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Introdução à Geometria Projectiva

1. Da Geometria de Euclides às Geometrias Não Euclidianas

A Matemática surgiu da necessidade de resolver problemas que o homem ia


enfrentando ao longo da história da humanidade. Inicialmente, ela tinha por base a
intuição e a experimentação.
A Geometria nasceu associada à resolução de problemas práticos, também
relacionados com a medição de terrenos.
As civilizações antigas como a Egípcia, a Hindu, a Babilónica e a Chinesa, chegaram a
vários resultados importantes relacionados com diversas áreas da Matemática.
Na área da Geometria, destacam-se, entre outros, a aplicação do teorema de Pitágoras,
o cálculo da área de formas rectilíneas simples e a observação da razão constante
entre o perímetro de uma circunferência e o valor do seu diâmtero.
A sistematização da Matemática surgiu com os gregos, iniciando com Tales de Mileto
(século VI a. C.), continuando com Pitágoras de Samos (cerca de 580 – 500 a. C.) e com
os pitagóricos por mais de dois séculos.
Euclides de Alexandria (≈325 – 265 a. C.) foi o primeiro a utilizar o método
axiomático, que permite organizar os resultados de forma lógica, bem como
demonstrá-los. Com base na sua famosa obra Os Elementos, considerada uma das
obras matemáticas mais bem sucdidas, composta por treze volumes em que explora
a Aritmética, a Teoria dos Números, a Geometria Plana e a Geometria Espacial.
Os cinco Postulados de Euclides:
P1: Para quaisquer dois pontos distintos A e B existe uma única recta que passa
por A e por B.
P2: Um segmento de recta pode ser prolongado indefinidamente para construir
uma recta.
P3: Dados um ponto qualquer e uma diatância qualquer, pode-se construir uma
circunferência de centro naquele ponto e com raio igual à distância dada.
P4: Todos os ângulos rectos são conguentes.
P5: Se uma recta cortar outras duas rectas de modo que a soma de dois ângulos
internos de um mesmo lado seja menor que dois rectos, então essas duas
rectas, quando suficientemente prolongadas, cruzam-se do mesmo lado em
que estão esses dois ângulos.
Com a evolução do conhecimento matemático e da linguagem matemática, foi
possível termos uma escrita diferente da apresentada por Euclides. Actualmente, o
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quinto postulado é mais conhecido segundo uma formulação moderna do texto


original, dada por John Playfair (1748 – 1819):
P5: Para qualquer recta t e qualquer ponto P não pertencente a t, existe uma única
recta r passando por P que é paralela a t.

Surpeendentemente, a obra de Euclides proporcionou o aparecimento de outras


geometrias. Enquanto os matemáticos sempre aceitaram os quatro primeiros
postulados de forma consensual, o mesmo não aconteceu com o quinto, mais
conhecido como Postulado das paralelas.
Muitos consideravam-no uma proposição (teorema), podendo, por esta razão, ser
demonstrado. Durante mais de dez séculos, alguns dos melhores matemáticos
tentaram prová-lo, mas sem sucesso.
O estudo do Postulado das paralelas e a busca de alternativas para o mesmo acabaram
por originar, já no século XIX da nossa era, o aparecimento de resultados que levaram
ao surgimento de geometrias que não verificam esse postulado, sendo chamadas de
Geometrias Não Euclidianas.
Por outro lado, no início do século XIII com o surgimento do movimento renascentista
influenciando em diversos campos da Arte, dentre elas, as artes plásticas, diversas
modificações com relação a técnicas de pinturas foram surgindo. Deste modo pintores
se preocupavam cada vez mais com a qualidade da representação tridimensional em
suas obras.
Para aqueles que buscavam essa qualidade, os conceitos da Geometria Euclidiana já
não satisfaziam suas necessidades. Na busca por outras formas de representações no
plano surgem pinturas que trazer o efeito de profundidade. Para conseguir criar
respectivo efeito, é necessário utilizar de linhas de projecção, as quais buscam um
ponto de convergência.
Dentro dos grupos de artistas se inicia a busca por conceitos matemáticos que são
expressos por pinturas e esculturas. Surge então a necessidade de uma
sistematização no modo de se observar um objecto, ou seja, de uma dada perspectiva
e assim se inicia o processo em que se analisa o modo como se vê um objecto.
Por exemplo, um método matemático simples: entre o olho e o objecto a ser pintado,
forma-se um cone de raios luminosos, chamado de cone de imagem ou de projecção.
A pintura é então idealizada como uma secção deste cone pelo plano da tela. Este
método é chamado de secção de projecção.
Portanto, esse chamado cone de raios luminosos ou cone de projecção são
necessariamente linhas de projecções, as quais possuem um foco (ponto em que as
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linhas se intersectam), e a partir desse foco, são desenvolvidas formas e figuras


