A História Secreta Da Independência Do Brasil - Freemason - PT
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“Laços fora, soldados! Pelo meu sangue, pela minha honra, juro fazer a liberdade do Brasil.
Independência ou morte!”
Para que se compreenda o processo da independência política do Brasil, é preciso ter claro – como destaca o
historiador Caio Prado Júnior – que as monarquias de Portugal e Espanha estavam decadentes desde o século
XVII.
No século XVIII, a Espanha foi buscar apoio em França, enquanto Portugal se amparava na Inglaterra. A
disputa entre Portugal e Espanha – grandes potências coloniais com economias pré-industriais e atrasadas –
era, na verdade, um reflexo da luta entre Inglaterra e França, as grandes potências mundiais da época.
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A maçonaria, com a sua diversidade natural, também expressava essas contradições políticas, económicas e
estratégicas. Na Inglaterra, os maçons defendiam a monarquia constitucional e serviam como uma ponta de
lança da influência britânica sobre o mundo. Esta ideia de monarquia acabou dominando os primeiros tempos
da independência brasileira. Mas em França, como nos Estados Unidos (que fizeram a sua independência a
partir de 1776), os maçons defendiam o regime republicano, e divulgaram essa ideia por todo o mundo desde
a revolução começada em 1789 com a tomada da Bastilha. O ideário republicano dessas correntes maçónicas
teve consequências decisivas para os países da América espanhola.
Um dos motivos pelos quais a acção dos maçons da Inglaterra era mais moderada no começo do século XIX
surgia do facto de que lá não tinha sido necessária, no século XVIII, a violência da Revolução Francesa.
Desde os tempos de Francis Bacon, a influência rosa-cruz e maçónica era bem maior e mais forte na
Inglaterra, tornando a aceitação das ideias liberais algo natural. Já em França, as elites tinham-se negado a
aceitar qualquer modernização, apesar dos esforços de grandes maçons e de sábios notáveis como Alessandro
Cagliostro e o conde de Saint-Germain, na segunda metade do século XVIII. A influência dogmática do
Vaticano, muito forte em França, era pequena na Inglaterra. A irresponsabilidade cega das elites levou ao
banho de sangue da Revolução Francesa.
Esta diferença entre as maçonarias francesa e inglesa explica, em grande parte, as lutas entre José Bonifácio,
maçon moderado e monarquista constitucional, e a maior parte do movimento maçónico brasileiro, que era
mais radical, principalmente no plano verbal, e tinha forte tendência republicana.
Até alguns anos antes, Bonifácio era considerado traidor da causa da independência brasileira nos meios
maçónicos. A partir dos anos 1980, historiadores como José Castellani passam a fazer justiça ao “Patriarca da
Independência”. Por outro lado, a história oficial tem ignorado o papel fundamental do líder maçónico
Joaquim Gonçalves Ledo na nossa independência – porque Ledo, republicano e mais exaltado, era adversário
de Bonifácio. Hoje, as informações disponíveis já permitem uma posição equilibrada, capaz de reconhecer
tanto o valor de Gonçalves Ledo como o de José Bonifácio.
Não há dúvida de que os maçons republicanos foram influentes desde o começo do Brasil. Na Inconfidência
Mineira, de inspiração claramente maçónica, Tiradentes e os seus companheiros sonhavam com a República.
A bandeira do movimento era um triângulo, símbolo maçónico, com a inscrição “Liberdade Ainda que
Tardia”. Os iniciadores do movimento tinham sido admitidos pela maçonaria francesa e estavam
entusiasmados pela independência dos Estados Unidos. O movimento foi descoberto e os seus integrantes
passaram a ser presos a partir de Maio de 1789. Antes de morrer na forca e ter seu corpo esquartejado em 21
de Abril de 1792, Tiradentes declarou:
“Se eu tivesse dez vidas, eu as daria todas para que os meus companheiros não sofressem nada.”
