EMILIANAPOMARICORIBEIRO Dissertação
EMILIANAPOMARICORIBEIRO Dissertação
EMILIANAPOMARICORIBEIRO Dissertação
São Paulo
2014
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São Paulo
2014
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Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa desde que citada a fonte.
Catalogação na publicação
Serviço de Biblioteca e Documentação
Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo
Dados fornecidos pela autora
Banca Examinadora
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela vida e pelas oportunidades e pessoas que colocou em meu caminho.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Paulo Nassar, pela amizade, pelas preocupações e
atenções constantes, por acreditar no meu potencial e por toda a valiosíssima inspiração
diária, refletida em orientações que me fazem crescer profissional, pessoal e
academicamente.
À Profa. Dra. Margarida Kunsch, pelos ensinamentos, pelo carinho e pela dedicação
com que me acompanha desde a graduação.
Ao Prof. Dr. João Carrascoza, pelas palavras sempre inspiradoras que afetam o meu
jeito de sentir e ver o mundo e elevam meus pensamentos.
À Profa. Dra. Marlene Marchiori, por quem tenho grande admiração pelos estudos,
pelo tempo dispensado para ser parte de minha banca.
À querida Daniela Queiroz, pela amizade, pela paciência, atenção, carinho e disposição
em me ajudar em cada etapa deste mestrado, desde as ideias iniciais do projeto até a
concretização deste sonho.
Aos meus colegas de trabalho Mateus Furlanetto, Else Lemos, Jovanka Mariana, Carlos
Ramello, Elan Oliveira, Andre Nakasone, Priscila Fiorelli, Carolina Modesto, Ana
Cláudia Paro, Raquel Vandromel, Nara Almeida e Michael Povoação, que torceram por
esta minha conquista.
À querida Gisele Souza, por toda a disposição para a revisão deste trabalho e pelas
grandes dicas e ao querido Rodrigo Cogo, por todas as inspirações, pelos incentivos e
pela leal parceria, que me fazem crescer e ter a certeza que não preciso ter medo no
caminho que estou trilhando.
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE TABELAS
LISTA DE FIGURAS
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................14
2. AS TRANSFORMAÇÕES DA COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL...................................................................................... 17
2.1 Comunicação organizacional: um campo de estudos em constantes
mudanças e evoluções..................................................................................17
2.2 Novos contextos............................................................................................23
2.2.1 O contexto pós-moderno...................................................................24
2.2.2 O contexto digital..............................................................................27
2.2.3 O contexto complexo.........................................................................32
2.2.4 O contexto metapórico e afetivo........................................................34
2.2.5 Consequências dos novos contextos..................................................37
2.3 As transformações contemporâneas sobre o sentir..................................38
2.3.1 O enfraquecimento das experiências e das afetividades....................38
2.3.2 O empobrecimento das memórias e a crise das narrativas................42
4. AS NOVAS NARRATIVAS.............................................................................65
4.1 As narrativas comunicacionais entre a tradição e a inovação.................65
4.2 O paradigma narrativo...............................................................................68
4.3 Os mitos, os rituais e o simbólico nas narrativas organizacionais..........78
4.4 A memória na construção de narrativas organizacionais........................80
4.5 A força do audiovisual nas novas narrativas............................................86
4.6 Storytelling....................................................................................................89
13
5. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS....................................................97
5.1. Enfoque da pesquisa...................................................................................98
5.2. Metodologia de pesquisa............................................................................99
5.2.1. Tipo de estudo......................................................................................99
5.2.2. Método de pesquisa............................................................................100
5.2.3. Estratégia de coleta de dados..............................................................101
5.2.4. Operacionalização da coleta de dados................................................104
5.2.5. As entrevistas......................................................................................104
5.2.6. Definição da população e da amostra.................................................105
5.2.7. Seleção dos entrevistados e caracterização da amostra......................106
5.2.8. Técnica de análise de dados................................................................107
5.2.9. Categorias de análise..........................................................................109
5.2.10. Esquema da pesquisa........................................................................114
5.3. Apresentação, análise e interpretação dos resultados...........................114
5.3.1. Perfil dos entrevistados.......................................................................115
5.3.2. Resultados gerais................................................................................117
5.3.3. Como cada categoria aparece nos depoimentos de vida.....................121
5.3.4. Média da frequência das categorias em todos os depoimentos..........156
5.3.5. Interpretações significativas sobre os resultados................................160
6. CONCLUSÃO..................................................................................................173
REFERÊNCIAS.....................................................................................................176
ANEXOS.................................................................................................................189
Anexo A: Transcrições das entrevistas analisadas.............................................189
14
1. INTRODUÇÃO
comunicação interna pode, de fato, ser afetiva e efetiva. Além de resumir os principais
desafios e as oportunidades para a comunicação interna sobre todos estes pontos em
discussão.
O capítulo seguinte introduz o conceito de novas narrativas, sobre a
compreensão do paradigma narrativo como uma possibilidade adequada para as
comunicações nos novos tempos. As ideias pretendem unir conceitos e reflexões da
narratividade e da contação de histórias aos processos comunicacionais como
potencializadores das emoções, das sensações e da reumanização dos ambientes
racionais, técnicos e objetivos das organizações. Para isso, há o aprofundamento de
questões ligadas as narrativas como a construção dos mitos, dos rituais e do simbólico,
além de reflexões sobre a importância da memória, esquecida e enfraquecida nos
tempos atuais, tão necessária para a consolidação das narrativas.
Ao final deste capítulo busca-se um esclarecimento sobre o conceito de
storytelling, como exemplo de nova narrativa e há o destaque para as micronarrativas
afetivas, tendo-as como possibilidades de ação estratégica para a comunicação interna,
baseadas sobre as teorias e técnicas do storytelling organizacional, para gerar um
possível reencantamento para a comunicação, sobretudo para a comunicação interna.
O último capítulo trará os conteúdos e análises de pesquisa sobre depoimentos
de funcionários e ex-funcionários – micronarrativas afetivas - de oito diferentes
organizações. O objetivo principal desta pesquisa empírica será verificar se os
entrevistados, pessoas comuns, vivendo seus cotidianos de trabalho nas organizações,
expõem – ou não – suas emoções, seus sentimentos de pertencimento e de
reconhecimento de si próprios, os valores mitológicos da organização e seus próprios
valores, seus atos heróicos, a disseminação de seus conhecimentos e suas identificações
em relação às organizações, sejam elas positivas ou negativas, como suas
vulnerabilidades, ao narrarem suas experiências e suas memórias em relação ao mundo
organizacional.
Com isso, esta pesquisa buscará compreender a força e a riqueza de informações
que podem existir nos relatos das pequenas partes que compõem a organização de forma
que, ao descrever, esclarecer e entender o conteúdo exposto em tais micronarrativas,
passa a ser possível refletir como a comunicação interna pode trabalhar de maneira mais
efetiva para gerar envolvimento, reconhecimento, identificação, compreensão e ação de
seus funcionários.
17
rejeitar a teoria anteriormente aceita em favor de outra incompatível com aquela - teoria
envolta ao que Kuhn (1982) chama de “paradigma”.
O “paradigma” é um modelo ou padrão aceito pela sociedade até o momento em
que, através deste, não se conseguem mais resolver os problemas pesquisados e
irregularidades são provocadas, surgindo então crises que vão gerar um novo
paradigma. “O fracasso das regras existentes é o prelúdio para uma busca de novas
regras” (KUHN, 1982, p.95). Os momentos de crise sobre determinados pensamentos
indicam que é chegada a ocasião para a renovação dos instrumentos, das técnicas, das
teorias e das conceituações.
Assim como todo pensamento científico, o campo da pesquisa em comunicação
organizacional também está em constante dinamismo e desconstrução/reconstrução. A
comunicação organizacional para Riel (1995) engloba as diferentes formas de
comunicação utilizadas por uma organização tais como: relações públicas, estratégias
organizacionais (public affairs), marketing corporativo, propaganda corporativa,
comunicação interna e externa, direcionadas para os públicos de interesse ou segmentos
com os quais a organização se relaciona. É o mesmo entendimento conceitual que
Nassar e Figueiredo (1995, p.19) tem sobre a comunicação empresarial ao comentar de
forma pioneira o ambiente comunicacional e relacional brasileiro: "é a somatória de
todas as atividades de comunicação da empresa. Elaborada de forma multidisciplinar".
Margarida Kunsch (2003), por sua vez, coloca a comunicação organizacional
como uma estratégia que pode ser utilizada como elemento de diferencial competitivo
por parte das empresas e Paulo Nassar, Mateus Furlanetto e Suzel Figueiredo (2009,
p.9) dizem que a comunicação organizacional está associada ao sucesso ou ao fracasso
das reestruturações patrimoniais das fusões e aquisições, às inovações tecnológicas, de
processos de produtos, aos processos de gestão da qualidade, do meio ambiente e de
riscos, à prestação de contas aos acionistas, aos rituais de reconhecimentos e de
passagens organizacionais, uma vez que trata das políticas de relacionamento das
empresas e instituições com a sociedade e com os inúmeros públicos.
Sendo assim, considerando que a comunicação organizacional é um campo de
estudos que diz respeito aos processos de comunicação que caracterizam as
organizações, ela apresenta grandes mudanças de paradigmas durante sua história e
evolução, uma vez que os estudos tendem a verificar o processo de comunicação de
acordo com as necessidades e os pensamentos das organizações em seu contexto social,
histórico, econômico, cultural e político.
19
baseada na imposição dos locutores por esquemas técnicos, sendo que os indivíduos
respondem a estímulos externos de uma maneira mecânica, de forma que os processos
sociais, psicológicos e econômicos são percebidos mais como sendo entidades estáticas
(BOUZON, 2011).
Isso indica a organização como uma entidade única, com sua cultura formada
independentemente das pessoas que dela fazem parte e a presença de um caráter mais
informativo da comunicação, visualizando-a apenas como um meio, uma ferramenta,
para atingir os objetivos organizacionais (MARCHIORI, 2008).
A década de 1950 foi marcada pelo aparecimento de publicações especializadas
no campo e o nascimento dos primeiros cursos de licenciatura. Charles Redding
considerou este momento como “de cristalização dos estudos”, quando houve
reconhecimento acadêmico da área e começaram a surgir pesquisas e as primeiras teses
de doutorado, dando maior abertura aos estudos da comunicação no âmbito das
organizações (KUNSCH, 2009, p.65). Os estudos até 1960 eram centrados na
comunicação de negócios e na comunicação industrial, com preocupações sobre as
habilidades comunicativas e a eficácia dos meios de comunicação.
Porém, já por volta da década de 1960, 1970, o positivismo entra em declínio,
surgindo contra-argumentações sobre a posição teórica neutra do investigador, agora
visualizando que ele pode influenciar nas observações a partir de sua interpretação. É
quando surgem novas argumentações contra a objetividade absoluta do positivismo e a
falta de metódos que comprovem sua eficiência pelos sentidos e subjetividades (RUÃO,
2005).
Um momento marcante dessa transição, na década de 1980, foi a edição do livro
“Comunicação e organizações: uma abordagem interpretativa”, de Linda Putnam e
Michael E. Pacanowsky, de 1983, resultado da “Conferência sobre Abordagens
Interpretativas ao Estudo da Comunicação Organizacional”, em Alta – Utah (1981), em
que se discutia sobre preocupações de análise das dimensões simbólicas das
organizações. E a edição especial do Western Journal of Speech Communication
(WGSC, de 1982), que focava a pesquisa interpretativa da comunicação organizacional
(KUNSCH, 2009, p.68).
Assim, abre-se a oportunidade para um estudo baseado na perspectiva
interpretativa que considera os seres humanos em sua condição de atores sociais e suas
interpretações perante suas relações e inter-relações no processo simbólico e subjetivo
da construção da realidade social (MARCHIORI, 2008). Este pensamento acredita que a
21
Vivemos uma “fase revolucionária”. São novos contextos que exigem novos
pensamentos para os estudos em Comunicação Organizacional. Para Nassar (2006) a
comunicação vista apenas como ferramenta, como técnica, como na perspectiva
funcionalista, hoje tem pouca utilidade. A Comunicação Organizacional, enquanto
pensamento e ação, como na pespectiva interpretativa, não passa de uma tentativa de
legitimar ou negociar uma determina interpretação, diante de inúmeras outras
interpretações sociais. E, por fim, a Comunicação Organizacional embasada sobre
relações de poder, como na perspectiva crítica, não conseguirá se desenvolver e
sobreviver, uma vez que hoje há a descentralização do poder.
Por isso, faz-se notável o desafio sobre as desconstruções/(re)construções dos
pensamentos sobre Comunicação Organizacional perante a “fase revolucionária” que
vivenciamos neste momento histórico que gera ruptura nos espaços conhecidos de
estabilidade, em uma progressão que tende a mais probabilidades e menos certezas
(MANUCCI, 2010).
24
1
Termo cunhado por Charles Baudelaire no artigo La peintre de la vie moderne, publicado em 1863, para
designar o que é transitório, efêmero ou contingente, mas parte integrante de uma outra metade eterna e
imutável, dentro da dualidade presente em sua obra.
25
Dessa maneira, as organizações devem temer que o seu controle seja perdido
totalmente, e, por outro lado, devem temer que não se tornem controladoras demais, não
permitindo a participação dos públicos. Porém, as corporações, ao mesmo tempo que
querem que suas marcas sejam celebradas e adoradas, não querem que os seus
consumidores se apropriem delas (JENKINS, 2009).
Deve-se assim, repensar a organização como uma guerra com os seus públicos,
forçando-os a aceitar suas mensagens e a comprar seus produtos e ideias. É preciso
entender e prestar atenção às decisões e opiniões dos seus públicos de interesse e
proporcionar experiências (JENKINS, 2009). Para Nassar (2008, p.192), na atualidade,
perante esta questão dos processos participativos, é que as organizações ganham
legitimidade, uma vez que envolvem grande número de protagonistas, observando e
opinando sobre suas políticas e ações. Além disso, as organizações precisam
compreender a participação, envolta por grande abrangência, alta interatividade e
velocidade, como um processo realizado também por não-especialistas, que geram a
descentralização da organização:
28
de informação por unidade de tempo e, por isso, seria necessário gerir o que devemos
dar atenção e o que podemos deixar de lado, aquilo que não nos seria útil
imediatamente. Só que a maioria das pessoas não consegue fazer isso, a capacidade de
análise sobre a relevância das informações fica comprometida quando se recebe uma
sobrecarga de informações.
A sensação é de que não conseguimos nos manter atualizados com tudo o que
ocorre no mundo. O sentimento é de culpa sobre as leituras acumuladas e sobre as
notícias que não chegaram aos nossos ouvidos. A incapacidade que nos colocamos
quando não sabemos explicar um conteúdo e a ilusão de achar que a pessoa ao nosso
lado está entendendo tudo e que saberia responder a qualquer questão. Há o receio em
dizer “não sei” e se apresentar desinformado.
