Como Se Faz Análise de Conjuntura - Herbert de SOuza
Como Se Faz Análise de Conjuntura - Herbert de SOuza
Como Se Faz Análise de Conjuntura - Herbert de SOuza
EDITORA VQZE$
A 1901 N ~ O 19965
VI
Herbert José de Souza
COMO SE FAZ
ANAL ISE
DE CONJ UNTU RA
161 Edição
•
\OZES
Petrópolis
1996
© 1984, Editora Vozes Ltda.
Rua Frei Luís, 100
25689-900 Petrópolis, RJ
Brasil
Diagramação
Valdecir Mello
ISBN 85.326.0091-3
Sumário
Introdução, 7
1
Algumas categorias para a análise da conjuntura, 9
2
Sistema do capital mundial. Dados gerais, 19
3
Sistema do poder político transnacionalizado, 25
4
Formas de controle político, 33
5
Estratégias em jogo, 39
6
Quadro atual, 45
7
Campos de confronto, 49
8
Um método prático de fazer análise de conjuntura
com os movimentos populares: a representação da
conjuntura, 53
Introdução
7
grupos, medimos a "força" ou o perigo de nossos
eventuais "inimigos" ou dos "perigos" e, a partir
desse conjunto de conhecimentos, informações e
avaliações, tomamos nossas decisões.
A análise da conjuntura é uma mistura
de conhecimento e descoberta, é uma leitura es-
pecial da realidade e que se faz sempre em função
de alguma necessidade ou interesse. Nesse sentido
não há análise de conjuntura neutra, desinteres-
sada: ela pode ser objetiva mas estará sempre
relacionada a uma determinada visão do sentido
e do rumo dos acontecimentos.
A análise da conjuntura é não somente
parte da arte da política como é em si mesma
um ato político. Faz análise política quem faz
política, mesmo sem saber.
Mas a análise da conjuntura é uma ta-
refa complexa, difícil e que exige não somente um
conhecimento detalhado de todos os elementos
julgados importantes e disponíveis de Uma. situa-
ção determinada, como exige também um tipo de
capacidade de perceber, compreender, descobrir
sentidos, relações, tendências a partir dos dados
e das informações.
Não deixa de ser surpreendente que
para uma atividade tão importante como é a de
analisar e acompanhar o desenvolvimento da si-
tuação política e económica de um país falte a
elaboração de teorias e métodos específicos. O
texto que segue visa oferecer alguns elementos
metodológicos para se analisar a realidade política
e perceber mais claramente a conjuntura.
8
1
Algumas categorias
para a análise
da conjuntura
9
a) Acontecimentos
10
lugar policiado vai verificar que a conjuntura está
ruim para ele naquele dia, a mãe que chega na
praça com seu filho vai pensar o contrário.
A importância da análise a partir dos
acontecimentos é que eles indicam sempre certos
"sentidos" e revelam também a percepção que uma
sociedade ou grupo social, ou classe tem da. reali-
dade e do si mesmos.
Identificar os principais acontecimentos
num determinado momento, ou período de tempo,
é um passo fundamental para se caracterizar e
analisar uma conjuntura.
b) Cenários
11
campo onde seu poder é maior. Dai a importância
de identificar os cenários onde as lutas se desen-
volvem e as particularidades dos diferentes ce-
nários.
Numa ditadura militar os cenários do
poder e da luta contra esse poder serão necessa-
riamente diferentes dos cenários de uma sociedade
democrática. Numa, talvez o quartel; noutra, o
parlamento, as ruas e as praças.
c) Atores
12
d) Relação de forças
13
e) Análise de fatos, eventos tendo como pano
de fundo as "estruturas", ou articulação entre
estrutura e conjuntura
14
forças, os movimentos, as contradições, as condi-
ções que o geraram. Se o acontecimento aparece
diretamente à nossa percepção este pano de fundo
que o produz nem sempre está claro. Um esforço
e um cuidado maiores devem então ser feitos para
situar os acontecimentos e extrair deles os seus
possíveis sentidos.
Procurar ver também os sinais de saída
para o "novo", o não-acontecido, o inédito. Tão
importante quanto entender o que já está acon-
tecendo é estar atento aos sinais dos fenômenos
novos que começam a se manifestar.
