2007 - Curadoria Exposicoes Virtuais
2007 - Curadoria Exposicoes Virtuais
2007 - Curadoria Exposicoes Virtuais
Brasília
2007
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Brasília
2007
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Brasília
2007
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AGRADECIMENTOS
Cinara Barbosa
6
RESUMO
Curadoria em Galerias Virtuais: para uma exposição fotográfica é uma pesquisa que
investiga o significado e aquilo que perfaz a prática de curadoria de arte. Procura esboçar uma
sistematização com intuito de criar parâmetros para a criação de exposições virtuais. Nesse
sentido, buscou-se investigar de que forma, no ambiente de web, o curador poderia contar
com elementos estruturais para o exercício de um fazer criativo e autoral. Nesse caso, a
fotografia serve como um fio condutor para reflexão sobre essas potencialidades. Foram
analisadas algumas galerias fotográficas e realizados exercícios descritivos sobre algumas
possibilidades de apresentação de imagens. Para tanto foi feito o cruzamento de informações,
segundo os curadores, acerca de seu papel, e sobre as considerações específicas do ambiente
virtualizado.
ABSTRACT
Curatorship in Virtual Galleries this is a piece of research that investigates the meaning and
substance of the practice of art curatorship, particularly for a photographic exhibition. It seeks to
outline a systematization, with the intention of creating parameters for setting up virtual
exhibitions. To this end, it has investigated how the creator may, within the scope of the Web, use
structural elements to make something creative and authorial. In particular, photography acts as a
connecting thread for reflection on these potentialities. Certain photographic galleries have been
analyzed and some possibilities for the presentation of images described. For this, information
was gathered from various curators on their role and on the specific considerations needed for a
virtualized space.
LISTA DE IMAGENS
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 12
SEÇÃO I | CURADORIA
1.1 O fim da arte: a era do curador? ......................................................................................17
1.2 O olhar através da escuta .................................................................................................23
1.2.1 Conservador de museu x curador............................................................................25
1.2.1.1 Mostras de arte: a Bienal de Veneza e a Documenta de Kassel ....................28
1.3 O curador contemporâneo ...............................................................................................31
1.3.1 Questões recorrentes à prática curatorial ................................................................35
CONCLUSÃO ....................................................................................................................125
BIBLIOGRAFIA.................................................................................................................128
ANEXOS
Imagens da Exposição... ........................................................................................................146
Fonte das Imagens ................................................................................................................150
CD (Exposição Imagens do Século Passado)
12
INTRODUÇÃO
Vive-se, sobretudo desde a última década do século XX, em meio a uma sociedade imersa
nos efeitos da tecnologia de conteúdo computacional. Uma das questões para se pensar a
atualidade decorrente desse momento diz respeito à exploração e às ferramentas utilizadas no
ambiente em rede existente na World Wide Web. É verdade que, se por um lado, muito se tem
falado acerca desse virtual, por outro, também é correto constatar que há muito ainda a explorar
sobre as possibilidades de sua construção, arraigada ainda em parâmetros a partir de atividades
cuja experiência primeva veio se erigindo no campo, por assim dizer, do real. É no sentido de
investigação e exploração desse espaço que se aplica esta pesquisa acerca da curadoria para
montagem de galerias virtuais de fotografia.
Pode-se dizer, grosso modo, que a prática curatorial visa, entre outras questões, à
montagem de exposições que são mostradas em espaços públicos, dentre eles, museus e galerias.
Depreende-se daí, portanto, que há uma série de afazeres até chegar ao momento da vernissagem,
como seleção de obras, expografia, levantamento de recursos, contratação de seguro e
divulgação, só para citar alguns. Todas as tarefas podem ser administradas pelo curador, mas
algumas delas também podem ser desenvolvidas por coordenadores específicos como o design de
montagem, o produtor e o captador de recursos.
No âmbito de uma exposição virtual para a web, no entanto, algumas urgências entram em
cena, enquanto outras desaparecem. A curadoria aplicada ao sistema em rede levará em conta
requisitos de sobremaneira interligados ao espaço de exposição virtual da galeria, que invalidam
algumas prerrogativas da exposição de moldes habituais. Uma das inúmeras possibilidades para
curadores pode ser inclusive a afirmação da autoria, questão valorada e muito discutida no
circuito curatorial contemporâneo. Dessa forma, é significativo fazer um percurso de
desvelamento acerca dessa prática analisando em que medida se realiza, de que forma se dá e
quais as questões que suscita.
Nesse sentido, para uma melhor disposição das partes que compõem este trabalho, fez-se,
uma divisão por seções, sendo que na primeira seção procurou-se esboçar um panorama histórico
13
da atividade curatorial, bem como definir o que vem a ser curadoria na atualidade. Sendo a
produção de arte e o artista materiais de trabalho para a atuação do curador, buscou-se aí algumas
pistas para sua conceituação. Nesse ínterim, portanto foi pertinente destacar como em meio às
transformações ocorridas na arte e na história da arte a partir do moderno, que por sua vez se
desenrolaram vinculadas às re-organizações mundiais do sistema econômico-político-social,
engendraram, entre outras questões, o processo de internacionalização da arte, a solidificação do
mercado e do sistema de legitimação arregimentado por connoiseurs.
A segunda seção foi destinada a tratar das questões relativas ao virtual, mas não só com o
intuito de entendê-lo, ou como questão técnica, mas sobretudo de percebê-lo pertinente como
conceito ou tema curatorial. Assim, após os devidos esclarecimentos para tratar de pontos
julgados inevitáveis, como as diferenciações de abordagens de cunho filosófico ou de senso
comum, propôs-se abordá-lo pelas referências atribuídas a ele por seus pensadores. Pois ora o
virtual é identificado na designação de uma sociedade de controle, partícipe de um sistema
14
Por fim, na última seção discutiu-se a exposição Imagens do Século Passado. A idéia
posta em questão é a de verificar a experimentação do exercício da autoria por parte do curador
na utilização de ferramentas e contingências do espaço virtual.
O objetivo central desta dissertação foi propor a análise do fazer curatorial aplicado à
montagem de exposição para galerias virtuais tendo como objeto a fotografia. A escolha deste
objeto se deu em parte à ausência, em princípio, de tridimensionalidade, materialidade de
elementos plásticos e seqüência narrativa linear como os contidos em gêneros como escultura,
pintura e performance, entre outros. Entendeu-se que os objetos dessas produções precisam do
registro fotográfico e, ou videográfico para serem apresentados em galerias virtuais, e estimulam
talvez a tendência a fidelização da reprodução da obra, mais do que ocorreria com a imagem
plana fotográfica. Assim, a curadoria ficaria restrita à seleção, não permitindo o livre exercício de
15
intenção autoral. Além disso, contou também, para essa eleição, minha atuação profissional como
curadora, pesquisadora e produtora no campo da fotografia, bem como o envolvimento em
atividades de revisão de portfolio em festivais e eventos dessa área.
Tendo em vista que o campo da curadoria tem um sentido que muitas vezes escapa, com
muitas perguntas que ainda precisam ser feitas, buscou-se apontar pistas, estabelecer conexões e
definições circunstanciais de modelos de curadoria no esforço da contribuição com algum tipo de
sistematização. Realizou-se uma identificação minuciosa de questões que apareciam com
freqüência nas entrevistas da bibliografia utilizada. Assim, enxergou-se, em um primeiro
momento, aquelas referentes à autoridade do curador, sua relação com o artista e seleção de
obras, as parcerias e a criação de conceitos e temas. Subseqüentemente a isso, percebeu-se que ao
construir a idéia da exposição, seu conceito e seu tema, os curadores apontavam reflexões nas
quais podiam-se basear para pensar a arte ou trabalhar com ela, produzindo com isso um
16
SEÇÃO I – CURADORIA
A produção de arte e o artista são o material de trabalho para a atuação do curador. Assim,
precisou-se levar em conta que a diversidade artística contemporânea imprime a real necessidade
de reflexão. Talvez mais que em outros tempos, pois a sua motivação produtora não está baseada
no interesse em construir cânones como outrora. Portanto, uma exibição de peças calcada na
linearidade cronológica e de viés evolucionista da narrativa, nos dias de hoje, e, em certas
circunstâncias, parece ter caído em desuso. Nesse sentido, com o intuito de realizar o que se
propôs, ou seja, em parte tentar compreender um pouco da trajetória dessa atividade e sobretudo
investigar quais as prerrogativas em que se calca esse fazer, entende-se que seja necessário tecer
algumas considerações acerca da arte, no que diz respeito a sua apreensão pelos connoiseurs e, a
partir dela, como irromperá a figura do curador, na acepção de sua essência quando de sua
ascensão na contemporaneidade.
A era da arte começa quando certos objetos começam a ser pensados em termos estéticos
(DANTO, 2006). De Giorgio Vasari, no século XVI, passando por Clement Greenberg, no século
XX, muito se construiu por meio de narrativas da arte. Aquele, narrador do renascimento,
entendia a arte como mimética. A maestria de sua realização seria obras que aprimorassem a
imitação da realidade, sendo o começo da utilização da perspectiva um salto nessa direção.
Greenberg, considerado um dos grandes teóricos do modernismo, procurou analisar como a arte
18
chegou até esse momento. Para ele, a pintura deveria mostrar os limites e os meios da própria
pintura.
Para Arthur C. Danto, a era da arte deveria ser entendida como o momento em que certos
objetos começariam a ser pensados em termos estéticos e não da aparição da produção da arte em
si (2006). Ainda em Danto, o contexto é que determina sua existência historicamente, fazendo
que em alguns momentos algumas obras sejam possíveis enquanto outras não.1 Questionável ou
não tal formulação, o que é significativo destacar é a importância do entendimento do papel
daqueles que detêm o poder e a autoridade de eleger e legitimar o que se constitui ser em uma
boa ou má arte e, assim, fazê-la ou não reconhecida ao mundo, sustentando-se, por sua vez, em
critérios por demais subjetivos que refletem um amálgama de conhecimento e gosto? Quem
sabe.2
Em todo o transcorrer da história até hoje, esses especialistas, por assim dizer, podem ser
definidos como sendo: historiadores, críticos pesquisadores, conservadores de museus, jornalistas
críticos, marchands (e o mercado de arte), artistas e, mais recentemente, curadores. Vale
complementar que colecionadores são um caso à parte pois, de maneira geral, se reportam de
forma variada para consulta a todos os outros. De onde se depreende que todos se constituem
legitimadores, mas não especialistas.
É nesse sentido que se torna significativo lembrar que a constituição da crítica de arte
moderna exerceu um papel determinante na divulgação, consagração e consolidação do
modernismo (BUENO, 2001: 144), tendo em vista que a crítica tradicional e o público se
1
Em seu posfácio Virginia H. A. Aita comenta essa questão indagando o que torna 50 cm3 de ar de Paris, de Marcel
Duchamp – simplesmente uma ampola de vidro vazia – uma obra de arte em 1919, e objetos arqueológicos, como
máscaras aborígines deixarem o museu etnográfico do Trocadero para o museu de arte (DANTO, 2006: 271).
2
A história de Greenberg por exemplo, está repleta de anedotas sobre seus métodos de validação artística. Ao visitar
o ateliê de um artista, permanecia de costas, sem ver nada, até o momento em que a obra estivesse no lugar certo para
ser mostrada e então dizia: “Bata me!” (DANTO, 2006: 99). O momento da visão e da formação do juízo deveria
então resultar incontestes e um aval para jovens artistas.
19
Como essa arte era um fato novo, os críticos não possuíam formação específica na área,
indo de historiadores e filósofos, como Greenberg e Harold Rosenberg, ao enciclopedista Giulio
Argan, passando por jornalistas de formação variada. Raymonde Moulin identifica dois grupos de
críticos naquela função: um, dos historiadores da arte e dos conservadores de museus; outro, dos
críticos profissionais (MOULIN apud BUENO, 2001: 145). Estes prestaram-se não só um papel
de intermediários culturais entre o movimento moderno em ascensão e o público, mas também,
por meio de sua atuação, contribuíram para a fundamentação do mercado de arte dessas obras.
3
A autora aplica o termo à artistas, marchands, críticos, historiadores e colecionadores.
4
Até então as maiores cifras tinham sido pagas em 1910, em Paris, pela Maison Druot (valor não informado); em
1912 uma pintura de Degas por 1,57 milhão de dólares e em 1914 uma pintura de Picasso por 11.500 francos. Ainda
em 1957 ocorreram outros leilões milionários utilizando-se de estratégias de marketing ostensivas. (BUENO, 2001:
167).
20
Is Jackson Pollock the gratest living painter in the United States?,5 fez com que a galerista Betty
Person vendesse toda a produção do autor e o alçasse ao sucesso, fazendo com que entre 1949 e
1951 computasse a venda de 35 telas e guaches. (BUENO, 2001:177).
Outro ponto importante atrelado à própria implementação desse mercado diz respeito à
organização de coleções de arte e o processo de internacionalização. É no início da Gildest Era
(1870), nos Estados Unidos, que se firmou a ação de colecionadores e a construção de museus
como o Bostom Museum of Fine Arts e o Metropolitan Museum of Art, de Nova Iorque (voltado
para arte moderna). Mais tarde, já na primeira metade do século XX, esses milionários foram
substituídos pelos proprietários de corporações como a Standard Oil, de J.D. Rockefeller, e
depois por aqueles preocupados também nessa formação por meio de uma atuação à frente de
galerias e mostras, como foi com Peggy Guggenheim.
5
Arthur C. Danto menciona que o artigo avalizava e atribuía o julgamento à Pollock, a um crítico intelectual de
Nova York, no caso Greenberg. (2006: 78).
6
“O mercado de vanguarda operava com os artistas agrupados em categorias e as galerias dividindo o espaço de
atuação e se auto-identificando a partir delas: pop-art, minimalismo, arte conceitual, post-painterly, op-art, earth art,
hiper-realismo, process art” [...] e ainda performance, filme, vídeo, decorative, narrative e popular image painting e
instalações. (BUENO, 2001: 229).
21
no caminho do que seria convencionado chamar de arte contemporânea. Aliás, a Pop Art mesma
foi propagandeada como sendo o resgate do verdadeiro espírito da modernidade, na campanha
ideológica defendida pelo marchand Leo Castelli no texto do catálogo da Bienal de Veneza de
1964, acerca do artista Robert Rauschenberg.
Para Danto, a Pop Art não almeja protestar. A rebeldia parece estar a serviço de ratificar o
lugar comum e o que o rodeia. O artista, nesse caso, é múltiplo em atuação: pintor, escultor,
escritor, cineasta, fotógrafo, etc. Mesclam-se estilos e gêneros de arte e materiais, e revelam a
fragilidade de critérios para conceituar o que seja arte. A qualidade deixaria de ser uma questão
22
de estilo para passar a ser uma questão de obras. A produção artística continua a existir, mas
diante da profusão, fusão e hidridização de estilos e gêneros, tornar-se-ia complicado fazer
explicações, aplicar correlações, enfim, designar, por meio de manifestos e narrativas, os
processos e a arte.7 Assim, de acordo com o autor, o desafio para o crítico é atribuir um valor a
cada obra, além das relações com o que já existe.
É consenso que movimentos como da Pop Art e tendências diversas como a Land Art, a
performance e as instalações desafiaram a construção da narrativa. A intenção artística não
desejava estar presa a um objeto, podendo demonstrar-se ou vir à tona, por exemplo, no contexto
relacional em que estava. Parece que, assim, mais do que nunca, o artista passou de fato a exercer
o papel de visionário, de intérprete da realidade imagética de sua época. Em um momento, o
artista produziu levando em conta a obrigação com métodos e técnicas, e a história da arte, por
meio de seus pesquisadores, os catalogava e os denominava. Em outro instante, a mídia, críticos
de jornais e especialistas de galerias particulares a serviço de um mercado tentavam diagnosticá-
la, produzindo um parecer.
Até aqui falou-se sobre a fundação de uma obra de arte em seu contexto, de alguns dos
intermediadores entre a arte e o mundo, que legitimam a obra e a noção que se tem dela, do
mercado de arte, de críticos, e de como isso se dá de forma efetiva na era moderna. Assim,
também falou-se de como todo esse arcabouço irá originar uma espécie de anomia da arte
ecoando no contemporâneo. Eis o que interessa, o que se passa, então, diante da pluralidade e
diversidade da expressão artística no que diz respeito não mais à montagem de acervos, mas
quando das organizações temporárias (bienais, salões e festivais), interessadas não mais em
retrospectivas históricas, mas em mostrar as transformações do contemporâneo. Quem está apto
como especialista nessa empreitada?
7
Trata-se do fim de um tipo de arte que pode ser compreendida pela história da arte. O que impera para o artista é a
liberdade de seguir qualquer estilo ou gênero artístico. Para Danto, assim como Hegel, a arte tornar-se-ia auto-
consciente, filosófica, deixando de fazer história. Quer dizer, se a era da arte começa quando certos objetos passam a
ser pensados em termos estéticos, ela pára de haver quando a produção da mesma deixa de ser coerente de forma
consciente. Danto retoma um conceito de Hegel de que para a apreciação das obras de arte devem ser seguidos dois
aspectos: o conteúdo da arte e o meio de apresentação. Deste relacionamento resulta a própria obra.
23
Em 1972, a Documenta de Kassel,8 sob curadoria do suíço Harald Szeemann,9 teve, pela
primeira vez, o foco em um tema específico. O lema Questionamento da realidade – os mundos
da imagem hoje propunha pensar o que então caracterizava a arte contemporânea e os critérios
que a norteavam. A denominação da mostra sugeriu um direcionamento, a priori, já antecipando
o que se veria e, sobretudo, o que se estava propondo ao público pensar ali.
