A História de Arroar

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A HISTÓRIA DE ARROAR, O LEÃOZINHO SEM LIMITES

"A história de Arroar, o leãozinho sem limites" apresenta ao psicoterapeuta


possibilidades para o trabalho com crianças cujas crenças se estabelecem em torno
do domínio ligado aos limites prejudicados.
Arroar é um leãozinho que deseja controlar tudo do próprio jeito e para o próprio
conforto. É exigente e acredita que os outros animais existem para satisfazer seus
caprichos. Ele se percebe "rei" e faz de seus pais e de qualquer outro que cruze o
seu caminho "seus súditos". Essa dinâmica de Arroar é também sustentada por seu
ambiente familiar, por pais que falham em estabelecer limites para o filhote, se
mostram permissivos e inclinados a realizar suas vontades pouco razoáveis e
acabam, portanto, sendo completamente controlados por ele. Pode-se notar
que Arroar é o protótipo do arrogo do tipo mimado. Os personagens da história
são: Arroar, seus pais, o ratinho da mata e Sibile, a perigosa serpente da mata.
A análise das ações do leãozinho permite ao terapeuta trabalhar com a identificação
de padrões de arrogo e testar sua conceitualização de caso, especialmente quando
a criança é capaz de identificar os próprios comportamentos nos comportamentos
do leão.
Existem vários temas que compõem o esquema de arrogo, que, nessa história,
podem ser investigados e trabalhados pelo terapeuta: falta de limites; problemas
na empatia, no autocontrole e na autodisciplina; cumprimento de regras; senso de
vulnerabilidade aumentado; excessiva independência; falta de tolerância; birras;
desobediências; dentre outros. Temas paralelos, como ser empático, ajudar o
outro, solução de problemas, relação com os pais, podem ser explorados à medida
que o terapeuta analisa com a criança os comportamentos dos personagens.

A HISTÓRIA INFANTIL
Na forma original, a história é apresentada em pequenos textos escritos com letras
grandes, para não cansar a criança com a leitura. Os desenhos ilustram a narrativa
do bloco para atrair a atenção e estimular a imaginação da criança. Os personagens
ajudam o terapeuta a investigar o padrão familiar, comparando os dados da história
com o padrão de educação da criança. Por exemplo, o personagem narrador
(ratinho) faz perguntas que o terapeuta pode direcionar à criança para questionar
os padrões de comportamentos de arrogo mimado dela. Quando solicita à criança
que responda às indagações do ratinho, o terapeuta acessa pensamentos
automáticos, crenças secundárias e centrais da criança. Além disso, a mudança do
leãozinho ao longo da narrativa permite ao terapeuta estabelecer, a partir da
história, diálogos socráticos com a finalidade de modificar pensamentos e crenças.
Essa técnica tem sido trabalhada com crianças que apresentam transtorno
desafiador de oposição e transtorno da conduta, apresentando bons resultados. A
técnica é aplicada assim que o terapeuta tem uma conceituação de caso que aponta
para esses tipos de transtornos. A leitura da história é trabalhada ao longo de três
sessões, como uma "mininovela". Na primeira sessão trabalha-se com os quadros
que envolvem a chegada da família de leões à mata até a preocupação dos pais
com a ausência do leãozinho na caverna. Na segunda sessão trabalha-se do quadro
em que o ratinho se propõe a procurar pelo leãozinho até a fuga do leãozinho e do
ratinho. Na terceira sessão trabalham-se os motivos ligados ao abandono do bando
até o final. Em todas essas sessões a história é utilizada para ensinar o modelo
cognitivo, estabelecer diálogos socráticos, conferir a conceituação cognitiva
estabelecida, ensinar distorções cognitivas e trabalhar as mudanças de
pensamento. A seguir, apresentaremos o texto completo e as ilustrações utilizadas
nessa técnica.
A HISTÓRIA DE ARROAR: O LEÃOZINHO SEM LIMITES

Olá, eu sou um ratinho, um ratinho da mata.