Buscar ver o fio condutor dos aconte-
cimentos. Não se pode afirmar a priori que todos
os acontecimentos "acontecem" dentro de uma
lógica determinada, seguindo um enredo predeter-
minado. Na realidade, os processos são cheios de
sentidos e dinâmicas que escapam ou não estão
subordinados a determinações lógicas. Isto, no en·
tanto, não nos impede de procurar, de pesquisar
o encadeamento, a lógica, as articulações, os sen-
tidos comuns dos acontecimentos. Quando somos
capazes de perceber a lógica interna de uma de-
terminada política económica ficará mais fácil
entender o sentido dos decretos, das ações e até
mesmo das visitas dos ministros do Planeja-
mento ...
Existem duas leituras possíveis dos
acontecimentos ou dois modos de ler a conjuntura:
- a partir da situação ou do ponto de vista do
poder dominante (a lógica do poder);
15
- a partir da situação ou do ponto de vista dos
movimentos populares, das classes subordinadas,
da oposição ao poder dominante.
De modo geral as análises de conjuntu-
ra são conservadoras: sua finalidade é reordenar
os elementos da realidade, da situação dominante,
para manter o funcionamento do sistema, do re-
gime. Uma análise feita tendo como pressuposto
uma correção de rota, mas não de direção fun-
damental. Esse tipo de análise parte do ponto de
vista do poder dominante e, de certa forma, de-
terminará não somente a seleção dos aconteci-
mentos e atares a serem analisados, como atri-
buirá a estes acontecimentos um sentido afinado
com. os interesses das classes dominantes. Todo
acontecimento é uma realidade com wn sentido
atribuído, não é um puro fato, mas wn fato lido
e visto por interesses específicos.
Partir do ponto de vista dos movimen-
tos populares não é, obviamente, inventar situa-
ções, acontecimentos e correlações de forças que
beneficiem o campo popular ao nível da fantasia
e da imaginação dos analistas interessados. É par-
tir dos acontecimentos ~ocial e historicamente
determinados, existentes, concretos, mas percebê-
los, analisá-los sob a ótica dos interesses das clas-
ses subordinadas, dado que toda análise de con-
juntura só adquire sentido quando é usada como
um elemento de transformação da realidade.
A análise de conjuntura deve levar em
conta as articulações e dimensões locais, regionais,
nacionais e internacionais dos fenômenos, dos
acontecimentos, dos atares, das forças sociais.
IR
A importância dos elementos na análise
de conjuntura depende de cada situação, de rela-
ção ou posição num contexto mais amplo e mais
permanente.
A análise de conjuntura de modo geral
é uma análise interessada em produzir um. tipo de
intervenção na política; é um elemento fundamen-
tal na organização da política, na definição das
estratégias e táticas das diversas forças sociais
em luta.
Uma questão chave na análise de con-
juntura é a percepção da complexidade e da di·
ficuldade em determinar relações de causalidade
de tipo unilinear, simples. Existe um. elemento
constante de imprevisibilidade em relação à ação
política: sua existência, seus efeitos, suas causas.
A ação política é em si mesma um elemento da
realidade política: é a base da possibilidade de
transformações, de mudança, do surgimento do
novo. Falar de uma lógica da ação é falar também
de sua imprevisibilidade.
As categorias "estratégia" e "tática" são
também instrumentos úteis para a análise da ação
dos diferentes atores sociais. lf: possível buscar iden-
tificar as linhas gerais de ação, as estratégias em-
pregadas por estes atores sociais para conseguir
realizar seus objetivos. Poderíamos definir estra-
tégia como a articulação, a definição de um con-
junto de meios, de forças, de elementos tendo em
vista realizar objetivos gerais ou "projetas" mais
globais que respondem a interesses e objetivos so-
ciais, econômicos e políticos de determinadas for-
ças ou classes sociais.
1'1
Se na estratégia observamos os objeti-
vos e linhas de ação mais gerais, na tática obser·
vamos os meios e formas particulares, concretas
de ação, tendo em vista a realização de estratégias
determinadas. Nem sempre, porém, um aconteci-
mento, ou um conjunto de ações aparentemente
articuladas entre si constituem uma tática ou uma
parte de uma estratégia. Na sociedade, no pro-
cesso social, o que acontece não tem que ver
necessariamente com uma lógica ou um plano
estabelecido. Só as teorias conspirativas ou "es-
truturalistas" da história acreditam nisso. Por isso
as análises de conjuntura deveriam estar sempre
abertas à descoberta de várias possibilidades e
alternativas.