proporcionais ao longo desse cone, propiciando assim o efeito de profundidade.

É visto que, quando um quadro possui linhas de fuga, é necessário desenvolver todas
as figuras que se sucedem referenciando-as com relação a suas respectivas linhas. A
partir de uma proporcionalidade que está presente e é orientada pelas mesmas, é
possível construir uma escala e com ela, relacionar as proporções das imagens e assim
a criar o que é chamado de cone projectivo na tela, tornando possível representar o
que é visto a olho nu.
Para se analisar tais construções com olhar matemático, é necessário iniciar o estudo
sobre respectivo tema a partir dos trabalhos de Girard Desargues (1591-1661),
matemático, arquiteto, engenheiro francês, o primeiro a elaborar com linguagem
matemática aquilo que pintores traziam em suas telas.

2. A Geometria Projectiva

A existência de geometrias distintas constitui ferramenta útil na resolução de


problemas geométricos.
Diferentemente da Geometria Eulidiana cujas bases de formulação são mais
conhecidas, dada a sua lomga história e ser âmbito de estudo em todos os níveis de
ensino, a Geometria Projectiva já não, pois esta, não sendo euclidiana, é sustentada
por resultados relativamente recentes não tão conhecidos como os da Geometria
Euclidiana.
A Geometria Projectiva pode ser considerada como geometria de visão, pois, aos
nossos olhos, duas linhas paralelas parecem encontar-se num ponto muito distante,
como é o caso, por exemplo, da linha férrea quando olhamos para os carris numa
perspectiva.
A história da Geometria Projectiva tem as suas origens na Itália, no século XV junto
com o Renascimento. Com base na sua capacidade de observação, os artistas pintores
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do Renascimento (Leonardo da Vinci, Leon Battista Alberti, Paolo Uccelo, Piero della
Francesa, Durer, etc.), no século XV, com o objectivo de tornarem as suas obras mais
realistas, desenvolveram a teoria da perspectiva, introduzindo os conceitos de ponto
de fuga e de perspectividade.
Estes artistas, chegaram à conclusão de que o olho “vê” de uma cena são os raios de
luz entre ele e cada ponto de cena. Ou seja, aperceberam-se que conseguiriam uma
representação realista a duas dimensões de um objecto tridimensional se unissem
através de uma recta cada ponto do espaço tridimensional com um cenro de projecção
(olho) e intersectando tal recta com um plano (tela), como se ilustra no exemplo da
figura a seguir. Este tipo de aplicação que veio a ser denominada projecção cónica.

A Geometria Projectiva explora e explica, do ponto de vista metemático, os resultados


obtidos por esses artistas.
Demorou cerca de dois séculos para que as ideias desses artistas pudessem ser
formuladas matematicamente. Essa construção foi feita por um pequeno grupo de
matemáticos franceses motivados dor Gerard Desargues (1591–1661).
Somente no inicio do século XIX, Jean Victor Poncelet (1788–1867) criou sua grande
obra sobre Geometria Projectiva publicada em 1822 com o título “Tratado das
propriedades projectivas das figuras” que deu o mérito de ser conhecido como o pai
da Geometria Projectiva. Certamente você deve ter já se questionado: mas , qual é,
concrectamente, o objecto de estudo da Geometria Projectiva? E você vai poder
responder esta pergunta ao longo da leitura deste e doutros textos.
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É mais fácil respondé-la fazendo uma pequena


analogia com a Geometria Euclidiana que já
conhecemos: enquanto a Geometria Euclidiana se
preocupa com o mundo em que vivemos, a
Geometria Projectiva lida com o mundo que
vemos.
Na prática, por exemplo, os carris da linha férrea
não são rectas paralelas, mas rectas que se
encontram no horizonte, no infinito, conforme
ilustra a figura ao lado.
Como poderá perceber em diante, essa é uma das
características marcantes da Geometria
Projectiva: duas rectas quaisquer sempre se
intersectam.