Moro aqui há muito tempo e já vivi muitas aventuras.
Mas nada se compara com a história que vou lhe contar agora.
Preste muita atenção!
Tudo começou há algumas semanas...
Já era tardezinha e eu estava colhendo frutinhas da mata.
De repente, ouvi um barulho.
Olhei e vi um casal de leões e um filhotinho se aproximando.
Fiquei com medo.
Curioso... Nunca os tinha visto na mata. O que será que eles querem? - pensei
comigo mesmo.
Resolvi ficar para ver o que queriam por aqui.
Comecei, então, a ouvir um pouco da conversa.
- Minha querida, estou preocupado. Ter deixado o bando foi mesmo a melhor
solução? - disse o papai leão.
- Não vejo outra saída. Arroar seria prejudicado se ficássemos... Também me
preocupo muito, mas estamos fazendo isso pelo bem de Arroar - respondeu a
mamãe leoa com uma cara muito triste.
- Tá bom, fique calma, tudo vai se resolver. Vamos ficar um tempo por aqui, e
depois retornamos para nosso bando.

Fiquei intrigado com toda aquela conversa.


Afinal, o que estava fazendo uma família de leões naquele lugar da mata?
Por que estavam abandonando seu bando?
Era tudo muito estranho.
Decidi, então, descobrir e fui seguindo-os de longe até que chegamos a uma
caverna.
- Essa caverna me parece boa. Vamos ficar aqui mesmo. - disse o papai leão.
- Venha, Arroar, vou ajeitar uma caminha bem gostosa e cheia de folhas macias
para você descansar. - disse a mamãe leoa.
- Não gostei desta caverna! Ela é muito escura e úmida para mim - rosnou
descontente o filhote. - Eu não fico aqui!
- Escuta, garoto, ficaremos nesta caverna sim, pois estamos todos cansados e a
noite está chegando. - respondeu o pai.
- Aqui não fico e ponto final! - rosnou mais alto o filhote.

Nossa! Confesso que fiquei assustado com aquele leãozinho.


Ele rosnava mais alto e exigia o que queria de seus pais.
Parecia não se importar com o perigo ou com as consequências de agir assim!
O que será que faz ele pensar que pode agir dessa maneira?
De repente, a mamãe leoa, já bastante inquieta e aflita com a situação, resolveu
terminar a conversa.
- Tá bom, tá bom, Arroar! Vamos andar mais um pouco e acharemos um lugar que
seja bom para você, do jeitinho que você gosta. Mas vamos parar de discutir!
- Mas, meu bem, e se não acharmos? Onde iremos dormir? Aqui me parece muito
confortável. - retrucou o papai leão.
- Não quero mais discutir, meu amor. Acharemos um outro lugar. Vamos!

Minha curiosidade aumentou. Resolvi, então, continuar seguindo de longe a família


real para ver o que acontecia.
A noite chegou e eles ainda não tinham achado um lugar seguro e confortável para
dormir.
Então o leãozinho começou a reclamar:
- Mãe, tô muito cansado! Vocês não vão arrumar um lugar para eu descansar?
- Vamos, Arroar. Fique tranquilo que nós encontraremos um lugar seguro e
confortável, como você gosta!
Mas o reizinho não parava de reclamar:
- Mas eu não quero andar mais! Tô cansado! Vocês deveriam saber que minhas
patinhas não aguentam andar tanto! - reclamou, chateado, o filhote.
- Então vamos parar aqui. Você está cansado e, além disso, não conheço bem essa
mata. É arriscado continuarmos a caminhada à noite. - disse o pai leão.

Mas Arroar não concordava.


- Ah, não! Ah, não! Como vamos ficar aqui? Nem caverna tem! Eu quero um lugar
quentinho e macio para dormir!
- Podemos dormir sob uma árvore, como essa grande aqui, meu filho. - dizia o
papai leão.
- Não. Não gosto de dormir em árvores! Árvore não é lugar para um animal como
eu e sim para macacos! Além disso, posso cair e me machucar!
Eu achei que dessa vez o filhote ia aprender uma lição de bons modos. Que nada!
Para minha surpresa, a mamãe leoa entrou na conversa e disse:
- Acho que Arroar tem razão, meu bem. Se ele se machucar, a situação vai ficar
pior. Vamos continuar até acharmos um lugar seguro.
- Mas é noite, não conhecemos a mata e estamos todos cansados. - disse o pai.
- Arroar não precisa caminhar - disse a mãe. - Podemos colocá-lo nas suas costas.
Assim ele não se cansa. Vamos!