Todas estas constatações são sintomas que Wurman (1999) considera como
indicadores da dificuldade das pessoas em lidar com a grande carga informacional, que
apenas nos deixa ansiosos, muitas vezes com baixa autoestima e com conhecimentos
superficiais. Para Wurman, “quase todo mundo apresenta algum grau de ansiedade de
informação. Lemos sem compreender, vemos sem perceber, ouvimos sem escutar”
(WURMAN, 1999, p.38).
Envolvendo todas estas questões do contexto digital, seus pontos positivos e
negativos sobre a abertura à participação, à colaboração, à legitimação por diversos
protagonistas, a credibilidade das opiniões positivas ou negativas proporcionada pelas
inter-relações, não apenas com pessoas próximas, mas de desconhecidos falando sobre
um produto ou uma ideia, a potencialização dos excessos informacionais, o déficit de
atenção, o isolamento do homem na hiper realidade, tudo isso está sobre a lógica da
Cultura da Convergência (JENKINS, 2009), que diz respeito:
Essa cultura da convergência mostra-nos que por meio das histórias que se pode
navegar e entender as redes, na medida em que os usuários são incentivados a procurar
por partes dessas histórias, fazem conexões, interpretações, escolhas e opinam sobre
31
elas. Essa é a lógica da rede, assim como Nassar (2008) coloca: “são as mensagens, as
histórias que configuram as redes de relacionamentos, só por meio da análise, da
interpretação e da opinião sobre esses conteúdos é possível entender a rede” (NASSAR
2008, p.199).
Através das histórias contadas em diferentes suportes midiáticos, fica mais fácil
envolver o público, uma vez que “a compreensão obtida por meio de diversas mídias
sustenta uma profundidade de experiência que motiva mais consumo” (JENKINS, 2009,
p. 135). Pensamento que pode ser completado pelas ideias de Paulo Nassar (2009a) ao
dizer que além de maior envolvimento, as histórias, expostas como depoimentos de vida
sobre plataformas digitais, sobre acontecimentos reais dos públicos, geram maior
credibilidade, pois é visto como distante dos interesses organizacionais, distante da
imposição de ideias:
Por isso, a convergência será estimulada pelos próprios públicos, que exigem
que as organizações sejam mais sensíveis a seus gostos e interesses. Estamos em uma
época em que as organizações precisam estar mais abertas a renegociar e expandir a
participação dos seus públicos. Mas será que as organizações estão preparadas para este
relacionamento ou estão propensas a conformar-se com as antigas relações com as
mídias?
O que se pode contestar, com razão, é que uma teoria seja teoria
objetiva. Não, uma teoria não é objetiva; uma teoria não é o reflexo da
realidade; uma teoria é uma construção da mente, uma construção
lógico-matemática que permite responder a certas perguntas que
fazemos ao mundo, à realidade. Uma teoria se fundamenta em dados
objetivos, mas uma teoria não é objetiva em si mesma. A objetividade
é uma coisa absolutamente certa. Ela é determinada por observações e
verificações e essas verificações precisam de comunicações
intersubjetivas (MORIN, 1996, p.40).
Por isso, Morin (1996) “retira da palavra método o caráter de corpus, de receita,
de técnica, que lhe foi atribuído pela ciência tradicional e lhe restabelece, na perspectiva
33
FILHO, 2008). O afeto é capaz de trazer uma modificação no ser, que o leva a sentir e a
pensar de maneira diferente àquela anterior ao fato de ter sido afetado (ESPINOSA,
1979). O afeto leva a pessoa a ter diferentes atitudes e comportamentos, ou seja, leva-a
para uma ação, movida pelo seu novo sentir.
A comunicação só ocorre quando a mensagem consegue afetar o invisível, o
interior da pessoa, a sua alma, que, segundo Nietzsche (2003) é uma estrutura social de
impulsos e afetos, e quando essa intensidade da afetivação é exteriorizada, tomando o
corpo da pessoa afetada em matéria de expressão e de ação. Isso significa que a
comunicação só ocorre quando “os afetos ganham a espessura do real e se efetuam”
(ROLNIK, 1989, p.26), quando as mensagens afetam o invisível e se exteriorizam em
uma ação visível.
Espinosa (1979), o filósofo dos afetos, esclarece essa compreensão, ao afirmar
que, quando um corpo é afetado, esse afeto pode aumentar ou diminuir a sua potência
de agir, estimulando-o ou refreando-o. Se os afetos produzem alegria, a potência de agir
é aumentada, caso contrário, se são causa de tristeza, ela diminui. O afeto, quando de
fato ocorre, leva a pessoa a uma ação, positiva ou negativa.
Por estes pensamentos, Marcondes Filho (2008) define a comunicação
exatamente como um “acontecimento”, um processo que ocorre apenas quando se afeta
profundamente uma pessoa, gerando nela mudanças em sua mente e em seu coração,
levando-a a uma ação. Para o autor, comunicação não é transmissão de informações.
Mesmo se houver troca e compartilhamento, é mais do que isso, é um processo que
pode ser (re)construído, fluidamente, de acordo com os afetos gerados e com as
reverberações causadas no interior das pessoas. Por isso, a comunicação, para ele, é um
acontecimento raro nos tempos atuais, pois, em meio a tantas informações, são
pouquíssimas as mensagens que conseguem afetar e modificar as pessoas que as
recebem.
Paulo Nassar (2006) também vê a comunicação organizacional como um
acontecimento, que é desenhada de acordo com os relacionamentos, ou seja, com os
afetos produzidos pela co-participação dos membros constitutivos de uma organização:
afetividade. Isso faz com que as pessoas coloquem sua vida emocional, interior, à deriva
(SENNETT, 2010, p.19).
3
(informação verbal) Discussão levantada pelo Prof. Dr. Paulo Nassar em reunião do Grupo de Estudos
de Novas Narrativas, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, no dia 27 de
fevereiro de 2013.
47
Marchiori (2006) diz que a organização não pode apenas preocupar-se com a
qualidade dos produtos, serviços e tecnologia, mas também com a qualidade dos
relacionamentos que a organização desenvolve para com seus públicos, principalmente
ao que se refere ao relacionamento com o público interno, visando a criação de um
ambiente no qual informação, conhecimento e competência sejam valorizados,
49
Sobre estes pensamentos, Paulo Nassar (2009b) enxerga exatamente que aquelas
mensagens embasadas na dimensão instrumental da comunicação, focadas no
funcionalismo e na mecanização, na automação e na lucratividade, com mensagens
disparadas pelos níveis gerenciais e sem espaço para feedbacks, tornaram-se ineficazes.
Estas seriam as mensagens quantitativas do modelo administrativo, objetivas e técnicas,
para fins de produtividade e de economia de tempo, com receptores passivos, tratados
como meras funções, como business (MATOS, 1998), as quais podem ser chamadas de
velhas formas de comunicação, uma vez que se tornaram ineficazes perante os novos
tempos.
Porém, apesar destes aspectos negativos da comunicação organizacional em seus
excessos, imposições e insensibilidades, Kunsch (2010, p.46) nota que a dimensão
predominante nas organizações ainda é a dimensão instrumental, ou seja, aquela que
visa a comunicação como mais funcional e técnica, focada na transmissão de
informações, dentro de uma visão linear em que a comunicação é assimétrica. Para
Cogo (2012b), estas reflexões apontam que:
Para Bendassolli (2007, p.223), o trabalho como sujeito4 era uma instância pela
qual os indivíduos se tornavam quem eles eram. Essa importância da identidade do
homem pelo trabalho se deu quando o sujeito racional de Descartes foi substituído pelo
sujeito do trabalho de Marx, em que houve um “deslocamento do ‘eu consciente’,
4
O trabalho como sujeito, é para Bendassolli (2007), no sentido filosófico, uma categoria ou forma
construída pelo entendimento para servir, por determinado tempo, com disposição transcendental, além da
multiplicidade de sensações, sentimentos e experiências.
54
Esse pensamento está ligado à metáfora do vínculo, colocada por Linda Putnam
como aquela que “direciona o foco da transmissão e o processamento da informação
para a conexão; assim, a comunicação é o elo que cria vínculos entre pessoas e forma
organizações como redes de relacionamentos” (PUTNAM, 2009, p.48-49). Isso
significa que o enfraquecimento da formação desses vínculos acaba prejudicando as
relações, a formação das memórias e, consequentemente, a comunicação no interior das
organizações.
Putnam (2009) também reflete sobre a importância da metáfora do símbolo,
diretamente ligada aos significados culturais e históricos. Ela privilegia “o significado e
a interpretação, principalmente por meio de rituais, narrativas e sinais físicos. A
comunicação nessa metáfora refere-se à sensibilização e à interpretação de símbolos
relacionados à identidade organizacional” (PUTNAM, 2009, p.61), ou seja, a forma
como o homem interage e interpreta o meio organizacional e se expressa a partir dos
significados adquiridos e das suas atividades sobre eles.
55
Para Aktouf (1996, p.228), “a busca pela dignidade do ser humano no ambiente
de trabalho é, nos tempos atuais, uma condição sine qua non para o alcance do alto
desempenho nos negócios”. Assim, as organizações não podem preocupar-se apenas
com normas e procedimentos. Segundo Caldas Silva (2010), é preciso enfatizar o
aprendizado contínuo dos funcionários e da própria organização a partir da integração
do sentir. É necessário pensar e agir nas relações humanas diárias. “Para tanto, cada vez
mais elas precisam reconhecer as pessoas e investir em seu desenvolvimento humano,
em benefício de maior qualidade de vida e de melhor desempenho grupal no trabalho”
(CALDAS SILVA, 2010, p. 209).
Por isso, sobre todas as dificuldades dos novos tempos para o ambiente de
trabalho e para o funcionário, a comunicação precisa deixar de ser
instrumental/informacional para buscar as respostas necessárias para a superação das
crises de identidades, da falta de reconhecimento e a falta de sentido do trabalho,
aprofundando a sua dimensão humana. A comunicação pode fazer com que os
funcionários possam reconstruir suas identidades através da criação de vínculos, das
interações, das emoções, das memórias, das narrativas, da abertura para a imaginação e
para a criatividade, reconhecendo as individualidades e olhando para os funcionários
como seres humanos, valorizando seus potenciais.
Seguindo esta reflexão, Matos (2004) coloca a comunicação interna como fator
de motivação, se for participativa e afetiva, ao invés de informativa, e se forem
compreendidas as opiniões e as competências dos funcionários, ao invés de impor uma
comunicação, assim como explica que:
Sendo assim, é preciso olhar para dentro dos indivíduos para perceber o
potencial expressivo que cada um possui. Olhar e escutar os funcionários como pessoas
e dar espaço para eles criarem e perceberem as suas contribuições. O que cada um
absorveu para dentro de si, de acordo com seu perfil cognitivo, ou seja, como recebem e
interpretam o mundo organizacional e suas comunicações e a forma como cada um
aborda um tema, uma situação ou um problema e trabalhar com esses pontos para que a
58
Segundo essa visão, haveria uma comunicação mais ideal e efetiva nos novos
tempos para aperfeiçoar os processos de decisões e propício para a criação de
comunicações conjuntas aos funcionários, capazes de mobilizar, envolver, despertar
atenção e inspirar as pessoas? A resposta pode ser afirmativa se a comunicação
estratégica envolver os valores individuais do seu público interno:
Sendo assim, é através das interações, das criações de vínculos, da abertura para
o imaginário e para uma perspectiva afetiva que a comunicação interna pode ser capaz
de (re)criar comunicações afetivas, qualitativas, envolventes e fixadoras de memórias,
com abordagens mais relacionais, significativas e transcendentes a partir de cada pessoa
pertencente à organização. Em um processo que comunicar não significa apenas
informar, mas sim, interagir, favorecer a troca de mensagens com bases em sentimentos
e experiências de vida - algo próximo, íntimo, humano – comunicações capazes de
afetar positivamente e serem, de fato, envolventes e efetivas e, para isso, para criar
novas formas de comunicação interna, é preciso antes compreender o funcionário como
potencial humano e entender suas formas de recepção e de expressão.
funcionários para que eles possam cognitiva e afetivamente se envolver e agir, sentindo-
se reconhecidos a partir do sistema de valores implicados por seus interesses. Esses
valores comandam as regulações das energias interiores, tendendo a assegurar ou
restabelecer o equilíbrio da pessoa (PIAGET, 1969). Na reequilibração, pelos interesses
gerados, eles assimilam as experiências pelo eu experiencial, somando-as as suas
histórias, memórias pelo eu recordadivo, e formando um novo conhecimento, uma nova
narrativa, uma motivação para uma lembrança futura positiva e um sentido para seu
trabalho.
Para se gerar a atenção, a memória e o interesse, deve-se ter também um
ambiente propício para as percepções e para as assimilações; além disso, as escolhas
sobre o conteúdo da comunicação também devem se basear nas percepções das pessoas.
O conceito de gestalt (ARNHEIM, 1994) está ligado a esse funcionamento da
percepção humana em um campo perceptivo, analisando o comportamento do indivíduo
perante suas competências sensoriais e cognitivas. Arnheim (1994) conceitua a gestalt
como a psicologia da forma e das percepções, em que a atribuição de sentido é um
importante conceito.
O autor diz que não percebemos as coisas isoladas, temos sempre a percepção do
campo, do conjunto, de todos os elementos. As interações e assimilações como os
insights, as percepções pré-lógicas (sem interpretações racionais) e os complementos
por associações são produções de sentido de acordo com as percepções do campo como
um todo.
Portanto, o que entra nos funcionários, seja pelos sentidos, pelo campo
perceptivo, afeta-os e desequilibra-os, segundo seus repertórios. Como o desequilíbrio é
um estado incômodo no ser humano, eles buscam o reequilíbrio, onde se forma o
conhecimento e a motivação para agir. De acordo com Piaget (1969) isso ocorre em
dois momentos: 1) processo de assimilação, que se dá pela gestalt, pelas suas
percepções sobre o ambiente e sobre os conteúdos escolhidos pelos comunicadores,
causando neles um desequilíbrio inicial, que os fazem tentar assimilar aquele conteúdo
comunicado ao seus repertórios. Quando há o insight, o segundo processo é gerado: 2) a
acomodação, que é o reequilíbrio, a comunicação transformadora que é capaz de afetar
e de produzir um sentido para motivar o funcionário a agir.
Por isso, o principal ponto da comunicação interna é criar um ambiente e uma
comunicação que leve em consideração a participação dos funcionários, não a mera
troca de informações, mas a valorização dos seus estados de espírito no momento
63
4. AS NOVAS NARRATIVAS
O caráter da vida é dual: a sucessão dos tempos traz o novo e faz o velho.
