O Algarve e As Guerras Liberais
O Algarve e As Guerras Liberais
O Algarve e As Guerras Liberais
Maio de 2011
Ilustrao da Capa: Quadro As Guerras Liberais de Mestre Mrio Silva Edio: Regimento de Infantaria N. 1 Autores: Nuno Miguel Pascoal Dias Pereira da Silva, Coronel de Infantaria Comandante do Regimento de Infantaria n. 1; COR Amrico Henriques; Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva; Dr. Lus Bvar de Azevedo; Dr. Pedro Nunes; Prof. Dr. Antnio Rosa Mendes; GEN Alexandre Sousa Pinto; Dr. Joaquim Nunes; CAP Arnaldo Anica; Prof. Dr. Jos Vilhena Mesquita; ALF Vera Oliveira Rodrigues; ALF Pedro Rafael. Paginao, impresso e acabamento: Regimento de Infantaria n. 1 Depsito Legal: 326850/11 ISBN: 978-989-20-2393-9
NDICE
PREFCIO .................................................................................................................... CONFERNCIAS PROFERIDAS: CONFERNCIA 1: AS LUTAS LIBERAIS ... CONFERNCIA 2: AS CONSTITUIES LIBERAIS PORTUGUESAS ................. TRICAS ......... CONFERNCIA 4: O REMECHIDO . 9 29 7
CONFERNCIA 5: A PARTICIPAO DO SUL DO PAS NAS GUERRAS LIBERAIS ... 137 CONFERNCIA 6: O LIBERALISMO E A IGREJA ...... CONFERNCIA 7: A CAMPANHA DO REMEXIDO ... CONFERNCIA 8: O ALGARVE E AS LUTAS LIBERAIS SNTESE CURRICULAR DOS CONFERENCISTAS .......................................... POSFCIO . 149 161 167 181 187
PREFCIO
Este novo livro editado pelo Regimento de Infantaria n. 1 o 2. volume duma trilogia sobre a histria do Algarve, que se iniciou com as invases francesas e terminar com a 1. Repblica. Esta nossa iniciativa pretende desta forma contribuir para o conhecimento mais aprofundado do papel desta provncia na Histria de Portugal. Foi nesta nossa provncia que desembarcaram as tropas liberais comandadas pelo Duque da Terceira com destino a Lisboa, onde desembarcaram a 24 de Julho. Os conferencistas que participaram nos trs painis de conferncias organizados pelo RI1 so oriundos do meio acadmico, eclesisticos e militar sendo personalidades de relevante prestgio dado o seu conhecimento aprofundado da Histria da poca. Assim, os discursos dos referidos conferencistas so da sua prpria responsabilidade. Parece-nos relevante realar a extraordinria disponibilidade de todos os conferencistas em colaborar nesta iniciativa, pois fizeram-no a ttulo gracioso. O presente livro editado em DVD constitudo pelos textos dos conferencistas, pelo registo udio das suas conferncias, tendo tambm disponveis algumas fotografias do evento. No dia 19 de Maio data do lanamento do livro os textos constantes neste livro e no anterior O Algarve e as Invases Francesas sero colocados online, para consulta aberta no blog Histria do Algarve.
de realar a disponibilidade da empresa Delta Cafs e do Instituto Superior Dom Afonso III em patrocinarem esta iniciativa facto que permitiu o lanamento do presente livro.
Nuno Miguel Pascoal Dias Pereira da Silva Coronel de Infantaria Comandante do Regimento de Infantaria 1
Parte importantssima dos problemas que ento afligiram Portugal, a Gr-Bretanha, verdadeira vencedora das guerras da Revoluo e do Imprio, foi, na altura, o exemplo acabado da mxima diplomtica que diz: As Naes no tm amigos, tm interesses. Por fora dos Tratados de 1807, o secreto de Agosto, e de 1808 e 1810, a Gr-Bretanha assenhoreouse do comrcio do Brasil, transferiu para Londres o centro desse mesmo comrcio, e abriu nossa Jia da Coroa os caminhos de uma independncia h muito sonhada. Materializando, igualmente de forma exemplar, aquela mxima diplomtica, a Gr-Bretanha, pese embora o sacrifcio extremo de muitos dos seus filhos, defendeu aqui os seus interesses vitais, ao transformar Portugal no santurio da sua estratgia para vencer Napoleo na Pennsula Ibrica, santurio traduzido num formidvel campo de batalha defendido a todo o custo, e sem que o preo a pagar lhe casse directamente em cima. Vencedora da guerra, senhora dos mares, fiel da balana de uma Europa perigosamente reaccionria, a Gr-Bretanha o nosso suposto grande defensor - capitalizando porventura da situao desesperada em que nos encontrvamos, ia colocar-nos agora o p no pescoo de duas formas distintas: Recuperando tudo quanto o Marqus de Pombal lhe havia tirado ao minimizar as consequncias do Tratado de Methuen; e dominando a sociedade portuguesa ao dominar o seu Exrcito, superiormente enquadrado por oficiais britnicos num Portugal que, por fora da Guerra Peninsular, havia sido transformado num grande quartel. Agravando ainda mais o desesperado da nossa situao, o governo portugus, uma regncia que o povo alcunhava de os Reis do Rossio (porque habitavam o Palcio da Inquisio, situado no local onde hoje est o Teatro Nacional D. a Maria II.) era completamente controlado pelo Marechal Beresford, o Comandante do Exrcito, que aqui punha e dispunha, amparado por um estatuto de verdadeiro residente e certo da lealdade dos oficiais britnicos que lhe comandavam as tropas. Como facilmente se pode compreender, toda esta situao de subalternidade superiormente assumida, ganhava mais e mais foros de intolerabilidade no corao das elites portuguesas e, sobretudo, no dos oficiais portugueses do Exrcito Portugus, to vencedores da Guerra Peninsular quanto os britnicos o haviam sido, e que se viam sistematicamente preteridos nas suas carreiras e nas suas promoes. O incio de todo este drama comea pois por uma questo meramente corporativa, ou seja, os oficiais do Exrcito Portugus no queriam o comando britnico, pelo que muitos deles organizaram uma revolta.
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Ora, tal revolta estava mascarada com uma certa ideia de liberalismo, embora nem todos os seus intervenientes compartilhassem essa ideia. Segundo consta, a revolta era dirigida contra o governo britnico, ou seja, contra o comando britnico que, na realidade, existia em Portugal. Tudo isto viria a conduzir famosa conspirao de Gomes Freire de Andrade, tristemente ocorrida em 1817. Os homens que fizeram a conspirao de Freire de Andrade (se que esta foi dirigida por Gomes Freire de Andrade, porque, na realidade, nunca se provou tal facto), pertenciam s vrias lojas manicas, entradas definitivamente na vida dos portugueses durante todo o perodo da Guerra Peninsular. Em Portugal existiam maons, (sem dvida alguma!), vindos das tropas portuguesas que haviam combatido com Napoleo ou que tinham estado junto do Exrcito britnico, tal como havia ainda um importante grupo de maons oriundos do prprio Exrcito britnico. A maonaria era, de facto, uma realidade, uma moda da poca, e uma moda com a qual o Portugal que ento sabia ler e escrever se tinha profundamente envolvido. Assim, pode dizer-se com alguma certeza histrica que o problema de 1817 nasceu em duas lojas manicas: a Filantropia e a Virtude. Sabe-se hoje, que membros da loja Virtude quiseram atrair para a maonaria a Condessa de Juromenha, Dona Maria da Luz (que era amante de Beresford), para por ela estarem ao corrente das intenes e pensamentos do comando britnico. Parece pois no restarem grandes dvidas quanto ntima ligao manica, e forte tonalidade anti-britnica, de todo o movimento corporativo que esteve na origem remota do levantamento liberal portugus. Denunciado Regncia (ou seja, aos reis do Rocio e ao Marechal Beresford) por dois oficiais do Exrcito Portugus, Andrade Corvo e Morais Sarmento (eles prprios maons) este movimento conduziu tragdia do Campo de Santana, ou dos Mrtires da Ptria, e ainda execuo, por enforcamento de Gomes Freire de Andrade, no stio do Almarjo, em frente do Forte de S. Julio da Barra, num local no lado oposto da marginal, hoje assinalado por um cruzeiro rodeado por uma cerca. Entretanto no Brasil, e em 1815, D. Joo VI proclamava o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, dando assim nossa imensa colnia de alm-Atlntico o estatuto de reino, numa altura em que a Amrica do Sul Espanhola comeava a sentir o terramoto poltico que a iria dividir em pequenas e grandes repblicas independentes. Admitimos hoje que tal conjunto de movimentos independentistas nunca poderiam suceder no Brasil, uma vez que o Brasil 11
tinha um cimento unitrio de reino, muito embora este raciocnio parea ser desmentido pelas revoltas republicanas do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais, muito na linha do que sucedeu no reinado de D.a Maria I com a revolta do Tiradentes, o que aponta para um certo sentimento de independncia, e de partio do grande Brasil em vrios mosaicos republicanos. Ora, se tal no sucedeu, foi porque D. Joo VI, para alm da criao do Reino Unido, teve a sorte extraordinria de, dentro do prprio Brasil, existir um movimento de homens de ideias avanadas, chefiado por Jos Bonifcio de Andrade Silva, movimento que foi, sem dvida, o grande farol que iluminou o caminho do Brasil para a independncia assente na grandeza da sua unidade. D. Joo VI estava pois assentado no Brasil e separado de Portugal, muito embora estivesse frente de um Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Porm, no entender dos portugueses que sabiam ler e que viviam em Portugal, tal situao significava como que um virar dos plos desta esfera imperial, ao tornar Portugal praticamente numa colnia de um Brasil que, pelo seu tamanho, riqueza e potncia, passaria a ser o grande motor desse mesmo imprio, tudo sob o olho sagaz da Inglaterra que assim esperava continuar a controlar todo o seu comrcio. Como se pode compreender, esta situao levou a que uma certa elite portuguesa e que vivia na Metrpole, e qual pertenciam muitos dos apoiantes do que sucedera em 1817, comeasse a ter um sentimento profundo de revolta, no s contra o predomnio ingls na vida nacional, mas tambm contra a ausncia, to longamente inexplicvel, da Famlia Real. Quanto Gr-Bretanha, era sabido nos meios mais chegados Regncia que o seu governo, por intermdio de Lord Strangford e de Charles Stuart, pressionava D. Joo VI para regressar a Portugal, uma vez que, se tal acontecesse, teriam o Brasil isolado sob a sua esfera de influncia, coisa que de certa forma j acontecia. Porm D. Joo VI recusava-se a regressar a Portugal, o que, segundo opinies hoje expressadas em vrias obras, se devia sua forte convico quanto s ambies britnicas de completo assenhoreamento do comrcio brasileiro. (No nos podemos contudo esquecer de outras opinies sobre esta matria.e devidas a contemporneos dos acontecimentos). Fosse como fosse, tudo isto e toda a confuso em que se vivia ento na nossa Metrpole, levou criao de um movimento no Norte, mais precisamente centrado na cidade do Porto, que englobava em grande parte maons reunidos num clube de ideias liberais chamado Sindrio, o qual tinha na sua chefia um advogado muito famoso na praa da Invicta 12
Manuel Fernandes Toms um natural da Figueira da Foz a quem Rocha Martins chamou o mais probo dos cidados do seu tempo. Ainda segundo Rocha Martins, Fernandes Toms estava apoiado por dois vultos ilustres da cultura portuguesa da poca, dois homens que, tal como ele, estavam prontos para tudo sacrificar na luta pela implantao do liberalismo esclarecido em Portugal: Silva Carvalho e Ferreira Borges (que por curiosidade, tm ainda hoje ruas com os seus nomes, na que chamada a Lisboa liberal). Ora sucede que o Sindrio do Porto arregimentou, entre 1818 e 1820, um importante grupo de intelectuais, de militares, de comerciantes e de juristas, que comungavam de uma mesma grande ideia para mudar os destinos do Portugal de ento: necessrio libertar a Ptria do domnio britnico, tornando-se igualmente imperativo que a soberania passe a residir na Nao. Quer isto dizer, meus queridos amigos, que ideias to modernas como sejam o Rei soberano absoluto j no tem razo de ser, ou o Rei reina mas no governa, esto subjacentes ao movimento militar que em 24 de Agosto de 1820 rebentou no Porto, no Campo de Santo Ovdeo, e ao qual se juntou, no ms de Setembro daquele mesmo ano, o levantamento de Lisboa. A unio entre as foras revoltadas de Lisboa e as foras do Porto, estabeleceu uma Junta Suprema de Governao do Reino que reunia os homens que tinham feito o levantamento, na sua maioria movidos mais por uma ideia profundamente anti-britnica do que por um ideal liberal, e entre eles muitos militares como Gaspar Teixeira, Antnio da Silveira, Magessi, Teles de Jordo e outros, que, curiosamente, iriam depois participar na Guerra Civil, mas do lado absolutista. Obviamente que na Junta Suprema participava tambm a grande intelectualidade da chamada Nobreza de Toga, figuras da talha de um Borges Carneiro, de um Ferreira Borges ou de um Manuel Fernandes Toms, isto para no falar do ainda jovem Vila Flor o futuro duque da Terceira - ou do conde da Taipa, homens estes que, sendo militares, tinham uma grande influencia junto daquela intelectualidade, com quem iriam constituir o grande bastio do grupo liberal. No entanto, este bastio do grupo liberal encontrou-se, desde o triunfo da Revoluo, dividido em duas grandes faces: De um lado, aqueles que diziam que a soberania reside na Nao, e que o Rei reina mas no governa, ou seja, os chamados vintistas puros; E do outro lado, aqueles que afirmavam que a soberania reside na Nao, residindo por isso tam13
bm na prpria Pessoa do Rei, os chamados liberais monrquicos, aqueles que, sem qualquer tonalidade de republicanismo, iro ser mais tarde, na projeco do drama, os grandes apoiantes da Carta Constitucional. Mas, partida e logo aps o triunfo da Revoluo vintista, aquilo a que os revolucionrios imediatamente se propuseram, foi elaborao de uma Constituio, elaborao essa que originou o aparecimento de duas linhas de pensamento, como primeira ciso entre eles: De um lado uma linha militar, de bota cardada do poder pelo poder, englobando aqueles que no fundo queriam fundamentalmente expulsar os britnicos; E do outro lado a linha dos intelectuais vintistas, que queriam uma Constituio feita com base na Constituio que melhor conheciam, a Constituio espanhola de 1812, conhecida como Constituio de Cdiz, e que era chamada a Pepa, por ter sido promulgada no dia 18 de Maro, o dia de So Jos. Foi a luta entre estes grupos de apoiantes das duas formas de Constituio, se que se pode chamar Constituio a uma delas, que originou, no dia 11 de Novembro de 1820, as primeiras gritarias e as primeiras pancadarias nas ruas de Lisboa (verdadeiro intrito de todo o drama que depois veio) num movimento logo chamado de Martinhada. Curiosamente, a Martinhada foi dirigida pelo General Gaspar Teixeira, saindo deste movimento a Constituio de Cdiz como base inspiradora da futura Constituio Portuguesa, e tambm dos procedimentos para a eleio da Assembleia que recebeu o nome de Cortes Constituintes. Lanava-se assim o trabalho de elaborao da Constituio, comeando pela preparao das eleies para a Constituinte, e levando de imediato ao Palcio das Necessidades, a sede das Cortes, o delrio da discusso poltica em nome da liberdade do povo. Mas se o Portugal que sabia ler estava profundamente empenhado em todo este processo, a maioria esmagadora dos portugueses, o Portugal que no sabia ler, o Portugal amante apaixonado do trono e do altar, o Portugal que se identificava mais profundamente com o Povo Portugus vencedor da Guerra Peninsular, no percebia, nem queria perceber, absolutamente nada do que se estava a discutir. E o que era ainda mais evidente, que esse Portugal assistia embasbacado a todo aquele arraial de discursos e gritarias em nome da sua liberdade, sendo que, na verdade mais pura, no entendia patavina do jogo liberal, e estava a anos-luz de poder perceber, ou sequer aceitar, a Democracia. E foi assim, com toda esta confuso e todo este alheamento, que Portugal viu nascer a sua primeira Constituio. E muito embora tal Constituio comeasse com as palavras Em nome da Santssima Trindade (), e tivesse como principal patrocinador, e grande presiden14
te de todo aquele arepago, Frei Francisco de S. Lus, a verdade que o que mais evidncia saa do texto constitucional, era o ataque declarado ao altar, a destituio pura e dura do poder do trono (o Rei reina mas no governa) e o cercear de privilgios daquela que tinha sido a grande fora motora e de comando do Povo Portugus na Guerra Peninsular, a Nobreza Rural de um Portugal eminentemente rural. Por tudo isto, no de estranhar que uma vaga de fundo se levantasse, vinda dos solares de provncia e dos altares da Igreja, espiritualmente liderada por dois homens desta mesma Igreja, Frei Fortunato de So Boa Ventura e Jos Agostinho de Macedo, que numa luta tremenda contra tudo o que se identificasse com o ideal liberal, o faziam confundir, aos olhos da Nao, com as invases francesas, e com tudo o que de mau nos tinha chegado nas pontas das baionetas dos exrcitos franceses. E para dar mais nfase sua retrica anti-liberal, Fortunato e Jos Agostinho escreviam e diziam que aquilo que os liberais queriam, tal como os franceses antes deles, era uma destruio das grandes tradies, das grandes ncoras, das grandes amarras, em que assentara sempre a vivncia e a liberdade do Povo Portugus: O paternalismo monrquico ligado ao altar, e a Santa Madre Igreja em ntima comunho com o trono. Piorando ainda mais este quadro, e colocando-o no caminho da tragdia, logo que a ideia do liberalismo e a certeza da Revoluo chegaram ao Brasil, os brasileiros imediatamente reclamaram o mesmo para eles, ou seja, queriam tambm o liberalismo para o Brasil, tal e como estava institudo em Portugal. Assim comeou no Brasil um movimento que, com base nos ideais liberais, iria conduzir, por fora de circunstncias comuns ao Reino Unido, no s ao regresso da Famlia Real a Portugal, mas presena no Brasil, representante Ptrio em nome do Imperador, do filho mais velho de D. Joo VI, o Prncipe Real, D. Pedro, entregue direco espiritual de Jos Bonifcio Andrade da Silva, e de todo um grupo de intelectuais brasileiros que j sonhavam com qualquer coisa mais, para alm desse mesmo liberalismo. Quando os portugueses, na Metrpole, cometeram uma das asneiras mais tremendas do liberalismo, ao pedirem nas Cortes o regresso do Brasil ao estatuto de colnia, retirandolhe os Tribunais Supremos, para ali enviando tropas, e praticamente exigindo o regresso a Portugal do Prncipe Real D. Pedro, a reaco brasileira foi tremenda, materializada numa autentica em direco independncia, independncia essa que j havia sido prevista por D. Joo VI quem, aquando do seu regresso a Portugal, teria dito ao filho: Tu ficas, mas no te esqueas, se o Brasil se tornar independente, guarda a coroa para ti, que sempre me hs de ter respeito, e no a deixes cair na mo de qualquer um destes aventureiros.. 15
Estava assim dado o mote para aquilo que depois viria a suceder, quando de Lisboa se exigiu o regresso de D. Pedro Metrpole, imagem definida da nova Ptria que comeava a nascer com a resposta do seu prximo fundador: Fico e sou o defensor perptuo do Brasil! Mandaram-se ento tropas para o Brasil e ordenou-se ao Brigadeiro Madeira para resistir pelas armas, enquanto esquadra se mandava bloquear os portos. E finalmente, aquando do levantamento republicano do Rio Grande do Sul, numa altura em que D. Pedro foi a S. Paulo com a sua cavalaria da Guarda Paulista para o debelar, a ordem imperiosa para o regresso imediato do Prncipe a Lisboa, pondo fim a toda a agitao independentista, chegou. Estava-se a 7 de Setembro de 1822, e foi nas margens do Ypiranga que D. Pedro recebeu, das mos de um dos seus Ajudantes, a ordem expressa das Cortes para regressar a Lisboa, perdendo assim o Brasil o seu estatuto de membro de Reino Unido. Subido nos estribos e desembainhando a espada, o Prncipe arrancou as cores azul e encarnado do seu chapu armado e gritou: Independncia ou morte, estamos separados de Portugal!. Acabara de se fechar a primeira pgina do drama que to profundamente iria enlutar a nossa Terra. A independncia do Brasil conduziu ao desmoronamento do Imprio Portugus do outro lado do Atlntico, j que tudo o que tinha sido um verdadeiro motor de Portugal, materializado pela Companhia de Jesus e pelas campanhas dos Guararapes, pela epopeia de D. Joo V e pelos sonhos do Marqus de Pombal com a sua Companhia do Gro Par e Maranho, todo o domnio soberano daquele manancial extraordinrio que era o Brasil, acabara de se perder. Mas por outro lado, para aqueles que em Portugal lutavam contra o nascente regime liberal, a independncia do Brasil tomava a forma de pecado mortal do liberalismo manico, garrote vil passado no pescoo do nosso comrcio, traio infame e verdadeiro dobre de finados anunciando a runa inevitvel da Ptria. Quanto a D. Joo VI, que sua chegada a Lisboa havia jurado a Constituio, ao contrrio da sua mulher, a espanhola D. Carlota Joaquina, que se recusara a faz-lo, via-se agora confrontado com o problema da independncia do Brasil, independncia que ele, como imperador do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, imediatamente condenou com uma completa rejeio. Porm, o facto de ter jurado a Constituio liberal, agora mais do que nunca identificada com a desgraa da Ptria, afastou o Rei dos favores do Portugal profundo, tradicionalista e fanaticamente catlico, e que acabava de encontrar na Rainha Dona Carlota Joaquina, ento exilada entre Queluz e o Ramalho, como represlia pela recusa da Constituio, o lder 16
imediato dos inimigos do novo sistema. E tal era o dio que a Rainha votava Constituio e aos seus apoiantes, que os liberais lhe chamavam a megera de Queluz. D. Carlota Joaquina tornava-se assim no chefe espiritual daqueles que combatiam o regime liberal, e que eram cada vez mais. E eram-no porque os portugueses, de uma forma geral e na sua esmagadora maioria, continuavam a no perceber o jogo democrtico, a no entender as ideias liberais, a ver na Maonaria o motor malvado dos ataques ao altar e ao trono, para alm de comearem agora a ouvir, da boca do Clero e da Nobreza Rural, tudo o que significava, em runa e em desgraa nacional, a independncia do Brasil Como temos vindo a constatar, reinava ento em Portugal uma confuso tremenda, agravada de forma alarmante por um crescente sentimento de revolta popular, e tudo aquilo combinado com o estado verdadeiramente desgraado em que o Reino se encontrava como reflexo directo da destruio causada pela Guerra Peninsular. Assim sendo, facilmente se compreende que Manuel da Silveira, 2. Conde de Amarante, logo no incio de 1823, se tenha revoltado em Trs-os-Montes, recusando o regime liberal, e aclamando a Monarquia absoluta, tradicional e de direito divino, tal e qual como todos os seus antepassados, e desde que Portugal era Portugal, a tinham entendido, aceitado e defendido. Esta revolta levou ao primeiro choque armado entre as faces liberais e absolutistas, num combate que aconteceu na Serra de Santa Brbara, e que terminou com a vitria absolutista. Porm, metidos de seguida em Amarante pelo General Lus de Rgo, que era sogro de Rodrigo da Fonseca Magalhes (outro dos grandes vultos deste perodo do liberalismo) as tropas absolutistas acabaram vencidas, e o conde de Amarante e as suas tropas foram obrigados a refugiar-se em Espanha. Acontece que, devido a este levantamento, foram mandadas tropas para o Norte do Reino a fim de debelarem a corrente de revoltas que se estavam a verificar nas populaes. Como muito bem sabemos, a Norte do Tejo Portugal ainda hoje profundamente tradicionalista, e era precisamente contra o expressar indignado desse mesmo tradicionalismo que essas tropas, constitudas pelos filhos desse mesmo Portugal tradicionalista, foram enviadas. Assim, perfeitamente compreensvel luz do pensamento dos dias de hoje, que os soldados dos Regimentos de Infantaria 16, 18 e 23, que seguiram para o Norte a combater as revoltas populares, se tenham revoltado ao chegar a Vila Franca de Xira, soltando vivas Monarquia absoluta e negando, de armas na mo, o constitucionalismo liberal.
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Abaixo a Constituio, viva o Rei absoluto!. E foi ao reboar deste grito de revolta popular, que a Rainha Dona Carlota Joaquina, que era m como as cobras mas extraordinariamente esperta, mandou o seu filho mais novo, o Senhor Infante D. Miguel, para chefiar aquele levantamento. Smbolo acabado do portugus de ento, marialva, cavaleiro, toureiro, brigo, mulherengo e praticamente analfabeto, D. Miguel, acompanhado pelos seus ajudantes de campo e entre eles o conde de Vila Flor, foi recebido em Vila Franca num ambiente de verdadeiro delrio, tendo ali recebido o apoio do Exrcito e de individualidades das mais diferentes origens sociais da vida portuguesa. E curioso recordar que, entre aqueles que em Vila Franca apoiaram D. Miguel, para alm do conde de Vila Flor, estava Joo Carlos de Saldanha de Oliveira e Daun, os dois militares que, num futuro bem prximo, iriam ser, com toda a honra e glria, os mais importantes comandantes liberais. Por aqui podemos constatar at que ponto a sociedade portuguesa estava aterrorizada com tudo aquilo que sucedia, com a incerteza do futuro imediato, com a alterao permanente da ordem pblica, com a incapacidade demonstrada pelo poder politico liberal, e via em D. Miguel qualquer coisa que, na realidade histrica, ele no era nem podia ser. E, momento marcante deste movimento, recordamos aqui o encontro de D. Joo VI com o seu filho em Vila Franca, e a entrada absolutamente triunfal que os dois tiveram em Lisboa, com o povo rendido a atrelar-se aos varais da carruagem, e o Rei a nomear D. Miguel como Generalssimo do Exrcito. Este movimento de Vila Franca, ocorrido em Maio de 1823 e a que se chamou Vilafrancada, conduziu ao fim da Constituio de 1822, e representou o encerramento do primeiro captulo da histria do liberalismo em Portugal. No entanto, e como evidncia histrica de capital importncia, ele viria a originar a ascenso de D. Miguel como grande vedeta e grande chefe da causa absolutista, dando a todos aqueles que defendiam o tradicionalismo monrquico de direito divino um lder perfeitamente identificado com a causa, e com a me que na vida, para alm de uma ambio desmedida, s o via a ele. Mal rodeado e pior aconselhado desde o inicio da sua vida politica, D. Miguel seria o homem que iria assumir a chefia de uma tentativa de golpe de Estado, quando os liberais, rasgada a Constituio, pediram a D. Joo VI que, imagem do que D. Lus XVIII fizera em Frana, desse a Portugal uma Carta Constitucional. Porm, D. Joo VI, (um homem que a Histria hoje quer lavar, dizendo-o um monarca de extraordinrio bom senso) mais uma vez iria deixar Portugal agarrado s cuecas, perdoem-me a expresso mas no encontro outra 18
(!!), ao no dar qualquer Carta Constitucional, e ao rodear-se de homens incapazes de lidar, com a fora que s o prestigio garante, com toda a problemtica da luta directa entre as clientelas rivais de liberais e absolutistas. E para piorar ainda mais as coisas, o nico homem de autentico valor que se encontrava prximo do Rei, para o apoiar e aconselhar, o marqus de Loul, esse acabou cobardemente assassinado em Salvaterra de Magos, s mos do nascente caceteirismo absolutista. Inevitavelmente, a luta directa entre as faces, agravada pela permanente indeciso do Rei, acabou por redundar, em 30 de Abril de 1824, numa tentativa de golpe de Estado, a chamada Abrilada, o qual s no redundou numa grande vitria absolutista, muito possivelmente com a abdicao do Rei, porque o corpo diplomtico, tendo frente o Embaixador de Frana, Hyde de Neuville, no o permitiu. Protegido pelos diplomatas estrangeiros, mais do que por portugueses, D. Joo VI procurou o seguro refgio da nau inglesa Windsor Castle, e da, com as costas quentes, ajustou as contas com o filho, demitindo-o de Generalssimo, e enviando-o pura e simplesmente para Viena, para a ustria, para junto de Metternich (outra asneira brutal de D. Joo VI) onde o Infante, como peixe na gua, aprendeu na perfeio todos os malabarismos da reaco vencedora de Waterloo. Lanou-se assim Portugal numa tentativa de recuperao do sistema liberal, tentativa que, ponta abaixo e ponta acima, aqui caio alm me levanto, l se foi aguentando at morte de D. Joo VI, em 10 de Maro de 1826. Acontece porm que em 1825, aquando do reconhecimento da independncia do Brasil, D. Joo VI promulgou dois documentos, historicamente importantssimos e, ainda hoje, motivo de acesa discusso entre as diferentes correntes monrquicas. Resumidamente, num desses documentos, Sua Majestade reconhece, de facto, a independncia do Brasil, tendo como Imperador o seu filho D. Pedro, sucessor destes reinos de Portugal e do Brasil, enquanto que num outro documento, assinado em data posterior, Sua Majestade o Senhor D. Joo VI, reconhece e confirma a independncia do Brasil, mas no se refere a D. Pedro como o sucessor da coroa portuguesa. Parece hoje facto aceite o assassinato de D. Joo VI. Diz-se at que Sua Majestade ter sido envenenado com uma laranja, disso se acusando mutuamente liberais e absolutistas. Talvez que esta situao possa justificar o facto de D. Joo VI no ter indicado, hora da sua morte, o nome do sucessor, coisa que era pouco habitual na prtica dos monarcas portugueses. No entanto D. Joo VI, ou algum por ele (as opinies variam) indicou quem iria ser a cabea
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da Regncia: a sua filha Dona Isabel Maria, apoiada pelo Duque de Cadaval, pelo Duque de Lafes, e por uma pliade de pessoas da mxima confiana de D. Joo VI. Mas fosse como fosse, a verdade que Portugal caminhava a passos de gigante no sentido de uma catstrofe, governado como estava por uma fraqueza poltica perigosamente incapaz, sem Carta Constitucional ou Constituio que o regesse, econmica e socialmente destroado, e vendo-se agora a caminho de ter, sentado no trono, o homem que lhe levara o Brasil. Dentro da imposio tradicional do funcionamento sucessrio, o Duque de Lafes foi enviado ao Brasil com o intuito de aclamar D. Pedro IV como rei de Portugal, na esperana que o Imperador brasileiro abdicasse da Coroa Portuguesa em nome de D. Miguel. No entanto, antes que o Duque de Lafes chegasse ao Brasil, chegaram ali as notcias da morte de D. Joo VI, e D. Pedro, interiorizando a sua condio de herdeiro da Coroa, resolveu dar imediatamente a Portugal uma Carta Constitucional, a Carta Constitucional de 1826. Documento do mximo interesse politico e Histrico, a Carta tem, como lei fundamental, uma particularidade que d Coroa fora interventora na deciso politica: que na Carta o Rei detm o poder moderador entre o poder legislativo, o poder executivo e o poder judicial. E esta particularidade torna, partida, a Carta diferente da Constituio de 1822, onde imperava, sem peias, a ideia de que o Rei reina mas no governa. Mas a essncia da Carta Constitucional, outorgada mas no votada, levava a divises dentro do prprio movimento liberal, onde aqueles que apoiavam a Constituio de 1822, nas suas bases de votao democrtica e limitao do poder real, iriam agora, por fora do quadro geral da situao j descrita, apoiar a Carta Constitucional como amarra de unio entre as correntes liberais. E muito embora, inicialmente, todos se tenham reunido em torno da Carta Constitucional, mormente os vintistas e os cartistas, a verdade que esta unio se desfez imediatamente aps a Guerra Civil. Quando a Carta Constitucional chegou a Portugal, a Infanta Regente Dona Isabel Maria no a fez jurar imediatamente, sempre na esperana de guardar a possibilidade de no reunir cortes para a proclamar. No entanto, o General Saldanha, condecorado com a medalha da poeira evocadora da Vilafrancada e agora Governador das Armas do Porto, ameaou a Regncia com a interveno militar, forando assim a proclamao da Carta e o seu juramento. Reflexo imediato desta atitude de fora, o convite formulado pela Regente ao General Saldanha para formar governo, ainda hoje no espanta ningum. 20
Gostaria aqui de dizer que o General Joo Carlos de Saldanha de Oliveira Daun foi um homem extraordinrio, um romntico, e um soldado de fantstica bravura. Mas obriga a verdade Histrica a dizer tambm, que ele foi um golpista e um revolucionrio ambicioso faminto de poder. H quem diga at que teria algo de louco, sendo inclusivamente violento, iberista, e maon com ideias de prtica poltica de imposio pela fora. Sinteticamente, um dos grandes chefes da causa liberal, Cndido Jos Xavier, tinha para ele uma definio curiosssima: O Saldanha frente da canalha muito mais perigoso do que D. Miguel frente dos Silveiras. Por tudo isto, a Gr-Bretanha no queria, nem podia, admitir para Portugal um governo do qual fizesse parte o General Saldanha, com todos os perigos de violncias e confrontos que da certamente adviriam. E assim, pretextando impedir uma mais do que anunciada Guerra Civil, a velha aliada imps-nos a presena da diviso do General Clinton e, para cmulo da nossa vergonha e coroar da interveno militar estrangeira nos negcios do Reino, acabou por forar a demisso de Saldanha. A que misria tinha chegado Portugal!!! Entrava-se assim no perodo crucial que antecedeu a Guerra Civil, perodo fundamentalmente caracterizado por uma srie de levantamentos absolutistas, arregimentando a esmagadora maioria do Portugal profundo enquadrado pela Igreja e pela Nobreza Rural, de brao dado com a Grande Aristocracia de faco miguelista. Afirmavam estes defensores apaixonados da tradio, do trono e do altar, a culpa manica da desordem social agravada pela grosseira impraticabilidade dos princpios expressados na Carta Constitucional e na Constituio, superiormente maquinada pelo brasileiro D. Pedro, traidor Ptria por mor da independncia do Brasil. Ou seja, juntavam-se no mesmo saco os dios pedreirada (como insultante ao trono e ao altar) e o ataque determinado realeza de D. Pedro IV, impossibilitado de ser Rei de Portugal pela sua condio de estrangeiro (chamavam-lhe at o imperador dos macacos) impossibilidade constante das antigas leis fundamentais do Reino, que remontavam aos tempos de D. Afonso Henriques e s cortes de Lamego. Assim, para estes defensores da causa identificada com a tradio monrquica ancestral, o Rei era Rei por direito divino e, como tal, soberano absoluto de Portugal. Porm, para o ser de pleno direito, tinha de ser portugus, pelo que, e para evitar a repetio dos Felipes, o brasileiro no podia ser Rei de Portugal, cabendo assim a legitimidade sucessria ao Senhor Infante D. Miguel. Acontece porm que - pressionado por um lado pela Inglaterra (que nunca aceitaria as Coroas de Portugal e do Brasil novamente juntas), por outro pelos brasileiros que temiam um 21
retrocesso no seu processo de independncia, e ainda por outro pela sua prpria postura face a Portugal - logo aps ter sido aclamado rei de Portugal no Rio de Janeiro, e aps ter dado ao Reino a Carta Constitucional, D. Pedro IV realizou um acto de abdicao em nome da sua filha D. Maria da Glria, Princesa do Gro-Par e futura D. Maria II de Portugal. Estava-se no dia 2 de Maio de 1826 e, na sua essncia, o acto de abdicao de D. Pedro IV podia resumir-se da seguinte forma: Eu abdico na minha filha, com duas condies: D. Miguel dever casar com a minha filha D. Maria da Glria, e dever ainda jurar a Carta Constitucional. Perante o cumprimento de tais condies, ser D. Miguel, em meu lugar, Regente at maioridade da minha filha. Esta deciso do, agora, Rei D. Pedro IV, foi apoiada por quase todas as Cortes da Europa, sendo porm categoricamente recusada pela esmagadora maioria do povo portugus, na sua teima de considerar que D. Pedro no podia abdicar de um trono a que no tinha direito. No entanto, em Viena de ustria e aconselhado por Metternich, o Senhor Infante, como ento chamavam a D. Miguel, aceitou os termos da proposta do Rei seu irmo e, depois de cumprir o acordado (com o casamento resumido ao papel, claro est!) regressou a Portugal. Estava-se no principio da Primavera de 1828, e a esmagadora demonstrao de apoio, amor, delrio apaixonado, que constituiu a chegada de D. Miguel a Lisboa, com um povo inteiro a cantar o Rei chegou!!!, no s alarmou todos os liberais, como convenceu, de vez, os absolutistas, de que a realeza de D. Miguel, muito embora violando todos os acordos que tinham permitido o regresso do Infante a Portugal, era o nico caminho, politica e patrioticamente, correcto. Porm, a par do fervor popular de o Rei chegou, o regresso de D. Miguel e as medidas de carcter administrativo por ele imediatamente tomadas, correram paredes meias com a maior onda de perseguies, de prises arbitrrias, e com o pior caceteirismo, numa abertura imperdovel aos actos de maior torpeza, maior vingana pessoal, maior vandalismo, que se possa imaginar. Na mo de sicrios da baixeza do General Telles Jordo e mais do filho, do sota Leonardo, do Sedvem toureiro, do Z Verssimo da policia, ou do Preto dos palitos, a ordem pblica imposta a cacete pelo partido de D. Miguel, instigada pela megera de Queluz (finalmente triunfante) e escrupulosamente dirigida por Jos Antnio de Oliveira Leite, o sinistro conde de Basto, levou o terror a campear nas ruas, a ferocidade mais primria a expulsar o que de melhor existia nos quadros da Nao, uma camarilha boal de analfabetos aos degraus do poder, e o descrdito internacional prpria Monarquia. 22
Na aclamao, como Rei absoluto, de D. Miguel I, em Cortes Gerais da Nao, este, que havia jurado a Carta Constitucional, tudo desdisse e tudo anulou, arrastando assim para o seu partido um odioso to evidente, que o reconhecimento internacional da sua Coroa se tornou mais do que problemtico. A ttulo de curiosidade, lembro-vos que os miguelistas dizem, ainda hoje, que D. Miguel no jurou a Carta Constitucional, tendo jurado sobre um livro escrito por Jos Agostinho de Macedo, intitulado Os burros, razo pela qual, os liberais apelidavam os absolutistas de burros. Igualmente, e quanto ao seu casamento, tambm voltou com a palavra atrs, ao afirmar no poder casar com a sobrinha, uma vez que esta tinha apenas 7 anos e ele, D. Miguel, 24, sendo portanto tal casamento inconcebvel. Fugiam os liberais para Inglaterra e para Frana, e enchiam-se as enxovias de So Julio da Barra, onde imperava o Telles Jordo. Esvaziava-se o Portugal que sabia ler, mas era tambm significativo o nmero dos que ficavam, dispostos a lutar pelo seu ideal e por aquilo que consideravam ser a legitimidade da Senhora Dona Maria II. E foram esses fiis que se revoltaram em Aveiro, ainda antes da aclamao de D. Miguel. Mal dirigidos e pior enquadrados, animados de todo o ideal do mundo mas incapazes de enfrentar quem quer que fosse, os revoltosos de Aveiro e de outras localidades do Norte e Centro do Reino marcharam sobre o Porto, e a foram recebidos em triunfo. Porm, o comandante da revolta, o General Sousa Refios, no era um chefe militar altura dos acontecimentos, e assim no foi de estranhar a derrota esmagadora que o Exrcito governamental, sob o comando do General Antnio Coutinho e Povoas, lhe imps na Cruz de Marossos, perto de Coimbra. Debandaram, este o termo, os liberais de escantilho para o Porto, e a encontraram aqueles que tinham regressado da Gr-Bretanha, a bordo do Belfast, para apoiar a revolta. Ali estavam, pois, o conde Vila Flor e o General Saldanha, o conde da Taipa e Cndido Jos Xavier, todos sob a superior liderana, imposta alis pelos ingleses, do marqus de Palmela, como chefe de expedio e futuro chefe de Governo. Mas tomando conhecimento da catstrofe da Cruz de Marossos, e da proximidade do Exrcito de Povoas, os liberais apavoraram-se, e rapidamente partiram, outra vez a bordo do dito Belfast de volta a Inglaterra e ao exlio. Ficou este movimento conhecido como a Belfastada, e dele saram os liberais interna e externamente enxovalhados. Salvou-se daquela vergonha a personalidade fascinante de Bernardo de S Nogueira de Figueiredo, o futuro marqus de S da Bandeira, que retirou 23
sobre a Galiza com o que restava das pobres tropas liberais, levando-as da para a Inglaterra, e para o sofrimento nos barraces de Plymouth. Tentava a diplomacia miguelista que o governo do Rei absoluto fosse internacionalmente reconhecido, mas a barreiras a tal reconhecimento levantavam-se por todos os lados. Na Gr-Bretanha, onde governava de Wellington que pessoalmente apoiava D. Miguel, o governo no tinha fora, nem vontade, suficiente para reconhecer o governo miguelista. Na Frana, onde o governo de Polignac era o que de mais reaccionrio havia na Europa e muito embora estivesse sentado no trono D. Carlos X, tambm no havia fora bastante para conseguir reconhecer o governo de D. Miguel. Assim, o governo miguelista foi apenas reconhecido pela Santa S (tendo em conta que a luta dos liberais era contra o altar), e pela Espanha (uma Espanha absolutista, que havia sido invadida pelo Exrcito Francs do duque dAngoulme. A ttulo de curiosidade, existe em Paris uma praa muito famosa, com o nome Trocadro, celebrando a batalha de Trocadro, onde os absolutistas, com o auxilio do duque dAngoulme, venceram os liberais, impondo o regime apostlico de Fernando VII). Mas tambm a Rssia e os Estados Unidos da Amrica reconheceram o governo de D. Miguel, sendo relevante o reconhecimento dos americanos, presos aos interesses que eles tinham no Brasil e na Amrica do Sul, incompatveis com uma nova unio de Portugal com o Brasil. Com os liberais perseguidos, presos ou enforcados e, na sua maioria exilados na Frana e Inglaterra, foi no meio do Atlntico, no arquiplago dos Aores, e especialmente na ilha Terceira, que se instalou o grande bastio da causa liberal. Para ali convergiram, pois, todos os esforos, todos os seguidores, todos os voluntrios, da causa da Liberdade, identificada agora com a Rainha a Senhora Dona Maria II. Bateram-se os liberais na Terceira, e ali se cobriram de glria no Pico do Celeiro e na Praia da Vitria. Ali ganhou fama o conde de Vila Flor, e dali partiu para conquistar para a causa todo o arquiplago, e com ele a credibilidade internacional. E foi ali que se assentou a fora do chamado Exrcito Libertador, constitudo em boa parte por tropas estrangeiras, financiadas por dinheiros estrangeiros, e superiormente dirigidas por D. Pedro, que entretanto abdicara da Coroa no Brasil em nome do seu filho, D. Pedro de Alcntara. Foi este o modo encontrado, e internacionalmente aceite, para que, e como simples duque de Bragana, D. Pedro pudesse apoiar a causa da sua filha, a Senhora Dona Maria II, e dirigir, como Regente e em seu nome, a luta contra o absolutismo.
