entre a Rua
General Garzon e a Avenida Borges de Medeiros,
composto de um castelo d’água, boxes para cava-
los, o Tattersal (local para realização de leilões) e o
hospital dos cavalos. Essas construções apresentam
elementos da arquitetura Eclética e alguma influência
Neocolonial, sendo importantes como registro histó-
rico das atividades do Jockey. Boxes
Acervo IRPH
Janeiro indicou os bens analisados para proteção
e, em dezembro de 2011, o prefeito Eduardo Paes
tombou o conjunto das vilas e os imóveis objetos
deste estudo.
Acervo IRPH
Tattersal
Acervo IRPH
Base do castelo d’água
Acervo IRPH
Henrique Fonseca
participaram a Gerência de Cadastro e Pesquisa e
Proteção e a Gerência de Intervenção Urbana deste
instituto, com o intuito de contribuir para a realização
do Plano de Estruturação Urbana do Méier, então em
desenvolvimento na Gerência de Planos Locais – 3,
na Secretaria Municipal de Urbanismo. O trabalho
teve o objetivo de indicar, no bairro do Méier e ar-
redores1, elementos de interesse cultural e áreas com
valor para a proteção do ambiente cultural.
Passarela de acesso à Estação Riachuelo
Henrique Fonseca
apresentam edificações de grande qualidade ar-
quitetônica e valor individual já reconhecido, pro-
tegidas ou indicadas para tombamento. No entan-
to, a arquitetura que melhor representa o caráter
da área é justamente aquela distante dos cânones
eruditos, mas criada através de diferentes leituras
destes, por classes populares e médias da socie-
dade, em geral a grande maioria dos moradores
dos bairros abrangidos pelo estudo. Este tipo de
arquitetura, aqui identificada pela denominação
de marcos urbanos, bem como os pequenos con- Edifício da Escola Municipal Augusto Paulino
Filho, na Rua Cônego Tobias, 116 – Méier
juntos a que se propõe preservar, são os principais
responsáveis pela existência das trocas sociais ca-
racterísticas da cultura suburbana, tão importantes Proteção. Dentre eles, se encontram os elemen-
para a memória e história da cidade. tos ligados à história ferroviária (estações, pontes,
passarelas, travessias), por sua importância como
Marcos urbanos e áreas de interesse cultural memória dos diferentes momentos do processo
de ocupação e expansão do subúrbio; os edifícios
Foram entendidos aqui como os elementos cons- maçônicos, por suas características arquitetônicas,
truídos pelo homem que se tornaram referência, com símbolos ligados à Maçonaria aplicados às fa-
guardando a memória da ocupação urbana da re- chadas e por seu valor histórico e relação com o
gião, aos quais se atribui valor cultural de cunho bairro; e o conjunto das residências do Méier, re-
artístico, histórico ou afetivo. Algumas edificações gistro das diferentes tipologias utilizadas ao longo
ainda não protegidas foram indicadas, a maio- da ocupação dos bairros do Méier e Lins de Vas-
ria delas já identificada em estudos anteriores, concelos, além de outras edificações e conjuntos
realizados pela Gerência de Cadastro, Pesquisa e identificados nas vistorias ao local.
Henrique Fonseca
Rua Engenho Novo, 95 fundos – Sampaio.
Edificação em madeira de tipologia única na
Rua Carolina Santos, 47 – Lins de Vasconcelos região, edificada junto à via férrea
Além disso, encontramos recantos dotados de estende da linha férrea até a Serra do Engenho
características urbanas que, pelo valor arquitetô- Novo, ainda conservando edificações do período.
nico de seu conjunto edificado, de sua importân- Para essas áreas, propusemos a criação de redu-
cia histórica ou pela qualidade de sua ambiência, tos onde fosse mantida a tipologia de unidades
mereceriam ter sua morfologia protegida. Tais unifamiliares ou bifamiliares, podendo ser tolera-
áreas ainda preservam um modo de vida carac- dos pequenos edifícios. Outras áreas, como o en-
teristicamente suburbano, cada vez mais raro na torno da Igreja de Nossa Senhora da Conceição,
cidade. Trata-se da relação das residências com o no Engenho Novo e do Fortim Caetano Madeira
espaço público e, portanto, da relação dos mora- (BTN), no Riachuelo, foram definidas também por
dores com a rua, com os transeuntes e com sua seu potencial arqueológico e exigem acompanha-
vizinhança. É o ato de botar cadeira no portão, mento em caso de obras que trabalhem no solo e
que, apesar de inibido pelo aumento da sensação subsolo. Há ainda, nessas regiões, conjuntos urba-
de insegurança nas grandes cidades, ainda pode nos remanescentes do final do século XIX e início
ser observado em alguns desses locais, bem como do século XX, com os quais as construções pos-
outras atividades notoriamente propiciadas pelas teriores guardam harmonia de escala e tipologia.
