Esquema Fundam Da Logoterapia DEZEMBRO Word 2007
Esquema Fundam Da Logoterapia DEZEMBRO Word 2007
Esquema Fundam Da Logoterapia DEZEMBRO Word 2007
1. Introdução
2. A psicologia e as diferentes visões e abordagens de homem
3. O homem Viktor Frankl e o seu percurso científico inicial
4. A logoterapia: um estudo antropológico
5. Os conceitos fundamentais
5.1 A vontade de sentido
5.2 Frustração existencial
5.3 O vazio existencial
5.4 O sentido da vida
5.5 A essência da existência
5.6 O sentido do amor e do sofrimento
5.7 Transitoriedade da vida
5.8 As chamadas “técnicas” ou “assertivas da logoterapia”
5.9 O credo profissional segundo Frankl
5.10 A tese do otimismo trágico
5.11 Situações clínicas
5.11.1 Na literatura
5.11.2 Experiência pessoal
6. Considerações finais
7. Bibliografia
8. Anexos
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1. Introdução
O meu percurso até a psicologia foi um longo caminho. Interessado em muitas áreas,
iniciei um curso de Comunicação Social, não satisfeito iniciei medicina e, em crise com a
medicina passei a pensar na psiquiatria como alternativa, mas já neste tempo a minha busca
era por uma ciência que privilegiasse o relacionamento como caminho para a saúde. Foi neste
contexto que conheci a psicologia, da qual passei a ser um entusiasta.
Os anos ’80 eram ainda marcados pelos fortes movimentos estudantis e movimentos
de massa. Na sociedade, tudo era passível de questionamentos e a tônica era o feminismo, a
sexualidade como um todo e os questionamentos abalavam as estruturas ou qualquer que
fosse a ordem estabelecida. Na faculdade, porém, a Psicologia já não me parecia responder às
questões fundamentais do Homem. Na medida em que os valores (família, a religião, o “ser”
substituído pelo “ter”) perdiam espaço na sociedade, eu percebia uma Psicologia por
demasiado centrada no passado do indivíduo, nas situações de causa e efeito e pouco atenta à
situações do “presente” e mesmo “desatenta”, eu diria, do “futuro” enquanto projeto ou
mesmo perspectivas de um vir a ser do homem.
“Esta psicologia não resolve as questões fundamentais do homem”, era uma minha
certeza. Um primeiro contato com Martin Buber - “Eu e Tu” – foi um primeiro sinal que a
Psicologia poderia ser diferente. Na faculdade, dentro de uma mesmice entre os professores,
percebia que um deles tinha uma postura profissional diferente. Competente e reconhecido
entre os estudantes, não por isso deixava de ser próximo e disponível e não por isso deixava de
expressar um quase permanente sorriso. “Realizado”, pensava eu. Pois foi ele quem me
chamou a atenção para um evento a ser realizado na universidade, o I Congresso Internacional
de Logoterapia, com a presença de Viktor Emil Frankl.
O congresso foi um sucesso e mais que o congresso, a figura de Frankl foi uma
resposta. “A vida sempre tem um sentido”, afirmava ele, com convicção de quem tinha feito –
possivelmente – uma das experiências mais dolorosas da humanidade. Foram mais de três
anos nos campos de concentração nazistas e as condições sub humanas, a fome, a miséria
extrema, o trabalho escravo e as condições próprias da guerra, com mortes e destruição de
inteiras cidades não foram suficientes para mudar esta convicção mas, ao contrário, a
reforçaram. De fato, Frankl percebeu que o sentido da própria existência não pode ser
atribuído, mas deve ser permanentemente descoberto. Como ele próprio conta, o perceber a
importância e o sentido de escrever as suas convicções para a posteridade da ciência o
mantiveram vivo. Para muitos, assegura Frankl, a vida no campo de concentração tinha um
sentido enquanto havia esperança de reencontrar os familiares ou esperança de reconstruir a
própria vida no pós-guerra. Para os prisioneiros, o saber que os familiares, sentido e razão da
própria existência, não estavam mais vivos ou, por qualquer motivo, o não perceber o sentido
da própria existência era razão para “atirar-se nos fios” da cerca elétrica. Em outras palavras,
porque viver se a vida não tem um sentido? Frankl cita Nietzsche, quando diz “quem tem um
porquê viver suporta qualquer como”.
