TJDF 1645487 Nulidade Vicio CitaçãoPJ

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 5

Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS


TERRITÓRIOS

Órgão 6ª Turma Cível

Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0710486-62.2022.8.07.0001

APELANTE(S) TV STUDIOS DE BRASILIA LTDA

APELADO(S) EZEQUIAS HENRIQUE VILARINDO ALENCAR


Relator Desembargador ESDRAS NEVES

Acórdão Nº 1645487

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. VIA


POSTAL. REMESSA. ENDEREÇO DIVERSO. VÍCIO. CONSTATAÇÃO. TEORIA DA
APARÊNCIA. INAPLICABILIDADE. SENTENÇA. CASSAÇÃO.A citação tem por escopo dar
ciência da demanda ao réu e viabilizar o exercício da ampla defesa e do contraditório. A realização da
citação em endereço diverso da pessoa jurídica, cujo aviso de recebimento foi acolhido por pessoa que
lhe é estranha, conduz à nulidade do respectivo ato. A teoria da aparência, amplamente admitida pela
jurisprudência com amparo no art. 248, § 2º, do Código de Processo Civil, pressupõe que a citação
tenha sido realizada no endereço da pessoa jurídica, a despeito de recebida por pessoa desprovida de
poderes de representação.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores do(a) 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito


Federal e dos Territórios, ESDRAS NEVES - Relator, ALFEU MACHADO - 1º Vogal e LEONARDO
ROSCOE BESSA - 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ALFEU MACHADO, em
proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. PROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata do
julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 01 de Dezembro de 2022

Desembargador ESDRAS NEVES


Relator

RELATÓRIO

Cuida-se deAPELAÇÃO CÍVELinterposta por TV STUDIOS DE BRASÍLIA LTDA (ré) em face de


sentença proferida pelo Juízo da Décima Sexta Vara Cível de Brasília, que, nos autos da ação de
conhecimento movida por EZEQUIAS HENRIQUE VILARINDO ALENCAR (autor), julgou
procedente a pretensão autoral,para condenar a ré a: i) retirar de sua plataforma/site todo e
qualquer vídeo/imagem que torne possível a identificação do autor, em especial os vídeos/imagem
colacionados através do link ali reportado; ii) pagar a quantia de R$ 100.000,00, a título de
compensação por danos morais, corrigida pelo INPC a contar da publicação da sentença e
acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a partir da data da veiculação da matéria. Em face da
sucumbência, a requerida foi condenada, ainda, ao pagamento das custas processuais e de honorários
advocatícios, estes fixados em 10% do valor da condenação(ID 40499840).

Opostos embargos de declaração pela ré (ID 40499846), foram estes rejeitados (ID 40499854).

Em suas razões recursais (ID 40500410), a ré/apelante suscita preliminar de nulidade da citação. Para
tanto, destaca não estar estabelecida no endereço indicado na peça de ingresso. Afirma que, por
pertencer ao grupo Sílvio Santos, localiza-se no município de Osasco/SP, mais especificamente na
Avenida das Comunicações nº 4, Vila Jaraguá, CEP: 06276-905. Frisa que a carta de citação foi
recebida por terceiro, em logradouro absolutamente desconhecido, consoante se verifica do respectivo
aviso de recebimento juntado aos autos. Pondera, nesse contexto, que a condenação imposta pela
sentença guerreada, após a decretação de sua revelia, viola o princípio do contraditório e da ampla
defesa. Pugna pelo reconhecimento da nulidade da citação, de forma a ser devolvido o prazo para a
apresentação da contestação. Argumenta, ainda, que a emissora responsável por veicular a reportagem
questionada teria sido a TV BRASÍLIA, afiliada da TV OMÊGA LTDA (REDETV!), com inscrição
no CNPJ sob o nº 02.131.538/0001-60. Ressalta não possuir responsabilidade pelos fatos narrados na
exordial, uma vez que não realizou a reportagem em questão. Observa que as emissoras supracitadas
não se confundem, promovendo comparativo das imagens do logotipo de cada uma delas. Assevera
que somente tomou conhecimento da presente demanda após a publicação da sentença condenatória,
que, além de lhe causar enorme surpresa, acarretou prejuízo descomunal. No mérito, discorre sobre as
normas constitucionais voltadas à proteção do direito à livre manifestação da imprensa. Sustenta,
ainda, que a condenação imposta, no montante de R$100.000,00, mostra-se desproporcional ao suposto
dano perpetrado, dando ensejo ao enriquecimento sem causa do apelado.