características tipológicas da arquitetura e pela
morfologia urbana que sugerimos proteger. Marcos urbanos de interesse na Paisagem Cul-
tural
Logo, foram selecionados alguns loteamentos
(o caso do entorno da Praça Amambaí e do Bairro Podemos entender o conceito de Paisagem Cul-
Myriam), datados das décadas de 1930 ou 1940, tural como o resultado das obras conjugadas do
além de trechos de bairros como no Riachuelo, homem e da natureza, em virtude de sua unida-
cuja ocupação data do final do século XIX e se de e/ou integração, incluindo as áreas com valor
Henrique Fonseca
etnológico ou antropológico. Como elementos
relevantes na área estão o Maciço da Tijuca, a Ser-
ra dos Pretos Forros e Parque Nacional da Tijuca.
Considerando as visadas das principais vias de pe-
netração da região, percebe-se com facilidade a
importância da moldura verde representada pela
Serra dos Pretos Forros, que integra o maciço para
o espaço urbano.
Henrique Fonseca
tuições beneficientes ou simplesmente por resi-
dências. Isto é, ocupações com baixa densidade,
normalmente com ambiências notáveis, tais como
o Morro do Smith (onde fica o Reservatório Mon-
teiro de Barros); o Morro das Dores (Convento e
Capela Nossa Senhora das Dores, na Rua Santos
Titara); o Morro do Paim, o Morro do Vintém (Es-
cola Municipal Benevenuta Ribeiro) e o Morro do
Jacaré (Colégio Salesiano e Fortim Caetano Ma-
deira), entre outros. Alguns desses locais apresen-
Trecho proposto para proteção nos bairros
tam pontos de observação e contemplação com do Lins de Vasconcelos e Engenho Novo
potencial turístico, outros são simples referências
na paisagem, capazes de situar os moradores no
espaço do bairro.
Henrique Fonseca
Henrique Fonseca
Henrique Fonseca
quanto à altura das edificações fosse tomado, es-
pecialmente junto à serra, considerando-se a exis-
tência de edificações das décadas de 60 e 70 que
apresentam uma relação muito contrastante com
as tipologias das edificações dos períodos anterio-
res, bloqueando a visibilidade das montanhas e da
paisagem em geral.
Henrique Fonseca
gência das manifestações culturais e constituem o
cenário onde se dão as trocas sociais tão peculia-
res das áreas ao longo da linha férrea, propiciado
pela morfologia desses bairros, pela escala e tipo-
logia das construções e pela relação destas com a
paisagem, o que garante seu valor cultural e sua
especificidade. Logo, entendemos que, para que
esse modo de vida permaneça, é importante que
sejam preservados os espaços que possibilitem a
manutenção dessas características.
1
Os bairros que compõem o presente estudo são os abrangi-
dos pelo PEU do Méier: São Francisco Xavier, Rocha, Riachuelo, Esquina das ruas Caimbé e Bicuíba –
Sampaio, Engenho Novo, Méier, Lins de Vasconcelos, Todos os Engenho Novo
Santos, Engenho de Dentro, Cachambi, Jacaré e Jacarezinho.
Henrique Fonseca
Henrique Fonseca
Em 2014, a Vila Proletária Marechal Hermes, que De fato, era um projeto ambicioso - a criação de
deu origem ao bairro de mesmo nome, estará co- um verdadeiro bairro para mais de cinco mil pes-
memorando seu centenário. No Dia do Trabalha- soas -, inspirado nas vilas europeias que foram vi-
dor, há quase cem anos atrás, era inaugurada pelo sitadas pelo próprio Hermes da Fonseca em sua
então presidente Hermes da Fonseca uma vila viagem ao velho mundo, antes de se tornar pre-
para operários destinada a abrigar 1.350 famílias. sidente. Propunha moradias de baixa densidade,
Possivelmente (e ouso a afirmar isto), trata-se da em vez de moradias coletivas que se destinavam
primeira intervenção federal na questão habita- naquela época à classe operária; a implantação de
cional no Brasil, ou, pelo menos, a primeira inter- equipamentos urbanos como hospital, maternida-
venção de grande porte e inovadora, ao antecipar de, escolas, creche, biblioteca, além de um teatro,
a abordagem de questões que viriam a ser discu- estabelecimentos de comércio e de serviços; a lo-
tidas pelos modernistas mais de 30 anos depois. calização da vila próxima a uma estação de trem.