Ininterruptamente, novos conhecimentos são descobertos no âmago dos pensamentos de
uma época em constante dinamismo e evolução, demonstrando, segundo a segundo, a
interdependência dos fatos passados e futuros.
Impossível pensar a inovação sem considerar a tradição. O desenvolvimento do
amanhã só é alcançado com o esmiuçar da cultura, das histórias e das origens. De
acordo com a lógica das evoluções, da criação, destruição e reconstrução dos
conhecimentos, há a busca pela compreensão no passado somada à visão de progresso
no futuro.
Janus, o deus de duas faces da mitologia romana, ilustra a ideia. Representação
do fim e do início do calendário, nomeando o mês de janeiro, seus rostos voltados para
lados opostos observam passado e futuro, tradição e inovação. A dualidade necessária
para a circulação dos tempos.
Paulo Nassar (2007) utiliza-se dessa figura mitológica metaforicamente,
comparando-a a um comunicador. A comunicação organizacional, como ciência, só
pode evoluir sobre essa mesma lógica: olhando para o futuro, aspirando sobre ideias e
novidades comunicacionais – refletidas pelas necessidades vindas das mudanças
sofridas pelo mundo – mas sem se esquecer do passado, sem ignorar as tradições, os
mitos, ritos, rituais, memórias e histórias de uma organização. Para Arendt (1987,
p.170) a:
que acima de tudo, precisa ser um contador de histórias - passadas e futuras5 (NASSAR,
2013). A narrativa é a melhor forma para “transmitir conhecimentos, tradições, mitos e
não apenas sustentar a sobrevivência física, mas assegurar a evolução cultural da
organização” (FREITAS, 2013, p.39).
Em sua obra Mito e Realidade, Eliade (2000) trata o mito como a narrativa de
uma criação, isto é, uma explicação sobre a origem de determinado ser, objeto ou
costume, inseridos em dado contexto sociocultural. A obra de Kelley (2005), The Ten
Faces of Innovation, é um interessante adendo à função primeva do mito de Eliade.
Nela, o autor apresenta dez profissionais, que personificam diferentes aspectos humanos
e características voltadas para levar inovação aos processos da empresa. Dentre esses
personagens há o contador de histórias, representado pelo comunicador. Para ele, narrar
histórias reforça a construção de uma cultura de valor, transmitindo os objetivos da
organização, promovendo a colaboração de todos, criando heróis e conectando as
pessoas às tradições, histórias e mitos das organizações, entusiasmando-as pela emoção
e convidando-as para a ação (KELLEY, 2005).
Dessa forma, temos que o ressurgimento da contação de histórias para a
valorização das tradições é uma forma inovadora da comunicação organizacional nestes
novos contextos e perspectivas, apresentadas nos Capítulos 2 e 3 deste trabalho. A
contação de histórias por parte das organizações seria uma reação à tecnologia, ao
consumismo, ao imediatismo, à superficialidade e à descartabilidade das relações
(MATOS, 2005, p.17).
Na mesma linha, Núñez (2009, p. 23) diz que só uma verdadeira história
estrutura e dá sentido às confusas e excessivas informações diparadas a cada dia na pós-
modernidade, de forma que “uma história tem muito mais poder de persuasão que toda
uma artilharia de dados, provas, apresentações e argumentos” (NÚÑEZ, 2009, p. 83).
Sendo assim, se considerarmos a narrativa como um encadeamento de acontecimentos
vividos por um protagonista, seja ele um indivíduo, um grupo social ou uma instituição,
temos que, dentro de uma organização ou mesmo no seio social, são as narrativas,
enquanto registros histórico-científicos ou enquanto a mitologia de uma cultura, que
preservam o que importa na evolução de uma sociedade através do tempo. Assim, os
acontecimentos fazem sentido por sua relevância dentro desse processo evolutivo.
5
(informação verbal) Discussão levantada pelo Prof. Dr. Paulo Nassar em reunião do Grupo de Estudos
de Novas Narrativas, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, no dia 27 de
fevereiro de 2013.
67
Isso significa que a comunicação deve ser “um conjunto de atos retóricos cuja
argumentação evoca o passado, justifica o presente e prepara o futuro” (HALLIDAY,
1998, p.32). A lei entre a tradição e a inovação para a modificação dos tempos presentes
opacos e confusos, para o aprofundamento das experiências, o revigoramento das
memórias e o despertar para narrativas interessantes e atraentes na comunicação
organizacional, assim como também na comunicação interna, que possam ao mesmo
tempo reviver o passado e descobrir através dele os passos futuros.
Denning (2006, p;20-21) coloca que “as histórias excitam a imaginação e geram
estados consecutivos de criação de tensão (perplexidade e reação) e de liberação de
tensão (insight e solução)”, ou seja, as histórias podem ser capazes de sistematizar as
experiências na construção e no desenvolvimento de projetos corporativos, encontrar
soluções diante de obstáculos e insights que podem contribuir para ocasiões futuras
(COGO, 2012a, p. 133).
68
Para criar essas histórias, é preciso refletir sobre a soma entre a tradição e a
inovação sobre os contextos atuais, pois, a partir dessa união, é possível gerar um novo
sentido, um novo afeto, um novo olhar, e, consequentemente, uma nova narrativa,
baseada na emoção, na humanização, na identificação, no reconhecimento e na
individualização:
Cogo (2012, p.80), de acordo com esses pensamentos, reflete que são as
narrações que possibilitam o resgate das opiniões, dos sentimentos e das intenções, a
produção de sentido para o seu mundo, bem como a influência organizacional nesta
definição. Isso demonstra que os seres humanos têm necessidade de possuir símbolos
que os ajudam a entender e a interpretar o mundo (SNUNWOLF, 2005, p.305) e que
estes símbolos, perdidos na pós-modernidade, podem ser retomados pelas histórias
contadas e pelos discursos proferidos pelas organizações e pelos próprios envolvidos
com as narrações organizacionais.
É nesse processo da construção da realidade narrativa que é possível, portanto, a
comunicação interna juntar os valores do imaginário coletivo, os mitos e as memórias,
retomando as tradições, para gerar um sentido e possibilitar a transformação nos
funcionários, que constroem conjuntamente à organização essa narrativa, de forma que
eles também podem contribuir e ajudar, por esses processos, nas decisões dos rumos
futuros. Além disso, é através das narrativas que se podem gerar sentidos sobre suas
atuações no trabalho e reconstruir suas identidades fragmentadas pela pós-modernidade,
uma vez que:
conduta. As narrativas são mais simples que as crônicas dos fatos; dão
forma ao movimento adiante do tempo, sugerindo motivos pelos quais
tudo acontece, mostrando suas consequências (SENNETT, 2010, p.
31).
Por isso, temos que é através do paradigma narrativo que comunicadores podem
contar as histórias organizacionais e proferir seus discursos, “reencantando o mundo,
despertando a compaixão, e a lembrança do universo mítico do qual todos fazemos
parte” (BUSSATO, 2006, p.31). O reencantamento do mundo, da comunicação
organizacional e da comunicação interna está, portanto, refletida sobre esse novo
paradigma, sobre a construção de novas narrativas, as quais são capazes “de servir de
ponte para ligar as diferentes dimensões e conspirar para a recuperação dos significados,
que tornam as pessoas mais humanas, íntegras, solidárias, tolerantes, dotadas de
compaixão e capazes de ‘estar com’” (BUSSATO, 2006, p.12). Ideias que estão ligadas
ao emocional, deixadas de lado em um mundo racional por parte das organizações:
Jovchelovitch e Bauer (2008) falam exatamente sobre o mesmo ponto, dizendo que toda
narrativa contém uma dimensão expressiva e uma referência representativa. A
narratologia da expressão diz respeito às formas de expressão pela visão de real do
narrador, em que estão envolvidas: as formas de manifestação do narrador, os materiais
de expressão transmitidos pelas mídias narrativas (imagens, palavras, sons etc), níveis
de narração, temporalidade, pontos de vista etc. (GAUDREAULT, JOST, 2009).
Já a narratologia temática (narratologia de conteúdo), diz respeito a contação de
histórias com os personagens, suas ações e interações, a qual tem a ver com o impacto
de contexto. Isso significa que a narrativa privilegia uma realidade - a do narrador.
Porém, essa realidade receberá diversas interpretações particulares diversos pontos-de-
vista do seu contexto sócio-histórico (JOVCHELOVITCH e BAUER, 2008).
No contexto da comunicação, cabe aos profissionais da área assumir o papel da
organização enquanto disseminadora de seu discurso narrativo, pensando tanto em sua
narratologia modal (estudando e analisando as melhores formas de expressão, por quais
mídias serão transmitidas para os devidos fins), assim como também em sua
narratologia temática (estudando o conteúdo da mensagem a ser transmitida,
considerando os diversos pontos de vista e as interpretações que ela receberá).
Os comunicadores podem perceber esses aspectos narratológicos a partir das
principais categorias da narrativa apontadas por Todorov (1966), ou seja, a do tempo, a
do aspecto e a do modo. O tempo tem relação ao contexto e a duração da narrativa. O
aspecto é a maneira pela qual o comunicador enxerga a organização e seus objetivos e a
partir desta sua compreensão (dessa visão de real do comunicador-narrador), ele pode
pensar nos melhores modos, que seriam: o tipo de discurso utilizado, o tipo de
linguagem, a escolha do conteúdo da narrativa. Assim sendo, as ferramentas expressivas
da narratologia de expressão ou o conteúdo criado/adaptado das narrativas temáticas
visam a construção mítico-simbólica de uma organização protagonista na sociedade na
qual se insere.
A realidade narrativa é, portanto, reconstruída na medida em que há
comunicação, ou seja, na medida em que são criados significados pelas narrativas que
surgem por meio da relação e da interação entre a organização e seus públicos de
interesse, assim como a construção de sentido para eles.
Essa classificação é dada também pela professora francesa, da universidade de
Sorboune, Nicole D’Almeida (2009), que trata a linguagem da organização sobre o
ponto de vista de que é através das narrativas que as organizações podem se colocar
74
Por isso, temos que as narrativas desenvolvidas sobre este paradigma, as quais
podemos chamar de novas narrativas, já que são uma resposta às velhas formas de
comunicação, só podem ser potencialmente desenvolvidas em organizações que, no
75
diferenciação que nasce pela história de uma organização junto às pessoas e, também,
dessas pessoas com a organização, é um atributo que poucas organizações ainda
possuem. Sobre este contexto, um pesquisador dinamarquê, Jensen (2006 apud
NASSAR, 2007, p.186) acredita na tendência de uma sociedade em futuro próximo,
onde o consumo deverá ser “muito mais emocional do que racional. E as empresas terão
que agregar seus valores e sua história aos produtos se quiserem fisgar o coração dos
clientes. E o mesmo aplica-se para a comunicação com qualquer público, inclusive o
interno.
E é sobre estes aspectos que Pink (2007) reflete que estamos deixando de ser
uma economia e uma sociedade “baseadas nas faculdades lógicas, lineares, frias e
objetivas da Era da Informação e fazendo a transição para [...] as faculdades criativas,
empáticas e sistêmicas – a Era Conceitual” (PINK, 2007, p.1). Para isto, este autor
indica o desenvolvimento de aptidões ligadas a questões sobre novas formas de
transmitir mensagens, narradas para serem pessoalmente gratificantes e especialmente
emotivas, ligadas à subjetividade, aos anseios e às memórias afetivas.
Ele acredita que a lógica e a racionalidade não são o ideal nesse novo contexto,
“limitar-se ao apelo das necessidades racionais, lógicas e funcionais é clamorosamente
insuficiente” (PINK, 2007, p.33) nessa nova Era Conceitual. O imprescindível para as
novas narrativas é compreender comportamentos, estabelecer relacionamentos e
preocupar-se com as pessoas, com leveza e humor, entendendo suas aspirações e
buscando a interação e o compartilhamento de suas ideias.
O autor afirma também sobre a importância da construção de sentido, na
transcendência, para atingir a essência da vida – os valores intangíveis – aqueles que
não são possíveis pela informação, mas sim, pela comunicação e pelo compartilhamento
daqueles que, de fato, são relevantes e geram identificação para os públicos de interesse
da organização. A sociedade busca cada vez mais valores como: simplicidade, ao invés
de complexidades e sobrecargas; criatividade, no lugar de padronizações e humanização
contra a mecanização; tempo e espaço para que as narrativas afetivas sejam histórias
interessantes, que propiciem integração e participação, superando os sentidos vazios.
Para Pink (2007), as velhas narrativas seriam exatamente aquelas ligadas à
sociedade dos excessos e das abundâncias, as quais ele conceitua como desenvolvidas
sobre as habilidades high tech, ou seja, necessidades objetivas, lógicas e racionais. O
que ele acredita é que essas narrativas não funcionam mais com os indivíduos da
atualidade, que necessitam de narrativas desenvolvidas sobre outras duas aptidões
77
Esses conceitos podem ser considerados o alicerce das novas narrativas. O que
também pode ser associado a uma nova “maneira de estar junto, em que o imaginário, o
onírico, o lúdico, justamente, ocupam um lugar primordial” (MAFFESOLI, 2010, p.27)
e podem gerar narrativas capazes de afetar, transformar e inspirar.
Sobre a esfera do que se é sonhado e sobre o despertar das emoções, Carrascoza
(2004a), embasado nas ideias de Nietzsche, conceitua as essências apolínea e dionisíaca
para modelos de narrativas publicitárias. O modelo apolíneo possui um viés racional e
imperativo. Já o dionisíaco é focado na emoção, no humor e na narração. Ambos
possuem efetividade na publicidade e são utilizados de acordo com os objetivos das
mensagens. Apropriando-se das mesmas definições nietzchianas, Nassar (2009c),
observa que, ao se tratar de um ambiente organizacional, temos que:
O homem quer gerar um sentido para si, ele necessita de referência, precisa
(re)criar seu mundo, seu espaço conhecido, sua comunidade, sua organização enquanto
espaços sagrados, transformando o caos amorfo, em cosmo, algo conhecido, referencial.
Para isso, busca reproduzir o momento da criação, reproduzindo e atualizando o
processo cosmogônico engendrado pelos deuses, o que é nomeado por Eliade (2010) de
cosmogonia.
Para o autor, a cosmogonia só é possível ocorrer através dos ritos e dos rituais,
ou seja, da atribuição de significados humanizadores ao que não é humano,
transformando o espaço caótico, inabitado, em cosmo, habitável. Ideia que pode ser
comparada à necessidade da reumanização nos processos mecanizados das
organizações, uma vez que, para Eliade (2000), tirar o significado espiritual é tirar a
dimensão humana.
