Paper - Proteção Internacional Dos Direitos Da Pessoa Humana
Paper - Proteção Internacional Dos Direitos Da Pessoa Humana
Paper - Proteção Internacional Dos Direitos Da Pessoa Humana
LISBOA
2023
Lucca Moro Costa
Lisboa
2023
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ÍNDICE
INTRODUÇÃO……………………………………………………………………3
REFERENCIAL TEÓRICO………………………………………………………4
CONCLUSÃO…………………………………………………………………….21
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1 INTRODUÇÃO
3
2 REFERENCIAL TEÓRICO
4
Com o advento do Renascimento e, posteriormente, do Iluminismo, com os
quais as ideias de autonomia e liberdade individual atingem um patamar elevado e
com o contínuo decaimento da ética cristã como estrela-guia universal do
comportamento individual, a discussão sobre a morte assistida gradativamente
ganha terreno. Já no século XVI, Sir Thomas More, em Utopia, descreveu que na
comunidade utópica por ele envisionada, haveria auxílio ao suicídio daqueles que
assim desejassem e estivessem vivendo um sofrimento incurável e intenso.
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De acordo com o National Health Service (NHS), sistema público de saúde
do Reino Unido, o suicídio assistido pode ser definido como “o ato de
deliberadamente auxiliar outra pessoa a tirar sua própria vida”. Já José Roberto
Goldim3, um dos maiores especialistas brasileiros em bioética e catedrático da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dispõe que o “o suicídio assistido
ocorre quando uma pessoa, que não consegue concretizar sozinha a sua intenção
de morrer, solicita o auxílio de um outro indivíduo. A assistência ao suicídio de outra
pessoa pode ser feita por atos (prescrição de doses altas de medicação e indicação
de uso) ou, de forma mais passiva, através de persuasão e encorajamento. Em
ambas as formas, a pessoa que contribui para a ocorrência da morte da outra,
compactua com a intenção de morrer através da utilização de um agente causal.”.
3 JOSÉ ROBERTO GOLDIM. Bioética: índice geral de textos, resumos, definições, normas
e casos. Disponível em: https://www.ufrgs.br/bioetica/suicass.htm
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Cumpre esclarecer que o conceito de suicídio assistido a ser aqui trabalhado
envolve o que é realizado no âmbito da morte clinicamente assistida, acompanhado
por profissional da saúde e realizado apenas mediante consentimento livre e
informado de paciente acometido de doença grave, incurável e que traz profundo
sofrimento.
Por outro lado, a eutanásia retira das mãos do paciente o ato de terminação
da própria vida e coloca a injeção do fármaco letal nas mãos do profissional de
saúde. Luciano Maia Alves Ferreira 5, em sua obra “Eutanásia e Suicídio Assistido”,
define a eutanásia como aquele que “provoca também a morte antes da hora, porém
de maneira suave e indolor, a pedido de um paciente terminal e em sofrimento, sem
perspectivas de melhora e justamente por isso torna-se tão atrante para tantas
pessoas.”
5 LUCIANO MAIA ALVES FERREIRA, Eutanásia e suicídio assistido: uma análise normativa
comparada/ 1º ed. 2018.
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Subscreve-se, portanto, à definição de eutanásia apresentada pela
Associação Médica Americana6, que dispõe: “eutanásia é a administração de um
agente letal por outra pessoa a um paciente com o propósito de aliviar o sofrimento
intolerável e incurável deste paciente.”
Sanles Sanles vs. Espanha (2000), Ada Rossi e outros vs. Itália (2008),
Nicklinson e Lamb vs. Reino Unido (2015), Gard e outros vs. Reino Unido (2017) e
Afiri e Bidarri vs. França (2018), são casos que envolvem a morte clinicamente
assistida e obtiveram decisões de rejeição da admissibilidade que impediram a
análise mais profunda do mérito.
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Diane Pretty era uma cidadã britânica da cidade de Luton, na Inglaterra.
Pretty sofria de uma rara e fatal doença neurodegenerativa chamada doença do
neurônio motor (motor neurone disease). Com o avanço da doença, Pretty perdeu a
capacidade de fazer tarefas básicas diárias e, eventualmente, ficou impossibilitada
de se mover, falar e deglutir alimentos.
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suicídio assistido, enquanto a violação aos artigos 9 e 14 corresponderiam a
infringimentos da liberdade de consciência e da proibição da discriminação, na
medida em que o Estado britânico estaria violando o direito de se suicidar de uma
pessoa que estaria impossibilitada fisicamente de fazê-lo.