Na verdade, a Inconfidência Mineira não estava ligada directamente à maçonaria, embora tenha sido
inspirada pelo ideal maçónico. A primeira associação maçónica no Brasil – que ainda não era uma loja
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“Eu El-Rei faço saber (…) que se tendo verificado pelos acontecimentos que são bem notórios o
excesso de abuso a que têm chegado as sociedades secretas (…) sou servido declarar por criminosas
e proibidas todas e quaisquer sociedades secretas de qualquer denominação que sejam…”
Mas o avanço das ideias liberais, estimulado no mundo inteiro pelas maçonarias inglesa e francesa, já era
inevitável. Os velhos regimes coloniais e as monarquias absolutistas tinham os dias contados. Em Portugal, a
revolução liberal de 1820 alterou radicalmente a situação e as Cortes (parlamento) portuguesas passaram a
pressionar Dom João VI. Quando finalmente o rei deixou o Brasil e voltou para Lisboa, em Abril de 1821, as
Cortes pretendiam fazer a sociedade brasileira voltar à situação de simples colónia, depois de ter sido sede do
Império, e isso acelerou a ruptura.
O príncipe regente D. Pedro fora aconselhado pelo seu pai a chefiar a independência caso esta fosse
inevitável. Em 9 de Janeiro de 1822, ele cedeu a um movimento organizado por José Joaquim da Rocha e
outros maçons e desobedeceu aos decretos 124 e 125 das Cortes portuguesas, que alteravam a estrutura
administrativa do Brasil e mandavam que o príncipe regente voltasse imediatamente para Portugal.
“Digam ao povo que fico”, anunciou D. Pedro, firmando uma aliança com os maçons.
Em 13 de Maio, a loja maçónica “Comércio e Artes” deu a D. Pedro o título de “Defensor Perpétuo do
Brasil”. Crescia a influência de Joaquim Gonçalves Ledo. Poucos dias depois, José Bonifácio assumiu o
cargo de ministro do Interior e do Exterior.
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Em 2 de Junho de 1822, meses depois do Dia do Fico, Bonifácio criou o Apostolado, organização semelhante
à maçonaria, e nomeou D. Pedro como seu chefe, com o título de “arconte-rei”. Meses antes do dia sete de
Setembro, um dos lemas do “Apostolado da Nobre Ordem dos Cavaleiros da Santa Cruz” era,
significativamente, “Independência ou Morte”. Como parte do juramento prestado ao ingressar na ordem,
cada novo membro do apostolado dizia:
“Juro promover, com todas as minhas forças e a custo da minha vida e riqueza materiais, a
integridade, a independência e a felicidade do Brasil, como império constitucional, opondo-me tanto
ao despotismo que o altera como à anarquia que o dissolve. Assim Deus me ajude.”
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As palavras do grito de Ipiranga, em 7 de Setembro, seriam, mais tarde, praticamente uma renovação desse
compromisso por parte do futuro imperador. Gonçalves Ledo e os principais líderes do movimento
emancipador eram membros do “Apostolado”.
A data da iniciação de D. Pedro na maçonaria não parece estar bem estabelecida. Alguns autores falam de
Maio de 1822; outros indicam o dia 13 de Julho. Segundo aquele que é talvez o principal pesquisador
maçónico da independência, José Castellani, D. Pedro foi iniciado na maçonaria apenas no dia 2 de Agosto.
De qualquer modo, em 17 de Julho, Ledo organizou as lojas maçónicas no Grande Oriente do Brasil e
ofereceu o cargo de grão-mestre a José Bonifácio, ficando com a posição imediatamente inferior, de primeiro
vigilante. Dois dias depois, uma carta de D. Pedro a seu pai deixava claro que a ruptura entre Brasil e Lisboa
já era total:
“O Brasil, senhor, ama a vossa majestade, reconhecendo-o e sempre reconheceu como seu rei; (mas
quanto às Cortes)… hoje não só as abomina e detesta, mas não lhes obedece, nem lhes obedecerá
mais, nem eu consentiria em tal…”
Em obediência à estratégia traçada por José Bonifácio, principal conselheiro do príncipe, em 1º de Agosto,
D. Pedro assinou um “Manifesto aos Brasileiros”, redigido por Gonçalves Ledo, e um decreto tomando
providências para a defesa militar e a vigilância dos portos brasileiros. Como proclamação da independência,
o “Manifesto” é muito mais claro e poderoso que o Grito do Ipiranga, de 7 de Setembro, e tem valor legal e
oficial, que o evento do riacho não possui. O nome do autor do Manifesto está claramente estabelecido. O
Barão do Rio Branco escreveu:
“Foi Ledo quem inspirou todas as grandes manifestações daqueles dois anos da nossa capital, quem
instigou o governo a convocar uma constituinte e quem redigiu alguns dos principais documentos
políticos, como o manifesto de 1º de Agosto de 1822, dirigido por D. Pedro aos brasileiros.”
