Quando A Ansiedade Vira Doença
Quando A Ansiedade Vira Doença
Quando A Ansiedade Vira Doença
2017
Introdução
A ansiedade sempre permeou a existência humana, porém, nos últimos anos, a sua
incidência vem se intensificado demasiadamente e, via de consequência, apresentando
maior relevância para os pesquisadores que investigam os efeitos desse estado sobre o
organismo e o psiquismo humanos. O advento da globalização, o avanço da tecnologia
e as inovações do mundo moderno ensejaram, como consequência direta, o aumento
das exigências, das expectativas e das pressões existentes sobre o ser humano, fazendo
com que o indivíduo tenha dificuldades para adaptar o seu comportamento a este novo
panorama que se apresenta (Sadock, Sadock & Ruiz, 2017).
O período contemporâneo é definido por alguns autores como a Idade da Ansiedade,
devido à vinculação desse transtorno com o ritmo de vida experimentado nos dias
hodiernos, uma vez que frente a esta nova realidade, exige-se um comportamento
diferenciado do ser humano. No decorrer de sua existência, o ser humano experimenta
maiores ou menores graus de ansiedade, de preocupação, de raiva ou de medo, dependendo
das circunstâncias fáticas vivenciadas em determinado período da vida, como por exemplo,
antes de uma prova muito importante, de um primeiro encontro ou de uma entrevista de
emprego. Nestes casos, trata-se de uma característica normal da vida dos indivíduos, ou
seja, diante das situações difíceis, importantes ou novas é normal as pessoas apresentarem
diferentes graus de ansiedade (Lucena-Santos, Pinto-Gouveia & Oliveira, 2015).
Deste modo, a ansiedade é uma manifestação fisiológica inerente ao ser humano e
até necessária para a sobrevivência social, assim sendo, é necessário reconhecer o valor
positivo e adaptativo dela, pois desempenha um papel motivador na vida das pessoas,
impulsionando os sujeitos a se prepararem para confrontar as situações da vida.
Ademais, a ansiedade mobiliza os recursos físicos e psicológicos, estabelecendo
atitudes de defesa e ataque para enfrentamento de situações que ameacem ou desafiem os
sujeitos. Ela é um sinal de alerta sobre perigos iminentes e capacita o indivíduo a tomar
medidas necessárias para enfrentar as ameaças (Barlow, 2016).
Assim, a ansiedade prepara o organismo para tomar as providências adequadas, no
sentido de impedir a concretização desses possíveis prejuízos, ou pelo menos, para tentar
diminuir as suas consequências. Ela é uma reação natural e necessária à autopreservação
do ser humano. Contudo, a ansiedade pode perder a sua função adaptativa, o seu papel
protetor e motivador, e tornar-se patológica. Este sentimento estimula o indivíduo a entrar
em ação, porém, em excesso, faz exatamente o contrário, impedindo as reações (Hales,
Yudofsky & Gabbard, 2012).
A ansiedade patológica surge de uma inquietação e de uma preocupação
desproporcional à situação ou ameaça, originando-se com intensidade e duração
consideráveis, acarretando sofrimento e prejuízos de ordem funcional, organizacional e
social (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: DSM-5, 2014).
Segundo Braga et al. (2010), dentre o grupo dos transtornos mentais, as descrições
da ansiedade patológica são mais recentes, datando as primeiras pesquisas a seu respeito
do século XIX. De modo sistematizado, tomando como base um artigo de Clark e Beck
(2012), existirá uma “preocupação normal”, que é moderada, passageira, geralmente
de âmbito limitado, e experimentada pela maioria dos indivíduos, e uma “preocupação
patológica”, que é excessiva, crônica, penetrante, incontrolável, e experimentada apenas
pelos indivíduos com ansiedade patológica.
Atualmente, a maioria das pessoas com transtornos de ansiedade pode ser tratada
através de uma intervenção profissional adequada, com tratamento farmacológico
combinado com psicoterapia. Dentre as abordagens terapêuticas existentes, uma das mais
indicadas é a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), a qual, segundo Beck e Knapp
(2008), tem como princípio fundamental que a maneira como os indivíduos percebem e
processam a realidade influenciará a maneira como eles se sentem e se comportam.
Procedimentos metodológicos
Revisão da literatura
Nos últimos anos, os avanços tecnológicos, assim como as pressões sociais, políticas
e econômicas, estão repercutindo diretamente na vida do ser humano, fomentando
constantemente sentimentos de angústia, medos, preocupações, ansiedades e aflições.
Isso decorre do fato de que as pessoas estão cada vez mais isoladas do convívio social, os
momentos de lazer estão cada vez mais restritos, as cidades estão mais violentas, os índices
de criminalidade e a competição econômica se intensificam, ao passo que a segurança no
emprego decai vertiginosamente (Leahy, Tirch & Napolitano, 2013).
