Daniellecorpas, 3m3
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Abstract: This article addresses poetry battles in the city of Salvador-Bahia. Promoted
in peripheral areas of the capital, slams have been politically engaged in the self-
representation of minority social identities, especially the black ethno-racial identity,
and integrate with other cultural manifestations of the same focus. In this context, the
unfolding in different spaces beyond the performance allows for the creation of places
for the affirmation of discourses of this social segment, acting as an “information
traffic”.
Introdução
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capital baiana, os atores do slam não apenas circulam entre diferentes batalhas e saraus,
inclusive promovidos em zonas “centrais” da cidade, como também publicam livros e
antologias de poesia, recitam poemas em ônibus, promovem eventos e rodas de
conversa em escolas, dialogam com rappers e artistas do audiovisual, formando, assim,
uma teia de atores engajados com a poesia, marginal e militante, que viceja nas
periferias da metrópole.
Traficantes de informação
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GAMA, D.M.H.L.; PENTEADO JÚNIOR, W.R. | Batalhas de poesia em Salvador-BA: Artivismos entre
a voz e o papel
(2010, p. 211) sublinha, ainda, a íntima relação dessa literatura com o espaço onde é
construída, de modo que “a junção entre território e sujeito apresenta-se como uma
forma de construção de uma identidade inscrita no território da periferia”. Assim,
transplantam-se, nesses textos, embates sociais para o discurso literário transformando-
o, segundo o autor, em espaço de disputa.
Nesse contexto, multiplicaram-se os saraus e, posteriormente, os slams como
performances orais, abertas ao público, onde se busca de modo essencial a
autorrepresentação através da poesia. Nessa batalha que parte das margens da
sociedade, atores das periferias passaram a poder dizer eles mesmos o que é a periferia,
o que é ser de periferia e todos os aspectos derivados dessa realidade. Essa é a estratégia
que tem sido utilizada pelos slammers (poetas do slam) contra representações
equivocadas e desumanizadas de diversos setores da sociedade a respeito dessas
populações.
Tomando palavras de Roberta Estrela D’Alva (informação verbal)1, pesquisadora
e poeta que trouxe as batalhas para o Brasil, o slam não é “sobre literatura escrita, [e,
sim] sobre performance”, ou seja, sobre a presença simultânea de artistas e públicos, em
um mesmo tempo e lugar. No entanto, o slam não pode ser entendido como fenômeno
isolado. Vê-se que tal expressão sociocultural tem se configurado nos últimos anos
como ambiente caro a grupos socialmente marginalizados (não somente habitantes de
locais periféricos, mas também sujeitos atravessados por múltiplos marcadores sociais
de diferença como raça, gênero e sexo), que participam dos eventos de slams como de
outros processos, a fim de ocupar espaços para além da batalha, em um efeito dominó
reverso em tom de levante em suas comunidades, sejam estas territoriais ou identitárias.
Ademais, por ancorarem-se nas vivências das comunidades ali representadas, os
textos produzidos nos slams, embora necessariamente autorais, acabam por tornar-se de
certo modo coletivos. Numa rede de afetos, tais narrativas transbordam o momento e
lugar das batalhas em novas “partilhas do sensível” (RANCIÉRE, 2005), através da
produção de eventos literários, publicação de livros e vídeos de poesias, documentários,
e do próprio trânsito de seus atores pela cidade nesses “circuitos” (MAGNANI, 2005),
compartilhando e visibilizando suas narrativas político-poéticas.
1
Na palestra “Literatura das Bordas – Todas as palavras em evidência”, proferida no Festival Literário
Letra de Mulher, realizado pela Caixa Cultural, em Salvador, em março de 2018.
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[...] estes negros são as vítimas mais constantes da repressão policial, são quase invisíveis
nos meios de comunicação, são as maiores vítimas do desemprego, exercem as funções
que exigem menor qualificação, recebem salários mais baixos e dificilmente ascendem no
emprego; têm mais dificuldade de acesso ao ensino superior e público e tendem a ocupar
vagas nos cursos superiores menos prestigiados. (LIMA, 2002, p. 78)
2
“Pega a Visão” é até mesmo o nome de uma batalha de rimas que acontece no bairro de Sussuarana,
periferia de Salvador.
