Literatura
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1
DA CALMA E DO SILÊNCIO Não era engano, cordura,
(Conceição Evaristo) Não era afeto mentido;
Se ela assim te não cativa,
Quando eu morder Esquece-a, que sou altiva,
a palavra, Esquece-a, sim ─ fementido.
por favor,
não me apressem, SINFONIA EM AMARELO
quero mascar, (Oscar Wilde)
rasgar entre os dentes,
a pele, os ossos, o tutano Como amarela borboleta
do verbo, Cruza a ponte a diligência;
para assim versejar Um transeunte, intermitente,
o âmago das coisas. Surge tal mosca inquieta.
2
Tem que passar além da dor. A UM POETA
Deus ao mar o perigo e o abismo deu, (Olavo Bilac)
Mas nele é que espelhou o céu.
Longe do estéril turbilhão da rua,
SONETO 73 Beneditino escreve! No aconchego
(William Shakespeare) Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha e teima, e lima, e sofre, e sua!
Em mim tu podes ver a quadra fria
Em que as folhas, já poucas ou nenhumas, Mas que na forma se disfarce o emprego
Pendem do ramo trêmulo onde havia Do esforço: e trama viva se construa
Outrora ninhos e gorjeio e plumas. De tal modo, que a imagem fique nua
Rica mas sóbria, como um templo grego
Em mim contemplas essa luz que apaga
Quando no poente o dia se faz mudo Não se mostre na fábrica o suplicio
E pouco a pouco a negra noite o traga, Do mestre. E natural, o efeito agrade
Gêmea da morte, que cancela tudo. Sem lembrar os andaimes do edifício:
"Pesa-me esta brilhante auréola de nume... NOS OLHOS TRAZ O AMOR A MINHA DAMA...
Enfara-me esta azul e desmedida umbela... (Dante Alighieri)
Por que não nasci eu um simples vaga-lume?"
Nos olhos traz o Amor a minha dama
e tudo o que ela olha se enobrece.
Todos se voltam para vê-la – e aquece
os corações, do seu aceno, a chama.
3
Moças, me ajudem a cantar sua fama. Mas confesso minha implicância com aquele
“meio-dia e meia”.
Tudo que é doce, humilde, simples, vivo, Sei que “meio-dia e meio” está errado; “meio”
brota no coração de quem a escuta, se refere à hora e tem de ficar no feminino. Sim,
pois que, antes de ouvi-la, a viu, feliz. “meio-dia e meia” está certo. Mas a língua é como
a mulher de César: não lhe basta ser honesta,
Basta um sorriso: o coração cativo convém que o pareça. Aquele “meia” me dá ideia
não sabe mais o que a mente perscruta, de teste de colégio para pegar estudante distraído.
pois tudo o que a supera ela não diz. Para que fazer da nossa língua um alçapão?
Lembrando um conselho que me deu certa vez
RETRATO um amigo boêmio quando lhe perguntei se
(Cecília Meireles) certa frase estava certa (“olhe, Rubem, faça como
eu, não tope parada com a gramática: dê uma
Eu não tinha este rosto de hoje, voltinha e diga a mesma coisa de outro jeito”), eu
assim calmo, assim triste, assim magro, preferiria dizer “doze e meia” ou “meio-dia e trinta”,
nem estes olhos tão vazios, sem nenhuma afetação. Aliás a língua da gente não
nem o lábio tão amargo. tem apenas regras: tem um espírito, um jeito, uma
pequena alma que aquele “meio-dia e meia” faz
Eu não tinha estas mãos tão sem força, sofrer. E, ainda que seja errado, gosto da moça que
Tão paradas e frias e mortas; diz: “Estou meia triste...” Aí, sim, pelo gênio da
Eu não tinha este coração língua, o “meia” está certo.
Que nem se mostra. BRAGA, Rubem. Recado de primavera. Rio de Janeiro: Record, 1984. p. 58.
A PERFEIÇÃO
(Clarice Lispector)
O que me tranquiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.
MEIO-DIA E MEIA
(Rubem Braga)
4
UM MUNDO LINDO sempre companheiros. E o mundo, povoado de
(Marina Colasanti) companheiros, era lindo.
Mas os outros, os outros todos foram acabando
Morreu o último caracol da Polinésia. Havia um aos poucos, vítimas do único predador disposto a
caracol da Polinésia, um caracol de árvore, e transformar suas conchas em objetos turísticos. E o
nenhum outro. Era o último. E morreu. Morreu de último caracol da Polinésia, cansado de ser o último,
quê? Ninguém sabe me dizer. O jornal não acha cansado de ser tão só, deixou-se pisar pela Morte
importante revelar a causa mortis de um caracol da que passava apressada, certo talvez de poder
Polinésia. Noticia apenas que com ele extinguiu-se renascer em algum mundo lindo, em que milhares
a sua espécie. Ninguém nunca mais verá em lugar de ovos de caracol preparam-se para eclodir.
algum, nem mesmo na Polinésia, um polinesiano Marina Colasanti In: A casa das palavras. São Paulo: Ática, 2002. p. 15-16
caracol.
Pois eu ouso dizer que sei o que foi que o matou.
Ele morreu de ser o último. Morreu de sua extrema
solidão. Sua vida não era acelerada, nada capaz de
causar-lhe stress, mas era dinâmica; ao longo de
um ano, graças a esforços e determinação e
impulso fornecido pela própria natureza, o molusco
lograva deslocar-se cerca de setenta centímetros.
Mais, teria sido uma temeridade. Assim mesmo, de
que adiantavam esses setenta centímetros suados,
batalhados dia a dia, sem ninguém para medi-los,
sem nenhum parente amigo companheiro que lhe
dissesse, você hoje bateu sua marca? Sem ninguém
para esperá-lo na chegada?
O último caracol da Polinésia olhava ao redor e
não via ninguém. Ali estava, frequentemente, seu
tratador – o caracol vivia no Zoológico de Londres –
mas o tratador não era ninguém, o tratador era
qualquer coisa menos importante que o tronco
sobre o qual o caracol se deslocava, o tratador era
de outra espécie. E via, sim, de vez em quando via
os pesquisadores que o examinavam, olho
agigantado pela lente. Mas os pesquisadores não
tinham uma concha rosada cobrindo-lhes as costas.
Os pesquisadores também não eram ninguém.
Então o caracol da Polinésia olhava o mundo, e o
mundo estava vazio. E como pode alguém viver,
como pode alguém querer viver num mundo
esvaziado de seus semelhantes?
Seguramente ele era muito bem tratado no
Zoológico, comida não havia de lhe faltar – o que
come, comia, um caracol da Polinésia? – e de dia e
de noite estava livre de predadores. Seus
antepassados, talvez ele mesmo na infância,
tinham tido que lutar pela sobrevivência. E a vida
era dura. Mas lutavam em companhia. Quando um
deles era esmagado – quantos caracóis são
esmagados mesmo na Polinésia! – outros
lamentavam sua sorte. Quando um deles se
atrasava em sua marcha – é tão fácil a um caracol
se atrasar – outros esperavam por ele. Havia