Ademais, as expectativas das pessoas em relação ao conforto material também
foram impactadas em função da produção de uma nova identidade consumidora, sendo
reforçada constantemente pela publicidade na televisão, nas rádios e mídias sociais, que
tanto induzem as pessoas a adquirirem seus produtos e serviços, como preconizam a busca
desenfreada por um padrão de beleza e de felicidade inalcançável (Leahy, 2011).
Os mesmos teóricos salientam, ainda, que a pessoa que detém algum transtorno de
ansiedade apresenta um estado de vulnerabilidade pessoal aumentada, em outras palavras,
o sujeito, frente a estímulos internos e externos, tem uma visão sobre si mesmo distorcida
como se estivesse em uma situação de perigo, da qual ele não tem controle ou é incapaz
de enfrentar. Deste modo, a pessoa acaba interpretando erroneamente os eventos ou sinais
neutros como ameaçadores, acreditando que estes afligem a sua segurança e bem estar.
Os transtornos de ansiedade, consoante Zamignani e Banaco (2005), caracterizam-se
pela existência de quatro componentes sintomáticos: emocionais, cognitivos, fisiológicos
e comportamentais. No aspecto emocional e cognitivo, o indivíduo pode manifestar
sensação de medo, sentimento de insegurança, antecipação apreensiva e pensamento
catastrófico, bem como, aumento do período de vigília ou alerta.
Do ponto de vista fisiológico, a ansiedade é um estado de funcionamento cerebral
que acarreta sintomas neurovegetativos, tais como, insônia, taquicardia, palidez, aumento
da respiração, tensão muscular, tremor, tontura, desconforto gastrointestinal, dentre uma
série de outras condições (Zamignani & Banaco, 2005; Leahy, 2011).
As atitudes compensatórias mais comuns apresentadas pelo ansioso são os
comportamentos de fuga e esquiva, oriundos de situações importantes de sua vida
acadêmica, social e profissional, ou seja, na presença de um evento ameaçador, o
mesmo emite uma resposta que elimina, ameniza ou adia esse evento. Este padrão
comportamental característico decorre do fato do indivíduo superestimar a probabilidade
do perigo, considerando a ameaça desproporcional ao risco real (Zamignani & Banaco,
2005; Leahy, 2011).
De acordo com a DSM-V (American Psychiatric Association, 2014) e a CID-10
Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde
(Organização Mundial da Saúde [OMS], 1996), os transtornos ansiosos estão classificados
em categorias diagnósticas, as quais são agrupadas em cinco categorias de transtornos:
ansiedade generalizada, pânico, transtorno obsessivo-compulsivo, fobias e estresse pós-
traumático.
Para que o paciente possa ser classificado como portador de algum destes transtornos
mentais, é necessário que os sintomas apresentados por ele cumpram os critérios de
diagnósticos definidos nos manuais de Psiquiatria. Ao mesmo tempo, é imprescindível
que o indivíduo apresente significativo sofrimento emocional e comprometimento na sua
vida diária e que as preocupações decorrentes do problema sejam constantes e duradouras,
Tratamento
Técnicas interventivas
Psicoeducação
O primeiro passo do processo de psicoterapia consiste em colocar o cliente a par da
TCC e de seu transtorno psiquiátrico. Segundo Dobson e Dobson (2010), a psicoeducação,
define-se como o ensino de princípios e conhecimentos psicológicos relevantes para
o cliente, ou seja, esta ocasião visa esclarecer além de informações a respeito do seu
transtorno, familiarizar o paciente ao modelo de tratamento empregado pela terapia
cognitiva comportamental.
Reestruturação cognitiva
Segundo Leahy (2011), reestruturar cognitivamente, no caso dos transtornos de
ansiedade, refere-se ao questionamento do terapeuta, acerca dos pensamentos e crenças
distorcidas do sujeito, procurando auxiliar o mesmo, a enfraquecer as suas interpretações
errôneas, por meio da busca de evidências, para em seguida auxiliá-lo na formulação de
concepções menos trágicas e exageradas em relação à realidade. Ademais, este instante
é propicio para modificar os erros cognitivos característicos dos pacientes ansiosos,
tais como a catastrofização, a leitura mental e a generalização. Para a realização desta
restruturação cognitiva, o terapeuta poderá empregar a técnica da descoberta guiada que
é aplicada através do questionamento socrático. Segundo, Dobson e Dobson (2010), o
questionamento socrático pode ser definido como uma série de questões cuidadosamente
elaboradas para auxiliar o paciente a descobrir o seu padrão disfuncional de pensar e
simultaneamente formular conclusões mais coerentes em relação a um determinado
problema e sobre a sua realidade. Deste modo, ao tratar o sujeito ansioso, promovendo a
reestruturação e a flexibilidade cognitiva, o terapeuta tem por desígnio levá-lo a buscar
interpretações alternativas das suas percepções exageradas e, em paralelo, instruí-
lo a avaliar eventos com maior realismo, neutralizando o sentido de risco ou perigo
descomedido das situações.