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labore nessa função: entre as temáticas, destaca-se o amor afrocentrado ou o amor entre
indivíduos de identidades sexuais ou de gênero não hegemônicas. Nesse sentido, é
possível refletir, como na leitura de Dias (2006, p. 16) a respeito da literatura marginal,
sobre “[...] o quanto a cultura periférica e suas instituições, como os movimentos
organizados [...] são vistas como estágios preparatórios à eclosão da violência do
oprimido, insuflada pela memória dos séculos de opressão”.
Nessa batalha, a função dos poetas passa a ser a de mediar e disseminar
informação aos pares, estrategicamente trazendo referências da cultura negra, da cultura
local, valorizando pessoas da comunidade e suas trajetórias, e de incentivar a leitura e a
escrita entre seus públicos, como forma de alcançar, pela educação e cultura, outros
lugares sociais. Os poetas, assim, afirmam-se como veículos de mensagens que
provocam reflexão e conscientização entre seus pares sobre temas que lhes afetam,
através do que consideram o “corre”, a “função”3 dos poetas das periferias – recorrendo
a outra metáfora que, além da arma, é constante nos poemas de slam: o tráfico de
informação.
Em poema recitado no Slam da Onça (batalha que acontece no bairro de
Sussuarana), em setembro de 2018, Kuma França, poeta do bairro de Cajazeiras que foi
campeão do circuito estadual Slam Bahia em 2017, referia-se a si mesmo como
“aviãozinho” ou “falcão”4, atuando no trabalho de “recrutar” jovens para o tráfico de
poesia. Tal analogia à prática ilegal, compartilhada na cena do rap e dos slams, funciona
como estratégia para subverter um sinal negativo, lançado como estigma pela sociedade
a esses sujeitos, tornando-o, de outros modos, potência. Argumentou Kuma, quando o
entrevistamos:
3
Utilizo os termos “corre” e “função” na acepção da gíria que se refere a atividades ilícitas, como
envolvimento em pequenos roubos e furtos ou no tráfico de drogas.
4
Aviãozinho e falcão são funções no tráfico de entorpecentes. O aviãozinho é aquele que leva a droga
para o consumidor, retornando com o dinheiro. O falcão é o “olheiro”, o fogueteiro, geralmente um
menor, que vigia a favela e avisa da eventual chegada da polícia.
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(FRANÇA, 2018, p. 90)5 ilustra esse movimento: “[...] ouvi alguém falar / E finalmente
aceitei um padrão / E me rendi à categoria de traficante de informação”. A alusão ao
tráfico é também utilizada pelo poeta Evanilson Alves, em postagem reproduzida pela
página do Facebook do Slam Deixa Acontecer (promovido em 2017 também na
Sussuarana), em que se adianta, irônico: “E antes que me pergunte sobre minha correria.
Sou envolvido, sim, com a poesia” (ALVES, 2017, grifo nosso).
Tal função, implícita ou explícita nos slams, parece bem condensada nas palavras
de Carlos de Meneses (Mestre Aedo), poeta de Sussuarana:
Emicida lançou até uma música recentemente... que no início ele faz um trecho que ele
fala assim, se você rebater um palavrão com outro palavrão eles só vão ouvir o seu. E
depois eles falam que os inimigos e seus lacaios, vêm com tudo, jogam sujo, e a gente
não pode simplesmente reagir com a mesma baixeza. E realmente, essa forma de a gente
escrever e a gente compartilhar conhecimento, porque só escrever não é o bastante, a
gente tem que compartilhar, a gente tem que resgatar os nossos, trazer pro combate, e
aumentar o nosso exército porque acho que a melhor forma da gente combater esses
problemas é a gente se municiando de informação real. É trazer informação,
conhecimento pro nosso povo, pra que eles saibam não só os problemas que eles estão
lidando, mas como reagir a esses problemas sem precisar se rebaixar... (Trecho de
entrevista – 29/09/2018). (GAMA, 2019, p. 159)
A escrita produzida pelos slammers tem, desse modo, um compromisso com “os
nossos”, como diz Aedo, de “trazê-los para o combate”. Ressalta-se que, no Brasil, de
forma diversa do que ocorre nos Estados Unidos, por exemplo, onde o slam foi criado,
as batalhas são promovidas, em sua grande parte, por periferias para comunidades de
periferias. Nos EUA, como discute a poeta e pesquisadora Susan Somers-Willett
(2009), o slam tem se configurado como performance de poetas não-brancos e plateias
predominantemente brancas, sendo os eventos realizados em bares ou outros locais
fechados e voltados ao consumo.