18
2
Sistema do capital mundial.
Dados gerais
20
nais, mas as peças de tais carros são produzidas
(cadeia produtiva) por milhares de pequenas e
médias empresas de autopeças;
-um aparelho de TV é decomposto em 10.000
peças, produzidas por milhares de empresas que
se submetem ao sistema produtivo de algumas
poucas montadoras transnacionais.
As empresas transnacionais estão con-
centradas nos palses capitalistas desenvolvidos.
Mais de 2/3 dos investimentos transnacionais estão
concentrados nestes países.
Este sistema se realiza no interior das
nações, orienta, reorienta, determina o sentido, o
estilo, os limites do desenvolvimento das nações.
Articula-se, sob formas determinadas,
até mesmo com os países e economias socialistas.
Muitas empresas transnacionais produzem hoje no
interior dos países socialistas através de contratos
reaJizados entre os governos e as empresas.
22
Como legitimar um Estado nacional que não tem
como objetivo central atender os interesses na-
cionais?
O processo de transnacionalização exer-
ce pressões visíveis no sentido de: mudar o papel
do Estado na economia, ora ampliando sua inter-
venção direta, ora fazendo-a diminuir. Centraliza
o poder estatal no executivo, aprofunda as crises
de legitimidade afetando os mecanismos tradicio-
nais de constituição e definição do poder do Es-
tado.
23
e soCiais: os mveis salariais, o leque salarial no
interior do Brasil e entre o Brasil e outros países,
mesmo entre os subdesenvolvidos, mostram uma
situação de extrema desigualdade. A diferença sala-
rial entre o trabalhador brasileiro e um americano
pode chegar a lOxl. Cerca de 70% da população
brasileira não são mercado para os produtos das
transnacionais, particularmente os mais sofisti!:a-
dos. Mas mesmo assim existe um mercado de 10
a 15 milhões de brasileiros para as transnacionais
que operam no Brasil.
A transnacionalização da economia e da
política é um fenômeno que caracteriza o processo
brasileiro de forma global e determina o rumo
de seu desenvolvimento. Como o Estado transna-
cionalizado teve que se impor à Nação e se divor-
ciou dela, daí derivam as grandes questões políti-
cas e a origem de suas crises. O Estado brasileiro
está sendo dirigido por atores políticos que não
têm condições de se apresentar clara e direta-
mente à sociedade, porque respondem aos interes-
ses do grande capital transnacional instalado no
país. A história política de Roberto Campos, Mário
Henrique Simonsen e Delfim Netto ao longo des-
ses 20 anos ilustra esse ponto. Enquanto essa
situação perdurar será problemático instituciona-
lizar o poder do Estado. Nacionalizar o Estado
passou a ser uma questão fundamental e nova.
Tão nova que para muitos esta proposta pode
parecer sem sentido, já que não se consegue
pensar um Estado que não seja nacional, por de-
finição. A realidade ultrapassou a definição e a
transnacionalização redefiniu a natureza dos Esta-
dos nacionais.
3
Sistema do poder político
transnacionalizado
25
O Estado é praticamente reduzido ao
Poder Executivo federal.
Centralizado e tecnocratizado o Estado
passa a exercer o seu poder através de decisões
autoritárias, com base no uso direto da força ou
no recurso visível à coerção armada (Forças Ar-
madas) e no uso intensivo dos meios de comuni-
cação de massa sob o controle direto e indireto
do Estado. O monopólio da produção e difusão
da informação, em mãos das grandes redes de TV
e sob controle do Estado, definem um tipo de
poder político que também escapa às análises
convencionais. Trata-se do poder de "construir o
real", de definir o real, de incluir e excluir atares,
forças sociais no quadro do real apresentado a
milhões de pessoas. As coisas, os acontecimentos,
as pessoas, os movimentos sociais, as idéias, as
propostas, as alternativas existem, ou não, através
de um único canal, na ponta do qual se coloca a
vontade de um grupo, classe e Estado. Na outra
ponta milhões de pessoas recebem o pacote de
imagens que se pretende passar como a realidade
inquestionável.