A psicologia não pode não refletir o pensamento da sua época, visto que não somente
o “objeto” do estudo da Psicologia é o próprio Homem, mas o ‘pesquisador’, ou seja, aquele
que busca conhecer o homem estará sempre inserido em um contexto cultural que dá
também ao ‘pesquisador’ – o homem – as ‘ferramentas’ a serem utilizadas nesta ‘pesquisa’.
Nos anos 50, a cultura do pós-guerra buscava respostas para as muitas questões
pendentes e forma um ótimo fermento para o proliferar de novas idéias a respeito do homem.
Tanto que em contraposição às concepções de homem vigente então na Psicologia –
determinista e condutivista – consolidaram-se duas novas grandes correntes: uma
denominada Psicologia Humanista, com berço nos EUA e outra Psicologia Existencial, com
berço na Europa. Em ambas as escolas existem experiências ou pensamentos anteriores, como
que “precursores” desta própria escola. (García Pintos, 1988).
Embora existam semelhanças em ambas as escolas, pois ambas nascem como fruto de
um questionamento à psicologia vigente, ao seu ‘modus operandi’ – existem também
diferenças significativas. (As semelhanças, porém, permitem que passem a coexistir os
chamados “existenciais-humanistas”, ou seja, quem identifique como correta ou completa
uma visão do Homem que integra aspectos de ambas as teorias.) (** poderia simplesmente
cancelar a afirmação acima, mas, ver o texto abaixo ... e ver Pintos, pg 49 e seg) Segundo
Pintos, o existencialismo europeu é gerado em uma raiz cultural fortemente filosófica,
característica da cultura européia e “simultaneamente, na América cresce um movimento com
semelhantes inquietudes e orientações parecidas, que concluirá constituindo a corrente
humanista”. Possivelmente, conclui o Autor, aspectos sociais fizeram com que o movimento
americano se desenvolvesse sem interrupções, ao contrario do movimento europeu, no qual
“analistas existenciais do porte de Biswanger, Boss, Caruso e o próprio Frankl (entre outros),
seguiam suas investigações em meio a fortes perseguições políticas.”
Garcia Pintos cita o processo histórico europeu, as origens e formação de Frankl para
apresentá-lo “inequivocamente como um autor existencial (...) com uma base filosófica muito
forte que dá substancia ao corpo teórico”. Segundo Garcia Pintos, porém, “poderia dizer-se
que Frankl é o mais “humanista” de todos os existencialistas europeus pelo seu aspecto ou
matiz cheio de esperança e otimista da sua teoria e o critério pragmático da sua terapia”. (C. G
Pintos, pg 52.)
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Sutich e juntos começam um movimento convocando colegas a trabalhar em temas como o
amor, a criatividade, a autonomia, a auto realização, a liberdade. Autores como Rollo May,
Murray, Allport, em torno de 1950 terminam conformando uma escola que denominam
Psicologia Humanista, que aparece como uma “terceira força”, que pretende ser uma resposta
aos erros do condutivismo e da psicanálise freudiana. Em 1959 se organiza o “I Simpósio de
Psicologia Humanista” e em 1961 aparece o “Journal of Humanistic Psychology”. O Jornal de
Psicologia Humanista, em 1964 coloca os cinco princípios básicos da psicologia humanista:
O existencialismo europeu, por sua vez, tem raízes mais antigas. Kierkegaard (1813 – 1855,
considerado o pai do existencialismo) Husserl (1859 – 1938, criador da fenomenologia), e
Heidegger (1889 – 1976, possivelmente a grande figura do existencialismo contemporaneo),
todos nasceram no século XIX, mostrando o quanto o existencialismo se constrói em uma
longa historia e no contexto europeu, de guerras e luta quase permanente pela sobrevivência.
Frankl assinala que a Logoterapia condivide importantes conceitos de Karl Jaspers (1883 –
1969), Max Scheler (1874 – 1918), Nicolai Hartmann (1822 – 1950), que serão abordados
oportunamente.
“Bergson restitui à filosofia o seu domínio mostrando que a ela não se podiam
aplicar de forma alguma os progressos que eram próprios da ciência” (R.
Maritain, 1952). Por sua vez, o filósofo alemão Edmund Husserl (1859 – 1938)
chamou de fenomenologia o seu trabalho, com grande repercussão também
na psicologia. Entre os discípulos alemães podemos destacar Martin
Heidegger, Edith Stein, Max Scheler e Nicolai Hartmann. Na França,
destacaram-se Jean Paul Sartre, Maurice Merleau-Ponty e Gabriel Marcel e na
Espanha cabe destacar José Ortega y Gasset. (in Xauza, pg 60 e 61).