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E do outro lado? Do outro lado estava Portugal em peso, porque essa a verdade Histrica e indesmentvel, idolatrando uma causa e um homem, um homem que foi, talvez juntamente com Sidnio Pais, o Chefe de Estado mais amado de toda a nossa Histria. verdade que estavam milhares de pessoas presas, torturadas e muitas enforcadas. igualmente verdade que, simples suspeita de malhado ou pedreiro livre, qualquer cidado podia sofrer a represso mais tremenda, e tambm verdade que o governo absolutista carregava com o odioso de toda a Europa civilizada. Mas verdade superior a todas estas, verdade que era crida como dogma no corao da maioria esmagadora dos portugueses, a Coroa de Sua Majestade o Senhor D. Miguel I, Rei absoluto por vontade do seu Povo expressa em Cortes Gerais, e Rei Portugus em toda a dimenso, valia ao Portugal profundo o sacrifcio da prpria vida dos seus filhos. E essa, doa a quem doer, era a verdade! Quando, em Frana, Carlos X caiu devido revoluo de 1830, e na Gr-Bretanha, o duque de Wellington perdeu o lugar de Primeiro-Ministro a favor de George HamiltonGordon, 4. Conde de Aberdeen, tudo isto complicado pelo estalar da Guerra Civil em Espanha enfrentando Carlistas com Isabelinos, no quadro do conflito portugus o apoio causa liberal viria a mudar completamente. Agora, toda a legitimidade estava do lado da Rainha, e D. Miguel representava a usurpao. causa liberal abriram-se crditos e facilidades de recrutamento, enquanto que causa miguelista, e muito por culpa das asneiras clamorosas dos seus dirigentes, at a esquadra lhe levaram!!! Cabe aqui relembrar que, apesar do tempo que j passou, hoje ainda vulgar ouvir dizer que a causa liberal era apoiada pelo estrangeiro, e que era uma causa mercenria, como se os dinheiros de Outrequin & Jouge fossem portugueses, e os Bourmont, Eliot, Alm, Brevielle, Larochejaquelin e tantos outros, fossem nascidos em Mafra ou na Costa da Caparica. Junho de 1832. De Ponta Delgada, e sob o comando do ingls Rose Sartorius, vai sair para o Continente a grande esquadra liberal, na realidade a fora naval mais heterognea que imaginar se possa. Nela vo embarcados cerca de 7.500 homens que, sob o comando supremo do Imperador (como lhe chamavam os seus homens, numa aproximao clarssima ao seu heri inspirador Napoleo Bonaparte) constituem o Exrcito Libertador. Para se lhe opor, o governo de D. Miguel no tinha, praticamente nada. E radica aqui uma das principais razes militares do desfecho da Guerra Civil. Como consequncia da estpida
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represso miguelista e do seu desvairado caceteirismo, os esbirros do conde de Basto chegaram ao exagero de perseguir sbditos estrangeiros radicados em Portugal. Ora foi precisamente por causa da agresso e priso de dois sbditos franceses que a Frana orleanista e liberal, apoiante de D. Maria II, enviou ao Tejo a esquadra do Almirante Roussin, para exigir a libertao dos seus sbditos e uma indemnizao. Bem tentaram o visconde de Santarm e o duque de Cadaval que o conde de Basto libertasse os presos, mas qual qu!.... Nem ele, nem o Rei queriam arrear bandeira, e o Almirante Roussin levou a Esquadra portuguesa para Toulon, arreando-lhe as bandeiras e internando-a. Assim, foi sem qualquer oposio significativa que, no incio do ms de Julho de 1832, a esquadra liberal fundeou em frente praia dos Ladres, em Arnosa de Pampelido, junto a Vila do Conde, e as tropas da Rainha desembarcaram, levando a Guerra Civil ao Continente. Iniciada muito antes de 1832, a chamada Guerra Civil de 1832-34 lanou Portugal numa luta dramtica, de consequncias desastrosas (e, no fundo, ainda hoje sentidas) que iria enlutar a Ptria at 1850, at ao movimento da Regenerao. Ora essa luta, que se retratou no Setembrismo, no golpe dos arsenalistas, na revolta dos marechais, na ditadura de Costa Cabral e na revoluo herica da Maria da Fonte, nem com a Guerra da Patuleia se conseguiu esclarecer, e conduziu vergonha de uma interveno militar estrangeira que levaria Conveno de Gramido. Luta fratricida e impiedosa, marcando geraes de portugueses e libertando foras incontrolveis, a Guerra Civil e tudo o que a originou, mais talvez do que as desgraas a que deu origem, pode, e deve, ser considerada como o bero da Republica e de tudo o que se lhe seguiu. Foi, pois, um esboo dos antecedentes imediatos de todo o drama que se viveu em Portugal e que dividiu os portugueses, assentado na sua impreparao para compreender a finalidade e a execuo do jogo democrtico, na criminosa manuteno da sua ignorncia para proveito das foras polticas, e na pssima situao financeira, comercial, industrial e social, em que o Reino se encontrava devido Guerra Peninsular e independncia do Brasil, que eu
vos quis transmitir de uma forma muito simples e, espero bem, que clara.
Muito obrigado.
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Enquanto simples jurista, venho aqui falar-vos de leis, o que na realidade pouco emocionante, comparativamente anlise dos factos histricos. Muito embora, na realidade, tais factos histricos, se traduzam em normas, e tais normas possuam uma carga histrica. Ora, a minha uma viso relativamente ao Direito constitucional, uma viso cultural e aberta, sendo que no considero que o Direito se possa fechar numa redoma, num domnio inteiramente fechado. A minha perspectiva a de jurista, ou seja, parto das normas e interpreto-as, integrando-as na realidade cultural. Isto , integro esses factos jurdicos e introduzo-lhes a dimenso jurdica, que utiliza uma metodologia diferente da histria. Ora, como jurista, tenho como base as normas, sendo que parto destas para anlise dos factos. Assim, falar-vos-ei das constituies liberais portuguesas. Na verdade, curioso, terem existido trs constituies liberais portuguesas, em sentido literal, ou seja, a constituio de 1822, a Carta Constitucional e a constituio de 1838. Porm, acrescento ainda, a constituio de 1911, porque em rigor, na altura, o que se traduzia por Repblica em Portugal, era, na verdade, um liberalismo serdio, ou seja, tardio, do ponto de vista constitucional, que consumou o que as constituies liberais do sculo XIX no foram capazes de fazer.
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O presente texto resulta da transcrio de uma conferncia feita oralmente. Doutor e Agregado em Direito. Professor das Faculdades de Direito da Universidade de Lisboa e da Universidade Catlica Portuguesa.
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As constituies liberais portuguesas de 1822, 1826 e 1838, definem, apesar das relaes difceis entre a Igreja e o poder poltico, como religio oficial do Estado: a catlica. Portanto, ao contrrio do que se passou em Frana, Espanha e Itlia, o laicismo no era inteiramente assumido no quadro constitucional. De facto, esse passo laico foi dado pela constituio de 1911 uma tpica constituio liberal que introduz a dimenso republicana e a dimenso laica, que na realidade, j estavam em embrio nas constituies liberais, mas que as condies do pas no permitiram que se realizasse. Alis, as constituies, enquanto factos culturais, servem para fazer coisas, isto , tm uma realidade que utilitria. Ora, Montesquieu, no seu clebre Lesprit des lois, quem pela primeira vez vem afirmar que as constituies tm de ser interpretadas sociologicamente, e que inclusivamente, servem para representar as classes sociais. De facto, as constituies so to ou mais eficazes, completas, acabadas, quando so capazes de representar essas ditas classes sociais, porque tm uma dimenso sociolgica, isto , servem para algo, e quando no servem, de alguma forma sintomtico de algum fracasso. Assim, tendo em conta as constituies portuguesas liberais, pode afirmar-se que a que resistiu, foi a constituio de 1826, uma vez que as constituies de 1822 e a de 1836 foram constituies relativamente falhadas, as quais apenas conseguiram ter perodos de regncia muito curtos, isto , no tendo por isso, marcado verdadeiramente o sculo XIX portugus. A constituio de 1826 a constituio menos liberal, sendo teoricamente menos liberal que a constituio de 1822. Pode afirmar-se que a constituio de 1826, a constituio mais adequada ao sculo XIX portugus, uma vez que, no sculo XIX portugus, o liberalismo foi uma realidade que veio do estrangeiro, ou seja, de incio no existiam condies sociais, pois no havia burguesia, no havia mercado, todas essas coisas iriam apenas surgir na segunda metade do sculo XIX, e foi por essa razo que sucederam todas estas guerras anteriormente mencionadas. Foi necessrio esperar pela constituio menos liberal de todas, que em termos tericos, foi a que acabou por dar origem ao perodo mais longo do liberalismo portugus, que corresponde segunda metade do sculo XIX, e portanto, essa , na ptica de um jurista, a constituio mais adequada realidade portuguesa. Na verdade, as constituies, para serem bem sucedidas, devero resolver problemas polticos e integrar as classes sociais. Quando tal no acontece, as constituies dir-se-o falhadas, isto , destinar-se-o ao caixote do lixo da histria, como dizia uma certa linguagem marxista, mas que, enfim, tambm pode ser utilizada de forma irnica, sem qualquer conotao marxista, mas que tem a ver com a dimenso histrica das constituies. 30
Ora bem, existe tambm um fenmeno muito comum em Portugal: que as constituies so todas revolucionrias, sendo que a nica que aparentemente no o , a constituio de 1826. Assim, a revolta de 1820, encontra-se na origem da constituio de 1822, e consequentemente, da constituio de 1826; a revoluo de 1836 encontra-se na origem da constituio de 1838; a revoluo de 1910 encontra-se na gnese da constituio de 1911; a revoluo de 1926 est na origem da constituio de 1933; a revoluo de 1974, est na origem da constituio de 1976. Portanto, todas as constituies resultaram de rupturas, e consequentemente de um fenmeno revolucionrio, e todas elas tinham como objectivo construir uma nova ordem, ou seja, todas se propunham como objectivo resolver todos os problemas. A ideia de transio, de sedimentao constitucional, foi uma ideia britnica e no uma realidade portuguesa. Posteriormente, umas constituies sobreviviam e outras no, ou seja, trata-se de uma lgica tipicamente francesa, em que as constituies resultavam de revolues, e pretendiam impor uma nova ordem. Ora, essa nova ordem, resultava no quadro da realidade de um determinado pas. Para alm disso, tambm existe outra coisa que no deixa de ser curiosa, que as revolues so de facto todas muito parecidas, uma vez que, na origem das revolues, encontram-se fenmenos corporativos e, a dirigi-las, encontra-se o Exrcito. Existem ainda outras causas, alm das dimenses corporativas, relativamente ao surgimento da primeira constituio (de 1822), o facto de existir uma pequena burguesia em Lisboa e no Porto, a qual liderou a Revoluo. Assim, quando olhamos para a realidade histrica, ou quando se fala de dimenses da democracia em sentido usual nos dias de hoje, trata-se de convenes que os juristas utilizam. Efectivamente porm, estas revolues eram feitas com uma populao muito reduzida, uma vez que so executadas na sequncia de um pequeno golpe, que associado a uma ideia maior, que se encontra na origem deste golpe, e que ir em posteriormente, impor-se na sociedade e estabelecer um esquema de organizao poltica. Ora bem, a constituio de 1822, foi a que instaurou o constitucionalismo em Portugal, e consequentemente, o liberalismo poltico em Portugal. Alm disso, o que estava em causa, do ponto de vista constitucional, era a instaurao de um Reino Unido - o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve -, e esta era uma realidade que surgiria em todas as constituies liberais. Mas, curiosamente, nunca existiu qualquer Reino Unido no Algarve, sendo o Algarve o libi para se retirar o poder ao Brasil, inicialmente em 1822, razo pela qual se recorreu ao Algarve. O objectivo da constituio de 1822, era que o Brasil se mantivesse ligado a Portugal.
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A revoluo de 1820 sucedera, com o objectivo de fazer com que o Rei retornasse a Portugal, ou seja, metrpole, uma vez que Portugal tinha ento o seu centro, isto , a sua capital, no Rio de Janeiro, e para os portugueses (residentes na metrpole), era essencial que a capital de Portugal, retornasse para a metrpole, isto , para Lisboa. Ora, a razo da revoluo de 1820, era precisamente a insatisfao dos portugueses mais instrudos, residentes em Portugal (na metrpole), relativamente alterao da capital de Portugal, para o Rio de Janeiro. Na verdade, todos se encontravam insatisfeitos por exemplo, a nobreza encontrava-se longe do reino, portanto no poderia influenciar o Rei, e alm disso, no possua vida de Corte. Ora, a nobreza que se encontrava no Brasil, era na verdade, considerada a verdadeira Corte. De facto, em Portugal no havia Corte, uma vez que a burguesia no tinha o poder de influenciar ningum, por estar longe do Rei. No entanto, depois de o Rei retornar a Portugal ( metrpole), colocava-se ainda outro problema: o Brasil era o centro, isto , possua a capital do Reino de Portugal. Assim, era necessrio contentar o Brasil, uma vez que era preciso evitar que o Brasil se tornasse independente, pois o retorno da capital do Reino de Portugal para Lisboa, no iria certamente agradar aos brasileiros. Ora, tal como os portugueses no gostaram de ver a capital de Portugal transitar para o Rio de Janeiro, evidentemente que, tambm os brasileiros no iriam gostar que o Brasil fosse transformado numa provncia. Assim, a ideia do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, destinava-se, por um lado, a garantir que o Brasil continuasse a pertencer ao Reino de Portugal, mas ao mesmo tempo, destinava-se a diminuir o papel do Brasil no reinado, colocando a seu lado o Algarve Reino de Portugal, Brasil e Algarves. Assim, pode afirmar-se que o Algarve surge como um libi das constituies liberais, porque em rigor, no existia Reino Unido algum. Isto porque o Brasil ficaria sem qualquer poder, uma vez que aquilo que a constituio previa era apenas que ali houvesse uma deputao permanente do poder executivo. Assim, no Brasil, no existia Cmara legislativa, nem Supremo Tribunal, e nem rgos prprios do Governo, sendo que, nem na Europa nem em Portugal existiam organismos representativos do Brasil, nem havia uma segunda Cmara, de tipo federal, como era normal em Estados mistos. Portanto, a ideia de que existia um Estado misto, era, na realidade uma fico, e assim, sendo fico, tanto o era para o Brasil como para o Algarve. Ora, existia aqui, por um lado, uma tentativa de resolver o problema do Brasil e, simultaneamente, dar uma compensao, isto , criar um libi para que os brasileiros no ficassem demasiado ufanos com tal situao. No entanto, tal situao falhou ainda antes de a constituio entrar em vigor, aps o grito de Ipiranga. Os revolucionrios queriam evitar o grito de Ipiranga, alis, em consequncia disso, a 32
prpria forma da constituio era muito curiosa, pois, seguiu uma tcnica legislativa original, que no se fez em mais nenhuma constituio portuguesa. As Cortes constituintes eleitas Portugal, Brasil, frica e sia -, comearam por aprovar umas bases da constituio, precisamente as bases que foram aprovadas para tentar acalmar o Brasil, ou seja, para tentar que o Brasil no se tornasse independente. Aps a situao anteriormente referida, criou-se a constituio em 1822, precisamente nesse acto entre 1820 e 1822, quando estava em causa, uma soluo a dar aos brasileiros. Assim, era necessrio dizer que se tratava de um Estado misto, ou seja, um Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, no entanto, tal construo falhou. Assim, por essa razo, a constituio de 1822 historicamente foi uma constituio falhada, pois, a partir do momento em que entrou em vigor, no conseguiu resolver o seu principal problema poltico evitar a independncia do Brasil -, tal como era o seu propsito. As fontes da constituio de 1822 so vrias, desde a constituio espanhola de 1812 - a constituio de Cdiz - e as constituies francesas (1791-1785). Ora, a constituio de 1822 era uma constituio tipicamente liberal e poltica, de acordo com a lgica do Estado liberal do sculo XIX, sendo que, de acordo com o dogma do liberalismo poltico, tem como matrias apenas a organizao e a separao dos poderes e a defesa dos direitos individuais. Do ponto de vista sociolgico, porm, a constituio de 1822 no foi to efectiva como a constituio de 1826, o que estava relacionado com a forma como a sociedade estava representada no quadro do poder poltico de ento. Nos termos do artigo 29. da constituio de 1822, o Governo da nao portuguesa era uma monarquia constitucional hereditria que regulava o exerccio dos trs poderes, sendo que, nos termos do artigo 30. da mesma constituio, constava o princpio da separao de poderes: o poder legislativo, executivo e judicial. Isto significava, do ponto de vista sociolgico, que o poder mais importante do Estado, o legislativo, que residia nas Cortes, era atribudo classe burguesa, embora com dependncia da sano do Rei (aqui, denota-se uma tentativa de agradar o Rei, com um poder de sano, mas que no era efectivo, pois, na prtica, no correspondia a um verdadeiro poder de colaborao entre os rgos, mas sim a um simples poder de veto suspensivo); o poder executivo encontrava-se no Rei, que o exercitava com a colaborao da nobreza, que indirectamente estava representada sob a autoridade do mesmo Rei; e o poder judicial encontrava-se na mo dos juzes. Alm disso, cada um dos poderes era autnomo e independente, sendo que nenhum deles podia influenciar o outro. Tal lgica era tpica do liberalismo poltico, ou seja, a separao de poderes e garantia dos direitos individuais que, do ponto de vista terico, correspondia 33
criao de um modelo de Estado liberal, o qual pode ser metaforicamente considerado como tendo dois pais e duas mes. Assim, por um lado, na base do Estado encontrava-se a ideia democrtica de Hobbes e de Rousseau. Porm, a democracia de Hobbes e Rousseau era apenas uma ligeira reminiscncia, que s existia no momento inicial, uma vez que, para Hobbes, ela dava origem ao Leviat um monstro todo-poderoso -, enquanto que, em Rousseau, ela dava origem criao da vontade geral, que se impunha totalitariamente vontade particular. H ainda que ter em conta que, quando se fala em democracia, a democracia do sculo XIX, e no a actual que est em causa. A noo de democracia est relacionada com a origem do poder, sendo que o poder tinha uma origem democrtica e baseava-se num pacto, algo diferente do que existia at a, ou seja, a ideia que se encontra actualmente na base das democracias, em que a legitimidade do poder no a monarquia, no o poder divino, incutido a uma pessoa, o poder resulta de um contrato. No entanto, os pais deste Estado democrtico e liberal Hobbes e Rousseau -, tambm faziam com que a democracia desaparecesse, por efeito do pacto social, ela era uma espcie de pecado original do Estado. Alm disso, havia o contedo dado, pelos autores a quem denomino de as mes do Estado, porque o seu pensamento, de alguma maneira, possui um lado mais afectivo, mais terno, que so Locke e Montesquieu - so estes dois autores que iro dizer que o Estado precisa de ter um contedo, que o da separao de poderes e da garantia dos direitos individuais. De tudo isto resulta uma ideia de constituio, que exclusivamente poltica. Uma constituio que no se ocupa da economia, da sociedade - tudo isso alheio constituio, tudo isso resolvido pela sociedade, pela lgica da mo invisvel, que conduz as coisas pelo melhor caminho. Portanto, o Estado no tem a ver com a economia, ocupa-se apenas da poltica, e o contedo da constituio a separao de poderes e a garantia dos direitos individuais, e isto que corresponde realidade do sculo XIX. Enfim, existe um terico socialista do sculo XIX que brinca, dizendo que este Estado liberal uma espcie de co de guarda da propriedade, alimentado a impostos, uma vez que a funo principal do Estado era ser o guardio da propriedade e a interveno do Estado limitava-se aos impostos. Neste modelo, a Administrao no devia sequer intervir na sociedade. O Estado era por natureza, um Estado minimalista, portanto um Estado muito diferente daquele que conhecemos actualmente. por isso que a constituio de 1822, como tpico das constituies liberais, abre com um ttulo, que corresponde aos direitos e deveres individuais dos portugueses, e h aqui um grande tratamento da questo dos direitos, como questo essencial da liberdade. Surge 34
aqui uma trilogia, que ir aparecer depois nas outras constituies liberais portuguesas, logo no artigo 1., onde se explica que a funo da constituio manter a liberdade, a segurana e a propriedade de todos os portugueses. Ora, esta trilogia liberdade, segurana e propriedade, que est na origem da constituio. Na constituio de 1822, define-se liberdade de uma forma negativa, que tambm uma ideia muito liberal, estabelecendo-se no artigo 2. , que liberdade os portugueses no serem obrigados a fazer o que a lei no manda, nem deixar de fazer o que ela no probe. , portanto, uma ideia que corresponde a esta lgica, de um Estado mnimo. O Estado define os limites da liberdade, que uma ideia muito enraizada, mesmo nos dias de hoje, mas uma ideia do sculo XIX. Quando as pessoas definem liberdade, em termos de linguagem do senso comum, normalmente utilizam uma frase bastante popular: a minha liberdade termina onde acaba a liberdade dos outros. Mas, a verdade que a liberdade no termina nem comea, sendo que esta ideia do terminar e do comear uma ideia liberal, era ver a liberdade como propriedade, tal como dizia o saudoso Prof. Lucas Pires, correspondia a uma espcie de direito real da liberdade. Nestes termos, a liberdade tem limites, confina a Norte, a Sul, a Este e a Oeste, e esses limites so definidos pela lei. Na verdade, nos nossos dias, a questo deveria ser colocada de forma diferente, pois a minha liberdade que condio da dos outros, no termina nem acaba. O problema no do meio nem do fim, a ideia do meio e do fim, a ideia liberal, a ideia do sculo XIX, da definio dos limites da liberdade, a tal lgica negativa, que era a lgica do Estado liberal. E portanto, as leis que definiam estas balizas, eram extremamente importantes na lgica da constituio, e mesmo quando no artigo 6. se estabelece o direito sagrado da propriedade privada, direito sagrado inviolvel - a expresso do legislador -, mesmo aqui se estabelece uma limitao, dizendo que podia haver expropriao por utilidade pblica, e que essas implicariam indemnizao. Tambm o artigo 9., da constituio de 1822, define a igualdade dos cidados perante a lei, luz do sculo XIX e no luz do sculo XX. A igualdade era entendida como a igualdade perante a lei, a libertao dos vnculos, a lgica do acabar com a estratificao da nobreza, isto , tratava-se de fazer com que, independentemente do nascimento, todos pudessem ter condies de acesso a todos os cargos, no estava ainda relacionada com a dimenso social, uma vez que essa questo s ir surgir no sculo XX, a ideia de que as pessoas devem ter condies econmicas equilibradas, e isso no uma noo liberal. A noo liberal a de uma liberdade jurdica, todos nascem iguais, a nica excepo a esta lgica a da fonte de legitimidade da monarquia, da a noo de compromisso destas constituies (compromisso 35
este que s desaparece em 1911). Da tambm a possibilidade de entender que a constituio de 1911 a ltima constituio liberal, ela , portanto, em sentido metafrico, a ltima constituio do sculo XIX e no a primeira do sculo XX. Enquanto, nos outros pases, por essa altura, tinham comeado a surgir as constituies do Estado social, a nossa constituio de 1911 era ainda uma constituio liberal, do sculo XIX, portanto. Depois, surgem-nos as garantias da lei penal, a abolio das penas cruis e infamantes, e a finalizar esta parte da constituio, no artigo 19., estabelecem-se deveres do Estado, e entre estes deveres do Estado, o primeiro o venerar a religio. Isto mostra bem a j referida especificidade do liberalismo portugus, que no era laico, ou melhor, no tinha a coragem de se assumir como laico, mesmo que gostasse de o ser. Mesmo se alguns liberais gostariam de introduzir essa dimenso do laicismo, nenhuma das constituies portuguesas era laica, todas elas consagravam a religio catlica como religio oficial do Estado. E o primeiro dever pblico era o de venerar a religio, s em seguida deveriam amar a ptria, obedecer constituio e s leis, e contribuir para as despesas do Estado (a tal lgica do imposto, que era importante). Tambm, se por um lado, desaparecem as penas infamantes (a abolio da escravatura no surge ainda, pois ainda era muito cedo para ela surgir em Portugal, embora tenhamos sido os pioneiros nesta realidade). Enfim, a escravatura no estava sequer includa na ideia da igualdade liberal, jurdica, dos cidados perante a lei, aspecto que s surgir mais tarde, durante a consolidao do liberalismo portugus. H uma outra coisa curiosa na constituio de 1822, que era a mais liberal de todas, que as restries ao sufrgio so quase todas restries capacitrias. Ora bem, h que esclarecer, na lgica da representao social, que as constituies liberais so constituies burguesas, elas foram feitas para que o burgus esteja representado no Parlamento e, consequentemente, para que o burgus mande. A funo legislativa a principal do Estado, e a nova classe, a classe ascendente, a burguesia, que surge com o liberalismo poltico, que est representada no Parlamento. Assim, as constituies liberais dos demais pases europeus so quase todas censitrias, isto , estabelecem restries de renda para se poder votar. O voto tambm no universal (isso uma realidade do sculo XX), o voto restrito e censitrio, ou seja, quem vota quem tem um determinado nmero de rendimentos, e quem pode ser eleito, tem rendimentos ainda superiores. Curiosamente, a constituio de 1822 - a constituio mais liberal de todas -, tem como restrio principal, a capacitria, ou seja, deve-se saber ler e escrever, chegando idade de 25 anos completos para se poder votar. No entanto, esta restrio capacitria, no fundo, 36
tambm uma restrio censitria, porque s sabia ler e escrever quem tinha condies monetrias, e, portanto, por detrs desta restrio capacitria tambm est encoberta uma restrio de natureza censitria. Portanto, aqui, curiosamente, as regras censitrias, surgem na condio de ser eleito, no na condio de votar, mas na condio de ser eleito. A constituio estabelece um sistema estratificado de vrios rgos eleitorais, vrios colgios eleitorais com regras de elegibilidade progressivamente mais exigentes, em que se excluem os vadios, os falidos (quem no sabe tomar conta do seu patrimnio, no pode tomar conta do patrimnio do Estado o que se calhar um princpio muito sbio, a recuperar actualmente das antigas constituies liberais); em que se exige um mnimo de renda para poder ser eleito, ou seja, no qualquer um que pode ser eleito. Como ironizava o saudoso Prof. Lucas Pires, havia aqui uma inverso de algo que corresponde realidade de hoje, ou seja, actualmente, ascende-se ao poder para ficar rico, enquanto que, na poca liberal, era preciso ser rico para ascender ao poder. Assim, quem iria para o Parlamento seria a burguesia, o que corresponde realidade do sculo XIX. Quanto forma do Estado, tnhamos um Estado misto. Mas era um Estado misto aparente, no havendo em rigor nada tpico de um Estado composto. A constituio usa uma linguagem algo flutuante, pois fala no Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, sendo que o Algarve s aparece nesta enumerao como Reino, embora depois, acabe por ser tratado como qualquer provncia, alm de haver uma outra referncia, no artigo 38., ao Reino de Angola, embora no fosse acrescentado o nome de Angola ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve. Por outro lado, a unio real era aparente, porque em primeiro lugar no havia, nem nos rgos nacionais, representantes do Estado brasileiro, eleitos enquanto tal. Ora, o que normal, que num Estado misto, exista uma segunda Cmara para representao dos Estados, que integram esse Estado misto. Portanto, deveria existir representao do Brasil ao nvel do poder legislativo, o que, na verdade, no havia em Portugal. A nica coisa que se fez como sucedneo disto, foi permitir que, no Conselho de Estado, houvesse representao do Brasil, mas tambm dos Algarves e todas as outras provncias, mas, em rigor, o Conselho de Estado no tinha importncia nenhuma, pois apenas desempenhava uma funo de consulta do chefe de Estado. Alm disso, tambm no havia rgos de poder prprios no Brasil, pois no estava previsto na constituio que houvesse uma Cmara legislativa, nem que houvesse um poder executivo, nem um poder judicial no Brasil, prevendo-se apenas no texto constitucional que houvesse apenas uma deputao do executivo do Brasil.
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Tudo isto explica porque que a constituio de 1822 no funcionou. O Brasil, que at ento possua a capital do Reino de Portugal e do Brasil - o Rio de Janeiro -, que era a capital do imprio na Europa e Alm-mar, de um momento para o outro, ficaria sem qualquer poder. O Brasil perderia a Corte e ficaria consequentemente sem nada, ficaria com uma Delegao do poder executivo do Continente. Assim sendo, como bvio, esta constituio acabou por falhar, apesar da votao das bases da constituio, que tentou refrear os nimos autonomistas brasileiros. Tal no foi, no entanto, conseguido e, por essa razo, a constituio no foi capaz de resolver os problemas que se colocavam. Entre as diferentes instituies polticas, na lgica da separao de poderes, as Cortes eram descritas no artigo 102.. As Cortes serviam, como se viu, para a representao da burguesia, elas tinham o monoplio do poder legislativo e a prpria iniciativa legislativa era exclusiva dos Deputados, outra coisa que no corresponde realidade de hoje. Existia, a propsito do processo legislativo, uma norma muito curiosa (o artigo 106.), sobretudo para os dias de hoje, em que vivemos numa altura em que existem leis a mais e existem leis por tudo, o que algo bastante diferente do que acontecia em 1822. De facto, no mbito da constituio de 1822, existiam muito poucas leis, precisamente porque o Estado devia interferir o mnimo na vida pblica e, portanto, o processo legislativo era um processo muito curioso, onde se comeava por ler uma proposta, e depois, esperava-se que houvesse 15 dias para as pessoas reflectirem sobre a proposta, e posteriormente, comeava-se a discutir a proposta, e em caso de urgncia, poderia haver uma proposta provisria. Portanto, as leis demoravam meses, ou at anos a serem feitas, uma vez que as leis deveriam ser reflectidas, pensadas. As Cortes tinham ainda poder constituinte, tomavam juramento ao Rei, legislavam em matria de imposto, entre outras coisas. No que respeita ao Rei, que era a cabea do executivo, tinha um poder importante de impedir, para usar a expresso de Montesquieu (le pouvoir dempcher), ou seja, de impedir a actuao do Parlamento, na lgica dos freios e contra-pesos que o mecanismo de separao de poderes. O Parlamento criava as leis, mas estas podiam ser impedidas pelo Chefe de Estado, o que actualmente corresponde s figuras da promulgao e do veto. Ora bem, na lgica do sculo XIX, falava-se antes em poder de sano, sendo esta vista como uma forma de colaborao entre o Rei e as Cortes, e nas constituies liberais esta sano gozava de uma eficcia absoluta. Deste modo, o Rei concorda ou no com o decreto do parlamento e, caso no concorde, aquele no entraria em vigor.