E assim foi feito.


Caminharam mais algum tempo até que finalmente acharam uma bonita caverna.
Desta vez não houve discussão. Nem poderia, pois Arroar já estava dormindo sobre
o dorso do pai.
Decidi passar a noite ali também, assistindo de longe aos meus novos e curiosos
vizinhos.
Na manhã seguinte, acordei tarde. Estava muito cansado da caminhada do dia
anterior.
Olhei ao redor e não vi ninguém da família real.
Eu me perguntava onde eles estariam.
Será que já haviam partido?
Já estava indo embora, quando, de repente, ouvi a leoa chamando o Arroar.
Ela rugia muito alto e parecia muito preocupada.
Por que será? Cheguei mais perto, a fim de descobrir...

A mamãe leoa, muito preocupada, movia-se por todos os lados da mata.


- Arroar! Arroar! Meu filho, onde está você? Arroar! Arroar!
Então, o papai leão chegou apressado e ofegante, dizendo:
- Meu bem, procurei Arroar por toda parte! Onde será que esse filhote se meteu?
- Não sei, não sei... Ele acordou mais cedo do que nós e saiu sem falar nada. A
culpa é nossa, não devíamos ter dormido tanto... Mas eu estava tão cansada!
O papai leão estava realmente muito bravo e rosnava:
- Já falei mais de mil vezes para ele não sair sem dizer aonde vai. Ele nunca nos
obedece! Parece nem se importar conosco!
- Ele não faz por mal. Ele é apenas muito curioso. - defendeu a mamãe leoa.
- Vamos esperar um pouco, então. Ele deve estar apenas explorando o lugar. Logo,
logo ele volta.
- Mas não será melhor ir procurá-lo? Ele é tão indefeso, sem o nosso cuidado não
vai sobreviver! Fico tão preocupada, meu bem! - falou a mãe aflita.

Enquanto discutiam o que fazer, resolvi subir numa árvore. Talvez pudesse ver
onde estava Arroar.
Mas o que eu estava fazendo? - pensei comigo mesmo. De repente me vi envolvido
na busca de um leãozinho que mal conhecia...
Tive sorte! Vi o filhote lá longe, perto da "Grande Árvore", onde vivia Sibile, a
grande serpente da mata.
Nossa! Aquele filhote corre grande perigo. Preciso ajudar! - pensei rapidamente.
Corri bem depressa em direção da Grande Árvore!
Ainda bem que nós ratos somos bem ligeiros! Caso contrário Arroar teria se metido
em grandes problemas!
Cheguei lá e, para minha surpresa, Arroar já estava conversando com Sibile - a
perigosa serpente da mata.
Ela vivia ali há anos e todos a evitavam, pois era traiçoeira.
Com muito medo, fiquei de longe vendo o que se passava.
Comecei a ouvir o que Sibile dizia ao leãozinho.

- Como dizia, leãozinho, não é preciso ter medo de mim. Eu apenas...


- Quem disse que tenho medo de você? - interrompeu o leãozinho. - Não sabe que
tipo de animal eu sou? Estou acima de todos vocês!
- Ah, sim, sim, meu pequenino rei - concordou a serpente. - Sendo assim, sua
majestade é quem me concederá a honra de apresentar-lhe alguns lugares bem
divertidos nessa mata...
Nossa! - pensei comigo. Arroar nem imagina que a serpente quer fazer dele o seu
almoço!
Sibile sempre gostava de brincar com sua presa antes de dar seu bote final. Então,
ela continuou a seduzir o filhote com seus falsos elogios. E Arroar adorava ser
admirado e elogiado pela serpente.
- Mas você está realmente sozinho, meu príncipe? - certificou-se a enorme
serpente.
- Acha que preciso de guarda-costas? Até deixei meus pais na caverna porque
queria liberdade para conhecer a mata, do meu jeito.
- Ah, sim, sim... É claro! - concordou a serpente.