Neste Estado transnacionalizado, divor-
ciado do país, desaparece a divisão tradicional dos
poderes: executivo, legislativo, judiciário. No Brasil
principalmente a partir de 1964, o legislativo apre-
sentou milhares de projetas de lei sem conseguir
transformá·los em lei, enquanto o executivo passou
a legislar por decreto.
Da transnacionalização do sistema de
poder político e do Estado decorre a impossibili-
dade de controlar o poder executivo através de
26
mecanismos políticos sensíveis às suas bases na-
cionais e populares.
Neste quadro os movimentos e partidos
populares são submetidos à lógica das leis de
segurança nacional e o povo é identificado como
inimigo potencial da Nação. As manifestações dos
movimentos populares são tratadas como mani·
festações agressivas do inimigo do Estado.
Os processos eleitorais de modo geral
são banidos, por tempo fixado segundo os cálculos
do poder dominante, ou controlados e manipulados
de forma a não ameaçar o núcleo central do poder
executivo.
Os parlamentos, onde se refletem de
certo modo os interesses nacionais e populares,
capitalistas ou não, são transformados em instân-
cias decorativas, chamados a legalizar os atas do
poder executivo ou serem marginalizados do si&
tema de poder.
27
- desenvolve-se o monopólio do executivo na pro-
dução e difusão das infonnações, a partir das
quais a realidade é pensada sem mecanismos de
controle público sobre a qualidade ou a veraci-
dade destas informações;
- a produção dos dados é em grande medida
privilégio do Estado. A estatística deixa de ser
confiável para ser uma arma politica;
- o Estado, sem fiscalização e controles demo-
cráticos, determina quem somos, que produzimos,
quanto ganhamos e prognostiga como será nosso
futuro;
- a sociedade civil é pensada como reflexo do
Estado, e se vê muitas vezes incapaz de contrapor-
se aos dados produzidos e manipulados pelo Es-
tado.
Os movimentos de opos1çao real ao re-
gime são tratados segundo os princípios da guerra
e não da política. Não há jogo político, mas guerra
política.
As instituições militares são colocadas
na direção da política do Estado por força da
lógica da ordem, sem serem as que realmente
dirigem as opções e os destinos do país. Assumem
como profissionais da guerra e da ordem do Es-
tado transnacionalizado, caindo prisioneiros da ló-
gica de um sistema que na verdade os dirige.
Em um Estado transnacionalizado as
lideranças militares que dirigem o poder politico
se afastam da sociedade nacional, do Povo e da
Nação.
28
CONTRADIÇõES DESTE SISTEMA
30
conquista da democracia é uma condição essencial
para a realização das aspirações nacionais e po-
pulares.
As formas autoritárias dos Estados trans-
nacionalizados variam de ditaduras militares e re-
gimes "civis" com forte presença das forças ar-
madas na retaguarda da ordem, o que não varia
é sua contradição com a democracia.
Todas essas características e contradições
gerais podem ser encontradas nos estados transna-
cionalizados, particularmente aqueles com um nível
atrasado de desenvolvimento capitalista. Essa regra
geral pode ser aplicada à maioria dos estados lati-
no-americanos, nas últimas décadas.
A emergência dos movimentos populares
em luta contra o autoritarismo produziu, no entan-
to, uma nova etapa de liberalização dos Estados
nacionais que revelam e desafiam o processo de
transnacionalização capitalista. A luta pela demo-
cracia passa pela reconquista dos Estados nacionais
e por uma nova articulação da economia e da poli-
tica a nível mundial.
31
4
Formas de controle político
Asexistentes
formas de controle político são mecanismos
em cada formação social com o
objetivo de manter a estabilidade e a ·ordem dos
regimes. O conhecimento dessas formas é um ele-
mento importante na análise da conjuntura por-
que elas atuam de forma permanente e nem sem-
pre são visíveis à nossa percepção.
COERÇÃO ECONôMICA
33
MECANISMOS DE CONTROLE SOBRE A
ORGANIZAÇAO SOCIAL
36
através da teologia da libertação, minaram as
bases da resignação e o regime passou a reforçar
um outro mecanismo de controle ideológico: o
medo.