Pede, ao final, o provimento da insurgência.

Preparo comprovado (ID 40500412).

Contrarrazões apresentadas (ID 40500417).

É o relatório.
VOTOS

O Senhor Desembargador ESDRAS NEVES - Relator

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

A apelante suscita, preliminarmente, a nulidade da citação promovida na origem, sob o fundamento de


que foi realizada em endereço diverso de sua sede e recebida por terceiro com o qual não possui
vínculo.

Razão lhe assiste.

A citação é o ato pelo qual o réu é cientificado da demanda, a fim de que exerça o seu direito de
defesa. Consoante prelecionam Daniel Mitidiero, Sérgio Cruz Arenhart e Luiz Guilherme Marinoni,
trata-se, em regra, de ato pessoalindispensável para a validade do processo e representa uma condição
para concessão da tutela jurisdicional, ressalvadas as hipóteses em que o processo é extinto sem
afetação negativa da esfera jurídica do demandado(indeferimento da petição inicial e improcedência
liminar).[1]

Conforme se infere do ato constitutivo apresentado (ID 40499849), bem como do comprovante de
inscrição e situação cadastral expedido pela Receita Federal do Brasil (ID 40499850), a apelante está
sediada na Avenida das Comunicações nº 4, Vila Jaraguá, Osasco/SP, CEP: 06276-905. Não obstante,
é possível verificar que a carta de citação foi enviada para Quadra 2, Lote 340, Zona Industrial - SIG,
Brasília/DF, CEP 70610-901, ou seja, para endereço diverso do domicílio da sede da pessoa jurídica
(ID 40499837).

Ademais, o respectivo aviso de recebimento foi assinado por Marcus Silva, que não guarda qualquer
relação com a apelante, inexistindo nos autos elementos hábeis a demonstrar que tal pessoa detenha
algum vínculo com a referida sociedade, seja de subordinação, seja de representação.

À luz desse contexto, a citação da pessoa jurídica apelante deve ser reputada inválida, haja vista a sua
realização em endereço incorreto e sem a mínima identificação da relação existente entre a pessoa
nominada no aviso de recebimento e a pessoa jurídica citanda.

Ressalte-se que a teoria da aparência, amplamente admitida pela jurisprudência com amparo no artigo
248, § 2º, do Código de Processo Civil, pressupõe que a citação tenha sido realizada no endereço da
pessoa jurídica, a despeito de recebida por pessoa desprovida de poderes de representação. Confira-se
a redação do sobredito dispositivo legal:

Art. 248. Deferida a citação pelo correio, o escrivão ou o chefe de secretaria remeterá ao citando
cópias da petição inicial e do despacho do juiz e comunicará o prazo para resposta, o endereço do
juízo e o respectivo cartório.

(...)

§ 2º Sendo o citando pessoa jurídica, será válida a entrega do mandado a pessoa com poderes de
gerência geral ou de administração ou, ainda, a funcionário responsável pelo recebimento de
correspondências.
Destarte, sem que tenha sido observado o próprio endereço da pessoa jurídica, pressuposto elementar
da regularidade da citação, não se legitima o emprego da teoria da aparência. Nessa diretriz, veja-se o
seguinte julgado do colendo Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL.


CITAÇÃO. TEORIA DA APARÊNCIA. INAPLICABILIDADE. NULIDADE RECONHECIDA.
VÍCIO TRANSRESCISÓRIO. PREJUÍZO EVIDENTE. (...) 3. Inaplicabilidade da teoria da
aparência no caso concreto, em que a comunicação foi recebida por funcionário da portaria do
edifício, pessoa estranha aos quadros da pessoa jurídica.(...) 5. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp n. 913.878/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado
em 30/9/2019, DJe de 4/10/2019.) (g.n.)