- Sabe, meus pais vivem colocando regras para tudo: "Não faça isso, Arroar", "Isso
é perigoso, Arroar", "Não vá tão longe, Arroar", "Hora de dormir, Arroar"... - disse
o leãozinho rindo de si mesmo ao imitar seus pais.
- Hi, hi, hi... Muito engraçado mesmo... - riu junto a serpente.
- E com tantas regras eles vivem atrapalhando as minhas aventuras.
- É mesmo muito chato! Quem precisa de regras?- replicou a serpente.
- Gosto de fazer tudo que tenho vontade! Meu lema é fazer o que eu quero, quando
eu quero e do jeito que eu quero! - riu poderosamente Arroar. - Afinal, sou ou não
sou um rei?
E a serpente concordava com tudo que Arroar dizia. E Arroar ficava cada vez mais
encantado pela falsa bajulação da serpente, que fazia de tudo para atender a seus
pedidos e caprichos... Arroar só não percebia o que estava por trás de tanta
bondade. É isso que dá só enxergar a si mesmo e desejar se sentir um leão melhor
do que todos os outros.

O que eu temia aconteceu. Depois de mais algum tempo, a serpente finalmente


prendeu Arroar em feixes de cipó.
- Seu tolinho! Pensava que eu estava interessada em suas tolices? - zombou a
serpente. - Meu único interesse é fazer de você meu jantar! Hummm! Delicioso!
Um jantar real!
- Você não pode fazer isso comigo! - rosnava, bravo, Arroar.
- Cale-se! Só não como você agora, sua majestade, porque já fiz minha refeição
por hoje, mas mais tarde pode ser que eu queira petiscar algo "realmente
especial", hi, hi, hi, hi...
Precisava fazer algo rápido para ajudar Arroar.
Espere! - pensei comigo. Nem nos conhecemos. Por que deveria me arriscar para
livrar alguém de uma enrascada em que ele mesmo se meteu por desobediência a
seus pais?
Bem, deixei esses pensamentos para depois e, mesmo sem saber por que, resolvi
fazer algo por ele. Esperei Sibile cair em sua soneca da tarde e, então, agi rápido.

Fui onde Arroar estava amarrado e o chamei bem baixinho:


- Ei, Arroar, não se preocupe. Vou ajudar você a sair daqui.
- Hã? Você? Um rato? Afinal, quem você acha que é para me ajudar?
- Não sou simplesmente um rato, meu caro amigo. Neste exato momento sou sua
única esperança de continuar vivo!
- Não diga bobeira! Sempre consegui sair das piores enrascadas... E nunca dependi
de você para isso.
- Mas acredite... Vai precisar dessa vez!
- Se quer realmente fazer algo por mim, então chame meus pais. Eles saberão o
que devem fazer com essa serpente estúpida...
- Por que eu deveria fazer o que me manda fazer?
- Ora, ora, você não quer me ajudar? Então faça o que eu quero!
- Você parece sempre querer ditar as regras, não é? Mas se parar para pensar e
refletir, você entenderá que as coisas não funcionam assim como você pensa.
- Do que você está falando? Você nem sabe quem eu sou...

- Mas acho que já sei quem você "pensa que é": um rei em busca de súditos!
- Ah, agora, sim. Você começa a falar a minha língua.
- Ai, ai... Arroar não entendeu nada! - suspirei comigo mesmo.
- Bem, vamos deixar essa conversa para depois... Não temos muito tempo. Se eu
for chamar seus pais, talvez eles apenas cheguem para servir de sobremesa para
Sibile. Então, fique quieto e faça exatamente o que eu disser, certo?
- Não sei por que, mas eu sempre encontro gente que quer me dar ordens... -
reclamou o leãozinho.
- Silêncio! Vou tentar roer todo esse cipó. Não se mexa e não faça barulhos.
Havia muito cipó e meus dentes ficaram doendo de tanto roer! Terminando, Arroar
e eu fugimos sem olhar para trás.
Você pode imaginar a cara de Sibile ao acordar e ver que seu jantar "real" havia
escapado?