Ou seja, a habitação do trabalhador não deveria Enfim, propostas novas, até em então não trata-
se resumir somente à moradia, também era ne- das na problemática da habitação social no Brasil
cessário pensar a infraestrutura, os equipamentos e que nas palavras do discurso do presidente, no
urbanos e a acessibilidade. canteiro de obras da vila, em 1913, pareciam ser
o início de um programa habitacional - Esses edi-
fícios que os rodeiam nesse momento não são
Janaina Barboza
Janaina Barboza
Localização do bairro de Marechal Hermes
Janaina Barboza
Janaina Barboza
Escola Municipal Evangelina Duarte Batista, Teatro Armando Gonzaga, projetado
localizada na Praça 15 de Novembro por Affonso Reidy
Após a sua inauguração, as obras não foram rei- Ao estudar a evolução urbana e a história do lugar,
niciadas, ficando a vila abandonada por longos é possível perceber que este bairro do subúrbio
anos. O projeto só seria retomado anos depois, na carioca guarda um conjunto arquitetônico expres-
década de 30, durante o governo de Getúlio Var- sivo, que, certamente, contribui para dar a ele
gas: o traçado urbano original da vila é mantido, uma fisionomia muito particular, além de outros
casas inacabadas foram concluídas; novas casas elementos, que julgo importante preservar, como
construídas; são inaugurados um cinema, o Cine o desenho das quadras, as praças, o padrão de
Lux, e o Hospital Carlos Chagas. Entre as décadas loteamento e a arborização.
de 40 e 50, conjuntos habitacionais com linhas in-
fluenciadas pelo modernismo presente na época Infelizmente, este patrimônio, que remete às ori-
são erguidos, assim como o Ginásio Professor José gens da habitação social no Brasil, está ameaça-
Acioly (1948), o Teatro Armando Gonzaga (1954) e do. E não é em função da especulação imobiliária
a Maternidade Alexandre Fleming (1956). ou do abandono de seus moradores. Parte desta
história está se perdendo, por causa da falta de
Janaina Barboza
Janaina Barboza
Janaina Barboza
manência deste conjunto, estudar corretamente
possíveis transformações e estabelecer novas re-
gras de ocupação visando a sua legibilidade. O
meio legal que o poder público dispõe para isto
é criando uma Área de Proteção do Ambien-
te Cultural (APACs). Através deste instrumento, a
sociedade pode assegurar, pelo menos do ponto
de vista legal, que bens de relevância cultural e os
quais exemplificam uma época de ocupação da
Casas de comércio
cidade não se percam em meio à transformação
do espaço urbano, constantemente em curso.
Sua criação se justifica porque visa assegurar a per-
manência desta paisagem, se justifica pela história do
Acredito que a maioria dos moradores do bairro bairro, pelas especificidades do lugar, pela intenção
não ignora seu passado. Muitos moram lá há anos de manter a diversidade de tipologias presentes na
e a história é contada pelos mais velhos aos mais cidade, e poderia ser pioneira no sentido de cooptar
novos. Suponho também que muitas pessoas da e mobilizar os moradores locais, através de organi-
região são favoráveis e acham justo que Marechal zações e associações comunitárias que lá já existem.
Hermes tenha a primeira APAC do subúrbio cario- O instrumento jurídico é fundamental, mas é a iden-
ca. Este reconhecimento, por parte do poder pú- tificação que as pessoas têm com os bens culturais,
blico, da importância de Marechal Hermes, seria os quais os técnicos afirmam serem interessantes ou
muito bem-vinda, especialmente porque ela esta- relevantes para a cidade, que vai de fato mantê-los
ria localizada numa zona da cidade que passa por preservados. Para assegurar que este patrimônio
um processo de transformação e homogeneiza- complete 100 anos é necessário iniciar os trabalhos
ção da paisagem, o qual não considera a existên- o quanto antes.
cia de uma forma própria de ocupação dos bairros
Notas
suburbanos, que resultou em tipologias que fazem 1
Arquiteta que desenvolveu trabalho final de graduação A pai-
parte da história local, que, por sua vez, conferem sagem suburbana: estudo para criação de uma APAC em
identidade a estes bairros. Marechal Hermes, EAU / UFF, 2006.
Janaina Barboza
Palavras Cruzadas
Marcia Balsam Niskier
1 2 3
A - Solar do Visconde do Rio Seco, Centro A - Fonte Stella, São Cristóvão A - Fábrica de Gás, Cidade Nova
B - Museu Villa Lobos, Botafogo B - Fonte Wallace, Santa Cruz B - Fábrica Bangu, Bangu
C - Solar dos Abacaxis, Cosme Velho C - Bebedouro, Alto da Boa Vista C - Trapiche Modesto Leal, Santo Cristo
Palavras Cruzadas
A B
2) A - Fonte Stella, São Cristóvão
C U B I S M O C
1) C - Solar dos Abacaxis, Cosme Velho
H T L
Você conhece este patrimônio cultural?
A R K A
U A I S M B
S E C L E T I S M O R
I S I D U
O C C E T
N H I R A
I S N L
S M I I
M O S S
O M M
B A R R O C O