No Brasil, muito mais assemelhado a um trabalho de base (para tomar emprestada
expressão usada pelas militâncias sociopolíticas), no slam e suas ramificações, tanto no
palco como no papel, o público “de fora” – entenda-se brancos, de classe média, ou
mesmo instituições hegemônicas como a mídia ou a academia – não são esperados,
sequer desejados. Como pode-se perceber na fala do slammer Sandro Sussuarana, um
dos criadores do Slam da Onça, de Salvador:
5
O livro, produzido com a colaboração de artistas de saraus, slams e coletivos poéticos das periferias da
cidade, foi apoiado pela Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb/BA) e lançado no espaço onde
ocorre o Slam da Onça, em julho de 2018.
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[...] pra gente nunca foi interesse prioritário que a mídia viesse divulgar a gente, pra gente
sempre foi interesse prioritário que a periferia se percebesse enquanto produtora de
cultura, e de qualidade (Trecho de entrevista – 30/06/2018 – Ênfases dele). (GAMA,
2019, p. 67)
Freitas (2020), em seu artigo sobre o Slam Resistência, de São Paulo, menciona
diversas slammers, afirmando que muitas dessas poetas têm livros publicados, sejam
impressos ou em áudio, além de outros projetos de poesia para além do slam. Ainda
conforme a autora, em relação ao Slam Resistência: “Ao ocupar a praça (e a rede) e
reclamar por direitos, seus poetas, organizadores e público adotam novas gramáticas –
novas formas, significados e funções – para produzir a cidade, produzir poesia e
produzir vida” (FREITAS, 2020, p. 13). Nesse contexto, a publicação de sua escrita
passa a ter, para além de um projeto literário pessoal, uma conotação mais coletiva e
política.
Tecendo um breve comparativo, tomemos o Movimento Poetas da Praça (MPP),
grupo literário que representou, em Salvador, a então denominada literatura marginal,
no Brasil dos anos 70. Correia (2012, p. 198) afirma que seus atores reivindicavam “o
que lhe foi negado – a praça, a nudez e o apelo a uma sensualidade que não reconhece
os limites domésticos e familiares”. Nesse sentido, a preocupação com a impressão e
publicação era minimizada. Afirma Silva (2008, p. 35), que também pesquisou o
movimento, que “o que se buscava eram alternativas para dizer a poesia e para veiculá-
la fora dos padrões institucionais de distribuição, embora, em alguns casos, essa poesia
fosse fixada tipograficamente”7.
Ao contrário dos autores da época, no entanto, que buscavam certa
“marginalidade” por opor-se ao conservadorismo burguês ou ao regime político
6
Consideram-se práticas “artivistas” as que ligam arte a ativismos culturais e políticos.
7
Ainda assim, o autor menciona que integrantes do MPP podiam viver da venda de folhetos e livros em
pequenas tiragens, vendendo-os em praças, bares, teatros, praias, cidades do interior e de fora do estado.
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[...] a publicação dessa poesia, apesar de ser apenas uma poesia, no livro, já foi o
suficiente pra minha família me reconhecer como poeta. Que quando eu cheguei em casa
com o livro, eu falei aqui, ó, eu sou poeta, eu tenho uma poesia num livro publicado. Já
mudou completamente... Já me fez também começar a tentar planejar um livro meu, já de
eu me reconhecer como poeta profissional, mesmo, de querer trazer os meus registros, e é
a questão de soltar pro mundo, pra que outras pessoas conheçam, pra que tenham um
outro alcance além da... um livro que é lançado aqui em Salvador ele pode ir, por
exemplo, pra São Paulo, mesmo que eu não vá pra São Paulo. Mas a minha poesia tá lá.