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“Embora, em sua origem grega, a palavra fenômeno significa aparência, a
fenomenologia busca ultrapassar as aparências e chegar ás essências. Seu
método trata de descobrir o fenômeno, isto é, aquilo que se dá
imediatamente. O fenômeno de que fala ela não é a aparência e sim a
manifestação da coisa mesma, do ser em si.”
Mas talvez a mais clara distinção entre humanismo e existencialismo refere-se ao fato
que os humanistas percebem no homem uma capacidade interior de crescimento, de auto-
superação, de auto-atualização e colocam o exemplo da semente, que contém em si um todo
completo, capaz de constituir-se por si só. Os existencialistas, por sua vez, consideram como
fundamental o fato que o homem se constitui na própria existência, ou seja, existe somente o
nada, a partir do qual o homem se constitui, como um “ser-ai”, conforme Heidegger.
Em 1985 Frankl ressaltava: “A quebra das tradições deixa um vazio, pois o homem de
hoje não tem mais a orientação clara do que fazer.” Paralelamente, sendo o homem um “ser-
em-relação”, no vazio das tradições, que anteriormente mostravam um caminho e podiam dar
um sentido para o quotidiano, na ausência destas, entram novas possibilidades, como
riquezas, entre as quais a qualidade do relacionamento interpessoal. Frankl irá descobrir,
vivenciando o clima da I Guerra Mundial e o doloroso pós-guerra e mais tarde a II Guerra
Mundial e os campos de concentração, o quanto a questão dos valores e do sentido permeiam
a realização do homem, podendo ser um “sinal” de esperança ou desespero, de vida ou de
morte.
Da infância Frankl recorda uma família afetuosa, citando o fato de acordar-se com a presença
do pai que o contempla carinhosamente. Desde muito pequeno dizia que seria médico, mas
um médico diferente, que “não usaria remédios para curar as pessoas”. Os questionamentos
intelectuais, a curiosidade permanente, a profundidade das suas reflexões deram-no o título,
ainda na infância, de “o pensador”.
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Frankl, nascido em 1905, tinha 9 anos no inicio da I Grande Guerra. O pós-guerra trouxe
dificuldades também para a família Frankl, a ponto de mendigar pão e realizar qualquer
trabalho. Ingressou no Realgymnasium, por onde transitou também o autor do paradigma da
época, Sigmund Freud; se interessa pelas ciências naturais, pelos primeiros trabalhos de
psicologia experimental e autores como W. Oswald e G. T. Fechner. A inquietude do
“pensador” se reflete em questionamentos como este, relatado pelo próprio Frankl:
“Recordo bem a reação que tive aos treze anos, quando fui submetido á um ensinamento
redutivo. Nosso professor de ciências naturais estava explicando que a vida, em última análise,
não era que um processo de combustão, um processo de oxidação. Então fiquei de pé em um
salto e exclamei ‘Professor Fritz, se é assim, que sentido tem a vida?’” Esta inquietude não foi
alimentada somente pelos ensinamentos reducionistas, mas também pelo clima reinante em
Viena, no qual o suicídio de jovens desesperados e destruídos moralmente era um fato
cotidiano. Pintos sinaliza que a época foi marcada por três “convulsões”: uma convulsão
política, com uma paz instável, uma convulsão social, com a destruição, desemprego e
diferentes demandas sociais e um clima de convulsão científica, com os trabalhos realizados
por Freud. Neste contexto, três episódios são marcantes e mantém particularmente viva a
inquietude do jovem Frankl, então com 16 anos: primeiro, o suicídio de um colega, com um
livro de Nietzsche em mãos; um fato de forte impacto, mas que o leva a confirmar a sua
suspeita de estreita relação entre o filosófico cosmovisional e o modo pessoal de enfrentar as
situações de vida. Como segundo fato, interessado pela compreensão do fenômeno humano e
o seu significado, Frankl se anima a escrever uma carta ao “mestre” Sigmund Freud. Com
grande excitação recebe uma resposta e um convite a continuar a correspondência. Como
terceiro e último fato, o periódico “Der Tag”, o convida, em 1923, a escrever quatro artigos
com referencia aos problemas existenciais da juventude crescida no clima depressivo do pós-
guerra, um tema muito afinado com os seus interesses.