A função mais importante do mito no paradigma narrativo é, pois, “fixar” os
modelos exemplares de todos os ritos, rituais e de todas as atividades humanas
significativas na organização, através do simbólico. Eliade (2010) constata em sua obra
“O Sagrado e o Profano”, que, é graças ao simbólico que os homens podem transcender
a experiência individual, elevando-a ao ato espiritual necessário para a recolocação da
79
Assim, temos que a história, como campo de conhecimento, seria apenas uma
exposição lógica e racional de acontecimentos se as memórias não estivessem presentes.
As memórias são capazes de construir a narração sobre emoções, reincorporando ao
passado um grau de sacro, de mito (PINTO, 2001, p.297). Ao se buscar o passado para
enriquecer as suas narrações presentes, as ideias passam pelos pontos exatos em que os
sentidos foram atingidos, por aquilo que realmente trouxe um valor e uma identificação:
A partir destas perguntas, fica evidente que a memória organizacional ainda tem
muitas oportunidades para ser desenvolvida, principalmente sobre o paradigma
84
Essas questões estão envolvidas sobre o que Proust (2002) chama de memória
involuntária, aquela que ele considera como a mais valiosa, uma vez que transmite a
totalidade das experiências vividas, como a “inocência”, o “encantamento” e o “terror”,
uma vez que esta resulta de percepções emocionais, que envolvem sentimentos e
subjetividades. Por todos estes pontos, ao se pensar no contexto atual e no paradigma
narrativo, fica a reflexão de que:
Trata, portanto, da conscientização por parte das organizações, que sua linha do
tempo histórica é formada pelas histórias de milhares de indivíduos, tanto daqueles que
trabalham na organização, quanto daqueles que consomem seus produtos e serviços,
bem como pessoas relacionadas a estas primeiras, como a família dos colaboradores.
Através da memória oral, o registro das organizações se liberta da frígida
documentação, para se reavivar a cada vez que é contado, atualizando suas narrativas e
reproduzindo o processo cosmogônico pelo qual se deu a criação da organização em seu
contexto social e proporcionando estados de elevação mítica a todos os depoentes e
ouvintes partícipes desse processo.
Para Nassar e Cogo (2012, p. 102), um centramento estratégico da narrativa, se
localizado na memória organizacional, sobretudo na memória oral, como tratamos aqui,
86
terceiro sentido, o qual abre o campo de significações infinitamente, para longe dos seus
sentidos óbvios, gerando um sentido que ele chama de “obtuso”.
Esse novo sentido formado não é imediatamente entendido de maneira clara,
precisando - para a sua significação - de emoções, de valores e de subjetividades,
encontradas apenas no interior de cada espectador. Assim, o terceiro sentido, é a relação
entre a proposta sensorial que a linguagem audiovisual proporciona e a adesão
cognitiva/afetiva de quem recebe tais imagens e sons:
É por isso que, inpirados pelas ideias de Genette (1972) sobre a narratologia,
Gaudreault e Jost (2009), analisam a narrativa da linguagem audiovisual à luz da
narração, dos pontos de vista, do tempo e de interrogações mais específicas como as
relações imagens-sons, para chegar à conclusão de que o audiovisual pode fortalecer
ações de comunicação focadas em narrativas, sobretudo as que envolvem registro e
transmissão de memória oral de participantes da organização, para que surja o “estado
de espírito” tão necessário para a reumanização das complexas, duras e racionais
corporações.
Ao se falar sobre estes registros de memória oral, sobre a contação de histórias
que narram as experiências vividas, sejam elas em formatos audiovisuais ou em outras
plataformas, tem-se o conceito de micronarrativas afetivas que são um tipo de
storytelling, ideias que serão exploradas a partir da próxima seção.
4.6. Storytelling
Sendo assim, temos que esta função específica do storytelling gira em torno dos
depoimentos reais das narrativas de experiência de integrantes de uma organização, a
fim de que eles se reconheçam, identifiquem-se, sintam-se heróis do seu cotidiano,
reconstruindo suas identidades fragmentadas sob a égide histórica de uma organização,
o que, para fins de engajamento e inserção social tanto do indivíduo quanto da empresa
ou instituição, tratam de um tipo de storytelling, resultando histórias que neste trabalho
conceituamos como micronarrativas afetivas.
Porém, essas grandes narrativas, explicativas sobre o mundo e que serviam como
referências para a sociedade, começaram a se enfraquecer a partir do século XX e se
perderam na pós-modernidade. Bauman (2001) acredita que, em um mundo líquido,
fluido e fragmentado, os poderes “passaram do “sistema” para a “sociedade”, da
“política” para as “políticas da vida” – ou desceram do nível “macro” para o nível
“micro” do convívio social” (BAUMAN, 2001, p.14). Touraine (1998 apud BAUMAN,
2001, p.14), discute sobre a “defesa por todos os atores sociais, de sua especificidade
cultural e psicológica (...) que pode ser encontrado dentro do indivíduo, e não mais em
instituições sociais ou em princípios universais”.
Na mesma linha de pensamento, para Pérez (2008), o contexto complexo e pós-
moderno que envolve a globalização traz consigo uma uniformização dos produtos, das
culturas, dos valores, dos modelos de gestão, mas ao mesmo tempo, reafirma a
preservação dos valores individuais.
Assim temos que, frente à crescente globalização, recentemente viabilizada pela
ascenção das novas mídias, que promovem o fluxo constantemente crescente de
informações, ideias e conhecimentos, que promove a atualização constante de conceitos
sobre todos os aspectos de nossa realidade, tornando-a um simulacro, nosso mundo se
fragmenta e se torna fluido, colocando em cheque a solidez de preceitos e identidades
das instituições da sociedade tradicional (BAUMAN, 2001), retirando nossos grandes
referenciais, nossos grandes sentidos, nossas grandes histórias e nossos grandes heróis.
Por isso, temos que uma diferença relevante entre a modernidade e a pós-
modernidade está na construção das narrativas. Na pós-modernidade “a função narrativa
perde o grande herói, os grandes perigos, as grandes viagens e os grandes objetivos”
(D’ALMEIDA, 2012, p. 90). É o fim das grandes narrativas, que podiam confortar com
explicações sobre a vida.
Como consequência, “na sociedade individualizada, o indivíduo precisa
aprender, sob pena de um prejuízo irreversível, a reconhecer-se a si mesmo como foco
da ação” (BECK, 2010, p. 199). Com a perda do sentido holístico de suas referências e
de suas identidades, os indivíduos passam a se importar com o “eu primeiro”.
Por isso, Lyotard (1989) defende as pequenas histórias ao invés de grandes
relatos, onde podemos reivindicar um homem mais relacional e relativo. Há uma
contradição entre o global e o local: se temos de um lado corporações e marcas globais,
por outro, temos estratégias de miniaturização, microsegmentação, micromarketing e
todas as técnicas “um a um” (PÉREZ, 2008, p. 582).
93
pertencente a ela. E esse sentimento de pertencimento pode ser gerado pela retomada
das tradições, das origens, dos mitos, ritos e rituais da organização, uma vez que “contar
histórias refere-se ao processo pelo qual contadores e ouvintes constroem
conjuntamente narrativas em uma experiência coletiva” (PUTNAM, 2009, p.54).
Pensamento que pode ser complementado pelas ideias de Cogo (2012) que diz
que as “histórias que as pessoas contam sobre as relações sociais nas organizações
precisam ser tratadas como narrativas que buscam construir sentido para as ações, tanto
passadas como futuras, procurando plausividade para as experiências” (COGO, 2012a,
p. 79). Isso significa que através das micronarrativas pode ser possível que funcionários
compreendam a sua atuação na organização e enxerguem a importância das suas
experiências particulares para o funcionamento e a formação da experiência
organizacional como um todo.
Além disso, a criação de espaços que as organizações porventura derem para que
as pessoas possam contar e escrever suas histórias podem contribuir muito para
valorizar a dimensão humana da comunicação. Os trabalhadores de uma organização,
mergulhados na pós-modernidade, nos curtos prazos, na efemeridade e nos excessos de
informações perderam seus horizontes e sofreram uma desumanização, isso por estarem
refratários aos outros e à paisagem, alheios pela atenção difusa e “presos à máquina que
dirigem e com a qual cortam, indiferentes, uma geografia em compasso de mudança. O
encalhe é um momento de reumanização” (NETO, 2005, p.9). Assim como coloca
também Domingos (2008):
tornar um herói no seu dia a dia, reconhecendo seus atos e incentivando-os em suas
ações.
Na Era Conceitual, um dos pontos principais para o desenvolvimento do
trabalho, é o seu envolvimento com o humor. Para Pink (2007, p.181-182) “misturar
trabalho e diversão tornou-se não só mais comum mas também mais necessário”, de
forma que o humor, o lúdico, “está se mostrando um parâmetro preciso de eficácia
gerencial e inteligência emocional nos tempos atuais. Para Daniel Goleman (1998,
p.45), a inteligência emocional é a “capacidade de identificar os nossos próprios
sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e de gerir bem as emoções dentro de
nós e nos nossos relacionamentos”.
Por esta definição, convidar os funcionários a contarem e escutarem histórias
como uma ação lúdica e como uma ação de expor suas criatividades e suas inteligências
emocionais pelo humor, pode trazer interessantes respostas de participação,
envolvimento, auto-conhecimento e auto-motivação, a partir da compreensão de seus
próprios sentimentos e da graça de suas próprias vivências reconhecidas ao serem
lembradas.
De um modo geral, as micronarrativas, ao afetar pela emoção, pela
subjetividade, no campo da comunicação interna, elas possivelmente darão visibilidade
à diversas ações como: a possibilidade dos funcionários em expressar suas experiências
em relação à organização; confirmar as experiências e significados compartilhados entre
membros da mesma organização; realizar treinamentos, orientando e socializando novos
funcionários; desenvolver, aperfeiçoar e renovar o senso de propósito dos funcionários
da organização, entendendo suas ambições, desejos e razões por trabalhar ali; preparar
um grupo para a realização de planejamentos, segundo suas ideias e para a realização de
planos de aplicação e tomada de decisão em consonância com os propósitos
compartilhados; e proporcionar um espaço para co-criar visão e estratégia
organizacionais, de acordo com os pensamentos dos funcionários (COGO, 2012a,
p.127).
Sendo assim, pretende-se analisar no capítulo referente à pesquisa empírica deste
trabalho (procedimentos metodológicos) se as micronarrativas podem ser utilizadas de
forma estratégica pelas organizações, sobretudo ao que diz respeito a comunicação
interna, uma vez que através de projetos em que se proporcione o narrar e o escutar
histórias, pode-se levar a reumanização, a partir das manifestações dos sentimentos e
das subjetividades para um ambiente que ainda é muito técnico, objetivo e racional.
97
5. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
(Heráclito6)
6
Filósofo pré-socrático, nascido por volta de 540 a.C.
98
mais preocupada com o processo do que com a estrutura, com o significado do que com
a frequência e mais interessado com a densidade do que com a generalização (VAN
MAANEN, 1979).
Poupart (2008) faz o levantamento de algumas utilizações e suas justificativas
dadas pelos pesquisadores que recorrem à metodologia qualitativa, tais quais: 1) é
utilizada para analisar as realidades sociais segundo a perspectiva dos atores sociais,
sendo considerada indispensável para a compreensão das condutas sociais; 2) muito
usada para denunciar preconceitos e práticas discriminatórias, uma vez que possibilita a
compreensão de dilemas e questões enfrentadas pelos atores sociais; 3) e, por ser uma
ferramenta de informação sobre as entidades sociais, é uma metolodologia capaz de
elucidar as realidades sociais, mas, principalmente, explorar as experiências dos atores
sociais.
Sendo assim, por se tratar de uma pesquisa do campo da comunicação, em que
se visa compreender e analisar sobretudo fenômenos de ordem subjetiva, interpretando a
ocorrência de fenômenos, segundo os novos contextos em que ocorrem, analisando as
realidades sociais e as experiências dos funcionários dentro destas realidades, será a
melhor opção o metódo qualitativo de pesquisa.
5.2.5. As entrevistas
perguntas sobre o tema específico do projeto institucional, como por exemplo, como o
funcionário entrou naquela organização contratante, que histórias ele vivenciou ali,
quem ele conheceu neste ambiente) e finalização (momento em que se avalia o presente
e se faz uma ponte para o futuro, os sonhos, medos, mudanças que gostaria de realizar e
avaliação sobre a experiência em contar a sua própria história de vida).
Apesar de seguir esse modelo, e de todos os depoimentos possuirem estas três
partes, o roteiro não é um questionário rígido, ele é um guia que ajuda o entrevistado a
selecionar e organizar sua narração em tópicos principais, por isso, chamado de
entrevista semiestruturada. O registro da narrativa é articulado pelo entrevistador
qualificado, que pode auxiliar o entrevistado na organização de suas lembranças,
acrescentando, tirando ou reformulando algumas das perguntas durante a entrevista, de
acordo com o ritmo e o jeito de contar a história que o entrevistado possui.
Como dependem do entrevistado e de seu ritmo, cada gravação audiovisual das
narrativas possui um tempo diferente de duração, e, consequentemente, os tamanhos das
transcrições, feitas todas também pelo Museu da Pessoa, são diferentes em cada
entrevista. Porém, uma vez que o material analisado se refere ao conteúdo e não a sua
quantidade, isso não infuenciará nos resultados aos quais se pretende analisar nesta
pesquisa. É importante esclarecer também que o conteúdo escolhido a ser analisado será
diretamente o material já transcrito, assim como é indicada a realização pela
metodologia escolhida para a análise de conteúdo.
Fundado em 1991, em São Paulo, o Museu da Pessoa conta hoje em seu acervo
com mais de 15 mil histórias de vida e 72 mil documentos e fotos digitalizados, de
acordo com projetos e programas nas áreas de educação, comunicação,
desenvolvimento comunitário e memória institucional.
Para esta pesquisa, serão contemplados os projetos realizados apenas sobre o
programa memória institucional, uma vez que aí se encontram os projetos
organizacionais, em suas mais variadas finalidades, ou seja, são projetos em que
organizações contrataram o Museu da Pessoa para a coleta de depoimentos de pessoas
que fizeram ou ainda fazem parte da história da organização.