É Szeemann quem fala de um certo look through the ear,10 o olhar através da escuta
(tradução nossa) para emitir o que, na verdade, é mais um lamento por conta da necessidade de
intermediações para explicar a arte. É uma metáfora que ilustra como o ponto de vista e a opinião
dos curadores servem como ponte na relação entre obra e espectador. O ideal seria talvez que
nada disso fosse preciso, e que a obra de arte pudesse ser mostrada sem intermediadores. Mas, o
fato é que na organização de uma exposição de arte, seja contemporânea ou de perfil histórico, há
vários personagens e agentes presentes. Além do artista, existem produtores, patrocinadores,
diretores de instituições, críticos de arte e proprietários de coleções. No entanto, é o curador
quem pode exatamente dizer, ou melhor, é dele a voz que dá o tom geral do discurso da
exposição.
O que ocorre é que, atualmente, o cargo de curador ganhou uma grande projeção,
chegando a ser tão importante ou a ter tanto status quanto o artista. A dimensão é tanta que na
exposição 2080, inaugurada em 2003, no Museu de Arte Moderna (MAM), de São Paulo, com 49
obras de 37 artistas que foram referências nas artes visuais entre 1983 e 1987, além de mostrar a
8
A exposição de arte contemporânea Documenta, ocorre na cidade de Kassel desde o ano de 1955, e surgiu com o
intuito de dar lugar às vanguardas artísticas excluídas ou destruídas durante a Segunda Guerra pelos nazistas, que a
consideravam como arte degenerada. Foi idealizada pelo artista Alfred Bode e pelo historiador de arte Werner
Haftmann.
9
Harald Szeemann (1933-2005) nasceu em Bern, Suíça. Criou a denominação de curador independente. Foi curador
independente ao organizar a mostra When Attitudes Become Form: Live in Your Head, exibida em Berna (Suíça),
Krefelt (Alemanha) e Londres (Inglaterra) e que lhe deu notoriedade internacional. Foi ainda curador da Documenta
5, em Kassel. Organizou a exposição itinerante Happennig and Fluxus (1970-71). Criou em 1980 a mostra Aperto na
Bienal de Veneza (KUONI, 2001: 169), e disponível em:
http://www.mapadasartes.com.br/setoresnn.php?not=1¬id=28
10
No prefácio do livro Foci – Interviews with ten international curators, o crítico de arte Barry Schwabsky lembra
essa observação feita pelo curador.
24
geração 80, uma questão levantada foi a própria figura do curador. Felipe Chaimovich, curador
da exposição, aproveitou para relembrar o que aconteceu, pois, segundo ele, 2080 não pretendia
ser meramente uma remontagem do que já foi feito. O curador disse pegar “as idéias curatoriais da época,
11
sem correr o risco de anacronismo”. Seu objetivo é, guardadas as devidas proporções, discutir a figura da
pessoa controladora e editora da exposição ligando-a à década que se consagrou como sendo a do
curador.12
Da mesma forma, a 50ª Bienal de Veneza, em 2003, teve como tema o controverso título
de Sonhos e conflitos – a ditadura do espectador. A mostra sofreu dura análise das críticas
internacionais e italiana, que se refiram a ela como a ditadura dos curadores, justamente o
contrário do que o curador disse pretender realizar.
Francesco Bonami,13 curador e organizador geral da 50ª edição de Veneza, disse que o
que procurou fazer foi abandonar a fórmula das megaexposições em curso desde os anos 60,
definidas por uma tese curatorial única da visão onipresente do curador que, segundo ele, não
cabe mais no mundo fragmentado em que vivemos. Em sua concepção, tentou promover uma
mudança da visão ditatorial do curador/organizador das mostras, dando ao observador a chance
11
A Década de 80 não foi perdida. Disponível em: http://www.speculum.art.br/module.php?a_id=291
12
LAGNADO, Lisette. Intuito educativo predomina em exposição do MAM-SP sobre a arte brasileira dos anos 80
Disponível em: http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/1585,1.shl
13
Foi diretor do Museu de Arte Contemporânea de Chicago, é membro do conselho permanente da Manifesta
(Eslovênia) e da Trienal de Yokohama e diretor artístico da Pitti Immagine de Florença (KUONI, 2001: 32); e
Disponível em: http://www.investarte.com/site/scripts/noticias/ibienal_veneza.asp.
25
de ser o ditador de sua própria imaginação, de seu tempo e experiência. Para isso, dividiu a bienal
em complexos temáticos que chamou de ilhas no meio de um grande arquipélago.14
É interessante notar que, nos dois exemplos de exposições citadas anteriormente, dadas as
suas diferenças, ambas colocam como questão, senão diretamente como temática, pelo menos
como elo de ligação, a discussão acerca do papel do curador e das práticas curatoriais. Reflete,
portanto, sobre o papel de vulto em que se transformou o curador na intermediação entre obra e
público. Mas o que faz e como age um curador? E o que constitui uma curadoria?
14
Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG58967-6011-270,00.html - matéria; e
http://www.labiennale.org/it/biennale/storia/recenti/it/7817.1.html.
26
Pode-se dizer que o curador tem uma versão18 histórica que o colocou por um tempo na
posição do mantenedor de acervo ou conservador de museu, sendo este o local apropriado para ao
público no acesso aos objetos da história das civilizações e da arte. Assim, costuma atuar na
figura anônima do organizador, arquivista, museólogo ou diretor da instituição, que deveria
mostrar suas obras permanentes. Era usual exibir estas de forma didática, educativa e acadêmica,
com uma organização cronológica ou de estilos, no sentido de traçar assim uma trajetória e uma
evolução.
Nathalie Heinich e Michael Pollak (2000: 232), apontam alguns passos do processo de
profissionalização da carreira de curador na França. Segundo os autores, isso primeiro ocorreu
ainda sob o antigo regime, por meio da criação e autonomização na função de cuidar e conservar
o acervo das coleções reais. Depois, durante a Revolução, veio a fundação de museus e o
aumento do número de postos dessa atividade. E, por fim, com a criação da Escola do Louvre, em
1882, proporcionando a regulamentação no recrutamento e critérios de competência que
acarretaram sua oficialização. Com isso foi outorgado o título de curador aos membros do corpo
de curadores dos museus do país, estabelecida a regulação ética da profissão e a implementação
de órgãos de controle, como a associação geral dos conservadores das coleções públicas, criada
15
Diretora do Vera List Center for Art and Politics. Organizou exposições no Independent Curators International –
ICI, de1998 a 2003, e foi diretora da organização cultural The Swiss Institute, em Nova Iorque , de 1992 a 1997. É
editora do Energy Plan for the Western Man: Joseph Beuys in America, e Words of Wisdom: A Curator's Vade
Mecum. Disponível em: http://www.generalstudies.newschool.edu/alumni/02a_newsletspr04.pdf
16
Acrescenta-se que na Espanha, curador também é chamado de comissário.
17
Disponível em: http://www.mapadasartes.com.br/setoresnn.php?artig=1&texid=7
18
Não se deseja aqui posicionar o mantenedor de museu e acervo como a origem do papel do curador, embora
momentaneamente essa relação sirva a título de ilustração. Mais adiante será retomado o assunto.
27
Para os autores, é papel dos curadores, além de cuidar dos acervos e da apresentação da
herança cultural, principalmente o de enriquecer o patrimônio da instituição com a aquisição de
trabalhos contemporâneos que resistam ao tempo e à moda. (FERGUSON; GREENBERG;
NAIRNE, 2000: 233).19
No que diz respeito à atuação do curador na apresentação de obras, Martha Ward explica
que o uso moderno da palavra exposição desenvolveu-se na França, entre os séculos XVII e
XVIII, prestando-se a especificar o ato de colocar algo à apreciação pública, não sendo restrito às
artes (FERGUSON; GREENBERG; NAIRNE, 2000: 454). Pode-se arriscar a distinguir, com
base no que a autora relata,20 dois campos de exibição, o das exposições temporárias e o das de
coleções de museu.
Apesar da palavra curador, desde sua oficialização, ter sido colocada em uso no que diz
respeito às obras de arte, no âmbito museológico não constitui como certa sua validade de sentido
nos moldes de hoje. Ou seja, a atuação do curador na atualidade o coloca como um fenômeno do
contemporâneo. Ele faz parte de um processo da própria arte, que acabou por redefinir tanto suas
características e atribuições quanto sua origem.
19
O tempo em questão, quer dizer no sentido da durabilidade relativa a sua significância e não de relativa
conservação.
20
A autora não distingue formalmente essas áreas mas as deixa entrever.
21
E a conseqüente internacionalização da arte e o crescimento do mercado de arte. Pois “o novo mundo da arte não
teria se efetivado não fosse o desenvolvimento de uma nova situação cultural nos Estados Unidos – um país de
tradições emergentes – que forneceu um público para o impressionismo e construiu um campo para a arte moderna”.
(BUENO, 2001: 30).
28
acordo com os cânones das Academias de Belas-Artes até 1942. Somente no pós-guerra, sob a
tensão da guerra-fria, passou a ter interesse pela arte moderna “como símbolo da liberdade e do
progresso que os países desejavam representar” (Ibidem, 149). Reabre em 1948 exibindo os precursores
modernos, ainda na perspectiva do conceito de exposição como apanhado e em retrospectiva,
como uma forma também de resgate do tempo e pagamento de dívida com a história da arte.
Embora houvesse uma predominância francesa,22 o expressionismo abstrato americano pôde ser
apreciado pela iniciativa de Peggy Guggenheim, que exibiu sua coleção ao público em mostra
paralela ao evento.
Torna-se importante pontuar que é com a referência de Veneza que se criou a Bienal de
São Paulo em 1951, prevalecendo ainda o padrão francês, com intuito de colocar essa parte das
Américas em contato com o “circuito internacional” (BUENO, 2001:151). Sobre essa época, Bueno
22
A arte moderna francesa teve prioridade com a organização de programações didáticas por meio de dois núcleos.
Um nacional, dedicado aos contemporâneos, e outro internacional, destinada aos consagrados. Essa hegemonia
permaneceu até 1956.
23
Foi determinante a atuação de Leo Castelli, apoiado pela política para a cultura e as artes do Governo Kennedy.
Entre outras estratégias o marchand conseguiu com que primeiro fossem escolhidos parceiros na delegação para
organização; acionou galerias e colecionadores e, com a seleção, conseguiu que seus artistas expusessem nos
principais lugares como a Documenta de Kassel, a Tate Gallery em Londres, o Museu de Arte Moderna, de Paris e a
Bienal de Veneza. (BUENO, 2001: 192).
30
destaca que nos anos 50 os artistas dividiam com a crítica especializada o “reconhecimento dos
pares”, tendo inclusive uma pequena participação em júri, pois:
até então, a maior parte dos representantes das correntes plásticas contemporâneas
emergia por intermédio de grupos e movimentos. O crescimento do número de
produtores, o aprofundamento da desterritorialização nas artes e da segmentação da
linguagem levaram a uma extinção gradativa dos movimentos, como regra de revelação
das novas expressões. Desde então – com a modernidade se consolidando e a
autonomização do olhar se realizando plenamente –, a tendência dominante eram artistas
isolados trabalhando em torno de problemáticas comuns. Nesse contexto, o sistema
marchand-crítico consolidou-se como principal instrumento de consagração e revelação
dos novos artistas que emergiam agrupados e identificados a partir de rótulos como pop-
art e minimalismo, difundidos pelos agentes do mercado. (BUENO, 2001: 153).
Dessa forma, também contribuem para a existência do curador a atuação das gerações de
artistas-organizadores-curadores, principalmente na Europa a partir da década de 1960. Nesse
sentido é que se deu, entre os anos 60 e 70, a propagação de feiras, eventos diversos e a criação
das mais variadas formas de galerias para exibição de arte, realizadas com ampla estratégia de
divulgação por meio de assessorias de imprensas, ao mesmo tempo em que os museus avançavam
em um processo de estagnação do qual só vieram a se recuperar na última década do século XX.
Os novos espaços passaram a ter uma freqüência de público estimulado por uma programação
sazonal e montagens que contemplavam as novas aplicabilidades exigidas por uma arte híbrida e
experienciada.
Mas, para Peter Funken,24 a carreira de curador free-lance surge principalmente no início
dos anos 1980, devendo-se ao aumento de demanda pela mediação da arte. Ocorreu como
conseqüência de um clima econômico favorável na sociedade que a valorizou. Funken explica
que muitos curadores começaram profissionalmente como críticos, para desenvolvimento de uma
pequena especialização que servisse de passagem para organizar exposições. (TANNERT;
TISCHLER, 2004: 23).
Para Alice Creisher e Andréas Siekmann25 foi dado ao papel mediador do curador uma
prioridade parecida com as dos donos de galeria e do mercado de arte nos anos 80. Segundo eles,
isto se deve em parte à tendência de autopromoção daqueles que ansiavam por credibilidade para
com as produções independentes do mundo da arte (TANNERT; TISCHLER, 2004: 36).
24
Curador independente e crítico de arte alemão.
25
Ambos são artistas e críticos de arte americanos.
33
Dessa forma, entende-se que o papel do curador experimenta seu surgimento a partir dos
anos 60, propiciado pelos acontecimentos das exposições temporárias; com a fundação da
Documenta de Kassel e as transformações na Bienal de Veneza; diante da pluralidade do fazer
artístico e da hibridização da arte; e impulsionado pelas tendências globalizantes, vindo a se
tornar um fenômeno a partir dos anos 80 e a se firmar na década seguinte.
Para o crítico de arte americano Barry Schwabsky,26 curador é alguém que “arruma coisas”
colocando-as juntas, mas que, nesse sentido, leva em conta tanto tudo que é antagônico, quanto
compatível, à primeira vista. O que é importante avaliar é como as coisas se adequam juntas e
como é o ambiente criado pelas diferenças entre as coisas. (THEA, 2001: 9).
Permite-se dizer, assim, que tendo em vista a concretização dessa atividade de forma
independente, possibilitada tanto por novos espaços que não só museus, quanto por apoios
econômicos, ela irá paulatinamente exigir um comprometimento e uma consciência cada vez
maior do curador com as etapas e o entendimento dessa atividade. Assim, se por um lado esse
papel ainda é praticado, ora por críticos, ora por representantes (curadores) de museu ou
historiadores da arte, por outro também é verdade que o mercado passou a exigir uma maior
disponibilidade e formação.27
A partir daí a especializacão tanto prática quanto formal (acadêmica), na área curatorial,
possibilitou autonomia e segurança suficientes para propostas diferenciadas e inovadoras de
ocupação e exibição, em espaços desobrigados de sua função primordial, mas confiantes do
26
O crítico de arte é autor de The Widening Circle: Consequences of Modernism in Contemporary Art.
27
Os cursos de formação são sobretudo estrangeiros. Entre eles pode-se mencionar o do Bard College (Nova Iorque)
e o Royal College (Londres). No Brasil há cursos esporádicos e palestras como os do Grupo de Estudos em
Curadoria do MAM (São Paulo). Em agosto de 2006 a UniBrasil (Curitiba) abriu um curso de especialização em
crítica de arte e curadoria (disponível em:
http://www.canalcontemporaneo.art.br/cursoseseminarios/archives/000830.html)
34
Nesse sentido, as exposições hoje podem ser de um outro quilate do que somente sobre
um gênero, tendência, panorama artístico, ou sobre autores e épocas. Embora às vezes
controversa, a curadoria pode se dar pela escolha de tema e orientação. Como uma intuição
acerca do mundo. Numa perspectiva em que cabem diversas interpretações ligadas e mantidas,
como já foi dito antes, por uma sutil e embasada subjetividade.
Para o curador Harald Szeemann, com as exposições é possível mostrar uma idéia
pessoal, biográfica e utópica (THEA, 2001:18). Sob sua curadoria, a 49ª Bienal de Veneza,
ocorrida em 2001, teve como conceito o tema Platéia da Humanidade. A seleção das obras foi
feita com base na busca por dramas do dia a dia que se referiam ao social, à ecologia, às novas
tecnologias e às paixões. O pavilhão Itália, normalmente destinado à produção italiana, foi
ocupado de uma outra forma. Ao centro do espaço foi colocada a obra O Pensador, de Rodin, e à
sua volta diversas representações do homem nas culturas africanas, latino-americanas e asiáticas.
Espetacularização ou conceito artístico?
Para Chus Martínez “o curador deve saber o que lhe interessa”.29 É necessário que saiba quais os
discursos que pretende colocar em jogo e como estruturar as exposições. Assim, ele evita “um
desfile de obras” e propõe uma análise das perguntas que certas práticas artísticas suscitam.
Há várias motivos a considerar no que diz respeito à luz direcionada para a figura do
curador. Uma delas diz respeito ao seu poder de decisão. É ele quem decide e defende seus
arranjos, por mais gratuitos que possam ser. Todos desejam saber o que diz, como alinhava as
idéias por meio dos trabalhos e artistas escolhidos, e se há – por que não? – alguma polêmica
envolvida.
28
Hou Hanru nasceu em Guangzhou, China e desde 1990 mora em Paris. É membro do comitê global consultivo do
Walker Art Center, Minneapolis, EUA. Como curador organizou diversas exposições entre elas a do pavilhão
Francês da Bienal de Veneza em 1999 (THEA, 2001: 137).