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Curiosamente, na constituio de 1822, este poder do Rei era to enfraquecido, que havia apenas um mero veto suspensivo, que era superado at pelo silncio do Rei. Pois, o artigo 114., expressa que, caso o Rei no se pronunciasse num prazo de 1 ms, era como se tivesse sancionado a lei, o que corresponderia quando muito a uma ideia de colaborao subordinada, onde, na verdade, o Rei no tinha qualquer poder efectivo. O Rei, de facto, na constituio de 1822, no gozava de poder de sano, do qual ir, no entanto, gozar nas constituies de 1826 e de 1838 e, tambm por isso, que essas constituies so mais adequadas realidade do sculo XIX portugus. De facto, na constituio de 1822, o predomnio era do Parlamento, onde estava representada a burguesia. O Rei, para alm disso, nomeava e demitia os Secretrios de Estado, nomeava para os cargos pblicos, tinha interferncia nas relaes internacionais, mas no detinha porm qualquer poder efectivo. Duas notas ainda. Uma para referir uma realidade muito curiosa do sculo XIX portugus, que depois no transitou para o sculo XX, que a de haver juzes electivos, para alm de juzes de facto. Outra, para acentuar o carcter rgido da constituio de 1822, o que contraria uma ideia feita dos nossos dias, da rigidez das constituies actuais por contraponto flexibilidade das do passado. A constituio de 1822 tinha requisitos temporais de reviso, pois s podia ser revista de 4 em 4 anos, alm de que exigia ainda uma maioria qualificada quanto necessidade de reviso; determinava a necessidade de mandato especfico de reviso e de uma maioria qualificada para a sua aprovao, ou seja, era muito mais rgida que a actual constituio de 1976. Em termos de apreciao final, como j foi referido, a constituio falhou, do ponto de vista das relaes com o Brasil, e na lgica do Estado misto, mas tambm falhada, porque no foi capaz de contentar de forma eficaz todas as classes sociais. Assim, na lgica de Montesquieu, a diviso do bolo do poder, pelas diferentes classes sociais, no correspondia lgica da constituio de 1822. A lgica da constituio de 1822, dava todo o poder Burguesia, sendo esta a classe que se encontrava no parlamento, e o prprio Rei, indirectamente, representava a classe senhorial. Ora, na verdade, o Rei tinha uma funo subordinada, porque a sano no existia. Uma constituio que dava todo o poder burguesia s poderia funcionar num pas que tivesse uma classe burguesa forte, que tivesse uma estrutura capitalista, o que no existia em Portugal, em 1822. Por todas essas razes, a constituio falhou. Na segunda metade do sculo XIX, iro surgir os esteios para o liberalismo poltico, com o surgimento de um verdadeiro mercado nacional, que far surgir uma classe burguesa mais forte. Mas tudo isso vai surgir demasiado tarde, do ponto de vista da constituio de 39
1822, pois j tinha passado o seu tempo. Assim, no que respeita representao das classes sociais, a constituio de 1822 estava fora do seu tempo, porque dava todo o poder burguesia e a burguesia em Portugal era inexistente, na altura. Era uma classe fraca, que no tinha fora para se impor sozinha, embora tivesse alguma importncia em Lisboa e no Porto, e mesmo assim reduzida. De facto, a burguesia tinha ajudado a fazer a revoluo, mas no era ainda capaz de sustentar um modelo de Estado (to) liberal, e por isso que esta constituio viria a ter perodos de vigncia muito limitados (de Setembro de 1822 a Junho de 1823, e depois de 1836 a 1838, e aps a revoluo Setembrista at surgir a constituio de 1838). Embora, a constituio de 1822 tenha sido muito importante do ponto de vista doutrinrio e tenha marcado uma ruptura com a ordem do passado, ela seria tambm uma constituio falhada, podendo-se acrescentar ironicamente que esta constituio estava reservada ao caixote do lixo da histria. Posteriormente, temos a constituio de 1826, a qual, independentemente de juzos ideolgicos, vai ser a mais adequada e apropriada para a realidade do sculo XIX portugus. Esta constituio, na realidade, chamava-se Carta Constitucional, e foi outorgada pelo monarca D. Pedro, pela graa de Deus, outorga a seguinte constituio. Portanto, logo na feitura da constituio, existe uma legitimidade do poder constituinte, que monrquico, enquanto que, a constituio de 1822 era democrtica, elaborada pelas Cortes. A ideia do poder moderador era de Benjamin Constant, cuja influncia na elaborao da constituio era assumida por D. Pedro IV, e correspondia prtica do orleanismo francs, de Louis Philippe. S que o poder moderador, tal como caracterizado por Constant e aplicado em Frana, era diferente do portugus, dando-se aqui algo que, com excesso de ironia, mas com alguma razoabilidade, Vasco Pulido Valente costuma chamar de uma traduo do francs em calo. O quarto poder ou o poder moderador, que cabia ao monarca, no um poder de interveno directa no jogo poltico, pois o Rei era apenas um rbitro, e no um jogador. Em termos simplificados, pode-se afirmar que o que correspondia ao poder moderador, era basicamente o que corresponde actualmente aos poderes do Presidente, num sistema semi-presencial, como o nosso. Tratava-se de uma espcie de reunio das faculdades de impedir (facults dempecher), que Montesquieu havia concebido como dispersas entre os diferentes poderes polticos, e concentr-las num nico rgo, atribuindo a esse rgo um poder de arbitragem. Ora, na constituio de 1826, aquilo a que se chama poder moderador, no era apenas o poder de arbitrar, era o poder de actuar. Existe aqui, portanto, uma realidade que faz do Chefe de Estado a chave do poder poltico, pois o Governo depende quase exclu40
sivamente do Rei, tal como o Rei que nomeia Deputados para uma das Cmaras a Cmara dos Pares -, interferindo assim tanto no poder executivo como no legislativo. Isso explica o fenmeno do rotativismo portuguesa, na segunda metade do sculo XIX, que consiste numa manifestao de concentrao do poder real, em que o Rei decidia, a seu bel-prazer, quando era altura de mudar de governo. Assim, enquanto que, em Inglaterra, havendo uma crise poltica, o chefe de Estado dissolvia o parlamento e convocava eleies, nomeando depois, para formar governo o lder do partido vencedor, em Portugal, perante uma crise poltica, o Rei convocava igualmente eleies, s que antes convidava o lder do partido da oposio a formar Governo, que a seguir ganhava as eleies. Assim, as eleies eram sempre ganhas pelo partido do poder (e h quem diga que o mesmo sucede ainda hoje...), o qual, a seguir, ratificava a sua actuao anterior, em ditadura (com o parlamento dissolvido). Assim, o Rei no era apenas um rbitro do sistema, mas tambm um jogador com um poder muito importante, pois detinha o poder de interferncia no poder legislativo e executivo, e at no poder judicial. Ora tal resultava da realidade portuguesa, no tinha nada a ver com Benjamin Constant, nem com a respectiva ideia de poder moderador. Em termos de representao social, a constituio de 1926 completamente diferente da constituio de 1822, porque aqui, a classe velha, a classe do antigo regime, ou seja, a classe senhorial, sentia-se representada pelo Rei, que tinha poder, e portanto, havia um equilbrio entre o poder da burguesia na Cmara Baixa do Parlamento com o poder da aristocracia, que estava na Cmara Alta, e que era representada pela Rei. Assim, havia aqui uma nova lgica que funcionou bem, no incio do sculo XIX, mas que ir funcionar ainda melhor na segunda metade do sculo XIX. Pois, por essa altura, ir ser criada uma nova estratificao social, em que ir surgir uma nova nobreza e uma nova burguesia, criadas pela lgica liberal. Ora na realidade, esta nova nobreza liberal vem da burguesia (so os tempos do foge co, que te fazem baro, para onde, que me fazem visconde) e tal ir contribuir para que a constituio de 1826 consiga ter um perodo de vigncia mais amplo do que o sucedido anteriormente. Do ponto de vista dos direitos fundamentais, temos aqui uma realidade, que sendo curiosamente de arrumao das matrias, no deixa de ter a sua importncia. O Professor Jorge Miranda est sempre preocupado com a questo da arrumao da constituio, e essa preocupao tem alguma razo de ser, pois ela tem subjacente uma determinada valorao das matrias. Assim, a Carta Constitucional, em vez de comear como a de 1822 e a de 1838, com 41
os direitos fundamentais, remete os direitos fundamentais para o fim, o que pode significar uma certa desvalorizao da sua importncia relativa. Assim, ser o ltimo artigo da constituio que ir falar dos direitos fundamentais, sendo este o artigo mais longo da constituio, embora o nico. Este artigo encontra-se, alis, muito bem escrito, dele constando realidades novas: a proibio da retroactividade das leis; a liberdade de deslocao e emigrao; a liberdade de trabalho e emprego; a propriedade intelectual; a proibio das perseguies por razes religiosas (embora continue a existir a religio oficial, nos termos do artigo 6.); os prenncios dos direitos de tipo cultural (no quadro da instruo); a garantia da nobreza hereditria. Uma tal consagrao, nos direitos fundamentais, da garantia da nobreza hereditria, significa uma lgica de continuidade entre o liberalismo e o antigo regime, sendo certo que a constituio de 1826 conseguiu contentar ambos os lados, tendo sido, por isso, a mais adequada para a realidade do sculo XIX portugus. Contudo, se do ponto de vista sistemtico, a relevncia dos direitos fundamentais menor na Carta Constitucional do que em 1822 e em 1838, tal no significa que a Carta Constitucional seja menos liberal do que as demais portuguesas constituies. Alis, foi no quadro desta constituio, que mais tarde se aboliu a pena de morte: primeiro, no Acto Adicional de 1852, para os crimes polticos; depois, para os crimes civis, pela Carta de Lei de 1 de Junho de 1867. Do ponto de vista do sistema poltico, existiam quatro funes do Estado, dando origem a um sistema monrquico, hereditrio e representativo (artigo 4.). Esta enumerao muito curiosa, pois o Regime comea por ser monrquico, sendo a constituio dada pelo monarca, e em que o Rei detm um grande poder, podendo mesmo interferir com os demais; depois hereditrio, estando aqui includa a preservao da aristocracia liberal; e a seguir, representativo, ou seja, d poder aos burgueses, no mbito do Parlamento. Temos aqui uma lgica de compromisso, que a lgica, no fundo, de todas as constituies, que so tambm compromissos sociais. Neste caso, tratava-se de um compromisso que era o mais adequado realidade portuguesa, tendo em conta que a classe burguesa, na primeira metade do sculo XIX, tinha ainda um peso reduzido. Havia, desde logo, o poder moderador, que era a chave de toda a organizao poltica. Atravs dele, o Rei interferia nos demais poderes estaduais, nomeadamente no legislativo, elegendo os membros de uma das Cmaras (a Cmara dos Pares). Este foi, de resto, o problema mais discutido nos finais do sculo XIX portugus, uma vez que os sucessivos actos constitucionais, consoante eram mais liberais ou mais monrquicos, estabeleciam a lgi42
ca totalmente representativa das duas Cmaras, ou atribuam ao monarca o poder de nomear os membros de uma das Cmaras. Alm disso, o monarca tinha poderes de sano, ou seja, o diploma no entrava em vigor enquanto no tivesse a concordncia do rei. Alm destes poderes relativamente ao executivo, o monarca possua tambm poderes em relao ao executivo, designadamente de nomeao e demisso livre de todos os ministros. A lgica era de responsabilidade exclusiva do Governo, perante o Chefe de Estado, num quadro de concentrao de poderes. Mas o monarca era tambm dotado de poderes relativos ao poder judicial, incluindo o de suspender magistrados, de perdoar e moderar penas. Conforme se disse antes, em rigor, o que correspondia ao poder moderador portugus no era tanto a reunio dos poderes de impedir num nico poder do Estado, mas antes a atribuio de poderes de controlo do Chefe de Estado, em relao a todos os demais poderes pblicos. Da que, os actos de poder moderador eram os nicos que no eram sujeitos a referenda ministerial, ou seja, eram actos livres, em que nem sequer a assinatura dos ministros era necessria, como acontecia em relao a todos os actos do poder legislativo. Mas o rei era tambm o chefe do poder executivo. De resto, pode-se falar de um sistema de concentrao de poderes no rei, que no correspondia ideia do liberalismo poltico, mesmo se temperado com os poderes do legislativo e com a autonomizao do Chefe do executivo, que era uma prtica, que iria surgir no quadro portugus, tambm por influncia francesa. Esta realidade, de alguma maneira, fornece uma fatia importante do bolo do poder burguesia, mantendo, porm, a representao da nobreza hereditria, numa frmula poltica mais equilibrada, entre a nova e a velha classe preponderante. Posteriormente, porm, tudo se viria a transformar na segunda metade do sculo XX, com o surgimento de uma nova aristocracia liberal, que vinha reforar o poder da burguesia. Na segunda metade do sculo XIX, existia o j referido fenmeno de rotativismo portuguesa, que era inspirado no britnico, embora completamente diferente no caso portugus. Assim, existiam dois grandes partidos (surgidos na fase dos melhoramentos materiais do Fontismo), que alternavam entre si o poder. O Governo, de resto, no dependia do Parlamento, mas sim do rei, sendo que, no incio, dependia apenas dele, mas posteriormente passou a haver a lgica de dupla responsabilidade poltica. Ora, ocorrendo uma crise poltica, o rei demitia o governo e dissolvia o parlamento, mas convidava o partido da oposio a formar governo, antes das eleies. Seguidamente, o partido da oposio ganhava as eleies e legitimava tudo o que tinha sido feito at ento - o chamado bill de indemnidade. Entre o momento em que foi nomeado um novo Governo e entre o momento em que haveria eleies, 43
havia a prtica dos actos ilegais, totalmente ilegais e inconstitucionais, porque quem actuava era o Governo que elaborava leis, e quem podia elaborar as leis era o Parlamento, e o Parlamento no existia. Da que, aps as eleies, o primeiro acto do Parlamento recm-eleito era conceder um bill de indemnidade, ou seja, convalidar tudo o que tinha sido feito at ento. Na realidade, estava-se perante uma situao de inconstitucionalidade orgnica, mas como as eleies haviam sido ganhas pelo governo, a coisa resolvia-se a contento. Embora a constituio de 1826 fosse a de mais longa vigncia no sculo XIX portugus, h ainda que contar com a constituio de 1838. A constituio de 1838 era um compromisso entre a constituio de 1822 e a constituio de 1826, isto , representava um compromisso entre Vintistas e Cartistas, embora estivesse mais prxima da constituio de 1822, sendo assim, mais Vintista do que Cartista. Tal compromisso detectava-se logo na elaborao da constituio, decorrente do acordo entre as Cortes e o monarca, sendo elaborada pelas Cortes, mas havendo porm uma sano real. Esta constituio foi influenciada pela constituio francesa de 1830, pela constituio belga de 1831, pela constituio brasileira e pela constituio espanhola de 1837. O drama da constituio de 1838, que teve um perodo muito curto de vigncia (entre 1838 a 1842), era o de que, na realidade, no agradava a ningum. O seu carcter demasiadamente compromissrio, acabou por levar a que ningum se revisse na Constituio de 1838, nem os Vintistas nem os Cartistas, sendo que ambos preferiam ou a constituio de 1822 ou a Carta constitucional. Pois, como dizia, com ironia, Lucas Pires, as solues meias-tintas em Portugal, em regra, transformam-se em solues troca-tintas, o que pode bem servir para caracterizar o drama desta nossa constituio. Tal como sucedia em 1822, a constituio de 1838 detm um ttulo III bastante desenvolvido, com os direitos e garantias fundamentais dos portugueses, acrescentando novos direitos: a liberdade de associao, a liberdade de reunio, o direito de resistncia. No que respeita ao direito de propriedade, existia algo muito curioso (que estava relacionado com a criao do capitalismo em Portugal, nos finais do sculo XIX), que a norma que consagrava uma espcie de irreversibilidade das privatizaes - em contraponto com a norma da constituio de 1976, que estabelecia a irreversibilidade das nacionalizaes. O que estava em causa era terminar com os vnculos da propriedade, pondo termo a propriedade vinculada, que fazia com que a propriedade se transmitisse do pai para o filho varo mais velho (o que era algo que contrariava a lgica do capitalismo e da sociedade burguesa). Assim, tratava-se no apenas de
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revogar a lei dos vnculos, pela via legislativa, como tambm afirmar, do ponto de vista constitucional, que tal era irreversvel, que no podia ser mudado. A constituio de 1838 consagrava uma lgica de tripartio de poderes, em que o poder legislativo competia s Cortes com sano de rei (o que significava que, na realidade, o rei tinha mais poderes em 1838 do que tinha tido em 1822); o poder executivo cabia ao rei, que o exercia atravs dos Ministros e Secretrios de Estado; e o poder judicial cabia aos juzes e aos jurados. O poder legislativo comportava duas Cmaras, mas que no tinham qualquer utilidade social, pois eram ambas electivas, sendo certo que havia restries censitrias maiores para a Cmara Alta do que para a Cmara Baixa (vide os artigos 34., 75. e 77.). Poder-se-ia considerar que o objectivo era colocar os cidados mais ricos e mais burgueses na Cmara Alta, enquanto que os cidados menos ricos ou menos burgueses deveriam ser colocados na Cmara Baixa, mas era uma distino que no tinha qualquer sentido, sendo irrelevante, do ponto de vista sociolgico. Fazendo a comparao, de acordo com a constituio de 1838, foram atribudos ao rei mais poderes, do que na constituio de 1822, pois o chefe de Estado possua efectivos poderes de sano das leis (no havendo, portanto, possibilidade de superar o veto legislativo do monarca). O sistema de Governo procurava fazer um compromisso entre os poderes do monarca e os poderes do Parlamento, ou seja, em termos sociolgicos, havia uma partilha do bolo do poder entre a burguesia e a aristocracia (que, indirectamente, era representada atravs do monarca). Assim, a burguesia tinha a fatia maior do bolo e o monarca tinha poderes de sano, mas apesar de tudo, era ainda muito poder para a burguesia no sculo XIX portugus. Por essa razo, a constituio de 1838 tambm falhou, porque efectivamente a realidade do sculo XIX portugus era diferente, mais conforme com a constelao de foras espelhada na constituio de 1826. Para terminar, apenas uma referncia breve constituio de 1911, que , conforme antes se disse, ainda uma das constituies liberais portuguesas. Pois, a constituio de 1911, com a introduo do republicanismo e do laicismo, continua a manter o esprito das constituies liberais portuguesas, como os liberais de 1822 tentaram fazer e no conseguiram. Por essa razo, reafirmo ironicamente, que a constituio de 1911 no a primeira constituio do sculo XX portugus, mas sim a ltima constituio liberal portuguesa.
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tempo de acabar, e vou faz-lo de forma erudita, parafraseando o Padre Antnio Vieira, quando pedia desculpa, por no ter tido tempo para ser mais breve...
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um cavaleiro que, prestes a desfalecer, se atirou a seus ps, apresentando-lhe um mao de papis lacrados. Ao l-los, o seu semblante transformou-se completamente, denotando a profunda irritao que as notcias de Lisboa lhe causavam. Passaram-lhe, ento, pelo pensamento, as afrontas, humilhaes, insultos a que as Cortes de Lisboa o vinham h muito sujeitando, a si e aos seus deputados. Num arrbo, prprio do seu temperamento desempoeirado mas colrico, chamou para junto de si toda a comitiva que ali se achava espalhada e, arrancando do chapu o lao portugus, atirou-o ao cho, clamando com energia: Independncia ou Morte!. Este gesto de D. Pedro, ento com 24 anos, Prncipe Herdeiro do Reino Unido de Portugal e do Brasil e Regente do Brasil, veio no s desfazer a esperana de obrigar o Brasil a integrar-se no Estado nacional portugus, como pr em causa a primeira experincia liberal portuguesa, abrindo, por outro lado a questo sucessria, que viria a dividir o pas e a provocar a guerra civil. A capacidade de analisar e julgar um modo de pensamento alargado, ou seja, a possibilidade de uma pessoa pensar, colocando-se no lugar de outrem, o senso comum a todos que orienta a nossa imaginao quando sondamos o comportamento intencional, isto , a aco dos sujeitos histricos, permitindo avali-los de modo a justificar as suas aces, ou seja, adoptar o ponto de vista deles, conceber como eles viram uma determinada situao e julgar, abstraindo dos nossos prprios interesses e preconceitos pessoais. Desta maneira, a Histria ter de colocar-se dentro da opinio recebida: ocupar-se, no dos problemas sugeridos pelas teorias sociais, elaboradas na actualidade, mas sim daquelas que preocuparam as sociedades passadas. Uma das principais heranas da Revoluo Francesa foi a ideia moderna de revoluo e a figura do revolucionrio moderno, hoje interiorizada por todos ns. Talvez se torne, assim, difcil apercebermo-nos da aterradora novidade que o fenmeno ento constituiu. Porm, se no conseguirmos entender o grande pnico vivido pelos nossos antepassados, arriscamo-nos a no compreender o objecto dos seus esforos e tampouco o ardor das lutas que travaram. O sculo XIX j foi chamado o sculo das revolues. Todas estas revolues tiveram como pontos comuns serem quase todas dirigidas contra a ordem estabelecida, quase todas empreendidas em prol da liberdade, da democracia poltica ou social, da independncia ou unidade nacionais.
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A agitao revolucionria tem como primeira fonte a Revoluo Francesa de 1789, mas no se esgota nela. De facto, no fim do sculo XVIII, comea a fazer-se sentir no Continente a influncia poltica da Inglaterra, onde os princpios do liberalismo e do governo representativo se impuseram s tentativas absolutistas. A uma primeira vaga a que correspondem os movimentos liberais que se produzem em nome da liberdade, contra as sobrevivncias ou os regressos intempestivos do antigo regime, seguiu-se uma segunda vaga, formada pelas revolues democrticas propriamente ditas. Note-se que, entre 1830 e 1850, liberalismo e democracia se diferenciavam e at se opunham: a democracia o sufrgio universal, o governo do povo, enquanto o liberalismo o governo de uma elite. Durante a segunda metade do sculo XIX, so estas correntes que se vo sucedendo e combatendo, mas ambas tm como inimigo comum a ordem estabelecida, os princpios oficiais, as instituies legais, as classes dirigentes, as dominaes estrangeiras. o conflito entre as foras de renovao e os poderes estabelecidos, que explica tambm a violncia e a frequncia das confrontaes, que quase sempre levaram prova de fora, tanto a nvel nacional como europeu. As transformaes polticas operadas em Portugal no sculo XIX, no constituram factos isolados do nosso percurso histrico, mas significaram a nossa adaptao a uma nova rerum ordo que se imps a todo o mundo e se tornou o modo de ser e agir de toda uma civilizao. Voltando independncia do Brasil, hoje geralmente aceite que qualquer que tivesse sido a evoluo poltica portuguesa, o Brasil teria conseguido a sua emancipao. Tal decorre, no s do iderio revolucionrio da poca, como dos sinais manifestados pelos movimentos independentistas de Fevereiro de 1821, em Pernambuco, no Par e no Maranho, mas tambm da independncia americana e da evoluo dos acontecimentos nas colnias espanholas, entre 1818 e 1824. Acresce que a proclamao de D. Pedro e a sua qualidade de primeiro imperador constitucional, so hoje considerados factos polticos de grande repercusso histrica, demonstrativos de aguda previsibilidade, habilidade e coragem polticas. Com efeito, no s se conseguiu manter, entre as duas naes, o nexo das ligaes dinsticas, como se conservou, por quase 70 anos, uma monarquia num vasto continente semeado de repblicas. 49
A nova situao do Brasil viria a ser confirmada solenemente na Carta de Lei e dito Perptuo de 15.11.1825, subscrito por D. Joo VI, que ratifica o Tratado de reconhecimento da independncia do Brasil, de 29 de Agosto do mesmo ano. A monarquia dualista de 1815 mudava de sistema poltico, recebia uma nova estrutura, mas subsistia. Naqueles instrumentos que reconheciam a independncia do Brasil, firmavam-se, tambm, os direitos de D. Pedro ao Trono de Portugal: ...e por a sucesso das duas Coroas Imperial e Real pertencer a meu sobre todos muito amado Filho e Prncipe D. Pedro, nele por este mesmo acto e carta patente, cedo e transfiro j, de minha livre vontade, o pleno exerccio da soberania do Imprio do Brasil para o governar denominando-se Imperador do Brasil e Prncipe Real de Portugal e Algarves, reservando para mim o ttulo de Imperador do Brasil e o de Rei de Portugal e Algarves com a plena soberania destes dois Reinos e seus domnios. Entretanto, a Constituio, que resultara da revoluo liberal-burguesa de 1820, foi jurada pelo Congresso a 30.9.1822 e pelo Rei D. Joo VI no dia seguinte, 1 de Outubro. A opinio pblica inquietava-se com a situao instvel do pas e manifestava a sua desiluso sobre os prometidos benefcios do regime constitucional. A Rainha D. Carlota Joaquina recusara jurar a Constituio; o Conde de Amarante, em Vila Real, rebela-se contra a Constituio. Em Outubro-Dezembro de 1822, realiza-se o Congresso de Verona, que configura a contra-ofensiva reaccionria ao liberalismo. Em Abril de 1823, um exrcito francs, agindo em nome da Santa Aliana, invade a Espanha para forar a abolio da Constituio de Cdiz e restabelecer Fernando VII como Rei absoluto... Em Portugal, a ruptura viria a acontecer em 27.5.1823, quando um regimento da guarnio de Lisboa partiu para Vila Franca de Xira, de onde o seu comandante exigiu o restabelecimento dos direitos do Rei. O Infante D. Miguel, testa de um numeroso grupo, junta-se aos revoltosos. Ao fim da tarde desse dia, todos os regimentos da capital apoiavam o movimento da Vilafrancada. Restabeleceram-se as prerrogativas reais; D. Miguel foi nomeado Comandante em Chefe do Exrcito; foi criada um junta encarregada de elaborar uma nova constituio. As faces que compunham a junta no se entenderam e, em 30.4.1824, a guarnio militar de Lisboa saiu rua, vitoriando o Infante D. Miguel que, em proclamaes popula50
o, afirmava que o Rei corria perigo e acusava as autoridades constitudas de constranger o Rei a no permitir o regresso antiga ordem. Inicialmente D. Joo VI contemporizou com o Infante, mas alguns dias depois, a 9 de Maio, pressionado pelo corpo diplomtico, aceitou refugiar-se no navio ingls Windsor Castle, ancorado no Tejo, reassumindo o comando em chefe do exrcito e mandou vir o Infante sua presena para o informar da sua expatriao. D. Joo VI viria a falecer 2 anos depois, a 10.3.1826. Nesses dois anos, Portugal foi governado por um absolutismo moderado. A prometida constituio nunca se concretizou, chegando o soberano a anunciar a sua inteno de convocar as Cortes maneira antiga. Numerosos liberais fugiram do pas, exilando-se em Inglaterra e em Frana. Pouco antes de falecer, D. Joo VI nomeara um Conselho de Regncia, presidido por sua filha, a Infanta D. Isabel Maria. Essa Regncia ordenou, desde logo, que os documentos oficiais passassem a ser emitidos em nome de D. Pedro IV, Rei de Portugal e enviou ao Rio de Janeiro uma delegao de altas personalidades a fim de em nome da Nao Portuguesa render preito a D. Pedro como Rei natural e legtimo soberano felizmente chamado pela ordem de sucesso a ocupar o trono. Uma semana depois de o falecimento de D. Joo VI ser conhecido no Brasil, D. Pedro abdicou a favor de sua filha, D. Maria da Glria, ento com 7 anos, sob a condio de ela casar com seu tio D. Miguel, ao qual seria confiada a Regncia do Reino, e que em Portugal fosse jurada uma nova constituio. A Carta Constitucional viria a ser outorgada por D. Pedro a 29.4.1826. Julgou D. Pedro com esta soluo de compromisso concitar o apoio das trs correntes do espectro poltico portugus: liberais, moderados e absolutistas. Recorde-se que o modelo de carta constitucional, adoptado pela primeira vez em Frana por Lus XVIII, em 4.6.1814 e logo depois nos Pases Baixos, na Noruega e no GroDucado de Varsvia, foi um instrumento que, sob a aparncia de um regresso ao Antigo Regime e sob a cor de uma restaurao, fez apreciveis concesses ao esprito da poca e reivindicao liberal de um texto constitucional. Em 25.3.1824, D. Pedro havia outorgado ao Brasil uma Carta Constitucional. Nos termos da Carta Constitucional de 1826, o Rei, atravs do exerccio do poder moderador, era a chave de toda a organizao poltica, conservando uma interveno efectiva 51
nos trs poderes do Estado: no executivo, nomeando e demitindo livremente os ministros; no legislativo, reservando-se o direito de dissoluo e de veto; no poder judicial, atribuindo-se o direito de moderar ou anular as penas. Foi esta latitude de poderes reais que fez nascer a oposio dos elementos mais radicais do liberalismo, oposio que, logo em 1836 se manifestou com a revoluo de Setembro e, depois, com a restaurao cartista de 42, deu origem s lutas da Patuleia, s terminadas em 51 com a Regenerao. Entretanto, a Regente D. Isabel Maria fez aclamar a nova Rainha D. Maria II e jurar a Carta em todo o pas, organizando tambm as eleies para as novas Cortes. Em Viena, o Infante D. Miguel aceitou as condies de seu irmo, jurou a Carta e realizou os esponsais com a sobrinha. Por Decreto de 3.7.1827, D. Pedro nomeia o Infante seu Lugar-Tenente e Regente do Reino. Em Fevereiro de 1828, D. Miguel regressa a Portugal, onde jurou novamente fidelidade a D. Pedro e a D. Maria II, assim como Carta Constitucional. Porm, em Maro de 1828, D. Miguel dissolveu as Cortes, voltando a convoc-las, como Cortes Gerais da Nao, para 23 de Junho desse ano, com os seus trs braos, clero, nobreza e povo, segundo o tradicional modelo histrico. Foi ento deliberado o reconhecimento da realeza de D. Miguel, desde a data da morte de seu pai e a declarao de nulidade de todos os actos praticados por D. Pedro desde ento. No dia 11.7.1828, D. Miguel foi aclamado Rei, de acordo com o antigo uso da Nao, prestando o juramento protocolar. As potncias estrangeiras retiraram os seus representantes diplomticos at 1829, data em que quase todas elas, excepo da Inglaterra, Frana e ustria, formalmente reconheceram a realeza miguelista. A primeira reaco militar contra a restaurao absolutista deu-se ainda em 1828, com uma revolta eclodida no Porto e alargada a quase todas as guarnies militares a norte do Mondego. Os revoltosos foram perseguidos at ao Porto pelas tropas governamentais do General Pvoas, quando entrou na barra do Douro o navio Belfast, fretado pelos emigrados liberais em Inglaterra e que transportava Palmela, Saldanha, Vila Flor e outros militares liberais. A esperana renasceu, mas em breve a situao militar se revelou insustentvel e o Belfast foi obrigado a regressar a Inglaterra. 52
Apenas o ento major S Nogueira e poucos mais lograram, com muita bravura e diligncia, conduzir as tropas em retirada pelo Minho at Galiza. Cerca de 200 conseguiram, depois, seguir para Plymouth. Foi o episdio da Belfastada. Esta revolta proporcionou aos miguelistas o pretexto para lanar uma feroz e intensa perseguio aos liberais, que se traduziu em cerca de 1000 prises, devassas, julgamentos sumrios, sem qualquer garantia para os arguidos (a Alada de triste memria), condenaes forca, etc. No Algarve, pode dizer-se que os acontecimentos precederam o movimento do Porto. O 2 Batalho de Infantaria n 2, aquartelado em Tavira, j em fins de Maro comeara a reagir contra os actos de D. Miguel. Algumas famlias de Tavira tinham fugido e o general de diviso, Lus Incio Xavier Palmeirim, procurara, por ordem do dia, manter a ordem e serenar o batalho. Conhecida, porm, a proclamao de D. Miguel como Rei absoluto pelo Senado de Lisboa, em 25 de Abril de 1828, os miguelistas pronunciaram-se entusiasticamente a favor da aclamao de D. Miguel. Estavam de guarnio no Algarve o Regimento de Infantaria n 2, comandado pelo Tenente-Coronel Lus Maldonado d Ea, e o Regimento de Artilharia n 2, comandado pelo major Chateauneuf. O Regimento de Infantaria estava dividido em dois batalhes, um comandado pelo Tenente-Coronel Maldonado d Ea, de guarnio em Lagos e o outro comandado pelo major Manuel Bernardo de Melo, em Tavira. Embora os oficiais superiores dos dois regimentos fossem afectos causa constitucional, no podiam confiar nos soldados, pois a maior parte deles haviam pertencido ao dissolvido Regimento n 14, que fora forado a refugiar-se em Espanha, durante o regime constitucional. Em Lagos, Maldonado dEa procurou aclamar D. Pedro IV, mas o Governador da praa, Ludovice, deu-lhe voz de priso e dominou facilmente um incio de rebelio. Em Tavira, Manuel Bernardo de Melo, saiu da cidade com um contingente, ao qual se juntaram 6 companhias das milcias de Lagos e com essa fora procurou entrar em Faro, esperando o apoio do Regimento de Artilharia n 2 e do seu comandante Chateauneuf. Este, porm, viu-se desautorizado pelos seus homens, que passaram a obedecer aos oficiais absolutistas, em particular ao Tenente Landerset. 53
Aps um tiroteio de cerca de trs horas, os constitucionais retiraram e procuraram seguir rumo a Beja, mas foram aprisionados no caminho, conduzidos a Faro, onde o Major Chateauneuf foi assassinado pela populaa com requintes de ferocidade, tendo o seu corpo sido retalhado. Cerca de dois anos antes, havia sido dominado um outro pronunciamento militar em Tavira, favorvel causa miguelista, em que tiveram papel decisivo alguns dos mesmos protagonistas. Na Gazeta de Lisboa, de 4.11.1826, transcreve-se o ofcio, datado de 28.10.1826, em que Saldanha d conta da ocorrncia Regente D. Isabel Maria: ...a rebelio de Tavira foi unicamente militar, e auxiliada por alguns magistrados e outros Empregados Pblicos, pela maior parte filhos de outras Provncias, no chegando talvez a vinte o nmero de Algarvios, no empregados, que estejam complicados na rebelio. O esprito dos Povos foi sempre bom mesmo dominados pela fora e ameaos; merecendo particular considerao a conduta dos Eclesisticos; podendo o Clero deste Reino servir de modelo ao Clero de Portugal...A conduta do Regimento n 2 de Artilharia, n 2 de Infantaria, Regimento de Milcias de Lagos e Segundo Batalho do Regimento de Milcias de Tavira, e da oficialidade de todos estes Corpos digna da Contemplao de Sua Alteza: porm com muita especialidade o Major Chateauneuf, Comandante do Segundo de Artilharia, o Coronel Simes do Segundo de Infantaria, os Coronis de Milcias de Tavira Maral Henrique de Azevedo e Luiz Garcia de Bvar; e do Coronel de Milcias de Lagos Jos de Mendona de Almeida.... A revolta do Porto teve repercusses na Madeira e na Ilha Terceira dos Aores. A primeira foi dominada pelos miguelistas, mas na Terceira os revoltosos aguentaram-se firmemente, estimulando com o seu exemplo os liberais espalhados pelas outras ilhas. A eficcia do Conde de Vila Flr conduziu, em breve, ao domnio de quase todo o arquiplago. A presena de D. Maria II em Inglaterra, para onde fora enviada por seu pai, deu novo alento aos milhares de exilados que, com o dinheiro vindo do Brasil, ao abrigo do Tratado de Paz de 1825, organizaram uma expedio que desembarcou nas praias da Terceira, nos princpios de 1829. Em 1830, deu-se uma viragem na poltica europeia. Em Julho, foi derrubada, em Frana, a monarquia tradicionalista de Carlos X, substituda pela Monarquia de Julho, de cariz liberal, com Lus Filipe, Duque de Orleans.
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A Santa Aliana perderia a sua posio anti-revolucionria e os movimentos liberais reanimaram-se por toda a Europa, incluindo a vizinha Espanha. Em Lisboa, houve duas revoltas, sufocadas com um saldo de mais de 200 mortos. No Brasil, crescia a oposio ao governo de D. Pedro, em grande parte devido sua cada vez maior preocupao com os assuntos portugueses, pelo que o Imperador, em 7 de Abril de 1831, abdicou a Coroa imperial em seu filho e partiu para Londres com sua filha Maria da Gloria. Em Inglaterra, contraiu, em condies leoninas, vrios emprstimos que lhe permitiram equipar uma expedio que, organizada em Belle-Isle, com o beneplcito de Lus Filipe de Frana, zarpou para os Aores, tendo desembarcado na Terceira em Maro de 1832. Nesta ilha, D. Pedro assumiu a Regncia em nome de sua filha e constituiu o primeiro ministrio liberal, com Palmela e Mouzinho da Silveira. Em Junho de 1832, testa de um exrcito de 7500 homens (900 portugueses, 2300 franceses, 2130 ingleses, 900 belgas, 500 polacos, 400 irlandeses, 370 escoceses), embarcou rumo a Portugal, tendo desembarcado na praia dos Ladres, prximo do Mindelo, no dia 8 de Julho desse ano. As foras regulares miguelistas, entretanto organizadas, totalizavam 80.000 homens, alm de 30.000 voluntrios. As tropas de D. Miguel que protegiam o Porto foram apanhadas de surpresa e bateram em retirada, permitindo a entrada do exrcito liberal, 4 dias depois, quase sem disparar um tiro. Os miguelistas reorganizaram-se e cercaram o Porto, situao que veio a caracterizar a guerra durante cerca de um ano. Uma engenhosa linha de fortificaes volta da cidade, oferecia uma proteco quase inexpugnvel. Por outro lado, o acesso ao mar era salvaguardado pela esquadra do ingls Sartorius, permitindo o abastecimento em vveres, armas e soldados. A populao portuense foi aderindo causa de D. Pedro, passando a ajudar com dinheiro, trabalho, homens para recrutamento. Contudo, em Junho de 1833, no sentido de aliviar a presso sobre o Porto, os liberais decidiram uma expedio martima ao Algarve, comandada por Vila Flr, j Duque da Terceira. Esta expedio iria mudar as perspectivas da guerra. 55
Transportadas na esquadra de Napier, as tropas de Terceira desembarcaram, em 24.6.1833, na pequena praia da Altura, entre Cacela e Monte Gordo. Quase sem resistncia, foram tomadas Tavira, Olho e So Bartolomeu de Messines. No dia 5 de Julho, ao largo do Cabo de So Vicente, deu-se o combate naval entre as duas foras navais, tendo a esquadra miguelista ficado completamente destroada. De Lagos, o corpo expedicionrio marchou rumo a Beja para a apoiar um pronunciamento liberal. No mesmo sentido resolveu seguir o Visconde de Molelos, comandante da diviso miguelista do Sul, com vista a sufocar a rebelio de Beja, deixando assim o caminho livre para Lisboa. Terceira, dando conta deste erro tctico, saiu de So Bartolomeu de Messines, passa por So Marcos da Serra e atravessa o Alentejo. A 20 de Julho, toma Alccer do Sal e no dia seguinte acampa diante de Setbal, que conquista 2 dias depois. Daqui passa a Azeito e Cacilhas, derrotando, em Vale da Piedade a Cavalaria miguelista e as tropas de Teles Jordo, morto na refrega. Almada rende-se no dia seguinte. Tomados de pnico, o Duque de Cadaval e o seu ministrio abandonam Lisboa com toda a guarnio, proporcionando a entrada triunfal do Duque da Terceira, em 24.7.1833. Dois dias depois arriba ao Tejo a esquadra de Napier. Em 28 de Julho, chega D. Pedro do Porto, onde deixou Saldanha como governador militar. O grosso das foras miguelistas, com a presena do prprio D. Miguel, continuava retido no cerco do Porto, porm as alarmantes notcias sobre os sucessos do inimigo determinaram o levantamento do cerco e a marcha para o sul, com o objectivo de reconquistar a capital. Saram-lhes ao encontro as foras liberais que as bateram em combates sucessivos, de que se recordam Almoster (Fevereiro de 1834) e Asseiceira (Maio de 1834). Entretanto, a evoluo dos acontecimentos, leva a um progressivo reconhecimento da autoridade de D. Pedro. Por outro lado, em Espanha alterada a lei sucessria, por forma a afastar D. Carlos da sucesso de seu irmo Fernando VII e a jurar herdeira D. Isabel, filha do segundo casamento desse soberano. 56
D. Carlos, tradicionalista como D. Miguel, retirou-se para Portugal, de onde envia um protesto a seu irmo. Estes acontecimentos, serviro de pretexto interveno no nosso territrio das tropas do general Rodil, em Abril de 1834. No final deste ms, celebrado o Tratado da Qudrupla Aliana, entre a Inglaterra, a Frana, a Espanha e o governo de D. Pedro. Perdiam-se definitivamente as esperanas para a causa de D. Miguel. Em 26 de Maio de 1834, assinada a Conveno de vora Monte, pela qual se pe fim s hostilidades e se determina o exlio de D. Miguel. Mais decretou a Conveno uma ampla amnistia geral, sendo mantidas aos oficiais as patentes que tinham em 1828, e garantida aos funcionrios civis e religiosos uma indemnizao pela irradiao dos seus cargos. D. Miguel passaria a receber uma penso anual de 60 contos. Chegado a Gnova, D. Miguel publicou, no dia 20.6.1834, um protesto, considerando nulas e de nenhum efeito as clusulas da Conveno. Em Setembro desse ano, em Roma, declara ao Papa, por intermdio do Marqus de Lavradio, que fora coagido a aceitar a Conveno, pelo que no renunciara aos seus direitos ao Trono. Esta atitude de D. Miguel, determinaria a publicao, em 19.12.1834, j no reinado de D. Maria II, falecido que era D. Pedro, da chamada Lei da Proscrio e Banimento, que estipulava a excluso de D. Miguel e de toda a sua descendncia da sucesso na Coroa de Portugal. A referida Carta de Lei, cujo contedo viria a ser acolhido na Constituio de 1838, seria revogada, j em pleno Estado Novo, pela Lei n 2040 de 27.5.1950. O fim da guerra civil no trouxe a desejada e necessria estabilidade ao pas. A situao econmica revelava-se extremamente difcil. A emancipao do Brasil prejudicara fortemente o comrcio, faltavam equipamentos e quadros profissionais. A nica fonte de riqueza era a terra, sobre a qual recaiam os impostos e as rendas que favoreciam as classes possidentes. A situao poltica caracterizava-se pela fragilidade do poder executivo, pela falta de definio ideolgica das correntes polticas, pela marginalizao das camadas populares e
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indisciplina dos chefes militares, que se consideravam credores do regime e como tal detentores do direito natural de mandar. Desta maneira, a vida poltica esteve, durante largo tempo, mais subordinada aos movimentos e ajustes de quartis do que s disposies constitucionais. A oposio via na Carta Constitucional uma das causas da degradao da situao poltica e pugnava pelo regresso do regime da Constituio de 1822. O motim, ocorrido em Espanha, em Agosto de 1836, que forou reposio da Constituio de 1812, deu o mote para o movimento popular de Setembro de 1836, liderado por Passos Manuel, que obrigou a Rainha a pr em vigor a Constituio de 1822. Igual manifestao popular viria ainda a manifestar-se em Novembro desse ano, sufocando o contra-golpe da Belenzada, visando a restaurao da Carta. O governo sado do movimento revolucionrio ficou conhecido como setembrista, designao que at meados do sculo acabou por exprimir a ala mais esquerda do liberalismo. Em Julho de 1837, d-se um simulacro de guerra civil, conhecido como a revolta dos Marechais (Saldanha e Terceira), sendo a Carta proclamada nos quartis de muitas cidades da provncia, situao que viria a ser debelada, em Setembro desse ano, atravs de encarniados combates. Os grupos civis mais radicais, mostravam-se frustrados relativamente s consequncia da revoluo em que se haviam empenhado e dispunham-se a recuper-la com novas aces. Contavam com a Guarda Nacional e sobretudo com o batalho dos arsenalistas, formado por trabalhadores do Arsenal. Porm, na noite de 13.3.1838, as tropas do governo cercaram os arsenalistas no Rossio, em Lisboa, e dizimaram-nos a rajadas de metralhadora. O massacre do Rossio, deu o golpe de misericrdia ao setembrismo que foi perdendo gradualmente fora, deixando aos conservadores o protagonismo poltico. Entretanto, preparada a Constituio de 1838, que representou um compromisso entre a Carta e a Constituio de 1822, mas cuja durao no foi para alm de 1842. Neste ano, depois de um golpe de Estado pacfico, desencadeado do Porto por Costa Cabral, foi reposta a Carta Constitucional. Jos Bernardo Costa Cabral, um dos chefes arsenalistas, passara, em breves anos, da esquerda radical para a direita cartista.
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Mas mais importante que esta viragem poltica, de resto comum a outras notveis figuras desta poca, foi a nova concepo de aco poltica que lhe estava subjacente. Costa Cabral foi o primeiro intrprete esclarecido do realismo poltico, da real politik, como hoje lhe chamaramos. Com efeito, preocupou-se menos com os princpios do que com os factos, menos com o futuro do que com o presente. Traou, assim, como objectivos prioritrios: a restaurao da ordem do Estado, a eficcia do servio pblico, a pacificao dos meios polticos, o desenvolvimento econmico. As suas reformas foram penetrando no interior do pas, atingindo o modo de pensar e de agir ancestral e tradicional, que continuava a caracterizar sobretudo os meios rurais. A aco de Costa Cabral, traduzida num quase despotismo, contrastando com o seu apregoado respeito pela Carta e pelas liberdades nela consignadas, provocou um descontentamento generalizado, que foi tomando progressivamente contornos revolucionrios. O detonador desta situao explosiva foi a Lei da Sade, que proibia o enterramento dentro das igrejas, disposio que surgia aos olhos do povo como uma ofensa sacrlega e um atentado dignidade humana. Acresce que, ao mesmo tempo, se iniciava o cadastro da propriedade rstica, com vista ao lanamento da contribuio predial, logo se entendendo que o governo pretendia avaliar as courelas para as vender aos ingleses. Em meados de Abril de 1846, semelhana do que acontecera no princpio desse ms na Galiza, deflagrou uma revolta dos camponeses minhotos, a que se deu o nome de Maria da Fonte, pelo papel preponderante que as mulheres desempenharam e pelo facto de os primeiros incidentes terem tido origem na freguesia de Fonte Arcada, concelho de Pvoa de Lanhoso. A revolta foi, curiosamente, apoiada por setembristas, absolutistas, moderados, alguns cartistas de direita, reunindo assim, numa estranha aliana (coalizo), generais, aristocratas, clrigos, burgueses, proletrios e trabalhadores rurais, o que no deixa de constituir um sinal de esvaziamento ideolgico e revolucionrio. Os pronunciamentos polticos e militares eclodiram um pouco por todo o pas. Costa Cabral viria a ser afastado, mas alguns meses depois a Rainha formava um ministrio, presidido por Palmela, com moderados das alas setembrista e cartista.