Sendo assim, do universo de 142 projetos já realizados pelo Museu da Pessoa
para o programa de memória institucional, desde a sua fundação até 2013, foram
106
Ano da
Nome Idade Empresa Atuações Setor Projeto
entrevista
Ana
Cândida Memória
Coordenadora Celulose e
de 42 Votorantim Votorantim 2007
de marketing Papel
Campos Cimentos
Machado
Attílio
Concursado BNDES 50
Geraldo 84 BNDES Financeiro 2002
(aposentado) anos
Vivacqua
Clarindo Aracruz Trabalhos Celulose e Memória
68 2005
Giacomin Celulose pontuais Papel Aracruz
Diretor de
50 Anos de
Cláudio projetos do
69 Volkswagem Automotivo Volkswagen 2002
Menta carro Gol
do Brasil
(aposentado)
Memória,
Identidade e
Eduardo Pão de Gerente de
47 Alimentício Cultura do 2003
Romero Açúcar marketing
Pão de
Açúcar
José
Fiscal de Memória da
Roberto 47 Petrobras Energia 2005
Controle Petrobras
Moreira
Serviço de
Morgana Psicóloga Psicologia
38 InCor Saúde 2000
Masetti concursada InCor 25
anos
Patrícia Memória das
Bueno 31 Natura Promotora Comésticos comunidades 2006
Vieira Natura
Para Duarte (2008, p. 78), “analisar implica separar o todo em partes e examinar
a natureza, funções e relações de cada uma”. A análise dos dados secundários, obtidos
pelas entrevistas realizadas pelo Museu da Pessoa será feita pela técnica de análise de
108
2) A manifestação das subjetividades: Para Baldissera (2009, p.73), para que ocorra a
humanização das organizações e a valorização de seus funcionários, contra
comunicações meramente informacionais, massivas, excessivas e racionais, é
fundamental que se possibilitem e/ou fomentem as manifestações das subjetividades dos
integrantes da organização, de forma que através delas, pode-se aprender, criar e inovar
seus processos, de maneira mais coerente entre os objetivos da organização e dos
sujeitos que a constituem. Ou seja, através dessas manifestações e da sensibilidade do
110
3) O humor: Na Era Conceitual, segundo Pink (2007, p.181), liberar as tristezas das
organizações na era da abundância e dos novos contextos tornou-se não só mais comum
mas também mais necessário, representando qualidade de vida, motivação e
envolvimento, além de contribuir para uma melhoria no clima organizacional. Isso
porque, através do humor, é possível gerar sensações de bem-estar, alívio e leveza,
sensações estas necessárias para lidar com pressões, competições e estresses em um
contexto de velocidades, efemeridades, racionalidades e metas lucrativas. Esta categoria
visa observar a presença do humor nas micronarrativas contadas pelos funcionários, de
forma que eles possam extravassar sua criatividade, por manifestações irônicas, com
carisma, às vezes sutis, às vezes explícitas. O humor também pode ser percebido pela
utilização de linguagem metafórica e palavras no diminutivo. A sua presença é
observada e identificada também pela narração de fatos engraçados, estranhos,
normalmente seguidos de risos.
4) A presença mitológica: Para Núñez (2009, p.28) mitos são “histórias sagradas,
exemplares e significativas que têm dado sentido à existência do homem desde o
princípio dos tempos, porque fornecem modelos de conduta e conferem significado à
existência”. Quando aplica-se este conceito do ponto de vista da comunicação interna,
trata-se da compreensão das histórias de vida como exemplares e significativas, dando
ao homem a oportunidade de descobrir suas origens e seus propósitos de vida, incluindo
seu propósito profissional, como o ato espiritual (ELIADE, 2010), elevando o
111
funcionário a um status mais elevado de sua existência. Segundo Castro (2000, online),
as histórias individuais estão presentes nas organizações com narrativas que “se somam
à própria história que determinou a criação da empresa, conferindo-lhe veracidade e
conduzindo toda uma forma de atuação”. Essa categoria seleciona, além destas
características sobre origens, as figuras mitológicas do mundo organizacional como
exemplares, construidoras de legados e de histórias, além de aspectos em que o
entrevistado atribui significados humanizadores ao que não é humano, como a própria
organização, a ser considerada não apenas como um pólo econômico, mas também
como personagem histórica e como agente social de tranformação. Além disso, as
descrições de aspectos universais e de rituais organizacionais como: reuniões,
admissões, demissões, festas, promoções, renovações, concursos, tradições e momentos
de transcedência, tranformação e magia também são contabilizados como pertencentes à
esta categoria.
10) Vulnerabilidades: Matos (2010, p. 109), diz que “não há história verdadeira sem
equívocos, vulnerabilidades, superações, fragilidades. Nenhuma história que valha a
pena ser contada é feita apenas de sucessos”. Geralmente são pontos da narrativa que
marcaram os entrevistados e que podem demonstrar força, superação, transparência e
credibilidade em suas falas. Esta categoria compreende fatos da narração sobre pontos
da história de vida que não deram certo, saídas de um emprego, preconceitos sofridos,
confusões e caos, pontos que não se lembra ou que não se quer lembrar por alguma
razão, aspectos que ainda não se atingiu o esperado e a descrição de algo que não se
tinha ou não se tem conhecimento para tomar uma atitude.
114
- Ana Cândido de Campos Machado: quando entrevistada, aos 42 anos, era mãe de
uma filha pequena e a coordenadora do programa de marketing industrial da Votorantim
Celulose e Papel, chamado “Foco no Cliente”. Paulista, publicitária com pós-graduação
em administração e marketing, trabalha na Votorantim desde os seus 29 anos, quando o
marido de uma amiga que trabalhava nesta empresa levou o seu currículo para o setor
de Recursos Humanos, que a selecionou. Antes, Ana trabalhava com tecnologia e
precisou aprender tudo sobre papel, que segundo ela, é algo milenar, mas que possui
também muita tecnologia envolvida para os seus diferentes tipos.
- Cláudio Menta: paulista que, quando adolescente, amava filmes de ficção científica.
Esse interesse o fez escolher a profissão de engenheiro elétrico, formando-se pela escola
Politécnica da USP. Casou-se com sua esposa Lucinda por persistência, foi pai e avó.
Antes de se casar, começou a trabalhar na Vemag, a qual foi comprada pela
Volkswagen na década de 1960, onde se tornou diretor de projetos do carro Gol até se
aposentar.
- Eduardo Romero: carioca, cuja maior preocupação na adolescência era “como ia ser
o por do sol”, foi obrigado pelo pai a procurar um emprego em São Paulo, onde sua mãe
morava. O Pão de Açúcar aconteceu duas vezes em sua vida, foi seu primeiro emprego
e, depois de alguns anos de mudanças e de estar casado, voltou a trabalhar no Grupo
Pão de Açúcar, como gerente de marketing, cargo exercido até seus 47 anos, quando
entrevistado. Participou da criação e do desenvolvimento de inúmeros projetos como a
Maratona Pão de Açúcar em São Paulo, o show Paul Music, o Pão de Açúcar delivery e
o Pão de Açúcar Kids.
- José Roberto Moreira: teve uma infância bastante rural, vivendo em um sítio em
Barra Mansa, Rio de Janeiro. Fez vestibular para o IME e “passou de primeira” em
engenharia elétrica. Prestar concurso para a Petrobras foi, para ele, algo intuitivo, mas
não acreditou quando entrou. Trabalhou com a parte de planejamentos e operações até
ser fiscal do controle do fluxo de óleo de poços de petróleo, responsabilidade que tinha
aos 47 anos, ao ser entrevistado.
- Morgana Masetti: nascida em São Paulo, capital. Não se dava bem com matemática e
física e resolveu fazer psicologia na PUC-SP, por gostar de humanas e por vivenciar em
117
sua infância, uma doença depressiva de sua mãe, a qual era algo enigmático e que
ninguém encontrava respostas. Não queria trabalhar em um consultório e descobriu a
psicologia hospitalar como uma paixão. Prestou concurso para o InCor e foi contratada,
trabalhando durante cinco ou seis anos, quando estava com incertezas sobre as reais
ajudas proporcionadas pela sua profissão aos pacientes. Resolveu viajar, refletir e
estudar. Fez mestrado em Psicologia Social, o que resultou em um livro intitulado
“Soluções de palhaços”. Neste tempo, encontrou-se com Wellington Nogueira, fundador
do Doutores da Alegria, com quem desenvolveu vários projetos. Aos 38 anos, quando
entrevistada, contou ter virado uma Doutora da Alegria, e retornado ao InCor assim,
com novas ideias sobre a psicologia hospitalar.
- Patrícia Bueno Vieira: nascida em São Paulo, sonhava trabalhar na Natura “desde
sempre”. Tentou entrar na Natura aos 18 anos, quando lhe disseram que era nova
demais. Conseguiu realizar seu sonho aos 20, após uma entrevista com a responsável
pela Central de Atendimento da Natura. Aos 31 anos de idade, quando entrevistada, era
promotora de produtos Natura há seis anos.
Tranformação 4 1 8 1 8 4 6 6 38
Rituais 5 6 5 6 7 15 11 9 64
Humanização 8 1 3 7 11 7 4 2 43
Ato Espiritual 8 2 6 3 8 4 10 4 45
Heroísmo 26 12 12 46 25 45 47 23 236
Mundo comum 0 0 1 2 2 3 5 1 14
Dificuldades/
10 4 4 23 8 22 18 6 95
desafios
Ajuda de algo ou 2 1 2 6 8 7 7 4 37
alguém
Superações 5 3 3 10 9 8 8 6 52
Retornos 4 1 1 3 5 4 5 3 26
Lembrança de
detalhes 8 6 8 28 14 18 16 7 105
Primeiras
6 3 4 8 5 8 5 6 45
recordações
Memórias
2 3 14 23 5 14 8 1 70
sociais/históricas
Matrizes culturais 3 1 2 7 2 0 7 2 24
Reconhecimento 64 28 41 70 52 56 57 54 422
Sentir-se
18 11 11 20 11 14 19 17 121
orgulhoso
Sentir-se motivado 8 2 3 4 10 5 8 6 46
Reconhecer suas
4 3 6 4 1 9 5 10 42
oportunidades
Reconhecer suas
17 5 5 20 18 9 19 11 104
ações
Reconhecer a
16 6 4 18 11 19 6 5 85
organização
Ter o
reconhecimento da 1 1 12 4 1 0 0 5 24
família
Sentimento de
46 13 19 42 39 47 46 29 281
pertencimento
120
Vínculos com
7 2 5 10 5 13 13 10 65
colegas
Fazer parte de um
18 6 8 22 18 24 21 6 123
projeto
Ambiente 7 1 0 7 4 4 4 6 33
Mudança de
atitude por causa 4 2 1 0 5 4 4 4 24
dos valores da org.
Identificação c/ os
10 2 5 3 7 2 4 3 36
valores da org.
Disseminação do
27 6 7 44 40 53 43 10 230
conhecimento
Tendências da
2 1 1 9 10 7 1 1 32
época
Soluções de
4 3 1 3 11 4 3 1 30
problemas
Palavras técnicas 0 0 1 3 0 11 4 3 22
Explicação de
8 0 1 8 6 5 11 1 40
conceitos
Explicação de
13 2 3 21 13 26 24 4 106
processo/ projeto
Vulnerabilidades 6 3 5 13 7 13 9 3 59
Algo que não deu
3 2 1 5 0 8 2 2 23
certo
Saída de um
1 0 0 1 1 0 1 0 4
emprego
Preconceito 1 0 0 0 0 0 0 0 1
Ainda não atingiu
1 0 3 0 0 0 0 0 4
o esperado
Não lembra de
0 1 1 3 0 2 3 0 10
algo
Caos/ confusões 0 0 0 4 6 1 2 0 13
Algo que não
0 0 0 0 0 2 1 1 4
sabia
apresenta vários códigos que a identificam, pode-se observar também que o não
aparecimento de um dos códigos de identificação em uma micronarrativa, não indica
que a categoria não esteja presente nesta fala do entrevistado, já que há a presença de
outros códigos que a identificam.
A manifestação destes elementos nas micronarrativas revelam que
independentemente das atuações do profissional, de suas idades, do seu sexo, do tempo
de permanência na organização e do cargo exercido pelo profissional entrevistado, ao
narrar suas trajetórias de vida, elementos ligados ao emocional, às subjetividades, ao
humor, ao reconhecimento de si próprio e da organização, ao sentimento de
pertencimento, à mitologia, aos seus próprios atos heróicos, à valorização de suas
próprias memórias, à disseminação de seus conhecimentos e às suas vulnerabilidades
estão presentes.
Para aprofundar as análises sobre as categorias e a presença dos códigos de
identificação que a constituem, será importante refletir sobre suas frequências em
relação as falas dos entrevistados, que podem variar de acordo com suas personalidades,
suas visões de mundo, suas experiências e suas crenças e também pelo ritmo e pela
condução da própria entrevista. Por isso, o próximo passo será analisar e interpretar
como cada uma das categorias aparece e perpassa pelos depoimentos de vida sorteados,
exemplificando suas presenças.
Como todas as categorias estiveram presentes nas falas dos entrevistados, nesta
parte do trabalho pretende-se passar por cada uma delas, explorando a quantidade de
códigos de indentificação, exemplificando-os com algumas citações encontradas nas
micronarrativas, analisando e interpretando a importância de cada uma destas categorias
para o desenvolvimento de uma comunicação interna que as leve em consideração na
hora de planejar suas ações. Sendo assim, a seguir será feita a análise e a interpretação
sobre os resultados referentes a cada categoria e seus respectivos códigos:
122
Número Autores
Exemplos de
Códigos Entrevistados total de dos
citações
referências exemplos
"sinto-me
extremamente feliz
de ter participado,
Ana (11), Attílio (2), Eduardo
que foram
Clarindo (4), Cláudio momentos
Afir. dos
(9), Eduardo (12), José 98 maravilhosos"
sent. +
(25), Morgana (21),
"Uma coisa
Patrícia (14)
fantástica. Uma
Cláudio
sensação
indescritível"
Ana (4), Attílio (1),
Clarindo (2), Cláudio "eu saia um pouco
Afir. dos
(6), Eduardo (3), José 23 com a sensação de Morgana
sent. -
(1), Morgana (3), impotência"
Patrícia (3)
por ter atingido suas metas ou ânimo por ter sido reconhecido, são todos exemplos que
podem “alterar as tomadas de decisões de modo a reverter muitas situações, tornando-as
assim, mais favoráveis aos objetivos individuais e organizacionais” (OLIVEIRA,
2013).
Além disso, é importante reforçar que, em tempos de efemeridade, fluidez,
velocidade e excessos de informações, em que normalmente não há espaço para as
emoções, fazer o caminho contrário e explorar os sentimentos em suas ações de
comunicação interna, na criação de peças, ou até mesmo, fazer as coletas e as edições de
depoimentos a serem também expostos a outros funcionários, é uma alternativa para se
conquistar a atenção dos públicos e envolvê-los pela afetividade.