Para ajudá-lo ainda a distinguir uma geometria da outra, vejamos o quadro


comparativo que se segue, entre a Geometria Euclidiana e a Geometria Projectiva:

Geometria Euclidiana Geometria Projectiva


(o que sabemos)
 Descreve ângulos e formas;  Extensão do plano euclidiano
 Duas rectas se intersectam num (pontos ideais);
ponto, escepto as paralelas;  Todas as rectas se intersectam em
 Sistema de coordenadas define o algum ponto;
espaço;  Nas transformações afins;
 Origem pode ser qualquer ponto; transformação linear + tranlação;
 Nas transformações euclidianas,  Também pode se esticar o espaço;
translada-se a origem e gira-se os  Os pontos no infinito não são
eixos; diferentes dos outros;
 Conceito de infinito na GE;  Todos os pontos são iguais;
 Todos os pontos são iguais  Após uma transformação, pontos no
 Após uma transformação, pontos no infinito podem virar pontos no
infinito continuam no infinito; espaço e vice versa;
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3. Conceitos fundamentais da Geometria Projectiva


Muitos termos e conceitos são comuns entre as geometrias Projectiva e a Euclidiana.
Os conceitos primitivos de ponto e de recta na Geometria Euclidiana são os mesmos
existentes na Geometria Projectiva.
Se um determinado ponto pertence a uma recta, diz-se que o ponto é incidente com a
recta e vice-versa
Os pontos que incidem com uma mesma recta, tal como na Geometria Euclidiana,
também são denominados pontos colineares. E se duas rectas se intersectam num
único ponto, são denominadas também rectas concorrentes.

3.1. Axiomas da Geometria Projectiva


Existem diferentes formulaçoes dos axiomas da geometria Projectiva, uma das quais
é que se segue:
A1: Existem uma recta e um ponto que não são incidentes.
A2: Toda recta é incidente com pelo menos três pontos distintos.
A3: Dois pontos distintos são incidentes com exactamente uma recta.
A4: Se A, B, C e D são quatro pontos distintos tais que AB intersecta CD, então AC
intersecta BD.
A5: Se ABC é um plano, existe ao menos um ponto fora do plano ABC.
A6: Quaisquer dois planos distintos têm ao menos dois pontos em comum.
A7: Os três pontos diagonais de um quadrangulo completo nunca são colineares.
A7: Se uma projectividade deixa invariante cada um de três pontos distintos de uma
recta, ela deixa invariante todos os pontos da recta.

3.2. Feixe de rectas


Consideremos um conjunto de todas as rectas de um plano: a, b, c, d,  , distintas ou
não, e concorrentes num ponto P. Ao conjunto dessas rectas chama-se feixe de rectas
e representa-se por P(a, b, c, d, ).
As rectas deste feixe são os elementos do feixe e o ponto P é o centro do feixe.
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3.3. Feixe de pontos


Ao conjunto de todos os pontos (A, B, C, D,  ) do plano, distintos ou não, incidentes
com uma recta r, chama-se feixe de pontos e geometricamente representa-se por
r(A, B, C, D, ).
Os pontos do feixe são os seus elementos e a recta r é a base do feixe.

3.4. Perspectividade e Projectividade


A intersecção de um feixe de rectas P(a, b, c, d,  ) com uma recta t, não incidente com
P, define um feixe de pontos da recta t: t(A, B, C, D,  ).
Assim, existe uma correspondência biunívoca entre o feixe de rectas e o feixe de
pontos, tal que a cada elemento do feixe de rectas corresponde um e só um elemento
do feixe de pontos e vice-versa. Isto é, a cada recta de P(a, b, c, d,  ) corresponde um
único ponto de t(A, B, C, D, ) e, inversamente, a cada ponto de t(A, B, C, D,  )
corresponde um única recta de P(a, b, c, d,  ).

