Memória Da Ferrovia
Memória Da Ferrovia
Memória Da Ferrovia
A vida é como um rio, um fluxo constante que, às vezes, não consegue parar.
Em alguns momentos da vida, o rio é largo e profundo; em outros, é estreito e raso. O
importante é saber navegar: aproveitar os momentos felizes e lidar com os tristes.
Como disse, o rio não para. E seguindo o fluxo do rio da minha vida, agora estou
de mudança (minha neta me ajuda com as caixas). Ao pegar uma velha sacola
empoeirada, deparo-me com uma foto da minha infância, e isso me faz rememorar um
passado feliz, em que a vida se resumia a tão somente brincar.
Minha casa era pequena, coberta com uma lona e mais parecia um barracão.
Não havia divisão entre os cômodos: meu quarto era na cozinha e ao mesmo tempo na
sala. Ali perto, havia um rio de onde tirávamos o alimento e, também, que servia para
nossa diversão. Ao redor, açaízeiros, sumaúmas e maçarandubas, árvores típicas da
Amazônia.
Às vezes, eu saía com meu pai para caçar, pois tinha medo de ele ir e não
voltar, o que acontecia com muitos caçadores. Enquanto isso, minha mãe plantava
hortaliças para nosso consumo, o que não era garantia de comida na mesa,
principalmente quando meu pai nada trazia da floresta.
Mas havia a esperança… E era o que me restava. Um dia, indo comprar pão,
por sorte, encontrei uma colega de infância, a menina que retirou as pedras do meu rio,
fazendo a água fluir novamente.
Ela me falou da família de um policial que queria contratar alguém para ajudar
na casa deles. Decidi aceitar o novo emprego e passei a ter uma vida mais aprazível.
Pude, então, ir ao cinema pela primeira vez… Ainda lembro os detalhes, a expectativa,
a melhor roupa…
Fomos morar em uma vila de casas, ambiente muito comum naquele tempo,
normalmente formada por núcleos familiares. Para mim, foi um local novo, com
pessoas, inicialmente, estranhas, mas que depois passaram a representar decepções e
alegrias que eu nunca mais esqueceria.
Essa fase foi como o encontro do rio com o mar: fortes ventanias e águas
agitadas. Ao mesmo tempo em que um rapaz disse que me amava, fez isso de tal
modo que a família que me acolhera foi a mesma que me expulsou por pensar mal de
mim, pois, uma vez, saímos e voltamos muito tarde. Isso era muito inapropriado para
uma jovem e, naquela época, a sociedade belenense era muito conservadora e
tradicional.
Da mulher, era exigido “um bom comportamento”. Tivemos que nos casar e
desse relacionamento vieram meus filhos, motivo de alegria e determinação para fazer
o melhor por eles. Rio que flui… Enche… Seca…