Número Autores
Exemplos de
Códigos Entrevistados total de dos
citações
referências exemplos
"Então, fatalmente
esse é o meu
Ana (10), Attílio (2), sonho, conseguir
Clarindo (8), Cláudio José
Sonhos/ implantar o projeto
(7), Eduardo (15), José 87
Manifestações das subjetividades
"Esses executivos
deviam depois
ocupar posições
Ana (19), Attílio (4),
mais importantes
Clarindo (9), Cláudio
na Alemanha
Crenças (7), Eduardo (11), José 100 Cláudio
porque eu acredito
(12), Morgana (32),
que a primeira
Patrícia (6)
geração veio para
seguir quase que
uma aventura aqui"
"O “Pão de
Ana (4), Clarindo (7), açúcar” aconteceu
Cláudio (12), Eduardo em dois momentos,
Segredos 32 Eduardo
(2), José (3), Morgana foi meu primeiro
(2), Patrícia (2) emprego, isso
poucos até sabem"
"Mas eu acho que
como começo de
carreira a
Ana (4), Attílio (3),
experiência daqui
Clarindo (5), Cláudio
foi fundamental,
Achismos (6), Eduardo (7), José 65 Morgana
para as outras
(14), Morgana (21),
coisas que eu
Patrícia (2)
pensei e
desenvolvi na
minha vida"
declarações são as pessoais como pescar e ficar na praia, narrados tanto por Clarindo,
como por Eduardo. Presentes em todos os entrevistados, são somadas 46 referências.
Já o código sobre achismos é contabilizado todas as vezes que o entrevistado
admite algo, colocando suas opinião em sua fala, dizendo as expressões “eu acho” ou
“eu achava”, resultando em 65 representações. Na mesma linha de identificação,
crenças aparecem sob um total de 100 citações. Este código de identificação seleciona
as expressões como “eu acredito”, “eu acreditava” ou “eu estava certo de que”, ou
quando a pessoa fala algo que significa uma certeza em sua afrmação. É um código que
aparece inúmeras vezes em todos os entrevistados.
Diferente deste último código, os segredos não são tão frequentes, apresentando
apenas 32 citações, já que são bem específicos e não aparece na fala de um dos
entrevistados. Eles tratam de situações em que o narrador conta pontos de sua vida que
ele não havia contado para muitas pessoas, como o caso do Eduardo, que narra algo que
“até poucos sabem” sobre o Pão de Açúcar estar duas vezes presente em sua vida, como
primeiro emprego e depois como gerente de marketing, ou então, como um segredo da
organização, como quando o Cláudio conta sobre momentos de tensões na Volkswagen,
em que fusões geraram grandes estresses e até um suicídio.
A partir dessas revelações, nota-se a importância dessa categoria pelos seus
resultados recorrentes e esclarecedores de que a comunicação interna, através de ações
de contações de histórias pessoais pode oferecer aos indivíduos essa abertura para suas
imaginações, refletindo sobre aqueles valores transcendentes e específicos de cada
integrante da organização, na medida em que compreendem aquilo que de fato pode ser
significativo para aqueles que narram em voz alta os aspectos em que acreditam, suas
opiniões e suas afetividades sobre as ocorrências no mundo organizacional.
Ao manifestar as subjetividades, os indivíduos vivem um momento em que eles
podem mergulhar em seu íntimo e gerar significados e reflexos sobre os propósitos de
sua vida, reconstruindo suas identidades. Por outro lado, compreender as subjetividades
da equipe é permitir que os objetivos da organização possam ser atingidos mais
facilmente quando estes levam em consideração tais ideias, como foi observado na
teoria.
129
- Humor:
Número
Autores dos
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações
exemplos
referências
A categoria humor foi identificada pela presença dos códigos ironia, palavras no
diminutivo, metáforas e contação de casos engraçados, gerlamente, em muitos casos,
seguidos por risos. Independentemente de suas formações - engenheiros, psicólogos,
comunicadores ou mesmo quem não apresentava um estudo superior - narraram muitos
casos capazes de fazer sorrir, surpreender e divertir, pontos que, Lipovetsky (1989)
coloca como essenciais para que sejam trabalhados pela comunicação nos tempos
atuais. Alguns exemplos de citações podem ser observados na tabela 5.
A ironia trata das citações em que o entrevistado fala algo querendo dizer outra
coisa, para satirizar alguma situação. Ela aparece nos depoimentos de todos os
entrevistados, somando 48 referências ao total. As palavras no diminutivo aparecem
diversas vezes. Elas não representam algo pequeno no seu tamanho, mas como uma
piada, diminuindo a importância de algo, alguém ou de uma sitação de maneira
engraçada, ou de maneira carinhosa que dá certo tom humorístico, apresentando ao todo
40 referências.
As metáforas, com o registro de 89 citações, surgem nas micronarrativas com
conotações divertidas, estabelecendo pensamentos criativos, ao correlacionar dois fatos
que inicialmente não pareciam ter ligação, o que torna a mensagem com um tom
engraçado para ser contabilizado dentro da categoria humor. Já os fatos engraçados
correspondem a todos os casos contados pelos narradores, como histórias cômicas, por
vezes de algo inesperado, tendo um resultado com número de 70 citações.
Como apresentam-se relevantes suas ocorrências, ações como estas envoltas pela
contação de histórias individuais, podem ser utilizadas pela comunicação interna para
gerar leveza, alegria, entretenimento e bom humor para os funcionários, já que são
expressões que tendem a causar sorrisos ou risos ao serem narradas, escutadas e
interpretadas. Além disso, sua percepção pode demonstrar inteligência emocional, a
qual pode ser utilizada como um potencial daquele que narra para determinadas ações.
Outro ponto positivo para a presença relevante desta categoria é que um espaço
para a descontração, para a fluidez da criatividade e da diversão singela trazida pelo
humor pode melhorar aqueles ambientes apresentados por muitas organizações em que
normalmente são pesados, estressantes e fazem as pessoas prezarem por uma seriedade
que, muitas vezes é desnecessária e pode causar desmotivação, infelicidade e baixa
produtividade.
131
- Presença mitológica:
Número Autores
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações dos
referências exemplos
"Porque o comércio
também aqui era pouco.
Tinha umas quatro
Ana (4), Attílio (1), vendinha só. Depois Clarindo
Mitos de Clarindo (8), Cláudio (1), que a Aracruz chegou
38 começou desenvolver
transformação Eduardo (8), José (4),
Morgana (6), Patrícia (6) tudo"
Por estes resultados presentes nas falas dos entrevistados, tem-se que os mitos
organizacionais são formados a partir das histórias que cada ser humano integrante da
organização conta a si mesmo e aos outros, para gerar um significado. Para a
comunicação interna, identificar a presença da mitologia organizacional permite
“reconhecer o poder que as histórias individuais têm e que se ampliam com as da
própria organização, contribuindo para o sucesso ou insucesso dos seus processos
internos de gestão” (CASTRO, 2000, online). Isso significa que, através destes pontos
levantados pelas micronarrativas é possível (re)construir uma macronarrativa
organizacional em que sejam valorizados todos os símbolos criados, integrando os seus
significados aos processos de legitimação. Além disso, ao narrar, as pessoas se
reconhecem como pertencentes a esta macronarrativa.
- Heroísmo:
Número Autores
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações dos
referências exemplos
"fiz um ano de
especialização (pelo
BNDES), ao final do
Attílio
curso prestei exames,
pesados, algumas
provas duraram cinco,
seis horas"
Ana (10), Attílio (4), "Mas foi um desafio
Caminho Clarindo (4), Cláudio aprender sobre papel,
das provas/ (23), Eduardo (8), José 95 porque todo mundo Ana
dificuldades (22), Morgana (18), acha que é simples,
Patrícia (6) mas não é"
"Então, a gente fazia
todos os estudos
necessários, mas só a
prática, a instalação José
que iria provar que
realmente isso daria
certo."
Ana (5), Attílio (3), "Então, isso criava uma
Clarindo (3), Cláudio barreira, um problema
Superações (10), Eduardo (9), José 52 de entendimento. Mas Cláudio
(8), Morgana (8), Patrícia com o tempo isso foi
(6) sendo resolvido."
jornada profissional, quando é citado este momento em suas vida como algo marcante e
transformador, assim como colocado nos exemplos de citações na tabela 7.
Eduardo morava no Rio de Janeiro, vivia de mesada e foi obrigado pelo pai a
sair do seu mundo comum, onde sua maior preocupação era de como seria o por do sol,
para procurar emprego em São Paulo. José teve que sair de Barra Mansa para fazer
cursinho especializado para a faculdade IME, que era o seu sonho. Morgana saiu de
casa, deixando seus pais em Minas Gerais para estudar na PUC-SP e começar sua
carreira de psicóloga em São Paulo. Clarindo trabalhava na roça, com plantações, mas
mudou-se para Aracruz cidade para onde a organização Aracruz Celulose estava
levando desenvolvimento e melhores oportunidades. Patrícia estava acostumada com a
vida no interior da cidade Taubaté com a tia quando decidiu que queria trabalhar na
Natura. Ou seja, todos estes narram o momento em que o destino convocou-os para uma
reigão desconhecida no início de suas jornadas profissionais.
Para este início de jornada, todos eles tiveram ajuda de algo ou de alguém, o que
Campbell (2007) chama de “auxílio sobrenatural”. As citações na tabela 7 exemplificam
algumas destas narrações, porém, resumidamente tem-se que todos apresentam este
estágio em suas falas, resultando em 38 referências. Ana sempre morou em São Paulo,
mas a Votorantim não foi seu primeiro emprego. Ela teve a ajuda do marido de uma
amiga para seu currículo chegar até a área de Recuros Humanos da Votorantim e ela ser
chamada para uma entrevista em que foi aceita. Eduardo tinha um primo que sabia de
uma vaga que era o perfil dele no Pão de Açúcar e o indicou. Patrícia entrou na Natura
quando conheceu Emanuela, que era a supervisora e fazia o recrutamento. Clarindo foi
ajudado pela própria Aracruz que o contratou por causa da serraria que ele tinha.
Cláudio descobriu sua vocação para engenheiro após ter sido ajudado por um professor
particular que o fez aprender a estudar, saindo do zero na prova de matemática ao
melhor aluno da turma. Attílio foi ajudado a descobrir seus gostos pelo pai, que era
advogado. Morgana conheceu sua verdadeira vocação quando encontrou o Wellington
Nogueira, fundador do Doutores da Alegria, sendo levada a fazer mestrado sobre o
assunto e a publicar um livro.
Sobre a parte da iniciação, os códigos identificavam o caminho das provas, as
dificuldades enfrentadas e suas superações até atingirem a apoteose, ou seja, em “um
degrau acima do entusiamo, quando meramente se tem o deus dentro de si” (VOGLER,
2009, p. 252), podendo então o entrevistado se sentir como poderoso, como um modelo
a ser seguido.
139
- Valorização da memória:
em locação de ferrovias
Clarindo (4), Cláudio
Primeiras e também nos trabalhos
(8), Eduardo (5), José 45 Attílio
recordações de movimento de terra,
(8), Morgana (5),
esse foi meu primeiro
Patrícia (6)
emprego."
"Porque a energia
funcionava com motor a
óleo. Quando dava 10
Ana (2), Attílio (3),
horas da noite eles
Memórias Clarindo (14), Cláudio
davam um sinalzinho de
sociais/ (23), Eduardo (5), José 70 Clarindo
que ia terminar, ia
históricas (14), Morgana (8),
desligar os motor. A
Patrícia (1)
turma dos que estava na
rua tinha que ir para
casa"
"Na época era uma
coisa um pouco da
Ana (3), Attílio (1),
minha personalidade, de
Clarindo (2), Cláudio
Matrizes alguém tímida que
(7), Eduardo (2), 24 Morgana
culturais escutava muito, tinha
Morgana (7), Patrícia
muita facilidade para
(2)
estar escutando os
outros"
141
Rádio Eldorado que hoje não existem mais, na de Attílio que comenta sobre a sua
faculdade na Escola de Engenharia da Universidade do Brasil, a qual ficava localizada
no Largo São Francisco, mas que hoje tem uma nova sede em outra região de São
Paulo. Além destes, Cláudio comenta que andava em um bonde que o deixava na Rua
São Bento, onde ficava seu colégio, e que, quando fez admissão na Vergueiro: “A
Catedral ainda não estava pronta. Mas tinha uma igreja famosa perto de casa, que era a
Igreja Santo Antônio do Pari, que é a igreja do casamenteiro. Então, no dia de Santo
Antônio sempre enchia de moças lá”.
As matrizes culturais dizem respeito aos conhecimentos adquiridos por uma
pessoa a partir de uma experiência individual, uma vivência interpretativa, em que o
entrevistado reflete sobre a percepção de algo que ele desenvolveu por ter um talento,
apresentando 24 citações, assim como a de Morgana, que apresenta em sua fala sobre as
lembranças da sua personalidade na infância que influenciaram a psicóloga que ela
seria, ou então quando Cláudio tirava zero na prova de matemática e então conta que um
professor particular o ensionou a estudar e ele diz: “Como eu tinha adquirido aquela
facilidade de estudar matemática, eu queria fazer engenharia química. Aí eu fiz o
vestibular, entrei”.
Sendo assim, por todos estes códigos e suas presenças, nota-se que nesses
registros podem surgir tanto datas marcantes para a organização como fundação, início
de um projeto, duração de um processo ou até mesmo datas e acontecimentos marcantes
ao próprio entrevistado, os quais, ao serem registrados, podem ser utilizados pela
comunicação interna em comemorações, promovendo o reconhecimento dos
funcionários e de suas ações, como, por exemplo, comemorar os 20 anos de um projeto,
ou montar uma exposição ou desenvolver uma publicação ou uma produção audiovisual
sobre a história da organização, em que se valorizem as pessoas que dela fizeram parte,
também reconhecendo-as e despertando nelas o sentimento de pertencimento.
Ações em que se valorizem as memórias da organização, suas datas, seus
detalhes, suas evoluções e os desenvolvimentos trazidos para a sociedade podem gerar
identificação e empatia, construindo uma cultura organizacional forte, ligada aos valores
das vivências de todos aqueles que contribuiram conjuntamente para a construção desta
realidade narrativa, seja através de suas ações, de suas próprias matrizes culturais ou dos
seus sentimentos afetados pelas experiências que ali vivenciou. Quando esta realidade
narrativa é apresentada fortemente de maneira positiva pelo público interno, certamente
ela será observada também dessa maneira externamente.
143
- Reconhecimento:
Número Autores
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações dos
referências exemplos
Quando acordamos
de manhã, falamos:
“Estou indo
Ana (8), Attílio (2),
trabalhar!!” (risos).
Clarindo (3), Cláudio (4),
Sentir-se motivado 46 Isso não tem preço, Ana
Eduardo (10), José (5),
não tem salário, não
Morgana (8), Patrícia (6)
tem nada, é isso que
me fez ficar e vou
ficando, ficando...
afirma seu orgulho por causa de uma atitude, de uma ação, de uma conquista ou de um
sucesso, tendo ao todo 121 citações.