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A nova situao poltica no agradou a ningum, reacendendo os nimos, sobretudo quando Palmela foi substitudo, em Outubro de 1846, por Saldanha, ento cabralista convicto, nomeado para controlar, com mo de ferro, os acontecimentos. Jos da Silva Passos, apoiado por setembristas e anti-cabralistas, desencadeia no Porto um movimento popular e constitui uma Junta Provisria do Governo Supremo do Reino, presidida pelo Conde das Antas e tendo Passos como vice-presidente. Formam-se outras juntas em todo o pas e inicia-se a guerra civil. A Junta governativa provisria do Algarve mandou espalhar uma proclamao, na qual se exortavam os habitantes do Algarve a pegarem em armas, acrescentando que a Rainha estava coacta e por isso havia derrubado um ministrio para eleger outro da mesma poltica dos cabrais; convida os habitantes da provncia a juntarem-se para ir salvar a soberana e p-la em plena liberdade e sustentar a Carta Constitucional, como tambm o Decreto de 10 de Fevereiro de 1842, e que devem fazer isso para no cair a Nao na Escravido... A proclamao era assinada pelas seguintes personalidades: Lus Maldonado dEa governador civil do distrito de Faro Jos Pedro Celestino Soares Comandante da 8 Diviso Militar Joaquim Pedro Jdice Samora Juiz de Direito de Tavira Manuel Jos de Bvar Gomes da Costa Antnio Sarmento de Saavedra Teixeira s foras da Junta Provisria do Governo Supremo chamadas patuleias aliaramse vrias guerrilhas miguelistas. Reiniciam-se as tentativas de restaurao miguelista e entre 20 e 23 de Outubro de 1846 d-se, no Minho, a revolta dos Pinotes. Saldanha derrota o Conde de Bonfim em Torres Novas e os guerrilheiros miguelistas, comandados por Macdonell, so vencidos em Braga. Costa Cabral nomeado por Saldanha para ministro em Madrid e da manobrou no sentido de conseguir o apoio de Espanha e de convencer Londres de que a Patuleia projectava restaurar D. Miguel. A interveno miguelista nestes conflitos, servia de pretexto para que o levantamento nacional fosse conotado como uma questo dinstica, que poria em causa o trono de D. Maria II, pretexto desejado pelos Cabrais, mas temido por Ribeiro Saraiva, defensor de uma soluo armada em defesa da legitimidade de D. Miguel, pois o perigo miguelista aceleraria o processo de interveno estrangeira, previsto no quadro do Tratado da Qudrupla Aliana. 60
Em fins de Maro de 1847 a Junta do Porto organizou uma expedio ao Algarve, com cerca de 1000 homens. A expedio desembarcou em Lagos e em Sagres, atravessou o Algarve e o Alentejo e ocupou Setbal a 16 de Abril, a esperando pela adeso dos revoltosos de Lisboa. Por esta altura, S da Bandeira teve uma primeira abordagem, por parte do Coronel ingls Wylde, com vista negociao do termo das hostilidades. Em 29.6.1847, aps as intervenes espanholas e inglesa terem ajudado a vencer a Junta, foi assinada a Conveno de Gramido. Embora a Patuleia se articule com a Maria da Fonte, na origem um movimento poltico e militar influenciado pela ideologia pequeno-burguesa que em Frana conduziu revoluo de 1848 e Segunda Repblica. Tratou-se, mais, como algum j referiu, de uma reaco do liberalismo doutrinal contra o neo-aristocracismo devorista dos bares do cabralismo. O Algarve, como noutras ocasies de grande significado histrico, participou activamente nos conflitos poltico-militares que rechearam o sculo XIX. Naturalmente que as assimetrias ditadas pela morfologia da regio, distinguindo o longo litoral da abrupta serra, no deixaram de marcar a vida e a mentalidade das respectivas populaes. Desta maneira, o litoral algarvio proporcionou, desde logo, o contacto com o exterior, desenvolvendo-se as relaes econmicas com outros pases, sobretudo de frica, Mediterrneo e Europa central. Atrados pela excelente posio geogrfica do Algarve e pelas oportunidades de negcio que a sua produo frutfera oferecia, particularmente o figo e a laranja, estrangeiros e pessoas de outras regies de Portugal aqui se vieram instalar. De entre os mais importantes, referirei John Barr Crispin, Consul de Inglaterra, edificador em Faro da casa onde nasci, que serviu, durante alguns anos, de Arquivo Distrital de Faro; e Manuel Jos Gomes da Costa, meu 5 Av, nascido em Santo Tirso de Prazins, concelho de Guimares, que para Faro veio residir, nesta cidade constituindo uma das mais slidas casas de comrcio da provncia, sobretudo orientada para a exportao de fruta. Pelo seu casamento com Maria Francisca da Paz de Bvar Albuquerque de Mendona Weinholtz, deu origem a uma famlia com profundas razes no Algarve.
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No assim de admirar que a actividade econmica e os contactos com outras mentalidades e culturas viessem estimular o acesso ao ensino superior e adopo de novos paradigmas polticos e sociais, permeveis ao iderio liberal. Em contraposio, o interior algarvio, pelo isolamento geogrfico, estaria mais afecto ao que se convencionou chamar de tradicionalismo apostlico, consubstanciado pelo caciquismo dos grandes proprietrios rurais e pelo controlo espiritual exercido pelo clero local. Recordemos, tambm, que foi a posio geo-estratgica do litoral algarvio que facilitou a entrada dos exrcitos libertadores do Duque da Terceira, em 24.6.1833, em Cacela, e do Visconde de S da Bandeira, em 31.3.1847, em Lagos. Perdoe-se-me, finalmente a imodstia de acrescentar, ainda, algumas notas, quase pessoais, que mais no pretendem ser do que o testemunho da participao de uma das famlias algarvias que, na poca conturbada do liberalismo e das guerras civis, teve alguma notoriedade, que muito honra os seus descendentes, constituindo parte integrante da memria e capital simblico familiares. O palcio Bvar, em Faro, bero e residncia de vrias geraes, at hoje, alojou, por cedncia voluntria, o Estado Maior do Exrcito Libertador, quando das invases francesas, contribuindo os seus proprietrios com avultada quantia de dinheiro para custear as despesas militares. No mesmo palcio, no dia 1 de Agosto de 1826, se realizou uma sesso solene, seguida de baile, comemorativa da outorga da Carta Constitucional por D. Pedro IV. Do casamento do j referido Manuel Jos Gomes da Costa, Coronel de Milcias e Cavaleiro da Ordem de Cristo, importante comerciante em Faro, com Maria da Paz de Bvar Weinholtz, filha e neta de oficiais generais do Sleswig-Holstein, ento integrado na Dinamarca, que reorganizaram a artilharia portuguesa e foram os inventores da pea considerada precursora das modernas metralhadoras, nasceram, entre outros: . Lus Garcia de Bvar Gomes da Costa, j anteriormente mencionado, a propsito da revolta de Tavira, em 1826, onde se distinguiu. Durante as invases francesas, alistou-se, apenas com 14 anos, fazendo a campanha da libertao sem receber qualquer soldo. Pelas suas convices liberais, foram-lhe confiscados os bens e forado a emigrar; . Frederico Jacob de Bvar Gomes da Costa, preso em Lisboa, em 17.11.1830, por Jos Verssimo e encarcerado, por largos anos, na Torre de So Julio da Barra.
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. Maria Feliciana de Bvar Gomes da Costa, casou com seu primo, Jos Lino de Almeida Coelho de Bvar e foram os pais do Visconde de Bvar, Francisco de Almeida Coelho de Bvar, ao qual se devem importantes obras pblicas no Algarve, entre as quais, a ponte sobre o rio Arade, a estrada litoral do Algarve, o caminho-de-ferro, a linha telegrfica de Faro a Sagres, etc. Com Jos Lino de Almeida Coelho de Bvar ocorreu um episdio que no resisto em relatar, pelo que ilustra de coerncia e dignidade, no obstante as atitudes extremas provocadas pelas lutas polticas, vividas em clima de paixo e violncia. Jos Lino foi assassinado na casa da sua quinta, junto ao rio Alvor, pela guerrilha miguelista do Trovoadas, um marinheiro chamado Jos de Oliveira, cuja alcunha lhe vinha do nome do navio em que prestara servio. Houve quem acusasse o prprio Remexido desse crime, mas o certo que ele, publicamente, o reprovou, tendo mandado fuzilar o assassino, no mesmo local onde havia cometido o crime. Alm disso, o Remexido apresentou, pessoalmente, desculpas famlia Bvar, seus rivais polticos, mandando colocar homens seus s portas dos palcios Bvar, em Faro e em Portimo, para evitar eventuais incidentes. . Manuel Jos de Bvar Gomes da Costa, enquanto Capito de Milcias, em Tavira, foi preso no pronunciamento de Abril de 1828 e nessa situao se manteve at Maro de 1831, sendolhe confiscados os bens. Pelas suas aces, foi condecorado com o grau de Cavaleiro das Ordens da Torre e Espada e de Nossa Senhora da Conceio de Vila Viosa. De 31.3.1837 a 29.2.1840, foi Administrador Geral do Algarve. Foram seus filhos: . Lus Frederico de Bvar Gomes da Costa, o Conselheiro Lus Bvar, como ficou conhecido. Tendo iniciado a sua carreira de magistrado em Tavira, como Delegado do Procurador Rgio, em 1853, foi Presidente da Relao de Lisboa, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justia, Deputado, Presidente da Cmara dos Pares do Reino e da Cmara dos Deputados, em vrias legislaturas, Par do Reino Vitalcio, Conselheiro de estado efectivo, Gr-Cruz das Ordens da Torre e Espada, de Cristo e de Nossa Senhora da Conceio de Vila Viosa, membro proeminente do partido Regenerador e uma das figuras mais respeitadas na sua poca. . Jernimo Augusto de Bvar Gomes da Costa, meu trisav, licenciado em Medicina, scio correspondente do Instituto de Coimbra, Chefe do partido Regenerador do Algarve, Governador Civil do Distrito de Faro de 31.3.1881 a 18.2.1886 63
Ambos estes irmos eram genros do Conselheiro Dr. Mateus Antnio Pereira da Silva, natural de Vila Real de Santo Antnio, que tendo iniciado a sua carreira de magistrado em Tavira e Lagos, passou aos Aores, onde foi Corregedor e Procurador e o 1 Recebedor Geral do pas. Foi Venervel da Maonaria de 1833 a 1835, Presidente da Cmara Municipal de Tavira em 1838 e Deputado s Cortes em 1846.
O nosso percurso histrico revela um Portugal de contrastes sucessivos, entre o real e o mtico, entre o atraso quase alarmante e os lampejos inovadores de uma exuberante criao cultural universalizante. Se bem que esta contradio possa reflectir a peculiaridade e a fora anmica do Portugus, no sendo um sinal de fragilidade, mas a expresso de uma capacidade de imaginao, constantemente adaptvel s circunstncias, por outro lado, sempre nos faltou a prospectiva, o projecto, a reconverso da experincia passada em rampa para o futuro. A Histria faz-se de altos e baixos, de avanos e de recuos, de vitrias e de derrotas, de rejeies e de cedncias, de lgrimas de tristeza e de alegria, mas o fio condutor dos vrios momentos histricos a esperana, o sonho. Como j tive ocasio de dizer, noutras circunstncias, entre ns, esse sonho decorre da nossa criatividade mitognica, que segundo Gilbert Durand, modelou a alma de um povo, mas tambm tutelou a sua Histria, acrescentando que esses mitos que se mantm vivos na tradio popular ou na obra dos poetas, pensadores e artistas de hoje fazem de Portugal um lugar onde o pensamento europeu pode reencontrar as suas fontes. Embora aparentemente histria e utopia sejam dois conceitos dialcticos, contrastantes e antinmicos, no fundo, entrelaam-se e completam-se, formando um continuum. A Histria alimenta-se de utopia, nas ideias, na ideologia, na projeco reformista ou revolucionria. Por outro lado, a utopia encontra as suas razes na Histria e desenvolve-se atravs do tempo e dos espaos histricos. O pensamento utpico um pensamento polissmico, que atravessa a filosofia, a politologia e muitas outras disciplinas, traduzindo a aspirao a um mundo melhor, a uma sociedade mais feliz. Neste sentido, a utopia confunde-se com a histria da esperana, com a histria da liberdade, no seu imparvel movimento para o futuro. 64
Mas tambm um olhar para o passado, reflectindo os dramas pessoais, a histria das ideias, das instituies, da sociedade, das artes. Na verdade, quando se elaboram ideias que transcendem a ordem existente, cai-se no campo da ideologia e desta passa-se, inevitavelmente, utopia. Esta assim uma metfora da Histria. Porm, uma fora positiva, pois na vida dialctica, na arte e na poltica oposio, renovao, inquietao, representando a resistncia ao encrostamento poltico, escolstico, profissional, humano. Traduz, afinal, a capacidade de sonhar e de realizar o sonho.
Muito obrigado,
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PINTO, Jos M. Castro (2005) O Remechido Entre a Guerra e o Amor. Lisboa. Pltano Editora. 10 p MATEUS VILLALVA, Maria Helena Mira; Alina, coord. (2006) O Essencial Sobre a Histria do Portugus. Lisboa. 2005.Caminho. 78 p
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balho reveste-se de algum carcter importante, nem pelo simples facto que no se constata a existncia, no meio militar, a existncia de literatura que aborde este tema. A finalidade , ento, de alimentar a Instituio Exrcito com um tema, que preocupou os chefes militares das guerras liberais. Como metodologia utilizada na sua maior parte, foi a pesquisa documental em literatura j existente de outros autores, foi a pesquisa na sua origem dos documentos existentes da poca e por fim entrevistar algumas pessoas, que seus antepassados lhes deixaram alguma histria oral. Juntando tudo isto e estabelecendo cruzamentos possvel alcanar um pouco de mais conhecimento nesta matria, mas sempre usando uma abordagem militar. Foi, assim, ento estruturar o trabalho inicialmente com um enquadramento histrico para o inteirar e relacionar o decurso da histria no sculo XIX a luta de guerrilha, recorrendo para isso pesquisa documental existente e que aborda a Histria de Portugal. Como outro item do trabalho a abordagem ao Jos Joaquim de Sousa Reis, a sua biografia at meados da guerra civil, para isso a metodologia usada foi pesquisa documental e alguma investigao. Foi ento necessrio recorrer, no s a literatura existente como a documentos existentes em arquivo para descrever, o crescimento de Jos Joaquim de Sousa Reis, o surgimento da sua alcunha, o trabalho que desenvolvia para a monarquia ento instituda e o seu enquadramento como militar, at 1820. Com o incio das guerras liberais foi necessrio descrever num captulo as aces desencadeadas pelo Remechido. Inicialmente com a sua entrada na vida militar, seguidamente a sua participao na guerra civil propriamente dita, esta desenvolvida no Algarve e por fim a sua participao na batalha de SantAnna, a ltima grande batalha no qual Remechido teve uma enorme importncia no desenrolar da aco absolutista. Para a redaco deste captulo em semelhana com os anteriores a metodologia usada foi a pesquisa documental, embora tambm foi usada a histria oral, atravs das entrevistas. com a vitria Liberal que se d uma reviravolta nos acontecimentos, passando Remechido a ter a necessidade de sobreviver s vinganas liberais, formando ento uma guerrilha e a actuar com ela de forma no convencional. Est ento retratado um quinto pargrafo, a descrio da guerrilha ao nvel do comando, do teatro de operaes e zonas de empenhamento, operaes, informao e contra informao e logstica. Este o captulo mais importante de todo o trabalho desenvolvido, pois d a conhecer na generalidade a aco que Remechido desenvolvia com a sua guerrilha bem como sustentava os seus homens. Este tambm um captulo em que est espelhado a tentativa de separao do tema com literatura existente, 68
revestindo-o de carcter militar, atravs da pesquisa em artigos existentes da poca e com histria oral. Este captulo aborda um perodo desde a reactivao da guerrilha em 1836 at meados da captura de Remechido. Captura essa que est descrita num sexto pargrafo em que aborda a resposta liberal para eliminao da guerrilha (1837-1838). Esto, assim, descritas num primeiro sub-captulo algumas das diferentes aces desenvolvidas pelos liberais, e num segundo captulo a aco desenvolvida para a captura de Remechido em finais de Julho de 1838. A metodologia utilizada para a redaco deste sexto e ltimo captulo a pesquisa documental, tanto em literatura j existente como em artigos militares e administrativos decorrentes da poca retratada. Assim este trabalho sobre a guerrilha do Remechido tem em certos aspectos e semelhanas com obras literrias existentes, isto porque a abrangncia de bibliografia utilizada e existente no muito grande, embora seja importante para a estudar a nvel militar. Embora existir uma tentativa de alcanar novos resultados e percepes atravs do uso de histria oral. Dado que existiu uma fora no convencional que causou tantos problemas a um ento novo governo e tipo de governao, como que um homem de nome Remechido com uma fora de 350 homens actuou por forma criar tantas preocupaes? Ou seja, como eram suas aces e como as conseguia desencadear por toda a regio algarvia? Como conseguia sustentar a sua guerrilha? So estas as questes de cariz militar que o trabalho prope abordar.
Enquadramento Terico
Para o desenvolvimento deste trabalho a literatura utilizada foi variada, embora a obra existente que o sustenta a de MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa-Amrica. N 175. Embora que na parte final do trabalho seja utilizado os documentos existentes no Arquivo Histrico Militar, 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1. Tal como as literaturas de Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa, e SORIANO, Simo Jos da Luz (1887), Vida do Marqus de S da Bandeira, Lisboa, Tomo I, Cap XI, O livro que sustenta o enquadramento histrico de MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. Editorial Estampa.
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VARGUES, Isabel Nobre. Portugal, a Santa Aliana dos Reis e a Santa Aliana dos povos. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 45 6 NOGUEIRA, Jos Manuel Freire (2005). De Viena a vora-Monte. In: Doutoramento em Histria Militar, Lisboa, 2005. 7 VARGUES, (Ob. Cit.), Pag 45 8 Idem 9 Vargues, (Ob. Cit). Pag 63 10 SARAIVA, Jos Hermano. A Revoluo de 1820. In: SARAIVA, Jos Hermano, Dir. (1983) Histria de Portugal; Vol 5. Lisboa. Publicaes Alfa;5; Pag 374
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mentadas por Beresford, em relao a um regulamento e recrutamento militar, conduziram a essa revoluo. Por detrs deste arranque poltico de cariz liberal encontrava-se a imprensa. Todavia essa no se encontrava em Portugal, pois embora sendo portuguesa, parecendo uma falcia, esta imprensa escrita em portugus, era publicada em Inglaterra, na sua grande parte, devido liberdade de imprensa que l se praticava. Isto fazia com que se divulgassem opinies e passasse para o pblico11, toda uma ideologia liberal em Portugal que se formava no exterior e era canalizada para o interior12. Posteriormente algumas das altas entidades do reino em Lisboa, exerceram uma enorme aco no sentido de evitar as tentativas de transformao poltica. Estas resultaram em perseguies, exlios e prises. As tentativas de transformao poltica surgiram com as associaes secretas, que formavam o principal foco de descontentamento, no qual vo constituir um movimento revolucionrio. Este movimento vai reflectir uma efectividade na tomada de conscincia liberal por parte de alguns sectores da sociedade portuguesa 13. Em 1817, criou-se um novo governo cujo objectivo principal era o de afastar os ingleses e outros estrangeiros do controle militar e promover a salvao e a independncia de Portugal14. Os elementos que constituam esta sociedade manica 15, referida anteriormente, eram oriundos na sua maioria, de militares regressados a Portugal depois de terem desempenhado funes no exrcito napolenico. Como cabecilha desta organizao e promotor da Revoluo Liberal, temos o general Gomes Freire de Andrade e Castro, ao qual em Outubro de 1817 o processo de captura dos maons chega ao fim com a captura e posteriormente sentena de morte do general Gomes Freire 16, com a acusao de ser o autor da conspirao, juntamente com mais onze elementos, e com a deportao, expulso e absolvio de outros. Mas esta limpeza no foi suficiente para eliminar todos os maons, isto porque a ideia de libertar o pas continuava bem assente. Foi, ento, que no Porto foi fundado o Sindrio 17,
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VARGUES, Isabel Nobre. Portugal, a Santa Aliana dos Reis e a Santa Aliana dos povos. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 48 12 Idem. Pag 50 13 Idem. Pag 52 14 Ibidem 15 Sociedade secreta que surgiu vinculada s ideias do laicismo humanitrio e liberal do iluminismo. Originariamente era uma das sociedades secretas que chegara ao sc. XVII apoiando em fundamentos de filosofia natural e at mtico-alquimicos, tal como se depreende do simbolismo dos signos e nmeros. O seu nome deriva do francs maon pedreiro e os integrantes como pertencentes franco-maonaria. A organizao manica estruturase segundo lojas, federadas por pases, embora no existiam instituies de carcter mundial. 16 Ver foto I.1.1.1. em anexo B 17 VARGUES, Isabel Nobre. Portugal, a Santa Aliana dos Reis e a Santa Aliana dos povos. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 54
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uma associao secreta, criada, por juristas tais como Manuel Fernandes Toms
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e Jos da
Silva Carvalho. Esta associao formada para interferir a quando de uma revolta popular, manteve-se cautelosa, mas, com a noticia dos acontecimentos revolucionrios em Espanha 19, passou a actuar de forma ofensiva, tentando juntar a ela foras militares que, de alguma forma, tivessem um peso considervel no decurso de um movimento revolucionrio, para que fosse alcanado o sucesso. D-se, ento, a 24 de Agosto de 1820, um pronunciamento militar clssico, este tratou de ser uma sublevao de uma fora militar, longe do poder poltico com o objectivo de obter a adeso da Guarnio Militar de Lisboa20. Isto veio a permitir o derrube de antigas classes mais importantes (o clero e a nobreza) sendo o poder ocupado pela Nova Burguesia. Este movimento durou cerca de trs anos, at que em 1823, as Cortes Ordinrias estando a trabalhar na formao de uma nova ordem liberal e constitucional, na Europa estava em curso uma contestao contra o liberalismo revolucionrio. No Congresso de Verona foram tomadas deliberaes pela Santa Aliana sobre a necessidade de interveno militar francesa na Pennsula Ibrica (que tinham pelo nome de cem mil filhos de S. Lus 21) que ameaavam os liberais revolucionrios na pennsula. No seguimento desta notcia, o secretario de Estado dos Negcios de Guerra, Manuel Gonalves de Miranda22, deslocou-se s Cortes a 1 de Fevereiro de 1823, onde deu a conhecer os acontecimentos na Europa atravs de um relatrio, que chamava a ateno dos deputados para que colocassem os olhos na Europa e a necessidade de preparar uma possvel interveno militar. Isto fez com que fosse criado um corpo militar de defesa que tinha como nome Guarda Nacional. Mas este alerta no foi suficiente para deter a rebelio contra-revolucionria que, em 23 de Fevereiro, Manuel da Silveira, comeou em Trs-os-Montes, mas sendo promovida em Espanha e financiada pelo ouro da Frana 23. Trs meses depois, d-se uma revolta militar absolutista mais uma vez contra o regime liberal. Esta revolta foi originada por um regimento de Vila Franca de Xira que se rebelou, ao qual o infante D. Miguel encabeou, e que teve o
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Ver foto I.1.1.2.em anexo B Vargues, (Ob. Cit.). Pag 55 20 NOGUEIRA, Jos Manuel Freire (2005). De Viena a vora-Monte. In: Doutoramento em Histria Militar, Lisboa, 2005 21 VARGUES-TORGAL, Isabel Nobre; Lus Reis. Oposies revoluo de 1820 no Trinio Liberal. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 66 22 Ver foto I.1.1.3. em anexo B 23 VARGUES-Torgal, 23 VARGUES-TORGAL, Isabel Nobre; Lus Reis. Oposies revoluo de 1820 no Trinio Liberal. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 66.
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nome de Vila-Francada, terminando assim o primeiro movimento liberal e voltando D. Miguel ao poder. Mas o avano e tentativa das foras contra-revolucionrias, no terminara aqui, apenas se vo presenciar anos de moderao, com movimentos de oposio contrarevolucionrios. , ento, que em meados de 1832, parte dos Aores a expedio liberal, com o objectivo de repor no trono D. Maria da Glria, o qual tinha sido usurpado por D. Miguel. Esta esquadra liberal comandada por D. Pedro, era constituda por cerca de 8000 homens e mais de 50 navios24. Foi com este movimento que se deu inicio Guerra Liberal, tendo o desembarque sido feito a 8 de Julho na praia da Arnosa de Pampelido, perto do Mindelo a norte do Porto, seguindo ento direco ao Porto, sem qualquer resistncia absolutista. D. Miguel que foi, assim apanhado de surpresa por um desembarque no Porto e no em Lisboa, enviou logo de seguida foras para destroar o invasor25. A proporcionalidade das foras opositoras era enorme, ou seja, entre 8000 e 8500 por parte dos liberais, contra 80 000 por parte dos absolutistas, entre os quais existiam ainda mercenrios estrangeiros. Apresentando de incio uma posio tctica ofensiva com algumas vitrias, devidas descoordenao e rivalidades entre os chefes militares absolutistas no Porto, essas operaes foram repudiadas passando a uma postura defensiva. Foram construdas trincheiras e redutos em torno do Porto mas com uma fora liberal exterior, na margem esquerda do rio Douro, no Convento da Serra do Pilar, funcionando as duas como centros de resistncia. O cerco cidade do Porto durou cerca de um ano, com a situao para a parte dos liberais desesperante, devido falta de alimentos, doenas, deseres, indisciplina. Os absolutistas estando a preparar o ltimo assalto cidade, os liberais desenvolveram uma inteligente manobra de diverso, enviando uma coluna de 2500 homens para o Algarve comandada pelo duque da Terceira, com a finalidade de aliviar a presso das foras absolutistas no Porto.
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SILVA, Antnio Martins. A Vitria definitiva do liberalismo e a instabilidade constitucional: cartismo, setembrismo e cabralismo. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 90 25 SILVA, (Ob. Cit.). Pag 90
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Inventrio de Registos Paroquiais em microfilme. Localizao: Concelho de Lagoa, Freguesia de Estombar, Baptismos. A. D. F., S.G. U., 0452 P. 2.1.54.3 27 OLIVEIRA, Dr. Manuel Alves de. Dir (1987) Moderna Enciclopdia Universal. Lisboa. Crculo de Leitores. Lexicoteca. Vol 16. 28 Annimo. Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. pag 4 29 Idem, pag 5 30 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa, pag 6
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bem composto que o bispo do Algarve, ordenou um elogio em pblico pelo prprio tio de Jos Joaquim de Souza Reis31, dado que era um seminarista e futuro prior. Foi tambm na continuidade destas festividades de S. B. Messines, que aps alguns dias Jos Joaquim de Souza Reis, com o seu tio e fora do seminrio, teve a oportunidade de conhecer uma senhora com que veio a namorar e de futuramente a casar. A esposa chamavase D. Maria Clara Machado de Bastos, descendente de algarvios, muito reconhecidos em servios na guerra da aclamao de 1640, e naturais de Tavira. Era tambm sobrinha do Capito de Ordenanas32Manuel Incio de Bastos33. Mas este namoro e casamento teve muitos entraves por parte do tio de Jos Joaquim de Souza Reis, porque este o havia educado para a profisso sacerdotal. Assim sendo negoulhe o matrimnio. Mas foi ento que Jos Joaquim de Souza Reis usou todo o seu talento e todos os estratagemas imaginveis para fazer mudar a ideia do seu tio. Sendo superior a todas as objeces Jos Reis conseguiu a autorizao do tio. Casou em 181934 e foi nesta ocasio em que a sua esposa lhe colocou a alcunha de Remechido como reconhecimento do seu esforo e incansabilidade com que conseguiu o sim do tio. O casamento foi aceite por toda a populao de S. B. Messines35, tal como a sua alcunha que ficou conhecida e respeitada por todos36. Deste matrimnio nasceram sete filhos 37.
1.3.O Homem
Jos Joaquim de Sousa Reis passou a residir em S. B. Messines na casa do tio de sua mulher e tomando em parte dos negcios, que eram a renda dos dzimos38 de S. Marcos da
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Idem As ordenanas foram institudas em 1570 no reinado de D. Sebastio, embora a deciso de modernizar as foras militares portuguesas ter se dado por volta de 1505, ano em que o rei D. Manuel fixou a politica geral de Portugal em relao Europa e s descobertas. Sem foras militares de carcter permanente desde o desaparecimento dos besteiros do conto, milcias populares vindas dos tempos medievais, a inteno de D. Manuel foi de criar uma organizao militar em comparao com a existente na altura na Sua. As foras militares eram recrutadas junto da populao em geral, combatendo em grandes quadrados compactos, armadas com armas existentes na altura, tais como, piques, alabardas, arcabuzes e espadas. Esta tctica fora usada, com o mesmo sistema de armas, por foras com que os Cantes tinham mantido a sua independncia face a Carlos o Temerrio, Duque de Borgonha. As ordenanas foram de novo restabelecidas em 1640, e a sua organizao passou a ser de carcter definitivo, como meio de recrutamento para o exercito em 1643. 33 Annimo. (ob. cit.), Pag 7 34 Idem. 35 A populao de S. B. Messines era constituda sensivelmente por 800 fogos e 2700 habitantes. 36 Annimo. (1838). (Ob. Cit.). Pag 7 37 Ver foto II.1.2.1. em anexo B
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Serra. Deslocando-se pessoalmente com empregados para fazer a respectiva cobrana nos montes e serras na sua rea de responsabilidade, fez com que Remechido tomasse conhecimento de todos os locais, caminhos, veredas e pessoas existentes por onde fazia as cobranas. Mas tambm administrava os bens do tio da sua mulher, que eram substanciais 39. Como representava algum estatuto reconhecido, Remechido reconheceu a necessidade de melhoramentos naquele local. Assim, para bem-estar dos residentes, empregou-se e conseguiu com que a Cmara de Silves providenciasse a construo de uma Escola de primeiras letras, de um forno pblico 40e a autorizao para a realizao da Feira da Nossa Senhora da Sade41, esta em 1825. Mas suscitou tambm algumas inimizades e invejas das pessoas mais ricas de S. B. Messines, devido ao facto de ser uma pessoa que captou a estima e venerao da populao em to pouco tempo.
Captulo III 1. A Aco do Remechido na Guerra Liberal 1.1.A Entrada na vida Militar
Jos Joaquim de Souza Reis Remechido tendo sido reconhecido junto da populao e tendo em considerao a sua posio social, foi eleito para o cargo de juiz de vintena 42, aps a Revoluo de 182043. Foi proposto tambm, j em 1824, a alferes da companhia de ordenanas, uma tropa de 3 linha que tinha como misso a defesa de S. B. Messines 44. Sendo de seguida rejeitada a proposta, sob pretexto de ser apontado como constitucional, devido cega obedincia com que desempenhou as funes de juiz de vintena, no ano de 182045. Isto por-
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O dzimo foi a prtica bblica de dar a deus uma dcima parte dos ganhos, que era paga atravs de imposto associado religio, que os reis na antiguidade exigiam aos seus povos. Historicamente eram pagos na forma de bens, como com produtos agrcolas. 39 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 8 40 Vereao da Cmara de Silves de 17NOV1824 41 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido.Lisboa. Publicaes Europa- Amrica. N 175 42 Em cada lugar ou localidade com mais de vinte fogos havia um juiz de vintena, que decidia verbalmente as desavenas entre vizinhos. Estes eram nomeados pelas Cmaras Municipais da sua localidade, entre os homens bons de cada localidade. 43 CABRITA, Aurlio Nuno. (2005).O Remexido - Traos biogrficos de um homem coerente e fiel aos seus princpios. In: Arquivo Municipal de Lagoa. Remexido. Lagoa. Pag 33 44 Idem 45 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 9
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que os absolutistas ainda estavam no poder antes do Pronunciamento Militar de 24 de Agosto e da implantao do novo governo liberal a 1 de Outubro do mesmo ano. No sendo estes os seus sentimentos, de constitucional, mas sim compatriota, foi sempre sua inteno obedecer s autoridades constitudas por qualquer governo, fosse ele de direito e de facto46. Foi, ento, no ano de 1828, que foi confirmada a sua nomeao a capito de ordenanas, tinha ento trinta e um anos de idade. Trs anos aps esta nomeao, Remechido mereceu elogios e consideraes pblicas devido s funes desempenhadas 47. A 22 de Fevereiro de 1828, o Rei D. Miguel regressa a Portugal, para cumprir as determinaes que a seu respeito o irmo D. Pedro, planeara um governo de regncia, substituindo o da infanta D. Isabel, e a efectivao do projecto de casamento com a sobrinha, a 26 de Fevereiro assume a regncia e nomeia um executivo atravs do juramento que o infante D. Miguel faz Carta Constitucional no Palcio da Ajuda.48. Mas o facto, foi, de D. Miguel passou a exercer actos polticos no sentido de legitimar um poder absoluto, faltando assim ao seu juramento. Os miguelistas venciam os liberais, obrigando-os a importante xodo, , a represso exerceu-se rapidamente sobre os revolucionrios, criando-se tribunais especiais as aladas -, onde foram julgados e condenados morte49. Em 1831, D. Pedro abdicara da coroa brasileira para reaver o trono portugus, com o emprstimo de esforos ingleses 50, e existindo revoltas militares um pouco por todo o pas e mais propriamente no Algarve. Devido influncia da maonaria algarvia nas foras armadas51 foi ento organizado, na cidade de Faro, o Batalho de Voluntrios realistas. Aqui o comandante das foras nomeou Remechido para ser um dos seus oficiais subordinados. Apresentando-se, ento, em Faro, foi promovido a alferes, mas o facto de estar sete lguas 52 de distncia da famlia fez com que redigisse um requerimento apresentando como motivo e alegando a fraqueza da perna, que havia partido em rapaz jogando bola 53. O Remechido
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Idem Ibidem 48 VARGUES, Isabel Nobre; TORGAL, Lus Reis. Da revoluo contra-revoluo: vintismo, cartismo, absolutismo. O exlio politico. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 74 49 Idem Pag 76 50 SILVA, Antnio Martins. A Vitria definitiva do liberalismo e a instabilidade constitucional: cartismo, setembrismo e cabralismo. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal - O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 89 51 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido.Lisboa. Publicaes Europa- Amrica. N 175 52 Cada lgua tem uma distncia de 5000 metros logo sete lguas so 35 Km 53 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 9
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pediu, ento, cunha ao seu compadre Manuel Raimundo Telles Moniz Corte Real, capitomor do Termo de Silves, a fim de que este pedisse transferncia para Silves, isto porque, Remechido seria mais til em Silves do que no Batalho de Realistas de Faro 54. Mas como esta concesso foi de cariz temporrio, o Remechido pediu a sua demisso, voltando para junto de sua famlia em S. B. Messines onde colocou as armas de parte e se dedicou agricultura55. Com a ordem do Governo ento institudo 56, Visconde de Mollelos foi nomeado ento, General do Algarve. Esta ordem determinava que os Capites-mores dos Termos dividissem as ordenanas em Teros, foi ento que o Remechido foi nomeado Comandante dos Teros de Ordenanas do Termo de Silves, tendo em seu comando um nmero de 345 homens em armas57.
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Com D. Miguel, foi decretado a 28 de Fevereiro de 1828 uma nova organizao do exrcito, este extinguiu os Batalhes Nacionais e criou os Batalhes de Voluntrios Realistas e em 1829 o Exrcito foi reduzido devido a factores de natureza econmica, ficando assim com: 12 Regimentos de Infantaria; 4 Batalhes de Caadores; 4 Regimentos de Artilharia; 8 Regimentos de Cavalaria; 1 Batalho de Artfices Engenheiros. 55 PINTO, Jos M. Castro (2005) O Remechido Entre a Guerra e o Amor. Lisboa. Pltano Editora. Pag 16 56 Governo de D. Miguel, institudo com o seu juramento Carta no Palcio da Ajuda. 57 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 10 58 NOGUEIRA, Jos Manuel Freire (2004) As Guerras Liberais Uma reflexo Estratgica sobre a Histria de Portugal. Lisboa. Instituto da Defesa Nacional. Edio Cosmos. Pag 250
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estado em Portugal aquando da 3 invaso francesa, nomeadamente na batalha do Buaco e na defesa das linhas de Torres. Com ele vieram 5 vapores e mais de 600 mercenrios59. Napier detendo informaes de os burgueses abastados e defensores do Liberalismo se encontravam nas principais localidades do Algarve, (Olho, Faro e Lagos)60 (era aqui nestas principais localidades que se encontravam os burgueses abastados, e defensores do Liberalismo 61), como tambm Napier tinha tambm guardado boas memrias do Rio Guadiana, sabia que para alcanar a vila de Mrtola com os vapores (nova tecnologia ao alcance de um chefe militar) rapidamente, e aps isso, poderia marchar at Beja, com a esperana de se realizar um levantamento favorvel causa 62. Este movimento torneante foi uma manobra tctica muito inteligente que libertou os liberais do seu cerco cerrado no Porto e obrigou os absolutistas a dividirem as suas foras, e abandonar as posies que ocupavam. Assim sendo, o embarque das foras expedicionrias para realizar esta manobra comeou no dia 12 de Junho e terminou no dia 14 do mesmo ms, tendo sido a partida no dia 21. Foi, ento, que, na noite do dia 23 de Junho, a fora liberal dobrou o cabo de S. Vicente e pelas 15 horas da tarde estava junto praia da Alagoa 63 situada entre o forte de Cacela e o Monte Gordo, a praia escolhida para de fazer o desembarque. 64 Terceira comandava as tropas, Palmela ia como governador civil dos territrios que se conquistassem, Napier comandava a esquadra: 3 fragatas, 1 corveta, 1 brigue, 5 vapores.65 O desembarque ocorreu sem qualquer tipo de oposio.