29
Curadora da Sala Rekalde (Bilbao-Espanha) disponível em:
http://forumpermanente.incubadora.fapesp.br/portal/.event_pres/workshops/folder.2005-06-
20.3748870081/oficina_chus/
35
De acordo com Catherine Thomas (2002: 9), a extensão de palavras usadas para descrever
o que é curador é vasta: “zelador, facilitador, negociador, comunicador cultural, agitador cultural” (tradução
nossa). E todos esses entendimentos sobre curadoria implicam em formas de troca social que são
muitas vezes desconhecidas. Já para Rosa Martinez,30 essa prática dá a chance de trabalhar em
diálogo com o artista para co-produzir uma nova realidade e se relacionarem juntos em um novo
contexto (THEA 2001: 79).
Para a crítica de arte Carolee Thea31 (2001:12), enquanto artistas e seus trabalhos
fornecem elementos de uma paisagem cultural, curadores são mediadores criativos que absorvem,
organizam e alimentam informações na rede de desenvolvimento dos sistemas de exposição que
são as bienais, feiras de arte, museus (ou centros culturais) e projetos culturais.
De acordo com Adriano Pedrosa,32 o curador tem sido cada vez mais chamado para
executar vários papéis. É um como um agente que negocia e chama interlocutores e instituições
de diferentes níveis. Outra questão a que se refere diz respeito ao próprio conhecimento. Ou seja,
certo tipo de prática curatorial associada ao que chama de projects, que vai além das exposições.
Explica que estas não são mais um mero mostruário em uma galeria, já que palestras, seminários
e conferências têm se tornado habituais. Nesses casos, a exposição não é mais o foco principal.
(THOMAS, 2002: 36 et seq.).
Uma das conclusões a que se pode chegar, até o momento, é que o curador
contemporâneo apresenta o seu entendimento de arte inicialmente por meio de exemplos. Assim,
a exposição é um exemplo de um conceito sobre arte. A junção de artistas e dos trabalhos que
realizam, mesmo que díspares em técnicas e aparentemente incongruentes, deve propor um
discurso uníssono com a proposta. Podendo ser, inclusive, a de mostrar, no exagero de elementos
opostos, a idéia de pluralidade ou hibridização que as obras emanam.
30
Rosa Martínez foi co-curadora da Bienal de Veneza de 2005. É curadora-chefe no Museu de Arte Moderna de
Istambul, Co-curadora da 1ª Bienal de Moscou e Curadora-associada do Magasin 3, em Estocolmo, na Suécia. Foi
Diretora-artística da 5ª Bienal Internacional de Istambul e é co-curadora da Bienal de São Paulo de 2006. Disponível
em: http://bienalsaopaulo.globo.com/fundacao/institucional/fund_quemsomos.asp
31
Também é curadora e contribui para a revista Sculpture Magazine. (THEA, 2001: 141).
32
Foi curador-adjunto e Editor de Publicações da 24ª Bienal de São Paulo (1998), Co-curador da 27ª Bienal de São
Paulo (2006) e Curador responsável por exposições e coleção do Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte
(2001-2003). Entre seus projetos estão: F[r]icciones (Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofia, 2000-2001, com
Ivo Mesquita) e Farsites: Urban Crisis and Domestic Symptoms in Recent Contemporary Art (InSite-05, San Diego
Museum of Art, Centro Cultural Tijuana, 2005). É Curador da Coleção de Paisagens de Paulo A. W. Vieira (Rio de
Janeiro) e da Coleção Teixeira de Freitas (Lisboa, Portugal). Disponível em:
http://bienalsaopaulo.globo.com/fundacao/institucional/fund_quemsomos.asp
36
É assim que as escolhas e propostas dos curadores às vezes podem ser mal compreendidas
e, ou, pouco acertadas. Foi o que ocorreu durante a Bienal de São Paulo de 1985, sob curadoria
da jornalista e crítica Sheila Leirner. Pela primeira vez, um tema havia sido proposto para o
evento, O homem e a vida, que teve na expografia A Grande Tela uma proposta arriscada.
Segundo a curadora, a intenção foi de aglutinar as obras de grande formato, em corredores
extensos, enfileiradas uma atrás das outras. No seu ponto de vista essa expografia estaria
apropriada a destacar a linguagem artística da época, que era contrária à caixa branca pertinente
às décadas anteriores. Na visão dos artistas e de alguns visitantes, no entanto, tudo não passou de
uma forma de exibição que gerava um grande desconforto e equívoco, mas que pela primeira vez
marcava a imposição de uma autoria curatorial. (PÓLO, 2004: 26).
Uma proposta de curador, portanto, está baseada no que normalmente se costuma chamar
de conceito. Assim, é possível ter a intenção de mostrar uma tendência artística ou uma
percepção da arte e do mundo por parte de quem a faz. É desse modo que a exposição ArteFoto,
que estreou no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), do Rio de Janeiro, em 2002, com
curadoria de Ligia Canongia, quis, ao mesmo tempo, abarcar o resgate histórico e fazer um
recorte fundando um discurso preciso sobre a fotografia. Ou seja, sobre o primeiro tópico, a
exposição esteve preocupada em organizar historicamente as experiências artísticas que levavam
em conta a fotografia como expressão e suporte desde 1940. Já no que diz respeito ao segundo
tópico, tratava-se de reconhecer na fotografia a busca de expressão para pensar a arte e, ao
mesmo tempo, colocar o que a distinguiria de uma outra foto, de conteúdo jornalístico ou de
caráter ensaístico documental.
No decorrer dessa pesquisa pôde-se perceber questões recorrentes nas diversas entrevistas
presentes na bibliografia utilizada, no que tange à problematização nas relações de trabalho do
37
curador e, também, sobre as temáticas que levam em conta para a criação de exposições. Não é
intenção analisar minuciosamente cada um dos pontos, mas apenas apontar, como se disse, as
questões que são insistentemente mencionadas pelos entrevistadores e apresentadores, ou citadas
espontaneamente pelos curadores. Dessa forma, elas servem como um esboço no empenho do
entendimento do que o curador deve levar em consideração para realizar seu trabalho.
Como foi dito anteriormente, o campo da curadoria tem um sentido que muitas vezes nos
escapa. Há muitas perguntas a serem feitas e não necessariamente respostas, mas outras perguntas
podem ser propostas para uma melhor reflexão sobre o assunto. Assim, foi possível avistar no
decorrer da pesquisa, por meio da fala de curadores, questões que problematizavam sua atuação,
ou questões da arte pelas quais são orientados. Fez-se, portanto, um esforço minucioso com o
intuito de identificar nesses discursos o que poderiam ser pistas para que fossem estabelecidas
conexões e, por que não, definições circunstanciais quanto aos temas e categorias de curadoria.
Tudo com intuito de colaborar com algum tipo de sistematização.
Nesse sentido, no que diz respeito às relações de trabalho dos curadores contemporâneos,
as questões mais comentadas e identificadas nessa pesquisa tratam sobre a autoridade exercida
pelo curador; o método para seleção de artistas e obras; as parcerias que estabelece; a eleição de
temas pelos quais se orientam para pensar a exposição; e o tipo de orientação da exposição na
construção de um conceito. A partir daí, percebeu-se que ao construir a idéia da exposição, seu
conceito e tema, os curadores apresentavam reflexões nas quais podiam se basear para pensar a
arte ou fazer dela um pensamento.
O exercício do poder e autoridade por parte do curador ocorre tendo em vista que é o
responsável por tomar as decisões de escolha de equipe, artistas, parceiros e por fazer a
intermediação com instituições ou patrocinadores. Dessa forma, muitas vezes é julgado como
ator de uma prática ditatorial em que impera sua vontade, soberana, sobre qualquer outra. A
crítica é feita ao seu poder decisório, indaga se a proposta e a seleção estão a serviço apenas de
um ponto de vista particular do curador sobre a arte, ou se a arte, ou tema em questão, estão
sendo eficazmente representados.
Até que ponto a escolha se dá na limitação do conhecimento do que está sendo produzido,
ou se realmente contempla a produção contemporânea pretendida? A atuação de chefia do
38
curador exige um comando que promove poder e prestígio, podendo em conseqüência ser tanto
antipatizado quanto glorificado.
A curadora Barbara London33 não crê que artistas, ou o público, estejam interessados em
saber a opinião do curador. Mas sim em conhecer o que os artistas estão fazendo. Ela afirma que
o trabalho de curadoria alcança sucesso quando desaparece por trás do que está sendo
apresentado e ao mesmo tempo continua a ter uma visão intelectual. Ou melhor, dá liberdade e
serve de guia. (THEA, 2001: 134).
Um dos pontos cruciais para a prática curatorial pois diz respeito à seleção de artistas e
obras, demonstrando inclusive credibilidade, profissionalismo e também maestria do curador.
Isto porque, tendo em vista a diversidade e grande produção de arte contemporânea, é
significativo na importância do papel do curador descobrir novos artistas. Mas também prever, no
valor contido ali, a potencialidade de uma existência longa. Essa questão se refere a como faz o
curador para ter acesso ao que está sendo feito.
De forma geral são mencionadas como relevantes formas de sistema de pesquisa por parte
do curador nesse quesito: a rede de contatos que sirvam como fonte (inclusive artistas); o
acompanhamento de carreiras; a parceria com outros curadores que tenham domínio em
segmentos muito específicos como, por exemplo, a arte produzida para Internet; a visita a ateliês
e exposições; viagens de reconhecimento; e leitura de revistas de arte, jornais e catálogos de
mostras.
Alguns curadores como Yuko Hasegawa34 trabalham com artistas, a partir de seus
conceitos, que criam trabalhos em função de um contexto. (THEA, 2001: 52). Outros trabalham
de forma muito especializada e focam o interesse estritamente em descobrir artistas jovens ou
marginalizados, que sejam contra o formalismo e estejam em busca de inovações. Outros ainda
centram a pesquisa em torno de artistas de países em desenvolvimento; naqueles que
desenvolvem projetos – trabalhos de difícil produção ou até irrealizáveis – ; trabalhos em grandes
escalas; aqueles que se resolvem ou se completam com a ação do expectador; que utilizam a
tecnologia e promovem a interatividade; e a new media. (THEA, 2001).
33
Curadora de vídeo do MOMA (Nova Iorque) e do projeto on line Time Stream. Disponível em:
http://www.moma.org/exhibitions/2001/timestream/index.html
34
É curadora do museu de Arte Contemporânea de Kanazawa, Japão. Foi curadora da Bienal de Istambul (2001) e é
professora de História da Arte na Tokyo National University of Fine Arts and Music. (THEA, 2001: 138).
39
Sobre a identificação de autores e quais as fontes que vem utilizando para a organização
da 27ª Bienal de São Paulo, intitulada Como viver junto, a curadora Lisette Lagnado diz que,
embora não haja no projeto “representações nacionais”, tem procurado ouvir as indicações de
especialistas de vários países (REVISTA FOTOSITE, 2006). Diz também que se utiliza de
revistas, visitas a museus, galerias e mostras, além de entrevistar cada artista quando possível.
Fig. 3 Long March Project,35 Grande estudo sobre recortes de papel no município
de Yanchuan, 2004, durante a 27ª. Bienal de São Paulo, 2006
FONTE: http://www.longmarchspace.com/images/latinamerica/e-index.htm
Fig. 4 Long March Project, The Miniature Long March - Qin Ga, 2002
FONTE: http://www.longmarchspace.com/images/qinga/qigalongmarch/e-qinga.htm
35
O grupo, selecionado para Bienal de São Paulo 2006, realiza uma obra em cada parada da rota percorrida pelo
exército de Mao Tse Tung.
40
De acordo com isso, é que a 51ª Bienal de Veneza, ocorrida em 2005, ao escolher pela
primeira vez duas mulheres, Rosa Martínez e María de Corral, como curadoras, estava querendo
privilegiar a concepção de arte de ambas, mas também sinalizar para as questões de gênero pelas
quais elas se preocupam ou que elas próprias poderiam simbolizar. Não parece pois, à toa, que a
mostra tenha sido aberta com um candelabro feito de absorventes femininos, de autoria da
portuguesa Joana Vasconcelos. Para Martínez, há muitas leituras da obra, “de como artistas trabalham
com elementos da cultura popular, como se subverte a ideologia de que só a luz masculina ilumina, enfim, a
polissemia da obra é muito ampla”. (CYPRIANO, Folha de São Paulo, 2005: 8 de junho: E 3).
Embora, de acordo com a perspectiva atual, a curadoria constitua também uma autoria,
podendo ser uma obra em si, pode-se, além desse modelo e com base no que foi ilustrado pelos
autores anteriormente, especificar alguns segmentos de exposição, mais identificados com o
formato de produto cultural.
- Individual: autor vivo que idealmente trabalha na mostra em parceria com o curador.
Este por sua vez atua como interlocutor para um artista e pensam juntos a seleção e a expografia.
42
- Coletiva: vários artistas muitas vezes ligados por um tema ou alguma identificação
específica: arte eletrônica, fotografia etc. Assim, geralmente a organização é centralizada no
coordenador ou curador.
- Temática: aborda um determinado assunto, como, por exemplo, o corpo, a violência etc.
Ou por meio de um tema como água36 orienta a linha de pensamento e a perspectiva que se quer
tomar e os trabalhos apresentados.
O tema portanto deve ser considerado como pertencendo a cada um dos segmentos e por sua
vez carrega um conceito embutido. Este irá tratar de uma orientação, das linhas de pensamento e
embasamento da qual se vale o curador para selecionar obras e autores, avaliar e montar a
expografia. As Bienais usualmente elegem um tema e, em volta dele, montam a conduta
conceitual.
Fig. 7 Exposição coletiva, Fancy Dance, Artsonje Museum, Seoul, Korea, 199937
FONTE: http://artsonje.org/new_eng/exhi/l_exhi_1999.asp
Rosa Martínez crê que, tendo em vista o montante de informações em que vivemos, os
artistas acabam processando-as rapidamente e produzindo muito ruído. O curador agiria então
37
A curadora Yuko Hasegawa propõe com a exposição Fancy Dance o conceito de visão nova para o século XXI.
Aponta não só os caminhos da arte nesse século mas promove uma compreensão mais profunda das culturas
coreanas e japonesas da arte. Mostra trabalhos de artistas da nova geração e promove a relação das duas culturas.
Entre os artistas estão: Dumb Type, Kazuhiko Hachiya, Ideal Copy, Maywa Denki, Mariko Mori, Motohiko Odani,
Takeharu Ogai + Ai Ogawa, Kazuyo Sejima + Ryue Nishizawa, Yutaka Sone, Toshiaki Takayasu, Miwa Yanagi,
flow, Shinya Tsuji.
44
como um editor, amparado por critérios estéticos e políticos, habilitado a eleger as mensagens
mais significativas para interpretar o mundo. Funcionaria, assim, como um filtro nesse ruído.
(CYPRIANO, Folha de São Paulo, 2005: 8 de junho: E 3).
De todas as maneiras deve-se considerar o curador como alguém que, mesmo atuando de
forma independente, sempre estará atrelado a alguma instituição ou grupo para o qual estará
desenvolvendo seu trabalho. Logo, tanto a temática que deseje abordar, quanto as obras que
precise incluir em seu projeto, dependerão dos arranjos administrativos e financeiros da afinidade
de visão com os parceiros que viabilizam a estrutura da mostra. Quando um curador inicia um
trabalho de pesquisa e montagem, precisa construir o seu conceito, eleger artistas e obras que
podem representá-lo. A partir disso, busca defender a concepção elaborada para montagem de
suas exposições em bienais, feiras de arte, museus, centros culturais, galerias e até mesmo na
world wide web.
38
VIRILIO, Paul in Bomba Informática (1999: 24)
39
Termo criado pelo escritor Willian Gibson em seu livro Neuromancer de 1984.
40
Por “acesso” entende-se aqui somente os diversos mecanismos dentro da Web que permitem a criação e/ou
disponibilizam espaço para páginas pessoais ou formas de comunicação. Não se deseja dizer portanto, que o acesso à
Internet seja irrestrito e fácil.
41
Jean Baudrillard utiliza essa expressão em referência aos meios de comunicação. Acrescenta que “em toda parte a
socialização mede-se pela exposição às mensagens midiáticas. Está dissocializado, ou é virtualmente associal, aquele
que está sub-exposto aos media” (1991: 104).
42
O que ocorre no ciberespaço é que há culturas diferentes vinculadas por afininidades profissionais, preferências etc
e não há uma identidade nacional localizada.
46
Google digitando a palavra virtual.43 Entre o resultado de 979 milhões de opções estão
horóscopos, bibliotecas, educação a distância, universidades, centros esportivos, museus de
informática, museus de arte, livrarias, centros culturais, comércio eletrônico, incubadoras,
hospitais, atlas e até mesmo um braille entre outros, todos com o complemento virtual. Grosso
modo, para todos ali que participam e fazem a cultura da web, virtual é estar conectado, é estar no
ciberespaço.
O paradigma do virtual, portanto, fala sobre o real a partir daquele. Devido à aplicação
dessa palavra, designada a assumir a representação de sentido de, primeiro, tudo que seja on line
(assimilação corriqueira do senso comum e ampliada pelos meios de comunicação), e, depois, off
line, mas sempre via computadores. É em contato com ele, que, às avessas, passa-se a pensar as
diversas realidades. Ou seja, é o surgimento do seu perfil tecnológico que faz urgente não só o
seu entendimento, mas o do próprio sentido do real em relação ao seu significado.
De acordo com Pierre Lévy (1999: 47), o sentido do virtual tem três tipos de abordagens.