O reconhecimento de suas ações são aquelas expressões referentes ao
reconhecimento que o entrevistado tem em relação ao sucesso das atividades
desenvolvidas por ele em sua atividade profissional. Como são contados, em todas as
entrevistas, muitos casos de realizações pessoais, estes códigos ganham bastante
representatividade, com 104 referências, as quais organizam os pensamentos sobre
aquelas atitudes que levaram o indivíduo a se sentir vitorioso. Normalmente estão
envolvidas com a narração de projetos e de superações sobre dificuldades, no momento
em que o entrevistado reconhece que o seu trabalho gerou resultados para a
organização.
O código de identificação sobre se sentir motivado aparece somatizando 46
exposições sobre o quanto o entrevistado se sente entusiasmado e animado em relação
ao seu trabalho exercido na organização, aparecendo em todas as narrações através de
afirmações como esta exemplificada na tabela 9.
Reconhecer suas oportunidades compreende todas as 42 referências em que o
entrevistado conta sobre suas chances, tanto em relação aos estudos, como o exemplo na
tabela 9, como em relação ao seu desenvolvimento como profissional, quanto aquelas
oferecidas pela organização, como na citação de Eduardo que diz: “Então, foi uma
grande conquista de um grupo (...) que não era grande nem pequeno, era do tamanho
certo e eu tive a oportunidade de ser um membro desse grupo.”
Muitos entrevistados falam do investimento que a organização proporcionou
para os estudos, como o mestrado feito pelo José pela Petrobras, a especialização feita
na França pelo Attílio pelo BNDES, assim como as oportunidades reconhecidas para o
crescimento pessoal e profissional como narrados pela Morgana sobre tudo o que
aprendeu no InCor e pelo Clarindo ao falar das oportunidades que a Aracruz ofereceu a
ele.
Reconhecer a organização contempla as declarações que o entrevistado faz sobre
o quanto ele admira o lugar em que trabalha e a sua história. Aparece em todos os
depoimentos com 85 referências ao todo. Esses reconhecimentos passam desde citações
sobre as pessoas identificarem-se com as ações desenvolvidas pela organização, como
ações de reciclagem como é o caso da Natura e do Pão de Açúcar citados por Patrícia e
Eduardo, de desenvolvimento para a sociedade como Clarindo fala inúmeras vezes em
relação à Aracruz e Attílio sobre o BNDES, de produção de novas tecnologias como a
146
Ana e o José falam sobre a Votorantim e a Petrobras, como citações sobre o crescimento
da organização como Cláudio fala da Volkswagen do Brasil.
Ter o reconhecimento da família diz respeito as manifestações sobre o quanto a
família do narrador tem orgulho daquela pessoa e o quanto elas identificam o seu
sucesso. Há poucas manifestações, com 24 ao todo, por 6 dos 8 entrevistados, citadas
normalmente quando o ritmo da entrevista levava para assuntos familiares sobre os pais,
filhos ou esposa e marido, mas às vezes aparece espontaneamente como no depoimento
de Patrícia, exemplificado na tabela 9.
Esses resultados apontam que, pelas micronarrativas, é possível detectar se o
funcionário sente-se reconhecido e, por isso, motivado a continuar, a ter ideias novas, a
se envolver em novos projetos ou não. No caso das entrevistas analisadas quase todas as
citações são positivas, porém, há citações da Morgana, que significavam que ela não
estava motivada por não sentir que utilizava todo o seu potencial como psicóloga no
hospital e, por isso, resolveu sair e procurar estudar e se desenvolver sobre novas
possibilidades. Neste caso, essas citações foram consideradas como subjetividades
(código incertezas) e como vulnerabilidades (códigos sobre algo que não deu certo,
saída de um emprego e confusões) como será visto adiante.
Para a comunicação interna é fundamental compreender essas questões para
evitar que se percam talentos, investindo naquilo que eles expõem como motivos de
reconhecimento, como: elogios pelos seus trabalhos desenvolvidos, palavras amigáveis
de seus superiores, oportunidades de crescimento e de desenvolvimento profissional,
como por exemplo, pelo pagamento de cursos ou pela flexibilidade de horários para
participar em congressos, ou até mesmo em relação a ter tempo com a família ou o
próprio reconhecimento que esta demonstra. Por outro lado, caso apareçam citações
negativas sobre a falta de reconhecimento, excessivas cargas horárias, salários baixos, e
até desmotivação por conta de realizações de trabalhos que não agradam ao funcionário
ou que não exploram positivamento todo o seu potencial, é de extrema importância que
sejam identificadas e trabalhadas para tentar evitar estresses, esgotamentos, ansiedades e
infelicidades que podem levar o funcionário a não se envolver com os projetos e até
mesmo desejar sair da organização.
147
- Sentimento de pertencimento:
Número Autores
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações dos
referências exemplos
- Disseminação do conhecimento:
Número Autores
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações dos
referências exemplos
Tendência à
globalização
significava que a
Autolatina ia ter que Cláudio
pegar um produto do
exterior para fazer no
Ana (2), Attílio (1), Brasil
Tendências Clarindo (1), Cláudio (9),
32 Mas a tendência é que
da época Eduardo (10), José (7),
os robôs submarinos
Morgana (1), Patrícia (1)
estão ficando cada vez
mais baratos, os
barcos, os José
mergulhadores têm
sido utilizados em
situações cada vez
Disseminação do conhecimento
mais limitadas.
Um dos maiores
problemas que existia
no começo da nossa
engenharia era de
fazer o
Ana (4), Attílio (3), dimensionamento
Soluções de Clarindo (1), Cláudio (3), interior do carro; a
30 Cláudio
problemas Eduardo (11), José (4), posição de pedais (...)
Morgana (3), Patrícia (1) Aí a gente foi mais a
fundo na história e
vimos que,
mundialmente, se
utilizam manequins
para isso
E de lá ações
promocionais, iam
para praia, meninas e
garotos bacanas,
bonitos com coletor de
dados, perguntando
Eduardo
para as pessoas, que
estavam lá tomando
Ana (13), Attílio (2), sol, perguntando para
Explicação Clarindo (3), Cláudio as pessoas: “O senhor
processo/ (21), Eduardo (13), José 106 não quer fazer
projeto (26), Morgana (24), supermercado?”
Patrícia (4)
E o peixe pequeno a
gente pega e solta,
porque a gente tem
Clarindo
que soltar o pequeno
hoje para ter o grande
amanhã
diminuir a vibração dos caminhões que transportavam os materiais, dizendo: “e era uma
solução simples com os papéis auto-copiativos. Consistia em pegar um feltro que é
utilizado na máquina de papel e revestir o caminhão com aquilo pra diminuir as
vibrações durante o trajeto na estrada, uma coisa super simples”. Eduardo conta qual foi
a solução que encontrou quando foi desafiado a criar o Pão de Açúcar Kids, chamando
pensadores para ajudar e buscando conhecimento na Disney e com o Maurício de Souza.
Além dessas explicações, José cita quando teve que criar dois modelos de carros para
testar um motor tanto na parte dianteira quando na parte traseira.
As palavras técnicas aparecem em pouca frequência, tendo apenas 22 referências
Alguns outros exemplos, além do da tabela 11, ainda de José, que é o entrevistado que
mais apresenta citações de palavras técnicas, há referências a “Helipradoquixanuaiser”,
que ele explica ser um equipamento que conectava o poço do fundo do mar até o navio,
além de falar sobre nomes de outros equipamentos como Serim, EPR e Early
Production Raiser. Mas, além de José, outros se utilizam de poucas palavras técnicas
como Clarindo que fala sobre “Caieiras”, que é “o monte que eles fazem de madeira
igual uma toca de índio. E depois coloca o fogo aí e cobre com terra” e Morgana que
cita alguns tipos de terapias como: terapia psicanalítica, lacaniana e psicodrama.
O código de identificação em que os entrevistados explicam conceitos é
referente a explanações sobre ideias voltadas sobre a sua área de atuação. Este código
aparece em todos os depoimentos, exceto no de Attílio, sendo contadas 46 explicações
deste tipo. Ana fala sobre a importância em não se pensar apenas o cliente na hora de
vender os produtos, mas em entender quais são as suas necessidades de mercado ou
quando algum conceito ligado à sua área é detalhado, assim como Morgana esclarece:
“Por exemplo, quando o paciente não aceita alguma coisa que você coloca tem um
nome pra isso que é resistência (...) então é o termo para mostrar que aquela pessoa não
está aderindo ao processo, a uma interpretação sua”.
A explicação de projetos e processos, são as que aparecem com maior
frequência, com 106 identificações, aparecendo em todas as transcrições, uma vez que
ao se narrar as suas atividades, os entrevistados contam com prazer e segurança sobre os
seus conhecimentos dentro das explicações de como realizaram tais atividades. Muitas
vezes, isso se dá também por serem instigados pelo próprio entrevistador que faz
perguntas referentes a estes processos para que fiquem intensionalmente registrados os
processos, de maneira detalhada, já que também é de grande relevância para eles
explicarem sobre suas atuações na organização. Todos os entrevistados apresentam
153
inúmeras citações. José e Cláudio são os que mais detalham em suas explicações e
Eduardo é o que abrange mais histórias sobre inúmeros projetos diferentes nos quais
esteve envolvido.
Sobre esta categoria, há dois pontos diferentes a serem interpretados. A presença
do conhecimento a ser coletado, disseminado e transmitido pode ser de grande
relevância para que não se percam os conteúdos produzidos pela organização. Podem
também ser utilizados como referência em ações de comunicação interna que visem a
integração de novos membros aos processos organizacionais.
Porém, por outro lado, palavras muito técnicas e mensagens objetivas muito
específicas sobre determinados processos não tornam uma história interessante e
atrativa. Em relação às outras categorias, pode-se perceber que a presença de citações
sobre os códigos referentes à disseminação de conhecimento são bem menores. Isso
pode ser justificado pelo fato de que as micronarrativas, depedentes dos entrevistadores
e das conduções que estes fazem para a contação da história, tendem a ser menos
técnicas e objetivas.
Caso o comunicador necessite criar ações que envolvam a disseminação de
informações e de conhecimentos, ele deve tentar evitar os seus excessos, as suas
exposições exageradas de palavras técnicas, caso seja possível, e tentar criar ações
diferenciadas, pautadas por mensagens mais atrativas como histórias que exemplificam
um processo de maneira mais afetiva e atrativa.
154
- Vulnerabilidades:
Número Autores
Códigos Entrevistados total de Exemplos de citações dos
referências exemplos
no mercado. Um mercado
exclusivamente masculino."
Como cada depoimento de vida possuia uma duração diferente de acordo com o
ritmo do entrevistado, as ocorrências das categorias foram transformadas em
porcentagem, de acordo com a quantidade de conteúdo analisado em cada
157
Externalização
10,49% 9,42% 14,46% 17,32% 11,33% 9,84% 15,25% 14,10% 12,78%
dos sentimentos
Manifestação
das 12,35% 9,42% 12,40% 8,21% 9,69% 11,47% 20,08% 10,37% 11,75%
Subjetividades
Sentimento de
14,20% 9,42% 7,85% 7,50% 10,77% 11,01% 8,88% 12,03% 10,21%
pertencimento
Humor 7,41% 7,97% 9,09% 15,36% 9,67% 6,09% 6,56% 6,64% 8,60%
A presença
8,02% 10,87% 12,40% 5,17% 10,77% 7,73% 7,92% 5,39% 8,53%
mitológica
Heroísmo 8,02% 8,70% 4,96% 8,21% 6,91% 10,53% 9,07% 9,54% 8,24%
Disseminação
do 8,33% 4,35% 2,89% 7,86% 11,05% 12,41% 8,30% 4,20% 7,42%
conhecimento
Vulnerabilidades 1,85% 2,17% 2,07% 2,32% 1,93% 3,04% 1,74% 1,24% 2,05%
Por estes resultados, pode-se perceber que a presença das categorias estão bem
distribuídas nas falas dos entrevistados, considerando que, por serem organizadas em
dez categorias, a média equilibrada seria de 10% de presença para cada uma delas. Os
valores de frequência variam próximos aos 10%, apresentando poucas variações para
cima ou para baixo, mas mostrando que a presença é significativa em todas as
categorias, exceto a categoria das vulnerabilidades, que aparece com apenas 2,05% de
presença.
158
Isso pode ser justificado, como pudemos perceber por meio das análises dos
códigos, por uma questão de condução do entrevistador ou por uma escolha do narrador
ao contar os fatos, sendo que normalmente as pessoas preferem falar de suas vitórias aos
seus fracassos, vibrar pelos seus sucessos e esconder os seus insucessos. E, geralmente,
quando citadas algumas de suas vulnerabilidades, elas são seguidas por uma
justificativa, uma superação e um sentimento de reconhecimento sobre suas ações. Essa
ideia é reforçada quando apresenta-se na categoria oposta, de maior frequência, o
reconhecimento de si próprio e da organização na qual se trabalha, com 16, 29% de
frequência.
O próprio fator da pessoa estar sendo entrevistada, escutada, e, sendo assim, ela
saber que tem voz, isso já traz ao narrador, em certo nível, um sentimento de
reconhecimento. Ao narrar, as pessoas desejam deixar registradas as suas ações bem
sucedidas, as suas realizações que lhe fizeram ser o que são naquele momento em que
são interrogadas.
Um fato curioso é que a pessoa entrevistada com maior frequênica dessa
categoria (22,40%), é a promotora da Natura, que possui o cargo mais baixo dentre os
entrevistados e a menor idade. Quando se pode imaginar o contrário, de que quanto
mais vivências e conquistas, maior a frequência de reconhecimento em suas
micronarrativas, este dado mostra que isso não é regra. Se o que foi realizado por ela for
significativo, ela pode se sentir reconhecida e reconhecer o que a organização fez, tanto
por ela quanto para a sociedade.
A valorização da memória é a segunda categoria com maior frequência,
aparecendo com 14,50%. Por ser tratar de uma ação de memória é evidente que esta
categoria apresente uma significativa ocorrência em todas as falas, já que a proposta dos
projetos são exatamente o levantamento do que foi significativo na vida de cada um dos
entrevistados. Os três entrevistados de idades mais avançadas foram os que tiveram
mais ocorrências nesta categoria, indicando que quanto mais idade, mais vivências e
experiências e, consequentemente, mais memórias são destacadas e valorizadas.
As categorias de externalização dos sentimentos e das manifestações das
subjetividades aparecem de forma bem distribuída entre as falas dos entrevistados com
respectivamente 12,78%, 11,75% de frequência. Esses resultados são interessantes na
medida que demonstram exatamente o equilíbrio destas duas categorias que dizem
respeito ao mais íntimo dos entrevistados, que são suas emoções, seus sonhos, suas
159
sonhos e desejos, com as suas motivações e seus medos, seus sentimentos positivos e
negativos, seus conhecimentos e suas vulnerabilidades, a partir das memórias de cada
um deles.