a b c d

t A B C D

Assim, perpectividade (ou perspectividade elementar) é a correspondência biunívoca


que faz corresponder a cada recta de P(a, b, c, d,  ) um único ponto de t(A, B, C, D, 
). Ou ainda, é a correspondência biunívoca que faz corresponder a cada ponto de t(A,
B, C, D, ) uma única recta de P(a, b, c, d,  ).
Podemos usar como símbolo de perspectividade o sinal “  ”.
Usando como exemplo o ilustrado na figura acima, podemos escrever:
P(a, b, c, d,  )  t(A, B, C, D,  ), ou
t(A, B, C, D,  )  P(a, b, c, d,  ).
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3.5. Perspectividade entre pontos


Consideremos um ponto P(a, b, c, d,  ) e as rectas t(A, B, C, D,  ) e s(E, F, G, H,  )
em perpectiva conforme a figura que se segue.
De acordo com esta figura a seguir, podemos dizer que existe uma correspondência
biunívoca entre os elementos dos feixes de pontos de t e s, dado que a cada ponto de
t(A, B, C, D, ) corresponde um único ponto de s(E, F, G, H,  ) e vice versa.
Assim, os pontos dos pares (A e E), (B e F), (C e G) e (D e H), dizem-se homólogos.
Portanto, pode se dizer que os feixes de pontos t(A, B, C, D,  ) e s(E, F, G, H,  ) são
perspectivos do ponto P.
P
a
b c d
t A B C D
G H
F

E
s

Diz-se que os feixes de pontos t(A, B, C, D,  ) e s(E, F, G, H,  ) são perspectivos de


um ponto P se existe uma correspondência biunívoca entre os pontos dos feixes e se
as rectas incindentes com os pontos homólogos são concorrentes no ponto P.
Assim, o ponto P diz-se centro da perspectividade.

3.6. Perspectividade entre feixes


Sejam dados dois pontos distintos P e P’ e ainda dois feixes de rectas P(a, b, c, d,  ) e
P’(a’, b’, c’, d’, ) conforme ilustra a figura que se segue:
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De acordo com a figura, podemos dizer que p(A, B, C, D,  )  P(a, b, c, d,  ) assim


como t(A, B, C, D, )  P’(a’, b’, c’, d’, ).
E aplicando a propriedade comutativa e a transitiva, podemos escrever:
P(a, b, c, d,  )  P’(a’, b’, c’, d’,  ).
Assim, os feixes de rectas P(a, b, c, d,  ) e P’(a’, b’, c’, d’,  ) são perspectivos da recta
p. E as rectas dos pares (a e a’), (b e b’), (c e c’) e (d e d’), dizem-se homólogas.
Portanto, dois feixes de rectas P(a, b, c, d,  ) e P’(a’, b’, c’, d’,  ) são perspectivos de
uma recta p se existe uma correspondência biunívoca entre os feixes e se os pontos
de intersecção das rectas homólogas incidem com a recta p.
Diz-se que a recta p é o eixo de perspectividade.

Analisando atentamente os conceitos 3.4 e 3.5 podemos notar, com a ajuda das
respectivas figuras, que da mesma forma que existe perpectividade entre feixe de
rectas e um feixe de pontos, também existe perspectividade entre rectas e os feixes
de pontos.

3.7. Projectividade
Consideremos agora a figura a seguir, com os feixes de rectas P1 e P2.

De acordo como o ponto 3.5 anterior, podemos observar que os feixes de pontos p1 e
p2 são perspectivos em P1; assim como p2 e p3 são perspectivos em P2:
p1(A1, B1, C1, D1)  p2(A2, B2, C2, D2)  p3(A3, B3, C3, D3)
Reparemos que, efectuando as duas perspectividades sucessivamente, podemos
obter p3(A3, B3, C3, D3) a partir de p1(A1, B1, C1, D1). Ou seja, existe uma correspondência
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biunívoca entre os elemetos dos dois feixes de pontos que resulta na composição das
duas perspectividades.
Só que esta trasnsformação, repare, já não é perspectividade. Porquê?
Simplesmente porque as rectas A1A3, B1B3, C1C3 e D1D3 não são concorrentes num
único ponto. Assim, diz-se que a correspondência que resulta da composição de duas
perpectividades é uma projectividade.