Uma técnica, uma de senso comum e outra filosófica. O que o autor vem falando, sobretudo a
partir da reflexão da história da técnica no processo de hominização, é que, nesse caso, o virtual,
filosoficamente falando, não se opõe ao real. O seu contrário é o atual.
Nesse sentido, a imagem de um real de feição material, concreta e física, que se oporia à
imaterialidade que configuraria a abstração pertinente ao virtual, é condizente com um sentido
corrente, que imagina e tem como parâmetro o palpável. Para o autor, seguindo um caminho
apontado por Deleuze,44 o virtual deve ser considerado como algo que existe em potência, “um
complexo problemático”, podendo ser um acontecimento (a linguagem e a virtualização do presente),
um objeto (a técnica e virtualização da ação), ou uma entidade (o contrato e a virtualização da
violência) e que pede uma resolução que gera a atualização. (LÉVY, 1996).
Quer seja o virtual um veículo multimídia ou, como prefere Lévy (1999: 65), de horizonte
unimídia multimodal (real eminente, não físico, nunca presente), a emergência da análise do
virtual impetrada pelo autor como um movimento de heterogênese (devir outro) do humano é,
antes de tudo, uma defesa contra o ataque às tecnologias de informação, suas ramificações e
constituintes: internet, www, virtual, digital, imagem de síntese, imagem numérica, realidade
43
Busca realizada em 19 de junho de 2006.
44
Pierre Lévy recorre a distinção feita pelo filósofo Gilles Deleuze no livro Différence et répetition, entre possível e
virtual.
47
O virtual da informatização tem um quê de deja vu. Agora são os processos de sedução da
mídia eletrônica que estão na berlinda. Os críticos ao modo de comunicação um-todos dos mass
midia podem não ter o que questionar diante da participação efetiva do método todos-todos que a
rede expõe. Mas, se refugam nesse ponto, é só para mais adiante atacar o virtual como algo
enganador.
Para Lúcia Santaella (2004: 77) são seis as eras culturais a título de contextualização da
cibercultura, a “oral, escrita, impressa, de massas, das mídias e digital”. Diante disto, embora possam
45
Computadores fazem arte é título da música da banda pernambucana Chico Science (1966-1997) e Nação Zumbi.
Durante a década de 1990 lançaram movimento mangue beat, originalmente chamado de mangue bit (referindo-se á
memória dos computadores). O grupo utilizou não só do cenário da internet e demais referências computacionais em
suas criações como também dos mecanismos eletrônicos para fazer música e da comunicação virtual para divulgá-la:
“Computadores fazem arte, Artistas fazem dinheiro. Computadores avançam. Artistas pegam carona. Cientistas
criam robôs. Artistas levam a fama”, de Fred Zero Quatro no disco Da lama ao caos (1994).
46
Umberto Eco discute no campo da comunicação as posições dos que eram contra, e outros nem tanto assim, à
Indústria Cultural, e à cultura de massa. Marca a herança e resquícios do pensamento crítico frankfurtiano.
48
existir outros prognósticos para pensar o proposto aqui, acredita-se na relevância de se considerar
alguns acontecimentos e desdobramentos do virtual como sintoma.47 Dessa forma, arriscou-se a
estipular quatro valores de análise que repercutiram no horizonte do pensamento após as
transformações pós-revolução industrial e, conseqüentemente, no desenrolar das eras da imprensa
e das massas, e que ganharam novo fôlego na época do digital. A saber: técnica, cultura,
ideologia e sociedade. Sendo que essas abordagens vem ocorrendo na ordem de preocupação,
tanto das competências teóricas de pesquisas acadêmicas, quanto na de organismos e partícipes
da sociedade, que tomam e realizam suas impressões, como é o caso de curadores e artistas.
Walter Benjamin fundou para a obra de arte a noção de aura e de hic et nunc ao falar das
técnicas de reprodução em série. Pois, afinal, não é a iminência da perda que faz surgir o
sentimento de valor no objeto perdido? Dessa forma, fez perceber, através dos mecanismos
técnicos do cinema e da fotografia – que além de tudo pretendiam-se como possibilidades
artísticas – como era inerente à arte o caráter de autenticidade e unicidade. As transformações
impostas por aquelas técnicas conformavam, na concepção Theodor Adorno e Horkheimer
(1985), a industrialização da cultura, um caso de exploração comercial e vulgarização, usando-a
como ferramenta de dominação ideológica em favor do capital. A produção baseava-se no
pastiche levando em conta o que o público já o tinha em seu repertório. Sendo ou não um
conceito-fetiche,48 o fato é que tal formulação chamou a atenção para as mudanças sociais e
comportamentais por meio de formas de entretenimento julgadas palatáveis.
Para a filósofa Hannah Arendt, a cultura diz respeito aos objetos e é um fenômeno do
mundo. Já o entretenimento relaciona-se com pessoas e é um fenômeno da vida. Portanto, o que
irá diferenciá-los refere-se ao caráter de funcionalidade e durabilidade. “Um objeto é cultural na
medida em que pode durar; sua durabilidade é o contrário mesmo da funcionalidade, que é a qualidade que faz com
que ele novamente desapareça do mundo fenomênico ao ser usado e consumido” (ARENDT, 1999: 260). E
assim são as obras de arte – um fenômeno do mundo público assim como a política –, superiores
nesse sentido de permanência.
Se, para Marshall Mcluhan (1999: 72), o “meio é mensagem”,49 para Lévy (1999: 113), o que
está implícito no virtual é o valor do universal que carrega, pois “essa mídia tende à interconexão geral
das informações, das máquinas e dos homens [...] a mensagem dessa mídia é o universal, ou a sistematicidade
transparente e ilimitada”.
49
Significa que as conseqüências sociais e pessoais de qualquer meio – ou seja, de qualquer uma das extensões de
nós mesmos – constituem o resultado do novo estalão introduzido em nossas vidas por uma nova tecnologia ou
extensão de nós mesmos. Os meios como extensões de nossos sentidos, estabelecem novos índices relacionais, não
apenas entre os nossos sentidos particulares, como também entre si, na medida em que se inter-relacionam.
(MCLUHAN, 1999: 21; 72).
50
Fig. 8 Barbara Kruger, sem título, exposição na Mary Boone Gallery, Nova Iorque, 199150
FONTE: http://www-tc.pbs.org/art21/artists/kruger/img/BK_3.jpg?mii=1
Manuel Castells (2003: 8) apontou três processos independentes que inauguraram uma
nova estrutura social predominantemente baseada em redes. Foram elas “as exigências de uma
economia flexível e globalizada; as demandas da sociedade por valores da liberdade individual e da comunicação
aberta; e os avanços extraordinários na computação e nas telecomunicações possibilitados pela revolução
microeletrônica”.
50
O trabalho da artista, fotógrafa e design americana Bárbara Kruger utiliza elementos gráficos, fotos em preto e
branco e de texto de propaganda aludindo ao repertório imagético de uma sociedade exposta à linguagem da
imprensa e da propaganda. Combina fotomontagens e slogans. Manipula, se apropria e propõe uma reformulação
semântica desse material para falar de relações sociais distorcidas produzidas pelas desigualdades de gênero, classe e
raça. Foi ganhadora do prêmio Leão de Ouro, na 51ª Bienal de Veneza sob curadoria de María de Corral e Rosa
Martínez.
51
Para Fredic Jameson (2004: 62) o que ocorre, no entanto, é uma espécie de “paranóia high-
51
tech” . Não se trata apenas de um caso de determinação na vida societária ou na produção cultural
proporcionada pela tecnologia. Sugere, portanto, que as representações de uma rede
computadorizada de comunicações figuram como distorções hipnóticas e fascinantes de algo
maior, que é todo o sistema mundial do capitalismo multinacional. De acordo com o autor, a
solidificação da terceira fase do capitalismo capacita-se através da informação globalizada e
virtualizada. Nesse pós-modernismo, tudo passa a fazer parte do sistema. Tudo vira do avesso
para servir à mídia. Esta que parece ser o último paradeiro do conceito da verdade da civilização,
pois é por meio dela que questões pertinentes à educação e ao exercício da cidadania,
historicamente vinculadas a uma ideologia de esquerda, passam a figurar, a fim de uma suposta
consciência apenas individual. Por fim, esta descrição diz respeito à análise da formação da
sociedade de controle, dos espaços lisos desterritorializantes e da servidão maquínica52
propostos por Gilles Deleuze, em que o essencial é a linguagem digital da cifra (a senha), pois:
51
Em sua análise acerca do pós-modernismo, o autor refere-se à questão da totalidade impossível que se quer
representar, com a noção de um computador global incapaz à cognição humana. (JAMESON, 2004: 62).
52
Este conceito foi desenvolvido em conjunto com Félix Guatarri In Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Editora
34, v. 5. Rio de Janeiro.
53
No artigo intitulado Post-Scriptum sobre as Sociedades de Controle, Deleuze explica que controle é nome que
Willian Burroughs (escritor beat americano) “propõe para designar o novo monstro”, Foucault reconhece o que se
aproxima e Paul Virilio (1990: 220) também analisa as formas rápidas de controle ao ar livre.
52
contínuo. O indivíduo não pertence a nenhuma identidade e ao mesmo tempo pertence a qualquer
uma. Está amarrado à formação permanente e portanto nada pode concluir. Nessa sociedade do
work in progress pessoal, o essencial é uma senha que dê acesso à informação. Todos estariam à
mercê da vigilância por aparatos tecnológicos de consistência virtual.
Nota-se, até aqui, que, para alguns autores, o processo de virtualização do mundo é o
espelho de uma liberdade vigiada, do rastreamento a todo momento, e da solidificação de um
sistema de dominação de controle, disfarçado por meio da falsa inclusão, tanto na prática da
participação cidadã, quanto na de intenção alternativa, ou seja, de burlar o instituído. Para André
Parente (1999: 101), no entanto, “como a câmera escura para a sociedade do espetáculo, o panóptico para a
sociedade disciplinar e a televisão para a sociedade pós-industrial, a realidade virtual é o dispositivo que melhor
representa o papel das novas tecnologias da imagem na sociedade contemporânea”. Ainda de acordo com
Parente, alguns vêem na realidade virtual o lado negativo de uma imagem sem referente. Para
Pierre Lévy (1996: 23), o virtual não é coisa de agora pois o primeiro grau de virtualização se deu
com a invenção de novas velocidades.
54
A autora faz referência também aos objetos-cifra de Freud, os sonhos e de Darwin, os animais.
53
coletivizada. Ao mesmo tempo que histórias pessoais são documentarizadas e divulgadas na rede,
também só passam a existir em dependência da assistência e da história do outro. As
comunidades seriam então pequenos organismos individuais e o indivíduo consciente de sua
especificidade.
Se a experiência do ciberespaço está destinada a nos transformar, não é porque ela vai
substituir a realidade por uma realidade cibernética, uma realidade simulada, mas porque
o ciberespaço é uma inegável lembrança do fato de que somos condicionados para,
desde muito cedo, ignorar e negar que nossa subjetividade é, por si só, uma simulação
hiper-realista.
55
Dumb Type é um grupo multimídia japonês, composto de cinco integrantes centrais e alguns membros
temporários. Segundo a curadora Yuko Hasegawa não há espaço para manifestação de características individuais no
grupo. Para ela a colaboração artística serve como exemplo para um direcionamento da sociedade que procura estar
interconectada e produzindo uma consciência coletiva. Como ilhas em um arquipélago. Ao mesmo tempo individuais
e coletivas. (THEA, 2001: 43).
54
No que tange à prática curatorial, o virtual provoca, devido a sua bi-lateralidade subjetiva
e objetiva (filosófica e tecnicamente), interesses igualmente diferentes. Um ponto, o primeiro, diz
respeito às construções conceituais que podem ser feitas em derredor da situação virtualizada. Ou
seja, trata das questões já mencionadas acerca dos fluxos de informação, da estruturas
globalizantes e das novas formações sociais, que podem ser abordadas de maneira igualmente
crítica pelo curador, só que talvez mais em relação aos arranjos gerais pelos quais passa o mundo,
e menos com foco no teor de culpabilidade do sistema virtual, pois este é parte de uma estrutura
maior, que é a sociedade. O outro ponto trata da determinação técnica como mecanismo,
ferramenta e recurso de trabalho, seja como forma de acompanhar uma tendência inevitável das
formas de produção, seja como forma de utilização para se pensar o novo, em novas formas de
apresentação.
A essa altura, cumpre destacar algumas considerações distintivas sobre que o denominam-
se mundos virtuais, realidade virtual, ciberespaço e interatividade, a fim de se posicionar em
relação ao que se propôs e entender como galeria virtual.
De acordo com Lemos (apud de PAULA, 2004: 41), o ciberespaço pode ser entendido,
primeiramente, a partir da definição de Willian Gibson como “um espaço não físico formado por um
conjunto de redes de computadores através das quais todas as informações circulam”. Ou, de outro modo, como
“o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias digitais” (LÉVY
apud de PAULA, 2004: 42).
Em sua análise, Douglas de Paula explica que, sobremaneira, o conceito gira em torno dos
termos redes e mundos virtuais. Contudo, ressalta que André Lemos não subjuga a condição de
55
estar no ciberespaço à conexão na rede mundial propriamente. No entanto, no que diz respeito
aos mundos virtuais, para de Paula (2004: 42), a diferença irá ocorrer entre o que significam a
“digitalização de virtualidades sensoriais e informacionais”, ambientes simulados e imagens de síntese
tridimensionais.
Dessa forma, Suzete Venturelli (2004: 102) considera a realidade virtual como a técnica
de interface em que existe um ambiente tridimensional, podendo ser imersiva – a dos ambientes
virtuais – ou, teleimersiva – a dos mundos virtuais implementados na Internet com linguagem de
modelagem (java 3d ou VRML). Assim, a “realidade virtual é percebida por meio de mundos virtuais” (de
PAULA, 2004: 41).
Retomando André Parente (1999: 103), “os dois principais sistemas de realidade virtual são os
sistemas de visualização de imagens (realidade virtual, ambiente virtual e realidade artificial) e os sistemas de
comunicação em rede (ciberespaço)”. Laymert Garcia dos Santos (1999: 113) define a realidade virtual
como “a geração de um mundo a partir de uma relação homem-máquina, um mundo criado artificialmente, que o
usuário, depois pode habitar”.
No entanto, para Pierre Lévy (1999: 145), os mundos virtuais constituem tanto os
sistemas off line, CD-ROMs por exemplo, como os sistemas on line, acessível pela rede, abertos à
interação, transformação e conexão com outros mundos. Não há motivos para opô-los. Mas deixa
margem para consideramos, como mundo virtual, um documento de texto digitalizado (de
PAULA, 2004: 42).
potencializa no ciberespaço. Sendo este um grande computador geral, ocupado por grupos que se
formam por afinidade e que pertencem a um espaço que não é passível de ser designado (é um
outro lugar e lugar nenhum), em que as distâncias são invisíveis e que lida com um tempo
alongado, reversível e fragmentado que é o próprio tempo computacional. (VENTURELLI, 2004:
100).
56
Aplicar-se-á o termo visitante ao invés de usuário, por entender-se que compete mais adequadamente ao caso da
galeria.
57
Falarmos em interatividade hoje é quase uma condição para uma obra de viés tecnológico. Pois,
afinal, se é um recurso possível e genuíno, porque não utilizá-lo?
De acordo com Venturelli (2004: 77), num sistema interativo coexistem diferentes
interações e elas podem fazer parte de um mesmo sistema. A autora explica ainda que um sistema
assim pode ser estático (responde sempre da mesma maneira ao ser acionado); dinâmico
(responde de forma distinta a cada diferente momento do acionamento); autônomo (cria suas
próprias regras, condicionada ao tempo, sua existência depende das interações ocorridas). Dessa
forma, “a criação de um sistema é inerente à criação de uma obra interativa. O domínio de tal atuação se dá
determinantemente na possessão do tempo presente”. (DOMINGUES, 2002: 45).
De Paula (2004: 47) propõe o entendimento do termo interação no que diz respeito aos
espaços computacionais em três relações: máquina-máquina (interações de processamento interno
para permitir o funcionamento ao ligar); homem-máquina (troca entre usuários interfaces
sensório-motoras: mouse, teclado etc); e homem-homem (por meio da conexão por pelo menos
dois computadores). Entende-se, assim, por interatividade a condição da ação como condição a
priori para determinação do efeito na obra, enfim, para que ela aconteça.
Dessa forma, tratando-se do projeto de curadoria para uma galeria virtual de fotografia,
caso a interatividade ocorra, deve ser prevista mais como uma estética da própria obra. O trabalho
deverá suportar adequadamente a proposta. Ao ser utilizada, deve-se levar em consideração a
pertinência ao trabalho, e estar condizente com a interpretação e julgamento do artista e do
curador.
Originalmente, cabe aos museus e galerias de arte a exposição de uma obra para dar
visibilidade pública ao trabalho artístico de um certo autor. As galerias comerciais, visando a
58
Saliente-se, porém, que essa nova realidade de existência virtual passou a ser o campo de
experiências artísticas, chamando a atenção para a emergência de exibição dessa produção, bem
como a preservação da história desse ciberespaço, em particular, por parte de museus e curadores.
Estes se depararam com uma nova realidade emergente, inconstante e auto-substitutiva, dada sua
impermanente materialidade on-line. Pois o que um dia foi posto na rede poderia não ser
encontrado no outro dia.