Se na resignação a dominação era inter-
nalizada na própria vítima, no medo é necessário
criar a idéia de um perigo, ameaça, inimigo po-
deroso ou força sem limites que se coloca fora
e por cima da vítima. Os grupos sociais ou as
pessoas atacadas pelo medo ficam paralisadas en-
quanto sentirem que esse inimigo externo os
ameaça. Mas retomarão os movimentos quando
esse inimigo desaparecer. Daí ,que o regime que
usa o terrorismo, o medo como arma de controle
social deve estar sempre criando as situações de
medo, inventando perigos, explorando as situações
de ameaça, para manter acesa a chama do medo
nas pessoas.
CONTROLE DA INFORMAÇÃO
36
de "inteligência" militar (Escola Nacional de In-
formações, Serviço Nacional de Informações, Ce-
nimar, CIE, CIA e dezenas de outros).
Neste contexto a identüicação destas
agências produtoras de informação e dos interes-
ses que elas representam é uma tarefa importante
para a leitura adequada da conjuntura. Os órgãos
de inteligência trabalham com um sentido de
"guerra" na produção de informação e de contra-
informação, onde o que interessa é o objetivo
que o órgão persegue e não a existência do fato,
onde predomina a manipulação do dado e não sua
veracidade.
Num regime autoritário é düícil saber
se o editorial de um grande jornal está sendo
escrito por um órgão de inteligência, uma agência
de publicidade ou uma grande empresa transna-
cional.
No Brasil este sentido de manipulação
já atingiu o IBGE e lançou uma onda de descré-
dito sobre as estatísticas básicas do país.
A democratização do Estado, do regime,
passa pela democratização de todas as agências e
instituições, civis e militares, estatais e privadas
que produzem a informação, dado que informação
é poder e produzir informação é produzir as con-
dições da. existência e exercício do poder político.
37
5
.Estratégias em jogo
Asapenas
idéias que apresentamos a seguir constituem
um pequeno exercício de análise das
estratégias em jogo e que podemos considerar
como uma das formas mais interessantes de se
fazer uma análise de conjuntura, porque a idéia
de estratégia serve para se identificar as intenções
dos grupos e classes sociais e tentar descobrir os
sentidos mais globais dos acontecimentos e da ação
de diferentes atores.
Como se trata apenas de um exemplo,
vamos dispensar maiores análises e fiquemos so-
mente com o esquema que identifique as estraté-
gias existentes no grupo dirigente no poder, grupo
dirigente fora do poder e oposição e movimentos
populares.
O fim da forma de dominação autoritá-
ria, chamada agora de Velha República, abriu cami-
nho para uma nova fase de dominação politica libe-
ral, a Nova República. Esse foi o caminho brasilei-
ro de transição politica da "ditadura" para uma
proposta de regime Liberal-Democrático. A Nova
República, no entanto, celebrou seus primeiros pas-
sos sepultando seu ator principal, Tancredo Neves.
O vice-presidente da Nova República representaria
39
a continuidade da Velha e teria de encarnar agora
toda a esperança democrática dentro dos limites
de uma aliança liberal que nasceu órfã.
Neste quadro de uma peça que apenas
começa, as estratégias em jogo não estão claramen-
te definidas. Como o jogo apenas começou, as
visões e os atores ainda não se acostumaram ao
novo.
Por isso, o esquema que propomos é
apenas um exercício para ilustrar possibilidades de
estudo através da identificação de estratégias:
A) Composição entre a oposição liberal e os libe-
rais dissidentes que romperam com o poder domi-
nante. Dentro da Aliança podemos identificar duas
correntes principais:
a) liberais internacionalistas: setores dissidentes do
PDS que ajudaram a constituir a transnacionaliza-
ção da sociedade brasileira, nos períodos Castelo,
Geisel e Figueiredo;
b) liberais nacional-reformistas: lideranças de opo-
sição ao regime anterior, que expressam aspirações
da classe média e das grandes massas marginali-
zadas.