No “Manifesto de Sua Alteza Real aos Povos deste Reino”, o príncipe regente proclama:
“Está acabado o tempo de enganar os homens. Os governos que ainda querem fundar o seu poder
sobre a pretendida ignorância dos povos, ou sobre antigos erros e abusos, têm de ver o colosso da
sua grandeza tombar da frágil base sobre que se erguera outrora… eu agora já vejo reunido todo o
Brasil em torno de mim, pedindo-me a defesa dos seus direitos e a manutenção da sua Liberdade e
Independência.”
Pedro acrescenta:
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“Acordemos, pois, generosos habitantes deste vasto e poderoso império. Está dado o grande passo
da vossa independência e felicidade há tanto tempo preconizados pelos grandes políticos da Europa.
Já sois um povo soberano; já entrastes na grande sociedade das nações independentes, a que tínheis
todo o direito… a Europa, que reconheceu a independência dos Estados Unidos da América, e que
ficou neutra na luta das Colónias Espanholas, não pode deixar de reconhecer a do Brasil (…). Que
não se ouça entre vós outro grito que não seja União. Do Amazonas ao Prata que não retumbe outro
eco que não seja Independência. Formem, todas as nossas províncias, o feixe misterioso que
nenhuma força pode quebrar…”
Independência, aqui, não implicava ainda total separação, mas sim uma completa autonomia:
“Acordemos, pois, generosos habitantes desse vasto e poderoso Império, está dado o grande passo
da Vossa Independência e Felicidade, há tanto tempo preconizadas pelos grandes políticos da
Europa. Já sois um Povo Soberano; já entrastes na grande Sociedade das Nações Independentes, a
que tínheis todo o direito.” [1]
Cinco dias depois desta declaração formal de independência, dirigida “Aos Povos do Reino do Brasil”, um
outro manifesto declara formalmente a independência, agora perante a comunidade internacional.
No “Arquivo Diplomático da Independência” [2] temos o documento de seis de Agosto de 1822, redigido
por José Bonifácio e assinado pelo príncipe-regente D. Pedro. Este segundo manifesto tem uma breve
introdução anexada a ele, que é intitulada, de modo muito claro:
“Sucinta e Verdadeira Exposição dos Factos que Levaram o Príncipe, Agora Imperador, e o Povo
Brasileiro a Proclamar o Brasil Como uma Nação Livre e Independente”.
“O Brasil foi uma colónia de Portugal até 28 de Janeiro de 1808, quando D. João VI, agora Rei de Portugal
e dos Algarves e naquele momento Príncipe-Regente, na sua passagem a caminho do Rio de Janeiro e
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estando na Bahia, declarou por uma Lei que os portos brasileiros ficavam livres e abertos a todas as
Nações.”
A introdução do Manifesto de Seis de Agosto traça então um breve histórico e lembra que, em 16 de
Dezembro de 1815, o Brasil foi “categoricamente” promovido à categoria de Reino – o Reino Unido de
Portugal, Brasil e Algarves.