No caminho de volta, Arroar veio se gabando de suas "aventuras".


- Espera aí, Arroar, você não acha que pode se machucar ou machucar os outros
por causa de suas "brincadeiras perigosas"?
- Que nada! - respondeu Arroar com a maior naturalidade.
- Mas você não vê que quase virou almoço de Sibile por causa de sua
desobediência?
- Esquenta não, ratinho, sempre haverá um jeitinho de "se sair bem nas
aventuras".
Ouvindo essas "aventuras", fiquei então me perguntando:
Por que será que Arroar não tinha medo de ser punido quando desobedecia? Por
que será que Arroar não tinha medo que suas "brincadeiras perigosas" pudessem
dar errado e machucá-lo? Por que será que ele pensa que pode fazer todas suas
vontades, a qualquer custo e sem se preocupar com os sentimentos dos outros?
Achei que Arroar precisava pensar diferente. Mudar alguns pensamentos.

Então eu me coloquei bem em frente do pequeno reizinho e lhe disse:


- Arroar, você não pode continuar a pensar e a agir desse modo!
- Como assim, "não posso"? Eu posso todas as coisas! - rugiu forte.
- Não, não pode! É sério! Escute-me, por favor! A vida tem regras e nós precisamos
respeitá-las. - falei, olhando firme e bem dentro dos olhinhos de Arroar.
- Regras...? - repetiu o leãozinho pensativo.
- Sim, regras... limites... Como as bordas de um rio que não deixam a água vazar
para fora de seu curso e inundar toda a mata!
Arroar me encarou, pensativo, por alguns momentos.
Depois, abaixou a cabecinha e disse em voz baixa e um pouco triste.
- É. Tá bom. Acho que você tem um pouco de razão... Talvez eu tenha quebrado
algumas regras mesmo...
- Mas por que você age assim? - perguntei-lhe.
- Não sei... Gosto de ser livre e fazer o que gosto!
- Mas, cumprindo regras, você não deixa de fazer o que você gosta. Obedecendo
regras, a gente faz o que gosta, na hora certa e da forma certa.
- Obedecer?... - repetiu, intrigado, o pequeno filhote.

- Sim, Arroar, ter autocontrole... ter paciência... saber esperar o tempo para cada
coisa. Como o sol que aparece de dia e a lua que aparece de noite. Tudo no seu
tempo!
- Ou como as estações do ano, não é? Outono, inverno, verão e primavera. Eu
gosto do verão! - disse o leãozinho.
- Sim, muito bem! Não é gostoso esperar pelo verão?
- Muuuiiito. E quando ele chega, eu aproveito bastante!
- E veja que cada estação tem o momento certo de vir e realizar as coisas da
estação! Na mata não há bagunça e atropelos. Até a mãe natureza tem regras!
Continuamos nossa caminhada, e Arroar continuava pensativo sobre tudo que
falamos.
Depois de um tempo, ele me disse:
- Sabe, ratinho, acho que agora entendo melhor o que aconteceu com minha
família. Antes de vir para a mata, eu, papai e mamãe vivíamos juntos com um
bando de leões...
- Como numa grande família. - completei.
- Sim, mas eu achava todos muito estúpidos e chatos por colocarem regras no
bando...

Arroar continuou sua história:


- Como eu quebrava todas as regras os leõezinhos não gostavam muito de brincar
comigo, e depois os leões do bando acabaram proibindo seus filhotes de brincarem
comigo.
- Que chato! Então, você acabou ficando sozinho.
- Sim, fiquei sem coleguinhas. No início pensei "Quem precisa deles?". Pensava que
eu era melhor do que eles e resolvi mostrar do que era capaz!
- Nossa! O que você fez?
- Bem, eu resolvi seguir escondido o bando de leões adultos, que saiam para uma
caçada. Queria lhes mostrar como já sabia caçar bem melhor do que eles.
- Humm... Quebrando as regras e caçando o perigo, não é? E o que aconteceu?
- Bem, minha técnica é muito boa, mas quando fui ao ataque, um búfalo estúpido
estragou tudo! Ele, assustado, fez com que toda a manada de búfalos fosse em
direção ao bando de leões, atropelando todos.
- Então o búfalo estragou tudo? Acha mesmo que foi o búfalo, Arroar? - perguntei,
olhando diretamente nos olhinhos de Arroar.