Destes fatos, podemos nos deter no segundo. Conta Frankl: “Ele respondia imediatamente as
minhas cartas. Um dia coloquei no papel tudo o que me vinha em mente acerca da gênese da
mímica da afirmação e da negação, anexei uma carta e mandei tudo a Freud; assustei-me
quando me escreveu dizendo que tinha apresentado na Internationale Zeitschrift fur
Psychoanalyse (Revista Internacional de Psicanálise), onde de fato, o texto foi publicado em
1924”. O primeiro encontro pessoal com Freud, porém, foi casual “e demasiado tarde”,
segundo o próprio Frankl. Adler já havia se separado de Freud, um episódio de grande
repercussão na sociedade científica e Frankl, naquele momento, simpatizava com os princípios
adlerianos. “Eu havia entrado na esfera de influencia de Adler e já tinha decidido publicar o
meu segundo trabalho cientifico na ‘Revista Internacional de Psicologia Individual’”, o que
ocorreu em 1925.
O ano de 1927 foi de profunda crise na sociedade adleriana. O fato mais marcante foi a
expulsão de Allers e Schwarz. Frankl passou a ser ignorado por Adler e seu livro 2 – pronto para
ser impresso – deixado de lado. Embora não visse motivo para deixar a associação, Frankl foi
expulso alguns meses mais tarde. Em 1939 uma revista suíça publicou uma síntese do não
impresso livro “Philosophie und Psychotherapie”, uma tentativa de aproximação da filosofia
com a psicoterapia, que aborda quatro temas fundamentais: 1) sustenta que a psicanálise
atende especialmente as pulsões do homem, esquecendo, no entanto, a totalidade corporal,
psíquica e espiritual da pessoa humana. 2) coloca uma crítica à atitude do psicoterapeuta que
se esquiva na abordagem dos problemas existenciais dos pacientes. 3) estabelece que o
paciente “deve” ser interpelado plenamente em sua liberdade e responsabilidade, no que
podemos reconhecer um gérmen do futuro “modus operandi” da logoterapia, ou seja,
apelando para a liberdade e responsabilidade do paciente o motivamos para que modifique a
sua atitude diante da situação que se coloca como um problema. 4) enuncia a importância de
não descuidar-se na clínica o tema dos valores.
1
Embora não seja possível uma tradução exata, significa “O homem no quotidiano”. Interessante notar
que Frankl afirmava ser o homem, por ser portador de espírito, capaz de perceber os valores e portanto,
intuir e distinguir o melhor para si. Desvelar os valores para que o homem do quotidiano possa assumir
o próprio caminho era o objetivo da revista.
2
Em 1939 uma revista suíça publicou uma síntese do livro “Philosophie und Psychotherapie”, uma
tentativa de aproximação da filosofia com a psicoterapia, que aborda quatro temas fundamentais (ver
pg 26 livro G Pintos).
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Frankl conclui o curso de medicina em 1930, tempo no qual havia fundamentado o seu núcleo
teórico estudando Max Scheller. O pensamento de Frankl consistia em crer que a pessoa
humana tem em si mesma – à semelhança com o humanismo – a possibilidade de dar a si
mesma um significado à sua própria existência e que o terapeuta tem a função de sustentar o
paciente na busca e realização deste significado. Em 1936 Frankl conclui uma dupla
especialização em neurologia e psiquiatria.
“Qualquer homem podia, inclusive sob tal circunstancia, decidir o que seria
dele – mental e espiritualmente – pois mesmo no campo de concentração se
pode conservar a dignidade humana. É esta liberdade espiritual, que não nos
podem arrebatar, que faz que a vida tenha sentido e propósito” (1982).
(...) Nós o conhecemos no campo de concentração, onde tudo o que não lhe
era essencial foi jogado fora... Sobrou o que ele não pode ‘ter’, mas o que ele
deve ‘ser’. O que restou foi o próprio homem, em sua essência, queimado pela
dor, dissolvido pelo sofrimento – o elemento humano em sua quintessência”
(Frankl, 1978).