Chama-se projectividade entre feixes de rectas ou pontos à composição finita de


perspectividades e representa-se com o símbolo (  ).
Assim, segundo a figura anterior, temos p1(A1, B1, C1, D1)  p3(A3, B3, C3, D3).

De um modo geral, podemos a partir daqui concluir facilmente que uma projectividade
p1(A1, B1, C1, D1, )  pn(An, Bn, Cn, Dn,  ) é resultante da composição de n  1
perspectividades.
Pode-se considerar que uma perspectividade é um caso particular da projectividade,
isto é, uma perspectividade é sempre uma projectividade, mas uma projectividade
nem sempre é uma perspectividade.

3.8. Plano Projectivo


Chama-se plano projectivo  (P, R, I) a uma estrutura de incidência, em que os
elementos de P são designados por pontos, os elementos de R são designados por
rectas e I é a relação de incidência, que satisfaz às seguintes propriedades:
P1: Dois pontos distintosincidem com uma única recta.
P2: Duas rectas distintas possuem um único ponto em comum.
P3: Existem quatro pontos não colineares, três a três.
Analizando este conceito, podemos perceber a diferença entre um plano euclidiano e
o plano projectivo: o plano euclidiano, por admitir a existência de rectas paralelas,
não verifica a propriedade (P2). Porém, um plano projectivo pode ser obtido a partir
de um plano euclidiano.

3.9. Ponto impróprio


Seja Ɛ um plano euclidiano e r uma recta desse plano. Assim um feixe de rectas
paralelas à r é o conjunto formado pela recta r e todas as outras rectas paralelas à r.
Assim, podemos associar a cada feixe de rectas paralelas um ponto, no plano
projectivo.
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O ponto impróprio (ou ponto ideal, ponto infininto) é um ponto do plano projectivo
que define a direcção de um feixe de rectas paralelas no plano euclidiano e
representa-se pelo símbolo (P∞).
Seja r uma recta do plano euclidiano, pertencente a um feixe de rectas paralelas cuja
direcção é definida pelo ponto impróprio P∞. Portanto, qualquer recta incidente com
P∞ é paralela à recta r.
Assim, uma recta do plano euclidiano com o respectivo ponto impróprio, no plano
peojectivo, chama-se recta estendida (ou aumentada).

3.10. Recta imprópria


Tomando em conta que no plano euclidiano, diferentes efeixes de rectas paralelas têm
diferentes pontos impróprios, no plano projectivo, dado que os feixes têm direcções
diferentes, todos os pontos impróprios constituem uma única recta, no plano
projectivo.
Chama-se recta imprópria (ou recta ideal, recta no infinito) à recta incidente com
todos os pontos impróprios e representa-se por (l∞).
Assim, o plano euclidiano com a recta imprópria formam um novo plano, o plano
projectivo.

Ao conjunto formado pelo plano euclidiano e a recta imprópria chama-se plano


euclidiano estendido (ou aumentado) e representa-se por (Ɛ∞).
Repare que, no plano euclidiano, os pontos e as rectas que forem diferentes das dos
pontos imprórios e das rectas impróprias são designados de pontos próprios e rectas
próprias.
Repare também que o plano Ɛ∞ também é um plano projectivo, pois verifica as 3
propriedades do plano projectivo (apresentadas em 3.7).

Considerando que no plano projectivo todas as rectas se intersectam (P2), sempre que
quisermos referir que duas ou mais rectas, no plano projectivo, correspondem a
rectas paralelas no plano euclidiano, diremos então que o respectivo ponto de
intersecção é um ponto impróprio.
O plano euclidiano também pode ser definodo a partir do plano projectivo. Qualquer
recta do plano projectivo pode ser considerada como recta imprópria, sendo, neste
caso, todos os seus pontos também impróprios. Assim, todas as rectas concorrentes
num mesmo ponto impróprio da recta imprópria, no plano projectivo, passam a
constituir um feixe de rectas paralelas no plano euclidiano.
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Partindo destas considerações, podemos definir um número mínimo de rectas e


pontos de um plano projectivo.
Seja Ɛ∞ um plano prpjectivo. De acordo com a propriedade P3, existem quatro pontos
não colineares A, B, C, e D em Ɛ∞ conforme ilustra a figura a seguir.
Pela prppriedade P1, os quatro pontos definem as rectas AB, BC, AC, AD, BD e CD. E
segundo a propriedade P2, existem três pontos E, F e G tais que E≡AB⋂CD, F≡BC⋂AD,
G≡AC⋂BD.