1.2.2 A Travessia
Logo com a chegada desta fora liberal, o comandante miguelista do Algarve, General Mollelos, que possua 1600 homens em armas, constitudos por Batalhes Realistas de Faro,
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NOGUEIRA, (ob. cit.). Pag 255 LOPES, Joo Baptista da Silva (1841) Corografia ou Memria Econmica, Estatstica e Topogrfica do Reino do Algarve, 1 Volume, Lisboa, Academia Real das Cincias de Lisboa. Pag 18 61 Doutrina poltico-econmica e sistema doutrinrio que se caracteriza pela sua atitude de abertura e tolerncia a vrios nveis. Surgiu na poca do iluminismo contra o esprito absolutista. Parte do conceito de que o conhecimento da razo humana e o direito aco e realizao prpria, livre e sem limites, o melhor sistema para a satisfao dos desejos e necessidades da humanidade. Exigia no s a liberdade de pensamento mas tambm a liberdade poltica e econmica. Na sua origem, o liberalismo no era s partidrio das liberdades individuais mas tambm da dos povos, no sendo estranho aos movimentos de libertao nacional surgidos durante o sc. XIX. 62 NOGUEIRA, Jos Manuel Freire (2004) As Guerras Liberais Uma reflexo Estratgica sobre a Histria de Portugal. Lisboa. Instituto da Defesa Nacional. Edio Cosmos. Pag 256 63 Ver foto III.1.2.1.1.em anexo B 64 SORIANO, Simo Jos da Luz (1887), Vida do Marqus de S da Bandeira, Lisboa, Tomo I, Cap XI, Pag 349 65 Idem, Pag 257
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Tavira, Beja e Serpa e ainda 100 cavalos de Cavalaria n 5 66, travou um combate de encontro que a fora constitucional estava a desenvolver, um corpo de 2500 homens em armas. Este foi o primeiro combate travado nas terras do Algarve na ponte de Almargem 67, com o objectivo da fora liberal alcanar Tavira. Deste combate resultou a sua perca para os absolutistas juntamente com uma pea de artilharia e munies (pea de calibre 6 e munies de calibre 3) 68. Mollelos vendo que a sua fora estava em menor nmero, retirou-se para Faro, e de seguida, por S. Marcos da Serra, em direco a S. Clara at Messejana. Tendo o duque da Terceira ordenado um reconhecimento fora miguelista69, Mollelos reconheceu a necessidade de se defender contra a sua perseguio e reconhecimento. Ordenou, ento, aos capites-mores que reunissem as ordenanas da arma de infantaria e de cavalaria. O Remechido que estava inicialmente proposto a comandante de ordenanas de cavalaria 70, foi nomeado comandante de ordenanas de infantaria. Recebeu, ento, ordem para reunir os seus homens de espingarda. Aps a retirada do Visconde Mollelos de Faro para o Alentejo, mais propriamente Santa Clara a Velha, no dia 30 de Junho, Remechido aps receber ordem no dia anterior, para a sua tropa irregular seguir esta retirada, recebe ento ordem para ocupar o ponto miguelista em S. Marcos da Serra com a finalidade de reunir homens de 1 e 2 linha para se juntarem ao Visconde, pois a sua retirada no lhe dera tempo para tal. Mas juntamente ordem, emanava que Remechido, naquele local de S. Marcos da Serra, intercepta-se as comunicaes e fizesse prisioneiros, pois a estrada para Lisboa passava por S. Bartolomeu de Messines, primeira povoao da serra algarvia, e S. Marcos da Serra71, estando a 2 lguas de distncia. Enquanto Visconde Mollelos aguardava um aumento dos efectivos, composto por milcias72 de Tomar, caadores n1 de Tavira, um batalho de infantaria n14 e um esquadro de cavalaria n2 comandado pelo brigadeiro Jos Pinheiro, e por foras vindas do Porto, esta sendo uma Brigada constituda por um Batalho de infantaria n 8 e n17, milcias de Aveiro, realistas de Penafiel, um esquadro de cavalaria n4 e por duas peas de artilharia de calibre
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Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 10 Ver foto III.1.2.2.1.em anexo B 68 SORIANO, (ob. Cit.). Pag 350 69 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido.Lisboa. Publicaes Europa- Amrica. N 175. Pag 28 70 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 10 71 LOPES, Joo Baptista da Silva (1841) Corografia ou Memria Econmica, Estatstica e Topogrfica do Reino do Algarve, 1 Volume, Lisboa, Academia Real das Cincias de Lisboa. Pag 76 72 As Milcias foram criadas em 1643, no reinado de D. Joo IV, devido ao compromisso da coroa com as classes privilegiadas das provncias, que aceitaram um aumento dos impostos, mas ganharam o privilgio de no serem recrutadas para as tropas de linha.
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n 3 comandadas pelo brigadeiro Brito Taborda, que encontrando-se em Coimbra no dia 2 de Julho, sara de ao encontro do Visconde juntando-se a ele no dia 12 do mesmo ms 73. Reunindo assim um efectivo de 6000 homens em armas. Quando o Remechido estava a executar a ordem dada pelo Visconde fez prisioneiro um espio, este com a misso de localizar o Remechido. Terceira aps ter conquistado Loul e Quarteira, marchou em direco a S. B. Messines. Mas como Terceira tinha receio de entrar na serra algarvia (para sul do Malho, o terreno demasiado spero, d pouca facilidade de transporte) 74 e no Alentejo, ento recuou para Loul para recrutar homens 75 e esperou pela conquista de Lagos por parte de Napier, e do desenrolar do encontro naval entre as esquadras liberal e absolutista76. Remechido fez como prisioneiros alguns homens que dias antes tinham desertado das foras do Visconde de Mollelos. Estes eram o Tenente Couceiro de Cavalaria n 5 juntamente com quatro homens77, e ainda uma fora de reconhecimento comandada pelo Ajudante de Ordens do Duque da Terceira, o major Jos Pedro de Mello 78. Vencida a batalha naval de 5 de Julho, por Napier, Terceira decide ento entrar pela serra e de seguida no Alentejo em direco a Lisboa. Sendo esta uma operao conjunta, fez com que Napier sasse de Lagos, no dia 13 de Julho, em direco foz do Tejo para a bloquear, tal como Terceira que deixara S. B. Messines no mesmo dia. O comandante absolutista, Visconde Mollelos no possuindo informaes acerca do desenrolar das operaes no Pas, tal como das operaes do duque da terceira, e da veracidade de pedidos de ajuda79, parte em direco a Beja, j que lhe constava que a houvera um pronunciamento liberal80. Entretanto ordenou a Remechido que operasse segundo os movimentos da Diviso Constitucional 81, e que fosse ao encontro do major Andr Camacho Jorge Barbosa, mais conhecido por Camacho, que se encontrava em Almodvar. A finalidade deste encontro, ordenado por Mollelos, era a de organizar as guerrilhas existentes em duas guerrilhas realistas, aps a retirada da fora liberal. A guerrilha da direita, comandada pelo Capito
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SORIANO, Simo Jos da Luz (1887), Vida do Marqus de S da Bandeira, Lisboa, Tomo I, Cap XI, Pag 351 TAVEIRA, Alfredo pereira (1905), Sumrio Histrico Sobre a Defesa de Portugal, Lisboa, 2 parte (18151905), M. Gomes, Editor, Livreiro de suas Majestades e Altezas, Pag 129 75 NOGUEIRA, Jos Manuel Freire (2004) As Guerras Liberais Uma reflexo Estratgica sobre a Histria de Portugal. Lisboa. Instituto da Defesa Nacional. Edio Cosmos. Pag 261 76 SORIANO, Simo Jos da Luz (1887). Vida do Marqus de S da Bandeira. Lisboa. Tomo I. Cap XI. Pag 351 77 Annimo. (1838). Lisboa. Biografia de Remexido. Lisboa. Pag 12 78 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa- Amrica. N 175. Pag 28 79 SORIANO, Simo Jos da Luz (1887). Vida do Marqus de S da Bandeira. Lisboa. Tomo I. Cap XI, Pag 358 80 NOGUEIRA, (ob. cit.). Pag 261 81 Annimo, (ob. cit.). Pag 13
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de Ordenanas Remechido, ia actuar na zona ocidental do Algarve, ou seja no Barlavento (a partir de S. B. Messines), e a guerrilha da esquerda, comandada por Camacho, ia actuar na zona oriental82, ou seja, no Sotavento (a partir de Salir). Acompanhando os movimentos liberais na sua entrada para o Alentejo, Remechido deslocou-se para Santa Ana da Serra e de seguida para S. Marcos da Serra para executar a ordem. Por ele passara, no dia 14 de Julho, o Duque da Terceira, pela estrada principal, enquanto o Remechido se encontrava nos pontos mais altos, observando a sua marcha 83. Ainda antes do incio do deslocamento liberal para Lisboa, as guerrilhas j tinham interceptado vrias cartas, bagagens, munies e ordens que se destinavam fora de manobra liberal. Mas foi com a entrada na serra, que a guerrilha comandada pelo Capito de Ordenanas Remechido, comeou a executar ataques de flagelao. Estas operaes ofensivas por parte de foras irregulares constavam de ataques rpidos e combinados que Remechido executou contra a fora liberal a quando da sua passagem da serra algarvia para o Alentejo. Cancelou os ataques quando se apercebeu que a fora liberal deixara as terras algarvias.
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MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 28 83 Annimo. (1838). Biographya de Remechido o Clebre Guerrilheiro do Algarve. Edio da Typographya de Tavira. Tavira. 1892. Pag 13 84 MACHADO-CARDOSO, (ob. cit.), Pag 28 85 Termo usado pelos absolutistas para distinguir aqueles que no defendiam a causa de D. Miguel. 86 Annimo, (ob. cit.), Pag 15 87 Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. S. Marcos da Serra (Silves), n578, 1978. (Escala 1:25 000)
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Ao ter a necessidade de planear um ataque, acampou no Monte Grande 89 (29SNB6227)90, a sua ordem de operaes para aquela aco foi, a de aclamar o nome de D. Miguel sem a necessidade de existirem vinganas particulares 91. Para isso, o ataque dava-se entre as 23 e 00 horas da noite, pois tendo ele morado ali conhecia os hbitos dos habitantes, cujo costume era de recolher cedo.92 A manobra constava de dividir a fora em trs, ordenando que fosse uma pela direita, contornando o Penedo Grande e a seguir dirigir-se para a aldeia, conservando, no entanto na Ermida de S. Pedro seis soldados de cavalaria para evitar que algum que por ali passasse descobrisse a manobra e os denunciasse populao. Ordenou o Remechido que outra fora deveria subir at linha de alturas do Penedo Grande e aguardasse a coberto das vistas at que este envolvesse e surgisse, em frente, pela N. Senhora da Sade. Por fim, a fora da esquerda contornava o Penedo Grande pela esquerda. 93 Porm, quando se efectuava a manobra, a sua fora foi descoberta por um rapaz que os denunciou populao, abrindo esta logo de seguida fogo sobre a fora. Todavia quando este chega a S.B.Messines j a sua fora tinha controlado a situao. De salientar, no entanto, que foi ordenado o fuzilamento de alguns dos seus homens porque estes no tinham cumprido a ordem vinganas pessoais, e ele no queria que situaes como aquelas se voltassem a repetir 94. A 20 de Julho pelas 8 da manh, sbado, chega a notcia a Albufeira de que S. B. Messines tinha sido atacada e tomada pelo Remechido no dia anterior 95. Da surgiu o alarme e a preocupao dos habitantes, isto porque Albufeira apoiava o Liberalismo. Foi, ento, no dia 24 de Julho, que se deu uma das piores carnificinas por parte dos absolutistas contra os liberais. O testemunho encontra-se relatado por um annimo que narrou e deu o nome de Memria dos desastrosos acontecimentos de Albufeira por ocasio da Invaso dos Guerrilhas em Julho de 1833. Durante quatro dias, desde que os habitantes receberam as notcias do sucedido que se prepara a defesa da vila, em que o efectivo liberal era de quase 250 homens em armas96, a guerrilha do Remechido atacou com a sua fora, novamente dividida em trs. E
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Annimo. (1838). Biographya de Remechido o Clebre Guerrilheiro do Algarve. Tavira, Edio da Typographya de Tavira. 1892. Pag 15 89 Ver imagem III.1.2.3.1.em anexo B 90 Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. S. Bartolomeu de Messines (Silves), n587, 1979. (Escala 1:25 000) 91 Annimo, (ob. cit.), Pag 16 92 Idem. Pag 15 93 Ver imagem III.1.2.3.1. em anexo B 94 Annimo, (ob. cit.), Pag 16 95 PINTO, Jos M. Castro (2005) O Remechido Entre a Guerra e o Amor. Lisboa. Pltano Editora. Pag 39 96 PINTO, Jos M. Castro (2005) O Remechido Entre a Guerra e o Amor. Lisboa. Pltano Editora. Pag 39
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desta contava tambm com mulheres para que estas carregassem todo o produto das pilhagens em burros. A motivao dos guerrilheiros era originada com tudo aquilo que conseguiam arrecadar com o saque que faziam s vilas atacadas, mas para alm disso, os ataques eram momentos oportunos para eliminar credores, isto fazia aumentar a sede de matar por parte dos absolutistas. Este facto fez com que Remechido quase perdesse o comando dos seus guerrilheiros, e para no ter o mesmo destino que os malhados, teve de acatar os pedidos dos seus homens mesmo contra a sua vontade. Quase em simultneo, mas no dia 23 de Julho, Camacho, comandante das foras da esquerda, cercara e atacara a cidade de Loul. Como tinha sido planeado pelos dois comandantes, o do barlavento e do sotavento, estes prosseguiram nas suas marchas rpidas, e com algumas escaramuas e foram entrando gradualmente nas terras, fazendo as acclamaes e constituindo as autoridades97, ou seja, substituindo a guarda nacional98 pelos voluntrios realistas. Os liberais com pouca representao de foras, fizeram com que a resposta absolutista resultasse numa sucesso de triunfos militares absolutistas em terras do Algarve. E para esta viragem da situao militar foi necessria a decisiva aco das guerrilhas, mesmo havendo indisciplina e fraca combatividade dos guerrilheiros, audaciosos no saque a povoaes abertas, inaptos, porm, a guerra regular, que obrigava a efectuar ataques, debaixo de fogo cerrado do inimigo99. Por outro lado, os liberais ficaram circunscritos a Faro, Lagos e Olho100 suportando um enorme assdio, estes confinados aos muros das vilas, com apenas capacidade apenas de manobra por mar, (o qual no era controlado pelos absolutistas) e carecendo dos bens principais de subsistncia, enfrentando cerca de seis meses de ataques violentos.
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Annimo. (1838). Biographya de Remechido o Clebre Guerrilheiro do Algarve. Edio da Typographya de Tavira. Tavira. 1892.Pag 16 98 A Guarda Nacional foi criada em Maro de 1823, pelo facto de na Europa estar a decorrer uma contestao contra o liberalismo revolucionrio. As deliberaes tomadas no congresso de Verona pela Santa Aliana sobre a necessidade de interveno militar francesa na Pennsula (os chamados cem mil filhos de S. Lus) ameaavam os liberais revolucionrios europeus, e em particular os da Pennsula Ibrica. 99 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 32 100 Idem. Pag 34
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SORIANO, Simo Jos da Luz (1887), Vida do Marqus de S da Bandeira, Lisboa, Tomo I, Cap XI, Pag 396 102 Idem, Pag 397 103 Ibidem 104 Ibidem
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ciplina e combatividade105, constituindo assim uma diviso liberal com um efectivo de cerca de 900 homens em armas106, partindo em perseguio dos absolutistas. Voltando s operaes no dia 10 de Maro, regressou a S. Brs de Alportel, isto porque ali se encontrara de novo fora inimiga e com um efectivo superior de 2000 homens em armas. Aps renhido combate, os absolutistas retiraram para Almodvar, uma vila no Alentejo107. Ainda antes de ir em perseguio da fora absolutista que se encontrava na mesma vila alentejana, Bandeira passou no dia 15 de Maro por S. B. Messines, no intuito de ordenar esposa do Remechido que escrevesse uma carta para que o seu marido se entregasse juntamente com os seus guerrilheiros e com a promessa de serem bem recebidos108. Se esta aco psicolgica do baro, S da Bandeira, tivesse sido acatada pelo Remechido teria provavelmente sido uma mais valia para os liberais que teriam ganho a posse de todo o Algarve. De notar que ainda antes da batalha de 24 de Abril de 1834, ocorreu um acontecimento que considerando as narrativas da poca convm, no entanto, sublinhar que as opinies divergem em saber se foi a fora onde se encontrava S da Bandeira a quando da sua marcha para entrar em contacto com os absolutistas que se encontravam em Almodvar, e que o mesmo S da Bandeira no contra-atacou por no querer abrandar a marcha 109 ou se foi um batalho mvel de Lagos que por ali passava, a sofrer uma emboscada no Vale da Mata110 e a sofrer grande perda de mortos e feridos111. Colocando posies polticas parte dos autores das narrativas, a realidade que Remechido fez uso do terreno, atacou uma fora em movimento. S da Bandeira iniciou uma perseguio aos absolutistas no Alentejo e optou por dividir a fora, para que uma parte desta fosse eliminar as guerrilhas existentes em Mrtola e a outra aguardasse em Almodvar, no sentido de controlar o Algarve e evitar um novo controle desta regio por parte dos miguelistas. Entretanto, S da Bandeira foi informado que D. Miguel estava a formar uma outra fora, constituda por 2000 homens, composta pelos regimentos de infantaria n2 e 14, caadores n4, 200 cavallos, 8 bocas de fogo, alguns batalhes de voluntrios realistas, e corpos de milcias, comandados pelo brigadeiro Toms Cabrei-
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MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 36 106 Idem. Pag 37 107 SORIANO, Simo Jos da Luz (1887). Vida do Marqus de S da Bandeira. Lisboa. Tomo I. Cap XI. Pag 401 108 Idem 109 SORIANO, (ob. cit.), Pag 401 110 Ver foto III.1.3.1. em anexo B 111 MACHADO-CARDOSO, (ob. cit.), Pag 41
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ra112. S da Bandeira informou ento Lisboa que necessitava de mais foras. Na ausncia de guerrilhas em Mrtola, a fora que era comandada pelo coronel Charlier, voltou a 21 de Maro a Almodvar para formar novamente o grosso da fora de S da Bandeira para ir atacar Beja, iniciando aqui a conquista liberal no Alentejo e a concretizar o objectivo estratgico de D. Pedro. aqui em Beja que S da Bandeira tambm recebe informaes de que uma fora absolutista comandada pelo brigadeiro Bourmont teria iniciado uma manobra para envolver a fora liberal, atacando-a pela sua retaguarda, cortando-lhe a sada para o Algarve e para efectuar esta manobra entrou em Espanha onde j teria passado a margem esquerda do Guadiana113. Com a fora comandada por Cabreira e com a fora de Bourmont a envolv-lo, S da Bandeira que teria ficado cercado e sem capacidade de manobra, decidiu assim voltar de novo ao Algarve para reunir toda a fora e enfrentar Cabreira. Aps ter reunido todas as suas foras, Bandeira marchou para S. B. Messines, no dia 10 de Abril, iniciando o combate contra a fora de Bourmont que o perseguia, na localidade de Benaftima, a noroeste de S. Marcos da Serra (de acordo com os manuscritos do senhor Francisco Vargas). Foi ento que, no dia 23 do mesmo ms, Cabreira entrou no Algarve e pernoitou em S. Marcos da Serra. Entretanto j Bandeira tinha recuado para S. B. Messines. Os defensores do absolutismo 114 tendo reunido toda a sua fora juntamente com as guerrilhas, formaram um corpo de entre 3000 a 4000 homens. Os liberais encontravam-se junto Igreja de SantAnna com apenas 1500 homens. Assim a posio de Cabreira era na margem esquerda do Rio Arade, a norte, no stio da Pedra Alva (29SNB62862718)115, e de Bandeira na margem direita, a sul, na Igreja de SantAnna (29SNB62362644) 116. Nesta importante batalha as foras de Remechido foram importantes pois atacaram um flanco liberal, tornando insuportvel a continuao das operaes liberais. Foram tambm, as foras de Remechido que feriram S da Bandeira, quando este foi ousadamente metter-se de espada
112
SORIANO, Simo Jos da Luz (1887). Vida do Marqus de S da Bandeira. Lisboa. Tomo I. Cap XI., Pag 402 113 SORIANO, (Ob. Cit.), Pag 403 114 Doutrina poltica que predominou na Europa desde os secs. XVI-XVIII e cuja forma de governo caracterizou essa mesma poca. O absolutismo nasceu como forma de compensao dos abusos da nobreza. Em Portugal, o absolutismo foi estabelecido desde D. Joo I, tendo-se reforado com D. Joo II. Com D. Jos, j no sc. XVIII, tomou a forma de absolutismo esclarecido (apesar de se humanizar o direito penal, se fomentar o ensino, a cultura e a tolerncia religiosa, os povos continuam a no tomar parte nas decises do estado). 115 Ver foto III.1.3.2. em anexo B 116 Ver foto III.1.3.3. em anexo B
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na mo entre as fileiras do inimigo117. Em suma, a vitria desta batalha para os miguelistas deveu-se ao facto de Cabreira empregou as guerrilhas e a tropa apeada a executar os ataques contra a cavalaria de S da Bandeira uma vez que este teimava em a aplicar em terreno muito acidentado para vencer uma fora numericamente superior. Mas para alm destes acontecimentos, a cena poltica estava preste a mudar com a interveno da Inglaterra e da Frana nomeadamente a liderarem um acordo que teve pelo nome de Qudrupla Aliana. A finalidade deste acordo era de tanto a coroa espanhola como a coroa portuguesa, se comprometerem a pr um fim aos conflitos peninsulares recebendo uma dotao compatvel com o seu estatuto118. Para isso, era necessrio exilar os prncipes absolutistas de Portugal e Espanha que estavam a desenvolver a guerra civil nos seus pases. Caso isto no fosse conseguido, era levantada a hiptese de os pases fundadores do acordo virem a intervir com foras armadas. Com os principais pases da Europa no lado liberal, a causa absolutista estava perdida. Foi a 26 de Maio de 1834, na localidade de vora Monte, assinada uma conveno com o mesmo nome, que estipulava rendio incondicional dos absolutistas e o exlio de D. Miguel. Para o grupo dos vencidos, no qual est inserida a guerrilha do Remechido, s lhes restava voltar pacificamente para as suas casas e retomar as suas actividades no militares119.
Captulo IV
1. A Aco de Guerrilha (1834-1838)
SORIANO, Simo Jos da Luz (1887), Vida do Marqus de S da Bandeira, Lisboa, Tomo I, Cap XI, Pag 406 118 SILVA, Antnio Martins. A Vitria definitiva do liberalismo e a instabilidade constitucional: cartismo, setembrismo e cabralismo. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa. Pag 93 119 PINTO, Jos M. Castro (2005) O Remechido Entre a Guerra e o Amor. Lisboa. Pltano Editora. Pag 130 120 http://www.jornaldefesa.com.pt/conteudos/view_txt.asp?id=242 6 de Julho de 2006
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que se d uma significativa alterao na utilizao das Ordenanas. Por ordem do Duque de Lafes vo ser levantadas na Provncia de Trs-os-Montes, pelo ento coronel do regimento de Cavalaria de Chaves, Manuel Incio Pamplona Crte-Real, futuro Conde de SubSerra, duas Companhias de Voluntrios Reais do Monte e seis Companhias francas recrutadas nas Ordenanas, com as quais se cria o Corpo de Voluntrios Pagos de Trs-os-Montes. As duas primeiras companhias sero comandadas por oficiais das Ordenanas, as outras por oficiais subalternos, havendo algumas comandadas por cadetes, dos regimentos de Trs-osMontes. O Marqus de Alorna tambm mandar levantar uma na Beira, mas sem autorizao. a aplicao, pelo duque e pelos oficiais mais chegados a si, das ideias de Frederico II da Prssia, que defendia a criao em tempo de guerra de unidades de voluntrios para realizarem a guerra de postos, ou como se dizia em francs - a petite guerre -, ou ainda como vai ser mais conhecida, na sua traduo espanhola, a guerrilha. Em Portugal, como o prprio nome das companhias indica, e vem expresso claramente nas instrues do duque aos generais como base da tctica a utilizar na campanha, este tipo de guerra conhecido por Guerra de Montanhas.121 Aps a conveno de vora Monte, e com o fim da guerra civil, surge um novo tipo de guerra por todo o pas, isto a guerra subversiva 122, porque nasce no seio dos defensores liberais a prtica de assassinar os vencidos, aliada vingana. Tudo isto gerou a insegurana de muitos antigos oficiais e soldados do exrcito miguelista que passaram a esconder armas e a andar a monte. Tambm fez nascer o descontentamento do povo devido situao de misria em que o pas se encontrava, juntamente com a grande dvida externa provocada pelos gastos de guerra. Aliado estava tambm presente a grande distncia entre a burguesia e o povo, pois o individualismo agrrio, a apropriao de baldios com os pequenos camponeses a serem expropriados das suas terras, fez aumentar o proletariado agrcola, o que levou ao aumento do desemprego sazonal123 e ainda nos servios administrativos, o despedimento dos funcionrios absolutistas em favor dos liberais 124. Foi a partir daqui que o novo regime comeou a deparar com grandes resistncias em relao implementao do seu novo governo por parte do
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Luta conduzida no interior de um territrio, por parte da populao, ajudada ou reforada ou no do exterior, contra a autoridade de direito ou de facto, com o fim de, pelo menos paralisar a sua aco. prolongado, metdico e com o objectivo de conquistar o poder. 123 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 43 124 Idem, Pag 44
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Alentejo e do Algarve, mas principalmente na serra do Algarve, onde nos finais da guerra civil se formaram temveis guerrilhas, que se reactivaram com sucesso a partir de 1836125. Como absolutista e antigo oficial de ordenanas miguelista Remechido volta a casa 126. Mais tarde recebe a informao de que todos os oficiais Miguelistas estavam a ser assassinados. Sentiu ento necessidade de se esconder em locais inspitos, tais como a gruta do Barranco127, (onde de facto esteve durante dezassete meses 128) e ainda numa outra que se encontra a uns metros a norte129 de sua casa onde provavelmente tambm se escondeu. A 21 de Maro de1836, D. Miguel proclama uma corrida s armas para acabar com os assassnios executados pelos liberais, juntamente com isto, nomeia oficiais para comandar tais operaes. Entre eles est Remechido que nomeado Governador do Algarve e Comandante em Chefe Interino do Exrcito do Sul130. Mas foi o facto dos liberais ordenarem uma punio da sua esposa e a priso do seu filho, Manuel da Graa Reis, que o levou a passar ofensiva. Recebendo ento ordem, comeou a organizar a sua fora131, constituda por miguelistas foragidos132 que procuravam sobreviver em pequenos grupos atravs de roubos feitos populao e escondendo-se depois nas serras do Algarve. Entre eles estavam soldados desertores que tinham desertado, uma prtica frequente, devido saudade dos seus parentes, do desejo de liberdade, o medo de guerra, a severidade da vida militar, e o tipo de comunicao estabelecido entre soldados e oficiais 133. Estavam tambm lavradores que tinham posies divergentes em relao guerrilha, uns porque albergavam os guerrilheiros juntos dos seus montes e facultavam-lhes cobertores134, (escondem-lhes as armas, trocam dinheiro para os pagamentos e fornecem informaes sobre os movimentos da tropa)135 para alm de tambm vender gneros136 e outros forneciam informaes sobre os movimentos das guerrilhas, tendo, por isso o
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http://www.esa.ipb.pt/estudosrurais/Pdfs/Antonio_Cardoso.pdf Ver foto IV.1.1.1. em anexo B 127 Ver foto IV.1.1.2. em anexo B 128 OLIVEIRA, Francisco Xavier de Atade de. Monografia de S. Bartolomeu de Messines, Porto, (1909), Pag 132 129 Ver Foto IV.1.1.3. em anexo B 130 Carta do Remechido a Jos Maria do Carvalhal, Ten-Cor de Inf 14, de 26 de Novembro de 1836. A.H.M., 1 diviso, 21 seco, caixa 7, n1 131 Correspondncia de Remechido para Jos Maria Pestanha a 26 de Agosto de 1836, A. H. M., 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1. 132 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag. 61 133 COSTA, Fernando Dores. Condicionantes Sociais das Prticas de Recrutamento Militar (1640-1820), Comisso Portuguesa de Histria Militar, VII Colquio, Lisboa, 1996, Pag 271 134 Testemunho deixado pelo entrevistado sr. Vtor Manuel da Palma Anastcio 135 MACHADO-CARDOSO, (ob. cit.), Pag 95 136 Testemunho deixado pelo entrevistado senhor Francisco Vargas
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destino do barranco137 ou de lhe queimar a casa (como aconteceu no stio da Casa Queimada)138. A guerrilha era constituda tambm por ferradores139 e correeiros, estes muito importantes na manuteno da Logstica. Por fim, por assalariados rurais, homens novos, solteiros, desenraizados, sem perspectivas de ascenso social, para eles a guerrilha representou um meio de satisfazer carncias vitais140. Reuniu assim inicialmente 45 homens que andavam a monte e atacou a povoao de S. B. Messines.
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Significa fuzilar Testemunho deixado pelo entrevistado senhor Francisco Vargas 139 Carta de Maral Jos Espada, Ajudante e secretrio interino, a Francisco Jos Nogueira a 23 de Junho de 1838., A.H.M. 1 diviso, 21 seco, caixa 7, n1 Ver digitalizao IV.1.2.1. em anexo B 140 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag101 141 Carta do Remechido a Jos Maria do Carvalhal, Ten-Cor de Inf 14, de 26 de Novembro de 1836. A.H.M., 1 diviso, 21 seco, caixa 7, n1 142 MACHADO-CARDOSO, (ob. cit.),. Pag 55 143 Numa pequena povoao junto a Loures eclodiu em 13/5/1837 uma revolta absolutista conhecida por "Conspirao dos Marnotas". Veteranos do exrcito miguelista, atravessaram o Tejo em Muge e aclamaram D. Miguel em Samora Correia,ao verem o exrcito governamental debandaram, sendo alguns dos seus intervenientes condenados morte (1839) e outros amnistiados (1840).
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Jos Espada, o Estado-Maior era constitudo por Simo Francisco Cabrita (chefe de EstadoMaior Interino), Manuel da Graa Reis Remechido (Ajudante do General Interino), Joaquim Jos Alves Ribeiro (Lugar Tenente Mestre), Francisco Joaquim Nogueira (Alferes Comandante de Caadores n 2), Joo Lus Monteiro Baia (Tenente Comandante do Regimento de Infantaria n 2), Fermino da Costa Lobo (Tenente Comandante do Regimento de Infantaria n 14)144, estes aconselhavam e auxiliavam Remechido no seu exerccio de comando. Estes Regimentos so os locais de onde estes oficiais miguelistas eram provenientes antes da Conveno de vora Monte e no de um Regimento que existisse na realidade, isto porque, a ttulo de exemplo, Remechido no final das suas cartas assinava Quartel nas Serras e no entanto no existia qualquer tipo de quartel, o que existia era um buraco escavado mo feito pelos prprios guerrilheiros, com cerca de mais de 20 metros de comprido por 1 de largura (embora estas medidas variasse consoante a necessidade) e no final era redondo, este local onde Remechido na sua grande maioria das vezes emanava as suas ordens, situava-se em 29SNB56303936145 a 4 quilmetros a norte de S. Marcos da Serra146. Mas por outro lado era o quartel era mvel, porque estava situado onde Remechido se encontrava, para preparar as operaes, outro exemplo, desta vez Quartel nos vales147, este situado no Vale da Mata148, em 29SNB60622942149.
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Relao da nomeao dos oficiais de Estado-Maior da Diviso do Exrcito do Sul em Novembro de 1836, A. H. M., 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1 145 Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. S. Marcos da Serra (Silves), n578, 1978. (Escala 1:25 000) 146 Ver foto IV.1.2.2. em anexo B 147 Correspondncia de Remechido para Francisco Jos Nogueira a 24 de Fevereiro de 1838, A. H. M., 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1 Ver digitalizao IV.1.2.3. em anexo B 148 Ver foto IV.1.2.4. em anexo B 149 Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. Amorosa (Silves), n586, 1978. (Escala 1:25 000) 150 Ver imagem IV.1.3.1. em anexo B
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comando na zona da serra de Monchique, com os seu subalternos, Carvalho na zona de Aljezur, Ribeira na zona de S. Martinho das Amoreiras, Odemira e S. Luzia. Por fim com Joo Lus Leo Monteiro Baia, major comandante de Brigada actuava na zona compreendida pela linha do Guadiana, mas para alm das suas zonas de empenhamento serem relativamente estas, as foras tambm podiam se desempenhar nas operaes de outra zona.
1.4. As Operaes
As operaes desencadeadas pela guerrilha logo aps sua reactivao revestiram-se de carcter rpido e sincronizado, pelo que, logo a 19 de Julho de 1936, a guerrilha executou um ataque vila de Ourique com um efectivo de 30 a 40 homens em armas 151. Este ataque para alm de destruir as foras liberais mal organizadas na defesa das localidades, foi tambm um golpe de mo, ou seja, um ataque em terreno controlado pelo inimigo com a finalidade, neste caso, de libertar onze miguelistas que se encontravam presos, e no de conquistar ou manter a posse de terreno, retirando no final de cumprir a misso 152. ento que, de acordo com o Memorial das Operaes153 de Remechido, e aps esta operao, ele se reuniu na Foz do Zebro (29SNB70563096)154, no Concelho de S. Barnab para desenvolver um ataque deliberado a S. B. Messines, isto porque, esta reunio durou desde o dia 15 at o dia 21 de Agosto. Atacou assim S. B. Messines no crepsculo nutico matutino do dia 23 do mesmo ms com 45 ordenanas e 5 de pau, de onde morreram onze liberais e quatro absolutistas. Esta operao foi executada apenas por fogos de mosquetes e ataques corpo a corpo. As suas operaes seguintes tiveram diferentes intervalos de actuao e diferentes locais, isto para no se tornar previsvel, tanto as datas dos ataques e os locais, para que as foras liberais no se precaverem, e para que os ataques fossem bem planeados. Assim aps o ataque a S. B. Messines, o prximo desencadeou-se no dia 16 de Setembro em Sabia e em S. Clara, no Alentejo, mas nestes locais s se efectivou a priso e o fuzilamento de quatro liberais. No dia 21 de Setembro entra em Salir, outra localidade no interior algarvio, sem qualquer presso liberal, mas no dia 6 de Outubro, entra em Benafim, uma localidade perto da anterior,
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MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 62 152 EXRCITO PORTUGUS. Estado-Maior do Exrcito (1987) RC 130-1 OPERAES. Lisboa. Departamento de Operaes. Volume I. Capitulo 8. seco II. Pag 10 153 Ver digitalizao IV.1.4.1. em anexo B 154 Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. S. Bartolomeu de Messines (Silves), n587, 1978. (Escala 1:25 000)
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mas quando se retirava para o interior da serra do Caldeiro, no sitio do Malho, no dia 7 de madrugada foi travado um combate com uma fora de S. B. Messines, comandada pelo capito Neutel, (nasceu em 1797 na freguesia de Santa Marinha, concelho e comarca de Ceia, bispado de Coimbra. Era filho legtimo do Dr. Manuel Mendes Neutel e de D. Joana Clara Madureira Lobo. Veio para S. B. Messines com a ordem de perseguir as guerrilhas. Foi capito de infantaria 4 e casou nesta povoao com D. Maria da Piedade Figueiredo, filha legtima do major Jos Gregrio de Figueiredo e de D. Catarina Jacinta, da mesma povoao; e nesta povoao se conservou at sua morte em 13 de Junho de 1886.)155, e com o tenente Fonseca. Neste encontro o capito Neutel disps as foras por forma a executar um duplo envolvimento guerrilha, mas sem sucesso, dado que a guerrilha conseguiu dispersar, embora o que refere o Memorial que Remechido poderia ter derrotado o sucesso se as suas foras tivessem aguentado firmes e a guarda avanada no seu posto. So nestes encontros de fogo directo com presso para os guerrilheiros que Remechido no consegue derrotar foras organizadas. Na continuao das suas operaes aps a este combate Remechido dispersa as foras para que fosse difcil a sua perseguio, com parte da sua fora sendo perseguida, ele continua a flagelar os poucos efectivos que se encontram nas povoaes, neste caso, no dia 16 de Outubro, volta a S. Clara de Sabia e prende quatro soldados, no dia 21 de Outubro entrou em contacto com a guarda nacional de S. B. Messines, em Monte Mogo (29SNB54583260) 156, pois esta, desde o dia 7 de Setembro que perseguia a guerrilha, Remechido mais uma vez no falando por si mas sim pela guerrilha relata as guerrilhas se puseram em fuga, e nem querendo fazer alto, e frente ao inimigo, isto salienta a fuga da guerrilha aos combates contra foras organizadas e pretendendo apenas roubar as populaes e matar. Ainda de salientar o facto do seu comandante nem sempre consegue exercer a actividade de comando, pois em semelhana com os trgicos acontecimentos de Albufeira, Remechido teve ordenar o fuzilamento de liberais que j se encontravam presos, por exigncias dos seus homens, com a ameaa de perder o comando e ser morto juntamente com os liberais, caso no cumprisse este pedido, logo para alcanar a sua misso necessitava de concretizar algumas exigncias dos seus homens. No dia 22 de Novembro entra em S. Ana da Serra e captura 23 porcos ao Prior, no dia 30 no stio da Cortinhola na freguesia de Alte foi travado um pequeno tiroteio, mas Remechi-
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Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. S. Marcos da Serra (Silves), n578, 1978. (Escala 1:25 000)
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do decidiu no atacar porque lhe chegaram informaes de que o destacamento de S. B. Messines, continuando na sua perseguio, lhe cortara o caminho de retirada. No dia 1 de Dezembro, tendo lhe chegado informaes que os destacamentos de Monchique e de Odemira marchavam em direco a Alte e tendo passado a noite em S. Barnab, Remechido foi ao encontro deles, e assim que a fora liberal avistou as guerrilhas ps-se em fuga deixando para trs bagagens e furtos que fizera. No dia seguinte foi capturado o Correio do Alentejo, correio esse que no seu trajecto de Lisboa para o Algarve passava por Almodvar em seguida para Loul157. A ltima operao ordenada por Remechido foi uma entrada em S. Martinho das Amoreiras, Alentejo, em que foram capturados 15 armas, 2 cavalos e algum fornecimento ainda foram fuzilados alguns liberais. Ano de 1837, ainda de acordo com o memorial das operaes, as operaes desencadeadas pela guerrilha comandada por Remechido, foram baseadas na generalidade, na captura de armas, mantimentos, correios vindos de Lisboa para o Algarve e vice-versa, animais, tanto para servir de transporte, como para alimentao, dinheiro, pessoas que cometeram crimes contra a guerrilha, informaes sobre os pontos de marcha inimiga 158 e pequenas foras liberais. Foi tambm neste mesmo ano, mais propriamente a 9 de Maro de 1837, que Remechido necessitou de ocultar os seus homens, pois as foras liberais possuam um grande nmero de efectivos empenhados na caa guerrilha, para escaparem, ordenou que dispersassem e se ocultassem com a populao, para isso foi necessrio que escondessem as armas. Com os seus homens ocultos Remechido com apenas o seu estado-maior e uma fora de cavalaria, ordena um reconhecimento em fora para os stios de Mrtola, e que consistiu num ataque para incomodar o inimigo quanto pudesse, a fim de ver se podia conseguir alguma divergncia, realizado por uma fora de volume aprecivel, com o fim de pr prova a resistncia do inimigo e de obter informaes para a sua ordem de batalha 159.
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CARIMBOS DE CORREIO: ALGARVE SC. XIX. Arquivo Municipal de Lagoa, Lagoa, Setembro, 2005 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 66 159 EXRCITO PORTUGUS. Estado-Maior do Exrcito (1987) RC 130-1 OPERAES. Lisboa. Departamento de Operaes. Volume I. Capitulo 5. seco II. Pag 10
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que contribuiu para a longa sobrevivncia da guerrilha, atravs da segurana, assegurando o segredo. exemplo da necessidade de Remechido possuir informaes sobre as posies e marchas dos liberais 160, estas recolhidas atravs do emprego especfico das suas foras, de acordo com a sua localizao, mas tambm foram usadas pessoas que no faziam parte da guerrilha161, que lhe forneciam informaes acerca de manobras envolventes ou laterais dos liberais a quando de uma operao desencadeada pela guerrilha. O transporte de correspondncia entre Remechido e os seus comandantes era feito a partir de bagageiros, homens destacados para entregar a correspondncia 162, mas para que estes homens no fossem seguidos, e os liberais descobrissem o quartel de Remechido, a correspondncia e outro material tinha o destino de Vale Grou de Cima (29SNB5240), isto quando o cerco guerrilha andava mais apertado, s depois que algum homem do quartel de Remechido que ia a este local, de noite, levantar o material e/ou correspondncia 163. A informao tambm era adquirida atravs da captura do correio proveniente de Lisboa para o Algarve com ordens, material de guerra e dinheiro, que Remechido usou para pagar aos seus homens, e do Algarve para Lisboa, esta rota do correio era bem conhecida pela guerrilha 164. Como Joo Baptista da Silva Lopes escreve no segundo captulo, nmero 7, sobre correios e estradas do livro Corografia ou Memria Econmica, Estatstica e Topogrfica de Reino do Algarve, A caixa geral do correio do Algarve estabelecida em Faro, onde chega de Lisboa nas teras, quintas e sbados das 10 as 11 horas da manh, e parte nas teras, sextas, e domingos 1 hora da tarde, para alm do conhecimento por parte de Remechido165 das datas de travessia dos correios, as estradas por onde estes passam so ptimas para emboscadas feitas pela guerrilha, e mais uma vez como Joo Baptista da Silva Lopes escreve As estradas do Algarve so menos ms na beira-mar, no barrocal porm piores, e na serra so pssimas. Algumas povoaes apenas se comunicam entre si por veredas, , As comunicaes com o Alentejo pelos pontos da serra j mencionados so quase intransitveis,, No havendo frequentemente passagem de pessoas estranhas da provncia, e existindo conhecimentos, amizades e parentescos entre as que nela so moradores.