Técnicas de relaxamento
O treino respiratório é uma estratégia muito benéfica no tratamento de ansiedade,
devido às frequentes alterações respiratórias observadas nos portadores desses transtornos,
proporcionando ao paciente um momento de distração, oferecendo a ele, a sensação de
um senso de controle sobre o próprio organismo. Conforme, aludem Barlow (2016), este
procedimento consiste em um recurso psicofisiológico, que abarca respostas somáticas
e autônomas, com o intuito de proporcionar tranquilidade e bem-estar ao paciente. Este
momento é considerado um processo de aprendizagem que inclui o controle da respiração
em situações estressantes e o relaxamento de diferentes grupos musculares, de modo a
alcançar um estado de conforto e bem estar.
Dessensibilização sistemática
Esta técnica consiste segundo Barlow (2016), expor o paciente por repetidas
vezes e por um tempo prolongado, aos estímulos ansiogênicos de forma imaginária
ou in vivo (exposição real), conforme for mais indicado ao seu caso, com a intenção
de proporcionar a habituação e extinção às situações desencadeadoras de ansiedade.
Deste modo, o cliente é apresentado aos estímulos ou situações temidas que provoquem
desconforto ou ansiedade para ele, enquanto é solicitado que ele se abstenha de realizar
qualquer ritualização ou atitude compensatória de evitação. As exposições podem ser
realizadas de forma abrupta que ocorre por implosão ou inundação, na qual a pessoa é
exposta diretamente ao estímulo aversivo ao vivo ou por imaginação, para provocar a
ansiedade mais intensa e sem interrupção até que ela diminua. De outro modo, a exposição
pode ocorrer gradualmente, sendo esta a formatação mais indicada e usual, que consiste
em redigir uma lista e, por conseguinte, hierarquizar os objetos e eventos temidos pelo
paciente para que ele seja exposto a estas situações, iniciando pelos itens que produzem
menor sofrimento em direção àqueles mais perturbadores.
Prevenção de recaída
Esta é a fase de fechamento do tratamento embasada na teoria cognitiva-
comportamental. Este momento para Dobson e Dobson (2010), consiste em realizar uma
revisão do processo psicoterápico, elaborar um planejamento de metas e ações futuras para
o paciente e discutir sobre os sentimentos do cliente e do terapeuta. Além disso, o terapeuta
poderá apresentar ao paciente um gráfico ou mapa com a finalidade de proporcionar uma
maior visualização dos efeitos, progressos e mudanças conquistados com a terapia, bem
como, das áreas que ele pode continuar tratando e aperfeiçoando.
Conclusão
O tema ansiedade patológica e o tratamento desta doença, com base na TCC, bem
como, as principais técnicas utilizadas para o tratamento dos transtornos ansiosos são
importantes, tanto para o aprofundamento do conhecimento acerca do assunto, quanto para
o auxílio da psicoeducação dos pacientes que sofrem deste sentimento perturbador.
Ademais, evidenciou-se relevante esta pesquisa, em virtude do número de pessoas
acometidas pelos transtornos de ansiedade aumentar diuturnamente, tornando-se, então,
um assunto de extremo interesse aos profissionais da área da saúde, que, em razão deste
crescimento, necessitam estar capacitados e bem preparados para atender esta nova
demanda.
A ansiedade é reconhecida parte da sobrevivência humana, sendo considerada
normal, quando é adaptativa e motivadora, auxiliando o sujeito a preparar-se às situações
consideradas por ele difíceis e complexas. Entretanto, esta mesma emoção pode causar
diferentes transtornos mentais, quando desencadeia sofrimento psicológico e prejuízos
significativos na vida acadêmica, social e profissional da pessoa.
Desta forma, a ansiedade é considerada patológica, quando a intensidade ou
frequência do sentimento é desproporcional, bem como, a sua resposta cognitiva,
comportamental e emocional não corresponde à situação que a desencadeia.
Os transtornos ansiosos afetam tanto as crianças, quanto os adultos, causando
impactos consideráveis no seu cotidiano, sendo importante salientar, que a ansiedade
patológica observada na idade adulta pode ter iniciado ainda durante a infância e a
adolescência, conforme se pode observar em dados extraídos de estudos sobre o assunto
em tela.
Assim, quando a ansiedade for diagnosticada como uma patologia é recomendado
que a pessoa procure um tratamento psicoterápico o mais depressa possível, podendo
Referências