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O fato que Frankl chama a sua teoria de “logo”, ou terapia centrada no sentido,
propõe o quanto o ‘sentido’ tenha um caráter exponencial para Frankl. De fato, este é, já, o
primeiro indicativo do ‘eu’ em Frankl: o ‘eu’ frankleano não é movido pela busca do prazer ou
do poder, referindo-se às duas grandes correntes da sua época, preconizadas por Freud e
Adler. Hoje, no contexto das demais correntes marcadamente existenciais, podemos
completar que o ‘eu’, segundo Frankl, vive “a” angustia de encontrar um sentido para a
própria existência, enquanto que para os demais (Sartre, Heidegger) o homem vive a angustia
do nada, do ‘não-ser’ ou a angustia do permanente ‘decidir’. Quis o destino que Frankl fizesse
em primeira pessoa o que ele chamou de “experimentum crucis”, ou seja, tres anos prisioneiro
em campos de concentração, onde a finalidade dos algozes não era somente ganhar uma
guerra, mas sim destruir um grupo, uma raça e onde a existência passava a ser “um número”
(Frankl, "Em busca de sentido", Vozes).
Neste ponto cabe ressaltar que caíram muitos “determinismos”, não somente os
psíquicos, mas também os sociais e aparece com força a “vontade de sentido” como coloca
Frankl.
Consciente que as questões do sentido e dos valores estão entre os tópicos mais
polêmicos, cito uma experiência clínica freqüente, quando coloco a seguinte questão para o
cliente: busco que recorde, da sua memória, duas disciplinas do curso médio que lhe eram
uma, a mais fácil e agradável e outra, a mais difícil; supondo que tenham sido História e
Matemática, faço imaginar que ele, cliente, está em um período de exames/testes e que
recebe, neste momento, estas duas provas e em ambas a mesma nota: 8,0! O momento
seguinte é ‘clássico’: qual das duas notas lhe dá mais satisfação? Bem, deveria deixar um
momento para reflexão, mas antecipo que em grande parte – não na totalidade e por isso
cabe um esclarecimento – as respostas são que a nota 8,0 para a disciplina mais difícil tem
mais ‘valor’! E por que teriam mais valor? Porque significaram mais esforço e este esforço
confere um ‘valor’, mesmo se a nota é a mesma para ambas as disciplinas! Bom, esta resposta
não é absoluta, pois algumas pessoas não percebem em um primeiro momento esta questão
do valor intrínseco no esforço. Significa que não existe ‘valor’ no esforço? Eu não diria tanto,
mas poderia confirmar que os ‘valores’ sempre serão únicos e exclusivos de cada indivíduo.
Exemplificando ainda, chamo a atenção para as muitas situações de consultório, onde
encontramos filhos adolescentes que tiveram as suas dificuldades (crises e dificuldades na
escola, por exemplo) sempre resolvidas pelos pais. Que resultados nós encontramos?
Adolescentes com as necessidades materiais satisfeitas, mas que buscam um algo, seja o
próprio limite, seja o valor que lhe foi negado, por não realizar o esforço que a vida lhe
colocou.
Uma das contribuições mais significativas de Frankl tem a ver com a ‘estrutura’ do Eu e
Frankl usa a proposta de Freud para introduzir um novo conceito de ‘inconsciente’, sem antes
redimensionar também o EU ou o Ego. Segundo Frankl, Freud faz com que o ID apareça como
o verdadeiro EU, ou seja, ocorre uma “Ideificação”, visto que o Ego é subjugado, e o Homem
um ser fundamentalmente ‘impulsionado’; afirmando o Homem como um ser
fundamentalmente livre, Frankl afirma também que o Inconsciente contém em si um elemento
‘espiritual’, elemento este que confere uma capacidade de auto-transcendência que lhe são
específicas e únicas.
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Em termos de clínica, estas afirmações são fundamentais, visto que, sendo o homem
um ‘buscador de sentido’, pode o terapeuta perceber a eventualidade de ‘propor’ um valor,
que poderá ou não ser percebido como tal pelo cliente. Frankl conta um dos seus casos clínicos,
mostrando que tal valor pode ser percebido: um senhor de idade avançada, relata tristeza e
depressão após o falecimento da esposa, com a qual convivera muitos anos; percebendo a
presença do amor que uniu o casal, Frankl questiona:
“Como estaria ela se o senhor tivesse falecido antes?”. “Muito mal, não sei se teria
forças para superar”, responde o cliente.
- Entendo. O teu amor por ela justifica este sofrimento, que o somente o senhor pode
vivenciar e assim fazendo, o teu sofrimento é suficiente e necessário para que não seja
ela a pagar por isso.