Não existindo outro ponto em, os pontos E, F e G incidem com a mesma recta.
Assim, um plano projectivo tem, no mínimo, sete pontos e sete rectas.
Um plano projectivo finito (plano com sete pontos e sete rectas) como o da figura
acima, é também conhecido como plano de Fano, em homenagem ao matemático
italiano Gino Fano.
Em qualquer plano finito, as rectas contêm o mesmo número de pontos n  1 com n 
N e os pontos incidem no mesmo número de rectas n  1 .
Assim a ordem de um plano projectivo finito é definido pelo número natural n, sendo
a menor ordem de todas n  2 .
Neste caso, o plano de Fano é exemplo de um plano finito de ordem 2.
Usando a análise combinatória e tendo em conta as propriedades do plano projectivo,
pode-se afirmar que um plano projectivo finito de ordem n possui exactamente
n 2  n  1 pontos e n 2  n  1 rectas.

3.11. Princípio da dualidade


Um princípio considerado válido e uma das maiores vantagens da Geometria
Projectiva em relação à Euclidiana, é o princípio da dualidade, que consiste na troca
de palavras em afirmações ou teoremas, de modo a obter textos correspondentes
igualmente válidos, os quais são designados por duais dos iniciais.
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Por uma questão da lógica matemática, se considerarmos que T representa uma


proposição ou um teorema, então o respectivo texto dual será T*.
Podemos considerar que existem dois princípios da dualidade, sendo um para o
plano e outro para o espaço.
No plano projectivo, fazendo a troca dos termos “ponto” e “concorrente” pelos termos
“recta” e “colinear”, respectivamente, e fazendo as devidas adaptações, obtemos o dual
igualmente válido no plano projectivo.
Este princípio só é possível pelo facto de pontos e rectas terem o mesmo
comportamento quanto à relação de incidência. A verificação de que os duais das
propriedades do plano projectivo são também afirmações verdadeiras permite
estabelecer o princípio da dualidade no plano projectivo.
Podemos verificar que as propriedades P1 e P2 são duais. O dual da propriedade P3
diz que: (P3*:) esistem quatro rectas, não concorrentes, três a três.
Como prova da veracidade temos:
Pela P1, podemos afirmar que os quatro pontos definem as rectas AB, BC, CD e AD.
Verificamos que a recta AB não é concorrente com as rectas BC e CD no ponto C, caso
contrário, os pontos A, B e C seriam colineares.
Da mesma forma, verificamos a não concorrência das restantes rectas.
Assim fica demonstrada a veracidade da propriedade P3*, o que permite garantir a o
princípio da dualidade no plano projectivo.
Há duas vantagens a destacar que o princípio da dualidade traz à Geometria
Projectiva:
 Permite a obtenção de resultados, através dos duais de teoremas,
proposições, etc.;
 Confere-lhe um poder de síntese, permitindo limitar o número de
demostrações, pois a demonstração de resultados duais fica justificada pelo
próprio princípio.

3.12. Razão Cruzada


Cosideremos os feixes de pontos r(A, B, C) e r’(A’, B’, C’). Conforme ilustra a figura
ao lado, facilmente concluímos que, na generalidade, a perspectiva não preserva as
distâncias entre pontos.

Verificamos que r(A, B, C)  r’(A’, B’, C’), onde AB = BC e sem necessidade de recorrer
a cálculos, podemos verificar que A´B´ ≠ B´C´.
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Como a projectividade é definida por uma composição finita de perspectividades,


podemos concluir que a projectividade também não preeserva as distâncias.