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Correspondncia de Antnio Venncio Ramos a Remechido no dia 13 de Junho de 1838, A. H. M., 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1. 161 Despesa feita com os espias no ms de Maro de 1837, A. H. M., 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1. Ver digitalizao IV.1.5.1. em anexo B 162 Correspondncia de Nogueira para Remechido em 28 de Julho de 1838, A. H. M., 1 diviso, 21. seco, caixa 7, n1. Ver digitalizao IV.1.5.2. em anexo B 163 Correspondncia de Remechido para Nogueira em 21 de Maro de 1838, (Idem) 164 Correspondncia de Remechido para Nogueira em 9 de Junho de 1838, (Idem) 165 Ver foto IV.1.5.3.em anexo B
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A contra-informao sempre foi usada pela guerrilha, existem provas disso, a nvel da correspondncia, esta apresentava uma enorme falta de informao. Desde o local do quartel, patente, e nome dos subordinados de Remechido, exemplo, de Francisco Nogueira que em Fevereiro de 1838 era Capito e em Maro de 1838 era o tenente Joaquim Nogueira Camacho.
1.6. A Logstica
Para Remechido, a logstica, sempre apresentou uma enorme importncia, a preocupao de manter os seus homens est espelhado no contedo das correspondncias. Principalmente quando os liberais intensificam a presso militar no Algarve, aps chamada de ateno por parte da Cmara de Silves, a 21 de Janeiro de 1837, sobre o efectivo e operaes desencadeadas pela guerrilha 166. A guerrilha que sempre teve o apoio da populao rural, deixou de o ter, ento aumentaram as movimentaes para adquirir os materiais 167 e vveres, atravs dos saques s aldeias168 embora o elevado grau de perigosidade em serem capturados, e a aquisio de material de guerra, proveniente de Lisboa, dirigida para Nogueira e posteriormente repartida pelas foras de Remechido tambm se complicou. A alguns dias de Remechido dar inicio a um movimento ou operao, a troca de correspondncias entre si e os seus homens aumentava, para coordenar as operaes e para a aquisio de toda a logstica para suportar a dita operao, o exemplo da aquisio de pedreneiras, ferragens, po 169, plvora, e homens provenientes de outras zonas de empenhamento. S quando toda a logstica estava disponvel, que davam incio operao, deixando homens a cuidar de animais que possuam e a guardar todo o material no necessrio, estes, em buracos feitos pelos mesmos, e cobertos com vegetao. Estes quartis nas serranias onde s os guerrilhas conheciam o seu local, eram locais para se esconderem e para pernoitarem, existindo a algumas lguas de distncia das principais localidades. Mas tambm eram locais onde exerciam todos os tipos de trabalhos para o esforo de guerrilha, tal como ferrar
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Representao rainha da Cmara de Silves de 21 de Janeiro de 1837, A. H. M., Guerrilha do Remechido 1837, 1 Diviso, 21 seco, caixa 7, n 1. Ver digitalizao IV.1.6.1. em anexo B 167 Proclamao de Remechido ao juiz de S. Martinho a 27 de Dezembro de 1836, A. H. M., 1 Diviso, 21 seco, caixa 7, n 1. Ver digitalizao IV.1.6.2. em anexo B 168 Relao dos dinheiros tirados de indiferentes povos da serra e do Algarve pelo sargento Vintura, 4 de Julho de 1838, A. H. M., 1 Diviso, 21 seco, caixa 7, n 1. Ver digitalizao IV.1.6.3. em anexo B 169 Correspondncia de Remechido para Nogueira em 7 de Julho de 1838, A. H. M., 1 Diviso, 21 seco, caixa 7, n 1.
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cavalos, criar gado para se alimentarem e at existiam sepulturas 170. Onde carecia destes buracos, um pequeno nmero de guerrilheiros iam ao monte onde vivia uma pequena famlia, sendo os movimentos feitos maioritariamente no perodo nocturno, esta tambm a algumas lguas de distncia do local a ser atacado e pedir que lhes fornecessem alguns cobertores, pedindo tambm que os fossem deixar num determinado local e noutro dia os fossem buscar num outro local diferente171.
Captulo V 1. Resposta Liberal 1.1. Resposta liberal para o aniquilamento da guerrilha (1837-1838)
Uma resposta para o aniquilamento da guerrilha nem sempre foi eficaz, isto porque numa representao da Cmara de Silves rainha, est espelhado a preocupao de eliminar os actos de guerrilha. Em que at sugerido, a 21 de Janeiro de 1837, pela prpria Cmara vrias formas de extingui-la se tem aprontado de diferentes partes = queimar parte da serra, estabelecer colunas volantes, guarnecer os povos que habitam nas faldas, recolher os habitantes a povoaes para que os voluntrios ou constrangidos no forneam alimentos aos guerrilheiros, retirar gados, formar uma guerrilha constitucional para perseguio daquela 172. Com o pedido de ajuda tomado em ateno, mas estas propostas no sendo levadas a cabo, os liberais formaram uma cintura tctica, em semelhana com a executada numa povoao junto a Ayamonte, Espanha173, em que formaram uma linha constituda por seis destacamentos174, por espies paisana, tiraram gados, haveres, a guarda nacional passaram a revistar importantes pontos de passagem, o uso de passaporte175, e retiraram as armas pessoais das pessoas, tanto que era necessrio as pessoas mais necessitadas em defender-se aquando das suas deslocaes, solicitar uma licena de uso e porte de arma176.
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Entrevista ao senhor Constantino. Entrevista ao senhor Vtor Manuel Anastcio 172 Representao rainha da Cmara de Silves de 21 de Janeiro de 1837, A. H. M., Guerrilha do Remechido 1837, 1 diviso, 21 seco, caixa 7, n 1. 173 FERREIRA, Maria de Ftima S e Melo. (2002) Rebeldes e Insubmissos. Resistncias Populares ao Liberalismo (1834-1844), Porto, Edies Afrontamento. 174 Memorial das Operaes de Remechido, A. H. M., 1 diviso, 21 seco, caixa 7, n 1. 175 MACHADO-CARDOSO, Antnio; Antnio, Luc. (1981) A Guerrilha do Remexido. Lisboa. Publicaes Europa - Amrica. N 175. Pag 66 176 Requerimentos recebidos pelo Governo Civil de Faro 1837, A. D. F., M 2/Cx 414
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Os Liberais tambm tentaram minimizar os prejuzos causados aos agricultores mais abastados, tanto que criaram um Decreto de 31 de Agosto de 1833, que conferia as pessoas danosas uma indemnizao sobre as perdas e danos causados pelos guerrilheiros, para isso criaram peritos nas reas da agricultura, da construo (pedreiros) e da serralharia (carpinteiros)177. Mas com a chegada a 15 de Dezembro de 1837 do coronel Fontoura que os liberais conseguem derrotar a guerrilha de Remechido. De acordo com Machado e Monteiro, Fontoura pagou e vestiu as suas tropas, estabeleceu depsitos de vveres em diversos locais, construiu um hospital de campanha em Loul, mobilizou um grande nmero de homens da Guarda Nacional para o Algarve e Alentejo para o seu uso na defesa de pontos importantes, conferindo tropa de linha mobilidade para executarem batidas serra. Para alm de melhorar o uso da tropa, tambm, fortificou os muros das aldeias, retirou das serras ferreiros, ferradores obrigando-os a recolher-se s guarnies militares e aos habitantes dos montes, ao deslocarem-se para as vilas, trancando as suas habitaes e levando consigo todos os seus mantimentos e gados, inutilizou moinhos e azenhas, fez com que os procos convencessem os paroquianos a hostilizar os rebeldes, ordenou o fuzilamento de pessoas capturadas com armas na mo e por fim fez com que os correios e abastecimentos vindos de Lisboa para o Algarve mudassem de rota passando no pela serra algarvia mas sim pelo rio Guadiana. Esta tctica privou a guerrilha de abastecimentos, contacto com as populaes da serra, do uso da sua mobilidade dada pela cavalaria. Aumentaram assim as dificuldades dos pagamentos aos homens, aumentaram tambm as deseres e a insubordinao. Isto obrigou Remechido a adoptar mais uma vez a tctica de camuflagem e disperso da guerrilha, embora continuasse com a eliminao de espias e a tentativa de captura de correios, e por fim reduziu as despesas causadas pelas raes a oficiais, praas e escoltas. Tentando recorrer assim mais em frequncia aos lavradores das serras.
1. 2. A Captura de Remechido
Com a continuao das suas manobras de aumento de efectivos, Remechido foi, de acordo com o Oficio do Coronel Fontoura ao baro da Ponte de Santa Maria de 30 de Julho, localizado por espias. Foi ento atravs de uma operao de juno entre a 1 coluna coman-
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Auto de Instalao e Actas das Sesses da Comisso de Liquidao das perdas e Danos Causados pela Usurpao. A. D. F., Subseco B/B, srie 1, n 1.
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dada pelo major Vasconcelos em que esta tomou a direco Almodvar, Corte das Velhas, onde deveria aguardar pela 5 coluna, comandada pelo capito Cabral que partiria de S. Martinho das Amoreiras sob a mesma direco, estas iriam juntar-se s 3 e 6 colunas, comandadas por Capito Neutel e major Cardoso, ambas vindas de S. B. Messines, no stio de Monte Grou. Mas foi no dia 28 de Julho de 1838 pelas 18 horas que Remechido frente de 248 homens foi emboscado no stio da Portela da Corte das Velhas (29SNB5443) 178 pelas 1 e 5 colunas, no possuindo linha de fuga devido s 3 e 6 colunas, aguardou, atravs de fogo de supresso pela cada da noite, mas em vo. Foi ento conduzido a S. B. Messines e posteriormente a Faro onde num julgamento pressa, no edifcio da Misericrdia de Faro, e ordenado o seu fuzilamento a 2 de Julho de 1838, pelas 18 horas no Campo da Trindade onde actualmente fica situado o Jardim Joo de Deus e a escola Toms Cabreira.
Concluso
Sabe-se que Remechido estudou num seminrio com o objectivo de ser padre e como tal no possua conhecimentos militares. Porm o facto de andar de monte em monte, de casa em casa e por todos os caminhos existentes nas serras, tornou-o muito conhecedor do terreno existente. Para alm disso o seu esforo incessante para a melhoria da localidade de S. Bartolomeu de Messines fez com que captasse todo o apoio, estima e venerao dos seus habitantes. A nvel militar, Remechido actuava com diferente nmero de efectivos, consoante os momentos, isto , podia actuar com 45 ou com 350 homens. Actuava com uma fora forte em infantaria quando possua um maior efectivo de homens e/ou com cavalaria com nmeros reduzidos de efectivos para conferir uma maior mobilidade. Remechido sempre procurou actuar como fora convencional e nestas actuaes a tcnica e tctica utilizada era deveras diferente usada pelos liberais que ainda utilizavam as tcticas das guerras peninsulares. Remechido, pelo contrrio dividia a fora em trs, com uma parte a apoiar e duas a flanquear. Utilizava carabinas curtas para efectuar tiro a cavalo e no fazia uso de foras de artilharia. Como nem sempre possua dinheiro para pagar aos seus homens, estes eram motivados pelo saque s localidades, pois dividia os produtos do saque por eles. Sempre que possvel e necessrio utilizava mulheres munidas com burros para efectuarem o carregamento dos produtos roubados. Agricultores abastados pelos quais Remechido tinha confiana trocavam o
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dinheiro que vinha para a guerrilha por dinheiro mais pequeno ou em gneros para a subsistncia dos seus homens. Numa fase inicial fornecia tambm os mesmos gneros a habitantes pobres da serra, adquirindo assim sua confiana. Com a necessidade de conseguir actuar e manter zonas de empenhamento em todo o Algarve e sul do Alentejo forneceu relativas zonas de empenhamento aos seus homens, mas consoante a necessidade para os ataques fazia juno de foras. Estabelecendo assim uma troca de informaes constante entre si e os seus homens, mas ao qual, a correspondncia no apresentava informao perceptvel de entendimento a quem a adquirisse fora da guerrilha, apresentando s vezes contradies. Quando o cerco guerrilha estava mais apertado Remechido ordenava que os seus homens fossem para as suas terras e que passassem por meros agricultores, escondendo as armas em buracos feitos pela guerrilha em locais mais recnditos da serra. Estes locais eram denominados de quartel e, para alm de serem usados para esconder o armamento, eram tambm usados como esconderijo das foras para pernoitar. Era daqui que Remechido emanava as suas ordens e para alm disso tambm se efectuava a criao de animais para a alimentao da guerrilha, sua mobilidade e execuo de todos os tipos de trabalhos e ofcios. Os quartis estavam situados consoante a necessidade, tanto perto das localidades como longe, e tambm consoante a necessidade poderia estar empenhado algum a guarnecer ou no. A alimentao dos guerrilheiros para alm de advir do saque provinha tambm de agricultores que lhes forneciam alimentao atravs do pedido de Remechido aos mesmos. Estes deixavam os vveres em locais estabelecidos por Remechido e que mais tarde este ia buscar. As operaes desenvolvidas por Remechido estavam orientadas para a flagelao de tropas liberais, estacionadas nas localidades que estavam a guarnecer, bem como ou movimento, mas evitando o confronto directo com foras organizadas. Quando se davam encontros com este tipo de foras, Remechido ordenava a retirada e disperso, voltando a reunir a fora dispersa em determinado local que ele anteriormente definia. Os ataques eram previamente bem planeados, pois Remechido possua espies que o informavam acerca das posies e marchas dos liberais. Mas tambm possua uma enorme preocupao em eliminar espies liberais, que foram causa principal da sua captura. Como os espies de Remechido eram bastante importantes para a aquisio de informaes, a captura do correio que vinha de Lisboa para o Algarve foi preocupao incessante, pois assim adquiria ordens e informaes, e foi
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tambm com a mudana da rota do correio que se propiciou a sua captura no dia 28 de Julho de 1838 na Portela da Corte das Velhas. Remechido tentou sempre manter a ordem e a disciplina dos seus homens, para isso e sempre que necessrio ordenava castigos para aqueles que no cumpriam as suas ordens. Mas tambm tentava que o seu nome no tivesse um cariz de facnora. Para isso todos aqueles que fossem capturados e no fossem reconhecidos por terem executado crimes contra os seus homens, Remechido ordenava a sua libertao. Remechido evitava o confronto directo com foras organizadas, o que nem sempre era possvel, pois os combates travados foram bastantes e sempre com baixas para ambas as partes.
P. Anastcio
Manuel Pai:
Antnio Pai:
Elvira Me:
Isabel
S. Bartolomeu S. Bartolomeu S. Marcos da S. Bartolomeu de Messines de Messines Serra de Messines S. Bartolomeu S. Bartolomeu Corte Pereiro SantAnna de Messines de Messines S. Bartolomeu Passadeiras de Messines
Residncia
Data hora
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2006 20:10
2006 13:30
2006 18:20 -
S. Bartolomeu Bem Parece Corte Pereiro - SantAnna de Messines S. Bartolomeu S. Bartolomeu Passadeiras de Messines de Messines
Anexo B. Fotos
Foto I.1.1. Gomes Freire
Fonte: http://www.remexido.web.pt
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Foto III.1.3.1. Local do Vale da Mata onde foi desencadeada a emboscada por parte da guerrilha
Fonte: Foto tirada pelo autor Foto IV.1.1.1. Antiga casa de Remechido
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Fonte: Foto tirada pelo autor Foto IV.1.1.3. Gruta do Penedo Grande
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Foto IV.1.2.1. - Carta de Maral Jos Espada, Ajudante e secretrio interino, a Francisco Jos Nogueira a 23 de Junho de 1838
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Foto IV.1.2.3. - Correspondncia de Remechido para Francisco Jos Nogueira a 24 de Fevereiro de 1838
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Foto IV.1.2.5. Carta do Remechido a Jos Maria do Carvalhal, Tenente-Coronel de Infantaria 14, de 26 de Novembro de 1836
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Foto IV.1.6.3. Relao dos dinheiros tirados de indiferentes povos da serra e do Algarve pelo sargento Vintura, 4 de Julho de 1838
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Bibliografia
Fontes Manuscritas:
ARQUIVO DISTRITAL DE FARO: Requerimentos recebidos pelo Governo Civil de Faro 1837, M 2/Cx 414 Subseco B/B
Auto de Instalao e Actas das Sesses da Comisso de Liquidao das perdas e Danos Causados pela Usurpao, srie 1, n 1.
1 diviso, 21 seco:
Correspondncia Relativa s Operaes do Algarve, 1834, caixa 7, n 16. Relao da nomeao dos oficiais de Estado-Maior da Diviso do Exrcito do Sul em Novembro de 1836,caixa 7, n1. Carta do Remechido a Jos Maria do Carvalhal, Tenente-Coronel de Infantaria 14, de 26 de Novembro de 1836, caixa 7, n1. Carta de Maral Jos Espada, Ajudante e secretrio interino, a Francisco Jos Nogueira a 23 de Junho de 1838, caixa 7, n1. Correspondncia de Remechido para Francisco Jos Nogueira a 24 de Fevereiro de 1838, caixa 7, n1. Correspondncia do Tenente de Infantaria n 2 Camacho para Francisco Joaquim Nogueira a 10 de Maro de 1838, caixa 7, n1. Correspondncia de Antnio Venncio Ramos a Remechido no dia 13 de Junho de 1838, caixa 7, n1. Despesa feita com os espias no ms de Maro de 1837, caixa 7, n1. Correspondncia de Nogueira para Remechido em 28 de Julho de 1838, caixa 7, n1. Correspondncia de Remechido para Nogueira em 21 de Maro de 1838, caixa 7, n1. 131
Ofcio do coronel Fontoura ao baro da Ponte de Santa Maria de 30 de Julho de 1838, Documentos Relativos ao Aprisionamento do Chefe de Guerrilhas Jos Joaquim de Sousa Reis, caixa 7, n 1. Representao rainha da Cmara de Silves de 21 de Janeiro de 1837, caixa 7, n 1. Memorial das Operaes de Remechido, caixa 7, n 1. Correspondncia de Remechido para Nogueira em 7 de Julho de 1838, caixa 7, n 1. Proclamao de Remechido ao juiz de S. Martinho a 27 de Dezembro de 1836, caixa 7, n 1. Relao dos dinheiros tirados de indiferentes povos da serra e do Algarve pelo sargento Vintura, 4 de Julho de 1838, caixa 7, n 1. Correspondncia de Remechido para Jos Maria Pestanha a 26 de Agosto de 1836, caixa 7, n1. Correspondncia de Remechido para Nogueira em 21 de Maro de 1838, caixa 7, n 1. Correspondncia de Remechido para Nogueira em 9 de Junho de 1838, caixa 7, n1.
Livros
- Annimo. (1838). Biographya de Remechido o Clebre Guerrilheiro do Algarve. Tavira, Edio da Typographya de Tavira. 1892.
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- VARGUES-TORGAL, Isabel Nobre; Lus Reis. Oposies revoluo de 1820 no Trinio Liberal. In: MATTOSO, Jos. Dir. Histria de Portugal- O Liberalismo (1807-1890). Vol 5. Lisboa. 1993. Editorial estampa.
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Eventos Cientficos:
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- http://www.genealogia.netopia.ptpessoaspes_show.phpid=52250- (10Outubro06)
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- http://www.esa.ipb.pt/estudosrurais/Pdfs/Antonio_Cardoso.pdf (22Maio06)
Mapas:
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- Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. S. Bartolomeu de Messines (Silves), n587, 1979. (Escala 1:25 000)
- Portugal. Servio Geogrfico do Exrcito. Carta Militar de Portugal. Pereiras (Gare). Pereiras, n570, 1969. (Escala 1: 25 000)
Materiais multimdia
Arquivo Distrital de Faro. Inventrio de Registos Paroquiais em microfilme. Localizao: Concelho de Lagoa, Freguesia de Estombar, Baptismos. Cota ADF/SGU 0452 P.2.1.54.3
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Esta era a situao vigente aquando dos acontecimentos que iremos tratar. Torna-se necessrio lembrar, ainda, que no princpio do sculo XIX os espanhis e os franceses fizeram vrias tentativas para tomar conta destes nossos territrios. O Algarve sem qualquer ajuda e Portugal com a ajuda britnica conseguiram passar de invadidos a invasores e derrotar o inimigo, j em Frana, em 1814. Militarmente foi obra de que todos nos podemos e devemos orgulhar, mas cujas consequncias foram terrveis em termos econmicos, comerciais e financeiros. Portugal e o Algarve saram vitoriosos, mas de rastos, situao que estava longe de estar resolvida aquando da guerra civil. Os franceses, derrotados, deixaram-nos, no entanto, alguns dos novos conceitos sados da Revoluo Francesa que, seis anos passados, germinaram no Porto quando, em 1820, se imps a D. Joo VI, ainda no Brasil para onde se tinha retirado em 1807, uma Constituio que, em teoria, passava o poder das mos do rei para as do povo. D. Joo VI regressa Europa deixando o reino do Brasil, agora integrando de pleno direito o novo Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve, ali deixando seu filho D. Pedro como seu representante. Este D. Pedro, prncipe real do Reino Unido, em 1822, declara unilateralmente a separao do Brasil e coroa-se como imperador D. Pedro I, assumindo, assim, a nacionalidade brasileira (acrescenta aos nomes de vrios dos seus filhos um de Alcntara Brasileiro) e renunciando, portanto, nacionalidade portuguesa (ainda no estava em voga a dupla nacionalidade). D. Joo VI morre em 1826, vtima de envenenamento como hoje se sabe ser certo, e deixa um testamento recheado de incongruncias; nomeia como regente a sua filha D. Isabel Maria enquanto o legtimo herdeiro e sucessor da coroa no der as suas providncias a este respeito179 isto depois de, na carta patente de 13 de Maio de 1825, ter escrito que a sucesso das duas coroas imperial e real, pertencia ao prncipe D. Pedro. neste testamento que se baseiam os problemas que desembocam na guerra civil. que no compete aos reis designarem sucessores; so as leis da sucesso que, em cada pas, determinam as sucesses e elas podem ser diversas. Vo das chamadas leis slicas (que excluem as senhoras da sucesso) at s electivas (que designam a forma de eleger o novo monarca, como, p.ex., na Polnia ou, ainda hoje, nos Estados Papais). Em Portugal a Lei da Sucesso era, desde a Restaurao, muitssimo clara no havendo, por isso, qualquer necessidade de levantar uma tal questo em testamento.
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Os que consideravam que, de acordo com a Lei, s um portugus poderia ser rei de Portugal, viam como legtimo sucessor D. Miguel, o nico filho varo para alm do brasileiro D. Pedro e que, por isso, eram designados por legitimistas ou realistas. Os que consideravam que D. Joo VI indicara no testamento como rei D. Pedro, pela forma como ali se referira ao sucessor. A Regncia, presidida pela infanta D. Isabel Maria, declara D. Pedro como sucessor e rei de Portugal. A guerra civil inicia-se entre uns e outros estando em causa fundamentalmente a questo da legitimidade do sucessor. A grande maioria da Nao, aristocratas, eclesisticos e povo, adere aos legitimistas. Convm tambm ter uma ideia do clima poltico internacional. O entendimento entre as potncias europeias que resultara do Congresso de Viena estava ultrapassado. Para alm das desinteligncias entre a Inglaterra e as potncias continentais a propsito das questes ibricas, a sublevao grega tinha traado linhas de clivagem definitivas que levaram diviso de posies logo que se iniciou a guerra entre gregos e turcos. , pois, neste tabuleiro de interesses cruzados que se desenvolve a questo portuguesa de 1826180. Por todo o Pas se formavam mltiplas conspiraes; revolta se convidavam as tropas e as autoridades. A revolta do Algarve foi considerada como a mais perigosa e para l seguiu o general Saldanha com os 4.000 homens da guarnio de Lisboa no tendo sido necessrio actuar porque o conde de Alva, governador das armas do Algarve, conseguiu resolver a situao com os seus prprios meios tendo forado os revoltosos a procurar refgio em Espanha para onde passaram ento mais 1.000 homens e quatro peas de artilharia. Mas, desguarnecida Lisboa, ali rebentam violentas manifestaes absolutistas que sendo incontrolveis pela polcia obrigam o governo a solicitar apoio aos ingleses da esquadra do almirante Beauclerck surta no Tejo181. Embora o ambiente internacional fosse como nunca favorvel a D. Miguel, no houve nessa altura em Lisboa o discernimento suficiente para ver que tudo se jogava no tabuleiro externo e que Portugal no poderia (como nunca pde) contrariar a potncia martima. Os miguelistas conduziram-se em poltica externa de forma completamente inbil que lhes trouxe mais humilhaes e dificuldades que benefcios, ao contrrio dos liberais que, com Palmela e outros,
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conseguiram apoios internacionais, nomeadamente da Inglaterra, da Frana e da prpria Espanha182. nesta fase que D. Pedro quer conciliar o impossvel, propondo o casamento de sua filha D. Maria, ento com 8 anos, com seu irmo D. Miguel. Casamento que este, aconselhado por Metternich, aceita quando, estando no exlio, ainda no se apercebera de tudo quanto estava em jogo, mas que, apenas regressado de Viena em Fevereiro de 1828, e vendo a grande maioria consigo logo afasta a ideia de casar com a sobrinha e aceita a sua aclamao em Cortes convocadas moda antiga como rei absoluto, quebrando qualquer ligao Carta outorgada por D. Pedro ainda em 1826. Os liberais revoltam-se no Porto logo em Maio de 1828 mas, uma vez liquidada a revolta, D. Miguel domina sem contestao o territrio portugus, com excepo da Ilha Terceira, nos Aores, que se revoltara e obedecia a autoridades liberais 183. D. Pedro, apercebendo-se da oposio internacional, nomeadamente da Inglaterra, nova reunio das coroas brasileira e portuguesa aceita abdicar do Imprio a favor de seu filho D. Pedro e da coroa portuguesa a favor de sua filha D. Maria da Glria e na qualidade de duque de Bragana e regente em nome da filha que regressa Europa a fim de se bater com o irmo D. Miguel. Mesmo nesta ocasio, como se constata, D. Pedro deu prioridade ao Brasil, entregando-o ao filho varo e deixando Portugal entregue a uma filha que, mesmo sendo a mais velha, no deixa de ser, luz da mentalidade da poca, uma segunda escolha. Na sua mente estaria ainda a possibilidade de esta, casando com o tio, salvar a face ao seu ramo se as coisas corressem mal. A luta entre liberais e absolutistas no adquirira ainda perfeita nitidez. Como sabemos a histria escrita pelos vencedores que tendem a denegrir os vencidos para justificar a sua causa. Tambm na sequncia da vitria liberal estes trataram de endeusar D. Pedro e diabolizar D. Miguel. Ser real a inteligncia de D. Pedro e a estupidez de D. Miguel? A seriedade e capacidade de D. Pedro e a insensatez e incapacidade de D. Miguel? Penso que estes irmos no seriam to diferentes quanto a histria oficial os pinta, nem sequer em termos ideolgicos. Se D. Miguel era loucamente apaixonado por cavalos e touros D. Pedro no o era menos por mulheres; lembro que, tendo casado duas vezes, teve sete e um filhos legtimos, respectivamente, mas no deixou de, de vrias outras senhoras, fora dos casamen-
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tos, ter mais dez filhos ilegtimos conhecidos e assumidos como tal, alguns das mesmas idades e filhos de irms, como o caso da famosa marquesa de Santos e de uma sua irm 184. Penso que ter sido a enorme diferena numrica de apoiantes de um e de outro, a favor de D. Miguel, que levou D. Pedro a transformar uma questo inicialmente apenas dinstica numa questo ideolgica entre liberais e absolutistas. Esta alterao levou alguns dos apoiantes de D. Miguel, que lhe reconheciam a legitimidade sucessria a mudar de campo porque ideologicamente eram liberais. Podemos, portanto, concluir que as lutas que comearam com o aparecimento de duas faces polticas belicosas nos ltimos anos do reinado de D. Joo VI s acabaram em vora Monte a 26-V-1834; a disputa ideolgica que dividiu o Pas tem extenso muito diversa para cada um dos diferentes observadores porque ela no nada fcil de determinar 185. Ora, h que reconhecer que os ideais liberais eram mais acessveis e aceites pelos mais viajados e conhecedores do mundo, isto , pelos mais ilustrados, o que nos permite perceber a melhor qualidade dos liberais face fraqueza qualitativa dos absolutistas. Talvez possamos dizer, em linguagem corrente, que os liberais eram poucos mas bons. Para combater o exrcito de D. Miguel, com cerca de 80.000 homens e abundncia de meios, D. Pedro teve de recorrer, em Inglaterra e Frana, a mercenrios que pagava a peso de ouro e que, portanto, estavam longe de atingir um tal nmero, desembarcando no Mindelo com menos de 10.000 homens. Como cavaleiro que no deixei de ser e ex-comandante do Regimento de Lanceiros n 2, lembro, p.ex., que este Regimento tem a sua origem na contratao do Cor. Bacon do 17 de Lanceiros ingls e de muitos outros oficiais ingleses de lanceiros e de sargentos e praas contratados em Frana, maioritariamente, muito mal afamados. Ainda hoje, o Regimento portugus tem por divisa o Morte ou Glria, traduo perversa do Death or Glory do, tambm ainda hoje existente, 17 de Lanceiros. O MGen. Freire Nogueira na excelente obra que publicou sob o ttulo de As Guerras Liberais regista que o ano de 1828 no terminava da melhor forma para nenhum dos partidos. Os liberais derrotados no Porto, expulsos da Madeira, possuam uma rainha de 9 anos, um exrcito numericamente ridculo, faminto e ainda por cima internado em Inglaterra e, como nico ponto de apoio, uma minscula ilha perdida no oceano. 186. Por outro lado, pelo menos os mais lcidos dos miguelistas, no se iludiam: se era um facto a expulso do Conti184 185
ZUQUETE (1989), Vol. I, pp. 745-750. NOGUEIRA (2004), p. 186 Idem, pp. 208-209,
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nente e da Madeira do exrcito rebelde era certo tambm que a Europa lhes voltara as costas187. Admitia-se, em Lisboa, que a expedio liberal partiria dos Aores e iria directamente sobre a capital. Para fazer face a esta eventualidade D. Miguel disps o seu exrcito com 30.000 homens a ocupar praas e fortalezas e os restantes 50.000 distribudos por 5 Divises e 1 Coluna Mvel: a 1 Div., com 10.000 homens, ocupava Lisboa; a 2 Div., com 9.000 homens na costa entre Leiria e Caldas da Rainha; a 3 Div., com 8.000 homens, entre Torres Vedras e Sintra; a 4 Div., com 13.000 homens, entre a Figueira da Foz e Vila do Conde e a 5 Div., com 6.000 homens, na costa algarvia; a Coluna Mvel situava-se na rea de Lisboa. Dispunha ainda o exrcito de D. Miguel de 40 bocas-de-fogo e de 3.800 cavalos188. Tratava-se de um dispositivo indito para a nossa histria militar pois nunca, at ento, houvera necessidade de nos defendermos de uma invaso pelo mar, dispositivo esse que, no podendo constituir uma defesa capaz, garantia 600 Km de costa eficazmente vigiados 189. A deciso liberal de desembarcar a Norte do Porto, mais concretamente no Mindelo, apanhou os miguelistas completamente desprevenidos permitindo aos liberais a ocupao rpida do Porto. Passada a surpresa inicial, a chefia miguelista reagiu concentrando em Coimbra a 2 Div., que abandona a costa que vigiava marchando para Souto Redondo onde se juntou 4 Div., sem ter havido o cuidado prvio de nomear um comando que coordenasse as duas divises que, assim, se mantiveram independentes originando as habituais rivalidades entre os comandantes generais Santa Marta e Pvoas. Com estas foras e com as do visconde de Montalegre cerca-se a cidade obrigando os liberais a limitarem-se sua defesa, pois, por falta de foras, estavam impossibilitados de tentar aces ofensivas com probabilidades de xito. nesta situao que o recm-nomeado governador militar do Porto, Bernardo de S Nogueira, organiza defensivamente a cidade e a Serra do Pilar e ir depois, no Alto da Bandeira, fazendo jus sua fama, perder um brao e ganhar o direito concesso do ttulo de visconde de S da Bandeira190. Com a derrota de Souto Redondo, D. Pedro decide contratar o general Solignac, francs, que comandara uma diviso do exrcito de Massena e fora adjunto de Loison na invaso
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Idem, p. 209. Idem, p. 234. 189 Idem, p. 235. 190 Idem, p. 250.
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de Junot e que se supunha fosse competente e conhecedor de Portugal. Solignac chega ao Porto em Janeiro de 1833. Em Abril, D. Pedro despede o almirante Sartorius e, por conselho de Palmela, contrata para o substituir Napier sob o nome de Carlos de Ponza que j antes havia defendido uma expedio directa sobre Lisboa, mas que agora, mais prudentemente, aceitava uma aproximao indirecta, dirigindo o olhar para o Algarve, onde admitia que a populao estava pela rainha e tinha por certo um levantamento ps desembarque 191. Um primeiro vislumbre do tema que me foi proposto inicialmente vai surgir agora, uma vez que D. Pedro se decidiu por um desembarque no Algarve com 2.500 homens, cujo embarque se iniciou a 12 de Junho com partida da esquadra a 21. Terceira comandava as tropas, Palmela ia como governador civil dos territrios que se conquistassem e Napier comandava a esquadra constituda por 3 fragatas, 1 corveta, 1 brigue e 5 vapores. O desembarque deu-se a 24 a duas lguas de Tavira. Os miguelistas, mais uma vez, foram surpreendidos por uma aproximao indirecta e a desarticulao das suas foras no Sul ficou praticamente garantida. A 25 os liberais entram em Tavira retirando-se o visconde de Molelos para Faro e depois para S. Bartolomeu de Messines. Com o caminho aberto o duque da Terceira passou a Olho e a Faro, onde entrou a 27. Em Faro, Palmela estabeleceu um governo provisrio e mandou lavrar o auto de aclamao da rainha, enquanto Terceira perseguia Molelos que retirara para Messejana192. O governo de Lisboa decide mandar avanar a esquadra no Tejo para o Algarve e Napier sai de Lagos ao seu encontro, que se d a 3 de Julho por alturas do cabo de S. Vicente. o prprio Napier que descreve a cena referindo que o inimigo formava duas linhas indo na proa e a barlavento a nau D. Joo VI que levava iado o pavilho do chefe da esquadra As trs corvetas e dois brigues formavam a diviso de sotavento preenchendo os espaos que ficavam entre as outras embarcaes da sua esquadra a barlavento. O estado do mar e do vento no permitiu qualquer aco durante dois dias, s no dia 5 Napier, com 5 navios e 176 peas, enfrentou a enorme vantagem da artilharia do inimigo, batendo-o por partes, primeiramente contra quatro navios inimigos, depois abordando a nau Rainha e sucessivamente a D. Joo VI e a Princesa Real que, de imediato, arriaram o pavilho. S a fragata Martim de Freitas salvou a honra do convento miguelista dando duro combate o que valeu ao seu comandante, Pedro de Carvalho, a entrega por Napier quele do comando da nau Rainha que, como
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vimos, fora tomada em combate, tornando-o no primeiro portugus a comandar um navio da esquadra liberal. Da esquadra miguelista apenas escaparam 2 corvetas, que fugiram para Lisboa, e o brigue Tejo que foi aportar Madeira 193. Tambm estes marinheiros ingleses eram pagos por D. Pedro a peso de ouro: o valor dos navios capturados, avaliado em 130.000 libras, foi prometido s tripulaes, cabendo um oitavo (16.000 libras) a Napier, 2.000 libras a cada comandante e, por exemplo, 200 libras a cada marinheiro194. Aps esta vitria naval, Napier convenceu Terceira a deixar no Algarve uma guarnio mnima que garantisse a manuteno deste reino na obedincia rainha, partir para Lisboa com 1.600 homens e 16 cavalos, enquanto a esquadra de Napier subia a costa na mesma direco. Mais uma vez os miguelistas so surpreendidos. A 23, Terceira, no Vale da Piedade, defronta uma fora comandada por Teles Jordo constituda por 3.000 homens de infantaria e 3 esquadres de cavalaria, vencendo-a e perseguindo-a at Cacilhas, em cujo cais se iam amontoando soldados, bagagens, cavalos e artilharia, no meio de enorme confuso perecendo cerca de 1.000 homens, incluindo o prprio general Teles Jordo 195. Esta vitria liberal causou em Lisboa um tremendo temor, tendo o duque de Cadaval, aps reunio do Conselho Militar, decidido a imediata evacuao da cidade, concentrando as tropas no Campo Grande e em Loures, marchando para Norte na manh de 24 196. Com Lisboa na posse dos liberais estes tinham o Pas nas mos, era uma questo de tempo. As to desejadas adeses (na Repblica chamaram-lhes adesivos) comearam rapidamente a dar-se; em princpios de Setembro, as tropas liberais em Lisboa elevavam-se j a cerca de 38.000 homens, sendo 18.000 de primeira linha. A 26 de Maio do ano seguinte, depois de mais algumas batalhas perdidas, assinada a Conveno de vora Monte; D. Miguel obrigado a reconhecer a derrota e parte para o exlio. Penso que podemos agora, uma vez explicado o contexto geral da situao poltica e militar, dizer qualquer coisa mais concreta sobre o que se passou no reino dos Algarves neste perodo terrvel da histria ptria, para alm do que j atrs dissemos. Parece-me no merecer contestao o facto de que o que melhor poder caracterizar os acontecimentos que aqui ocorreram e que de certo modo os diferencia do sucedido em Portu-
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Vd. NAPIER (2005), pp. 93-107. NOGUEIRA (2004), p. 261. 195 Idem, p. 262. 196 Idem, ibidem.
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gal a existncia de uma aco de guerrilhas altamente eficiente e duradoira, sob o comando de quem passou histria como O Remexido. Sem querer ser maador com pormenores de somenos importncia, julgo dever esclarecer, no entanto, logo partida, que, ao contrrio do que hoje em dia est largamente estabelecido e como tal consta na maioria dos dicionrios lingusticos, a guerrilha no se caracteriza por quem a faz mas antes uma tctica de guerra utilizada para, com pequenas foras, contribuir para a finalidade da fora principal197. A guerrilha ser, pois, to mais eficaz quanto melhor for coordenada pela hierarquia militar porque s assim a sua aco concorrente com a daquela fora. Reside neste pormenor a diferena substancial entre o que se passou em Portugal e em Espanha no decorrer da Guerra Peninsular: ns tnhamos uma guerrilha institucionalizada, feita pelas Ordenanas, pelas Milcias e, at, pelas foras Regulares s ordens do Comando do Exrcito, enquanto em Espanha, at 1812, as guerrilhas eram realmente bandos de civis armados que a ningum obedeciam e que, por isso mesmo, em nada contribuam para os objectivos polticos e militares estabelecidos, cujos exrcitos prosseguiram de derrota em derrota, apesar das aces hericas que, sem dvida, as guerrilhas praticavam. Este esclarecimento , quanto a mim, fundamental para entendermos a aco do Remexido, aco que deve ser vista em trs tempos: o primeiro, enquanto o Algarve estava em poder dos miguelistas e sofre o desembarque do duque da Terceira; o segundo, quando o Algarve passa ao controlo dos liberais e o terceiro, aps a Conveno de vora Monte. Quem era, afinal, esse Remexido? De seu nome Jos Joaquim de Sousa Reis, nascido em Estombar em 1796, filho de humildes agricultores, sobrinho e afilhado do prior de Alcantarilha que ficou seu tutor quando cedo perdeu o pai e que o fez ingressar no Seminrio em Faro onde foi aluno aplicado e mesmo distinto. Tudo indicava que viria a ser um excelente sacerdote quando a viso de uma dama o fez mudar de ideias e deixar tal caminho para se casar. A noiva, de condio social acima da sua, dispunha de bens econmicos que o marido se encarregou de administrar com talento, obtendo rapidamente o reconhecimento geral de homem bom e respeitvel198. convidado a integrar, ao servio de D. Miguel, o Batalho de Voluntrios Realistas, primeiro em Faro e posteriormente em Silves. O visconde de Molelos, em 1832, general comandante das foras de D. Miguel no Algarve, com a sua nomeao para comandante dos
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Vd SOUSA PINTO (2009), pp. 369-385. Aurlio Nuno Cabrita, O Remexido Traos biogrficos de um homem coerente e fiel aos seus princpios, AAVV (2005), p. 29-50, que seguimos na sntese que seguidamente se apresenta.