(Trecho de entrevista – 29/09/2018). (GAMA, 2019, p. 80)
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Fica evidente na fala (na escrita) de Valdeck que a publicação faz parte de um
projeto político dos artistas. Não se trata apenas de alcançar o prestígio do livro: a
reprodução da estrutura canônica serve para que se estabeleçam nesse campo as vozes
vindas de outros lugares, que antes não tinham acesso a essa produção e que continuam
tendo-a dificultada. Ademais, Somers-Willett (2009) aponta que não se pode
compreender o slam sem sua relação com parâmetros acadêmicos ou canônicos
tradicionais – também nele há juízos de valor, há pontuação para os melhores, a busca
pelo prestígio. A diferença parece residir em que no slam sua estrutura e o registro
escrito de sua produção poética têm uma função: como em “mutirões da palavra”
(RODRIGUEZ, 2003), seus atores pautam discussões coletivas e públicas para “chegar”
e “bater” em diferentes espaços.
Matos (2012) que estudou, em sua pesquisa de doutoramento, textos escritos em
diários produzidos por jovens de periferias, destaca, recuperando em sua análise
conceitos de Rancière, o sentido dessa escrita como operação política. Tal caráter, para
a pesquisadora, nos ajuda a compreender essa escrita como forma de “desorganizar” o
que o filósofo identificou por “palavra soberana”, ou seja, as forças discursivas
hegemônicas (RANCIÈRE apud MATOS, 2012, p. 8). Cabe a mesma reflexão em
relação aos escritos produzidos a partir das atuações dos poetas de slams.
Sabemos, no entanto, que apesar dessa potente “desorganização” em curso,
estamos longe de um equilíbrio de forças, pois como afirma Stuart Hall, em sua
discussão sobre identidades e mediações culturais na diáspora:
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e atendimento aos artistas. Um dos poetas presentes então reclamou, afirmando algo
como: “para as periferias, eles só dão a praça e dizem ‘Grita aí!’”. Ou seja – para eles, a
praça, a rua, só, não bastam.
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apresentar seu trabalho pra que as pessoas conheçam, e o slam, por ser uma questão
competitiva, tem um afinco muito maior da preocupação na pesquisa, no estudo, no
entender o que as palavras estão falando, na questão da interpretação, de como você quer
que as pessoas sintam a poesia que você vai recitar, da dedicação que você tem em
ensaiar ela, vários dias para você ir numa competição e você fazer bonito, porque sua
poesia vai ser votada, vai ter uma nota pra ela [...]. Então a gente criou o slam pra isso,
pra incentivar a escrita, né, profissional, mesmo, engajada, política, direcionada, e a
leitura, mas com a intepretação do texto boa, com dedicação, com entendimento, e acima
de tudo com profissionalismo (Trecho de entrevista – 30/06/2018). (GAMA, 2019, p. 5)
O Sarau da Onça foi idealizado e continua sendo protagonizado por jovens negras(os) de
um bairro periférico de Salvador, a Sussuarana, que surgiu como uma iniciativa de
potencializar outras formas de (re)existir na comunidade através da força-palavra e
favorecer os encontros que sempre motivam muito mais do que a escuta ou o recitar de
textos, acentua as trocas simbólicas entre quem participa e se configura como lugar de
reconhecimento e legitimação do protagonismo de sujeitos que buscam, através do texto
literário, referenciar temáticas que tratem do seu cotidiano, quando, por exemplo,
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mas muito mais incisivos no cenário combativo das batalhas de poesia. Slams, para
além e a partir das performances, usando palavras de Minchillo (2017, p. 7), “[...]
interferem no mapa da produção e recepção literárias” e ampliam “o território no qual se
faz, se julga e se consome literatura”.