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o acompanhavam se recusaram a fornecer a requisição para aquisição da
substância nas quantidades necessárias para realizar o suicídio.
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garantir a saúde e a segurança públicas. A necessidade de receituário fornecido por
médico após meticulosa consulta psiquiátrica, segundo a Corte, seria uma forma de
garantir que aquele que deseja cometer o suicídio assistido possua discernimento e
capacidade para tomada de tal decisão, de modo que o requisito visaria, também,
garantir a autodeterminação individual.
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Koch, portanto, aciona a Corte Europeia de Direitos Humanos, alegando
violação aos artigos 8 e 13 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos. Em
suma, alegou que a violação ao Artigo 8 consistiria na recusa em garantir, por parte
do Estado alemão, a morte dignificada e que respeitasse os direitos à vida privada e
familiar. Já a violação ao Artigo 13, o qual prevê o direito a um recurso processual
efetivo, se daria com a recusa das Cortes alemãs em analisar o pedido formulado
por Ulrich Koch com base na sua suposta ilegitimidade.
Em sua análise do caso, a Corte considerou que houve sim uma violação ao
Artigo 8 da Convenção por parte do Estado alemão. Neste caso, a Corte Europeia
entendeu que Ulrich Koch poderia ser considerado vítima de violações de direitos
humanos no caso analisado, já que era pessoa extremamente próxima (esposo) e
cuidador da sua mulher, com a qual esteve casado por 25 anos. A Corte esposou
entendimento de que Koch possuía “claim” dos direitos de sua falecida mulher,
considerando-o como também vítima da violação de direitos. Segundo a Corte, as
autoridades judiciais alemãs possuíam um dever de analisar o mérito do caso, não
importando se a decisão que tomasse fosse a favor do postulado pela requerente ou
não.
Outro marco da decisão da Corte foi, mais uma vez, reassegurar a existência
da margem de apreciação válida para que os países-membros do Conselho da
Europa pudessem regular a questão da morte clinicamente assistida. A Corte decidiu
que a análise do mérito da questão deveria ser propriamente feita pelos Tribunais
alemães, na medida em que não haveria consenso entre os membros do Conselho
da Europa sobre como regular o suicídio assistido.
Koch vs. Alemanha mostra a Corte Europeia de Direitos Humanos, mais uma
vez, indo em uma direção de autonomia dos Estados para regulamentar a morte
clinicamente assistida, sem incorrer em violação da Convenção.
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Alda Gross, cidadã suíça, não possuía qualquer doença clínica diagnosticada
mas, devido ao avanço da idade e à debilitação física e psíquica, decidiu que poria
fim à própria vida por meio do suicídio assistido. Todavia, Gross não conseguia obter
autorização médica para aquisição do pentobarbital sódico necessário, justamente
por não possuir doença diagnosticada que justificasse o fornecimento do fármaco.
Diante dessa situação, Gross apelou às Cortes suíças para que recebesse o
receituário. O caso chegou até à Suprema Corte suíça, a qual não acolheu os
suplícios da autora. Segundo a Corte suíça, não haveria qualquer obrigação por
parte do Estado em garantir o acesso ao referido medicamento, bem como que os
requisitos estabelecidos pela Academia Suíça de Ciências Médicas não teriam sido
atingidos, já que Gross não sofria de doença terminal.
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modo, a Corte entendeu que Gross deliberadamente havia omitido e violado a boa-
fé que deveria possuir com seu advogado e perante à Corte. Desse modo, após
requerimento do governo suíço, o caso foi extinto sem julgamento de mérito, sendo
que a Corte considerou que Alda Gross havia cometido um abuso do direito de
petição individual.
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representaria uma violação ao dever dos Estados-membros do Conselho da Europa
de proteger a vida, previsto no Artigo 2 da Convenção.
Todavia, a Corte foi mais longe em Lambert vs. França. A CEDH analisou o
mérito da lei francesa que serviu de base para a retirada do suporte vital de Vincent
Lambert e chegou a conclusão de que esta possuía um framework de atuação
médica claro e seguro para a tomada de uma decisão deste tipo. Na ocasião, o
Tribunal entendeu que incumbia às Cortes francesas analisar se Vincent Lambert
atingia os requisitos necessários e que esta havia apresentado uma decisão
embasada em laudos médicos elaborados por um painel de profissionais
capacitados e que atestaram a irreversibilidade do quadro de Lambert. Segundo a
Corte, todos os pontos foram cuidadosamente analisados e a decisão exarada não
violaria a Convenção, na medida em que a análise do caso foi embasada e bem
fundamentada.