- Tá bom. Eu estraguei tudo. Eu fui desobediente, não segui as regras.


- E você entende que sua desobediência colocou todos em risco, não é?
- Mas eu só queria mostrar que sou especial! - defendeu-se Arroar.
- Você se acha melhor que os outros filhotes, Arroar?
- Sim, eu sou! - respondeu rapidamente o filhotinho.
- Não é por isso que você acredita que não precisa seguir regras como todo mundo
e pode desobedecer a seus pais ou pode fazer tudo que deseja?
- Hã???? - questionou Arroar sem entender direito.
Chegamos à caverna, mas antes de nos despedirmos, disse a Arroar:
- Meu querido leãozinho, eu gostaria muito que soubesse o quanto você é especial.
- Então você concorda comigo que sou especial?
- Sim, mas não porque "você não precisa cumprir regras como os outros animais"...
- Não? Como, então? - perguntou Arroar, querendo saber mais.

- Qualquer animalzinho da mata é especial "quando não vive só para si mesmo",


Arroar. É especial alguém que compartilha sua vida com os outros e, com isso,
torna sua vida e a dos outros mais bonita com a amizade. Ninguém se torna
especial para si mesmo e sim para os outros.
- Puxa, é mesmo! Você se tornou especial para mim. Mesmo não me conhecendo
decidiu me ajudar, roendo todo aquele cipó e me tirando daquela enrascada. Como
eu pude pensar que você não poderia fazer nada por mim? Agora entendo que
precisamos uns dos outros, não importa o nosso tamanho...
Depois de nos despedirmos com um forte abraço, o leãozinho foi correndo
encontrar seus pais.
- Papai, mamãe! Tenho uma novidade para lhes contar... Uma grande aventura,
com um ratinho muito especial!
A mãe e o pai de Arroar saíram da caverna para encontrá-lo. Eles estavam aflitos e
ficaram muito bravos com o filhote. Mas Arroar foi logo se explicando e pela
primeira vez pediu desculpa para os pais. Alegres, eles o beijaram e o abraçaram.
Fiquei de longe assistindo a cena por um tempo, ouvindo Arroar contar-lhes toda
nossa conversa pelo caminho. E então eu me afastei.

Bem, agora eu sabia a razão daqueles leões entrarem na mata.


Eles tinham abandonado seu bando. Devem ter ficado muito envergonhados com a
atitude de Arroar naquela caçada...
Mas hoje as coisas estão diferentes.
Os pais de Arroar perceberam que o leãzinho havia voltado daquela "aventura na
mata" um tanto diferente. Já não desobedecia e parecia se importar com o que os
outros sentiam...
A mamãe de Arroar compreendeu que amar seu filhote vai além de fazer as
vontades do filho. Ela aprendeu que amar é ensinar o filhote a respeitar os outros
para que ele possa ser respeitado também.
E o papai leão entendeu que fazer o que o filhote quer, para evitar barulho e
discussão, pode trazer consequências muito ruins para todos.
Acho que todos aprenderam nessa aventura!
Eu penso que até resolveram voltar para o bando, pois não os vejo mais por aqui.

Quem sabe algum dia eu volte a encontrar com Arroar, mas agora como um grande
leão-rei?
Espero que ele nunca se esqueça do verdadeiro sentido de sua realeza: ninguém é
rei para si mesmo. Um verdadeiro rei não exige ser servido. Um verdadeiro rei
compartilha com os outros seus talentos e sua sabedoria. Isso o torna muito
especial.
Como o sol, nosso astro rei, que ilumina e aquece a todos e permite que a vida
floresça aqui na mata!
FIM

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