Afasia
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PRATICANDO
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PRATICANDO
Terapia do paciente com afasia predominantemente compreensiva
Vamos supor que você tem um paciente e observou na avaliação que ele
não consegue ler, fala só algumas palavras (é apráxico) e tem uma
compreensão limitada ao dia a dia e ao simples; se você começa a falar
de coisas mais complexas ou que são de fora do ambiente dele, ele já
não compreende.
Mas não podemos esquecer que esse paciente é apráxico! Então, ele
tem um problema para planejar. Ele sabe o que vai dizer, mas na hora de
planejar como dizer, como articular, o plano sai errado e, em vez de falar
“laranja”, ele fala “maçã”, por exemplo; ou ele quer falar “maçã” e nem sai
a primeira sílaba!
Você vai escrever esse passo a passo, vai mostrar imagens desses
passos acontecendo e imagens da ação final (pode usar o kit Cartões
Verbais ou pegar cenas de filme/novela).
Não!
Se você tem 40 minutos de sessão, você vai dividir esses 40 minutos
entre todas as alterações que encontrou na avaliação, para que sejam
trabalhadas na mesma sessão. Portanto, se tem 4 alterações, nesse
caso você teria 10 minutos por sessão para trabalhar cada alteração.
Fonoaudiólogo que faz treino de linguagem com material infantil, que usa
treino de cartilha, que não trabalha atenção, memória, planejamento e
execução, com certeza vai ter pacientes com prognóstico pior do que o
fonoaudiólogo que faz o oposto disso.
Portanto, tenha sempre em mente que o seu paciente afásico é cognitivo,
é adulto e vai precisar passar por um processo de reaprendizagem, não
de aprendizagem!
Será que o paciente vai achar legal tomar água na seringa? Pode até ser
que sim, mas é uma coisa que ele nunca fez na vida, nunca precisou se
planejar pra isso. O que eu quero dizer é que quando vamos falar (na
fala espontânea), não fazemos “bico-sorriso-estralo de língua” antes de
cada palavra. Certo? Então, eu acho delicado a gente distanciar muito o
paciente do que ele precisa fazer para só depois trazê-lo para o que ele
realmente vai precisar. Por isso eu acho que não dá certo com todo
mundo. E com isso eu não estou dizendo que o método não é bom ou
que não funciona, estou só dizendo que não vai funcionar pra todo
mundo. Vou explicar por quê!
A antiga “Afasia de Wernicke” (antiga, porque hoje em dia não se usa mais
classificação de afasias) era caracterizada por logorreia, lembra? Isso
significa que a logorreia é uma característica comum em afasias
predominantemente compreensivas.
Você vai precisar inserir esse paciente no mundo! Pensa nas aulinhas de
inglês para iniciantes. Quando o professor te ensina “bola”, ele mostra a
bola, tem a palavra “ball” escrita, tem alguém falando a palavra (portanto,
tem o som)... São fornecidos todos os inputs para que você aprenda como
é “bola” em inglês.
Certo? Não tem mais como não saber isso a essa altura do campeonato,
concorda?
Nesse caso, o “puta merda” é o jargão dele e ele usa como comunicação.
Esse é um jargão bastante comum, inclusive, e algumas vezes eles até
conseguem se comunicar, mesmo usando só os jargões.
Então, de novo, vamos trabalhar palavras com diversos inputs: ele vai
repetir, ler, escrever, ver foto, objeto, sempre um campo semântico de cada
vez. Aos poucos, ele vai substituindo o jargão por “oi”, pelo nome da filha,
vai aumentando o vocabulário e diminuindo o uso do jargão.
Você vai colocar, por exemplo: faca, vaca e saca. Aí você fala uma dessas
palavras (sem dar pista visual) e pede pra ele apontar qual você falou. Assim,
você vai conseguir avaliar se ele está escutando a mesma coisa que ele lê. Se
você detectar que ele tem alteração de processamento auditivo, mas uma boa
compreensão, compensa encaminhar para os nossos colegas audiologistas
fazerem um treino em cabine com ele, ok?! É razoavelmente comum isso
acontecer.
E a parafasia verbal?
Muitas vezes, o fonoaudiólogo pode achar que esse paciente tem uma
alteração de discurso, quando na verdade ele tem uma alteração semântica.
E o que fazemos nesses casos?
Nós reforçamos o significado das coisas, para quê elas servem, onde
encontramos... Podemos dar pistas como aquelas que encontramos em
palavras cruzadas, sabe? Você dá a dica e o paciente dá o nome. Por
exemplo: “é um lugar onde a maioria das pessoas gosta de ir no calor, tem
muitas no Brasil, lá tem água salgada”, e o paciente fala “Farmácia”, mesmo
querendo falar “Praia”. Você continua reforçando a parte semântica, mostra
foto, mostra a palavra escrita e ele vai organizando as “gavetas” semânticas
dele.
PRATICANDO
- É possível não conseguir restabelecer a
comunicação de um paciente afásico?
Vou te dizer que é bem difícil isso acontecer, viu?! É mais fácil isso acontecer
por falta de habilidade do terapeuta do que por incapacidade neurológica do
paciente.
- Tenho um paciente que tem boa compreensão auditiva, mas toda vez que eu coloco
uma figura, ele se perde. Ele vai melhor na compreensão verbal do que de objetos, por
exemplo. O que eu posso fazer pra melhorar essa percepção de figuras e objetos?
Existe algo chamado negligência. É possível haver negligência dentro de
um quadro de acidente vascular encefálico (AVE), por exemplo. Então, o
paciente tem basicamente quatro quadrantes para olhar: canto superior
esquerdo, canto superior direito, canto inferior esquerdo e canto inferior
direito. Essas áreas precisam ser testadas. A gente parte do pressuposto
de que esse paciente vai ser avaliado por uma equipe multidisciplinar e
bem atenta. Quem avalia negligência é o neurologista e quem trata é o
terapeuta ocupacional. Mas, na realidade, sabemos que nem sempre é
assim que funciona. Por isso, sempre precisamos saber quais são os
profissionais que estão acompanhando nossos pacientes e manter
contato com a equipe inteira, saber o que está sendo trabalhado, o que foi
detectado na avaliação etc.