O Manifesto de Seis de Agosto propriamente dito, dirigido “A Todos os Governos e às Nações Amigas”,
abre com os principais argumentos pelos quais o povo brasileiro “proclama a todo o Mundo a sua
Independência Política; e, como um Reino e uma Nação independente está resolvido a manter esse direito…”
“… eu, com o conselho dos Representantes populares, e na presença e sob a protecção de Deus
Todo-Poderoso, declaro e proclamo que o Brasil é uma Nação Livre e Independente, e que o
Governo Estabelecido é em todos os actos um Governo Independente e Soberano. E a todas as
nações amigas Eu declaro que os portos do Brasil estão livres e abertos ao Comércio…”
Todos esses dados, e inúmeros outros factos que os reforçam, estão indiscutivelmente documentados e
consensualmente estabelecidos. O Grito do Ipiranga, em Setembro, é uma ratificação da Declaração da
Independência feita mais de um mês antes. Foi mais um anúncio (feito pelo príncipe perante a sua própria
guarda pessoal e comitiva em viagem) de que o caminho escolhido seria trilhado até o fim.
No dia seguinte ao Manifesto de Primeiro de Agosto, D. Pedro parece ter sido iniciado na maçonaria, mas
não há consenso, entre os historiadores maçónicos, sobre a data exacta.
Três dias depois do Manifesto, ele foi elevado ao grau de mestre maçon. Em 7 de Setembro, ocorreu o Grito
do Ipiranga. Em 9 de Setembro, em reunião maçónica no Grande Oriente do Brasil, D. Pedro foi proclamado
imperador. Os acontecimentos precipitaram-se. Em 18 de Setembro ele escreveu a D. João VI anunciando
que o Brasil não obedeceria mais às Cortes portuguesas. Em 12 de Outubro foi aclamado publicamente como
imperador. O acordo entre José Bonifácio e os maçons, que era frágil de ambos os lados, desfez-se. A
maçonaria tinha exigido de D. Pedro três papéis assinados em branco e o juramento prévio da futura
Constituição, fosse qual fosse o seu texto. Como resposta, em 25 de Outubro, D. Pedro fechou o Grande
Oriente do Brasil, e, no dia 30, Bonifácio processou os principais líderes maçónicos.
Dia 3 de Novembro, Bonifácio ordenou a prisão de Gonçalves Ledo, mas ele escapou para a Argentina, onde
foi recebido com honras pelos dirigentes da maçonaria local.
Em 3 de Maio de 1823, foi finalmente instalada a Assembleia Constituinte. Em 7 de Julho, foi anulada a
condenação contra os líderes maçónicos e eles puderam voltar. José Bonifácio afastou-se do governo em 17
de Julho.
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O movimento maçónico participou em todas as lutas daquele período, e até do período posterior à
proclamação da República em 1889, expressando, pela sua actuação frequentemente desordenada e
contraditória, os talentos e as fraquezas da alma brasileira. Cumprida uma etapa histórica, a maçonaria
despolitizou-se, o que é bom.
Quando estudamos as décadas mais conturbadas do século XIX, em que não faltaram golpes e contragolpes
na vida política brasileira, é sempre oportuno lembrar dos versos do poeta inglês Alexander Pope (1688-
1744):
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No início do século 21, os sonhos de Tiradentes e Frei Caneca, assim como os projectos mais abrangentes de
José Bonifácio, só são desactualizados e contraditórios na sua superfície externa e aparente. Na realidade,
eles continuam essencialmente actuais, assim como os Manifestos que proclamaram a independência em 1 e
6 de Agosto de 1822.
O Brasil, visto como um povo, continua a acumular forças e avança passo a passo, naturalmente, na direcção
de uma maior independência nacional; sem pretender uma “separação” em relação ao resto do mundo, mas
apontando para a justiça social, a reforma agrária, a preservação do meio ambiente e – claro – a ética na
política e na administração pública
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“História do Grande Oriente do Brasil, A Maçonaria na História do Brasil”, de José Castellani, publicação do
Grande Oriente do Brasil, Brasília, DF, 1993, 359 pp., além de diversos apêndices.
“Itambé, Berço Histórico da Maçonaria no Brasil”, de Chico Trolha, Ed. Maçónica A Trolha, Londrina, PR,
Abril de 1996, 224 pp.
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