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Teros de Ordenanas de Silves fora que dispunha de cerca de 350 espingardas inicia-o verdadeiramente na carreira militar. J vimos que, aps o desembarque, o duque da Terceira obrigou o general Molelos a retirar para o Alentejo, mas no tivemos oportunidade de referir ento que foi deixado o Remexido com as suas tropas como responsvel pela vigilncia dos liberais na fronteira entre as duas regies tendo ocupado, para o efeito, a zona de So Marcos da Serra e S. Bartolomeu de Messines, rea que lhe permitia, complementarmente, interceptar todas as comunicaes vindas do exterior e dirigida aos liberais. Quando o Duque avana para Lisboa, deixando no Algarve as principais localidades guarnecidas por pequenas unidades normalmente de voluntrios, os miguelistas tentam reocupar posies dividindo ento para o efeito a regio, ficando o Barlavento sob a alada do Remexido que comeou por atacar vitoriosamente S. Bartolomeu de Messines. Seguem-se Alcantarilha, Estombar, Mexilhoeira, Portimo, Ferragudo e Lagoa que, em poucos dias, so ocupadas. Aps dois dias de cerco caiu tambm Albufeira, sucedendo-lhe outras localidades. Somente escaparam Faro, Olho e Lagos. Em Setembro de 1833 a Cmara de Faro expe a D. Pedro o pnico vivido na regio e a impossibilidade de resistir por muito tempo em tal apuro aos guerrilhas devastadores e incendirios suplicando algum socorro de fora armada, o que s veio a ocorrer em Fevereiro de 1834 com a chegada de S da Bandeira, indiscutvel brilhante militar, mas que s mos do Remexido sofre pesada e humilhante derrota junto da Ermida de SantAna, prxima de S. Bartolomeu de Messines. O Remexido juntara-se ao brigadeiro Toms Cabreira e com uma fora de 5.000 infantes e 300 cavaleiros causam um tal nmero de baixas s 1.000 baionetas e 80 lanceiros de S da Bandeira que o foram a retirar deixando toda aquela serra pejada de cadveres. A assinatura da Conveno de vora Monte, em Maio, deveria ter posto cobro s hostilidades ao garantir direitos aos vencidos mas estes, sentindo-se perseguidos e espoliados pelos adversrios, vivendo em autentico clima de terror, so levados e entre eles o Remexido, que tentava reiniciar a interrompida vida de agricultor, a passar clandestinidade na qual viveu os quatro anos de vida que lhe restaram antes de ser preso e condenado morte fazendo a vida negra a tudo quanto lhe cheirasse a liberal. Em Novembro de 1836 D. Miguel no exlio, atendendo aos feitos por si praticados, nomeia-o governador do reino do Algarve e comandante em chefe interino de todas as tropas realistas, regulares e irregulares, do exrcito de operaes do Sul, atribuindo-lhe a comenda da Torre e Espada. 146
At sua priso e morte manteve-se sempre fiel aos seus compromissos e ideais e a sua mstica foi transmitida aos filhos que o renderam e continuaram activos e, depois destes, a outros miguelistas que a levaram at 1840.
Procurei apresentar-vos um texto que, podendo ser considerado polmico por no corresponder histria normalmente proclamada, mas que, sendo a minha viso e interpretao dos factos, me pareceu mais interessante para vos mostrar um ponto de vista relativamente aos acontecimentos diferente daquele que, certamente, era de vs j conhecido.
Como vos disse inicialmente no me cingi ao ttulo que me tinha sido proposto mas espero, sinceramente, que a alterao pela qual me responsabilizo no vos tenha defraudado nas vossas expectativas.
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Prtico A vastido do tema proposto O Liberalismo e a Igreja - e as mltiplas vertentes que envolve, exigiu uma escolha difcil: definir o mbito do tratamento, as fronteiras do assunto e da correspondente investigao. Perante as diversas opes, resolvi dar conta e apreciar aspectos menos abordados e ngulos menos iluminados pelo conhecimento histrico. Assim, circunscrevi a rea e o assunto: Os Bispos do Algarve durante as Guerras Liberais, 18201844. Avano com uma breve, limitada abordagem e apresentao do tema, reconhecendo as dimenses que ficam escondidas ou menos iluminadas.
O Algarve um reino aparte, o Reino do Algarve, como tal reconhecido a partir da Reconquista, que substitura o milenar eixo de referncia leste - oeste (Mediterrneo Atlntico) pela ligao norte-sul (Portugal-Algarve) e tornara esta regio um territrio perifrico de Portugal. Esta situao reflecte-se na vida da Igreja local do Algarve, a diocese, mormente quando vista atravs da histria dos seus bispos. Os bispos do Algarve, salvo honrosas e brilhantes excepes, esto de passagem, para outra diocese ou cargo palaciano, ou demasiado
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ausentes, sendo a diocese governada por procuradores, e prolongando-se os perodos de vacncia da s episcopal. O perodo considerado neste caso espelha de forma evidente esta constatao. Igualmente espelha as circunstncias, limitaes e vicissitudes a que estavam sujeitas as nomeaes episcopais. Entre o Vintismo e o fim do Setembrismo, de 1820 a 1842, a diocese do Algarve teve quatro bispos (D. Joaquim de Sant'Ana Carvalho, de 1820 a 1823; D. Frei Inocncio Antnio das Neves Portugal, em 1824; D. Bernardo Antnio de Figueiredo, de 1825 a 1838; e D. Antnio Bernardo da Fonseca Moniz, a partir de 1844 at 1854) sendo que dois foram forados ao afastamento/renncia, um no chegou a ser ordenado na ordem episcopal e apenas um teve um governo pastoral normal. Ao mesmo tempo as nomeaes reflectem as sucessivas alteraes polticas as quais orientaram as escolhas e a eleio, uma vez que a nomeao dos bispos seguia o procedimento tradicional: o soberano escolhe, elege, e o Papa, normalmente, ratifica a escolha, confirma-a e, apenas ento tem lugar a ordenao episcopal.
1. D. Joaquim de Sant'Ana Carvalho 1820 1823 A Revoluo Liberal, iniciada pelo pronunciamento militar do Porto e consolidada pela constituio da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino e da Junta Provisional Preparatria das Cortes a 27 Setembro de 1820, encontra o Bispado do Algarve sem Bispo residente. D. Joaquim de SantAna Carvalho s entrar na diocese a 8 Abril de 1821. Eleito por D. Joo VI em 1818, confirmado pelo Papa Pio VII em Janeiro de 1819 e sagrado a 16 de Abril de 1820, D. Joaquim constitura um Governador da Diocese, o Chantre Joo Jos de Matos, com poderes diminutos enquanto no entrava no Algarve. D. Joaquim de SantAna Carvalho era ao tempo da eleio para a diocese Censor do Santo Ofcio. Este cargo fazia-o conhecedor das vicissitudes que o liberalismo emergente na Europa de ento trazia vida da Igreja e s monarquias absolutistas suas contemporneas. A Revoluo Francesa, o Imprio de Napoleo, as ameaas internas nos Estados Pontifcios no lhe seriam estranhas, como no o seriam as tentativas para repor o Antigo Regime e, no que respeita relao entre a Igreja e o Estado, o regalismo nas suas diversas modalidades. Acrescente-se que as Cortes, em 1822, tinham suspendido a censura prvia para a imprensa, extinto o Tribunal do Santo Ofcio e decretado a reduo das casas conventuais e a proibio da admisso de novios, a ele que fora membro da estrutura da Inquisio e da Ordem de S. Paulo, Eremita, pelo que estas e outras posies dos liberais, sobretudo os radicais, no deixariam 150
de lhe ser indiferentes. Todas estas notas deixam antever as atitudes que vai tomar face ao Liberalismo emergente na vida e na sociedade portuguesa e devem ser tomadas em linha de conta no apuramento de razes e causas para as mesmas.
Os acontecimentos que se do no pas nestes primeiros tempos da Revoluo Liberal so conhecidos e impem mudanas decisivas no Algarve, na vida social e politica como na vida religiosa, estando o bispo ausente. Assim, acontece com a eleio e reunio das Cortes Gerais Extraordinrias e Constituintes da Nao Portuguesa, aprovao das bases da Constituio ou o juramento das mesmas. O prelado, mesmo fora da diocese, acompanha as mudanas e cumpre as determinaes das Cortes: jura, ainda que o faa por procurao ao governador diocesano a quem incumbe de mandar fazer o juramento ao clero e ao cumprimento da obrigatoriedade da celebrao de um Te Deum. A adeso de D. Joaquim de SantAna Carvalho ao iderio liberal resulta da obrigao imposta pelo novo poder e no, necessariamente, de convico pessoal ou de evidncia das mudanas impostas pelos novos tempos. De facto, mais de uma vez, procurou adiar o cumprimento das determinaes e, no podendo resistir, f-lo por interposta pessoa. Concretizando: o juramento das bases da Constituio; a publicao de Pastorais em que ficasse expresso o apoio nova situao e o juramento da prpria Constituio. Em Julho de 1821 procurou, alegando falta de sade, adiar a redaco e publicao de uma Pastoral, em conformidade com Portaria do Governo, na qual fizesse a exaltao das vantagens e benefcios do governo representativo e exortasse obedincia que lhe deveriam mostrar os povos. Acabou por no conseguir opor resistncia e mandou que o Provisor publicasse a Pastoral exigida, porm em termos que no agradou e que apenas acentuam os traos de opositor ao novo sistema. Num breve parntesis, anoto a continuidade da viso e considerao da religio entre o antigo e o novo regime: a religio catlica e os seus ministros exercem uma funo cvica de morigerao, educao e orientao dos fiis. Aps a promulgao da Constituio, em 1822, e do subsequente juramento (obrigatrio), o Bispo igualmente procurou jurar mediante procurador por estar fora de Faro, mas melhor advertido veio cidade episcopal para o fazer pessoalmente. Quando da revolta conservadora do conde de Amarante, de orientao absolutista, em Fevereiro de 1823, mandou, logo em Maro, enviar uma carta aos procos em que ordenava que explicassem aos fiis as vantagens do sistema constitucional e os prevenissem contra os inimigos. Este facto revela alguma alterao no seu modo de olhar para os novos tempos, mas 151
no o suficiente para afastar suspeitas acerca do posicionamento poltico do prelado face ao regime constitucional. Alis, as diversas atitudes e as contradies que manifestou face ao novo regime motivaram a desconfiana das autoridades e levaram o governo a ordenar a sua deportao para o convento do Varatojo em Abril de 1823. A dissoluo das Cortes e a abolio da Constituio com a Vila Francada (Maio de 1823) ps fim deportao de D. Joaquim. Em Lisboa, determinou que fossem suspensos de pregar diversos sacerdotes que tinham falado a favor do constitucionalismo e fossem investigados os clrigos que tinham alistado na guarda cvica. A deportao, por ordem do Intendente Geral da Polcia, de alguns sacerdotes algarvios para conventos foi considerada da responsabilidade do bispo, como tambm a fama de ter solicitado ao Rei amplos poderes para cast igar, no regresso ao Algarve, os que tinham desrespeitado as leis da Igreja. O caso evidencia apego a modelos e prticas anteriores, prprias do Antigo Regime e do exerccio de cargo de Qualificador do Santo Ofcio. Ao pedido, D. Joo VI d resposta negativa. Parece que esta recusa teria estado na origem da sua renncia ao Bispado, o que aconteceu. Em Fevereiro de 1824, j na hora da despedida, publicou uma pastoral na qual refere os sofrimentos por que passara, os erros que cometera e dos quais pedia a caridade do perdo, tecia elogios ao sucessor e pedia as bnos do Cu para o clero e fieis algarvios.
2. D. Frei Inocncio Antnio das Neves Portugal 1824 Aceite a renncia de D. Joaquim, foi nomeado para lhe suceder o Confessor da princesa D. Maria Francisca Benedita D. Frei Inocncio Antnio das Neves Portugal, da Ordem dos Carmelitas, que com dificuldade aceitou a eleio mas, resignado, solicitou ao Papa a confirmao que foi concedida por Leo XII a 25 de Dezembro de 1823. Tomou posse da diocese por procurao e determinou que continuasse a ser governada nos mesmos termos providenciados pelo seu antecessor aquando da renncia. Antes de ter sido sagrado bispo faleceu em Queluz, a 30 de Maro de 1824.
3. D. Bernardo Antnio de Figueiredo 1825 1838 Ao mesmo tempo verificavam-se mudanas na orientao poltica. Depois de um tempo de predominncia absolutista, na sequncia da Vila Francada, do-se mudanas de sentido liberal aps o desfecho da Abrilada (30 de Abril de 1824) que culmina com o exlio de D. 152
Miguel e a reposio de um governo de pendor constitucional moderado. neste contexto que nomeado novo bispo para a diocese e nele se inscreve o perfil do escolhido por D. Joo VI. Entre 1825 e 1838, a S episcopal do Algarve foi ocupada por D. Bernardo Antnio de Figueiredo. Eleito por D. Joo VI em Outubro de 1824, foi confirmado pelo Papa a 21 de Dezembro do mesmo ano, tomou posse da diocese por procurao e, depois de sagrado bispo entrou solenemente em Faro a 24 de Julho do ano seguinte. Trazia consigo a experincia de governo de uma diocese fora at ento Provisor e Governador da diocese da Guarda e de participao activa na vida poltica liberal como deputado, pela Beira, s Cortes Constituintes. Desde a sua chegada a Faro e incio do governo pessoal, o novo Bispo manifesta na sua actuao quer a capacidade de ordenar e disciplinar as questes eclesisticas e pastorais quer a promoo do liberalismo, visa a sua adeso a este iderio. Em referncia ao primeiro aspecto menciono a Pastoral sobre o ensino da doutrina crist de 18 de Janeiro de 1826 ou a reforma do Seminrio repondo orientaes de D. Francisco Gomes; em referncia ao segundo o rpido cumprimento de avisos do Governo, nomeadamente o que impe normas acerca do casamento de menores. A implantao do regime liberal traz consigo crises sucessivas, avanos e recuos, que se manifestam nos conflitos com os mentores da continuidade absolutista. Os golpes e contragolpes protagonizados por membros da Famlia Real expressam estas lutas que a doena de D. Joo VI agudiza. A morte do Rei, a 10 de Maro de 1826 abre uma crise sucessria, resolvida com o pacto entre D. Pedro, Imperador do Brasil e reconhecido Rei de Portugal, e seu irmo D. Miguel. Este regressaria do exlio, juraria a Carta Constitucional entretanto outorgada, casaria com herdeira de D. Pedro, D. Maria II, e formaria governo de regncia dada a menoridade da soberana. Os primeiros tempos do episcopado de D. Bernardo situam-se neste ambiente difcil, contraditrio e marcadamente conflituoso. O Bispo coloca-se abertamente no campo constitucional, aderindo e promovendo a Carta e as resolues/orientaes de D. Pedro. Assim, ao ter conhecimento da outorga da nova constituio logo, a 19 de Julho de 1826, envia aos procos uma circular mandando que publiquem a proclamao da Regncia do Reino de doze do mesmo ms (Julho) sobre a Carta Constitucional outorgada a estes reinos pelo seu legtimo Monarca o Senhor D. Pedro IV, reconhecendo nela uma ddiva prpria de um Rei magnnimo; e parte do principio da fidelidade e obedincia devida ao Soberano, para persuadir a sua aceitao, e fugir das sugestes sinistras dos inimigos do pas, estabelecendo argumentos e
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mximas que bem manifestam quanto estava convencido dos princpios constitucionais, e ideias liberais e ss (SL, 498-499). Nomeado Par do Reino, de acordo com as novas normas constitucionais, D. Bernardo tomou assento na respectiva Cmara, voltando ao debate parlamentar. A Regente, a princesa D. Isabel Maria, ao fazer uma recomposio governamental, de sentido constitucional, nomeou-o ministro dos Negcios Eclesisticos e da Justia, cargo que exerceu, brevemente, entre 8 de Junho e 14 de Agosto de 1827. O acordo familiar em ordem sucesso de D. Joo VII entre D. Pedro e D. Miguel comea a concretizar-se, embora em sentido oposto ao acordado: D. Miguel aceita ficar noivo da sobrinha, D. Maria da Glria, filha de D. Pedro e de menoridade, sendo nomeado Regente no quadro constitucional da Carta que jurara em Viena, onde estava exilado. A 22 de Fevereiro de 1828 chega a Lisboa, repete o juramento, recebe a regncia e nomeia novo governo. Cedo se definem as intenes do infante. Convoca a reunio dos Trs Estados do Reino, e, a 23 de Junho, proclamado Rei pelas Cortes Gerais do Reino, que anulam a vigncia da Carta Constitucional e repem as Leis tradicionais. Neste intervalo, o Bispo do Algarve, ainda convencido da recta inteno de D. Miguel ao jurar a ordem constitucional, escreve em Lisboa, uma Pastoral na qual considera a nomeao do Regente como um rasgo da Providncia que vela especialmente sobre Portugal, e como um recurso aos nossos males nas arriscadas e laboriosas circunstncias em que nos haviam precipitado as dissenes e tormentas polticas. Faz o Prelado muitos elogios s qualidades de D. Miguel, e convida os diocesanos a implorarem as graas do Cu necessrias para o seu escolhido, um corao benigno, humano e compassivo para os seus povos, e recomenda a obedincia aos seus mandados, e que no tomem parte no que s da competncia dos magistrados e tribunais, tendo caridade contra os que arvoram o estandarte da rebelio e da discrdia; no se confundindo o patriotismo com os projectos de ambio, e de interesse pessoal, e menos com o crime e com a revolta. (SL, p 500) Na letra da Pastoral como no seu esprito fica patente a forma como se entende, no contexto regalista a que o liberalismo cartista no ser alheio, o papel da religio e dos ministros. No regresso ao Algarve deveria ter dado conta dos ventos que sopravam, fortes, em sentido contrrio ao acordado entre os dois irmos. Em Faro, o bispo viu-se confrontado com uma realidade que se distancia daquela que parece desejar na comunicao que fez aos diocesanos. No ambiente torna-se visvel o objectivo politica de D. Miguel e dos seus sequazes e 154
palpvel o medo como meio de concretizao do mesmo. Nas alteraes que fizera ao governo vigente sua chegada a Portugal, inclura os responsveis pelo governo militar com recurso a partidrios ou simpatizantes do absolutismo. No governo militar do Algarve colocara o general Palmeirim, certamente na certeza de que prosseguiria os objectivos de retorno ao modelo de governo absolutista. As circunstncias novas e a presso quer das autoridades militares quer do povo, levaram o Bispo a consentir, com a oposio possvel, a que, em Faro, o reconhecimento e aclamao de D. Miguel como rei absoluto se fizesse no seu Pao. O Bispo ofereceu alguma resistncia s exigncias do general, mas acabou por consentir que ali se reunissem os notveis de Faro. A 29 de Abril de 1828, reuniu-se na Sala do Trono esta assembleia enquanto no Largo da S se juntava muito povo, partidrio de D. Miguel. Perante a ameaa vinda do exterior e a orientao de parte dos convocados lavrado assinado o Auto de aclamao. A partir deste primeiro passo, que manifestamente forado a dar, D. Bernardo acaba por, em todos os actos pblicos, se manifestar seguidor do rei absoluto. Mesmo ao tratar e apresentar matrias de doutrina ou costumes sempre aludiu aos direitos de D. Miguel, ameaado pelo Corregedor de Faro, que se gabava publicamente da ascendncia que sobre ele tinha, ou da eficcia dos temores que suscitava. Publicou, conforme exigncia do governo miguelista, uma Pastoral em que qualificava de mpios os actos do imperador D. Pedro como regente em nome de D. Maria II. Apesar das manifestaes favorveis ao miguelismo, e da resposta que deu s exigncias, o governo no confiava na sinceridade das posies. Quando, a 3 de Maio de 1828, D. Miguel chamou a Cortes, na forma tradicional, os Trs Estados do Reino, nas quais deveria ter assento, D. Bernardo foi preterido a favor do bispo resignatrio, seu antecessor, D. Joaquim de SantAna Carvalho, cujo passado era mais consentneo com o absolutismo restaurado. Este acontecimento, aliado a outros nomeadamente as alteraes de cariz miguelista e os levantamentos militares de tropas constitucionais contra Faro (avano do Batalho de Infantaria n 2 e do Regimento de Milcias de Lagos), que provocaram a fria popular na cidade e foram ocasio de insultos ao bispo, por desconfianas de constitucionalismo. Tudo isto avolumou os receios de D. Bernardo e justificam os seus posicionamentos, sem contudo os legitimar. Os acontecimentos decorrentes do desembarque das tropas liberais no Mindelo, em Julho de 1832, o cerco do Porto e os sucessos militares de D. Pedro IV acabaram por revelar o lado para que pendia a balana da vitria militar e poltica. O desembarque das tropas do 155
Duque da Terceira na Alagoa, a 24 de Junho de 1833, a ocupao de Tavira, e a derrota da armada miguelista na batalha do Cabo S. Vicente, colocam o Algarve no centro das lutas e movimentaes militares da guerra e apontam de modo decisivo para o desenrolar dos acontecimentos. A presena vitoriosa das tropas liberais no Algarve, fazem ver a D. Bernardo a extenso das mudanas e, provavelmente, deram-lhe a medida das posies que tomara. De novo receoso sai de Faro para o pao de S. Brs de Alportel com inteno de se retirar para Lisboa, mas sem meios para o fazer. Contudo, parece no ter sido inteno do novo poder afastar o Bispo. Palmela, que acompanhava as tropas desembarcadas e vinha munido de amplos poderes, convidou o Bispo a regressar a Faro, no que foi acompanhado pela insistncia do Provisor e do Vigrio Geral. Como a resoluo de D. Bernardo foi diferente, procurou seguir para Lisboa, aonde vai chegar, doente e maltratado, j depois da proclamao do governo de D. Maria II (as tropas liberais entraram na cidade a 24 de Julho de 1833). As autoridades confinaramlhe residncia no convento de S. Domingos, mas logo lhe deram liberdade para residir onde quisesse. Retirou-se para uma quinta no Sobral de Monte Agrao. Ali faleceu a 8 de Abril de 1838. Logo que desembarcou em Portugal, D. Pedro e o seu governo comeam a legislar um conjunto de medidas que visam desmantelar o sistema antigo e a implantar o novo. A 30 de Julho de 1832, escassos 22 dias aps o desembarque, publicado o decreto da abolio dos dzimos. Os dzimos eram impostos que se destinavam sustentao do clero e do culto. A sua extino imps severas restries aos rendimentos eclesisticos e, concomitantemente significou a quebra dos privilgios. Em contrapartida o Estado garantia a mesma subsistncia atravs de subvenes, que significavam a funcionalizao do clero, mas que as dificuldades de tesouraria no permitiam satisfazer. A Diocese, o Bispo, o Cabido e demais instituies da Igreja tinham rendimentos prprios provenientes de propriedades rurais, de juros e foros e dos dzimos. Os procos incluam-se nesta grupo, muito embora os das paroquias rurais se mantivessem com os prmios dos paroquianos, que consistiam na prestao de certos produtos da terra, paga no tempo da colheita e recebida no lagar ou na eira. Esta modalidade de cngrua manteve-se para l da extino dos dzimos e demais prestaes de carcter feudal. Em 1834 um conjunto de medidas causou feridas profundas na vida da Igreja em Portugal e tambm no Algarve, diocese que na prtica no tinha bispo. So extintos os conventos e mosteiros das ordens masculinas, expulsos os frades e monges, e os bens nacionalizados e posteriormente vendidos em hasta pblica. As Igrejas e alfaias litrgicas entregues s dioce156
ses, mas muita da prataria confiscada para entrar no errio pblico para, derretida, ser sustento da moeda. As livrarias dispersas e algumas destrudas. O Seminrio de Faro foi encerrado aos seminaristas e o governo ordenou que nele se aquartelassem tropas.
4. D. Antnio Bernardo da Fonseca Moniz 1844 - 1854 A morte de D. Bernardo Antnio de Figueiredo motiva a imediata vacatura da diocese. Alis, esta situao no trazia nada de novo ao governo da mesma, de facto a ausncia prolongada de D. Bernardo e as suas circunstncias deixaram o Algarve numa situao paralela vacatura. Uma diferena fundamental: de direito estava aberto o caminho da eleio, muito embora Portugal estivesse em situao delicada face Santa S a qual poderia ser classificada de cismtica. Considerada a situao de vacatura, cabe, segundo a forma habitual, ao soberano eleger o novo bispo. D. Maria II no exerccio da prerrogativa tradicional vai nomear, a 5 de Janeiro de 1840, D. Antnio Bernardo da Fonseca Moniz para o bispado do Algarve. formao eclesistica o bispo eleito alia os estudos de Direito que, conjuntamente, abrem portas a uma carreira eclesistica e poltica. Sendo arcebispo de Braga D. Miguel da Madre de Deus, entre 1819 e 1827 exerceu no arcebispado diversos cargos, nomeadamente Procurador-geral da Mitra, Desembargador da Relao Metropolitana, Promotor Apostlico, Examinador Sinodal, e mesmo Vigrio Geral. As convulses da guerra encontram-o Abade de Beiriz. Eram conhecidas as suas posies a favor da Carta e do liberalismo, pelo que o avano dos miguelistas no Norte levaram-no a retirar-se para Beiriz por receio de perseguio. No mesmo ms em que assinada a Conveno de vora-Monte (23 de Maio de 1834), D. Pedro, Regente em nome da Rainha, nomeia-o governador do bispado de Coimbra e, seguidamente, Tesoureiro Mor da S de Lisboa e Cnego da mesma. Em 1836 foi nomeado Governador do arcebispado de Braga. Neste intervalo de tempo fora eleito deputado pelo Minho s Cortes de 1834 e 1836 e Senador pelo crculo de Viana em 1840. Mesmo em traos largos, o currculo do bispo eleito evidencia as referncias subjacentes eleio. D. Antnio no apenas defende as novas ideias polticas como as prticas, exercendo cargos de influncia e participando nas lutas eleitorais quer em contexto cartista quer setembrista. A escolha rgia orientava-se pelos princpios da sujeio dos bispos ao interesse do equilbrio poltico determinante no tempo, continuando a reflectir a doutrina regalista. Contudo, a eleio de D. Antnio da Fonseca Moniz acontece em plena situao de cisma, devido ao corte de relaes diplomticas entre a Corte de Lisboa e a Santa S, que reflecte a 157
luta entre ambas as faces em conflito. Em algumas dioceses criaram-se situaes de cisma: o Estado liberal no aceitava os bispos eleitos por D. Miguel, mesmo que confirmados por Roma, e Roma no confirmava os prelados eleitos aps a vitria liberal. Esta situao no atingira o Algarve no perodo das guerras liberais, mas agora fazia sentir os seus efeitos. Com muita dificuldade e dilatando o tempo das negociaes a Santa S acabou por confirmar os bispos nomeados pelo governo miguelista, pressionada sobretudo pelas vacaturas prolongadas de algumas dioceses do Padroado do Oriente. A guerra civil e a vitria liberal levou D. Pedro a recusar a continuidade dos bispos de escolha miguelista, imponha a sua substituio e, consequentemente, proponha novos titulares. No perodo que decorre entre 1832 e 1842 e na situao referida, a Santa S no confirmava as nomeaes episcopais feitas pelos governos de D. Pedro e de D. Maria II, enquanto no fosse solucionada a questo que exigia demorada negociao. A entrega da Rosa de Ouro a D. Maria II, a 24 de Abril de 1842, que o Papa Gregrio XVI concedera e enviara rainha assinala, simbolicamente, o fim da separao. O bispo eleito toma as providncias necessrias ao governo da diocese, nomeando o Vigrio Geral. Pouco tempo esteve em Faro, pois no incio de 1841, em Fevereiro, regressou a Lisboa para assumir cargo nas Cortes. At normalizao das relaes diplomticas o eleito esperou a confirmao papal, o que veio a acontecer a 22 de Janeiro de 1844. Recebida a bula, foi sagrado a 16 de Junho seguinte, tendo entrado em Faro no primeiro de Setembro do mesmo ano. O governo e o cuidado pastoral da diocese do Algarve entraria em situao de maior normalidade no fora a debilidade da sade do novo bispo, a qual lhe impediu de fazer a visita cannica, percorrendo o territrio e conhecendo os seus fiis, bem como participar nas sesses da Cmara dos Pares (1845 e 1846) em que tinha assento. Tambm na aco de D. Antnio Bernardo da Fonseca Moniz como na sua nomeao se manifestam as dificuldades e ausncias dos seus antecessores.
Fim de percurso Estes traos largos e breves, este caminho percorrido de pouco mais de duas dcadas, mostram quer a presena/ausncia de um bispo, quer as dificuldades/contradies da aco inerente ao pastor. A diocese do Algarve atravessou o mar tormentoso do incio do Liberalismo sem contar com competente timoneiro, que ao menos pudesse orientar na travessia, amparasse os necessitados enfim exercesse o cuidado prprio do ministrio episcopal. As mudanas impostas pela nova ordem incluram muitas que afectavam profundamente a Igreja e os fiis cristos, criaram perseguio e revolta, geraram injustia e desrespei158
to. Face a tudo isto faltou o acompanhamento e a palavra do bispo. Indico algumas das mais significativas, a merecerem seguramente uma outra hora de investigao e estudo, um outro percurso pela Histria da Igreja do Algarve: . Proibio da entrada de novias para os mosteiros e conventos; . Alterao do modelo de sustentao do clero e financiamento da aco pastoral, social e cultural da Igreja; . Extino das ordens religiosas masculinas e nacionalizao dos seus bens e posterior venda; . Encerramento do Seminrio diocesano e suspenso da formao dos candidatos ao clero algarvio; . Revoltas populares, nomeadamente a guerrilha do Remexido, que contou com o apoio de algum clero.
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BIBLIOGRAFIA
SL Silva Lopes, Memorias para a Histria Ecclesiastica do Bispado do Algarve, Typographia da Academia Real das Sciencias, Lisboa, 1848
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Casado, vivendo desafogadamente dos seus rendimentos agrcolas, foi nomeado Alferes de uma Companhia de ordenanas, que eram tropas de 3. linha. Entretanto, de Alferes, subiu ao posto de Capito dessas mesmas ordenanas. Em 1833, o Remexido era Capito. Ora nesse ano, os Liberais vieram da cidade do Porto, numa Armada, tendo desembarcado numa praia do sotavento algarvio perto da actual Manta Rota. Nessa ocasio, encontrava-se o Regimento de Infantaria de Tavira, que era tropa de 1. linha, colaborando no cerco Tropa liberal, que ocupava a cidade do Porto. Ora, por esse motivo, o Algarve encontrava-se desguarnecido de militares na sua parte leste, e por conseguinte, no foi oposta resistncia ao desembarque na Manta Rota, salvo uma pequena resistncia na Ribeira da Almargem, imediatamente vencida pelo inimigo. Ora, o referido desembarque, ocorreu no dia 24-06-1833, sendo que no dia seguinte, j a cidade de Tavira se encontrava na posse dos invasores, uma vez que a populao tavirense j havia abandonado a cidade, por ter fugido na sua quase totalidade com a aproximao da Tropa liberal. Simultaneamente, o General Molelos, Governador das Armas do Algarve, fugiu de Tavira sede de seu Governo -, colocando-se a caminho de Beja. No entanto, aquando da sua retirada, ainda teve ocasio de nomear dois Comandos no Algarve, para se oporem ao invasor: Um dos Comandos nomeados, era o Capito Remexido, na zona oeste; e o outro Comando era o Major Camacho, na zona leste, cabendo a este, inclusivamente, a Vila de Loul. Ora, do territrio atribudo ao Remexido, pertencia a vila de Albufeira, a qual foi atacada pela tropa do dito Remexido, antes de terminar o ms de Julho do ano de 1833, que venceu a batalha, mas no sem que antes, os seus soldados cometessem na vila, vrias atrocidades, as quais o Remexido no conseguiu evitar. Ora, em Loul, territrio atribudo ao Major Camacho, aconteceu outro tanto com a tropa do Major Camacho, por esses mesmos dias. Simultaneamente, a cidade de Tavira viria a cair nas mos do Major Camacho. No entanto, em Fevereiro de 1834, chegaria ao Algarve uma Fora comandada por S da Bandeira, com o objectivo de reforar Faro e Olho, povoaes nas quais Camacho no conseguira penetrar. Fora essa que se expande a toda a provncia. Dois meses depois, D. Miguel enviaria o Coronel Toms Cabreira, Comandante do Regimento de Infantaria de Tavira, reforado, atacar S da Bandeira. O confronto, viria a ocorrer perto de S. Bartolomeu de Messines, saindo da Batalha S da Bandeira derrotado. Nos dias seguintes, Toms Cabreira procurou tomar Faro e Olho, mas sem qualquer xito. Neste 162
acontecimento, intervieram as tropas espanholas, na luta entre D. Miguel e D. Pedro IV. Tal, feito atravs do abrigo da qudrupla aliana, formada entre a Gr-Bretanha, a Frana, a Blgica e Espanha. Ora, a D. Miguel j severamente derrotado no centro e no Norte do pas, no resta outra soluo seno retirar-se para voramonte, e a assinar uma conveno humilhante, dando por finda a luta, e retirar-se para Itlia com a promessa de ficar mudo e quieto. Assim, viria a acabar a Guerra Civil em Portugal. Porm, no se sabe o motivo, pois a lei no o indica, em 19 de Dezembro de 1834, viria o Governo Portugus Liberal -, publicar uma lei, na qual, se estabelece que todas as pessoas que se levantarem ou tomarem armas a favor do ex-rei D. Miguel, se for em provncia ou em distrito, que esteja declarado em insurreio, o Comandante militar, que dela logo convocar e presidir a um Conselho, composto de quatro vogais militares, por ele nomeados, Conselho que, ouvidos os presos os condenar a serem fuzilados, e que, para a execuo da sentena, ficavam assinadas apenas vinte e quatro horas, de tudo se lavrando auto, sendo que, me baseio no anterior, do qual possuo uma cpia. De facto, no descobri o motivo deste diploma, mas deparou-se-me que, antes da sua publicao tratarem os vencedores de eliminar os vencidos: no Algarve figura cabea, o Coronel Toms Cabreira, o qual comeou por ser preso e levado para a cadeia de Faro, onde na noite de 21 de Novembro de 1834, um grupo de doze ou mais indivduos, embuados, o foram buscar, assassinando-os, no sendo possvel a identificao dos assassinos. Diz o Prefeito (actual Governador Civil), que dois dias depois para o Ministro do Reino (Arquivo Distrital de Faro). Mas, pior ainda, aconteceu com outro tavirense, Sebastio Martins Mestre, ex-Comandante Militar de Vila Real de Santo Antnio, o qual foi assassinado quando, sob priso, se deslocava protegido pela respectiva escolta, naquela vila raiana. Assim, o que ter salvado o Major Camacho, ter sido a sua fuga urgente numa embarcao para o estrangeiro, donde regressou muitos anos depois. Tambm, o prprio Remexido, tratou de se por a salvo, escondendo-se na serra prxima da sua residncia, serra essa que ele bem conhecia. Ora, uma vez que os Liberais no encontraram o Remexido, provocaram a sua mulher e os seus filhos, que se encontravam em S. Bartolomeu de Messines. Ora, tal acontecimento, juntamente com a promessa de que D. Miguel, ex-rei de Portugal, regressaria a Portugal e expulsaria os Liberais, promessa essa feita em 1835 pela primeira vez, ter levado o Remexido a recrutar outros fugitivos e, juntamente com estes, ter atacado o peloto que guarnecia S. Bartolomeu de Messines, na noite de 23 de Agosto de 1836. 163
Ora, essa foi a primeira aco do Remexido contra as tropas liberais, aps a Conveno de voramonte, assinada havia j mais de dois anos. Assim, desde 23 de Agosto de 1836, foram vinte e trs meses de bate e foge. Mas, em 15 de Dezembro de 1837, o Governo Liberal nomeou para chefe das operaes, contra o Remexido, o Coronel Fontoura. Porm, encontrando-se em pleno Inverno, e os militares encontravam-se desprotegidos de fardamento, o Coronel Fontoura comeou por mobilizar cerca de mil homens de 2. linha, de forma a substituir os militares de 1. linha, que guarneciam os vrios pontos fortificados da zona de operaes, enquanto ele utilizaria estes na guerra de movimento. Ao mesmo tempo, Fontoura ordena populao residente na serra, que esta deixe as suas residncias, marchando para junto dos pontos fortificados, trazendo consigo os seus gados e haveres, sob pena, de as suas casas serem destrudas (1981, p. 70 do livro A Guerrilha do Remexido, Antnio do Canto Machado e Antnio Monteiro Cardoso). Porm, a ofensiva de Fontoura, s viria a ser desencadeada em Julho de 1838, por motivos alheios sua vontade. A serra algarvia ento passada a pente fino. E, no dia 28 desse dito ms, a tropa liberal depara finalmente com a Guerrilha, nas cristas da Portela da Corte das Velhas, a Norte de Messines. Diz-se que eram duzentos e quarenta e oito, os homens pertencentes Guerrilha, que ali se encontrava, sendo certo que esta era comandada pelo prprio Remexido. No entanto, do lado da tropa liberal, eram muitos mais. Mas, assim mesmo, a Guerrilha abre fogo, procurando ganhar tempo, at que, ao aproximar-se da noite, comea a retirada, protegendo o prprio Remexido. Porm, este reconhecido por um Capito, de seu nome Manuel Maria Cabral. Ora, Remexido tentou alvej-lo, mas a sua arma encravou, sendo que foi aprisionado pelo Capito Cabral. Assim, foi o Remexido aprisionado, sendo que, ao que consta, os que se encontravam com o Remexido tero conseguido fugir. Momentos depois, ter chegado ao local Fontoura, decidindo levar Remexido para Messines e dali, para Faro, onde tero chegado dois dias depois. Remexido era transportado num assinino, o que aumentava o riso da assistncia. Assim, em Faro, no dia um de Agosto de 1838, no edifcio da Misericrdia, realizouse o julgamento, perante um grande efectivo militar e pelo menos oito habitantes de cada uma das freguesias mais prximas, mandados vir para presenciar ao julgamento. Presidia ainda, o Comandante da regio militar Baro da Ponte de Santa Maria. A acta do julgamento diz que Remexido se apresentou, perante o jri com passos vagarosos mas firmes, talvez reveladores
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do que o esperava: a morte por fuzilamento no dia seguinte, no Campo da Trindade, onde se encontra actualmente o Jardim da Alameda. Porm, antes de ser fuzilado, Remexido escreveu ao seu filho Manuel, seu ajudante no Comando da Guerrilha, a seguinte carta: Meu filho: junto ou quase prximo de ir morrer, me veio falar o Sr. Capito Neutel, afirmando que se tu te vieres apresentar a ele, te assegurava a tua vida e estabilidade e que olharia por tua me e irmos. () Tu, que tens juzo, considera as cousas e bem vs a perseguio que poders ter; parecia-me que poderias concorrer para assegurar algum arranjo de tua me; e por isso, te peo que, cedendo te venhas apresentar e te pede o teu pai pela ltima vez, que sejas bom e (que) te lembres sempre da minha alma. Recebe a minha ltima bno como de um pai que sempre estimou a todos os filhos e a ti como teu pai de corao. () Faro, no oratrio, 2 de Agosto de 1838. Assinado, Remexido. (p. 188 do livro referido, A guerrilha do Remexido). Ora, o Capito Neutel no demorou a fazer chegar a carta ao seu destinatrio, mas no consta de que mos se serviram para tal. Carta a que Manuel Remexido respondeu, negando-se porm, a aceitar o conselho de seu pai. (p. 189 do referido livro). As notcias sobre a guerrilha do Remexido que se seguiram, fui eu encontr-las nos Dirios do Governo. Ora, de facto a guerrilha do Remexido continuou activa, embora tivesse deslocado o seu centro nevrlgico para a zona das proximidades do Rio Guadiana, talvez para se interligar com a tropa espanhola dependente de um tal D. Carlos, pretendente da coroa espanhola, que actuava do outro lado da fronteira. Nos finais daquele mesmo ano de 1838, foi a aldeia do Azinhal, no concelho de Castro Marim, atacada pela guerrilha algarvia, tendo a mesma sido repelida, sabendo-se depois que, no combate, ficara ferido o seu Comandante, ou seja, o Manuel Remexido, o qual foi transportado pelos seus camaradas, durante a retirada. No entanto, considerando o seu Comandante ferido, um empecilho, resolveram deix-lo num monte, ao cuidado de um impedido. O monte denominava-se, pois, P do boi e pertencia ao concelho de Almodvar. Assim, em 10 de Novembro de 1839, Manuel Remexido foi encontrado por uma coluna militar Liberal. Ora, o impedido imediatamente fugiu, mas Manuel Remexido, estando impossibilitado de mover-se e encontrando-se de roupa branca e envolto numa manta foi encontrado. Assim, o Comandante em chefe da tropa em operaes Coronel Fontoura -, fazendo propaganda, decidiu mand-lo conduzir ao Hospital de Faro para tratamento. Mas Remexido Jnior, s viveria mais um ms. 165
O cadver de Remexido Jnior foi autopsiado por dois mdicos do referido Hospital, os quais, feita a autpsia, declararam que a morte fora resultado de uma bala de fusil que, entrando na regio elaca da perna esquerda, atravessou o ischion, da qual levou grande poro e a chanfradura. No dia seguinte, pelas 11 horas, foi Remexido Jnior sepultado no mesmo cemitrio, em que o fora seu pai, 15 meses e 10 dias antes. A guerrilha algarvia ainda estrebuchou mais alguns meses, at que foi dada por extinta, tambm porque a guerrilha espanhola igualmente o foi, e porque D. Miguel de Portugal no regressou a Portugal.