O Museu Walker Art Center, que existe desde o século XIX, é hoje uma referência de
instituição inovadora a constituir não só um espaço de galerias de trabalhos digitais e de natureza
virtual, como por dar início a uma coleção. O New Media Iniciatives foi fundado em 1996 por
Steve Dietz para dar espaço às artes digitais, originando a Gallery 9,59 com diversas seções. O
Walker possui ainda uma coleção digital e assim realiza ao mesmo tempo a legitimação desse
segmento em junção à arte contemporânea e permite a sobrevivência no espaço originário. É, por
assim dizer, uma galeria virtual de trabalhos virtuais.
57
De acordo com o Estatuto do Conselho Internacional de Museus (ICOM), em seu Artigo 2º, § 1º “o museu é uma
instituição permanente sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento e aberto ao público, que
adquire, conserva, pesquisa, comunica e exibe para finalidades do estudo, da instrução e da apreciação, evidência
material dos povos e seu ambiente”. (Definição adotada em Assembléia Geral em Copenhagen, em 1974).
Disponível em: http://www.icom.org.br
58
VRML é uma linguagem que permite a criação de ambientes virtuais tridimensionais por onde se pode passear e
visualizar objetos. Em um museu virtual nesses moldes a intenção é que o usuário possa explorar experiências
similares as vividas em um museu real. A visita virtual do museu do Louvre está disponível atualmente na seção
Panoramas. Disponível em: http://www.louvre.fr
59
Disponível em: http://gallery9.walkerart.org
59
A arte produzida para o ciberespaço exige um tipo de curadoria muito específica, não
sendo esta o que pretendia-se, desde o início, abordar nesta pesquisa. Diz respeito a trabalhos de
web art e net art62 que se distinguem pelo protocolo on line utilizado.
60
Disponível em: http://www1.uol.com.br/bienal/24bienal
61
Disponível em: http://www1.uol.com.br/bienal/24bienal/web/ricardo
62
“[...] a web arte enfatiza mais a interação e o diálogo com o espectador, como pode ser avaliado nos mundos
virtuais tridimensionais tele-imersivos. A net arte por outro lado, apropria-se de recursos de banco de dados para
criar trabalhos participativos, cujo conceito principal está voltado para a construção de obras coletivas, a partir da
interatividade dos sistemas artísticos criados. Nos dois casos a interação e a conectividade são fundamentais para que
se estabeleça a obra plenamente”. ( VENTURELLI, 2004: 96).
60
reconhecíveis.63 Pois, diante do novo, buscamos o que está à mão, em nosso próprio repertório, a
fim de classificarmos e sentirmos seguros.
Para Fábio Oliveira Nunes, “a maioria dos sites que levam a designação arte na Internet são chamados
64
galerias virtuais”. É possível encontrar desde diversos tipos de obras de arte, técnicas e materiais
de pinturas, a instalações, que são mostradas “por meio de imagens fotográficas, desenhos ou ambientes
virtuais”.
Nunes organiza os sites em três grupos distintos: “os de instituições culturais, os pessoais de
65
artistas e aqueles de internautas que admiram obras de arte”. Segundo o autor, as instituições culturais
disponibilizam na rede, de forma geral, seus acervos e exposições já realizadas, com textos
explicativos ou críticos. São colocados por meio de divisão por páginas ou salas. Há também
modelos criados no sistema VRML (Virtual Reality Modeling Language) ou em 360º (Java -
Livepicture) que, como foi comentado anteriormente, permite comandos por parte do visitante
para circulação entre os trabalhos, com a intenção de reconstituir no ciberespaço a experiência de
adentrar em uma sala.
63
Afinal, seria ou não a arte postal então uma das primeiras manifestações artísticas a tratar da comunicação em
rede? “A arte postal encontra suas origens em movimentos como Neo-Dadá, Fluxus, Novo Realismo e grupo japonês
Gutai, formado no fim dos anos 50, antecipando grandes mudanças que viriam a ocorrer no mundo das artes
ocidentais, como o happening e action painting. O ano de 1963, data de fundação da New York Correspondence
School of Art pelo artista Ray Johnson, pode ser considerado a data de nascimento da arte postal” (PRADO, 2004:
259). As diferenças entre a arte postal e a comunicação em rede dizm respeito à tecnologia dos meios eletrônicos em
suas particularidades como a velocidade de comunicação para longas distâncias; a instantaneidade, os suportes
imateriais, o tempo real, a interatividade, e, ainda, a dissolução da autoria e a ubiqüidade.
64
Disponível em: http://webartenobrasil.vilabol.uol.com.br/home.htm
65
Ibidem
61
mostram criações que foram produzidas e pensadas para a internet e que dependem dela para
existir.66
Com base nas definições propostas por Nunes e Prado analisar-se-á mais adiante alguns
sites que têm como assunto a fotografia, a fim de se estabelecer possíveis conexões. No entanto,
antes, disto, exige-se esclarecer os critérios de seleção dos sites.
Os sites escolhidos, além de tratarem sobre fotografia de maneira geral, embora com
abordagens diferenciadas entre si, apresentam algum tipo de mostra. Pode-se dizer que as
páginas a exibem de forma seqüencial, assemelhando a uma exposição tradicional, como de
quadros lado a lado e, às vezes, com algum texto de apresentação. E, dentro de links identificados
por categorias – fotógrafos e assuntos; ou seções – exposições e portfolios. Pode-se dizer, por
enquanto, que contêm galerias virtuais de fotografia.
Alguns dos sites são revistas eletrônicas. Contém notícias variadas sobre o assunto,
informações e seções sobre cursos; concursos; mercado; lançamento de equipamentos e livros;
artigos de especialistas (pesquisadores ou fotógrafos); links para páginas de fotógrafos, empresas
ou sites; classificados; exposições, ensaios, entrevistas e/ou portfolios. Entre eles estão:67 Photos
(http://photos.uol.com.br/); Banco da Imagem (http://www.bancodaimagem.com.br) e Fotosite
(http://fotosite.terra.com.br).
As revistas portais são aquelas que fazem um apanhado de tudo o que há na web. Não há
conteúdo. Funcionam como um grande catálogo em hyperlink. Assim, é possível chegar às
relações de: agências; bancos de imagens; cursos; fabricantes; fotografia digital; fotógrafos;
galeria; instituições; laboratórios; lojas; oficinas; portais; e revistas. Exemplo Portal da Foto
(http://portaldafoto.com.br).
66
Ibidem
67
Estes exemplos servem apenas como ilustração das classificações. Não se propôs a fazer um levantamento do que
há na Web sobre cada categoria ou analisar quais os mais relevantes. Atemo-nos antes aos que contêm galerias
significativas para nossa investigação.
62
Os bancos de imagens são destinados à venda de fotos on line para uso comercial. As
imagens podem ser encontradas por sistema de busca por tema, como Crianças, ou por meio de
tópicos já estabelecidos pelo site. Aparecem lado a lado e em diversas páginas. Alguns também
são agências e, dada a localidade geográfica, apresentam uma realidade e assuntos especializados.
É o caso da Lumiar, de Recife (http://www.lumiaronline.com.br). Outros exemplos: Stock Brazil
(http://www.stockbrazil.com.br), Corbis (http://pro.corbis.com) e Brasil Imagem
(www.brasilimagem.com.br).
Os sites que são, em sua essência galerias exibem ensaios fotográficos comprometidos
com uma linguagem distinta da foto comercial. Poderia-se entendê-los como voltados para a
exibição de formas expressivas imagéticas. Entre alguns deles, pode-se citar o Expofoto
(http://www.telemar.com.br/museu/expofoto) e o Zone Zero (http://www.zonezero.com).
Dessa forma, é em volta desses estilos de fotografia expressiva que gira o material que irá
ser alocado nas galerias, ou em seções específicas dentro de sites de fotógrafos-artistas, ou de
revistas eletrônicas . Mas que não pertencem ao espaço de banco de imagem.
Acrescente-se que os sites que contêm ou são galerias e que interessam a essa pesquisa
são, a exemplo do que definem Prado e Nunes, de divulgação de trabalhos fotográficos
expressivos e não galerias virtuais, individuais (páginas pessoais) ou de uma instituição virtual
(um coletivo como a revista eletrônica).
Posto isso, ressalta-se que os sites citados anteriormente contêm fotos dispostas de modo
seqüencial, com intuito, conteúdo e estética diferentes entre si. No entanto, apesar do espaço
parecer uma galeria, preferiu-se a denominação vitrine ou mostruário para aqueles vinculados ao
uso comercial (venda e prestação de serviços). A esse mesmo espaço nos sites pessoais costuma-
se denominar portfolio. Sobre a definição e importância de distinção entre seções que são galeria
e portfolio fez-se a análise das páginas selecionadas: Fotosite, Photosynthesis, Expofoto e Zone
Zero.
O Fotosite68 é uma revista eletrônica brasileira de fotografia, com pessoa jurídica sediada
em São Paulo. É um espaço destinado a trabalhos fotográficos ditos, no meio, como autorais, ou,
ainda, de caráter ensaístico, e que possui uma galeria dentro da seção intitulada porfolios.
com recorte panorâmico e abaixo de cada uma delas os nomes dos autores conforme pode ser
visto a seguir:
detalhe
Fig. 18 Modelo anterior, Primeira página Fig. 19 Modelo anterior, Página da biografia
FONTE: http://fotosite.terra.com.Br
Fig. 20 Seqüência de páginas do modelo anterior que aparecem conforme vão sendo clicadas
FONTE: http://fotosite.terra.com.br
Fig. 21 Modelo em slide show, Primeira página Fig. 22 Slide Show, Página de seqüência das fotos
FONTE: http://fotosite.terra.com.br
67
Fig. 23 Eustáquio Neves, Primeira página Fig. 24 Eustáquio Neves, Página de seqüência
FONTE: http://fotosite.terra.com.br
Fig. 25 Mário Cravo Neto, Primeira página Fig. 26 Mário Cravo Neto, Página de seqüência
FONTE: http://fotosite.terra.com.br
De acordo com Pisco Del Gaiso,69 sócio-fundador do Fotosite, a escolha dos fotógrafos
para participação na galeria se dá, principalmente, devido a algum acontecimento, o lançamento
de um livro, uma exposição, um prêmio ou uma data comemorativa. Mas, também, por convite a
algum profissional importante para a fotografia e que não conste no site. Ou, ainda, por material
enviado e por contato direto com a equipe. Gaiso não considera sua atuação como uma curadoria,
mas uma edição. Esclarece que a seleção do material é realizada em parceria com o fotógrafo,
com quem discute a triagem. Diz ainda, que a intenção do site é ser um grande inventário da
fotografia brasileira oportunizando o alcance mundial da rede.
O site carioca Photosynthesis e papo furado, criado e coordenado pelo fotógrafo Flávio
Rodrigues, ex-sub-editor de fotografia do Jornal do Brasil durante dez anos, foi um dos pioneiros
e mais importantes sites à época de sua criação, em 1998, ao inaugurar de fato uma comunidade
69
PISCO DEL GAISO. Entrevistador: a autora. São Paulo/Brasilia 15 jul. de 2006. Entrevista concedida por
telefone.
68
nacional de relacionamento no ciberespaço, tendo a fotografia como afinidade. Não é à toa que
ainda hoje apresente em sua primeira página uma estatística geográfica de seus participantes.70
É desta forma que foi um dos primeiros sites brasileiros a trabalhar com essa idéia de
exposição. Há três tipos de galerias, a saber:
70
Dentre os fotógrafos participantes há: profissionais (78,82%) e amadores (21,18%). E nos Estados: Bahia (3,95%);
Brasília (4,41%); Minas Gerais (5,26%); Paraná (6,58%); Rio de Janeiro (18,68%); Rio Grande do Sul (6,38%); São
Paulo (31,25%); Santa Catarina (3,75%); e outros (19,74%). (Cadastro, 28/06/06).
71
Disponível em: http://www.photosynt.net
72
Ibidem
69
Outra galeria é intitulada Ensaios. Faz parte de uma seção chamada Ao pé da letra que
contém oito sub-seções com entrevistas, artigos, opiniões, uma galeria menor chamada Pé-na-
estrada e a galeria Ensaios.
Fig. 30 Seção Ensaio, Primeira página Fig. 31 Página de entrada de um dos ensaios
FONTE: http://www.photosynt.net
Fig. 34 Seção Murais de Exposição, Primeira página Fig. 35 Detalhe da entrada de uma das exposições
FONTE: http://www.photosynt.net
O site carioca Expofoto – mostra virtual de fotografia73 tem cinco anos de existência. É
uma galeria virtual de fotografia dentro do site do Centro Cultural Telemar. Foi criada por uma
proposta do seu coordenador, Pedro Agilson, para dar sobrevida a uma exposição sua, realizada
no Museu do Telefone, que foi, em seguida, fechado para obras.
73
http://www.telemar.com.br/museu/expofoto
71
Ao entrar por exemplo no ensaio do fotógrafo Paulo Jares, aparece na seqüência74: título;
nome no fotógrafo; um quadro em branco; e imagens de fios que sugerem a idéia de movimento
através de efeitos de fusão. O quinto quadro é de imagem fixa com opções, à esquerda, para
retornar e, à direita, para acesso às informações mostradas no sexto quadro.
1 2 3
4 5 6
Fig. 38 Fios que sugerem a idéia de movimento através de efeitos de fusão
FONTE: http://www.telemar.com.br/museu/expofoto
74
Tivemos dificuldades na captura de uma imagem anterior ao quinto quadro contendo o seguinte texto: 10:00,
Ruído. Dessa forma, nos quadros seguintes o texto seguirá como legenda.
72
Não é necessário clicar no item info. Este só fica disponível enquanto o mouse permanece
sobre o ícone. Essa seção contém tópicos de como usar o sistema de acesso às imagens, sobre o
fotógrafo, créditos e link para comentários. Ao mover o cursor, volta-se ao quinto quadro para a
procura do elemento de passagem (dito no modo de usar) às imagens seguintes.
7 8 9
claridade nua
Fig. 39 Paulo Jares, Claridade nua
FONTE: http://www.telemar.com.br/museu/expofoto
passagem
O ícone modo de usar informa o procedimento para que, com o mouse circulando sobre a
foto, descubra-se a passagem para fotos seguintes, enquanto podem ser vistos detalhes
específicos por meio de movimentos e zoom, na seqüência a seguir:
rua
existe uma curadoria ao explorar certas vertentes fora da linha principal de trabalho de
algum fotógrafo. Com outros, apenas uma edição ligeira. Curador do Firmo77? Como
pode ser? Do Pedro Vasquez, por exemplo, recebi o projeto de um livro com um
discurso visual sofisticadíssimo já pronto. Editar o quê?! Ou seja, cada caso é um caso.
1 2 3 4
Fig. 41 Pedro Karp Vasquez, A Partida
FONTE: http://www.telemar.com.br/museu/expofoto
A exposição começa com a imagem do espiral (1), seguida de textos: título (2), citação de
Emily Dickinson (3) e texto explicativo com três passagens (4) – no quadro mostramos somente a
primeira. A exposição possui 19 divisões temáticas78. A primeira delas é intitulada A Partida. A
seguir, as fusões:
75
AGILSON, Pedro. Entrevistador: a autora. São Paulo/Brasilia 30 jul. de 2006. Entrevista concedida por e-mail.
76
Idem
77
Refere-se ao fotógrafo Walter Firmo.
78
Ou outros temas são: os poderes humanos, as sombras e as ilusões, os perigos da jornada, a mão que indica o
caminho, o caminho certo, a espera e a hora de agir, o castelo, os sinais do caminho, a ascensão, lição dos animais, a
montanha sagrada, a pirâmide, o vazio, o portal, a iluminação, olhos de ver, visões do paraíso e vida nova.
74
O site é o que mais se aproxima de modelo de proposta exclusiva de galeria virtual com
curadoria levando em conta ferramentas do digital. Se o que é exibido não depende
exclusivamente do sistema on line para existir, dado que o que está ali poderia acontecer em um
CD-Rom, pelo menos se busca a cumplicidade do visitante, na navegação, ao fazer com que
procure a passagem para as imagens seguintes.
O site de origem mexicana Zone Zero, publicado em inglês e espanhol, foi citado pelos
entrevistados anteriores como referência de uma página de relevância internacional da fotografia
autoral. Pode-se atribuir essa repercussão em parte à divulgação realizada por seu idealizador e
coordenador, Pedro Meyer, nos diversos festivais de fotografia que participa pelo mundo,
atrelados ao Festival da Luz.79
79
O Festival of Light é uma colaboração internacional de mais de 22 festivais de fotografia em torno do mundo,
entre eles o Fotofest (Houston, EUA); Encuentros Abiertos (Buenos Aires, Argentina); PhotoEspaña (Madrid,
Espanha); FotoSeptiembre (Cidade do México, México), Mois de la Photo (Paris, França) e os brasileiros FotoRio
(Rio de Janeiro) e FotoArte (Brasília).
76
A parte da galeria trata das exposições propriamente ditas. Não estão classificadas, mas
divididas em três tipos de busca: por descrição da obra (sem foto); por descrição da obra com
foto; e pelo nome do autor. Sendo que, nas duas primeiras opções, os trabalhos aparecem na
77
ordem daqueles publicados mais recentemente e, nos autores, segue o padrão de ordem
alfabética.
Passando o mouse sobre as fotos que correm no quadro 1, surge um quadrado branco, que,
clicado, permite o acesso à foto ampliada.
Outra exposição:
Feita a análise dos sites de fotografia que apresentam formatos de galeria passar-se-á a
alguns questionamentos.
No Fotosite, os trabalhos pessoais estão na seção portfolio e sabe-se que não se trata de
material comercial, porque, primeiro, está clara a proposta da página, e também porque não há
dúvida que essa parte cabe ao banco de imagem e agência contidos no site em outra seção.