Frankl (Quadrante, 2003) em sua “imago hominis”, define o homem como “unidade
apesar da pluralidade: porque há uma unidade antropológica, apesar das diferenças
ontológicas”. Frankl propõe uma imagem de homem baseada em analogias geométricas.
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projetado no sentido horizontal, resultará um retângulo e projetado no sentido vertical
resultará em um círculo, ambos como um corpo fechado, embora o copo seja um corpo
aberto;
Para concluir, Frankl ressalta que “á luz da ontologia dimensional, o caráter fechado do
sistema de reflexos fisiológicos e de reações psicológicas não está em contradição nenhuma
com a humanidade do homem. Parece-nos igualmente claro que os resultados obtidos nas
dimensões inferiores continuam a ter a mesma validade que antes, dentro dessas dimensões.”
E neste contexto, Frankl recorda algumas pesquisas unilaterais como a reflexologia de Pavlov,
o behaviorismo de Watson, a Psicanálise de Freud e a Psicologia Individual de Adler. Em se
tratando de projeções ou de reducionismos, conclui-se que deva existir uma dimensão
“superior” ou “mais compreensiva, que inclui e abarca uma dimensão inferior” de maneira a
encontrarmos o homem em sua totalidade. Esta dimensão superior ou mais compreensiva é
aquela que abarca ou compreende o espírito, ou o espiritual, como Frankl prefere chamar.
Continuando a justificar a sua ontologia dimensional, Frankl diz (Quadrante, 2003, pg 47):
O homem, portanto, como o entende Frankl, deve ser entendido como um ser bio-
psico-espiritual. Chegamos ao ponto, no entanto, de nos perguntarmos: o que Frankl fala
sobre e como define “espírito”?
“Como o espírito não é uma substancia, Frankl prefere evitar o uso do substantivo
“espírito”, referindo-se a ele, então, como “o espiritual”. O espiritual contém dois aspectos:
um enquanto dimensão constitutiva do ser humano e outro enquanto manifestação desta
dimensão.
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todas as suas manifestações são livres. O espiritual não é transmissível, pois o que herdamos é
o elemento corporal e o psíquico. Outro sinônimo de espírito3 é “persona”. (Guberman &
Soto).
5. Considerações finais
Além disso, possivelmente a morte seja um dos temas mais “perturbadores” entre os
tantos abordados pela psicologia. Mas o que a psicologia pode dizer aos prisioneiros e
particularmente aos condenados á morte? Frankl relata em uma entrevista, (Xauza, 1988) uma
sua experiência a respeito, mostrando um pouco o porque deste distanciar-se de outras
escolas.
“Há alguns anos a revista americana Newsweek publicou a primeira entrevista dada
por Benigno Aquino (filipino, líder político), contando sobre como tinha sido possível suportar
o isolamento por tanto tempo. Ele responde ter recebido, na prisão, um livro de um psiquiatra
vienense. Era o meu livro, onde eu explicava como, em qualquer situação, uma pessoa sempre
conserva a liberdade para escolher esta ou aquela atitude. Aquino respondeu que foi o livro
quem deu a força necessária para suportar o isolamento. (...) Fui convidado pelo diretor do
presídio San Quentin (EUA), para fazer uma conferencia, a pedido dos prisioneiros, que haviam
lido o meu livro. Na ocasião, ainda havia uma camara de gás e prisioneiros condenados á
morte, que também ouviram minhas palavras. Eu estava acompanhado por professores da
Universidade da California e ao fim da conferencia, eles perguntaram aos presos o que haviam
achado, queriam saber as reações destes homens que iam morrer dentro de algum tempo. Os
prisioneiros disseram que se beneficiaram muito com a conferencia. Disseram ter ouvido
dezenas de psiquiatras, psicólogos e psicanalistas, que vinham a San Quentin. Eles diziam aos
presos sempre a mesma coisa, que eles estavam ali porque eram vítimas, seja do seu passado,
de sua situação social, vítimas da educação, vítimas dos guetos negros. “E nós odiamos ouvir
isto”, disseram os prisioneiros
3
(*No original consta: “Otro sinônimo de lo espiritual es “persona”, o que em tradução literal significa
que o Autor coloca “persona” como equivalente a “espiritual”, conforme a preferência de Frankl, citada
anteriormente. No português, porem, “espiritual” ficaria muito identificado com o adjetivo.)
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