Na mesma esteira de entendimento, colhe-se julgado da egrégia 6ª Turma Cível desta Corte de Justiça:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE


PRESCRITO. PRELIMINAR ACOLHIDA. CITAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. NULIDADE DA
CITAÇÃO POSTAL. MISSIVA ENVIADA PARA ENDEREÇO DIVERSO DO CONSTANTE NO
CONTRATO SOCIAL. AVISO DE RECEBIMENTO ASSINADO POR PESSOA ESTRANHA À
APELANTE. NÃO INCIDÊNCIA DA TEORIA DA APARÊNCIA. SENTENÇA CASSADA.
APELAÇÃO PROVIDA. 1. Consoante disposto nos arts. 238 e 239, ambos do Código de Processo
Civil - CPC, a citação é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para
integrar a relação processual, sendo que a validade do processo depende da sua higidez, ressalvadas as
hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido. 2. O Superior
Tribunal de Justiça - STJ, por adotar a teoria da aparência, perfilha o entendimento de que é válida a
citação pela via postal, com aviso de recebimento entregue no endereço correto da pessoa jurídica,
mesmo que recebida por terceiros, os quais, sem nenhuma ressalva, identificam-se como
representantes da empresa, ainda que desprovidos de poderes expressos de representação, e assinam o
documento de recebimento (v.g., AgInt no REsp 1705939/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª
Turma, DJe 22/04/2019). 2.1. A validade da citação postal da pessoa jurídica, portanto, deve observar
dois destacados requisitos: (i) o envio da missiva para o seu endereço de funcionamento; e (ii) que ela
seja recebida naquele local, ainda que seja por terceiro que não apresentou qualquer reserva. 3.Na
hipótese, a citação da apelante se revela nula, porquanto a carta citatória foi enviada para
endereço diverso daquele constante no seu contrato social e o aviso de recebimento foi assinado
por pessoa estranha à apelante. Logo, não há falar em aplicação da teoria da aparência, nem
mesmo do disposto nos § § 2º e 4º do art. 248 do CPC.3.1. Apelação provida para cassar a sentença
fustigada, declarar nulos os atos praticados a partir da citação e, à vista disso, determinar o retorno dos
autos ao Juízo de origem para que seja reaberto o prazo para oposição dos embargos à monitória. 4.
RECURSO PROVIDO. SENTENÇA CASSADA. (Acórdão 1425362, 07091652620218070001,
Relator: ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 18/5/2022, publicado no DJE:
1/6/2022) (g.n.)

Por fim, cumpre registrar que, ante o comparecimento espontâneo da apelante, a irregularidade foi
suprida, nos termos do artigo 239, §1º, do Código de Processo Civil, devendo a parte ré, para o regular
processamento do feito, ser intimada (por meio de seu advogado) a fim de apresentar contestação,
oportunidade em que poderá alegar toda a matéria de defesa, inclusive, aquelas previstas no artigo
337, do Código de Processo Civil, atentando-se a contraparte, se for o caso, para as disposições do
artigo 338, do referido diploma legal.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTOao recurso a fim de, acolhendo a preliminar


suscitada,CASSARa r. sentença recorrida, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem para
que seja oportunizada a apresentação de contestação, prosseguindo-se o feito em seus ulteriores
termos.

Sem majoração de honorários, nos termos do artigo 85, § 11, do referido diploma legal, em
conformidade com o julgamento do Superior Tribunal de Justiça no AgInt nos EREsp 1.539.725/DF.

É como voto.

[1] In Novo Código de Processo Civil Comentado, 3a edição em e-book baseada na 3a edição
impressa, Editora Revista dos Tribunais, 2017.

O Senhor Desembargador ALFEU MACHADO - 1º Vogal


Com o relator
O Senhor Desembargador LEONARDO ROSCOE BESSA - 2º Vogal
Com o relator

DECISÃO

CONHECIDO. PROVIDO. UNÂNIME.

Você também pode gostar