Todavia, pode-se tomar como um outro exemplo, a página pessoal da fotógrafa e artista Patricia
Gouvêa, que estabelece como segmentos diferentes portfolio e o seu trabalho artístico autoral. Na
página da escola de fotografia Ateliê da Imagem
79
Entende-se portfolio como sendo, de maneira geral, uma ferramenta destinada a conter os
mais significativos trabalhos executados por um profissional. Leva em conta, portanto, as
especificidades originais, nas quais o trabalho existe de fato. O portfolio fotográfico pode ser
feito de imagens impressas (cópias), ou ser virtual.80 A problematização é que, no caso do objeto,
a fotografia, é ela mesma sua própria forma de apresentação. Isto nos faz perguntar o que
diferenciará uma coisa de outra? O que faz uma foto ser artística, expressiva e autoral, em um
momento, e, em outro, ser jornalística ou publicitária? Por enquanto, pode-se arriscar que, tanto o
espaço em que está, como a forma com que é mostrada, assim como seus elementos intrínsecos
(assunto, enquadramento, etc.) são elementos que auxiliam na identificação. Como esse assunto
por si só requer uma discussão profunda, que remete inclusive às origens da fotografia, abster-se-
á de penetrar nesse campo. Pretende-se, não obstante, abordar na seção seguinte os tópicos
relevantes referentes à curadoria de fotografia.
80
Nesse caso ainda devem ser consideradas as versões: CD-Rom, site pessoal, e-mail dirigido, ou o próprio
computador, normalmente laptop.
80
O que torna importante depreender, com a análise realizada até o momento, é que, no caso
específico de sites cuja designação seja fotografia, e que contenham exposições, deveria se
considerar uma distinção mais efetiva entre a seção chamada portfolio e outra que constituiria a
galeria virtual. Aquela poderia conter imagens de trabalhos, coberturas jornalísticas, publicitárias
e etc. e a esta caberia trabalhos artísticos. Nesse sentido, entende-se que, no segmento do virtual,
a prática curatorial poderia vir a ser uma ferramenta importante, realizando, inicialmente por
meio da seleção, uma diferenciação entre as diversas perspectivas de trabalhos fotográficos,
como também vindo a valorizar e realçar a expressividade e a aprimorar o conceito.
81
81
Os sociólogos Nathalie Heinich e Michael Pollak (2000) utilizam esse termo para sinalizar o curador quando do
fenômeno das exposições temporárias.
82
No Brasil foi determinante, para o crescimento de exposições e projetos culturais e conseqüentemente a prática
curatorial, a implementação de leis de incentivo, como a Lei Rouanet, e a criação de diversos espaços culturais. No
Rio de Janeiro se deu, do fim dos anos de 1980 para 1990, também como forma de preservação de patrimônio
histórico: Centro Cultural Banco do Brasil, Espaço Cultural Correios, Casa França-Brasil,Centro Cultural Justiça
Federal, Centro Cultural Light. Além destes há ainda: Instituto Itaú Cultural e Estação Pinacoteca (São Paulo),
Centro Cultural Banco do Brasil, Espaço Caixa Cultural (Brasília); Centro Cultural Usina do Gasômetro (Porto
Alegre); Centro Cultural Dragão do Mar (Fortaleza); Casa das 11 Janelas (Belém) entre outros.
82
Fig. 53 Projeto Arte/Cidade, 200283 Fig. 54 Local de intervenção Projeto Arte Cidade
FONTE: http://www.pucsp.br/artecidade/indexp.htm
83
Projeto ocorrido em uma área de cerca de 10 km2, na região leste de São Paulo, em um imenso galpão até então
inexplorado do Sesc Belenzinho, onde funcionava a fábrica têxtil Moinho Santista. Disponível em:
http://www.pucsp.br/artecidade/indexp.htm
84
Nesse trabalho o fotógrafo Cássio Vasconcelos instalou uma grande imagem fotográfica da Estação Brás, com
área de projeção final de 2,70 metros por 8 metros, segmentada em 67 partes que, vistas isoladamente, pareciam
registros desconexos, sem ligação uma com a outra. Ao se posicionar em determinado ponto da sala, o observador
via a união de todos os fragmentos, constituindo uma única cena: uma área do metrô avançando em direção ao
fotógrafo, com vários prédios ao redor e a região central ao fundo. Foram inúmeros cálculos matemáticos, 67 fotos,
suspensas por fios quase imperceptíveis e distribuídas em cinco planos. A cada plano, as fotos tinham as dimensões
ampliadas, proporcionais à visão monocular. O primeiro plano estava a 2,80 metros do observador; e o último a 11
metros. A localização do ponto de fusão não foi sinalizada. O visitante deveria descobrir por conta própria. De
acordo com o fotógrafo, é desse mesmo modo que é a região leste, “difícil de vê-la como um todo”. Disponível em:
http://www.pucsp.br/artecidade/novo/cassio_int.htm
83
Viu-se como, durante esse percurso recente, o curador vem atuando de maneiras diversas,
na perspectiva de prováveis modelos de exposição (biográficas/monográficas; individuais;
coletivas; temáticas) e locais de exibição. Conclui-se, portanto, que ele pode atuar como aquele
que seleciona e edita, diante da exposição do legado de um artista; ou como aquele que media e
orquestra, diante da pluraridade das novas produções da arte contemporânea; e, ainda, como
aquele que cria, utilizando a obra de arte como instrumento e tendo em mente o ambiente da
mostra, tornando-se autor.
No caso do virtual, da mesma maneira, o curador tem, diante de si, modos de atuação.
Um, diante das ferramentas computacionais à mão para fazer uso em seu trabalho na edição e
preparação visando a apresentação da fotografia. Como foi dito, pode ocorrer, além do
ciberespaço, em suportes como CD-Rom, por meio de projeções fotográficas etc. Desse modo,
com base no material original, o curador tem no virtual um facilitador na manipulação das
imagens, mas de maneira alguma é o criador delas.
A outra atuação é diante do virtual que constitui a web. Podendo ser editor, selecionando
previamente o material, mas deixando à cargo do visitante/usuário a escolha ao acesso a cada
obra, que poderá selecionar clicando aleatoriamente. Como orquestrador, faria com que, para
maior segurança do entendimento do material, e ainda levando em consideração sua
heterogeneidade (gênero, material, assunto, autores, etc), a seqüência das obras fosse pré-
definida, sem opção de escolha de trajeto ou estando alocada em conjuntos de seções com títulos
explicativos. Ou ainda, podendo mesclar o material artístico com as questões pertinentes ao
ciberespaço exercendo, dessa forma, a autoria.
Ao curador caberá dessa forma, de maneira ampla, fazer propostas. Quando cria,
tornando-se autor, a proposta não será, no nosso caso, a imagem em si, mas a capacidade de gerar
no público diversas formas de leituras, e de sugerir maneiras de pensar. Assim, a reflexão acerca
das possibilidades de uma exposição virtual de fotografia se refere tanto os elementos da prática
curatorial abordados até aqui, como também o modo de atuação em relação ao material e ao
tema. Implica, da mesma forma, levar em consideração o ambiente do ciberespaço e suas
peculiaridades, tendo em mente que os estudos podem assumir, conforme seja o caso, a face de
um duplo virtual, seja como ferramenta, seja como espaço.
Na sala convencional, por mais que se edite uma seqüência de apresentação, o visitante
tem a opção de se deslocar no espaço, podendo começar a vê-la de onde quiser, inclusive pelo
fim. O controle é mais difícil. É verdade que o design de montagem, visando a preponderância do
85
tour concebido, poderia elaborar artifícios para garanti-lo. Um exemplo seria a construção de
longos e estreitos corredores, com grandes vazios entre as fotos, e, até mesmo, o uso de portas
entre elas, controladas por timing, que liberariam a passagem após determinado tempo do
visitante diante do quadro, em uma tentativa de garantir a atenção dirigida uma a uma à imagem.
No entanto, tal engenharia poderia assumir uma força discursiva conceitual maior do que
a pretendida pelo curador. Afinal, o cubo branco tem por si só sua dinâmica e sistemática para a
assistência. Portanto, qualquer montagem excepcional carregaria em si carga emblemática
suficientemente autônoma para dirigir o discurso. No virtual, o curador pode ter o controle de
mostrar exatamente a seqüência pensada. Ou seja, apresentar de forma concisa a edição e,
melhor, fazer com que realmente seja visualizada da maneira desejada.
qualidades técnicas, e do interesse por parte do meio de comunicação no qual será veiculada a
imagem.
Nesse sentido, segundo o fotógrafo André Dusek (apud PAIVA, 1989: 212), a edição diz
respeito à utilidade que a foto terá, portanto há diferenças se vai para a parede ou para o jornal.
De acordo com Orlando Brito (Ibidem), fotojornalista e ex-editor de fotografia da Revista Veja,
“muitas vezes é preciso mostrar coisas que não se tem a sua frente para publicar [...] o problema não é a edição, mas
a consecução, é conseguir as fotos [...] com o fotojornalismo o mais importante é o conteúdo, nem sempre a forma.
Nem sempre o bonito é necessário”.
Para o fotógrafo Antonio Saggese (Ibidem: 213), o editor faz um trabalho de co-autoria.
No caso da exposição de fotografia ou da organização de livro autoral, o editor pode servir como
uma espécie de interlocutor na análise do material bruto. Desse modo, avista caminhos, faz
contextualizações com a linguagem da fotografia, sua história e seus autores, para certificação do
que realmente se deseja mostrar, tendo em vista que todo trabalho emana algo àquele que vê.85
Seguindo essa orientação, em um ensaio, por exemplo, com fotos genéricas, centradas na
estética do instante decisivo,86 a presença de muitas imagens de caráter temático,87 mesmo que
contenham o discernimento sobre o momento fotografado, poderão gerar uma expectativa
errônea. Ou seja, afastar-se da intenção de mostrar um universo próprio, calcado na idéia da força
da foto pela foto e não pelo assunto. Pois, um elemento pode conter grande carga discursiva
simbólica e atrair a atenção na leitura do todo: fotos de carnaval, de viagens, etc. O diferente
disso seria quando os mesmos temas citados estão nas fotos mas não a tipificam. Ou, então, trata-
se de um trabalho autoral exclusivo sobre um único assunto.
85
Entende-se que atuando dessa maneira o editor aproxima-se do trabalho de curadoria.
86
No livro Images à la Sauvette, publicado em inglês sob o título The Decisive Moment (1952), Cartier-Bresson fala
acerca da decisão do olho, que percebe o instante decisivo em que todos os elementos que compõem a cena em
movimento se equilibram formando uma organização fotográfica. A eleição e consecução do instante não é fruto da
causalidade mas de uma atitude do fotógrafo. Acerca do gênero da paisagem, Santos Zunzunegui (1994) fala da
categoria da pontualidade, aspecto da temporalidade que se define como ausência de duração. Utiliza-se o
significado de instante decisivo aqui como licença interpretativa no sentido de expressar aquelas imagens que não
estão circunscritas a um tema específico.
87
Por caráter temático significa dizer fotos de: tipos brasileiros, festividades populares e folclore ou carnaval.
88
A revisão de portfolio nos festivais de fotografia atrelados ao Festival da Luz, é uma atividade com o objetivo de
dar visibilidade aos trabalhos dos artistas e fotógrafos por meio do contato com diretores de festivais, museus,
centros culturais, curadores, galeristas, colecionadores, pesquisadores e editores.
87
Com a chegada do sistema digital, tanto de tratamento quanto para captura da imagem, e a
necessidade instantânea da informação, a atividade de edição perdeu a força na tarefa de
avaliação técnica. Ou seja, sobre a análise da cópia em papel (ampliação) mais apropriada para
melhor resultado de impressão. Ou, o tipo de corte que poderia ser executado sobre
enquadramento original. Em substituição a esses métodos, intensificou-se mais a prática de
seleção priorizando a urgência em atender a informação em tempo real dos sites de notícias.
Assim, muitas vezes é o próprio fotógrafo quem edita ou pré-edita as imagens e as encaminha
para a equipe de arte. Ou, ainda, envia as fotos para arquivos sobre determinada matéria em que o
conteúdo é acessível ao editor do caderno.
89
Disponível em: http://www.fotofest.org/ff2006/meetingplace_reviewers.htm#Harris
90
Disponível em: http://www.fotofest.org/ff2006/meetingplace_reviewers.htm#Harris
88
Nesse sentido, o curador, mais do que selecionar, faz propostas, pensa o material, propõe
direções e, em nome de um conceito, não teme em dessacralizar o enquadramento original da
imagem. O curador consegue, nesse caso, enxergar propostas além do fotógrafo e do editor,
preocupados em preservar o instante original e a versão tradicional de exibição: moldura; passe-
partout; e impressões em tamanho médio de 50 x 60cm com margem. No entanto, há trabalhos
que permitem, por assim dizer, uma interferência maior, enquanto outros não.
91
A exposição Martín Chambi – O Poeta da Luz, ocorreu em Brasília, no Conjunto Cultural da Caixa e em São
Paulo, na Pinacoteca do Estado em 2003.
92
Fotografado aos 52 anos, o homem de 2,10 m de altura e 150 kg virou figura-símbolo na galeria de tipos.
89
Há pouco tempo, Martin Chambi veio a ter seu valor iconográfico reconhecido, sendo
ainda pouco divulgado embora detentor de um trabalho de valor histórico arraigado. É um tipo de
material com acervo coeso e também histórico. Portanto, pode sugerir uma curadoria editorial em
que se preze pela representatividade do autor, preservando pormenores técnicos estilísticos como
as ampliações em banho de ouro velho reproduzindo a tonalidade sépia-dourada que era utilizada
pelo autor.
93
A exposição, sob curadoria de Ligia Canongia estreou no Centro Cultural Banco de Brasil (CCBB) do Rio de
Janeiro, em 2002, e no ano seguinte, no CCBB de Brasília, como parte do Festival de Fotografia de Brasília,
FotoArte.
90
O que tentou-se recuperar com essa digressão é a aplicação do termo edição como um
trabalho que se soma à curadoria. No caso da fotografia, conta em certo grau o entendimento
sobre enquadramento, luz, assunto, a história imagética da fotografia, critérios de paisagem,
retratos, qualidade técnica do arquivo, que por fim, se justificam sempre sob a força discursiva e
poética do conceito da obra. Logo, na prática da edição para uma exposição, leva-se em conta que
a idéia de sequenciamento poderá ser mais facilmente demonstrada por meio de uma seqüência
rígida no virtual, com uma curadoria que tanto pode ser de editor quanto de orquestrador. O
curador-editor pode deixar livre o acesso para apreensão do trabalho do artista. O curador-
orquestrador pode querer dirigir a atenção, fazendo predominar a edição, a seqüência definida,
utilizando-se do recurso da imobilidade.
3.3 CATÁLOGO
94
Normalmente, constam no catálogo o título da exposição, textos de apresentação, ficha técnica, logomarca de
patrocinadores e, ou da instituição em que ocorre a exposição e fotos do trabalho.
95
Considera-se que as questões relativas ao arquivamento do material, para garantir a história da galeria ou ainda da
web, cabem ao coordenador da galeria, pessoas diretamente envolvidas ou a cargo de alguma instituição voltada para
a preservação de manifestações do ciberespaço.
91
Não obstante, percebeu-se que uma das possibilidades para existência de catálogo seria a
utilização dos próprios mecanismos eletrônicos. Dessa forma, o catálogo eletrônico seria uma
versão editada da exposição para download. Ou seja, com textos, algumas fotos, e,ou outros
acréscimos, como informações sobre o artista, o curador, curiosidades e clipping. Pronta para
arquivamento no computador do visitante.
Outro tipo seria o catálogo em versão impressa, de desenho reduzido, visando a economia
de impressão. Talvez, mais próximo do formato de folder, inclusive com indicação de dobras,
contendo todos os textos e algumas imagens.
Outro ainda seria o catálogo por tour em que se teria o executável da exposição inteira.
Este modelo parece ser o mais pertinente no que se refere ao modelo de seqüência rígida. Já no
caso de uma exposição em que se exija a interação do usuário, ou fora do padrão rígido em
questão, poderia ser viabilizada a gravação do tour executado pelo próprio visitante.
No que diz respeito aos textos explicativos da mostra como apresentação, título da
exposição e ficha técnica,96 entende-se que poderiam constar tanto no começo quanto no fim. No
entanto, entende-se que a colocação ao término da mostra é mais condizente com a proposta
conceitual em questão. Assim, o visitante, por sua cognição, percebe o discurso visual no que vê,
mesmo não o tendo claro. A seqüência rígida facilitaria a emissão da mensagem da edição. O
texto funcionaria como a certificação ou guia dessa apreensão. Dessa forma, o curador deve levar
em conta que tipo de fruição intensiona atingir. Se a revelação e condicionamento antes ou depois
da exibição das obras.
96
No caso do virtual a ficha técnica é reduzida. Basicamente seria artista, curador, web design, algum assistente e
divulgador ou assessor de imprensa.
92
Como já foi dito ao longo dessa pesquisa, a idéia da curadoria tem um sentido que escapa.
Pois assume o caráter da subjetividade individual por curador e trabalho (cada caso é um caso).
Apesar de serem frágeis formulações de tipos de curadoria de exposição de acordo com algum
modelo, as perspectivas curatoriais apontam para o caminho da criação e organização de
exposições multifacetadas,97 definidas por um tema ou assunto, e, alinhavadas por um conceito.