As duas correntes têm em comum o obje-
tivo de institucionalizar o regime liberal-democrá-
tico, que garanta o desenvolvimento do capitalismo
no Brasil. Os liberais internacionalistas acentuam
a identificação e compatibilidade entre o nosso de-
senvolvimento e a dinâmica do capitalismo mundial
(a ordem mundial é benéfica à ordem nacional).
Os liberais nacional-reformistas colocam ênfase na
necessidade de atender mais à dinâmica do merca-
do interno e às necessidades de reformas estrutu-
40
rais que integrem no país real os milhões de mar-
ginalizados (a ordem mundial não é necessariamen-
te benéfica à ordem nacional). O Brasil vem em
1" lugar, pela ordem.
As duas correntes aceitam a alternância
do poder como um princípio político a ser garan-
tido e concordam com um calendário de institucio-
nalização do país:
1) Remoção imediata do entulho autoritário e libe-
ralização do Estado e da sociedade e de suas re-
lações.
2) Eleições diretas para prefeitos das capitais e an-
tigas áreas de segurança nacional.
3) Constituinte.
4) Eleições diretas para presidente da República a
ser definida pela Constituinte.
As divergências se situam na definição
de política económica.
As estratégias dos liberais-internacionalis-
tas é a de acertar o passo do Brasil com o mundo
capitalista. Para isso é fundamental:
- pagar a dívida externa;
- combater a inflação, reduzir os gastos públicos,
combater a corrupção;
- desestatizar a economia;
-acabar com todas as restrições (reservas de mer-
cado, proteções alfandegárias, etc.); a atuação do
capital transnacional. O mundo é um só, assim
também o capital.
A estratégia dos liberais nacional-refor-
mistas é a de rever o modo pelo qual o Brasil se
articula com a economia mundial, dando maior ên·
fase às necessidades da sociedade nacional e mais
41
urgência ao atendimento das demandas sociais das
nossas populações. Para isso é fundamental:
- condicionar o pagamento da dívida externa à não
aplicação de uma política recessiva sob imposição
do FMI;
- combater a inflação sem achatar os salários;
- democratizar a gestão da economia sem sacrifi-
car as empresas públicas;
- rever as estratégias de desenvolvimento de for-
ma a dar prioridade à empresa nacional, ao merca-
do interno, à criação de empregos e ao combate à
miséria.
C) Movimentos populares
Nos movimentos populares e nas dife-
rentes organizações políticas podemos encontrar a
coexistência de 3 tipos de estratégias:
a) Defensiva
- está presente, dominante nos movimentos po-
pulares;
- os movimentos procuram defender-se dos ata-
ques, das situações graves;
- pensam nos meios de defesa; evitam ficar a des-
coberto;
- não têm proposta de ataque nem alternativa à
estratégia dominante.
b) Reativa
- é uma estratégia que se dá mais ao nível de
oposição política;
-diante da iniciativa, da ação do governo, faz outra
diametralmente oposta;
- é uma estratégia subordinada à iniciativa dos
grupos dirigentes no poder.
c) Alternativa
- é uma estratégia que toma iniciativa no plano
político;
- tem uma ação própria, com importância original;
- existe mais ao nível da prática que da formu-
lação de políticas e estratégias alternativas;
- exemplos no campo do poder local: experiências
de conselhos comunitários e das prefeituras, com
participação popular;
- CEBs: organização, formação e participação
delas na vida e nas lutas dos movimentos populares;
- tais experiências retecem o tecido social a partir
de novos valores e objetivos;
- uma estratégia alternativa expressa uma visão e
uma vontade de transformação global da sociedade;
não parece ser ainda a estratégia dominante nos
movimentos populares e na oposição brasileira, que
fica mais a nível da resistência e da posição pura-
mente reativa às iniciativas dos grupos dominantes
ou do governo;
- a importância desse tipo de estratégia cresce na
conjuntura da Nova República.