Tenho dito,
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Comecemos paradoxalmente pelo fim: o Algarve, globalmente entendido na sua unificao geo-antropolgica, participou activamente no processo revolucionrio que levou implantao poltica do Liberalismo em Portugal. Disso no temos a mais pequena dvida. Razo pela qual percepcionamos o Algarve como um complexo histrico-geogrfico, moldado no cosmopolitismo sociocultural, resultante do trfego mercantil e da extraco pesqueira, em que estruturara a sua economia. No admira, por isso, que tivesse tido grandes similitudes com as posies polticas defendidas na cidade do Porto, ao tempo considerada como o fulcro do revolucionarismo portugus. Tanto assim que quando, em 24 de Agosto de 1820, nas artrias daquele burgo se proclamou a regenerao da ptria, a libertao do jugo britnico e o retorno da Corte exilada no Brasil, os quartis e municpios algarvios rapidamente acorreram a expressar a sua anuncia Revoluo.
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Ilustrao 1 A Revoluo de 24 de Agosto de 1820, reuniu os interesses militares vontade popular de libertao do jugo estrangeiro Contudo, bem certo que, semelhana do resto do pas, pouco maior foi a participao do Algarve, que se limitou a tomar conhecimento e a apoiar o processo revolucionrio em curso. Aclamou-se o novo regime, assinaram-se Autos de juramento e fidelidade nos municpios, louvou-se a atitude patritica das novas autoridades, substituram-se as chefias militares e cantaram-se louvores sagrada Constituio, como se de uma miraculosa panaceia se tratasse. Foi uma revoluo cvica e civilizada. Elegeu-se um parlamento, aboliram-se as instituies retrgradas e as enleantes razes senhoriais, mas na prtica pouco restaria para a posteridade. Tal foi a fugaz experincia do nosso primordial liberalismo. No obstante, teve a revoluo vintista uma particularidade sui generis, que chamou a si a participao espontnea dos cidados interessados em colaborar na elaborao do texto constitucional e na discusso da reforma dos sectores econmicos. E nesse aspecto teve o Algarve uma interveno preciosa, j que em matria da reviso fiscal, da agricultura e, sobretudo, das pescas, ofereceu diversas Memrias para elucidao das leis regulamentares e revitalizao dos sectores. Na avaliao global das capturas e na distribuio dos bancos pesqueiros, essa colaborao poderia ter alcanado profcuos resultados legislativos, que s no foram aplicados devido fugaz durao do regime. Nos momentos contra-revolucionrios da Vilafrancada e da Abrilada, no teve o Algarve qualquer tipo de interveno. 168
O golpe militar da Vilafrancada aboliu a Constituio e a Liberdade conquistada com a Revoluo de 24 de Agosto de 1820. O infante D. Miguel tornou-se no fautor principal do absolutismo Alis, no a poderia ter, face focalizao geopoltica dos eventos. Tambm no os contrariou. O regime cara em descrdito com a perda do Brasil, a economia dava sinais de contraco e o descontentamento social, sobretudo nos quartis devido ao incumprimento das promoes, empurrara os prprios protagonistas da to apregoada regenerao nacional para o ignbil caminho da contra-revoluo. A promessa de uma nova constituio acalentou esperanas, serenou o pas. Nessa expectativa permaneceu o Algarve at que a morte de D. Joo VI veio trazer ribalta poltica a decantada Questo Portuguesa. No sendo um equvoco sucessrio, o certo que a entronizao de D. Pedro IV, imperador do Brasil, parecia satisfazer tudo e todos. As prprias autoridades algarvias tornaram clara a sua anuncia, demonstrada nas vrias exposies congratulatrias enviadas Regente Isabel Maria. Uma coroa bifronte, num espao multi-continental, no desagradava burguesia, desejosa de retomar o chorudo trfego brasileiro. Mas a doao da Carta Constitucional veio reintroduzir o novo regime e criar um pomo de discrdia entre os conservadores, adeptos do tradicionalismo aristocrticoeclesistico, e os progressistas da esquerda revolucionria, favorveis ao liberalismo poltico e ao livre-cambismo. Reacendera-se em 1826 um feroz e irreconcilivel antagonis169
D. Pedro, imperador do Brasil, e herdeiro da A Regente Isabel Maria assegurou o coroa portuguesa, suscitou a possibilidade de uma funcionamento das instituies e da monarquiaCarta Constitucional bifronte, euro-americana
mo poltico, que haveria de prolongar-se por toda a primeira metade do sculo. O reaccionarismo apostlico fulcralizado nas terras altas do nordeste e das beiras, com o apoio e conivncia espanhola, acendera a chama da rebelio em nome dos inauferveis direitos do infante D. Miguel ao trono ptrio. Essa era a mensagem da propaganda realista. Mas, a verdade era bem mais simples. O que cindia os portugueses no era fundamentalmente o direito sucessrio de qualquer dos pretendentes, mas to s o sistema poltico que cada um deles defendia e propalava. A questo, por conseguinte, no era de regime, mas antes da organizao poltica do Estado. Uma dicotomia de interesses concernentes natureza e funo do poder, o confronto de ideias, de direitos e deveres, de projectos e ideologias, eis o buslis da questo. As convenincias de classe repartiam-se entre Pedro e Miguel, cuja legitimidade ao trono foi usada por ambos os partidos com os mais fervorosos argumentos sem que, contudo, deles se pudessem vangloriar na plenitude do direito que efectivamente lhes assistia. A legitimidade no assistia de forma inequvoca e irrefutvel a qualquer dos pretendentes. O prncipe D. Pedro fizera-se imperador de uma nao que antes era colnia e o principal sustentculo econmico da ptria, que com esse gesto atraioara. A reaco apostlica considerava-o indigno de cingir a coroa dos seus maiores e a diplomacia internacional nunca reconheceria uma unio luso-brasileira, sob pena de perder os seus mercados e influncia poltica. Estavam nesta consonncia os interesses econmicos britnicos e a vontade poltica da Santa Aliana. Por outro lado, sob o infante D. Miguel impendia a no menos grave acusao de aleivosia, decorrente da liderana do movimento contrarevolucionrio iniciado com a Vilafrancada e concludo na Abrilada. Neste quadro poltico o que existia de comum entre ambos os pretendentes ao trono era o estigma da insolncia perante o Estado e a figura tutelar da Coroa, que por acaso at era a do progenitor de ambos. O exemplo que ambos haviam transmitido sociedade no era o mais recomendvel. Contudo, ao primognito assistia o direito sagrado da sucesso, que nem as Cortes, nem o prprio D. Joo VI, tiveram a coragem de anular, designando outro sucessor. Parece evidente que estaria por detrs disso o
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velado desejo de uma unio dinstica entre as duas naes ou pelo menos de um forte estreitamento das relaes polticas e econmicas entre os dois Estados. Estranhamente a sucesso, ou a indigitao de D. Pedro para o trono de Portugal no ofereceu dvidas a qualquer dos partidos. Os absolutistas tinham conscincia da impossibilidade prtica do unionismo luso-brasileiro. Por isso sustentaram a imagem de um D. Miguel renovado, europeizado e moderno, para se sentar com dignidade no trono dos seus maiores. E se assim pensaram, melhor o fizeram. Porm, a doao da Carta Constitucional frustrou todas as expectativas. O sistema inviabilizaria a transio pacfica para o absolutismo. Da que a estratgia tenha evoludo para a hipocrisia de uma Regncia domesticada e subserviente na pessoa do novo prncipe. O novo regime constitucional-parlamentar parecia agradar sobremaneira ao povo algarvio, cujos municpios, entidades socioeconmicas e conventos fizeram jurar os acostumados Autos de aclamao e fidelidade s instituies ptrias. Os encmios e eptetos neles exarados traduziam a aparente harmonia de uma incontestvel anormalidade. Ou seja, nas suas palavras D. Pedro era o Dador da Liberdade, o Pai, o Salvador da ptria, enquanto D. Miguel seria o transmissor das directrizes constitucionais, materializador da esperana e da grande regenerao nacional. Como se estes dois espritos, emanados de antagnicos projectos polticos, pudessem algum dia compatibilizar-se. No quadro poltico-socioeconmico da nao estabelecera-se uma dialctica entre a ideologia das liberdades individuais e a mentalidade tradicionalista, centralizadora e retrgrada do passado, consubstanciada na sagrada unio do Trono e do Altar. Mas essa era uma dialctica de surdos. O que estava em jogo era o antagonismo, irreconcilivel e feroz, entre o reformismo liberal e o restauracionismo absolutista. O partido miguelista, embasado no foro classista, defensor da intolerncia e exclusividade catlica, identificava-se com o obscurantismo do Antigo Regime, em absoluta contraposio ao reformismo estrangeirado. A nao atrasada e submissa, reflectida nas camadas populares, constituam o seu alfobre poltico, da apregoar-se insistentemente que os miguelistas constituam uma espcie de partido nacional-popular. Em contraposio surgiam os liberais, 171
defensores da regenerao da ptria e da construo do estado moderno, apregoando reformas radicais e uma nova ordem poltico-socioeconmica. Por isso suscitaram receios e temores num povo mentalmente atvico e avesso a alteraes profundas no seu ronceirismo quotidiano. Os constitucionalistas apregoavam a Liberdade como se tratasse de uma palavra mgica, que redimiria todos os males da sociedade. Embora o seu conceito fosse algo indefinido, desde h muito que no nimo do mais ignaro cidado fervilhava o sentimento e significado da liberdade. A questo apenas mudava de figura quando se lhe associava a imagem do liberal como se fosse a do anti-cristo, ou a do manico herege, demolidor do trono e do altar. Todos esses podos e eptetos atemorizantes constituam o cerne da propaganda miguelista, plasmada nos interesses do clero e da aristocracia. A velha aristocracia esclerosada nos valores do Antigo Regime no conseguia adaptar-se aos ventos de mudana que sopravam dos Pirinus. Receava que a alterao do sistema poltico lhe fosse fatalmente desfavorvel. Com os liberais prefigurava-se a instalao dos valores da equidade do cidado perante a lei e a sociedade, quadro esse que para os instalados do absolutismo parecia emanado do esprito anrquico de qualquer ser diablico. Esse era, alis, o arrasador arqutipo do liberal, difundido pelo clero em inflamantes sermes, pressagiadores do fim do mundo. Apesar da favorvel adeso Carta e da aparente anuncia da nao soluo de compromisso estabelecida por D. Pedro, o certo que a reaco apostlica conseguiu desencadear um movimento insurreccionista nas terras da beira transmontana, encabeado pelo Marqus de Chaves. A chama da contra-revoluo depressa incendiou o pas, com o apoio de alguns quartis, do clero e da fidalguia mais conservadora. O Algarve imiscuiu-se no impulso reaccionrio. A 8 de Outubro de 1826, o Regimento de Infantaria 14, sedeado em Tavira, acolitado pelo decado Batalho de Caadores 4, oriundo de Castro Marim, proclamaram o infante D. Miguel como Rei Absoluto. Formaram uma Junta Provisria do Governo do Algarve em consonncia poltica com os revoltosos do Marqus de Chaves. Embora se tivessem apoderado de todo o sotavento algarvio, o certo que o barlavento ops-se s pretenses dos miguelistas, cindindo-se a regio entre os dois partidos beligerantes. Pairou ento uma ameaa de guerra civil que, felizmente, seria sufocada em cerca de dez dias. De qualquer modo, notou-se que a geografia poltica do Algarve estava relacionada com o plo burgus de Lagos e a fidalguia castrense de Tavira. Seja como for, a explicao para este rpido desaire dos absolutistas dever residir na escassa adeso das autoridades poltico-administrativas, qual se deve acrescentar os fracassos militares do Marqus de Chaves e do general Magessi. A providen172
cial fuga para a Espanha apostlica de Fernando VII tornou-se na estratgia de sobrevivncia da causa contra-revolucionria, imitada tambm pelas foras algarvias de Infantaria 14 e Caadores 4. Do outro lado da fronteira as tropas miguelistas estabeleceram as suas bases e campos de treino militar, concentrando a sua ateno em pontuais e quase cirrgicos ataques nas terras da raia, captando novos aderentes e publicando proclamaes contra a Regncia da infanta Isabel Maria. Perante a chegada do novo prncipe, numa situao catica de um reino sem rei, e face permanente actividade das foras reaccionrias, no foi difcil cambiar a situao a seu favor. A poltica da paz podre depressa resvalaria para um clima de purgao poltica. Chegado ao trono, D. Miguel formou um governo de inspirao realista, substituiu os comandos militares, os governadores das provncias e todas as autoridades municipais ou locais. Chamou a si os que antes haviam sido perseguidos pelos liberais, dando-lhes lugares e posies de chefia poltico-administrativa, mergulhando, assim, o pas num ambiente de vingana e de permanente perseguio poltica. Os caceteiros moviam desenfreada caa aos liberais, que escapavam pelo porto de Lisboa em desabrida emigrao. A maonaria e alguns oficiais de prestgio, como S Nogueira, Vila Flor e Saldanha, lograram pronunciar os quartis do norte em favor da causa liberal, cujas foras por dificuldades logsticas acabariam por se concentrar na cidade do Porto. Mais uma vez o pas se dividia ao meio. Todavia, os caudilhos da liberdade, no conseguindo conter as ambies e rivalidades pessoais, fomentaram certas dissenes de que resultaria a desconexo das ordens de comando, arrastando consigo os revoltosos para o oprbrio da Belfastada.
Alfndega de Lagos (antigo mercado de escravos) junto ao quartel onde deflagrou a revolta do Algarve em 1828 173
Na esteira do levantamento do norte, tambm o Algarve, no dia 25 de Maio de 1828, pegaria em armas contra o usurpador. O grito da revolta fora preparado pelos oficiais do Regimento Infantaria n. 2, sedeado em Lagos e, pontualmente aquartelado em Tavira, devido ao expatriamento de Infantaria 14. Todavia, em Lagos uma denncia fez abortar o pronunciamento que, no obstante, em Tavira surtiu pleno efeito, aclamando-se a Carta e a Rainha D. Maria II. Mas, em Faro, o Regimento de Artilharia n. 2, contrariando o plano revolucionrio a que aderira, no saiu em apoio da revoluo. Perante a disparidade das circunstncias as hostes pedristas foram esmagadas dois dias depois num feroz combate s portas de Faro. O partido liberal tinha cometido vrios erros, sobretudo na avaliao do inimigo. Em primeiro lugar, usaram de excessiva complacncia para com os oficiais miguelistas, especialmente com o Governador das Armas, general Lus Ignacio Palmeirim, que submetendo-se aparentemente revoluo esperou pelo momento mais oportuno para a torpedear. Depois no puseram em ferros os inimigos mais poderosos, tanto na sociedade civil como na militar. A falta de coeso marcial partiu a regio em dois plos adversos, o que se assemelhava ao fracasso de 1826, que deveria ter servido de exemplo. O confronto militar acirrou dios e extremou posies. E tal como antes, tambm agora as foras do governo, sendo bastante superiores, no tiveram dificuldades em concitar a adeso generalizada das populaes. Os liberais, comete174
ram praticamente os mesmos erros dos seus adversrios em 1826. A posse da capital teria sido a chave da questo. Em todo o caso, a presena fsica de D. Miguel no trono, embora apenas como Regente, era um inultrapassvel handicap para o partido liberal, at a considerado rfo e falho de liderana.
Batalha Naval do Cabo de S. Vicente Repare-se na similitude das rebelies militares operadas no Algarve em 1826 e 1828, ambas efectuadas contra o poder institudo e ambas esmagadas ingloriamente. Poder-se-ia, por isso, admitir que os movimentos sediciosos contra as foras do governo estariam partida condenados ao malogro. O nico caso que excede a regra, no Algarve, ocorreu a 24 de Junho de 1833, com o desembarque das tropas do Duque da Terceira que, praticamente sem qualquer oposio, submeteram esta provncia, derrotaram a frota miguelista na batalha do Cabo de S. Vicente e marcharam vitoriosos para Lisboa, onde entraram triunfalmente no glorioso 24 de Julho. Se acaso no tivesse existido a guerra civil de 1832-1834, que culminou com a inglria rendio miguelista em vora-Monte, seramos forados a acreditar nessa hipottica regra, que muito peculiar nos pases macrocfalos. Ou seja, num espao poltico de cariz centralista, a provncia nunca teria qualquer poder ou significado militar para a segurana do Estado. Em geral essa circunstncia aproxima-se da regra histrica ou da lei sociolgica. E, com efeito, todas as anteriores revoltas ocorridas na primeira metade do sculo transacto nunca puseram em causa a legitimidade da figura do rei. Porm, a nica coroa que saiu vencida 175
foi a de D. Miguel. As razes que explicam o desaire no se podem assacar inpcia dos generais realistas ou valentia dos mercenrios pedristas. O que verdadeiramente uniu e fortaleceu o partido liberal rumo vitria final foi o poder do ideal. No seio dos seus opositores no existia a fora de um ideal, muito menos a de um conceito to sublime quanto o da liberdade. Por isso, eram mais fracos e desunidos, acabando por ser batidos por um exrcito dez vezes inferior. Era esse o poder do ideal. Em todo o caso, o que mais particularizou o regime miguelista foram as perseguies, aladas e devassas polticas, que aps a entronizao do novo prncipe no mais parariam de apoquentar os adeptos da liberdade. O poder assentava na sacralidade do trono, na exclusividade da religio catlica e na defesa das instituies tradicionais. Como a pedreirada liberal no aceitava esses princpios polticos nem esses preceitos religiosos, transformaram-se em inimigos do Estado. A delao, a coaco e a extorso constituam uma espcie de modus vivendi, do prprio regime. Funcionava dessa maneira tanto na vivncia social como no comportamento poltico. A represso e o terror constituam a estratgia do poder. S no Algarve contamos 400 pronunciados nas devassas polticas que se iniciaram logo aps a fracassada revolta de 25-5-1828. Mas no cmputo nacional esse nmero teria ascendido a largos milhares de cidados. No caso especfico do Algarve constatamos que o espectro social era plurifacetado, com particular incidncia na pequena burguesia dos artfices e comerciantes, no foro judicial e administrativo, nos militares, proprietrios, negociantes, etc. Um quadro muito abrangente ao qual no faltavam tambm as classes laborais, embora em reduzido nmero at pela sua diminuta expresso nos conflitos polticos. A maioria dos implicados na revolta foi condenada aos presdios da capital, sofrendo as agruras do crcere ou a deportao para as colnias africanas. As intervenes militares no Algarve, em 1826 e 1828, ambas em defesa da implantao do sistema constitucional, demonstram que no era uma regio marginal,
alheada da conjuntura poltica que envolvia a nao. A evoluo dos factos confere-lhe uma especial
Paliada exterior durante o Cerco do Porto
conflitos, comprovando-se no s a sua ateno aos problemas nacionais como tambm a sua efervescente actividade partidria. O desenvolvimento dos sectores piscatrio e mercantil justificou a fixao no litoral algarvio de empresrios estrangeiros, sobretudo britnicos, franceses e espanhis, suscitando uma espcie de aculturao poltica das populaes locais. Alis, curioso o facto de aqui se radicarem muitos liberais espanhis, fugidos s perseguies de Fernando VII, que gozaram dum certo estatuto de tolerncia devido ao facto de desenvolverem actividades profissionais teis regio. Alguns desses estrangeiros, nomeadamente andaluzes, est iveram ligados s lojas manicas de Lagos e de Faro, que to bom contributo deram para o sucesso da causa da liberdade no Algarve. Em suma, o miguelismo ao invs de procurar manter a popularidade de que o infante parecia gozar no seio do povo, acabou por se deixar resvalar para um nepotismo tirnico, excessivamente persecutrio e sem precedentes. Com o evoluir dos anos frustraram-se as expectativas e o regime apodreceu numa guerra civil, praticamente fulcralizada na cidade do Porto. Apesar da desproporo das foras envolvidas, a resistncia e a coeso ideolgica dos liberais tornou-se na sua principal arma. O impasse a que parecia resumir-se o chamado Cerco do Porto foi ultrapassado atravs do estabelecimento de um novo palco de guerra sedeado no Algarve. A escolha desta regio, quase esquecida no extremo sul do pas, demonstra a sua importncia geo-estratgica no quadro da unidade territorial da nao portuguesa. Mas tambm evidencia um prvio conhecimento das facilidades de penetrao militar numa costa indefesa, cuja populao j se havia empenhado em anteriores momentos ao lado da causa liberal. E a verdade que em apenas oito dias, as tropas do Duque da Terceira submeteram todo o reino do Algarve. A disparidade das foras envolvidas no lhes era favorvel. Porm, alguma inpcia, acrescida pela frequente indeciso do general Molelos, ter evitado o entrechoque militar. E, na verdade, o partido miguelista perdeu a guerra no Algarve. A batalha naval do cabo de S. Vicente trouxe mais uma vez evidncia a incapacidade de chefia e a falta de estratgia militar dos absolutistas, que perdendo a sua esquadra perderam igualmente a esperana de poder decidir o conflito a seu favor. Num pas litoralizado como o nosso, torna-se imprescindvel acautelar o controlo da extensa costa martima. A perda desse domnio expusera a capital a um ataque concertado por terra e mar. Esse era ab inicio o plano urdido pelos liberais quando desembarcaram no Algarve.
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Mas o desfecho da situao seria imprevisivelmente facilitado pelo general Molelos quando se afastou para Beja, franqueando aos liberais a estrada para Lisboa. A campanha do Algarve estava terminada. No dia 24 de Julho o Duque da Terceira entrava em triunfo na capital. O governo fugia para Santarm e com ele seguia um exrcito desmoralizado e descrente nos seus inaptos oficiais, a quem, alis, acusava de traio. Arrastaram-se at cidade de vora, onde concluram que a guerra estava perdida. Sem a pompa nem a circunstncia do seu real estatuto, o infante assinou a capitulao numa humilssima casa da pacata aldeia alentejana de vora-Monte. O exlio foi o seu destino. Terminara a via-sacra do miguelismo, Casa onde foi assinada a Conveno de vora-Monte mas no se extinguira a causa apostlica. A vingana de algumas vtimas do regime deposto sobre os seus antigos algozes, obrigara muitos dos vencidos a no regressar s suas casas. A prometida amnistia poltica no passava de letra morta e a to almejada paz seria ameaada pelo surgimento de bandos de guerrilheiros, que despontavam um pouco por todo o interior do pas, com especial acuidade no Alentejo e Algarve. Essas foram as regies mais flageladas pelas vendetas pessoais e pelas brbaras atrocidades dos oportunistas, movidos pela cobia extorsionria. As guerrilhas surgiram por volta da ecloso do movimento Setembrista, sem que, porm, se perceba qualquer correlao de interesses polticos entre os guerrilheiros e a esquerda revolucionria. O descontentamento que grassava nos campos por causa do absentismo dos proprietrios e da falta de trabalho foi aproveitado pelo proscrito rei D. Miguel para, numa inflamante Proclamao, apelar ao levantamento popular. Os soldados e apaniguados realistas, que se haviam homiziado nos recnditos das serranias, saram dos seus redutos decididos a cobrar com juros os insultos, vinganas e toda a casta de atrocidades de que foram vtimas. A luta surgia do Campo em direco Cidade, e em muitos aspectos parecia dar a entender que se tratava de um ajuste de contas socioeconmico entre pobres e ricos, 178
camponeses contra proprietrios. Todavia, nunca a luta de classes esteve vincadamente expressa, nem as relaes de produo se tornaram inquestionavelmente perceptveis nos ataques das guerrilhas. Em todo o caso, o campons encarava a Cidade no sentido opressivo, visto nela se encontrarem sedeadas as instituies que regulavam a sua vida quotidiana, sobretudo a repartio da Fazenda Pblica que o sobrecarregava de impostos. A figura que mais se distinguiria no contexto das guerrilhas miguelistas, seria a do Remexido, cujos sucessos militares depressa extravasaram as fronteiras nacionais. O prprio D. Miguel, agradado com as notcias da sua fidelidade causa legitimista, nomeara-o Governador do Reino do Algarve e Comandante Interino das Operaes do Sul. Isto deu um certo fulgor aos rebeldes que sustentaram durante dois anos um clima de terror e de insegurana nas terras do interior serrenho, tanto no Algarve como no Alentejo, onde os bandos do Padre Maral Jos Espada, de Francisco Nogueira Camacho ou dos irmos Baioa cometiam as maiores atrocidades contra os proprietrios rurais, os aldees indefesos e os soldados do governo. As malas do correio e os almocreves tornaram-se presas fceis das guerrilhas, que ao controlarem as estradas dominavam as comunicaes terrestres com a capital. O caso tomara foros de escndalo nacional e os crimes perpetrados roavam os limites da barbrie. A oposio poltica no Parlamento chacoteava da fragilidade do governo face escalada das guerrilhas, que no sendo numerosas em efectivos vexavam com o peso da derrota os Batalhes das Guardas Nacionais. A verdade que o governo nunca deu grande importncia s guerrilhas, considerando que o seu extermnio competia aos meios de defesa militar das prprias regies. Mas quando teve conhecimento do conluio das guerrilhas com as tropas Carlistas, que na raia espanhola ameaavam proceder fuso ibrica das foras contrarevolucionrias, o governo decidiu extirpar o mal pela raiz. Foras treinadas e bem armadas, instrudas nos preceitos da guerrilha e avisadas das dificuldades do terreno, foram enviadas para a serra do Algarve, responsabilizando-se as populaes citadinas pelo patrocnio financeiro das operaes de combate. Isto , os algarvios viram-se obrigados a pagar a defesa do seu territrio e dos seus bens,
Gravura coeva do fuzilamento do Remexido
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atravs de um emprstimo forado no valor de 25 contos de ris, sem os quais no se poderiam equipar as tropas dos meios blicos e logsticos, capazes de coroar de xito as perigosas incurses serra. E, com efeito, o emprstimo deu-se por bem empregue, pois que as campanhas iniciadas em Maio pelo coronel Fontoura culminariam a 2 de Agosto de 1838 com o fuzilamento do Remexido. Sem o seu lder carismtico a guerrilha andou deriva durante dois anos, ao longo dos quais foram abatidos os principais chefes dos rebeldes dispersos pelos montes alentejanos. O prprio filho do Remexido no escapou s montarias das tropas governamentais, sendo o ltimo a cair. Da por diante assistiu-se consolidao do regime constitucional, definitivamente expurgado das bolsas de resistncia miguelista. No deixa de ser, porm, curioso que o fim das guerrilhas, operado nos princpios da dcada de quarenta, amainasse a contestao camponesa, abrindo, talvez, o caminho ao retorno do partido cartista s cadeiras do poder, sob a gide dos irmos Costa Cabral. Em todo o caso, o que importa destacar , mais uma vez, o papel preponderante desempenhado pelo Algarve no dirimir dos acontecimentos poltico-militares que envolveram a implantao do liberalismo em Portugal. Nenhuma outra regio, excepo das cidades do Porto e Lisboa, tiveram tanta importncia nem foram to decisivas como o foi o Algarve. E nisso s se demonstra a fulcral consequncia do seu posicionamento geo-estratgico no contexto nacional. Pese embora o esquecimento a que era normalmente votado, pela sua prpria condio de extremo sul da pennsula, os factos e as circunstncias vem demonstrar que tinha condies naturais e econmicas que lhe proporcionariam um desenvolvimento autosustentado. No obstante, sempre o Algarve se identificou e integrou no territrio nacional, contribuindo em alguns dos mais decisivos momentos da histria ptria, para a definio do rumo nacional. E no temos qualquer pejo em afirmar que o Algarve, no processo histrico que conduziu implantao do liberalismo portugus, desempenhou um papel poltico notvel, uma aco socioeconmica deveras importante e um alinhamento geo-estratgico imprescindvel. Trs vectores que estiveram na base dum sucesso poltico-militar, que teve no arquiplago dos Aores, na cidade do Porto e no reino do Algarve os seus expoentes de abnegao, herosmo e resistncia, contra a represso, tirania e iniquidade do nepotismo miguelista.
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Professor Doutor de Direito, Professor Catedrtico de Universidade Catlica do Lisboa, Professor associado com agregao da Faculdade de Direito de Lisboa, responsvel pelas relaes internacionais da Faculdade de Direito de Lisboa atravs dos programas Erasmus e Erasmus Mundo, Doutor Honoris Causa no Brasil, Autor de inmeras publicaes de Direito Administrativo, Ambiental e Constitucional. LUS BVAR DE AZEVEDO Nascido em Faro, em 11 de Novembro de 1940. Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa; ex-Administrador de empresas do Grupo Portucel EP, de empresas privadas de celulose e de papel, representante dessas industrias, em Portugal e internacionalmente; fundador e membro da direco dos Institutos D. Joo VI e Duque de Loul, scio efectivo da Sociedade de Geografia de Lisboa, etc; autor de 20 trabalhos publicados, de natureza empresarial, poltica, histrica e genealgica; Alferes Miliciano de Cavalaria, condecorado com a Medalha de Mrito Militar, por aces em campanha no Norte de Angola (1965-1967) e com a respectiva Medalha Comemorativa. PEDRO VARGAS NEVES O Tenente de Infantaria, Pedro Filipe Vargas Neves, est a comandar a Companhia de Comando e Servios do Regimento de Infantaria n. 1, desde 03 de Dezembro de 2009. licenciado em Cincias Militares, na especialidade de Infantaria, pela Academia Militar, tendo ingressado no Quadro permanente em 2007. Dos seus 4 anos de carreira militar, exerceu as seguintes funes: - Comando de Peloto, de Guarnio e Segurana, durante um ano, no Regimento de Infantaria n. 19; - Adjunto do Chefe de Seco de Operaes e Segurana, como Comandante do Peloto de Guarnio e Oficial de Tiro do Regimento de Infantaria n. 1, durante um ano e dois meses. Tem um louvor. Tem como Trabalho final de Curso A Guerrilha do Remechido. ANTNIO ROSA MENDES Licenciado em Histria e em Direito pela Universidade de Lisboa, Mestre em Histria Cultural e Poltica pela Universidade Nova de Lisboa, e Doutor em Histria Moderna pela Universidade do Algarve. Professor na Universidade do Algarve, de cuja Biblioteca director e onde lecciona disciplinas de Histria da Cultura, Histria do Algarve e Direito do Patrimnio Cultural. 182
Coordena o Centro de Estudos de Patrimnio e Histria do Algarve (CEPHA) e o Curso de Mestrado em Histria do Algarve. Colaborou na Histria de Portugal, dirigida por Jos Mattoso (vol. III, coord. Joaquim Romero Magalhes, captulo A vida cultural,) e na Histria de Portugal, dirigida por Joo Medina (vol. VII, captulos. Colgio Real dos Nobres de Lisboa, Biblioteca Pblica da Corte, Lus Antnio Verney, Ribeiro Sanches, Estrangeirados e exilados do iluminismo portugus). Autor, entre outros trabalhos, do ensaio A Peregrinao, A Peregrinao de Ferno Mendes Pinto (in Mare Liberum, n. 15, Junho de 1998) e dos livros Ribeiro Sanches e o Marqus de Pombal: Intelectuais e Poder no Absolutismo Esclarecido, Cascais, Patrimonia Historica, 1998, e Cultura e Poltica no Algarve Setecentista. Damio Faria e Castro (17151789), Olho, Gente Singular Editora, 2007. Foi presidente de Faro, Capital Nacional da Cultura 2005. Foi membro da Comisso das Comemoraes do 2. Centenrio de Olho da Restaurao e coordenador cientfico do Congresso Olho, o Algarve e Portugal no Tempo das Invases Francesas (14-15-16 Nov. 2008).
ALEXANDRE SOUSA PINTO - Alexandre Maria de Castro de Sousa Pinto, TenenteGeneral, nasceu no Porto a 17-11-1941. Alistou-se na Academia Militar, onde frequentou o curso de Cavalaria, sendo promovido a Alferes em 1965. Como Coronel, comandou o Regimento de Lanceiros n 2 e como oficial General foi Governador Militar de Lisboa. Est na situao de reforma e , desde 2003, Presidente da Comisso Portuguesa de Histria Militar e acadmico honorrio da Academia Portuguesa da Histria. JOAQUIM JOS DUARTE NUNES Padre, Sacerdote do Presbitrio da Diocese do Algarve, e Natural de Monchique. Actualmente membro do Departamento Diocesano de Pastoral Litrgica, Secretariado do Patrimnio Cultural da Igreja, e Chanceler da Diocese. Licenciado em Histria pela Faculdade de Letras de Lisboa, completou os estudos teolgicos na Faculdade de Teologia da Universidade Catlica. Tem colaborado com diversas instituies na realizao de exposies de arte religiosa e elaborao dos respectivos catlogos.
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Participou nas Jornadas de Histria do Instituto Superior de Teologia de vora com trabalhos relacionadas com a Histria da igreja no Algarve. Lecciona no Seminrio de Faro, Ano Propedutico, Histria da Igreja. ARNALDO CASIMIRO ANICA Nasceu na freguesia da luz de Tavira em 4 de Fevereiro de 1926. Depois de completar a instruo primria passou a ajudar seu pai, na agricultura, at que aos 21 anos de idade foi incorporado na vida militar no Batalho de Caadores n. 4, em Faro. A decidiu-se pela vida militar, concorrendo a Furriel do quadro permanente, posto a que foi promovido em 1950. Sendo 2. Sargento, foi mobilizado para a Guerra do Ultramar em 1960, embarcando para Angola em Maro de 1961. Fez quatro comisses no Ultramar, todas por imposio, a ltima das quais em 19731975. Duas delas em Angola e duas na Guin. Em 1968-70 frequentou o curso da Escola Central de Sargentos, tendo sido promovido a Sargento-Ajudante em 1970, a Alferes em 1971, a Tenente em 1972. Foi no posto de Tenente que fez a sua ltima comisso. Salvo as quatro referidas comisses, foi no Quartel de Tavira que prestou quase todo o tempo de servio militar. Foi promovido a Capito em 1976. Passou situao de reserva em 1984, data em que passou a desempenhar a misso de Delegado da Manuteno Militar em Tavira, cargo que desempenhou at passar situao de Reforma, oito anos depois. Nos ltimos anos do servio, no Quartel de Tavira, foi oficial de Justia e oficial Bibliotecrio. E foi como oficial Bibliotecrio que se dedicou ao conhecimento da Histrico Militar do Algarve, nomeadamente a da cidade de Tavira. Por essa altura foi nomeado, cumulativamente com o referido servio, delegado da COMISSO DE HISTRIA MILITAR, sediada no ARQUIVO HISTRICO MILITAR de Lisboa. Nessa funo comeou a estudar mais intensamente a Histria Militar, no somente a do Algarve mas tambm a do Baixo Alentejo, produzindo vrios estudos nesse mbito, os quais enviou referida Comisso. Depois, ao passar reserva e, por fim, situao de Reforma, dedicou-se Histria civil da cidade de Tavira, situao em que tem produzido vrios volumes. 184
Refira-se, por fim, a sua colaborao na Imprensa Regional com centenas e centenas de escritos sobre os mais diversos temas.
JOS CARLOS VILHENA MESQUITA - Professor universitrio e historiador. Nasceu 1-8-1955 em Vila Nova de Famalico. Licenciou-se em Histria, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com a mdia geral de 16 valores. Foi docente no ensino secundrio, desde 1978 at 1983, tendo nesse ano iniciado a carreira universitria. Em 1989, apresentou Provas de Aptido Pedaggica e Capacidade Cientfica, sendo aprovado com Muito Bom. Em 1997 doutorou-se em Economia, na Universidade do Algarve, sendo aprovado com Distino e Louvor. Regeu as cadeiras de Histria Econmica e Social, nos cursos de Economia e de Gesto de Empresas, e de Histria Contempornea no curso de Sociologia, ambos na Universidade do Algarve. Em 1994 foi galardoado com o 2. Prmio Especial Algarve de Comunicao Social, no tendo sido atribudo mais alta distino. Em 1995 recebeu o 1. Prmio Samuel Gacon, no mbito da Comunicao Social Algarvia, institudo pela RTA. Participou em vrios Congressos, Colquios e Seminrios, no pas e no estrangeiro, nos quais apresentou comunicaes. Proferiu dezenas de Conferncias, escreveu ensaios e publicou centenas de artigos na imprensa regional algarvia, no Dirio de Notcias e, noutros rgos nacionais. Fundou em 30-1-1998 a Associao dos Jornalistas e Escritores do Algarve da qual Presidente. director da Revista Stilus, do Jornal Escrito e do boletim cultural N Vital. Da sua lista de obras fazem parte mais de vinte ttulos publicados desde 1982 at 2010.
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POSFCIO
Uma palavra, em jeito de Posfcio O Iluminismo atribuiu enorme valor s faculdades intelectuais humanas, preconizando a necessidade de esclarecer o homem e de o ajudar a tomar conscincia do seu mundo, exaltando a razo crtica como fora para a resoluo dos problemas do homem, enquanto ser autnomo, pensante a actuante, o Homem concebido como centro do bem colectivo e individual. O liberalismo, enraizado nesses princpios, colocando o Cidado no centro do interesse da sociedade e das suas instituies,
salvaguardar os direitos individuais. tentou circunscrever os limites do poder poltico e definir e
Os liberais do Algarve, liderados por cidados de elevada qualidade humana, respeitadores do prximo e da liberdade, propugnando pelos direitos naturais e inalienveis do indivduo, lutaram em defesa do bem colectivo contra as organizaes obscuras que engrenavam os interesses de poucos, em nome desses poucos. O liberalismo, quando praticado em defesa do bem colectivo, respeitando o indivduo, uma enorme escola de virtudes e fonte de desenvolvimento. Assim, o Instituto Superior Dom Afonso III decide apoiar a publicao deste Livro de Actas que, fidedignamente, traduz as jornadas realizadas no Regimento de Infantaria N 1, em Tavira, dedicadas s Guerras Liberais no Algarve, por iniciativa do seu Comandante Coronel Nuno Pereira da Silva, tambm um Algarvio, iniciativa que saudamos efusivamente. Como um dos herdeiros de quem financiou essas guerras do lado dos liberais, expresso o orgulho em ver o apoio do Instituto a esta publicao, sobejamente relevante para o futuro do Algarve. 187
Bem-haja!
O Director do Instituto Superior Dom Afonso III Doutor Ventura de Mello-Sampayo, Professor Catedrtico
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