Ou seja, de uma maneira ou de outra, mais ou menos intensa, há sempre algum tipo de idéia de
orientação que repercute. Tanto por parte de quem executa, o curador, como por parte de quem
assiste, o expectador, especializado ou não. Falar do conceito faz parte da cena. Faz parte,
portanto, da concepção atual de exposição. Exista ou não. Fazer curadoria também é pensar
conceitos.
97
Heinich e Pollak denominam como multidisciplinares que agrupam várias categorias de trabalhos como artes
visuais, arquitetura, literatura ou música, em torno de um assunto. (2000: 236).
93
imagem númerica.98 Por meio do tema que fala dos processos de manipulação, os trabalhos
artísticos podem discutir conceitualmente questões acerca da invenção da supra realidade, em que
não importa o que é falso ou verdadeiro, em sua origem, mas a verdade da imagem em si,
realizando a quimera do desejo e do imaginado, dizendo: tudo é real.
Outro exemplo é de Lúcio Carvalho, artista e design que vive em São Paulo. O artista
realiza um trabalho de colagem e manipulação digital para gerar imagens de volume exagerado,
98
A imagem digital pode ser entendida como “a imagem fotográfica numérica, independente de sua forma de
captura, se com câmera digital ou analógica e posteriormente digitalizada”. (ZAMBONI, 2004).
99
Fotosite Revista. p. 50, n° 14, out/nov. 2006.
94
sem aparente figura e fundo, e primeiro e segundo planos, em que tudo produz uma realidade de
caráter fantástico.
tridimensionais com ricos detalhes, e fazem fotografias digitais para construção de um mundo
imaginário.100
100
Disponível em http://www.aperture.org/store/books-detail-
w.aspx?ID=464&gclid=CIbxiMvBo4gCFQTpPgodogSRYA
96
participante dessa exposição coletiva, gerando uma única imagem. Nesta, haveria a quantidade de
hyperlinks referente à quantidade de fotos expostas. Ao passar o mouse sobre as partes, haveria o
destaque para um elemento daquela área indicando o hyperlink. Clicando nele, passaria-se para
uma seqüência prevista para aquela imagem. Caso fosse outra foto, seria outro arranjo, e assim
sucessivamente. A segunda imagem também conteria links que levariam, cada um, para uma
seqüência específica. Ou seja, cada imagem selecionada sugeriria uma seqüência. Qualquer
alteração na escolha da foto e de seus links, mudaria o arranjo do labirinto.
hyperlynks
imagem híbrida
A presente idealização considera que cada trabalho deveria conter, em princípio, marcas
estilísticas muito diferenciadas de artista para artista. Essa proposta curatorial só viabiliza-se
tendo o artista como parceiro e não estando exclusivamente na função de edição ou orquestação.
Para que possa se realizar, prescinde, em parte, da autoria individual para reconhecimento do
artista, e coloca acima disso o conjunto das peças como uma obra só. Não entende-se esse
modelo como essencialmente autoritário, além do poder de seleção que tem o curador. Em um
98
projeto com tal teor de intervenção na obra original, todos os participantes devem ser
comunicados da proposta e estar cientes da iniciativa antes de cederem os trabalhos. Mas,
também é uma possibilidade de exercício de autonomia e poder criativo do curador sim, tendo em
vista que o resultado final caberá a ele definir, sendo contraproducente para a liberdade do
projeto a submissão ao gosto dos envolvidos a todo instante.
101
Os endereços de algumas dessas revistas constam na bibliografia. Mas não foi considerada nenhuma indicação de
página individual de artista tendo em vista que implica na definição da orientação curatorial a priori estando de
acordo com cada projeto.
102
Utiliza-se esse exemplo a título de explicitar uma participação efetiva do processo curatorial tendo em vista que a
autora realizou consultoria fotográfica para o projeto. A exposição foi dividida em nichos como o legado imemorial,
a saga do imigrante e o momento da integração e contou com a co-curadoria do fotógrafo argentino Juan Travnik.
99
Detalhe do mosaico.
Diversas imagens montadas
digitalmente formam a foto
Apesar dos artistas receberem encomendas de trabalhos, livres para criação, foi
transmitido um resumo do tema, de pontos representativos e curiosidades de cada país em relação
à herança árabe. O desafio era conjugar a autoria de cada trabalho com a necessidade da
curadoria de fazer a representação adequada diante de um assunto que provoca, no público em
geral, sem conhecimento específico daquela cultura e povo, expectativas baseadas em um
repertório esteriotipado, em que a síntese de tudo, muitas vezes, pode significar a imagem de
mulheres com véus, fazendo assim uma estreita ligação de tudo com a religião mulçumana. Além
100
do conhecimento específico que tinha a equipe curatorial na área de fotografia, o curador geral
esteve munido de ampla pesquisa pessoal que garantia a solidez argumentativa.
103
Movimentos Improváveis – o efeito cinema na arte contemporânea, ocorreu entre 19 de maio e 13 de julho de
2003, no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro.
101
Sobre a complexidade definidora das imagens hoje, o curador-autor dessa mostra justifica
que a arte contemporânea cada vez mais é trabalhada por imagens híbridas, na indistinção das
matérias e dos procedimentos, com funções e finalidades misturadas, e circulação de formas
vertiginosas. (DUBOIS, 2003: 4).
Observa-se, por conseguinte, nessa exposição, como que, com a delimitação de um tema,
bordou-se um conceito que é instrumentalizado por meio de obras, de acordo com a idéia do
curador, mas que precisa estar dizendo do que se trata: um problema de ordem epistemológica
acerca da complexidade das imagens.
No que diz respeito ao nosso caso, a exposição movente seria aquela que consideraria a
idéia do movimento como princípio, sendo a temática do próprio trabalho artístico ou não. Assim,
poderia se compor de fotos que tivessem o movimento dentro do espaço da imagem. Ou seja,
utilizando-se de mecanismos como closes, fades, fusões, etc, poderia-se circular no plano da
composição da imagem, a exemplo do que ocorre no site Expofoto. Seria possível destacar
detalhes, enfatizar ângulos, propôr inclusive uma outra foto dentro da foto. E, sem perder o
movimento, poderia-se passar para a foto seguinte.
102
É por meio do fenômeno das exposições temporárias ocorridas, sobretudo, a partir dos
anos de 1980, que se dá a proposta de construção do conceito e pela qual o curador consegue
firmar a autoria. Sobre as exposições temporárias faz-se necessário esclarecer algumas distinções
sobre tipos em relação ao espaço ocupado e ao conteúdo. Entende-se por temporárias as mostras
que ora são eventos sazonais, como festivais e bienais (ocorrem de dois em dois anos, de quatro
em quatro, uma vez por ano, em um certo mês), e aquelas de caráter único. Estas são preparadas
levando-se em conta a importância da exposição em si. Não se limitam a um determinado período
para ocorrência, mas depois da estréia podem sofrer remontagens e itinerar. É o caso da maioria
das exposições exibidas em espaços como centros culturais, galerias e museus.
irão contribuir fortemente para a ascensão do curador. Considera-se que os eventos sazonais,
alguns existentes desde o século XI, só irão fazer essa contribuição quando em conformidade
com as próprias transformações da arte a caminho da autonomização do olhar e de seus sistemas
de organização.
Outra diferenciação diz respeito ao conteúdo, ou seja, a diferença entre arte e produto
cultural. Por exemplo, festivais e bienais de arte abrigam a arte contemporânea em que se faz
necessário um curador orquestrador, inclusive para ligar a arte, para frente e para trás, além do
atual, mas em relação à história da arte, ou como autor e, assim, imprimindo uma marca. Já
algumas mostras de caráter único podem não ser de artes plásticas, mas terem temas específicos,
baseando-se em datas comemorativas ou configurando-se como uma possibilidade do mercado
cultural. Como, por exemplo, a Mostra do Redescobrimento, Brasil + 500,104 que celebrou os
500 anos de descobrimento do Brasil, apresentando o entendimento da arte em sintonia com
valores percebidos como historicamente culturais e vice versa. Mesmo assim, o curador pode
atuar como aquele que, por meio da seleção de obras e montagem, dá a versão da idéia que deseja
defender, conduzindo assim o pensamento do público na interpretação do assunto em questão.
A questão da autoria tem embutida um elemento simbólico. Afinal reconhece-se que certo
trabalho ou autor tem autoria. Dessa maneira, os sociólogos Heinich e Pollak utilizam-se da
comparação com a indústria do cinema para fazer a análise do desenvolvimento da profissão de
curador no acesso à condição de autor. Para os autores, as características econômicas da produção
104
A mostra do Redescobrimento Brasil + 500 ocorreu em abril de 2000 no Ibirapuera, em São Paulo. Contou com
15 mil obras, em 60 mil metros quadrados, divididos em 13 módulos, com acervos desde a pré-história brasileira até
o contemporâneo.
104
cinematográfica têm inúmeros pontos em comum com aquelas que geram as produções das
exposições. Entre eles, a fabricação de um só objeto, suscetível de reprodução, no caso do
cinema, e remontagem, no caso da exposição, mas não em produção em série (FERGUSON;
GREENBERG; NAIRNE, 2000: 239-240).
105
Os autores explicam que a noção de autor tem origem na crítica francesa dos anos 50 para promover e elevar o
papel do diretor, no sentido da criatividade, comparável ao desfrutado por pintores, escritores e compositores. Essa
atribuição pela crítica foi associada à Nouvelle Vague.
106
Para tal concepção os autores partiram da análise de caso da exposição Vienne, naissance d’un siècle, 1986, no
Centre Pompidou, Paris, França.
105
especializado ou não, que percebe as obras não apenas individualmente, mas como a exposição
de um objeto total, ou seja, todas as obras juntas formando uma grande obra. (Ibidem: 239-240).
Nesse sentido, pode-se entender que as curadorias, independentemente de que modelo for,
são trabalhos em que o destaque da figura do curador lhe proporciona a posição de dignatário. Ou
seja, o curador tem assim, em todos os modelos, uma certa porção de assinatura pessoal. Afinal,
será o seu estilo, a sua especialidade (se, por exemplo, curador de fotografia), a sua autoridade e
conhecimento que estarão organizando, selecionando e dirigindo a mostra. Desse modo, seja em
que exposição for, é, em certa medida, autor, na perspectiva em que assumir uma posição de
destaque, de responder pela exposição, de ser uma personalidade e basear o trabalho em
princípios subjetivos. É a qualidade destes que irá justificar tanto erros quanto acertos para
repercussão. No entanto, percebe-se que há curadorias em que o grau de licenciamento e
liberdade, no arranjo das peças e proposições, são mais preponderantes.
É com o propósito da autoria e da criação que o curador suíço Hans-Ulrich Obrist vem
desenvolvendo exposições constituídas apenas de textos, como forma de diversificar e ampliar a
prática curatorial, valendo-se para tanto da web. O projeto Do It,107 como o próprio curador
explica em seu texto de apresentação, é uma exposição que está entre a atualização e a
virtualização, entre a repetição e a diferença.
107
Disponível em: http://www.e-flux.com/projects/do_it/itinerary/itinerary.html
106
Fig. 72 Do it
FONTE: http://www.e-flux.com/projects/do_it/itinerary/itinerary.html
Fig. 73 Trabalho do grupo Are You Meaning Company com as instruções de execução e a solicitação para o
registro dos trabalhos realizados para serem adicionados à página
FONTE: http://www.e-flux.com/projects/do_it/manuals/0_manual.html
resoluções artísticas demonstradas que perfazem seu estilo e direcionamento. Mas, então, pode o
curador ser autor, propondo uma exposição como obra?
A justificativa dada por Hoffmann é a Bienal de Veneza de 2003 com a participação dos
artistas Gabriel Orozco e Rirkrit Tiravanija como co-curadores. Dessa forma, convidou artistas a
refletirem sobre o assunto e escreverem propostas conceitualmente sobre como as coisas
poderiam funcionar juntas em uma exposição como a Documenta. Entre junho e outubro de 2003
cerca de 25 artistas encaminharam seus ensaios de curadoria, que posteriormente receberam
comentários da audiência.
108
Foi co-curador da 1ª Bienal de Praga (2003), da 1ª Bienal de Tirana (2001), e foi curador assistente da 1ª Bienal
de Berlim (1998). Como curador independente, organiza exposições desde 1998 como: Stockholm (2001); A Little
Bit of History Repeated, Berlin (2001); A show that will show that a show is not only a show, Los Angeles (2002);
The exhibition as a work of art, Rio de Janeiro (2003); A walk to remember, Los Angeles (2005); e Home of the free,
Chicago (2006).
109
Disponível em: http://www.e-flux.com/projects/next_doc/index.html
110
A Exposição como Trabalho de Arte aconteceu em março de 2003, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage,
no Rio de Janeiro. Teve participações de Artur Barrio, Adriano Pedrosa, Ana Paula Cohen, Carla Zaccagnini, Iran do
Espirito Santo, Ivo Mesquita, Laura Lima, Lisette Lagnado, Luiz Camillo Osorio, Paulo Herkenhoff e Ricardo
Basbaum, com curadoria de Jens Hoffmann. Disponível em: http://www.e-
flux.com/displayshow.php?file=message_315.txt
108
ter a curadoria. Os convidados, de maneira geral, optaram por dizer que curadores e artistas têm
funções específicas.
Uma das propagandas em favor do virtual diz respeito à pretensa liberdade de expressão
em um território de ninguém e de todos. Uma vez criado um site, blog ou fotolog, só para citar
alguns, seria então, de acordo com essa idéia, difícil de se aplicar penalizações aos responsáveis
por má conduta na rede. Protegidos por nick-disfarces,111 muitos usuários assumem preferências
ou se recriam diante da tela do computador, assumindo uma personalidade potencializada pela
ferramenta que têm diante de si. O virtual e os meios computacionais têm tantas facilidades na
capacidade de criação, reprodução de conteúdo e veiculação, que confundem sobre o que é legal
ou não.
111
Referente aos nicknames (apelidos) das salas de bate-papo e relacionamento na Web.
112
Exemplo sobre a possibilidade de uso de ferramenta buscando a fragmentação. Foto original à esquerda, e à
direita com recorte.
109
Mas, por outro lado, no virtual, o curador poderia também propor curadorias como as
auto-licenciadas. Para isso se utilizaria da digitalização de imagens de fotógrafos renomados,
divulgadas impressas em livros de arte, quando não disponíveis na própria web.
Para o caso de uma curadoria auto-licenciada, poderia ser apropriada para traçar a
trajetória da fotografia através de sua história, quanto um panorama de determinada época. Bem
como, estabelecer conexões entre períodos, tendências, estilos e assim propor intermezzos. Quer
dizer, a frágil separação que coloca, de um lado, a fotografia jornalística e documental e, de
outro, a fotografia de cunho autoral, expressivo e de comprometimento artístico. Caberia ao
curador, portanto, o papel não só de apontar, mas de arriscar a afirmação de conexões entre elas e
a defender posições. E, sobretudo correr o risco pelas escolhas, algumas vezes acertadas, outras
não.
110
2
Fig. 77 (1 e 2) Guy Tillim, Leopold and Mobutu, 2004 113
FONTE: http://www.michaelstevenson.com/contemporary/exhibitions/congo/congo1.htm
113
Guy Tillim é fotógrafo sul africano, ex-fotojornalista. O trabalho em questão foi apresentado durante a 27ª Bienal
de São Paulo, 2006, sob curadoria geral de Lisette Lagnado. Em diversos textos de apresentação sobre seu trabalho,
encontrou-se a referência de como suas imagens significam mais que apenas uma reportagem. No guia da bienal,
menciona-se como ao passar do PB para cor, o fotógrafo passou a oscilar entre documental social e objeto de arte. As
imagens mostram o trabalho realizado no Congo. Figura 80 (1), à esquerda, Defesa militar Mai Mai em treinamento;
no centro display no Museu Militar em Brussels, à direita, general Mai Mai Vita Katembola. Figura 80 (2) à
esquerda e à direita, pessoas deixando seus lugares pela luta entre grupos rebeldes; ao centro, estátua no Museu da
África Central. Disponível em: http://www.michaelstevenson.com/contemporary/artists/tillim.htm
114
Trabalho de fotógrafo da África do Sul também apresentado na 27ª Bienal de São Paulo, 2006.
115
Fotógrafo brasileiro, presente na 27ª Bienal de São Paulo, 2006. Foto à esquerda: sobre a posse do Presidente
Lula. Foto à direita: a cidade de Istambul.
111
Não há consenso por parte de especialistas da arte sobre a validade ética da atuação do
curador de se pensar que para tanto, ele pretenda-se e faça-se artista. No entanto, percebeu-se
que, embora algumas curadorias recebam críticas de suas propostas, inclusive por parte de outros
curadores, acusando-as de bizarras, não está claro que curadores tenham a exata clareza dos
limites da ação e do que vão realizar até começarem a fazer. Ou seja, não há um pensamento a
priori sobre se irá se fazer uma exposição autoral, há um processo de trabalho em relação ao
conteúdo que vai se colocando aos poucos. Assim, é diferente realizar uma mostra que tenha um
tema e outra que, além disso, tenha um conceito.
Para Lisette Lagnado, curador-autor é aquele que, parafraseando Foucault, “estabelece uma
116
possibilidade indefinida de discurso”. Nesse sentido, a autoria não se justificaria pelo sujeito, pela
personalidade em que se crê a pessoa, mas desponta na complexidade de formulações,
aproximações, continuidades e exclusões que demonstra. (FOUCAULT, 1992).