43
6
Quadro atual
b) Grandes Projetos
- há mais de 35 grandes projetas governamentais
em curso, cujas infra-estruturas totais ultrapassam
os 300 bilhões de dólares;
45
vanos destes projetas estão paralisados ou so-
frendo graves crises;
- a Nova República vai ter que se definir rapida-
mente sobre a continuidade ou descontinuidade
desses grandes projetas. Vários deles envolvem
sérios problemas políticos e sociais, como o Nu-
clear, Cerrados, Nordestão, Ferrovia do Aço.
c) Questão Operária
d) Questão Agrária
46
e sociais relativas à situação das populações rurais
e à questão fundiária;
- desenvolvimento das lutas no campo, ocupações
e invasões. Violência contra posseiros e povos in-
dígenas;
- amplia-se a consciência da urgência e importân-
cia da Reforma Agrária.
e) Questão Política
- reforma constitucional;
- eleições diretas;
- reforma partidária. Surgimento de novos parti-
dos e legalização de partidos políticos comunistas
e clandestinos.
47
7
Campos de confronto
a) Estado e Sociedade
49
b) Estado e Partidos Políticos
- liberalização da atuação partidária e novo peso
do Legislativo dentro do Estado;
- desenvolvimento dos partidos políticos e emer-
gência dos partidos clandestinos, até então repri-
midos pelo Estado;
- ocupação dos espaços de poder do Estado pelos
partidos.
c) Estado e Igreja
- com a Nova República, redefinição das relações
Estado e Igreja. O Estado se reabre à influência
política da Igreja. Como a Igreja se colocará frente
a essa abertura do poder?
- a redefinição das relações entre Igreja e Estado
provoca, e ao mesmo tempo depende, da redefini-
ção da correlação de forças entre as várias verten-
tes (conservadora, liberal e democrático-popular)
da própria Igreja.
d) Estado e Empresários
- identificação mais profunda entre o conjunto do
empresariado brasileiro e transnacional com as
perspectivas da Nova República;
- a ação empresarial sobre o Estado amplia seus
espaços e aprofunda as pressões diretas para defi-
nir as políticas governamentais.
e) Estado e Militares
- os militares deixam a direção politica do Estado
e se retiram para a linha de manutenção da ordem,
50
pedindo silêncio sobre sua atuação passada na dir&
ção do Estado e na implantação do regime auto-
ritário;
- a Nova República, para ser liberal, não pode
coexistir com a tutela militar.
51
8
Um método prático de fazer
análise de conjuntura com
os movimentos populares:
a representação
da conjuntura
53
conjunto do país, debatendo suas idéias e confron-
tando suas posições.
6. O debate será livre e sem nenhum tipo de dire-
ção e de intervenção do plenário. Pode ter um
tempo de 20 minutos e será interrompido para
que logo depois se faça uma avaliação do que
"aconteceu" na representação e comparar isso com
o que acontece na realidade.
As experiências realizadas com este mé-
todo foram muito interessantes tanto pelo que foi
produzido como análise coletiva da conjuntura,
como pela tomada de consciência dos participantes
sobre o seu nível de informação e conhecimento
da realidade. A representação é reveladora também
das atitudes básicas que temos sobre as diferentes
forças sociais que atuam na luta política e o quan-
to estamos ou somos influenciados pela informa-
ção e ideologia dominantes.
54
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Fa" 031 222-44 82 (90035-000) Rua Ramiro Barcelos, 386
BRASfUA, DF re1 .• 10511225-4879
Fo" 051 225-4977
A10codo e varejo
(70730-516) SCWNarte, Q 704, Bl. A, n" IS Varejo
(90010.273) Roo Róachuela, 1280
reL 10611223-2436
Fax• 061 223-2282 los
r~ .• 11226.3911
Fo" 051 226-3710
Golãnla,GO
Varejo RECIFE,PE
(7-4023-010) Rua 3, n" 291 Alocado e varejo
rer.?5&1!1~~~~ 11,(,Principe, 482
1
reL 10621225-3077
Fa" 062 225-399-4
Fax• 081 423-7575
CAMPINAS, SP
Atacado RIO DE JANEIRO, RJ
p3090-061} Ruo Paula Bueno, 782- Taquoral Atacado
F:~· 18:~1 ~;tãm g~~~~ -~~~ Rva Benedito Hipólito, 1
Vare;o
~~: 18~ 11m:~~~~
t!J.~ ij1)~~0~~~~fl~.3 de Joguaro, 1164 Varejo
Fax, (019 234-9316 (20031-201) Ruo Senador Oonfos, 118-1
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Bauru, SP Fax. 021 220·6445
Escrin5rio comerciar
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