A amostra apresentava: um diretor de projeto, um gerente, uma coordenadora,
um fiscal, uma concursada que se tornou uma Doutora da Alegria, uma promotora, um
engenheiro concursado que era analista de projetos e um marceneiro que fez trabalhos
pontuais para uma organização, sendo um fornecedor que se considerava membro da
organização. Destes oito entrevistados sorteados, dois já estávam aposentados. Um fez
apenas alguns trabalhos para uma das organizações. Três eram mulheres. Uma delas
havia desistido de sua profissão em busca de novos sonhos. Outra delas ainda estava no
início da carreira.
Mas não importam tais características, em todas as micronarrativas contadas por
eles pode-se contar a presença de diversas citações que identificam a externalização dos
sentimentos, as manifestações das subjetividades, o humor, a presença mitológica, o
heroísmo, a valorização da memória, o reconhecimento, o sentimento de pertencimento,
a disseminação do conhecimento e suas vulnerabilidades. Todas características
destacadas na teoria como fundamentais para serem trabalhadas pela comunicação
interna nos novos contextos apresentados e a nova maneira de sentir o mundo e agir
sobre ele.
Os entrevistados foram sorteados a fim de que reduzisse a imparcialidade sobre
a presença de tais características nas falas, independentemente de quem eles fossem. E
os resultados foram bem interessantes na medida também em que se pode fazer algumas
considerações de acordo com suas diferenças.
Não importa se são narrativas de funcionários aposentados, como Attílio e
Cláudio, que demonstram o quanto o trabalho deu a eles o sentido e o significado para
as pessoas que eles se tornaram, servindo de exemplos para futuros funcionários, além
de todo o registro de seus conhecimentos, produzidos por anos para as organizações em
que trabalharam. Como verificou-se pela teoria, por Seaman e Smith (2012), é preciso
reconhecer a força que o passado possui para liderar com senso histórico sobre os
passos futuros. Por outro lado, em narrativas de pessoas muita jovens, como Patrícia de
apenas 31 anos, no começo de sua carreira, há inúmeras histórias, sonhos, revelações e
manifestações de grande relevância que devem ser significativas para a construção de
uma nova narrativa para a comunicação que esteja de acordo com todos esses
sentimentos.
162
A vida que as pessoas possuem não são formadas apenas por grandes momentos
o tempo todo. Mas são as miudezas vividas que compõem a nossa grandeza. Por isso, é
163
importante valorizar as riquezas dos detalhes cotidianos, os quais são essenciais para a
construção do nosso ser e do nosso sentido de existência. A naturalização da rotina, os
excessos de informações, a velocidade dos fatos, faz com que, por muitas vezes, “estes
pequenos milagres presentes no dia a dia sejam desvalorizados” (CARRASCOZA,
2013)7.
Ao perceber este fenômeno, cabe ao comunicador saber valorizar e enxergar, por
uma ótica invertida, como podem ser grandiosos os pequenos detalhes narrados a partir
das experiências cotidianas vivenciadas pelo público interno. Como na obra de Italo
Calvino (1994), sobre o telescópio invertido de Palomar, que, ao invés de ampliar os
espaços, focava para as coisas próximas do cotidiano. Metaforicamente, mostra que as
grandes questões do mundo e do significado sobre a existência do homem estão
presentes em cada objeto observado, em cada cena presenciada e em tudo que é digno
de ser pensado e memorável.
Sendo assim, compete ao comunicador, por esta ótica invertida, conseguir
visualizar e valorizar os pequenos momentos como grandiosos, porque na verdade é
tudo o que as pessoas possuem. Não é possível memorizar todo o vivido. Por isso, o
profissional de comunicação interna precisa estar preparado para escutar e enxergar essa
beleza do cotidiano memorável. Aquilo que aparentemente poderia parecer banal e
corriqueiro, pode conter elementos incríveis porque, se foi memorável para o
entrevistado, significa que aqueles pontos da micronarrativa possuem o de mais valioso
para ele.
Desta forma, “mesmo quando um detalhe parece irredutívelmente insignificante,
rebelde a qualquer função, ele tem pelo menos a significação de absurdo ou de inútil”
(BARTHES, 2013, p.29). Todo detalhe possui uma significação, inclusive o silêncio.
Cabe ao comunicador interpretar “os ditos e os não ditos” (PÊCHEUX, 1997),
manifestações verbais e não verbais, o explícito e o implícito, “o que é dito” e o “como
é dito”.
Entre estes “não ditos” podem estar aspectos negativos ou vulnerabilidades que
o narrador tentou esconder através de seu controle emocional, ao determinar o que
“poderia” ou “deveria” contar e não contar. Por isso, para Mônica Cristine Fort et al
(2009, p.94) uma boa comunicação supõe liberdade de manifestar opiniões e
7
(informação verbal). Discussão levantada pelo Prof. Dr. João Carrascoza em reunião do Grupo de
Estudos de Novas Narrativas, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, no dia
17 de dezembro de 2013.
164
É melhor dar voz a estas pequenas partes e saber trabalhar com a ebulição de
ideias que possam surgir das micronarrativas destes multiprotagonistas organizacionais,
do que apenas deixá-las que explodam e se espalhem sem tempo de serem
compreendidas. Isso reflete também o quanto há de poder nas pequenas partes
integrantes/construtivas da organização. É preciso pensar o quanto cada uma destas
165
partes possuem seus afetos, seus desejos, suas opiniões, críticas e imagens positivas e
negativas sobre diversos aspectos organizacionais e, que, estas mesmas pequenas partes
possuem suas redes humanas e seus capitais relacionais (dentro e fora da organização a
qual pertencem), e elas podem exercer influências sobre outras pessoas, levando essas
ideias e visões sobre a organização.
Segundo a pesquisa Trust Barometer, realizada pela agência Edelman Significa
em parceria com a Aberje e a ESPM, o maior estudo global acerca da confiança,
demonstra que desde 2009 até os dados mais recentes em 2014, a categoria “pessoas
como eu” estão sempre entre as três fontes primárias de confiança, recebendo em 2014,
62% de confiança8.
Estes resultados estão de acordo com as reflexões de que hoje é preciso
considerar que existe um descentramento do poder em relação à organização. Os novos
contextos e as novas formas de sentir o mundo e agir sobre ele faz com que o indivíduo
saiba que possui voz e que pode utilizá-la nas diversas plataformas para influenciar suas
redes relacionais. Por isso, é melhor que a comunicação interna saiba compreender a
riqueza de tais informações, de modo a se trabalhar com elas tanto para valorizar esses
pequenos poderes, como também para reduzir possíveis confrontos e conflitos.
Segundo Moisés Naím (2013), as pessoas hoje não se sentem mais obrigadas a
guardar silêncio e aceitar arbitrariedades de autoridades. Para ele, os grandes poderes
perderam lugar para pessoas que se enxergam livres para perseguir seus próprios
desejos e, quando não estão satisfeitas com uma determinada ordem, não medem
esforços para modificá-las. Por isso, a organização precisa estar ciente destas novas
possibilidades e abrir espaços para escutar os micropoderes, incluindo seus
funcionários, independentemente de suas hierarquias, de forma a criar as novas
narrativas da comunicação, que estejam de acordo com estes novos contextos.
Sendo assim, estas novas narrativas devem valorizar o poder das pequenas partes
da organização, suas memórias, suas afetividades, subjetividades, sentimentos e
vulnerabilidades, de forma que a macronarrativa organizacional fale de acordo com
estas micronarrativas e que contemplem maior atratividade em tempos de déficit de
atenção, mais emoção ao invés de racionalidades e que sejam menos excessivas e mais
afetivas, e que (re)construam as identidades perdidas nos novos contextos.
8
Resultados da pesquisa podem ser obtidos pelo site: http://pt.slideshare.net/EdelmanInsights/edelman-
trust-barometer-2014-brasil
166
Dessa maneira, por um lado temos que o comunicador precisa refletir sobre as
informações presentes nas narrações, como a circulação das emoções e das
subjetividades, o humor, a disseminação de saberes, a valorização das memórias que
recuperam o legado da organização, legitimando seus feitos, suas ações e seus projetos
de forma que se construam novas narrativas baseadas em tais detalhes levantados pelos
micropoderes da organização. Por outro lado, as micronarrativas apresentam
potencialidades afetivas na medida em que proporcionam ao narrador a visualização e a
valorização de seus próprios desenvolvimentos realizados como partícipes dos
processos organizacionais, em que são reconhecidos vínculos e identidades.
Fato este que traz a percepção sobre a importância para que a comunicação
interna abra espaço para o mito e para o nascimento das figuras mitológicas
organizacionais. Essa ação é, de certa forma, a “abertura secreta através da qual as
inexauríves energias do cosmo penetram nas manifestações culturais humanas”
(CAMPBELL, 1997, p.5). Trata-se, portanto, da canalização de figuras simbólicas
universais nos moldes de determinada cultura, seja ela étnica, nacional ou
organizacional.
Ao narrar e escutar histórias, retorna-se a um tempo que se foi, as tradições,
memórias, mitos, ritos e rituais. Assim, a comunicação pode ser inovada, uma vez que
“o paradigma dominante racionalista (...) auxiliaria na morte dos mitos, o contar
histórias seria uma retomada desta possibilidade evocativa. Ser, estar e agir no mundo
tem a ver com o desabrochar do imaginário (COGO, 2012a, p.117). Matos (2010, p.75-
76) diz que o cérebro armazena mais facilmente narrativas de experiência, porque além
de evocarem emoções, como coloca Pink (2007), elas também possibilitam a
identificação com narradores, contextos, ações e características dos personagens ou com
sua trajetória.
A contação de histórias, como pode-se verificar estimula a imaginação a ponto
de promover um deslocamento das realidades concreta e factual. Para Lacan (2008) o
imaginário é um registro psíquico. O ser humano é marcado pela incompletude, e, por
isso, ele busca no outro (pessoas, amor, imagens, objetos) uma sensação de completude,
de unidade.
Como pudemos perceber, é pelo desabrochar do imaginário, que pode ser
proporcionado pelas micronarrativas, que funcionários identificam-se com as histórias
narradas, uma vez que o “eu” é como Narciso: ama a imagem de si mesmo que ele vê
no outro. Esta imagem que o “eu” projeta no outro e no mundo é fonte de amor, paixão,
desejo de reconhecimento, agressividade e competição. É o que Lacan (2008) chama de
simbólico, ou seja, tudo aquilo que encerra um sentido e um significado que, neste caso,
refere-se ao sentido da existência do homem como essencial para mundo organizacional
e o seu significado formado pelas identificações com a alteridade pertencente a este
mesmo mundo.
Dessa forma, a montagem imagética da comunicação interna estratégica sobre
este aspecto deveria ser meticulosamente composta com a intenção da construção
simbólica necessária à elevação da história de vida da pessoa ao seu status mitológico.
Todos os profissionais biografados, como pode ser observado pela pesquisa, assumem
171
2010), que coloca a questão de que ainda que mudem as personagens, objetos e
cenários, a imemorialidade mítica do símbolo divino ainda está presente no imaginário
coletivo.
É por este motivo que vale parafrasear a expressão “Infeliz a terra que não
produz heróis”, apresentada em “A vida de Galileu”, de Bertold Brecht. Os contextos
atuais perderam seus grandes heróis do passado, os quais não são mais referência. Eles
faziam parte da modernidade, em que havia narrativas que consolidavam uma esperança
de futuro. Na pós-modernidade, não é mais o futuro que importa e sim o presente, não é
mais a ilusão de uma fantasia, é o real e o possível do instante vivido.
Heroínas hoje são as pessoas que lutam, enfrentam desafios e sobrevivem neste
mundo caótico. No mundo organizacional e do trabalho as relações devem ocorrer
também sobre estes aspectos. As organizações precisam manter vivas as suas
macronarrativas, mas precisam dar a elas novas significações, reforçando as suas
referências a partir das micronarrativas, reconhecendo todas as memórias e histórias das
pessoas que fazem parte dela, produzindo seus heróis do cotidiano e suas mitologias,
envoltas de sentimentos de reconhecimento, de pertencimento, assim como suas
emoções, subjetividades e vulnerabilidades.
173
6. CONCLUSÃO
suas dificuldades, suas superações, seus atos heróicos no cotidiano do trabalho, assim
como o seu propósito de vida, elevando-se a um estado de compreensão sobre a sua
importância para aquela organização. Ou seja, o indivíduo é afetado pelas suas próprias
palavras, contribuindo para a formação de sentido para si, ao passo que mexe com as
suas experiências mais profundas e significativas.
Por outro lado, o comunicador, a partir do olhar sobre o “telescópio invertido”,
ao enxergar a riqueza dos “detalhes grandiosos” que surgem em tais micronarrativas, ele
adquire o poder para organizar as ideias acerca da narrativa organizacional, adaptando-a
sobre a descoberta das presenças mitológicas, de seus heróis cotidianos, da valorização
das memórias, favorecendo, inclusive, na reflexão sobre os passos futuros da
organização. Isso significa que podem ser geradas novas referências e significações para
a macronarrativa organizacional, na medida em que são valorizados todos os símbolos
criados, integrando os seus sentidos e os seus significados aos processos de legitimação,
para que missão, visão e valores organizacionais sejam significativos também para os
seus sujeitos integrantes/construtivos.
Da mesma maneira, as micronarrativas ainda podem auxiliar no planejamento de
ações de comunicação interna sobre o entendimento da presença e da ausência destes
elementos das categorias, mais focadas sobre as emoções, as subjetividades e os
sentimentos de pertencimento e de reconhecimento expostos, valorizando o
individualismo e o heroísmo dos funcionários, criando uma cumplicidade sobre as ações
desenvolvidas futuramente, levando em consideração as evocações passadas, as
conquistas coletivas e a importância de cada um sobre estas realizações.
Além disso, ações de comunicação interna que envolvam o narrar e o escutar
dessas miconarrativas pelos membros da equipe interna da organização, faz com que
surjam identificações pelas histórias, colocando todas as pessoas participantes dessa
ação sobre uma mesma importância e uma mesma condição: a de humanos que possuem
seus sonhos, suas lutas, suas afetividades e suas superações, independentemente de suas
funções e tempo de casa. Essas ações pensadas sobre o compartilhamento de
micronarrativas também podem ser capazes de driblar o déficit de atenção destes novos
tempos, na medida em que conforme foi estudado pelas teorias e pode ser observado
pela pesquisa empírica, ao envolver o lado emocional ao invés do racional, histórias são
capazes de envolver, gerar curiosidade e prazer.
Ademais, as micronarrativas possibilitam espaços democráticos para a troca de
ideias, para a escuta das polifonias existentes no mundo organizacional, criando
175
REFERÊNCIAS
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ANEXOS
Anexo A: Transcrições das entrevistas analisadas