No entanto, é importante que se diga que, apesar das leis para Internet ainda estarem
sendo formalizadas, é necessário se prezar pela ética e bom senso tendo em mente o que se
almeja. No caso, por exemplo fazer uma curadoria de clássicos da fotografia e destes com
contemporâneos. Uma exposição auto-licenciada deve preocupar-se em não macular a moral do
autor e preservar a imagem em sua íntegra. Caso se valha de licenças poéticas, como colocação
de movimento, tonalidades de cor, som e recortes, é interessante mostrar, ao final, a imagem
original e seus dados de autoria, legenda, etc. Esta proposta está baseada na idéia de imagens que
podem se configurar como sendo de domínio público. Qualquer outro caso de trabalhos pouco
116
Curadoria e autoria. Em: WORKSHOP RUMOS: CURADORIA, São Paulo, Itaú Cultural, 22 de fevereiro, 2001.
Anotações.
112
conhecidos ou que o acesso ao material tenha se dado por meio da imprensa, web, ou envio de
portfolio, acredita-se ser necessário o contato com o autor para compartilhamento do projeto.
Não faz parte dessa pesquisa as questões acerca dos direitos que circundam a publicação
de imagens, mas cabe mencionar que, além dos direitos relativos ao autor da foto, há também os
direitos de imagem de pessoas retratadas. O curador, ao creditá-las, protege-se de encargos da
tomada, mas não da responsabilidade de sua veiculação.
A exposição de coleção por download é aquela em que uma das fotos, que compõe a
mostra, pode ser oferecida em alta qualidade ao visitante. Este poderia baixá-la e imprimí-la em
qualquer papel, em tamanho até de 20 x 25 cm, e assim emoldurá-la e pendurá-la na parede da
sala de sua casa. Poderia também repetir o processo quantas vezes quiser.
Por outro lado, se o mesmo sistema for proposto para o comércio de fotos on line, o que
estará em jogo será a garantia da comodidade e facilidade da oferta de serviço. Assim, mediante o
pagamento poderia se ter acesso à foto. No entanto, não é garantido que tal sistema irá atender a
expectativa de quem pretende colecionar obras assinadas, limitadas, de garantida impressão e
certificado que valorizem a foto fine art. Neste caso, o recurso pode ser utilizado para a
comercialização, mas ficando a produção da impressão fotográfica e o envio para o comprador
por conta do autor, a fim de atender aos padrões requeridos de qualidade.
Com o virtual é possível explorar de modo intensificado tanto a percepção visual quanto a
auditiva, porém não é verdade que seja algo exclusivo desse ambiente. As exposições
convencionais podem explorar as percepções na expografia de forma variada por meio de
iluminação, sonorização, contato tátil, olfativo e sensório-motor. No entanto, no ambiente virtual
as ações podem ser localizadas, podendo diferenciá-las com mais facilidade, agilidade e
viabilidade de uma imagem para outra. Desse modo, uma imagem pode ter várias tonalidades que
se alternem nela mesma e entre si. O som pode ser diferenciado de uma para outra sem que haja
interferência nas passagens. O parâmetro do sistema individual de sonorização seria na exposição
real, a utilização de fones de ouvido acoplados a cada quadro. Mas como foi explicitado
anteriormente, é preciso se considerar as regras habituais das salas convencionais para se
certificar do efeito pouco comum da expografia.
O sistema de panorâmicas virtuais ou 360° é muito utilizado por arquitetos para maquetes
e projetos e permite a visualização do ambiente de forma circular dando a impressão de se estar
no centro do cenário. Esse recurso também vem sendo usado para criação de pan-reportagens,
usando o software Quicktimevr (realidade virtual), como a publicada na página do jornal Francês
115
O sistema digital das fotos panorâmicas virtuais permite ainda a captura de som local.
Desta forma pretende-se passar ao expectador a vivência do fato ocorrido de maneira diferente do
jornal impresso e da TV. Um produto híbrido, nem foto, nem vídeo, com um movimento que não
é da imagem, mas gerado pelo visitante. Aliás, vale destacar que com recursos computacionais
como esse, o trabalho de pós-produção para tratamento e montagem das imagens é maior e
minucioso. O que rivaliza com a necessidade da notícia em tempo real da web. Dessa forma,
presta-se como um recurso extra da informação de primeira hora.
117
A reportagem tratou sobre a manifestação de estudantes ocorrida em Paris em março de 2006, sobre as mudanças
das regras quanto ao primeiro emprego.
116
De outro modo, uma exposição pan-virtual poderia ser também uma proposta da
curadoria ao artista. No papel de interlocutor, o curador enxerga desmembramentos ou direções
para as quais o artista pode seguir. Assim, agindo como conselheiro, faz perceber que outros tipos
de modelização podem ser tomados a partir de um certo trabalho. Com isso percebe-se que no
âmbito da galeria virtual ela poderia abarcar variações a partir de uma obra, conforme vem se
demonstrando até aqui com a descrição das possibilidades.
118
Para o historiador francês Laurent Gervereau, no livro Histoire du visuel au XXe Siècle, a partir do ano 2000 vivemos
o tempo da acumulação, em que a Internet integra diversos tipos de mídias e,ou suportes.
119
Gordon Cheung procura entender como visualizamos o virtual. Assim, diz capturar alucinações entre o virtual e
realidades atuais do mundo globalizado. Utiliza em sua técnica spray sobre tela, oléo, gel acrílico, pastel e papel
jornal do Financial Times. Disponível em: http://www.gordoncheung.com/
117
A exposição por busca é aquela em que o visitante ao entrar na mostra tem à frente um
mosaico de fotos miniaturizadas que toma toda a tela do computador. Ao clicar em uma das
imagens, o sistema exige que sejam definidos padrões e feitas descrições na caixa de
propriedades. Nas anotações dos metadados constarão referências de cor, tamanho, luz
(diafragma e velocidade) e descrição de tema. Feito isso, lança-se a imagem na seção da galeria
clicando no botão de busca que irá percorrer o acervo pré-definido de 100 imagens, dando-lhe o
resultado por analogia do que foi encontrado.
Os metadados podem ser entendidos como dados sobre dados, ou referente aos dados
sobre o sistema que opera com aqueles dados. A finalidade é a organização da documentação
118
organizando-os de forma estruturada. Podem ser incorporados em qualquer arquivo, onde serão
utilizados para a descrição das características do recurso e seus relacionamentos.
No caso específico dessa mostra, trata-se de uma hipótese conceitual. Portanto, não houve
verificação do sistema para comprovação da eficácia. No entanto, tal esboço se justifica pelo
entendimento de que, à curadoria cabe conceber planos de exposição. Uma vez imaginados, tanto
conceitualmente (a idéia que se deseja abarcar) quanto espacialmente (a montagem), é a vez de se
colocar em prática. Para tanto, importa a seleção de equipe de trabalho especializada em cada
função.
A exposição intitulada Imagens do Século Passado120 é uma mostra que procura refletir,
por meio do silogismo acerca da constituição da autoria e do repertório de imagens fotográficas
como patrimônio imagético de memória, aquilo que perfaz a prática de curadoria. Ao apresentar
essa mostra fotográfica, pretende-se sobretudo entender as condições do virtual. Ou seja, percebê-
lo despregado de comparações e adaptações, mas, se possível, como um espaço que deve ser
desvendado e desvelado a fim de novas formulações. Deseja-se, assim, que o jogo das peças se
mostre montado nesta exposição, metaforicamente aludido a ele.
120
Esse projeto foi inicialmente concebido pela autora durante a disciplina Tópicos Especiais em Mídias
Contemporâneas, ministrada pela Prof. Dra. Suzete Venturelli, no primeiro semestre de 2005. Na ocasião, a
exposição foi desenvolvida em linguagem de modelagem 3D aplicada pelo software Virtual Reality Modelling
Language (VRML).
120
A estrutura da galeria é simples não tendo, pois, nenhuma carga significativa na estrutura
desenhada. Ao acessar o sítio na web, ou ao abrir o documento, o visitante se depara na entrada,
primeiro, com um painel com o título da exposição e, abaixo dele o texto de apresentação. Este,
ao ser clicado é disponibilizado na íntegra em programa de texto word. De cada lado do painel,
setas indicam a passagem à exposição.
Dentro do espaço pode-se ver e percorrer três paredes com quadros expostos. A exibição
consta de 13 imagens121 em toda a sala. Sobre cada quadro há links de acesso. A indicação de
passagem é marcada pelo acionamento de cor cinza dentro do espaço do quadro.
121
São designadas como imagens porque ou são originalmente fotografias ou assim se finalizam a partir de frames
cinematográficos
121
A intenção do projeto é sugerir o deslocamento por parte do visitante que deve percorrer o
ambiente, olhar cada parede, o conjunto de quadros, se aproximar deles para vê-los de perto, e
conferir as legendas. No entanto, ao se aproximar irá perceber que não há nenhuma imagem
reconhecível à visão. Não há nada para ver. São apenas retângulos vazios, supostamente,
molduras vazias, com as respectivas legendas colocadas sobre a foto na seguinte seqüência, da
parede da esquerda para a da direita:
Marilyn Monroe com seu vestido branco esvoaçante no filme O Pecado Mora ao Lado
Che Guevara
A bomba de Hiroshima
A ovelha Dolly
Manifestante sozinho enfrenta tanques do Exército na Praça da Paz Celestial, Pequim, China
Com o planejamento demonstrado, pretende-se que o expectador, diante do que não vê, se
pergunte se é preciso realmente ver algo. Será preciso?
espectador trafegue por um espaço criado para essa função, experiencie e perceba os registros de
sua memória. É preciso que desgaste, ande, levante, baixe, olhe e busque o que está nele mesmo.
O visitante deve questionar se precisa ou não ver algo nesta mostra. Ou, se consegue
enxergar as imagens por meio do repertório de sua memória particular. Não da sua história
imagética pessoal, digamos familiar, mas de sua vivência, sim, pessoal, mas de origem social e
midiática. Será que ainda é preciso ver as imagens? Ou é capaz de ser um co-autor da exposição
projetando-as de sua lembrança? Afinal, não são elas públicas e amplamente divulgadas pelos
meios de comunicação? Íntimas da sociedade? É o caso de um dar-se conta.
A obrigação do all rights reserved não nasceu junto com a fotografia. Algumas das
imagens universais que são sugeridas na exposição foram de uma época em que se tinha em
conta o inconteste teor de verdade divina. Quer dizer, era o fato ocorrido que estava ali na foto
como a materialização automática do percurso do tempo histórico, e não uma pessoa-fotógrafo
documentando uma cena. Por isso, não importa se são fotos em si, ou a partir de imagens de
televisão, ou apenas notícia de jornal. Ou, se nunca se viu alguma delas de fato. Não importa. Eis
o ponto. É um fazer idéia sobre a coisa, que significa a coisa em si, produzindo a imagem que se
tem dela. É a minha, e a sua Queda do Muro de Berlim. É, no caso, uma virtualização.
125
Mas se necessário pode-se ter a resposta imediata por meio do resultado da busca. O
efeito complicador será saber qual das imagens-sites atenderão a expectativa que se tinha em
relação a cada quadro da lembrança.
Nossa exposição virtual é um tipo sem modelo. É um artifício que não gera outros que
não sofram com o risco do pastiche, porque espera-se que tenha conseguido realizar o exercício
de um formato expositivo cerrado mas de discurso indefinido – lembrando Foucault – na
aproximação de um autoria. Poderia se dizer muito mais. Mas é válido reconhecer que a
consecução produzida se deve em toda medida ao amparo material do virtual. Como matéria do
objeto, as condições virtuais não só amplificam a repercussão de acesso, como miniaturizam o
mundo de ações necessárias administrativamente para realização. No seu melhor, a utilização da
Web torna possível curadorias imaginativas, em que a substância idéia é a obra.
Mais que um tema expositivo, como a fotografia como ilustração de sua história, por
exemplo, Imagens do Século Passado pretende apresentar um conceito. Em certa medida,
acredita-se que é um projeto que levanta desdobramentos de abordagem. Apenas foram
projetados alguns deles. O assunto não está encerrado, nem totalmente pronta a curadoria em
exposição. Mas, ainda pode-se dizer que se trata também de assumir, sem receio, a confluência
entre o trabalho de curador e artista. Sendo diferentes, eles são parceiros na atitude de
trabalharem colocando problematizações e conceitos. Ambos são autorias enquanto inesgotáveis
associações.
126
CONCLUSÃO
O curador pode ser entendido como aquele que empreende conexões fundadoras no
arranjo de peças artísticas. Assim como o virtual, alude à referência pós-moderna no que diz
respeito à fragmentação e à confluência de tempos e espaços. Pode, portanto, sendo um pouco de
tudo – coordenador, produtor, autor, artista, crítico e designer – ser, em síntese, curador.
Das questões que repercutem no métier da curadoria, entre elas, a chefia exercida pelo
curador, o modo como seleciona artistas e peças, e parcerias que estabelece, é por meio da eleição
de temas e da construção de conceitos que o curador acerca-se da noção de autoria. Esta pode ser
entendida como forma de proposição na recontextualização de obras. Dessa maneira, os diversos
objetos artísticos juntos, pelas escolhas feitas, proporcionam uma outra dimensão significativa,
127
que por sua vez não é estanque. Os arranjos e a aparência, da forma como são apresentados,
suscitam múltiplas conexões, diante de uma exposição, que parecem ser um conjunto de uma
única peça: a mostra.
Nesse sentido, de acordo com o objetivo dessa pesquisa, de analisar a prática curatorial
com intuito de criar parâmetros para proposições no ambiente virtual de Web, pôde-se chegar a
entendimentos essenciais dessa função.
O virtual vale para a curadoria tanto como ferramenta computacional, quanto no que trata
aos elementos expositivos que perfazem o ciberespaço. Sendo ferramenta digital, auxilia o
trabalho de organização, a manipulação para tratamento da imagem e atua como recurso
dinâmico visando à exibição em diversas mídias. Nas galerias fotográficas da web, irá funcionar
na organização e idealização das apresentações considerando as potencialidades desse espaço em
consonância com a obra.
A segunda consideração é que, como editor, o curador poderá selecionar o material a ser
exibido deixando a cargo do visitante/usuário a escolha no acesso às obras. Como orquestrador,
poderá realizar suas combinações peculiares, tendo a facilidade de contar com a determinação de
um tour orientado por meio de uma sequência rígida, a fim de uma melhor cognição das ligações
empreendidas. Como autor, poderá realizar também conexões particulares, mas atentando
sobremaneira para as condições da expografia virtual, tanto como ferramenta quanto do
ciberespaço.
necessariamente estar atreladas à imagem quando da sua exibição, podendo fazer parte de um
resumo, ou, de acordo com a proposta, até serem omitidas. Movimentos, fades e fusões são
recursos e não obrigações de apresentação. A responsabilidade do material quando exibido e da
maneira como a exibição é feita é do curador. Pode-se conseguir a sugestão de sensações por
meio do cruzamento de informações como som, texto e imagem. Por se tratar de um ambiente de
simulação, marca a diferença do resultado obtido em relação ao ambiente convencional, podendo
surpreender a percepção. Não só permite mas é da natureza desse espaço que as exposições
sejam marcadamente híbridas. O visitante assume novas possibilidades (universais e em tempo
real) de se fazer também autor da obra.
Por outro lado, o espaço virtual auxilia o curador na realização de propostas de intenso
teor conceitual, em que idéias são, em si, substâncias concretas, com resoluções e alcance
potencializados pelo local expositor. Assim, o curador encontra um espaço propício para que
possa prescindir de peças a fim de trabalhar o conceito como obra. A essa curadoria caberia,
portanto, cuidar do que não pode ser visto apenas com o olhar, mas para além dele.
129
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Fig. 5 http://www.iartes.pt/bienalveneza2005/imagem_joana_vasconcelos.htm
Fig. 6 Acervo da autora
Fig. 7 http://artsonje.org/new_eng/exhi/l_exhi_1999.asp
Fig. 8 http://www-tc.pbs.org/art21/artists/kruger/img/BK_3.jpg?mii=1
Fig. 9 - 10 http://dumbtype.com/
Fig. 11 - 26 http://fotosite.terra.com.br
Fig. 27 - 35 http://www.photosynt.net
Fig. 36 - 43 http://www.telemar.com.br/museu/expofoto
Fig. 44 - 50 http://www.zonezero.com
Fig. 51 http://www.ateliedaimagem.com.br/quem_somos.php
Fig. 52 http://www.patriciagouvea.com
Fig. 53 - 55 http://www.pucsp.br/artecidade/indexp.htm
Fig. 56 http://www.terra.com.br/istoe/1761/artes/1761_olhos_da_raca.htm
Fig. 57 http://socrates.berkeley.edu/~dolorier/02.html
Fig. 58 http://www.terra.com.br/istoe/1736/1736emcartaz.Htm
Fig. 59 http://www.rodrigobraga.com.br/trabalhos/fantasia_01.htm
Fig. 60 http://www.luciocarvalho.com.br/
Fig. 61 Acervo da autora
Fig. 62 - 64 http://www.aperture.org/store/books-detail-
w.aspx?ID=464&gclid=CIbxiMvBo4gCFQTpPgodogSRYA
Fig. 65 - 66 Catálogo Aperture
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Marilyn Monroe com seu vestido branco esvoaçante no filme O Pecado Mora ao Lado
http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/pecado-mora-ao-lado/pecado-mora-ao-lado.htm
Che Guevara
http://www.cheguevaradelaserna.hpgvip.ig.com.br/galeria.html
A bomba de Hiroshima
http://educaterra.terra.com.br/voltaire/artigos/bomba_atomica.htm
A ovelha Dolly
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u8460.shtml