Lambert vs. França talvez tenha sido o caso em que a CEDH foi mais longe
em analisar a legalidade e legitimidade de normas balizadoras da terminação
precoce da vida, neste caso, a retirada do suporte vital. Foi uma decisão altamente
celebrada por ativistas do direito à morte com dignidade, na medida em que
garantiu, de modo claro e inequívoco, não haver incompatibilidade entre normas que
dispõem sobre casos similares e as normas de proteção do direito à vida constantes
na Convenção.
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2.3.6. Mortier vs. Bélgica (2022)
Tom Mortier é um cidadão belga cuja mãe optou por morrer pela injeção de
eutanásia. Todavia, Mortier estava extremamente irresignado com o fato de que não
foi informado da decisão da sua mãe pelas autoridades que acompanharam o caso.
No caso, a mãe de Tom Mortier sofria de depressão grave e crônica e recebeu a
autorização para realização da eutanásia por uma equipe médica que acompanhava
o caso. A paciente havia, de modo explícito, informado seu desejo de não envolver
os filhos no processo de tomada de decisão, mas deixou uma carta de despedida e
exigiu que os médicos não mantivessem contato com os filhos.
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Inicialmente, a Corte deixa bem claro que não analisará uma possível
incompatibilidade entre a eutanásia e a Convenção, mas sim se a lei belga estaria
dentro da margem de apreciação que o CEDH definiu como cabível ao procedimento
da morte clinicamente assistida pelos Estados-membros do Conselho da Europa.
Por fim, a Corte concluiu também não ter ocorrido violação ao Artigo 8 da
Convenção, entendendo que os médicos que acompanhavam a mãe de Tom Mortier
não descumpriram dever de informar aos familiares sobre o procedimento. Pelo
contrário, os mesmos teriam insistido em diversas oportunidades para que a
paciente informasse seus desejos aos seus filhos, mas esta havia se recusado. O
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CEDH referiu que os profissionais de saúde possuem um dever ético de
confidencialidade e de guardar os segredos confiados por seus pacientes, de modo
que não possuíam qualquer dever de informar a mãe de Tom Mortier do caso.
Mortier vs. Bélgica é marcante por ser o primeiro caso envolvendo eutanásia
a ser analisado pela Corte, mas também por conta de, mais uma vez, reiterar não
haver incompatibilidade entre leis estatais que regulamentam a morte clinicamente
assistida e a Convenção. Além disso, a lei belga, as quais é uma das mais atacadas
por opositores da eutanásia como sendo excessivamente permissiva, foi analisada
como sendo compatível com a Convenção, representando uma grande vitória aos
defensores da morte com dignidade.
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3 CONCLUSÃO
Ao longo dos anos, em Haas vs. Suíça, por exemplo, houve um avanço, na
medida em que a Corte definiu que deveria haver um balanceamento entre os
princípios dos artigos 2 e 8, bem como estabeleceu a margem de apreciação dos
Estados-membros do Conselho da Europa para regularem a morte clinicamente
assistida. Gross vs. Suíça avança ao estabelecer que é possível e compatível com a
Convenção que os Estados-contratantes regulamentem a morte assistida quando
estabelecerem critérios claros e suficientes para garantirem a autonomia dos
solicitantes.
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O futuro ainda não é claro sobre como a Corte continuará a julgar casos
análogos, mas já há uma jurisprudência sólida sobre a possibilidade dos Estados-
membros regularem a morte assistida, desde que com critérios rigorosos e técnicos
que garantam todos os direitos do paciente.
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4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Cohen, M., & Hortensius, J. (2018). A Human Rights Approach to End of Life?
Recent Developments at the European Court of Human Rights. Journal of the
Brazilian Institute of Human Rights.
Koch vs. Germany, (European Court of Human Rights July 19, 2012).
https://hudoc.echr.coe.int/eng#{%22itemid%22:[%22001-112282%22]}
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Oliveira, N. M. P. (2016). A jurisprudência do Tribunal Europeu de Direitos
Humanos sobre o fim da vida. Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário.
Pretty v. United Kingdom, (European Court of Human Rights April 29, 2002).
https://hudoc.echr.coe.int/eng-press#{%22itemid%22:[%22003-542432-544154%22]}
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