Também é comum nas batalhas tensionarem-se referências da literatura nacional
ou internacional: os poetas com frequência citam autores como Luiz Gama, Conceição
Evaristo e Carolina de Jesus, para dar alguns exemplos. Ainda, trazendo outro trecho do
poema “(R)Evolução”, de Kuma França (2018, p. 89), nota-se como o poeta expõe a
importância que dá a referências de mais proximidade, geográfica ou afetiva:
Os meninos se auto-organizam pra estudar junto, escrever junto, fazer poesia nos
coletivos junto, então isso é uma ramificação do slam, uma ramificação do sarau, de
potencialidade, de mostrar que eles são capazes de fazer, de escrever, de falar sobre as
suas vivências, sobre suas dores e apresentar em outros espaços, e não ficar recluso
somente ao sarau, ao slam, porque não é uma coisa de você vem, apresenta no slam e
depois acaba. Existe uma continuidade porque eles entendem que assim como foi
despertado neles dentro do slam, eles precisam despertar em outras pessoas e isso é muito
importante porque eles ajudam a gente que está nessa caminhada, né, nesse trabalho de
formiguinha de tentar despertar o senso crítico de algumas pessoas, que conseguimos
despertar o deles, e entenderam, e eles fazem com que outras pessoas entendam que assim
como chegou neles pode chegar nessas outras pessoas, né, então o slam ele deixa de ser
uma competição pra ser uma celebração, de quantos poetas mais novos vão estar
presentes na próxima edição, entende? Do menino que foi numa edição do slam e viu o
amigo, e no próximo ele quer competir junto com o amigo, não pra saber se é melhor ou
se é pior, mas pra ele poder falar “Meu amigo, tamo junto. Você escreve, eu escrevo, e a
gente pode fazer com que outras pessoas escrevam, e a gente pode mudar a vida de outras
pessoas, pode dar uma perspectiva de vida diferente pra outras pessoas, seja através da
poesia, ou seja através da arte em geral”. Como muita gente que já foi pro sarau, foi pro
slam e hoje faz dança. Ou faz música. Que pra gente é tão bom quanto, se eles estivessem
recitando poesia, é ver eles dançando, que eles estão fazendo uma coisa que eles gostam
de fazer e que eles se perceberam enquanto capazes, a partir, não só a partir do sarau, mas
a partir dos amigos que eles viram lá no sarau (Trecho de entrevista – 30/06/2018).
(GAMA, 2019, p. 185-186)
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Ainda mais porque as pessoas que eu andava aqui, né, até as pessoas da minha própria
família diziam que poesia era coisa de vagabundo, de marginal, de quem não tem o que
fazer, que não ia dar nada, que eu tinha que procurar um trabalho de verdade. E certos
trabalhos não me levam aos lugares que a poesia me leva (Trecho de entrevista –
09/11/2018). (GAMA, 2019, p. 186)
Esses são aspectos muito típicos do discurso do slam. Miranda (2015, p. 65),
abordando o cenário de saraus marginais e slams, recorre ao conceito de disseminação,
proposto por Homi Bhabba, como uma “escrita dupla, que contempla o pedagógico e o
performático”. O movimento das batalhas tende, assim, a extrapolar a competição.
Nessas reações e movimentos comuns, resiste o intuito expresso da poesia no slam que
é “passar o recado”, “pegar a visão”. A performance poética no slam, na interação com
outros espaços pelos quais seus atores transitam, em seus desdobramentos e redes,
inscreve-se no corpo e no território, pela voz, pela tela ou pelo papel, por diferentes
meios e linguagens que a um tempo significam e são a batalha, a batalha maior pelo
direito de dizer e de existir.
Considerações finais
8
Falas registradas durante a roda de conversa na Festa Literária Internacional do Pelourinho (Flipelô), em
Salvador, em novembro de 2018.
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Recebido em 25/02/2022
Aceito em 26/04/2022
i
Danielle Marcia Hachmann de Lacerda da Gama é Doutoranda em Comunicação pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Mestre em Ciências Sociais pela
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e Bacharel em Comunicação Social pela
Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Membro do grupo de pesquisa Comunicação,
Arte e Cidade (CAC-UERJ). E-mail: [email protected]
ii
Wilson Rogério Penteado Júnior é Doutor e Mestre em Antropologia Social pela
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), desenvolve estágio pós-doutoral em
Antropologia Social na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É Professor
Associado de Antropologia no Centro de Artes, Humanidades e Letras da Universidade Federal
do Recôncavo da Bahia (CAHL-UFRB) e professor pesquisador no Programa de Pós-
Graduação em Ciências Sociais (PPGCS-UFRB) e no Programa de Pós-Graduação em
Arqueologia e Patrimônio Cultural (PPGap-UFRB). E-mail: [email protected]
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