No entanto, podemos observar um caso particular em que as distâncias são


preservadas por perspectividade, caso em que o centro de perspectividade é
impróprio e as rectas r e r´ têm um ponto impróprio como ponto de intersecção,
conforme ilustra a figura a seguir:

Por outro lado, podemos facilmente verificar que nem sempre uma perspectividade
mantém a posição relativa entre pontos, pois, como ilustra a figura abaixo, o ponto B
está entre os pontos A e C e o ponto homólogo B´ não se encontra entre A´e C´. Como
consequência, acontece o mesmo com a projectividade.
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Porém, existe uma relação que é preservada tanto pela perspectividade como pela
projectividade. Esata relação é conhecida como razão cruzada, sendo uma razão entre
duas razões.
Para tal, podemos considerar uma recta r com a orientação e dois dos seus pontos
distintos A e B. O segmento de recta com origem em A e extremidade em B (AB) possui
um sentido oposto ao segmento BA, ou seja, BA   AB .

Considerando C um ponto incidente em r, distinto dos pontos A e B, podemos admitir


dois casos conforme ilustra a figura anterior.
A razão da divisão do segmento de recta AB por C é representda por (AB, C) e definida
AC
por: ( AB, C )  .
BC
No entanto, podemos observar que quando AC e BC têm o mesmo sentido a razão da
divizão do segmento de recta AB por C é positiva e quando AC e BC têm sentidos
contrários, ela é negativa.
Ou seja: (AB, C) < 0 se AC e BC têm sentidos opostos e (AB, C) > 0 se AC e BC têm o o
mesmo sentido, independentemente da orientação da recta r.

Assim, consideremos quatro pontos distintos A, B, C e D incidentes numa recta r.


Nesta ordem, a razão cruzada de A, B em relação a C, D é representada por (A,B; C,D)
e é igual à razão (AB, C) e (AB, D) isto é:
AC
AC BD AC BD
( A, B; C , D )  BC ⟺ ( A, B; C , D )    
AD BC AD AD BC
BD
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Consideremos como exemplo, quantro


pontos distintos A, B, C e D incidentes na
recta r nesta ordem, conforme ilustra a
figura ao lado.
Então, temos:

3.13. Pontos harmónicos conjugados


Para melhor abordarmos este ponto, vamos antes falar da configuração do plano
projectivo designada quadrângulo.
Um quadrângulo completo [PQRS] é formado por quatro pontos P, Q, R e S, designados
vértices (não existindo três pontos colineares entre eles) e pelas seis rectas definidas
por cada par de vértices, designadas por lados.
Num quadrângulo completo, dois lados dizem-se opostos quando não possuem
vértices em comum. Os pontos de intersecção dos lados opostos são designados por
pontos diagonais.
Na figura que se segue, está ilustrado o exemplo de um quadrângulo completo [PQRS]
em que os pontos E, F e G são os pontos diagonais:

A figura dual do quadrângulo completo é o quadrivértice completo (quadrilátero


completo), que é formado por quatro rectas designadas por lados (não existindo três
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rectas concorrentes) e pelos seis pontos de intersecção de cada par de rectas


(vértices).
Na figura abaixo está ilustrado o exemplo de um quadrivértice completo [pqrs]:

Quatro pontos colineares A, B, C e D formam um conjunto harmónico de pontos se


existir um quadrângulo completo de tal forma que um par de lados opostos seja
incidente com A, outro par de lados opostos seja incidente com B, isto é, A e B sejam
pontos diagonais do quadrângulo, e cada um dos lados do terceiro par de lados
opostos incida com C e D, respectivamente.
Sejam A, B, C e D quatro pontos colineares. Se eles formam um conjunto harmónico
de pontos, então C e D dizem-se conjugados harmónicos com respeito a A e B, e denota-
se por H(A,B;C,D). A figura que se segue ilustra um conjunto harmónico:

A seguir apresentamos os passos para a construção do conjugado harmónico.


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Consideremos três pontos coliineares A, B e C conforme a figura abaixo. Para


determinar o ponto D, conjugado harmónico de C em relação a A e B, vamos:
I. Determinar dois pontos I e J
colineares com C, não incidentes
com a recta AB;
II. Traçar as rectas AJ, AI, BJ e BI;
III. Determinar o ponto K≡AJ⋂BI;
IV. Determinar o ponto L≡AI⋂BJ;
V. Traçar a recta KL; e
VI. Determinar o ponto D≡KL⋂AB.
O o ponto D é conjugado harmónico
de C em relação a A e B.

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